30 de maio de 2011 Estratégia de Desenvolvimento Urbano, Socioeconômico e Ambiental para o Entorno do Aterro Metropolitano de Jardim Gramacho _ Diagnóstico Socioeconômico de Jardim Gramacho Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _2 SUMÁRIO 1. Introdução 3 2. Contextualização do Desenvolvimento de Jardim Gramacho e seu Aterro Metropolitano 6 3. Levantamento de Equipamentos e Serviços Públicos Básicos em Jardim Gramacho 16 4. Diagnóstico Socioeconômico de Jardim Gramacho 40 5. Diagnóstico Ambiental de Jardim Gramacho 101 6. Considerações Finais 141 7. Bibliografia 149 8. Anexos 151 Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _3 1. Introdução O Aterro Metropolitano de Jardim Gramacho (AMJG) é a peça principal do sistema de coleta e destinação de resíduos sólidos da região metropolitana do Rio de Janeiro. Em funcionamento há mais de 30 anos – tendo passado quase metade em condições de lixão – o AMJG recebe hoje mais de 8.000 toneladas de resíduos sólidos por dia, servindo de vazadouro principalmente à cidade do Rio de Janeiro, mas também a Duque de Caxias e em menor escala, a São João do Meriti, Mesquita, Queimados e Nilópolis. O AMJG atingiu seus limites estruturais e ambientais, o que acarretou o início do processo de encerramento de suas operações. Esta nova fase do aterro coincide com a promulgação da Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei nº 12.305/2010), que traz diversas regras que são pertinentes a este passivo socioambiental. Hoje, já é consenso que soluções para problemas ligados aos resíduos sólidos necessitam de articulação intermunicipal e entre as diferentes esferas do Poder Público, envolvendo também, na medida do possível, os grupos da sociedade civil direta e indiretamente afetados, que, no caso do AMJG e de outros aterros brasileiros, incluem grupos socioeconomicamente vulneráveis como os catadores de materiais recicláveis. Portanto, a proposta do Instituto de Estudos do Trabalho e da Sociedade (IETS) para a Secretaria Estadual do Ambiente (SEA) é a elaboração de uma estratégia de desenvolvimento urbano, socioeconômico e ambiental, para o bairro de Jardim Gramacho, que acompanhará o encerramento do Aterro Metropolitano e integrará a remediação urbanística e ambiental dos desdobramentos do funcionamento do aterro nesta área. Esta estratégia será composta por um diagnóstico socioeconômico, ambiental e de infraestrutura, um plano de ações, que utilizará as informações do diagnóstico para obter melhores resultados, e uma proposta de estrutura de governança que garanta a sustentabilidade do plano de ações apresentado. Assim, o presente diagnóstico reúne informações atuais acerca da infraestrutura e serviços públicos urbanos no território e as condições socioeconômicas dos moradores, com foco especial no seu grupo mais vulnerável, que são os catadores. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _4 Primeiramente, um breve histórico acerca do surgimento e da evolução urbana do bairro de Jardim Gramacho e, sobretudo, do Aterro Metropolitano lá localizado, tem por objetivo resgatar elementos relevantes sobre a constituição do território em questão. Esta seção pretende ilustrar um pouco da relação entre o AMJG e o bairro, como estes se influenciaram mutuamente e como suas remediações estão intrinsecamente ligadas. Em um segundo momento, apresenta-se o levantamento secundário realizado para contextualizar a pesquisa de campo que seria realizada para este projeto. Nesta parte, informações relevantes sobre a infraestrutura urbana e os serviços públicos existentes, além das atividades econômicas identificadas e, em especial, os depósitos de material reciclável, tem por objetivo indicar questões a serem investigadas a fundo pelo diagnóstico. O levantamento, assim, aponta para a precariedade da infraestrutura e a pouca abrangência dos serviços públicos do bairro, que será corroborada com números no diagnóstico que segue. Conforme será explicado, o diagnóstico socioeconômico foi construído através de uma pesquisa de campo, em que questionários especificamente elaborados para a população de Jardim Gramacho e para os catadores da região foram aplicados em uma amostra representativa de domicílios. Os dados obtidos, uma vez consolidados, ilustram a atual situação do bairro e apontam especificamente para seus maiores pontos de vulnerabilidade: bolsões de pobreza e indigência na periferia, baixíssima escolaridade, escassez de serviços públicos, e, principalmente, o enorme impacto que o fechamento do aterro terá sobre uma parte significativa da população de Jardim Gramacho. O diagnóstico ambiental, logicamente, coloca em foco a degradação do meio ambiente no bairro e o impacto social gerado por isto. Na medida em que a saúde e a qualidade de vida estão intrinsecamente ligadas ao meio ambiente, o impacto ambiental do AMJG no bairro é de extrema relevância para o bem-estar desta população. Assim, esta seção tem por objetivo avaliar as condições atuais do ar, água e solo do bairro, além de propor possíveis ações que integrarão o plano de desenvolvimento integrado de Jardim Gramacho. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _5 Portanto, este documento, além de reunir conhecimento técnico acerca de Jardim Gramacho, servirá de base para a elaboração do plano de ações estratégicas. Os dados aqui contidos deverão nortear as ações dos atores envolvidos nas problemáticas deste território, a fim de que estas sirvam melhor as necessidades e demandas da população e do meio ambiente de Jardim Gramacho. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _6 2. Contextualização do Desenvolvimento de Jardim Gramacho e seu Aterro Metropolitano Desde a ocupação da região da Guanabara, os sucessivos vazadouros de lixo foram feitos sobre manguezais à beira da baía. O primeiro que se tem registro foi no saco de São Diogo, que é a atual área do bairro de Santo Cristo, próximo ao Canal do Mangue e a Praça Marechal Hermes. Depois foi no Caju, bairro que até hoje compõe o sistema de coleta e destinação de resíduos sólidos com uma estação de transferência de resíduos (ETR) que recebe mais de 2.000 toneladas de lixo por dia. Posteriormente, vazou-se o lixo na ilhota de Saravatá, que ficava próxima ao ponto de encontro entre a Linha Vermelha e a Rodovia Washington Luiz e ao estuário do rio Meriti até esta ser incorporada ao continente no início da década de 1980. Mais tarde, foi no início da estrada Rio – Petrópolis, perto de onde hoje se localiza a sede do jornal O Globo e o novo Hospital Municipal Dr. Moacyr Rodrigues do Carmo.1 Finalmente o destino do lixo de grande parte da Região Metropolitana do Rio de Janeiro (RMRJ) foi Jardim Gramacho, um bairro no município de Duque de Caxias que, desde então, passou a ser conhecido como a localização de um dos maiores aterros do país. As sucessivas mudanças de destino para o lixo, portanto, acompanharam a evolução histórica da cidade do Rio de Janeiro e de sua região metropolitana, sendo repetidamente empurradas em direção ao fundo da Baía de Guanabara, mas sem sair de cima dos manguezais. Apesar de sua atual relevância metropolitana, o bairro de Jardim Gramacho teve sua evolução urbanística pouco documentada. Então, para compreender como a área se desenvolveu, foi preciso buscar indícios históricos acerca do espaço geográfico no qual o bairro se insere. Assim, a história de ocupação da Baixada Fluminense, e, em especial, de Duque de Caxias, tem seu início ainda no século XVI com as doações das sesmarias por Estácio de Sá. Durante o período de prosperidade da cana-de-açúcar, os rios da região, incluindo o rio Sarapuí (que passa ao norte do atual bairro de Jardim Gramacho), eram muito utilizados para escoar as mercadorias ali produzidas por meio dos diversos embarcadouros 1 Adaptado de AMADOR, Elmo, "Baía de Guanabara: um balanço histórico", Capítulo 7 in ABREU, Mauricio de (org.), Natureza e Sociedade no Rio de Janeiro, RJ: Biblioteca Carioca, 1992, páginas 246–247. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _7 construídos ao longo dos leitos. Neste contexto, há relatos sobre a existência de fazendas e plantações próximas a área hoje ocupada por Jardim Gramacho, indicando que esta não estava fora ou distante deste processo de ocupação. Outros indícios, como o desenho urbano da área hoje ocupada pelo bairro, sugerem que parte de seu arruamento é anterior à construção da Rodovia Washington Luiz (antiga Rio – Petrópolis), que ocorreu no início da década de 1930. O arruamento também indica que Jardim Gramacho, antes da referida estrada, era integrado ao bairro de Gramacho, hoje localizado do outro lado da rodovia. Atualmente, o bairro ocupa grande parte do espaço entre a Rodovia Washington Luiz e os manguezais que circundam a Baía de Guanabara na altura de Duque de Caxias. Um relatório acerca do bairro2 indica que a primeira área loteada para ocupação urbana em Jardim Gramacho foi para a construção de um conjunto habitacional (COHAB). Este estilo de moradia popular foi construído em todo o Estado do Rio de Janeiro notadamente a partir da década de 1970. Coincidentemente ou não, é nesta década que o governo decide instalar na periferia do bairro um aterro para qual seria destinado o lixo da região. Na época, Jardim Gramacho era habitado por poucas famílias de baixa e média renda e abrigava escassas e pequenas indústrias. O Aterro Metropolitano de Jardim Gramacho (AMJG), que é atualmente a peça-chave do sistema de coleta e destino dos resíduos sólidos provenientes da RMRJ, surgiu em um contexto de grandes transformações políticas e socioeconômicas no Brasil e no próprio Rio de Janeiro. Na década de 1970, o planejamento federal militar visava o desenvolvimento de regiões metropolitanas nos grandes centros do país, o que resultou, entre outras coisas, na criação da RMRJ e na fusão dos estados da Guanabara e Rio de Janeiro (1974/1975) como medidas incentivadoras de uma maior articulação entre os municípios desta área conurbada. Com este mesmo propósito, o governo criou a Fundação para o Desenvolvimento da Região Metropolitana do Rio de Janeiro (FUNDREM), em cujo âmbito seria planejado o curso de diversas atividades públicas em abrangência metropolitana. 2 Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (IBASE). Diagnóstico Social de Jardim Gramacho. Comunidades COEP. Duque de Caxias, 2005. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _8 Assim, coube a FUNDREM coordenar, supervisionar e implantar o sistema de disposição final dos resíduos sólidos urbanos gerados na RMRJ. Neste âmbito, o grande projeto previsto no programa de desenvolvimento desta região era um aterro sanitário metropolitano que fosse capaz de receber, em caráter de disposição final, os resíduos sólidos das cidades do Rio de Janeiro, Duque de Caxias, Nova Iguaçu, Nilópolis e São João do Meriti. Atribuiu-se à Companhia Municipal de Limpeza Urbana do Rio de Janeiro (COMLURB), titular dos serviços públicos de limpeza urbana e manejo dos resíduos sólidos da capital e a única empresa com capacidade técnica e institucional para um empreendimento deste porte, a operação e o gerenciamento deste projeto e o seu devido desenvolvimento com a concordância dos municípios que seriam envolvidos3. Em sua projeção, foi estimado que o aterro receberia aproximadamente 3.000 toneladas de lixo por dia durante uma vida útil de cerca de 20 anos, que resultaria, no ano de 2002, em um talude de massa de resíduos de aproximadamente 30 metros (somando o lixo e os materiais utilizados em seu recobrimento). Estava previsto também a formação de consórcios entre os municípios envolvidos para lidar com as questões ambientais provenientes do funcionamento do aterro, já que a limpeza pública era legalmente prevista como um serviço comum de âmbito regional4. Os principais critérios utilizados na escolha da localização do aterro foram a equidistância entre e o local e os municípios envolvidos e a disponibilidade de terras públicas utilizáveis para tal destinação. Assim, a área escolhida é localizada à beira da Baía de Guanabara no município de Duque de Caxias, tem mais de dois milhões de metros quadrados e pertencia à União – sob a responsabilidade do Instituto de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) – que a doou à COMLURB para a instalação do referido aterro. Apesar do registro de início da instalação e de operação do novo aterro datar de 1978, sua localização à beira da baía e muito próxima aos estuários dos rios Iguaçu e Sarapuí passou a infringir a Portaria nº 53 de 1979 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) que 3 Nota-se aqui que o diálogo no âmbito de destinação final dos resíduos sólidos sempre foi entre a COMLURB e os demais municípios da RMRJ, e nunca entre a Prefeitura do Rio de Janeiro e as demais Prefeituras envolvidas. 4 Lei Complementar nº14 de 1973, que instituiu as regiões metropolitanas de São Paulo, Belo Horizonte, Recife, Porto Alegre, Salvador, Curitiba, Belém e Fortaleza e instituiu as regras referentes às regiões metropolitanas em geral e as posteriormente criadas (como a do Rio de Janeiro). Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _9 proibiu o lançamento de lixo em cursos de água e suas cercanias imediatas, mas isto não foi motivo suficiente para interromper as recentes operações, nem para obrigar os gestores públicos a tomar providências para relocar o novo aterro para uma área mais adequada. Além disso, o início das operações do novo aterro coincidiu com uma grave crise econômica que atingiu o Brasil e o mundo na transição da década de 1970 para a de 19805. Este fator afetou gravemente a atenção prestada, o orçamento disponível e a vontade política dos gestores públicos em relação ao aterro. Na época também não havia exigências legais de estudos de impactos ambientais (hoje conhecidos como EIA/RIMA) para empreendimentos potencialmente perigosos, como era claramente o caso do novo aterro. Neste contexto, não demorou muito para que a falta de apoio institucional e de recursos financeiros e técnicos, somada à ausência de medidas administrativas das prefeituras envolvidas, tornassem o promissor aterro sanitário metropolitano em um lixão de difícil operação. A abertura do aterro teve um impacto imediato na vida do bairro de Jardim Gramacho. Já nos primeiros anos de funcionamento, as vias de acesso construídas foram ocupadas por estabelecimentos de tipo comercial e industrial que lidavam com reutilização e reciclagem dos resíduos e nas áreas próximas ao aterro surgiram casebres que abrigavam uma população de catadores que, em sua maioria, haviam migrado de outros aterros desativados ou áreas onde era despejado o lixo da região. Relatos de catadores mais antigos indicam que muitos deles já exerciam esta atividade no vazadouro de lixo anterior à Jardim Gramacho, que fica alguns quilômetros ao sul do bairro, também próximo à Rodovia Washington Luiz. Ao contrário deste antigo local de despejo – um grande terreno baldio na beira da estrada – o novo aterro era localizado nas cercanias de um bairro residencial, o Jardim Gramacho, que oferecia contexto e espaço para os catadores recém-chegados se estabelecerem. 5 É na transição da década de 1970 para 1980 que se dá também a abertura política do regime militar, notadamente com a revogação dos atos institucionais em 1978. O ambiente político antidemocrático que havia se instaurado a partir de 1964 é pertinente na medida em que não ensejava articulações entre instâncias governamentais (como as Prefeituras envolvidas no projeto) e muito menos denúncias por parte da população acerca de danos ambientais ou sociais causados por empreendimentos públicos. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _10 Na primeira década da existência do aterro, que funcionou desde o princípio como um lixão, não eram feitos o recobrimento regular do lixo, a captação das águas pluviais, a fiscalização dos caminhões, o monitoramento do solo e do entorno do aterro, entre outras exigências mínimas legais e de bem-estar socioambiental. Assim, nestes anos ocorreram rupturas do solo e vazamentos de chorume nas águas da baía e dos rios Iguaçu e Sarapuí e surgiram roedores, aves e insetos nas cercanias. Com o passar do tempo, o aterro passou a receber cada vez mais tipos de lixo de caráter prejudicial ao meio ambiente e à saúde pública, como os resíduos industriais e hospitalares. Enquanto isso, a COMLURB continuava sem os recursos necessários para a operação satisfatória do aterro e não recebia as suas parcelas de pagamento dos municípios da Baixada Fluminense que vazavam seus resíduos em Jardim Gramacho. Estas Prefeituras também não dialogavam ou cooperavam entre si para enfrentar as questões da destinação dos resíduos sólidos urbanos e seus desdobramentos ambientais. Entre 1978 e 1988, o recebimento diário de lixo no aterro aumentou gradualmente de 3.000 para 5.000 toneladas, sem que a operação e o manejo dos resíduos melhorassem ou fossem otimizados. Paralelamente, mas em decorrência disto, o número de catadores aumentou, novamente sem que fossem criadas medidas de segurança, nem políticas trabalhistas e de inclusão social. Além disso, o crescimento do talude também significou outros aumentos, como o do chorume que poluía os rios e a baía, dos incêndios causados pelo metano produzido pelo lixo e pela irregularidade de seu recobrimento e da ocorrência de rupturas que comprometiam a capacidade natural de impermeabilização do solo argiloso sob o aterro. A década de 1990 foi marcada por uma onda de conscientização ambiental e de crescente preocupação com o destino dado ao lixo urbano em níveis internacional e nacional. No Rio de Janeiro (que sediou a ECO '92), a COMLURB e as administrações municipais ligadas ao despejo de lixo em Jardim Gramacho foram pressionadas por recomendações do Programa de Despoluição da Baía de Guanabara e por diversas autuações da FEEMA para resolver as irregularidades e minimizar os danos ambientais causados pelo aterro e sua má operação. Diante da inviabilidade (política, orçamentária e Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _11 fundiária) de mudar o local de destinação do lixo da RMRJ, a COMLURB optou por promover a recuperação do aterro e de sua operação dentro das normas legais através de licitação pública que concederia estas responsabilidades a uma empresa privada. Este processo, portanto, foi concluído em 1996, quando cerca de R$150 milhões de reais foram investidos na recuperação do aterro – que passa a ser oficialmente chamado de Aterro Metropolitano de Jardim Gramacho (AMJG) e a funcionar como um aterro controlado, dentro dos mínimos legais exigidos. Com isso, a situação física do aterro sofreu profundas melhorias e passou-se a administrar com mais cuidado e atenção o talude de lixo metropolitano que já media aproximadamente 32 metros de altura antes do final da década de 1990. Assim, as sucessivas empresas que ganharam a concessão para operar o AMJG sob a supervisão da COMLURB, entre 1996 e o contrato atual, foram, respectivamente, a Queiroz Galvão S.A. (1996–2001), a S.A. Paulista (2001–2006), a CAENGE Ambiental (2006–2008) e a Novo Gramacho Energia Ambiental S.A. (a partir de 2008). Nesta nova fase de operação do aterro, passou-se a ter o controle dos caminhões com balanças digitais, implantaram-se sistemas de drenagem para coletar e tratar as águas pluviais e o chorume e passou-se a coletar e queimar o biogás (metano), extinguindo os incêndios outrora recorrentes. Apesar de não ter havido a remoção do lixo antigo para nova impermeabilização do fundo do aterro, implantou-se uma cortina de argila orgânica impermeável em todo o seu entorno e instalou-se uma manta protetora no fundo da área que passou a receber o lixo dos serviços de saúde (cuja operação passou a ser totalmente diferenciada do restante do AMJG). Alega-se que a argila natural do fundo do aterro continua impedindo o vazamento de lixo e chorume na Baía de Guanabara e nos rios próximos (Iguaçu e Sarapuí), mas instalaram-se sistemas de monitoramento da instabilidade do solo, a fim de evitar novas rupturas e deslizamentos. A recuperação do aterro significou, além de medidas ambientais e remediações técnicas, uma reestruturação do seu funcionamento interno. Ao longo do período em que era um lixão, foi feito um loteamento por funcionários da COMLURB de espaços dentro do aterro que recebiam o lixo dos caminhões. Estas áreas, genericamente denominadas “rampas”, passaram a ter donos que, por sua vez, eram responsáveis pelo pagamento dos Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _12 caminhões, tratores e catadores que transitavam e trabalhavam em seus lotes. A reforma do aterro, no entanto, gradualmente desfez este arranjo, dando fim às rampas e retomando estes espaços e as funções de seus “donos” para a empresa concessionária. As medidas de contenção e recuperação do aterro, também foram acompanhadas de algumas melhorias das condições socioambientais do entorno do AMJG promovidas pelas sucessivas empresas concessionárias. A Queiroz Galvão S.A., empresa responsável pela remediação do lixão e sua posterior operação nos moldes de um aterro controlado, replantou mudas de mangue dos três tipos encontrados nesta área da Baía de Guanabara, contratou uma assistente social para cadastrar os catadores, conscientizá-los sobre o uso de equipamentos de proteção individual (EPI), organizar a entrada e saída deles no aterro e para controlar a entrada de crianças e pessoas vulneráveis, entre outras coisas. A empresa também construiu um centro de triagem na entrada do aterro e apoiou a criação, com o intermédio da assistente social, de uma cooperativa de catadores – a COOPERGRAMACHO – para lhes dar melhor estrutura e organização. Esta assistente, devido à necessidade de continuação do seu trabalho e aos laços de confiança que havia construído com os catadores, foi sucessivamente contratada pelas empresas concessionárias. Além destas medidas tomadas pela Queiroz Galvão S.A., destacam-se outras duas ocorridas durante o período de operação pela S.A. Paulista: a construção de uma escola e uma nova sede para o posto de saúde do bairro – ambas de administração municipal. A criação da primeira cooperativa de catadores em Jardim Gramacho, portanto, ocorreu em 1996 e foi induzida pela COMLURB e pela empresa concessionária da época com a ajuda de uma assistente social. Em termos de organização local, esta foi a primeira a surgir no entorno do AMJG, tendo sido relatado que nesta época eram muito poucos os catadores politizados e que as movimentações do narcotráfico nestas cercanias podem ter sido um fator desencorajador de articulações reivindicatórias por parte dos trabalhadores no aterro. Além disso, ressalta-se a dificuldade enfrentada pela assistente para atrair os catadores à cooperativa devido à perda de liberdade que isto representava. A catação, quando feita individualmente, não impõe jornada de trabalho nem requer prestação de contas a nenhum superior, além da remuneração ser à vista no ato da venda dos materiais recicláveis Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _13 coletados. Aderir à cooperativa, portanto, significava se submeter a regras e perder a autonomia do quanto se trabalha e quanto se ganha em consequência. Assim, a COOPERGRAMACHO atraiu – em seu período de maior adesão – menos de 100 catadores; sobretudo, mulheres e idosos que valorizavam a segurança socioeconômica garantida pela cooperativa, como pagamento de INSS e seguro de vida. Em 2004, a dinâmica organizacional dos catadores ganha nova força com a desvinculação de um dos membros da COOPERGRAMACHO, que, com o intuito de formar uma organização representativa mais abrangente da classe profissional (ainda não reconhecida formalmente), fundou a Associação de Catadores do Aterro Metropolitano de Jardim Gramacho (ACAMJG). Em contato com o Instituto Brasileiro de Inovações próSociedade Saudável (IBISS), os fundadores da ACAMJG, em especial um deles, participou de um curso de liderança oferecido pelo instituto, adotando uma postura pró-organização local. Desde a criação da ACAMJG, três outras cooperativas surgiram no contexto do aterro: a COOPERCAXIAS, a COOPERJARDIM e a COOPERCAMJG, que foi fundada como um braço econômico e produtivo da ACAMJG. Todas estas organizações, apesar de suas diferenças internas e de formas de trabalho, estão articuladas para defender seus interesses em comum – necessidade de material reciclável e de meios para fazer a coleta, como caminhões, galpões, prensas, entre outras maquinarias administrativas, como computadores. Também a partir de 2004, a COMLURB e a Prefeitura do Rio de Janeiro passaram a procurar formas de substituir o AMJG por outro destino final para os resíduos sólidos sob sua responsabilidade. Este fator intensificou as demandas organizadas por parte dos catadores cooperativados, que se articularam com a Defensoria Pública e com o Movimento Nacional dos Catadores de Recicláveis (MNCR). Nesta época, a Prefeitura de Duque de Caxias, que havia vazado parte de seu lixo no aterro desde o princípio, iniciou uma série de tentativas de fechar o AMJG ou dificultar o seu funcionamento. Em 2005, o Prefeito Washington Reis instituiu uma Taxa de Recomposição Ambiental a ser cobrada de todos os caminhões (inclusive os da COMLURB) que quisessem despejar lixo no aterro. O preço da cobrança seria baseado no número de eixos do Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _14 caminhão. Semanas após a validação da lei que regulamenta a taxa, o Prefeito fechou o aterro alegando inadimplência da COMLURB. O fechamento durou pouco e gerou disputas judiciais entre a Prefeitura de Caxias, responsável pelo bairro de Jardim Gramacho, e a COMLURB, formalmente dona do terreno onde se localiza o aterro. A empresa carioca de limpeza urbana alega que Duque de Caxias também a deve dinheiro pelos anos que vazou seus resíduos sólidos gratuitamente no AMJG. Também em 2005, o Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (IBASE) se aproximou de Jardim Gramacho no contexto do projeto de Comunidades COEP, apoiado por Furnas Centrais Elétricas S.A. O objetivo geral do projeto era ajudar a organização local de espaços afetados por barragens e/ou lixões, áreas de quilombolas ou outros fatores de vulnerabilidade. Em Jardim Gramacho, o IBASE ajudou a formar o Fórum Comunitário de Jardim Gramacho (Fórum) que passou a ser uma instituição de representação local do bairro, mesmo que ainda pouco capilarizada. O projeto financiou a construção da sede do Fórum, onde moradores, com o apoio de cerca de 30 instituições, se divide em grupos de trabalho para formar demandas do bairro. Apresentadas em cartilhas, estas demandas são articuladas pelos próprios moradores junto da Prefeitura e de demais ofertantes de serviços públicos, como a empresa de ônibus que transita em Jardim Gramacho. Todas essas melhorias, no entanto, não foram suficientes para resolver os problemas socioeconômicos gerados ao longo das quase três décadas de descaso administrativo com o aterro e o bairro de Jardim Gramacho. A recuperação e a nova operação técnica do aterro também não foram capazes de postergar indefinidamente a sua exaustão, uma vez que a área já havia ultrapassado por muitos anos a sua vida útil prevista. Por isso, desde 2004 a COMLURB tenta resolver o crescente problema no sistema de coleta e destinação de resíduos sólidos do Rio de Janeiro. No seu último contrato de concessão, assinado em 2008 entre a COMLURB e a empresa Novo Gramacho Energia Ambiental S.A., já consta como obrigação da empresa, mediante autorização da COMLURB, o encerramento do AMJG e o seu monitoramento por pelo menos 10 anos. Hoje, o aterro recebe cerca de 8.000 toneladas de lixo dos quais cerca de 80% são provenientes do Rio de Janeiro, 13% de Duque de Caxias, 4% de São João do Meriti, 2% de Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _15 Mesquita, 1% de Nilópolis e 1% de Queimados. Hoje, o talude de lixo e de material de recobrimento já ultrapassa 40 metros de altura, sendo possível vê-lo da Rodovia Washington Luiz e do Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro (Galeão/Tom Jobim). Além de ter se tornado um significante passivo socioambiental, atualmente o aterro se encontra fora das exigências legais da nova Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei nº 12.305/2010) e causa problemas ao aeroporto e aos projetos de recuperação dos portos e da saúde ambiental da Baía de Guanabara. Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei nº12.305 de 2010) Estão sujeitos a essa lei as pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado que, direta ou indiretamente, sejam responsáveis pela geração, gestão integrada ou gerenciamento de resíduos sólidos [Artigo 1º]. Um dos objetivos dessa Política Nacional de Resíduos Sólidos é a integração dos catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis nas ações que envolvam a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos [Artigo 7º, XII]. Esta lei institui: a gestão integrada de resíduos sólidos, que é o conjunto de ações voltadas para a busca de soluções para os resíduos sólidos, de forma a considerar as dimensões política, econômica, ambiental, cultural e social, com controle social e sob a premissa do desenvolvimento sustentável [Artigo 3º, XI]; e a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos, que é o conjunto de atribuições individualizadas e encadeadas dos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, dos consumidores e dos titulares dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos, para minimizar o volume de resíduos sólidos e rejeitos gerados, bom como para reduzir os impactos causados à saúde humana e à qualidade ambiental decorrentes do ciclo de vida dos produtos [Artigo 3º, XVII]. Fica estabelecida a responsabilidade dos Municípios e do Distrito Federal pela gestão integrada de resíduos sólidos gerados nos respectivos territórios, juntamente com as competências de controle e fiscalização dos órgãos federais e estaduais e com a responsabilidade do gerador [Artigo 10]. Nestes artigos, a lei explicita sua orientação descentralizadora. Em nível estadual, é prevista ao Estado a possibilidade de elaborar planos microrregionais ou para regiões metropolitanas e aglomerações urbanas. [artigo 17, §1º] Isso é incentivado claramente no artigo 16, §1º: serão priorizados no acesso aos recursos da União referidos no caput os Estados que instituírem microrregiões, de acordo com a previsão constitucional. O conteúdo mínimo dos planos para as outras esferas federativas é similar ao previsto para o Plano Nacional, adaptado à competência e âmbito de ação de cada um. Os incisos V dos artigos 15 e 17, que tratam do conteúdo mínimo dos planos nacional e estadual, respectivamente, têm a mesma redação: metas para a eliminação e recuperação de lixões, associadas à inclusão social e à emancipação econômica de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _16 3. Levantamento de Equipamentos e Serviços Públicos Básicos no Jardim Gramacho O presente levantamento tem por objetivo contribuir com informações ao diagnóstico socioeconômico, ambiental e de infraestrutura urbana de Jardim Gramacho em Duque de Caxias, bairro no qual se localiza o Aterro Metropolitano de Jardim Gramacho (AMJG) – que atualmente serve de destinação final dos resíduos sólidos do Rio de Janeiro e outros quatro municípios da Baixada Fluminense (Duque de Caxias, Nova Iguaçu, São João do Meriti e Nilópolis). Para tanto, procurou reunir informações acerca da existência, abrangência e condições da infraestrutura pública urbana – que inclui os equipamentos (como redes públicas de esgoto e água) e os serviços (como educação e saúde públicas) básicos – e sobre os programas sociais desenvolvidos pelas três esferas de governo e pela sociedade civil no território. Assim, a seguir esta parte do relatório é estruturada da seguinte forma: a seção de Metodologia explica brevemente como as informações aqui constantes foram obtidas; a seção de "Equipamentos e serviços públicos básicos" reúne o que foi possível levantar sobre o desenvolvimento urbano do território, suas áreas mais carentes em infraestrutura, e a abrangência espacial e populacional das redes públicas de escolas, de estabelecimentos de saúde e de transporte; a próxima seção, de "Programas sociais", está subdividida entre os projetos que são mantidos pelas esferas de governo e os que são promovidos por organizações da sociedade civil, como ONGs, Igrejas e associações; na seção de "Atividades econômicas", tentou-se observar a relevância na atividade econômica do Aterro Metropolitano de Jardim Gramacho [AMJG] na geração de trabalho e renda, por meio da identificação da quantidade de depósitos ligados a esta atividade no bairro; por fim, a seção de "Considerações finais e indicações futuras" serve como norteadora para uma posterior sofisticação e adensamento das informações contidas nesse relatório. