"Mas, dr. Willie, não vai ficar estreita?" - pergunta Domingos Casoni ao prefeito Willie Davids, em 1937, acompanhando a abertura de uma rua em Londrina. Davids responde que a largura está ótima: a cidade não passaria de 20 mil habitantes. O estreitamente das ruas teria sido determinado pela matriz da colonizadora em Londres, corrigindo a planta original feita pelo engenheiro Alexandre Rasgulaeff. Medíocre a visão inglesa de futuro diante da velocidade da urbanização. Já estavam na cidade as Casas Penambucanas, o Banco Noroeste e a Caixa Econômica Federal; o município tinha cinco escolas primárias e a zona do meretrício se expandia. Em artigo no Diário de S. Paulo, em 1938, o presidente do Banco do Estado de S. Paulo, Carlos Assumpção, aponta para o futuro do Norte d o Paraná, onde "o orçamento de Londrina é d e praticametne mil contos de réis". Assumpção defende o prosseguimento da ferrovia numa região "fadada a ser uma Califórnia brasileira", para alcançar o oeste e o Paraguai. Nos dois anos seguintes o município atinge a 70 mil habitantes, dos quais 10 mil nas zonas urbana e suburbana, com 1.744 casas. E 11.177 casas em todo o município incluindo aquelas nos distritos - Nova Dantzig, Rolãndia, Marilândia, São Roque (depois Tamarana) e São Sebastião. Os números são de um mapa da Agência Municipal de Estatística referente a 1939, .apontando depósitos de 17 mil contos de réis nas agências do Banco do Brasil, América do Sul, Noroeste, Caixa Econômica Federal e da Casa Bancária Irnigratória Ltda. Pela estatística do ano, os casamentos foram 309; nasceram 2.714 londrinenses e morreram 834 moradores. Circulavam 120 automóveis, 250 caminhões, 16 ônibus, 30 motocicletas, 4 tratores e 1.300 carroças. A agência de estatística, coordenada por Aristeu de Oliveira, registra arrecadação superior a 3 mil contos de réis (3.394:211$000) na Coletoria Estadual de Londrina em 1939. Em 1937, Domingos Casoni dera início ao primeiro loteamento urbano independente da Companhia de Terras Norte do Paraná - a Vila Casoni, em chácaras compra- das da colonizadora. Na quadra da Rua Maranhão entre a Avenida Minas Gerais e a Rua Mato Grosso, Pedro Santiago Chocair tem farmácia em frente à livraria de João Alfredo de Menezes. "Face à vizinhança, esses dois cidadãos costumavam palestrar nas horas de folga e dessas conversações, e por sugestão do farmacêutico, surgiu a idéia de se fundar uma Associação Comercial. Logo se lembraram do Sr. David Dequêch, amigo de ambos, para liderar o movimento." Memória de Alberto João Zortéa, que participou da redação dos estatutos da Associação. Nascido num distrito de Biblos, Líbano, David Dequêch chegou com 18 anos incompletos ao Brasil, em 1912, indo para Mafra (SC), onde estava uma irmã. Formado em História e Contabilidade, em Nazaré, na antiga Palestina, Dequêch estivera em Paris gastando o dinheiro de um prêmio ganho por uma tradução do francês para o árabe. Dedica-se a diferentes negócios no Brasil, entre eles a Empresa Joinville de Navegação, com um vapor e um veleiro, cujas linhas desde Santa Catarina atingiam Santos e Cabo Frio. Nessa fase visita o Líbano e casa-se em São Paulo, com dona Jamile. Atraído ao Norte do Paraná, monta casa de comércio em Cwbará e, acompanhando a colonização, compra terreno urbano em Jataí, à época uma ACIL- F b d e r ~ t e m S e r t é o "cidade maleitosa", onde não chega a se estabelecer, transferindo para Londrina a "Casa Central", em 1932. No ano anterior havia mandado construir a casa de madeira que serviria de residência e loja. Essa casa, a segunda do perímetro urbano - a primeira foi a de Alberto Koch -, situava-se na esquina da Avenida Paraná com a Rua Duque de Caxias, onde está hoje o Posto Iris, e foi derrubada em 1953. "Eu não vim para Londrina. Londrina é que veio depois que eu estava aqui. Quando cheguei era o Patrimônio de Três Bocas, em 1932. Aqui fui o primeiro comerciante estabelecido" - relatou Dequêch a Zortéa. A "Casa Central" era sortida. Vendia tudo: tecidos, cereais e até pinga. "Vinham tropas comprar. Entravam no patrimônio armados de facão, revólver e até carabina no arreio." A primeira missa de 1933 foi celebrada no depósito do armazém de Dequêch, pelo padre Jonas, de Sertanópolis. Dona Jamile e Dequêch teriam cinco filhos, todos londrinenses: Nady (única mulher), Nelson, Nilo (futuro presidente da ACL), Norton e José Mário. "Nós abaixo assinados, comerciantes estabelecidos neste