Serra do Lenheiro em São João del-Rei como atrativo ecoturístico: um estudo de caso Roberto Rômulo Braga Tavares Bacharel em Turismo – IPTAN Fone: (32) 3371- 4076; 8803-7549 E-mail: [email protected] Data da recepção: 11/03/2011 Data da aprovação: 03/05/2011 Resumo: O presente artigo tem como objetivo apresentar um estudo sobre a Serra do Lenheiro como atrativo eco-turístico, destacando os pontos positivos e negativos dessa atividade tanto para o ambiente físico quanto para as populações envolvidas. Para tanto, foram utilizados como recursos metodológicos: revisão de literatura, visitas in loco e aplicação de questionários semi-estruturados para turistas e comunidade local. Tal pesquisa é fundamental para destacar as principais formas de agressão ao meio ambiente local, referentes às práticas ecoturísticas na Serra do Lenheiro, bem como sugerir algumas ações para a preservação das demais áreas turísticas em seu entorno. Palavras-chave: Serra do Lenheiro – Ecoturismo – Preservação – Meio ambiente. Introdução Baptista (1997), Barieri (1997) e Drew (1989) têm escrito sobre a relação entre o desenvolvimento sócio-econômico através do Turismo, do Ecoturismo e a utilização e proteção do Meio Ambiente. Estabelecem claramente a complexidade da conexão entre esses processos ou sistemas, o que revela a interdependência profunda que se manifesta em, pelo menos, dois âmbitos: a possibilidade de fazer com que o desenvolvimento seja sustentado, o que requer que se possa contar com uma base ambiental sólida, a qual possibilite prever as futuras condições de vida; e a relação que existe entre o manejo racional dos recursos e do meio ambiente e o desenvolvimento a longo prazo, ou seja, o destino de uma região está essencialmente condicionado por sua ação sobre os meios naturais nos quais repousa. Nesse sentido, tanto a preservação ambiental, em face da crescente demanda, como novas possibilidades de oferta de trabalho adquirem relevância extraordinária, cuja influência sobre o desenvolvimento se torna cada vez mais significativa. Dados esses elementos básicos, de acordo com Baptista (1997) é necessário perguntar quais são as alternativas possíveis para se enfrentar as questões ambientais, superando as dificuldades de todo tipo e, ao mesmo tempo, criando condições para se incrementar os setores econômicos diretamente envolvidos com esse fato. Por isso, entendemos que o estudo da Serra do Lenheiro em São João del-Rei como atrativo ecoturístico, é pertinente e provocante, pois possibilita uma pesquisa de campo, a fim de identificar e destacar as atividades existentes nessa região relacionadas ao Ecoturismo e as conseqüências da atividade turística para a comunidade local. 1. A importância do turismo como atividade econômica e cultural O Turismo é visto como uma grande e próspera indústria, que quando bem planejada, além de gerar lucros, possui condições para auxiliar na solução de problemas sociais, como a miséria, o desemprego, a violência e a degradação da Natureza. Conforme Andrade (2000, p.12-13): O homem é o autor do ato de viajar, que encerra em si, necessariamente, o elemento físico primeiro que diferencia as quantificações e as distinções entre o espaço em que se situa e todos os demais espaços diversos daquele em que em ato ocupa e do qual precisa sair para que possa dar existência ao fenômeno viagem. Finalmente, sempre que se movimenta, o homem o faz no espaço e, para deslocar-se, mesmo que em medida física de aparências insignificantes, consome ou utiliza determinada quantidade de tempo, que é o elemento determinante de qualquer ato que o ser vivo pratique ou sofra, tanto consciente como inconscientemente. [...] Ser turista é fácil; difícil é a atividade preparatória dos que pretendem capacitar-se para exercer as tarefas que garantem um turismo de melhor nível para turistas de todos os níveis. A partir dessa afirmação, podemos inferir, portanto, que o compromisso do Turismo e de seus profissionais deve ser o de organizar e conduzir atividades no sentido de uma responsabilidade socioambiental que busca minimizar impactos ambientais e socioculturais negativos e potencializar os impactos positivos, de forma a contribuir para que os recursos que hoje utilizamos se mantenham suficientes e disponíveis para o uso das gerações futuras. 