A Metáfora da Dança nas Organizações: uma Auto-Etnografia sobre Aprendizagem na Prática Autoria: Igor Baptista de Oliveira Medeiros, Claudia Simone Antonello Resumo Os estudos organizacionais no Brasil sobre a noção da aprendizagem têm reproduzido um discurso paradigmático que restringe a produção do tema com o devido tratamento epistemológico e metodológico. Nesse sentido, esse artigo busca evidenciar a perspectiva sócio-cultural para explicar o fenômeno da aprendizagem. O objetivo é analisar a dança e toda sua teatralidade como uma metáfora para elucidar alguns dos diversos conceitos que surgem com a teorização da aprendizagem baseada na prática. Para isso utilizamos como metodologia a auto-etnografia. As principais contribuições percebidas em campo foram justamente a forte noção de que a “aprendizagem na prática” é situada e socialmente construída, ocorre a partir da interação e das trocas simbólicas entre os indivíduos, das percepções entre corpos, artefatos e objetos, e das emoções vivenciadas a cada gesto, a cada ação, a cada atividade, cada prática. 1. Introdução Esse texto é uma tentativa de explicar processos de aprendizagem nas organizações sob uma perspectiva sócio-cultural. Essa perspectiva vem amenizar a supremacia explicação da aprendizagem a partir das teorias cognitivas, que a consideram em termos de processos mentais individuais desenvolvidos através de educação formal e institucional fornecida por especialistas e teóricos da área (FOX, 1997). Em contraste com as constatações cognitivistas, Silvia Gherardi (2000) tem discutido que a aprendizagem organizacional não ocorre na cabeça das pessoas e tampouco é uma commodity, de fato, ela é um processo que gera conhecimento ‘situado’ em práticas organizacionais. O conhecimento enraizado na prática e aprendizagem organizacional situada são características distintas da típica sociedade do conhecimento de um mundo contemporâneo de produção industrial e pós-industrial (STRATI, 2007). Uma nova literatura nasce dessas proposições, a “aprendizagem na prática”. Entretanto, essa abordagem tem sido fortemente avessa ao paradigma dominante nos estudos organizacionais. Trabalhos racionais, positivistas, estruturalistas, funcionalistas, todos foram deixados de lado para enfatizar o irracional, o emocional, o simbólico, a estética da vida organizacional, a fim de explorar aspectos até então negligenciados, e para problematizar a produção do pesquisador sobre conhecimento organizacional (STRATI, 1998). Em se tratando desse mundo mais sensorial, por que não falarmos em arte também? Pelas palavras da escritora brasileira Clarice Lispector: “Na arte, a inspiração tem um toque de magia, porque é uma coisa absoluta, inexplicável. Não creio que venha de fora pra dentro, de forças sobrenaturais. Suponho que emerge do mais profundo ‘eu’ da pessoa, do inconsciente individual, coletivo e cósmico”. Em sendo parte de cada um de nós e, dessa forma, de todos; estudar como arte pode relacionar-se com o ambiente de trabalho das pessoas é considerar a significância do contato humano nos mecanismos sociais que fazem parte da aprendizagem nas organizações. Proponho com esse artigo, a partir de uma investigação auto-etnográfica, a análise da dança como uma metáfora para elucidar alguns dos diversos conceitos que surgem com a teorização da aprendizagem baseada na prática. Todavia, o objetivo aqui não é perpetuar alguma prática em administração que se aproprie das artes, mas trazer à cena acadêmica algumas noções sobre como as artes, e nesse estudo em especial a dança, podem ajudar a explicar uma realidade organizacional que se manifesta cada vez mais através de diferentes matizes. Matizes que revelam um tecido organizacional que, ao meu entender, tem como cerne catalisador de todos os seus processos, a aprendizagem. Nesse primeiro momento, eu procurarei contextualizar a noção de aprendizagem nas organizações e os seus devires até a noção emergente de “aprendizagem na prática”, bem 1 como algumas das abordagens teóricas que a caracterizam. Em seguida, irei imergir no mundo da dança contemporânea e sua teatralidade, para ajudar a explicar as situações de aprendizagem que acredito serem dialógicas com o contexto organizacional. Assim, nessa parte, também estarei dialogando os conceitos com minha experiência etnográfica; e depois farei as considerações finais e sugestivas. 2. Uma ‘Emergente Noção’ De Aprendizagem Nas Organizações "A grandeza de uma obra de arte está fundamentalmente no seu caráter ambíguo, que deixa ao espectador decidir sobre o seu significado". Theodor Adorno, filósofo alemão A institucionalização de um campo de estudo não requer legitimidade tão somente de uma comunidade restrita de acadêmicos ou consultores, mas principalmente das organizações e da sociedade em geral. E neste processo de mobilização de credibilidade, artefatos culturais são criados, como livros, congressos, cursos universitários, programas de especialização, e sobretudo novas identidades. Seguindo essa história, a cerca de vinte anos atrás, a partir de uma operação metafórica que justapôs o conceito de aprendizagem com o de organização, um fenômeno social nascia: a “organização que aprende”. A existência da organização que aprende já se tornou algo ‘natural’ porque ela está institucionalizada, e instituições produzem identidade. Identidades que viajam no tempo-espaço e são apropriadas eventualmente pelas empresas. Sob a marca de “organizações que aprendem”, empresas, em sua maioria já com boa reputação, batizam-se com essa identidade através de um ritual que requer esforços dispendiosos para legitimar uma imagem corporativa que seja reconhecida e confiável sob os olhos de seus colaboradores e da sociedade como um todo (GHERARDI, 2005). É de se admirar a linha tênue que separa a produção científica em administração do discurso ‘gerencialista’ e comercial. Um discurso fixo, de difícil reversividade, pois está preso e subjugado a uma questão paradigmática, a um condicionamento histórico, que massifica e reduz a literatura da área a bulas rotulamente espetacularizadas. As críticas ao longo dos anos têm sido rígidas, pois quando um novo tópico surge, em especial nos estudos em administração, a abordagem normativa e prescritiva freqüentemente prevalece sobre a analítica, descritiva e crítica. Em um ambiente e sob uma disciplina preocupados com o valor econômico do conhecimento, ele rapidamente é objetificado para criação de vantagem competitiva. Conhecimento e competências tornam-se recursos, commodities e bens os quais podem ser estocados, transferidos e reutilizados, produzindo riqueza e sendo apropriados como e quando necessários (GHERARDI, 2005). De forma análoga a Weick e Westley (1996, p. 440) que propunham “aprendizagem organizacional” como oxímoro – [...] aprender é desorganizar e aumentar variedades. Organizar é esquecer e reduzir variedades –, Kalling e Styhre (2003) discutem que o termo ‘gestão do conhecimento’ também é um oxímoro, visto que conhecimento propõe fluidez e um envolvimento processual, enquanto gestão se objetiva em controle e ordem. A literatura que emerge para romper com as