Introdução aos Microarrays de ADN Anastasios Koutsos Alexandra Manaia Julia Willingale-Theune Versão 2.3 Versão Portuguesa ELLS – European Learning Laboratory for the Life Sciences Anastasios Koutsos, Alexandra Manaia e Julia Willingale-Theune Introdução aos Microarrays de ADN Versão 2.3 Introdução aos Microarrays de ADN 1.1 Introdução Vivemos uma época a que os historiadores do futuro chamarão a “era genómica”, em que os vários cientistas, em todo o mundo, trabalham num dos mais ambiciosos programas científicos de sempre – o projecto Genoma Humano (Human Genome Project- HGP). O objectivo principal do HGP é sequenciar os 3 biliões de nucleótidos (os As, Cs, Gs e Ts) que formam os 23 pares de cromossomas humanos. A publicação da primeira versão da sequência do genoma humano, em 2001, levou a uma revolução na biologia molecular, pois veio em grande medida evitar que os cientistas precisassem de clonar e sequenciar cada gene que estivessem a estudar (implicados em doenças humanas etc). Passaram a poder procurar as sequências dos genes directamente em bases de dados de livre acesso. No entanto, esta versão inicial da sequência do genoma continha ainda centenas de milhar de “buracos” (gaps= regiões de sequência ainda desconhecida) e também regiões cuja posição ainda não estava definida (podiam ter sido “mal ligadas” ou trocadas com outras). Desde a versão inicial da sequência do genoma humano, a investigação para preencher os “buracos” e corrigir os erros prosseguiu: em Outubro de 2004 só já faltava preencher cerca de 341 “buracos”! Qual será o próximo passo? Vai com certeza consistir em tentar perceber a função dos genes e de que forma estes agem de forma coordenada para assegurar a funcionalidade e o equilíbrio dos indivíduos. Também será importante compreender de que modo é que a actividade de certos genes conduz ao aparecimento de doenças, como por exemplo o cancro. É previsível que futuramente venham a ser desenvolvidas terapêuticas personalizadas, adaptadas a cada indivíduo e ao seu próprio património genético. Além do programa do genoma humano, existem vários projectos que também produzem uma imensidão de dados. Tecnologias como a “whole-genome shotgun’ (WGS), em que todo o genoma é separado em pedaços de vários tamanhos que, depois de sequênciados e unidos, utilizando um software especial, permitem aos cientistas sequênciar o genoma de vários “organismos-modelo”, utilizados em investigação científica há muitos anos (levedura, mosca da fruta, ratinho, etc). Descobrir quais os genes que estão envolvidos na “versão animal” de uma doença pode ser crucial para identificar os genes equivalentes nos humanos. Além disto, a comparação do ADN humano com o dos “organismos-modelo” também se tem revelado útil para estudar aspectos básicos da evolução. A lista dos “organismos-modelo” cujo genoma foi já completamente sequenciado, inclui microrganismos, invertebrados, plantas e muitos vertebrados, como o rato, ratinho, chimpanzé e continua a crescer. Novas ferramentas estão a ser desenvolvidas para ajudar a interpretar a imensa quantidade de informação resultante de todos estes projectos científicos. 3 _______________________________________________________________ Introdução aos Microarrays de ADN . . 1.2 A expressão dos genes na célula Com algumas excepções, todas as células do nosso corpo contêm um conjunto idêntico de cromossomas e portanto de genes. Mas em cada tipo de células só alguns destes genes estão activos, ou seja são expressos, levando à produção de um conjunto de proteínas específicas de certo tipo de células. A expressão génica é o termo utilizado para descrever a transcrição da informação do ADN para as moléculas de mARN mensageiro que são depois traduzidas em proteínas que executam as várias funções das células. Estudando o tipo e a quantidade de mARN produzidas pelas células, os cientistas identificam quais os genes expressos e percebem como as células reagem a variações das suas próprias necessidades (nutrientes, oxigénio etc). A expressão dos genes resulta de processos complexos e é muito regulada, permitindo que a célula responda de forma dinâmica, tanto aos estímulos do ambiente, como a alterações das suas próprias necessidades. O mecanismo que controla os genes que são expressos numa célula é semelhante a um interruptor tipo ligado/desligado (“on/off”), que funciona também como um “regulador do som”, aumentando ou diminuindo o nível de expressão de um determinado grupo de genes para se ajustar às necessidades da célula. 1.3 Análise da expressão génica Analisar a expressão dos genes envolve o estudo das quantidades de mARN e de proteína que são produzidas pela célula num determinado período. Até aos anos noventa, os cientistas só conseguiam analisar simultaneamente a expressão de meia-duzia de genes. Recentemente, criaram-se novas ferramentas, os “microarrays”, conhecidos também por “chips de ADN”, que conduziram a um extraordinário salto quantitativo, pois permitem estudar simultaneamente milhões de genes numa única experiência de execução simples, rápida e eficiente. O princípio subjacente a este novo utensílio tecnológico envolve a comparação de amostras. Por exemplo, para estudar o processo de envelhecimento, comparam-se tecidos jovens com envelhecidos; para perceber a evolução, comparam-se organismos simples com complexos; para estudar como a expressão génica se modifica em situações patológicas comparam-se tecidos sãos com patológicos. 