1.1. Desenvolvimento e sustentabilidade Ferreira (1992) ressalta que o custo social da industrialização, absorvido nas décadas passadas, convive hoje com a outra face da moeda: o pagamento do custo ambiental de uma sociedade consumista. O desenvolvimento clássico das atividades empresariais e industriais tem submetido o planeta nas últimas décadas a um desgaste preocupante, considerando, entre outros motivos: que o planeta deverá ter no próximo século o dobro de sua população atual; que estamos fazendo uso de nossos recursos naturais, não dando tempo de se renovarem; que ecossistemas estão perdendo sua biodiversidade de forma praticamente irreversível; que o uso excessivo e/ou inadequado dos recursos naturais tem levado à poluição da água, do ar e dos solos. Porém, segundo Hogan (1992), as tendências e ações de conservação nos têm trazido a perspectiva de mudança na direção de uma maior consciência ambiental no sentido do desenvolvimento em bases sustentáveis, pois já se entende que somente mudando nosso modo de ser, com a utilização harmônica dos recursos naturais pelas comunidades atuais é que os manteremos suficientes e impediremos impactos ambientais e culturais, permitindo atender tanto as nossas necessidades como as de gerações futuras. Apesar de o desenvolvimento sustentável constituir assunto largamente discutido, ele ainda se mostra de difícil consecução. Após a Eco-92 1 esse conceito se tornou um discurso fácil, um objetivo desejado por todos e, por isso, politicamente adotado e reproduzido sem que se avalie seu significado e viabilidade. Se a realidade tem provado ser o desenvolvimento sustentável um conceito de difícil entendimento e de difícil consecução, a complexidade aumenta quando esse conceito é introduzido na problemática urbana. Segundo Corrêa (1989), as origens da ideia de desenvolvimento sustentável, claramente ligado a uma agenda dita "verde", ou mesmo a desejos de idealização do meio rural, propondo-se a solução dos problemas de uma metrópole por meio da simples possibilidade de redução demográfica urbana, explica, em parte, a dificuldade de se assimilar esse conceito nas cidades. Outro fato que parece explicar o surgimento tardio nas áreas urbanas de questões ambientais é que muitos estudos produzidos sobre o tema ambiental, no começo dos anos 70, consideravam as cidades com desdém, provocando uma tendência de "retorno à natureza". Outro aspecto, ainda segundo Corrêa (1989), que adiciona complexidade a essa discussão é que as cidades, como um todo, não são a fonte principal de poluição nem mesmo o maior agente de consumo, mas partes delas o são (certas indústrias em particular, as classes com maior poder de consumo e determinado estilo de vida e mesmo classes de rendas mais baixas quando forçadas a ocupar áreas ambientalmente frágeis da cidade, por exemplo). 1 Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada na cidade do Rio de Janeiro – Brasil. Uma vez que as condições socioeconômicas tornam possível reduzir a convivência com problemas ambientais, como por exemplo, o lixo que é incinerado ou depositado em áreas distantes da aglomeração urbana, e diretrizes urbanísticas exigem a adoção de um zoneamento funcional, forçando as indústrias a localizarem-se em áreas especiais, vê-se surgir um problema ambiental regional, e não meramente local ou urbano. Esses dois fatores fizeram do problema ambiental nas cidades um problema menos aparente e as cidades sob essa condição pareceram ter eliminado seus impactos negativos sobre o ambiente natural. Uma realidade facilmente observada em cidades de países desenvolvidos, mas não presente na maioria das cidades brasileiras. De fato, a observação da insustentabilidade de cidades em países desenvolvidos, conforme Ferreira (1992), só é visível se levarmos em consideração os impactos ambientais de suas demandas por recursos em regiões distantes. Na realidade, muitas