FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS
ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
DEPARTAMENTO DE ENSINO
CURSO DE MESTRADO EM ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
199706 517
T/EBAP M672c
11111111111111111111111111111
1000077676
COMISSÃO NACIONAL DE RESIDÊNCIA MÉDICA:
CAMINHOS E DESCAMINHOS NA GESTÃO DESTA
MODALIDADE DE ESPECIALIZAÇÃO MÉDICA NO BRASIL
DISSERTAÇÃO APRESENTADA A ESCOLA
BRASILEIRA
DE
ADMINISTRAÇÃO
PÚBLICA PARA A OBTENÇÃO DO GRAU
DE
MESTRE
EM
ADMINISTRAÇÃO
PÚBLICA
UBIRAJARA JOSÉ PICANÇO DE MIRANDA JUNIOR
Rio de Janeiro, 1997
FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS
ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
DEPARTAMENTO DE ENSINO
CURSO DE MESTRADO EM ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
COMISSÃO NACIONAL DE RESIDÊNCIA MÉDICA:
CAMINHOS E DESCAMINHOS NA GESTÃO DESTA
MODALIDADE DE ESPECIALIZAÇÃO MÉDICA NO BRASIL
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO APRESENTADA POR
UBIRAJARA JOSÉ PICANÇO DE MIRANDA JUNIOR
E
APROVADA EM 24/04/1997
PELA COMISSÃO EXAMINADORA
LUIS CÉSAR GONÇALVES DE ARAÚJO (DOUTOR EM ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA)
FÁTIMA BAYMA DE OLIVEIRA (DOUTORA EM EDUCAÇÃO)
~o
~ IÍ
Ua f w/)' Q, - J6 "'éfL.
I
VALÉRIA DE SOUZA (MESTRE EM ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA)
Às minhas mulheres queridas:
Mariana e Luisa: filhas de beleza e alma pura,
sonhos de todo uma vida,
o meu eterno amor.
lYarilucia: esposa e razão do meu amor,
razão da realização deste trabalho,
se puder, perdoe meus erros.
Do fundo do meu coráção,
Obrigado por tudo que fIZeram por mim,
Perdoem pelo tempo que não pude me dedicar a vocês.
III
Aos meus familiares:
Minha mãe, Concita, mulher sábia e generosa,
meu grande estímulo no gosto pelos estudos.
Meu pai, Seu Bira, homem forte e sensível,
meu grande estímulo no gosto pela música.
Meus irmãos, Dely, Dil, Pepé e,
Meus tios, Ely, Didi, Tetéu, Titia e Lourdinha,
meu mais profundo respeito.
IV
AGRADECIMENTOS:
Agradecer não é tarefa fácil. Nem sempre correspondemos aquilo que
nos é oferecido. Entretanto, faz-se necessário reconhecer aqueles que direta ou
indiretamente contribuíram para a elaboração desta dissertação e o cumprimento deste
mestrado.
Aos Professores do Mestrado em Administração Pública, da Escola
Brasileira de Administração da Fundação Getúlio Vargas, meus sinceros agradecimentos.
Aos Profissionais da Secretaria Acadêmica da EBAP, especialmente
Berenice, Vaninha e D. Vânia, pelo carinho e consideração com que sempre me
acolheram.
A todos os Colegas de Mestrado pelo apoio recebido ao longo do curso,
em especial os amigos: Felipe Neves, José Almi, Jamil, Cecília, Irapuã, Alberto,
Severiano, Wilbert, Paulo e Simone, pela oportunidade de ter dividido com vocês
momentos de crescimento profissional e pessoal.
Aos Professores do Mestrado da ENSPIFIOCRUZ e do NUTESIUFRJ,
pelo apoio recebido nas disciplinas que me deram oportunidade para complementar meus
interesses acadêmicos, em especial, Proft. Eliana Labra, Maria Helena Machado,
Sherrine Borges, Eliana Claudia, Nildo Batista, Dyla Tavares e Romeu Gomes.
v
Aos meus demais familiares, pelo estímulo e carinho recebido durante
o desenvolvimento deste trabalho, especialmente,
tios Jairo, Martinha, Si/vinha e
Iaiazinha; primos Carlinhos, Caiaco, Anna Luiza, Jairinho, Caíca, Adir, Marco, Monica,
Gustavo e Ricardo; cunhados Nevinha, Paula, Ivan, J.Cícero, Artur, Paulo, Angela
Maria, Teca, e João; sobrinhos e afilhados queridos.
Meus tios, Jomar, Nogueira, José Raimundo e Tirzah,
grande saudade.
Carinho especial à minha sogra Nadyr, pelo afeto e respeito que sempre
teve por mim.
À memória de meu sogro Luiz, bravo guerreiro.