narrativas desse pensamento moderno constituído pelo mito do progresso, da mudança, e da objetividade, é a da “aprendizagem na prática”1. Sob a ótica da “gestão do conhecimento”, da “organização que aprende” e mesmo da “aprendizagem organizacional” na perspectiva experiencial, o ato de aprender é principalmente baseado em problemas, é a necessidade em solucionar um problema – um estímulo externo – que ocasiona a aprendizagem. A noção de “aprendizagem na prática” nos permite evidenciar que, nas práticas cotidianas, aprender e conhecer não podem ser tratadas como atividades dissociadas. Pelo contrário, elas ocorrem no desenrolar da experiência, com ou sem estarmos cientes disso. Essas práticas são acessadas via socialização organizacional e elas são apreendidas ao serem desempenhadas em consciência do ‘mistério’ que distingue suas aplicações (GHERARDI, 1999). Elas enfatizam que são as pessoas quem criam, atuam e inventam a organização, não de forma individual com mentes inter-relacionadas, mas através 2 de suas corporealidades, que as permitem apreender um conhecimento sensível assim como um raciocínio intelectual acerca dos elementos não-humanos que constituem o espaço organizacional (STRATI, 2007). Essa noção de “aprendizagem na prática” está sustentada em diferentes teorias da aprendizagem organizacional, principalmente oriundas das perspectivas sociológica e antropológica. Irei apresentar e discutir como essas diferentes teorias contribuem para a teorização da aprendizagem baseada na prática. 2.1. Teorias para uma prática da aprendizagem A primeira perspectiva a analisarmos como fomentadora da “aprendizagem na prática” no meio organizacional é a perspectiva cultural. A noção de cultura está intimamente ligada à idéia de prática, “seu pressuposto fundamental é a busca em descrever o ponto de vista nativo sobre seu sistema de valores, sua experiência de vida – pensamentos, emoções, sentimentos e práticas que constituem sua própria realidade existencial, sua cultura" (ROCHA, 1996). O conceito de cultura organizacional utilizado para a compreensão da aprendizagem organizacional é concebido por Cook e Yanow (1993) como um conjunto de valores, crenças e sentimentos, acompanhados de artefatos de sua expressão e transmissão (tais como mitos, símbolos, metáforas e rituais) que são criados, herdados, compartilhados entre um grupo de pessoas e que os fazem distintos de outros grupos. A perspectiva cultural revela, dessa forma, como artefatos e interações sustentam tanto a significação quanto a “aprendizagem na prática” sem ter que dizer se um ator pensa, acredita ou age sob uma idéia específica, ou um conjunto de valores ou predisposições (GHERARDI, 2005). Um entendimento cultural e simbólico da organização é base para revelação de dois tipos de conhecimento: o conhecimento estético e o conhecimento sensível. O conhecimento estético é definido por Antonio Strati (2003) como a forma de conhecimento que a pessoa adquire ao ativar as capacidades específicas de suas faculdades perceptivo-sensoriais e de seu julgamento estético no dia-a-dia da vida organizacional. A estética destaca e legitima o sentimento pessoal como uma forma intersubjetiva de conhecimento, ou seja, “um sentimento que é tanto individual quanto coletivamente construído em atos interativos por indivíduos que experimentam, entendem e julgam através dos sentidos” (STRATI, 2003, p. 54). A estética concerne sentir o pathos dos artefatos materiais e não-materiais de uma organização, perceber a beleza organizacional, apreciar a grandiosidade de certas práticas, sentir desgosto em certos trajetos da ação organizacional. Em termos de investigação e pesquisa, a rede de faculdades perceptivas e sensoriais de estudiosos e atores organizacionais produz conhecimento que não é tão somente verbal, tampouco ‘dizível’. Outras linguagens intervêm do visual ao gestual, e outros processos de criação do conhecimento estão envolvidos, do intuitivo ao evocativo. Em vez de confinar análises acerca das capacidades de raciocínio e de abstração dos sujeitos que se identificam com uma organização, o entendimento estético do contexto organizacional relaciona-se com a capacidade de ver, ouvir, cheirar, tocar, provar. O conhecimento estético é um julgamento sensível de avaliações sobre perfeição e imperfeição percebidas que carregam a natureza do sentimento ou um julgamento em harmonia com sentimentos ao invés dos conceitos (STRATI, 1998). Constituído de conhecimento estético, o conhecimento sensível é uma ampliação daquilo que é percebido através dos sentidos, julgado através dos sentidos, e produzido e reproduzido através dos sentidos. Ele reside no visual, no auditivo, no olfativo, no gustativo, no tocável, no julgamento sensitivo-estético. Ele proporciona relações dialéticas com a ação e relações próximas com as emoções dos atores organizacionais. O conhecimento sensível não se restringe à mera relação direta, física e objetivamente observável do mundo, de fato, ele preza pela relação corpórea, pessoal e íntima do sujeito com a experiência do mundo (STRATI, 2007). A fala do autor complementa que: Conhecimento sensível floresce das faculdades perceptivo-sensoriais dos indivíduos, e de seus julgamentos estéticos, e isso traz à tona os artefatos e materialidade cultural, os corpos e os objetos que 3 fazem parte no cotidiano da vida de organizações. A atenção do pesquisador então se transfere para as diferenças específicas entre as pessoas no trabalho. O que um deles é capaz de sentir, outro talvez não sinta, e a ‘realidade’ desses sentimentos estéticos é socialmente formada pelas negociações coletivas que também envolve o pesquisador (STRATI, 2007, p. 75). Dessa forma, conhecimento sensível é uma base para “aprendizagem na prática”, não é uma forma pura de conhecimento e aprendizagem. De fato, ele é uma forma hetérea e complexa pela emoção e afetividade distintas em sua criação, e pelo seu relacionamento com os demais elementos que caracterizam a ‘prática’ na vida organizacional. A principal contribuição dessa linha de pesquisa é justamente a superação da dicotomia mente-corpo e a introdução de sentimentos como formas de conhecimento não-cognitivas. A perspectiva sociológica é certamente a que mais fornece complementações teóricas para subsidiar a noção de “aprendizagem na prática” no dia-a-dia das organizações. Os autores dessa vertente, como Lave e Wenger, Gherardi, Nicolini, defendem que os processos de aprendizagem dos indivíduos da organização ocorrem através do trabalho, da prática e da interação, pela reflexão e ação, considerando que trabalho e organização são práticas sociais engajadas por atividades situadas em contextos específicos de interação (GHERARDI; NICOLINI, 2001). Irei discorrer acerca dessas principais teorias. A primeira delas é a já bem estabelecida teoria da aprendizagem situada. Em contraste com a perspectiva cognitiva esta teoria vê a aprendizagem e conhecimento como processos que são integrais para prática cotidiana no ambiente de trabalho, na família, e em outros espaços sociais. O foco muda de um conhecimento objetivo e descontextualizado para o reconhecimento