A ABORDAGEM GEOGRÁFICA EM ESTUDOS DE VIOLÊNCIA URBANA EM
DOURADOS/MS
Cássio Alexandre Sarti Figueiredo1, Maria José Martinelli Silva Calixto2.
1
Acadêmico de Geografia UFGD, Bolsita do Programa de Educação Tutorial em Geografia UFGD;
2
Docente orientadora, Tutora do Programa de Educação Tutorial em Geografia UFGD
RESUMO: O presente trabalho é fruto da pesquisa “Explorando as dinâmicas da violência
urbana em Dourados-MS”. Ela assume relevância diante do significativo número de atos
julgados violentos ocorrentes na cidade de Dourados-MS, tornando-se lócus deste tipo de
discussão. Vale ressaltar que o município se destaca regionalmente na oferta serviços
especializados como educação, saúde e comércio. Contudo, é marcado por desigualdades
socioespaciais cada vez mais visíveis, como é o caso das ocupações irregulares de áreas
urbanas, dos “vazios” urbanos, e como já dito, as consideráveis taxas de criminalidade, o que
redefine constantemente seu tecido social. Cabe observar que embora chamadas cidades
médias sejam locais de recebimento de fluxos de classe média (o que, para alguns autores,
significa aumento da qualidade de vida), essa é uma ideia que precisa ser melhor investigada,
a medida que essas cidades também são locais de contradições socioespaciais. Neste sentido,
essa pesquisa tomará como objeto de análise especifica os casos de violência homicida.
Acreditamos que este tipo de ato violento, se desdobra no modo como a população vive, vê e
percebe os espaços da cidade, enquanto cristalização destas relações sociais por vezes
perversas, fruto de uma série de condicionantes históricas em constante mutação. Desta
forma, o objetivo central desta pesquisa é analisar as áreas da cidade de maior incidência de
violência homicida, considerando as variáveis socioeconômicas e de percepção. Também
utilizaremos fontes orais visando compreender como os moradores de bairros, com altos
índices de violência, percebem e vivenciam essa realidade no seu cotidiano. Assim,
esperamos contribuir para uma reflexão acerca da temática na cidade de Dourados, buscando
apreender as nuances dessa dinâmica. Por fim, consideramos que esta pesquisa, poderá
oferecer importante contribuição para o entendimento de uma das “fissuras” que assola a
cidade contemporânea, centrando nosso olhar no sentido de ampliar o entendimento acerca de
cidade de Dourados.
Palavras-Chave: crime, espaço geográfico, desigualdades socioespaciais
INTRODUÇÃO
No contexto contemporâneo, temas relativos aos problemas que assolam os moradores
citadinos ganham importância à medida que adensam as disparidades socioespaciais,
acirrando- as cada vez mais, sobretudo no espaço urbano. Dentre os vários elementos
Encontro de Ensino, Pesquisa e Extensão UFGD – 22 a 24 outubro 2012 – Dourados-MS
concernentes aos tidos “desajustes sociais” encontram-se os expressivos índices de
criminalidade violenta como no caso da cidade de Dourados (Mato Grosso do Sul), município
que se destaca na oferta serviços especializados como educação, saúde e mercadorias, mas
que possui desigualdades sociais, cada vez mais presentes em sua estrutura urbana, como
ocupações irregulares1, vazios urbanos e altas taxas de criminalidade, conjunturas que
redefinem constantemente seu tecido social.
Neste sentido, propomo-nos a estudar um destes elementos presentes na cidade,
especificamente o que concerne à violência homicida, expressão criminal das mais trágicas,
enquadrada nas mortes por causas externas (na tipologia apresentada pela Classificação
Internacional de Doenças), ou seja, quando o óbito não acontece por ocorrências naturais, mas
sim, intencionalmente. Esta dinâmica é carregada de complexidades e nuance que modificam
comportamentos e sentimentos da população.
Dentre as diversas formas de violência, o homicídio é a que causa mais
estragos, pois além de interromper a vida de alguém, destrói a família da
vítima e rompe-se com a estabilização de uma rede de sentimentos
interpessoais provocando, dentro desse maranhado complexo, o medo da
morte como principal fator advindo desse processo. (SANTOS; RAMIRES,
2009, p.144)
Com isso, acreditamos que este tipo de ato violento, presente na realidade de
Dourados, se desdobra no modo como a população “olha” e “percebe” os espaços da cidade,
enquanto cristalização destas relações sociais por vezes perversas, fruto de uma série de
condicionantes históricas em constante mutação.
Desta forma, o objetivo central desta pesquisa é analisar e mapear os locais de maior
incidência violência homicida em Dourados estabelecendo conexões com variáveis
socioeconômicas e de percepção, fenômeno expresso de forma subjetiva, mas quando
expresso de forma coletiva, torna-se unívoco.
