GUARDA MUNICIPAL E SEGURANÇA PÚBLICA
Aristides Medeiros
ADVOGADO
Consoante estabelecido no art. 144, caput, da
Constituição Federal, os órgãos incumbidos da segurança pública, isto é,
da segurança geral, são apenas (numerus clausus) os ali relacionados, ou
seja, a polícia federal, a polícia (rectius: patrulha) rodoviária federal, a
polícia (rectius: patrulha) ferroviária federal, as polícias civis e as
polícias militares, além dos corpos de bombeiros militares.
A Guarda Municipal (como igualmente a chamada
“Força Nacional de Segurança” – Dec. nº 5.289, de 20/11/2004) não
faz parte da segurança pública propriamente dita, tanto que não é
listada no aludido caput do dispositivo constitucional, mas sim referida
em um parágrafo (o 8º), cujo respectivo texto é explícito e conclusivo
ao limitar a ação da mesma à proteção dos bens dos municípios e de
seus serviços e instalações, e, ainda assim, desde que o seja “conforme
dispuser a lei”.
E a lei a que se reporta in fine o citado § 8º
haverá de ser da esfera federal, valendo referir que, com o objetivo de
indicar os preceitos constitucionais sujeitos a regulamentação pelo
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Congresso Nacional, a Secretaria de Estudos e Acompanhamentos
Legislativos (do Ministério da Justiça) editou em 1989, através do
Departamento de Imprensa Nacional, a obra “Leis a elaborar”, em cuja
nota
explicativa inicial está
dito
que para
tal foi
procedido
“levantamento das matérias que necessitarão de complementação legal
para que se cumpra o que determina o texto constitucional” (pág. 3),
evidenciado na sua página 176 que o assunto constante do tal § 8º
depende de regulamentação por meio de legislação federal, ali
expressado, ipsis litteris: “Matéria objeto de lei; condições para a
instituição de guardas municipais, pelos Municípios. Natureza da lei:
Ordinária”.
No caso do Estado do Rio de Janeiro, verbi
gratia,
o
§
1º
do
art.
183
da
respectiva
Constituição
(www.cmresende.rj.gov.br/PDF/const_est_rj.pdf) não dispôs (e
nem
o poderia fazer) que a Guarda Municipal deve agir colaborando na
segurança pública junto a órgãos estaduais, até porque expressamente
destacou que a atuação seria “conforme dispuser a lei”, sendo de se
notar, também, que, ainda ad exemplum, o art. 147 da Constituição do
Estado de São Paulo (www.jurisdoctor.adv.br/legis/constisp.htm), além
de não se referir a possível colaboração com as polícias, enfatizou
deverem ser “obedecidos os preceitos de lei federal” (o grifo não é do
original).
De outra sorte, o art. 30 da Lei Orgânica do
Município
do
Rio
de
Janeiro
(vide
3
www2.rio.rj.gov.br/pgm/leiorganica/leiorganica.html)
não aludiu a
Guarda Municipal, como também igualmente o não fez o art. 9º da Lei
Orgânica
do
Município
de
São
Paulo
(vide
www.camara.sp.gov.br/central_de_arquivos/homepage/lom_05.pdf ).
Em artigo intitulado “As Guardas Municipais na
Constituição Federal de 1988”, - publicado na Revista dos Tribunais
671/48, - acentuou DIÓGENES GASPARINI que “...mesmo que pela sua
natureza se pudesse entender a prestação dos serviços de polícia
ostensiva e de preservação da ordem pública como de interesse local,
esses não seriam do Município por força do que estabelece o § 5º do
art. 144 da CF, que de forma clara atribui essas competências à Polícia
Militar”.
E prosseguindo: “A melhor doutrina, na vigência
desses diplomas legais, orientou-se no sentido da impossibilidade da
criação e da manutenção de serviços de policiamento ostensivo e de
preservação da ordem pública a cargo de guardas municipais. Nesse
sentido concluiu o Procurador do Estado, Dr. Pedro Luís Carvalho de
Campos Vergueiro, no parecer citado e assim ementado: “Guarda
Municipal – Carece o Município de competência para a manutenção da
ordem pública, que compete, com exclusividade, à Polícia Militar
Estadual”
E
brilhantemente
concluiu:
“Não
havendo
competência para agir do Município, não se tem como legitimar do seu
‘agente policial’, mesmo que aquele ou este queira a atribuição. Por essa
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razão, tem-se como correta a lição de Caio Tácito, assim oferecida:
“Primeira condição de legalidade é a competência do agente. Não há, em
Direito Administrativo, competência geral ou universal : a lei preceitua,
em relação a cada função pública, a forma e o momento do exercício da
atribuição do cargo. Não é competente quem quer, mas quem pode,
segundo a norma de direito. A competência é, sempre, um elemento
vinculado, objetivamente fixado pelo legislador”.