Aos amigos deste Rio de Janeiro querido, companheiros de jornada, em
especial, Raquelzinha, Rubens, FafY, Cacá, Isabela, Marquinhos, Marilinha, Suzana,
Celina, Ligia, Caçulinha e Duda (Saudade), pelo apoio nas horas mais difíceis.
Aos colegas da Fundação Hospitalar do Distrito Federal, por
colaborarem na minha liberação para o cumprimento deste Mestrado.
Muitas pessoas não foram citadas, mas nunca esquecidas.
Meus sinceros agradecimentos a todos!
VI
AGRADECIMENTOS ESPECIAIS:
Ao meu orientador: Professor Luis César Gonçalves de Araújo, pela
sensibilidade que caracteriza o mestre, por me ouvir com paciência e me conduzir na
busca do conhecimento, à luz da realidade. Também pelo incentivo e apoio na
elaboração deste trabalho.
À Professora Fátima Bayma de Oliveira, pela colaboração quando da
fase de elaboração do projeto.
À Professora Valéria de Souza, pela orientação dada pelos caminhos da
Administração Pública, em busca de um referencial.
À Professora Deborah Moraes Zouain, pela ajuda nos momentos finais
de preparo e entrega da versão preliminar da dissertação.
VII
RESUMO
Este trabalho procura analisar o papel da Comissão Nacional de
Residência Médica (CNRM) como órgão responsável pela principal modalidade de
especialização médica no Brasil.
Para tanto faz-se uma revisão analítica da Residência Médica (RM) como
política pública, seu traçado histórico e evolutivo, bem como da própria CNRM,
desde a sua criação em 1977 até o ano de 1995, levando em consideração, tanto
aspectos político-administrativos, quanto técnico-educacionais, considerados de
importância relativos ao tema.
Quanto à utilização de material adequado para a realização desta
pesquisa buscou-se aproveitar dados de natureza bibliográfica e documental
como base para uma abordagem mais ampla da questão, sendo, entretanto, dado
ênfase à análise dos dados através do método de pesquisa qualitativa, pôr
intermédio de entrevistas semi-estruturadas pessoais.
Ao final promove-se algumas considerações, procurando vislumbrar
alguns pontos que possam servir de consideração para uma melhor reflexão
sobre a gestão da RM no Brasil.
_-\BSTR\CT
This work :cearches to analyze th . ,. role ;)f th . ,. :\acional Residenc . .'
CommissÍon (C~\R-'n as au aecountable organ in Brazil for the main .\ledkal
Speciaüzation mndality.
For ,lil that ~ho"ing an anaiytieal re\iew oI' ~\ledical Residence (R:\I) as a
Public Political. the historic and eyolurional sketched. even like C~R'I Ítsrif.
~ince 1977 "hen the (SR.\ I "as cl'eated unti11995, pointed out the Political.\Ianagellwnt aSpl'cts sueh as the Thecrucal-edueationals , considered the
impol'tance rdatin~ to the ~uhj(·ct.
Taking in :lccount the adt'quate utilization of the material for the
adueyement oi' this ~eareh~ seeking to pl'ofit informations of BibJiographical
nature and documental, as a mean for a hroden approach to the issue, bdng
howen'l' emphasized the analyze oi" the inf()rmations thl'ough the qualitatin"
search method by intermediate of pel'sonal sl"mi-l"structured.
At the end. l't'bounds ~ome reganis lookin2: for to cast some points that
could he ust'Íid on consideration fOI' a lll'ttel' reflexioll about tlU' R.\I
administration in Brazil.
ÍNDICE
Págs.
CAPÍTULO I - O PROBLEMA
2
l.l-APRESENTAÇÃO
2
1.2 - INTRODUÇÃO
4
1.3 - OBJETIVO FINAL
7
1.4 - OBJETIVOS INTERMEDIÁRIOS
7
1.5 - DELIMITAÇÃO DO ESTUDO
8
1.6- RELEVÂNCIA DO ESTUDO
9
CAPÍTULO 11 - REFERENCIAL TEÓRICO
10
2.1 - UM REFERENCIAL PARA ANÁLISE SOBRE A ORGANIZAÇÃO
DO TRABALHO MÉDICO ESPECIALIZADO
10
2.2 -MARCO CONCEiTUAL PARA UM ESTUDO SOBRE POLÍTICA
PÚBLICA
16
2.3 - EVOLUÇÃO E ORGANIZAÇÃO HISTÓRICA DA RESIDÊNCIA
MÉDICA
26
2.4 - CRIAÇÃO, COMPOSIÇÃO E FUNÇÕES DA COMIS5'ÃO
NACIONAL DE RESIDÊNCIA MÉDICA
38
CAPÍTULO m - METODOLOGIA
45
CAPÍTULO IV - ANÁLISE DOS DADOS
53
4.1 - O CENÁRIO
53
4.2 - OS ATORES
57
4.3 -A INTERPRETAÇÃO DOS ATORES
58
CAPÍTULO V - CONSIDERAÇÕES FINAIS
81
CAPÍTULO VI - REFERÊNCIAS BmLIOGRÁFICAS
87
VIII
2
CAPíTULO I - O PROBLEMA
1.1 - APRESENTAÇÃO
o
tema aqui selecionado resultou da experiência vivenciada na
área da saúde, em especial na Assessoria da Comissão Nacional de Residência
Médica (CNRM), órgão vinculado à Secretaria de Educação Superior (SESu), do
Ministério da Educação e do Desporto (MEC) e na Coordenação dos Programas
de Residência Médica, no Centro de Desenvolvimento de Recursos Humanos para
a Saúde (CEDRHUS), órgão da Fundação Hospitalar do Distrito Federal (FHDF),
instituição majoritária da Secretaria de Saúde do Distrito Federal (SES/DF).