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _17 3.1 Metodologia Este levantamento, por ter sido feito à distância, trabalhou primeiramente com o universo e as informações de Jardim Gramacho levantados por um screening realizado pela empresa Overview no final de 2010. O universo para Jardim Gramacho, em Duque de Caxias, é de 13.703 moradores distribuídos em 5.863 domicílios. No que concerne o número de catadores residentes no bairro, foram identificados 1.217 catadores distribuídos em 841 domicílios – o que representa cerca de 9% da população de Jardim Gramacho e aproximadamente 14% de seus domicílios. A partir das informações constantes neste screening sobre as escolas, postos de saúde, empresas, entre outros estabelecimentos do bairro, foram acessadas as bases de dados oficiais, como a DataEscolaBrasil do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais [INEP] para os estabelecimentos educacionais e o DATASUS do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde [CNES] para os estabelecimentos de saúde. Quanto às informações sobre a prestação de serviços de transporte público, foi acessado o website da empresa e foram feitos diversos contatos telefônicos – o que, mesmo assim, não possibilitou à equipe obter as informações desejadas. Para os programas sociais, foram consultados os websites dos Ministérios (na esfera federal), e das Secretarias (nas esferas estadual e municipal) acerca dos projetos e ações realizadas no bairro de Jardim Gramacho. Foram feitos também contatos telefônicos com as Secretarias Municipais, que resultaram em alguns esclarecimentos de informações antigas ou errôneas obtidas pela internet (novamente por meio de insistência da equipe). Também foram utilizados como referência dois diagnósticos socioeconômicos: um, de agosto de 2005, que foi feito pelo Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas [IBASE] em parceria com Furnas Centrais Elétricas S.A. e o Comitê de Entidades no Combate à Fome e Pela Vida [COEP] e o outro, de fevereiro de 2007, que foi feito pelo Observatório Urbano Estado do Rio de Janeiro [OUERJ] em parceria com a Universidade do Estado do Rio de Janeiro [UERJ]. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _18 Cabe enfatizar que o levantamento, apesar de ter coletado diversas informações relevantes e fidedignas, encontrou muitas dificuldades em acessar e obter informações cruciais para um desenho mais detalhado dos equipamentos infraestruturais e programas assistenciais no bairro. Algumas dessas informações poderiam ser obtidas com uma visita à Jardim Gramacho pela equipe. Outras questões só poderão ser esclarecidas com a colaboração dos órgãos públicos. Desta forma, estas questões estão esplanadas na seção de "Considerações finais e indicações futuras", com apontamentos de quais informações poderiam ser requeridas ou obtidas junto aos Secretários municipais de Duque de Caxias para possivelmente serem incluídas nas entrevistas que serão futuramente realizadas. 3.2 Equipamentos e serviços públicos básicos O diagnóstico social elaborado pelo Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas [IBASE] em 2005 afirma que "as ocupações mais antigas, como a COHAB (conjunto habitacional – 1ª área loteada de Jardim Gramacho), o Morro do Cruzeiro, o Triângulo e o Morro da Placa possuem infraestrutura urbana (saneamento, pavimentação das ruas, água e energia elétrica de redes oficiais) adequada à demanda. As localidades que possuem ocupação recente são áreas mais pobres, em geral sem saneamento básico, água, e algumas ainda sem luz. Incluem-se aqui a Chatuba, a Favela do Esqueleto, o Beco do Saci, a Cidade de Deus, a Avenida Rui Barbosa, o Parque Proletário e a Comunidade da Paz/Maruim, entre outras" (IBASE, 2005, p. 9). As subdivisões do bairro de Jardim Gramacho acima mencionadas, no entanto, não se encontram mapeadas ou endereçadas em nenhum órgão público ou sistema virtual de mapas, como o Google. No entanto, conhecimento adquirido pela equipe em suas visitas ao bairro (prévias a esse levantamento) tornou possível o mapeamento de quatro áreas mencionadas no diagnóstico como ocupações mais recentes que não possuem os equipamentos e infraestrutura básicos. Portanto, no Mapa 1, a seguir, é possível observar que as áreas identificadas no mapa se localizam a margem do bairro, em suas bordas. Como o bairro de Jardim Gramacho fica entre a Rodovia Washington Luiz (BR-040) e a Baía de Guanabara, os assentamentos precários se encontram, muitas vezes, em cima do manguezal, em áreas precariamente Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _19 aterradas pelos próprios moradores com lixo que foi disposto clandestinamente e terra, como é o caso de algumas casas na Comunidade da Paz/Maruim e na Favela do Esqueleto. Dos assentamentos precários identificados e visitados pela equipe, o Parque Planetário e a Comunidade da Paz/Maruim são os maiores em área e dispõem de energia elétrica, mas permanecem carentes dos demais equipamentos básicos como sistemas de saneamento e água canalizada (IBASE, 2005, p. 9). Ainda de acordo com este diagnóstico, "um representante do poder público presente no 1º Encontro de Integração Comunitária de Jardim Gramacho" afirmou que no bairro "existem hoje 32 ruas sem asfalto. 16 ruas oficiais e 16 ruas pertencentes às ocupações mais recentes, não oficiais e que não constam nos mapas dos bairros" (IBASE, 2005, p. 9, nota de rodapé 2). Mapa 1: Áreas com assentamentos precários no bairro de Jardim Gramacho Favela do Esqueleto Av. Rui Barbosa Parque Planetário Comunidade Paz/ Maruim Fonte: Google Images ©2011; Marcações: IETS, 2011. Informações específicas sobre a existência e abrangência de infraestrutura básica como rede de água, esgoto, luz elétrica e coleta de lixo foram encontrados no diagnóstico Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _20 socioeconômico do OUERJ (2007), com base em dados concedidos pelo banco do PSF/SIAB do mesmo ano. Segundo este documento, no bairro de Jardim Gramacho cerca de 77% dos domicílios são abastecidos pela rede oficial de água, 71% pela rede oficial de esgoto, 98% têm luz elétrica e 85% destinam seu lixo à coleta pública (pg. 30). Nestas informações, destaca-se que 14% dos domicílios que não são atingidos pela rede oficial de esgoto, lançamno a céu aberto, enquanto os outros 15% o fazem em fossas. Em visita a uma das casas localizadas na Favela do Esqueleto, o morador disse à equipe que não havia saneamento básico em toda a sua área. 3.3 Educação Partindo dos dados contidos no screening da Overview, haviam 16 estabelecimentos de ensino (escolas e creches) localizados no bairro de Jardim Gramacho. Quando este rol é comparado à base de dados DataEscolaBrasil do INEP, apenas dez deles foram encontrados. Os seis estabelecimentos que não constam na base do INEP são identificados no screening apenas pelo seu endereço, faltando-lhes, com duas exceções, o nome. Destes estabelecimentos, dois são creches e um, chamado Escola Palhaçinho Feliz, remete à educação infantil. Os outros três são identificados como um centro educacional e duas escolas, a Escola Educacional Florescer e a outra sem maiores detalhes. Com base em conhecimento adquirido na visita ao Fórum Comunitário de Jardim Gramacho e através da leitura dos diagnósticos do IBASE (2005) e do OUERJ (2007), pode-se inferir que estas creches e escolas que não são reconhecidas pelo INEP têm caráter extraoficial, funcionando com apoio exclusivamente comunitário para suprir demandas não atendidas por creches e escolas das redes públicas municipais e estaduais. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _21 Na base DataEscolaBrasil, foram identificados dez estabelecimentos educacionais oficialmente em funcionamento no bairro de Jardim Gramacho. Destes dez, dois funcionam apenas como creche e pré-escola e o restante se divide entre escolas que oferecem Ensino Fundamental, Ensino Médio ou ambos. Das oito escolas, apenas uma não constava no screening, a CE Lara Vilella. No entanto, foi confirmada a existência e o funcionamento desta escola através de contato telefônico com a mesma. Na Tabela 1, os dez estabelecimentos constantes no rol do INEP estão listadas juntamente com a indicação de sua dependência administrativa, mostrando que cinco são municipais, três são estaduais e dois, privados. Como exceção, foram deixadas de fora dois estabelecimentos identificados tanto pela Overview quanto pelo INEP – a Creche e a Escola Comunitárias ASPAS – por estarem atualmente paralisadas. Ambos os estabelecimentos, cuja sigla nominativa representa "Ação Social Paulo Sexto", são mantidos pela Paróquia Imaculada Conceição, que está ligada à Diocese de Duque de Caxias e São João de Meriti. No entanto, estão listados no Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _22 DataEscolaBrasil como creche e escola privadas, o que indica que este órgão não faz distinção entre estabelecimentos educacionais filantrópicos ou comunitários e particulares. Mapa 2: Estabelecimentos de ensino do bairro de Jardim Gramacho EM Mauro de Castro Creche e Pré-Escola Municipal Ubaldina Alves da Silva CIEP/ Brizolão 218 Ministro Hermes Lima EM José Medeiros Cabral CE Lara Villela Creche Centro de Atendimento à Infância Caxiense Jardim Gramacho EM Jardim Gramacho CE Álvaro Negromonte Fonte: Google Images ©2011; Marcações: IETS, 2011 No Mapa 2, acima, os estabelecimentos de ensino no bairro de Jardim Gramacho estão indicados com marcadores coloridos. As marcações em vermelho representam os estabelecimentos educacionais oficialmente em funcionamento segundo o INEP, em amarelo, são os que foram apenas identificados pela Overview, e, finalmente, em azul, a creche e a escola comunitárias ASPAS, previamente mencionadas. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _23 A Tabela 2 distingue o número de matrículas por fase educacional de cada um dos estabelecimentos no rol do INEP. Notam-se as matrículas constantes para as creches, onde há um total de apenas 128 nas duas creches oficialmente reconhecidas. Além disso, com o Mapa 2 foi possível perceber que ambas as creches em funcionamento se localizam muito próximas uma da outra. Ao observar as matrículas disponíveis para a pré-escola, percebe-se que nas duas creches do rol o número de matrículas diminui, mas no total dos estabelecimentos de ensino que oferecem a pré-escola, as matrículas quase duplicam para 245 (quase o dobro das matrículas para creche). Os dados, obtidos junto ao PSF/SIAB no mesmo ano, indicam que havia 1.745 crianças entre 0 e 6 anos residindo em Jardim Gramacho (OUERJ, 2007, p. 26). Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _24 A oferta de matrículas escolares no bairro de Jardim Gramacho, a partir do ingresso no Ensino Fundamental, passa por uma gradual e significativa diminuição: enquanto para os anos iniciais do Fundamental existem 1.853 matrículas, os anos finais têm 1.355 (quase 500 a menos) e o Ensino Médio, 722 matrículas (mais de 600 a menos). Portanto, dois cenários são possíveis: ou os alunos passam a estudar em outros bairros (o que requer que haja transporte público ou escolar para eles) ou há um caso sério de evasão escolar, em que os alunos deixam de estudar na medida em que avançam nos anos escolares. Em relação ao tamanho das escolas, as três que tem o maior número de matrículas são a CE Álvaro Negromonte, com um total de 1.124 matrículas, a EM Mauro de Castro, que oferece 872 matrículas, e a EM José Medeiros Cabral, com um total de 605 matrículas. Sabe-se, pelas entrevistas e leituras realizadas e pelas visitas ao território anteriores a este levantamento, que a escola municipal Mauro de Castro foi construída por uma antiga empresa concessionária responsável pela gestão do AMJG, a SA Paulista6. A Tabela 3, a seguir, apresenta de forma genérica as informações obtidas no DataEscolaBrasil sobre a oferta de programas de educação (além do currículo de ensino regular) e a oferta de transporte público escolar. Os programas educacionais contemplados são a Educação Especial7, o Atendimento Educacional Especializado (AEE)8 e a Educação de Jovens e Adultos (EJA)9. 6 A S.A. Paulista é uma empresa de engenharia e construção cujas principais áreas de atuação são barragens, hidroelétricas, rodovias e outras obras de grande porte. A partir do anos 2000, S.A. Paulista também passou a trabalhar com o gerenciamento de destinos para resíduos sólidos, como o Centro de Tratamento de Resíduos de Nova Iguaçu e o Aterro Metropolitano de Jardim Gramacho. O AMJG foi gerido pela S.A. Paulista entre 2001 e 2006 (aproximadamente). Apesar de nada sobre o lixo constar em seu site oficial <www.sapaulista.com.br>, foram encontradas publicações oficiais da empresa que tratam do assunto <http://www.aeerj.com.br/arq/encarte/enc-396.pdf>. 7 "1. Educação que visa integrar o excepcional à vida social. 2. Ensino para deficientes físicos e/ou mentais. 3. 'Toda a educação geral ou profissional proporcionada a pessoas física ou mentalmente desfavorecidas, socialmente desajustadas ou retardadas, cujas necessidades educativas exigem programas e métodos pedagógicos outros que aqueles considerados como normais'. (UNESCO) (cf. DUARTE, S.G. DBE, 1986)" (Site do INEP – Thesaurus Brasileiro de Educação). 8 Tipo de Educação Especial que foca em crianças com deficiências mentais e cujo objetivo é ensinar aos alunos instrumentos e noções que suas condições dificultam o aprendizado natural <http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/aee_dm.pdf>. 9 "A educação de jovens e adultos destina-se aos que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e médio e deve ser apropriada às características do alunado, a seus interesses, condições de vida e de trabalho." (Site do INEP – Thesaurus Brasileiro de Educação). Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _25 Na tabela acima, nota-se que a Educação Especial está presente em duas escolas do bairro: a EM Jardim Gramacho e a EM Mauro de Castro. Quando os dados mais específicos foram obtidos junto ao INEP, descobriu-se que apesar da oferta da Educação Especial existir, o número de matrículas é pequeno – 4 matrículas na primeira escola e 10 na segunda. Outra informação relevante é que as matrículas são, em ambos os estabelecimentos de ensino, para os anos iniciais do Ensino Fundamental. Quanto ao AEE, (que, segundo o DataEscolaBrasil, é uma modalidade da Educação Especial) este é ofertado nas mesmas escolas, a EM Jardim Gramacho e a EM Mauro de Castro. Na primeira escola, existem 14 matrículas para cada dos seis tipos de atendimento: atividades de vida autônoma, desenvolvimento de processos mentais, comunicação alternativa e aumentativa, orientação e mobilidade, atividades de enriquecimento curricular e língua portuguesa na modalidade escrita. Os alunos podem se matricular em mais de um tipo de atendimento. Na segunda escola, existem 16 matrículas para AEE, mas apenas três tipos de atendimento: as atividades de vida autônoma, o desenvolvimento de processos mentais e a comunicação alternativa e aumentativa. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _26 Pela referida tabela, nota-se também que a única escola que oferece os três programas educacionais citados – Educação Especial, AEE e EJA – é a EM Jardim Gramacho. A CE Lara Villela, que é da rede estadual, é a outra escola do bairro que também oferece EJA. Além disso, consta no DataEscolaBrasil que na EM Jardim Gramacho a oferta de EJA é apenas para os anos iniciais do Ensino Fundamental (constam 105 matrículas na base da dados oficial), enquanto na CE Lara Villela, a oferta de matrículas é somente para os anos finais do Ensino Fundamental (da 5ª a 8ª série – totalizando 174 matrículas). Nenhuma das escolas oferece EJA para o Ensino Médio. Por fim, o transporte público escolar só é oferecido nas escolas da rede estadual de ensino – a CE Álvaro Negromonte, a CE Lara Villela e o CIEP/Brizolão 218 Ministro Hermes Lima. Para a primeira escola (que é a maior do bairro, com 1.124 alunos matriculados), 1.117 estão cadastrados para utilizar o transporte público escolar. Destes, 1.114 estão na zona residencial urbana e constam na base do INEP como "Poder Público Municipal" – no DataEscolaBrasil, não fica claro se esta designação federativa diz respeito ao prestador do serviço, ao responsável administrativo ou a outra classificação. No INEP constam, para o CE Lara Villela, 544 cadastrados no transporte público escolar: 541 na zona residencial urbana e "Poder Público Municipal" e 3 na zona residencial rural e "Poder Público Municipal". Notou-se, porém, que na mesma base de dados constavam apenas 134 matrículas nesta escola. Algumas hipóteses podem ser levantadas para explicar essa discrepância, como um erro na base de dados do INEP ou a proximidade desta escola com a EM José Medeiros Cabral – para a qual constam 605 matrículas na base de dados aqui analisada. No diagnóstico social do IBASE (2005), consta que o CE Lara Villela havia cerca de 815 alunos, que segundo entrevistas este número estava aquém da capacidade infraestrutural da escola e que haveria nela a implementação do Ensino Médio a partir de 2006. O transporte público escolar do CIEP/Brizolão 218 Ministro Hermes Lima atende apenas alunos na zona residencial urbana, constando como "Poder Público Municipal", chegando a um total de 365 cadastrados. De acordo com o INEP, este é o exato número de matrículas nesta escola. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _27 3.4 Saúde Para o levantamento dos estabelecimentos que oferecem serviços públicos de saúde, foram utilizadas as informações obtidas no screening e a base de dados oficial do CNES – o DATASUS. Segundo a Overview, duas localidades prestam os referidos serviços no bairro: o Posto Municipal de Saúde Edna Siqueira Sales, localizado na Rua Paracatu, s/n, e cinco unidades do Programa Saúde na Família (PSF)10 na Rua Monte Castelo nº 996. No entanto, quando o DATASUS foi consultado, algumas discrepâncias surgiram: apesar de todos estes estabelecimentos de saúde pública identificados pela Overview constarem no CNES, o endereço das unidades do PSF não é o que foi indicado no screening. Em contato telefônico com a sede do PSF/ESF, foi confirmado o endereço indicado pelo screening: Rua Monte Castelo, 996. Mapa 3: Estabelecimentos de saúde do bairro de Jardim Gramacho Posto de Saúde Edna Siqueira Sales Endereços do PSF/ESF no DATASUS/ CNES Unidades do PSF/ESF Hospital Dr. Moacyr Rodrigues do Carmo Fonte: Google Images ©2011; Marcações: IETS, 2011. 10 A última unidade a ser inaugurada é chamada pela nova nomenclatura, Estratégia Saúde na Família (ESF), ou seja, é a Unidade ESF Jardim Gramacho V. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _28 Além desses estabelecimentos, a equipe, em visitas ao bairro anteriores a este levantamento, identificou o Hospital Municipal Dr. Moacyr Rodrigues do Carmo como o mais próximo de Jardim Gramacho. Entre as pessoas que citaram este hospital como referência, foi unânime o comentário da dificuldade em chegar a este estabelecimento, apesar de sua proximidade em distância, por razão dos sentidos das pistas e possibilidades de retorno na Rodovia Washington Luiz. O hospital se localiza perto do complexo do O Globo, na Rodovia Washington Luiz nº3200, do lado direito na direção de Petrópolis. No mapa a seguir é possível visualizar a localização destes estabelecimentos de saúde, destacando que as marcações em verde são os endereços confirmados de funcionamento dos mesmos e as em rosa são as localizações constantes na base de dados do DATASUS, que se acredita estar desatualizada para as unidades do PSF/ESF. Foi confirmado, portanto, o funcionamento de sete unidades de saúde em três estabelecimentos distintos no bairro de Jardim Gramacho: as cinco unidades do PSF/ESF, o Posto de Saúde e o Hospital. A dependência administrativa e a gestão destes estabelecimentos de saúde são todas municipais (cabendo a Prefeitura de Duque de Caxias). A Tabela 4, abaixo, classifica estes estabelecimentos pelo tipo de atendimento prestado – ambulatorial, internação (leitos), emergência e serviço auxiliar de diagnóstico e terapia (SADT)11. Entende-se por atendimento ambulatorial, a assistência de enfermagem que envolve consultas, controle de sinais vitais (como pressão arterial e frequência cardíaca), administração de medicamentos, realização de curativos e similares e, entre outros serviços deste tipo, o encaminhamento do paciente, conforme sua necessidade, a outros estabelecimentos que prestem serviços mais específicos. Assim, não existem leitos disponíveis aos pacientes quando o serviço disponível em determinado estabelecimento é apenas ambulatorial. Com base nesta tabela, pode-se afirmar que tanto as unidades do PSF/ESF quanto o Posto de Saúde Edna Siqueira Sales prestam apenas o serviço ambulatorial 11 Segundo o portal da Secretaria de Saúde e Defesa Civil, na seção Vocabulário do Guia SUS do Cidadão, SADT quer é: "Serviços Auxiliares de Diagnóstico e Terapia são diversos procedimentos como exames e terapias [e até pequenas cirurgias] realizadas por unidades vinculadas ao SUS" <http://portal.saude.rj.gov.br/Guia_sus_cidadao/Vocs.shtml>. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _29 enquanto o Hospital Dr. Moacyr Rodrigues do Carmo presta todos os tipos de atendimento (ambulatorial, internação, emergência e SADT). Nas fichas de informação do DATASUS, constam que em todas as unidades de PSF/ESF estão disponíveis equipamentos de odontologia (como fotopolimerizador e amalgamador) do mesmo gênero e quantidade – um de cada. No entanto, nestas mesmas fichas, variam as instalações físicas para a assistência ambulatorial listadas como disponíveis. Neste sentido, para as unidades do PSF I e II constam dois consultórios para clínicas básicas e um para odontologia (em cada ficha); para a unidade PSF III, o mesmo e mais uma sala de imunização; para o PSF IV, constam dois consultórios para clínicas indiferenciadas, um para odontologia, dois outros consultórios "não médicos", uma sala de imunização, uma sala de curativo e uma sala de nebulização; e, por fim, para a unidade ESF V, constam apenas um consultório de odontologia, uma sala de curativo e uma sala de imunização. Estas incongruências em instalações físicas para o atendimento ambulatorial não faz sentido a partir da informação de que todas as unidades do PSF/ESF de Jardim Gramacho têm sede no mesmo local. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _30 O Posto de Saúde Edna Siqueira Sales, que também só presta atendimento ambulatorial, conta com três consultórios de clínicas básicas e um consultório de odontologia segundo a base do DATASUS. O Hospital Municipal Dr. Moacyr Rodrigues do Carmo, inaugurado em setembro de 2008 é considerado como o hospital público mais moderno do Estado do RJ, tem cerca de 18 mil m2 de área construída e custou algo em torno de R$72 milhões aos cofres públicos 12. Neste sentido, é um estabelecimento de saúde que presta, segundo sua ficha do DATASUS, serviços de atendimento ambulatorial, internação, emergência e SADT. Para tanto, conta com mais de 230 leitos para pacientes de necessidades variadas, além de dispor de equipamentos e realizar atendimentos, diagnósticos, tratamentos e cirurgias a níveis dos melhores e maiores hospitais públicos. Não foi possível determinar, com as informações disponíveis no DATASUS, quantos atendimentos ou demais serviços prestados pelo hospital são para pacientes residentes em Jardim Gramacho, não sendo possível, portanto, determinar o impacto que este estabelecimento teve na oferta de serviços de saúde para os moradores do bairro. Quanto à disponibilidade de atendimento destes estabelecimentos, a Tabela 5 demonstra que não são todos os que atendem pacientes vindos por demanda espontânea. Neste sentido, demanda espontânea se diferencia de demanda referenciada (na base do DATASUS); a primeira é a que caracteriza o paciente que busca livremente e diretamente um estabelecimento de saúde e a segunda diz respeito ao paciente que foi encaminhado por médico ou outro estabelecimento, que estava previamente cadastrado, ou que tinha atendimento previamente marcado. A informação que se destaca da tabela a seguir é que as unidades dos PSF I e ESF V não constam na base de dados do CNES como disponíveis para atendimento de demanda espontânea. Novamente, não foi possível confirmar esse dado através do contato telefônico com estas unidades, nem compreender a razão para tal já que as demais unidades prestam esse serviço e se localizam na mesma sede. 12 Segundo notícia intitulada "Presidente e governador inauguram hospital em Duque de Caxias" em 13/08/2008 por Eliane Jorge e Denise Domingos para a seção de Notícias da Subsecretaria de Comunicação Social do Governo do Rio de Janeiro <http://www.imprensa.rj.gov.br/SCSsiteImprensa/detalhe_noticia.asp?ident=47498>. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _31 Mesmo com estas possibilidades de atendimento, deve ficar claro que nenhuma das unidades de saúde localizadas dentro de Jardim Gramacho oferecem atendimento 24 horas. Caso haja a necessidade de receber atendimento médico durante a noite ou fora dos horários de atendimento dos estabelecimentos mencionados, o morador do bairro ainda terá dificuldade de acesso, tendo em vista que a próxima seção discute a oferta precária de transporte público em Jardim Gramacho. Por fim, a Tabela 6 apresenta o quadro de profissionais que trabalham em cada um destes estabelecimentos de saúde. Assim, com estas informações fica claro que o quadro de médicos do Posto de Saúde, e, portanto, a probabilidade de atendimento com melhor qualidade e especialidade profissional, é maior do que o das unidades do PSF/ESF – o que corrobora o encaminhamento de pacientes destes para aquele. Em relação ao tamanho, as equipes das unidades do PSF/ESF tem quase o mesmo número de profissionais, e também são aproximados em número à equipe do Posto de Saúde. Logicamente, a equipe de médicos e demais profissionais de saúde do Hospital é significativamente maior. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _32 Tabela 6: Unidade de saúde por quantidade de profissionais Médicos Outros profissionais UNIDADE PSF JARDIM GRAMACHO II 1 10 UNIDADE PSF JARDIM GRAMACHO I 1 12 UNIDADE PSF JARDIM GRAMACHO III 1 12 UNIDADE PSF JARDIM GRAMACHO IV 1 12 POSTO MUNICIPAL DE SAUDE EDNA SIQUEIRA SALES 8 6 ESF JARDIM GRAMACHO V 1 10 235 543 Unidade de Saúde Hospital Municipal Dr. Moacyr Rodrigues do Carmo Fonte: CNES (dezembro 2010); Elaboração: IETS, 2011. 3.5 Transporte A oferta de serviços de transporte público no bairro, excluindo o já citado transporte público escolar, é muito reduzida. Jardim Gramacho é servido por três linhas de ônibus, mantidas pela mesma empresa concessionária – a Auto Viação Reginas – que atende os municípios contíguos do Rio de Janeiro, São João do Meriti, Belford Roxo, Duque de Caxias, Magé, Guapimirim e Cachoeiras de Macacu. Pelo site e em contato telefônico, só foi possível levantar informações acerca do itinerário dessas linhas, sem que fossem obtidos dados como o tamanho da frota que circula nestas linhas ou o tempo de espera para os passageiros. Por Jardim Gramacho, portanto, passa apenas uma linha intermunicipal, cujo ponto inicial e final é a Av. Monte Castelo e passa, indo para a Central (no Rio de Janeiro), pela Rua Frei Caneca – na CE Álvaro Negromonte – antes de pegar a Rodovia Washington Luiz, e voltando da Central, passa apenas pela Av. Pelotas. Ambas as ruas do bairro pela qual passa esta linha são trechos curtos e muito próximos à Rodovia mencionada – o que significa que não integra nenhuma outra área do bairro. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _33 As outras linhas que passam pelo bairro – COHAB x Hospital de Duque de Caxias e Jardim Gramacho x Hospital de Duque de Caxias – são municipais e ligam dois pontos finais do bairro (a Rua Prainha e a Av. Monte Castelo, respectivamente) às proximidades de um hospital que fica no centro da cidade. No Mapa 4, abaixo, observa-se o trajeto aproximado das duas linhas municipais do bairro. O mapeamento aproximado dos itinerários dessas linhas é extremamente importante para ilustrar uma dicotomia bastante discutida por moradores, frequentadores e estudiosos do bairro: a divisão invisível entre a área mais próxima ao aterro (mais recentemente ocupada e precariamente urbanizada) e a área mais antiga (e com melhor infraestrutura) – que é por onde passam as linhas de ônibus. Mapa 4: Trajeto das linhas municipais de ônibus do bairro de Jardim Gramacho COHAB x Hospital de Duque de Caxias Jardim Gramacho x Hospital de Duque de Caxias Fonte: Google Images ©2011; Marcações: IETS, 2011. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _34 A outra possibilidade de transporte público ofertada aos moradores de Jardim Gramacho não chega ao bairro em si, mas encontra-se próximo e disponível aos que necessitarem: a linha ferroviária. Utilizando como referência a saída dos ônibus de acesso à Rodovia Washington Luiz, na altura da Rua Frei Caneca, em Jardim Gramacho, e utilizando o caminho mais curto até a estação ferroviária de Duque de Caxias, são entre 5 e 6 km. De carro, seriam aproximadamente 11 minutos e a pé são, no mínimo, 1 hora e meia. Alternativa para se chegar à estação de trem é utilizando as linhas de ônibus municipais que passam por Jardim Gramacho e tem, como ponto final, a Praça Senhor do Bonfim no centro de Duque de Caxias, que fica a cerca de 1,6 km de distância. A pé se completa esse trajeto em aproximadamente 20 minutos. 