cidades nos países desenvolvidos conseguiram enormes progressos no sentido do desenvolvimento sustentável (como reflexo imediato do progresso socioeconômico de seus países); porém, esses resultados positivos serão encontrados tão somente no interior de suas próprias fronteiras urbanas. Nesses países, as maiores preocupações dos grupos ambientalistas deixam de ter como tema prioritário os problemas ambientais urbanos não-aparentes, dirigindo seus esforços para uma visão mais global sob o título de "agenda verde". Nesse caso, suas agendas (com uma grande influência em ações de ajuda internacional, empréstimos multilaterais e declarações universais) são enormemente caracterizadas por questões como camada de ozônio, grandes ecossistemas naturais, mudanças no clima global, dentre outros. Tudo isso, segundo Leis (1991), contribui para a falta de um posicionamento consistente em termos de problemas ambientais urbanos assim como para a falta de discussão em relação àquilo que se convencionou chamar de "agenda urbana". 1.2 Turismo e preservação – conflitos de possibilidades Conforme os estudos de Baptista (1997), durante os anos de 1970, começou-se a criticar o impacto negativo do turismo de massas sobre o meio ambiente, apontando-se como razão para tanto a devastação de áreas naturais, como parques e zonas costeiras, o comprometimento da qualidade de vida nos centros históricos das cidades, causado por congestionamento, todo tipo de poluição e danos, o aumento da violência e o crescimento desordenado da periferia. Na década de 1980, falou-se muito na necessidade de desenvolver formas alternativas de turismo, através de uma abordagem holística da atividade, de forma a beneficiar visitantes e visitados. O continente americano investiu muito em suas cidades turísticas, na diversificação de seus atrativos, na interpretação e apresentação de seu patrimônio. O planejamento, novamente segundo Baptista (1997), fez-se, no entanto, sem uma efetiva parceria criativa entre órgãos de preservação e turismo, sem o efetivo envolvimento da população e de suas práticas culturais, que foram, em muitos casos, excluídas e pasteurizadas para o rápido consumo turístico. O resultado, conforme Baptista (1997), pode ser visto ainda hoje quando se passeia por algumas cidades brasileiras, por exemplo. Tem-se a impressão de já se ter visto aquela paisagem, tal a mesmice encontrada no ambiente, esvaziado de conteúdo sociocultural, com meros cenários de filme ou shopping centers ao ar livre, com decoração e mobiliário semelhante e lojas sempre iguais, celebrando o não-lugar no cenário global. O prazer da visita é comprometido, aqui e lá, por razões distintas, sendo o denominador comum a concentração de gente e barulho. É só na última década do século XX, especialmente após a Eco 92, que a questão da sustentabilidade ganhou conceitos e formas concretas, levando a novas concepções de como desenvolver o turismo, e todas as atividades correlatas, de forma sustentável. Hoje, concorda-se que o turismo sustentável deve voltar-se para a harmonização das necessidades de seus quatro componentes: a comunidade receptora, os visitantes, o meio ambiente e a própria atividade. Se bem planejado dentro dos princípios da sustentabilidade, o turismo pode ter um impacto positivo e ser um catalisador para a restauração, preservação e revitalização de paisagens naturais e culturais, reforçando a cultura local e contribuindo para a geração de empregos e renda nas comunidades. 1.3 Atividades turísticas – planejamento participativo e parcerias para ação Segundo Baptista (1997), além de levar em consideração a preservação da natureza, da cultura e dos processos produtivos locais, o planejamento sustentável deve adotar uma abordagem que trabalhe a mentalidade da população nativa e os hábitos das organizações turísticas locais. Ou seja, levar em conta os medos, desejos e necessidades da população local se tornou essencial no planejamento turístico hoje. O planejamento do turismo com a comunidade é visto como necessário ao desenvolvimento sustentável por duas razões principais: se o desenvolvimento do turismo não for compatível com desejos e objetivos da comunidade, ou for dominado por interesses econômicos exclusivamente externos, conflitos e tensões podem resultar no declínio do turismo; a comunidade de uma localidade tem o direito de ser envolvida no desenvolvimento de uma indústria que sempre traz custos e benefícios para o ambiente em questão. Assim, o envolvimento da comunidade é vital para o desenvolvimento sustentável do turismo, desde que faça parte de uma estratégia mais ampla e integrada, o que requer sólidas parceiras entre organizações públicas e privadas. 