É válido frisar, que embora estudos desta temática tenham aumentado nos últimos 40
anos, ainda são reduzidos no campo da ciência geográfica e praticamente nulos no campo das
cidades-médias, esperamos que ao estudá-la sob esta perspectiva, iremos contribuir para uma
reflexão a mais, sobre esta problemática. Assim, esta pesquisa em fase de desenvolvimento,
está contribuindo para o entendimento de uma das fissuras que assolam cidade
contemporânea, centrando nossos olhares, no sentido de ampliar nossos entendimentos
relacionados ao espaço urbano de Dourados.
1
Em pesquisa realizada por Francisco da Silva Queiroz, verificou-se no ano de 2010, 25 ocupações irregulares
na área urbana de Dourados.
Encontro de Ensino, Pesquisa e Extensão UFGD – 22 a 24 outubro 2012 – Dourados-MS
MATERIAIS E MÉTODOS
O termo violência originário do latim violentia, que remete a vis - força, vigor,
emprego de força física ou os recursos do corpo em exercer a sua força vital, torna-se
violência “[...] quando ultrapassa um limite ou perturba tácitos e regras que ordenam relações,
adquirindo carga negativa ou maléfica”. (ZALUAR, 1999, p.03)
Já pela definição apresentada, percebe-se que o tema abarca uma gama considerável
de atos que são tidos como violentos, dentre eles, pode-se elencar desde a miséria, fome, falta
moradia à roubos, homicídios, delinquência de cunho sexual, discriminação (física e/ou
moral) e humilhações.
Os reflexos dessas ações desdobram-se sobre o espaço geográfico, principalmente
através do medo e da insegurança, sentimentos que muitas vezes condicionam o isolamento
social e a individualidade, cada vez mais crescente, transformando nossas cidades em locais
de árdua convivência.
Santos e Ramires (2009) apud Tuan (2005) apontam que a cidade representa o maior
anseio da humanidade na construção de uma estrutura harmônica, seja na sua arquitetura ou
no campo dos laços sociais. Contudo, durante sua história ela vem sendo alvo da violência e
do caos, acentuado pelo longo processo de urbanização, que materializa uma cidade
fragmentada, marcada por problemas sociais, tornando-se um local favorável a atos
criminosos, sendo estes uns dos problemas causados pelo desenvolvimento desigual, pois a
cidade, ao ser expandida para além da área já urbanizada, provoca o chamado
desenvolvimento urbano e contraditoriamente os problemas desse desenvolvimento. Acentuase a desigualdade socioespacial e a segregação espacial urbana. Cria-se um espaço
aparentemente desarticulado [...] (RODRIGUES, 2008, p.11, grifos do autor).
A partir destas considerações, o estudo da violência sobre o ponto de vista geográfico
ganha importância ao não se restringir apenas a espacialização dos dados, mesmo porque esta
metodologia é utilizada por outros ramos da ciência (como a criminologia e ciências sociais)
com o objetivo de estabelecer uma aproximação com o objeto de estudo a ser estudados.
Logo, questionar a violência nas suas diversas escalas, analisar o papel do espaço
urbano nos processos de produção e reprodução desta problemática e o modo como a
população à vivência, é um dos principais prismas que devem perpassar estudos desta
temática, sobre a esfera da Geografia.
Para operacionalizar a pesquisa estão sendo levantados dados de órgãos responsáveis,
que forneçam informações plausíveis de análise e de comparações, tendo em mente que estes
Encontro de Ensino, Pesquisa e Extensão UFGD – 22 a 24 outubro 2012 – Dourados-MS
tipos de dados possuem limitações, pois muitas pessoas não registram os crimes das quais
foram vítimas, seja por descrença na instituição, falta de provas, não considerar o fato
importante e medo de represálias (MELARA 2008 apud FÈLIX, 1996).
Além disso, indicadores do IBGE também serão de grande valia para obtermos
informações dos indicadores socioeconômicos para correlacionarmos com as taxas de
homicídios levantadas.
Recortes temporais e de unidades de análise serão realizados a partir das averiguações
dos números de ocorrências, tendo cautela na sistematização e comparação dos mesmos, pois
neste tipo de análise, qualquer tipo de erro compromete a eficácia da pesquisa.
Posteriormente utilizaremos de fontes orais (entrevistas) para compreendermos como
os moradores de bairros com altos índices de violência a percebem e vivenciam no seu
cotidiano. Tendo como objetivo entrevistas de análise qualitativa, elas nortear-se-ão, com
vistas a identificarmos as distintas situações sociais e experiências presentes nestes locais,
sem a preocupação com a quantificação.
RESULTADOS PRELIMINARES
Ao observarmos os questionamentos e tensões que norteiam a temática da violência
urbana, percebemos o quanto esta dinâmica é carregada de elementos que interferem no modo
como vivenciamos e percebemos a cidade, criando limites entre o ir e vir, estereótipos entre o
seguro e não seguro.
Dados de 2010, divulgados pela Base de Dados Nacional do Sistema de Informações
de Mortalidade do Ministério da Saúde (SIM/ SVS/ MS) apontam uma taxa de 26,0
homicídios para cada 100 mil habitantes no município de Dourados, índice considerado alto
pelo órgão de pesquisa, que segue a metodologia da Organização Mundial de Saúde (OMS)
estabelecendo parâmetros de pesquisa com base nas declarações de óbito, de preenchimento
obrigatório, emitidas em todo o Brasil.
