UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL - UNIJUI
DCSa - DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM SAÚDE MENTAL
Marcia Letícia Dreilich da Silva
REABILITAÇÃO PSICOSSOCIAL, UM DISPOSITIVO DA REFORMA
PSIQUIÁTRICA BRASILEIRA
Trabalho de Conclusão de Curso
IJUÍ/RS 2011
Marcia Letícia Dreilich da Silva
REABILITAÇÃO PSICOSSOCIAL, UM DISPOSITIVO DA REFORMA
PSIQUIÁTRICA BRASILEIRA
Trabalho de Conclusão apresentado ao Curso
de Pós-Graduação Lato sensu em Saúde
Mental do Departamento de Ciências da
Saúde da Universidade Regional do Noroeste
do Estado do Rio Grande do Sul para a
obtenção do título de Especialista em Saúde
Mental.
Orientadora: Profª MSc. Leila Mariza Hildebrandt
IJUÍ/RS ABRIL DE 2011
RESUMO
REABILITAÇÃO PSICOSSOCIAL, UM DISPOSITIVO DA REFORMA PSIQUIÁTRICA
BRASILEIRA
Marcia Letícia Dreilich da Silva
Orientadora: Profª MSc. Leila Mariza Hildebrandt
Este estudo tem por objetivos identificar e analisar artigos publicados em português, no
período de 2005 a 2010, disponíveis na base de dados do Scientific Eletronic Library Online
– Scielo, que abordam a temática Reabilitação Psicossocial e sua interface com a Reforma
Psiquiátrica. A metodologia utilizada foi a revisão bibliográfica. Foram encontrados seis
artigos com aderência ao tema, utilizado as palavras chave reabilitação psicossocial e
reabilitação psicossocial X reforma psiquiátrica. Para realizar a análise do conteúdo
pesquisado, utilizou-se a técnica da análise temática. Com base nos artigos selecionados
surgiu a seguinte temática: A reabilitação psicossocial no contexto da reforma psiquiátrica. A
partir dos artigos discutidos evidenciou-se que a reabilitação psicossocial se constitui em um
instrumento importante na consolidação da reforma psiquiátrica brasileira.
Palavras–chave: Reabilitação Psicossocial; Reforma Psiquiátrica.
i
ABSTRACT
PSYCHOSOCIAL REHABILITATION, A DISPOSITIVE OF BRAZILIAN PSYCHIATRIC
REFORM
Author: Marcia Letícia Dreilich da Silva
Advisor: Profª MSc. Leila Mariza Hildebrandt
This study aims to identify and to analyze articles published in Portuguese, in the period of
2005 to 2010, available in the database of the Scientific Eletronic Library Online – Scielo,
which deal with the thematic of Psychosocial Rehabilitation and its interface with the
Psychiatric Reform. The methodology used was a bibliographic review in which six articles
with adherence to the theme were encountered, using the key words psychosocial
rehabilitation and psychosocial rehabilitation X psychiatric reform. To perform the analysis of
the researched content, the technique of thematic analysis was used. Based on the selected
articles the following thematic emerged: the psychosocial rehabilitation in the context of
psychiatric reform. From the articles discussed was evidenced that psychosocial
rehabilitation constitutes an important instrument in the consolidation of Brazilian psychiatric
reform.
KEYWORDS: Psychosocial Rehabilitation; Psychiatric Reform.
v
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 1
2. METODOLOGIA................................................................................................................ 3
3. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS ................................................................... 4
3.1. TEMA: A reabilitação psicossocial no cenário da reforma psiquiátrica ........................ 6
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................. 13
REFERENCIAS .................................................................................................................... 15
1. INTRODUÇÃO
A Reforma Psiquiátrica Brasileira surgiu a partir da falência do modelo de atenção
psiquiátrica centrado no hospital e na figura do médico, como única forma de tratamento e
da prática do confinamento para com os portadores de doença mental. Na década de 70, o
italiano Franco Basaglia lutou pela extinção dos manicômios e substituição destes por
serviços comunitários. Ressalta-se que a construção de um novo paradigma exigiu o
rompimento de um modelo assistencial baseado na institucionalização da loucura, na
estigmatização do portador de “doença mental”, nas práticas de maus tratos e na
cronificação da doença (BASAGLIA, 2001). Essa situação mobilizou a sociedade brasileira
que passou a questionar a eficiência e a eficácia do modelo vigente. Mas, foi exatamente
com os trabalhadores da área da saúde mental que apareceram os primeiros movimentos
de questionamento e transformação do processo de privatização e hospitalização da doença
mental.
Ao dirigir um olhar para a história, o sistema público de saúde, altamente médicocentrado, passou a coexistir com o surgimento da medicina comunitária no final da década
de 1960. A vertente comunitária da psiquiatria trouxe novas práticas organizadas em torno
da atenção psicossocial. Surgiu nos anos 70, a “Reforma Sanitária” e, concomitantemente, a
“Reforma Psiquiátrica” e esta é “compreendida como um conjunto de transformações de
práticas, saberes, valores culturais e sociais, é no cotidiano da vida das instituições, dos
serviços e das relações interpessoais que o processo da Reforma Psiquiátrica avança,
marcado por impasses, tensões, conflitos e desafios” (BRASIL, 2005 p. 6). Para Kantorski
(2001, p.07), é nesta época que a “publicação latino-americana busca, no resgate das
experiências européias e norte-americanas, refletir seus conteúdos teórico-práticos, suas
diversidades, suas contribuições, conflitos e limites, além de debruçar-se sob a criação de
novos espaços de assistência ao doente mental situados no contexto brasileiro”.
