RECONHECIMENTO E TRAJETÓRIAS ACADÊMICAS DE ESTUDANTES DE ORIGEM POPULAR NA UFRB José Raimundo Santos Prof. Assistente CFP/UFRB [email protected] À GUISA DE UMA INTRODUÇÃO... Dentre os estudos críticos e as pesquisas sobre educação há aqueles que objetivaram compreender a relação emancipatória da educação, com relação às políticas de ações afirmativas e de inclusão social de jovens de origem popular nas universidades brasileiras, observando o processo de aceitação e reconhecimento destes nos espaços acadêmicos. O principal objetivo desses estudos está em pensar a emancipação do homem, enquanto um sujeito crítico à forma instrumental de uso da racionalidade, ou seja, busca-se compreender não apenas os conflitos presentes na lógica da organização social vigente, mas a expressão de um comportamento crítico como uma relação dialógica ao conhecimento produzido e à realidade social. Ao se pensar o projeto de educação das instituições de ensino superior e a implementação de políticas de inclusão social e de ações afirmativas, objetiva-se, também, desvelar a relação entre o discurso institucional e as práticas cotidianas instituídas. Práticas estas que, subliminarmente, estabelecem regras de conduta e convívio para as relações sociais, autenticam os saberes e conhecimentos e, possibilitam aos indivíduos o trânsito descontraído pelos espaços sociais que orientam esses projetos. Consequentemente implica em debater as formas de reconhecimento dos indivíduos em suas individualidades, das identidades em sua coletividade e, da educação em seu papel universal de inclusão e promoção do indivíduo à condição de cidadão. A universalização do acesso à educação superior, inicialmente fundada em processos 2 classificatórios e meritocráticos como o vestibular e, atualmente, ampliada para mecanismos de inclusão por meio de políticas públicas de acesso e, mais recentemente, o Sistema de Seleção Unificado que usa a média do Exame Nacional do Ensino Médio, está baseada em modelos hegemônicos e homogêneos de percepção acerca da educação. Esta universalização, ao tempo em que, estabelece políticas reparatórias no acesso, têm, ainda, no interior das instituições, práticas cotidianas instituídas que não asseguram a isonomia na permanência dos sujeitos no sistema formal de educação no país. Por esta razão, o permanecer na universidade com acesso às bolsas de iniciação à pesquisa e/ou extensão, como também às atividades de ensino e/ou aos benefícios da assistência estudantil ainda são regidas por práticas instituídas que não percebem estes novos sujeitos e suas especificidades e, portanto, o são, consequentemente, excludentes. Estes modelos minimizam as tensões sociais produzidas historicamente pela não participação de parcelas da população no processo educacional. Ou seja, há grupos de indivíduos que desprovidos de um dado capital cultural1 não dispõem das mesmas condições para a disputa das oportunidades, mesmo que essas sejam disponibilizadas universalmente. E, na lógica produtiva e capitalista da sociedade, esses indivíduos, são aqueles que passam a serem percebidos como coisas, dissolvidos das suas características humanas e, de forma latente, vistos como partes operantes no funcionamento da máquina capitalista, que tende a economicizar o homem e a vida cotidiana. Assim, tem-se que nesta lógica instrumental de universalização da educação, opera a individualização, enquanto movimento processual e dinâmico que inclui a especialização do homem nos diversos campos que atua – social, econômico, científico e político – e, no desenvolvimento do trabalho. Esse indivíduo é produto do que é 1 “O capital – que pode existir no estado objectivado, em forma de propriedades materiais, ou, no caso do capital cultural, no estado incorporado, e que pode ser juridicamente garantido – representa um poder sobre um campo (num dado momento) e, mais precisamente, sobre o produto acumulado do trabalho passado (em particular sobre o conjunto dos instrumentos de produção), logo sobre os mecanismos que contribuem para assegurar a produção de uma categoria de bens e, deste modo, sobre o conjunto de rendimentos e ganhos.” (BOURDIEU, 1989, p. 134). 