Proporcionalidade e Segurança Pública III Mostra de Pesquisa da Pós-Graduação PUCRS Betina da Silva Adami ¹ Mestranda em Direito pela PUCRS e bolsista da CAPES. Prof. Dr. Ingo Sarlet (orientador) Programa de Pós-Graduação em Direito, Mestrado, PUCRS. Resumo O objetivo deste trabalho é identificar e analisar o contexto político-institucional em que são desenvolvidas políticas de segurança pública no Brasil e os contornos teóricos possíveis para a aplicação do princípio da proporcionalidade no desenvolvimento dessas políticas de segurança pública. Busca-se uma abordagem aproximada à teleologia axiológica constitucional, situada, por um lado, no contexto do respeito à vida, à liberdade e à dignidade da pessoa humana e, por outro, nos valores da comunidade, colocando-se entre o afastamento de uma intolerável “tolerância zero” e uma política criminal abolicionista. Introdução O fenômeno da globalização impulsiona-nos a transpor a análise tradicional das construções econômicas, político-institucionais e sociais da modernidade. As ponderações daí decorrentes têm, subseqüentemente, projeções sobre o comportamento do Estado, mormente no que toca ao Estado Democrático de Direito, objeto precípuo desta análise. III Mostra de Pesquisa da Pós-Graduação – PUCRS, 2008 Nesse ponto, as transformações sentidas nesses diversos aspectos – que puderam ser observadas nos últimos 30 anos aproximadamente – são fecundas e decisivas para a análise de como é mantida a sociedade “ocidental” – industrial, capitalista, democrática e moderna. Num primeiro momento, verifica-se que a globalização (sobretudo sob o seu aspecto econômico) age sobre os elementos tradicionais do Estado – a sua soberania, seu território e povo, impulsionando um enfraquecimento de sua base material, sua soberania e sua classe política. A redução do Estado provoca também o enfraquecimento do Estado Democrático de Direito e do estímulo à concretização de direitos fundamentais, bem como, por outro lado, faz prosperar os níveis de poder econômico e social daqueles atores que se beneficiam com a exclusividade da pauta econômica. Nesse contexto é que emerge, então, a problemática que se pretende apontar nessa análise – a demarcação constitucional acerca da segurança pública e a equalização da proporcionalidade, circundadas pelas situações postas pelo fenômeno globalizante. Fomenta igualmente essa análise a observância de um sentimento de insegurança generalizada e o surgimento de “medos urbanos” e, nessa linha de argumentação, aponta-se para uma redefinição da cartografia das cidades, marcadas por zonas que são ainda “transitáveis” e espaços marcadamente pobres e violentos. Essa bipolarização não é apenas geográfica ou espacial, mas alimenta o medo e o desprezo pela diferença, já que a localidade homogênea perde a qualidade de caráter e a habilidade para lidar com a incerteza e com a diferença. Nesse cenário, as políticas desenvolvidas no campo da segurança pública tomam especial importância e, na esfera das disputas políticas, a sua discussão torna-se, no mais das vezes, palco para a construção de poder. O que se impõe verificar, nesse passo, é a contextualização da proporcionalidade no Estado Democrático de Direito, especificamente no que diz com a manipulação dos instrumentos postos à disposição do Estado para operacionalizar a segurança pública. Tal questão coloca-se sob uma dupla perspectiva, que nos remete à problemática dos deveres de proteção do Estado na esfera dos direitos fundamentais e aos contornos possíveis de uma teoria convergente com as exigências (de uma equalização proporcional) derivadas do III Mostra de Pesquisa da Pós-Graduação – PUCRS, 2008 Estado Democrático de Direito, ao que chamaremos, na esteira das proposições de Ingo Sarlet, de proibição de excesso e de insuficiência. Metodologia Como método de abordagem, a respeito da pesquisa doutrinária, utilizamos o método hipotético dedutivo. As leituras buscam construir conjecturas que passarão a ser analisadas criticamente. A importância da utilização desse método reside no fato de podermos tecer, a partir de pesquisas já desenvolvidas e de outros dados empíricos, novas considerações sobre a problemática exposta. Resultados (ou Resultados e Discussão) Os resultados aqui apresentados não deverão ser tomados como conclusivos, tanto no que diz respeito com a sua extensão como no tocante ao seu conteúdo, já que são objeto de pesquisa mais acurada que ainda está sendo desenvolvida. • O contexto político-institucional é decisivo para o sentido que tomam as políticas desenvolvidas no campo da segurança pública; • Uma leitura constitucional da proporcionalidade coloca-se tanto a combater o abolicionismo como uma política de “tolerância zero”; • A polarização instaurada no seio da sociedade dá espaço a manipulação de toda a sorte de medidas arbitrárias e erosivas do Estado Democrático de Direito, muito embora apareçam sob o pretexto de serem necessárias à manutenção da segurança social. • A pressão exercida pela sociedade sobre o Poder Legislativo para assegurar padrões toleráveis de segurança contra a criminalidade, acaba gerando políticas III Mostra de Pesquisa da Pós-Graduação – PUCRS, 2008 que não têm maiores preocupações com os resultados concretos e, menos ainda, com a legitimidade constitucional das opções tomadas. • Hoje, como ainda um número enorme de pessoas em todo o mundo é excluída do acesso aos direitos fundamentais prestacionais básicos (como alimentação saudável, moradia, educação, trabalho), acaba que a repressão derivada de um ampliado poder do Estado de punir, nega a liberdade, controla e disciplina para manter a exclusão. Conclusão O principal desdobramento desta análise é a conclusão de que a aplicação do princípio da proporcionalidade não diz respeito apenas à sua condição na esfera jurídica, mas depende sobremaneira das condições políticas em que pode se desenvolver. Nesse contexto, as considerações aqui postas vêm no sentido de identificar e reforçar a vinculatividade do princípio aos poderes encarregados de desenvolver políticas no campo da segurança pública, justamente porque geram reflexos precisamente sobre o tipo de sociedade que pretendemos construir – e cujas diretrizes podem e devem ser extraídas de uma abordagem constitucionalmente adequada. Referências AGAMBEN, Giorgio. Estado de Exceção. São Paulo: Boitempo, 2ªed., 2007. BAUMAN, Zygmunt. Globalização: as conseqüências humanas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1999. ______. O mal-estar da pós modernidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1998. ______. Tempos líquidos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2007. FELDENS, Luciano. 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