Abril/Maio/ Junho - 2010 Encarte especial Parte Integrante do Jornal do CRC-PA Ano 2 • Nº 5 Valter Barbosa Guimarães Júnior* Mudanças na Contabilidade aplicada ao setor público O Brasil passou por várias crises econômicas e, só a partir do Plano Real, passou a trilhar o caminho da estabilidade. Neste processo, o orçamento unificado – fiscal, da seguridade social e de investimento das empresas estatais – desempenhou papel fundamental no planejamento e controle das finanças públicas, tanto que passou a ser confundido como a própria contabilidade pública. Como resultado, tem-se a cultura orçamentária sólida e a contabilidade aplicada ao setor publico frágil. O Conselho Federal de Contabilidade – CFC não tem medido esforços para o desenvolvimento de um referencial teórico e prático para a Contabilidade aplicada ao setor público brasileiro, que permita aos contabilistas ocuparem seus espaços e obterem reconhecimento nesta área específica. Para que isso ocorra é necessário que atuem como instrumentalizadores dos gestores públicos na busca da eficiência, da eficácia e da economicidade e transparência que permita à sociedade o efetivo controle da coisa pública. Atento ao que ocorre em nosso tempo, o CFC não quer mudar por mudar, mas busca também a adoção de padrões de comparabilidade entre a Contabilidade Brasileira e a Internacional. O cenário atual remete à gestão pública para a governança que, segundo o IFAC (2001), “é o sistema pelo qual as organizações são dirigidas e controladas”. Nela, os cidadãos definem as regras que os gestores devem seguir na gestão dos recursos para o atendimento das demandas da sociedade. Estas regras buscam a transparência como forma de incentivar o comportamento voltado para o espírito público, que iniba a ação dos que se julgam donos da informação e do próprio patrimônio público. Em consonância com o exposto, não há como se falar em boa governança sem uma Contabilidade baseada em teorias corretamente interpretadas. Neste sentido, a Contabilidade aplicada ao setor público, finalmente, despertou para a necessidade de fortalecer, ou melhor, “implementar” a Contabilidade Patrimonial. Trata-se da volta às suas origens, pois o enfoque patrimonial da Contabilidade aplicada ao setor público data da época da chegada da família real ao Brasil, que * Contador, mestre em Controladoria e Contabilidade e docente do Ensino Superior. Conselheiro e vice-presidente de Controle Interno do CRC-PA, no período de 2006-2009. foi abandonada, segundo estudos do Professor Lino Martins, com a Proclamação da República. Cabe ressaltar que interpretações equivocadas da lei 4.320/64 têm prejudicado a eficácia da Contabilidade, pois, segundo o Professor Heraldo Reis, “o regime de caixa tem provocado distorções nas receitas governamentais, posto que não possibilita a visualização integral do seu volume no exercício. É, sem dúvida alguma, uma distorção gravíssima de entendimento que se reflete na informação sobre a gestão financeira e sobre o desempenho tributário da entidade governamental. Sobre o mesmo tema, Selene Peres Nunes (2009), revela que “há uma grande confusão entre Contabilidade e Orçamento, pois ambos têm aspectos que os diferenciam: a) orçamento Público - instrumento de gestão com foco nos fatos que se relacionam diretamente com os fluxos financeiros da entidade e tem conceitos, critérios e regimes próprios; b) contabilidade pública - registra e demonstra os atos e fatos da Administração Pública, com enfoque no patrimônio e suas variações, bem como demonstra a execução do orçamento.” Depreende-se então que o foco da Contabilidade deve estar nos atos e fatos que alteram ou tem o potencial de alterar o patrimônio, independente de autorização da lei. A Contabilidade deve demonstrar o patrimônio tal como se apresenta, mesmo que o gestor tenha praticado atos que contrariem às leis, como executar despesas sem existência de disponibilidade financeira, pois o patrimônio foi alterado. Para reforçar a necessidade da Contabilidade corretamente aplicada sob a égide das bases teóricas, existe o firme propósito de levá-la à convergência com as normas internacionais de Contabilidade aplicadas ao setor público as IPSAS, a partir de 2012, permitindo a sua comparabilidade com a praticada em outros países. Para tal, alguns passos foram decisivos, dentre os quais destacamos: a) A aprovação do apêndice II da resolução 750/93, que da interpretação aos Princípios Contábeis sob a perspectiva do Setor Público; c) A emissão da Portaria MF 184, de 25.08.2009, que dispõe sobre diretrizes necessárias para a convergências às normas internacionais; b) A edição das dez primeiras normas brasileiras de Contabilidade, técnicas aplicadas ao setor público: NBC T 16.1 – Conceituação, objeto e campo de aplicação. NBC T 16.2 – Patrimônio e Sistemas Contábeis. NBC T 16.3 – Planejamento e seus instrumentos sob o enfoque contábil. NBC T 16.4 – Transações no Setor Público. NBC T 16.5 – Registro Contábil. NBC T 16.6 – Demonstrações Contábeis. NBC T 16.7 – Consolidação das Demonstrações Contábeis. NBC T 16.8 – Controle Interno. NBC T 16.9 – Depreciação, Amortização e Exaustão. NBC T 16.10 – Avaliação e Mensuração de Ativos e Passivos em Entidades do Setor Público. d) A assinatura do Decreto 6.976 reconhece a STN competente para atualizar os anexos à Lei 4.320/64 e da observância obrigatória dos Princípios de Contabilidade; Neste processo de mudança, não podemos esquecer que existe o enfoque orçamentário solidificado no setor público - em função da prioridade a ele dispensada há vários anos - e que não podemos cair no mesmo erro cometido de priorizarmos a Contabilidade Patrimonial , abandonando o aprendizado orçamentário. Os dois deverão e) A divulgação dos manuais de Contabilidade aplicados ao setor público brasileiro; f) A divulgação do novo PCCASP – Plano de Contas aplicado ao Setor Publico a ser utilizado por União, Estados, Distrito Federal e Municípios; g) A discussão do Projeto de Lei que substituirá a Lei 4.320/64 – PLS 249/2009 do Senador Casagrande. h) A tradução das primeiras 31 IPSAS – International Public Sector Accounting Standard. coexistir e complementarem-se. Para alcançar os seus objetivos, o CFC firmou várias parcerias com órgãos federais, estaduais e municipais – em especial com Secretaria do Tesouro Nacional-STN, além das universidades, buscando a formação de multiplicadores para formar, até o final de 2011, dez mil profissionais do setor público.