Tais atividades foram assim desenvolvidas desde 1988, tendo
suscitado por diversas vezes conflitos a respeito da gerência e da organização
desta modalidade de treinamento da área médica, denominada, legitimada e
reconhecida como Residência Médica.
Por se ter participado ativamente, tanto como médico-residente no
início da carreira médica, quanto como responsável pela gerência de programas na
atualidade, é que se permite questionar o papel da Comissão Nacional de
Residência Médica (CNRM), enquanto gestora desta atividade de pós-graduação
médica em todo o país.
3
Assim sendo, pretende-se fazer com este estudo uma revisão
analítica do que seja a residência médica como uma política pública, o traçado
histórico e evolutivo da residência médica, bem como o papel da CNRM, desde a
sua criação, em 1977, até o ano de 1995, levando em consideração,
primordialmente os aspectos político-administrativos, sem deixar de apontar os
aspectos técnico-educacionais de importância pertinentes ao tema.
Não se tem a pretensão, de maneira alguma, de esgotar a
discussão sobre a gestão desta modalidade de capacitação médica, muito pelo
contrário, apenas tentar-se-á vislumbrar alguns pontos que possam servir de
consideração para uma melhor reflexão sobre a gestão da residência médica no
Brasil.
4
1.2 -INTRODUÇÃO
Dentre as políticas setoriais de desenvolvimento de recursos
humanos em saúde, a capacitação do profissional médico tem merecido especial
atenção, dada a complexidade e as necessidades cada vez maiores que se
impõem a esta área do conhecimento.
A Pós-Graduação em Medicina é uma etapa peculiar na Educação
Médica, tendo na Residência Médica (RM) sua forma de especialização de caráter
regular e permanente, utilizada para capacitar profissionais dos diversos ramos da
Medicina.
Por
razões
de
natureza
político-administrativa
e
técnico-
educacional, em determinado momento histórico fez-se necessário ordenar esta
modalidade de treinamento. Assim sendo, foi criada a Comissão Nacional de
Residência Médica (CNRM), com o propósito de regulamentar as atividades que,
de longa data, vinham sendo desenvolvidas neste contexto de formas as mais
diversas.
Diante disso, parte-se do pressuposto que a criação de um órgão
para gerenciar uma modalidade específica de treinamento na área da medicina
nasce da necessidade de se organizar o que já existia, sofrendo, portanto,
diversos mecanismos de pressão, mecanismos estes, ou de relevada importância,
5
contando com o apoio das diversas instituições e atores envolvidos, ou
desfavoráveis, de acordo com a circunstância que esteja prevalecendo no âmbito
pol ítico-institucional.
Cabe assim destacar alguns questionamentos que representam
inquietações sobre o tema, dentre esses alguns considerados de interesse para a
pesquisa que ora se levanta:
• Como se encontra a gestão e a organização da RM no Brasil?
• Como administrar este universo sujeito a riscos de deformação,
implosões e explosões causados por indefiniçóes nas políticas de educação e de
saúde?
• Como administrar a necessidade de médicos na rede de serviços, via
RM?
• A diversidade de especializações corresponde às expectativas da
demanda no mercado de trabalho?
• As resoluções da CNRM estão adequadas à realidade atual?
6
Frente a esses questionamentos, procura-se entender o papel da
gestão da pós-graduação médica. Assim sendo, entende-se que tal entendimento
passa pela análise de uma problemática de cunho sócio-político e que, portanto,
segundo Demo (1994),
, ' ... ao tra tarmos probl emas sociais,
não tratamos só de como pensamos a vida, mas
sobretudo de como vivemos concretamente . .. "
Face as diversidades apresentadas sob os pontos de vista político,
educacional e social, além dos aspectos regionais de natureza estrutural do setor
saúde, pretende-se analisar o papel da Comissão Nacional de Residência Médica,
em seu contexto histórico-administrativo, como órgão responsável por esta
modalidade de pós-graduação em medicina.