3.6 Atividades econômicas Por abrigar o Aterro Metropolitano de Jardim Gramacho (AMJG), o bairro de Jardim Gramacho é conhecido pelas suas atividades econômicas que giram em torno do lixo e materiais recicláveis. O diagnóstico do IBASE (2005) cita pesquisas realizadas por Lúcia Pinto (2004) e pela Drª Valéria Bastos (1998) para argumentar que a economia de Jardim Gramacho gira em torno do funcionamento do aterro, dizendo: "Em sua pesquisa (2004), Lúcia Pinto descreve que a economia deste sub-bairro, sobretudo nas áreas periféricas ao aterro, está voltada para a atividade de catação, comercialização e recuperação de recicláveis" (p. 10) ou então: "Em números, Valéria Bastos relata que cerca de 60% dos moradores vivem de atividades ligadas à comercialização de recicláveis. Alguns diretamente realizando atividades como a catação de lixo, a abertura de aterros clandestinos e trabalho nos depósitos de sucatas. Outros vivendo, indiretamente, das já citadas atividades de comércio em estabelecimentos como biroscas, barracas e bares, instalados fundamentalmente na Av. Monte Castelo, via principal que leva ao aterro" (p. 10). O screening da OVERVIEW, no entanto, identificou que cerca de 9% da população do bairro Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _35 está ligada diretamente à atividade da catação mas não determinou quantas pessoas estão ligadas indiretamente às atividades do aterro e dos recicláveis. O levantamento realizado pela Equipe de Combate à Dengue no bairro, cujas informações constam no diagnóstico do OUERJ (2007), aponta para atividades econômicas bastante diversas localizadas em Jardim Gramacho. Eles identificaram 74 pontos de caráter industrial dentre os quais existem indústrias metalúrgicas e de álcool e açúcar, fábricas de parafusos, vidro, motores, tinta, produtos de limpeza, móveis e cigarros, além de marcenarias e serrarias. Neste mesmo levantamento foram identificados 229 pontos de caráter comercial (como lojas, padarias, restaurantes e similares) e 156 pontos de serviços. A informação constante no diagnóstico é genérica, mas é suficiente para indicar que a talvez a dependência econômica do bairro no aterro não seja tão intensa quanto aparenta. 3.6.1 Depósitos O levantamento sobre os depósitos e galpões existentes foi, sem dúvida, o que mais encontrou dificuldades em obter as informações desejadas. Como não foi possível acessar a listagem dita oficial dos depósitos legalizados através da colaboração da COMLURB e da Secretaria Estadual de Ambiente (SEA), só o que está disponível para a equipe são as informações do screening da Overview. Esta base de dados, no entanto, meramente identificou a existência de depósitos – para os quais, em sua grande maioria, não foi especificado o ramo de comércio em que atuam. Foi possível distinguir, por indicações feitas pelos pesquisadores de campo que realizaram o screening, alguns depósitos ou galpões que são certamente ligados ao AMJG por trabalharem com os resíduos e sua reciclagem. Portanto, dos 174 depósitos e galpões identificados no bairro, apenas 12 foram especificados como parte da cadeia produtiva do lixo (seja juntando material para a reciclagem ou de fato reciclando). Destes 12, cinco são localizados ao longo da Avenida/Rua Monte Castelo, dois são na Rua Quipapá, que fica a poucos metros do aterro e um em cada uma das seguintes ruas: Almerim, Bragança, Jaboticabal, Manaus e Remanso. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _36 Além disso, foram identificados pelo screening dois vazadouros clandestinos em uma rua referida como Rua Monte Alegre – que não pôde ser localizada no sistema de mapas utilizado pela equipe. Suspeita-se, já que os vazadouros clandestinos tendem a se localizar em ruas menos visíveis e habitadas, que esta seja uma rua ainda não asfaltada e não reconhecida pelos mapas oficiais ou formais, mas também não se pode eliminar a possibilidade de que o pesquisador de campo possa ter se confundido, visto que, próximas uma da outra e ao AMJG, existem as ruas Monte Castelo, Monte Azul e Monte Serrat. Também foram encontrados outros cinco depósitos/galpões nesta rua, o que cria a impressão de que não foi um erro de anotação ou digitação, e reforça a ideia de precariedade e clandestinidade deste logradouro. Mapa 5: Densidade e localização dos depósitos e galpões comerciais no bairro de Jardim Gramacho13 Avenida /Rua Monte Castelo Rua Jaboticabal Rua Quipapá Rua Remanso Densidade dos depósitos por rua (a cor mais intensa representa um maior número de depósitos). Rua Bragança Rua Almerim Rua Manaus Fonte: Google Images ©2001; Marcações: IETS, 2011. 13 No Anexo II, no final do documento, encontra-se a tabela com a relação de ruas do bairro com o número de depósitos que nelas se localizam. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _37 Não é possível notar, ao observar a densidade de depósitos ou galpões espacialmente distribuída, nenhuma área específica em que este tipo de estabelecimento comercial se concentre. O mapa acima mostra que os depósitos estão localizados em todo o bairro, e que a sua maior densidade encontra-se em quatro ruas: a principal via de acesso ao aterro no bairro – Avenida/Rua Monte Castelo – onde ficam 36 depósitos ou galpões, uma rua transversal a ela – Rua Almirante Midosi – em que se localizam 18 desses estabelecimentos, e duas ruas na área supostamente dotada de melhor equipamento urbano público – as ruas Remanso e Almerim – com 13 e 12 pontos deste tipo respectivamente. 3.7 Considerações finais e indicações futuras O presente levantamento, conforme outrora explicado, foi feito sem que tenham ocorrido visitas de campo com o propósito de obter informações que compusessem este relatório. Neste sentido, o levantamento se baseou em informações provenientes do screening da Overview, de diagnósticos feitos por outras instituições e algumas pesquisas realizadas no bairro, além das bases e sites oficiais de entes e administrações públicas. Com as informações obtidas sobre os equipamentos e serviços públicos básicos, foi possível observar que no bairro de Jardim Gramacho existem carências quanto à infraestrutura urbana e a oferta de alguns serviços públicos que serão comentados a seguir. Primeiramente, identificou‐se que nas áreas de assentamentos precários há ausência quase absoluta de infraestrutura como acesso a saneamento básico, energia elétrica e abastecimento de água. Também ficou claro que estas áreas se localizam nas áreas periféricas do bairro, em áreas próximas ao manguezal. Em segundo lugar, apontou‐se para uma possível demanda não satisfeita por creches e pré‐escolas públicas, baseada na comparação entre as matrículas indicadas pelo INEP (128 em duas creches e 245 em sete pré‐escolas, num total de 372) e o número de crianças residentes no bairro que têm entre 0 e 6 anos, segundo dados do PSF/SIAB constantes no diagnóstico da OUERJ de 2007 (que eram 1.745 neste ano). Desta mesma forma, também Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _38 ficou claro que o número de matrículas no Ensino Médio (que só é oferecido em duas escolas de rede estadual) também é menor do que o número de adolescentes na idade correspondente a esta fase educacional (cerca de 1.300 potenciais alunos para 722 matrículas). Em terceiro lugar, a inauguração do Hospital Dr. Moacyr Rodrigues do Carmo à cerca de 6 km de Jardim Gramacho, na Rodovia Washington Luiz, poderia representar uma melhoria no acesso à saúde para os moradores do bairro. No entanto, não há meio de transporte eficiente para leva‐los do bairro ao hospital – tendo em vista a reduzida oferta de ônibus e o desfavorável sentido das pistas e proximidade de retornos na rodovia mencionada. Assim, é possível que os residentes de Jardim Gramacho ainda optem pelo atendimento no Hospital Municipal de Duque de Caxias, que é ligado ao bairro pelas suas duas únicas linhas municipais de ônibus. Por fim, o transporte público em ônibus é muito pouco abrangente e não serve a todo o bairro. Restrito há duas linhas municipais e uma intermunicipal que liga o bairro à Central no Rio de Janeiro, os itinerários não passam pelas proximidades do aterro – o que limita o impacto que estes poderiam exercer na integração do bairro de Jardim Gramacho. Em quarto lugar, ao longo da elaboração deste levantamento, não foram encontrados quaisquer indícios acerca da existência de posto de policiamento ou presença de policiais ou guardas em Jardim Gramacho. Este é um fator importante, tendo em vista a movimentação intensa de caminhões e a proliferação de vazadouros clandestinos no bairro. Além disso, o policiamento é uma forma básica e central de presença do Poder Público em qualquer território. As atividades econômicas, por sua vez, se mostraram presentes por todo o bairro. As informações contidas no screening não foram suficientes para definir a parcela destas atividades que estão direta ou indiretamente ligadas ao AMJG, e dados obtidos nos diagnósticos utilizados apontam para a diversidade comercial e industrial de Jardim Gramacho. No entanto, pesquisadoras como Valéria Bastos e Lúcia Pinto alegam que grande parte da população do bairro tem sua renda ligada ao aterro. Por não ser possível acessar a lista de depósitos oficialmente reconhecidos pela COMLURB que são ligados à cadeia Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _39 produtiva dos resíduos sólidos, os dados reunidos pela equipe sobre este tema foram de caráter genérico. Além disso, notou‐se, na elaboração deste levantamento, que dois dos principais estabelecimentos públicos de saúde e ensino – o Posto de Saúde Edna Siqueira Sales e a Escola Municipal Mauro de Castro – foram construídos por uma empresa privada responsável pela gestão do AMJG. Isto é relevante na medida em que aponta para a possibilidade de atuação por parte de entidades particulares na prestação de serviços públicos básicos. Neste mesmo sentido, os estabelecimentos de ensino identificados apenas pela Overview, caso tenham caráter comunitário ou filantrópico, podem indicar o potencial da organização social dos moradores do bairro – que já pode ser observada junto às cooperativas de catadores, às organizações religiosas de caridade e ao fórum comunitário. As informações e possíveis conclusões obtidas por este levantamento secundário servirão de base para o diagnóstico socioeconômico de Jardim Gramacho, que será elaborado a partir da consolidação dos dados recolhidos em recente pesquisa de campo. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _40 4. Diagnóstico Socioeconômico de Jardim Gramacho O presente diagnóstico tem como objetivo fornecer informações atuais acerca da realidade local de Jardim Gramacho para embasar a estratégia de desenvolvimento integrada deste bairro. Para tanto, apresentamos dados gerais sobre a população, as condições dos domicílios, o acesso a serviços de infraestrutura, educação, saúde, renda e trabalho com base na pesquisa de campo amostral realizada pela empresa Overview em Jardim Gramacho no final de 2010. Em determinados momentos, são feitas comparações com o Estado e a Região Metropolitana do Rio de Janeiro, dependendo da disponibilidade de dados provenientes da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) de 2009 e da Pesquisa Mensal do Emprego (PME) de janeiro de 2011, de forma a comparar Jardim Gramacho com o contexto maior em que está inserido. Em especial, a análise tem como foco os catadores de materiais recicláveis, seus domicílios, características educacionais e de seu trabalho. Nota-se um grande atraso deste grupo no acesso à infraestrutura urbana, cujo impacto no meio ambiente e na saúde gera preocupações. As condições precárias das moradias em que vivem os moradores de Jardim Gramacho, particularmente os catadores, indicam a urgência da necessidade por ações de reordenamento espacial. A baixa escolarização e a alta incidência de pobreza também demandam ações emergenciais de transferência de renda, complementares ao Programa Bolsa Família, que devem estar conjugadas a uma perspectiva da reconversão profissional. Em suma, a estratégia de desenvolvimento da região deve seguir um plano de ação amplo e integrado que contemple desde melhoria da infraestrutura urbana, dos domicílios, dos transportes, o aumento da escolaridade, formação profissional e empreendedora até a atração de investimentos e empresas para a região. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _41 4.1 Metodologia _Plano de Coleta de Dados A coleta das informações em Jardim Gramacho procurou garantir a cobertura da população do bairro e dos moradores que são catadores de matérias recicláveis residentes no bairro e atender o cumprimento do prazo estabelecido para a coleta de dados. Além de recensear todos os moradores nos domicílios particulares ocupados e nos domicílios coletivos, o levantamento fez o cadastro ou listagem de todas as unidades residenciais e não residenciais que compõem cada setor censitário que faz parte da delimitação do bairro de Jardim Gramacho. _Desenho Conceitual O Plano Amostral foi desenhado para uma pesquisa domiciliar, por meio de entrevistas quantitativas e presenciais com moradores de domicílios particulares no bairro de Jardim Gramacho no município de Duque de Caxias, baseado na malha dos setores censitários do IBGE elaborada para o Censo Demográfico de 2000. Adota-se o conceito de domicílio como o local de moradia estruturalmente separado e independente, constituído por um ou mais cômodos (PNAD/IBGE 2008). A separação é caracterizada quando o local de moradia é limitado por paredes, muros, cercas etc., coberto por um teto, e permite que seus moradores se isolem, arcando com parte ou todas as suas despesas de alimentação ou moradia. A independência do domicílio fica caracterizada quando o local de moradia tem acesso direto, permitindo que seus moradores possam entrar e sair sem passar pelo local de moradia de outras pessoas. Os domicílios são classificados como particulares quando destinados à habitação de uma pessoa ou de um grupo de pessoas cujo relacionamento é ditado por laços de parentesco, dependência doméstica ou, ainda, normas de convivência. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _42 A amostra é representativa do universo de domicílios em Jardim Gramacho, foi aplicado um único questionário por domicílio onde o entrevistado respondeu as questões referentes à: acesso a infraestrutura e disponibilidade de serviços, situação fundiária das moradias, posse de bens, perfil socioeconômico dos moradores, condições de saúde, identificação de moradores ocupados na atividade de reciclagem, indicação de trabalhadores afins e indicação de entidades que atuam na região, entre outras dimensões. _Cadastro de Seleção O Cadastro básico de seleção da Pesquisa Domiciliar é a “base dos dados Agregados por Setores Censitários do Resultado do Universo do Censo Demográfico 2000” (CD 2000) referente aos setores censitários que delimitam o bairro de Jardim Gramacho. _Definição dos Setores Os setores censitários pertencentes a Jardim Gramacho foram identificados utilizando os mapas dos setores censitários que fazem parte das informações do CD “Arquivos de Setor do Censo Demográfico 2000 – Base do Universo”. Quando se compara a malha dos setores censitários produzidos pelo IBGE para o Censo Demográfico 2000 e dados de imagem de satélites é possível identificar os setores censitários no contorno do que se presume Jardim Gramacho. A partir desta comparação foi identificada uma diferença na delimitação da área, provavelmente originada pelo crescimento da população entre as datas de construção da malha dos setores censitários de 2000 e das imagens de satélite. Para minimizar problemas de subestimação da população residente nas favelas a serem pesquisadas foi proposto um “Screening” onde foi realizado o levantamento do número de unidades residenciais e não residenciais de sua população em período que antecede a pesquisa de campo. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _43 _Contagem de Domicílios Segundo os setores censitários do IBGE elaborados para o Censo Demográfico de 2000, o bairro de Jardim Gramacho é formado por 20 setores censitários. Entretanto, no momento na contagem constatou-se que um deles não pertencia, de fato, a Jardim Gramacho. Para a seleção da amostra de domicílios e da amostra de domicílios com moradores catadores de matérias recicláveis foi feito, no período que antecede a pesquisa domiciliar, uma contagem de domicílios e moradores residentes. A contagem de domicílios teve como objetivo o mapear os domicílios da região, coletando a informação do número de moradores em cada domicílio, o número de moradores que trabalham com coleta de materiais recicláveis em Jardim Gramacho e a informação do melhor horário para o catador ou chefe do domicilio ser encontrado em sua residência para fazer a entrevista. Junto com as informações de localização do domicílio foi possível construir um cadastro dos domicílios, o que possibilitou a seleção probabilística dos domicílios. _Screening O screening iniciou com o reconhecimento do perímetro, identificação de ruas dentro do setor, identificação do ponto inicial (ou ponto de referência), identificação e numeração de quadras, identificação e nomeação de faces, arrolamento e preenchimento da folha de listagem. Para o reconhecimento do perímetro e identificação de ruas dentro do setor foi feito o reconhecimento e demarcação do perímetro do setor de trabalho, onde definiram o espaço de trabalho, apoiados na descrição do setor censitário, no croqui do IBGE e a imagem aérea do local (Google Earth). Para a Listagem das unidades residenciais e não residenciais o levantamento registrou todas as construções dentro do perímetro do setor, fazendo anotações e referências para identificação do domicílio na listagem. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _44 Na listagem constam todos os endereços, inclusive os vagos, os fechados, os ocasionais e não residenciais. Durante o arrolamento foram feitas perguntas sobre a quantidade de moradores do domicílio e moradores que exercem a atividade de catadores de materiais recicláveis. Para os domicílios onde foram identificados moradores que são catadores foi perguntado qual o dia e hora mais provável para encontrá-los no domicílio. Para levantar as informações foi definido que o entrevistador deveria retornar três vezes ao domicílio antes de classificá-lo como fechado. Duas destas visitas deveriam ser feitas no mesmo dia, com intervalo mínimo de 4 horas, enquanto a terceira visita deveria ser realizada em um dia diferente, não necessariamente no dia seguinte14. Durante o screening os domicílios foram classificados como: Domicilio Ocupado – Domicilio listado, cujos dados foram coletados com informações de moradores ou de terceiros (vizinhos); Domicílio fechado - Domicílio ocupado, listado, cujos moradores estavam temporariamente ausentes durante todo o período da coleta. (Neste caso foram feitas três visitas, dois no mesmo dia e um no dia seguinte). Domicílio de uso ocasional - Domicílio particular permanente que na data de referência servia ocasionalmente de moradia. Ou seja, são aqueles usados para descanso de fins de semana, férias ou outro fim, mesmo que, na data de referência, seus ocupantes ocasionais estivessem presentes. Domicílio vago - Domicílio particular permanente que não tinha morador na data de referência, mesmo que, posteriormente, durante o período da coleta, tivesse sido ocupado. 14 Intervalo entre a primeira e segunda tentativa de entrevista inferior a 4 horas foi permitido em casos onde fosse informado, por algum vizinho, o horário da presença do morador. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _45 Domicílio coletivo - Domicílio em que a relação entre residentes é restrita a normas de subordinação administrativa (e.g., hotéis; pensões; presídios; penitenciárias; quartéis; postos militares; asilos; orfanatos; conventos; hospitais e clínicas (com internação); alojamento de trabalhadores; motéis; campings etc.). Unidade não residencial – oficina, lojas, etc. A tabela a seguir mostra o número de domicílios encontrados durante o screening. Foram contados ao todos 5858 domicílios, sendo 1166 domicílios fechados onde tem informação que existem moradores, mas não foi possível conhecer o número de moradores. Tabela 1: Domicílios segundo o screening Número de domicílios Número de moradores 1. Domicílio ocupado 4.219 13.613 2. Domicílio fechado 1.166 0 3. Domicílio ocasional 47 58 4. Domicílio vago 422 0 4 4 5.858 13.675 5. Domicílio coletivo Total _Seleção de Domicílios Os Domicílios foram estratificados em domicílios com catadores e domicílios sem catadores. Os domicílios foram selecionados de forma aleatória simples em cada um dos estratos. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _46 A escolha do plano amostral para os catadores de materiais recicláveis residentes em Jardim Gramacho foi feito após o screening. Uma vez que não era conhecido o universo de catadores, não era possível definir tecnicamente o tamanho da amostra nem o esquema de seleção. Se o número de catadores residentes em Jardim Gramacho fosse relativamente pequeno seria feito um censo de catadores. Caso contrário, a amostra de catadores estava limitada a 450 entrevistas, por questões de custo da pesquisa. Outro fator delimitador do tamanho da amostra era o custo disponível para realizar a pesquisa domiciliar. _Tamanho da Amostra Após o screening e respeitado a questão orçamentária foi escolhido uma amostra total de aproximadamente 1080 domicílios de Jardim Gramacho onde se alcançaria domicílios com, no mínimo, 400 catadores de materiais recicláveis. O desenho amostral possibilita resultados representativos para o universo de domicílios e população residente em domicílios particulares com e sem catadores. O desenho amostral do questionário em domicílios com catadores de materiais recicláveis possibilitou resultados representativos para o universo de catadores residentes em domicílios em Jardim Gramacho. Como o screening permitiu conhecer o número de moradores e catadores de materiais recicláveis, foi selecionada uma amostra aleatória de forma a alcançar o número mínimo de 400 catadores. A partir dessa condição chegamos a uma amostra de 271 domicílios com catadores e 823 domicílios sem catadores. O tamanho de amostra citado representa uma fração da amostra de 32% para domicílios com catadores e 16,5% para domicílios sem catadores. A tabela abaixo representa a margem de erro para os indicadores de proporção referente ao domicílio. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _47 Tabela 2: Tamanho da amostra domiciliar Amostra de Domicílios Número de domicílios (screening) Margem de Erro (%) Absoluto Domicílio sem catador 823 5017 3,13% Domicílio com catador 271 841 4,91% Total 1094 5858 2,67% Estratos _Fatores de Ponderação Para calcular os fatores de ponderação da amostra a serem utilizados para fazer estimativas sobre a população pode-se adotar duas abordagens: (1) não levar em consideração a população dos domicílios fechados; (2) levar em consideração uma estimativa do número de moradores nos domicílios que se encontravam ocupados e estavam fechados durante o screening. Quando não é utilizada a estimativa do número de moradores em domicílios fechados, as estimativas calculadas subestimam indicadores de total, mas ao mesmo tempo, são feitas estimativas mais conservadoras. Quando é utilizada a estimativa do número de moradores em domicílios fechados encontramos indicadores de totais de domicílios recenseados mais próximo do total efetivo, mas se pressupõe que a distribuição do número de moradores de domicílios fechados tem o mesmo padrão que os domicílios investigados. Para o Censo Demográfico 2010, o IBGE utilizou a estimativa de moradores em domicílios fechados levando em consideração o número de moradores dos domicílios investigados. O IBGE supõe que o número de moradores de domicílios fechados não tem o mesmo padrão que o número de moradores em domicílios pesquisados, admite que o número médio de moradores nos domicílios fechados é menor e tem padrão similar aos Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _48 domicílios que estavam fechados durante ao período estipulado para a coleta de dados, mas que foram realizados em período posterior ao fim da coleta de dados. Não foi possível utilizar o procedimento realizado pelo IBGE devido à diferença de tempo de aplicação. Enquanto o IBGE utiliza 4 meses para fazer a coleta das informações e após o prazo conta com mais 2 meses de segunda tentativa, a pesquisa de Jardim Gramacho contou apenas com apenas 3 semanas de pesquisa de campo já contando com as tentativas adicionais de encontrar os domicílios fechados. “Para expansão dos dados coletados nos Questionários da Amostra do Censo Demográfico 2000, foram calculados pesos para as unidades domiciliares pesquisadas, sendo tais pesos atribuídos também a cada um de seus moradores. Por unidades domiciliares pesquisadas, entende-se os domicílios particulares ocupados e as famílias e pessoas sós moradoras em domicílio coletivo.” (Metodologia do Censo Demográfico 2000, Relatórios Metodológicos, Seção 12.5.3 Expansão da amostra, página 519). A partir do Censo 2010, portanto, o IBGE adotou a metodologia que passou a considerar a estimativa da população nos domicílios fechados como parte do cálculo da contagem da população (universo da população). (Fonte: Censo Demográfico 2010 – Metodologia de Estimação do Número de Moradores em Domicílios Fechados, IBGE, Novembro de 2010) 15. Baseado nisso resolveu-se refazer o cálculo da estimativa populacional utilizando esta metodologia e comparar com os valores obtidos através da aplicação da metodologia anterior: 15 http://www.censo2010.ibge.gov.br/download/nota_tecnica.pdf Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _49 Tabela 3: Estimativas de população e domicílios em Jardim Gramacho Metodologia Censo 2000 Censo 2010 Domicilios Parâmetros População Catadores 5.858 5.858 13.706 17.777 1.217 1.582 Fazendo uma análise da robustez das metodologias o IETS resolveu, para comparação de diferenças, fazer todos os cálculos de quantidades de pessoas e catadores, utilizando a nova metodologia do IBGE. Constatou-se, como esperado, que os novos cálculos causam alterações não significativas nos valores das médias e proporções já calculados. As diferenças só são relevantes nos números absolutos, por óbvio. Independente da abordagem utilizada para calcular os fatores de ponderação, praticamente todos os indicadores de proporção e média para domicílios, moradores e catadores permanecem inalterados. Também permanecem inalterados os indicadores para totais de domicílios. As diferenças ocorrem quando utilizamos indicadores de totais para as informações referentes a moradores e catadores. A tabela a seguir mostra a diferenças para os indicadores de proporção e total de domicílios. Nota-se que os resultados utilizando as duas abordagens não apresentam diferenças. Tabela 4: Acesso a serviços de escoamento sanitário por presença de catador no domicílio Forma feita para o escoadouro do banheiro(s) no domicílio Levando em consideração estimativa de moradores em domicílios fechados Sem levar em consideração estimativa de moradores em domicílios fechados N % N % Rede geral coletora de esgotos 4161 73,5 4161 73,5 Rede pluvial 101 1,8 101 1,8 Fossa séptica 199 3,5 199 3,5 Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _50 Fossa rudimentar 202 3,6 202 3,6 Vala a céu aberto 360 6,4 360 6,4 Rio, lago ou mar 276 4,9 276 4,9 Não tem banheiro 83 1,5 83 1,5 Outra forma 282 5,0 282 5,0 Fonte: IETS. Pesquisa em Jardim Gramacho, Duque de Caxias - RJ (IETS/Overview), 2010. A tabela abaixo mostra a diferenças para os indicadores de média, proporção e total para informações referentes à população. Podemos observar que as mudanças de resultados referentes aos indicadores de média e proporção são muito pequenas as diferenças estão relacionadas aos indicadores de total e a estimativas referentes a subgrupos específicos. Tabela 5: Síntese de Indicadores de renda, pobreza e desigualdade – 2011. Levando em consideração estimativa de moradores em domicílios fechados Sem levar em consideração estimativa de moradores em domicílios fechados 13.706 17.777 Renda domiciliar per capita 372,9 373.0 Porcentagem de pobres 42,4 41.9 Porcentagem de indigentes 15,3 14.9 Número de pobres 5.807 7.449 Número de indigentes 2.101 2.645 Gini 0,44 0,43 104,5 102,9 62,1 63,1 7.282.234,34 9.198.477,74 1.565.129 2.004.124 Indicadores População Distância média para Linha de Pobreza* Distância média para Linha de Indigência** Recurso anual para eliminar a Pobreza (R$) Recurso anual para eliminar a Indigência (R$) Fonte: IETS. Pesquisa em Jardim Gramacho, Duque de Caxias - RJ (IETS/Overview), 2010. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _51 Da mesma forma que a anterior, a tabela abaixo mostra que a diferença para os indicadores de proporção referentes aos catadores é insignificante, as diferenças estão relacionadas aos totais. Tabela 6: Associação a cooperativas ou similares dos catadores do AMJG – 2011 Levando em consideração estimativa de moradores em domicílios fechados Sem levar em consideração estimativa de moradores em domicílios fechados N % N % 234 14,8 180 14.8 ACAMJG 39 16,7 30 16,7 COOPERCAXIAS 39 16,7 30 16,7 COOPERJARDIM 20 8,5 15 8,3 COOPERGRAMACHO 62 26,5 48 26,7 Outra 47 20,1 36 20,0 Não especificada 27 11,5 21 11,7 309 19,5 237 19,5 Catadores associados a cooperativas Cooperativas associadas Membros da família associados a cooperativas Fonte: IETS, Pesquisa no aterro de Gramacho (IETS/ Overview), 2011, Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _52 4.2 Características demográficas e perfil das famílias A população de Jardim Gramacho é de 13,7 mil pessoas distribuídas por 5.863 domicílios, correspondendo a uma média de 3,7 pessoas por domicílio, um pouco acima da verificada no Estado do Rio de Janeiro (3,06). Vale lembrar que o Estado possui um dos mais baixos números de moradores por residência do país. No Brasil, a média de pessoas por domicílio corresponde a 3,34. Deste universo de moradores e domicílios, 3.590 pessoas (mais de ¼ da população do bairro) moram em 841 domicílios em que há pelo menos um catador de material reciclável. Sendo assim, as residências com catadores representam cerca de 14% do total de domicílios, que têm uma média de 4,1 pessoas por domicílio. Destas 3.590 pessoas, 1.190 são catadores ativos, enquanto os demais são seus familiares. A pirâmide etária de Gramacho é mais jovem do que a do Rio de Janeiro, o que está relacionado ao menor nível de desenvolvimento socioeconômico. De fato, mais da metade dos domicílios (53,3%) possuem crianças, enquanto somente 19,4% possuem idosos. Assim, a razão de dependência das crianças é de 51,4%, enquanto a dos idosos é de 9,3%. Isto indica que há uma maior necessidade de focalização das políticas públicas para as crianças, sem deixar de haver também uma atenção aos idosos elegíveis a aposentadorias e do Benefício por Prestação Continuada (BPC). Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _53 Gráfico 1 : Presença de criança e idoso nos domicílios de Jardim Gramacho Total 32% Domicílios com catador 48% 27% Domicílios sem catador 65% 33% 0% 10% 14% 4% 4% 45% 20% 30% 40% Sem criança e sem idoso 50% 16% 60% Com criança 5% 70% Com idoso 80% 90% 5% 100% Com criança e com idoso Fonte: IETS. Pesquisa em Jardim Gramacho, Duque de Caxias - RJ (IETS/Overview), 2010. Já a pirâmide etária dos domicílios com catadores de materiais recicláveis é significativamente mais jovem do que a dos domicílios sem catadores, o que se reflete numa maior proporção de domicílios com crianças e menor proporção de domicílios com idosos. Com isso, a razão de dependência das crianças que vivem com catadores alcança 74,3%, frente a 44,1% nos domicílios sem catadores de materiais recicláveis. Gráfico 2 : Pirâmide etária dos domicílios com catadores 80 anos ou mais 75 a 79 anos 70 a 74 anos 65 a 69 anos 60 a 64 anos Faixa etária 55 a 59 anos Feminino 50 a 54 anos 45 a 49 anos 40 a 44 anos Masculino 35 a 39 anos 30 a 34 anos 25 a 29 anos 20 a 24 anos 15 a 19 anos 10 a 14 anos 5 a 9 anos 0 a 4 anos 8,00 6,00 4,00 2,00 ,00 2,00 Fonte: IETS. Pesquisa em Jardim Gramacho, Duque de Caxias - RJ (IETS/Overview), 2010. 