Publicação mensal
ISSN 0100-7203
Órgão Oficial de Divulgação Científica da Federação Brasileira das
Associações de Ginecologia e Obstetrícia
Rev Bras Ginecol Obstet v. 34, n. 2, p. 49-98, fev. 2012
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Jurandyr Moreira de Andrade (Ribeirão Preto/SP)
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Editor Executivo
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Jesus de Paula Carvalho (São Paulo/SP)
Jon Oyvind Odland (Tromso, Norway)
José Carlos Peraçoli (Botucatu/SP)
José Geraldo Lopes Ramos (Porto Alegre/RS)
José Guilherme Cecatti (Campinas/SP)
José Meirelles Filho (Cuiabá/MT)
Joseph A.Spinnato, II (Cincinnati, Ohio)
Krikor Boyaciyan (São Paulo/SP )
Luiz Carlos Zeferino (Campinas/SP)
Luiz Gerk de Azevedo Quadros (São Paulo/SP)
Luiz Henrique Gebrim (São Paulo/SP)
Manoel J. B. Castello Girão (São Paulo/SP)
Manuel de Jesus Simões (São Paulo/SP)
Marair Gracio Ferreira Sartori (São Paulo/SP)
Marcelo Zugaib (São Paulo/SP)
Marcos Felipe Silva de Sá (Ribeirão Preto/SP)
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Marilza Vieira Cunha Rudge (Botucatu/SP)
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Paulo Traiman (Botucatu/SP)
Ricardo Mello Marinho (Belo Horizonte/MG)
Roseli Mieko Yamamoto Nomura (Santo André/SP)
Ruffo de Freitas Júnior (Goiânia/GO)
Rui Alberto Ferriani (Ribeirão Preto/SP)
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Selmo Geber (Belo Horizonte/MG)
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Sérgio Mancini Nicolau (São Paulo/SP)
Técia Maria de Oliveira Maranhão (Natal/RN)
Victor Hugo de Melo (Belo Horizonte/MG)
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Secretária Executiva
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Revisora de Referências Bibliográficas
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Órgão Oficial de Divulgação Científica da Federação Brasileira das
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14049-900 – Ribeirão Preto/SP
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mensal da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia.
A responsabilidade por conceitos emitidos nos artigos é de inteira responsabilidade de seus
autores. É permitida a reprodução total ou parcial dos artigos, desde que mencionada a fonte.
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texto publicado, não podendo ser feitos acréscimos ou exclusões no mesmo.
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ISSN 0100-7203
Órgão Oficial de Divulgação Científica da Federação Brasileira das
Associações de Ginecologia e Obstetrícia
Rev Bras Ginecol Obstet v. 34, n. 2, p. 49-98, fev. 2012
Sumário
Editorial
49
Geraldo Duarte
52
Eliana Amaral
Sífilis e gravidez...e a história continua!
Syphilis and pregnancy...the story continues!
Sífilis na gravidez e óbito fetal: de volta para o futuro
Syphilis during pregnancy and fetal death: back to the future
Artigos originais
56
Maria Isabel Do Nascimento
Gestações complicadas por sífilis materna e óbito fetal
Pregnancies complicated by maternal syphilis and fetal death
Alfredo De Almeida Cunha
Elisângela Victor Guimarães
Felipe Silva Alvarez
Sandra Regina Dos Santos Muri Oliveira
Eduardo Loyola Villas Bôas
63
Laura Helena França de Barros Bittencourt
Fabiana Maria Ruiz Lopes-Mori
Regina Mitsuka-Breganó
Marivone Valentim-Zabott
Roberta Lemos Freire
Simone Benghi Pinto
Soroepidemiologia da toxoplasmose em gestantes a partir
da implantação do Programa de Vigilância da Toxoplasmose
Adquirida e Congênita em municípios da região oeste do Paraná
Seroepidemiology of toxoplasmosis in pregnant women since the implementation of the Surveillance
Program of Toxoplasmosis Acquired in Pregnancy and Congenital in the western region of
Paraná, Brazil
Italmar Teodorico Navarro
69
Gláucia Rosana Guerra Benute
Daniele Nonnenmacher
Roseli Mieko Yamamoto Nomura
Mara Cristina Souza de Lucia
Marcelo Zugaib
Influência da percepção dos profissionais quanto ao aborto
provocado na atenção à saúde da mulher
Perception influence of professionals regarding unsafe in attention to women’s health
74
Ana Gabriela Pontes
Marta Francis Benevides Rehme
Anice Maria Vieira de Camargo Martins
Maria Thereza Albuquerque Barbosa Cabral Micussi
Técia Maria de Oliveira Maranhão
Resistência à insulina em mulheres com síndrome dos ovários
policísticos: relação com as variáveis antropométricas e
bioquímicas
Insulin resistance in women with polycystic ovary syndrome: relationship with anthropometric
and biochemical variables
Walkyria de Paula Pimenta
Anaglória Pontes
80
Winny Hirome Takahashi
Reginaldo Guedes Coelho Lopes
Ablação histeroscópica do endométrio: resultados após
seguimento clínico de 5 anos
Results of hysteroscopic endometrial ablation after five-year follow-up
Daniella De Batista Depes
Hosana Karinne de Marathaoan Souza Martins e
Castello Branco
86
Alana Soares Brandão Barreto
Marina Ferreira de Medeiros Mendes
Luiz Claudio Santos Thuler
92
Ana Carolina Japur de Sá Rosa-e-Silva
Mariani Mendes Madisson
Avaliação de uma estratégia para ampliar a adesão ao
rastreamento do câncer de mama no Nordeste brasileiro
Evaluation of a strategy adopted to expand adherence to breast cancer screening in Brazilian
Northeast
Macroprolactinemia e hiperprolactinemia intermediária:
manifestações clínicas e achados radiológicos
Macroprolactinemia and intermediate hyperprolactinemia: clinical manifestations and image
Marcos Felipe Silva de-Sá
Rosana Maria Reis
Julio Cesar Rosa-e-Silva
Lucia Alves Silva Lara
Agenda
97
Agenda
Instruções aos Autores
A Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia (Rev Bras Gincecol
as respectivas publicações sobre o tema. Se houver interesse da revista,
será enviado convite para apresentação do texto definitivo. Todos
os autores devem ter publicações em periódicos regulares, indexados
sobre o tema da revisão. O número de autores é limitado a quatro,
dependendo do tipo de texto e da metodologia empregada. Devem ser
descritos os métodos e procedimentos adotados para a obtenção do
texto, que deve ter como base referências recentes, inclusive do ano em
curso. Tratando-se de tema ainda sujeito a controvérsias, a revisão deve
discutir as tendências e as linhas de investigação em curso. Apresentar,
além do texto da revisão, resumo, abstract e conclusões. Ver a seção
“Preparo do manuscrito” para informações quanto ao texto principal,
página de rosto, resumo e abstract;
Obstet., ISSN 0100 7203), publicação mensal de divulgação científica
da Federação das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo),
é dirigida a obstetras, ginecologistas e profissionais de áreas afins, com
o propósito de publicar contribuições originais sobre temas relevantes no
campo da Ginecologia, Obstetrícia e áreas correlatas. É aberta a contribuições nacionais e internacionais. A revista aceita e publica trabalhos em
português, inglês e espanhol.
O material enviado para análise não pode ter sido submetido simultaneamente à publicação em outras revistas nem publicado anteriormente.
Na seleção dos manuscritos para publicação, são avaliadas originalidade,
relevância do tema e qualidade da metodologia utilizada, além da adequação às normas editoriais adotadas pela revista. O material publicado
passa a ser propriedade da Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia
e da Febrasgo, só podendo ser reproduzido, total ou parcialmente, com
a anuência dessas entidades.
5.
Comentários Editoriais, solicitados pelo editor;
6.
Resumos de Teses apresentadas e aprovadas nos últimos 12 meses,
contados da data de envio do resumo. Devem conter, aproximadamente, 300 palavras e, para serem aceitos, devem seguir as normas
da revista quanto à estruturação, à forma e ao conteúdo. Incluir título
em português e inglês e, no mínimo, três palavras ou expressõeschave. Não há revisão do texto dos Resumos de Teses. No arquivo
enviado, informar: nome completo do autor e do orientador; membros
da banca; data de apresentação e a identificação do serviço ou
departamento onde a tese foi desenvolvida e apresentada. Lembramos
que a publicação do resumo não impede a posterior publicação do
trabalho completo em qualquer periódico.
7.
Cartas dos Leitores para o Editor, versando sobre matéria editorial
ou não, mas com apresentação de informações relevantes ao leitor.
As cartas podem ser resumidas pela editoria, mas com manutenção
dos pontos principais. No caso de críticas a trabalhos publicados,
a carta é enviada aos autores para que sua resposta possa ser
publicada simultaneamente.
Os manuscritos submetidos à revista são analisados por pareceristas
e o sigilo sobre a autoria e a identidade dos revisores é garantido durante
todo o processo de edição. Os pareceres dos revisores e as instruções do
editor serão enviados para os autores para que eles tomem conhecimento
das alterações a serem introduzidas. Os autores devem reenviar o texto
com as modificações solicitadas assim que possível, devendo justificar, na
carta de encaminhamento, se for o caso, o motivo do não atendimento de
alguma sugestão para modificação. Não havendo retorno do trabalho
após três meses, presume-se que os autores não têm mais interesse na
publicação. Os autores podem solicitar em qualquer ponto do processo
de análise e edição do texto a sustação do processo e a retirada do
trabalho. Os conceitos e as declarações contidos nos artigos são de
responsabilidade dos autores.
A revista publica contribuições nas seguintes categorias:
1.
Artigos Originais, trabalhos completos prospectivos, experimentais ou
retrospectivos. Manuscritos contendo resultados de pesquisa clínica
ou experimental original têm prioridade para publicação.
2.
Relatos de Casos, de grande interesse e bem documentados, do
ponto de vista clínico e laboratorial. Os autores deverão indicar
na carta de encaminhamento os aspectos novos ou inesperados em
Informações gerais
1.
A revista não aceita material editorial com objetivos comerciais.
2.
Conflito de interesses: devem ser mencionadas as situações que podem
influenciar de forma inadequada o desenvolvimento ou as conclusões do
trabalho. Entre essas situações, menciona-se a participação societária
nas empresas produtoras das drogas ou dos equipamentos citados
ou utilizados no trabalho, assim como em concorrentes da mesma.
São também consideradas fontes de conflito os auxílios recebidos, as
relações de subordinação no trabalho, as consultorias etc.
3.
No texto, deve ser mencionada a submissão e a aprovação do estudo por um Comitê de Ética em Pesquisa reconhecido pelo Comitê
Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP).
4.
Artigo que trate de pesquisa clínica com seres humanos deve incluir
a declaração, na seção Métodos, de que os sujeitos do estudo
assinaram o termo de consentimento livre e informado. Os autores
relação aos casos já publicados. O texto das seções Introdução e
Discussão deve ser baseado em revisão bibliográfica atualizada. O
número de referências pode ser igual ao dos trabalhos completos.
3.
Técnicas e Equipamentos, para apresentação de inovações em diagnóstico, técnicas cirúrgicas e tratamentos, desde que não sejam, clara ou
veladamente, propaganda de drogas ou outros produtos. Valem para essa
categoria todas as normas aplicadas para trabalhos completos.
4.
Artigos de Revisão, incluindo avaliação crítica e sistematizada da literatura,
meta-análises ou revisões sistemáticas. A seleção dos temas e o convite
aos autores têm como base planejamento estabelecido pela editoria.
Contribuições espontâneas podem ser aceitas. Nesse caso, devem ser
enviados inicialmente um resumo ou roteiro do texto, a lista de autores e
v
devem informar, também, que a pesquisa foi conduzida de acordo
com a Declaração de Helsinque revisada em 2008.
5. No caso de trabalhos envolvendo experimentação animal, os
autores devem indicar na seção Métodos que foram seguidas as
normas contidas no CIOMS (Council for International Organization
of Medical Sciences) Ethical Code for Animal Experimentation (WHO
Chronicle 1985; 39(2):51-6) e os preceitos do Colégio Brasileiro
de Experimentação Animal - COBEA (www.cobea.org.br).
6. Todos os ensaios controlados aleatórios (randomized controlled
trials) e clínicos (clinical trials) submetidos à publicação devem ter
o registro em uma base de dados de ensaios clínicos. Essa é uma
orientação da Plataforma Internacional para Registros de Ensaios
Clínicos (ICTRP) da Organização Mundial da Saúde (OMS), e
do International Committee of Medical Journal Editors (ICMJE). As
instruções para o registro estão disponíveis no endereço eletrônico
do ICMJE (http://www.icmje.org/clin_trialup.htm) e o registro pode
ser feito na base de dados de ensaios clínicos da National Library
of Medicine, disponível em http://clinicaltrials.gov/ct/gui.
Preparo dos manuscritos
As normas que seguem foram baseadas no formato proposto pelo ICMJE
e publicado no artigo “Uniform Requirements for Manuscripts Submitted to
Biomedical Journals”, atualizado em Outubro de 2008 e disponível no
endereço eletrônico: http://www.icmje.org/.
Apresentação do texto
1.
Os trabalhos devem ser digitados em espaço 2 em todas as seções, da
página de rosto às referências bibliográficas, tabelas e legendas. Cada
página deve conter aproximadamente 25 linhas em uma coluna. Usar
preferencialmente o processador de texto Microsoft Word® e a fonte Times
New Roman 12. Não dar destaque a trechos do texto: não sublinhar ou
usar negrito. Numerar todas as páginas, iniciando pela de rosto.
Não usar maiúsculas nos nomes próprios (a não ser a primeira letra)
no texto ou nas referências bibliográficas. Não utilizar pontos nas
siglas (DPP em vez de D.P.P.). Quando usar siglas ou abreviaturas,
descrevê-las por extenso na primeira vez que mencionadas no texto.
Iniciar cada seção em uma nova página: página de rosto; resumo e
palavras ou expressões-chave; abstract e keywords; texto; agradecimentos; referências; tabelas individuais e legendas das figuras.
7.
O número de autores de trabalhos completos e relatos de casos é limitado a sete. Trabalhos de autoria coletiva (institucionais) devem ter os
responsáveis especificados. Trabalhos e estudos multicêntricos podem
ter número de autores compatível com o número de centros (cada situação será avaliada pela editoria e pelos revisores). Os investigadores
responsáveis pelos protocolos aplicados devem ser especificados. Todos
os autores devem ter conhecimento do texto enviado para a revista.
2.
8.
O conceito de coautoria é baseado na contribuição de cada um, para
a concepção e planejamento do trabalho, análise e interpretação
dos dados, para a redação ou revisão crítica do texto. A inclusão
de nomes cuja contribuição não se enquadre nos critérios citados ou
que tenham fornecido apenas suporte material não é justificável.
Página de rosto
9.
Os autores serão informados, por correspondência eletrônica, do
recebimento dos trabalhos. Os trabalhos que estiverem de acordo
com as Instruções aos Autores e se enquadram na política editorial
da revista serão enviados para análise por revisores indicados pelo
editor. Os originais em desacordo com os objetivos da revista ou
com essas instruções são devolvidos aos autores para as adaptações
necessárias antes da avaliação pelo Conselho Editorial ou recusados
sem análise por revisores.
10. Junto dos arquivos originais, deve ser enviada uma carta de encaminhamento, na qual deve ficar explícita a concordância com as
normas editoriais, com o processo de revisão e com a transferência
de copyright para a revista.
11. Para manuscritos originais, não ultrapassar 25 páginas de texto
digitado ou aproximadamente 30.000 caracteres. Limitar o número
de tabelas e figuras ao necessário para apresentação dos resultados
que são discutidos (como norma geral, limitar a cinco). Para manuscritos do tipo Relato de Caso, não ultrapassar 15 páginas de texto
ou 18.000 caracteres (ver “Preparo do manuscrito”, “Resultados”).
12. O trabalho deve ser enviado pelo sistema de submissão online no portal
SciELO. O endereço eletrônico de todos os autores deve ser fornecido.
Desta forma, os coautores receberão informação sobre a submissão do
vi
trabalho e, assim, não será necessária a assinatura de todos na carta
de encaminhamento. O endereço eletrônico para correspondência com
a revista é [email protected]. O arquivo correspondente ao trabalho
deve ser único e deve conter texto, referências, tabelas e figuras.
Apresentar o título do trabalho em português e em inglês; nomes
completos dos autores sem abreviaturas; endereços eletrônicos válidos de
todos os autores (opcional, em substituição à carta de encaminhamento);
nome da instituição onde o trabalho foi desenvolvido; afiliação institucional
dos autores; informações sobre auxílios recebidos sob forma de bolsas de
estudos, financiamento, fornecimento de drogas, reagentes ou equipamentos. Obrigatoriamente deve ser fornecido o endereço da instituição onde o
trabalho foi desenvolvido, o qual é publicado na página inicial do trabalho.
Devem ser indicados nome, endereço, telefone/fax e e-mail do autor para
o qual a correspondência deve ser enviada. Essas informações pessoais
são empregadas apenas para correspondência com a revista e somente
são publicadas se houver pedido do(s) autor(es).
Resumo
O resumo do trabalho deve aparecer na segunda página. Para trabalhos completos, redigir um resumo estruturado, que deve ser dividido em
seções identificadas: objetivo, métodos, resultados e conclusões. Deve ter
aproximadamente 300 palavras. O resumo deve conter as informações
relevantes, permitindo que o leitor tenha uma ideia geral do trabalho. Deve
incluir descrição resumida de todos os métodos empregados e da análise
estatística efetuada. Expor os resultados numéricos mais relevantes, e não
apenas indicação de significância estatística. As conclusões devem ser
baseadas nos resultados do trabalho e não da literatura. Evitar o uso de
abreviações e símbolos. Não citar referências bibliográficas no resumo.
Abaixo do texto do resumo indicar o número de registro e/ou identificação para os ensaios controlados aleatórios e ensaios clínicos (ver item
5 das “Informações Gerais”).
Na mesma página do resumo, citar pelo menos três palavras ou
expressões-chave que serão empregadas para compor o índice anual da
revista. Devem ser baseadas nos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS)
publicado pela Bireme, que é uma tradução do Medical Subject Headings
(MeSH) da National Library of Medicine e está disponível no endereço
eletrônico: http://decs.bvs.br.
O abstract deve ser versão fiel do texto do resumo estruturado (purpose,
methods, results e conclusions). Deve ser também acompanhado da versão
para o inglês das palavras ou expressões-chave (keywords). O resumo e o
abstract dos Relatos de Casos e dos Artigos de Revisão e de Atualização
não devem ser estruturados e são limitados a 150 palavras.
Introdução
Repetir, na primeira página da introdução, o título completo em português
e inglês. Nessa seção, mostre a situação atual dos conhecimentos sobre o
tópico em estudo, divergências e lacunas que possam eventualmente justificar o desenvolvimento do trabalho, mas sem revisão extensa da literatura.
Para Relatos de Casos, apresentar um resumo dos casos já publicados,
epidemiologia da condição relatada e uma justificativa para a apresentação
como caso isolado. Expor claramente os objetivos do trabalho.
Métodos
Iniciar essa seção indicando o planejamento do trabalho: se prospectivo
ou retrospectivo; ensaio clínico ou experimental; se a distribuição dos casos
foi aleatória ou não etc. Descrever os critérios para seleção das pacientes
ou Grupo Experimental, inclusive dos Controles. Identificar os equipamentos
e reagentes empregados (fabricante, cidade e país). Se a metodologia
aplicada já tiver sido empregada, indicar as referências, além da descrição
resumida do método. Descrever também os métodos estatísticos empregados
e as comparações para as quais cada teste foi empregado.
Os trabalhos que apresentam como objetivo a avaliação da eficácia
ou a tolerabilidade de tratamentos ou drogas devem, necessariamente,
incluir Grupo Controle adequado. Para informações adicionais sobre o
desenho de trabalhos desse tipo, consultar ICH Harmonized Tripartite
Guideline - Choice of Control Group and Related Issues in Clinical Trials
(http://www.hc-sc.gc.ca/hpfb-dgpsa/tpd-dpt/e10_e.html). Ver também
itens 4 e 5 das “Informações Gerais”.
Resultados
Apresentar os resultados em sequência lógica, no texto, nas tabelas
e nas figuras. Expor os resultados relevantes para o objetivo do trabalho
e que são discutidos. Não repetir no texto dessa seção todos os dados
das tabelas e figuras, mas descrever e enfatizar os mais importantes, sem
interpretação dos mesmos (ver também “Tabelas”). Nos Relatos de Casos,
as seções “Métodos” e “Resultados” são substituídas pela “Descrição do
caso”, mantendo-se as demais.
Discussão
Devem ser realçadas as informações novas e originais obtidas na
investigação. Não repetir dados e informações já mencionados nas seções
“Introdução” e “Resultados”. Evitar citação de tabelas e figuras. Ressaltar
a adequação dos métodos empregados na investigação. Comparar e
relacionar suas observações com as de outros autores, comentando e explicando as diferenças. Explicar as implicações dos achados, suas limitações
e fazer as recomendações decorrentes. Para Relatos de Casos, basear a
discussão em ampla e atualizada revisão da literatura. As informações
sobre os casos já publicados podem ser tabuladas e exibidas nessa seção
para comparações.
Agradecimentos
Dirigidos a pessoas que tenham colaborado intelectualmente, mas
cuja contribuição não justifica coautoria, ou para aquelas que tenham
provido apoio material.
Referências
Todos os autores e trabalhos citados no texto devem constar dessa
seção e vice-versa. Numerar as referências bibliográficas por ordem de
entrada no trabalho e usar esses números para as citações no texto. Evitar
número excessivo de referências, selecionando as mais relevantes para
cada afirmação e dando preferência para os trabalhos mais recentes.
Não empregar citações de difícil acesso, como resumos de trabalhos
apresentados em congressos, teses ou publicações de circulação restrita
(não indexados). Não empregar referências do tipo “observações não
publicadas” e “comunicação pessoal”. Artigos aceitos para publicação
podem ser citados acompanhados da expressão: “aceito e aguardando
publicação” ou “in press”, indicando-se periódico, volume e ano. Trabalhos
aceitos por periódicos que estejam disponíveis online, mas sem indicação
de fascículos e páginas, devem ser citados como “ahead of print”.
Outras publicações dos autores (autocitação) devem ser empregadas
apenas se houver necessidade clara e forem relacionadas ao tema. Nesse
caso, incluir entre as referências bibliográficas apenas trabalhos originais
publicados em periódicos regulares (não citar capítulos ou revisões).
O número de referências bibliográficas deve ser aproximadamente
35. Os autores são responsáveis pela exatidão dos dados constantes das
referências bibliográficas.
Para todas as referências, citar os autores até o sexto. Se houver
mais de seis autores, citar os seis primeiros, seguidos da expressão et al.,
conforme os seguintes modelos:
Formato impresso
• Artigos em revistas
- Ceccarelli F, Barberi S, Pontesilli A, Zancla S, Ranieri E. Ovarian
carcinoma presenting with axillary lymph node metastasis: a case
report. Eur J Gynaecol Oncol. 2011;32(2):237-9.
- Jiang Y, Brassard P, Severini A, Goleski V, Santos M, Leamon A, et al.
Type-specific prevalence of Human Papillomavirus infection among
women in the Northwest Territories, Canada. J Infect Public Health.
2011;4(5-6):219-27.
• Artigos com título em inglês e texto em português ou outra língua
Utilizar o titulo em inglês, entre colchetes e no final da referência,
indicar a língua na qual o artigo foi publicado.
- Prado DS, Santos DL. [Contraception in users of the public and private
sectors of health]. Rev Bras Ginecol Obstet. 2011;33(7)143-9.
Portuguese.
- Taketani Y, Mizuno M. [Application of anti-progesterone agents for
contraception]. Rinsho Fujinka Sanka. 1988;42(11):997-1000.
Japanese.
• Livro
- Baggish MS, Karram MM. Atlas of pelvic anatomy and gynecologic
surgery. 2nd ed. Philadelphia: WB Saunders; 2006.
vii
• Capítulos de livro
- Picciano MF. Pregnancy and lactation. In: Ziegler EE, Filer LJ, editors.
Present knowledge in nutrition. Washington (DC): ILSI Press; 1996.
p. 384-95.
Formato eletrônico
Apenas para informações estatísticas oficiais e citação de referências de periódicos não impressos. Para estatísticas oficiais, indicar
a entidade responsável, o endereço eletrônico, o nome do arquivo
ou entrada. Incluir o número de tela, data e hora do acesso. Termos
como “serial”, “periódico”, “homepage” e “monography”, por
exemplo, não são mais utilizados. Todos os documentos devem ser
indicados apenas como [Internet]. Para documentos eletrônicos com o
identificador DOI (Digital Object Identifier), este deve ser mencionado
no final da referência, além das informações que seguem:
- Brasil. Ministério da Saúde. DATASUS [Internet]. Informações de
Saúde. Estatísticas vitais. Mortalidade e nascidos vivos: nascidos
vivos desde 1994. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2008. [citado
2007 Fev 7]. Disponível em: <http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/
deftohtm.exe?sinasc/cnv/nvuf.def >
Legendas
Digitar as legendas usando espaço duplo, acompanhando as respectivas figuras (gráficos, fotografias e ilustrações). Cada legenda deve ser
numerada em algarismos arábicos, correspondendo a cada figura, e na
ordem em que foram citadas no trabalho.
Abreviaturas e siglas
Devem ser precedidas do nome completo quando citadas pela primeira
vez no texto. Nas legendas das tabelas e figuras, devem ser acompanhadas
de seu nome por extenso. As abreviaturas e as siglas não devem ser usadas
no título dos artigos e nem no resumo.
Empregar o seguinte endereço para correspondências não previstas nas
instruções:
Jurandyr Moreira de Andrade
Editor
Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia – Editoria – Avenida
Bandeirantes, 3.900, 8º andar – Campus Universitário – CEP 14049-900 –
Ribeirão Preto (SP) – Fone: (16) 3602-2803 – Fax: (16) 3633-0946 –
E-mail: [email protected].
• Monografia na Internet ou livro eletrônico
- Foley KM, Gelband H, editors. Improving palliative care for cancer [Internet]. Washington: National Academy Press; 2001 [cited 2002 Jul 9].
Available from: http://www.nap.edu/books/0309074029/html/.
Tabelas
Apresentar as tabelas em páginas separadas, com espaço duplo e
preferencialmente fonte Arial 8. A numeração deve ser sequencial, em
algarismos arábicos, na ordem em que foram citadas no texto. Todas as
tabelas devem ter título e todas as colunas da tabela devem ser identificadas
com um cabeçalho. A legenda deve conter informações que permitam ao
leitor entender o conteúdo das tabelas e figuras, mesmo sem a leitura do
texto do trabalho. As linhas horizontais devem ser simples e limitadas a
duas no topo e uma no final da tabela. Não empregar linhas verticais.
Não usar funções de criação de tabelas, comandos de justificação, tabulações decimais ou centralizadas. Utilizar comandos de tabulação (tab)
e não o espaçador para separar as colunas e, para nova linha, a tecla
enter. No rodapé da tabela, deve constar legenda para abreviaturas e
testes estatísticos utilizados.