E é com conflitos e desafios, que o movimento pelas modificações no campo da
saúde mental mobilizou toda a sociedade brasileira. Cientistas, políticos, trabalhadores,
movimentos sociais, usuários do sistema e familiares uniram-se em torno de um único
propósito: reformar o modelo vigente. O Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental –
MTSM surge como protagonista na denúncia deste sistema e começa a construir
coletivamente uma crítica aos manicômios e a possibilidade de ruptura do modelo
excludente, segregador e hospitalocêntrico de assistência às pessoas com transtornos
mentais. O resultado dessa grande mobilização, além de vários outros eventos, foi a
realização da 8ª Conferência Nacional de Saúde, em Brasília no ano de 1986, um marco
histórico para a sociedade brasileira que, em meio a um processo de transição para a
redemocratização do país, elaborou os princípios basilares da Carta Magna de 1988, eis
que, garantiu um capítulo exclusivamente dedicado a saúde na construção do Sistema
Único de Saúde. Posteriormente, em 1987, realiza-se a 1ª Conferência Nacional de Saúde
Mental, no Rio de Janeiro (BRASIL, 2005).
Também, no ano de 1987, o surgimento de Centros de Atenção Psicossocial –
CAPS e Núcleos de Atenção Psicossocial – NAPS no estado de São Paulo faz com que a
possibilidade de construção de uma rede de cuidados efetivamente substitutiva ao hospital
psiquiátrico comece a se concretizar. Em 1989, a luta é pela regulamentação da Reforma
Psiquiátrica no campo legislativo e normativo, tendo início com a entrada do Projeto de Lei
do Deputado Paulo Delgado no Congresso Nacional, em que só foi promulgada 12 anos
depois. Esta lei dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos
mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental com o intuito de extinção dos
manicômios do país. “A apresentação deste projeto potencializou o debate em todo o país e
estimulou a criação de leis e orientações semelhante em vários estados e municípios”
(BRASIL, 2001 p. 19). Exemplo disto é o Rio Grande do Sul que teve a 1ª Lei Estadual no
contexto brasileiro a tratar da Reforma Psiquiátrica.
Com a promulgação da lei 8080/90, que regulamenta o Sistema Único de Saúde e
estabelece um novo paradigma na saúde pública, imediatamente transposta para a saúde
mental, em que produz um novo arcabouço teórico-técnico-prático, introduz, assim, uma
nova dimensão no processo de reforma psiquiátrica. Para Amarante (2008, p. 81), a
Reforma Psiquiátrica no Brasil:
É um processo que surge mais concreta e principalmente a partir da conjuntura da
redemocratização, em fins da década de 1970, fundado não apenas na crítica
conjuntural ao subsistema nacional de saúde mental, mas, também e
principalmente, na crítica estrutural ao saber e às instituições psiquiátricas clássicas,
no bojo de toda a movimentação político-social que caracteriza essa mesma
conjuntura de redemocratização.
Amarante (2009) diz ainda que a Reforma Psiquiátrica parte de um conjunto de
iniciativas de todos os setores, sejam elas, políticas, sociais, culturais, jurídicas, entre outras
e tem como objetivo transformar a relação da sociedade para com a pessoa portadora de
transtorno mental. A Reforma Psiquiátrica em construção visa transformar a instituição, o
poder médico psiquiátrico e as práticas de cuidado a esse contingente populacional.
A partir dessa proposição de mudanças, uma nova legislação em saúde mental foi
estruturada. Tanto em nível estadual como federal, leis foram elaboradas e promulgadas. A
partir disso, em 2001 foi aprovada a Lei Federal nº 10216/01, que dispõe sobre a proteção e
os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo
assistencial em saúde mental. Em seu artigo 5º traz:
O paciente há longo tempo hospitalizado ou para o qual se caracterize situação de
grave dependência institucional, decorrente de seu quadro clínico ou de ausência de
suporte social, será objeto de política específica de alta planejada e reabilitação
psicossocial assistida, sob responsabilidade da autoridade sanitária competente e
supervisão de instância a ser definida pelo Poder Executivo, assegurada à
continuidade do tratamento, quando necessário (grifo meu) (BRASIL, 2004).
Nesse cenário, a reabilitação psicossocial merece destaque e se constitui em um
importante instrumento que faz parte da atenção ao sujeito mentalmente enfermo e sua
família e se configura em uma das estratégias da implantação e solidificação da reforma
psiquiátrica brasileira. Quanto à definição de reabilitação psicossocial, Hirdes (2001, p. 65)
pontua que esta “é um processo que facilita a oportunidade para indivíduos - que são
prejudicados, inválidos ou dificultados por uma desordem mental – alcançarem um ótimo
nível de funcionamento independente na comunidade [...]”.
O tema-foco de discussão deste artigo é a reabilitação psicossocial, identificada, a
partir dos pressupostos da reforma psiquiátrica, como uma estratégia de atenção a pessoa
portadora
de
transtorno
mental,
que
possibilita
práticas
que
vão
desde
a
desintitucionalização do sujeito à (re) inserção do mesmo na sociedade, promovendo o
desenvolvimento de sua autonomia.
A partir das considerações elencadas, este estudo tem por objetivos identificar e
analisar artigos publicados em português, no período de 2005 a 2010, disponíveis no
Scientific Eletronic Library Online – Scielo, que abordam a temática sobre a reabilitação
psicossocial e sua interface com a reforma psiquiátrica.
2. METODOLOGIA
Para a realização deste estudo utilizou-se o método dialético, o qual “fornece as
bases para uma interpretação dinâmica e totalizante da realidade, já que estabelece que os
fatos sociais não podem ser entendidos quando considerados isoladamente, abstraídos de
suas influências políticas, econômicas, culturais [...]” (GIL, 1999 p.32). Por meio dele há a
possibilidade de investigar a realidade, considerando sua historicidade, totalidade e
contradição.