Tendo como norte esses dados, partimos a discussão para os intermeios da cidade de
Dourados, que enquanto uma cidade média tem atraído nas últimas décadas, um intenso fluxo
populacional, tanto para residir quanto para usufruir dos serviços que o município oferece,
como educação (em especial a de nível superior), saúde (variada gama de clínicas nas diversas
especialidades médicas), comércio e lazer, logo exerce um papel polarizante nas cidades em
seu entorno (ao passo que esses mesmos municípios de porte menor dinamizam a economia
douradense).
Encontro de Ensino, Pesquisa e Extensão UFGD – 22 a 24 outubro 2012 – Dourados-MS
Devido a estes elementos presentes nas cidades médias, muitos autores as definem
como “lócus da qualidade de vida”, por aliar toda a oferta de bens e serviços, sem os tidos
“males” dos grandes centros urbanos. Porém indagamos que é necessário cuidado ao designálas desse modo, já que espaço urbano é marcado por desigualdades socioespaciais e tensões
cada vez mais gritantes, revelando descompassos no tido desenvolvimento urbano.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Entendemos que esta pesquisa possui um papel ímpar na compreensão das dinâmicas
sociais referentes à violência em Dourados, além disso, análises que contemplam cidades
médias são de importância fundamental, pois fogem a métodos alusivos aos grandes centros
urbanos. Assim, damos atenção ao nosso local de moradia, pois é nele que ações sociais se
materializam, se (re) significam, conforme as conjunturas em constante movimento.
A violência urbana ao se mostrar complexa e multicausal no tempo- espaço necessita
de estudos que levem em consideração não apenas dados estatísticos, mas sim, o “olhar” do
morador que vivência esta problemática em seu cotidiano.
É importante destacar que este estudo ainda necessita de um maior aprofundamento
teórico metodológico, o que está sendo realizado na RECIME (Rede de Pesquisadores sobre
Cidades Médias), que propicia a troca de ideias e experiências entre alunos e docentes que se
encontram em distintos estágios de pesquisa (graduandos, mestrandos, professores da rede
básica de ensino e de nível superior)
Feitas estas breves considerações, muito questionamentos ainda nos surgem sobre este
tema tão amplo que vem ganhando evidência nas discussões acadêmicas e em especial da
ciência geográfica, concomitante a isso, nossa realidade urbana repleta de contrastes
eminentes, instiga-nos a entender as formas como a dinâmica de atos violentos se desdobra no
espaço.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CARLOS, Ana Fani Alessandri. O lugar no/do mundo. Hucitec: São Paulo, 1996.
FELIX, Sueli Andruccioli. A Geografia das ofensas: análise dos espaços de crimes,
criminosos e das condições de vida da população de Marília-SP. Relatório científico.
UNESP: Marília. julh. /2001.
MELARA, Eliane. A dinâmica da violência criminal no espaço urbano de Santa MariaRS. Dissertação (Mestrado em Geografia), Universidade Federal do Rio Grande do Sul: Porto
Alegre, 2008.
Encontro de Ensino, Pesquisa e Extensão UFGD – 22 a 24 outubro 2012 – Dourados-MS
QUEIROZ, Francisco. As fronteiras do caminho: Ocupação de áreas urbanas e
desigualdade socioespacial em Dourados-MS. Trabalho de Conclusão de Curso
(Geografia), Universidade Federal da Grande Dourados: Dourados, 2010.
RODRIGUES, Arlete Moysés. Prefácio. In: CALIXTO, Maria José Martinelli Silva (Org.). O
espaço urbano em redefinição: Cortes e recortes para a análise dos entremeios da
cidade. UFGD: Dourados-MS, 2008. p.11-16.
SANTANA, Francisco dos Santos. Homicídios em Salvador 1998-2001: Efeitos das
desigualdades socioeconômicas na mortalidade por violência. Dissertação (Mestrado em
Saúde Pública). Escola Nacional de Saúde Pública, Fundação Oswaldo Cruz: Rio de Janeiro,
2004.
SANTOS, Márcia Andréia Ferreira, RAMIRES, Julio Cesar de Lima. Espaço urbano e
violência: uma contribuição geográfica. In: Caminhos de Geografia, v. 10, n. 30:
Uberlândia. 2009.
ZALUAR, Alba. Um debate disperso- violência e crime no Brasil da redemocratização. In:
São Paulo em perspectiva, 1999.
WAISELFISZ, Julio Jacobo. Mapa da violência 2012- Os novos padrões da violência
homicida no Brasil. Instituto Sangari: São Paulo, 2011.
Encontro de Ensino, Pesquisa e Extensão UFGD – 22 a 24 outubro 2012 – Dourados-MS
Download

A ABORDAGEM GEOGRÁFICA EM ESTUDOS DE