4,00 6,00 8,00 Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _54 Gráfico 3 : Pirâmide etária dos domicílios sem catadores 80 anos ou mais 75 a 79 anos 70 a 74 anos 65 a 69 anos 60 a 64 anos Faixa etária 55 a 59 anos Feminino 50 a 54 anos 45 a 49 anos 40 a 44 anos Masculino 35 a 39 anos 30 a 34 anos 25 a 29 anos 20 a 24 anos 15 a 19 anos 10 a 14 anos 5 a 9 anos 0 a 4 anos 8,00 6,00 4,00 2,00 ,00 2,00 4,00 6,00 8,00 Fonte: IETS. Pesquisa em Jardim Gramacho, Duque de Caxias - RJ (IETS/Overview), 2010. A maior parte das famílias (52%) em Jardim Gramacho é composta por casal e filhos (Gráfico 4). Em seguida, aparecem as famílias monoparentais femininas (16%) e os casais sem filhos (14%). Nos domicílios de catadores, há maior incidência de famílias monoparentais femininas (20%). Assim, a pirâmide etária jovem e a consequente maior razão de dependência de crianças nos domicílios onde moram catadores de materiais recicláveis, apontam tanto para o potencial educacional e de força de trabalho ali existente quanto para a maior vulnerabilidade destes domicílios no caso de eventuais perdas em renda. A pirâmide etária também indica que a complementação da renda domiciliar por meio de aposentadorias ou BPC é reduzida, tendo em vista que somente em 8% dos domicílios com catadores moram pessoas de 60 anos ou mais (o que representa 4% dos catadores, cerca de 51 pessoas). Isto, no entanto, não diminui a importância de encaminhar os idosos, quando elegíveis, para estes benefícios. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _55 Gráfico 4 : Perfil das famílias nos domicílios de Jardim Gramacho 06% 09% 16% 03% 14% 52% Uma pessoa Casal com filhos Casal sem filhos Pai com filhos Mãe com filhos Outros Fonte: IETS. Pesquisa em Jardim Gramacho, Duque de Caxias - RJ (IETS/Overview), 2010. Outro fator de vulnerabilidade dos domicílios em que há catadores é a grande porcentagem destes que abrigam famílias monoparentais femininas (20%). Este dado sustenta a necessidade de bons estabelecimentos públicos de educação, possivelmente em tempo integral e especialmente creches. As famílias monoparentais femininas de catadores devem constituir um grupo de especial atenção no território, sendo incluídas em programas de assistência social e transferência de renda direta. 4.3 Características dos domicílios Conforme identificou o levantamento secundário realizado no âmbito deste projeto, a ocupação formal e mais antiga de Jardim Gramacho constituiu áreas melhor aparelhadas de equipamentos urbanos e melhor acesso a serviços públicos, enquanto outras áreas de ocupação mais recentes ainda têm condições habitacionais e infraestruturais muito precárias. Observou-se, inclusive, que alguns destes assentamentos precários estão sobre manguezais aterrados com lixo e terra pelos próprios moradores. A contagem de domicílios na qual se baseou a amostra para esta pesquisa, verificou em quantos domicílios do bairro haviam catadores de materiais recicláveis. Assim, foi Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _56 possível determinar a concentração dos catadores em determinadas áreas do bairro, utilizando a divisão territorial dos setores censitários. A partir do georreferenciamento destas informações, observou-se que 76% dos catadores de materiais recicláveis se concentram em cinco setores censitários. Estes setores são localizados na franja urbana do bairro, próximos ao aterro e aos manguezais. Além disso, estes setores englobam as áreas de assentamentos precários identificadas pelo levantamento, o que sugere que os domicílios e áreas urbanas com pior infraestrutura são aquelas em que se concentram o maior número de catadores. Dentre estas áreas de ocupação recente que concentram catadores, o levantamento foi capaz de mapear a Comunidade da Paz/Maruim, a Favela do Esqueleto, o Parque Planetário e a Avenida Rui Barbosa, conforme mostrado anteriormente. No bairro de Jardim Gramacho, 67,5% dos imóveis são próprios, 14,9% cedidos e 10,9% alugados. Contudo, a condição de propriedade dos imóveis difere muito de acordo com a presença de catadores de materiais recicláveis no domicílio. Enquanto nem metade dos domicílios com catadores são próprios, este percentual ultrapassa 70% nos domicílios sem catadores. Além destes, cerca de 20% dos domicílios com catadores são alugados e 26% são cedidos, o que representa quase o dobro dos números observados nos domicílios sem catadores, como ilustra o Gráfico 5. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _57 Gráfico 5 : Condição de propriedade dos imóveis em Jardim Gramacho Total 66% Domicílio com catador 1% 44% 1% Domicílio sem catador 20% 10% próprio, já pago 20% 30% 1% 40% próprio, ainda pagando 50% 15% 7% 26% 70% 0% 11% 60% alugado 70% cedido 9% 9% 13% 80% 90% 6% 100% outra condição Fonte: IETS. Pesquisa em Jardim Gramacho, Duque de Caxias - RJ (IETS/Overview), 2010. *Nota: pessoas de 25 anos ou mais. Em Jardim Gramacho, a documentação acerca de imóveis próprios é comum: 88,5% dos proprietários a possuem. No entanto, ainda há nenhum tipo de documento de propriedade do imóvel em 17% dos domicílios com catadores e 11% dos domicílios sem catadores. Além disso, deve-se considerar a baixa formalidade documental dos imóveis cedidos e alugados dentre os catadores. Assim, uma ação de regularização fundiária, essencial ao desenvolvimento socioeconômico de qualquer território, teria caráter pontual, mas essencial, no bairro e deverá, sobretudo, contemplar os imóveis domiciliares dos catadores. Quase a totalidade dos domicílios (96%) em Jardim Gramacho são casas e menos de 4% são apartamentos. Este perfil domiciliar, portanto, deve ser observado no momento de projeção e construção de novas habitações, especialmente populares. Os materiais de construção dos imóveis podem ser classificados como duráveis ou não duráveis.16 Domicílios cuja estrutura é predominantemente composta de materiais não 16 Materiais duráveis: paredes de alvenaria/tijolo (com ou sem revestimento de emboço/chapisco) ou madeira aparelhada; cobertura de telha (de cerâmica, barro, ou amianto), madeira aparelhada ou laje de concreto; piso de madeira aparelhada, cerâmica, lajota, ardósia cimento ou carpete. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _58 duráveis são considerados rústicos. No gráfico a seguir, observa-se que em quase 10% dos domicílios de Gramacho as paredes externas são de materiais não duráveis. Também há um percentual significativo de domicílios cujo piso é de madeira aproveitada ou terra batida: 8,2%. 40% Gráfico 6 : Domicílios cuja estrutura é de material não durável em Jardim Gramacho 35% 30% 25% 20% 15% 10% 5% 0% Paredes externas Domicílio sem catador Cobertura Domicílio com catador Piso Total Fonte: IETS. Pesquisa em Jardim Gramacho, Duque de Caxias - RJ Essas porcentagens são muito elevadas tratando-se de domicílios com catadores de materiais recicláveis, nos quais a estrutura é bem mais rústica do que a dos domicílios sem catadores (Gráfico 6). De fato, em mais de 1/3 dos domicílios de catadores o piso é de material não durável (sendo 97% de terra batida) e em 31,2% deles as paredes externas não são de alvenaria/tijolo nem de madeira aparelhada – em 95% destes as paredes são de palha ou madeira aproveitada. Em 10,7% dos domicílios com catadores de materiais recicláveis a cobertura do imóvel é de zinco ou madeira aproveitada. É importante ressaltar que em 63% destes domicílios (mais que o dobro do bairro) a cobertura é de amianto, considerado cancerígeno e causador de doenças respiratórias. Materiais não duráveis: paredes de estuque, taipa revestida, madeira aproveitada, ou palha; cobertura de zinco ou madeira aproveitada; piso de madeira aproveitada ou terra batida. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _59 Estes dados sugerem uma grande discrepância entre a qualidade dos domicílios pertencentes aos catadores de Jardim Gramacho e a dos domicílios pertencentes ao restante dos moradores do bairro. Sendo assim, as ações voltadas à infraestrutura habitacional deverão se focalizar nas áreas em que se concentram os domicílios com catadores, como é o caso dos cinco setores anteriormente citados em que 76% dos catadores moram. Cerca de 90% dos domicílios de Jardim Gramacho estão localizados em ruas e possuem acesso de veículos. Em relação aos domicílios de catadores de materiais recicláveis, ¼ estão localizados em becos ou vielas. Portanto, é menor a proporção de domicílios que podem ser acessados por veículos nestes domicílios: 79,5% contra 93% nos domicílios sem catadores. Gráfico 7 : Localização dos domicílios de Jardim Gramacho 3% Total 90% Domicílio com catador 6% 74% 16% 9% 2% Domicílio sem catador 93% 0% 10% 20% 30% Rua 40% Beco 50% 5% 60% Viela 70% 80% 90% 100% Servidão Fonte: IETS. Pesquisa em Jardim Gramacho, Duque de Caxias - RJ (IETS/Overview), 2010. Quanto à pavimentação, cerca de 80% dos domicílios do bairro estão em vias (ruas, becos ou vielas) pavimentadas e um quase 70% têm calçadas pavimentadas. Este quadro se agrava quando o recorte são os domicílios onde vivem os catadores. Destes, apenas 38,7% estão em vias pavimentadas e 25,4% em vias com calçadas pavimentadas – o que sugere que o problema de pavimentação atinge especialmente as áreas em que se concentram os domicílios com catadores de materiais recicláveis. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _60 Por outro lado, a questão da regularização do arruamento abrange grande parte do bairro: um pouco mais da metade do total de domicílios (51,7%) estão em vias não identificadas por nome. Ainda, apesar de que em 60,8% das vias do bairro todas as casas ou a maioria delas são numeradas, a ordem da numeração só é respeitada em 41,7% das vias. Assim, chegar aos domicílios parece ser mais difícil pela má identificação das vias e casas do que pelas condições de acesso. No entanto, mesmo com a aparente dificuldade para localizar os domicílios em Jardim Gramacho, 83% deles dizem receber correspondência. O problema de localização (identificação do endereço) é maior nos domicílios de catadores devido à ocupação desordenada e informal do espaço. Efetivamente, mais de 80% destes domicílios estão em vias não identificadas por nome (percentual que é inferior a 50% nos domicílios sem catadores). Ademais, enquanto a maioria dos domicílios em que não há catadores é numerada, 68,7% dos domicílios com catadores estão em vias em que poucos domicílios ou nenhum deles possuem numeração, e destes, menos de 20% respeitam uma ordem. Como consequência, entre os domicílios com catadores de materiais recicláveis, menos da metade (48,1%) recebe correspondência, sendo, portanto, um número substancialmente menor do que os demais domicílios sem catadores do bairro. Novamente, os dados demonstram que o problema de regularização da estrutura urbana está concentrado nas áreas em que se localizam os domicílios com catadores de materiais recicláveis. Tanto no que diz respeito à propriedade dos imóveis e à qualidade da pavimentação das vias e calçadas, quanto no que se refere à nomeação e numeração do arruamento. Estes fatores, no entanto, não são meramente de ordem urbanística, tendo também impacto na geração de trabalho e renda na medida em que, se remediados, aumentam a formalidade dos catadores e, consequentemente, melhoram suas chances de conseguir um emprego de qualidade com carteira assinada. No que diz respeito ao deslocamento até os serviços de utilidade pública, os entrevistados pela pesquisa avaliaram o tempo médio gasto até as unidades mais próximas de policiamento, saúde, transporte público e escola/creche. Cabe ressaltar que o tempo médio declarado é de acordo com a unidade que os entrevistados consideram mais próxima, Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _61 o que muitas vezes representa a que eles utilizam. Portanto, o tempo médio gasto até a unidade de policiamento mais próxima é de cerca de 40 minutos. Este dado também indica para a inexistência de posto de policiamento no bairro, conforme consta no levantamento. A unidade de saúde menos distante fica, em média, a quase meia hora (28 minutos) dos domicílios do bairro. Tendo em vista a existência de um posto de saúde e de unidades do PSF em áreas centrais de Jardim Gramacho, conforme consta no levantamento, este tempo médio elevado até a unidade de saúde mais próxima pode ser reflexo da escolha dos moradores de irem a hospitais quando em busca de atendimento.17 O trajeto até o acesso ao transporte público e a escola/creche é relativamente curto: leva aproximadamente 7 e 17 minutos, respectivamente. Este dado, no entanto, não contradiz indicações acerca da carência de opções e itinerários de transporte público e de escolas e creches para determinadas fases do Ensino Básico, que serão discutidas mais a frente. O tempo médio de deslocamento para as unidades de policiamento e saúde, transporte público e escola/creche mais próximos é maior dentre os domicílios com catadores do que os sem catadores. A maior diferença é em relação ao ponto de policiamento, o que denota a ausência do Poder Público sobretudo nas áreas marginais do bairro, onde se concentram os domicílios em que moram os catadores de materiais recicláveis. 17 A possibilidade de os moradores irem com mais frequência a hospitais do que a postos de saúde, por preferência ou em busca de um tipo de atendimento mais específico, pode ter base no fato de que o posto de saúde e PSF só prestam serviços ambulatoriais, enquanto nos hospitais há oferta de todos os tipos de atendimento - ambulatorial, internação, emergência e serviço auxiliar de diagnóstico e terapia. Segundo o levantamento, o hospital mais próximo de Jardim Gramacho é Hospital Municipal Dr. Moacyr Rodrigues do Carmo, que apesar de se localizar relativamente perto em termos de distância, tem o acesso dificultado devido ao sentido das pistas da Rodovia Washington Luiz e à inexistência de retornos próximos. Ademais, é possível que muitos moradores ainda optem por utilizar os serviços do Hospital Municipal de Duque de Caxias. Localizado no centro de Caxias, este hospital fica mais distante de Jardim Gramacho do que o Hospital Municipal Dr. Moacyr Rodrigues do Carmo, porém é ligado ao bairro pelas duas únicas linhas municipais de ônibus existentes em Gramacho, que têm seu ponto final nas proximidades do referido hospital. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _62 Gráfico 8: Tempo de deslocamento a partir do domicílio 49 Minutos 39 29 20 10 0 Trabalho Unidade de policiamento Unidade de saúde Domicílio sem catador Escola/Creche Domicílio com catador Transporte público Total Fonte: IETS. Pesquisa em Jardim Gramacho, Duque de Caxias - RJ A análise da mobilidade dos moradores de Jardim Gramacho para ir e voltar do trabalhado diariamente leva em conta, primeiramente, se há, dentre os entrevistados, pessoas que trabalham fora do bairro. Neste sentido, em metade dos domicílios do bairro tem pelo menos um morador que trabalha fora de Jardim Gramacho. A média geral de deslocamento diário entre a casa e o trabalho dos moradores deste território é de quase 1 hora e meia, considerando ida e volta. Contudo, estes números são bastante diferentes se os domicílios forem diferenciados de acordo com a presença de catadores de materiais recicláveis. Primeiramente, apenas 8% dos domicílios com catadores têm moradores que trabalham fora do bairro, enquanto este número representa 68% dos domicílios sem catadores. Além disso, nos domicílios com catadores, o tempo de deslocamento para o trabalho é cerca de 20 minutos mais rápido do que nos domicílios sem catadores – o que pode ser explicado pela proximidade das residências dos catadores ao AMJG, onde a grande maioria trabalha. Em relação ao meio de transporte utilizado, 40,7% dos respondentes vão de ônibus e 34% vão a pé para o trabalho em Jardim Gramacho. No entanto, há uma grande diferença Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _63 entre os domicílios com e sem catadores de materiais recicláveis: enquanto em 58% dos primeiros o respondente vai trabalhar a pé, esse percentual equivale a 18,5% entre o segundo grupo. O inverso ocorre em relação ao ônibus: apenas 4,8% dos domicílios com catadores utiliza este meio de transporte, enquanto 32,9% dos entrevistados em domicílios sem catadores vão trabalhar de ônibus. Destaca-se a carona (muito provavelmente em caminhões de lixo), que aparece como meio de transporte de 11% dos respondentes que vivem em domicílios com catadores. Com base nestes dados, pode-se afirmar que o encerramento do AMJG terá um grande impacto na escolha de transporte de cerca de 70% dos catadores que vão, atualmente, a pé ou de carona para o trabalho. Este impacto pode ser, em muitos casos, também financeiro, tendo em vista o baixo custo dos meios de transporte referidos. Por isso, melhorias nas linhas de ônibus, como uma maior frequência de veículos, a criação de novos trajetos e uma maior abrangência e capilaridade em áreas dentro do bairro nos itinerários existentes, que já são demandadas pelos moradores, passarão a ser importantes para viabilizar a integração dos catadores no mercado formal de trabalho. No entanto, précondição para estas melhorias é a possibilidade do acesso de veículos nas vias mais afastadas das principais avenidas. Gráfico 9: Meios de transporte utilizados no deslocamento domicílio-trabalho 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% A pé Carona Domicílio sem catador Fonte: IETS. Pesquisa em Jardim Gramacho, Duque de Caxias - RJ (IETS/Overview), 2010. Ônibus Domicílio com catador Bicicleta Automóvel próprio Total Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _64 4.3 Acesso a serviços básicos A existência de infraestrutura urbana básica é intrínseca à qualidade de vida dos moradores de qualquer bairro. Em Jardim Gramacho, a pesquisa irá mostrar que esta infraestrutura está muito aquém dos padrões da Região Metropolitana do Rio de Janeiro (RMRJ). Os dados a seguir, portanto, reforçam o quadro de que há um maior déficit de serviços e infraestruturas básicas nos domicílios com catadores do que no restante do bairro. Certos serviços essenciais, tais como o abastecimento de água, têm cobertura quase universalizada na Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Enquanto na RMRJ 99,1% dos domicílios possuem água canalizada, apenas metade dos domicílios em Jardim Gramacho tem acesso à rede geral e canalização, sendo que destes, cerca de 5% a rede geral abastece apenas a propriedade ou terreno (fora da casa). No levantamento, os diagnósticos analisados indicavam que o acesso à água por rede oficial era de 77% nas residências do bairro, o que se provou otimista. De fato, dentre os domicílios abastecidos, somente 4% é abastecido diariamente; a maior parte (56%), é abastecida 2 ou 3 vezes por semana. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _65 Gráfico 10: Abastecimento de água nos domicílios de Jardim Gramacho Rede não oficial Rede geral só na propriedade Bica comunitária Outro Poço/nascente Rede geral na residência 0% 5% 10% 15% Total 20% 25% 30% Domicílio com catador 35% 40% Domicílio sem catador 45% 50% Fonte: IETS. Pesquisa em Jardim Gramacho, Duque de Caxias - RJ (IETS/Overview), 2010. Pouco menos de 1/3 dos domicílios em Jardim Gramacho é abastecido via poço ou nascente, o que aponta para a qualidade da água como um determinante para as condições de saúde dos moradores do bairro. Conforme se tem mostrado, as condições de saneamento básico são consideravelmente piores nos domicílios com catadores de materiais recicláveis do que nos domicílios sem catadores. Apenas 38,2% destes domicílios são atendidos por rede geral de abastecimento de água e 23% deles utilizam bica comunitária. No bairro de Jardim Gramacho, em 74,6% dos domicílios com banheiro o escoadouro é feito via rede geral coletora de esgotos. Novamente, este número está bem abaixo da RMRJ, onde este percentual é de 91,5%. De resto, 7,2% dos domicílios possuem fossa, metade séptica e metade rudimentar, 6,4% das residências faz o escoamento em vala a céu aberto e 4,9% escoa diretamente em rio, lago ou mar. Assim, em pelo menos 15% dos domicílios de Jardim Gramacho o escoamento é feito de forma inadequada. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _66 Tabela 7: Escoamento sanitário nos domicílios de Jardim Gramacho Domicílio sem catador Domicílio com catador Total Rede geral 81,6% 27,5% 74,6% Rede pluvial 1,5% 3,9% 1,8% Fossa séptica 3,0% 7,3% 3,6% Fossa rudimentar 2,6% 10,2% 3,6% Vala a céu aberto 3,8% 24,4% 6,4% Rio, lago ou mar 3,4% 15,5% 4,9% Outra forma 4,1% 11,2% 5,0% Fonte: IETS. Pes qui s a em Ja rdi m Gra ma cho, Duque de Ca xi a s - RJ (IETS/Overvi ew), 2010. Entre os domicílios com catadores de materiais recicláveis, 7,5% não tem banheiro. Este número representa cerca de 65 domicílios e uma média de 250 pessoas, de um universo de 841 domicílios em que moram 3.590 pessoas (catadores e seus familiares). Como pode ser observado na Tabela 7, a diferença em acesso à rede geral coletora de esgotos, entre domicílios com catadores e o restante, é enorme. A rede oficial chega a pouco mais de ¼ dos domicílios com catadores de materiais recicláveis enquanto mais de 80% do restante do bairro é atendido por este serviço. Em aproximadamente 40% dos domicílios com catadores, o escoamento sanitário é feito via vala a céu aberto ou despejado em rio, lago ou mar, expondo estes moradores a uma série de elementos prejudiciais à saúde. Certos aspectos do problema relativo ao escoamento pluvial estão relacionados ao relevo de Jardim Gramacho. Como parte da Baixada Fluminense e com sua localização muito próxima à Baía de Guanabara, o bairro é bastante propenso a alagamentos nas épocas de chuvas e maré cheia. O percentual de entrevistados que respondeu haver alagamentos em seu domicílio normalmente quando chove chega a 26,1%. Além disso, 21,5% dos respondentes declararam Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _67 haver inundações em seus lotes e 12,7% em suas residências. Em particular, os domicílios com catadores estão mais expostos a enchentes, como pode ser visto no gráfico abaixo. Gráfico 11: Escoamento pluvial nos domicílios de Jardim Gramacho 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% Ocorrência de alagamentos próximo a residência Ocorrência de inundações no lote Domicílio sem catador Domicílio com catador Ocorrência de inundações na residência Total Fonte: IETS. Pesquisa em Jardim Gramacho, Duque de Caxias - RJ (IETS/Overview), 2010. Além de muitos domicílios estarem suscetíveis a inundações, alguns estão também vulneráveis a deslizamentos: 30% dos domicílios estão em terrenos inclinados e há deslizamentos próximos a 17,3% das residências quando chove. Em 88,5% dos domicílios em Jardim Gramacho, o lixo é coletado direta (83,2%) ou indiretamente (5,3%) pelo serviço de limpeza. Estes números são compatíveis às estimativas identificadas pelo levantamento em outros diagnósticos anteriores a este. Embora seja o serviço essencial com melhor cobertura no bairro, seu alcance ainda está abaixo da média na RMRJ, aonde chega a 99,1% dos domicílios. Ademais, é um contrassenso a coleta não chegar a todos os domicílios do bairro onde está justamente localizado o maior aterro do Estado, o AMJG. Em 89,4% dos domicílios de Jardim Gramacho em que há coleta, o lixo é coletado 3 vezes por semana. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _68 Tabela 8: Destino do lixo nos domicílios de Jardim Gramacho Domicílio sem catador Domicílio com catador Total Coletado diretamente 88,2% 52,3% 83,2% Coletado indiretamente 5,1% 6,5% 5,3% Queimado/enterrado 4,8% 30,4% 8,3% Jogado em terreno baldio/logradouro 1,2% 4,2% 1,6% Jogado em rio, lago ou mar 0,4% 1,9% 0,6% Outro destino 0,4% 4,6% 1,0% Fonte: IETS. Pes qui s a em Ja rdi m Gra ma cho, Duque de Ca xi a s - RJ (IETS/Overvi ew), 2010. Nos domicílios com catadores, em apenas 68,8% o lixo é coletado direta ou indiretamente. O restante dos domicílios não atendidos por este serviço opta, em 30,4% dos casos, por queimar ou enterrar seu lixo (práticas consideradas muito nocivas à qualidade do ar, solo e água), percentual que equivale a 8,3% do total dos domicílios de Jardim Gramacho. Em relação ao combustível usado para a alimentação, 95,4% dos domicílios utilizam gás de botijão para cozinhar e quase 80% compra o gás com um distribuidor a domicílio. No bairro de Jardim Gramacho, 74% dos domicílios estão localizados em vias que possuem iluminação pública. A escuridão nas vias públicas é ainda maior nos domicílios com catadores de materiais recicláveis: somente 36,4% contam com iluminação na rua/beco/viela onde estão situados, enquanto esta cobertura é de 80,2% no restante dos domicílios sem catadores. Quanto ao fornecimento de energia elétrica às residências, apenas 71,1% dos domicílios em Jardim Gramacho têm acesso à rede elétrica oficial. Nas residências com catadores, esta porcentagem cai drasticamente para 23% (menos de ¼). O alto percentual destes domicílios que têm sua energia elétrica proveniente de outras fontes aponta para a possível existência de canais de fornecimento informais e ilegais. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _69 Gráfico 12: Acesso à energia elétrica nos domicílios de Jardim Gramacho Total 71% 17% 10% 1,0% Domicílio com catador 23% 22% 54% 1,9% Domicílio sem catador 79% 9% 11% 0,9% 0% 20% 40% Oficial Compartilhada 60% Outra 80% 100% Não tem Fonte: IETS. Pesquisa em Jardim Gramacho, Duque de Caxias - RJ (IETS/Overview), 2010. O acesso a serviços essenciais, como abastecimento de água e de luz elétrica e saneamento básico, é fundamental para que se possa viver com dignidade e qualidade. Em Jardim Gramacho, um determinado grupo de moradores – os catadores de materiais recicláveis – têm acesso restrito a estes serviços, enquanto os demais moradores, cujo acesso é mais amplo, continuam aquém dos padrões da Região Metropolitana em que se inserem. Sendo assim, os catadores de materiais recicláveis, que vivem, sobretudo, nas ocupações recentes do bairro, devem ter seu acesso a estes serviços assegurado, além de condições habitacionais adequadas. Para que isso seja possível, é necessário determinar quais assentamentos estão consolidados, para que recebam investimentos habitacionais e infraestruturais, e quais ainda são demasiadamente precários, para que sejam removidos e realocados pra locais apropriados. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _70 4.4 Acesso às tecnologias de informação e comunicação (TICs) O acesso às tecnologias de informação e comunicação (TICs), como o telefone fixo, o celular, o computador e a internet, é aspecto determinante para a geração de trabalho e renda. Quanto maior for este acesso, mais próximos estarão os moradores e catadores do bairro a postos de trabalho de qualidade. Ademais, o acesso às TICs é essencial para fomentar o empreendedorismo, a educação e o desenvolvimento geral do bairro. Nos domicílios de Jardim Gramacho, o alcance do telefone público, ou “orelhão”, é baixo (35%) quando comparado ao telefone particular – 54% dos domicílios do bairro têm telefone fixo e 68,3% têm celular (86,5% deles pré-pagos). Gráfico 14 : Posse de TICs nos domicílios de Jardim Gramacho 70% 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% Celular pré-pago Telefone fixo Computador sem internet Domicílio sem catador Tv a cabo Computador com Celular pós-pago internet Domicílio com catador Total Fonte: IETS. Pesquisa em Jardim Gramacho, Duque de Caxias - RJ (IETS/Overview), 2010. Em consonância com a tendência de alta penetração de celulares pré-pagos nas populações de baixa renda, a posse deste tipo de aparelho nos domicílios com catadores fica próxima da observada nas residências sem catadores e no bairro como um todo e ultrapassa metade dos domicílios. Com efeito, à exceção dos celulares pré-pagos, o acesso às TICs é consideravelmente menor nos domicílios com catadores de materiais recicláveis, como fica claro no gráfico abaixo. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _71 Apenas 30,3% dos domicílios em Jardim Gramacho têm computador e só 11% dos domicílios têm acesso à internet. Estes percentuais são mais altos na RMRJ e equivalem a 45,6% e 38,7%, respectivamente. Em relação aos computadores, com ou sem internet, os domicílios com catadores têm acesso muito mais restrito do que o restante dos domicílios do bairro. O mesmo acontece com a TV a cabo. 4.5 Vitimização A segurança pública em Jardim Gramacho é um tema delicado, e, por isso, de extrema importância. Como mencionado anteriormente, o levantamento não foi capaz de identificar nenhum posto de polícia no bairro, indício reforçado nesta pesquisa pela distância significante (40 minutos) entre os domicílios do bairro e unidades de policiamento. A ausência do Poder Público no território abriu espaço para que formas de poder paralelo surgissem. Para identificar a força destes poderes paraestatais em Jardim Gramacho, foi feita uma análise de vitimização junto aos moradores do bairro. A partir da Tabela 10, é possível notar que roubos e furtos são os eventos de risco a que os domicílios de Jardim Gramacho estão mais expostos, seguidos de ameaças, agressões físicas e violência doméstica. No entanto, o que chama atenção nestes dados é a maior incidência de situações de risco nos domicílios com catadores de materiais recicláveis do que no restante dos domicílios do bairro. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _72 Tabela 10 : Incidência* de eventos de risco nos domicílios de Jardim Gramacho Domicílio sem catador Domicílio com catador Total Algum bem furtado 8.3% 15.5% 9.3% Algum bem roubado 6.9% 11.1% 7.5% Casa invadida por assaltantes/ bandidos 3.8% 5.2% 4.0% Sofreu alguma forma de ameaça 2.1% 8.9% 3.0% Sofreu alguma forma de agressão física 1.2% 4.8% 1.7% Foi vítima de violência doméstica 0.9% 4.4% 1.4% Foi ferido por algum outro tipo de arma 0.2% 0.4% 0.3% Alguém disparou uma arma de fogo contra alguma pessoa do domicílio e causou ferimento 0.1% 0.7% 0.2% Alguém foi ferido por bala "perdida" 0.2% 0.0% 0.2% Alguém disparou uma arma de fogo contra alguma pessoa do domicílio causando morte 0.1% 0.4% 0.2% Alguém foi morto por bala "perdida" 0.1% 0.0% 0.1% Alguém do domicílio foi morto por algum outro tipo de arma 0.1% 0.0% 0.1% Fonte: IETS. Pesquisa em Jardim Gramacho, Duque de Caxias - RJ (IETS/Overview), 2010. *Nota: nos últimos 12 meses. Em apenas 24,2% dos casos a polícia foi chamada, mas entre domicílios com catadores este percentual é mais baixo (12,1%) do que entre domicílios em que não há catadores (27,8%). Mais uma vez, a situação é mais desfavorável nos domicílios de catadores de materiais recicláveis. A porcentagem de casos em que foi registrada a ocorrência é ainda mais baixa: 20,3%; sendo 7,1% nos domicílios com catadores e 24,4% nos domicílios sem catadores. Quando os respondentes foram indagados sobre porque não chamaram a polícia e nem registraram a ocorrência, a resposta com maior representatividade (cerca de ¼ das declarações dos entrevistados) foi o medo de represália em ambos os casos. Contudo, entre os entrevistados que vivem em domicílios com catadores de material reciclável, esta Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _73 resposta teve quase o dobro da frequência do que a observada entre os respondentes que moram em domicílios sem catadores. Estes últimos declaram que “não era importante” ou “não fazia diferença” com mais frequência do que o medo de represália. Estas duas respostas também têm grande representatividade quando considerados os respondentes de todos os domicílios de Jardim Gramacho, o que demonstra a falta de credibilidade da polícia e de seus instrumentos para resolver as situações de risco no bairro. De fato, segundo os entrevistados, apenas ¼ dos casos foram completamente resolvidos. Ainda assim, somente 29% dos respondentes que moram em domicílios sem catadores e 35% dos que vivem em residências de catadores de materiais recicláveis disseram se sentir muito inseguros ou inseguros no bairro. 