Figuras (gráficos, fotografias e ilustrações)
As figuras devem ser apresentadas em páginas separadas e numeradas
sequencialmente, em algarismos arábicos, conforme a ordem de aparecimento
no texto. Todas as figuras devem ter qualidade gráfica adequada e apresentar
título e legenda. Para evitar problemas que comprometam o padrão da revista,
o processo de digitalização de imagens (scan) deve obedecer aos seguintes
parâmetros: para gráficos ou esquemas, usar 300 dpi/bitmap para traço;
para ilustrações e fotos (preto e branco), usar 300 dpi/RGB ou grayscale. Em
todos os casos, os arquivos devem ter extensão .tif e/ou .jpg. Também são
aceitos arquivos com extensão .xls (Excel), .eps, .psd para ilustrações em curva
(gráficos, desenhos e esquemas). São aceitas, no máximo, cinco figuras. Se as
figuras já tiverem sido publicadas, devem vir acompanhadas de autorização
por escrito do autor/editor e constando a fonte na legenda da ilustração.
viii
Itens para a conferência para a submissão do manuscrito
Antes de enviar o manuscrito, conferir se as Instruções aos Autores foram
seguidas e verificar o atendimento dos itens listados a seguir:
1.
carta de encaminhamento assinada por todos os autores (escaneada
e anexada como documento suplementar ou enviada pelo correio)
ou informação dos endereços eletrônicos válidos de todos os autores
na página de rosto;
2.
citação da aprovação do projeto do trabalho por Comissão de
Ética em Pesquisa, assinatura do termo de consentimento livre e
informado (na seção “Métodos”) e informação sobre o atendimento
das exigências para pesquisa em animais;
3.
número ou código do registro do estudo, se necessário, na página
de rosto (item 5 das “Informações Gerais”);
4.
conflito de interesses: informar se há ou não. Se houver, explicar sem
omissão de informações relevantes;
5.
página de rosto com todas as informações solicitadas;
6.
resumo e abstract estruturados e compatíveis com o texto do trabalho;
7.
três ou mais palavras-chave relacionadas ao texto e respectivas
keywords baseadas no Decs;
8.
verificar se todas as tabelas e figuras estão corretamente citadas no
texto e numeradas, e se as legendas permitem o entendimento das
mesmas;
9.
referências bibliográficas: numeradas na ordem de aparecimento e
corretamente digitadas. Verificar se todos os trabalhos citados estão
na lista de referências e se todos os listados estão citados no texto.
Geraldo Duarte1
Sífilis e gravidez...e a história continua!
Syphilis and pregnancy...the story continues!
Editorial
Um exemplo clássico de doença sexualmente transmissível (DST), a sífilis ainda representa expressivo desafio aos serviços de saúde pública em todo o mundo. Frente aos avanços
da Medicina contemporânea, parece anacrônico o fato de uma doença, que apresenta agente
etiológico bem definido, formas conhecidas de transmissão, longo período de incubação e
tratamentos que possibilitam excelentes índices de cura, continuar registrando novos casos
e escapando das medidas que visam o seu controle. Nesse mesmo diapasão de anacronismo,
assistimos perplexos aos desdobramentos da infecção pelo Treponema pallidum entre mulheres
na idade reprodutiva, prejudicando objetivamente tanto o prognóstico gestacional quanto o
prognóstico perinatal, visto que, além da sífilis congênita, observa-se elevação das taxas de
abortamento tardio, restrição de crescimento intraútero, prematuridade e – o pior de seus
prognósticos perinatais – a morte fetal1.
Considerando especificamente a morte fetal decorrente da infecção luética sob a perspectiva do conhecimento científico atual, conclui-se que, hodiernamente, sua ocorrência
na sociedade é simplesmente ilógica. Adjetivo tão contundente decorre da carência total de
razoabilidade para a não-aplicação dos ordenamentos protocolares, os quais, se cumpridos,
permitiriam evitar evento tão nefasto2-4.
Avaliações pontuais da ocorrência de sífilis congênita e da morte fetal por sífilis confirmam
que, nas últimas décadas, não houve nenhum avanço real no controle de tal complicação no
Brasil, desnudando a completa assimetria entre a elaboração e a divulgação de orientações
específicas para seu controle, e a efetivação das estratégias preconizadas nestes documentos5-7.
Continuamos pensionistas das mesmas falhas verificadas há quase meio século, traduzidas
e repetidas como inadimplência da assistência pré-natal, alargando-se a distância entre o
que a oficialidade preconiza e a capilarização destas orientações até a periferia do sistema de
saúde. Neste fascículo, a contribuição de Nascimento et al.8 confirma essas afirmações, visto
que, dos 48 casos de morte fetal estudados no Hospital Geral de Nova Iguaçu (Estado do
Rio de Janeiro), 54,2% dos casos tiveram algum tipo de assistência pré-natal, mas 33,3%
não tiveram nem acesso a este recurso. Estes dois percentuais traduzem a iniquidade a que
estas gestantes foram expostas: o primeiro traduz baixa qualidade do pré-natal e o segundo
indica que um terço dessas mulheres não teve acesso a um recurso básico, o pré-natal.
Correspondência
Geraldo Duarte
Departamento de Ginecologia e Obstetrícia
Avenida Bandeirantes 3.900
CEP: 14049-900
Ribeirão Preto (SP), Brasil
Recebido
28/12/2011
Aceito com modificações
18/01/2012
Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo – USP –
Ribeirão Preto (SP), Brasil.
1
Duarte G
Vários são os fatores sociais, econômicos e culturais que influenciam as taxas epidêmicas estacionárias da sífilis nos
últimos anos. Porém, seguramente, o fato de ser uma doença de sinais, que raramente leva ao prejuízo da força de trabalho, contribui objetivamente para que seja marginalizada pelos programas prioritários dos órgãos responsáveis pela saúde
pública, notadamente em países não-industrializados. No Brasil, por exemplo, a despeito de ser claramente indicada sua
pesquisa durante o pré-natal, não há disciplina para cobrar sua execução, observando-se frequentemente o não-cumprimento
dessa medida até por profissionais da rede oficial de saúde no país9. Outro fator que poderia determinar o sucesso dessas
ações seria a inclusão do parceiro na assistência pré-natal, solicitando o teste de triagem da infecção luética também para
ele (Venereal Disease Research Laboratory – VDRL)10. Citando novamente a colaboração de Nascimento et al.8, na maioria
dos casos de morte fetal por sífilis, as reações séricas indicavam doença recente, com probabilidade de infecção na atual
gravidez e a inclusão do parceiro no pré-natal poderia, potencialmente, ter evitado estas perdas.
Apesar da ampla disponibilidade dos testes subsidiários, que se prestam à identificação da sífilis, da existência de
melhor controle epidemiológico na atualidade e seu agente etiológico permanecer sensível à penicilina, a morte fetal
pelo Treponema pallidum recrudesceu em alguns lugares nos últimos anos11, numa relação direta da frequência da sífilis
entre as mulheres na idade reprodutiva.
Outra falha detectada na avaliação de Nascimento et al.8 foi a não-observância à orientação de realizar pelo
menos dois exames VDRL durante a gravidez e um no momento do parto. A mesma análise indicou que nenhum
dos casos teve seu exame repetido durante o pré-natal. Outro detalhe a ser evidenciado é a não-valorização de títulos
baixos de VDRL como indicativos de sífilis em atividade. Apesar de títulos elevados indicarem maior probabilidade
de doença ativa, durante a gravidez qualquer titulação deve ser valorizada , por ser muito difícil avaliar se o título de
anticorpos está em ascensão ou em descenso, – mesmo sem tratamento, alguns casos exibem queda espontânea dos
títulos do VRDL –, ou mesmo se houve tratamento de outra infecção (trato urinário, dentário, entre outras). Nesse
caso, ter-se-ia um título residual. A situação que pode ser resolvida com mais facilidade é representada pela reação
cruzada do VDRL, cuja dúvida pode ser aclarada utilizando uma reação específica para lues (entre outras o FTAAbs, ELISA e a hemaglutinação).
As falhas na assistência pré-natal, não cumprindo o protocolo do Ministério da Saúde do Brasil, fizeram com que os
programas federais e estaduais de controle das DST priorizassem a sífilis, criando programas específicos que visaram erradicar tanto a sífilis congênita quanto a morte fetal por este micro-organismo, todos com fracasso em seu epílogo1. Uma
das mais recentes iniciativas ocorreu com a criação da Rede Cegonha, iniciativa que prioriza o diagnóstico mais agilizado
(teste rápido). No entanto, aproximadamente um ano após o lançamento desse programa ainda não se conseguiu criar um
fluxo de confirmação diagnóstica da sífilis em gestantes. Resumindo, sabe-se que, sem disciplina e cobrança da efetividade
programática, nenhuma doença, cujo controle envolve adequações de comportamento pode ser erradicada.
Aliado aos problemas institucionais descritos, o comportamento sexual dos usuários de drogas ilícitas psicoativas
assume peso específico elevado na disseminação do Treponema pallidum12. Fácil aferir que, durante o efeito dessas drogas,
o discernimento de risco está rebaixado pelo estado de euforia, consequentemente, permitindo maior exposição a situações de práticas sexuais de risco e às doenças dela derivadas, dentre elas a sífilis. Outra importante interface do uso de
drogas ilícitas com a sífilis é a utilização do sexo como moeda para aquisição da droga, fato que, para alguns autores,
responde parcialmente pela recrudescência e perpetuação da sífilis congênita e da morte fetal por sífilis.
Sabe-se que a morte fetal por sífilis carreia em seu contexto o reflexo discriminador da falta de qualidade assistencial em saúde. Elevadas taxas dessa complicação ou da sífilis congênita são consideradas marcadores epidemiológicos
seguros da falência da saúde em determinada área13. Infelizmente, de forma geral, a precariedade destes indicadores
alia-se à pobreza, mas isso não significa que seja exclusividade de comunidades desfavorecidas economicamente, ocorrendo também em países desenvolvidos, com frequência inferior.
Segundo as propostas do Serviço de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde (SVS/PN/DST/AIDS)4, uma das
principais metas para controle da sífilis congênita é reduzir sua frequência de 3,9 para 1,8‰ até o final de 2011.
Concluindo, fica a certeza de que o rastreamento da sífilis durante a gravidez e o tratamento específico são as únicas
formas de evitar eficazmente a morte fetal. Sob todos os aspectos, incluindo o custo-benefício, a implantação dessa medida representa benefícios claros e indiscutíveis1. No Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto
da Universidade de São Paulo (HC-FMRPUSP), a avaliação trimestral do VDRL e no momento do parto é medida de
rotina, intervenções simples que conseguem evitar tanto a morte fetal como a sífilis congênita. Esta conduta tem como
fundamento as trajetórias de gestantes com morte fetal por sífilis atendidas em tal hospital, confirmando-se a possibilidade
da gestante infectar-se durante a gravidez14. Com disciplina no cumprimento dos protocolos vigentes para esta finalidade,
isto é perfeitamente viável. Portanto, sem a consciência gestora do valor do pré-natal não se investe na disciplina e nem
na exigência firme do cumprimento das ações saneadoras deste vergonhoso insucesso em saúde, a morte fetal por sífilis.
50
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):49-51
Sífilis e gravidez...e a história continua!
Referências
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São Paulo. Secretaria de Estado da Saúde. Coordenadoria de Controle de Doenças. Centro de Referência e Treinamento DST/AIDS.
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mulher e à criança. Cad Saúde Pública. 2005;21(4):1244-50.
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Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):49-51
51
Eliana Amaral1
Sífilis na gravidez e óbito fetal: de volta para
o futuro
Syphilis during pregnancy and fetal death: back to the future
Editorial
Tantas oportunidades perdidas...
Tem sido relatado, no Brasil e no exterior, o aumento da incidência de sífilis congênita
e suas consequências graves, como a natimortalidade. Sua ocorrência evidencia falhas na
assistência pré-natal relacionadas ao controle de uma infecção, cujo protocolo clínico é
bem conhecido, com triagem sorológica e tratamento de baixo custo. Isso contrasta com
a redução da transmissão vertical do HIV já demonstrada no Brasil, apesar de protocolos
clínicos complexos e de custo elevado. Dificuldades de acesso a exames laboratoriais e tratamento contribuem para a dificuldade no controle da doença e, assim, para a interpretação
das sorologias. No estudo de Nascimento et al.1, foram descritos 48 casos de gestantes
com sorologia reagente para sífilis (VDRL) e óbito fetal. Atendidos no Hospital de Nova
Iguaçu, no Rio de Janeiro, entre 2005 e 2008, estes casos corresponderam a 11,7% dos
óbitos fetais, que é uma porcentagem considerável. Apesar da idade gestacional média
avançada (29 semanas) e 26 (54,2%) pacientes terem sido acompanhadas no pré-natal,
somente 12 tinham sorologia realizada anteriormente, incluindo quatro com resultado
não-reagente. A sorologia não foi repetida durante o acompanhamento antes do parto. A
evolução para óbito fetal sugere que não foi realizado tratamento nos oito casos detectados
como sífilis materna no pré-natal ou o tratamento foi realizado tardiamente ou de forma
inadequada (dado não-informado).
Dados muito parecidos foram relatados recentemente por Casal et al.2, no Pará. De fato, as
falhas de cumprimento do protocolo recomendado têm impedido o controle da sífilis congênita,
apesar de ter um protocolo bem estabelecido e de baixo custo3. Como consequência, de 1998 a
2007, houve aumento acentuado da taxa de incidência dos casos de sífilis congênita nas Regiões
Norte e Nordeste, menos expressivo nas Regiões Sul e Centro-Oeste, com certa estabilização na
Sudeste4. Ao mesmo tempo, comemora-se o sucesso do programa de controle da transmissão
vertical do HIV, com redução acentuada da transmissão vertical em consequência de adesão a
um protocolo muito mais complexo e custoso5,6.
A insatisfação com a negligência quanto aos efeitos da sífilis na gestante tem ressurgido
também na literatura internacional7. Estimou-se, na Tanzânia, que 51% dos natimortos e
24% dos partos prematuros entre mulheres não-submetidas à triagem e não-tratadas foram
atribuídos à sífilis materna8. Esses achados no Brasil e no exterior contrastam com resultados
Correspondência
Eliana Amaral
Divisão de Obstetrícia do Centro de Atenção Integral à Saúde da
Mulher da Universidade Estadual de Campinas
Rua Alexander Fleming, 101 – Cidade Universitária
CEP: 13083-970
Campinas (SP), Brasil
Recebido
03/01/2012
Aceito com modificações
16/01/2012
Departamento de Tocoginecologia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP –
Campinas (SP), Brasil.
Conflito de interesses: não há.
1
Sífilis na gravidez e óbito fetal: de volta para o futuro
das revisões sistemáticas recentes, confirmando que a triagem materna e o tratamento podem reduzir a incidência de
morte perinatal e natimorto por sífilis em cerca de 50 a 80%9-12.
No Brasil, há muitos anos e em diferentes regiões, denuncia-se a pouca qualificação do pré-natal para a prevenção
da sífilis congênita, observando-se a não-realização da sorologia de triagem, tratamento não-realizado ou realizado
inadequadamente quando indicado e ausência de tratamento do parceiro13,14. São evidências de que há muitas oportunidades perdidas de prevenção. O estudo de Nascimento et al.1 demonstra, mais uma vez, a pouca qualificação da
atenção oferecida à gestante e ao seu concepto para controle da infecção e redução da natimortalidade. Tal fato ajuda a
relembrar a responsabilidade dos médicos como defensores do melhor cuidado clínico, uma ação compartilhada com
outros profissionais da saúde e com o sistema de atenção à saúde.
Por que seria tão difícil transpor a experiência de sucesso com o controle do HIV para o controle da sífilis congênita, se as intervenções diagnósticas e terapêuticas parecem tão banais e pouco custosas? Como virar este jogo?
Talvez a resposta esteja exatamente na falta de glamour da sífilis congênita, que não tem atraído a mídia, nem exigido
preocupação com atualização pelos profissionais, visto que é uma doença estigmatizada e, aparentemente, sem grandes
demandas tecnológicas para diagnóstico ou terapia de custo elevada. Se cada caso de sífilis congênita pode significar
uma cadeia de negligência que envolve os profissionais, as instituições e o sistema de saúde que o atende, é o momento
de observar as novidades, relembrar as responsabilidades e atualizar os conhecimentos.
O que há de novo no diagnóstico e tratamento?
Não há novidade acerca do tratamento de sífilis na gestação. Apenas penicilina é a droga recomendada, com elevada
passagem placentária e alta eficácia, sendo eficaz na redução à morbimortalidade perinatal10. Houve alguma sugestão
na literatura sobre o uso de drogas alternativas, como azitromicina, mas posteriormente se confirmou que há falhas
terapêuticas e resistência do Treponema pallidum a tal antibiótico15. Continuam válidas as recomendações dos manuais
publicados pelo Ministério da Saúde, com uso de penicilina benzatina em doses dependentes da fase da sífilis, orientada
por resultado de triagem sorológica no primeiro e no terceiro trimestres e no parto, ou sempre que houver aborto ou
natimorto3. A dificuldade de administrar a penicilina na unidade básica, por receio da rara reação anafilática, é outro
componente que contribui para a conduta inadequada.
Além das possíveis dificuldades de acesso a tratamento e exames laboratoriais ou demora no retorno dos resultados durante o pré-natal, sua interpretação para o correto diagnóstico e adequada conduta constituem-se numa
competência especial para o profissional que dá atenção pré-natal. No Brasil, utilizou-se até o momento o teste
não-treponêmico de floculação do tipo VDRL para triagem. A confirmação laboratorial, com teste treponêmico por
aglutinação de partículas (TPHA) ou teste fluorescente por absorção de anticorpos (FTA-Abs), tem sido recomendada, mas não é obrigatória e sua ausência não deve retardar a conduta. O resultado reativo do VDRL, a qualquer
título, se não há história de infecção previamente tratada, deve ser interpretado como sífilis materna, indicando-se
o tratamento da gestante. Se houve tratamento prévio, pode ser encontrada cicatriz sorológica com títulos baixos,
menores que <1/8. Na presença de teste treponêmico, sua positividade pode significar sífilis prévia (cicatriz) ou
atual e a interpretação dependerá do VDRL e da história de tratamento. Se VDRL reagente e teste treponêmico
não-reagente, trata-se de falso-positivo3.
Dados da década de 1990 mostram que pode haver até 30% de VDRL falso-positivo após confirmação por teste
treponêmico8. Se houver prevalência de VDRL reagente de 1,4% no Brasil3, está se falando que a verdadeira prevalência
poderia ser 0,98%. A diferença na grandeza da prevalência destes 30% de falso-positivo é bastante aceitável. Porém,
para o cuidado que se deve oferecer a partir do diagnóstico de sífilis materna (tratamento do parceiro, da gestante e
do recém-nascido, pesquisa de outras infecções de transmissão sexual e seguimento posterior para estabelecer cura), a
associação do VDRL não-treponêmico com um teste treponêmico seria a conduta mais indicada. A interpretação isolada
de teste não-treponêmico (VDRL ou RPR) positivo exige um bom conhecimento e cautela ao orientar a gestante. Se
os testes de TPHA ou FTA-Abs são realizados e resultam negativos, confirmando-se que se trata de um falso-positivo
do VDRL, os cuidados devem ser dirigidos para descobrir a origem dos anticorpos anticardiolipina. Nestes casos, a
procura de lúpus e/ou síndrome antifosfolípidica se impõe7.
A novidade fica por conta da introdução de testes sorológicos imunoenzimáticos, em substituição ao VDRL, para
automatizar a triagem laboratorial, substituindo o processo manual da realização do VDRL ou RPR. No entanto, esses
são testes treponêmicos, o que significa que, uma vez positivos (sífilis prévia), sempre serão positivos. Nestes casos, o
uso do VDRL em paralelo ou em sequência, sendo também positivo, define que a infecção é recente (especialmente
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):52-5
53
Amaral E
se títulos ≥1/8) e permite controle de cura acompanhando a redução de títulos após o tratamento. Embora os testes
imunoenzimáticos exijam também laboratório e sejam de custo similar, são menos trabalhosos e atualmente recomendados em substituição ao VDRL ou RPR, especialmente em regiões de baixa prevalência de sífilis, nas quais haverá
menos tratamento prévio de sífilis7.
Outro aspecto atual no diagnóstico é a utilização de testes rápidos por tiras de imunocromatografia, que se realiza
no consultório com sangue total ou gota obtida da ponta de dedo, sem necessidade de qualquer equipamento. A grande
vantagem destes métodos é a possibilidade de acesso ao diagnóstico em até 20 minutos e imediato tratamento em lugares
sem recursos laboratoriais. As desvantagens incluem custo, garantia de provisão e boas condições de armazenamento
e treinamento dos profissionais que vão realizar o teste. No entanto, é, também, um teste treponêmico, como os imunoenzimáticos e TPHA, permanecendo definitivamente positivo após sífilis prévia, mesmo se tratada adequadamente.
Tucker et al.16 encontraram sensibilidade e especificidade similares às de testes não-treponêmicos. Testado no Brasil,
em lugar de difícil acesso na Amazônia, o teste rápido identificou 62,5% (10/16) dos casos de sífilis, dois terços dos
casos de sífilis ativa (4/6) e todos os casos com títulos altos (VDRL>1:8), com valor preditivo negativo de 99,1%. Os
autores sugeriram que a baixa sensibilidade pode ter sido decorrente das condições de temperatura e umidade locais,
e também pelo treinamento dos profissionais17. Numa revisão sistemática sobre testes imunocromatográficos rápidos
para sífilis, demonstrou-se que, em clínicas de pré-natal, os testes têm sensibilidade mediana de 86%, especificidade de
99% e que o valor preditivo positivo é maior que 80% (20% de falso-positivo), se a prevalência for maior que 0,3%,
o que demonstrou bom desempenho16.
A introdução do teste rápido no arsenal diagnóstico para melhorar a cobertura de triagem para sífilis na gravidez,
permitindo tratamento imediato, é uma sugestão na literatura internacional e já tem sido discutida para ser adotada
em território nacional, à semelhança do que se faz com o teste rápido de HIV. Compõe a proposta de qualificação
da atenção pré-natal dentro do projeto Rede Cegonha, do Ministério da Saúde18. A portaria do Ministério da Saúde,
de 30 de dezembro de 2011, estabelece a possibilidade da utilização de teste rápido para diagnóstico de sífilis na
gestante e no parceiro, por profissionais capacitados, nas unidades de saúde, na etapa I do diagnóstico de sífilis19.
O teste rápido seria utilizado quando a gestante comparece para consulta pré-natal tardiamente ou quando não há
acesso ao laboratório para realização do teste não-treponêmico (VDRL). Nestas situações, seria realizado o teste
rápido e dada a conduta imediatamente, com aplicação da primeira dose de penicilina, se a amostra for reagente.
Se for possível, deve ser realizada a coleta de sangue por punção venosa para a etapa II do diagnóstico sorológico
com teste não-treponêmico.
A citada portaria redefine o diagnóstico laboratorial da sífilis, recomendando, como no diagnóstico de infecção
pelo HIV, a utilização de duas etapas (I e II). Recomendam-se dois testes concomitantes, sendo um treponêmico e
outro não-treponêmico, sem preferência de qual seria a etapa I ou II. Tanto os testes imunoenzimáticos quanto o rápido poderiam ser utilizados como teste treponêmico, além dos consagrados FTA-Abs e TPHA19. A translação desta
nova portaria para a rotina pré-natal, incluindo treinamento das equipes, será um desafio razoável a ser enfrentado por
razões operacionais. Portanto, os obstetras precisarão estar atualizados para poderem participar de tais mudanças e dos
debates decorrentes.
Se a conduta for dependente apenas do resultado reagente de um teste treponêmico, certamente serão novamente
tratadas as gestantes com testes treponêmicos reagentes residuais, como foi feito adequadamente no passado. Este é
um aspecto muito importante que deve ser de conhecimento do profissional que acompanha pré-natal e que deve ser
esclarecido para a paciente e o parceiro. A vantagem inquestionável do uso do teste rápido é permitir tratamento imediato nos casos reagentes, permitindo reduzir a morbidade e mortalidade associadas à infecção, potencialmente muito
graves para o feto e para o recém-nascido. O aconselhamento e tratamento do parceiro, no caso de triagem por teste
rápido, também devem ser realizados com rapidez, associados ao necessário esclarecimento.
Considerações finais
A incidência de sífilis congênita tem aumentado no Brasil, com mortalidade perinatal relevante e não há nenhuma
expectativa de controle, mantendo-se as mesmas estratégias fracassadas das últimas décadas. Talvez a atualização dos
conhecimentos técnicos, imposta pelas novas propostas para diagnóstico da sífilis, e a responsabilidade de realização
do teste rápido nas unidades de saúde nos casos indicados exijam maior compromisso dos serviços e dos profissionais
no controle da infecção congênita. A melhor estratégia é enfrentar este problema do passado com armas do futuro, que
acaba de virar presente nas recomendações técnicas de diagnóstico da sífilis.
54
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):52-5
Sífilis na gravidez e óbito fetal: de volta para o futuro
Referências
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Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):52-5
55
Maria Isabel Do Nascimento1
Alfredo De Almeida Cunha2
Elisângela Victor Guimarães3
Felipe Silva Alvarez3
Sandra Regina Dos Santos Muri Oliveira4
Eduardo Loyola Villas Bôas3
Gestações complicadas por sífilis materna
e óbito fetal
Pregnancies complicated by maternal syphilis and fetal death
Artigo Original
Resumo
Palavras-chave
OBJETIVO: Descrever as características de gestações complicadas por sífilis materna e óbito fetal. MÉTODOS: Foi feito
um estudo retrospectivo descritivo conduzido por revisão de prontuários de 48 gestantes com sífilis materna e desfecho
de óbito fetal, admitidas no período 2005-2008, no Hospital Geral de Nova Iguaçu, Baixada Fluminense, Estado
do Rio de Janeiro. O peso ao nascer ≥500 g e o óbito fetal documentado por declaração de óbito foram os critérios
de inclusão. Os seguintes aspectos foram analisados: sociodemográficos, antecedentes reprodutivos, aspectos da
gestação atual, cuidados de pré-natal, realização e resultados do teste Venereal Disease Research Laboratory (VDRL),
presença de intercorrências na gestação, além da sífilis, sendo as mortes fetais classificadas como materna, placentária
ou fetal. Os resultados foram apresentados por porcentagem, média, desvio padrão (DP) e valor máximo e mínimo.
RESULTADOS: A média de idade materna foi de 22,7 anos (DP=0,9 anos) e pelo menos metade das pacientes tinham
baixo grau de escolaridade. Na admissão hospitalar, 68,8% do grupo se encontrava no terceiro trimestre e com média
de idade gestacional de 29,2 semanas (DP=0,5); mais de 50% estava em trabalho de parto. A grande maioria dos
casos de óbito fetal (93%) ocorreu antes da hospitalização materna. Entre as pacientes que frequentaram o pré-natal
(54,2%), 30,8% não realizaram o VDRL, 30,8 e 15,4% tiveram resultado reativo e não-reativo, respectivamente e
nenhuma teve mais de um VDRL no pré-natal. No momento do parto, a maioria das pacientes (95,8%) realizou o
VDRL. No geral, a titulação do VDRL variou de 1:1 a 1:512, predominando titulações ≥1:4 (91,7%). Em 23% dos
casos foram encontradas outras condições relacionadas ao óbito fetal, além da sífilis. CONCLUSÕES: A infecção foi
a principal causa clinicamente identificada do decesso fetal nesta série de casos. O desfecho de feto morto ocorreu
no pré-termo e na presença de títulos altos de infecção materna, sugestivos de sífilis recente.
Gravidez de alto risco
Complicações infecciosas na gravidez
Natimorto
Sífilis congênita
Morte fetal/etiologia
Cuidado pré-natal
Keywords
Pregnancy, high-risk
Pregnancy complications, infections
Stillbirth
Syphilis, congenital
Fetal death/etiology
Prenatal care
Abstract
PURPOSE: To describe the characteristics of pregnancies complicated by maternal syphilis and fetal death. METHODS:
Retrospective descriptive study performed by reviewing the medical records of 48 pregnant women with maternal syphilis and
fetal death outcome admitted to Hospital Geral de Nova Iguaçu, Baixada Fluminense, State of Rio de Janeiro, during the period
from 2005 to 2008. Birth weight ≥500 g and fetal death documented by Death Certificate were the inclusion criteria. The
following aspects were analyzed: sociodemographic factors, reproductive history, aspects of the current pregnancy, prenatal
care, Venereal Disease Research Laboratory (VDRL) testing, and other gestational conditions, in addition to syphilis. The fetal
deaths were classified as maternal, placental or fetal. Percentage, mean, standard deviation (SD), maximum and minimum
values were reported. RESULTS: The mean maternal age was 22.7 years (SD=0.9 years), and at least 50% of the patients
had low educational level. At hospital admission, 68.8% of the subjects were in the third trimester, with a mean gestational
age of 29.2 weeks (SD=0.5), and more than 50% were in labor. The vast majority of fetal deaths (93%) occurred before
maternal hospitalization. Among the patients who received prenatal care (54.2%), 30.8% had no VDRL test, 30.8 and 15.4%
had a reactive and non-reactive result, respectively, and none had more than one prenatal VDRL test. At the time of childbirth,
most of the mothers (95.8%) carried out VDRL testing. Overall, the VDRL titers varied from 1:1 to 1:512, with predominant
values ≥1:4 (91.7%). In 23% of cases other clinical conditions related to fetal death, in addition to syphilis, were found.
