Carlota Pimentel – Contrato de Leitura Armando César Côrtes-Rodrigues 1 Contrato de Leitura Carlota Pimentel Armando César Côrtes-Rodrigues O poeta que fez da ilha um universo 1891 — 1971 5 O principal desafio deste projecto foi escrever um caderno biográfico, que, na forma, se assemelhasse aos publicados semanalmente pelo Jornal Público, escolhendo, no entanto uma personalidade de relevo para a sociedade portuguesa. Por outro lado, o propósito original deste e de outros trabalhos por nós elaborados é o de dar cumprimento ao Contrato de Leitura estabelecido no início do ano lectivo de 2007/2008, entre os alunos do 10.º F e o professor de Língua Portuguesa, Pedro Medeiros, da Escola Secundária Domingos. Este pequeno livro explora a vida e obra de Armando César Côrtes-Rodrigues, um poeta nascido em Vila Franca do Campo, nos finais do século XIX, falecido há pouco mais de 30 anos e que muitos jovens açorianos desconhecem completamente. 6 2 7 Prólogo 8 3 4 9 Armando Côrtes-Rodrigues deve ser um dos ilhéus mais conceituados de sempre. Nasceu em Vila Franca do Campo, no ano de 1891, e tornou-se um dos maiores escritores portugueses do século XX. A sua obra leva-nos a percorrer vastas áreas do saber, como por exemplo a literatura, a investigação Quadro rústico micaelense A Côrtes-Rodrigues e a informação. No entanto, se tivéssemos de salientar uma constante na sua vida, seria, sem dúvida, o seu amor pela Ilha. O reconhecimento e amizade dos seus conterrâneos inúmeras valeram-lhe homenagens e Trazem ao ombro o sacho prateado Os camponeses, de regresso aos lares. As aves voam no espaço aos pares E o ar tem um aroma perfumado. A enxada é brasão aureolado De nobreza de feitos singulares, Do trabalho por campos e pomares Deste nosso torrão abençoado. Comem o podre caldo alegremente E agradecendo a Deus a refeição, Conversam à luz branda da lareira. Rezam depois uma oração fervente E na serena paz do coração Dormem a sono sôlto a noite inteira. João Hickling Anglin dedicatórias. 10 5 11 Armando Côrtes-Rodrigues breve biografia 12 6 13 O homem Armando César CôrtesRodrigues nasceu a 28 de Fevereiro de 1891, em Vila Franca do Campo, S. Miguel, 7 Açores. Formou-se em Filologia Românica pela Faculdade de Letras de Lisboa e colaborou, com Fernando Pessoa, Almada Negreiros, entre outros, nos primeiros números da Revista Orpheu. Regressou a São Miguel em 8 1917, dedicando-se ao ensino, à escrita e à sua terra. 9 1 14 O berço Filho do poeta, médico e co-fundador do Instituto de Vila Franca, António César Rodrigues, e de Maria Ernestina Botelho de Gusmão CôrtesRodrigues, pode-se dizer que teve um início de vida triste, já que ficou órfão de mãe ao nascer. 11 12 15 Os seus amores Casou com Laura Sofia Botelho de Gusmão, com quem teve três filhos – Luís Filipe Botelho Gusmão Côrtes- Maria Ernestina Botelho Gusmão Côrtes- Rodrigues e Manuel Botelho Gusmão Rodrigues, Jorge 13 Côrtes- Rodrigues. 14 16 Estudos e carreira académica No início, ainda jovem, frequentou o Colégio Fisher e fez os seus estudos liceais em Ponta Delgada, revelando já nos seus tempos de adolescência um gosto especial pela escrita. Deixa os Açores, em 1910, para terminar os estudos liceais e superiores no continente. Em 1915, concluiu a sua licenciatura em Filologia Românica pela Faculdade de Letras de Lisboa, regressando dois anos mais tarde a São Miguel, onde exerceu as funções de professor. Nos sete anos que passou no continente, estabeleceu contactos e fez amigos importantes no seio da mais importante geração artístico-literária do século XX (a do primeiro Modernismo, a do Orpheu). 1 1 17 A arte da escrita Autor da primeira geração do Modernismo português, colaborou, ao lado de Pessoa, Mário de Sá-Carneiro e Almada Negreiros, nos dois únicos números da revista Orpheu. 