2. Histórico do ecoturismo Segundo projeções da OMT2, o Ecoturismo já é praticado por cerca de 5% do contingente total de viajantes, e apresenta perspectivas de um crescimento acima da média do mercado turístico convencional (cerca de 20% / ano), transformando-se num dos mercados mais promissores, 2 Sigla que significa Organização Mundial do Turismo. principalmente em países com significativas reservas naturais, como os da América Latina. Por isso, o Ecoturismo, segundo dados da EMBRATUR 3 (1994), tem recebido um tratamento diferenciado das autoridades governamentais brasileiras do turismo. A definição de uma agenda oficial brasileira para o ecoturismo, inspirada em nossos anseios e em nossa experiência, foi formulada por um Grupo de Trabalho organizado pelo Ministério da Indústria, do Comércio e do Turismo e Ministério do Meio Ambiente e da Amazônia Legal, em Goiás Velho / GO, em 1994, onde foram traçadas, também, as diretrizes para uma Política Nacional de Ecoturismo, que tem como principal objetivo preservar ao máximo as regiões, além de possibilitar melhorias de vida para as populações desses entornos. Hoje, o país procura implementar essa política através de programas em nível regional e local. O Ecoturismo, segundo a EMBRATUR (1994), é um segmento da atividade turística que utiliza, de forma sustentável, o patrimônio natural e cultural, incentiva sua conservação e busca a formação de uma consciência ambientalista através da interpretação do ambiente, promovendo o bem estar das populações envolvidas. O chamado Ecoturismo é uma atividade que, em primeiro lugar, promove o reencontro do homem com a natureza de forma a compreender os ecossistemas que mantêm a vida. As atividades são desenvolvidas através da observação do ambiente natural, mediante a transmissão de informações e conceitos ou por meio da simples contemplação da paisagem. Atividades de Ecoturismo procuram promover programas sérios e infraestrutura segura e profissional, oferecendo e praticando a educação ambiental de forma multidisciplinar com guias especializados. O desenvolvimento de roteiros e programas diferenciados de acordo com os vários tipos de ambientes, associados à transmissão de informações e conceitos, leva com relativa facilidade, ao aprendizado. Mas o grande legado deixado no turista é a compreensão e a consciência da 3 Sigla que significa Instituto Brasileiro de Turismo. importância de se preservar o ambiente natural, a história e a cultura dos lugares de visitação. 2.1 Impactos ambientais positivos e negativos causados pelo ecoturismo e ações para minimizá-los Impacto ambiental, de acordo com Hogan (1992), é a alteração no meio ou em algum de seus componentes por determinada ação ou atividade. Estas alterações precisam ser quantificadas, pois apresentam variações relativas, podendo ser positivas ou negativas, grandes ou pequenas. O objetivo de se estudar os impactos ambientais é, principalmente, o de avaliar as consequências de algumas ações, com o intuito de prever a qualidade do ambiente que sofrerá a execução de certos projetos ou ações, logo após a implementação dos mesmos. Antes de se colocar em prática um projeto, seja ele público ou privado, é preciso saber mais a respeito do local onde tal projeto será implementado, conhecer melhor o que cada área possui de ambiente natural (atmosfera, hidrosfera, litosfera e biosfera) e ambiente social (infraestrutura material constituída pelo homem e sistemas sociais criados). O estudo para a avaliação de impacto