O presente estudo foi realizado por meio de uma pesquisa bibliográfica e esta é
entendida por Gil (1999) como uma pesquisa elaborada a partir de material já publicado
como, por exemplo, livros e artigos, tendo a contribuição de vários autores. Neste caso
foram selecionados artigos publicados em português, na base de dados do Scientific
Eletronic Library Online – Scielo, no período de 2005 a 2010 que abordam a temática da
reabilitação psicossocial e reforma psiquiátrica brasileira. Ressalta-se que foram
encontrados seis artigos com aderência ao tema, utilizando a palavra chave reabilitação
psicossocial. Ao utilizar as palavras chave reabilitação psicossocial X reforma psiquiátrica
apareceram dois artigos que já haviam sido identificados utilizando o termo reabilitação
psicossocial. Portanto, todos os artigos que emergiram lançando os descritores reabilitação
psicossocial e reabilitação psicossocial X reforma psiquiátrica foram analisados.
Para realizar a análise do conteúdo pesquisado, utilizou-se a técnica da análise
temática. Para Minayo (2010), esta técnica é dividida em três etapas: pré-análise,
exploração do material, tratamento dos resultados obtidos e interpretação. Ou seja, após
serem escolhidas as unidades de registros e as categorias, foram realizadas várias leituras
do mesmo material afim de que fosse possível alcançar o núcleo de compreensão do texto e
em seguida foi feita a interpretação da leitura do material.
3. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS
A partir da leitura dos artigos selecionados, far-se-á inicialmente uma descrição dos
mesmos e a seguir a análise de seus conteúdos.
Para descrevê-los, se terá por base o quadro que mostra aspectos relativos aos
autores, tipo de periódico, local da realização do estudo, objetivos, métodos utilizados para
as pesquisas e seus principais resultados.
QUADRO 1: Classificação do acervo selecionado segundo título, periódico, local da realização do
estudo, autores, objetivos, método utilizado e resultados.
Título
Periódico
1- Saúde Mental
no Sistema Único
de Saúde:
mudança do
Modelo de
Saúde e
Sociedade,
v.18, supl. 1,
2009.
Local da
Realização
do estudo
Município de
Lins/São
Paulo
Autores
Objetivo (s)
Método
Utilizado
Resultados
Carlos
César
Escudeiro,
Maria
de
Lourdes A
Realizar uma
retrospectiva
histórica das
mudanças
ocorridas,
Estudo
descritivo,
relato de
experiência
Reorganização da rede
de atenção em Saúde
Mental em Lins/SP,
com
desinstitucionalização
Atenção na
Região de Lins –
SP.
S Souza.
descrevendo
as ações de
assistência,
promoção,
prevenção e
reabilitação
psicossocial,
através da
implantação
de serviços
substitutivos
integrados à
atenção
básica,
apontando as
soluções
capazes de
efetivar os
princípios do
Sistema Único
de Saúde
(SUS).
de pacientes com
doença mental.
2- As
Representações
Sociais dos
Profissionais de
Saúde Mental
Acerca do Modelo
de Atenção e as
Possibilidades de
Inclusão Social.
Saúde e
Sociedade.
São Paulo, v.
17, n.1, p. 95106, 2008.
Município de
São
Carlos/São
Paulo.
Adriana
Leão,
Sonia
Barros.
Compreender
como ocorrem
as práticas de
inclusão social
voltadas para
as pessoas
com a
experiência de
sofrimento
psíquico, no
intuito de
contribuir para
a avaliação
deste serviço,
considerado
um importante
avanço na
Reforma
Psiquiátrica
Brasileira.
Pesquisa
qualitativa;
estudo de
caso;
entrevistas
semiestruturadas.
Foi observado que os
discursos obtidos pelas
entrevistas revelam
concepções
representativas do
modelo psiquiátrico
tradicional.
3- A reabilitação
psicossocial na
atenção aos
transtornos
associados ao
consumo de
álcool e outras
drogas: uma
estratégia
possível?
Pinho, P.H. et
al. / Rev. Psiq.
Clín 35, supl
1; 82-88,
2008.
Pesquisa
bibliográfica,
em base de
dados
Medline,
Paula
Hayasi
Pinho,
Márcia
Aparecida
de Oliveira,
Marilia
Mastrocolla
de
Almeida.
Identificar a
utilização e
compreensão
do conceito da
reabilitação
psicossocial
na atenção
aos problemas
associados ao
consumo de
álcool e
drogas.
Revisão
bibliográfica
do banco de
dados
MEDLINE.
Foi encontrado os
termos “suporte social”
e “apoio social”, que
fazem referência a
importância da rede
social na recuperação
do usuário de álcool e
outras drogas, assim
como a reabilitação
psicossocial determina
a importância da rede
social do indivíduo
como um de seus
eixos.
4Problematizando
a Reforma
Psiquiátrica
Brasileira: a
Genealogia da
Reabilitação
Psicossocial
Psicologia em
Estudo,
Maringá, v.
15, n. 1, p. 2734, jan./mar.
2010.
Artigo de
reflexão
Alessandra
Teixeira
Marques
Pinto,
Arthur
Arruda
Leal
Ferreira.
Problematizar
um dispositivo
importante no
processo da
reforma
psiquiátrica
brasileira que
éa
reabilitação
psicossocial.
Artigo de
reflexão
Observou-se que a
reabilitação
psicossocial tem uma
grande importância na
vida dos ditos doentes
mentais, mas
apresenta o risco de
promover a
manutenção da
condição de
psiquiatrizado.
5- O
Acompanhamento
Interface
Comunicação,
Reflexão
teórica
Ana
Celeste de
Discutir o
processo de
Reflexão
teórica.
As reflexões conduzem
a importância da
Terapêutico (AT):
dispositivo de
atenção
psicossocial em
saúde mental.
Saúde,
Educação
v.13, n.30,
p.67-77,
jul./set. 2009
6- O cuidado de
pessoas com
transtornos
mentais no
cotidiano de seus
familiares:
investigando o
papel da
internação
psiquiátrica.
Estudos de
Psicologia
2006, 11(2),
159-168.