4.6 Educação Conhecer o nível de escolaridade dos habitantes de Jardim Gramacho é indispensável para uma reflexão mais fundamentada sobre as possibilidades de reinserção no mercado de trabalho de trabalho de pessoas cuja atividade econômica principal está direta ou indiretamente relacionada à catação após a desativação do AMJG. Além disso, uma análise direcionada aos moradores que estão estudando, sejam eles crianças, adolescentes (a maioria) ou adultos, fornece uma ideia do nível de qualificação da força de trabalho que estará disponível para as atividades econômicas que se planeja fomentar no bairro. Primeiramente, a taxa de analfabetismo em Jardim Gramacho é de 9,6%, o triplo da verificada na RMRJ. Contudo, este percentual é de 7,7% para moradores que não catam, mas corresponde a 23,2% dos catadores, ou seja, quase ¼ deles. A situação se agrava quando o analfabetismo funcional (pessoas com menos de 4 anos de estudo) é considerado: este abrange 22,6% dos moradores de Jardim Gramacho – 20% dos moradores que não catam e 41,2% dos catadores de materiais recicláveis. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _74 O Gráfico 15 ilustra a distribuição educacional das pessoas com 25 anos ou mais que vivem em Jardim Gramacho: 27,6% dos moradores têm menos de 4 anos de estudo, 1/3 (o grupo mais representativo) tem de 4 a 7 anos de estudo e 20% têm 11 anos de estudo, o que corresponde ao Ensino Médio completo. Apenas 3% das pessoas têm pelo menos 12 anos de estudo: metade com o Ensino Superior incompleto e metade com o Ensino Superior completo ou mais. Novamente, Jardim Gramacho está aquém dos níveis da RMRJ, que, em termos educacionais tem percentuais muito mais altos de escolaridade. Assim, a porcentagem de pessoas com o Ensino Médio completo ou um nível de instrução mais alto é de 47,7% na RMRJ, um pouco mais que o dobro da observada em Jardim Gramacho. Portanto, as pessoas com o Ensino Básico completo formam o grupo mais representativo na região metropolitana (27,6%), ao passo que chega a 20% o percentual de pessoas com pelo menos 12 anos de estudo, sendo 15% com o Ensino Superior ou mais. Gráfico 15 : Distribuição educacional da população adulta* de Jardim Gramacho Total 9% Catador 18% 33% 20% 17% 30% 20% 39% 3% 8% 3% 0.4% Não catador 8% 0% 16% 10% 0 anos 32% 20% 30% 1 a 3 anos 40% 4 a 7 anos 18% 50% 60% 8 a 10 anos 22% 70% 11 anos 80% 3% 90% 100% 12 anos ou mais Fonte: IETS. Pesquisa em Jardim Gramacho, Duque de Caxias - RJ (IETS/Overview), 2010. *Nota: pessoas de 25 anos ou mais. De acordo com o gráfico, o nível educacional dos catadores de materiais recicláveis é bastante inferior ao do restante dos moradores do bairro: metade dos catadores tem menos de 4 anos de estudo (dos quais 20% nunca estudou), o dobro do percentual referente aos demais moradores. O padrão de maior escolaridade dentre os moradores que não catam é Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _75 constante em todos os níveis educacionais. Enquanto 22% destes completaram o Ensino Médio, somente 3% dos catadores completaram esta fase do Ensino Básico. Assim, a escolaridade média da população adulta do bairro é de 6,2 anos – indicador que equivale a 8,6 na RMRJ, um pouco mais que os antigos 8 anos do Ensino Fundamental completo. Como anteriormente, constata-se uma diferença significativa na escolaridade média, medida por anos de estudo, entre moradores que não catam e catadores: enquanto os primeiros têm uma média de 6,7 anos, os catadores têm 4 (menos que o primeiro ciclo do Fundamental). Entretanto, pode-se esperar alguma melhora no perfil educacional da população de Jardim Gramacho, visto que em faixas etárias mais jovens a escolaridade média já atingiu ou ultrapassou aquela constatada entre os adultos (pessoas com 25 anos ou mais). Os adolescentes de 15 a 18 anos já possuem os 6,2 anos de estudo da população adulta e os jovens de 19 a 24 anos já estudaram uma média de 8,1 anos. Essa evolução é observada tanto entre moradores que não catam quanto entre catadores, sendo, porém, mais intensa dentre os primeiros; enquanto a distância entre a escolaridade média dos jovens e de adultos é de 2,4 anos nos domicílios sem catadores, ela corresponde 1,1 anos nas residências de catadores. Este avanço no número médio de anos de estudo dos moradores de Jardim Gramacho se deve, em grande parte, à frequência de crianças e adolescentes de 7 a 18 anos a escola, em especial do grupo de até 14 anos. Conforme ilustra o gráfico abaixo, 89% das crianças de 7 a 14 anos em Jardim Gramacho frequentam a escola, porcentagem não tão abaixo da verificada na RMRJ (96,4%). A frequência à escola cai para 67% entre os adolescentes de 15 a 18 anos, para apenas 10% entre os jovens (19 a 24 anos), e para 6% entre os adultos (25 anos ou mais). Por outro lado, pouco mais de 1/3 das crianças de 0 a 6 anos frequentam a creche ou escola, o que representa um obstáculo para que os pais que trabalham. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _76 Gráfico 16 : Frequência a creche ou escola por faixa etária em Jardim Gramacho 100% 90% 80% 70% 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% 0 a 6 anos 7 a 14 anos 15 a 18 anos Domicílio sem catador 19 a 24 anos Domicílio com catador 25 anos ou mais Total Fonte: IETS. Pesquisa em Jardim Gramacho, Duque de Caxias - RJ (IETS/Overview), 2010. As informações descritas no parágrafo anterior, obtidas através da aplicação do questionário socioeconômico, coincidem com as relatadas no levantamento realizado no âmbito deste projeto. Neste levantamento, foi indicado que há oferta insuficiente de matrículas em creches, o que faz com que parte delas seja suprida por estabelecimentos extraoficiais de ensino infantil. Conforme a contagem feita para esta pesquisa, existem 1.229 crianças entre 0 e 4 anos em Jardim Gramacho. No entanto, o levantamento indicou que, segundo o INEP, há apenas dois estabelecimentos oficiais nos quais constam 128 matrículas em creches. O gráfico acima também mostra que a frequência à escola, em todas as faixas etárias, é menor dentre os domicílios com catadores do que nas demais residências do bairro.18 Em geral, o número de crianças e adolescentes matriculados nas escolas que vivem em domicílios com catadores é menor do que entre as demais crianças e adolescentes do bairro. Além disso, nota-se que a maior diferença entre domicílios com e sem catadores em frequência escolar é no grupo de 15 a 18 anos, idade em que muitos adolescentes 18 É importante ressaltar que o número de catadores de materiais recicláveis que frequentam a escola é irrisório, o que impediu que a análise da frequência a escola e do funcionamento escolar fosse desenvolvida comparando este grupo com os não catadores. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _77 abandonam os estudos para trabalhar e ajudar em casa. Este dado é reforçado pela idade média mais baixa dos catadores em comparação com os moradores que não catam. No bairro de Jardim Gramacho, 80% das pessoas que estudam afirmaram que frequentam sempre a escola. No entanto, outro aspecto que contribui para que o nível de educação dentre os domiciliados com catadores seja mais baixo do que o dos demais moradores é a quantidade de faltas às aulas dentre as pessoas que frequentam a escola. Dos moradores de domicílios com catadores, 35% declararam faltar às aulas, mais que o triplo dos 10,3% aferido nos domicílios sem catadores. Menos de 1/3 dos estudantes do bairro estudam em escolas que funcionaram todos os dias no mês de referência da pesquisa. A frequência do não funcionamento escolar (número de vezes que as escolas em que os moradores de Jardim Gramacho estudam não funcionaram) também é maior entre os domicílios com catadores do que entre os domicílios sem catadores de materiais recicláveis. Gráfico 17 : Frequência do não funcionamento escolar* em Jardim Gramacho Total 31% Domicílio com catador 32% Domicílio sem catador 31% 0% 20% Nenhuma 23% 17% 25% 40% Até 2 vezes 30% 16% 24% 27% 32% 60% De 3 a 5 vezes 12% 80% 100% 6 vezes ou mais Fonte: IETS. Pesquisa em Jardim Gramacho, Duque de Caxias - RJ (IETS/Overview), 2010. *Nota: no mês de referência da Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _78 Tabela 11 : Principal motivo para o não funcionamento escolar Domicílio sem catador Domicílio com catador Total Razões adminstrativas 67.2% 37.9% 58.7% Professor Faltou 15.4% 32.9% 20.5% Greve 2.1% 7.7% 3.7% Problemas de infraestrutura 2.8% 4.6% 3.3% Violência na vizinhança da comunidade 0.0% 6.1% 1.8% Evento natural 1.1% 3.1% 1.7% Violência na vizinhança da escola 1.3% 0.5% 1.1% Outros 10.2% 7.2% 9.3% Fonte: IETS. Pes qui s a em Ja rdi m Gra ma cho, Duque de Ca xi a s - RJ (IETS/Overvi ew), 2010. Os principais motivos para que a escola não funcionasse são razões administrativas da rotina escolar e ausência do professor, apontados em 58,7% e 20,5% dos casos, respectivamente. Nos domicílios sem catadores de materiais recicláveis, na maior parte dos casos (67,2%) o não funcionamento se deu por conta de razões administrativas. Já nos domicílios com catadores, outras justificativas tais como greve, problemas graves de infraestrutura e, especialmente, violência na vizinhança da escola ou comunidade (6,6% dos casos frente a 1,3% nos domicílios sem catadores de materiais recicláveis), aparecem com maior representatividade. A análise do fluxo educacional pela taxa de distorção série-idade (porcentagem de alunos cursando determinado ciclo educacional com idade 2 anos acima da adequada naquele segmento) mostra que cerca de 1/3 dos alunos do primeiro ciclo do Ensino Fundamental estão atrasados, percentual ligeiramente mais alto no segundo ciclo do EF (35%) e no Ensino Médio (36%). Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _79 Se considerada a taxa de distorção série-idade ótima por segmento (são calculados os atrasos em cada série, posteriormente agrupados por ciclo educacional), nota-se que mais da metade dos alunos têm idade acima da adequada no primeiro e segundo ciclo do Ensino Fundamental e no Ensino Médio. Tabela 12 : Taxas de distorção série-idade em Jardim Gramacho Domicílio sem Domicílio com catador catador Total Taxa de distorção série-idade Do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental 28.3% 41.4% 32.9% Do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental 33.7% 41.3% 34.9% Do Ensino Médio 35.4% 40.9% 36.0% Do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental 46.5% 62.8% 52.3% Do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental 53.6% 67.3% 55.7% Do Ensino Médio 52.8% 51.2% 52.6% Taxa de distorção série-idade ótima Fonte: IETS. Pes qui s a em Ja rdi m Gra ma cho, Duque de Ca xi a s - RJ (IETS/Overvi ew), 2010. As taxas de distorção série-idade são mais altas nos domicílios com catadores de materiais recicláveis nos três segmentos de ensino considerados. Ou seja, ainda há muito que se avançar em matéria de educação em Jardim Gramacho, especialmente tendo em conta a necessidade de desenvolver novas atividades econômicas no bairro após a desativação do AMJG. Esta tarefa se mostra extremamente desafiadora dado o baixo nível educacional dos moradores em geral e, particularmente, dos catadores de materiais recicláveis, cuja escolaridade chega a ser nenhuma em 20% dos casos. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _80 4.7 Renda, Pobreza e Desigualdade O bairro de Gramacho possui uma renda domiciliar per capita de R$ 370 reais mensais, que representa apenas 40% da renda média da RMRJ. Logicamente, a baixa renda domiciliar per capita está associada a um alto percentual de pobres. Portanto, cerca de 43% da população do bairro esta situada abaixo da linha de pobreza e 16,4%, abaixo da linha de extrema pobreza (o triplo do percentual de indigência da região metropolitana).19 Esses percentuais representam cerca de 5,8 mil pessoas pobres e 2,1 mil pessoas extremamente pobres em Jardim Gramacho. Assim, estima-se que para eliminar a pobreza neste bairro seriam necessários R$ 7,3 milhões de reais anuais e para eliminar a extrema pobreza, R$ 1,56 milhões. Para os padrões da RMRJ, a desigualdade de renda entre os moradores de Jardim Gramacho é baixa. O Coeficiente de Gini, que mede a desigualdade de 0 a 1, é de 0,44 em Jardim Gramacho, bem mais baixo do que os 0,56 da média metropolitana. Isto quer dizer que há menos desigualdade de renda no bairro do que na RMRJ. No entanto, a renda média do bairro é muito baixa, ou seja, em Jardim Gramacho há certa igualdade na pobreza de seus habitantes. Como mencionado anteriormente, cerca de um quarto dos domicílios possuem pelo menos um catador e a renda domiciliar per capita desses domicílios é 21% inferior a dos demais domicílios do bairro. Assim, metade dos domicílios com catadores são considerados pobres pela definição utilizada, enquanto entre os domicílios sem catadores esse percentual é de 40%. A pobreza extrema corresponde a 18% dos domicílios com catadores e 14,4% dos domicílios sem catadores. Em média, nos domicílios com catadores 65% da renda domiciliar per capita vem da catação de materiais recicláveis, o que torna esta atividade muito importante no bairro, sobretudo para as famílias mais pobres. 19 Linha de indigência igual a R$ 118.10 e linha de pobreza igual a R$ 236,20 (em reais (R$) de outubro/2010 - IBGE-IPEACEPAL). Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _81 Com a retirada desta renda, o impacto sobre o bem estar das famílias dos catadores será elevado, tendo em vista que implicará: a redução da renda domiciliar per capita a um terço; o aumento do percentual de pobres de 50% para 87%; e dentre estes, a elevação da extrema pobreza será de 18% para 68%. Em termos de quantidade, este aumento da pobreza representará mais 1.342 pessoas pobres e 1.805 extremamente pobres, conforme mostram os gráficos a seguir. Assim, com o aterro funcionando, são 1.771 pessoas em situação de pobreza: 1.126 que vivem com rendas domiciliares per capita entre R$ 236 e R$ 118 reais (linha da pobreza) e 645 que vivem com até R$ 118 reais per capita mensais (linha da extrema pobreza). Com o fechamento, o número de pessoas em situação de pobreza aumentará para 3.113, dos quais 662 serão considerados pobres e 2.451, extremamente pobres. Devido a esta situação grave, os catadores de materiais recicláveis serão o principal público alvo para ações voltadas à geração de trabalho e renda. No entanto, serão necessárias medidas emergenciais de complementação de renda para minimizar o impacto do fechamento do aterro, que levará estes domicílios a perderem, em média, 65% da sua renda. Assim, a alternativa mais direta é contemplá-los com políticas de transferência de renda como o Programa Bolsa Família, que já atende 12.431 domicílios (21,4%) em Jardim Gramacho. Dos domicílios sem catadores, o percentual que é beneficiado é de 19,5%, enquanto cerca de 1/3 dos domicílios com catadores recebem este benefício. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _82 Gráfico 18 : Abrangência do Programa Bolsa Família 50 40 30 % 20 32.5 10 21.4 19.5 0 sem catador com catador total Fonte: IETS. Pesquisa em Jardim Gramacho (IETS/Overview), 2010. Percebe-se, no entanto, uma má focalização do programa no bairro, uma vez que quase dois terços dos domicílios que recebem o Bolsa Família não atendem aos critérios do programa e, portanto, não deveriam receber o benefício. Adotando o critério de elegibilidade, o programa só tem atuado em 12% dos domicílios com catador e 7% dos domicílios sem catador que deveriam estar recebendo a bolsa. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _83 Gráfico 19 : Abrangência do Programa Bolsa Família 100 porcentagem(%) 80 53.21 66.4 68.6 60 40 14.34 11.87 20 0 12.22 20.38 13.51 12.36 7.17 12.08 7.87 Sem Catador Com Catador Total Recebe BF e deveria receber Não recebe BF e deveria receber Recebe BF e não deveria receber Não recebe BF e não deveria receber Fonte: IETS. Pesquisa em Jardim Gramacho, Duque de Caxias - RJ (IETS/Overview), 2010. Se o programa estivesse contemplando todas as famílias de fato elegíveis, deveria estar presente em 19% dos domicílios sem catador, que, apesar de ser o mesmo percentual de domicílios que recebem a bolsa atualmente, não seriam os mesmo domicílios beneficiados. No caso dos domicílios com catador, o programa deveria estar contemplando apenas 28% dos domicílios que são de fato elegíveis. Hoje, o programa atende 32% dos domicílios com catadores, mas 20% não deveriam estar recebendo esta bolsa, ao passo de que 14,3% deveriam estar recebendo, mas não estão. Em outras palavras, para beneficiar todas as famílias que se enquadram no programa Bolsa Família bastaria fazer um remanejamento da distribuição das bolsas em Jardim Gramacho de maneira a atender as famílias que de fato seguem os critérios do programa. Atualmente, devido à má alocação do programa, a retirada do Bolsa Família teria um efeito reduzido nos índices de pobreza de Jardim Gramacho. Com a perda deste benefício, o Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _84 percentual de pobres subiria apenas um ponto percentual e o de extremamente pobres 2,5 pontos percentuais. Portanto, para a definição de estratégias adequadas para a superação da pobreza é fundamental aferir, por exemplo, o que aconteceria se a perda da renda da catação fosse acompanhada da inclusão de todas as famílias de catadores elegíveis no programa Bolsa Família. Após o encerramento do aterro, com a perda da renda da catação, cerca de 70% das famílias dos catadores passariam a ser elegíveis para receber o Bolsa Família. No entanto, o valor da bolsa teria impacto reduzido sobre a pobreza e a extrema pobreza. O percentual de pobres passaria de 87% para 85% e de extremamente pobres reduziria apenas de 68% para 65%. Assim, para o alívio da pobreza em Jardim Gramacho após a desativação do aterro, além de encaminhar as famílias elegíveis para receber os benefícios do Programa Bolsa Família, é preciso criar uma forma de complementação de renda mais eficaz para compensar a perda da renda da catação junto às famílias que estão abaixo da linha de pobreza e às que passarão a ser pobres após o encerramento do AMJG. 4.9 Características do trabalho No universo de 13,7 mil moradores de Jardim Gramacho, a população economicamente ativa é de cerca de 6 mil pessoas, representando 54,5% da população com 10 anos ou mais. Esta taxa de atividade é próxima da média da Região Metropolitana (54% em Jan/11, segundo a PME/IBGE). Por outro lado, a taxa de desemprego dos moradores de Jardim Gramacho é extremamente baixa. Apenas 3,3% da população economicamente ativa está de fato procurando trabalho, sendo, portanto, uma taxa de desemprego mais baixa do que a da RMRJ (5,1% em Jan/11, segundo a PME/IBGE), que, por sua vez, é tida como uma região de baixo desemprego. Além disso, a jornada de trabalho média dos trabalhadores é a máxima permitida por lei (44 horas semanais). Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _85 Sabemos que boa parte da RMRJ é constituída por “cidades dormitórios” que abrigam a população que trabalha na cidade do Rio de Janeiro. Jardim Gramacho não parece ser uma exceção a esta regra, já que, em metade dos domicílios, há pelo menos um morador que trabalha fora do bairro. Apesar destes fatores, a qualidade dos postos de trabalho dos moradores de Jardim Gramacho é extremamente precária, seja pelos rendimentos aferidos, seja pela qualidade do vínculo de trabalho. A renda média do trabalho é de cerca de R$ 780 reais, o que equivale a menos da metade da renda média da RMRJ, segundo a pesquisa supracitada. No tocante às relações de trabalho, apenas 35% dos ocupados residentes em Jardim Gramacho possuem emprego com carteira de trabalho assinada, média bem mais baixa do que a da RMRJ (47%). Mais da metade dos ocupados (52,5%) estão em postos de trabalho considerados informais – emprego sem carteira assinada ou trabalho por conta própria – dando a esta forma de inserção uma participação relativa muito elevada no bairro. Os empregos informais, portanto, representam um percentual superior ao de emprego com carteira de trabalho assinada. Já a atividade empregadora é praticamente inexistente (apenas 1,2% dos ocupados). Representando 21% das ocupações em Jardim Gramacho, a atividade de coleta é predominantemente informal: mais de ¾ dos catadores são trabalhadores por conta própria e 9,4% são empregados sem carteira. Além disso, apenas 8% dos catadores são cooperativados e 3,4% são empregados com carteira de trabalho assinada. Em contraste, os ocupados com outras atividades que não a catação são, em grande parte, empregados com carteira de trabalho assinada (43%). A situação laboral dos moradores de Jardim Gramacho, e de certa forma a sua precariedade, sofre grande influência da atividade de catação de material reciclável no aterro. No bairro, cerca de 20% dos trabalhadores ocupados são catadores. A precariedade dos postos de trabalho dos catadores é percebida também pela motivação para a atividade: 73% começaram a catar porque não encontraram outro Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _86 emprego. No tocante à contribuição para a Previdência, apenas 6,3% dos catadores contribuem, enquanto quase metade do restante dos moradores do bairro está formalizada nesse aspecto. Enquanto apenas 8% dos domicílios com catadores têm alguma pessoa trabalhando fora do bairro, este percentual é de 58% nos domicílios sem catadores. Logicamente, o local de trabalho exerce impacto no tempo médio de deslocamento até ele. Sendo assim, o tempo médio de deslocamento para o trabalho dos moradores de Jardim Gramacho que não catam é de 46 minutos, enquanto o dos catadores é de 27 minutos. Esses dados indicam que os moradores que não exercem a catação trabalham, na sua maioria, em atividades fora do bairro, sendo o mais frequente o trabalho na área de comércio. Os ocupados com a catação de materiais recicláveis possuem um rendimento médio 28% inferior à média dos ocupados em outras atividades. A jornada de trabalho dos catadores também é inferior a jornada dos demais trabalhadores. Enquanto os catadores trabalham, em média, as 44 horas definidas pela CLT, os outros ocupados trabalham cerca de 45,7 horas por semana. Em 97% dos casos, a catação de material reciclável é o único trabalho dos catadores. Este dado é especialmente relevante para o planejamento acerca da reinserção destas pessoas no mercado formal de trabalho uma vez que o aterro fechar, aumentando a necessidade de capacitações e treinamentos. Por outro lado, se 65% da renda domiciliar das famílias dos catadores é proveniente desta atividade, e a maioria destes ocupados só trabalha com a catação, a baixa escolaridade e falta de treinamento e capacidade para outros empregos pode prolongar o efeito empobrecedor da desativação do AMJG. Além disso, apenas 8% dos catadores fizeram algum tipo de treinamento para a realização desta atividade. Percebe-se também um desconhecimento sobre os termos “catador de material reciclável” e “agente ambiental” de quase 70% deles. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _87 Tabela 13 : Indicadores de Mercado de Trabalho - 2011 Indicadores Não Catador Catador Total 45.7 44.0 45.2 Renda do Trabalho Principal (R$) 894.27 697.75 841.94 Renda do Trabalho (R$) 907.14 701.49 852.38 Jornada de trabalho (hora/ semana) Fonte: IETS. Pesquisa em Jardim Gramacho, Duque de Caxias - RJ (IETS/Overview), 2010. A atividade da catação se desenvolve em três turnos: manhã, tarde e noite. A maior parcela (40%) dos catadores trabalha manhã e tarde, mas há uma parte substancial que trabalha à noite (35,6%). O material mais coletado no aterro é plástico seguido de metal e papel/papelão. O material coletado tem vários destinos, mas em geral é vendido para distribuidor de material reciclável. Quase metade dos catadores aproveita material coletado nas suas residências, principalmente, eletrodomésticos. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _88 No tocante ao perfil dos catadores, 55% são homens, enquanto dentre os moradores que não catam este percentual é de 48,6%. Apesar do maior percentual de homens, nota-se que as mulheres também são relevantes na catação, especialmente porque dentre os domicílios de catadores, é alta a porcentagem de famílias monoparentais femininas (20%). Conforme já havia ficado claro nas pirâmides etárias, os catadores possuem idade média mais baixa, concentrando-se nas faixas etárias que abrangem dos 20 aos 29 anos de idade. Este pode ser um aspecto positivo, já que a juventude é uma vantagem em termos de treinamento e capacitação para a inserção no mercado formal de trabalho. Devido à implementação do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI) no território há alguns anos atrás, percebe-se que há poucos catadores na faixa etária entre 10 e 14 anos. Diante da eminência do fechamento do aterro e dada a nova legislação referente aos resíduos sólidos, a inserção dos catadores em novos mercados formais de trabalho, seja como empregado, seja como empreendedor, é de suma importância. A percepção sobre o encerramento do AMJG é, logicamente, mais positiva dentre os moradores do bairro que não catam material reciclável. Dentre os catadores e seus familiares, apenas 16% avalia a desativação do aterro como positiva. Mesmo com essa diferença, catadores e não catadores convergem no que diz respeito às medidas a serem tomadas para atenuar os impactos deste fechamento, como, por exemplo, a necessidade de implantação de novas empresas no território. Tratando-se do encerramento do AMJG, 63% dos catadores pretendem procurar emprego e somente 8% desejam mudar de bairro ou cidade e permanecer trabalhando como catador. As possibilidades de reconversão profissional dos catadores de material reciclável e inserção em outras atividades econômicas, entretanto, são limitadas pela baixa escolaridade, deficiência de transportes e escassez de atividades econômicas na região, entre outros aspectos a serem enfrentados pela estratégia de desenvolvimento local. No entanto, quando questionados acerca de capacitação profissional, 69% dos catadores Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _89 demonstraram interesse, mas a maior parte dispõe de menos de 10 horas semanais para as aulas/cursos. Nota-se um baixo nível de associativismo e pretensão em se associar entre os catadores. Apenas 15% dos catadores são associados a cooperativas, e apenas 6% pretendem se associar por conta do encerramento do AMJG. Ademais, o Movimento Nacional de Catadores de Materiais Recicláveis é conhecido por apenas 38,5% dos catadores. Gráfico 21 : Planos futuros dos catadores para após o encerramento do AMJG – 2011 Aposentar ou viver de transferências do governo (Bolsa Família, etc.) 4% Outros 9% Mudar 8% Buscar associação com outros catadores em cooperativas 6% Abrir negócio 6% Procurar emprego 67% Fonte: IETS. Pesquisa em Jardim Gramacho (IETS/Overview), 2010. Mês de referência: outubro de 2010. 4.7 Condições e serviços de saúde A saúde dos moradores de Gramacho é bastante afetada pela carência de infraestrutura básica no bairro. Do lado da demanda (condições de saúde), ocorre a Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _90 disseminação de doenças devido às más condições sanitárias e, possivelmente, pela poluição do ar, água e solo causada pelo AMJG. Já pela perspectiva da oferta, ainda há insuficiência de serviços de saúde de qualidade, como a inexistência de uma unidade 24 horas e a distância relativamente grande (em tempo) até os hospitais mais próximos. Desde a sua criação, a importância do Programa Saúde da Família (PSF) tem sido crescente no atendimento básico à saúde no Brasil. Entretanto, os indicadores de cobertura no Estado do Rio de Janeiro costumam ser baixos (19,2% segundo o suplemento especial da PNAD 2008). Este padrão não se aplica a Jardim Gramacho, visto que 55,6% dos domicílios do bairro utilizam os serviços do PSF, seja frequentando o posto de saúde do PSF ou recebendo visitas dos Agentes Comunitários de Saúde (ACS). A cobertura do PSF é ligeiramente maior entre os domicílios com catadores de materiais recicláveis (60,4%) do que nos domicílios sem catadores (54,8%). Dos usuários do programa, 2/3 usam o PSF mensalmente, o que parece coincidir justamente com o calendário de visitas dos ACS. No entanto, os hospitais públicos seguem sendo os principais pontos de procura por serviços de saúde entre a população de Jardim Gramacho. Este fato explicaria o alto tempo de deslocamento até a unidade de saúde mais próxima declarado pelos entrevistados na pesquisa (em média 28 minutos). Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _91 Gráfico 22 : Uso de serviços médicos* em Jardim Gramacho 50% 40% 30% 20% 10% 0% Consulta marcada Emergência Exames laboratoriais Domicílio sem catador Exames de imagem Internação Cirurgia Domicílio com catador Visita em casa Total Fonte: IETS. Pesquisa em Jardim Gramacho, Duque de Caxias - RJ (IETS/Overview), 2010. *Nota: nos últimos 12 meses. Parte do motivo pelo qual os moradores de Jardim Gramacho buscam com maior frequência os hospitais é porque os serviços médicos mais requisitados são consultas marcadas, emergência e exames laboratoriais e de imagem. Todavia, enquanto nos domicílios com catadores de materiais recicláveis os serviços de emergência são os mais procurados, nos demais domicílios as consultas marcadas têm maior demanda, refletindo diferenças não apenas nas condições, mas também no trato da saúde. Com relação à espera e qualidade do atendimento, 16,8% dos moradores não foram atendidos no mesmo dia em que procuraram algum serviço de saúde. Em aproximadamente 1/3 dos casos em que não houve atendimento, o motivo foi a falta de médico; em 20%, os usuários foram orientados a voltar outro dia; em 10,7%, houve desistência devido à demora. Contudo, a avaliação do serviço prestado é positiva: quase 70% dos respondentes consideram o atendimento recebido bom ou muito bom. No entanto, deve-se ter em conta que esta avaliação é influenciada pelo padrão de serviços outrora oferecidos e às expectativas dos entrevistados para estes serviços públicos. Voltando o olhar para as condições de saúde da população de Jardim Gramacho, nota-se uma alta incidência nos domicílios de doenças fortemente relacionadas às péssimas Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _92 condições habitacionais e do meio ambiente, tais como dengue (16,6%), asma/bronquite (14,6%) e diarréia (12,2%). Estas doenças, assim como os problemas de pele, verminose, entre outras ligadas à falta de saneamento básico e à proximidade do aterro, ocorrem com mais frequência nos domicílios com catadores. Apesar da alta incidência de doenças e da dificuldade no acesso a serviços de saúde, 61,3% dos respondentes (dos quais 57,2% nos domicílios com catadores e 61,9% nos demais domicílios) considera seu estado de saúde bom ou muito bom. Esta percepção, no entanto, pode estar relacionada à falta de informação sobre as doenças frequentes ou à banalização de algumas delas. Tabela 14 : Incidência* de doenças graves e/ou crônicas nos domicílios de Jardim Gramacho Domicílio sem catador Domicílio com catador Total Hipertensão/cardiovascular 35.6% 20.7% 33.5% Dengue 16.5% 17.0% 16.6% Asma/Bronquite 12.6% 26.6% 14.6% Diabetes 12.9% 8.5% 12.3% Diarréia 11.3% 17.7% 12.2% Problemas de pele 6.7% 10.7% 7.3% Verminose 4.0% 12.9% 5.3% Hepatite 2.3% 3.7% 2.5% Câncer/tumores 2.2% 1.9% 2.1% Tuberculose 1.6% 3.0% 1.8% HIV/AIDS 0.6% 2.2% 0.8% Tuberculose 0.9% 0.7% 0.8% Meningite 0.6% 1.1% 0.7% Doença de chagas 0.6% 0.7% 0.6% Leptospirose 0.2% 0.7% 0.3% Fonte: IETS. Pesquisa em Jardim Gramacho, Duque de Caxias - RJ (IETS/Overview), 2010. *Nota: nos últimos 10 anos. