ALGORITMO DE APONTAMENTO PARA INJEÇÃO DE SATÉLITE EM ÓRBITA Hilton Cleber Pietrobom1 and Waldemar de Castro Leite Filho2 2 1 Instituto de Aeronáutica e Espaço - IAE, São José dos Campos, Brasil, [email protected] Instituto de Aeronáutica e Espaço - IAE, São José dos Campos, Brasil, [email protected] Resumo: Esse artigo apresenta um algoritmo denominado de APONTAMENTO, que calcula o ângulo de arfagem e guinada em que o último estágio de um veículo lançador de satélites deve ser apontado, bem como o seu instante de ignição, de forma que a altitude de injeção do satélite corresponda ao perigeu da órbita final, evitando desta forma a reentrada do satélite na atmosfera terrestre. Palavras-chave: Veículo Lançador de Satélites, VLS, Algoritmo de Apontamento. 1. INTRODUÇÃO O objetivo fundamental de um veículo lançador de satélites é a injeção do satélite em órbita. Para que o veículo cumpra sua missão de satelização, o voo deve obedecer a uma sequência de eventos que caracteriza as diversas fases pelas quais o veículo deve passar. A figura 1 ilustra a sequência de eventos do voo do VLS (Veículo Lançador de Satélites Brasileiro). O VLS possui quatro estágios, cujos motores utilizam propelente sólido. Somente os três primeiros estágios possuem controle do vetor de empuxo, utilizando para isso atuadores do tipo tubeira móvel para deslocar o vetor e criar forças e torques laterais. Desta forma, como o último estágio não possui tal controle, o mesmo deve ser orientado antes de sua ignição, ou seja, durante a fase balística que se inicia logo após a separação do terceiro estágio. Após a ignição do último estágio, ele é estabilizado por rotação, restando apenas a propulsão do último estágio para o ganho de velocidade necessário para a injeção da carga útil em órbita. A atitude de referência, que compreende um conjunto de ângulos em relação à um referencial inercial, utilizada pelo algoritmo de controle durante o voo do veículo, é definida durante a execução do projeto. Essa atitude definida antes do voo servirá para controlar a trajetória do veículo. Caso não houvesse nenhum tipo de perturbação durante o voo, e o veículo seguisse o mesmo perfil de atitude pré-definido, a missão seria realizada sem problema. No entanto, durante o voo, o veículo está sujeito a perturbações, tais como dis- persões propulsivas, arrasto aerodinâmico, perturbações de vento, que o conduzem a uma condição de voo diferente da nominal. Desta forma, se faz necessário um algoritmo que, baseado nos dados da trajetória real, corrija o instante de ignição e a atitude de referência para o último estágio, pois os respectivos dados pré-definidos já não condizem mais com a realidade. O algoritmo responsável por calcular o ângulo de arfagem e guinada em que o último estágio deve ser apontado, e o instante ótimo de ignição do mesmo, para colocar o satélite na órbita desejada, é chamado de APONTAMENTO. Tal algoritmo constitui-se de um conjunto de equações algébricas, cujo objetivo é, em função das condições em que o veículo se encontra e a energia propulsiva embarcada no último estágio, procurar uma órbita com parâmetros pré-estabelecidos. As informações fornecidas pelo APONTAMENTO serão utilizadas como referência pelo algoritmo de basculamento (ver [1] para maiores detalhes). Esse artigo, diferentemente da estratégia proposta em [2], que procura obter uma órbita circular com uma inclinação e altitude pré-estabelecidas, descreve uma estratégia de apontamento que não se preocupa com a excentricidade da órbita, mas em garantir que após a queima do último estágio, não ocorra a reentrada do satélite na atmosfera terrestre, fato que pode acontecer com a estratégia descrita em [2], principalmente para órbitas com baixas altitudes. Esse resultado é obtido fazendo com que a altitude de injeção do satélite seja igual ao perigeu da órbita final a ser alcançada. Foram realizadas simulações para avaliar o desempenho desta estratégia considerando dispersões no motor do último estágio. 