Município de
Bauru/São
Paulo
Araújo
Pitiá,
Antonia
Regina
Ferreira
Furegato.
reabilitação
psicossocial e
este tipo de
ação
terapêutica na
saúde mental,
com base na
clínica de AT.
Marcelo
Dalla
Vecchia,
Sueli
Terezinha
Ferreira
Martins.
Investigar as
modificações
no cotidiano
de familiares e
de pessoas
que passaram
por internação
psiquiátrica e
os significados
implicados
neste
processo.
consolidação de uma
rede de atenção que
possibilite perspectiva
de vida aos portadores
de sofrimento psíquico
como um desafio a ser
enfrentado que
considere
prioritariamente o
sujeito aí implicado e
seu contexto de
imersão social.
Entrevista
semi
estruturada,
após, análise
temática e
interpretação
em
perspectiva
sóciohistórica.
Observou-se que (1) a
concepção de “cura”
está relacionada à
recuperação da
capacidade produtiva,
restrita a partir do
surgimento dos
sintomas; (2) os
recursos informais são
complementares,
principalmente quando
os recursos públicos
não são suficientes ou
satisfatórios; (3) a
religiosidade está
presente na
compreensão
metafísica das causas
do sofrimento psíquico;
(4) a igreja, na figura
do correligionários,
consiste em um grupo
de suporte para o
usuário e para a sua
família; (5) a
insuficiência de
políticas adequadas de
atenção a família na
rede substitutiva.
Dos artigos selecionados, dois contam em sua autoria com psicólogos, dois com
enfermeiros e três com terapeutas ocupacionais. Além disso, em dois artigos, um dos
autores não possui identificação profissional e em um deles não há identificação dos autores
em relação a sua categoria profissional.
A seguir, será discutido o conteúdo dos artigos selecionados, cujas informações
foram agrupadas em uma temática conforme recomenda Minayo (2010).
3.1. TEMA: A reabilitação psicossocial no cenário da reforma
psiquiátrica
Nos artigos selecionados foram elencados conceitos e experiências que permitem
identificar, na contemporaneidade, de que forma a política de saúde mental no Brasil vem se
configurando dentro dos princípios da reforma psiquiátrica. Os artigos analisados referem-se
à reabilitação psicossocial de pessoas portadoras de transtornos mentais. Vejamos a seguir
o que se pode identificar por meio da produção científica.
Pinho et al. (2008, p.84) fazem referência a um estudo realizado por meio de
publicações internacionais (em inglês), considerando a estratégia da reabilitação
psicossocial e a reinserção social de usuários que apresentam problemas devido ao uso de
álcool e outras drogas como uma possibilidade de elevação da condição de doente mental
para a de cidadão. Para os autores, a reabilitação psicossocial dos pacientes com
transtornos mentais busca resgatar as potencialidades e a autonomia dos sujeitos usuários
de álcool e outras drogas por meio de “estratégias e ações intra-setorais e intersetoriais
efetivas com o propósito que estes possam assumir sua condição de sujeito social”.
Para Saraceno (2001, p. 14) a reabilitação psicossocial,
não é uma tecnologia, isso é uma abordagem, é uma estratégia que implica muito
mais do que simplesmente passar um usuário, um paciente, de um estado de
“desabilidade” a um estado de “habilidade”, de um estado de incapacidade a um
estado de capacidade. Se fora somente isso, efetivamente, não seria necessário,
tantos momentos de reflexão ao redor da reabilitação, considerando-a não como
uma estratégia técnica, e sim como uma estratégia global. Isso tem uma primeira
consequência muito importante. Implica numa mudança total de toda política dos
serviços de saúde mental.
A reforma psiquiátrica brasileira propõe um novo modelo assistencial em saúde
mental: a desinstitucionalização e a inclusão da pessoa portadora de transtorno mental.
Porém, desinstitucionalizar vai muito além do que simplesmente retirar o paciente dos
hospícios e manicômios. Desinstitucionalizar também significa qualificar, expandir e
fortalecer a rede de atenção em saúde mental extra-hospitalar por meio de práticas que
permitam a reabilitação psicossocial do doente mental.
Nesse sentido, para Hirdes (2001, p. 28), o processo de desinstitucionalização não
é negar a loucura, mas sim “rejeitar o aparato institucional para buscar outras formas de
intervenção, mais sadias no sofrimento psíquico”. Ou seja, intervenções que permitam a
reabilitação psicossocial do paciente, possibilitando que o sujeito portador da doença mental
consiga por meio do processo da reabilitação psicossocial se (re) inserir no meio social, com
plenas condições de exercer a sua cidadania.
Saraceno (2001 p. 32-33) entende que
a reabilitação psicossocial não consiste em tornar os fracos fortes, ao contrário,
consiste em mudar as regras do jogo para que os fortes possam se adaptar aos
fracos e coexistir no mesmo cenário, a fim de permitir que o paciente que tem uma
desabilidade, freqüente o mesmo cenário onde os fortes estão.
Na mesma linha de pensamento, Saraceno (2001) enfatiza ainda que a reabilitação
psicossocial não é um conjunto de técnicas que tem como propósito ocupar o tempo dos
doentes mentais e nem enquadrar o sujeito em modelos pré-estabelecidos, mas sim
considerar suas potencialidades e construir situações que respeitem seus limites. Pitta
(2010, p. 19) aponta que a reabilitação psicossocial “representa um conjunto de meios
(programas e serviços) que se desenvolvem para facilitar a vida de pessoas com problemas
severos e persistentes”.
Assim, para Pinho et al. (2008), a estratégia da reabilitação psicossocial aos
pacientes usuários de álcool e outras drogas surge como uma resposta às diversas
demandas do usuário, considerando sua singularidade, a partir da construção de um projeto
terapêutico em consonância com as suas necessidades. Estas estratégias se baseiam no
que os autores identificam como suporte/apoio social, sendo que este pode auxiliar no
tratamento, melhorando as relações interpessoais dos usuários com a sociedade. Essas
prerrogativas se aproximam da noção de reabilitação psicossocial como promoção da
autonomia e da reinserção social dos indivíduos, como mencionam Pinho et al. (2008).