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _93 Mesmo que a maioria avalie seu estado de saúde positivamente, metade dos entrevistados em Jardim Gramacho considera que morar e/ou trabalhar próximo ao AMJG prejudica muito sua saúde. No entanto, esta percepção é maior entre os respondentes que vivem em domicílios sem catadores (53,1%) do que entre as pessoas que moram em residências com catadores (48,7% destes acredita que não há danos à saúde advindos do lixo em seu entorno). Isto pode ocorrer tanto porque os catadores convivem mais com o lixo e o aterro, e tendem a banalizá-los, quanto porque a renda destes depende diretamente do funcionamento do AMJG. Gráfico 23 : Avaliação do prejuízo à saúde por morar/trabalhar próximo do AMJG Total 50% Domicílio com catador 16% 34% Domicílio sem catador 18% 49% 53% 0% 10% 20% 33% 30% Muito 16% 40% 50% Pouco 60% 31% 70% 80% 90% 100% Não prejudica Fonte: IETS. Pesquisa em Jardim Gramacho, Duque de Caxias - RJ (IETS/Overview), 2010. Além de viverem em áreas com menos infraestrutura sanitária do que o restante do bairro, as informações relativas à saúde dos catadores do AMJG merecem atenção especial, visto que trabalham em um ambiente composto por elementos potencialmente nocivos à saúde e que a catação requer contato pessoal continuado com estes elementos. No que diz respeito aos cuidados tomados na atividade da catação, mais de ¾ dos catadores declararam usar Equipamentos de Proteção Individual (EPI) e 23,2% disseram que Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _94 abrem os sacos de lixo com cuidado. Apesar disso, 40,5% deles já sofreram algum tipo de acidente no trabalho. Dentre os tipos de acidentes mencionados, os ferimentos por objetos cortantes (inclusive facas e similares usados pelos catadores durante o trabalho) possuem o maior percentual de respostas, atingindo 66,5% dos catadores que já se acidentaram. Atropelamentos e fratura de membros foram citados por 14% e 8,5% dos catadores que sofreram acidentes, respectivamente. De fato, em torno de 80% dos catadores de materiais recicláveis encontra cacos de vidro, pregos e/ou agulhas no lixo que separa. Um percentual um pouco menor, 67%, acha facas ou outro metal cortante. Mais da metade (56%) dos catadores que declararam encontrar pelo menos um dos objetos citados anteriormente já se acidentou com algum deles. Além dos objetos cortantes ou perfurantes, os catadores de materiais recicláveis de Jardim Gramacho têm contato diário com uma série de resíduos encontrados no aterro que representam um potencial perigo à sua saúde. Como pode ser observado no gráfico abaixo, mais de 80% dos catadores encontram pilhas e baterias no aterro. Ademais, pelo menos 3/5 dos catadores de materiais recicláveis têm contato com frascos de remédios (encontrados por 71% deles), embalagens de agrotóxicos e combustíveis (68%), venenos (62%) e resíduos hospitalares (60%). A saúde dos catadores de materiais recicláveis também é afetada por resíduos radioativos: 31% dos catadores se deparam com este tipo de material no AMJG. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _95 Gráfico 24 : Resíduos de potencial perigo segundo o percentual de catadores que os encontram no AMJG 100% 90% 80% 70% 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% Pilhas Baterias Frascos de Embalagens Embalagens remédios de agrotóxicos de combustíveis Venenos Resíduos hospitalares Resíduos radioativos Fonte: IETS. Pesquisa em Jardim Gramacho, Duque de Caxias - RJ (IETS/Overview), 2010. No entanto, não se tem certeza que, no momento da entrevista, os respondentes compreenderam exatamente o que são resíduos radioativos. 4.10 Conclusões Com o objetivo diagnosticar a realidade de Jardim Gramacho para direcionar o plano de ações integradas que será implementado no processo de desativação do AMJG, foi realizada uma pesquisa de campo amostral que abordou questões demográficas, de condições dos domicílios, de acesso à infraestrutura, de vitimização, educação, saúde, renda e trabalho. O levantamento feito para este projeto, que precedeu as análises do presente diagnóstico, havia identificado três possíveis fatos acerca do bairro que, caso confirmados, mereceriam atenção por parte do Poder Público. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _96 O primeiro era um grave déficit de infraestrutura urbana, como saneamento básico e acesso à luz elétrica e água canalizada, nas ocupações recentes de assentamento precários que ficam na periferia do bairro sobre os manguezais aterrados. O segundo fator era um déficit na oferta de matrículas em creches e pré-escolas, além de ter sido identificado também que haveriam menos adolescentes matriculados no Ensino Médio do que potenciais alunos nestas faixas etárias. Por fim, notou-se problemas no acesso à saúde, como a falta de facilidade em chegar a hospitais, mesmo que próximos em distância, e a inexistência de unidades 24 horas no bairro ou próximas a ele. No tocante a infraestrutura básica, serviços que atendem a mais de 90% da população do Estado ou da RMRJ, estão longe de serem universalizados em Jardim Gramacho. Metade dos domicílios do bairro não tem acesso à rede geral de água, em 25% dos domicílios o escoadouro não é feito via rede geral coletora de esgoto, a coleta do lixo não chega de forma direta a todos os dos domicílios, e apenas 71,1% dos domicílios têm acesso à rede elétrica oficial. Apesar do pouco acesso à infraestrutura urbana ser generalizado, este é ainda mais restrito aos domicílios em que moram os catadores e suas famílias. Para estes 14% das residências do bairro, 61,8% não tem acesso à rede geral de água, e 23% destes dependem da bica comunitária para se abastecer; 72,5% não tem acesso à rede geral de esgoto, escoando, portanto, em valas a céu aberto (quase 25%) e em rios, lagos ou mar (15%); 42,2% não tem seu lixo coletado e, em maioria, optam por queimá-lo ou enterrá-lo; e apenas 23% são abastecidos pela rede oficial de energia elétrica, ao passo que mais de 50% tem outra fonte energética, indicativo de fornecimento informal ou ilegal. Em termos educacionais, a questão das carência de creches no bairro se verificou a partir da identificação, nesta pesquisa, de que há 1.229 crianças entre 0 e 4 anos no bairro de Jardim Gramacho e, segundo o INEP, apenas duas creches oficialmente reconhecidas nas quais existem 128 matrículas. Se considerarmos que 16% das famílias do bairro são Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _97 monoparentais femininas e que este percentual sobe para 20% quando se trata apenas de catadores, uma maior oferta de creches públicas de qualidade se torna uma questão que incide na geração de trabalho e renda destas famílias. Além disso, o quadro de escolaridade do bairro, e em especial, dos catadores, é muito ruim. Quase 10% dos adultos residentes em Jardim Gramacho são analfabetos, 27,6% têm menos de 4 anos de estudo, 1/3 tem de 4 a 7 anos de estudo e 20% têm 11 anos de estudo, que corresponde ao Ensino Médio completo. Apenas 3% das pessoas têm pelo menos 12 anos de estudo: metade com o Ensino Superior incompleto e metade com o Ensino Superior completo ou mais. Conforme mencionado, a escolaridade dos catadores é bem mais baixa: 50% não chegou a completar 4 anos de estudo, o que os classifica como analfabetos funcionais, e, destes, 20% nunca chegou a estudar. A saúde dos moradores de Jardim Gramacho é bastante afetada pela carência de infraestrutura básica no bairro. Nota-se incidência elevada de doenças fortemente relacionadas às condições sanitárias, habitacionais e do meio ambiente, tais como dengue (16,6%), asma/bronquite (14,6%) e diarréia (12,2%), ainda mais expressivas nos domicílios cuja renda depende diretamente do AMJG. A maior vulnerabilidade da saúde dos catadores, além do contato com elementos que transmitem ou causam doenças, também se dá por conta da precariedade de seu trabalho: 40,5% deles já sofreram algum tipo de acidente na atividade de catação. Apesar da abrangência do PSF no bairro, os estabelecimentos mais procurados são, geralmente, os hospitais. Por isso, é necessário que o acesso a eles seja melhorado – atualmente, os moradores levam em média meia hora para chegar até o hospital mais próximo, o que confirma a dificuldade identificada pelo levantamento. Por outro lado, a segurança pública em Jardim Gramacho é praticamente inexistente. Além de não ter sido identificado nenhum posto de polícia no bairro pelo levantamento, Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _98 esta informação se torna ainda mais grave quando se considera a distância média entre os domicílios do bairro e a unidades de policiamento mais próxima – que é de 40 minutos. Além disso, a análise de vitimização mostra que há maior incidência de situações de risco (roubos, furtos, ameaça, agressão física, entre outros) nos domicílios com catadores de materiais recicláveis. Em menos de ¼ dos casos a polícia foi chamada ou foi feito o registro da ocorrência, o que demonstra a falta de credibilidade na polícia e em seus instrumentos para resolver as situações de risco. Jardim Gramacho pode ser considerado um bairro pobre. A renda domiciliar per capita é de R$ 370 reais mensais, 42,4% da população do bairro esta situada abaixo da linha de pobreza e 16,4% são considerados extremamente pobres. Esses percentuais representam 5,8 mil pessoas pobres e 2,1 mil pessoas extremamente pobres morando no bairro. Para eliminar a pobreza em Gramacho seriam necessários R$ 7,3 milhões de reais anuais e para eliminar a pobreza extrema, R$ 1,56 milhões. Apesar da baixa taxa de desemprego, a qualidade dos postos de trabalho dos moradores de Jardim Gramacho é extremamente precária, seja pelos rendimentos aferidos seja pela qualidade do vínculo de trabalho. A renda do trabalho é de cerca de R$ 780 reais, o que equivale a menos da metade da renda média da RMRJ. Mais da metade dos ocupados (52,5%) estão em postos de trabalho considerados informais – emprego sem carteira assinada e trabalho por conta própria. Essa última forma de inserção tem participação relativa muito elevada (36,6%) em Gramacho representando um percentual superior ao de emprego com carteira de trabalho assinada. A atividade empregadora é praticamente inexistente no bairro. A vulnerabilidade social dos domicílios com presença de catadores de material reciclável é mais elevada em todas as dimensões: acesso a infraestrutura, titularidade das propriedades, índices de pobreza e indigência, nível de escolaridade e condições de trabalho e dos domicílios. A coleta de material reciclável é uma atividade importante no Bairro, sobretudo para as famílias mais pobres. Um quarto dos domicílios possuem pelo menos um catador e a renda domiciliar per capita desses domicílios é 21% inferior a dos domicílios sem Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _99 catadores. Metade dos domicílios com catadores são considerados pobres, enquanto entre os domicílios sem catadores esse percentual é de 40%. A pobreza extrema corresponde a 18% dos domicílios com catadores e 14,4% dos domicílios sem catadores. Percebe-se que os domicílios de catadores de materiais recicláveis estão mais concentrados em determinados setores censitários do bairro, notadamente, mais precários. Estima-se que a retirada da renda dos catadores, sem ações compensatórias, terá grande impacto nas condições de vida da população de Gramacho: i) redução da renda domiciliar per capita a um terço; ii) aumento do percentual de pobres de 50% para 87%; e iii) elevação da extrema pobreza de 18% para 68%, ou seja, quase quadruplicará. Em termos quantitativos significa a entrada de mais 1.342 pessoas na pobreza e 1.805 na pobreza extrema. A situação laboral dos catadores de material é caracterizada por elevada informalidade e baixos rendimentos. A grande maioria não está protegida pela legislação trabalhista. Mais de 70% partiram para essa atividade porque não encontraram emprego. Somente 6,3% contribuem para a Previdência, enquanto quase metade dos não catadores está contribuindo. Os ocupados na coleta de lixo possuem um rendimento médio 28% inferior à média dos ocupados em outras atividades. Apesar da precariedade da atividade de coleta, é a única fonte de renda de uma parcela importante da população de Gramacho que avaliam negativamente o fechamento do aterro, enquanto a maior parte do resto da população aprova a medida. A percepção dos respondentes que vivem em domicílios sem catadores também difere da opinião das pessoas que moram em residências de catadores no tocante ao efeito do aterro à saúde: enquanto a maior parte (53,1%) dos primeiros considera a proximidade do aterro muito prejudicial à saúde, o percentual cai para 34% dos últimos. Com relação às ações a serem desenvolvidas no local, há certa concordância de que a implantação de novas empresas é prioritária. A baixa escolarização e a alta incidência de pobreza demandam ações emergenciais de transferência de renda, complementares ao Programa Bolsa Família, que devem estar Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _100 conjugadas a uma perspectiva da reconversão profissional. A estratégia de desenvolvimento da região deve seguir um plano de ação amplo e integrado que contemple melhoria da infraestrutura urbana, dos domicílios, dos transportes, o aumento da escolaridade, formação profissional e empreendedora e atração de investimentos e empresas para a região. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _101 5. Diagnóstico Ambiental de Jardim Gramacho O diagnóstico ambiental apresentado neste capítulo 5 foi elaborado usando como base somente dados secundários, por limitação de recursos financeiros. Os dados secundários utilizados se encontram disponíveis em internet (mapas, relatórios técnicos, reportagens, trabalhos acadêmicos, entre outros), e são oriundos de fontes distintas. Alguns dos principais endereços eletrônicos visitados para busca de informações sobre a área de estudo foram: INEA - Instituto Estadual do Ambiente (www.feema.rj.gov.br); COMLURB – Companhia Municipal de Limpeza Urbana (www.rio.rj.gov.br/web/comlurb); Prefeitura do Rio de Janeiro (www.rio.rj.gov.br); Prefeitura de Duque de Caxias (www.duquedecaxias.rj.gov.br); Ministério do Meio Ambiente – MMA (www.mma.gov.br); IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (www.ibge.gov.br); IBG - Instituto Baía de Guanabara (http://www.portalbaiadeguanabara.com.br), entre outros. Além das fontes supracitadas, dois relatórios técnicos de trabalhos realizados na área foram disponibilizados para a avaliação da equipe. O primeiro realizado pelo Observatório Urbano Estadual do Rio de Janeiro em 2008 e, o segundo realizado pela empresa Nova Gramacho, também em 2008. 5.1 Meio Ambiente E Saúde 5.1.1 Relação saúde e meio ambiente Meio Ambiente e Saúde compreende os aspectos da saúde humana, das enfermidades, dos danos e do bem estar que são determinados ou influenciados por fatores do meio ambiente. Também se refere à teoria e pratica de avaliar, prevenir, corrigir e controlar os riscos do ambiente que potencialmente podem prejudicar a saúde individual e coletiva de gerações atuais e futuras. Este tema inclui o estudo tanto dos efeitos patológicos diretamente relacionados aos fatores físicos, químicos, radiológicos e biológicos quanto aos efeitos na saúde e bem estar Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _102 derivados do meio físico, psicológico, social e estético em geral, compreendendo a habitação, desenvolvimento urbano, uso da terra e transporte. Historicamente, saúde e meio ambiente sempre estiveram intimamente relacionados, não sendo possível prevenir e proteger a saúde individual e coletiva sem cuidar do meio ambiente. Saúde pressupõe um meio ambiente saudável, assim, não se pode falar em danos ao meio ambiente sem pensar em danos à saúde individual e coletiva. É fato incontroverso que a degradação do meio ambiente corresponde a graves danos à saúde individual e coletiva. Saúde não somente se refere à ausência de doenças, mas sim ao completo bem estar físico, mental e social de um indivíduo. Nesse sentido, a orientação que se extrai da disposição contida no artigo 3º da Lei nº 8.080/90 é que "a saúde tem como fatores determinantes e condicionantes, entre outros, a alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a renda, a educação, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais". Assim o termo "saúde" engloba uma série de condições que devem estar apropriadas para o bem estar completo do ser humano, incluindo o meio ambiente equilibrado. Acerca da relação entre meio ambiente e saúde, conforme o artigo 225 da Constituição Federal do Brasil estipula: "Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações". Nota-se que o dispositivo em foco é categórico ao afirmar que o meio ambiente ecologicamente equilibrado é essencial à sadia qualidade de vida, ou seja, à própria saúde. Embora se tenha várias leis relevantes relacionadas ao Meio Ambiente e Saúde em nosso país, os moradores que vivem próximo ao Aterro Metropolitano de Jardim Gramacho (AMJG) – Duque de Caxias ainda estão longe de serem contemplados com o cumprimento de boa parte destas leis. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _103 5.1.2 Crescimento urbano, saneamento básico e saúde O crescimento urbano que ocorreu em Jardim Gramacho não foi acompanhado de investimentos adequados em infraestrutura habitacional formando em muitas localidades assentamentos "ilegais", as favelas e os cortiços. O resultado deste crescimento desordenado foi o aumento de pessoas vivendo em condições insalubres, em alguns casos em condições subumanas, sem cobertura de serviços básicos essenciais como água, esgoto e coleta de lixo e ainda expostas a diversos contaminantes ambientais típicos do desenvolvimento do AMJG, como o manuseio direto ou indireto com o lixo, a contaminação do solo e água subterrânea por agentes patogênicos, pelo chorume e por produtos químicos e a poluição atmosférica (Esquema 1). Esquema 1: Vias de contato homem – lixo. Estima-se que nesta região boa parte dos moradores vive em condições inadequadas de moradia. Além da disponibilidade dos chamados serviços essenciais, outros fatores relacionados à qualidade das habitações, podem também afetar a saúde. Por exemplo, Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _104 condições térmicas precárias, umidade, presença de mofo, má-ventilação, grande adensamento de indivíduos por cômodo, infestações por insetos e roedores, nível de ruído, todos estes fatores têm sido descritos como potenciais fatores de risco à saúde. A falta de periodicidade nas coletas de lixo pode acarretar problemas como o assoreamento de rios e da Baía de Guanabara, o entupimento de bueiros com consequente aumento de enchentes nas épocas de chuva, além do mau-cheiro, proliferação de moscas, baratas e ratos, todos com graves consequências diretas ou indiretas para a saúde (Esquema 2). Esquema 2: Limpeza pública e saúde – modelo causal. A proliferação de moscas (Musca domestica) pode ser responsável pela veiculação de várias doenças para o homem. Entre elas os bacilos da febre tifóide (Salmonella typhosa) que pode ser transportado nas pernas, corpo, tromba ou expulsá-las pela regurgitação ou nas fezes. Pode transmitir ainda diarréia, conjuntivite, hanseníase, tuberculose, tifo, erisipelas, cólera, meningite, peste bubônica. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _105 Muitas doenças causadas por vírus também podem ser transmitidas pela mosca doméstica, tais como, varíola, poliomielite, oftalmia purulenta, etc. Estas também veiculam ainda protozoários, podendo causar a disenteria amebiana, além de vermes, pois trazem seus ovos quando pousam em fezes humanas ou esterco de animais e logo a seguir entram em contato com o alimento humano. As baratas como a francesinha ou paulistinha (Blattella germânica) e a americana ou de esgoto (Periplaneta americana) depois da mosca doméstica são os animais que mais transmitem microrganismos causadores de doenças, podendo transportar cerca de 40 tipos de bactérias patogênicas. Elas podem transmitir: febre tifóide, hepatite A, verminoses intestinais, amebíase, giardíase, disenteria, helmintíase toxoplasmose, entre muitas outras, que podem ser adquiridas nos alimentos onde elas passam. Os ratos também são uma significante praga em Jardim Gramacho e podem-se diferenciar três espécies: a ratazana (Rattus novergicus); o rato-de-telhado (Rattus rattus) e o camundongo (Mus musculus), estes animais podem ser portadores e hospedeiros de várias doenças transmissíveis ao homem, como: 1) a leptospirose é uma doença infecciosa, causada por uma bactéria, a Leptospira interrogans e provoca febre alta, dores de cabeça, vômitos, anemia e icterícia; 2) peste bubônica, conhecida também como peste negra, esta doença é causada pela bactéria Yersínia sp. através da picada da pulga Xenopsylla cheopis e provoca inflamações dos gânglios linfáticos, petéquias (é um pequeno ponto vermelho na pele ou mucosas, causado por uma pequena hemorragia de vasos sanguíneos) e septicemia (que é uma infecção que ocorre no sangue causado pela proliferação de bactérias que danificam os tecidos do organismo). Os sintomas mais comuns são: febre alta, calafrios, respiração rápida, batimentos cardíacos acelerados, mal-estar, diminuição da temperatura corporal, queda de pressão arterial, confusão mental e feridas na pele. 3) hantavírus trata-se da 'hantavirose', uma doença causado pelo vírus Hantaan que representa uma séria ameaça a saúde pública. Apresenta diversas formas de manifestações, Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _106 tais como a síndrome pulmonar, febre hemorrágica e nefrite epidêmica. Na forma pulmonar, os sintomas são febre alta, mal estar, falta de disposição, dores musculares, dor de cabeça, podendo também ocorrer hipotensão e choque. Num segundo momento, temos um quadro pulmonar caracterizado por tosse seca e falta de ar, que pode levar o indivíduo a morte. Outras doenças são transmitidas por estes roedores, como o tifo murino, riquetsiose vesicular (semelhante a catapora), febre por mordedura, helmintíases, sarna e micoses diversas. Proposta: O controle destes vetores e pragas é um importante complemento às ações de saúde e bem estar de cidades para isso será necessário realizar um projeto de saneamento básico priorizando a retirada do lixo de diversos vazadouros existente na região, assim como regular a periodicidade das coletas de lixo e com destino ecologicamente adequado. 5.1.3 Água subterrânea e saúde Em Jardim Gramacho é comum o uso da água subterrânea por boa parte dos moradores e esse fato persiste e se intensifica devido a precariedade na periodicidade do abastecimento da água fornecida pela CEDAE na região, o que compromete a saúde da população local que tende a recorrer a meios inadequados (Esquema 3). O uso da água subterrânea sempre esteve intimamente relacionado com a saúde e esse processo se intensificou com forte influência do AMJG, pois boa parte do chorume que não é captado pela estação de tratamento é percolado subterraneamente. Diversas formas de contaminação estão intimamente relacionadas com água subterrânea próximo ao AMJG e vazadouros de lixo, desde organismos patogênicos, até elementos químicos como os metais pesados, tais como o mercúrio, o chumbo, o cromo, o cobre e o cádmio, e moléculas orgânicas como os organoclorados, podem ser concentradas nos aquíferos a partir destes depósitos de lixo. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _107 Resíduos líquidos e sólidos existentes nos vazadouros, bem como resíduos de esgoto no bairro, contem microrganismos, como vírus e bactérias patogênicas como, por exemplo, o vibrião da cólera que podem percolar pelo solo e contaminar a água subterrânea. Esquema 3: Efeitos diretos e indiretos do abastecimento de água e do esgotamento sanitário sobre a saúde Uma importante questão que precisa ser respondida em Jardim Gramacho é: saber em que raio de distância a pluma de chorume proveniente do AMJG está atingindo a água subterrânea da região. Responder essa questão é de suma importância para controle Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _108 ambiental e qualidade de vida da população local e adjacente. Para isso será necessário a confecção de poços e o monitoramento da água subterrânea em pontos estratégicos. Além de monitoramento da água subterrânea será preciso ensinar a população sobre os cuidados que se deve ter com esse tipo de água, como por exemplo: a necessidade de ferver a água que se bebe, para isso seria necessário montar uma equipe para promover ensino de educação ambiental e saúde. Também avaliar se a água subterrânea utilizada pelos moradores é própria para o consumo. 5.1.4 Qualidade do ar e saúde O ar em Jardim Gramacho geralmente apresenta um odor característico de lixo e também apresenta partículas de suspensão de poeira proveniente do AMJG e das ruas sem asfalto. Esse tipo de poluição não apresenta um caráter pontual (em uma pequena área atingida). As partículas de poeira em suspensão no ar podem ser transportadas pelo vento viajar por um determinado raio de alcance e tempo chegando até a outros bairros aonde vai se depositar podendo contaminar o solo com metais e agentes patogênicos. Este tipo de poluição provoca sérios danos à saúde. Algumas doenças são transmitidas através de microrganismos que estão no ar associados a poeira como vírus e bactérias. Outras doenças são provocadas quando pequenas partículas de poeiras são inspiradas e penetram profundamente nos pulmões e lá se acumulam agravando significativamente doenças como asma e bronquite. Os problemas de saúde causados por poluentes no ar podem variar de pequenas alterações bioquímicas e fisiológicas até dificuldade em respirar, tosse e agravamento de condições cardíacas. As doenças respiratórias cardiovasculares ocorrem quando respiramos em uma atmosfera poluída, o pulmão não funciona bem e tem dificuldade para filtrar o ar. Dessa Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _109 forma chega menos oxigênio para o coração, que terá de trabalhar mais para suprir a carência. Proposta: Para evitar essas doenças será necessário cobrir o Aterro Aanitário e vazadouros com uma camada de argila de aproximadamente 1m de espessura e posteriormente realizar o plantio com vegetação preferencialmente rasteira como a Grama e realizar a pavimentação de ruas e calçadas no bairro. 5.1.5 Contaminação do solo e saúde A contaminação do solo é outro assunto de grande preocupação ambiental em Jardim Gramacho, uma vez que esta interfere no solo, águas superficiais e subterrâneas, ar, na fauna e vegetação, podendo mesmo estar na origem de problemas de saúde pública, pois é através do solo contaminado se propaga vários tipos de doenças e contaminação por agentes químicos que pode causar malefícios diretos ou indiretos à vida humana, à natureza e ao meio ambiente em geral. O caso de Jardim Gramacho é peculiar, pela proximidade entre o AMJG e as residências e a área de circulação da vizinhança. Desta forma deve-se fazer análises microbiológicas e químicas (inorgânica e orgânicas) do solo, para avaliar de que forma seria o melhor aproveitamento do espaço destinado ao uso da população. Para evitar várias doenças transmitidas pelo solo e que se gaste menos com hospitais é necessário que os órgãos competentes cumpram suas atribuições, fornecendo a população um sistema eficiente de recolhimento de lixo e esgoto, a eliminação dos vazadouros e a sua cobertura com argila. Várias doenças podem acometer o indivíduo, principalmente se o mesmo comer ou beber alimento contaminado, andar descalço ou se ferir como, por exemplo: 1) A esquistossomose (barriga-d'água) é provocada pelo Schistosoma mansoni, verme achatado (platelminto) que entra pela pele (pés e pernas), aloja-se no fígado. Os prejuízos causados por este verme não se limitam a sua espoliativa, isto é, a sua capacidade de desviar Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _110 os nutrientes do indivíduo doente, mas também pode causar complicações hepáticas e intestinais que são muito frequentes, ocasionando diarréias, dores abdominais e rápido emagrecimento. Podem também provocar forte reação alérgica, com sensação de coceira, vermelhidão intensa e dor, e também causar problemas circulatórios que, por sua vez, acarretam a congestão e o edema das paredes do intestino, e do estômago, bem como perda de parte do plasma para a cavidade abdominal; 2) A ancilostomíase, popularmente conhecida como amarelão, é uma doença parasitária intestinal que causa diarréia moderada e dor abdominal. Infecções graves de amarelão podem ocasionar sérios problemas de saúde em recém-nascidos, crianças, mulheres grávidas e pessoas subnutridas. As infecções de amarelão são transmitidas principalmente pela pele em contato com o solo contaminado, pois, as larvas no solo têm a capacidade de penetrar na pele, mas também pode ocorrer pela ingestão de larva no caso de acidentalmente engolir solo contaminado colocar a mão suja na boca e etc. 3) O tétano é uma doença causada por uma bactéria (Clostridium tetani), e caracteriza-se por contrações e espasmos dos músculos do rosto, da nuca, da parede do abdome e dos membros. Esses espasmos são consequência da ação da toxina produzida pelo bacilo sobre o sistema nervoso. O bacilo do tétano pode ser encontrado sob a forma de esporo (uma forma resistente do micróbio) nos mais variados ambientes: poeira, pregos enferrujados, latas, água suja, galhos, espinhos e no solo, principalmente quando tratado com adubo animal, pois esse bacilo está presente nas fezes dos animais domésticos e do homem. A contaminação química do solo contaminado é outro fator que deve-se ter cautela, principalmente porque o AMJG em Jardim Gramacho recebeu vários destes produtos e estes podem causar uma série de doenças, pois normalmente em contato com a pele tem efeito cumulativo causando uma série de complicações tais como: 1) os inseticidas (BHC – Hexacloro Benzeno e DDT- Dicloro-Difenil-Tricloroetano) pode causar danos irreversíveis ao sistema nervoso central e causar convulsões, dores de cabeça, tremores, arritmia, câncer, danos ao fígado e até óbito em casos mais graves. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _111 2) os herbicidas (ex. Dioxina) – podem causar câncer; queda de imunidade; malformações e óbitos fetais; abortamentos; distúrbios hormonais; concentrações aumentadas de colesterol e triglicéridos; hiperpigmentação da pele, dor de cabeça e nos músculos; desordem no aparelho digestivo; inapetência, fraqueza e perda de peso; neuropatias; perda da libido e desordens dos sensos. 3) plásticos PVC (policloreto de vinila) – podem causar danos ao sistema nervoso central e em exposição durante longo período (sob níveis superiores a 0,1 mg/L) pode causar câncer e danificar o fígado e pulmão. 