permite, conforme Hogan (1992), que certa questão seja compreendida: proteção e preservação do ambiente e o crescimento e desenvolvimento econômico. Muitas vezes podemos encontrar grandes áreas impactadas devido ao rápido desenvolvimento econômico, sem o controle e a manutenção dos recursos naturais. A consequência pode ser poluição, uso incontrolado de recursos como água e energia. Qualquer atividade humana, executada em larga escala, pode ter consequências adversas para a terra, a vegetação e a vida animal, nos locais onde ocorrem. Os problemas ambientais são agora temas centrais do planejamento de muitos governos, porém, pouquíssimos projetos que contam com um estudo de impactos ambientais são analisados de fato. A qualidade do meio ambiente é um assunto central do desenvolvimento econômico do país, pois depende dela a sobrevivência da população. Contudo, os impactos causados pela atividade turística ao meio ambiente não são apenas negativos. Dentre os impactos positivos, podemos citar: conservação de áreas naturais importantes; conservação de locais arqueológicos e históricos e de caráter cultural e arquitetônico; melhoramento da qualidade ambiental; aumento da atratividade ambiental; melhoramento das infraestruturas; conscientização para os problemas ambientais. Por outro lado, existem os impactos negativos. De acordo com Boff (1999), o homem através do tempo vem conquistando espaço, quase sempre com pressão sobre os recursos naturais. Muitas vezes visando benefícios imediatos dando maior importância ao crescimento econômico e não se preocupando com a capacidade de recuperação dos ecossistemas. Assim, se com a modernização da agricultura por meio da adoção de novas técnicas, a produção de alimentos aumentou muito, como resultado enfrenta-se: a contaminação da água em todas as suas fontes, a substituição da cobertura vegetal, a redução de muitas espécies da fauna e da flora. A interferência humana no ambiente vem trazendo prejuízos e danos notados em vários locais do planeta. Segundo Scarlato (1993, p. 5): O ambiente além de ser o conjunto de interações entre os ecossistemas como entendido pelos biólogos, envolve também o sentido de interação com a cultura humana, numa relação de reciprocidade. Assim sendo, se há mudanças em uma das partes a outra será afetada, cabe então fazer parte às ações do homem como um ser capaz de adaptar-se às condições do meio e criar situações propondo alternativas para as dificuldades encontradas. Sendo o ambiente um conjunto de fatores naturais, pode-se compreender que os problemas ambientais não podem ser tratados com neutralidade. A sociedade é responsável por impactos causados aos ecossistemas. Esses impactos, contudo, têm natureza histórica e não podem ser resolvidos sem a transformação das relações da sociedade com a natureza. De acordo com Scarlato (1993), à medida que a nova sociedade se consolida com ela surgem os problemas ambientais, como a grande produção de lixo. Segundo o autor, a humanidade ainda não tinha percebido que o volumoso lixo que produzia podia ser um grave problema para o ambiente. Nesse sentido, vem a preocupação de como conscientizar a população para que esse problema seja amenizado, reconhecendo que a coleta de lixo seletivo é importante e que começa na sua própria casa e nas escolas. Deve-se propor uma ecologia integrada à cidadania, ao dia a dia mostrando como se forma uma consciência ecológica e como esta pode transformar a economia, a saúde, as tecnologias, as cidades, enfim, o comportamento. Quaisquer que sejam as modalidades de degradação e poluição, as pesquisas e os projetos sobre o ambiente, devem objetivar o conhecimento da complexidade das condições ambientais em seus recursos disponíveis e potenciais, visando reduzir ao mínimo o aspecto predatório na utilização do ambiente. A partir do reconhecimento dos impactos positivos e negativos da interferência do homem na humanidade, podemos afirmar que o conhecimento da estrutura e funcionamento dos ecossistemas constitui aspecto que, mais e mais, vem interessando às sociedades atuais, que passam a reconhecer