17 1 No primeiro número publicou um conjunto de poemas da sua autoria e, no segundo, influenciado pelos heterónimos pessoanos, criou o pseudónimo feminino Violante de Cysneiros, com o qual assinou diversos poemas, também não se mostrando indiferente, na sua poesia, aos movimentos criados pelo génio de Pessoa, o interseccionismo e o paúlismo. Em 1916, colaborou numa outra revista desse primeiro surto modernista em Portugal, a revista Exílio. Tornou-se desde logo visível a sua adesão 18 ao movimento do integralismo lusitano, de António Sardinha, e a um sentimento religioso extremado que não deixou de estar presente em toda a sua futura obra poética. Manteve uma forte ligação com Fernando Pessoa, com quem se correspondia regularmente. Embora partilhassem muitas ideias, os seus caminhos foram diferentes, já que na poesia de Côrtes-Rodrigues se nota muito mais a influência da cultura popular e da etnografia açoriana. Para este poeta, o universo começava na sua pequena Ilha e dela, das suas gentes e tradições, colhia toda a inspiração necessária. Importa salientar, ainda, o forte pendor religioso que marcou a sua vida e a sua obra, à imagem do que acontece com a generalidade dos açorianos. A minha tendência para o Povo – confessou Côrtes-Rodrigues a Eduino de Jesus – vem por uma afinidade de coração (sentir sempre a poesia da pobreza e dos pobres, talvez pela minha formação franciscana inicial) e por uma necessidade de evasão. Dr. F. Carreiro da Costa 19 A partir dos anos 40 ensaiou uma nova colaboração com algumas revistas poéticas: Presença, Cadernos de Poesia e Atlântico. Em 1953, o seu livro de poemas Horto Fechado e Outros Poemas (1953) recebeu o prestigiado Prémio Antero de Quental. 20 «Há três coisas que contam na vida: — Ler Poesia! — Escrever Poesia! — Viver em Poesia!» Daniel Rops 21 A ilha e as tradições 19 20 21 Quando regressei a São Miguel – escreve ainda Côrtes-Rodrigues – voltou essa tendência a renascer e daí o começo do Cancioneiro Popular na minha convivência quase diária com essa boa gente, que trago ainda no coração : a tia Marquinhas Pereira, que era tecedeira e escrevia na parede o primeiro verso das quadras que lhe lembravam para me dizer quando chegasse, todos os que figuram na minha peça O Milhafre… E tantos outros de quem seria longo falar. Armando Côrtes - Rodrigues Terminada a aventura do Orpheu, Armando Côrtes-Rodrigues dedicou-se à realização de estudos etnográficos sobre os Açores, algo que 22 sempre o interessara, fazendo recolhas das diversas formas de literatura oral existentes na sua ilha: canções, romances, provérbios… O resultado deste longo trabalho de pesquisa encontra-se reunido no Cancioneiro Geral dos Açores (1982), no Adagiário Popular Açoriano (1982) e no Romanceiro Popular Açoriano (1987), obras que o colocaram entre os mais importantes etnógrafos portugueses. O arquipélago natal […] constituía[m] temas básicos do seu labor literário […]. João Anglin in À memória de Cortes-Rodrigues Vivi com eles e dormi e comi nas suas casas. Fiz isso com os homens da Terra e com os do Mar. […] Passei muitos dias no capacho de lápis na mão, rodeado de mulheres e raparigas, numa fuzilaria de cantigas que tinha de registar quase na brevidade com que eram ditas. Armando Côrtes-Rodrigues 23 22 Com esse estágio junto do Povo da sua terra, Armando Côrtes-Rodrigues passa a dispor de um prodigioso manancial de elementos para os seus futuros trabalhos de carácter poético e dramático e de natureza científica. Dr. F. Carreiro da Costa 23 24 Participação Cívica Para além de distinto professor nos liceus de Ponta Delgada e de Angra do Heroísmo, Côrtes-Rodrigues assumiu-se, na sociedade açoriana, como um importante agente cultural, participando em inúmeras iniciativas e instituições. 24 25 25 Foi um dos sócios fundadores do Instituto www.iac-azores.org Cultural de Ponta Delgada, tendo dirigido a publicação da revista Insulana. Foi, ainda, o redactor chefe da revista Açores ilustrado, o secretário da sociedade Afonso de Chaves e o responsável pela Secção de Arte e Etnografia do Museu Carlos Machado. 26 Todas estas funções acarretaram grandes responsabilidades para a sua vida, mas, também, lhe permitiram fazer grandes amizades com inúmeras personalidades da sociedade açoriana. 26 27 O legado de Côrtes-Rodrigues Armando Côrtes-Rodrigues afirmou-se como um dos maiores intelectuais açorianos do século XX, deixando uma obra cultural marcante. É recordado na toponímia de Ponta Delgada, cidade onde também existe um espaço de memória e de criação estética, a Morada da Escrita/Casa Armando Côrtes-Rodrigues, um equipamento cultural instalado na última casa onde o escritor habitou. 