da “aprendizagem na prática” (HANDLEY; CLARK; FINCHAM; STURDY, 2007). Central à literatura orientada sob a perspectiva situada da aprendizagem estão conceitos como participação, identidade, e prática (em comunidades ou redes de prática; BROWN e DUGUID, 2001) e as dinâmicas entre eles. Lave e Wenger (1991) conceberam a noção de ‘comunidade de prática’ para falar sobre aprendizagem e conhecimento nas organizações. Esse conceito define um sujeito coletivo, um tipo distinto de comunidade que se constitui pelo voluntariado, pela visão e objetivos mútuos, além de um repertório compartilhado de ações, estilos, artefatos, discursos, histórias. Nas palavras de Lave e Wenger (1991): Conceber a aprendizagem em termos de participação chama atenção para noções de que ela é um envolvente e continuamente renovado conjunto de relações [...] um aspecto integral inseparável da prática social [...] aprendizagem e a noção de identidade são inseparáveis: elas são aspectos do mesmo fenômeno (LAVE; WENGER, 1991, p. 49, p. 53, p. 115). Nesse sentido, um processo mediador importante é o da ‘participação’ na comunidade que pode, por exemplo, ser periférica ou central (LAVE; WENGER, 1991) ou marginal (WENGER, 1998). Contudo, recentemente, a capacidade dos indivíduos em participar nas ‘comunidades de prática’ tem sido marcada pela dinâmica do poder nos ambientes organizacionais. A dimensão política que opera nas organizações tem levado a uma deturpação do conceito original e a noção de ‘comunidade’ foi teorizada e estendida para produzir distinções entre ‘comunidades’, ‘redes’, e ‘coletividades’ de prática (BROWN; DUGUID, 2001). A principal contribuição da teoria da aprendizagem situada certamente é a ênfase na visão de aprendizagem por voluntariado e pela relação profissional. Uma segunda influência sociológica é a teoria da atividade. Ela tem suas origens no trabalho de Vygotsky que enfatiza a natureza histórica, mediada e transformacional da aprendizagem. Engeström foi quem trouxe uma visão contemporânea dessa abordagem na noção de “sistemas de atividade”. Engeström sugere que as relações entre indivíduos e o objeto de sua atividade são mediadas por conceitos e tecnologias. Os relacionamentos entre a comunidade e o todo objeto de sua atividade são mediados por sua divisão de trabalho; e as relações entre indivíduos e as comunidades da qual eles fazem parte são mediadas por regras e 4 procedimentos. Tais fatores comprimem uma bricolagem inter-relacionada de recursos materiais, mentais, sociais, e culturais para o pensamento e a ação dos indivíduos (BLACKELER; CRUMP; MCDONALD, 2003). Um ‘sistema de atividade’ é, na visão desses autores, um sistema de perturbaçãoprodutiva constituído de incoerências, inconsistências, paradoxos e tensões. Nesse sentido, o conceito de atividade (cognato ao de prática) dissolve a distinções entre ordem e desordem. Visto que atividades são sempre atuadas em comunidades e são orientadas para objetos de trabalho que são parcialmente existentes e parcialmente emergentes e gerados dentro da própria atividade, o reconhecimento do objeto de uma atividade requer aprendizagem expansiva. Tal expansão demanda que o sistema de atividade aprenda novas maneiras de acomodar todos diferentes elementos de composição, um esforço que inevitavelmente afeta a natureza própria do objeto de trabalho e gera novas inconsistências e contradições, e assim engatilhando um novo clico de transformação (GHERARDI, 2005). A idéia de uma aprendizagem e uma ação no ambiente de trabalho que é parcialmente existente e emergente é a grande contribuição dessa teoria, pois revela o caráter experimental da “aprendizagem na prática”. A terceira teoria denomina-se ‘ator-rede’. Pensar o mundo como um efeito performático acarreta um reconhecimento de que, se entidades – humanas ou não-humanas – alcançam sua forma como uma conseqüência das relações nas quais elas estão localizadas, então elas têm que ser realizadas em, por e através dessas relações. A ordem e natureza das coisas são, portanto, sempre um resultado reversível e incerto, um efeito de operações, artifícios e processos que mantêm as coisas no lugar. E conhecimento e ação estão localizados em ambientes de relações sócio-material, ou como essa teoria propõe, redes de ação (GHERARDI, 2005). Essa teoria contribui para o campo da “aprendizagem na prática”, sobretudo ao conceber conhecimento na forma performática e em suas intermediações, que não só media práticas como também as propaga. A aprendizagem baseada no trabalho é mais uma teoria que denota um corpo de análise da prática organizacional. Os estudos que concernem esse tema compartilham a noção de que a aprendizagem está diretamente ligada à constituição do ambiente de trabalho. O ambiente de trabalho, por sua vez, é concebido como uma construção social através de interações entre participantes, e através do uso que eles fazem dos artefatos e das tecnologias presentes no local de trabalho. Em outras palavras, esses estudos consideram o trabalho como uma atividade na qual os objetos e sujeitos presentes no local constituem e atribuem sentido às atividades que surgem de suas interações (GHERARDI, 2005). De fato, a atenção é dada principalmente para a ‘tecnologia como uma prática social’, primeiro porque eles estão engajados no estudo naturalístico do trabalho e sua interação com diversas tecnologias; segundo, pois eles propõem objetos e tecnologias como elementos constitutivos do ambiente de trabalho (SUCHMAN et al., 1999). Esse foco na conversação e interação mediada pela tecnologia é a importante contribuição para a “aprendizagem na prática”. Dentre as teorias que possibilitam diferentes perspectivas para compreensão da aprendizagem nas organizações, poder-se-ia esperar que a psicológica e a da ciência da administração trouxessem algumas contribuições para a teorização de uma “aprendizagem na prática”. Contudo, essas teorias tendem a explicar a aprendizagem como um processo predominantemente cognitivo ou a partir de uma abordagem mais prescritiva. Por exemplo, posso mencionar a “aprendizagem incidental” e “aprendizagem na ação” que pressupõem a noção de prática, mas apesar da “aprendizagem na ação” considerar aspectos importantes como a questão da reflexão e da interação em grupo, essa perspectiva está embebida pela lógica da aprendizagem baseada na solução de problemas. Dessa forma, ela não é suficiente para explicar uma dimensão cultural, simbólica de uma aprendizagem que se constitui por compreensões estéticas e sensações vivenciadas nas organizações. 