que é através dos processos desenvolvidos em cadeia que certos recursos naturais são formados, se mantêm e são renovados e utilizados no dia a dia. E também que, pela utilização dos recursos naturais, transformados em bens e serviços, o homem supre suas necessidades e melhora o seu bem estar. Assim, conforme Giddens (2000), o conhecimento dos recursos naturais e ecossistemas constitui base de manutenção e conservação do ambiente nos processos de análise econômica que objetiva o desenvolvimento regional e seu planejamento. Essa é uma das ações que podem minimizar os impactos ambientais de qualquer atividade. 2. ASPECTOS GERAIS DA SERRA DO LENHEIRO 3.1 Aspectos históricos Na Serra do Lenheiro, podem ser contempladas interessantes pinturas rupestres, símbolos gravados em rochas. De formas diversas, alguns se assemelham a símbolos alfabéticos, outros a homens ou a animais. Segundo estudiosos, as pinturas rupestres da Serra do Lenheiro devem ter sido realizadas por tribos nômades, há cerca de 6 a 9 mil anos atrás. Acredita-se que esses homens abrigavam-se na serra para desfrutar das boas condições de caça. Conforme Gaio Sobrinho (1996), outro importante aspecto histórico da serra é o Córrego do Lenheiro. Esse córrego nasce na Serra do Lenheiro e deságua no Rio das Mortes. Com quase 6 km de extensão, ele marca a história e a paisagem de São João del-Rei, sob as pontes de pedra, rompendo toda a cidade. Segundo Gaio Sobrinho (1996), há ainda o Canal dos Ingleses que era um aqueduto4, que percorria longa extensão em curvas de nível, onde se separava o ouro, lavando a areia. Os vestígios do aqueduto, construído antes de 1830, podem ser encontrados na Serra do Lenheiro. A Serra do Lenheiro foi cenário na história da conquista e do povoamento de Minas Gerais. Por ela passava o antigo Caminho Geral do Sertão, posteriormente conhecido como Caminho Velho, por onde transitaram Fernão Dias Paes e sua histórica "Bandeira das Esmeraldas", Borba Gato, Matias Cardoso e o fundador de São João del-Rei, Tomé Portes del-Rei 5. 3.2 Aspectos geográficos A Serra do Lenheiro, com cerca de 1,6 bilhões de anos de formação, abriga inúmeros atrativos. Dentre eles, estão o Canal dos 4 5 Antigo sistema de canalização de água. Personagens da nossa história, os quais eram bandeirantes e participaram efetivamente de missões de reconhecimento e/ou exploração do interior do território brasileiro. Ingleses, a Gruta do Caitetu, o Pico Três Pontões, as pinturas rupestres e cachoeiras. O seu nome origina-se dos lenhadores, que extraíam a madeira dos arbustos da serra. Mas o sua maior contribuição à história de São João del-Rei foi o ouro, descoberto ali nos primeiros tempos do primitivo arraial. As pedras, utilizadas na construção das pontes e igrejas, também foram extraídas no local. Com altitude máxima de 1262 metros, essa formação é, geologicamente, a continuação da Serra de São José. Ambas estão separadas pelo vale do Rio das Mortes. São reconhecidas atrações as fontes de água, vida, cultura e lazer. 3. Planejamento da atividade turística na Serra do Lenheiro 4.1. Modalidades de ecoturismo na serra do lenheiro A Serra do Lenheiro oferece as seguintes opções no que tange ao ecoturismo: - Trekking (caminhadas); mountain bike; escalada; rapel e cachoeiras: a Cachoeira do Triângulo e Cachoeira Véu da Noiva; - Montanhismo: essa atividade é muito tradicional na Serra do Lenheiro, principalmente, pelo trabalho realizado pelo 11º Batalhão de Infantaria e Montanha. Os montanhistas do exército desafiam alturas, com o auxílio de cordas e outros equipamentos de segurança. O Batalhão possui uma Unidade Escola (CEMONTA)6, onde treina delegações militares de todo Brasil, inclusive do exterior. 5. Entrevistas com participantes de atividades ecoturísticas na Serra do Lenheiro A metodologia utilizada para essa etapa da pesquisa constituiu-se de elaboração e distribuição de cento e vinte questionários, sendo aplicados noventa na comunidade local e trinta com turistas e ecoturistas. 6 Sigla que significa Campo Escola de Montanhismo Da coleta desses questionários, passou-se a uma análise caracterizada por gráficos, os quais apresentam os pontos de destaque das entrevistas. 