3 orquestrado pela racionalidade predominante no sistema capitalista na contemporaneidade, que destitui do homem a possibilidade de se perceber e ser percebido como um ser outro, preenchido de história e cultura, sujeito-ator que fala de um lugar, cujas identidades, foram ultrajadas pela lógica homogeneizante imposta pela sociedade capitalista nas suas práticas de formação e especialização por meio dos sistemas formais de ensino. É por esta razão que compreender as trajetórias acadêmicas de jovens de origem popular e as formas de reconhecimento no interior das universidades significa empreender um debate sobre as formas de desrespeito e reconhecimento a que estão submetidos esses jovens no processo de afiliação e participação na sociedade e na vida acadêmica. ENTRE O INSTITUCIONAL E O INSTITUÍDO A idéia homogeneizante que recai sobre o conceito de ser universitário, traz consigo um modelo ideal e reprodutor de pensar este estudante no campo acadêmico e científico, como também, estabelece uma prática meritocrática de classificação que redesenha para dentro e para fora da universidade a forma como estes novos atores do ensino superior devem se comportar, agir e atuar. Este modelo estabelece, que a permanência destes jovens está condicionada a aceitação das regras para o trânsito e mobilidade e, para aceitação dos objetos de estudo disponibilizados para o desenvolvimento de suas pesquisas. Neste sentido, os saberes estruturantes deste ser universitário é entendido como aqueles que são apreendidos num processo histórico e ontológico que referenciam o ser em sua existência, e que estão relacionados a um lugar e um tempo, são redistribuídos e redirecionados para uma visão homogênea que simplifica as relações sociais e ameniza os conflitos, a partir de uma idéia universal de conhecimento, legitimado, no espaço social acadêmico, como a representação mais próxima do que é apreendido e reconhecido como cientifico. 4 Esta forma de redistribuição e reclassificação dos indivíduos no interior das universidades está condicionada ao lugar que este reivindica para si na instituição, que, por outro lado, apresenta de forma meritocrática as condições objetivas e subjetivas de inscrição destes sujeitos nos grupos de pesquisa, ensino e extensão, institucionalmente estabelecidos e reconhecidos como produtores de conhecimento. Neste campo, das afiliações e pertencimento aos grupos de pesquisa, ensino e extensão, circunscrevem-se as formas classificatórias de identificação e reconhecimento dos sujeitos, denominandoos como produtivos e/ou não produtivos, hierarquizando-os e impondo sobre eles uma forma alienante de produção do conhecimento, circunscrito a um objeto que já fora desenhado por aqueles líderes e pesquisadores do grupo. É assim que ocorre uma espécie de reificação do jovem iniciante na pesquisa científica, uma forma de coisificação deste ser producente, que passa a operar de forma instrumental, como reprodutor dos saberes que orienta racionalmente o fazer científico sob a lógica do já instituído e estabelecido. O acima dito, está presente no que Boaventura Santos denomina como Sociologia das Ausências. Nesta, ele nos apresenta um modelo teórico conceitual que contribui para elaboração de um quadro diagnóstico acerca da afiliação e reconhecimento de estudantes de origem popular na universidade. Segundo Boaventura há cinco formas de produzir ausência em nossa racionalidade ocidental que as ciências sociais compartem. A primeira seria a monocultura do saber e do rigor – aquela para a qual existe um único saber científico, os outros não têm validade, eliminam as realidades fora dos padrões ocidentais, os saberes populares. “(…) Essa monocultura do rigor baseia-se, desde a expansão européia, em uma realidade: a da ciência ocidental”. Essa monocultura do saber e do rigor ao negar as outras formas de se produzir conhecimento, produz o que Boaventura chama de “epistemicídio”: “a morte de conhecimentos alternativos”. A segunda seria a monocultura do tempo linear: “(…) a idéia de que a 5 cultura tem um sentido, uma direção, e de que os países desenvolvidos estão na dianteira”. Parte do pressuposto que tudo que existe nesses países desenvolvidos estão à frente dos outros países, eles se colocam na condução da história. A terceira monocultura da naturalização das diferenças: Naturaliza as condições das diferenças, como se as hierarquias fossem frutos de classificações naturais, “(…) não se pensa diferenças com igualdade; as diferenças são sempre desiguais”. A quarta seria a monocultura da escala dominante: Coloca a Hegemonia do global, universal, invisibiliza o local, o particular. A quinta e última forma de produzir ausências seria a monocultura do produtivismo capitalista: a idéia de que o ciclo de produção determina a produtividade humana, tudo que não é produtivo na lógica ocidental é considerado improdutivo e estéril. Ser improdutivo é a maneira de produzir ausência.