5 De fato, enquanto a literatura organizacional desenvolve a retórica da aprendizagem baseada em problemas, visto que esta é uma narrativa já afirmada como discurso disciplinar, e é sustentada por isto, a emergência da literatura sobre “aprendizagem na prática” dá luz a uma outra narrativa, que traz uma relação dialógica para a noção de prática, a da aprendizagem baseada em incertezas. Aprender em face às incertezas transmite a idéia de que a aprendizagem não é tão somente atividade, ela é também passividade. Atividade, dominação, racionalidade, instrumentalidade, masculinidade são alguns significados simbólicos associados com a aprendizagem baseada em problemas; enquanto passividade, subjugação, emocionalidade, criatividade, feminilidade, podem ser associadas com a aprendizagem baseada em incertezas (GHERARDI, 1999). Aprender de um modo passivo, assim como ensinar a aprender, de acordo com Polanyi é como ensinar uma pessoa a se entregar a obras de arte: “não é para observar nem para apalpá-las, mas para vivê-las. Então a satisfação em ganhar controle intelectual sobre o mundo externo é ligada a uma satisfação em ganhar controle sobre si mesmo” (POLANYI, 1962, p. 196). A experiência é primariamente uma relação ativo-passiva, ela não é algo primariamente cognitivo. Entretanto, Gherardi, Nicolini e Strati (2007) nos revelam que a medida de valor de uma experiência reside na percepção dos relacionamentos ou continuidades as quais ela proporciona. Aprender por passividade reintroduz o corpo, as emoções, o modo afetivo de aprendizagem, a intuição, receptividade, empatia, introspecção e entendimento estético. Quando damos prioridade à noção de práticas sob a mente, nós contribuímos para uma concepção transformadora do conhecimento que não é mais posse da mente, que é mediado tanto por interações entre pessoas como por arranjos materiais presentes no mundo. Para explicitar esta idéia de transfiguração e de constante movimento do conhecimento, que pode ser apreendido momentaneamente, busco inspiração em Matisse. O artista, a partir de uma encomenda para elaborar um painel para escadaria de um palácio em Moscou, pinta às pressas Dance I em 1909 (cujo título original é Dance and Music) e, posteriormente, pinta uma segunda versão intitulada Dance II (apresentada em Paris em 1910), quando então, as cores são mais intensas e os corpos mais musculosos. A cena trata-se de criaturas míticas numa paisagem em infinito, vide fotos 1 e 2. Foto 1 - Obra de Henri Matisse. Dance I (1909). Paris, Hôtel Biron. Fonte: Disponível em http://www.moma.org/collection/browse_results.php?object_id=79124. Acesso em 05.03.2008 6 Foto 2 - Obra de Henri Matisse. Dance II- 1910 Oil on canvas. Hermitage Museum, Saint Petersburg, Russia. Fonte: Disponível em http://oseculoprodigioso.blogspot.com/. Acesso em 05.03.2008 Práticas, portanto, são padrões de atividades institucionalizadas por virtude de um conjunto de julgamentos normativos que as pessoas negociam entre si, no curso da prática atual, e que expressam em termos éticos, estéticos e de critérios técnicos de apropriação (GHERARDI, 2005). Podemos dizer que as pessoas compartilham uma prática se as suas ações são consideradas compatíveis às normas de prática correta e incorreta, aos critérios de sensação estética, e a padrões de igualdade, de eqüidade (NICOLINI et al., 2003). Falando em prática, em atividades institucionalizadas por negociações entre pessoas de uma mesma coletividade, a partir de agora irei imergir no mundo da dança contemporânea e sua teatralidade, a fim de evidenciar as situações de aprendizagem que acredito serem dialógicas com o contexto organizacional. Convido o leitor a desprender-se de pré-noções sobre o assunto e permitir-se conversar também com o universo da dança e sua contemporaneidade, pois assim estarei apresentando minhas apreensões desta prática relacionadas com o ambiente organizacional, como em uma atitude parentética, dialogando com o fenômeno teórico sempre que a prática de minha experiência etnográfica se expressar. 3. A Metáfora da Dança Nas Organizações "Se eu pudesse explicar o que as coisas significam, não teria a necessidade de dançá-las". Isadora Duncan, bailarina norte-americana O interesse pela dança e pelo teatro sempre me foi muito marcante. Não vejo a criação de uma sem a outra. Mas assim como elas se manifestam fortemente essenciais, elas também deixam um vazio explicativo e uma obscuridade que incitam à investigação. É esse sentimento que também desperta o construto da aprendizagem e que me mobilizou estudá-lo em conjunto com essas práticas artísticas, com foco na dança. A surpresa que acometeu diversos de meus pares, em especial os mais afastados do meio acadêmico, como familiares e amigos, ao mencionar que gostaria de estudar relações entre arte e administração, fizeram-me crer por um instante que eu estaria delirando ou certamente perdendo meu tempo. Respostas do tipo: “mas você não acha que pode ser prejudicado? Porque deve ter preconceito sobre isso nas empresas, principalmente com dança, que a maioria dos homens acha que é algo para mulher” e “o que isso tem a ver com administração? Como fazer dança vai ajudar um executivo a tomar uma decisão melhor sobre o trabalho dele? Dança é para quem gosta, para lazer, não tem nada a ver com trabalho”. Para um pesquisador em início de carreira, ouvir isso pode ser algo bem frustrante. Embora também possa ser um gatilho para grandes descobertas, para evidenciar uma linguagem talvez esquecida no discurso que impera acerca do ideário organizacional e que talvez esconda as palavras, os gestos, as imagens, os signos e símbolos que precisam ganhar vida na busca de novas formas organizacionais. Prefiro aderir a essa segunda possibilidade, e a partir dela 7 tentarei explicitar as minhas descobertas nos quase sete meses de envolvimento regular e perene com a dança, advindo da prática amadora e esparsa que tive com a mesma e com o teatro ao longo dos anos. Todavia, essa investigação não busca ser apenas um relato amador sobre experiências vividas. Ela tem sua base metodológica no conceito de “prática analítica criativa”. Essa é uma expressão que Laurel Richardson (2000) designou para aquelas práticas analíticas que mesclam a linguagem da arte com a das ciências sociais e que têm o objetivo de produzir conhecimento social através de uma prática criativa, desde que apresente o devido embasamento teórico para suas proposições. Dentro das práticas analíticas criativas, a auto-etnografia é um gênero de tipo autobiográfico no qual pesquisadores incorporam narrativas pessoais em seus textos etnográficos. A própria tendência em relação à reflexividade nos estudos de caráter sóciocultural, influenciada pelas vertentes pós-modernista e feminista, também revela a crescente ênfase na auto-revelação (REED-DANAHAY, 2001). Todavia, como nos destaca Ruth Behar (1996), a importância de uma escrita mais vulnerável, que intensifique a relação de formas de conhecimento sensível e intelectual, não significa que qualquer coisa deve ser dita. “A exposição do pesquisador, que também se constitui em espectador, tem que nos levar a algum lugar sem a qual não conseguiríamos chegar” (BEHAR, 1996, p. 14). A performance auto-etnográfica é a convergência do ‘impulso autobiográfico’ e do ‘momento etnográfico’ representada pelo seu discurso auto-reflexivo e crítico, articulando as interseções de pessoas e da cultura através de sanções internas de nossa constante identidade migratória. A auto-etnografia nos torna intensamente consciente de como testemunhamos nossas próprias construções da realidade. Ela é um interpretar da cultura por auto-reflexões e refrações culturais de identidade (SPRY, 2001). E por assim dizer, a auto-etnografia apresenta diferentes níveis de consciência que conectam o pessoal com o cultural. É um olhar que recorre a um caminho de ida e volta entre o social e o pessoal. E nesse processo de ida e volta, a fronteira entre o pessoal e o social se dilui (ELLIS; BOCHNER, 2000). Posso lembrar ainda hoje a palpitação forte, a excitação ao colocar o sapato de dança e dar as primeiras sapateadas acanhadas na sala de dança. Era final de uma manhã de maio, o clima estava agradável, tanto lá fora como aqui dentro. As professoras estavam agitadas para ver todos os alunos prontos na hora, e estes, parecíamos animados e ansiosos para a aula demonstrativa. 