CONCLUSIONS: The infection was the main clinically identified cause of fetal death in this patient series. Fetal death occurred
during the preterm period and in the presence of high titers of maternal infection, suggesting recent syphilis infection.
Correspondência
Maria Isabel do Nascimento
Clínica de Ginecologia – Hospital Geral de Nova Iguaçu
Estrada Henrique Duque Estrada Mayer 953 – Posse
CEP: 26030-380
Nova Iguaçu (RJ), Brasil
Recebido
01/11/2011
Aceito com modificações
29/11/2011
Trabalho realizado no Hospital Geral de Nova Iguaçu – HGNI – Nova Iguaçu (RJ), Brasil.
Clínica de Ginecologia do Hospital Geral de Nova Iguaçu – HGNI – Nova Iguaçu (RJ), Brasil.
2
Hospital Geral de Nova Iguaçu – HGNI – Nova Iguaçu (RJ), Brasil.
3
Programa de Residência em Tocoginecologia do Hospital Geral de Nova Iguaçu – HGNI – Nova Iguaçu (RJ), Brasil.
4
Clínica de Obstetrícia do Hospital Geral de Nova Iguaçu – HGNI – Nova Iguaçu (RJ), Brasil.
Fonte de financiamento: nenhuma.
Conflito de interesses: não há.
1
Gestações complicadas por sífilis materna e óbito fetal
Introdução
Métodos
A sífilis materna constitui uma importante causa potencialmente evitável de óbito fetal e de outros resultados
perinatais adversos ocorrendo principalmente nas regiões
menos desenvolvidas do mundo1. Nos países desenvolvidos, a maioria dos óbitos fetais ocorre anteparto e no
pré-termo, 10 a 25% deles são causados por infecções,
estando a sífilis entre as mais comuns2. O risco de transmissão vertical do treponema pallidum, agente etiológico da
sífilis, é dependente do estágio da infecção materna e da
idade gestacional em que ocorre a exposição fetal3,4, sendo
de 70 a 100% a taxa de transmissão vertical observada
em gestantes com sífilis recente e de 30 a 40% nos casos
de sífilis tardia5.
Na presença de infecção recente não tratada, estimase que 25% das gestações terminem em aborto tardio
ou óbito fetal, 11% em óbito neonatal de recém-natos a
termo, 13% em parto prematuro ou baixo peso ao nascer
e 20% apresentando sinais clínicos de sífilis congênita3.
Calcula-se que cerca de 500.000 casos de óbito fetal,
globalmente registrados ao ano, estejam relacionados à
sífilis congênita6.
A despeito do grande número de óbitos fetais registrados
no mundo, o tema ainda tem sido pouco priorizado no que
tange a atenção política e as iniciativas programáticas7.
A baixa visibilidade do óbito fetal e a falha das ações de
prevenção da sífilis no pré-natal estão amplamente relacionadas e requerem intervenções delineadas depois de
adequada análise da situação em saúde e de identificação
das principais causas de óbito fetal nas diferentes regiões
geográficas8.
No Brasil, a transmissão vertical da sífilis permanece um grande problema de saúde pública9. De acordo
com o Ministério da Saúde do Brasil5, a prevalência
da doença em gestantes, no ano de 2004, foi de 1,6%
representando cerca de 50.000 parturientes com sífilis
ativa e 15.000 recém-natos com sífilis congênita naquele ano, sugerindo controle insuficiente da doença.
Considerando a repercussão extremamente grave e
potencialmente fatal da sífilis congênita, as diretrizes
brasileiras5 recomendam dois testes para sífilis durante
o pré-natal, sendo um na primeira consulta e o outro
por volta da trigésima semana de gestação, além de
um terceiro exame no momento do parto. Além disso,
os óbitos fetais representam uma carga importante na
mortalidade perinatal e tem sido enfatizada a necessidade de sua investigação com a identificação das causas
e posterior classificação10. Nesse sentido, o objetivo do
presente estudo foi descrever as características de gestações complicadas por sífilis materna e por óbito fetal
atendidas em unidade do Sistema Único de Saúde, no
Estado do Rio de Janeiro, no período 2005–2008.
O estudo teve desenho retrospectivo, conduzido a
partir de revisão de prontuários médicos de pacientes
admitidas na maternidade do Hospital Geral de Nova
Iguaçu (HGNI), referência para atendimento de gestação
de alto risco, na Baixada Fluminense, Estado do Rio de
Janeiro. Na unidade ocorrem 3.000 partos, em média,
por ano, correspondendo a 25% dos nascimentos em
hospitais do município.
A população de estudo foi constituída por parturientes
com desfecho de óbito fetal no período de 2005–2008
que tiveram teste sorológico não treponêmico – venereal
disease research laboratory (VDRL) - no pré-natal e/ou na
admissão hospitalar com resultado reativo.
Definiu-se o óbito fetal como a morte do feto que
ocorreu antes da completa expulsão ou extração do produto
conceptual do corpo materno, em idade gestacional igual
ou superior a 22 semanas e/ou peso de 500 g ou mais10.
Utilizou-se o peso fetal de 500 g ou mais e a documentação pela declaração de óbito como critérios de inclusão no
estudo. A relação dos óbitos fetais ocorridos no período
de estudo foi cedida pela Secretaria Municipal de Saúde
e orientou a identificação dos prontuários candidatos à
revisão e fonte de informação.
A sífilis materna foi definida como a reatividade
do VDRL em qualquer semana de gestação5. Os resultados do teste VDRL (qualitativo e titulação) foram
extraídos do cartão de pré-natal (quando arquivado
no prontuário), das anotações médicas contidas na
ficha de admissão de gestante e dos laudos de exames
laboratoriais feitos de rotina na maternidade, também
arquivados no prontuário.
No período, foram identificados 410 óbitos fetais,
sendo a positividade do VDRL detectada em 50 pacientes. Duas mulheres foram excluídas do estudo. Uma por
ter sido admitida como puérpera, após ter tido parto no
percurso para a maternidade, sendo o evento desconsiderado por ter ocorrido extra-hospitalar. Uma outra mulher
com VDRL reagente foi, excepcionalmente, submetida ao
exame confirmatório obtendo resultado negativo, sendo
também excluída do estudo, embora a realização do fluorescent treponema antigen absorvent test (FTA-Abs) não faça
parte da rotina da unidade. Assim, o grupo estudado foi
composto por 48 parturientes.
Os aspectos demográficos coletados foram: a idade
materna analisada como variável contínua e em categorias
(<20, 20–29, 30 e mais); a cor da pele categorizada em
branca, parda, negra e ignorada; a escolaridade classificada em fundamental incompleto, fundamental completo
ou mais e ignorado. O local de residência foi avaliado
considerando-se o município referido pela paciente: moradora de Nova Iguaçu (sim/não).
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):56-62
57
Nascimento MID, Cunha ADA, Guimarães EV, Alvarez FS, Oliveira SRDSM, Villas Boas EL
Os antecedentes reprodutivos foram analisados como
variáveis categóricas considerando-se: o número de gestações (1, 2 e 3 ou mais), a paridade (nulípara, 1, 2 e 3 ou
mais), o antecedente de aborto (sim/não), o antecedente
de cesárea (sim/não) e de óbito fetal (sim/não).
As características da gestação atual foram analisadas pelas condições de admissão e de parto sendo
considerados os seguintes parâmetros: (i) idade gestacional fornecida na ultrassonografia do pré-natal ou
no momento do parto ou calculada pela data da última menstruação, sendo analisada em classes (20–27;
28–36 ou 37 semanas e mais); (ii) pela presença dos
batimentos cardíacos fetais (BCF) se audíveis na admissão (sim/não); (iii) pela presença de trabalho de parto
no momento da admissão (sim/não); (iv) pela via de
resolução do parto (vaginal/cesáreo) e (v) pelo peso ao
nascer (500 a 999; de 1.000 a 1.499; 1.500 a 1.999;
2.000 a 2.499; 2.500 g e mais).
O acesso ao pré-natal foi avaliado, primeiramente
verificando-se a frequência à alguma consulta de pré-natal
(sim/não) e depois, restringindo-se àquelas que receberam
algum acompanhamento. Observou-se, também, a disponibilidade de cartão de pré-natal (sim/não) e o número de
consultas, segundo as categorias: 1, 2 e 3 ou mais.
A análise do VDRL foi feita considerando-se a obtenção do exame no pré-natal (sim/não), no momento do
parto (sim/não) e a titulação do VDRL no pré-natal e no
momento do parto, utilizando-se para essa característica
a seguinte classificação: não reativo; 1:1 a 1:4; 1:8 a 1:16;
1:32 a 1:64; 1:128 e mais; não realizado.
Finalmente, a presença de intercorrências como as
síndromes hemorrágicas ou hipertensivas e de outras
condições possivelmente relacionadas ao óbito fetal,
também foi pesquisada. Se identificadas, tais intercorrências foram classificadas considerando-se a origem
fetal, materna ou placentária11.
Foi feita a análise descritiva estimando-se medidas
de tendência central (média e desvio padrão (DP) e
valores máximos e mínimos) das variáveis numéricas,
bem como frequências absolutas e relativas das variáveis categóricas. Empregou-se o programa ACCESS e
o Pacote estatístico EPI-INFO para digitação e análise
dos dados, respectivamente.
Em conformidade com os princípios incorporados na
declaração de Helsinki, o presente estudo foi aprovado
pelo Comitê de Ética em Pesquisa do HGNI com parecer
número 21/2009.
Resultados
Foram analisados 48 casos de gestações que evoluíram com sífilis materna e óbito fetal, representando 11,7% do total dos óbitos fetais registrados
58
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):56-62
no período. As pacientes eram jovens, com 85,4%
do grupo com idade inferior a 30 anos e apenas
2,1% (1/48) com idade na faixa de 40-49 anos. A
idade mínima foi de 14 anos e a máxima foi de 45
anos, sendo a média de idade materna de 22,7 anos
(DP=0,9 anos). Ainda que tenha faltado informação
de 8,3% dos casos, a análise da cor da pele mostrou
predomínio de mulheres pardas (64,6%) em relação
às negras (18,8%) e brancas (8,3%). Todas as pacientes moravam na Baixada Fluminense, sendo 60,4%
em município vizinho à Nova Iguaçu. A despeito do
grande número de dados perdidos, observou-se que
pelo menos 50% das pacientes tinham baixo grau de
escolaridade (fundamental incompleto).
Os antecedentes reprodutivos mostraram que o número
de gestações variou de um a nove, sendo que a maioria
das pacientes relatou uma ou duas gestações (60,4%). Em
relação à paridade, predominaram as nulíparas (41,6%).
Mais de 10% das mulheres tinham antecedentes de parto cesáreo (12,5%), de aborto (16,7%) e de óbito fetal
(10,4%). As características demográficas e reprodutivas
estão apresentadas na Tabela 1.
Tabela 1. Caracterização sociodemográfica e reprodutiva de 48 casos de sífilis materna
e óbito fetal
Característica
n
%
<20
21
43,7
20–29
20
41,7
7
14,6
24
50,0
Faixa etária (em anos)
≥30
Escolaridade
Fundamental incompleto
Fundamental completo e mais
4
8,3
20
41,7
1
19
39,6
2
10
20,8
≥3
19
39,6
Nulípara
20
41,6
1
12
25,0
2
8
16,7
≥3
8
16,7
Sim
8
16,7
Não
40
83,3
Sim
06
12,5
Não
41
85,4
1
2,1
Sim
5
10,4
Não
39
81,3
4
8,3
Ignorado
Número de gestações
Paridade
Antecedente de aborto
Antecedente de cesárea
Ignorado
Antecedente de óbito fetal
Ignorado
Gestações complicadas por sífilis materna e óbito fetal
Tabela 2. Características no momento da admissão hospitalar e da resolução da gestação
de 48 casos de sífilis materna e óbito fetal
Característica
n
%
20–27
15
31,2
28–36
32
66,7
1
2,1
Idade gestacional (em semanas)
≥37
Presença de batimento cardíaco fetal
Tabela 3. Frequência das titulações do VDRL* no pré-natal e no momento do parto de 48
casos de sífilis materna e óbito fetal
n
%
n
%
4
8,3
0
0,0
1:1 – 1:4
2
4,2
11
22,9
1:8 ou 1:16
3
6,2
8
16,7
1
2,1
18
37,5
3
6,2
1:32 ou 1:64
Não
45
93,8
1:128 e mais
Sim
25
52,1
Não
23
47,9
2
4,2
9
18,7
Sem exame no pré-natal**
36
75,0
(.)
(.)
Sem exame na internação
(.)
(.)
2
4,2
***
VDRL: Venereal Disease Research Laboratory.
*
Tipo de parto
Vaginal
40
83,3
Cesárea
8
16,7
Peso ao nascer (em g)
500–999
Internação
Negativo
Sim
Presença de trabalho de parto
Pré-natal
Titulação
Corresponde a 16 pacientes que não fizeram pré-natal + 8 pacientes que não
fizeram VDRL no pré-natal + 12 pacientes com falta de informação.
**
Corresponde a 2 pacientes que não fizeram VDRL na internação.
***
(.): não aplicável.
8
16,7
1.000–1.499
13
27,1
1.500–1.999
12
25,0
2.000–2.499
7
14,5
≥2.500
8
16,7
No momento da admissão hospitalar, 68,8% do
grupo encontravam-se no terceiro trimestre de gestação
(28 semanas ou mais). A idade gestacional variou de 20 a
38 semanas, com média de 29,2 semanas (DP=0,5). Mais
da metade do grupo foi internado em franco trabalho de
parto e os batimentos cardíacos fetais já estavam ausentes
na maioria dos casos. A principal via de parto foi a vaginal
(83,3%). O peso do natimorto variou de 775 a 3.010 g,
com média de 1.706,4 g (DP=95,2 g), sendo que mais
de 50% pesaram 1.500 g ou mais. A caracterização das
gestações na admissão e no parto está apresentada na
Tabela 2.
Apesar do percentual de dados perdidos (12,5%),
verificou-se que 54,2% (26/48) das pacientes tiveram
algum acompanhamento de pré-natal e que 33,3%
(16/48) não tiveram acesso a esse recurso. Entretanto,
no grupo com pré-natal, somente 61,5% (16/26) possuíam o cartão de pré-natal no momento da admissão
na maternidade. O número de consultas variou de um
a cinco, com metade das mulheres tendo comparecido a
apenas uma ou duas consultas.
Apenas 30,8% (8/26) das pacientes com alguma visita
ao pré-natal tiveram a sífilis primeiramente detectada
nessa fase de acompanhamento; o teste foi não reativo
para 15,4% (4/26) delas e 30,8% (8/26) não realizaram
o exame. Essa informação foi perdida para 23% (6/26)
dos casos. Nenhuma das pacientes que teve alguma consulta de pré-natal realizou mais de um teste de VDRL
no pré-natal. No momento do parto, observou-se que
95,8% (46/48) das pacientes realizaram o VDRL e 91,3%
(42/46) apresentou titulações ≥1:4. A Tabela 3 apresenta
a frequência das diferentes titulações do VDRL obtidas no
acompanhamento pré-natal e no momento do parto.
Avaliando-se outras intercorrências na gestação, além
da sífilis, detectou-se a presença de causas placentárias (seis
casos de descolamento prematuro da placenta e um caso
de nó verdadeiro de cordão); de causas maternas (três
casos de síndromes hipertensivas); de causas fetais (um
caso de malformação congênita). Nos demais (37/48), a
única causa clinicamente identificada relacionada ao óbito
fetal foi a presença de sífilis.
Discussão
Embora o diagnóstico e o tratamento da sífilis estejam
plenamente acessíveis, a combinação da infecção materna
com o óbito fetal é ainda um fenômeno frequente8. O
presente estudo delineia uma situação bastante grave,
perpassando por falha no acesso, falha na realização de
exames e obtenção do diagnóstico da sífilis, tardiamente,
na ocasião da internação, quando o feto já se encontrava
morto, esbarrando na rotina pré-natal não cumprida e
sinalizando para as oportunidades perdidas de controle
da doença. A infecção foi encontrada em 11,7% do total
de parturientes de natimortos registrados no período de
2005-2008, prevalência semelhante à observada (12,6%) no
período de 1978–1984, na cidade de Ribeirão Preto12.
No município do Rio de Janeiro, de 1999 a 2002,
ocorreram 4.215 óbitos fetais, sendo a sífilis congênita
considerada causa básica de morte de 222 (5,3%) fetos,
com a distribuição absoluta permanecendo estável ao longo
dos quatro anos estudados13. Mas, os autores verificaram
que 16,2% dos óbitos fetais registrados no ano de 2002
estavam relacionados à sífilis congênita, assim evidenciando
uma piora da situação em relação ao período 1996-1998,
naquele município.
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):56-62
59
Nascimento MID, Cunha ADA, Guimarães EV, Alvarez FS, Oliveira SRDSM, Villas Boas EL
Apesar das diferenças entre as regiões, a sífilis materna
permanece impactando, ao longo dos anos, a natimortalidade mostrando a importância da sua inclusão, no ano
de 2005, na relação nacional de doenças de notificação
compulsória no Brasil14.
À semelhança de outros estudos de sífilis e resultados
adversos na gestação12,13,15-17, na presente série de casos, as
mulheres eram jovens, com média de idade de 22 anos,
um padrão etário diferente do que ocorre com outras
causas de óbito fetal como, por exemplo, as anomalias
congênitas, eventos mais observados em mães com 35
anos ou mais18. Também predominaram a cor da pele
não branca e a baixa escolaridade, sugerindo condições
socioeconômicas desfavoráveis e dificuldades de acesso a
serviços de saúde. Tais circunstâncias não são fatores de
risco diretos para resultados adversos na gestação, mas
refletem a ausência ou a pobre qualidade do cuidado
que as mulheres recebem durante a gravidez e o parto,
aumentando o risco de assistência pré-natal inadequada19
e de óbito fetal20.
Os antecedentes reprodutivos também são preocupantes, uma vez que uma grande proporção de mulheres era nulípara ou com baixo número de gestações
e partos e, ainda assim, houve relatos de abortamento
(16,7%) e de cesariana (12,5%) prévios. Além disso, o
óbito fetal também foi um fenômeno recorrente, fato
observado em 20% da casuística analisada em Ribeirão
Preto12. Dependendo da causa, o aumento do risco de
recorrência de óbito fetal em gestações subsequentes
é de duas a dez vezes21. Na Tanzânia, o antecedente de
feto morto em multíparas foi fortemente associado com
títulos altos de sífilis ativa, comparando com mulheres
soronegativas22.
No mundo, 2,2 milhões de óbitos fetais ocorrem no
terceiro trimestre, antes de iniciar o trabalho de parto, sendo
a sífilis materna uma das causas de óbito, oportunamente
manejáveis pelos cuidados pré-natais20. Nesse sentido, as
condições de internação mostraram que, na quase totalidade
dos casos (47/48), os resultados adversos ocorreram antes
da 37ª semana, configurando um fenômeno pré-termo. Um
terço dos óbitos ocorreu antes da 28ª semana, ou seja, antes de
atingir o momento preconizado para a realização do segundo
VDRL em gestações não complicadas. Considerando-se
que a detecção e o tratamento da sífilis entre a 24ª e a 28ª
semanas pode ser tarde demais para prevenir a ocorrência
de óbito fetal e de parto pré-termo3, tais achados sugerem
a necessidade de se investir na consulta inicial do prénatal, de modo que ela ocorra ainda no primeiro trimestre,
com tempo suficiente para se implementar o protocolo de
eliminação da sífilis materna e da transmissão vertical do
treponema pallidum, como recomendado pelo Ministério da
Saúde do Brasil5.
60
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):56-62
Embora, 52% das mulheres tenham sido admitidas
em trabalho de parto, foi observado que o feto já estava
morto, no momento da admissão hospitalar, em mais de
93% dos casos, proporção intermediária à encontrada
na cidade de Recife (95,7%)23 e em microrregião de
Minas Gerais (86,3%)24, permitindo classificar também os óbitos fetais relacionados à sífilis como um
fenômeno anteparto.
O peso ao nascer é outro fator de extrema importância
na avaliação dos casos de óbito fetal5. Nesse aspecto, nossos
resultados se mostram semelhantes aos do município do
Rio de Janeiro para o ano de 200213, com maior parte dos
natimortos tendo peso inferior a 2.500 g. Avaliando-se a
evitabilidade de tais óbitos apenas pelo critério do peso ao
nascer, se pode especular que mais da metade deles poderiam ter sido evitados com o rastreamento e tratamento
oportunos da sífilis, tendo em vista que 56% dos fetos da
nossa casuística pesaram 1.500 g ou mais.
A possibilidade de controle da doença foi perdida
no pré-natal à medida que um terço das pacientes não
recebeu esse acompanhamento. Entre as acompanhadas,
o número de consultas foi baixo, sugerindo que cogitar
a utilização de outros recursos, como testes rápidos,
capazes de agilizar a abordagem da sífilis logo nas primeiras visitas, parece apropriado. Também, a infecção
foi detectada, para a maioria delas, no momento do
parto. Nos Estados Unidos, dos casos de sífilis congênita registrados em 2008, 29% das mães não receberam
cuidados de pré-natal e a infecção foi detectada apenas
no momento do parto25. Além disso, 27% dos casos com
acesso ao pré-natal tiveram o rastreio da sífilis menos
de 30 dias antes do parto, intervalo insuficiente para se
implementar uma antibioticoterapia efetiva.
Na nossa casuística, nenhuma das pacientes foi submetida a dois testes de VDRL no pré-natal. Há relatos
na literatura mostrando que 0,4 a 2,8% das mulheres
grávidas tornam-se positivas para sífilis no intervalo entre
o primeiro e o segundo teste realizado, em geral no início
do terceiro trimestre3. No Brasil, mesmo entre gestantes
com seis ou mais consultas de pré-natal, a cobertura de
dois testes detectada no Estudo Sentinela26 foi de apenas
26,2%, sendo verificado também que 0,4% das mulheres,
com resultado negativo no primeiro teste, tiveram teste
positivo no segundo.
O estágio da sífilis materna e a titulação sorológica
da infecção fornecem indícios das condições fetais27.
No presente estudo, mais de 80% dos casos apresentou
VDRL maior que 1:4. Em geral, títulos maiores que
1:4 indicam infecção ativa, recentemente adquirida
e com maior risco de envolvimento fetal, estando a
mortalidade relacionada à intensidade da infecção, à
resposta inflamatória e à redução do fluxo sanguíneo
Gestações complicadas por sífilis materna e óbito fetal
placentário3. Na Tanzânia, mulheres com títulos de
VDRL >1:4 apresentaram risco quatro vezes maior
de algum resultado adverso quando comparadas com
as soronegativas22.
Embora apenas 8,3% das nossas gestantes tenham
apresentado VDRL com título inferior a 1:4, vale
mencionar os achados de Campos et al.28 a respeito de
tais valores. Os autores encontraram uma associação
significativa entre o VDRL de baixa titulação (1:1, 1:2
e 1:4) e os testes diagnósticos do tipo treponêmico e
mostraram que, em gestantes, tais títulos têm grande
significado clínico e são bons preditores da sífilis congênita, podendo ser aplicados isoladamente.
A análise de causas múltiplas é importante para
que se identifique corretamente a cadeia de eventos
que causam a morte perinatal na presença de doenças
de notificação compulsória13. Assim, buscamos no
presente estudo, identificar, além da sífilis, outras possíveis explicações para o óbito fetal, sendo encontradas
causas placentárias e maternas, bem como outras fetais
(anomalia congênita). Mas, a infecção foi a única causa
clinicamente detectada na maioria dos casos (77%)
estudados. No estudo realizado na Tanzânia22, 94%
dos óbitos fetais de mães com sífilis ativa não tratada
foram atribuídos exclusivamente à infecção.
A despeito da resolução do parto do feto morto
ocorrer preferencialmente por via vaginal, algumas
intercorrências maternas acabaram influenciando a
indicação da operação cesariana, todavia em proporção
inferior à relatada por Sampaio e Souza29. Esses autores
verificaram que 27,5% dos partos de pacientes com
feto morto registrado entre 2005 e 2008, em unidade
de saúde do Recife foram conduzidos por via alta.
Tal diferença pode ser atribuída à homogeneidade da
população por nós estudada, composta por mulheres
com sífilis, condição que isoladamente, não configura
indicação de cesariana. Nessas circunstâncias, a operação cesariana foi indicada para resolução de problemas adicionais e, além do descolamento prematuro
da placenta, o antecedente de cesariana e a artrodese
coxofemoral determinaram a realização da cirurgia. Por
outro lado, no estudo realizado no Recife, estiveram
presentes várias condições emergenciais, manejáveis
invariavelmente pela operação cesariana.
O estudo teve algumas limitações. Primeiramente
o desenho é descritivo com enfoque em uma população
com características contextuais específicas de uma região
periférica do estado do Rio de Janeiro, dificultando a
generalização dos resultados. Além disso, foi desenvolvido retrospectivamente com revisão de prontuários,
não sendo possível analisar questões importantes relacionadas à idade gestacional de início do pré-natal, à
data do teste VDRL e do tratamento, se efetuado, no
pré-natal. Ainda que a presença do feto morto indique
falha da abordagem da sífilis no pré-natal, vale a pena
mencionar a importância de se implementar estudos
comparativos para adequadamente avaliar tais questões.
Também, a caracterização das mulheres a respeito do
status marital e do uso de tabaco foi prejudicada pelo
alto percentual de dados perdidos.
Como forças do estudo, se pode destacar o enfoque
na combinação da sífilis materna com o óbito fetal,
fenômeno ainda pouco estudado no cenário brasileiro.
A adoção da definição de feto morto baseada exclusivamente no peso do concepto conferiu uniformidade à
população estudada, facilitando futuras comparações.
Também, a relação dos óbitos foi obtida de fonte oficial (Secretaria Municipal de Saúde), sendo as causas
relacionadas à morte do concepto revisadas, em uma
amostra de prontuários, por dois revisores, em momentos diferentes, proporcionando melhor qualidade
da informação coletada.
Em suma, a caracterização das gestações que evoluíram na presença de sífilis materna e do óbito fetal
mostrou que a infecção foi a principal causa, clinicamente identificada, para a maioria dos casos de decesso
fetal. O término das gestações, ainda no pré-termo e na
presença de titulações de VDRL altas, deram visibilidade a um fenômeno prioritariamente dirigido com a
implementação de melhorias no pré-natal. Estimular e
facilitar o acesso precoce ao pré-natal e o cumprimento
do protocolo preconizado no Brasil pode contribuir
para a redução da transmissão vertical do treponema
pallidum e impactar nesse importante componente da
mortalidade perinatal.
Agradecimentos
À Responsável Técnica da Divisão de Dados Vitais
da Secretaria Municipal de Saúde de Nova Iguaçu –
Isabel Cristina Mendonça – pela colaboração na obtenção dos dados.
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):56-62
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devem ser notificados pelos Laboratórios de Referência Nacional
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Laura Helena França de Barros Bittencourt1
Fabiana Maria Ruiz Lopes-Mori2
Regina Mitsuka-Breganó2
Marivone Valentim-Zabott3
Roberta Lemos Freire4
Simone Benghi Pinto3
Italmar Teodorico Navarro4
Artigo Original
Soroepidemiologia da toxoplasmose em gestantes
a partir da implantação do Programa de Vigilância
da Toxoplasmose Adquirida e Congênita em
municípios da região oeste do Paraná
Seroepidemiology of toxoplasmosis in pregnant women since the
implementation of the Surveillance Program of Toxoplasmosis Acquired
in Pregnancy and Congenital in the western region of Paraná, Brazil
Resumo
Palavras-chave
Toxoplasma/isolamento & purificação
Toxoplasmose/epidemiologia
Toxoplasmose congênita/epidemiologia
Soroprevalência de HIV/epidemiologia
Complicações parasitárias na gravidez/epidemiologia
Keywords
Toxoplasma/isolation & purification
Toxoplasmosis/epidemiology
Toxoplasmosis,congenital/epidmiology
HIV seroprevalence/epidemiology
Pregnancy complications, parasitic/epidemiology
Objetivo: Avaliar a suscetibilidade das gestantes à toxoplasmose em serviço público de saúde de dois municípios da
região oeste do Paraná. Métodos: Foram avaliadas 422 gestantes por meio da pesquisa sorológica de anticorpos
IgG e IgM anti-Toxoplasma gondii (ELISA e MEIA). As soronegativas repetiram a sorologia no segundo e terceiro
trimestre de gestação. Em um dos municípios, também foi realizada a triagem neonatal em 27 recém-nascidos para
detecção de IgM anti-Toxoplasma gondii pelo teste de fluorometria. Todas as gestantes responderam a um questionário
epidemiológico, para análise dos fatores associados ao risco da infecção pelo Toxoplasma gondii. Para análise estatística,
foram consideradas a variável dependente da presença de IgG anti-Toxoplasma gondii e as variáveis independentes
contidas no questionário epidemiológico. Resultados: A prevalência de anticorpos IgG anti-Toxoplasma gondii nas
gestantes foi de 59,8 e 60,6%. Em um dos municípios, as variáveis associadas à presença de anticorpos IgG foram
baixo nível de escolaridade e mais de uma gestação. Não houve associação com os outros fatores investigados, como
a ingestão de carnes cruas ou mal cozidas, vegetais crus, salames coloniais, manipulação de terra ou areia, horta
em casa e gatos em casa. No outro município, não foi observada associação estatística com nenhuma das variáveis
estudadas. Não foi confirmado nenhum caso de infecção aguda nem de soroconversão em ambos os municípios.
