Diagnóstico laboratorial da infecção por toxoplasma
Gondii na gestação
Diagnosis laboratorial of the infection for toxoplasma Gondii in the gestation
Mário Ferreira1, Melissa Cristina Mortean Bicheri2, Michele Bertanha Nunes3 & Cilene Carmen
Munhoz Ferreira4
RESUMO - A toxoplasmose, zoonose de distribuição universal, tem especial importância quando acomete gestantes, uma vez que a
transmissão placentária pode provocar lesões de localização e gravidade variadas no feto.
Foram pesquisados anticorpos IgM e IgG em 305 gestantes de Bernardino de Campos, SP. A prevalência de infecção pregressa na população estudada foi de 65,58%, toxoplasmose aguda foi diagnosticada em 5,84% dos pacientes estudados e 28,57% das gestantes
apresentaram sorologia negativa, sendo, portanto, suscetíveis de contrair toxoplasmose na gestação.
O estudo reforça a necessidade do acompanhamento sorológico para toxoplasmose no pré-natal.
PALAVRAS-CHAVE - Toxoplasma Gondii, sorologia, gestação.
SUMMARY - Toxoplasmosis, a universally distributed zoonosis, has special importance when attacks pregnant women, since the placental transmission, can cause injuries with varied localization and gravity in the fetus. Antibodies IgM and IgG in 305 pregnant women of Bernardino de Campos, SP, were studied. The predominance of former infection in the studied population was of 65,58%, acute toxoplasmosis was diagnosed in 5,84% of the studied patients and 28.57% of the pregnant women presented negative serology,
being susceptibles, therefore, to contract toxoplasmosis in the pregnancy. The study reinforces the necessity of serum attendance for
toxoplasmosis during the prenatal treatment.
KEYWORDS - Toxoplasma gondii, serology, pregnancy.
INTRODUÇÃO
A
toxoplasmose é uma zoonose de felídeos causada pelo
Toxoplasma gondii (Nicolle e Maneaux, 1908), que,
universalmente disseminada, infecta aves e mamíferos.
O contágio se dá, predominantemente, pela ingestão de oocistos eliminados pelas fezes de felídeos, gatos principalmente, que podem permanecer viáveis no solo por longos
períodos, resistindo a dessecação e variações de temperatura, o que torna possível a contaminação pela inalação de
poeira contaminada. Ocorre, ainda, pelo consumo de alimentos de origem animal, especialmente de carnes mal cozidas, contendo cistos (bradizoitos) do parasito. Quando digeridos, os cistos liberam esporozoítos e taquizoítos, que
penetram ativamente nas células dos hospedeiros, reproduzindo-se e disseminando-se rapidamente por via hematogênica para os mais variados tecidos e órgãos. A transmissão
pode ocorrer, também, através do transplante de órgãos. A
maior importância clínica, entretanto, está na transmissão
placentária, com infecção fetal ( Camargo ME, 1996).
No homem, o T. gondii é, sobretudo, um parasita oportunista. O estado imunitário tem papel decisivo na manifestação clínica da infecção toxoplásmica. No entanto, estudos em parasitas isolados de infecção humana, por análise
isoenzimática por PCR, mostram que o genótipo do tipo II
(grupos Z2, Z4,e Z8) é o mais frequente na toxoplasmose
congênita (Dodé, LM, 1997).
A transmissão placentária do parasito pode ocorrer quando
a gestante adquire a primoinfecção. O risco de infecção fetal é dependente da idade gestacional, variando de 17% no
primeiro trimestre, 25% no segundo trimestre, para 65% no
terceiro trimestre da gestação. Felizmente, a gravidade das
lesões fetais é inversamente proporcional à idade gestacional. No primeiro trimestre, as lesões graves são estimadas
em 13% dos casos, caindo para 10% no segundo trimestre, e
são raras no terceiro trimestre (Desmonts e Couvreur, 1974).
A instituição precoce de terapêutica antiparasitária adequada promove sensível decréscimo na percentagem de
fetos com lesões, bem como na gravidade das lesões (Camargo ME, 1996).