3.1. O cenário da dança contemporânea Antes de falarmos especificamente sobre dança e o contexto organizacional, precisamos contextualizá-la no ambiente do qual ela vive e nutre sua essência, o ambiente artístico. Dentro desse espaço, as principais trocas e partilhas são com o teatro. O paralelo entre dança e teatro atravessa ao longo do tempo as duas artes, e os limites por vezes imprecisos de seus territórios podem dar a impressão de que elas os compartilham. Podemos constatar as fascinações que se exercem entre as diferentes artes se encontram exacerbadas na cena contemporânea. Questões estéticas tão diversas quanto às questões do movimento, do sentido, da ação, da narrativa, da presença, da representação... são levantadas pelo teatro, o cinema, a dança, mas também por meio das artes plásticas, das instalações, das performances. Sendo a dança contemporânea essencialmente impressa de teatralidade, não é surpreendente que diversos elementos da pesquisa e da criação coreográficas atuais encontrem eco nas formas teatrais ditas “pós-dramáticas” (LEHMANN, 2002). Historicamente, o teatro pressupôs por muito tempo “drama” e “ação”. De fato, o que observamos foi uma modificação de paradigma, ou, se o termo paradigma evoca fixidez em excesso, assistimos um deslocamento de preocupação. E uma formulação sucinta para descrever esse deslocamento poderia ser a seguinte: nós passamos do representar para o apresentar. Ou, ainda, em outros termos: a “crise do teatro” não é exatamente a crise da ação, mas, muito antes, “a posta em crise da representação da ação” (CHEVALLIER, 2004). 8 Engraçado que ao começar as aulas, a minha pré-noção da dança e sua teatralidade era de um oceano de representações. Um espaço onde eu poderia ser qualquer outra coisa, menos quem sou no dia-a-dia. Mal sabia que ao imaginar estar representando algo eu estava, na verdade, apresentando a minha forma mais pura. Digo isso, pois ao me integrar ao grupo de sapateado dessa escola, eu me apresentei como administrador e mestrando em administração; porém, apenas quando algum colega ou professora manifestava o interesse em me perguntar. Eu sentia como se o administrador não tivesse espaço ali, como se ele fosse entediar e burocratizar o pensamento dinâmico que por ali flutuava. Acontece que os pares, sem pretensão, vieram aos poucos trocar idéias sobre o fazer administrativo e a dicotomia que me acometia a uma representação se esvaeceu. Com o passar dos meses, o que se apresentou foi um administrador que podia sapatear e um sapateador que podia fazer administração. O que pretende o palco, não é mais tanto representar uma grande ação única colocando em conflito, segundo uma linha de destino, vários personagens, mas, antes, apresentar. Apresentar ou exibir qualquer coisa da existência humana (GUÉNOUN, 1997), repetir os movimentos da própria vida (DELEUZE, 1968), “produzir a mais alta intensidade (por excesso ou por falta) daquilo que está ali, sem intenção” (LYOTARD, 1973, p. 104). Com isso, sobre o deslocamento do representar em direção ao apresentar aparecem três elementos: uma razão histórica, outra de ordem artística, e, enfim, uma necessidade de natureza política. A primeira das duas razões é histórica. Depois do início do século XX, o poder da razão, herdada dos iluministas, e a fé sem limites nas ciências exatas e em uma representação possível do mundo não cessaram de ser respostas à organização da vida. Contudo, é após Hiroshima e Auschwitz que a evidência das contradições da razão torna-se indiscutível: um projeto racional, que é conduzido racionalmente, nos leva à catástrofe. “Auschwitz pode ser tomada como um nome paradigmático para o inacabamento trágico da modernidade” (LYOTARD, 1993, p. 32). A segunda razão da passagem ao regime de apresentar concerne à prática artística. A aparição do cinema teve sobre o teatro um efeito de tremor de terra. E, desse último, importa tomar a exata medida, sob pena de perder o teatro para sempre. Essa é a questão que coloca Denis Guénoun (1997, p. 143-144), e que evoca também Hans-Thies Lehmann (2002, p. 116). Se o teatro teve durante longo tempo o monopólio da fabricação do imaginário, o teatro é ainda necessário? Dito de outra forma, por que continuar a representar as histórias, por que procurar tornar críveis os personagens se, nesse registro, o cinema é superiormente eficaz? Por que não se concentrar, antes, sobre isto que resta de específico no teatro: o corpo real de um ator se oferecendo ao olhar imediato de um espectador, o evento que constitui certa copresença (CHEVALLIER, 2004). Aqui, aparece a necessidade, quase o dever, de pensar o teatro como um ato efetivo de apresentação. Pois, alguns de nós não acreditamos mais nos discursos proféticos, alguns de nós desconfiamos das ideologias, mas não resta menos para nós, ocidentais que somos, e que vivemos sob a dominação do “sistema espetacular”. A sociedade do espetáculo integrado, total; a sociedade onde tudo é mercadoria, e toda mercadoria se dá em espetáculo para ser consumida por mais tempo, e baseada sob uma ideologia que jamais, tamanha perversidade, aparece como tal (DEBORD, 1992). O risco parece excessivo. Todo teatro de representação é um teatro de colaboração ideológica – de uma ideologia onipotente que, por não parecer como tal, recorre a todas as representações existentes. Ora, precisamente, um teatro que não é de representação, mas de apresentação, que convida a participar de uma experiência real, que trabalha com a presença do outro – do ator para o espectador, do espectador para o ator – resiste à apropriação pelo espetáculo. Seguramente, “ele tornou-se materialmente impossível de fazer entender a menor objeção ao discurso comercial” (DEBORD, 1992, p. 45), mas aqui, não se trata precisamente de um discurso. Pelo fato de sua natureza, o ato de representar, opera independentemente. Alguma coisa do teatro que difere da lógica comercial, e é necessário, vital, de não deixar de lado certa virtude política, própria ao teatro. 