MEDICINA QUE EU VIVI
Minha vida, minhas histórias
e a majestosa medicina que
ainda vivo!
Um texto de Dr. Frederico
Pedem-me para contar sobre a minha vida
e não sei como começar, pois vejo agora
como é difícil falar sobre si mesmo. Se ainda
fosse na mesa de um bar jogando conversa
fora com os amigos...
Vim a este mundo parece que sem nenhuma pressa, após um parto difícil, em uma tarde outonal de 25 de maio, (início da Revolução constitucionalista - talvez por isso seja
briguento, com diz minha esposa Alina...), na
casa de meus avós maternos e pelas mãos hábeis do Dr. Mario Aguiar, seu primo. O Dr.
Mário era um excelente médico e chefe de
uma numerosa família, dentre os quais o Dr.
Bernardo, que por sua vez atendeu minha esposa, no nascimento dos meus quatro filhos.
Venho de uma família rica, não de bens
materiais, mas sim de sentimentos espirituais,
de união e amor, descendente de muitas gerações e consubstanciada na união de minha
mãe com meu pai. Venho já de longo tempo, daquele em que se acreditava ainda na
cegonha e em Papai Noel e a violência e o
terrorismo eram só palavras do dicionário.
Venho de uma cidade pequena, Capivari, que
ostenta em seu brasão “Paulista por Mercê de
Deus”...Venho do tempo em que os pais e todas as pessoas mais velhas eram tratadas por
Senhor e Senhora, quaisquer que fossem suas
condições sociais.
Venho do tempo em que se assistia Tom
Mix nos seriados das matinês domingueiras, e
as peripécias de Flash Gordon no inimaginável ano 2000 nos pareciam coisa inatingíveis,
venho do tempo em que se ria às lágrimas
com as comédias do Gordo e o Magro, mas
também se arrepiava a ponto de depois não
se querer dormir no escuro, com os filmes
do Lobisomem, do Corcunda de Notre Dame
(Quasimodo) e principalmente do Frankenstein...
Venho do tempo em que alguém com 50
anos já era considerado um velho, quem diria
aos 80... Alegres e saudosos tempos, brincávamos após ter feito a lição da escola, de rodar pião e jogar bolinhas de gude, de empinar
papagaio e de correr descalço pelas ruas de
terra da minha Promissão, onde passei minha
infância, atrás da bandinha e do palhaço do
circo que chegava anunciando pomposamente respeitável público venham assistir esta
noite ao maior espetáculo da Terra! Lembrome mesmo ainda de uma das vezes em que,
seguindo o corso junto a algazarra da mole-
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cada, das dores causadas pelas bolhas nos pés
ao usar pela primeira vez um par de chuteiras
que havia ganhado de meu pai... Às 2 horas da
tarde minha mãe nos chamava para o lanche
onde havia, além do chocolate, o bolo de trigo
feito na hora com manteiga derretida em cima
e às vezes, suprema delicia, o bolo coberto
por suspiro...
Era a hora em que precisava “comprar” os
meus amiguinhos os quais, marotamente, fingiam ter que ir embora só para comer também
aquelas guloseimas. Por onde andarão aqueles peraltas, o Nenga, o Oscarzito, o Valdemar
Yda o Nilton?... E foi ali que, há alguns anos,
revendo a nossa casa e o nosso refugio secreto onde, com meus amigos nos escondíamos
para “pitar” os cigarrinhos de folha de uva,
não pude conter as lágrimas...
Fomos crescendo, e minha mãe, zelosa
de seus filhotes, dizia sem explicar porquê, e
que fingíamos inocência, que não deveríamos
ir brincar além da linha da estrada de ferro.
Era lá que ficavam as mulheres cheirosas,
pintadíssimas e que vinham às compras e à
farmácia do meu pai, de táxi ou de charrete,
nas suas calças compridas e sandálias de salto
alto e que me assustavam um pouco ao mesmo tempo que me atiçavam a curiosidade e
que, naqueles fascinantes tempos eram chamadas de “mulheres da vida”...
As férias escolares eram passadas em Capivari, casa de meus avós maternos Frederico
e Angelina (vovó gorda – a do meu pai era
a vó magra
Marianinha)
e onde as
ruas
já
eram calçadas por
paralelepípedos.
Chegáv a m o s
sempre à
noite após
estafante
viagem de
carro – um
Chevrolet
1936
–
por horas
intermináveis e
APM - Regional Piracicaba - Dezembro 2014
por estrada de areião, que não raras vezes, se
tornavam intransitáveis quando chovia. Mas
engraçado, pensando nisso agora, sempre
chegávamos mais ou menos na mesma hora
e, como num passe de mágica, todo cansaço
se acomodava quando meu avó, um “vero”
aristocrata italiano que se formara na escola
de farmácia de Ouro Preto (já meu pai formou-se na Escola de Farmácia de Pindamonhangaba), nos recebia aos beijos e dizendo
maliciosamente que parecia ter visto barras
de chocolate em um dos armários da farmácia. Uma semana era reservada para irmos
de trem a São Paulo ficando hospedados do
Hotel D’oeste junto ao largo de São Bento.
Até hoje posso me lembrar do aroma de seu
amplo salão de refeições, todo iluminado com
suas lâmpadas de globo, com seus garçons em
impecáveis uniformes e das madames elegantes com seus chapéus. Chovia sempre todas as
tardes, a garoa forte caia sobre os carros que
eu e meu irmão não cansávamos de apreciar
da sacada do salão de música, enquanto ouvíamos o sino da igreja de São Bento badalar
as horas... Era tempo de magia!
O Colegial foi feito no Colégio Bandeirantes em São Paulo onde já naquela época
o científico era direcionado para as matérias
ditas exatas como Engenharia, a Literatura
para o clássico e a biologia, botânica e química para a medicina, embora tivéssemos
que estudar todas, dando mais ênfase à sua
preferida. Enquanto eu escolhia medicina,
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