27 Na Morada da Escrita, os visitantes podem encontrar um conjunto de equipamentos multimédia que a transformam num espaço interactivo que permite aos visitantes envolverem- 28 -se directamente na exploração dos conteúdos apresentados. A despedida «Vou para Deus. Nele tenho onde a minha dor acoite! E as gotas das minhas chagas enchem de estrelas a noite.» Armando Côrtes-Rodrigues Foram muitos os que testemunharam a saudade de Armando Côrtes-Rodrigues, nomeadamente numa publicação do Instituto Cultural de Ponta Delgada, intitulada À Memória de Armando Côrtes-Rodrigues. 29 30 31 Biobibliografia Poesia: Ode a Minerva (1923) Em Louvor da Humildade (1924) Cânticos das Fontes (1934) Cantares da Noite Seguidos dos Poemas de Orfeu (1942) Quatro Poemas Líricos (1948) Dez Odes ao Tejo (1951) Horto Fechado e Outros Poemas (1953) Antologia de Poemas (1956) Teatro: O Milhafre (1932) Quando o Mar Galgou a Terra (1940) Auto do Espírito Santo (1957) 32 Etnografia: Poesia Popular Açoriana (1937) Cantar às Almas (1942) Adágios Meteorológicos do Adagiário Popular (1947) Reflexos do Brasil no Cancioneiro Popular Açoriano (1947) Adagiário Popular Açoriano (1982) Cancioneiro Popular Açoriano (1982) Romanceiro Popular Açoriano (1987) Vária: Os Açores – Introdução, selecção e notas de Armando Cortes-Rodrigues (s.d.) Voz do Longe – Crónicas lidas no Emissor Regional dos Açores (s.d.) 33 Legenda das fotografias 1- Armando César Côrtes-Rodrigues 2- Retrato do poeta Armando Côrtes-Rodrigues 3- Armando Côrtes-Rodrigues em sua casa 4- Tinteiro de secretário com relógio 5- Armando Côrtes-Rodrigues 6- Armando Côrtes-Rodrigues em criança 7- Armando Côrtes-Rodrigues 8- Ilhéu de Vila Franca 9- Chapéu de Armando Côrtes-Rodrigues 10- Óculos de Armando Côrtes-Rodrigues 11- António César Rodrigues e Maria Ernestina Botelho de Gusmão Côrtes-Rodrigues 12- Tia Estefânia e Armando Côrtes-Rodrigues 13- Laura Sofia Botelho de Gusmão 34 14- Laura Sofia Botelho de Gusmão, Dr. Armando Côrtes-Rodrigues, Luís Filipe Botelho Gusmão Côrtes-Rodrigues, Mª Ernestina Botelho Gusmão Côrtes-Rodrigues, Jorge Manuel Botelho Gusmão Côrtes-Rodrigues 15- Inscrição no verso: Grupo de professores e alunos no Liceu Nacional de Ponta Delgada: Dr. Rui Galvão de Carvalho, Dr. Armando CôrtesRodrigues, Dra Ligia Matos, Dr. João Anglin, Pe José Joaquim Rebello, Dr. Almeida Pavão 16- Grupo Nacional de professores e alunos do 7º ano do Liceu Nacional de Ponta Delgada 17- Alfredo Guisado, Armando Côrtes- Rodrigues, Almada Negreiros 18- Capa de um dos números da revista Orpheu 35 19- Amélia Rey Colaço, Dr. Armando Côrtes- Rodrigues 20- Fontenário dos remédios 21- Presidente da República Craveiro Lopes e Dr. Armando Côrtes-Rodrigues 22- Inscrição no verso: Quinta da Amora (Dir. Esq.): Armando Côrtes-Rodrigues, Dr. Armando Cândido, José de Melo e não identificado; (de pé ao fundo) António Dourado, João Branco 23- Frei Armando Branco, Dr. Armando Côrtes- Rodrigues, Padre Zacarias 24- Assembleia da última aula proferida por Armando Côrtes-Rodrigues; Inscrição no verso: Festa de homenagem na minha despedida e ultima lição no liceu de Ponta Delgada 36 25- Inauguração do Teatro Micaelense, 1950, Maria Ernestina Côrtes-Rodrigues, Maria Agnelo Cordeiro Borges, Clara de Vasconcelos Freitas da Silva Agnelo Borges, Embaixador Helder Mendonça e Cunha, Maria Jácome Correia 26- Museu Carlos Machado 27- Morada da Escrita/Casa Armando Côrtes- Rodrigues 37 Bibliografia ANGLIN, João H.: Flores com fruto, Tip. do Correio dos Açôres, Ponta Delgada, 1945. CÔRTES-RODRIGUES, Armando: Auto do Espírito Santo, Tip. do «Diário dos Açôres», Ponta Delgada, 1957. COSTA, Vasco Pereira da (Coord. geral): Catálogo – Morada da Escrita, Nova Gráfica Lda., Ponta Delgada. Vários: À Memória de Armando Cortes-Rodrigues, Instituto Cultural de Ponta Delgada - Tip. do «Diário dos Açôres», Ponta Delgada, 1973. Vários: Homenagem ao poeta Armando Côrtes-Rodrigues em Vila Franca do Campo, in Separata do vol. XVI – 2.º semestre, 1960 – da Revista «INSVLANA» órgão do Instituto Cultural de Ponta Delgada, Tip. do «Diário dos Açôres», Ponta Delgada, 1962. 38 Webgrafia http://www.bparpd.pt/Morada%20da%20Escrit a/web/documents/23.html http://pt.wikipedia.org/wiki/C%C3%B4rtesrodrigues http://www.citi.pt/cultura/temas/frameset_rodri gues.html http://www.astormentas.com/din/biografia.asp ?autor=Armando+Cortes-Rodrigues 39