9 De fato, apaga-se não somente o ‘re’ do verbo representar, mas também o complemento do objeto contíguo a esse verbo, a saber, a trama dramática – a ação e os personagens em ação. Tal despojamento oferece de melhor a abordagem da práxis2, a atividade humana, a nossa, tal como nós a vivemos hoje. Este é um ponto sobre o qual Jean-François Lyotard seguidamente insistiu: o próprio da práxis contemporânea é que ela é múltipla, descontínua e paralógica3, então, também não generalizável, não linear e imperfeitamente explicável. A razão não constitui, sempre, mais do que um modo de apreensão incompleto. Consequentemente, procurar dar conta de maneira monovalente da práxis, por meio da representação cênica de uma “grande” ação de conjunto, é inevitavelmente perder a linha – a atividade excede a “ação”. Ao querer representar essa ação sobre a cena, participamos, ainda, da falsificação comercial4 (CHEVALLIER, 2004). A práxis explicada por Lyotard me faz pensar sobre a aprendizagem na prática da dança. Em sendo a práxis toda e qualquer atividade humana, ela também é a dança, e a aprendizagem. No dia em que começamos a ensaiar passos da primeira coreografia que seria apresentada no espetáculo de fim de ano, a impressão que eu tive, e que pude perceber na expressão de meus colegas, era de que poucos conseguiriam subir ao palco do Theatro São Pedro para se apresentar. Os passos eram múltiplos e a sua ordenação era descontínua – não sabíamos qual seqüência começava e ligava às outras. Entretanto, a aprendizagem ocorria. A cada dia de ensaio, a confiança e a perícia nos movimentos e gestos de cada ação eram conquistadas. Com o seu desenrolar, a coreografia foi ganhando forma, e a aprendizagem se tornando paralógica, eu digo, cada um tinha consciência das suas fraquezas e falhas na coreografia, mas cada vez que ela se manifestava na coletividade, essas fraquezas eram atenuadas, e por vezes superadas. A compreensão da diferença e das contradições que se apresentavam em cada um, evidenciava a paralogia da aprendizagem em todos. Essa paralogia foi catalisadora da práxis plurivalente que começou transformando os passos em ações, e as ações na atividade de dançar. Se lembrarmos as teorias da “aprendizagem na prática”, percebemos aqui a manifestação das incoerências, inconsistências, paradoxos e tensões que promovem o ciclo transformador da aprendizagem para a teoria da atividade, bem como uma rede de atores pela qual conhecimento e ação se combinam em uma relação performática. Há aqui um menos que abre a um mais. Se for importante representar menos, é para apresentar mais – dito de outra forma, para expor e para interrogar adequadamente as particularidades contemporâneas da práxis. Os seres em ação que são os atores-bailarinos repetem, quer dizer, não reproduzem, mas re-ativam; eles produzem e sustentam ao mesmo tempo. Eles fazem o movimento. E o que eles manifestam, então, é que eles são eles mesmos a manifestação de um “poder próprio do existente, uma tenacidade do existente na intuição, que resiste a toda especificação pelo conceito”, sem significação pré-estabelecida e sem pretensão à exaustividade (DELEUZE, 1968, p. 23). É importante termos essas noções acerca do cenário da teatralidade, da qual a dança faz parte, para entendermos como a práxis organizacional está também imersa na cena contemporânea e como essas diferentes realidades se cruzam, e como a dança, e as artes, tomam parte em uma decisão empresarial. 3.2. A imanência da dança Antes de especificar meu pensamento sobre o interesse que a práxis organizacional pode dar à noção de imanência, vejamos o que ela abarca na dança, e o que pode ligá-las. Em primeiro lugar, estas relações são filosóficas. Mais especificamente, a verdadeira “base de pensamento” (LOUPPE, 2000, p. 13) que sustenta a dança contemporânea e que, ao longo do século, a modelou, está profundamente marcada pela fenomenologia. Os artistas da grande modernidade – a dança moderna antes de 1950 – tendo procurado primeiro liberar o corpo de todo modelo imposto e inventar outro corpo, uma corporeidade própria de cada um, convidavam, com a fenomenologia, a um retorno ao “corpo próprio”, se desfazendo do “corpo objeto” (MERLEAU-PONTY, 1945). Assim, MerleauPonty se opondo aos métodos objetivistas aplicados ao conhecimento do humano, insiste sobre a relação de imediaticidade que cada um tem com seu corpo, sem ter a priori consciência disso. O ‘corpo próprio’ não é observável, ele é lugar onde desabrocha minha 10 subjetividade e constitui o mediador graças a quem estou em relação com as coisas e com o outro. No entanto, o ‘corpo próprio’ é um corpo vivido que encontra seu sentido na própria materialidade de sua existência. Falar sobre a imediaticidade do corpo, mesmo inconsciente, e de sua subjetividade é trazer à tona o conhecimento sensível e estético da aprendizagem, que floresce das faculdades perceptivo-sensoriais dos indivíduos. Lembro que no ensaio em que ouvimos pela primeira vez a música que iríamos dançar, as apresentações na sala de dança foram impressionantes. O mesmo ocorreu no dia, já próximo ao espetáculo, em que vestimos todo o figurino e dançamos com ele. Essa sim foi nossa melhor apresentação, certamente. Me pego de surpresa agora a refletir sobre a influência que julgamentos estéticos, onde se apresentam artefatos e a materialidade cultural, os corpos e os objetos da práxis de uma atividade se manifestam, há um potencial efetivo para aprendizagem. Partindo deste “corpo próprio”, a dança contemporânea se desfaz de um corpo prédefinido. De fato, se o bailarino contemporâneo não tem mais que inventar outro corpo – Isadora Duncan, Mary Wigman, Merce Cunningham e muitos outros já tendo explorado este domínio –, ele procura, contudo “compreender, afinar, escavar e principalmente, fazer de seu corpo um projeto lúcido e singular. O bailarino de hoje permanece na escuta de seu corpo utilizando práticas, filosofias corporais, ensinamentos diversos, sempre em mutação” (LOUPPE, 2000, p. 62). Não se trata aqui de “reduzir” o pensamento da dança somente à fenomenologia, filosofia que, aliás, atravessa as outras artes contemporâneas. Mas muitas das temáticas que tratam da passagem para o bailarino de sua prática cotidiana, ao momento da apresentação – como fases de pesquisa e criação –, vão ao encontro, singularmente, das preocupações relativas à emergência, ao indeterminismo, à experiência do momento breve, à imanência mais do que à transcendência. “Compor na dança, sempre será contar com a revelação do instante e somente com ela”, escreve Laurence Louppe (2000, p. 206) que, em sua obra sobre a poética da dança contemporânea, desenvolve bastante a idéia de que o corpo está sempre em devir. Na maior parte do tempo, quando bailarinos e coreógrafos se encontram em um projeto comum, é necessário que estes definam juntos a corporeidade que, pelas circunstâncias, os unirá; de um ponto de vista técnico, mas também a partir da corporeidade particular de cada um dos intérpretes. É preciso destacar, pois acredito que essa seja uma das principais contribuições que percebi na prática da dança: a aprendizagem individual é estimulada pela coletiva. Talvez seja, em primeiro lugar, porque o grupo de sapateado constitui-se numa ‘comunidade de prática’, visto que é um sujeito coletivo e que é formado pelo voluntariado, por objetivos comuns, além de um repertório compartilhado de ações, estilos, artefatos, discursos, histórias. Sobretudo, em segundo plano, acredito porque sempre que algum colega procurava realizar a coreografia sozinho, ele falhava em alguma ação. Me recordo com vivacidade do dia em que