5.1. Análise dos dados coletados com os questionários De acordo com o primeiro gráfico, percebe-se que a importância da atividade turística para o município é muito salientada (53%), porém, na prática não identificamos estratégias e/ou ações que venham a confirmar esse dado. A região em especial, Serra do lenheiro, não tem um planejamento em relação às atividades de ecoturismo ou qualquer outro ramo do turismo, haja vista a degradação em seu ambiente. É necessário, principalmente a partir de pesquisas como essa, exigir que os órgãos responsáveis implementem urgentemente ações que venham não só dar lucro, mas principalmente que contribuam para a preservação de áreas ambientais riquíssimas como é o caso da Serra do Lenheiro. Importância da atividade turística para o munícipio Importante 42% 52% Não é importante Pouco importante Muito importante 5% 1% FIG. 1 – Gráfico sobre a atividade turística para o município Sobre o segundo gráfico – vantagens positivas e negativas da atividade turística – as informações coletadas apontam para o fato de ela ser considerada um bom incremento financeiro (70%) para a região. Daí a necessidade premente de se estruturar a região para receber bem os turistas e conscientizá-los da importância de se preservar os locais visitados. FIG. 2 - Gráfico sobre as vantagens do turista Vantagens Positivas e Negativas do Turista Recursos Financeiros 15% 10% Congestionamento 5% Intercâmbio Cultural 70% Depredação Ambiental Em relação ao terceiro gráfico, aponta-se uma questão fundamental que é a preocupação com o meio ambiente, percebendose que a relação entre os que têm muita preocupação (32%) e os que não têm (28%) é quase a mesma. Isso é muito sério, porém verdadeiro, pois retrata a realidade da destruição do meio ambiente. Preocupação com o Meio Ambiente Muita 28% 19% 32% Moderada 21% Pouca Nenhuma FIG. 3 - Gráfico sobre a preocupação com o meio ambiente O quarto gráfico apresenta as atitudes de preservação, onde se observa alguns pontos fundamentais: postura ambiental; não jogar lixo em qualquer local; preservação do patrimônio e dos bens locais. A preocupação é o sentimento da maioria em praticamente todos os itens, porém, não se percebe em termos reais essa situação, principalmente, na questão do lixo e na preservação de bens e do patrimônio em geral. FIG. 4 - Gráfico sobre as atitudes de preservação Atitudes de Preservação 60 50 40 30 20 10 0 Preocupa Muito Preocupado Pouco Preocupado Sobre o quinto gráfico – relação entre a prática do Ecoturismo, a idade e o sexo dos entrevistados –, percebe-se que a população mais jovem está mais preocupada com essa questão. Relação: Prática do Eco / Idade / Sexo 20 18 16 14 Masculino/Idade Feminino/Idade Masculino/Prática Feminino/Prática 12 10 8 6 4 2 0 13 entre 25 26 entre 36 37 entre 47 48 entre 58 59 entre 69 70 entre 79 FIG. 5 – Gráfico sobre a relação entre a prática do Ecoturismo, a idade e o sexo No sexto gráfico percebe-se que a maior parte da população local sabe da prática de Ecoturismo na região, porém, o maior número de participantes é composto de turistas. No sétimo gráfico são apresentados os locais de origem dos turistas – ecoturistas que conheceram a cidade de São João del-Rei. Origem dos Turistas 3% 3% 7% 3% 3% 3% 14% 17% 3% 10% 17% São Paulo Rio de Janeiro Belo Horizonte Uberlândia Espirito Santo Brasilia Barbacena Juiz de Fora Diamantina Ouro Preto Isso demonstra a importância da região como atrativo turístico. FIG. 6 – Gráfico sobre Ecoturismo desenvolvido em São João del-Rei EcoTurismo desenvolvido em São João Del Rei 36% sim 64% não FIG. 7 – Gráfico sobre a origem dos turistas No oitavo gráfico, percebe-se que a maior parte dos praticantes de Ecoturismo é do sexo feminino e que está entre 26 e 36 anos, mas também é grande o número de mulheres e jovens de 13 a 25 anos. Idade / Sexo / Prática do Ecoturismo 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0 Masculino/Idade Feminino/Idade Masculino/Prática Feminino/Prática 13 entre 25 26 entre 36 37 