4) solventes, produtos farmacêuticos e detergentes (ex. Benzina): podem causar dores de cabeça, náusea, perda de coordenação dos músculos, leucemia. No contexto do futuro de Jardim Gramacho, se encontra hoje os desafios de promover uma melhor qualidade de vida com o saneamento e educação ambiental, que pode favorecer progresso ambiental da região e consequentemente se ter melhorias na saúde dos moradores. Faz-se necessário comentar que segundo os resultados da pesquisa de campo realizada, 97% dos domicílios acusam a ocorrência de óbitos por doenças, e as mais incidentes dentre os moradores são hipertensão, asma, dengue, diarréia (Tabela 1). A diarreia está altamente ligada a ausência de saneamento básico, à própria atividade de catação e falta de higiene pessoal e durante preparação / consumo de alimentos. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _112 Tabela 1: Ocorrência de doenças em Jardim Gramacho Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _113 5.2. Qualidade De Vida Do Bairro Jardim Gramacho Neste capítulo será apresentado um resumo dos problemas ambientais do bairro de Jardim Gramacho referentes à contaminação ambiental, de acordo com o relatório da Nova Gramacho (2008) e outras fontes secundárias, como essa contaminação pode ocasionar riscos à qualidade de vida da população e apresentar as propostas para melhoria desta. Para ficar clara qualquer consequência oriunda de um impacto ambiental observado no bairro, para um mesmo problema serão relatados os resultados para o meio ambiente e para a população separadamente. 5.2.1 Problemas Ambientais Em relatório preliminar, foram descritos os problemas ambientais encontrados no bairro de Jardim Gramacho e que serão apresentados aqui em forma de tópicos. Qualidade do ar: * Decomposição do lixo / volatilização de contaminantes * Queima de lixo em áreas de disposição irregular de resíduos sólidos * Dispersão de microrganismo patogênico presentes em resíduos hospitalares * Excesso de material particulado no ar (poeira) A legislação ambiental pertinente à qualidade do ar é a resolução CONAMA 03 de 1990, que determina padrões de qualidade considerando os seguintes parâmetros: partículas sólidas totais; partículas inaláveis (PM10; PM5) – que são partículas sólidas menores que podem alcançar os pulmões durante a respiração; dióxido de enxofre (SO 2); dióxido de nitrogênio ou óxido nítrico (NO2); ozônio (O3); e, monóxido de carbono (CO). No âmbito estadual, a norma técnica 603.R-4 estabelece os critérios e padrões de qualidade do ar, como parte integrante do Sistema de Licenciamento de Atividades Poluidoras. Esta norma segue os critérios de qualidade estabelecidos na resolução CONAMA 03/90. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _114 Como não foi encontrado estudo anterior com medições reais desses parâmetros no bairro de Jardim Gramacho ou em proximidades, somente pela visita de campo e por relatos de moradores pode-se prever que ao menos as concentrações de partículas sólidas totais, partículas inaláveis (ambas oriundas do processo de remoção de terra tanto para recobrir o lixo no aterro quanto nas ruas sem pavimentação e áreas de despejo ilegal de lixo), monóxido de carbono (oriundo de queima incompleta de material orgânico do lixo) e dióxidos de enxofre e de nitrogênio (oriundos de decomposição de lixo) devem estar acima do limite estabelecido como seguro pela legislação brasileira. Propostas para curto prazo: Acabar com áreas de despejo irregular de lixo. Ações: limpeza de áreas utilizadas para esse fim até o momento; reaproveitamento dessas áreas para fins urbanísticos; coleta de lixo eficiente no bairro pela COMLURB. 1) Recobrimento das pilhas de resíduos sólidos no aterro e/ou áreas de vazadouro que sejam economicamente inviáveis para limpeza de terreno, seguido de reflorestamento com espécies vegetais nativas e/ou ornamentais, em especial, gramíneas e herbáceas, para conter possível erosão do solo por ação das chuvas e ventos, entre outros agentes de intemperismo. Tais medidas irão diminuir consideravelmente os problemas encontrados, restaurando a qualidade do ar em tempo curto. Propostas para médio-longo prazos: 1) Programa de conscientização da população sobre riscos do lixo perto de suas casas, ensinando que não se deve queimar o lixo e nem abandona-lo em áreas abertas. O programa pode ser desenvolvido por alguma ONG com caráter socioambiental que já atue ou não na região. 2) Monitoramento: pode ser feito com uma estação fixa, a ser escolhida pelo INEA, para servir de base para o monitoramento da qualidade do ar da região, visto que não há estação de monitoramento próxima. Sendo então Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _115 de grande utilidade não só para a população local, mas para a geração de dados sobre qualidade do ar do Estado do Rio de Janeiro. 3) Monitoramento: pontos móveis de coleta de ar para análise, como sugestão, pontos que foram áreas de disposição ilegal de resíduos para monitorar a emanação de gases provenientes de possíveis restos de resíduos que permaneceram após a limpeza destas áreas. O responsável por tal monitoramento poderia ser a própria empresa Nova Gramacho. Uma observação pertinente em relação à qualidade do ar em Jardim Gramacho é uma possível influência de gases oriundos da baía de Guanabara na região. A Baía de Guanabara é reconhecidamente um corpo hídrico com regiões em estado de eutrofização, ou seja, com excesso de matéria orgânica no sistema, sofrendo com áreas com baixas concentrações de oxigênio, gerando por decomposição desse material, diferentes gases, inclusive alguns mal cheirosos como o gás sulfídrico e a amônia. O bairro de Jardim Gramacho (Figura 1) se encontra na parte noroeste da baía, considerada como “hotspot” de contaminação, pois é uma área que recebe as águas dos 3 maiores rios que drenam áreas industriais e com maior ocupação humana (maior carga de esgoto doméstico) – rio São João de Meriti e rios Iguaçu-Sarapuí, Rio Estrela. Por exemplo, Guimarães & de Mello (2006; 2008) demonstraram que concentrações de compostos de nitrogênio como óxido nitroso, nitrito, nitrato e amônia são extremamente altas nesta parte da baía, podendo exportar para atmosfera esses compostos. Logo, a qualidade do ar nesta área estará intimamente ligada também ao Programa de Despoluição da Baía de Guanabara e suas metas até 2020. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _116 Figura 1: Localização do aterro controlado de Gramacho (círculo vermelho) em relação a Baía de Guanabara, RJ Qualidade do solo: * Erosão do solo de áreas do bairro * Contaminação do sedimento/solo de manguezal * Contaminação do solo de áreas de disposição irregular de resíduos Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _117 A legislação ambiental pertinente à qualidade do solo é a resolução CONAMA 420 de 2009, que determina padrões de qualidade considerando os seguintes parâmetros: metais e outras substâncias inorgânicas; hidrocarbonetos aromáticos voláteis; hidrocarbonetos policíclicos aromáticos; benzenos clorados; etanos clorados; etenos clorados; metanos clorados; fenóis clorados e não clorados; pesticidas organoclorados; bifenilas policloradas. Esta resolução classifica os solos de acordo com a concentração de substâncias químicas. A Classe 1 seriam solos que apresentam concentrações de substâncias químicas menores ou iguais ao valor de referência de qualidade. A Classe 2 seriam solos que apresentam concentrações de pelo menos uma substância química maior do que o valor de referência de qualidade e menor ou igual ao valor de prevenção. A Classe 3 seriam solos que apresentam concentrações de pelo menos uma substância química maior que o valor de prevenção e menor ou igual ao valor de investigação. E, por fim, na Classe 4 estariam solos que apresentam concentrações de pelo menos uma substância química maior que o valor de investigação. Dentro dos valores de investigação, são estipulados diferentes níveis aceitáveis para essas substâncias de acordo com o uso do solo. Os usos previstos são: agrícola, residencial e industrial. Utilizando um critério mais restritivo, ou seja, de acordo com o princípio da precaução, o cenário apropriado para a comparação entre os dados encontrados no bairro de Jardim Gramacho e a resolução CONAMA 420/09 seria o valor de prevenção. No entanto, as concentrações das substâncias previstas na resolução também podem ser comparadas com os níveis de intervenção para uso residencial. Sendo assim, comparando as concentrações máximas encontradas em solos das áreas circunvizinhas ao aterro de acordo com o relatório da Nova Gramacho (2008), somente o cádmio (50,1mg/kg) apresentou em um ponto concentração acima do valor de intervenção para áreas industriais (20mg/kg). O estudo da Nova Gramacho teve como malha amostral solos presentes num raio de 500m a partir do aterro de Gramacho (Nova Gramacho, 2008). Este solo seria classificado como classe IV e a concentração encontrada é Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _118 aproximadamente 6 vezes maior que o valor de investigação para áreas residenciais e 38 vezes acima do valor de prevenção. O Cádmio pode apresentar efeitos cancerígenos quando as pessoas estão expostas por inalação e efeitos não cancerígenos, como problemas em fígado, rins, quando a pessoa está exposta via consumo de água ou alimento contaminado (EPA, 2011). Propostas para curto prazo: 1) Reflorestamento de áreas com maior declividade, para evitar a erosão do solo, bem como das áreas citadas anteriormente no item 2.1.1. 2) Avaliar a estabilidade dos solos em áreas de vazadouros que serão utilizadas para construção civil, entre outros usos. 3) Antes de realizar os projetos urbanísticos para as áreas de vazadouro pós limpeza de terreno, deve-se analisar os parâmetros de qualidade de solo de acordo com a resolução CONAMA 420/2009, determinando se os níveis das substâncias tóxicas estão de acordo com o uso do solo (ou seja, se o planejamento urbano indicar a área x como área para construção de novas casas, os níveis de contaminantes a serem comparados no CONAMA serão os da classe residencial) a ser considerado no projeto urbanístico naquela área. Esta avaliação deve ser feita em solos superficiais e alguns perfis de solo (coletando solo em diferentes profundidades) para determinação de até quantos centímetros de solo há contaminação, gerando assim orientações para retirada de solo contaminado da região para posterior construção. Tais medidas irão diminuir consideravelmente os riscos de deslizamentos de terra e erosão, bem como os riscos à saúde humana por presença de concentrações altas de substâncias tóxicas em regiões a serem construídas. Qualidade dos sedimentos: Os sedimentos são formados por partículas oriundas do intemperismo físico, químico e/ou biológico do solo e/ou de rochas, que são transportadas por águas superficiais, vento, Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _119 entre outros mecanismos, até locais de baixa energia, onde pela Lei de Stokes, essas partículas são depositadas, formando camadas subsequentes. Estas camadas dão origem às camadas estratigráficas, o que favorece a formação de um retrato histórico ambiental de uma bacia hidrográfica, capaz de descrever eventos ocorridos e/ou suas consequências. Por exemplo, quando ocorrem queimadas, pode haver o depósito de partículas formadas pela combustão incompleta do material vegetal (“black carbon”) juntamente com o depósito de partículas de sedimento (argilas, siltes e areias), assim através do uso de testemunhos de sedimentos, o perfil vertical irá indicar a fase onde houve tais queimadas pela ocorrência do black carbon. Outro exemplo, são as mudanças na ocupação do solo, inclusive com o início da industrialização. Quando se inicia a atividade industrial em um local, os resíduos desta atividade podem ser carreados até o rio mais próximo e serem depositados juntamente com partículas de sedimento, gerando um registro histórico da evolução da contaminação destes sedimentos por metais e outras substâncias, que podem permanecer ligadas a argilominerais e outras partículas (Machado et al., 2004; Borges et al., 2009). Em relação aos sedimentos, vale ressaltar que a área de manguezal de Jardim Gramacho está sob influência do aterro e da Baía de Guanabara. Há relatos de vazamento de chorume para as áreas de manguezal, o que além de matar inúmeros vegetais e animais, contaminou historicamente o sedimento da região. O sedimento encontrado em frente aos manguezais já na área da Baía de Guanabara, que são oriundos de fontes diversas (vindos dos rios São João de Meriti, Iguaçu-Sarapuí, entre outros) é considerado o mais contaminado de toda a baía, alcançando concentrações de metais tóxicos altíssimas, parte devido a baixa circulação de águas na área e parte pela contaminação vinda pelos rios, e em alguns momentos (acidentes) do aterro. Não existe legislação específica para a determinação da qualidade de sedimentos. No entanto, existe a Resolução CONAMA 344/04, onde se estabelecem diretrizes para sedimentos que serão dragados. Esta resolução vem sendo utilizada até o momento, na ausência de outra resolução mais específica, para a classificação da qualidade de Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _120 sedimentos. Em âmbito estadual, os valores orientadores da qualidade dos sedimentos também são os apresentados na resolução CONAMA 344/2004 (site INEA, 2011). Estudo recente feito por Abreu (2009) demonstrou através de índices de qualidade de sedimento que a área noroeste da baía é a com maior risco à biota em geral e pior qualidade de sedimentos. Neste estudo, as concentrações de cádmio na área estavam um pouco acima ou no limite para nível 1 (limiar abaixo do qual prevê-se baixa probabilidade de efeitos adversos à biota) estabelecido na Resolução CONAMA 344/04, as concentrações de cromo estavam duas vezes maiores que o nível 1, as de cobre 3 vezes maiores que o nível 1, as de chumbo, 3 vezes mais altas, e as de zinco 4 vezes mais altas que o nível 1 e ultrapassando o nível 2 (limiar acima do qual prevê-se um provável efeito adverso à biota). As concentrações de Hg são ainda mais alarmantes, podendo ser até 20 vezes maior que a recomendada como nível 2 (Wasserman et al., 2000). O Programa de Despoluição da Baía de Guanabara não prevê ações para diminuir a contaminação da baía por metais e outras substâncias tóxicas. Somente prevê planos para melhora da qualidade da água por diminuir a entrada de esgoto sem tratamento prévio na baía. No entanto, especialistas indicam que a mudança da qualidade da água poderá deixá-la com maior concentração de oxigênio, o que consequentemente poderá liberar metais antes ligados ao sedimento de fundo da baía para a coluna d’água, disponibilizando-o para a biota local. Atualmente, projetos do Departamento de Geoquímica da Universidade Federal Fluminense estão avaliando o potencial de remobilização de metais do sedimento para a coluna d’água tanto por eventos de ressuspensão quanto por mudanças no estado trófico da água / sedimento da Baía de Guanabara (mestrado de Rodrigo Carvalheira; pós-doutorado de Ana Paula Rodrigues). Outros trabalhos do mesmo departamento, utilizando ferramentas como os sulfetos voláteis em ácido e os metais extraídos simultaneamente (AVS/SEM) tem sido realizados na Baía de Guanabara (Carvalho, 2001; Villar et al., 2010), com o objetivo de avaliar a carga de metais passíveis de liberação após a oxidação dos sedimentos, visto que estes metais estariam ligados a sulfetos estáveis em condições de anoxia. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _121 Mesmo evento ocorre quando há ações de dragagens, como por exemplo, na Lagoa Rodrigo de Freitas, onde Loureiro (2006) demonstrou o aumento das concentrações de mercúrio no sedimento e na água após as dragagens realizadas para os jogos do panamericano. Assim, esta área é considerada como altamente problemática, sendo realmente necessário o monitoramento para observação de mudanças do comportamento dessas substâncias. Propostas para médio-longo prazos: 1) Monitoramento da qualidade dos sedimentos, seguindo a resolução CONAMA 344/04, para monitorar o risco à saúde humana, em especial de catadores de caranguejos e pescadores, que entram em contato com o sedimento presente nas áreas mais baixas, onde ocorre o manguezal. Qualidade da água: * Contaminação do lençol freático pelo chorume do aterro e de vazadouros * Dispersão de contaminantes para o rio Iguaçu-Sarapuí e a Baía de Guanabara A legislação ambiental pertinente à qualidade de água superficial é a resolução CONAMA 357 de 2005, que determina padrões de qualidade considerando variáveis físicas (coloração; turbidez, sólidos dissolvidos totais), variáveis químicas (Al; Ba; Cd; Cl; Cu; Cr; Fe; P; Fl-; Mn; Hg; Ni; K; Na; Zn; Pb; Carbono Orgânico Dissolvido; DDT; Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO5,20); Demanda Química de Oxigênio (DQO); Fenóis; Óleos e Graxas; amônia, nitrato, nitrito e nitrogênio orgânico, oxigênio dissolvido, pH), variáveis microbiológicas (coliformes, densidade de cianobactérias), variáveis hidrobiológicas (clorofila a) e variáveis ecotoxicológicas (por exemplo, ensaio de toxicidade aguda com a bactéria luminescente Vibrio fischeri). Um detalhe importante é que na CONAMA 357/05, são estipulados diferentes níveis aceitáveis para essas substâncias de acordo com o uso da água, classificada em 5 classes: Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _122 especial, classe 1, classe 2, classe 3, classe 4. A resolução inclui águas doces, salinas e estuarinas. Em âmbito estadual, os valores orientadores da qualidade de água, são oriundos da resolução CONAMA nº 357/2005. Além dos padrões de qualidade da água, podem ser citadas as normas técnicas: NT-202.R-10, que estabelece critérios e padrões para lançamento de efluentes líquidos; e, NT-213.R-4, que estabelece critérios e padrões para controle da toxicidade em efluentes líquidos industriais. Há ainda a política estadual de recursos hídricos (lei 3239/99) e lei 4930/06 que dispõe sobre monitoramento e as ações relacionadas ao controle da potabilidade da água própria para consumo humano distribuída à população do Estado do Rio de Janeiro. Em relação a Jardim Gramacho, dos rios e córregos que passam pela região não se sabe a exata qualidade de suas águas e nem o uso concreto. A água para beber em boa parte da região é retirada de água de poço. Os rios e córregos seriam usados para banho em dias de calor, incluindo uma suposta piscina relatada por moradores, a qual crê-se que deva ser o lago artificial da CEDAE, de uma antiga estação de tratamento, hoje desativada na região. Já para água subterrânea, a legislação ambiental pertinente é a resolução CONAMA 396 de 2008, que determina padrões de qualidade considerando os seguintes parâmetros: sólidos totais, metais e outras substâncias inorgânicas; hidrocarbonetos aromáticos voláteis; hidrocarbonetos policíclicos aromáticos; benzenos clorados; etanos clorados; etenos clorados; metanos clorados; fenóis clorados e não clorados; pesticidas organoclorados; bifenilas policloradas; microrganismos. A CONAMA 396/08 institui diferentes níveis de segurança de acordo com o uso dessas águas subterrâneas. Os usos inclusos na legislação são: consumo humano; dessedentação de animais; irrigação; e, recreação. Em trabalhos anteriores (Nova Gramacho, 2008), com coletas de águas subterrâneas em áreas circunvizinhas ao aterro (até 500m), foram observadas concentrações de antimônio, bário, ferro, manganês, molibdênio, chumbo, cromo, níquel, nitrogênio Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _123 amoniacal e fluoreto acima do permitido pela CONAMA 396/08. Além da presença de bactérias termotolerantes, coliformes fecais e de Escherichia coli. Propostas para curto prazo: 1) Avaliar a qualidade das águas subterrâneas utilizadas para consumo humano, nos poços, para verificar se estão de acordo com a CONAMA 396/08, oferecendo ou não risco à saúde da população e gerando ferramentas para a melhora da qualidade de vida da população. 2) Identificar os usos pela população das águas superficiais encontradas na região (em trabalho de campo foram observados alguns córregos, com indicações de presença de esgoto doméstico, além da suposta “piscina” da CEDAE) e a qualidade das mesmas. Tais medidas irão ajudar a estabelecer programas de longo médio-prazo para diminuir consideravelmente os riscos de contaminação da população por substâncias tóxicas e por microrganismos patogênicos devido ao consumo de água subterrânea e possíveis usos para recreação de águas superficiais. Propostas para médio-longo prazos: 1) Criação de poços fixos de monitoramento das águas subterrâneas, para observar possível pluma de contaminação oriunda de percolação de chorume pelo solo, alcançando a água subterrânea. Esses poços podem ser instalados pela empresa Nova Gramacho, com o intuito de manter a segurança da população, pois o chorume é de sua responsabilidade. 2) Monitoramento das águas superficiais do rio Sarapuí e Iguaçu à jusante e à montante do aterro controlado, para avaliar a influência dos resíduos do aterro nesses rios e consequentemente a Baía de Guanabara, onde ambos deságuam e onde boa parte da área do aterro entra em contato direto pela faixa de manguezal. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _124 3) Programas de saúde populacional relativos à higiene pessoal e ao uso de águas de poço para consumo humano, como por exemplo, ensinar a ferver a água ou usar filtros, para que diminua a incidência de doenças causadas por microrganismos, como diarréia. Biota: * Proliferação de vetores; * Desmatamento das áreas de manguezal e ecossistemas alagados associados; * Introdução de espécies exóticas – amendoeira, leucena, capim colonião; * Contaminação de animais como caranguejos, camarões, peixes, etc.; * Morte de árvores de mangue por contato direto com chorume. O desmatamento das áreas de manguezal e outros ecossistemas alagados foi aqui citado por ter sido ao longo do tempo um problema da região, porém nos últimos anos foram realizadas intervenções por parte da Secretaria Estadual do Ambiente para a redução do desmatamento dessas áreas. Foi construída uma cerca ao longo da interface manguezalurbanização para conter o avanço das construções e disposições ilegais de resíduo sólido neste ecossistema. A legislação pertinente à qualidade de alimento é feita pela Agência Nacional de Segurança Sanitária - ANVISA ou órgãos como a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Food and Drugs Administration (FDA), determinando padrões de qualidade considerando as concentrações de substâncias tóxicas em alimentos como metais, presença de microrganismos, entre outros parâmetros. Um exemplo é a norma RES-18, que fixou para o mercúrio de qualquer origem, ocorrente em alimentos como concomitante, as seguintes tolerâncias para peixes, crustáceos e moluscos - 0,5 ppm e para qualquer outro alimento 0,001 ppm. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _125 Em relação a Jardim Gramacho, não há estudos sobre a qualidade dos alimentos retirados pela população na região como peixes, camarões e caranguejos publicados e disponíveis para consulta. O mais próximo encontrado são estudos sobre qualidade de peixes na Baía de Guanabara. Propostas para curto prazo: 1) Para a diminuição da proliferação de vetores, a retirada do lixo e a instalação da coleta regular do mesmo em todo o bairro são necessárias como proposto anteriormente. 2) Estudo da quantidade / qualidade do pescado e caranguejos recolhidos e comercializados na região, para averiguar a sustentabilidade e viabilidade dessas atividades na região. 3) Recuperação de áreas verdes, como as de manguezal, com criação de uma criação APA – proposta que será melhor discutida no próximo capítulo. Tais medidas irão ajudar a estabelecer o equilíbrio ambiental da região, melhorando a qualidade do ar, água e solo. A reconstituição de manguezais é de suma importância para a manutenção de estoques pesqueiros, ajudando a colônia de pescadores presentes na região (Colônia do Chacrinha), além dos catadores de caranguejos. Além disso, a criação de uma APA é sempre uma nova oferta de lazer em contato com a natureza, restaurando o contato da população com o meio em que vive. Propostas para médio-longo prazos: 1) Monitoramento de aves para indicação de melhoria de qualidade ambiental. Pois quando há um reflorestamento e as aves começam a retornar ao local, antes degradado, essas aves podem se tornar dispersoras de sementes, reestabelecendo o sistema. além de atrativo para predadores, Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _126 2) Monitoramento da reprodução de caranguejos, o que ajudaria a desenhar a retirada sustentável deste alimento do sistema, garantindo o futuro da atividade no local, além de acompanhar a melhora na reprodução deste animal de acordo com a recuperação do manguezal. 3) Monitoramento do reflorestamento feito, acompanhando o crescimento de árvores, vendo necessidade de reposições de mudas, podas, entre outras atividades. 4) Monitoramento do pescado na colônia de pescadores do Chacrinha, juntamente com a revitalização da área e atualização dos profissionais, para melhorar as condições de trabalho, a distribuição dos produtos, agregar maior valor ao produto, melhorar as técnicas de pesca, etc. Recomendação geral: Boa parte dos levantamentos referentes aos estudos de contaminação ambiental, envolvendo principalmente o que concerne a saúde humana, podem ser realizados por equipes especializadas em avaliação de risco à saúde humana, utilizando metodologias como as desenvolvidas pela agência americana de meio ambiente (Environmental Protection Agency – EPA). A aplicação dessas metodologias é importante, pois a comparação pura e simples com valores recomendados nas legislações ambientais é pautada em doses de contaminantes consideradas seguras para a população em geral, mas não prevê a segurança de grupos específicos, como o que encontramos em Jardim Gramacho – catadores de material reciclável, catadores de caranguejos, pescadores, pessoas sem condições de moradia, etc. Cada grupo desses, entre outros que podem ser desenhados nos diferentes cenários apresentados no bairro, apresentarão vias de exposição diferentes, por tempos de exposição diferentes, o que irá ter como consequência doses diferentes de contaminantes sendo administradas para estes grupos. Sumarizando com um exemplo: mesmo que as concentrações em um peixe estejam menores que os 0,5ppm permitidos por lei, um Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _127 pescador que tenha sua alimentação baseada em peixe, pode consumir em média por dia 200g de peixe, enquanto uma pessoa comum consumiria 250g por semana, dando 0,36g de peixe por dia. Por fim, o cálculo da dose do pescador contará com maior quantidade de peixe ingerida, em um maior número de vezes ao dia/ano, tendo consequentemente uma dose de ingestão do mercúrio maior do que a população normal. Assim trata-se de um grupo de risco, que mesmo com concentrações de 0,02ppm de Hg no peixe, caso o consumo do mesmo fosse diário, por exemplo, este grupo estaria em risco. Por isso é extremamente recomendável que seja realizada uma avaliação de risco à saúde humana, e se possível, também o risco ecológico, para que haja uma melhor visualização do cenário ao qual a população de Jardim Gramacho está exposta, bem como gerando dados plausíveis para a gestão dos grupos que estejam em risco/perigo. 5.3 Percepção da Sociedade Nesta seção serão discutidos alguns tópicos referentes aos resultados de pesquisa de campo pertinentes ao meio ambiente. Inicialmente, é importante observar a noção de dano à saúde por morar próximo ao aterro, em especial nos domicílios com catador (Tabela 2). Quase metade dos entrevistados pensa que morar próximo ao aterro não prejudica sua saúde. Isso demonstra uma profunda associação com o trabalho, ou seja, a sua fonte de renda não é ruim para ele. Esse resultado demonstra o quão necessário um programa de saúde, com campanhas de esclarecimento, é necessário na região. Em trabalho anterior na comunidade do Rio das Pedras, pode-se observar que as pessoas nem sabiam direito identificar quais doenças elas tinham ou tiveram, muito menos como contraíram tal doença. Essa falta de esclarecimento é fatal para o estabelecimento de novas condições de vida para os moradores de Jardim Gramacho. Outra questão interessante é a percepção do cheiro do lixo (Tabela 3). Mais da metade dos domicílios com catadores respondeu que não se incomoda ou se incomoda pouco com o cheiro do lixo. Isso é biologicamente explicável, pois o organismo humano após Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _128 alguns minutos de contato com um determinado cheiro, ele se adapta a ele. Assim como nos acostumamos com o próprio cheiro, com o cheiro de um perfume predileto, etc. A explicação é simples: a manutenção do estímulo por um longo espaço de tempo leva a uma diminuição na intensidade da sensação, o que leva a adaptação. Quando os estímulos prolongados são de alta intensidade, por exemplo, um cheiro muito forte, pode ocorrer a perda por completo da sensação. Daí não se sente mais o cheiro. Assim pessoas que não ficam em Jardim Gramacho o dia inteiro, quando voltam para suas casas, sentem o cheiro novamente. Já os catadores que vivem extremamente próximos ao lixo, durante um período longo do dia, não conseguem mais perceber o cheiro do lixo ou percebem-no atenuado. Tabela 2: Percepção dos danos à saúde em relação a proximidade com o lixo Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _129 Tabela 3: Percepção quanto ao cheiro do lixo em Jardim Gramacho Outros resultados interessantes são os que relatam os materiais aos quais os catadores tem contato durante a catação do lixo (Tabela 4). Primeiramente é interessante ressaltar que por Gramacho ter sido durante muito tempo um lixão e também porque as pessoas em casa ainda não separam suas pilhas e baterias e as dispõe no meio do lixo comum (por exemplo), muitos resíduos que deveriam ir para aterros especiais ou serem incinerados, acabam sendo depositados erroneamente em aterros como o de Gramacho. Pilhas e baterias são ricas em metais tóxicos. Embalagens de agrotóxicos e combustíveis possuem resíduos de substâncias orgânicas tóxicas, algumas cancerígenas. Remédios e venenos para insetos, ratos, pulgões, etc., também podem conter substâncias tóxicas, em especial os venenos, que podem conter substâncias que atuam no sistema nervoso central. Resíduos radioativos, considerados como cancerígenos, seja em qualquer dose de exposição, podem ser provenientes de hospitais, como o próprio caso do acidente em Goiânia, quando pessoas morreram ou tiveram sequelas por causa do contato com a pele. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _130 Tabela 4: Resíduos perigosos encontrados no lixo Os resíduos hospitalares chamam bastante atenção, pois qualquer resíduo perfurocortante oriundo de hospital, sem ter sido autoclavado antes, é uma fonte de contaminação certa para os trabalhadores. Como é demonstrada na Tabela 5, a maioria dos catadores já tiveram ferimentos por objetos cortantes, incluindo perfurocortantes oriundos de hospitais. Ou seja, doenças podem ter sido propagadas por causa da catação e disposição inadequada desses resíduos. Doenças graves estão na lista das transmissíveis por se furar com perfurocortantes, em especial agulhas, visto que dentre os objetos mais comuns apontados pelos catadores como causadores de acidente estão as agulhas (Tabela 6). Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _131 Tabela 5: Acidentes sofridos durante a catação no AMJG . Tabela 6: Objetos perfuro-cortantes encontrados no AMJG Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _132 Propostas socioambientais: Está claro que a atividade de catação do modo como é realizada atualmente, além de ilegal, pois em aterros não se pode haver catação em pilha de lixo, é também uma atividade de risco, que inclui insalubridade. E após o término das atividades do aterro de Gramacho, a população demonstrou a vontade de continuar morando no bairro e arranjar novos trabalhos. Assim, dentre as propostas para a melhoria ambiental da região, podem-se destacar algumas que poderão absorver mão de obra após pouca ou média qualificação. 1) Reflorestamento da área de manguezal e de outras áreas com riscos de deslizamento de terra / movimento de massa / erosão. No programa já realizado em conjunto com o Biólogo Mário Moscatelli em uma das áreas de manguezal em Jardim Gramacho, pessoas do bairro foram capacitadas e hoje são empregadas para fazer o preparo de mudas, coleta de propágulos, poda, plantação de árvores de mangue. Se a área expandir para a criação da APA, por exemplo, muitas pessoas podem ganhar seus novos empregos com o reflorestamento e monitoramento do crescimento das mudas de mangue. Inclusive pessoas com faixa etária indicada como problemática, entre 30 e 59 anos, pois o treinamento é rápido e fácil. 2) Programas antigos como o “Guardiões dos rios” da Prefeitura do Rio de Janeiro, também podem aproveitar mão de obra do bairro para a manutenção dos córregos e rios da região, mantendo-os limpos de resíduos sólidos, ajudando a manter a arborização de suas margens, entre outras vantagens. 3) Na revitalização da atividade de pesca, incluindo pessoas encarregadas para controle do pescado (quantos quilos, quais peixes, de que tamanho, chegam à colônia), bem como na distribuição destes em mais locais, criando novas oportunidades e atraindo ex e novos pescadores para a atividade. 4) Pessoas também podem ser capacitadas para o monitoramento de espécies de aves, com um pouco mais de tempo, mas é possível, visto que muitos moradores da região gostam de aves, inclusive capturam aves selvagens para ter em casa, sendo conhecedores de nomes populares de aves. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _133 5) Formação de um grupo para combate a dengue na região, inserindo-os no quadro efetivo das pessoas que trabalham neste programa do governo, ajudando a diminuir a incidência da doença no bairro, apontada pela pesquisa de campo como uma das doenças mais frequentes nos domicílios entrevistados. 6) Formar grandes centrais de triagem de materiais recicláveis na região, absorvendo mão de obra para a triagem em si, seguida da classificação dos resíduos nos diferentes tipos de plásticos, papéis, etc. 7) Realizar programas de valorização do material triado, não sendo 100% deste material vendido diretamente do jeito que chegou ao centro de triagem, mas sim manufaturado, agregando valor ao produto, melhorando a margem de lucro. O estudo de viabilidade deve ser feito antes da implantação, mas exemplos de sucesso já são encontrados no Estado do Rio de Janeiro. Exemplo 1. Reciclagem de papel para produção do chamado “papel semente”. A idéia começou em uma cooperativa bem pequena em São Gonçalo, com apenas 4 funcionários, que eram somente catadores de papel, e que agora além de reciclar papel, tornam este produto reciclado ainda mais atrativo: entre as camadas para a formação da nova folha de papel são colocadas sementes, que não alteram a textura nem a cor do papel e que permanecem viáveis de serem plantadas durante tempo razoável. Assim a cooperativa vende seus papeis sementes para empresas que fazem convite de festas, eventos, entre outros, e as empresas ganham pois os clientes gostam da idéia de poder plantar e ter um novo ser em casa, a partir do papel que usou para infinitas atividades. Mais informações em: www.papelsemente.com.br Exemplo 2. Reutilização da garrafa PET para fabricação de vassouras e/ou camisas. Cursos de poucos dias são dados por ONGs como a Recicloteca, demonstrando um número razoável de opções para o uso da garrafa PET para compor itens utilizados em casa, escritório, etc. Pessoas poderiam ser capacitadas e agregar o valor ao PET triado. Mais informações em: www.recicloteca.org.br. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _134 O gasto necessário para implantar tais programas de triagem e reciclagem pode ser oriundo de fundos liberados para a revitalização do bairro, bem como fundos referentes a taxas de compensação pelos impactos da atividade da Nova Gramacho. Ou até mesmo bancados por empresas que tenham programas socioambientais ou que estejam em busca de um para se tornar mais competitiva no mercado, buscando certificação ambiental, por exemplo. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _135 5.4 Meio Ambiente e Ordenamento Urbano A criação do Aterro Metropolitano de Jardim Gramacho (AMJG) e o crescimento urbano desordenado do seu entorno causou uma grande transformação na região. Ao longo dos anos a expansão das áreas invadidas utilizadas para moradia e as atividades relacionadas ao aproveitamento de resíduos recicláveis aumentou os impactos ambientais na região, gerando um grande número de vazadouros irregulares, condições precárias de moradia e destruição de boa parte dos remanescentes do ecossistema de manguezal vizinho ao AMJG. São propostas, aqui, ações de curto e médio-longo prazo que visam remediar os problemas ambientais apresentados acima e que possam de alguma forma envolver a participação da comunidade, gerando uma melhoria na qualidade de vida local e, se possível, novas oportunidades de emprego. As medidas de curto prazo são, em maioria, de responsabilidade dos órgãos públicos e geram melhorias imediatas na qualidade de vida da população do bairro de Jardim Gramacho. Já as medidas de médio-longo prazo demandam um tempo maior para serem executadas, dependem de certa forma, da execução das ações de curto prazo e o sucesso delas está diretamente relacionado com a participação da sociedade. As medidas serão apresentadas abaixo de acordo com sua prioridade de execução e associada a elas está a esfera responsável por sua realização. Ações a serem realizadas em curto prazo: Implantação da cobertura vegetal da área do AMJG: tem como primeiro objetivo reduzir imediatamente a quantidade de material particulado liberado no ar e secundariamente preparar o terreno para o processo de sucessão que permite o estabelecimento de espécies vegetais arbustivas e arbóreas, sendo o processo final a implantação de um bosque ou possivelmente a criação de um grande parque público. Essa atividade se estende por um período de longo prazo, uma vez que sua conclusão depende de processos biológicos. Para iniciar o processo de fixação da cobertura vegetal, sugere-se o uso de duas técnicas, hidrossemeadura e/ou a gramagem em placas. Ambas são mais indicadas para proteção de terrenos do tipo taludes (em declive) de cortes e Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _136 aterros normalmente compostos por solos de baixa fertilidade. Antes do plantio é preciso realizar uma a devida cobertura da pilha de lixo com uma camada de solo (preferencialmente argiloso) e avaliação do solo para determinar a necessidade de melhoramento se forem detectadas deficiências na fertilidade, estabelecendo os critérios para correção da acidez, adubação primária e para o manejo. Complementando a cobertura vegetal feita por hidrossemeadura e/ou por gramagem em placas, devem ser introduzidas mudas de árvores, de arbustos e de trepadeiras alastrantes, dando continuidade ao processo de recolonização. A seleção da vegetação deve priorizar espécies nativas da flora regional com capacidade de promover melhorias na disponibilidade de nutrientes no solo e com bom potencial de cobertura do terreno. É obrigatório o acompanhamento periódico do crescimento da vegetação desde a implantação até a total consolidação. Esta atividade é de responsabilidade da concessionária que administra o AMJG, a empresa Nova Gramacho. Retirada do lixo das áreas de vazadouros, irregulares ou não, no entorno do AMJG: etapa necessária para realização de qualquer empreendimento nas áreas dos vazadouros. Ainda que essas áreas não sejam, a princípio, utilizadas no processo de revitalização do bairro de Jardim Gramacho é de extrema importância a retirada do lixo para manter condições sanitárias aceitáveis na região. Para esse processo é necessário o uso de escavadeiras e caminhões para transporte do material para local adequado. Esta atividade é de responsabilidade dos órgãos públicos. Recuperação e reflorestamento do manguezal e de áreas verdes adjacentes ao AMJG: dar continuidade ao projeto em andamento de recuperação do manguezal vizinho ao AMJG, ampliando a área de execução do projeto, permitindo assim a recuperação de uma área maior de manguezal. Além disso, sugerimos a criação de áreas verdes em alguns terrenos atualmente utilizados como vazadouros irregulares e que após a retirada do lixo não serão utilizados para um fim específico. Levando-se sempre em consideração que a escolha da vegetação deve priorizar espécies nativas. Essa atividade Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _137 pode ser uma oportunidade de geração de empregos temporários, através da capacitação de agentes para trabalharem no processo de replantio das mudas tantos nas áreas verdes como no manguezal. Esses agentes podem ser moradores e/ou antigos catadores que trabalhavam no AMJG. A contratação temporária e capacitação desses agentes poderiam ser feita por organizações não-governamentais (ONG), diretamente pelos órgãos públicos, pela empresa Nova Gramacho e/ou de responsabilidade compartilhada entre ambos. Ações a serem realizadas em médio-longo prazo: Delimitação e criação de uma Área de Proteção Ambiental (APA) na área do manguezal adjacente ao AMJG: de acordo com a Lei Federal nº 9.985 de 18/07/2000 APA é uma “área em geral extensa, com um certo grau de ocupação humana, dotada de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais especialmente importantes para a qualidade de vida e o bem-estar das populações humanas, e tem como objetivos básicos proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais.” A criação da APA permitirá a ocupação e exploração dos recursos naturais, conforme normas específicas que assegurem a proteção da unidade. Os critérios para criação da APA foram definidos pelo Decreto nº 4.340 de 22/08/2002 e prevê a participação da população local e dos órgãos públicos. Instalação de um centro de educação ambiental: a sugestão é que esse centro seja um pólo de formação e um difusor de informação para a população, oferecendo palestras, oficinas, cursos de capacitação profissional e/ou ocupação como, por exemplo, técnicas de reaproveitamento de materiais (aprendendo a transformar plástico em camisetas e vassouras), informática, corte e costura, cabeleireiro, auxiliar de cozinha, garçom, trabalhos manuais e etc. Poderia ser implementado ainda uma biblioteca, um centro de informática e uma brinquedoteca para as crianças. De acordo com os dados obtidos no diagnóstico socioeconômico, a população de Jardim Gramacho é composta predominantemente por crianças, adolescentes e adultos jovens, com idade variando entre 5 e 24 anos, a criação desse centro além de auxiliar na formação de uma população mais consciente com as questões ambientais, poderia auxiliar na formação Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _138 profissional desses jovens com a oferta dos cursos de capacitação. Além da criação do centro, acreditamos que diferentes projetos ambientais poderiam ser aplicados na região permitindo a geração de empregos locais, como o projeto de plantação de mamona para a geração de biocombustível, a plantação de hortaliças, revitalização e reestruturação de colônia de pescadores local e a criação de usinas de reciclagem. Deve-se levar em consideração que o estabelecimento de alguns desses projetos dependem da avaliação dos níveis de contaminação do solo como estabelecido pela resolução CONAMA 420/2009. Parte do financiamento para criação do centro e dos projetos poderia partir de empresas privadas e a administração e organização de ambos seriam de responsabilidade compartilhada entre órgãos de diferentes esferas. Monitoramento constante: vale enfatizar que de nada adianta a realização de qualquer uma das medidas acima, seja de curto ou médio-longo prazo, se não houver um constante monitoramento da qualidade da água, ar, solo e da biota local. O monitoramento constante é uma medida que auxilia na prevenção de acidentes como o vazamento de chorume e a liberação de gases tóxicos. Essa ação é de responsabilidade da Nova Gramacho. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _139 5.5. Aterro Metropolitano de Jardim Gramacho Após o fechamento do AMJG os impactos ambientais ocasionados pela sua atividade continuarão sendo sentidos, contudo a intensidade desses impactos dependerá do grau de eficácia da execução das medidas de mitigação que forem implementadas como condicionantes para o encerramento de suas operações. Quanto ao destino do uso da área do aterro temos como exemplo a medida adotada no Fresh Kills Park (FKP) em Nova Iorque, onde um amplo projeto de criação de um grande parque público está em desenvolvimento. O FKP possui uma área muito maior que a do AMJG e somente cerca de 45% da sua área era de fato usada para depósito de lixo. No ápice de seu funcionamento o aterro chegou a receber cerca de 650 toneladas de lixo/dia. As atividades do FKP, como aterro, foram encerradas em 2001 e a proposta de construção do parque iniciada em 2003. Contudo, somente agora cerca de quase 10 anos após o encerramento do parque o projeto começará a ser executado. O tempo do projeto como um todo até implementação final do parque está estimado em cerca de 30 anos. De acordo com o plano diretor, apenas agora as etapas de recobrimento das pilhas de lixo estão sendo finalizadas. O parque é composto por quatro pilhas de lixo, sendo que duas delas, as maiores e mais recentes, estão em fase de encerramento (ainda estão passando pelo processo de recobrimento com sedimento). As outras duas foram encerradas no meio da década de 90 e o processo de recobrimento já foi encerrado, mas continuam sendo monitoradas. Essas duas áreas mais antigas serão as primeiras a serem destinadas ao uso como área pública nos próximos dez anos (que eles consideram a primeira fase de desenvolvimento do parque). O objetivo do projeto é que o desenvolvimento do parque seja dinâmico e que as áreas de uso vão se modificando ao longo dos 30 anos de implementação. No Brasil outro exemplo parecido com FKP está sendo desenvolvido no Estado de São Paulo no Parque Villa Lobos (PVL). Contudo a realidade do terreno do PVL é completamente diferente daquela encontrada no FKP e no AMJG. Antes da instalação do PVL não havia um aterro em funcionamento, com isso, não existe um sistema de coleta Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _140 de chorume nem de metano. Para instalação do parque foi necessário apenas a remoção de entulho e avaliação dos contaminantes do solo. Ambos os casos citados acima, principalmente o do parque de Nova Iorque, parecem ser ótimos exemplos a serem seguidos no processo de encerramento do AMJG, mas para isso é necessário compromisso e interesse dos órgãos públicos em restaurar a qualidade ambiental em Jardim Gramacho e proporcionar uma melhor qualidade de vida para sua população. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _141 6. Considerações finais Com o objetivo de servir como base de dados para a elaboração de uma estratégia integrada de desenvolvimento para Jardim Gramacho, este documento reuniu informações acerca dos aspectos socioeconômicos e infraestruturais do bairro e de seus habitantes. Nesta seção, as informações relevantes para a construção de um plano de ações estão organizadas de acordo com as três grandes áreas de atuação para este projeto: 1. Geração de Trabalho e Renda; 2. Educação, Saúde, Segurança e Assistência Social; 3. Infraestrutura Habitacional e Urbana. Assim, estas temáticas deverão, como grupos de trabalho, orientar as ações dos atores envolvidos no território, a fim de que sejam convergentes entre si e que atendam as demandas específicas dos moradores do bairro e, dentre eles, o grupo de maior vulnerabilidade social e financeira – os catadores de materiais recicláveis. 6.1 Geração de Trabalho e Renda O primeiro aspecto do bairro analisado pelo diagnóstico são as pirâmides etárias dos moradores e dos catadores que, conforme se verificou, são relativamente jovens, especialmente a dos últimos. Apesar disto indicar um baixo desenvolvimento socioeconômico no território, estas pirâmides também apontam para o potencial impacto que teriam medidas educacionais e treinamentos/capacitações profissionais. Por morarem muitas crianças no bairro, sejam filhas de catadores ou não, a razão de dependência é alta. Isto significa que, para que estas crianças tenham qualidade de vida é necessário que a sua renda familiar seja alta e que os serviços públicos como creches e escolas sejam de acessíveis. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _142 Em Jardim Gramacho, porém, a renda domiciliar per capita é baixa, sendo a média do bairro R$ 372 reais mensais e dentre os catadores R$ 311,00 reais mensais (21% inferior). Sendo assim, 42,4% dos domicílios do bairro encontram-se abaixo da linha da pobreza e 16,4% abaixo da linha da indigência.20 Os catadores se encontram em situação ainda pior: 50% de seus domicílios são considerados pobres e 18%, extremamente pobres ou indigentes. A baixa renda do bairro, no entanto, não é devida ao desemprego, mas à precariedade dos postos de trabalho, seja porque são informais e inconstantes, seja porque o salário ou renda proveniente destes são baixos. Em um universo de 6 mil pessoas economicamente ativas em Jardim Gramacho, 21% são catadores (cerca de 1.190 pessoas). Estes catadores vivem em 841 domicílios com aproximadamente outros 2.400 familiares. Sendo assim, o impacto do encerramento do AMJG será enorme e agravará drasticamente o quadro da pobreza no bairro. Uma vez fechado o aterro, não haverá mais a renda da catação para aqueles que dependem dela. Quase a totalidade dos catadores (97%) exerce apenas esta atividade econômica e em seus domicílios, a renda proveniente da catação compõe, em média, 65% da renda domiciliar. Assim, o percentual de catadores pobres irá subir de 50% para 87% e o percentual de extremamente pobres irá de 18% para 68%. Em termos de número de pessoas, com o aterro funcionando, são 1.771 pessoas em situação de pobreza: 1.126 que são considerados pobres e 645 considerados extremamente pobres. Com a desativação do AMJG, o número de pessoas em situação de pobreza aumentará para 3.113, dos quais 662 serão considerados pobres e 2.451, extremamente pobres. Nesse caso, serão necessárias ações emergenciais de transferência de renda, que visem ter impacto direto e que sejam complementares ao Programa Bolsa Família, tendo em vista que o valor da bolsa não seria o suficiente para aliviar a pobreza e extrema pobreza em Jardim Gramacho. 20 Linha de pobreza é de R$ 236,20 per capita mensais e a linha da indigência é de R$ 118,10 (outubro/2010 - IBGE-IPEA-CEPAL). Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _143 Apesar desta necessidade imediata de programas assistenciais de renda, o projeto visa realizar ações de médio e longo prazos com o objetivo de emancipar a população pobre de suas necessidades por assistência direta, almejando, portanto, fazer com que sejam capazes de manter sua qualidade de vida com a renda de seu trabalho. Para tornar isso possível, é preciso pensar em alternativas para gerar trabalho e renda uma vez que o aterro fechar. Dentre os catadores, a pesquisa confirmou que a grande maioria optou por esta atividade por falta de oportunidade de ingressar em outro emprego. Isto também transparece na opção de 70% dos catadores em procurar outro emprego depois que o AMJG encerrar. Assim, 69% demonstraram interesse em fazer capacitações e treinamentos profissionais para se reinserir no mercado de trabalho. A princípio, os catadores declararam que teriam poucas horas semanais para se dedicar a capacitação. Por outro lado, outra opção seria seguir na atividade da catação e trabalhar junto às cooperativas na triagem e na coleta seletiva. No entanto, ficou comprovado na pesquisa que apenas 15% dos catadores são cooperativados e, dos que não são, apenas 8% tem intenções em ingressar neste tipo de associação e continuar trabalhando com materiais recicláveis. Outro aspecto que afeta a geração de trabalho e renda é a alta incidência de informalidade no bairro. Apenas 35% dos ocupados do bairro possuem emprego com carteira assinada e mais da metade (52%) dos ocupados trabalha sem carteira assinada ou conta própria. A atividade de empregador é ínfima, o que indica a baixa oferta de empregos locais. Por fim, o maior desafio a ser enfrentado no âmbito da geração de trabalho e renda é a baixa escolaridade dos catadores. Apenas 7,8% possuem Ensino Fundamental completo e 2,1%, o Ensino Médio. A grande maioria, portanto, pode ser considerada analfabeta (20% nunca estudaram) ou analfabeta funcional (30% dos que estudaram não chegaram a completar 4 anos na escola). Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _144 6.2 Educação, Saúde, Segurança e Assistência Social Conforme citado, o nível educacional de Jardim Gramacho é baixo, especialmente entre os catadores de materiais recicláveis. No entanto, há sinais de melhora. Adolescentes de 15 a 18 anos já alcançaram a população adulta em anos de estudo e jovens entre 19 e 24 anos, ultrapassaram esse patamar e chegam a possuir, em média, 8,1 anos de estudo. Sendo assim, as ações educacionais no bairro devem se voltar para a manutenção destes jovens na escola (especialmente no Ensino Médio, onde há maior evasão) e, em longo prazo, devem incentivar o ingresso dos jovens que completarem o Ensino Básico no Ensino Superior. Quanto aos adultos com baixa escolaridade, os interessados em estudar podem ingressar na Educação de Jovens e Adultos (EJA) que é oferecida em duas escolas do bairro. No entanto, como muitos trabalham, seria mais interessante que fossem ofertados cursos curtos de capacitação para aprimorar capacidades básicas como a escrita, a leitura, a fala e o raciocínio ou de treinamento profissionalizante. Foram identificadas muitas demandas não satisfeitas em relação à prestação do serviço de educação pública no bairro. Garantir o transporte escolar e oferecer mais vagas em creches são as principais necessidades. Neste sentido, a oferta de creches se torna central para a geração de trabalho e renda, tendo em vista que a incidência de famílias monoparentais femininas em Jardim Gramacho é relativamente alta (20% dentre catadores e 16% no restante do bairro). Quanto à saúde, o Programa Saúde da Família (PSF) tem cobertura abrangente no bairro, especialmente dentre os domicílios dos catadores. No entanto, apesar desta abrangência e da existência de um posto de saúde em Jardim Gramacho, ainda há questões graves de saúde a serem resolvidas. Conforme mostrou a pesquisa realizada, as unidades de saúde mais procuradas pelos moradores do bairro são os hospitais. Mesmo com a inauguração de um novo hospital relativamente próximo à Jardim Gramacho em distância (que fica à alguns Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _145 quilômetros do bairro na Rodovia Washington Luiz), o tempo de deslocamento para este ou para outros hospitais ainda é muito longo. O acesso rápido à hospitais públicos é essencial – especialmente porque apenas estas unidades de saúde prestam certos tipos de atendimento, como o emergencial. Além disso, Jardim Gramacho não tem acesso fácil a nenhuma unidade de saúde que seja 24 horas. À noite, o tempo de deslocamento logicamente aumenta, com a menor frequência dos veículos de transporte público. A saúde no bairro, devido aos impactos do AMJG na água, ar e solo, deve ser tratada com extrema atenção para que as ações atendam às necessidades específicas dos moradores. Além de ações infraestruturais, também é recomendável que se façam campanhas de conscientização acerca de medidas preventivas que melhoram a qualidade de vida e da saúde. Apesar de o AMJG estar encerrando, as doenças ligadas ao contato direto com o lixo não se vão meramente desaparecer. Muitas delas são transmitidas pela água (parte significante dos moradores que não catam utilizam poço ou nascente) e por exposição ao esgoto (cuja precária infraestrutura será comentada a seguir). Em relação à segurança pública, esta é praticamente inexistente em Jardim Gramacho. Além do levantamento não ter identificado nenhum posto de polícia dentro do bairro, a pesquisa realizada apontou para o enorme tempo de deslocamento entre os domicílios e a unidade de policiamento mais próxima (40 minutos). As situações de risco (roubos, furtos, ameaças, violências) não são excepcionalmente recorrentes, apesar de acontecerem mais dentre os catadores do que o restante dos moradores de Jardim Gramacho. No entanto, o policiamento traz ordem e sentimento de segurança para o bairro – o que dificultaria, por exemplo, a proliferação de vazadouros clandestinos de lixo, e melhoraria o sentimento generalizado de insegurança que existe no bairro. Por fim, a assistência social prestada para os habitantes de Jardim Gramacho está aquém de seu potencial. Apesar de notícias recentes da proximidade da inauguração da Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _146 nova sede do Centro Regional de Assistência Social (CRAS), este continua a dividir espaço com o PSF no bairro. O CRAS é responsável por cadastrar moradores elegíveis para benefícios de programas governamentais e por prestar assistência social direta em nível local. No entanto, o Programa Bolsa Família é muito mal alocado no bairro, beneficiando muitas famílias que não preenchem os critérios de elegibilidade e deixando de beneficiar tantas outras que deveriam estar recebendo a bolsa. O desafio em relação à assistência social no bairro é que, uma vez fechado o aterro, ela se fará muito necessária. No entanto, não há indícios de que o CRAS ou outro órgão que preste esse serviço estejam preparados ou aparelhados para suprir estas demandas. 6.3 Infraestrutura Habitacional e Urbana Apesar de haver, em Jardim Gramacho, pouca desigualdade em renda entre seus moradores, há, indiscutivelmente, uma enorme discrepância em infraestrutura habitacional e equipamentos básicos como redes gerais de água canalizada, luz elétrica e esgoto. Primeiramente, como já foi reiterado durante o documento, as áreas de maior carência infraestrutural se encontram às margens do bairro, próximas ao manguezal e ao AMJG. Estes assentamentos precários de ocupação recente surgiram e cresceram junto com o aterro e abrigam, sobretudo, catadores de materiais recicláveis. Assim, apesar do acesso à água, luz e esgoto não ser universalizada nem mesmo entre os moradores que não catam, este é especialmente restrito aos catadores do bairro. Um dado que aponta para isso claramente é que 7,5% dos domicílios dos catadores (cerca de 60 residências e 250 pessoas) sequer possuem banheiro. Neste sentido, a diferença em acesso à rede geral coletora de esgotos, entre domicílios com catadores e o restante, é enorme. A rede oficial de escoamento chega a pouco mais de ¼ dos domicílios com catadores de materiais recicláveis enquanto mais de 80% do restante do bairro é atendido por este serviço. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _147 Em aproximadamente 40% dos domicílios com catadores, o escoamento sanitário é feito em valas a céu aberto ou despejado em rio, lago ou mar, expondo todos moradores à uma série de elementos prejudiciais à saúde. Em relação ao abastecimento de água, os dados também são impressionantes. Em todo o bairro, apenas metade dos domicílios tem acesso à rede geral e canalização, sendo que destes, cerca de 5% a rede geral abastece apenas a propriedade ou terreno (fora da casa). Dentre os domicílios de catadores, apenas 38,2% tem acesso à água canalizada da rede geral e, por isso, 23% deles ainda dependem da bica comunitária para ter acesso a este bem necessário. Conforme mencionado acima, no bairro cerca de 1/3 dos domicílios é abastecido via poço ou nascente, o que aponta para a qualidade da água como um determinante para as condições de saúde dos moradores do bairro. Quanto ao fornecimento de luz elétrica às residências, apenas 71,1% dos domicílios em Jardim Gramacho têm acesso à rede elétrica oficial. Nas residências com catadores, esta porcentagem cai drasticamente para 23%, indicando que há possivelmente fontes informais e ilegais de energia elétrica. Apesar da proximidade ao AMJG, a coleta de lixo não é universalizada no bairro e menos ainda dentre os domicílios dos catadores. Parte do projeto de reverter o passivo ambiental e social de Jardim Gramacho é tornar esta política pública em algo exemplar. A realização de uma coleta de lixo universal no bairro, portanto, é um importante detalhe. Além disso, outras questões de ordem urbana também precisam ser solucionadas como a pavimentação de ruas, a iluminação pública, a nomeação e numeração de ruas, entre outros. Logicamente, os principais focos de ações relacionadas a infraestrutura habitacional e urbana devem ser os assentamentos precários do bairro. Neles, a estrutura é bem mais rústica do que a dos domicílios sem catadores. De fato, em mais de 1/3 dos domicílios de catadores o piso é de material não durável (sendo 97% de terra batida) e em 31,2% deles as paredes externas não são de alvenaria/tijolo nem de madeira Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _148 aparelhada – em 95% destes as paredes são de palha ou madeira aproveitada. Em 10,7% dos domicílios com catadores de materiais recicláveis a cobertura do imóvel é de zinco ou madeira aproveitada. As questões de infraestrutura, portanto, são um verdadeiro desafio para o Poder Público no território. Apesar de serem necessários obras e gastos públicos para resolver as questões de abastecimento de água, luz e esgoto, além da oferta de moradias populares, estas medidas são absolutamente necessárias para que haja qualidade de vida no bairro. Em suma, a elaboração de um plano de ações estratégico deverá levar em conta as informações contidas neste relatório para otimizar o trabalho dos atores públicos e privados envolvidos neste projeto e para gerar resultados satisfatórios para os moradores de Jardim Gramacho. Estratégia de Desenvolvimento de Jardim Gramacho – Diagnóstico Socioeconômico _149 7. Bibliografia ABREU, I. M. Avaliação geoquímica, biológica e ecotoxicológica dos sedimentos da Baía de Guanabara – RJ. (Tese de doutorado.) Departamento de Geoquímica. 2009. AMATO, C. D.; TORRES, J. P. M.; MALM, O. DDT (dicloro tricloroetano): toxidade e contaminação ambiental- uma revisão. Quim Nova, Vol. 25, nº 6, 995-1002, 2002. BASTOS, Valéria e ARAÚJO, Maria Stela de. Possibilidades e Limites do Trabalho de Organização Social dos Catadores de materiais recicláveis do Aterro Metropolitano do Jardim Gramacho. Construtora Queiroz Galvão S.A. - Programa Social do Aterro Metropolitano do Jardim Gramacho. Duque de Caxias, 1998. 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Anexos Anexo I – Plano Urbanístico Esquemático Anexo II – Anexo do Levantamento Secundário Anexo III – Anexo Estatístico