SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO ACÓRDÃO Processo n.º 602/06 Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1 - XXXXXXXXXXX, impugnou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga um despacho do Senhor Director da Alfândega de Viana do Castelo que decidiu não existir dever de decisão, relativamente a um pedido de revisão de uma liquidação de Imposto Automóvel. Por despacho do Meritíssimo Juiz foi decidido que o processo seguiria os termos do processo de recurso contencloso e nao de processo de Impugnaçao judicial (fls. 102). Na sentença, aquele Tribunal veio a conceder provimento ao recurso contencioso. Inconformada a Fazenda Pública interpôs o presente recurso para este Supremo Tribunal Administrativo, apresentado alegações em que concluiu da seguinte forma: É extemporâneo o pedido de revisão do acto de liquidação "sub judice "; Deve ser extinta a instância por impossibilidade superveniente da lide, uma vez que prescreveram os prazos para efectuar o reembolso de imposto; Não foram apresentadas contra-alegações. O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer nos seguintes termos: O recurso merece provimento, nos termos de jurisprudência pacífica da Secção, tirada em numerosos casos idênticos (cfr. além da citada nas alegações de recurso, os de 8.3.06, r. 1154/05 e de 26.4.06, r. 86/06. Corridos os vistos legais, cumpre decidir. 2 - Na sentença recorrida deu-se como assente a seguinte matéria de facto: 1. A liquidação em questão, de imposto automóvel sobre o automóvel adquirido, usado, no estrangeiro, pela recorrente; data de 16.12.96 - processo apenso; 2. A recorrente pediu a revisão dessa liquidação em 07.12.01 - processo apenso; 3. O despacho em questão, de 10.12. 01, e do teor de fls. 59, sendo aqui dado por reproduzido para todos os efeitos. 3 - A primeira questão que é objecto do presente recurso jurisdicional é a de saber se é extemporâneo o pedido de revisão do acto tributário apresentado pela Recorrente contenciosa. Como bem refere o Excelentíssimo Magistrado do Ministério Público, a jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a formar-se no sentido de às receitas liquidadas pelos serviços aduaneiros antes da entrada em vigor da LGT ser aplicável o prazo de três anos previsto no art. 236.º do Código Aduaneiro Comunitário. ( 1 ) A liquidação cuja revisão foi pedida foi efectuada em 1996, quando vigorava o CPT. O CPT, em matéria procedimental, aplicava-se dlrectamente apenas aos procedimentos tributários da competência da Direcção-Geral de Impostos, como evidenciam as várias referências que são feitas às repartições de finanças, direcções de finanças e à Direcção-Geral de Impostos (por exemplo, os arts. 2.º, alínea d), 39.º, n.ºs 1 e 2, 46.º, n.ºs 1 e 3, 62.º, 62.º-A, 67.º, n.º 3, 98.º, n.ºs 1 e 2, 99.º, n.º 1 e 2, 101.º, 109.º-A, n.º 2, 110.º, n.º 5). Assim, relativamente às liquidações efectuadas pelas alfândegas, continuou a aplicar-se o regime de reembolso previsto no art. 101.º da Reforma Aduaneira, aprovada pelo DecretoLei n.º 46311, de 27 de Abril de 1965, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 244/87, de 16 de junho, que estabelecia que «o reembolso ou a dispensa de pagamento de quaisquer imposições que não constituam recursos próprios ou direitos residuais regula-se pelas disposições da regulamentação comunitária em vigor». A expressão «recursos próprios», usada no direito comunitário, reporta-se aos recursos próprios comunitários. Inicialmente, à semelhança das outras organizações internacionais, o orçamento comunitário dependia das contribuições financeiras dos Estados-Membros. Na sequência da decisão de 21 de Abril de 1970, as contribuições dos Estados-Membros foram substituídas por recursos próprios. Esta expressão designa as transferências efectuadas pelos Estados-Membros para o orçamento comunitário, com vista a cobrir o financiamento das despesas da União Europeia. (2) A expressão "direitos residuais” reporta-se aos direitos aduaneiros que continuaram a poder ser cobrados por Portugal, após a adesão e na fase de transição, relativos às trocas comerciais entre Estados-Membros da Comunidade Europeia. Assim, o alcance do referido art. 101.