(SANTOS, 2010:2) A monocultura do saber é um instrumento de reprodução do conhecimento já estabelecido, que opera de forma impositiva no processo de reificação dos jovens de origem popular, destituindo-lhe qualquer espécie de capital cultural ou saber, que possa ser reconhecido no campo científico. Este modelo de monocultura apresentado é o que legitima e dá origem às formas de epistemicídio cometidos pela modernidade. Boaventura Santos pressupõe a existência de uma forma de superação desta monocultura, compreendida como sendo a ecologia dos saberes que é representada pela idéia, de que não há, pois, nem ignorância em geral nem saber em geral. Cada forma de conhecimento reconhece-se num certo tipo de saber a que contrapõe um certo tipo de ignorância, a qual, por sua vez, é reconhecida como tal quando em confronto com esse tipo de saber. Todo saber é saber sobre certa ignorância e, vice-e-versa, toda ignorância é ignorância de um certo saber. (SANTOS, 2000, p.78 apud OLIVEIRA, 2008, p.75). 6 Boaventura Santos apresenta-nos o conceito de epistemicídio como um mecanismo de exclusão de saberes alternativos ao instituído, e coloca que este processo, de morte aos saberes não estabelecidos e reconhecidos pelas universidades, está presente no modelo de supremacia de uma monocultura do saber e de rigor, que nega outras formas de se produzir conhecimentos. Ou seja, a monocultura do saber empreende uma lógica de saber formal que legitima a ciência moderna e a credencia como critério único de verdade. A superação, segundo Boaventura Santos, está na identificação de conceitos e práticas, onde cada saber opera como um instrumento crítico de validação dos saberes aplicados. Nesta lógica e buscando romper com a idéia homogeneizante de naturalização das diferenças, as universidades têm o papel de redesenhar os conceitos e suas interpretações, constituindo uma contra hegemonia que favoreça a ampliação da diversidade de práticas sociais como forma alternativa de enfrentamento à globalização do local e dos saberes nele reconhecidos. São cinco as Ecologias para tornar as experiências ausentes em experiências presentes: A primeira é a ecologia dos saberes – Fazer com que o saber científico dialogue com todos os saberes, fazendo um uso contra-hegemônico da ciência hegemônica. Essa ecologia contraria a idéia de ciência única e valoriza outros saberes, os conhecimentos tradicionais. A segunda é a ecologia das temporalidades – reconhecer a existência de outros tempos além do tempo linear. Se reduzirmos todas as temporalidades a temporalidade linear afastamos todas as outras coisas diferentes das nossas. Ex: O tempo dos antepassados nas comunidades africanas, “os que estão antes estão conosco”. Cada um tem o seu tempo. A terceira é a ecologia do reconhecimento – somente aceitar as diferenças depois que as hierarquias forem descartadas. Descolonizar as mentes para entender o que é produto da hierarquia e o que não é. A quarta é a ecologia da transescala – Articulação em nossos projetos das escalas locais, nacionais e globais. O local pode ser embrionário se pode conduzir ao nacional. 7 A quinta e última é a ecologia das produtividades – recuperação e valorização dos sistemas alternativos de produção, das organizações populares, cooperativas, movimentos sociais que a ortodoxia capitalista desacreditou. (SANTOS, 2010:3) [grifo nosso] De fato a ecologia do reconhecimento complementa a ecologia dos saberes e desloca a categoria moderna de tempo, destituindo a linearidade da história e dos fatos, consequentemente, propõe (re)inaugurar, um fazer científico que desvele as máscaras estigmatizadas impostas pelo modelo racional moderno - presente e predominante nas universidades -, sobre os saberes tradicionais que trazem consigo esta demarcação etno racial que caracteriza uma coletividade e seus indivíduos, atribuindo-lhes identidades. Nesta lógica, pressupõe-se um modelo contra hegemônico ao modelo instrumental desenhado pela sociedade capitalista, que quer se ter como um modelo que seja representativo das múltiplas vozes que ecoam nas universidades, representativas de lugares, gêneros, raças e religiosidades, dentre outros, e, que trazem consigo as significações e racionalidades