Nenhuns dos recém-nascidos avaliados apresentou positividade para toxoplasmose. Conclusão: A toxoplasmose
é comum nas gestantes atendidas pelo serviço público de saúde da região estudada e há 40% delas suscetíveis à
infecção. Esse dado reforça a necessidade de manter o programa implantado nesses municípios.
Abstract
Purpose: To evaluate the susceptibility to toxoplasmosis in pregnant women in the public health service from two cities
in the western region of Paraná, Brazil. Methods: Four thousand twenty-two pregnant women were evaluated for
anti-Toxoplasma gondii IgG and IgM by ELISA and MEIA. Seronegative pregnant women repeated the serology in the
second and third trimester of pregnancy. Neonatal screening of 27 newborns was also performed in one of the cities to
detect IgM anti- Toxoplasma gondii by fluorometry. All pregnant women answered an epidemiological questionnaire to
analyze the factors associated with the risk of infection by Toxoplasma gondii. For statistical analysis, the presence of IgG
anti-Toxoplasma gondii was considered as the dependent variable and the variables contained in the epidemiological
questionnaire as the independent ones. Results: The prevalence of anti-Toxoplasma gondii IgG in pregnant women was
59.8 and 60.6%. In one of the cities, the variables associated with the presence of IgG antibodies were low educational
level and more than one pregnancy. There was no association with other factors studied such as consumption of raw or
undercooked meat, consumption of raw vegetables, consumption of colonial salami, handling soil or sand, the presence
of a home vegetable garden and cats in the household. In the other city there was no statistical association with the
variables studied. No case of acute infection and no seroconversion were confirmed in either city. None of the infants
evaluated were positive for toxoplasmosis. Conclusion: Toxoplasmosis is common in pregnant women attended by
the public health service in the region studied and 40% of them are susceptible to the infection. These data reinforce the
need to keep the screening program in these cities.
Correspondência
Laura Helena França de Barros Bittencourt
Centro de Ciências Agrárias do Departamento de Medicina Veterinária
Preventiva da Universidade Estadual de Londrina
Rodovia Celso Garcia Cid, Pr 445 km 380
CEP: 86057-350
Londrina (PR), Brasil
Recebido
02/08/2011
Aceito com modificações
19/12/2011
Trabalho realizado na Universidade Estadual de Londrina – UEL – Londrina (PR), Brasil; Universidade Federal do Paraná – UFPR –
Palotina (PR), Brasil.
1
Curso de Pós-Graduação em Ciência Animal da Universidade Estadual de Londrina – UEL – Londrina (PR), Brasil.
2
Departamento de Ciências Patológicas da Universidade Estadual de Londrina – UEL – Londrina (PR), Brasil.
3
Colegiado de Medicina Veterinária da Universidade Federal do Paraná – UFPR – Palotina (PR), Brasil.
4
Departamento de Medicina Veterinária Preventiva da Universidade Estadual de Londrina – UEL – Londrina (PR), Brasil.
Bittencourt LHFB, Lopes-Mori FMR, Mitsuka-Breganó R, Valentim-Zabott M, Freire RL, Pinto SB, Navarro IT
Introdução
Cerca de 90% das gestantes que adquirem toxoplasmose
durante a gestação são assintomáticas. Assim, testes sorológicos
devem ser realizados para detectar anticorpos anti-Toxoplasma
gondii e confirmar a presença ou ausência da infecção1.
As mulheres que adquirem a primo-infecção da toxoplasmose durante a gestação apresentam parasitemia
temporária, podendo desenvolver lesões focais na placenta
e cerca de 40 a 50% podem transmitir o parasita ao feto
pela via transplacentária2,3. A taxa de transmissão vertical
depende da idade gestacional em que a mãe adquire a
infecção, variando de 6% com 13ª semanas de gestação e
podendo resultar em morte fetal; 40% com 26ª semanas;
e 72% com 36ª semanas, podendo ocasionar hidrocefalia,
calcificação intracraniana e coriorretinite2. Também tem
sido observado déficit auditivo, em torno de 20%, nos casos
de crianças não tratadas4. Crianças com infecção congênita
podem ser assintomáticas ao nascimento e desenvolver
tardiamente lesões oculares5. A transmissão congênita é
rara em mulheres imunocompetentes cronicamente infectadas6, mas há relato de transmissão congênita em uma
paciente com infecção crônica que sofreu reinfecção com
cepa geneticamente diferente da infecção primária7.
A prevalência e a incidência da toxoplasmose em
gestante variam muito de um país para o outro, e entre as
regiões de um mesmo país8. O conhecimento da taxa de
gestantes soronegativas e das características epidemiológicas
de cada região é muito importante para planejar programas
de prevenção e assistência pré-natal e neonatal da toxoplasmose9-11. No Brasil, alguns estudos evidenciaram diferentes
prevalências da toxoplasmose em gestantes, como 31,0%
em Caxias do Sul (RS), chegando a 91,6% no Mato Grosso
do Sul12,13. No Estado do Paraná, em Londrina e Rolândia,
a prevalência da toxoplasmose em gestantes foi avaliada em
cerca de 50%. Nesses municípios, foi implantada, para as
gestantes atendidas pelo sistema público de saúde, a triagem
sorológica no pré-natal, com repetição de sorologia a cada
trimestre de gestação nas suscetíveis14-16.
O presente trabalho teve como objetivo avaliar a
suscetibilidade das gestantes à toxoplasmose e a vigilância dos recém-nascidos, além de observar algumas
características epidemiológicas dessa zoonose em gestantes
atendidas no serviço público de saúde dos municípios da
região oeste do Paraná, após a implantação do Programa
de Vigilância da Toxoplasmose Adquirida na Gestação e
Congênita, em 200917.
Métodos
Estudo observacional transversal, de Julho de 2009 a
Outubro de 2010, realizado em gestantes atendidas pelo
64
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):63-8
serviço público de saúde dos municípios de Palotina e
Jesuítas na região oeste do Estado do Paraná. Palotina
conta com uma população de 28.609 habitantes18 e, em
média, 400 gestantes são atendidas anualmente pelo
serviço público de saúde. O município de Jesuítas, com
8.988 habitantes18, tem aproximadamente 60 gestantes
atendidas, por ano, pelo mesmo serviço público de
saúde. O tamanho da amostra foi calculado pelo programa Epi-Info 3.5.119, com prevalência esperada de
50,0%, erro padrão de 5% e nível de significância de
5%. O tamanho ideal foi de 226 gestantes em Palotina
e 52 em Jesuítas.
O Programa de Vigilância da Toxoplasmose Adquirida
na Gestação e Congênita17 foi implantado em Julho de
2009 no município de Palotina e em Setembro de 2009 no
município de Jesuítas. Em março de 2009, foram realizadas
oficinas de capacitação para treinamento das equipes das
secretarias de saúde dos dois municípios sobre as ações do
programa. O programa preconiza a pesquisa de IgG e IgM
anti-T. gondii na primeira consulta do pré-natal, orientações
sobre a prevenção em todas as consultas, monitoramento
sorológico trimestral das gestantes suscetíveis, acompanhamento de gestantes e crianças com infecção aguda, e
notificação de casos. No município de Jesuítas, além da
triagem sorológica materna, foi implantada, em Janeiro
de 2010, a pesquisa de anticorpos IgM em papel filtro em
todos recém-nascidos. As amostras foram submetidas ao
teste de fluorometria (NeoToxo IgM®, Labsystems FEIA,
Helsinki, Finlândia).
No município de Palotina, no primeiro e terceiro
trimestre de gestação, as avaliações de anticorpos IgG e
IgM anti-T. gondii foram realizadas no Laboratório Central
(LACEN) por meio das técnicas de ensaio imunoenzimático
(ELISA – Dia.Pro®, Diagnostic Bioprobes, Milano, Italy)
e ELISA de captura (Dia.Pro®, Diagnostic Bioprobes,
Milano, Italy), respectivamente. No segundo trimestre,
a avaliação foi realizada em laboratório conveniado ao
serviço de saúde pela técnica de enzimaimunoensaio por
micropartículas (Meia-Abbott®, Laboratories, Illinois,
USA). Em Jesuítas as avaliações sorológicas foram realizadas, em laboratório conveniado ao serviço público de
saúde, pela técnica MEIA (Abbott®) para determinar os
níveis de anticorpos IgG e IgM nos três trimestres de
gestação. No segundo e terceiro trimestre, a sorologia foi
repetida para as gestantes soronegativas. Os resultados das
sorologias foram analisados e interpretados por médicos
e enfermeiros e, quando necessário, era solicitado auxílio
de especialistas.
As gestantes com soropositividade de anticorpos
IgG e IgM anti-T. gondii e ≤16ª semanas de gestação
foram submetidas ao teste de avidez de IgG (Vidas
Toxo IgG Avidity – Biomerieux®). As gestantes IgG
Soroepidemiologia da toxoplasmose em gestantes a partir da implantação do Programa de Vigilância da Toxoplasmose Adquirida e Congênita em municípios da região oeste do Paraná
e IgM soropositivas com idade gestacional superior a
16ª semanas foram encaminhadas ao hospital de referência e tratadas conforme preconizado pelo Programa
de Vigilância da Toxoplasmose Adquirida na Gestação
e Congênita17.
Após aceitarem participar da pesquisa e assinarem
o termo de consentimento livre e esclarecido (Comitê
de Ética em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da
Universidade Estadual de Londrina – UEL, parecer
159/09), as gestantes responderam a um questionário
epidemiológico contendo questões relacionadas às
variáveis sociodemográficas, como local da residência
(zona urbana ou rural), faixa etária, renda per capita,
número de gestações, nível de escolaridade e consumo
de água tratada; e a hábitos de comportamento e alimentares, como ingestão de carne crua ou mal cozida,
salame colonial, e vegetais crus, presença de horta na
residência, manuseio de terra e areia, e presença de
gatos na residência.
Todas as gestantes, no início do pré-natal, receberam
orientação sobre a toxoplasmose e as formas de prevenção
por enfermeiras das Unidades Básicas de Saúde (UBS). Essas
informações foram reforçadas com palestras nas reuniões
mensais do grupo de gestantes. Como material de apoio,
para prevenção da toxoplasmose, foram utilizados cartazes
fixados nas UBS, folhetos usados pelas enfermeiras durante
a orientação e, posteriormente, entregue as gestantes; um
vídeo animação foi apresentado nas palestras.
Para análise estatística, foi considerada a variável
dependente IgG anti-T. gondii reagente e as variáveis independentes, contidas no questionário epidemiológico, com
a utilização do programa Epi-Info 3.5.119. Foi utilizado o
teste do χ2, com correção de Yates ou exato de Fischer. A
razão de chances (Odds Ratio – OR) foi utilizada como
medida de associação entre a infecção pelo T. gondii e as
variáveis pesquisadas, com intervalo de confiança (IC) de
95% e nível de significância de 5%.
Resultados
Foram incluídas 422 gestantes, 356 em Palotina e
66 em Jesuítas com idade entre 14,4 a 42,8 anos – média
de 24,3 anos (±5,8), e de 16,8 a 38,4 anos – média de
25,3 anos (±6,1), respectivamente.
A soroprevalência de anticorpos IgG anti-T. gondii
nas gestantes de Palotina foi de 59,8% (213/356) e
60,6% (40/66) em Jesuítas. A soroprevalência para
IgM anti-T. gondii foi de 1,1% (4/356) no município
Palotina e nenhuma gestante em Jesuítas. Das quatro
gestantes com IgM anti-T. gondii, duas estavam no
primeiro trimestre de gestação e foram submetidas ao
teste de avidez-IgG; ambas apresentaram forte avidez,
indicando infecção crônica. Dos 27 recém-nascidos
avaliados na triagem neonatal, todos apresentaram
IgM não reagentes, por isso não foi realizada sorologia
dessas crianças.
Foi observado que 40,2 e 39,4% das gestantes investigadas eram soronegativas ao T. gondii, municípios
de Palotina e Jesuítas respectivamente.
Houve associação entre sorologia positiva para
toxoplasmose e menor nível de escolaridade das gestantes e maior número de gestações, no município
de Palotina. Outras variáveis como, por exemplo, ser
gestante residente na área rural e consumo de água
tratada não apresentaram associação significativa à
toxoplasmose (Tabela 1). Com relação aos hábitos alimentares e manuseio de solo, nenhuma das variáveis
investigadas mostrou associação com a soropositividade
IgG anti- T. gondii (Tabela 2).
Tabela 1. Variáveis sociodemográficas associadas a soropositividade de anticorpos IgG
anti-Toxoplasma gondii em gestantes atendidas no serviço público de saúde em municípios
do oeste do Paraná
Palotina
Variáveis
% IgG
reagente
Jesuítas
Valor p*
OR (IC)
% IgG
reagente
Valor p*
OR (IC)
Residência
Zona urbana
59,8
0,9
64,2
0,3
Zona rural
60,0
0,9 (0,5–1,7)
46,2
2,0 (0,6–7,1)
<20 anos**
57,0
1,0
47,1
1,0
20 -|30anos
62,1
0,4
1,2 (0,7–2,0)
67,6
0,2
2,3 (0,6–9,4)
>30 anos
58,7
0,9
1,0 (0,5–2,2)
57,1
0,8
1,5 (0,2–7,9)
Faixa etária
Renda per capita
<R$ 350,00
61,8
0,2
68,2
0,1
>R$ 350,00
54,8
1,3 (0,8–2,1)
48,0
2,3 (0,7–7,4)
1° trimestre***
55,8
1,0
67,3
1,0
2° trimestre
63,0
0,2
1,3 (0,8–2,2)
54,5
0,4
0,5 (0,1–2,6)
3° trimestre
63,9
0,3
1,4 (0,7–2,7)
20,0
0,05
0,12 (0,0–1,3)
Início do pré-natal
Número de gestações
Multíparas
66,7
0,004
68,3
0,168
Primigesta
51,3
1,9 (1,2–2,9)
48,0
2,3 (0,8–6,4)
Nível de escolaridade
(anos de estudo)
≤8
70,0
0,01
64,3
0,7
≥9
55,3
1,8 (1,1–3,1)
57,9
1,3 (0,4–4,0)
Consumo de água tratada
Sim
59,6
0,8
61,1
0,552
Não
63,0
0,8 (0,3–1,9)
58,3
1,1 (0,3–4,0)
*χ2 de xYates ou teste exato de Fisher; ** categoria de referência; *** categoria
de referência.OR: Odds Ratio; IC: intervalo de confiança (95%).
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):63-8
65
Bittencourt LHFB, Lopes-Mori FMR, Mitsuka-Breganó R, Valentim-Zabott M, Freire RL, Pinto SB, Navarro IT
Tabela 2. Variáveis hábitos de comportamento e alimentares associadas a soropositividade
de anticorpos IgG anti-Toxoplasma gondii em gestantes atendidas no serviço público de
saúde em dois municípios do oeste do Paraná
Palotina
Variáveis
% IgG
reagente
Jesuítas
Valor p*
OR (IC)
% IgG
reagente
Valor p*
OR (IC)
0,363
Ingestão de carne crua ou
mal cozida
Sim
66,7
0,939
100,0
Não
59,7
1,34 (0,2–7,4)
59,4
Ingestão de salame colonial
Sim
62,7
0,218
62,5
0,574
Não
55,7
1,33 (0,8–2,0)
58,5
1,18 (0,2–5,4)
Ingestão de vegetais crus
Sim
60,0
0,976
61,2
0,909
Não
57,1
1,12 (0,4–2,7)
58,8
1,10 (0,3–3,4)
Presença de horta na
residência
Sim
59,8
0,920
47,6
0,186
Não
59,9
0,99 (0,6–1,5)
68,2
0,42 (0,1–1,2)
Sim
71,4
0,103
62,5
0,612
Não
58,0
1,81 (0,9–3,5)
60,3
1,09 (0,2–5,0)
Manuseio de terra e areia
Presença de gatos na
residência
Sim
70,6
0,123
87,5
0,097
Não
58,0
1,73 (0,9–3,3)
56,9
5,3 (0,6–45,9)
* χ2 de Yates ou teste exato de Fisher. OR: Odds Ratio; IC: intervalo de confiança
(95%).
Discussão
Os dois municípios onde o estudo foi desenvolvido apresentaram prevalência semelhante de sorologia positiva – em
torno de 60,0%. A proximidade entre dois municípios (64
km) e a semelhança nas condições ambientais provavelmente
não interferiram na prevalência da toxoplasmose. Com relação
às características socioeconômicas e culturais, Palotina possui
colonização italiana e alemã, índice de desenvolvimento
humano (IDH) de 0,83 (o sétimo melhor do Estado), o
produto interno bruto (PIB) é 822.245,310 milhões de
reais e o PIB per capita 28.658,65 mil20. No município de
Jesuítas, a colonização é de italianos, japoneses, portugueses
e espanhóis, o IDH é 0,76 (121o do Estado), o PIB é de
100.331,151 milhões e o PIB per capita é 11.121,69 mil20.
As diferenças étnicas, culturais e econômicas dos municípios
não interferiram na prevalência da toxoplasmose.
No Paraná, foram observadas prevalências semelhantes,
como 55,1% em Rolândia14 e 56,6% em Londrina, no norte
do Estado21, bem como 56,4% na Bahia22, 67,3% em Porto
Alegre (RS)23, 73,5% em Vitória (ES)24, 74,5% em Alto
Uruguai (RS)25, 75,1% em Miracema (RJ)26 e 91,6% no
Mato Grosso do Sul14. A grande extensão territorial e a diversidade sociocultural de nosso país justificam a observação
de taxas diferentes de prevalência da toxoplasmose.
66
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):63-8
Quatro gestantes apresentaram anticorpos IgG e IgM
anti-T. gondii. Sendo a prevalência de anticorpos IgM,
no estudo, menor que 1,1%, resultado equivalente aos
achados no Mato Grosso do Sul13, mas inferior a cidades
do Estado do Paraná, Londrina e Rolândia, que apresentaram, em média, 2,0% de imunoglobulina M14,15, bem
como no Estado do Rio Grande do Sul, Porto Alegre,
2,6%27 e Caxias do Sul 2,8%12.
No município de Palotina, duas gestantes que iniciaram
o pré-natal após 16 semanas de gestação e apresentaram
anticorpos IgG e IgM anti-T. gondii, foram tratadas inicialmente com espiramicina e encaminhadas ao hospital
de referência para acompanhamento. A sorologia dos
recém-nascidos apresentaram IgG positivo e IgM negativo.
As crianças foram monitoradas até a negativação do IgG,
para confirmar a exclusão da infecção.
Nos municípios de Palotina e Jesuítas, com relação
ao local de moradia (zona urbana ou rural), não houve
associação com a infecção. Resultado diferente foi encontrado por outros pesquisadores, como Dias14 em Rolândia,
Avelino et al.28 em Goiânia (GO), Spalding et al.25 na
região do Alto Uruguai (RS). Nesses estudos, as gestantes
procedentes da área rural apresentaram maior prevalência
da infecção em relação às da área urbana.
Embora gestantes com idade superior a 21 anos
foram mais expostas à infecção, não foi encontrada
diferença com relação à faixa etária das mesmas em
ambos os municípios. Em um estudo com 503 mulheres grávidas em Recife29, também não se encontraram
diferenças entre idade e prevalência da toxoplasmose.
Resultados diferentes foram observados em Rolândia e
Caxias do Sul12,14, onde gestantes de faixa etária mais
elevada apresentaram maior prevalência da toxoplasmose.
Isso pode ser atribuído à maior exposição ao parasita no
decorrer dos anos.
Um fato importante a ser destacado é que aproximadamente 40% das gestantes eram soronegativas. Isso
evidencia a importância em intensificar as medidas de
controle, como capacitação dos profissionais de saúde,
facilidade de diagnóstico, terapêutica, entre outros, a
fim de prevenir infecções congênitas. Em estudo de
caso controle, em Goiânia, com 522 grávidas e 592
não grávidas, foi observado que as gestantes tinham
2,2 vezes mais a chance de se infectar com o parasita do
que as não grávidas. Os pesquisadores sugeriram que a
gestação pode ser considerada um fator de risco para a
toxoplasmose. A superior vulnerabilidade ao parasita pelas
gestantes pode ser atribuída a alterações imunológicas
e hormonais que ocorrem durante a gestação30. Nesse
estudo, as gestantes multíparas de Palotina apresentaram maior chance de infecção pelo T. gondii em relação
as primigestas. O risco foi calculado em 1,9 vezes mais
chance de adquirir a infecção.
Soroepidemiologia da toxoplasmose em gestantes a partir da implantação do Programa de Vigilância da Toxoplasmose Adquirida e Congênita em municípios da região oeste do Paraná
As gestantes com até 8 anos de escolaridade
apresentaram risco 1,8 vezes mais elevado de se infectarem que as demais, evidenciando que maior grau
de instrução é um fator de proteção para a infecção
pelo T. gondii. Esse dado identifica a importância de
investimento em educação, o que é apoiado por outros
autores14,24,28,29,31,32, pois se trata de um fator importante
para a prevenção da infecção e promoção da saúde. A
não ocorrência de soroconversão das gestantes pode ser
atribuída às medidas de educação em saúde implantadas
e operacionalizadas durante o período gestacional. Não
foi encontrada associação entre a toxoplasmose e os
diferentes hábitos de comportamento, como ingestão
de carnes cruas ou mal cozidas, ingestão de vegetais
crus, ingestão de salames coloniais, manipulação de
terra ou areia, presença de horta em casa, presença de
gatos em casa, provavelmente pela efetividade da implantação do Programa de Vigilância da Toxoplasmose
Adquirida na Gestação e Congênita, a partir de 2009,
acompanhados por especialistas. Higa et al.33, apesar
de terem observado o hábito de ingestão de leite cru
pelas gestantes e do contato com gatos durante a fase
adulta, também não encontraram associação com carnes
cruas ou mal cozidas. No município de Jesuítas também foi implantado o teste do pezinho, sendo um dos
poucos municípios brasileiros que realizam a triagem
pré-natal e a neonatal.
Por se tratar de um estudo de prevalência, os fatores
estudados foram associados à presença de anticorpos IgG
anti-T. gondii. Como esses anticorpos permanecem presentes
anos após a infecção, estas variáveis de comportamento
e hábitos podem ter sido alteradas. O estudo ideal para
analisar os fatores de risco à infecção é o de coortes; no
entanto, pelo fato de se tratar de uma doença de baixa
incidência na gestação aliado ao alto custo, esse delineamento foi impossibilitado. Apesar disso, o conhecimento
das características epidemiológicas da toxoplasmose, em
cada região, é de extrema importância para traçar programas de controle adequados a cada realidade.
Os serviços de saúde de Palotina e Jesuítas utilizaram
metodologias diferentes para detecção de anticorpos IgG e
IgM anti-T. gondii, mas as duas técnicas são utilizadas nos
laboratórios de rotina para o diagnóstico da toxoplasmose
e apresentam alta sensibilidade e especificidade34.
Os resultados permitem concluir que a infecção pelo
T. gondii é comum nos municípios avaliados; no entanto,
cerca de 40% das gestantes são soronegativas e apresentam
risco para transmissão fetal. Assim, as medidas preventivas
adotadas no serviço público de saúde devem ser mantidas
nesses municípios.
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Gláucia Rosana Guerra Benute1
Daniele Nonnenmacher2
Roseli Mieko Yamamoto Nomura3
Mara Cristina Souza de Lucia4
Marcelo Zugaib5
Influência da percepção dos profissionais
quanto ao aborto provocado na atenção à
saúde da mulher
Perception influence of professionals regarding unsafe in attention to
women’s health
Artigo Original
Resumo
Palavras-chave
Aborto induzido
Saúde da mulher
Aborto/legislação & jurisprudência
Atenção à saúde
Keywords
Abortion, induced
Women’s health
Abortion/legislation & jurisprudence
Health care (Public Health)
Objetivo: Identificar o conhecimento e a percepção dos profissionais da saúde em relação à legislação brasileira
sobre o aborto provocado. Métodos: Envelopes selados não identificados contendo os questionários foram enviados
a todos os profissionais (n=149) que trabalham no Departamento de Obstetrícia de hospital universitário e de hospital
público da periferia de São Paulo. Responderam ao questionário 119 profissionais. Para análise dos dados, utilizou-se
intervalo de confiança de 0,05 e os testes exatos de Fischer e c2. Resultados: Dos profissionais entrevistados, 48,7%
eram médicos, 33,6% profissionais da área de enfermagem e 17,6% eram profissionais de outras áreas (psicólogos,
nutricionistas, fisioterapeutas, administrativos e técnicos de laboratórios). Constatou-se diferença significativa (p=0,01)
na proporção de profissionais que acreditam que o aborto por malformação fetal não letal e no aborto decorrente
de gestações não planejadas deveriam ser incluídos na legislação brasileira. Observou-se que o conhecimento
da legislação e da descrição das situações permitidas por lei acerca do aborto foi significativamente diferente na
comparação entre os profissionais de saúde (p=0,01). Quando questionados sobre as situações em que a legislação
brasileira permite o aborto, observou-se que 32,7% dos médicos, 97,5% profissionais da área de enfermagem e
90,5% dos demais profissionais desconhecem a legislação vigente. Conclusão: Neste estudo, evidenciou-se o
desconhecimento dos profissionais de saúde com relação à legislação brasileira, em menor proporção entre obstetras
e em maior proporção entre os profissionais da área de enfermagem. Foram constatadas atitudes de discriminação,
julgamento e preconceito na assistência prestada às mulheres que provocam o aborto.
Abstract
Purpose: To identify the knowledge and awareness of health professionals regarding the Brazilian legislation on
induced abortion. Methods: Unidentified sealed envelopes containing the questionnaires were sent to all professionals
(n=149) working in the Obstetrics Department of a university hospital and public hospital at the periphery of São Paulo
(SP), Brazil. A total of 119 professionals responded to the questionnaire. The 0.05 confidence interval and the Fisher
exact test and χ2 test were used for data analysis. Results: Of the respondents, 48.7% were physicians, 33.6% were
nursing professionals and 17.6% were professionals from other fields (psychologists, nutritionists, physiotherapists,
laboratory technicians and administrators). There was a significant difference (p=0.01) in the proportion of professionals
who believe that abortion for non-lethal fetal malformation and due to unplanned pregnancies should be included in
the Brazilian legislation. It was observed that the knowledge about the law and the description of the circumstances
allowed by law on abortion was significantly different when comparing health professionals (p=0.01). When asked
about the situations in which Brazilian law allows abortion, 32.7% of physicians, 97.5% of nursing professionals and
90.5% of other professionals were unaware of the law. Conclusion: This study demonstrated the lack of of knowledge
of Brazilian law among health professionals, to a lesser extent among obstetricians and a to a greater extent among
nursing professionals. Attitudes of discrimination and prejudice were observed regarding the care provided to women
who induce an abortion.
Correspondência
Gláucia Rosana Guerra Benute
Avenida Dr. Enéas de Carvalho Aguiar 155 – PAMB – andar térreo
CEP: 05403-000
São Paulo (SP), Brasil
Recebido
26/08/2011
Aceito com modificações
13/12/2011
Trabalho realizado na Clínica Obstétrica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – USP –
São Paulo (SP), Brasil.
