O balanço de Lula
O jornal O Estado de São Paulo publicou,
neste domingo (26), uma entrevista de
quatro páginas com o presidente Luiz Inácio
Lula da Silva. Na entrevista, Lula rejeita a
possibilidade de uma mudança
constitucional para disputar um terceiro
mandato em 2010, fala sobre seu governo,
a política econômica, o PT e a crise do
mensalão, entre outros temas. A agenda
eleitoral é um dos temas centrais da
entrevista. Pragmático, Lula defende um
entendimento entre os partidos que
compõem a coalizão que o apóia no
Congresso, visando às eleições municipais
de 2008 e a sucessão presidencial, em
2010. “Tenho ponderado aos presidentes
dos partidos da base que seria importante
que eles conversassem e começassem a
mapear a possibilidade de alianças políticas
nas prefeituras das capitais e das cidades
mais importantes do País”. Para ele, esse
entendimento facilitaria a construção de
uma candidatura em 2010:“Se as direções
não conversam antecipadamente, permitem
que o jogo eleitoral e o interesse
eminentemente municipal determinem a
política local e o conflito nacional. Onde é
possível construir aliança política para
disputar, por exemplo, 2008? Onde é
possível ter candidaturas próprias? Esse
gesto pode facilitar a candidatura em 2010”.
Lula diz que esse candidato não precisa ser,
necessariamente, do PT: “Se a gente tiver
juízo, a gente constrói essa candidatura
única. Ser do PT ou não ser do PT é um
problema que o partido vai ter de decidir”. E
faz uma defesa da adaptação na política:
“Você está lembrado de quantas vezes eu
disse que era uma metamorfose ambulante.
Mas, se o político não vai se adaptando ao
mundo em que ele vive, ele vira um
principista. Na hora do discurso, à frente de
um partido, você pode ser principista, mas
na hora de governar você precisa saber que
tem um jogo que tem de ser jogado”.O
futuro do PTIndagado sobre se, ao final de
seu segundo mandato, o PT não ficará com
a cara do PMDB, Lula diz que “não é
possível que as pessoas queiram que o
partido de 2007 seja o mesmo de 1989”.
Segundo ele, a diversidade no interior do PT
é que permite que o partido não vá nem
para a ultra-esquerda nem para a direita.
“Que você fique em uma posição
intermediária daquilo que é a política
possível de ser colocada em prática daquilo
que é possível estar de acordo com a
realidade”, resume. Além disso, defende o
papel que a Carta ao Povo Brasileiro teve
na eleição de 2002: “foi aquela carta que me
deu a vitória em 2002. Eu sempre tinha 35%
dos votos, e me faltavam 15% para ganhar
as eleições. Aquela carta, a composição
com José Alencar de vice, eram os
ingredientes de que nós precisávamos para
fazer com que a gente pudesse ter os
outros 15%. Isso aconteceu, nós fomos a
61%”.Indagado pelos jornalistas do Estadão
sobre a possibilidade de uma mudança
constitucional que permitisse uma nova
tentativa de reeleição, Lula rejeitou
categoricamente a idéia: “Quando um
dirigente político começa a pensar que é
imprescindível, que ele é insubstituível,
começa a nascer um ditadorzinho”. E
garantiu que nada o fará mudar de posição:
“Não tem essa de o povo pedir. Meu
mandato termina no dia 31 de dezembro de
2010. Passo a faixa para outro presidente
da República em 1° de janeiro de 2011, e
vou fazer meu coelhinho assado, que faz
uns cinco anos que eu não faço”. Sobre o
julgamento do mensalão no Supremo
Tribunal Federal, Lula disse que, quem
errou deve pagar, que as denúncias devem
ser apuradas e que cabe ao Supremo
decidir se acata ou não os indiciamentos. “O
PT não errou. Eu acho que pessoas do PT
podem ter errado”, afirmou, recusando-se,
porém, a citar nomes.Lula defendeu a
política econômica de seu governo,
classificou-a como um grande acerto e
negou que ela seja uma continuidade dos
anos FHC. “Se eu continuasse com a
política, o país tinha quebrado. Mudou tudo.