entre 47 48 entre 58 59 entre 69 FIG. 8 – Gráfico sobre a prática de Ecoturismo por idade e sexo No nono gráfico, é possível perceber que o motivo que mais atrai os turistas é conhecer novos lugares, seguido de negócios e férias e curtir a natureza. Motivo da Viagem 14% 23% Negócios/Férias Conhecer novos lugares 21% Curtir a natureza Outros 42% FIG. 9 – Gráfico sobre o motivo da viagem dos turistas O décimo gráfico apresenta, a partir dos questionários aplicados, a opinião dos entrevistados sobre a Serra do Lenheiro como local de prática de Ecoturismo, os quais em sua maioria desconheciam essa função do local. Portanto, é urgente um trabalho não só de preservação do local, mas de conscientização da população para o fato de que essa atividade turística em muito pode contribuir para a melhoria de sua vida. Opinião sobre a Serra do Lenheiro para Prática do Ecoturismo 14% 10% 73% Interessante 3% Excelente Conheço Não conheço FIG. 10 – Gráfico sobre a opinião dos entrevistados sobre a Serra do Lenheiro para a prática de Ecoturismo 5.2. Propostas e contribuições para a minimização dos impactos ambientais causados à Serra do Lenheiro Neste tópico final do trabalho, procuramos listar algumas propostas tanto para minimizar os impactos ambientais quanto para estimular a região da Serra do Lenheiro como atrativo turístico: aumentar a capacidade de absorção de turistas, desde que respeitem as riquezas ambientais; levar ao conhecimento dos visitantes outras áreas turísticas; desenvolver ações para conservação ambiental; estabelecer parcerias com órgãos competentes a fim de promover a região e suas belezas naturais; fomentar campanha de conscientização; providenciar recipientes de lixo em lugares apropriados; aumentar a vigilância; aumentar a disponibilidade dos transportes públicos; criar programas de educação ambiental para a comunidade. Considerações finais A partir dessa pesquisa pode-se observar que muito precisa ser feito em relação à preservação e à conservação ambiental antes de se definir uma região como atrativo turístico. Isso porque, caso não se faça um planejamento prévio pautado na sustentabilidade, só se terá um lucro financeiro por pouco tempo, pois a degradação se tornará tão feroz que inutilizará tal região. Planejar com, ao invés de para (a comunidade), conforme Hogan (1992), não é fácil, uma vez que a dependência de recursos externos, públicos ou privados, impede o controle local. E os objetivos econômicos individuais de curto prazo tendem a predominar sobre os objetivos comunitários de longo prazo. Também caracteriza um fator de dificuldade a falta de informação e treinamento das pessoas envolvidas nessa ação. Outro fator complicador é a falta de interesse e compromisso daqueles que não estão envolvidos diretamente com o turismo. Uma pesquisa como essa não tem um ponto final, é simplesmente um começo na luta pela conscientização ambiental principalmente da comunidade local em relação à preservação e à utilização sustentável de suas riquezas naturais, em especial, da Serra do Lenheiro. Referências ANDRADE, José Vicente. Turismo: Fundamentos e Dimensões. São Paulo: Ática, 2000. BAPTISTA, Mário. Turismo: competitividade sustentável. Lisboa: Verbo, 1997. BARIERI, José Carlos. Desenvolvimento e Meio Ambiente: as estratégias de mudança da Agenda 21. São Paulo: Vozes, 1997. CORRÊA, Roberto. Espaço Urbano. São Paulo: Ática, 1989. DENKER, Ada de Freitas. Metodologia aplicada ao turismo. Saraiva, 1998. DREW, David. Processos Interativos Homem-Meio Ambiente. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1989. EMBRATUR. Diretrizes para uma política nacional de ecoturismo. Brasília: Embratur, 1994. FERREIRA, Leila da C. Sustentabilidade e Políticas Públicas no Brasil. São Paulo: Boitempo, 1992. GAIO SOBRINHO, Antônio. 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Such research emphasizes the main forms of aggression against the environment concerning eco-touristic practices and suggests actions that aim at preserving other nearby touristic areas. Keywords: Serra do Lenheiro – Eco-tourism – Preservation - Environment