1
Serviço de Saúde da Divisão de Psicologia do Instituto Central da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – USP –
São Paulo (SP), Brasil.
2
Divisão de Psicologia e Clínica Obstétrica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – USP
– São Paulo (SP), Brasil.
3
Departamento de Obstetrícia e Ginecologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – USP – São Paulo (SP),
Brasil.
4
Divisão de Psicologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – USP – São Paulo (SP),
Brasil.
5
Departamento de Obstetrícia e Ginecologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo –
USP – São Paulo (SP), Brasil.
Benute GRG, Nonnenmacher D, Nomura RMY, Lucia MCS, Zugaib M
Introdução
O aborto provocado é reconhecido como um problema de saúde pública em todo o mundo, decorrente
do alto índice de mortalidade materna associada à sua
realização1,2. Dos 20 milhões de abortos inseguros que
anualmente ocorrem no mundo com complicações ou
sequelas irreversíveis, 97% acontecem em países em
desenvolvimento3.
Apesar das restrições legais, das condenações sociais,
morais e religiosas e da alta mortalidade materna, o aborto
continua existindo, ocasionando 15% do total das mortes
maternas que ocorrem no mundo, por ano4-7.
No Brasil, o aborto é responsável por 11,4% do
total de mortes maternas e 17% das causas obstétricas
diretas, com parcela significativa decorrente do aborto
provocado6. Esse índice pode ser ainda maior, pois não
existem estatísticas oficiais e nem estudos com base
populacional, dificultando a avaliação da magnitude do
problema no país.
O aborto é um tema que está vinculado à vivência
reprodutiva da mulher, incluído nas políticas públicas de
saúde, nos programas de atenção à saúde da mulher para
atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS). Está também incluído na formação acadêmica dos profissionais da
área da saúde, em especial da medicina e da enfermagem.
No entanto, embora faça parte da preparação profissional,
a abordagem ainda é influenciada por questões morais,
sociais e religiosas que trazem dificuldades para a aceitação
do tema e, consequentemente, para a assistência prestada,
que acaba sendo norteada pela concepção de que o aborto é um crime, sem referenciar os direitos reprodutivos
ou as questões sociais que incluem a problemática da
clandestinidade8,9.
No Brasil, a legislação acerca do aborto é contemplada no Artigo 128 do Código Penal10 de 1940 e
exime da condição de crime à interrupção da gravidez
quando resultante de estupro (e o aborto é precedido
do consentimento da gestante, ou, quando incapaz, de
seu representante legal) e em casos de risco de vida à
gestante. Nos casos de anomalia fetal incompatível com
a vida, embora não esteja contemplado na legislação
como aborto legal, a interrupção da gravidez pode ser
solicitada caso haja interesse da gestante, mediante
autorização judicial.
Considerando que a atitude dos médicos pode
ser obstáculo importante para que as mulheres que
cumprem os requisitos legais obtenham um aborto em
hospital público, Faúndes et al.11 realizaram estudo
com objetivo de avaliar a opinião e o conhecimento
dos médicos sobre o aborto. Concluíram que, de modo
geral, tem havido maior reflexão sobre a problemática
do aborto, mas evidenciaram a necessidade de informar
70
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):69-73
corretamente os ginecologistas e obstetras sobre as leis
e normas que regulamentam a prática do aborto legal
no país, visando assegurar que as mulheres tenham, de
fato, acesso a esse direito.
Considera-se que a ampliação desse conhecimento para
todos os profissionais que atuam em obstetrícia e que lidam
de modo direto ou indireto com as mulheres que provocaram
o aborto permitirá a adequação do atendimento voltado
para a assistência integral à saúde da mulher.
Desse modo, este estudo teve como objetivo verificar o
conhecimento acerca da legislação brasileira e da percepção
dos profissionais que atuam em obstetrícia relacionadas
ao aborto provocado.
Métodos
Trata-se de estudo prospectivo e transversal. Todos os
profissionais que atuam no Departamento de Obstetrícia
de um hospital universitário e de um hospital público da
periferia de São Paulo (SP) foram convidados a participar.
O estudo foi previamente aprovado pelo Comitê de Ética
em Pesquisa das instituições envolvidas.
Para a coleta dos dados, foi utilizado um questionário, entregue em envelope fechado. Foi solicitado que os
profissionais preenchessem o questionário e depositassem o
envelope lacrado em urna específica para tal fim, colocada
nos departamentos dos hospitais.
Foram entregues, ao todo, 149 questionários, tendo
retornado 119 deles. Para garantir a participação voluntária
e anônima, os participantes foram informados de que a
devolutiva do questionário respondido seria compreendida
como consentimento na participação do estudo.
O questionário continha dados de identificação (idade; profissão; tempo de formação e tempo de trabalho em
Obstetrícia), seis perguntas fechadas e uma questão aberta,
comum para todos os profissionais entrevistados, além de
uma questão fechada específica para médicos.
Dos 119 profissionais entrevistados, 48,7% eram
médicos; 33,6% eram profissionais da área de enfermagem
(auxiliares, técnicos e enfermeiros) e 17,6% eram profissionais
de outras áreas (psicólogos, nutricionistas, fisioterapeutas,
administrativos e técnicos de laboratórios).
A média do tempo de formação foi de 139 meses
(DP=119) e a média do tempo de trabalho em Obstetrícia
foi de 104 meses (DP=111). A questão aberta da entrevista foi analisada por meio
da Técnica de Análise de Conteúdo12. Todos os resultados
obtidos com a categorização foram, posteriormente, analisados com técnicas quantitativas por meio do programa
Statistical Package for the social Science for Windows
(versão 16.0). As variáveis foram analisadas descritivamente, calculando-se médias e desvios padrão, frequências
absolutas e relativas. Os dados categóricos e quantitativos
Influência da percepção dos profissionais quanto ao aborto provocado na atenção à saúde da mulher
foram avaliados pelo teste do c2, sendo adotado nível de
significância de 0,05.
Os resultados foram expostos de acordo com a categoria
do profissional, dividindo-se entre médicos, profissionais
da área de enfermagem e demais profissionais (psicólogos,
nutricionistas, fisioterapeutas, administrativos e técnicos
de laboratórios).
Resultados
Quando questionados sobre o que representaria para
a sociedade a liberalização do aborto no Brasil, 72,4%
dos médicos, 57,5% dos profissionais de enfermagem
(auxiliares, técnicos e enfermeiros) e 68,4% dos demais
profissionais (psicólogos, nutricionistas, fisioterapeutas,
administrativos e técnicos de laboratórios) consideraram
um avanço para a sociedade.
A Tabela 1 apresenta os resultados relativos à opinião acerca de em quais situações o profissional acredita
que o aborto deveria ser permitido por lei. Constatou-se
diferença significativa na proporção de profissionais que
acreditam que o aborto por malformação fetal não letal e
no aborto decorrente de gestações não planejadas deveriam
ser incluídos na legislação brasileira.
O conhecimento autorreferido acerca da legislação
brasileira sobre o aborto e a existência de possibilidades
de interrupção da gravidez incluídas na lei encontram-se
apresentadas na Tabela 2. Observou-se que a distribuição
acerca do conhecimento da legislação e a descrição das
situações permitidas por lei acerca do aborto foi significativamente diferente na comparação entre os profissionais
de saúde.
Quando questionados sobre as situações em que a
legislação brasileira permite o aborto, considerou-se como
respostas adequadas aquelas que incluíram risco materno
e estupro, assim como aquelas que acrescentavam a solicitação de autorização judicial para os casos de malformação
fetal letal. Todas as demais respostas foram consideradas
como desconhecimento da legislação vigente.
Quando questionados se acreditam que as pessoas
de seu trabalho tratavam as mulheres que provocaram
aborto com discriminação, 50% dos médicos, 7,5%
dos profissionais da enfermagem e 14,3% dos demais
profissionais acreditam que as mulheres que provocaram
aborto são tratadas com discriminação. No entanto, a
maior parte dos profissionais da enfermagem e dos demais
profissionais entregaram o questionário sem responder
a essa questão (75 e 80,9%, respectivamente). Com
relação ao profissional que observaram a discriminação
com relação à mulher que provocou o aborto, tem-se
que 88,6% indicou a categoria médica, 80% os profissionais da enfermagem e 5,7% demais profissionais da
área de saúde.
Foi solicitado que os médicos apontassem em quais
situações eles realizariam, pessoalmente, o aborto, caso a
legislação brasileira autorizasse sua realização independentemente do motivo. Foram referidas as situações de
estupro (51,7%), malformação fetal letal (62,1%) e risco
materno (65,5%).
Tabela 1. Opinião pessoal sobre em quais situações o aborto deveria ser permitido por
lei. Comparação entre profissionais médicos e não médicos
Situações de aborto
Médico
Enfermagem
Demais
profissionais
n
%
n
%
n
%
Sim
52
89,7
34
85,0
20
95,2
Não
6
10,3
6
15,0
1
4,8
Sim
36
62,0
8
20,0
5
23,8
Não
22
37,9
32
80,0
16
76,2
Sim
51
87,9
34
85,0
20
95,2
Não
7
12,1
6
15,0
1
4,8
Sim
31
53,4
34
85,0
7
33,3
Não
27
46,5
6
15,0
14
66,7
Sim
55
94,8
32
80,0
18
85,7
Não
3
05,2
8
20,0
3
14,2
Valor p
Estupro
0,4
Malformação fetal
0,01
Malformação fetal letal
0,4
Gestação não desejada
0,01
Risco materno
0,07
Teste do χ2.
Tabela 2. Conhecimento da legislação brasileira sobre o aborto: autoavaliação e especificação
em quais situações o aborto é permitido por lei. Avaliação da pertinência das respostas e
comparação dos dados entre profissionais da saúde
Médico
Enfermagem
n
%
n
%
Sim
44
75,9
17
Não
14
24,1
23
Sim
55
94,8
Não
3
5,2
Risco materno e estupro
37
Risco materno, estupro
e autorização judicial
quando MFL
2
Desconhece a legislação
vigente
19
Demais
profissionais
Valor p
n
%
42,5
4
19,0
57,5
17
80,9
33
82,5
21
100,0
7
17,5
0
-
63,8
1
02,5
02
9,5
0,01
3,4
0
00,0
0
-
0,34
32,7
39
97,5
19
90,5
0,01
Acredita ter pleno
conhecimento da
legislação?
0,01
A legislação brasileira
permite a legalização
do aborto em alguma
situação específica?
0,01
Em que situações a
legislação brasileira
permite o aborto?
Teste do χ2.
MFL: malformação fetal letal.
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):69-73
71
Benute GRG, Nonnenmacher D, Nomura RMY, Lucia MCS, Zugaib M
Discussão
Os elevados índices de morte materna decorrente
do aborto ilegal13 fazem necessário que profissionais
atuantes na área da saúde se atualizem e repensem
constantemente as questões referentes ao aborto.
Os profissionais que atuam em Obstetrícia muitas
vezes não conseguem esconder a contrariedade diante da
situação do aborto, propiciando assistência pautada no
julgamento, na punição, na raiva e na discriminação.
Ao se analisar a percepção de profissionais de enfermagem de uma maternidade pública de Salvador (BA)
sobre a assistência prestada à mulher em processo de
aborto provocado, constatou-se que esses profissionais
entendem o aborto como crime e que a assistência
prestada é discriminatória, mesmo nos casos de aborto
previstos em lei14. Faúndes et al.11 apontam que, em
1996, foram evidenciadas as dificuldades enfrentadas
por entidades públicas para a implementação de programas de assistência às vítimas de violência sexual,
particularmente no que diz respeito à interrupção
legal da gestação, por dificuldade de aceitação dos
profissionais de saúde.
Em relação à liberalização do aborto, o estudo
aponta que a maior parte dos profissionais considerou que o aborto também deveria ser realizado em
situações de malformações fetais letais. Nesse estudo,
constatou-se que apenas os profissionais médicos
consideraram o aborto viável em circunstâncias nas
quais a gestação não é planejada ou mesmo em casos
de malformações fetais não letais. No entanto, médicos, quando questionados em que situações eles
realizariam o aborto, mencionaram as situações já
previstas na legislação, incluindo apenas os casos de
malformações fetais incompatíveis com a vida extrauterina. Faúndes et al. 13 observaram que, quando
questionados sobre a realização do aborto, 40% dos
médicos mencionaram que ajudariam uma paciente
(indicariam um médico de confiança ou ensinariam
a usar o misoprostol) que solicitasse o aborto por
não desejar a gestação, mas apenas 2% desse médicos
declararam que o realizariam. Entretanto, ressalta-se
que quando a questão foi dirigida a situações em que
a própria mulher (médica) ou a parceira do homem
(médico) estivesse na situação de uma gravidez indesejada, a porcentagem que praticaria o aborto foi de
77,6 e 79,9%, respectivamente. Nos atendimentos
decorrentes do aborto inseguro, o preparo da equipe
72
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):69-73
deve ir além do preparo técnico, estando vinculado às
reações emocionais e à maneira de abordá-las. Lunardi
e Simões 15, ao investigarem as reações da equipe de
enfermagem frente à possibilidade de participação em
aborto legal evidenciaram ausência de conhecimento
da legislação diante dos trâmites necessários para sua
realização. A avaliação do conhecimento, da opinião
e da conduta de obstetras e ginecologistas sobre o
aborto induzido e a legislação constatou que 93% dos
médicos responderam corretamente que a lei brasileira não pune o aborto quando a gravidez é resultado
de estupro, sendo que 90% também mencionou os
casos de risco de vida materno; porém cerca de um
terço respondeu inadequadamente, afirmando que a
legislação não penalizava o aborto quando o feto fosse
acometido por malformações graves13.
Esse estudo constatou deficiência inegável por parte
dos profissionais da saúde quanto ao conhecimento dos
preceitos legais que regulam o aborto no Brasil, dificultando o cumprimento da lei em hospitais e serviços
de saúde e interferindo na qualidade do atendimento
prestado às pacientes que abortam.
A competência técnica dos profissionais é ameaçada quando existe dificuldade de interação com
as pacientes, principalmente quando os problemas
de saúde são estigmatizados dentro da sociedade16.
Assim, o preconceito e a interferência de crenças pessoais no tratamento das pacientes possibilitam que o
atendimento seja realizado em função das necessidades
físicas, negligenciando o suporte emocional ou mesmo
orientações educativas17,18. Nery et al.19 aponta que,
nas situações de aborto, são relevantes para as mulheres que o vivenciaram a afetividade e o interesse dos
profissionais vinculados aos procedimentos técnicos16,
pois tal conduta tem repercussões positivas no estado
emocional das pacientes.
Para que a assistência integral à saúde da mulher,
tal como proposta no SUS, possa ocorrer, torna-se de
fundamental relevância que os profissionais estejam
integrados tanto com os aspectos técnicos, éticos e jurídicos do aborto, quanto com seus aspectos subjetivos,
evitando o julgamento, o preconceito e propiciando
mais do que a técnica, a interação, a afetividade, o
acolhimento. Neste estudo, evidenciou-se o desconhecimento dos profissionais de saúde com relação à
legislação brasileira, em proporção inferior entre obstetras e em proporção superior entre os profissionais
da área de enfermagem.
Influência da percepção dos profissionais quanto ao aborto provocado na atenção à saúde da mulher
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Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):69-73
73
Ana Gabriela Pontes1
Marta Francis Benevides Rehme2
Anice Maria Vieira de Camargo Martins1
Maria Thereza Albuquerque Barbosa Cabral Micussi3
Técia Maria de Oliveira Maranhão4
Walkyria de Paula Pimenta5
Anaglória Pontes6
Resistência à insulina em mulheres com
síndrome dos ovários policísticos: relação com
as variáveis antropométricas e bioquímicas
Insulin resistance in women with polycystic ovary syndrome:
relationship with anthropometric and biochemical variables
Artigo Original
Resumo
Palavras-chave
Síndrome do ovário policístico
Resistência à insulina
Obesidade
Índice de massa corporal
Keywords
Polycystic ovary syndrome
Insulin resistance
Obesity
Body mass index
OBJETIVO: Analisar a prevalência de resistência à insulina de acordo com diferentes medidas antropométricas e
bioquímicas em mulheres com síndrome dos ovários policísticos. MÉTODOS: Foram analisadas, retrospectivamente,
189 pacientes com síndrome dos ovários policísticos. O diagnóstico de resistência à insulina foi obtido utilizando-se
insulinemia, HOMA-IR, QUICKI, índice de sensibilidade à insulina e relação glicemia/insulina. Foram utilizados o índice
de massa corpórea e o lipid accumulation product. Para análise dos resultados, aplicou-se a estatística descritiva, a
ANOVA, o pós-teste de Tukey e a correlação de Pearson. RESULTADOS: As pacientes apresentaram média de idade
de 24,9±5,2 e de índice de massa corpórea de 31,8±7,6. O percentual de pacientes obesas foi de 57,14%.
Dentre os métodos de investigação de resistência à insulina, o índice de sensibilidade à insulina foi a técnica que
mais detectou (56,4%) a presença de resistência à insulina nas mulheres com síndrome dos ovários policísticos. Em
87% das pacientes obesas, detectou-se a resistência à insulina. A relação glicemia/insulinemia de jejum e o índice
de sensibilidade à insulina apresentaram correlação forte com o lipid accumulation product. CONCLUSÃO: A
prevalência de resistência à insulina variou de acordo com o método utilizado e foi maior quanto maior o índice de
massa corpórea. O lipid accumulation product também está relacionado à resistência à insulina.
Abstract
PURPOSE: To analyze the prevalence of insulin resistance, according to different biochemical and anthropometric
measurements in women with polycystic ovary syndrome. METHODS: A total of 189 patients with polycystic ovary
syndrome were retrospectively analyzed. Insulin resistance diagnosis was performed using fasting insulin, HOMA-IR,
QUICKI, insulin sensibility index and glucose/fasting insulin ratio. Body mass index and lipid accumulation product
were used. Data were analyzed statistically by descriptive statistics, ANOVA, Tukey post-test, and Pearson’s correlation.
RESULTS: The polycystic ovary syndrome patients had a mean age of 24.9±5.2 and a mean body mass index of
31.8±7.6. The percentage of obese patients was 57.14%. Among the methods of insulin resistance investigation, the
insulin sensibility index was the technique that most detected (56.4%) the presence of insulin resistance in women with
polycystic ovary syndrome. The insulin resistance was detected in 87% of obese patients. The fasting glucose/fasting
insulin ratio and insulin sensibility index were strongly correlated with lipid accumulation product. CONCLUSION: The
prevalence of insulin resistance varied according to the method used, and it was greater the higher the body mass
index. Lipid accumulation product was also related to insulin resistance.
Correspondência:
Maria Thereza Albuquerque Barbosa Cabral Micussi.
Avenida General Gustavo Cordeiro de Farias, s/n – Petropólis
CEP: 59010-180
Natal (RN), Brasil
Recebido
12/12/2011
Aceito com modificações
16/01/2012
Trabalho realizado na Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – UNESP –
Botucatu (SP), Brasil.
1
Programa de Pós-graduação da Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” –
UNESP – Botucatu (SP), Brasil.
2
Departamento de Tocoginecologia da Universidade Federal do Paraná – UFPR – Curitiba (PR), Brasil.
3
Departamento de Fisioterapia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN – Natal (RN), Brasil.
4
Departamento de Tocoginecologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN – Natal (RN), Brasil.
5
Departamento de Clínica Médica da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – UNESP – Botucatu (SP), Brasil.
6
Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual Paulista “Júlio de
Mesquita Filho” – UNESP – Botucatu (SP), Brasil.
Conflito de interesses: não há.
Resistência à insulina em mulheres com síndrome dos ovários policísticos: relação com as variáveis antropométricas e bioquímicas
Introdução
A síndrome dos ovários policísticos (SOP) é considerada a endocrinopatia mais comum durante a vida
reprodutiva da mulher, com prevalência que varia entre 5
a 10% das mulheres em idade fértil1. É caracterizada por
anovulação crônica e hiperandrogenismo, apresentando
fisiopatogenia complexa de caráter multifatorial2,3. Vários
estudos confirmam a hipótese de que a resistência à insulina
(RI) e a hiperinsulinemia desenvolvem papel patogênico
na SOP e parece ser um importante marcador de doença
metabólica, com risco cardiovascular2,3.
Os mecanismos envolvidos na RI são complexos, com
contribuições genética e ambiental. As anormalidades no
metabolismo da insulina identificadas na SOP são específicas e
incluem redução na secreção, excreção hepática e na sinalização
dos receptores de insulina4. A RI pode ser definida como um
estado metabólico, no qual o mecanismo de homeostase da
glicose normal falha em funcionar de forma adequada4.
Em 1980, Burghen, Givens e Kitabchi5 descreveram
pela primeira vez a relação entre RI e SOP, e estudos posteriores demonstraram que a RI é uma característica da
SOP com frequência estimada de 50 a 90%4,6-8. Também
demonstraram que a presença de RI ocorre independente
do índice de massa corpórea (IMC)9-12.
A frequência da RI varia de acordo com a população
analisada, na SOP, apresenta valores superiores aos da
população em geral6,7,9. A prevalência da RI variou de
64% em americanas7 a 79,2%, em italianas6. No Brasil, a
prevalência da RI observada em mulheres com SOP variou
de 33,0 a 70,5%, de acordo com o método de avaliação
à insulina utilizada8,13.
Embora o método considerado padrão-ouro para a
avaliação da sensibilidade à insulina seja o clamp euglicêmico hiperinsulinêmico, este é muito invasivo, complexo,
demorado e dispendioso, não sendo viável para aplicação
na prática clínica14. Métodos indiretos de investigação
de RI têm sido utilizados para rotina, devido à facilidade de
realização e menor custo15. São eles: índice de sensibilidade
à insulina (ISI), descrito por Matsuda e DeFronzo16 (que
utiliza o teste de tolerância à glicose oral); insulinemia de
jejum; relação glicemia/insulinemia de jejum; HOMA-IR
(homeostasis model assessment for insulin resistance) e QUICKI
(quantitative insulin sensitivity check index), que são baseados na glicemia e/ou insulinemia de jejum. Portanto, o
objetivo do presente estudo foi analisar a prevalência da
RI de acordo com as diferentes medidas antropométricas
e bioquímicas em mulheres com SOP.
Métodos
Foram incluídas, retrospectivamente, 189 pacientes com o diagnóstico de SOP, acompanhadas no
Ambulatório de Ginecologia Endócrina do Hospital
das Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu,
no período de 1997 a 2007. Foram incluídas mulheres
com idades compreendidas entre 16 a 40 anos e diagnosticadas com SOP, de acordo com os critérios estabelecidos pelo Consenso de Rotterdam17. Este estudo
foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP)
do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de
Botucatu, em 01 de março de 2004.
Foram excluídas: pacientes com intolerância à glicose
(IG); diabéticas; que apresentassem outras doenças, que
cursavam com anovulação crônica e/ou hiperandrogenismo
(hiperprolactinemia, distúrbios da tireoide, hiperplasia
adrenal congênita de início tardio, Síndrome de Cushing
e tumores produtores de androgênios de origem adrenal
ou ovariana); e as que estivessem em uso de qualquer
medicação que interferisse no eixo hipotálamo-hipófiseovário há menos de 90 dias.
Foram analisados: o padrão menstrual, no qual a
amenorreia foi definida por ausência de menstruação
por, no mínimo, 3 meses, e a oligomenorreia por menstruações com intervalos maiores que 35 e inferiores a
90 dias; o Índice de Ferriman-Gallwey modificado18
(considerada hirsuta quando o somatório das áreas fosse
maior ou igual a 8); acantosis nigricans foi pesquisada em
regiões de dobras como a nuca, axila, região inframamária e raiz de coxas19 e acne classificada em três graus20.
A circunferência da cintura foi obtida considerando
como medida da cintura a menor circunferência entre
o rebordo costal e a crista ilíaca, com limite de corte
de 88 cm21. O IMC foi calculado por meio do índice
de Quetelet22, cujo valor é obtido pela razão peso e
estatura2, considerando-se peso normal se os valores
estivessem entre 18,5 e 24,9, sobrepeso entre 25,01 e
29,9 e obesidade acima de 30 kg/m2. A pressão arterial
foi aferida utilizando a técnica recomendada por Perloff
et al.23. Foram diagnosticadas como hipertensas as pacientes que apresentaram pressão arterial sistólica maior
ou igual a 130 mmHg e/ou pressão arterial diastólica
igual ou superior a 85 mmHg, ou as que estivessem
em uso de anti-hipertensivos24.
Os valores de testosterona total plasmática foram
obtidos pelo método de quimioluminescência no equipamento Immulite 2000 (Diagnostic Products Corporation
– Los Angeles CA, EUA) e com valor de normalidade de
até 80 ng/dL.
O teste de tolerância à glicose oral (TTGO) foi
realizado administrando-se 75 g de glicose anidra, sem
restrição calórica, por via oral, dissolvida em 300 mL de
água, entre 8 e 9 horas da manhã, após jejum noturno de
12 horas. O líquido foi ingerido em um tempo máximo
de cinco minutos. Amostras de sangue para dosagem de
glicemia e insulina foram obtidas, imediatamente, antes
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):74-9
75
Pontes AG, , Rehme MFB, Martins AMVC, , Micussi MTABC, Maranhão TMO, Walkyria de Paula Pimenta WP, Pontes A
e após 30, 60, 90 e 120 minutos de ingestão de glicose
por via oral. A concentração plasmática de glicose foi
determinada pelo teste enzimático calorimétrico da glicose – oxidase no equipamento Vitrus, modelo 950, e o
resultado expresso em mg/dL. A insulina foi dosada pelo
método de quimioluminescência no aparelho Immulite
2000, em valores expressos em µUI/mL.
Foram realizadas dosagens do colesterol total, HDLcolesterol, LDL-colesterol e triglicerídeos, utilizando-se o
método de química seca, no equipamento Vitrus, modelo
950, da marca Johnson e Johnson. Considerou-se como
valores normais, colesterol total igual ou abaixo a 200
mg/dL, HDL-colesterol maior ou igual a 50 mg/dL,
LDL-colesterol abaixo de 100 mg/dL e triglicerídeos
abaixo de 150 mg/dL24.
Tabela 1. Características clínicas e bioquímicas das pacientes com síndrome dos ovários
policísticos
Parâmetro
Média (±DP)
Referência
Idade (anos)
24,9±5,2
-
Peso (kg)
81,5±21,3
-
IMC
31,8±7,6
18,5–24,9 kg/m2
Pressão arterial sistólica
116,3±14,4
<130 mmHg
Pressão arterial diastólica
75,1±10,4
<85 mmHg
Circunferência da cintura
92,2±16,0
<88 cm
Índice de Ferriman-Gallwey
11,0±6,0
<8
Testosterona total
98,4±46,2
<80 ng/dL
Colesterol total
182,6±34,8
≤200 mg/dL
LDL-C
111,9±29,7
<100 mg/dL
HDL-C
46,7±12,9
≥50 mg/dL
Triglicerídeos
126,7±80,9
<150 mg/dL
Glicemia de jejum
87,8±6,8
<100 mg/dL
Glicemia aos 120 minutos
99,2±21,3
<140 mg/dL
DP: desvio padrão; IMC: índice de massa corpórea; LDL: low-density cholesterol;
HDL: high-density cholesterol.
Tabela 2. Frequência de resistência à insulina entre as 189 mulheres com síndrome dos
ovários policísticos de acordo com os diferentes métodos
Métodos
SOP
n
%
Insulinemia de jejum (>12 μIU/mL)
93
49,5
G/I (<6,4)
79
42,0
HOMA-IR (>2,71)
87
46,3
QUICKI (<0,333)
87
46,3
106
56,4
ISI (<4,75)
G/I: razão entre glicemia de jejum/insulinemia de jejum; HOMA-IR: homeostasis
model assessment-insulin resistance; ISI: índice de sensibilidade à insulina; QUICKI:
quantitative-insulin-sensitivity check index.
76
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):74-9
Para diagnóstico da RI, foram utilizadas a insulinemia
de jejum, relação glicemia de jejum/insulinemia de jejum,
índice de HOMA-IR, QUICKI e ISI. Considerou-se RI
quando a insulinemia basal era superior a 12 µIU/mL6, e a
relação glicemia de jejum/insulinemia de jejum apresentou
valores inferiores a 6,4 µIU/mL6.