Nestes casos o suporte/apoio social é visto como uma condição importante na
recuperação do usuário de álcool e outras drogas e destacam este termo como um processo
da reabilitação psicossocial. Ou seja,
a família, os amigos e outros participantes podem ter um papel vital na
prevenção/desenvolvimento da recaída. O suporte social está associado às
necessidades subjetivas do indivíduo e também se relaciona a capacidade de
suporte emocional da família e amigos na redução dos conflitos interpessoais e no
estresse (MALHOTRA et al. 2001; Mc MAHON, 2001 apud PINHO et al., 2008 p.
86).
Para que isso se torne possível, o processo de reabilitação psicossocial implica na
construção de uma rede articulada, baseada nos princípios da reforma psiquiátrica. O
suporte ou apoio social referenciado pelos autores do artigo analisado, nada mais é do que
a articulação dessa rede de atenção em saúde mental, envolvendo os serviços oferecidos
pelos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), ambulatórios de saúde mental, unidade
básica de saúde, unidade de saúde da família, leitos psiquiátricos em hospitais gerais.
Também fazem parte da rede de apoio a família e a comunidade, além de todos os demais
dispositivos que possam contribuir na reabilitação psicossocial.
Ao analisar o artigo de Escudeiro; Souza (2009), os autores descrevem como se
deu o processo de reabilitação psicossocial e os avanços na implementação da rede de
atenção em saúde mental, a partir de instalações comunitárias em um município do Estado
de São Paulo. Este processo de reabilitação psicossocial se deu com a implantação de
serviços substitutivos ao modelo hospitalocêntrico e trouxe como resultados a redução de
internações hospitalares e o fechamento de dois hospitais psiquiátricos.
Dentro dos princípios da reforma psiquiátrica, estes serviços possibilitam o
processo de reabilitação psicossocial daquelas pessoas acometidas de transtornos mentais,
exemplos destes serviços substitutivos são CAPS; os residenciais terapêuticos; leitos
psiquiátricos em hospitais gerais; acompanhamento terapêutico - AT; acompanhamento
matricial; ambulatórios de saúde mental, entre outros.
Porém cabe ressaltar que não basta apenas “existir” estes serviços enquanto
estrutura física, eles devem compor antes de tudo, um arcabouço organizacional, ou seja,
contar com propostas de ações que possibilitem muito mais do que a desinstitucionalização,
e sim ações que possam resgatar as potencialidades da pessoa portadora de transtorno
mental. Para que isso se torne efetivo, é importante que estes serviços
[...] possibilitem o acolhimento das pessoas em crise e que todas as pessoas
envolvidas possam ser ouvidas, expressando suas dificuldades, temores e
expectativas. É importante que sejam estabelecidos vínculos afetivos e profissionais
com estas pessoas, que elas se sintam realmente ouvidas e cuidadas, que sintam
que os profissionais que as estão escutando estão efetivamente voltados para seus
problemas, dispostos e compromissados a ajudá-las. [...] na saúde mental e atenção
psicossocial, o que se pretende é uma rede de relações entre sujeitos que escutam
e cuidam – médicos, enfermeiros, psicólogos, terapeutas ocupacionais, assistentes
sociais, dentre muitos outros autores que são evidenciados neste processo social
complexo [...] (AMARANTE, 2007 p. 82).
Hirdes (2001) levanta uma questão relevante quanto a estes profissionais acima
citados. Para a autora, estes espaços de serviços substitutivos necessitam, antes de tudo,
de profissionais qualificados a este novo paradigma – a reabilitação psicossocial – da
reforma psiquiátrica.
Os novos serviços necessitam profissionais instrumentalizados para intervenções
reabilitativas. Serviços comunitários, centro de atenção psicossocial, ambulatórios
de saúde mental, leitos psiquiátricos em hospitais gerais só se farão concretos, na
perspectiva em questão, se os profissionais forem além de suas especificidades,
para se tornarem reabilitadores por excelência (HIRDES, 2001 p. 71).
A autora chama atenção à atuação em si dos “profissionais reabilitadores”, afim de
que se faça um trabalho completo, enxergue a pessoa portadora de transtorno mental em
todos os aspectos: biológico, psicológico e social.
Na mesma lógica de pensamento,
Goldberg (2010) aponta que é necessário que as universidades ofereçam uma proposta de
ensino e pesquisa, forme assim profissionais qualificados para trabalhar neste novo contexto
da reforma psiquiátrica. Uma das prática do processo de reabilitação psicossocial executado
por profissionais inseridos na rede de atenção em saúde mental é o acompanhamento
terapêutico – AT.
Ao analisar o artigo de Pitiá; Furegato (2009, p. 69), observa-se que os mesmos
mencionam a prática do AT “como um dos dispositivos de ação terapêutica que se incorpora
à atenção em saúde mental procurando promover a reintegração psicossocial dos
portadores de sofrimento psíquico [...]”. Para os autores, este recurso terapêutico contribui
para os atendimentos em saúde mental e a desconstrução do modelo asilar, proporcionando
que outros profissionais também se engajam na prática das ações terapêuticas, tais como
médicos, enfermeiros, psicólogos, terapeutas ocupacionais, assistentes sociais. Assim,
deixa-se de concentrar as ações apenas nas mãos dos médicos.