estávamos ensaiando a segunda coreografia e chegava em um determinado passo que todos os colegas erravam. A professora pediu para que cada um realizasse individualmente até que acertasse, e simplesmente não acontecia. Ela resolveu seguir adiante e eis que quando a coreografia foi toda apresentada no mesmo dia, a bendita seqüência ocorreu perfeitamente. Para mim, na hora ficou nítido que, em conjunto, na coletividade, a prática se revelava, mas também acredito que essa aprendizagem possa ter sido sedimentada paralelamente pelas seguidas repetições e esforços desprendidos individualmente. Nesse sentido, torna-me mais lúcida a noção de que a aprendizagem pode ocorrer por meios cognitivos, na mente humana, e através de um condicionamento comportamental, todavia, como venho argumentando nesse estudo, essas abordagens não são suficientes para explicar o todo fenômeno da aprendizagem. Nesse dia eu pude vivenciar mais uma proposição. Nas artes, como na vida e nos processos de aprendizagem, este devir pode expressarse de diferentes formas e estéticas. Na construção de significados do coletivo e do imaginário, uma dança pode ser resignificada na pintura, que por sua vez pode ser transformada pela sua releitura numa escultura. A partir da obra de Matisse, anteriormente mencionada e que ele mesmo reinterpreta, outros artistas assim o fizeram, evidenciando este devir, imanência e incompossíbilidade, vide fotos 3 e 4, Além disso, embora exista a obra “concretamente”, ela estará sempre atravessada pelo olhar de seu intérprete, seu conhecimento estético e sensível (conforme STRATI, 2003), que a apreende no instante que a admira e interpreta, num 11 constante por vir e significar, assumindo a possibilidade de ser um agente que participa da construção desta obra artística de maneira ativa e em igual tempo passiva. Foto 3 - Obra de Alice Pittaluga. “La Dance” inspirado em Henri Matisse, 1910 - Dance. Conjunto escultório no Jardim Botânico. Art urban..Fotografia de Claudio Lara. Rio de Janeiro. Fonte: Disponível em: http://www.flickr.com/photos/claudiolara/364863379/. Acesso em 05.03.2008 [...] O que dá o movimento, como diz Rodin, é uma imagem onde os braços, as pernas, o tronco, a cabeça são tomados, cada qual num instante diferente de tempo, figurando, portanto, o corpo numa atitude que não teve momento algum, e que impõe às suas partes ajustamentos fictícios, como esse enfrentamento dos incompossíveis pudesse, e somente ele pudesse, soldar no bronze e na tela a transição e a duração (CHAUÍ, 2006, p. 486). Foto 4 - Obra de Sancho Oliveira. Latão-Brass inspirado em Henri Matisse, 1910 - Dance (Hermitage version) Fonte: Disponível em: http://homensdearame.blogspot.com/2006/06/56-dance.html, Acesso em 05.03.2008. Quanto ao movimento, este também está sempre por vir, quer nasça da improvisação dos bailarinos, quer seja pré-escrito pelo coreógrafo; a dança tem esta particularidade de não partir de “nada”, ou antes, daquilo que surge. E, no seu desenvolvimento, esta relação com a emergência permanece. Se a observação dos modos de criação vai neste sentido, a passagem para a cena e a recepção do espetáculo exacerbam esta relação com o presente. Quanto à primeira fase de criação, esta acontece durante a pesquisa feita pelo coreógrafo e seus bailarinos, quase sempre essencialmente nutrida por improvisações. A matéria se molda com a passagem para o corpo e, mais geralmente, na escuta do que advém (GUHÉRY, 2004). As proposições acerca de improvisação no meio organizacional têm sido temas recorrentes. Na prática da dança, em especial a do sapateado, percebi que há um grande espaço para improvisação. Provavelmente porque essa dança provém da musicalidade do jazz, que inclusive é a metáfora da improvisação nas organizações, mas principalmente porque na prática do sapateado o intérprete, na maioria das vezes, atua em solos, mesmo se apresentando em coletividade. É inerente a essa dança a liberdade de criação, e o talento na mesma é percebido muito mais pela engenhosidade inovadora do que pela técnica rebuscada. As minhas percepções em campo apenas confirmam o que a literatura do tema propõe. No início das aulas, como elas tinham um caráter mais instrucional, havia sempre um 12 momento, quase sempre no fim, em que os alunos deveriam promover sons com os passos da dança que já conheciam e, conseqüentemente, a produção de sons e movimentos ia se acumulando até que todos estivéssemos sapateando em conjunto e produzindo um som que fosse audível. Posso dizer que para mim era sempre um momento inconveniente, me sentia realmente vulnerável e até incapaz, pois percebia ali, na necessidade da criação, a minha gritante inferioridade técnica. Não tivemos mais tempo com o aproximar do espetáculo para fazer essas atividades, mas acredito que agora, com um pouco mais de conhecimento e habilidade técnica, eu me sinta, pelo menos, mais relaxado e espontâneo. É claro, o fato de que se trata de dança supõe uma valorização do presente, tanto que ela está profundamente marcada por seu caráter efêmero e evanescente. Ela escapa da memória do espectador, ele apreende um movimento que não poderá memorizar objetivamente. As constatações que podemos fazer quanto à sua dificuldade em apreender um sentido ‘explícito’, imediato, corroboram esta idéia (GUHÉRY, 2004). Historicamente, a dança sempre pôs em questão a palavra: reconheceu-se sua capacidade de ser mais eficaz do que a palavra, ser mais imediata do que ela, mais rápida até. A obra dançada é mais fugaz do que as palavras e é difícil julgá-la, de tanto que sua referência objetiva é instável (GUHÉRY, 2004). Só se apreende a dança, fundamentalmente, no instante em que ela se faz. 3.3. Uma prática para os sentidos O sentido que emana da dança é antes de tudo perceptivo. Se alguns estudos, ainda muito raros, sugerem que no seio do processo espetacular as relações entre a cena e a sala beiram o sensorial e solicitam no espectador muitos outros canais além dos sentidos ‘nobres’ que são a visão e a escuta (PRADIER, 1994, p. 18), muitos evocam a particularidade da relação sinestésica que se instaura entre a dança e seu espectador: “[...] mais do que em outros lugares, a dupla presença bailarino-espectador, que também é um encontro de corpos, atualiza-se numa relação intensificada – diálogo ainda mais envolvente para o encontro das estéticas, pois implica um encontro no tempo e no espaço” (LOUPPE, 2000, p. 21). Verdadeira experiência, a dança contemporânea intensifica as relações corpo a corpo. Ciências humanas e coreográficas já estariam de acordo neste ponto, “o tônus postural fala à consciência do espectador” (2000, p. 75). Entrevistas com espectadores na saída de espetáculos confirmam este ponto de vista. A dança tem a particularidade de emitir mais sinais do que signos. Enquanto que o signo é próprio do homem – sistema dos sinais frutos da linguagem –, o sinal é comum ao homem e ao animal – sistema de sinais externos. O espectador só pode confiar em sua sensação para falar da dança. Os sinais emitidos por ela remetem frequentemente ao ‘eu’ social, mas não são signos diretamente traduzíveis, interpretáveis. Alguns