O índice de HOMA-IR foi calculado pelo modelo
matemático descrito por Matthews et al.25, aplicando-se a
seguinte equação: HOMA-IR=glicemia de jejum (mg/dL)
versus insulina (µIU/mL)/405. A RI foi considerada quando
os valores de HOMA-IR foram maiores que 2,71, de acordo
com a distribuição de valores para a população brasileira
normal26. O índice de QUICKI foi determinado pela fórmula: QUICKI=1/ (log insulina(µIU/mL)+log glicemia
(mg/dL). Considerou-se RI aqueles valores inferiores a
0,336. O ISI foi obtido pela equação expressa da divisão
de 10.000 pela raiz quadrada do produto da glicemia e
insulina de jejum, multiplicado pelo produto das médias
da glicemia e insulina nos tempos 0, 30, 60, 90, e 120
minutos. A RI foi considerada quando os valores do ISI
foram menores que 4,7516.
Utilizando uma medida antropométrica (circunferência
da cintura) e outra bioquímica (concentração de triglicerídeos), avaliou-se o lipid accumulation product (LAP). Sua
determinação em mulheres é dada pela seguinte equação:
(circunferência da cintura [cm] - 58) x (triglicerídeos
[mmol/L])3, com o objetivo de rastrear os riscos de RI,
doença cardiovasculares e diabetes melito do tipo 227.
Para a análise dos resultados, foram utilizadas as
médias, o desvio padrão e as frequências. Para as variáveis
quantitativas, foi utilizada a análise de variância, seguida
do método de Tukey. A correlação de Pearson foi utilizada
para relacionar a RI com IMC e o LAP. O nível de significância, adotado nos procedimentos estatísticos, foi de
95% de confiança. A análise estatística foi feita utilizando
o programa Statistical Analysis System (SAS), for Windows,
versão 9.1.3. (SAS, Inc. North-Caroline-Cary).
Resultados
As características clínicas e bioquímicas das pacientes
estudadas podem ser visualizadas na Tabela 1. Em relação
ao padrão menstrual, 77,8% apresentaram amenorreia,
20,1% oligomenorreia e 2,1% ciclo menstrual normal.
O hirsutismo esteve presente em 72% das pacientes, a
acantosis nigricans em 44,7% e a acne em 38,8%. A hiperandrogenemia ocorreu em 65% das pacientes.
A frequência de RI variou de 42 a 56,4%, de acordo
com os diferentes métodos utilizados. O ISI foi o método
que mais detectou a RI entre as pacientes (56,4%), seguido
da insulinemia de jejum (49,6%), QUICKI e HOMA-IR
(46,3%) e a relação glicemia e insulinemia de jejum (42%),
como pode ser visto na Tabela 2.
Resistência à insulina em mulheres com síndrome dos ovários policísticos: relação com as variáveis antropométricas e bioquímicas
Tabela 3. Frequência de resistência à insulina de acordo com o índice de massa corpórea em mulheres com síndrome dos ovários policísticos
Peso normal
37
Métodos indiretos de RI
Sobrepeso
44
Obesidade
108
Valor p
n
%
n
%
n
%
Insulinemia jejum >12 mµI/mL
7
19b
20
45b
87
80a
0,0001
G/I <6,4
5
c
14
18
41
75
69
<0,0001
HOMA-IR >2,71
5
b
14
QUICKI <0,333
ISI <4,75
b
a
16
36
85
78
<0,0001
5
c
14
16
b
36
85
a
78
<0,0001
10
27c
25
57b
95
87a
<0,0001
b
a
RI: resistência à insulina; ANOVA e pós-teste de Tukey: p<0,05 estatisticamente significante;
médias com mesma letra não diferem estatisticamente; G/I: razão entre
glicemia de jejum/insulina de jejum; HOMA-IR: homeostasis model assessment-insulin resistance; ISI: índice de sensibilidade à insulina; QUICKI: quantitative-insulinsensitivity check index.
a,b,c
Tabela 4. Correlação entre as medidas antropométricas e bioquímica com os métodos de diagnóstico para resistência à insulina
Métodos indiretos de RI
LAP
CC
IMC
r
valor p
r
valor p
r
valor p
Insulinemia jejum >12 mµI/mL
0,1
0,05
0,4
<0,001*
0,4
<0,001*
G/I <6,4
-0,3
<0,001*
-0,3
<0,002*
-0,4
<0,001*
HOMA-IR >2,71
0,1
0,1
-0,06
0,05
0,3
<0,002*
0,1
-0,06
0,05
0,3
<0,002*
0,05
0, 5
-0,3
<0,0001*
QUICKI <0,333
0,1
ISI <4,75
-0,2
<0,001*
RI: resistência à insulina; correlação de Pearson (r): p<0,05 estatisticamente significante; G/I: razão entre glicemia de jejum/insulina de jejum; HOMA-IR: homeostasis model
assessment-insulin resistance; ISI: índice de sensibilidade à insulina; QUICKI: quantitative-insulin-sensitivity check index.
A prevalência de RI nas mulheres com SOP, de
acordo com o IMC, pode ser visualizada na Tabela 3. A
prevalência de RI nas pacientes obesas foi significativamente maior quando comparada com as com sobrepeso
e peso normal.
Dentre os métodos de detecção de RI, somente a relação glicemia/insulinemia de jejum e o ISI apresentaram
correlação forte com o LAP. A relação glicemia/insulinemia de jejum também apresentou correlação forte com a
circunferência da cintura. O IMC apresentou correlação
significativa com os métodos de avaliação indireta da RI
(Tabela 4).
Discussão
Os resultados do presente estudo confirmam que a
SOP é um distúrbio heterogêneo, com ampla variabilidade
clínica e bioquímica e que acomete mulheres em idade
reprodutiva6,28. As pacientes apresentaram média etária
de 24,9±5,2 anos com IMC de 31,8±7,6 kg/m2, ou seja,
muito jovens, como nos estudos prévios que avaliaram a
RI na SOP6-8,11,13,29,30.
A obesidade isoladamente é caracterizada como um
fator de risco para o desenvolvimento da RI. Dunaif31,
estudando a sensibilidade e a RI em portadoras da SOP,
tanto entre as com peso normal quanto nas obesas,
decorre de um defeito intrínseco do receptor insulínico,
caracterizado pelo aumento da fosforilação da serina31. O
agravamento da RI pela obesidade é explicável pelo fato
de o tecido adiposo ser um órgão endócrino capaz de secretar diversas substâncias que interferem no metabolismo
dos carboidratos e lipídios. A coexistência da SOP com
a obesidade exerce um efeito sinérgico e deletério sobre
o metabolismo da glicose29-31.
Neste estudo foi verificada uma prevalência de RI que
variou entre 42 a 56,4%, utilizando-se cinco critérios para
estimar a sensibilidade à insulina e baseados nos pontos de
corte utilizados por Carmina e Lobo6 para a insulinemia
de jejum, relação glicemia de jejum/insulinemia de jejum,
QUICKI e ISI e, por Geloneze et al.26, para o HOMA-IR.
Os resultados mostram que os cinco critérios utilizados,
com maior ou menor acurácia, possibilitam confirmar
que a RI é comum em pacientes com SOP. Todavia, ao
se correlacionar a RI de acordo com o IMC, observou-se
que a frequência de RI aumenta progressivamente com
o IMC.
O ISI foi o que mais detectou RI (27% entre as com
peso normal, 57% entre as com sobrepeso e 87% entre as
obesas com SOP). Esse índice é o que melhor representa
o padrão de sensibilidade hepática e periférica à insulina,
dentre os métodos utilizados, e mostra boa correlação
com a técnica do clamp euglicêmico por realizar várias
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):74-9
77
Pontes AG, , Rehme MFB, Martins AMVC, , Micussi MTABC, Maranhão TMO, Walkyria de Paula Pimenta WP, Pontes A
medidas e não apenas uma de jejum, as quais podem levar
a resultados falso-negativos16.
Mulheres obesas com SOP foram as que apresentaram maior RI, independente do método utilizado, com
uma variação de 69% pela relação glicemia e insulinemia
de jejum a 87% pelo ISI. É importante salientar que a
RI detectada pelo HOMA-IR e QUICKI apresentou o
mesmo percentual. Neste estudo, mostrou-se que ambos
os métodos podem ser utilizados indistintamente para
avaliação da RI, independente do IMC.
Como neste estudo, Hayashida et al., em 200413, observaram, em 62 pacientes com SOP com média de idade
de 25 anos, um aumento significativo na RI com o aumento
do IMC e do percentual semelhante de RI detectado pelo
HOMA-IR e QUICKI. Em outro estudo8, com 105 mulheres
brasileiras com SOP com média etária de 23,8±5,8 anos
e média de IMC de 27,8±7,4 kg/m2, observou-se variação
na prevalência de RI de 44,8 a 51,4% quando utilizaram,
respectivamente, a insulinemia, QUICKI e HOMA-IR.
A variação foi de 64,8 a 70,5% quando se utilizou o ISI
e a área sob a curva de insulina. Além disso, observou-se
boa concordância entre o ISI e os índices de HOMA-IR e
QUICKI, reafirmando dados da literatura que consideram
estes métodos de avaliação de RI aplicáveis na prática clínica e em estudos populacionais, por serem mais simples
e menos dispendiosos14,15,32,33.
Algumas críticas são mencionadas ao HOMA-IR e
QUICKI para se avaliar a RI. Tais métodos medem os
parâmetros basais de jejum e refletem a sensibilidade à
insulina no tecido hepático e, somente indiretamente,
nos tecidos periféricos26, embora tenha sido verificada correlação significativa com o clamp euglicêmico
hiperinsulinêmico25,34.
Os pontos de corte para o HOMA-IR variam entre os
diferentes estudos30,35. Os resultados do presente trabalho
utilizaram o valor de corte de 2,71 baseado na população
brasileira34, com média de idade de 40±12 anos e IMC
34±10 kg/m2. Deve-se levar em conta também a falta de
padronização entre os laboratórios para a dosagem de insulina. No presente estudo, a insulinemia de jejum mostrou
uma prevalência semelhante ao QUICKI e HOMA-IR,
utilizando-se o ponto de corte de 12 mUI/mL e não o de
20 mUI/mL padronizado para a população americana36.
Mesmo a insulinemia de jejum também sendo alvo de
várias críticas quanto à interpretação, devido ao fato de
ser um método indireto de avaliação da sensibilidade
tecidual e apresentar baixas correlações com a ação da
insulina in vivo26.
Como o IMC, o LAP também apresenta relação com a
RI. É de se esperar que as mulheres com SOP apresentem
maior quantidade de gordura abdominal e perfil lipídico
desfavorável em relação às hígidas37. Apresentaram, portanto, valores superiores para o LAP. Essa medida representa
um importante indicador não só de RI37, mas também
de risco cardiovascular, diabetes tipo 2 e mortalidade27.
Esses resultados têm particular importância quando se
considera que a RI pode ser influenciada por fatores étnicos
e raciais e por fatores hormonais e metabólicos, dentre
eles a obesidade26,38, sendo este um importante fator para
o desencadeamento da RI.
Os resultados do presente estudo, em consonância com
a literatura, confirmam que a prevalência de RI varia de
acordo com o método utilizado, e embora estes sejam de
fácil execução, não existe um método indireto ideal para
avaliação da RI. Apesar das limitações, o diagnóstico de
RI pode ser o primeiro marcador identificável de risco
para doença cardiovascular em pacientes com SOP. Desta
forma, mulheres com SOP obesas e com RI devem ser
orientadas quanto à perda de peso com reeducação alimentar e exercício físico regular, enquanto que aquelas com
peso normal seguem de forma precoce essas orientações
quanto aos hábitos de vida saudáveis.
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Ablação histeroscópica do endométrio:
resultados após seguimento clínico de 5 anos
Results of hysteroscopic endometrial ablation after five-year follow-up
Artigo Original
Resumo
Palavras-chave
Hemorragia uterina/terapia
Hemorragia uterina/complicações
Histeroscopia/métodos
Resultado de tratamento
Keywords
Uterine hemorrhage/therapy
Uterine hemorrhage/complications
Hysteroscopy/methods
Treatment outcome
OBJETIVO: Avaliar os resultados clínicos, após seguimento mínimo de 5 anos, de pacientes com sangramento uterino anormal
de etiologia benigna que realizaram ablação endometrial, analisando a taxa de sucesso do tratamento em relação ao método,
compreendida como satisfação da paciente e melhora do sangramento uterino anormal, bem como complicações tardias, fatores
associados e recorrência dos sintomas. MÉTODOS: Estudo transversal conduzido após período mínimo de 5 anos de cirurgia
em pacientes submetidas ao procedimento entre 1999 e 2004. Foram analisados os seguintes dados: faixa etária quando da
realização da cirurgia, complicações imediatas e tardias, e fatores associados. Foi utilizado o modelo de regressão logística
com cálculo da respectiva Odds Ratio (OR) para se observarem as possíveis associações existentes entre a taxa de sucesso
da cirurgia e as variáveis analisadas. RESULTADOS: Cento e quatorze pacientes foram submetidas à ablação endometrial no
período de Março de 1999 a Abril de 2004. O tempo mediano de seguimento foi de 82 meses. O modelo de regressão
logística permitiu a predição correta do sucesso da ablação endometrial em 80,6%. A idade relacionou-se diretamente com
o sucesso do procedimento (OR=1,2; p=0,003) e a ligadura tubária pregressa mostrou relação inversa com o sucesso
da ablação endometrial (OR=0,3; p=0,049). Dentre as pacientes com falha terapêutica, 21 (72,4%) foram tratadas com
histerectomia. Em uma das pacientes submetidas à histerectomia foi confirmada a presença de hidro-hematossalpinge ao exame
anatomopatológico, caracterizando a síndrome da ligadura tubária pós-ablação. CONCLUSÃO: A ablação endometrial tem
se mostrado uma opção de tratamento vantajosa, mantendo altos índices de satisfação das pacientes, mesmo em seguimentos
a longo prazo A idade quando da ablação endometrial influenciou no sucesso terapêutico e mais estudos são necessários
para avaliar os fatores que poderão futuramente influenciar na indicação do procedimento em casos selecionados.
Abstract
PURPOSE: To evaluate the clinical outcomes after a minimum period of 5 years of follow-up of patients with abnormal
uterine bleeding of benign etiology who underwent endometrial ablation, analyzing the success rate of treatment defined as
patient satisfaction and improvement in uterine abnormal bleeding, as well as late complications and factors associated with
recurrence of symptoms. METHODS: A cross-sectional survey was conducted after a minimum period of 5 years after surgery
in patients who underwent the procedure between 1999 and 2004. We analyzed the following data: age at the time of
surgery, immediate and late complications and associated factors. Logistic regression with Odds Ratio (OR) calculation was
performed to evaluate possible associations between the success rate of surgery and the analyzed variables. RESULTS: A
total of 114 patients underwent endometrial ablation between March 1999 and April 2004. The median follow-up was
82 months. The logistic regression model allowed the correct prediction of the success of endometrial ablation in 80.6% of
cases. Age was directly related to the success of the procedure (OR=1.2; p=0.003) and previous tubal ligation showed
a negative association with the success of endometrial ablation (OR=0.3; p=0.049). Among the patients with treatment
failure, 21 (72.4%) underwent hysterectomy. In one of the hysterectomy cases, hydro/hematosalpinx was confirmed by
the anatomopathological exam, characterizing the postablation-tubal sterilization syndrome. CONCLUSION: Endometrial
ablation has proven to be a worthwhile treatment option, maintaining high rates of patient satisfaction, even over long-term
follow-up. The age at endometrial ablation influenced the therapeutic success. Further studies are needed to evaluate the
factors that may influence the future indication for the procedure in selected cases.
Correspondência
Winny Hirome Takahashi
Rua Pedro de Toledo 1.800 – 4° andar –
Vila Clementino
CEP: 04029-000
São Paulo (SP), Brasil
Recebido
21/06/2011
Aceito com modificações
15/12/2011
Trabalho realizado no Serviço de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital do Servidor Público Estadual “Francisco Morato de Oliveira” –
HSPE-FMO – São Paulo (SP), Brasil.
1
Programa de Pós-graduação (Mestrado), Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Estadual – IAMSPE – São Paulo (SP),
Brasil.
2
Serviço de Ginecologia e Obstetrícia, Hospital do Servidor Público Estadual “Francisco Morato de Oliveira” – HSPE-FMO – São
Paulo (SP), Brasil.
3
Setor de Endoscopia Ginecológica, Hospital do Servidor Público Estadual “Francisco Morato de Oliveira” – HSPE-FMO – São Paulo
(SP), Brasil.
4
Hospital do Servidor Público Estadual “Francisco Morato de Oliveira” – HSPE-FMO – São Paulo (SP), Brasil.
Ablação histeroscópica do endométrio: resultados após seguimento clínico de 5 anos
Introdução
O sangramento uterino anormal é uma queixa comum
nas mulheres em idade reprodutiva e sua abordagem é,
muitas vezes, um desafio para o ginecologista. O tratamento clínico é a primeira opção, com resultados variáveis
e eventualmente transitórios1-3. A histerectomia é a única
terapêutica definitiva e uma das cirurgias mais realizadas
em todo o mundo.
A ablação endometrial surgiu como método alternativo para as pacientes com sangramento uterino
anormal de natureza benigna, no qual a histerectomia
era anteriormente a única opção. A principal indicação
da ablação endometrial é o sangramento uterino anormal
de origem benigna em mulheres com prole constituída,
que não respondem ao tratamento clínico ou apresentam
contraindicações ao mesmo1. A curto e médio prazo, são
evidentes seus benefícios em relação aos riscos e complicações da histerectomia, com menor tempo cirúrgico, menos
morbidades cirúrgicas, menor tempo de hospitalização,
retorno mais rápido às atividades diárias e alto índice de
satisfação das pacientes4-6.
As técnicas de ablação endometrial são classificadas
como histeroscópicas (de primeira geração) ou não histeroscópicas (de segunda geração). As histeroscópicas são
realizadas sob visão direta e seus resultados dependem,
em parte, da habilidade do cirurgião. Incluem ressecção
endometrial com alça, eletrocoagulação com rollerball,
combinação de ressecção com eletrocoagulação e destruição com o Nd:YAG laser. As técnicas de segunda geração
são menos complexas, requerem uma menor curva de
aprendizado, com resultados semelhantes aos métodos
histeroscópicos, porém a um custo mais elevado1-3,7. As
complicações intra e pós-operatórias precoces da ablação
endometrial incluem perfuração uterina, sangramento,
infecção pélvica, lesões de vísceras abdominais, embolia
gasosa e síndromes de sobrecarga hídrica, sendo a maioria
possível de ser evitada com boa técnica e treinamento
adequado do cirurgião3,8.
A recorrência do sangramento uterino anormal ocorre
em 10 a 20% após 1 ano de seguimento, e a incidência
de histerectomia chega a 35% em estudos com maior
tempo de seguimento1,9.
Além disso, complicações a longo prazo têm recentemente sido relatadas. Após a ablação endometrial,
o miométrio é exposto e, com a saída do meio distensor,
as paredes uterinas se colabam, havendo uma tendência
natural a se unirem num processo de cicatrização. Isso
causa uma contratura que reduz a cavidade uterina a
uma estrutura tubular com frequente obstrução da área
cornual. O tecido endometrial remanescente ou regenerado, principalmente nas áreas cornuais e porção tubária
intramural, pode sangrar e causar hematometra central,
hematometra cornual, menstruação retrógrada ou retardar o diagnóstico de câncer endometrial. Em pacientes
submetidas a ligadura tubária prévia, o sangramento
retrógrado para a porção proximal da tuba pode resultar
em distensão dolorosa, sendo conhecida como síndrome
da ligadura tubária pós-ablação10-13.
Há relatos de incidência de 10% de hematometra
cornual sintomático e síndrome de ligadura tubária pósablação11. Não há dados na literatura brasileira sobre
esses aspectos.
Há poucos estudos publicados até o momento que
apresentam seguimento pós-ablação endometrial maior
que 5 anos, com o sucesso sendo avaliado pela taxa de
amenorreia e/ou satisfação da paciente com o procedimento. É importante que se conheçam quais os fatores
que influenciam o sucesso do tratamento e a recorrência
do sangramento uterino anormal, para que se planejem
uma melhor terapia e a seleção de pacientes.
Assim, este estudo teve como objetivo avaliar os resultados clínicos, após seguimento mínimo de 5 anos, de
pacientes com sangramento uterino anormal de etiologia
benigna que realizaram ablação endometrial, analisando a
taxa de sucesso do tratamento em relação ao método e os
fatores que influenciaram nesses resultados, bem como a
recorrência dos sintomas e as complicações tardias.
Métodos
Foi realizado estudo transversal e retrospectivo envolvendo pacientes do Setor de Endoscopia Ginecológica
do Serviço de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital do
Servidor Público Estadual de São Paulo “Francisco
Morato de Oliveira” (HSPE-FMO). Após aprovação
pelo Comitê de Ética em Pesquisa dessa instituição, foi
realizada a análise das características clínico-cirúrgicas
registradas em prontuário.
Os critérios de inclusão foram: pacientes com
sangramento uterino anormal, sem sucesso com o
tratamento clínico, na pré-menopausa, com histeroscopia diagnóstica prévia, histerometria ≤12 cm,
biópsia endometrial sem atipias citológicas, submissão pregressa à ablação endometrial pela técnica de
ressecção endometrial com alça combinada à eletrocoagulação com rollerball e seguimento ambulatorial
mínimo de 5 anos.
O valor da histerometria foi considerado normal
até 10 cm e pouco aumentado até 12 cm. Todo tecido
ressecado foi encaminhado para análise histológica,
incluindo pólipos endometriais ou miomas submucosos eventualmente presentes à ablação endometrial. A
intervenção era considerada bem sucedida quando a
paciente permanecia em amenorreia, hipomenorreia ou
eumenorreia e referia estar satisfeita com o procedimento.
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):80-5
81
Takahashi WH, Lopes RGC, Depes DB, Souza HKM, Branco MC
O grau de satisfação foi avaliado durante a última consulta de seguimento ambulatorial de rotina, quando
era questionada e anotada em prontuário a satisfação
da paciente com o método (satisfeita ou insatisfeita).
A necessidade de histerectomia ou nova ablação endometrial foi considerada como falha terapêutica.
As análises foram realizadas utilizando-se o pacote
estatístico Statistical Package for Social Sciences (SPSS),
versão 16.0. A partir dos dados, foi construída uma
tabela contendo características clínico-demográficas
das pacientes, sendo os dados apresentados em forma
de média ± desvio padrão (DP) ou mediana (mín-máx),
conforme a distribuição dos valores (normal ou não),
bem como em porcentagens. A determinação da taxa
de sucesso das pacientes após a cirurgia foi avaliada
utilizando-se do teste de proporção simples com valores
expressos em porcentagem. Foi utilizado o modelo
de regressão logística, sendo a variável dependente
(dicotômica) o sucesso da ablação, com cálculo da
respectiva razão de chances (Odds Ratio – OR) para se
observarem as possíveis associações existentes entre o
sucesso da cirurgia (variável dependente), e as variáveis idade, paridade, tipo de parto, uso de análogo
de GnRH no pré-operatório, histerometria normal,
cavidade anormal (pólipo ou mioma) e presença de
ligadura tubária prévia (variáveis independentes). A
análise de correlação entre as variáveis analisadas com
o intuito de reconhecer possíveis influências sobre o
modelo foi feito por meio do cálculo do r de Pearson
(bicaudal). O nível de significância foi estabelecido
como 5%.
Resultados
No período de Março de 1999 a Abril de 2004
foram realizadas 172 ablações endometriais em nosso
serviço. Destas, 16 não preencheram os critérios de
inclusão (9 foram submetidas à técnica de ablação com
balão endotérmico, 6 eram pacientes na pós-menopausa
e 1 paciente não apresentava com sangramento uterino anormal) e 42 pacientes perderam seguimento,
restando 114 pacientes para o estudo. As pacientes
foram acompanhadas por um período mediano de 82
meses (6-126 meses), ou até a realização de histerectomia ou nova ablação endometrial. A descrição das
características clínico-demográficas das pacientes está
representada na Tabela 1.
Após o tratamento cirúrgico inicial, 68 pacientes
(59,6%) apresentaram amenorreia e 24 (21,1%) hipomenorreia ou eumenorreia. Do total, 22 pacientes
(19,3%) não apresentaram melhora do sangramento
uterino anormal. Destas, 17 foram submetidas à
82
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):80-5
histerectomia e uma foi submetida à nova ablação do
endométrio.
Não foram relatadas complicações intraoperatórias.
No pós-operatório precoce, houve um caso de piometra,
com necessidade de antibioticoterapia intravenosa. A
paciente evoluiu bem, permanecendo em amenorreia
e satisfeita com o tratamento. A médio prazo, ocorreram três casos de hematometra, sem resolução após
dilatação cervical, sendo realizado histerectomia em
duas pacientes.
Dentre as pacientes com falha terapêutica, 21
(72,4%) foram tratadas com histerectomia, 6 (20,7%)
declararam-se insatisfeitas devido à persistência de
sangramento uterino anormal e 2 (6,9%) insatisfeitas
devido a outros motivos, como dor pélvica cíclica e
distensão abdominal, apesar de se apresentarem em
amenorreia. Entre as indicações de histerectomia, 17
(81%) foram resultantes da persistência do sangramento
uterino anormal, 2 (9,5%) devido à hematometra de
repetição e 2 (9,5%) decorrentes da presença de dor
pélvica cíclica pós-ablação, sendo que em 1 delas foi
confirmada a presença de hidro-hematossalpinge ao
exame anatomopatológico. Apenas uma paciente foi
submetida à nova ablação endometrial, permanecendo
eumenorreica até a conclusão deste estudo. Das histerectomias, 61,9% foram realizadas nos primeiros 2
anos após a ablação endometrial.
A idade na época da ablação variou de 29 a 59 anos,
com mediana de 45 (29–59) anos entre as pacientes
com sucesso terapêutico e (34–50) anos para as que
apresentaram insucesso, com diferença significativa
entre os dois grupos (p=0,004).
A Tabela 2 mostra as variáveis analisadas e suas
predições em relação à taxa de sucesso das pacientes
Tabela 1. Características clínico-demográficas de pacientes submetidas à ablação
endometrial
Parâmetros
Média±DP ou Mediana (mín-máx) ou n (%)
Idade (anos)
44,5±5,5
Número de gestações
2 (0–16)
Número de partos
2 (0–12)
Parto vaginal
1 (0–11)
Parto cesária
1 (0–4)
Tempo de seguimento (meses)
81 (6–126)
Ligadura tubária prévia
59 (51,8)
Histerectomia
21 (18,4)
Complicações
4 (3,5)
Retratamento
22 (19,3)
DP: desvio padrão; mín: mínimo; máx: maximo.
Ablação histeroscópica do endométrio: resultados após seguimento clínico de 5 anos
Tabela 2. Análise das variáveis analisadas e suas predições em relação à taxa de sucesso
das pacientes após ablação endometrial
OR
(IC95%)
Valor p
Idade
1,2
1,1–1,3
0,003
Número de gestações
0,7
0,4–1,4
0,4
Parto vaginal
1,8
0,7–5,1
0,2
Parto cesária
1,8
0,6–5,2
0,2
Ligadura tubária prévia
0,3
0,06–0,9
0,04
Análogo de GnRH
2,5
0,5–12,4
0,2
Histerometria normal
0,6
0,1–2,2
0,4
Cavidade normal
0,8
0,3–2,5
0,7
Complicações
0,2
0,01–2,9
0,2
Tabela 3. Resultados clínicos com o tratamento cirúrgico de ablação endometrial após
seguimento ambulatorial mínimo de 5 anos
Sem
melhora
Amenorreia
Hipo/
eumenorreia
Total
n
0
63
22
85
%
0,0
74,1
25,9
100,0
5
2
29
Resultados clínicos
Sim
Sucesso
n
22
%
75,9
17,2
n
22
68
24
114
%
19,3
59,6
21,1
100,0
Não
Total
6,9
100,0
OR: Odds Ratio, IC95%: intervalo de confiança de 95%.
após ablação endometrial. Dentre as variáveis analisadas,
a idade relacionou-se diretamente com o sucesso do
procedimento (OR=1,2; p=0,003) e a ligadura tubária
pregressa mostrou relação inversa com o sucesso da
ablação endometrial (OR=0,3; p=0,049).