município, estando de acordo com a feliz idéia de se fundar a nossa entidade de classe, denominada Associação Comercial de Londrina, cujas vantagens e fins serão oportunamente reunidos nos estatutos sociais elaborados por uma comissão previamente escolhida ente nós, declaramo-nos solidários com a mesma, comprometendo-nos a contribuir com a jóia de cincoenta mil réis, considerando-nos por isso como sócios fundadores desta corporação que zelará dos interesses de nós todos e do comércio em geral deste município. Londrina, 4 de junho de 1937." Seguem-se cerca de 100 assinaturas legíveis e inelegíveis, ocupando cinco páginas de um livro com o resto em branco. Presume-se que seja o rascunho da ata de fundação, formalizada em outro livro no dia seguinte - 5 de junho de 1937, em sessão no "salão nobre do Líder Clube, às 21 horas", aberta por Pedro Santiago Chocair, que nomeou Caetano Otranto secretário. Constituiu-se a diretoria provisória, presidida por David Dequêch e integrada por João Wanderley (vice), João Alfredo de Menezes (1" secretário), Manoel Barbosa Filho (2" secretário), Carlos de Almeida (19 tesoureiro), Caetano Otranto (2" tesoureiro). Conselho Consultivo: Atílio Bizatto, Frederico Schultheiss, Athanazio Bello, Augusto Nixdorf, Jacob Chocair, João B. Pismel, Geminiano Candêo, Olyrnpio Lopes dos Santos, Alberto Koch, Fuad Tarran, Antônio Faria e César Traballi. O Líder Clube estava na esquina da Rua Mato Grosso com a Benjamin Constant. Há conflito quanto ao número de fundadores nas atas dos dias 4 e S. Quando a Associação comemorou 30 anos, em 1967, Dequêch de- ACIL - PoderEmeri7ent.eno S M o clarou que no dia 5 de junho de 1937 se "reuniram 19 companheiros, nem mais nem menos, conforme consta da respectiva ata..." Pelo exposto, os fundadores foram David Dequêch, Pedro Santiago Chocair, Manoel Barbosa Filho, Carlos de Almeida, Caetano Otranto, Athanazio Belio, João Wanderley, João Alfredo de Menezes, Atíiio Bizatto, Frederico Schultheiss, Augusto Nixdorf, Jacob Chocair,João B. Pismel, Geminiano Candêo, Olympio Lopes dos Santos, Alberto Koch, Fuad Tarran, Antônio Faria e César Traballi. A 10 de junho de 1937 às 20 horas, no salão do Líder Clube, é eleita a primeira diretoria: presidente - David Dequêch (18 votos); lQvice-presidente- João Wanderley (21 votos); 2" vice-presidente - Manoel Barbosa Fího (17 votos); 1"secretário - Pedro Chocair (22 votos); 2" secretário -João Alfredo de Menezes (20 votos); 1"tesoureiro - Carlos de Almeida (16 votos); ZQtesoureiro - Caetano Otranto (15 votos). Conselho Consultivo: Elias Tarran, Geminiano Candêo, Atílio Bizatto, Kusako Nishioka, Victorino Abrunhosa e Olympio Lopes dos Santos. Comissão de Sindicância:Carlos dos Santos, Jacob Chocair, Francisco Krug e Antônio Faria. Começo do longo reinado de Dequêch, reeleito sucessivamente e convencido a não renunciar em 1939.Pausa entre 1945 e 48, quando cede o lugar a Nelson Antunes Egas, João Alfredo de Menezes e José Bonifácio e Silva. M w Einergente no Sertiio - ACIL Volta em 49, permanecendo por mais 10 anos. i * * * * * "Quando aqui cheguei, há quase meio século [19381, Londrina - então um aglomerado de poucos mil habitantes - ainda não havia se estruturado nem fisicamente como cidade. As ruas mais eram caminhos; raízes teimosas de árvores, no que seriam mais tarde calçadas. Sem iluminação, sem telégrafo ou telefone, sem esgotos. Apenas havia a intenção de se erguer uma cidade. Mas a Associação Comercial já existia. Este fato excepcional, como outros de igual ousadia, marca o espírito pioneiro que presidiu a organização da cidade. Cidade que não tendo passado a lembrar, empenhava-se em preparar o futuro." (Depoimento do ex-prefeito Milton Menezes (1914-1997) sobre o cinquentenário da Acil, em RAÍZES TEIMOSAS - 2-73 SOB A DITADURA - "Ao ensejo dos 50 anos da Associa- ção Comercial seja permitido a um londrinense [nascido em Jaguariaíval, que a conheceu aos três anos de sua existência, proclamar que era ela naquele tempo a única entidade que representava com autenticidade os direitos e interesses da região perante os poderes públicos federal, estadual e municipal. Vivíamos sob uma ditadura e ACIL - Podw E m e n t e no Scd& era graças à coragem e ao civismo dos diretores da ACL, que tinha à frente a figura inesquecível de David Dequêch, que os nossos problemas chegavam aos ouvidos os que decidiam." (Depoimento de Ruy Cunha, segundo promotor da comarca e sócio da Acil, em 1981)