OS CONFLITOS MUNDIAIS PELOS RECURSOS NATURAIS
Fernando Alcoforado*
Tudo leva a crer que as guerras do Século XXI terão como fulcro a batalha por recursos
naturais que tendem a se esgotar. Nosso modelo de desenvolvimento está atingindo seus
limites. Se for considerado o exemplo da China, em 2003, ela consumiu 30% do
petróleo e apenas uma fração muito pequena da população vivia com base nos padrões
dos países desenvolvidos. O que vai acontecer nos próximos anos se a China mantiver a
sua taxa de crescimento para proporcionar aos seus 1,3 bilhão de pessoas viverem de
acordo com os padrões dos países desenvolvidos? Haverá um impacto gigantesco sobre
a demanda de recursos naturais.
Mesmo antes do esgotamento dos recursos naturais, haverá uma "guerra econômica"
real, que poderà acontecer dentro de cinco anos. Com a falta de recursos naturais
necessários para a sobrevivência e a ausência de governo, a humanidade tende a uma
regressão à barbárie e ao comportamento cruel. As guerras de invasão têm diversos
objetivos, entre as quais a conquista de recursos naturais. O que os Estados Unidos e a
Inglaterra fizeram no Iraque não foi muito diferente daquilo que, no passado, os
espanhóis fizeram com os maias e com incas em busca de ouro nas Américas.
No Iraque, o objetivo foi claro: apropriar-se do "ouro negro", o petróleo. Sob esta ótica,
os Estados Unidos realizaram um "bom negócio" com a sua intervenção no Iraque, que
contém uma das maiores reservas de petróleo do mundo. Agora, a máscara cai, também,
no campo das invasões e guerras de ocupação pelo controle de minérios. Recentemente,
foram desvendadas as razões da invasão e da ocupação do Afeganistão: a existência de
imensas reservas minerais. Os antes desconhecidos depósitos de ferro, cobre, cobalto,
ouro e metais críticos para a indústria, como o lítio, são tão grandes que o Afeganistão
poderá, no futuro, transformar-se num dos mais importantes centros de mineração do
planeta, acreditam representantes do governo dos Estados Unidos.
Entre as descobertas encontra-se, também, nióbio, um metal essencial para a produção
de super-condutores, além de outros minerais raros. Já as reservas de lítio são
equivalentes ou maiores do que as da Bolívia, até recentemente as maiores conhecidas
no mundo. O Afeganistão pode se transformar na Arábia Saudita do lítio, uma matéria
prima essencial para as modernas baterias. A preocupação agora é como evitar que o
anúncio de novas descobertas leve os nacionalistas talibans a lutarem com mais vigor
para retomar o controle do país – e essa é uma preocupação do governo dos Estados
Unidos. Os soviéticos já sabiam da existência dessas minas e fizeram um mapeamento
durante o período em que as suas tropas ocuparam o Afeganistão, nos anos 1980.
Um fato indiscutível é o de que a humanidade já consome mais recursos naturais do que
o planeta é capaz de repor. O colapso é visível nas florestas, oceanos e rios. O ritmo
atual de consumo é uma ameaça para a prosperidade futura da humanidade. A
exploração de recursos naturais da Terra permite à humanidade atingir patamares de
conforto cada vez maiores. Diante da abundância de riquezas proporcionada pela
natureza, sempre se aproveitou como se o dote fosse inesgotável. Hoje se sabe que a
maioria dos recursos naturais pode desaparecer num prazo relativamente curto e que é
urgente evitar o desperdício. Estudo realizado pela Word Wildlife Fund mostra que o
atual padrão de consumo de recursos naturais supera em 30% a capacidade do planeta
de recuperá-los.
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Nos últimos 45 anos, a demanda pelos recursos naturais do planeta dobrou, devido à
elevação do padrão de vida nos países ricos e emergentes e o aumento da população
mundial. Hoje a humanidade utiliza 50% da água doce do planeta. Em 40 anos utilizará
80%. A distribuição geográfica da água doce é desigual. Atualmente 1/3 da população
mundial vive em regiões onde ela é escassa. O uso da água imprópria para o consumo é
responsável por 60% dos doentes do planeta. Metade dos rios do mundo está
contaminada por esgoto, agrotóxicos e lixo industrial.
Apenas 12% das terras do planeta são cultiváveis. Nos últimos 30 anos dobrou o total
de terras cultiváveis atingidas por secas severas devido ao aquecimento global. Na
China a cada 2 anos uma área equivalente ao estado de Sergipe se transforma em
deserto. Das 200 espécies de peixe com maior interesse comercial, 120 são exploradas
além do nível sustentável. Neste ritmo, o volume de pescado disponível terá diminuído
em mais de 90% até 2050. Estima-se que 40% da área dos oceanos esteja gravemente
degradada pela ação do homem. Nos últimos 50 anos o número de zonas mortas cresce
de 10 vezes.
Desde 1961, a quantidade de gases poluentes despejada pelo homem na atmosfera
cresceu 10 vezes. Essa descarga acelera o aquecimento do planeta provocando secas,
inundações e extinção de espécies. A redução desde 1970 até hoje, por habitat de
espécimes terrestres é de 33%, espécimes marinhos corresponde a 14%; e de espécimes
de água doce é de 35%.
A população mundial cresce aproximadamente 80 milhões por ano agravando a
demanda por água e seus serviços. Relatório da Unesco sobre o uso da água confirma
que, sem medidas contra o desperdício e a favor do consumo sustentável, o acesso à
água potável e o saneamento serão ainda mais reduzidos. O relatório estima que 5
bilhões de pessoas sofrerão com a falta de saneamento básico em 2030. O crescimento
populacional significa mais pressão na agricultura, setor que mais consome água no
planeta. A agricultura consome 70% de toda a água potável consumida no planeta.
Caso os atuais métodos de irrigação do solo não sejam aprimorados, a demanda do setor
agrícola por água vai aumentar entre 70% e 90% até 2050.
O Brasil é o país com a maior reserva de água doce do planeta e não está imune aos
problemas de escassez e mau uso da água principalmente no setor agrícola, onde o
desperdício é muito grande. A água é utilizada na irrigação com baixa eficiência,
estando o país muito aquém de uma produção agrícola sustentável. Em geral o
agricultor usa mais água do que o necessário. Na falta de controle e informação, o
agricultor tenta irrigar mais, com medo de irrigar menos, e assim ele acaba desviando
nutrientes do solo, causando erosão. Não há educação para a economia de água tanto no
campo quanto nas cidades. Outro aspecto importante é que o problema da água não é só
quantidade, mas acima de tudo qualidade.
A desertificação afeta, além do Nordeste, áreas em Minas e Rio Grande do Sul, o que
significa 15% do território do Brasil. Entraram na rota de desertificação 1.482
localidades espalhadas pelo Ceará, Piauí, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte,
Minas Gerais e Rio Grande do Sul. A desertificação não é um flagelo moderno. A
novidade é que o avanço deste processo sinaliza uma ameaça global. Segundo estudo
realizado pela ONU, a cada minuto, 12 hectares de terra viram deserto no mundo.
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*Fernando Alcoforado, 71, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional
pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico,
planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos
livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem
Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000),
Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de
Barcelona, http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento
(Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos
Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic
and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft &
Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010) e Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e
Editora, Salvador, 2010), entre outros.
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