espectadores não podem responder ‘no calor da hora’, sua emoção foi tão forte que seu sentimento ainda não pode ser formulado. Desenha-se, aliás, uma forma de progressão “coração-pensamento”; os espectadores apreciam na dança o fato de que ela fala mais às emoções do que ao intelecto, mas estas emoções se transformam, na maioria das vezes, em signos que os espectadores formulam, imediatamente ou com mais recuo no tempo (GUHÉRY, 2004). O tempo tem um caráter relevante na aprendizagem, e na prática da dança não seria diferente. Com um breve histórico de sete meses praticando, houve nesse período espaço para três apresentações do grupo. Diversos amigos compareceram na primeira, afinal seria a minha estréia, e com apenas três meses de contato com o sapateado, o resultado foi, ao menos, bem comentado pelos colegas e amigos, mesmo que de forma irreverente. O que cabe ressaltar aqui é a questão de que a aprendizagem de uma prática, em qualquer instância será uma situação desafiadora para o praticante, umas mais e outras menos, mas o que caracteriza uma prática é a sua “repetição ao longo do tempo, a fim de que ela seja reconhecida como modos de atuação habitual” (GHERARDI, 2005, p. 24). Dessa forma, a aprendizagem de uma prática está diretamente ligada ao engajamento que o sujeito lhe confere. O tempo também revela que a aprendizagem na prática é gradual. Aqueles que puderam presenciar a primeira apresentação e o espetáculo estavam surpreendidos com o salto de aprendizagem nas performances. Enquanto que o sentido da obra contemporânea se pensa mais em termos de jusante do que de nascente, que ele se origina de um fazer e emana do movimento da obra e de sua 13 recepção, notamos que a relação que o espectador da dança estabelece com ele é mais do tipo “sensorial” do que “explicativo”. Entretanto, é importante que faça sentido, que a dança ‘diga’ alguma coisa; ela não pode ser gratuita. É porque a abstração que a caracteriza essencialmente gera um fenômeno de atração-repulsa, o fato de ela não dizer explicitamente “nada” atrai tanto quanto afasta. E essa dialética é marcante na aprendizagem também. A demanda por uma explicação concreta desse fenômeno no meio organizacional apenas afasta a apreensão de sua construção. O processo de aprendizagem, assim como a dança, manifesta-se no homem por constantes devires, explicá-lo de modo unilateral e fragmentário é negar o seu caráter multifacetado e relacional, que faz desse fenômeno algo expressivo nas organizações que conseguem apreendê-lo. 4. Considerações finais Em contraste com o paradigma positivista-funcionalista supremo nos estudos organizacionais e com a perspectiva cognitiva dominante nos estudos da aprendizagem organizacional, esse artigo é um passo para extrair contribuições da perspectiva sócio-cultural na compreensão dos processos de aprendizagem nas organizações. No Brasil, principalmente, a literatura sobre aprendizagem organizacional é esparsa, exigindo de seus pesquisadores uma pausa para reflexão sobre os enfoques e métodos adotados para se investigar o tema. Nesse sentido, busquei analisar a dança e toda sua teatralidade como uma metáfora para elucidar alguns dos diversos conceitos que surgem com a teorização da aprendizagem baseada na prática. A metáfora se faz presente porque o processo de aprendizagem, assim como a dança, está sempre em devir. A forma de estudar esses fenômenos é dialógica e, deste modo, abre espaço para novas abordagens no campo de pesquisa da área, principalmente, ligado à “aprendizagem na prática”. Para isso utilizei como método de pesquisa a autoetnografia, que em toda sua complexidade, é uma das abordagens investigativas condizente com o fenômeno da aprendizagem, ainda mais quando se busca apreendê-lo em conjunto com uma atividade artística. O estudo não carrega o objetivo em perpetuar alguma prática na administração que se aproprie das artes, mas visa trazer à cena acadêmica noções sobre como as artes, e nesse estudo em especial a dança, podem ajudar a explicar uma realidade organizacional que se manifesta cada vez mais por diferentes matizes. Matizes que revelam um tecido organizacional que tem como catalisador de seus processos a aprendizagem. Por isso, esse texto é um convite à ampliação do conhecimento científico na área, uma provocação para explorar aspectos até então negligenciados, como o irracional, o emocional, o simbólico, a estética da vida organizacional. E, com isso, a porta de entrada para novos métodos de pesquisa que possam tratar a aprendizagem com o devido rigor. O fenômeno da aprendizagem nas organizações precisa emancipar-se das vertentes que o consideram apenas um solucionador de problemas, para então fazer parte de uma construção epistemológica significativa e concretizar-se como uma área de conhecimento científico. Por ora, as principais contribuições percebidas em campo foram justamente a forte noção de que a “aprendizagem na prática” é situada e socialmente construída, ocorre a partir da interação e das trocas simbólicas entre os indivíduos, das percepções entre corpos, artefatos e objetos, e das emoções vivenciadas em cada gesto, em cada ação, em cada atividade, em cada prática. Porque o artista é instrumento da arte, que a criação do artista é um tema da coletividade. Ela diz respeito àquilo que o homem é enquanto criador: homem coletivo, portador e plasmador da alma inconsciente e ativa da humanidade. Na condição de visionário, o criador é depositário de um saber misterioso que o leva a dizer o indizível sem que ele mesmo saiba por que (SILVEIRA, 1981). Seguindo o pensamento de Fernando Sabino, diria que, de tudo, ficam três coisas: a certeza de que estamos sempre começando, a certeza de que é preciso continuar e a certeza de que seremos interrompidos antes de terminarmos. Fazer de cada interrupção um caminho 14 novo. Fazer da queda um passo de dança, do medo uma escada às sensações, do sono uma ponte ao inconsciente, da procura expressiva um encontro criativo... é fazer da prática uma aprendizagem. O grupo voltará a se apresentar com as mesmas coreografias em maio, na comemoração ao dia internacional do sapateado. Tenho certeza de que a apresentação será bem diferente. 5. Referências BEHAR, Ruth. The vulnerable observer: anthropology that breaks your heart. Boston, MA: Beacon Press, 1996. BLACKELER, Frank; CRUMP, Norman; McDONALD, Seonaidh. 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A práxis compreende também a práxis não prática: refletir sobre a práxis ou bem pensar o mundo são as atividades praxísticas (CHEVALLIER, 2004). 3 Paralógico significa ao lado da lógica. O princípio da não-contradição é lógico: não podem estar reunidos a proposição A e a proposição não A. Ao inverso, a reunião dessas duas proposições contrárias participa exatamente da paralogia. Jean-François Lyotard defende, por exemplo, a idéia de uma “diferença compreendida como paralogia” (op cit). 4 O perigo que comporta o recurso da representação é ligado ao fato que, sendo fenomenalmente um ato direto e imediato – da presença ao presente –, o teatro produz certo tipo de expectativa que é importante não decepcionar (op cit). 16