que atribuem a si e ao outro, a essência que o identifica e o reconhecimento de ser parte de um grupo. O RECONHECER E O SER RECONHECIDO Ao se pensar uma ecologia dos saberes e do reconhecimento, propõe-se, inicialmente, romper com a monocultura da naturalização das diferenças, que caracterizam como naturais e estabelecidas as formas de hierarquização presentes na sociedade e reproduzidas no interior das universidades. Esta monocultura atua sobre os currículos existentes nas universidades, impondo aos cursantes deste nível de educação uma forma de igualdade que os desiguala, ou seja, há uma escala de importância socialmente constituída sobre as profissões e que reproduz-se nas universidades, fazendo com que os sujeitos cursantes destas futuras profissões também sejam hierarquizados e diferenciados no interior das mesmas. 8 Logo, não se pode pensar em uma única forma de reconhecimento, mas sim, nas múltiplas formas de reconhecer-se e ser reconhecido. Nesta lógica, a forma de reconhecimento pode ser referenciada e incorporada pelo sujeito, a partir de uma experiência negativa, cuja ruptura implica em ultrapassar as barreiras transcritas pelo habitus2 vigente, constituindo um contra-habitus a este modelo hegemônico referendado e que legitima as formas de estar e o permanecer na Universidade. A experiência negativa, produto da expropriação da identidade e dos saberes associados à origem dos estudantes de origem popular, é percebida como um despertar acerca da sua condição de ser universitário. E, este momento implica em indagar-se sobre as formas de classificação e reconhecimento a que estão submetidos, observando o jogo simbólico de negociações e estratégias desenvolvidas para anular o efeito danoso imposto pelas relações sociais estabelecidas e representadas na forma de um habitus acadêmico. Neste sentido, observa-se o crescimento de grupos e associações das mais distintas ordens no interior das universidades. O surgimento e o crescimento dos grupos de orações cristãs - evangélicas e católicas –, por exemplo, representa para muito dos jovens participantes a possibilidade de ser reconhecido pela associação a uma ética e a uma moral religiosa que os legitima para atuar em outros campos, classificados como importantes para a consolidação de uma carreira acadêmica, quer seja, pesquisa, ensino e/ou extensão. Contudo, em contraposição, ao assumir-se como participante de religiões de matriz africana, os jovens que o fazem são destituídos de um certo rigor para prática científica, visto que, pejorativamente esta religião é associada ao animismo e a crenças que ultrapassam a racionalidade, assumindo formas metafísicas de expressão da fé, onde 2 Habitus, para Bourdieu é um conhecimento adquirido, uma disposição incorporada, é aquilo que incorpora “o sentido do jogo [onde o indivíduo] que não tem de raciocinar para se orientar e se situar de maneira racional num espaço”. Logo o contra-habitus, seria esta disposição contrária àquilo que é esperado como incorporado por indivíduos pertencentes a uma classe social distinta da dominante, principalmente, quando se refere ao acesso ao ensino superior por alunos oriundos das classes desfavorecidas e estudantes das escolas públicas brasileiras. 9 o homem passa a ser receptor de uma entidade divina, cujos comportamentos encarnam práticas do sacrifício e da transfiguração do humano. Esta leitura sobre as religiões de matriz africana presente na sociedade e reproduzida em determinados espaços da universidade recai de forma negativa para esses estudantes. Mas, quando a busca por parte dos docentes e pesquisadores é compreender o conhecimento acerca das folhas e ervas utilizadas nos rituais sacros e práticas de cura nestas religiões, então, ainda que momentaneamente, é valorizado este saber e, assim, ocorre de reconhecer estes estudantes como sujeitos producentes e aptos aos fazer científico. Contudo, a definição desse objeto como científico, não implica no estabelecimento de uma relação dialógica entre os saberes tradicionais e acadêmicos. Como também, não ocorre o reconhecimento destes saberes - sobre as folhas e plantas, e rituais de cura produzidos nas comunidades terreiros - como equivalentes aos produzidos nas universidades, pois o discurso do rigor e a exigência de um método legitimado pela ruptura com a linguagem, que implicam no uso de uma forma monolinguística de expressar os achados que legitima o fazer cientifico, não reconhecem