2. ALGORITMO DE APONTAMENTO Dada a curta duração da fase de voo do último estágio que representa o tempo de queima do motor, pode-se aproximá-la por uma transferência impulsiva entre órbitas Keplerianas. O ganho de velocidade produzido pela queima do último Figura 1 – Sequência de eventos do voo do VLS. estágio, definido como ∆v4 , é dado por: Z tq4 Fe4 (t) dt ∆v4 = m4 (t) 0 (1) sendo af o semi-eixo maior da órbita final. A figura 3 mostra o diagrama da condição do veículo imediatamente antes e após a aplicação do impulso, sendo o ângulo δi responsável por mudar a inclinação da órbita. sendo Fe4 , m4 e tq4 a força de empuxo, a massa e o tempo de queima do último estágio, respectivamente. O valor de ∆v4 é calculado antes do voo. Da mesma forma, o ganho de posição é dado por: Z tq4 ∆v4 (ξ) dξ. (2) ∆r4 = 0 Tem-se que entre a separação do terceiro estágio e a ignição do último, o veículo está fora da atmosfera e não está sendo propulsado. A figura 2 ilustra essa fase (coast phase). Durante este período, pela conservação de energia e do momento angular, a órbita Kepleriana produz: v2 − 2.µ µ =− r a (3) e v3 .r3 . cos(γ3 ) = v.r. cos(γ) = v4 .r4 . cos(γ4 ). (4) sendo a o semi-eixo maior da elipse, µ o produto da massa da Terra pela constante gravitacional, e v, r e γ a velocidade, o raio e o ângulo de trajetória, respectivamente. Figura 3 – Diagrama vetorial no momento da impulsão do último estágio. Para obter uma órbita elíptica com semi-eixo maior af , é necessário que se satisfaça a equação 5, e que ~vsat esteja perpendicular a ~r. Com essas condições e pela observação da figura 3, determina-se as seguintes relações: v. sin(γ) + ∆v4 . cos(δi ). sin(θ) = 0 (6) e [v. cos(γ) + 2 ∆v4 . cos(δi ). cos(θ)] + 2.µ µ (∆v4 . sin(δi ))2 = . − r af (7) Fazendo com que o semi-eixo maior af seja igual a: Figura 2 – Condições do veículo na separação do terceiro estágio e ignição do último. Da equação 3, tem-se que a velocidade final de satelização vsat para uma órbita elíptica é igual a: s µ 2.µ (5) − vsat = r af af = Kr .r, (8) sendo a constante Kr > 1, pois desta forma tem-se que a altitude de injeção seja igual ao perigeu da órbita final, e através de manipulações algébricas das equações 3, 4, 6 e 7, o resultado será uma equação polinomial do tipo r3 + A1 .r2 + A2 .r + A3 = 0 (9) sendo A1 A2 A3 = −2. = = − 4− 1 a0 4− 1 a0 + + 1 Kr ∆v42 µ 2 1 Kr ∆v42 µ (10) 2 + 2 ∆v42 . sin2 (δi ). 2.v0 .r0 µ. cos(γ0 ) (11) 2 ∆v42 1 + a0 µ (2.Kr − 1).(2.v0 .r0 . cos(γ0 ))2 2 ∆v 2 Kr .µ. a10 + µ 4 (12) cujos valores de v0 , r0 , γ0 correspondem ao módulo da velocidade inercial, da posição inercial, e ao ângulo de trajetória no instante de tempo T0 , tomado logo após a separação do terceiro estágio, instante em que se inicia a execução do algoritmo de APONTAMENTO. O valor de a0 é calculado utilizando a equação 3, e ~r0 .~v0 , (13) γ0 = arcsin r0 .v0 sendo ~r0 = [x0 ; y0 ; z0 ] e ~v0 = [vx0 ; vy0 ; vz0 ]. Caso se considere Kr = 1, o algoritmo de APONTAMENTO irá buscar uma órbita circular, conforme é apresentado em [2], pois resultará em af = r. A equação 9 é um polinômio de terceira ordem para a variável r. Esta equação, teoricamente, possui três soluções. Entretanto, apenas uma tem significado físico. Para os valores dos dados simulados de v0 , r0 , γ0 , a solução analítica para r é: √ λ 2π A1 ri = 2. −p. cos − + (14) 3 3 3 tal que λ = arccos sendo p= −A21 + 3.A2 9 e q= −q p −p3 ! (15) −2.A31 + 9.A1 .A2 − 27.A3 . 54 A equação 14 apresenta a expressão que possibilita o cálculo do valor do raio da órbita que o veículo estará após a queima do motor do último estágio, caso seja impulsionado com os ângulos θ e δi , conforme mostrado na figura 3. Com o valor de ri , é possível determinar o tempo de ignição do último estágio (tig ), bem como os ângulos de arfagem e guinada, representados no sistema de navegação inercial, em que ele deve ser apontado nesse instante (θr e ψr ). Conforme descrito em [2], o tempo tig é dado por: s a30 . [(Ei − E0 ) − e0 .(sin(Ei )− tig = T0 + µ sin(E0 ))] + ∆r4 − tq4 , ∆v4 (16) sendo que e e E são excentricidade e anomalia excêntrica, respectivamente. O cálculo dessas variáveis é feito da seguinte forma: s 2 r.v 2 e = − 1 . cos2 (γ) + sin2 (γ) (17) µ a−r . (18) E = arccos a.e O ângulo de arfagem no triedro de voo, definido pelos versores ~r0 , ~v0 × ~r0 e ~r0 × (~v0 × ~r0 ) que formam a matriz M, é dado por: π a0 .(1 − e20 ) − ri θv = − − arccos + 2 e0 .ri a0 .