O diagnóstico laboratorial da toxoplasmose tem se baseado, principalmente, na pesquisa de anticorpos contra o parasito. Conforme as características imunoquímicas desses
anticorpos, diferentes marcadores sorológicos têm sido
descritos para distinguir entre infecção latente, comum na
população, e infecção recente. Embora, mais recentemente, a demonstração de componentes como antígenos e segmentos de DNA, em vários materiais biológicos, com alto
valor diagnóstico, tenha se tornado possível, o monitoramento das gestantes soro negativas, durante toda gestação, não perdeu sua importância.
A reação de Sabin-Feldman, baseada na neutralização de
parasitos vivos,em presença de anticorpos e complemento,
foi praticamente abandonada, devido à necessidade de se
manipular o parasito em sua forma infectante. Os testes de
hemaglutinação indireta, embora ainda utilizados, apresentam limitações, podendo levar a resultados falso-positivos inespecíficos ou de reação cruzada (Tundisi, RN, 1995).
A reação de imunofluorescência indireta, teste mais reprodutivo e seguro, que permite as separações das frações
IgM, IgA e IgG dos anticorpos anti-toxoplasma e sua titulação, através de diluições crescentes, é atualmente bastante empregada. Entretanto, a pesquisa de anticorpos
IgM, por esse método, tem se mostrado pouco sensível,
possivelmente devido à competição com as IgG, levando a
resultados falso-negativos (Costa, AMM, 1998).
Mais recentemente, os testes imunoenzimáticos, ELISA
(Enzime Linked ImunSorbent Assay) e ELFA (Enzime Linked Fluorescent Assay), têm contribuído para melhorar o
diagnóstico da toxoplasmose, uma vez que apresentam
maior sensibilidade e especificidade. Mais recentemente
ainda, os testes por ELFA-Imunocaptura para IgM e a de-
Recebido em 25/04/2006
Aprovado em 20/09/2006
1
Farmacêutico Bioquímico, TEAC pela SBAC, diretor do Laboratório Santa Paula LTDA, Ourinhos/SP.
2
Biomédica do Laboratório Santa Paula LTDA.
3
Farmacêutica Bioquímica do Laboratório Santa Paula LTDA.
4
Acadêmica do curso de Farmácia e Bioquímica da Universidade Estadual de Londrina, Pr.
RBAC, vol. 39(1): 37-38, 2007
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tecção da avidez de IgG para toxoplasmose têm melhorado ainda mais os recursos, para diferenciar toxoplasmose
aguda dos casos de contágio recente com alguns meses de
evolução, como recomendado nos Algorítimos I e II (Perry,
LC, Tessaro, MM; Guedes CR e Reis, MM, 2000).
RESULTADOS
Das 308 amostras analisadas, 202 apresentaram IgM não
reagente e IgG reagente (infecção pregressa), 88 apresentaram IgM não reagente e IgG não reagente (não infectadas), e 18 apresentaram IgM e IgG reagentes, sugerindo
toxoplasmose aguda, adotados os critérios contidos nos algorítimos I e II.
O gráfico I mostra os resultados em percentuais:
não infectadas
28,57%
toxoplasmose
aguda
5,84%
infecção pregressa
65,59%
DISCUSSÃO
Outros marcadores têm sido recomendados para os perfis
duvidosos, como as dosagens de anticorpos IgA e IgE contra toxoplasmose (Camargo, ME, 1996).
MATERIAL E MÉTODOS
CASUÍSTICA:
Foram analisadas 308 amostras de soro, obtidas de gestantes atendidas na rede básica (Serviço de Pré-natal) do município de Bernardino de Campos, SP, no período de janeiro de 2001 a dezembro de 2002.
A toxoplasmose aguda na gestação pode resultar em infecção congênita, podendo provocar no feto lesões de localização e gravidade variadas. O tratamento precoce da gestante infectada reduz substancialmente a transmissão placentária. O maior desafio na toxoplasmose é, portanto, diagnosticar e tratar rapidamente as infecções em gestantes
e recém-nascidos.
Em nosso estudo, a prevalência da toxoplasmose (71,42%)
está de acordo com outros autores (Camargo, ME, 1996),
50,0 a 80,0%, e (Carmo, ACZ, 2005), 64%.