as culturas ágrafas - no sentido moderno de conceituação sobre língua e linguagem - como legitimadas para produção e reprodução de conhecimento. Então, ao reivindicar uma identidade – política, social, racial ou de gênero – esses jovens passam a falar de um lugar e, importam para si uma historicidade de lutas e enfrentamentos que os legitima como sujeitos políticos, cujos ideais e as estratégias transpõem o local (universidade) e conduzem as lutas para um campo global (sociedade). Portanto, constituem um bloco contra-hegemônico ao estabelecido e passam a protagonizar a transformação, ainda que pontual, do habitus estabelecido que busca tratar os desiguais de forma igual. Este processo de reconhecimento implica em associações e dissociações, rupturas e alianças, mas, acima de tudo, representa uma estratégia de enfrentamento ao estabelecido e o desvelar das formas de reconhecimento e exclusão presentes nas instituições de ensino superior. Assim, as vozes que ecoam no interior das universidades 10 quando distribuídas pela origem social, demonstram, para aqueles de origem popular, que a busca em transformar em objeto de estudo os problemas existentes nas comunidades de origem é um entrave para a afiliação desses jovens aos grupos pesquisa, ensino e/ou extensão. JOVENS DE ORIGEM POPULAR E A UNIVERSIDADE: Afiliações e Estratégias As vozes dos jovens de origem popular aqui analisadas pertencem aos estudantes da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, mais precisamente aos estudantes do Campus Cruz das Almas, e aos cursos das áreas das ciências agrárias e ambientais e biológicas, como também os cursos das ciências exatas e tecnologias. E, foram coletadas durante o ano de 2009 e o primeiro semestre de 2010, no desenvolvimento das disciplinas de Filosofia e de Metodologia Científica. O instrumento para a coleta foi proposto em forma de uma autobiografia, cuja ênfase estava em apresentar a representação social do ser universitário e as estratégias pensadas como forma de inserir-se e ser reconhecido como parte do curso. Orientou-se para uma estrutura de redação que apresentasse a condição socioeconômica, o lugar de origem e a perspectiva futura com o diploma universitário, mais precisamente, foi sugerido um roteiro de escrita que possibilitasse ao pesquisador rascunhar sobre as estratégias para o permanecer de forma qualificada na universidade; os objetivos pessoais da obtenção do diploma e; em alguns casos, as associações individuais e coletivas e, então, a reivindicação de identidades por parte dos jovens. No que tange a permanência qualificada, buscou-se a relação entre objeto de estudo e pesquisa com a comunidade de origem e, a afiliação e inscrição nos grupos de pesquisa já estabelecidos. Para tanto a inscrição em bolsas de pesquisa e em projetos de ensino ou extensão, rascunhavam outra possibilidade de análise do reconhecimento atribuído e do uso social da racionalidade por parte dos jovens. 11 Institucionalmente a Pró-Reitoria de Políticas Afirmativas e Assuntos Estudantis afirma que, Na UFRB, as ações voltadas para os/as estudantes compreendem um amplo conjunto de Políticas Afirmativas e Estudantis que asseguram direitos e garantem condições diferenciadas para o acesso (Programa Universidade Para Todos – UPT; Rodas de Formação no ensino médio; ENEM; Sistema de Reserva de Vagas – Cotas Sócio-Raciais); a permanência (Programa de Permanência Qualificada – PPQ; Conexões de Saberes; PIBIC Ações Afirmativas; PET Conexões 2010), através das políticas institucionais de assistência consubstanciadas pelo Plano Nacional de Assistência Estudantil – PNAES; a pós-permanência em articulação com o desenvolvimento regional. (PROPAAE, jul./set., 2010) Dentre as ações da PROPAAE/UFRB para a assegurar a permanência dos estudantes de graduação no ensino superior tem-se no PPQ um instrumento institucional de fomento à participação dos estudantes em projetos de ensino, pesquisa e extensão, que lhes assegurem um reconhecimento acadêmico para dentro e fora da instituição. Dentre os objetivos do PPQ tem-se: 1. Garantir a permanência dos estudantes dos cursos de graduação da UFRB, ao assegurar a formação acadêmica dos integrantes do Programa, através de seu aprofundamento teórico por meio da participação em programas de extensão, atividades de iniciação científica vinculadas aos projetos de pesquisa existentes nos Centros, atividades de ensino/acadêmicas relacionadas à sua área de formação e ao desenvolvimento regional. 