(1 − e20 ) − r0 − arccos e0 .r0 r q r e20 −(1− a i )2 2µ µ 0 − . ri 2 a0 1−(1− a ) ri 0 . (19) arcsin ∆v4 . cos(δi ) A atitude inercial ψr e θr para o apontamento do quarto estágio é dada por: ψr = arcsin(T(2)) e sendo: θr = arctan(−T(3)/T(1)) − π, cos(δi ). cos(θv ) . sin(δi ) T = M. − cos(δi ). sin(θv ) 3. RESULTADOS O algoritmo de APONTAMENTO foi testado para duas missões deferentes do VLS, representadas por VLS-v1 and VLS-v2, que possuem diferentes trajetórias, parâmetros órbitais desejados, motores, massa estrutural, satélites, etc. As simulações foram realizadas utilizando os arquivos de propulsão nominal, superior e inferior, que especificam os limites máximo e mínimo que cada curva pode atingir. Como ilustração, as figuras 4 e 5 mostram o perfil de empuxo e massa de propelente para o motor do último estágio da missão VLS-v2, respectivamente. Os dados de entrada do algoritmo são apresentados na Tabela 1. Sendo considerado adequado para todos os casos testados, utilizou-se kr = 1.01. Os resultados obtidos podem ser vistos nas Tabelas 2, 3 e 4, sendo hi a altitude de ignição do motor do último estágio, iorb a inclinação da órbita obtida, eorb a excentricidade, Aporb o apogeu, P erorb o perigeu, e hf a altitude de injeção em órbita. 4. CONCLUSÃO O voo ideal ocorre quando as condições são nominais. No entanto, essa situação é muito difícil de acontecer. Com respeito a injeção de satélites em órbita, um dos problemas que pode ocorrer devido às perturbações é a reentrada do satélite na atmosfera terrestre, principalmente quando a órbita 4 6 x 10 Tabela 1 – Dados de entrada do algoritmo de APONTAMENTO. 5 Empuxo [N] 4 3 2 1 Empuxo Nominal Empuxo Superior Empuxo Inferior 0 0 10 20 30 40 Tempo [s] 50 60 70 80 Figura 4 – Perfil de empuxo nominal, superior e inferior para o motor do último estágio. VLS-v1 VLS-v2 ∆v4 [km/s] 3.375856 3.613275 ∆r4 [km] 92.281 97.76946 T0 [s] 192.625 191.375 x0 [km] 6609.126 6649.014 y0 [km] -40.083 22.679 z0 [km] 388.068 336.135 vx0 [km/s] 2.264 1.961 vy0 [km/s] 0.271 0.125 vz0 [km/s] 4.661 4.340 900 Tabela 2 – Resultados de simulação para o caso nominal. Massa Nominal Massa Superior Massa Inferior 800 700 Massa [Kg] 600 500 400 300 200 100 0 0 10 20 30 40 Tempo [s] 50 60 70 80 VLS-v1 VLS-v2 tig [s] 494.075 405.323 hi [km] 745.580 605.654 θr [graus] -116.245 -111.872 ψr [graus] 9.477 -1.457 iorb [graus] 16.222 15.981 eorb 0.009899 0.009771 Aporb [km] 919.304 776.640 P erorb [km] 776.242 638.173 hf [km] 776.259 638.196 Figura 5 – Perfil de massa de propelente nominal, superior e inferior para o motor do último estágio. Tabela 3 – Resultados de simulação para o caso superior. possui baixa altitude. O algoritmo de apontamento apresentado nesse trabalho apresenta meios de evitar tal problema, fazendo com que a injeção do satélite aconteça no perigeu da órbita final. Desta forma, a altitude mínima da órbita elíptica obtida será igual à altitude de injeção hf . Os resultados obtidos indicaram que o algoritmo se mostrou satisfatório em todos os três casos estudados (nominal, superior e inferior), pois hf ∼ = P erorb , como pode ser visto nas Tabelas 2, 3 e 4. O algoritmo descrito nesse trabalho foi utilizado no caso específico do VLS, mas é suficientemente geral para ser aplicado em casos similares, onde o último estágio possui motor a propelente sólido. Referências [1] Waldemar C. Leite Filho and Laís M. R. Mallaco. Strategy for pitch-over maneuver control. AIAA Guidance, Navigation and Control Conference, 1999. Portland USA. [2] Waldemar de Castro Leite Filho. Pointing algorithm - a strategy for orbit injection with uncontrolled last stage. In Proceedings of the 2nd ESA International Conference on Guidance, Navigation and Control Systems, The Netherlands, April 1994. VLS-v1 VLS-v2 tig [s] 494.074 405.323 hi [km] 745.580 605.654 θr [graus] -116.245 -111.872 ψr [graus] 9.477 -1.457 iorb [graus] 16.237 15.988 eorb 0.018780 0.019201 Aporb [km] 1049.518 912.280 P erorb [km] 775.677 637.588 hf [km] 775.677 637.589 Tabela 4 – Resultados de simulação para o caso inferior. VLS-v1 VLS-v2 tig [s] 494.074 405.323 hi [km] 745.580 605.654 θr [graus] -116.245 -111.872 ψr [graus] 9.477 -1.457 iorb [graus] 16.208 15.974 eorb 0.001123 0.000550 Aporb [km] 792.403 645.298 P erorb [km] 776.320 637.573 hf [km] 776.838 638.799