Nossos dados indicam que 28,57% das gestantes estudadas apresentavam risco de adquirir toxoplasmose durante
a gestação. Assim, podemos afirmar que a determinação
do perfil sorológico para toxoplasmose nas mulheres em
idade fértil e, principalmente, o acompanhamento das gestantes soro negativas possibilita significativa melhora no
diagnóstico dos casos agudos, garantindo tratamento em
tempo hábil e evitando tratamentos desnecessários.
REFERÊNCIAS
METODOLOGIA
As amostras foram submetidas à pesquisa de anticorpos
IgM e IgG para toxoplasmose, pela metodologia ELFA (Enzime Linked Fluorescent Assay) BIOMÉRIEUX SA, utilizando-se o sistema VIDAS, automatizado, no Laboratório
Santa Paula LTDA, em Ourinhos, SP.
Na metodologia aplicada, as imunoglubulinas M são capturadas por anticorpos policlonais presentes na fase sólida
do teste. Anticorpos anti-toxoplasma (anti P30), conjugados à fosfatase alcalina, ligam-se ao complexo antes formado. A ação da enzima no substrato 4-metil-umbeliferil fosfato gera produto fluorescente, cuja fluorescência é medida em 450 nm. O aparelho faz os cálculos automaticamente e libera um índice. Índices inferiores a 0,25 são considerados não reagentes, índices entre 0,55 e 0,65 são considerados indeterminados, e índices iguais ou superiores a 0,65
são considerados reagentes.
Para as pesquisas de anticorpos IgG, empregamos a mesma metodologia, sendo os resultados interpretados da seguinte forma: resultados inferiores a 8,0 UI/mL são considerados não reagentes, entre 8,0 e 9,9 UI/mL são considerados indeterminados, e superiores a 9,9 UI/mL são considerados reagentes.
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1 - Camargo, ME, in : Ferreira, AW, e Ávila, SLM. Diagnóstico Laboratorial das
principais doenças infecciosas e auto-imunes, Guanabara kogan, 1996,
pag.165-174
2 - do Carmo, ACZ; BOTTOM, SR; Fleck, J; Beck, ST. Importância do rastreamento pré-concepcional e pré-natal de infecção por T. gondii. Revista Brasileira de Análises Clínicas; vol.37.,2005.pág. 49-52.
3 - Tundisi, RN; Bassinello, P, Quarentei, RCA; Lago, APS; Vaz, AJ. Diagnóstico Imunológico de Toxoplasmose: estudo comparativo dos testes imunoenzimático e imunofluorescência indireta para pesquisa de anticorpos das classes IgM e IgG, LAES e HAES, n°96 agosto/setembro/1995, pág.130.
4 - Costa, AMM;Bonifácio, AC; Santos, RP; Cordeiro, JCS. Dosagem de IgM
anti-toxoplasma por IFI e ELFA em títulos elevados de IgG. News Lab, ano
VI, n°28, pág.78-81, 1998.
5 - Camargo ME. Diagnóstico de Laboratório de Toxoplasmose Humana. Rev.
Bras.Anal. Clínicas, 21(1). pág. 3-11, 1989.
6 - Dardé, ML. Tipagem das Cepas de Toxoplasmas na epidemologia da Toxoplasmose. News Lab ano V, n° 23, pág. 180-192, 1997.
7 - Camargo, ME. Resultados do teste VIDAS toxo IgM como marcador de toxoplasmose recente, LAES e HAES; pág. 35-36, 1993.
8 - Perry, LC; Tessaro, MM; Guedes, CR; Reis, MM – News Lab, pág. 114-120,
2000. Análise dos resultados da sorologia para toxoplasmose em gestantes,
utilizando a pesquisa de anticorpos específicos Enzima Linked Fluorescent
Assay.
9 - Jenum, P; Stray-Petersenb, Gundersen, A. Improved diagnosis of primary
Toxoplasma Gondii infection in early pregnancy by determination of antitoxoplasma inmunoglobulin; Gravidty Journal of Clinical Microbiology, v.35, n° 8,
pág. 1972-1977, 1997.
_________________________________________
ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA:
Mário Ferreira- Laboratório Santa Paula Ltda
Rua Ari Barroso, 403
CEP: 19900-300 , Ourinhos, SP. Brasil
RBAC, vol. 39(1): 37-38, 2007
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