º, na redacção referida, que se reporta à actividade da Administração Aduaneira, é o de aplicar o regime comunitário sobre reembolso a quantias cobradas pelos serviços alfandegários relativas a tributos que não constituam recursos próprios nem direitos residuais, como é o caso do Imposto Automóvel. (3) O reembolso, no âmbito do CAC, consubstancia-se na «restituição total ou parcial dos direitos de importação ou dos direitos de exportação que tenham sido pagos», podendo ter por fundamento ilegalidade da liquidação, como se infere do n.º 1 do art. 236.º do mesmo Código, pelo que assume a função procedimental que no CPT foi atribuída ao instituto da revisão oficiosa do acto tributário, sendo de aplicação preferencial em relação a este, relativamente a liquidações efectuadas pelos serviços aduaneiros, por se tratar de um regime especial e por o CPT não estar vocacionado para aplicação directa às liquidações aduaneiras. Assim, ao reembolso do Imposto Automóvel liquidado em 1996 aplica-se o regime de reembolso previsto no art. 236.º, n.º 2, do CAC, que se traduz em o pedido dever ser apresentado até ao termo do prazo de três anos a contar da data da comunicação ao devedor das quantias apagar. Por outro lado, embora a LGT tenha vindo a alargar o prazo de revisão do acto tributário para 4 anos (art. 78.º, n.º 1), o regime nela previsto apenas é aplicável aos factos tributários ocorridos a partir de 1-1-1998, como se estabelece no n.º 6 do art. 5.º do Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro. ( 4 ) No caso em apreço, a liquidação e pagamento do Imposto Automóvel em causa ocorreu em 1996, pelo que, sendo o pedido de revisão (reembolso) apresentado em 2001, é de concluir pela sua extemporaneidade. Assim, estando ultrapassado o prazo legal para a revisão do acto tributário, o Senhor Director da Alfândega de Viana do Castelo não tinha o dever legal de decidir [art.º 56.º, n.º 2, alínea b), da LGT], pelo que a sua decisão, proferida no despacho que consta de fls. 59, tem fundamento legal. Por isso, o recurso contencioso não pode ser provido. 4 - Sendo decidido que o recurso improcede, carece de qualquer relevância a apreciação da questão da prescrição, suscitada pela Fazenda pública no presente recurso jurisdicional, pelo que fica prejudicado o seu conhecimento. Termos em que acordam em - conceder provimento ao recurso jurisdicional; - revogar a sentença recorrida; - negar provimento ao recurso contencioso. Custas pela Recorrente contenciosa, apenas na 1.ª instância (uma vez que não contraalegou), com taxa de justiça que se fixa em 150 euros e 50% de procuradoria. Lisboa, 20.09.2006 Jorge de Sousa – Relator Baeta de Queiroz Pimenta do Vale (1) Neste sentido, podem ver-se os seguintes acordãos: - de 8-3-2006, recurso n.º 1154/05; - de 5-4-2006, recurso n.º 62/06; - de 26-4-2006, recurso n.º 86/06. (2) Sobre este conceito, podem ver-se o Glossário de termos relativos à construção europeia e às instituições e actividade da União Europeia e o art. 1.º da Decisão do Conselho n.º 2000/597/CE, de 29-9-2000, publicada em jornal Oficial, L 253/42, de 7-10-2000. (3) Nos termos do art. 1.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 40/93, de 18 de Fevereiro, "O imposto automóvel (IA) é um imposto interno incidente sobre os vefculos automóveis ligeiros de passgeiros» Por outro lado, trata-se de um tributo que não se inclui entre os recursos próprios comunitários indicados na Decisão n.º 94/728/CE, da Comissão, de 31-10-1994, publicada em jomal Oficial L 293, de 12-11-1994, página 9, nem na posterior Decisão n.º 2000/597/CE, já citada. (4) Aliás, este regime de revisão do acto tributário previsto na LGT apenas poderia ser aplicável até à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 472/99, de 8 de Novembro, que veio dar nova redacção ao art. 101.2 da Reforma Aduaneira, mantendo a remissão para o regime comunitário: "Quando, em consequéncia do mesmo Facto tributário, forem devidos direitos de importação e outros impostos a cobrar pela alfándega, observar-se-á o disposto na regulamentação comunitária, designadamente no que respeita ao prazo de caducidade do direito à liquidação, à cobrança a posteriori, ao reembolso e à dispensa do pagamento».