O AT possibilita novas formas de atenção em saúde mental, entendido pelos
autores como uma abordagem terapêutica que considera a pessoa com enfermidade mental
em seu contexto sócio-histórico-psíquico-biológico e cultural, com o propósito de contribuir
no processo de inclusão das diferenças, do bizarro, das dificuldades humanas (PITIÁ;
FUREGATO, 2009). Complementado a linha de pensamento dos autores citados, Leão;
Barros (2008, p.96) identificam que um dos principais desafios da reforma psiquiátrica é o
processo de inclusão social das pessoas portadoras de transtornos mentais e relatam que
um determinante da exclusão social do doente mental é pelas vias do trabalho, “[...] em
decorrência sobretudo dos estigmas atribuídos à doença, acrescido ao fato do desemprego
apresentar-se como um problema até mesmo para pessoas em condições “normais” de
produtividade e de competitividade”.
Para que seja possível que a pessoa portadora de transtorno mental tenha
autonomia de gerar normas, ordens para a sua vida, no processo de reabilitação
psicossocial, o profissional estabelece uma proposição que fundamenta as práticas de
inclusão social. Ou seja, a contratualidade entre profissional e usuário, visto como eixos
norteadores deste processo. Nesse sentido, Leão; Barros (2008) apontam que a construção
de um contrato terapêutico com o usuário deve considerar sua autonomia, sua rede social,
seu espaço de convivência e seu trabalho como valores sociais que podem contribuir na
atenção ao esse sujeito, na sua reabilitação psicossocial e no resgate de sua cidadania.
Kinoshita (2010, p.56-57) complementa que
a contratualidade do usuário, primeiramente vai ser determinada pela relação
estabelecida pelos próprios profissionais que o atendem [...]. Depois pela
capacidade de se elaborar projetos, isto é, ações práticas que modifiquem as
condições concretas de vida, de modo que a subjetividade do usuário possa
enriquecer-se, assim como, para que as abordagens terapêuticas específicas
possam contextualizar-se.
Um dos serviços que estabelece a contratualidade entre usuário e profissional e
também possibilita o trabalho de reabilitação psicossocial, visto como uma estratégia para
desenvolver a autonomia do sujeito e a inclusão social são os Centros de Atenção
Psicossocial. Porém, para Leão; Barros (2008), o paradigma da reforma psiquiátrica
tradicional
ainda
perpassa
as
práticas
das
equipes
técnicas
destes
serviços,
comprometendo assim todo o processo de desenvolvimento das potencialidades do sujeito,
reconstrução dos vínculos familiares, sociais e comunitários.
Segundo os autores mencionados, este paradigma tradicional ainda se faz presente
em virtude de que, muitas vezes, os profissionais de saúde mental não possuem uma
formação adequada para atuarem “na perspectiva da atenção psicossocial, necessitando de
maiores conhecimentos, tanto no que se refere ao aspecto clínico, quanto às questões
psicossociais, no sentido de realizar ações com os usuários que, de fato, sejam promotores
de inclusão social” (LEÃO; BARROS, 2008, p. 102).
para que seja efetivada a mudança paradigmática e não apenas a reformulação de
antigos princípios, é necessário estabelecer rupturas nas questões conceituais e
práticas que envolvam os profissionais nos novos serviços de atenção à saúde
mental (AMARANTE; TORRE, 2001 apud LEÃO; BARROS, 2008, p. 102).
Relembra-se novamente a questão levantada por Hirdes (2001), a qual faz
referência ao despreparo dos profissionais de saúde mental em lidar com as pessoas com
transtorno mental. A formação acadêmica, nas palavras da autora, não dispõe das
condições para que estes profissionais se ajustem as necessidades do movimento da
desinstitucionalização, comprometendo todo o processo de reabilitação do paciente e
concomitante a relação instituição-paciente-família.
Para que a inclusão social da pessoa portadora de transtorno mental aconteça de
forma efetiva, dentro das diretrizes da reforma psiquiátrica, deve-se buscar ações que
possibilitem e estimulem a realização de trocas sociais. Ou seja, além do envolvimento da
equipe técnica dos serviços substitutivos, também se faz necessário o envolvimento
daqueles que Hirdes (2001) chama de ‘contextos microssociais’: família; comunidade, os
quais devem buscar enfrentar o estigma do paradigma tradicional psiquiátrico por meio de
debates mais intensos e que possam resultar em ações de inclusão da pessoa acometida
de transtorno mental.
Sabe-se que o envolvimento do familiar no processo de reabilitação psicossocial,
nem sempre foi efetivo, porém ao longo dos anos, houve muitas transformações
significativas com resultados positivos. A família da pessoa com transtorno mental, na visão
de Vecchia; Martins (2006), assume um papel central depois do movimento da reforma
psiquiátrica. Ela é identificada como parceira e apoiadora no processo de reabilitação
psicossocial do familiar doente, porém a família não tem recebido a atenção necessária das
políticas de saúde mental vigentes no País. Além disso, ressalta-se que comumente há
sobrecargas dos familiares na convivência diária com a pessoa portadora de transtorno
mental, tanto na esfera pessoal como econômica, social e cultural como mencionam Koga;
Furegato (2002).
Além disso, Vecchia; Martins (2006) assinalam que o doente mental historicamente
foi considerado improdutivo, incapaz, representando vergonha para os seus familiares, por
isso, sua inserção no mercado de trabalho era limitada. Entretanto, a venda da força de
trabalho se constitui em uma maneira de reabilitar a pessoa portadora de transtorno mental,
dando-lhe a condição de cidadão, já que no modo capitalista esta é uma forma de inserção
na sociedade.
Em outro texto analisado Pinto; Ferreira (2010) destacam o lado negativo da
chamada despsiquiatrização, ou seja, o debate aqui levantado não é dizer que o movimento
pela reforma psiquiátrica, ou mesmo a despsiquiatrização (termo usado pelos autores) deve
ser ignorado, a questão é que
[..] trata-se antes de tudo de uma tentativa de reforçá-la, de retomar a sua força
crítica; pensá-la não como um processo acabado que devemos nos regozijar e
comemorar. Mas que qualquer comemoração só é válida no alerta constante dos
seus novos riscos [...]. É isso que intentamos levantar em relação a um dispositivo
específico bastante presente: a reabilitação psicossocial (PINTO; FERREIRA, 2010,
p.30).