A análise da correlação entre as variáveis analisadas revelou correlação inversa entre uso de análogo
de GnRH e idade (r=-0,2; p=0,006), ou seja, quanto
maior a idade, menor o uso de análogo de GnRH;
correlação inversa entre o uso de análogo de GnRH e
complicações pós-operatórias (r=-0,2; p=0,03); relação
inversa entre complicações pós-operatórias e sucesso
do procedimento (r=-0,2; p=0,02); correlação direta
entre ligadura tubária pregressa e complicações pósoperatórias (r=0,2; p=0,05) e correlação direta entre
idade e sucesso terapêutico (r=0,2; p=0,007). Houve
correlação entre ligadura tubária e paridade (r=0,5;
p<0,001). Não foram encontradas correlações significativas
entre o número de gestações, paridade, tipo de parto
(vaginal ou cesariano), histerometria ou cavidade
normal (ausência de mioma ou pólipo) e o sucesso
terapêutico. De acordo com os resultados do exame
anatomopatológico no pós-operatório, a presença de
mioma, pólipo, adenomiose ou hiperplasia glandular
simples não apresentou correlação significativa em
relação ao sucesso após a cirurgia. Entre os achados do
exame anatomopatológico resultantes do produto de
histerectomia ou nova ablação endometrial, foram oito
casos (38,1%) de miomatose uterina, sete (33,4%) de
miomatose com adenomiose, dois (9,5%) de adenomiose
e quatro (19%) sem outras particularidades.
Dentre as pacientes incluídas, 108 tiveram todos
os parâmetros selecionados (94,7%) e somente 6 (5,3%)
não tinham os dados completos. Após um seguimento
clínico mínimo de 5 anos, a presença de ablações endometriais bem-sucedidas em 82 pacientes inicialmente
permitiria uma predição de 75,9% no modelo inicial,
dado que o número de ablações bem e mal-sucedidas
diferem significativamente (p<0,001) (Tabela 3). O
modelo de regressão logística permitiu melhorar a
predição correta do sucesso da ablação para 80,6%.
Dentre as mal sucedidas, obteve-se predição de 38,5%
e, entre as bem-sucedidas, em 93,9% dos casos.
Discussão
Em vários estudos publicados, a taxa de sucesso da ablação
endometrial está em torno de 80 a 90%, com risco de 15 a
35% das pacientes realizarem nova ablação endometrial ou
histerectomia nos primeiros 5 anos1,14-17. Já em série e com
maior tempo de seguimento (mínimo de 5 anos) publicados
até o momento, a taxa de sucesso da ablação endometrial
tem variado de 67 a 92%18-24. Fürst et al.18, em 10 anos de
seguimento, encontraram satisfação de 84,3 (em uma escala
analógica visual em que 0 era “insatisfeita” e 100 era muito
satisfeita”), com 94% das pacientes recomendando o tratamento a sua melhor amiga e taxa de histerectomia de 22%
ao final do período, sendo que 38% das histerectomias foram
realizadas nos primeiros 2 anos18. Comino e Torrejón20, em um
período de 6 a 12 anos, realizaram 17,9% de histerectomias
pós-ablação, com 81,2% das histerectomias sendo realizadas
nos primeiros 2 anos. A taxa de sucesso foi de 81,8% após 5
anos de ablação endometrial, que manteve-se estável após 8
anos de acompanhamento (80%)19. Em um período de seguimento mediano de 82 meses, nosso estudo encontrou grau
de satisfação semelhante, de 80,6%. Vinte e uma pacientes
realizaram histerectomia e uma nova ablação endometrial, o
que representa uma taxa de 19,3% de necessidade de nova
abordagem cirúrgica, com 61,9% das histerectomias sendo
realizadas nos primeiros 2 anos de seguimento.
Em relação à idade, apesar de alguns estudos
discordantes15,20,24, mulheres com mais de 45 anos apresentaram melhores resultados cirúrgicos que mulheres
mais jovens16,18,23,25. Assim, Fürst et al.18, após 10 anos de
acompanhamento, evidenciaram taxa de histerectomia de
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):80-5
83
Takahashi WH, Lopes RGC, Depes DB, Souza HKM, Branco MC
43% em pacientes com menos de 40 anos e de 18% nas com
mais de 40 anos. Longinotti et al.23 também encontraram
taxa de histerectomia de 12% em mulheres com mais de 50
anos, 19,8% entre 45 e 50 anos, 31% entre 40 e 45 anos e
40,6% em mulheres com menos de 40 anos23. Do mesmo
modo, também encontramos correlação direta significativa
entre idade e sucesso terapêutico. À medida que aumenta a
idade da paciente, também aumenta em 20% a chance de
haver sucesso na cirurgia.
Em alguns estudos a médio prazo, a presença de
ligadura tubária prévia mostrou-se fator de risco para
histerectomia e dor pélvica pós-ablação16,26. Em estudos de maior seguimento, tal fato não se repetiu15,20.
Encontramos relação inversa entre a ligadura tubária
pregressa e o sucesso da ablação endometrial, ou a ligadura tubária pregressa diminui o sucesso terapêutico
em quase 70%. Também encontramos correlação direta
entre ligadura tubária pregressa e complicações pósoperatórias. Contudo, a síndrome da ligadura tubária
pós-ablação (SLTPA) foi por nós comprovada em apenas
uma paciente (1,7%), do mesmo modo que em outra série,
também com relato de um caso (4,2%)15. Outros autores,
no entanto, relatam taxas mais elevadas de SLTPA, com
variação entre 6 e 8,4%, respectivamente, todas confirmadas com exame anatomopatológico11,26,27 confirmadas
com exame anatomopatológico26,27. El-Nashar et al.25,
entre 816 mulheres submetidas à ablação endometrial,
encontraram 9 pacientes que se apresentaram com dor
pélvica e coleção intracavitária à ultrassonografia: em 3
foram evidenciadas hematometra e no restante não houve
comprovação ao exame anatomopatológico. Como não foi
solicitado ao patologista cortes seriados da área cornual
uterina e segmento tubário proximal para confirmar o
diagnóstico da SLTPA ou hematometra cornual, isso pode
ter influenciado nossos resultados.
Entre as complicações no pós-operatório, tivemos
três casos de hematometra (2,4%) diagnosticados clinicamente e confirmados por meio da ultrassonografia.
Destes, dois foram submetidos à histerectomia. Números
semelhantes foram obtidos em seguimento de 200 pacientes, com 5 casos de hematometra (2,5%), todos após
1 ano de ablação endometrial.
Assim relatado por outros autores18,23,25, a persistência
do sangramento uterino anormal foi a principal indicação
de histerectomia pós-ablação endometrial em nosso estudo,
com 81% dos casos, seguido por dor pélvica ou associação
de dor pélvica e sangramento uterino anormal.
A relação entre mioma uterino ou pólipo endometrial
e o sucesso da ablação endometrial tem se mostrado na
literatura de formas divergentes. Menor taxa de sucesso
quando mioma ou pólipo estivessem presentes19,20 não
evidenciou diferença em relação à presença de mioma
ou pólipo e a taxa de histerectomia ou amenorreia16,23,25.
Também não encontramos diferença significativa em
relação ao sucesso do procedimento e a presença de
mioma, pólipo, adenomiose ou hiperplasia glandular
simples. Já de acordo com o exame anatomopatológico
resultante do produto de histerectomia ou de nova ablação
endometrial, tivemos predomínio de miomatose uterina seguido de adenomiose, assim como Carey et al.28.
Viscomi et al.21 encontraram adenomiose em todas as
mulheres que foram submetidas à histerectomia após
falha da ablação endometrial.
Apesar de serem complicações pouco frequentes, o
hematometra e a SLTPA devem ser cogitados sempre que
uma paciente se apresente com dor pélvica pós-ablação
endometrial juntamente de amenorreia ou hipomenorreia.
Também quando possível, deve-se solicitar ao patologista
cortes seriados da área cornual uterina e segmento tubário
proximal para confirmação diagnóstica.
A ablação endometrial tem se mostrado uma opção de
tratamento vantajosa, mantendo altos índices de satisfação
das pacientes, mesmo em seguimentos a longo prazo. A
idade quando da ablação endometrial influenciou no sucesso terapêutico e a presença de ligadura tubária prévia
sugere maior atenção às complicações no pós-operatório.
O fato deste trabalho ter sido um estudo transversal de
caráter histórico pode ter limitado a análise estatística e
mais estudos são necessários para avaliar os fatores que
poderão futuramente influenciar na indicação do procedimento em casos selecionados. Contudo, a ablação
endometrial é método terapêutico valioso, que, sempre
que possível, deve ser indicado às pacientes no tratamento
de sangramento uterino anormal.
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in women undergoing hysterectomy after global endometrial ablation.
J Minim Invasive Gynecol. 2011;18(1):96-9.
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):80-5
85
Alana Soares Brandão Barreto1
Marina Ferreira de Medeiros Mendes2
Luiz Claudio Santos Thuler3
Avaliação de uma estratégia para ampliar
a adesão ao rastreamento do câncer de
mama no Nordeste brasileiro
Evaluation of a strategy adopted to expand adherence to breast
cancer screening in Brazilian Northeast
Artigo Original
Resumo
Palavras-chave
OBJETIVO: avaliar as ações do Programa “Um Beijo Pela Vida”, desenvolvido em um município do Nordeste brasileiro
visando ampliar a adesão ao rastreamento do câncer de mama em mulheres cadastradas pela Estratégia Saúde
da Família. MÉTODOS: utilizou-se abordagem quantitativa para avaliar a cobertura das ações de rastreamento
nas mulheres com 40 anos de idade ou mais. Foi realizada busca ativa das mulheres por agentes comunitários de
saúde das nove Equipes de Saúde da Família do município. Os percentuais das mulheres submetidas ao exame
clínico das mamas e à mamografia; de exames na faixa etária recomendada pelo Programa; da classificação das
lesões mamográficas, de acordo com o BI-RADS®; das mulheres que receberam encaminhamento para diagnóstico e
tratamento e o número de casos de câncer de mama detectados foram colhidos por meio de um questionário estruturado,
analisados pelo programa EPI-INFO™ e confrontados a padrões previamente fixados. RESULTADOS: foram incluídas
3.608 mulheres, correspondendo a 68,4% da população-alvo inscrita na Estratégia Saúde da Família. As taxas de
cobertura do exame clínico das mamas para mulheres de 40 a 49 anos e da mamografia para mulheres de 50 a
69 anos foram de 58,9 e 56,7%, respectivamente. As mulheres com lesões mamográficas altamente suspeitas foram
submetidas à punção por agulha fina ou por agulha grossa (100%). Seis casos novos de câncer foram detectados.
Foram cumpridos 80% dos padrões analisados. CONCLUSÕES: a avaliação das ações do Programa aponta para
sua adequação, considerando-se o grau de cumprimento das exigências previamente definidas.
Avaliação em saúde
Programas de rastreamento
Cobertura de serviços de saúde
Neoplasias da mama
Fidelidade a diretrizes
Keywords
Health evaluation
Mass screening
Health services coverage
Breast neoplasms
Guideline adherence
Abstract
PURPOSE: to evaluate the actions of the “Um Beijo Pela Vida” Program developed in a Brazilian Northeast city
to increase adherence to breast cancer screening by women registered by the Brazilian Family Health Strategy
for breast cancer screening. METHODS: a quantitative approach was used to evaluate the coverage of screening
actions for aged 40 years-old or more. Community workers from the nine Family Health Teams of the town carried
out an active search. The percentage of eligible women who were screened for breast cancer by clinical breast
examination or mammography, mammogram classification according to BI-RADS®, women screened who were referred
for further testing and treatment, and the number of breast cancers detected were collected by means of a structured
questionnaire, analyzed with the EPI-INFO™ software and compared to previously defined patterns. RESULTS: 3,608
women were included, corresponding to 68.4% of the target population registered in the Brazilian Family Health
Strategy. Coverage rates of clinical breast examination for women aged 40 to 49 years-old and of mammograms for
women aged 50 to 69 years-old were 58.9 and 56.7%, respectively. All women with highly suspicious mammographic
lesions were submitted to fine needle aspiration or core biopsy (100%). Six new cases of cancer were detected and 80%
of the standards established for this evaluation were carried out. CONCLUSIONS: the evaluation of the actions of
the Program suggests its adequacy considering the degree of fulfillment of the previously defined requirements.
Correspondência
Marina Ferreira de Medeiros Mendes
Grupo de Estudos de Gestão e Avaliação em Saúde – Instituto de
Medicina Integral Professor Fernando Figueira.
Rua dos Coelhos, 300 – Boa Vista
CEP: 50070-550
Recife (PE), Brasil
Recebido
11/08/2011
Aceito com modificações
02/01/2012
Trabalho realizado na Secretaria de Estado da Saúde da Paraíba – Monteiro (PB), Brasil.
Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira – GEAS/IMIP – Recife (PE), Brasil; Coordenadoria de Planejamento e
Controle dos Serviços de Saúde – Monteiro (RN), Brasil
2
Grupo de Estudos de Gestão e Avaliação em Saúde do Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira – IMIP – Recife
(PE), Brasil.
3
Instituto Nacional de Câncer – INCA; Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro – UNIRIO – Rio de Janeiro (RJ), Brasil.
Conflito de interesses: não há.
1
Avaliação de uma estratégia para ampliar a adesão ao rastreamento do câncer de mama no Nordeste brasileiro
Introdução
O câncer de mama representa, no mundo, a neoplasia
maligna mais frequentemente diagnosticada em mulheres.
As estatísticas indicam o aumento de sua incidência tanto
nos países desenvolvidos quanto nos em desenvolvimento.
No Brasil, o câncer de mama é a principal causa de morte
por câncer entre mulheres. Em 2012, a estimativa da doença é de 52.680 novos casos diagnosticados e com risco
estimado de 52,5 para 100.000 mulheres1. No Estado
da Paraíba as taxas de mortalidade por câncer de mama
ajustadas por idade vêm crescendo nos últimos anos, passando de 2,8 óbitos por 100.000 mulheres em 1990 para
10,0 óbitos por 100.000, em 2009, o que equivale a uma
variação percentual relativa de 257% em 20 anos2.
Soma-se às crescentes taxas de incidência e mortalidade
a constatação de que, no Brasil, o diagnóstico da doença
ocorre quando a mesma já se encontra em nos estádios
avançados. Em estudo realizado no Rio de Janeiro, o câncer
de mama foi diagnosticado em fase avançada (estádios clínicos II, III e IV) em 51% dos casos analisados; entretanto,
apenas 19,2% dos casos assintomáticos, em que a lesão foi
detectada por mamografia, apresentavam-se em estádio
avançado3. Uma síntese de nove estudos brasileiros baseados
em séries de casos hospitalares ou registros de câncer de base
populacional, realizados entre 1993 e 2007, mostrou que
45,4% (valor mediano) dos 3.352 casos de câncer de mama
estudados encontravam-se em estádio avançado (III ou IV)
no momento do diagnóstico4. Há duas décadas, a situação
era ainda mais crítica, quando 60 a 70% das mulheres eram
diagnosticadas tardiamente5, as possibilidades de cura eram
menores e a retirada total da mama se apresentava, muitas
vezes, como a única opção de tratamento.
Para enfrentamento do câncer de mama no país, o
Ministério da Saúde (MS), por meio do Instituto Nacional
do Câncer (INCA), desenvolveu o Programa “Viva
Mulher”, que tem como objetivo reduzir a mortalidade
e as repercussões físicas, psíquicas e sociais do câncer de
mama na mulher brasileira, por meio da oferta de serviços para detecção do câncer em estágios iniciais, para
tratamento e reabilitação. O INCA recomenda, para as
mulheres com idades entre 50 a 69 anos, rastreamento
por mamografia, com o máximo de dois anos entre os
exames. Já o rastreamento por meio do exame clínico das
mamas (ECM) deve ser oferecido anualmente para todas
as mulheres a partir dos 40 anos. Mamografia e ECM
anuais estão indicados a partir dos 35 anos de idade para
as mulheres pertencentes a grupos populacionais com risco
elevado de desenvolver câncer de mama. O INCA destaca, ainda, que o exame das mamas realizado pela própria
mulher (autoexame) não substitui o físico realizado pelo
profissional de saúde, treinado para tal atividade, e que,
embora não exista evidência científica de seu impacto
sobre a mortalidade pelo câncer de mama, seu estímulo
deve fazer parte das ações de educação para a saúde que
contemplem o conhecimento do corpo6.
Um estudo longitudinal, tendo por base 460 mulheres atendidas em serviços de saúde públicos e privados
do município de Taubaté, São Paulo, mostrou que 68%
delas referiam rastreamento mamográfico nos dois anos
anteriores à pesquisa, sendo maior a proporção (84,2%)
entre aquelas que tinham cobertura de planos de saúde
privados. Houve maior adesão (repetição da mamografia
em intervalos máximos de 24 meses) em serviços privados,
em mulheres na menopausa, com consultas ginecológicas
ou com o mastologista regulares, com histórico de coleta
de citologia oncótica e com rastreamento mamográfico
prévio. A escolaridade, o estado marital, a ocupação profissional, a renda familiar, a presença de doenças mamárias e os antecedentes familiares de câncer de mama não
apresentaram associação com a adesão ao rastreamento
mamográfico7. Outro estudo, envolvendo 3.749 mulheres
carentes atendidas no Núcleo Mama Porto Alegre, revelou que ter risco genético elevado, maior escolaridade,
história de uso de contraceptivo oral, até dois filhos e ser
ex-fumante estão associados de maneira independente à
maior adesão (intervalo entre exames menor ou igual a
18 meses) à mamografia8.
Com a finalidade de aumentar a adesão à mamografia
e ao exame de Papanicolau de mulheres de 19 cidades
da região de Barretos, em São Paulo, ao utilizar-se a distribuição de volantes e panfletos, chamadas por meio de
rádio e carros de som e visitas domiciliares por agentes
comunitários de saúde (ACS), mostrou-se ser esta última
a estratégia mais efetiva9. Em outro estudo envolvendo
uma população predominantemente de mulheres afroamericanas, observou-se que o uso de informação dirigida
às pacientes, lembretes, reuniões, eventos comunitários,
programas em igrejas e meios de comunicação aumentaram significativamente a adesão à mamografia de 31
para 56%10.
Neste contexto, este estudo teve por objetivo avaliar
as ações do Programa “Um Beijo Pela Vida”, desenvolvido
em um município do Nordeste brasileiro.
Métodos
Foi realizado um estudo de avaliação da cobertura das
ações de rastreamento do câncer de mama no Município
de Monteiro, localizado na Região do Cariri Ocidental,
extremo Sul do Estado da Paraíba, distante 320 km de
João Pessoa. Monteiro possui gestão plena de sistema de
saúde, população de 28.230 habitantes, entre os quais
13.874 são do sexo masculino e 14.356 do feminino,
sendo que 3.883 das mulheres têm idade superior ou igual
a 40 anos2. O município é dotado de nove unidades da
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):86-91
87
Barreto ASB, Mendes MFM, Thuler LCS
Estratégia de Saúde da Família (ESF), com cobertura de
100% da população, e de um serviço de média complexidade estruturado para a realização dos procedimentos
clínicos, cirúrgicos e com finalidade diagnóstica. Os
casos de câncer diagnosticados são tratados em centros
de referência localizados fora do município. A intensificação das ações de controle do câncer de mama ocorreu
por meio de uma estratégia de saúde pública, chamada
“Um Beijo Pela Vida”, que teve como objetivo aumentar
a adesão das mulheres às ações de detecção precoce do
câncer de mama. Desenvolvido pela Secretaria de Estado
da Saúde, com o apoio do Instituto Avon e da Cunhã
Coletivo Feminista, a ação teve como bases técnicas a
publicação do “Controle do Câncer de Mama: Documento
de Consenso”6, dos Parâmetros Técnicos para Programação
de Ações de Detecção Precoce do Câncer de Mama11 e do
Pacto pela Vida12. Este preconiza que os municípios devem comprometer-se a ampliar para 60% a cobertura de
rastreamento mamográfico e garantir punção diagnóstica
em 100% dos casos, nos quais houver necessidade.
Foi elaborado um fluxograma13 das ações a serem desenvolvidas pela Secretaria Municipal de Saúde, de acordo
com as recomendações do MS. Para a concretização dessas
ações, ACS foram capacitados para captar as mulheres a
serem submetidas ao ECM e à mamografia na unidade de
saúde da família e orientá-las sobre a adoção de hábitos
saudáveis na vida. Foram também capacitados os médicos
e enfermeiros das unidades a fim de que realizassem os
exames clínicos das mamas e encaminhassem adequadamente os casos ao serviço de referência. O Programa
também disponibilizou equipamentos de informática,
tais como computador e impressora, para os registros dos
dados na unidade secundária, e materiais didáticos produzidos exclusivamente para o Programa a serem utilizados
na abordagem das mulheres, tais como folders, cartazes
e livretos para agentes de saúde. Também foi utilizado
um modelo de silicone para ensinar a técnica de palpação
das mamas. Além disso, foram realizadas reuniões de
planejamento, redimensionamento da oferta de serviços e
identificação de referências para tratamento. Baseando-se
nas recomendações do MS, foi possível construir o modelo
lógico do Programa.
Utilizando um instrumento de coleta de dados estruturado, construído especialmente para esta pesquisa,
ocorreram visitas domiciliares, tendo como alvo mulheres
na faixa etária de 40 a 69 anos, residentes no município de
Monteiro. ACS das equipes de saúde da família, especialmente treinados para este fim, entrevistaram as mulheres
entre maio e novembro de 2008. Os dados foram inseridos
em um banco de dados criado para este fim, e informações
referentes aos exames complementares feitos entre 2001
a 2007 foram colhidas do banco de dados do Centro de
Atenção à Saúde da Mulher, que é a única referência da
88
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):86-91
região para os procedimentos diagnósticos do câncer de
mama. Os laudos mamográficos foram emitidos de acordo com o sistema BI-RADS® (Breast Imaging Reporting
and Data System)13, sendo os laudos classificados em seis
categorias: 1 – sem achados, 2 – achados benignos, 3 –
achados provavelmente benignos, 4 – achados suspeitos,
5 – achados altamente suspeitos e 0 – achados que necessitam de avaliação adicional. Outras informações relevantes
foram colhidas da base de dados existente nos serviços de
atenção básica, nas unidades de saúde da família e nos
serviços de referência de média e alta complexidade para
onde as mulheres foram encaminhadas.
Para a análise dos dados, utilizou-se o programa EPIINFO™. Foram descritas as características demográficas e
epidemiológicas das mulheres incluídas no estudo. Foram
ainda analisados os seguintes indicadores de qualidade do
Programa: percentuais de mulheres que foram submetidas
ao ECM e à mamografia (cobertura) e de exames na faixa
etária prioritária do Programa; classificação das lesões
mamográficas de acordo com o BI-RADS®. Ainda, os
percentuais de mulheres, que receberam encaminhamento
para esclarecimento diagnóstico em serviços de referência
secundária e para tratamento em serviços de referência
terciária, foram estudados.
Para cada pergunta avaliativa foram estabelecidos
critérios específicos a fim de se fazer uma apreciação das
respostas obtidas. Uma matriz de julgamento foi construída,
na qual avaliou-se o grau de cumprimento dos padrões
estabelecidos, atribuindo-se os seguintes juízos de valor: 75
a 100% – adequado; 50 a 75% – parcialmente adequado;
25 a 50% – não-adequado e 0 a 25% – crítico.
A pesquisa foi conduzida dentro dos padrões regulamentados pela portaria 196/96 e foi aprovada pela
Comissão de Ética da Secretaria de Estado da Saúde da
Paraíba em 26 de fevereiro de 2008, recebendo o registro
173.272.
Resultados
de um universo de 5.278 mulheres inscritas nas
nove equipes da ESF do Município de Monteiro, 3.608
(68,4%) foram entrevistadas em seus domicílios. Em
apenas uma equipe, situada em zona urbana, obteve-se
percentual de inclusão inferior a 50%. As características
epidemiológicas e demográficas das mulheres incluídas
neste estudo estão descritas na Tabela 1. A média de
idade foi de 58,2 anos, sendo que cada mulher teve, em
média, 5,8 gestações. Observou-se ainda que 1,3 e 2,3%
das mulheres apresentavam história de mãe ou irmã com
câncer de mama, respectivamente. As demais características
clínicas e referentes à utilização dos serviços estão dispostas
na Tabela 2. Vale ressaltar que 70,8% relataram ter sido
submetidas ao exame citopatológico do colo do útero pelo
Avaliação de uma estratégia para ampliar a adesão ao rastreamento do câncer de mama no Nordeste brasileiro
Tabela 1. Características epidemiológicas e demográficas das mulheres inscritas nas
equipes da saúde da família incluídas no estudo
Média (DP)
Mínimo–
Máximo
Idade em anos (n=3.608)
58,2 (13,3)
40–103
Idade em anos da primeira menstruação (n=3.528)
13,7 (1,6)
8–19
Idade em anos da menopausa (n=2.400)
46,5 (6,0)
20–70
Número de gestações (n=3.605)
5,8 (4,9)
0–30
Número de abortos (n=3.604)
0,7 (1,3)
0–12
Variável
Número de cesarianas (n=3.604)
0,2 (0,6)
0–12
Idade da primeira gestação, em anos (n=3.605)
18,9 (8,8)
0–49
Tempo de amamentação, em meses (n=3.589)
30,0 (52,5)
0–240
menos uma vez na vida, e que 58,9 e 49,0% tinham sido
submetidas a ECM ou mamografia, respectivamente.
Observou-se que 62,1% das mulheres encontravam-se
cobertas pelas estratégias de detecção precoce do câncer de
mama. Esse percentual foi maior entre mulheres com idades
entre 40 e 49 anos (72,2%, sendo 18,4% por ECM, 3,5%
por mamografia e 50,3% por ambos) e menor entre aquelas
com 70 anos ou mais (34,2%, sendo 8,0% por ECM, 3,1%
por mamografia e 23,1% por ambos). Na faixa etária de 50
a 69 anos, a cobertura foi de 68,7%, sendo 11,9% por ECM,
53,7% por mamografia e 3,1% por ambos. Além disso, em
73,6% dos casos, as mulheres foram submetidas aos dois
exames (ECM e mamografia), não havendo variação importante conforme a faixa etária. Das mulheres submetidas ao
ECM, 88,2% encontravam-se na faixa etária indicada pelo
Programa (40 a 69 anos), enquanto entre aquelas submetidas à mamografia, 51,6% encontravam-se na faixa etária
recomendada pelo MS (50 a 69 anos).
A análise do banco de dados do Centro de Atenção à
Saúde da Mulher permitiu identificar que, entre aquelas
que referiam terem sido submetidas à mamografia, os
laudos foram localizados em 55,7% dos casos. Foram
observados os seguintes resultados: 81 casos BIRADS® 0
(7,6%); 6 BIRADS® 1 (58,9%); 3 BIRADS® 2 (30,5%)
e 17 BIRADS® 3 (1,6%). Nas categorias suspeitas de
malignidade, foram encontrados 15 casos: 10 (0,9%)
pacientes com BIRADS® 4 e 5 (0,5%) com BIRADS® 5.
Dezessete mulheres (todos os casos de BIRADS® 4 ou 5, e
dois casos com lesões palpáveis nos quais o BIRADS® foi
1 ou 2) foram submetidas à punção por agulha fina e/ou
por agulha grossa (core biopsy). Uma paciente foi submetida
aos dois procedimentos. Das seis pacientes encaminhadas
para cirurgia, cinco apresentavam câncer de mama nos
estádios II e III e uma apresentava carcinoma in situ. A
taxa de detecção de câncer de mama foi de 0,34% (seis
casos em 1.767 mamografias analisadas).