A respeito do tema, aliás, PINTO FERREIRA
dissertou, verbis: “Os municípios podem instituir guardas municipais,
destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, de acordo
com a lei, Os constituintes poderiam ter alargado as forças das guardas
municipais, fazendo-as auxiliares da polícia militar e atribuindo-lhes
funções repressivas de crime” (in Comentários à Constituição Brasileira,
Ed. Saraiva, 1992, Vol. V, pág. 246). Repita-se: poderiam, mas o não
fizeram !!!
Neste passo, destaca JOSÉ AFONSO DA SILVA:
“Os constituintes recusaram várias propostas de instituir alguma forma
de polícia municipal. Com isso, os Municípios não ficaram com nenhuma
específica responsabilidade pela segurança pública” (in Curso de Direito
Constitucional Positivo, ERT, 7ª ed., 1991, pág. 653).
Coerentemente, ÁLVARO LAZZARINI discorre:
“Recordemos que a melhor doutrina entende, uniformemente, que a
Constituição Federal de 1988, apesar das investidas em contrário, não
autoriza os Municípios a instituírem órgãos policiais de segurança, pois
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as Guardas Municipais só podem ser destinadas à proteção de seus
bens, serviços e instalações, o que equivale dizer que o município não
pode ter Guarda que substitua as atribuições da Polícia Militar.. Nesse
sentido, igualmente, a jurisprudência do Tribunal de Justiça de São
Paulo tem sido pacífica no sentido da incompetência das Guardas
Municipais para atos de polícia, como, por exemplo, a condução de
alguém, por guardas municipais, para autuação em flagrante, e, até
mesmo, a incompetência de guardas municipais para dar busca pessoal”
(in Temas de Direito Administrativo, ERT, 2ª ed., 2003, pág. 95)
Convém
ainda
ser
salientado
que,
segundo
esclarecido por J. CRETELLA JÚNIOR, “A Segunda Câmara Criminal do
Tribunal de Justiça de São Paulo, julgando a Apelação Criminal nº
96.007-3/0, da Comarca de Araras, prolatou oportuno Acórdão
referente à matéria que estamos comentando, ressaltando que “guarda
municipal é guarda de patrimônio público municipal e que não está
investido de funções de natureza policial, não lhe cabendo arvorar-se
em agente policial e dar busca pessoal em quem que seja e sem razão
plausível, pelo que o manifesto abuso dos guardas leva a que se lhe
rejeitem os informes prestados” (Relator Des. Weiss Andrade)
(in
Comentários à Constituição de 1988, Forense Universitária, 1992, Vol.
VI, nº 455, pág. 3426)
Tanto é certo que a vigente Carta Magna não
atribuiu às guardas municipais competência para policiamento em geral
(e que agora isso somente poderá ser feito através de Emenda
6
Constitucional), que, na Câmara Federal e visando a tal, o Deputado
MAURÍCIO
RANDS
apresentou
a
PEC
nº
215/2007
www.camara.gov.br/internet/sileg/Prop_Detalhe.asp?id=382212),
(v.
de
cuja Justificação vale destacar-se o seguinte trecho: “Coerente com a
realidade de 1988, as guardas municipais não foram incluídas como
órgãos de segurança pública, cabendo-lhes apenas função de simples
proteção de bens patrimoniais do município. Esse modelo mostra-se
esgotado e, na prática, o que vemos são muitas guardas municipais
exercendo
funções
que,
de
direito,
elas
não
tem
respaldo
constitucional para realizar, mas que acabam sendo por elas executadas
em função da falência dos órgãos de segurança pública estadual. A
conseqüência disso é a atuação do Estado brasileiro – por uma
necessidade prática – com desrespeito à norma constitucional que lhe
cabe preservar. Para
corrigir-se essa
inconstitucionalidade que
decorre, frise-se, em razão da defesa de um bem maior que é a
segurança do munícipe, estamos apresentando a presente Proposta de
Emenda à Constituição que tem por objetivo reconhecer as guardas
municipais
como
órgãos
de
segurança
pública
e
atribuir-lhes
competência para desempenhar também e de forma complementar as
funções de policiamento ostensivo e preservação da ordem pública,
atribuídas à polícia militar” .
Referida PEC (à qual veio a ser apensada a PEC
nº 255/2008,
mesmo
de autoria
da
sentido
Deputada SOLANGE AMARAL,
-
no
vide
7
www.camara.gov.br/internet/sileg/Prop_Detalhe.asp?id=394216),referi
da PEC, - dizia, - recebeu,
na Comissão de Constituição e Justiça,
parecer favorável do Relator, Deputado ANTÔNIO CARLOS BISCAIA.
Como se verifica, a Constituição Federal admitiu a
instituição de guardas municipais com a finalidade (de lege lata) de
funcionar seus integrantes na proteção, apenas, dos bens, serviços e
instalações dos respectivos municípios, como, a pari, são os chamados
“seguranças” de empresas comerciais, sendo de lege ferenda a
aspiração a que aqueles organismos das municipalidades possam a vir a
ser considerados entidades auxiliares das forças policiais (como está
sendo pretendido através da pré-falada PEC 215/07), daí dever ser
concluído que, onde tais guardas atualmente estiverem fazendo
policiamento geral, estará havendo exorbitância de atribuições.
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