Mudou a nossa relação internacional”.
Questionado sobre quais as diferenças em
relação à política do governo anterior,
respondeu: “O ajuste fiscal que nós fizemos
em 2003. Você acha que não contou nada
para a gente poder garantir a economia? A
nossa política de crédito, a nossa política de
transferência de renda? A nossa política de
inovação tecnológica, a quantidade de
desoneração que nós fizemos? Não mudou
nada neste país?”. Citou o Bolsa Família e o
Pró-Uni como exemplos de programas que
estão mudando a vida de milhões de
brasileiros. E elogiou a atuação do
presidente do Banco Central, Henrique
Meirelles, concordando que foi “um grande
achado na administração da economia”.
Gasoduto e Banco do SulNo terreno da
política internacional, destacou a abertura
para a América Latina, África e Oriente
Médio, que fizeram com que o Brasil não
ficasse mais dependente de um único país.
“Embora a nossa exportação continue
crescendo 20% para os EUA e 20% para
Europa, ela cresceu 100% com a África,
70% com o Oriente Médio e cresceu 50%
com a América Latina”, exemplificou. Lula
negou a existência de uma disputa com a
Venezuela e a Argentina. “O Brasil tem US$
4 bilhões de investimentos na Venezuela. O
Brasil tem interesse em fazer parceria entre
Petrobrás e PDVSA. Estamos muito bem
relacionados na América do Sul, temos e
tivemos esses problemas com a Bolívia, que
são problemas naturais. O Brasil, com a
maior economia, tem de ser sempre mais
generoso com a Bolívia, o Paraguai, o
Uruguai, porque são países menores, que
precisam ter oportunidade de crescimento”.
Especificamente sobre os temas do
Gasoduto e do Banco do Sul, propostos
pelo presidente da Venezuela, Hugo
Chávez, Lula mostrou mais interesse no
primeiro do que no segundo. Segundo ele, o
gasoduto interessa ao Brasil e há mais de
50 técnicos da Petrobrás discutindo com a
PDVSA para verificar a viabilidade
econômica e ambiental do projeto. “Se ficar
comprovada toda a reserva de gás na faixa
do Orinoco, nós temos um potencial
extraordinário para desenvolver a América
do Sul”, afirmou. Quanto ao Banco do Sul
(que serviria como agente de financiamento
de projetos de desenvolvimento na América
Latina), o presidente brasileiro disse que, a
priori, não é contra, mas que é preciso
definir antes qual seria a característica do
mesmo. “Nós já temos o CAF (Corporação
Andina de Fomento”, que funciona bem.
Então o pessoal está discutindo”.Aberta
corrida presidencial?O Estadão destacou
as afirmações relativas à sucessão de 2010.
Na noite de domingo, uma matéria
repercutiu o conteúdo da entrevista,
afirmando: “Entrevista de Lula abriu corrida
presidencial, dizem aliados”. O PMDB de
(Michel) Temer teria reagido com euforia. “O
presidente Lula tem nos ouvido com
freqüência, portanto, não nos surpreendeu.
Ele tem nos tratado como os integrantes da
coalizão esperavam”, declarou Temer ao
jornal. Já o deputado José Eduardo
Cardozo (PT-SP) disse que uma
candidatura única dos partidos da base do
governo “é o caminho mais sensato a
seguir”, mas que esse é um processo difícil,
entre outras razões, por disputas regionais
difíceis de serem superadas. Cardozo
admitiu a possibilidade de o PT não ter
candidato, dizendo que o partido precisará
ter grandeza caso apareça um nome de
outro partido “que corresponda às
expectativas e tenha mais chances de
vitória”.Fonte: Marco Aurélio Weissheimer,
da Agência Carta Maior
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