2. Implementar na Instituição a adoção de uma política de permanência associada à excelência acadêmica. 3. Contribuir para reduzir o tempo médio de permanência dos alunos de graduação. 4. Combater o racismo e as desigualdades sociais. De fato, ao apresentar tais objetivos, a Instituição reconhece os conflitos sociais e raciais presentes na Universidade e, propõe políticas específicas para o combate e superação dos mesmos. Ao tempo em que cria e estabelece condições de permanência associada ao desenvolvimento acadêmico dos discentes. Este Programa pressupõe uma relação interdependente entre o processo formativo do estudante e o desenvolvimento 12 regional, propõe a afiliação destes estudantes aos grupos estabelecidos, levando em consideração que os seus problemas de pesquisa, fazem parte de suas trajetórias pessoais e, os saberes, também são aqueles historicamente incorporados que, em essência, influenciam no seu olhar sobre o conhecimento cientificamente apresentado na Instituição. RAZÕES PARA PROSSEGUIR O ESTUDO Os primeiros momentos do reconhecimento se dão conforme a natureza do gênero masculino ou feminino –, mas os demais são fruto das relações sociais e dos valores compartilhados nos grupos onde o sujeito interage. Portanto, reivindicar uma identidade, representa optar por associações e dissociações com grupos e indivíduos e, acima de tudo, requer que o indivíduo reúna as condições, materiais e simbólicas, para o enfrentamento dos conflitos no processo de reconhecimento e auto-reconhecimento no interior da Universidade, circunscrito aos distintos campos legitimados pela instituição. Neste sentido, apreender o fazer institucional através das estratégias dos estudantes de origem popular para permanecer na universidade, assegurando para si uma trajetória acadêmica qualificada, revela-nos um conflito entre, o modelo hegemônico de ciência que se isola na forma de uma monocultura de saber e no uso da racionalidade, em contraposição, ao discurso contra-hegemônico que propõe uma relação dialógica e comprometida dos sujeitos produtores do conhecimento. Portanto, tem-se a partir da ecologia dos saberes pensada por Boaventura Santos uma forma de superação das ausências promovidas pela monocultura do saber e do rigor, que em associação com a monocultura da naturalização das diferenças e, dentre outras, com a do produtivismo capitalista, estabelece uma metodologia de análise do uso social da racionalidade e da sua relação com o epistemicídio dos saberes destes jovens no empreender dialógico dos saberes e na afiliação aos grupos instituídos. Ou seja, ao se buscar a valorização dos conhecimentos tradicionais e o estabelecimento de categorias multireferenciais de observação e análise dos fenômenos na construção de uma relação 13 dialógica e de um modelo contra-hegemônico à ciência hegemônica estabelecida na Instituição, ter-se-á uma análise sobre o uso da racionalidade e a produção do conhecimento sob a lente multifocal dos estudantes de origem popular. Finalmente tem-se que, a afiliação circunscrita pelo institucionalmente estabelecido deveria se dar de forma eqüitativa e os partícipes, discentes bolsistas (PROPAAE; PIBIC/AF; PIBIC/FAPESB/CNPQ; PROEXT; CONEXÕES DE SABERES; PET, etc.) deveriam desempenhar os mesmos papéis nos projetos inscritos. Contudo, o que ecoa das falas dos discentes do PPQ/UFRB é um tratar que os iguala nas obrigações acadêmicas vinculadas meritocraticamente ao desempenho nas disciplinas, mas os desiguala nas atividades desenvolvidas, em virtude de um suposto baixo capital cultural que lhes é atribuído para o não desempenho da iniciação científica. Portanto, entre o discurso institucional e a prática instituída persiste a ausência de reconhecimento dos saberes destes jovens de origem popular como forma de hierarquização e de prevalência de uma monocultura de saber e de uma prática instituída de naturalização das diferenças que aniquila as identidades e silencia as vozes. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA E ESTUDOS ADORNO, Theodor W & HORKHEIMER. A Dialética do Esclarecimento. Fragmentos Filosóficos. Tradução Guido Antonio de Almeida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1985. ________________. Educação e Emancipação. Tradução Wolfgang Leo Maar. 4 ed. São Paulo: Editora Paz e Terra S/A., 2006. BANNELL, Ralph Ings. 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