Nas palavras dos autores, pode-se atentar que se a reabilitação psicossocial cria
possibilidades de emancipação e autonomia do sujeito no meio social, logo se exige dele
condições de “cumprir” com seus deveres enquanto cidadão pleno. Pinto; Ferreira (2010)
chamam isso de assumir o princípio da racionalidade moderna, igualdade de direitos e
cumprimento de deveres.
Inegavelmente a reabilitação psicossocial pode possibilitar transformações na vida
dos sujeitos em sofrimento psíquico. A questão que se apresenta é que as práticas
reabilitadoras podem ser tão violentas quanto o antigo hospício (PINTO; FERREIRA,
2010 p. 32).
Pode-se dizer que a reabilitação psicossocial, em tese, se configura como um “novo
tempo” da reforma psiquiátrica, pois ela vai além da desinstitucionalização propriamente dita
à pessoa portadora de transtorno mental, cujo processo de reabilitar não se limita a ‘fechar
as portas dos hospitais psiquiátricos’. Essa percepção vai ao encontro daquilo que os
autores discutem, pontuando que é necessário ter cuidado para implementar o que a
proposta de reabilitação preconiza, sem reproduzir práticas manicomiais nos serviços
considerados substitutivos. Pelo exposto, entende-se que a Reabilitação Psicossocial
propõe uma intervenção mais específica, mais centrada na pessoa e não na doença.
Desinstitucionalização está focado em como os serviços funcionam; reabilitação foca
em como as pessoas funcionam. Desinstitucionalização está focado em ambientes
fechados; reabilitação foca uma vida aberta. Desinstitucionalização está focado em
buscar livrar os pacientes do encarceramento; reabilitação está focado na busca de
suporte pessoal (ANTHONY et al. 1992 apud HIRDES, 2001, p. 70).
Dos artigos analisados, percebe-se que o tema reabilitação psicossocial se constitui
em um dispositivo importante no contexto da reforma psiquiátrica desde que suas
prerrogativas sejam incorporadas pelos trabalhadores da área da saúde mental, usuários,
familiares e comunidade em geral.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
No Brasil, desde o final da década de 70, com o movimento da reforma psiquiátrica,
as formas de atenção ao portador de transtorno mental ganham maior visibilidade e as
discussões em torno das práticas voltadas a este sujeito avançam significativamente.
Profissionais da área da saúde estão, cada vez, mais lança mão de ações que permitam a
reabilitação psicossocial da pessoa portadora de transtorno mental, com o objetivo de
ofertar a esta, condições para a sua (re) inserção no meio social e concomitante ao mercado
de trabalho.
A reabilitação psicossocial é considerada como um dispositivo importante dentro
dos princípios da reforma psiquiátrica. Ao realizar a análise de artigos científicos, cuja
temática está focada na reabilitação psicossocial, pode-se refletir criticamente como
acontece na prática este novo paradigma de atenção à pessoa portadora de transtorno
mental.
Identifica-se então que a reabilitação psicossocial requer a desinstitucionalização
da pessoa portadora de transtorno mental, porém o desafio vai além, é necessário antes de
tudo, desmistificar os aparatos manicomiais que ainda perpassam o fazer cotidiano dos
profissionais e da sociedade. Só assim será possível pensar em um projeto terapêutico que
permita fortalecer as potencialidades do sujeito, proporcionar o exercício da cidadania.
Os artigos aqui analisados mostram que o processo de reabilitação psicossocial é
abrangente, ou seja, esta nova estratégia de atenção deve acontecer tanto nas instituições
com a equipe multiprofissional envolvida, como também no meio social, na comunidade,
com a intervenção de familiares e amigos. Estes sujeitos são os principais ‘autores’
envolvidos para que a pessoa portadora de transtorno mental consiga desenvolver suas
habilidades e ter autonomia de gerir suas próprias necessidades.
É importante ressaltar que não é sempre que este envolvimento acontece, em
determinadas situações a própria família não está preparada em termos psíquicos e
emocionais para ajudar o seu familiar doente na sua reabilitação. Além disso, a comunidade
e/ou o meio social frequentemente possui preconceito e discrimina o indivíduo portador de
transtornos mentais. O profissional, muitas vezes, reproduz práticas manicomiais voltadas a
estigmatização da doença, ocorre assim uma fragmentação do cuidar que compromete todo
processo de reabilitação psicossocial do indivíduo doente.
Desta forma, é necessário investir em qualificação continuada aos profissionais da
rede de atenção em saúde mental e disponibilizar informações aos usuários do sistema,
sejam eles portadores do transtorno mental ou o próprio familiar, que, em muitas situações,
não consegue e não sabe lidar com essas experiências de adoecimento mental. A
sociedade também está desprovida de informações e consumida por um modelo de atenção
estigmatizante que valoriza a doença mental em detrimento da pessoa que está doente, o
que não contribui com o processo de reinserção do sujeito ao meio social.
Em suma, pode-se dizer que houve avanços em termos de atenção a pessoa
portadora de transtorno mental com o fortalecimento da rede pública de saúde, cujos
investimentos obedeceram a ótica da desinstitucionalização, um dos principais eixos da
reforma psiquiátrica, além de novas práticas, dentro de uma visão multidisciplinar. Assim, o
portador de transtorno mental passou a ser percebido como um sujeito que ocupa um
espaço, estabelece relações, tem desejos e é dono de sua existência. Porém no que se
refere à reforma psiquiátrica no Brasil, a reabilitação psicossocial é um processo que ainda
tem que avançar, em termos de práticas, especialmente, na construção de uma rede
articulada de serviços que tenha eficácia, eficiência e efetividade.
Enfim, para consolidar o processo da reforma psiquiátrica é antes de tudo superar o
paradigma da doença, do preconceito, o que equivale dizer que a reforma psiquiátrica deve
em primeiro lugar, acontecer em nós mesmos para depois se estender ao mundo das
práticas terapêuticas e da ressocialização da pessoa portadora de transtorno mental.