Na Tabela 3 está apresentado o percentual de mamografias consideradas altamente suspeitas, conforme
o número de exames. A periodicidade do exame está
associada a uma importante diminuição no percentual
Tabela 2. Características clínicas e utilização de serviços de saúde pelas mulheres
entrevistadas
Variável
n (%)
História de uso de contraceptivo oral (n=1.445)
530 (36,7)
História de uso de terapia de reposição hormonal (n=696)
288 (41,4)
História de cirurgia prévia (n=3.606)
34 (0,9)
História de mãe com câncer de mama (n=3.608)
46 (1,3)
História de irmã com câncer de mama (n=3.608)
84 (2,3)
História de inflamação na mama (n=3.608)
3,7 (1,0)
História de nódulo na mama (n=3.608)
94 (2,6)
Exame citopatológico do colo do útero prévio (n=2.662)
2.553 (95,9)
Exame clínico das mamas (n=3.608)
2.126 (58,9)
Mamografia (n=3.608)
1.767 (49,0)
Ultrassonografia mamária (n=3.608)
214 (5,9)
Punção por agulha fina (n=3.608)
13 (0,4)
Punção por agulha grossa (core biopsy) (n=3.608)
5 (0,1)
Tabela 3. Percentual de mamografias com lesões altamente suspeitas (BIRADS 4 e 5),
conforme o ranqueamento do exame no Centro de Atenção à Saúde da Mulher (CASM)
Ranqueamento do exame
no CASM
Mamografias realizadas
no CASM
BIRADS 4 E 5
(%)
1º exame
2.737
1,2
2º exame
1.219
0,7
3º exame
620
0,5
425
0,5
5.001
0,9
4º exame ou mais
TOTAL
Fonte: CASM/Monteiro/Paraíba.
de exames suspeitos, o que já pode ser observado a partir
da segunda mamografia.
Por fim, os dados coletados foram inseridos na matriz
de julgamento do Programa, comparando-se o observado
(coletado pela pesquisa) com o esperado (padrões estabelecidos). De acordo com os valores obtidos, o Programa
pode ser considerado como adequado pela análise dos
aspectos avaliados por esta pesquisa.
Discussão
Este estudo objetivou avaliar uma estratégia de saúde pública, desenvolvida com a finalidade de ampliar a
adesão das mulheres às ações de rastreamento do câncer
de mama no Município de Monteiro – Estado da Paraíba.
A avaliação consistiu fundamentalmente em fazer um
julgamento de valor sobre uma intervenção. Deve servir
para direcionar ou redirecionar a execução de ações, atividades, programas e, por conseguinte, deve ser exercida
por aqueles envolvidos no planejamento e na execução
de tais ações14,15.
O presente estudo se propôs a conhecer a cobertura do
ECM e da mamografia na população-alvo do programa de
controle do câncer de mama em um município do interior
da Paraíba. A avaliação de cobertura mede a proporção da
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):86-91
89
Barreto ASB, Mendes MFM, Thuler LCS
população que se beneficia do programa ou da intervenção16
e responde à pergunta formulada por muitos gestores, no
que se refere à magnitude da oferta das ações e do serviços, tal como: em que medida os recursos existentes são
suficientes para atender à população-alvo.
No que diz respeito à cobertura das ações, neste estudo
foi identificado que o Programa “Um Beijo Pela Vida”
cobriu 68,4% da população feminina com mais de 40
anos de idade cadastrada na ESF. A taxa de participação
aproximou-se daquela observada em programa semelhante desenvolvido em Mato Grosso do Sul, no qual houve
adesão de 74,9%17.
Neste estudo, entre as mulheres entrevistadas, observou-se que, na faixa etária entre 50 e 69 anos, 58,9%
haviam sido avaliadas com exame clínico das mamas,
enquanto a cobertura do exame mamográfico foi de
56,8%. Embora existam poucas informações da cobertura
de rastreamento mamográfico em mulheres atendidas nos
serviços públicos de saúde de cidades do interior do país,
observou que 53,2% daquelas de 40 a 69 anos atendidas
pela ESF no município de Dourados, no Mato Grosso do
Sul, referiam ter sido submetidas à mamografia prévia18,
valor semelhante ao descrito em Monteiro. Entretanto,
em Taubaté, em São Paulo7, observou-se que 61,5% das
mulheres atendidas no Sistema Único de Saúde (SUS)
referiam exame mamográfico prévio, contra 84,2% daquelas atendidas nos serviços privados.
Os valores de cobertura do ECM e do mamográfico,
descritos em Monteiro, são superiores ao dobro daqueles encontrados pela Pesquisa Nacional por Amostra
de Domicílio19, conduzida pelo Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), que, na Paraíba, mostrou
que 24,4% das mulheres com 40 anos ou mais haviam
sido submetidas ao ECM realizado por médico ou enfermeiro nos 12 meses anteriores à data da entrevista.
27,8% das mulheres de 50 a 69 anos de idade haviam
sido submetidas ao exame mamográfico nos dois anos
anteriores à data da entrevista. Em relação a esta última
comparação, em geral, espera-se que os percentuais de
cobertura nas capitais sejam superiores aos descritos no
interior dos estados, já que é onde concentra-se um maior
número de profissionais e de serviços de saúde. Portanto,
em Monteiro, foram obtidos valores muito próximos
daqueles da Capital do Estado, reforçando a ideia de que
a intervenção em um município do interior ampliou o
acesso das mulheres ao ECM e à mamografia.
Neste estudo a taxa de indicação de biópsias foi de
1% entre as mulheres rastreadas por mamografia (17 em
1767), valor inferior ao encontrado em estudo levado a
termo em Campinas20, baseado em 35.041 mamografias
consecutivas (1,7%). Em Campinas, a taxa de detecção
de câncer de mama entre pacientes assintomáticas foi
de 0,3%, exatamente o mesmo encontrado no presente
90
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):86-91
estudo. Taxas inferiores foram descritas em Mato Grosso
do Sul (0,1 casos por 100 mulheres rastreadas), em que
se empregou o ECM como estratégia de rastreamento17.
O American College of Radiology21 considera aceitáveis as
taxas de detecção que variem entre 0,2 e 1,0%.
No que diz respeito à distribuição dos estádios clínicos,
enquanto em Campinas20 foram identificados 93% dos
cânceres nos estádios 0 e I, em Monteiro esse percentual
foi de 20%. Deve ser destacado, no entanto, que, no atual
estudo, mais da metade das mulheres (51,0%) nunca
tinham sido submetidas à mamografia, diferentemente
da população estudada em Campinas, na qual a taxa de
exposição prévia à mamografia era superior a 90%.
Outro aspecto que deve ser destacado é que foram
observadas taxas de detecção de exames descritos como altamente suspeitos (BIRADS® 4 e 5), diferenciadas conforme
o ranqueamento do exame, variando de 1,2% quando se
tratava do primeiro exame a valores próximos a 0,5%, quando
se tratava do terceiro exame ou superior. Esse decaimento
nas taxas explica-se pela presença, na primeira rodada, de
casos prevalentes (que vêm se desenvolvendo por algum
tempo) e de casos incidentes (desenvolvidos recentemente);
já as mamografias subsequentes geralmente detectam anomalias incidentes, desenvolvidas recentemente. A análise
dos resultados das mamografias de 230.143 mulheres, com
mais de 40 anos, inseridas no Programa Norte-americano
de Detecção Precoce dos Cânceres de Mama e do Colo do
Útero (CDC’s National Breast and Cervical Cancer Early
Detection Program)22, mostrou que o percentual de exames
altamente sugestivos de malignidade também caía pela
metade comparando mulheres que faziam o exame pela
primeira vez àquelas em exames subsequentes, passando
de 5,5 para 2,7%. Há que se considerar os diferentes riscos
para câncer de mama nessas populações.
Além disso, a taxa de lesões altamente suspeitas encontrada no primeiro exame (1,2%) aproxima-se daquela
referente aos laudos de mamografias (mamografia unilateral
– código 02.04.03.003-0 e bilateral para rastreamento –
código 02.04.03.018-8), que foram digitados no Sistema
de Informação do Câncer de Mama (SISMAMA) e estão
disponíveis no site do DATASUS2. Neste, observa-se que,
para o Brasil, das 724.628 mamografias efetuadas no SUS
entre janeiro e dezembro de 2009, em mulheres entre
40 e 69 anos de idade, 1,9% foram classificadas como
altamente suspeitas (BIRADS® 4 e 5).
Com base nas informações disponíveis e na análise
da matriz de julgamento das ações do Programa “Um
Beijo Pela Vida”, conclui-se pela sua adequação no que
diz respeito ao cumprimento dos padrões estabelecidos
para esta avaliação. Entretanto, os percentuais de mulheres
atendidas na ESF, que foram submetidas ao ECM (40 anos
ou mais) e à mamografia (50 anos ou mais), mostraram-se
aquém do desejado.
Avaliação de uma estratégia para ampliar a adesão ao rastreamento do câncer de mama no Nordeste brasileiro
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Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):86-91
91
Ana Carolina Japur de Sá Rosa-e-Silva1
Mariani Mendes Madisson2
Marcos Felipe Silva de-Sá1
Rosana Maria Reis1
Julio Cesar Rosa-e-Silva1
Lucia Alves Silva Lara1
Macroprolactinemia e hiperprolactinemia
intermediária: manifestações clínicas e
achados radiológicos
Macroprolactinemia and intermediate hyperprolactinemia: clinical
manifestations and image
Artigo Original
Resumo
Palavras-chave
Hiperprolactinemia
Galactorréia
Prolactina
Hipófise
Adenoma
Keywords
Hyperprolactinemia
Galactorrhea
Prolactin
Pituitary gland
Adenoma
OBJETIVOS: Caracterizar as pacientes com valores indeterminados de hiperprolactinemia (teste de PEG para
identificação de macroprolactinemias com recuperação entre 30 e 65%) (PRLi) ou macroprolactinemia (PRLm), quanto
às características clínicas, como intensidade e variação dos sintomas e presença ou não de tumores no sistema nervoso
central. MÉTODOS: Estudo transversal, retrospectivo, de levantamento de prontuários, no qual foram incluídas 24
pacientes com diagnóstico de hiperprolactinemia (PRL>25 ng/dL), em idade reprodutiva, em seguimento em ambulatório
de ginecologia endócrina. Foram incluídas 11 pacientes com PRLm e 13 com PRLi. Dos dois grupos (PRLm e PRLi),
foram considerados para a análise registros dos dados relativos à idade, à paridade, ao índice de massa corporal,
à presença de galactorreia, à infertilidade e ao tumor do sistema nervoso central. Os dados antropométricos foram
expressos em média e desvio padrão e, para a comparação entre os grupos quanto à presença de tumor no sistema
nervoso central, galactorreia e infertilidade, utilizou-se o teste t de Student. RESULTADOS: A galactorreia foi mais
prevalente nas pacientes com PRLi (p=0,01). Setenta por cento das mulheres com PRLi apresentaram microprolactinoma
de hipófise, enquanto que este achado foi evidente em 17% das mulheres com PRLm (p=0,04). Dentre as pacientes
com PRLm e PRLi, nove não foram investigadas com imagem do sistema nervoso central por apresentarem níveis
pouco elevados de prolactina (cinco portadoras de PRLm e quatro de PRLi). Não houve diferença significativa quanto
à ocorrência de infertilidade ou de ciclos menstruais irregulares. CONCLUSÕES: Mulheres com hiperprolactinemia
intermediária apresentam mais sintomas de galactorreia e maior incidência de tumores do sistema nervoso central do
que aquelas com macroprolactinemia.
Abstract
Purpose: To characterize patients with indeterminate values of hyperprolactinemia (PEG test for the identification of
macroprolactinemias with recovery between 30 and 65%) (PRLi) or macroprolactinemia (PRLm), in relation to clinical
characteristics, such as the presence or absence of symptoms, as well as their intensity and variation, and the presence
or absence of central nervous system tumors. METHODS: This is a cross-sectional retrospective survey of records of
24 patients with hyperprolactinemia, in reproductive ages, with prolactin >25 ng/dL. Eleven women with PRLm and
13 with PRLi were included. Records from the two groups were extracted for analysis: age, parity, body mass index,
presence of galactorrhea, infertility, and central nervous system tumor. Anthropometrics data were expressed as mean
and standard deviation. To compare groups regarding the presence of central nervous system tumor, galactorrhea, as
well as infertility we used the Student’s t-test. RESULTS: Galactorrhea was more prevalent in patients with PRLi (p=0.01).
Seventy percent of women with PRLi presented pituitary tumor (microprolactinoma), whereas this finding was evident in
17% of the PRLm Group (p=0.04). Among the patients with and PRLm PRLi, nine were not investigated with the image
of the central nervous system because they have low levels of prolactin (five carriers and four PRLm PRLi). There were no
significant differences regarding the occurrence of infertility or irregular menstrual cycles between groups. DISCUSSION:
Women with intermediate hyperprolactinemia present more galactorrhea symptoms as well as central nervous system
tumors than women with macroprolactinemia.
Correspondência
Ana Carolina Japur de Sá Rosa-e-Silva
Avenida Bandeirantes 3.900 – Monte Alegre
CEP: 14049-900
Ribeirão Preto (SP), Brasil
Recebido
23/12/2011
Aceito com modificações
16/01/2012
Trabalho realizado no Serviço de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São
Paulo – USP – Ribeirão Preto (SP), Brasil.
1
Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – USP – Ribeirão Preto (SP),
Brasil.
2
Curso Acadêmico de Medicina da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – USP – Ribeirão Preto (SP), Brasil.
Conflito de interesses: não há.
Macroprolactinemia e hiperprolactinemia intermediária: manifestações clínicas e achados radiológicos
Introdução
A prolactina é um hormônio proteico produzido pela
adeno-hipófise, cuja ação está relacionada ao estímulo do
desenvolvimento da mama e à produção do leite, exercendo também um papel importante na função reprodutiva
feminina. O fenômeno de maturação do folículo e dos
oócitos, bem como a ação fisiológica do corpo lúteo, são
dependentes da prolactina que também é responsável por
manter o número adequado de receptores do hormônio
luteinizante (LH) e estradiol1-2. O valor máximo da prolactina, considerado normal para mulheres adultas na
fase folicular, varia de 15 até 30 ng/mL e alguns autores
consideram que um valor igual ou superior ao dobro da
faixa superior da normalidade poderia ser considerado
como francamente anormal3.
A hiperprolactinemia interrompe a pulsatilidade do
hormônio liberador das gonadotrofinas e, por consequência,
influencia negativamente a liberação do LH e FSH, com
prejuízo para a esteroidogênese4. Isto resulta em alterações
dos ciclos menstruais e infertilidade por anovulação.
O excesso de prolactina pode resultar de disfunções
hipotalâmicas ou de tumores hipofisários. Entretanto,
muitas vezes é secundário ao uso de alguns medicamentos
e pode ainda ser fisiológico em situações como amamentação e a gestação. Entre outros sintomas, a galactorreia
está presente em aproximadamente 50% das mulheres
portadoras de hiperprolactinemia5-6.
A prolactina é um hormônio bastante heterogêneo e,
do ponto de vista de peso molecular, existem três formas
principais em circulação: monômero de 23 kDa (small
prolactin), dímero de 45 kDa (big prolactin) e macroprolactina de peso molecular entre 150 e 175 kDa (big-big
prolactin)7. A hiperprolactinemia, gerada às custas de
prolactina de baixo peso molecular (fração small), tem
sido denominada pela maioria dos autores de hiperprolactinemia verdadeira8.
Em condições normais ou em pacientes com hiperprolactinemia sintomática, predomina-se em circulação
a forma monomérica ou livre, que é a forma ativa do
hormônio. A macroprolactina é constituída, na maioria
dos casos, por uma associação entre uma molécula de
prolactina e uma de IgG, o que leva a uma meia-vida
mais longa e a uma atividade biológica menor9.
Em pacientes com hiperprolactinemia (valores superiores a 25 ng/dL), o método mais empregado para a
pesquisa da existência de quantidades significativas de
macroprolactina é o estudo de recuperação pós-precipitação
do soro com polietilenoglicol (PEG). Valores recuperados
menores que 30% são considerados positivos para macroprolactinemia10, os maiores que 65% são considerados como
microprolactinemia e entre 30 e 65% são considerados
indeterminados (hiperprolactinemia intermediária)10-12.
As causas da presença de amostras com valores intermediários devem-se a fatores como: o predomínio da forma
dimérica, que apresenta precipitação não-uniforme; a
variação do coeficiente de precipitação do teste; a variação das formas monoméricas e das formas de alto peso
molecular, entre outros12.
Entre as pacientes com hiperprolactinemia, a frequência
de casos com predomínio de macroprolactina é de 23%8-13
ou mais. A importância deste fenômeno se deve ao fato de
que estas formas têm menor atividade biológica e estão
associadas a casos assintomáticos ou oligossintomáticos14,
e à presença de estudos de imagem do sistema nervoso
central normais. Desta maneira, em especial em pacientes
cujo quadro clínico não seja característico, a pesquisa de
macroprolactinemia é fundamental15.
Apesar da pouca informação referente à hiperprolactinemia às custas da macroprolactina, o quadro clínico
frustro secundário à baixa atividade de tais moléculas faz
com que seu tratamento seja muitas vezes desnecessário.
Segundo o guideline para tratamento de prolactinomas da
Pituitary Society4, as indicações formais de tratamento das
hiperprolactinemias se restringem aos casos de pacientes
sintomáticos, a macroprolactinomas ou a microprolactinomas assintomáticos com progressão do crescimento. Sendo
assim, casos de hiperprolactinemia não-associados a tumor
raramente terão indicação de tratamento, já que, na maioria
das vezes, são assintomáticos. Não há muita discussão com
relação à conduta diante de casos de macroprolactinemia
assintomáticos. No entanto, a conduta para os casos com
hiperprolactinemia indeterminada, com sintomas que
geram pouco desconforto, ou assintomática é, ainda, sujeita
a controvérsias, sendo possível que a paciente opte por
tratar, ou não, dependendo do desconforto produzido pela
doença. Há lacunas no conhecimento quanto à relevância
clínica da doença, seja em relação ao comportamento do
tumor ou quanto à evolução do quadro. Dessa maneira,
este estudo visa caracterizar as pacientes com valores
indeterminados de hiperprolactinemia (recuperação entre 30 e 65%) (PRLi) ou macroprolactinemia (PRLm),
quanto às características clínicas, tais como intensidade
e variação dos sintomas e presença, ou não, de tumores
no sistema nervoso central.
Métodos
Trata-se de um estudo transversal, retrospectivo, de
levantamento de prontuários, no qual foram incluídas
pacientes em seguimento no Ambulatório de Ginecologia
Endócrina do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto da
Universidade de São Paulo (FMRP-USP). As pacientes
apresentavam diagnóstico de hiperprolactinemia, mas eram
assintomáticas ou apresentavam sintomas clínicos leves (galactorreia somente à expressão da mama e oligomenorreia).
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):92-6
93
Rosa-e-Silva ACJS, Madisson MM, de-Sá MFS, Reis RM, Rosa-e-Silva JC, Lara LAS
Este estudo teve a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa
(CEP) do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto.
Foram incluídas mulheres em idade reprodutiva, com
níveis de prolactina sérica superiores a 25 ng/dL, submetidas à investigação para macroprolactinemia com o uso do
pós-teste de PEG16,17. Onze mulheres com diagnóstico
de macroprolactinemia e 13 com valores indeterminados de hiperprolactinemia foram incluídas. Foram
considerados para a análise os registros dos dados relativos
à idade, à paridade, ao índice de massa corporal (IMC),
à presença de galactorreia, à infertilidade e à presença de
tumor do sistema nervoso central. Nos dois grupos (PRLm
e PRLi), as dosagens de PRL foram obtidas pelo método da
imunoquimioluminescência, utilizando-se kits comerciais
específicos da IMMULITE DPC MED LAB, Los Angeles,
USA DPC (Immulite® 2000 immunoassay analyzer, Diagnostic
Products Corporation, Los Angeles, CA, USA).
Nas pacientes com valores de prolactina sérica superiores
a 25 ng/dL, procedeu-se ao tratamento da amostra de soro
com solução salina de PEG, a qual não precipita a forma
monomérica, mas precipita a macroprolactina possibilitando
que esta seja removida. Esta técnica consiste em realizar, inicialmente, a dosagem da prolactina total no soro. A seguir,
acrescenta-se o polímero polietilenoglicol à amostra testada.
Esta composição é misturada em agitador tipo vórtex durante
um minuto e, a seguir, centrifugada por cinco minutos, o
que leva à precipitação da macroprolactina. Empregando a
mesma técnica para a dosagem inicial da PRL, novamente os
níveis são dosados à prolactina no sobrenadante recuperado,
que representa a prolactina livre ou sua fração de small12.
O cálculo da porcentagem de macroprolactina (PRLm) é
dado pela fórmula: PRLm (%)=(PRLm x 2/PRL total)x100.
A recuperação da prolactina menor do que 30% significa que
há o predomínio de formas de alto peso molecular, sendo
considerados positivos para macroprolactinemia (PRLm),
valores maiores que 65% significam que a amostra tem
predomínio de formas monoméricas (microprolactinemia
ou hiperprolactinemia verdadeira) e valores de recuperação
entre 30 e 65% são classificados como indeterminados (PRLi).
Foram excluídas as mulheres portadoras de hipotireoidismo,
acromegalia, insuficiência renal crônica, hepatopatias, condições estas associadas ao incremento da prolactina sérica.
Foram também excluídas as usuárias de derivados de haloperidol, fenotiazinas, risperidona, sulpirida e verapamil, os
quais exercem efeito antagonista ou reduzem a reserva de
dopamina, a qual inibe a secreção de prolactina18. Os resultados foram analisados utilizando-se o programa GraphPad
Prism, versão 5.00 (GraphPad Software; Inc-2007). Os dados
antropométricos foram expressos em média e desvio padrão
e, para a comparação entre os grupos quanto à presença de
tumor no sistema nervoso central, galactorreia e infertilidade,
utilizou-se o teste t de Student. Valores de p<0.05 foram
considerados significantes.
94
Rev Bras Ginecol Obstet. 2012; 34(2):92-6
Resultados
Não houve diferença quanto à idade, ao IMC e à
paridade entre pacientes com PRLm e aquelas com PRLi
(Tabela 1).
Na avaliação dos sintomas, houve maior prevalência
de galactorreia entre pacientes com hiperprolactinemia
intermediária (p=0,01); mas não houve diferença significante com relação à ocorrência de infertilidade ou de
ciclos menstruais irregulares (Figura 1).
Quanto à etiologia, 16,7% das pacientes com macroprolactinemia eram portadoras de tumor, enquanto que
77,8% das pacientes do grupo com hiperprolactinemia
indeterminada apresentavam tumor hipofisário (p=0,04),
como pode ser observado na Figura 2. Dentre as pacientes
com PRLm e PRLi, nove não realizaram exame de imagem
do sistema nervoso central por apresentarem níveis pouco
elevados de prolactina, sendo cinco pacientes com PRLm
e quatro com PRLi.
Tabela 1. Características clínicas, epidemiológicas e antecedentes das mulheres portadoras
de hiperprolactinemia
PRLm média (DP)
PRLi média (DP)
Valor p
29,3 (9,8)
31,4 (9,0)
0,6
1,1(1,6)
0,8 (1,2)
0,7
23,4 (3,5)
24,2 (5,1)
0,7
Idade
Paridade
IMC
PRLm: macroprolactinemia; PRLi: indeterminado; DP: desvio padrão; IMC: índice
de massa corporal.
90
80
70
60
50
40
30
20
10
0
PRLm
PRLi
*
Galactorreia
Infertilidade
Ciclos irregulares
p=0,01; PRLi: prolactina indeterminada; PRLm: macroprolactina.
Figura 1. Sintomas referidos pelas pacientes.
90
80
70
60
50
40
30
20
10
0
PRLm
PRLi
*
Presença de tumor
Ausência de tumor
*p=0,04; PRLi: prolactina indeterminada; PRLm: macroprolactina.
Figura 2. Associação entre presença de imagem no sistema nervoso
central e hiperprolactinemia.
Macroprolactinemia e hiperprolactinemia intermediária: manifestações clínicas e achados radiológicos
Discussão
No presente estudo, observou-se maior prevalência de
galactorreia entre pacientes com hiperprolactinemia indeterminada quando comparadas àquelas com quadro definido de
macroprolactinemia. Há relato de que esse sintoma está presente em 4% das mulheres portadoras da forma intermediária
e em 19% das mulheres portadoras da forma monomérica8.
Entretanto, a galactorreia associada a distúrbios menstruais é
mais prevalente na forma monomérica19. Aproximadamente
40% das mulheres, com sintomas clínicos de hiperprolactinemia e níveis alterados de prolactina, apresentam nódulos
na hipófise20.
Em uma porcentagem expressiva dos casos de hiperprolactinemia está presente a forma macro, biologicamente
menos ativa, passível de recuperação pós-precipitação do soro
com polietilenoglicol. Essa técnica é capaz de caracterizar o
tipo de hiperprolactinemia em mais de 85% dos casos analisados, a um custo muito baixo, evitando-se encaminhamentos
desnecessários de pacientes para estudos de imagens11. Nos
casos restantes, fica o diagnóstico de hiperprolactinemia
intermediária e persiste a dúvida sobre suas repercussões e a
necessidade, ou não, do tratamento.
Neste estudo, chama a atenção a alta prevalência de
tumores no grupo de mulheres com hiperprolactinemia
indeterminada (77,8%), quando comparadas àquelas portadoras de macropolactinemia (16,7%). Altas incidências de
tumor também foram descritas por Hauache et al.21, 75%
das pacientes com hiperprolactinemia verdadeira e 11%
das PRLm apresentavam alterações nos exames de imagem
do sistema nervoso central. Entretanto, há outros relatos na
literatura que mostram associações menos frequentes entre
a presença de tumor e a PRLm. Toldy et al.8 encontraram
que o microadenoma estava presente em 9,8% das portadoras de macroprolactinemia e em 31,8% das mulheres
com hiperprolactinemia verdadeira. Vilar et al.19, em outro
estudo, encontraram uma associação de 11% entre a presença
de macroprolactinemia e de microadenoma hipofisário. No
entanto, não existem dados na literatura sobre a associação
entre hiperprolactinemia indeterminada e a frequência de
tumores no sistema nervoso central.
A PRLm responde por um terço ou mais dos casos de
hiperprolactinemia8,19,22. Já é reconhecido que, nos casos
em que há predomínio da macroprolactina, os sintomas são
menos comuns (44%) quando comparados àquelas mulheres
portadoras da forma monomérica (88,5%)19, e nem sempre
que estão associados aos níveis da macroprolactina podem
refletir a presença de comorbidades22. A relação da gravidade
dos sintomas clínicos com a prolactina monomérica bem
como as diretrizes para o tratamento destes casos já estão
bem estabelecidos4. Entretanto, ainda faltam evidências na
literatura, o significado, o quadro clínico e o manuseio da forma
indeterminada da hiperprolactinemia (recuperação >30% e
<65%), que está presente em 10 a 12% dos casos10,11.
Em relação à função reprodutiva, o presente estudo não
detectou diferença relevante entre os grupos quanto à ocorrência
de ciclos menstruais irregulares e relatos de infertilidade. Este
achado confirma o de outros autores19. Os distúrbios menstruais estão mais associados à forma monomérica19, bem como a
infertilidade associada à hiperprolactinemia, que está presente
em 17% das mulheres portadoras de macroprolactinemia
e em 44% das portadoras da forma monomérica8.
A rotina de screening para macroprolactinemia deveria
ser realizada para os casos de pacientes com quadro de hiperprolactinemia, o que, além de prevenir contra a mobilização inadequada de recursos com exames laboratoriais e de
imagens23, define o tratamento adequado evitando condutas
desnecessárias. Ademais, os achados do presente estudo
estão em conformidade com aqueles encontrados por outros
autores24, os quais também sugerem que, em mulheres com
macroprolactinemia, os estudos de imagem deveriam ser
realizados somente se houver sintomas clínicos associados.
Devido ao fato de que pacientes com hiperprolactinemia
intermediária apresentam-se mais sintomáticas, especificamente com relação à presença de galactorreia, e com maior
incidência de tumores de hipófise do que pacientes com
macroprolactinemia, acredita-se que seja mais prudente que
a condução terapêutica deste casos siga os preceitos clínicos semelhantes aos das pacientes com hiperprolactinemia
verdadeira, inclusive no que diz respeito à investigação dos
tumores do sistema nervoso central. Porém, devido à limitação
deste estudo pelo número reduzido de casos, são necessárias
mais pesquisas com casuísticas maiores para comprovar esses
achados, os quais poderão nortear a elaboração de protocolos
específicos para estas pacientes.
No presente estudo, evidenciou-se que a hiperprolactinemia intermediária está associada a uma maior incidência
de galactorreia e de tumor no sistema nervoso central.
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