1.4 Os “Microarrays”: como funcionam? Os “microarrays”, ou “chips de ADN” baseiam-se no facto de as moléculas de mARN se ligarem selectivamente, por emparelhamento, às moléculas de ADN com sequência complementar presentes nos chips. Para fazer um “microarray” imprimem-se “grelhas”, medindo apenas alguns centímetros, formadas por milhões (200000) de “spots” de ADN, em lâminas de vidro, semelhantes às utilizadas para histologia. Em cada “spot” é depositada uma gota minúscula, contendo moléculas de ADN em solução. Cada gota depositada por “spot” contém sequências específicas de um único gene. Estas moléculas ADN de cadeia simples impressas 4 _______________________________________________________________ Introdução aos Microarrays de ADN . . nos vários “spots” da grelha funcionam como autocolantes, atraindo a si as moléculas de mARN que lhes são complementares, de entre as muitas moléculas de mARN que são lançadas na superfície da lâmina. Os microarrays podem ser facilmente produzidos e a baixo custo, utilizando simples lâminas de vidro. Como pode imaginar, imprimir 20000 minúsculos “spots” de ADN numa superfície tão pequena é uma tarefa extremamente difícil. É preciso que os “spots” tenham exactamente a mesma forma e que sejam equidistantes uns dos outros. Para tal, é necessário utilizar robots que são programados para realizar este trabalho extremamente preciso. 1.5 Os “Chips” no EMBL Vários grupos de investigação do EMBL utilizam microarrays nas suas experiências. O grupo de Wilhelm Ansorge foi um grupo pioneiro na produção e na análise de microarrays, tendo produzido microarrays com genes humanos. O laboratório de Matthias Hentze tem utilizado microarrays para investigar uma doença chamada “hemacromatose”, causada por problemas metabólicos que levam a uma absorção excessiva de ferro, que se deposita em vários órgãos e tecidos do corpo. O ferro acumulado pode tornar-se tóxico causando vários problemas. Eileen Furlong utilizou microarrays para identificar os genes da mosca da fruta (Drosophila melanogaster) que estão envolvidos em cada etapa do seu desenvolvimento embrionário. O grupo do Prof Fotis Kafatos tem usado microarrays para identificar os genes do sistema imunitário do mosquito (Anopheles gambiae) que estão implicados na destruição do parasita unicelular que causa a malária no mosquito, antes deste infectar os humanos. 5 Agradecimentos Gostaríamos de agradecer a todos os que contribuíram para a elaboração desta actividade: - Ao Udo Ringeisen e a toda a equipa do Departamento de Fotografia do EMBL (EMBL Photolab), pela impressão dos tapetes do “microarray” em tecido, (para demonstração em cursos ou festivais de ciência) e pela produção da versão em plástico, (para utilização na sala de aula); - Ao Thomas Sandmann, na altura estudante de doutoramento no EMBL-Heidelberg, por várias discussões e sugestões muito úteis e também por nos ter chamado a atenção para o excelente material sobre “microarrays” intitulado ‚Snapshots of Science and Medicine‘, produzido pelo “NIH Office of Science Education”, em conjunto com o “Office of Research on Women‘s Health”; - Ao Russ Hodge, na altura, no Departamento de Comunicação e Relações Públicas do EMBL-Heidelberg (“Office of Information and Public Affairs” [OIPA]), bem como a toda equipa do “European Learning Laboratory for the Life Sciences” [ELLS], por muitas discussões, sugestões e apoio; - A Giovanni Frazzetto, Mehrnoosh Rayner e Vassiliki Koumandou por terem lido a primeira versão desta actividade e por terem contribuído para melhorá-la com as suas ideias e comentários. - A vários amigos e colegas do EMBL-Heidelberg com quem partilhámos ideias, entusiasmo e dúvidas; - “Os Exercícios para a sala de aula” foram adaptados do material sobre “microarrays” intitulado “Snapshots of Science and Medicine”, produzido pelo “NIH Office of Science Education”. Pode ser encontrado no seguinte website: science-education.nih.gov/snapshots; Imagem de capa por André-Pierre Olivier; Traduzido por Alexandra Manaia; Editado por Corinne Kox e Sonia Furtado. O ELLS usa licenças de direitos de autor Creative Commons para salvaguardar material produzido para os ELLS LLABs que será posteriormente utilizado por professores e outras instituições. Os símbolos de direitos de autor aparecem também no website ELLS TeachingBASE e nos ficheiros pdf, doc e ppt disponíveis para download. Atribuição Uso Não-Comercial Compartilhamento pela mesma licença Esta licença permite a terceiros remisturar, alterar e usar o seu trabalho como base, para fins não-comerciais, desde que lhe atribuam o devido crédito a si e utilizem uma licença idêntica para a obra resultante. 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