16
REFERÊNCIAS
AMARANTE, Paulo. Saúde Mental e Atenção Psicossocial. Temas em Saúde. Rio de
Janeiro: Editora Fiocruz, 2007.
AMARANTE, Paulo. (Coord.) Loucos pela vida: a trajetória da reforma psiquiátrica no
Brasil. 2ª Ed. 4ª Reimpressão – Rio de Janeiro: Fiocruz, 2009.
AMARANTE, Paulo. O Homem e a Serpente outras histórias para a loucura e a psiquiatria.
3ª reimpressão. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2008.
BASAGLIA, Franco. A Instituição Negada. São Paulo: Graal, 2001.
BRASIL. Ministério da Saúde. Legislação em saúde mental. 2. Ed. Brasília, 2004.
Disponível
em
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LEIS_2001/L10216.htm>.
Acesso em: 18/02/2011.
BRASIL, MINISTÉRIO DA SAÚDE. Reforma Psiquiátrica e política de saúde mental no
Brasil: 15 anos depois de Caracas. Brasília, 2005. Disponível em www.saude.gov.br.
Acesso em setembro de 2010.
________ SECRETARIA DE ASSISTÊNCIA À SAÚDE/ CONSELHO NACIONAL DE
SAÚDE: Conferência Nacional de Saúde Mental: Caderno Informativo. – 1. ed. –
Brasília, 2001.
ESCUDEIRO, Carlos César; SOUZA. Maria de Lourdes A S. Saúde Mental no Sistema
Único de Saúde: mudança do Modelo de Atenção na Região de Lins – SP. Saúde e
Sociedade,v.18, supl. 1, 2009. Disponível em http://www.scielo.br/pdf/sausoc/v18s1/07.pdf
Acesso em Janeiro de 2011.
GIL, Antônio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. – 5. ed. – São Paulo: Atlas,
1999.
GOLDENBERG, Jairo. Reabilitação como processo – O Centro de Atenção Psicossocial CAPS. In: PITTA, A. M. F. Reabilitação Psicossocial no Brasil. Editora Hucitec, 3ª
Edição, São Paulo 2010.
HIRDES, Alice. Reabilitação Psicossocial: dimensões teórico-práticas do processo.
Erechim/RS: EdiFAPES, 2001.
KANTORSKI, Luciane. P. A reforma psiquiátrica – um estudo parcial acerca da produção
científica. Revista Eletrônica de Enfermagem (online), Goiânia, v.3, n.2, jul-dez. 2001.
Disponível em www.fen.ufg.br/revista/index.htm. Acesso em setembro de 2010.
17
KINOSHITA, Roberto. T. Contratualidade e Reabilitação Psicossocial. In: PITTA, A. M. F.
Reabilitação Psicossocial no Brasil. Editora Hucitec, 3ª Edição, São Paulo 2010.
KOGA, Marico; FUREGATO, Antonia R. Convivência com a pessoa esquizofrênica:
sobrecarga familiar. Revista Ciência, Cuidado e Saúde. Maringá, v.1, n. 1 p. 69-73, 1.
Sem. 2002.
LEÃO, Adriana; BARROS, Sônia. As Representações Sociais dos Profissionais de Saúde
Mental acerca do Modelo de Atenção e as Possibilidades de Inclusão Social. Saúde e
Sociedade. São Paulo, v. 17, n.1, p. 95-106, 2008. Disponível em
www.scielo.br/pdf/sausoc/v17n1/09.pdf. Acesso em Janeiro de 2011.
MINAYO, Maria C. S. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 12. ed.
São Paulo: Hucitec; Rio de Janeiro: Abrasco, 2010.
PINHO, Paula H. et al. A reabilitação psicossocial na atenção aos transtornos associados ao
consumo de álcool e outras drogas: uma estratégia possível? Rev. Psiq. Clín 35, supl 1;
82-88, 2008. Disponível em http://www.scielo.br/pdf/rpc/v35s1/a17v35s1.pdf Acesso em
Janeiro de 2011.
PINTO, Alessandra T. M.; FERREIRA, Arthur A. L. Problematizando a Reforma Psiquiátrica
Brasileira: a Genealogia da Reabilitação Psicossocial. Psicologia em Estudo, Maringá,
v.
15,
n.
1,
p.
27-34,
jan./mar.
2010.
Disponível
em:
http://www.scielo.br/pdf/pe/v15n1/a04v15n1.pdf Acesso em Janeiro de 2011.
PITIÁ, Ana. C. A.; FUREGATO, Antonia R. F. O Acompanhamento Terapêutico (AT):
dispositivo de atenção psicossocial em saúde mental. Interface Comunicação, Saúde,
Educação.
v.13,
n.30,
p.67-77,
jul./set.
2009.
Disponível
em
http://www.scielo.br/pdf/icse/v13n30/v13n30a07.pdf Acesso em Janeiro de 2011.
PITTA, Ana M. F. (org.). Reabilitação Psicossocial no Brasil. Editora Hucitec, 3ª Edição,
São Paulo 2010.
SARACENO, Benedetto. Libertando identidades: da reabilitação psicossocial à
cidadania possível. 2ª ed. Rio de Janeiro (RJ): Te Corá/Instituto Franco Basaglia;
2001.
VECCHIA, Marcelo D.; MARTINS, Sueli T. F. O cuidado de pessoas com transtornos
mentais no cotidiano de seus familiares: investigando o papel da internação psiquiátrica.
Estudos
de
Psicologia
2006,
11(2),
159-168.
Disponível
em
http://www.scielo.br/pdf/epsic/v11n2/a05v11n2.pdf Acesso em Janeiro de 2011.
Download

ARTIGO FINAL POS SAUDE MENTAL - Biblioteca Digital da UNIJUÍ