7
1.3 - OBJETIVO FINAL
Analisar a trajetória político-administrativo da Comissão Nacional
de Residência Médica, enquanto órgão responsável pela Residência Médica no
Brasil.
1.4 - OBJETIVOS INTERMEDIÁRIOS
a) Analisar sob o enfoque político-administrativo, o papel da CNRM
na organização, credenciamento, controle e avaliação da RM no Brasil;
b) Analisar os principais pontos que envolvem as políticas públicas
de recursos humanos para a saúde referentes à Residência Médica;
c) Estabelecer o diagnóstico situacional da RM no Brasil.
8
1.5 - DELIMITAÇÃO DO ESTUDO
No que diz respeito ao horizonte temporal, a análise será feita no
período que vai de 1977, ano em que foi criada a CNRM, até o primeiro trimestre
de 1996, sendo entretanto necessário fazer referência também ao espaço
correspondente a meados da década de 40 até 1977, para que seja melhor
compreendida a antecedência histórica conjuntural.
Quanto ao horizonte espacial, muito embora exista uma grande
diversidade no contingente de atores que se apresentam como co-partícipes desta
ambiência, o enfoque principal deste estudo estará circunscrito à Comissão
Nacional de Residência Médica, por a mesma contemplar de forma abrangente a
representação das entidades envolvidas com essa atividade em todo o país.
Com relação ao objeto de estudo serão analisados os documentos
oficiais que regem a RM no Brasil, além da bibliografia técnica pertinente ao tema,
bem como serão interpretadas as principais análises proferidas pelas instituições
que compõem o Sistema de Residência Médica no Brasil.
9
1.6 - RELEVÂNCIA DO ESTUDO
o estudo ora realizado alcança importância ao se verificar que:
• existem poucos estudos específicos relativos a Comissão
Nacional de Residência Médica, especialmente no tocante ao seu papel enquanto
gestora desta modalidade de treinamento;
• há necessidade de se analisar a participação da CNRM frente às
políticas de saúde e educação no contexto nacional;
• é também necessário uma melhor compreensão da relação da
CNRM com as sociedades de especialidades médicas, no que diz respeito ao
estabelecimento de critérios para a aprovação de sub-especialidades no Sistema
de Residência Médica; e,
• porque merece especial atenção a relação da CNRM com os
mecanismos de inserção do profissional médico no mercado de trabalho em saúde.
Espera-se, portanto, que as conclusões e resultados deste
trabalho possam servir como mais um parâmetro de comparação com outros
estudos, pretendendo portanto agregar contribuição efetiva para o melhor
desenvolvimento da gestão desta modalidade de pós-graduação médica no Brasil.
10
CAPíTULO 11 - REFERENCIAL TEÓRICO
2 1- UM REFERENCIAL PARA ANÁLISE SOBRE A ORGANIZACÃO DO
TRABALHO MÉDICO ESPECIALIZADO
A configuração exata das profissões tradicionais no Brasil, entre
elas a medicina, ocorreu apenas no final do século XIX, vivendo esta seu momento
maior como prática profissional liberal até o início da década de 30, passando a
partir daí a conviver com um processo de perda progressiva de seu predomínio.
Nos anos 60 já ocorre a superação desta prática de trabalho,
substituindo-se o modelo de produtor privado isolado e independente para
conformar a prática médica em trabalhos especializados de produtores associados
e de cooperação obrigatória.
A crescente dependência da assistência médica de uma tecnologia
(1) de alta complexidade acelerou a tendência para a especialização, o que,
segundo Capra (1982), veio reforçar a propensão médica de tratar partes
específicas do corpo, esquecendo-se de cuidar do paciente como um todo.
(1) Entende-se por Tecnologia um corpo de conhecimentos aplicáveis para controlar, transformar ou criar
coisas ou processos naturais ou sociais. É mais ampla que a técnica, que é um modo simples de resolver
problemas práticos. (Ladriére, 1979)
11
A prática da medicina transferida do consultório do clínico geral
para o hospital e a abordagem técnica da saúde levaram a uma excessiva ênfase
na tecnologia médica como o principal caminho para melhorar a saúde. É a
"medicina tecnológica" emergindo como a modalidade preferencial de organização
do trabalho médico. (Schraiber, 1993)
A especialização do trabalho médico vinculou-se, portanto, à
organização social da medicina, articulada ao exercício profissional dos médicos
com a tecnologia contemporânea. Assim sendo, a tecnologia médica atingiu um
grau de sofisticação sem precedentes, tornando-se onipresente na moderna
prática médica assistencial.
A expressão medicina tecnológica caracteriza a prática que se
realiza na forma de especialização do trabalho, destacando o caráter tecnologizado
desta prática, tendo em vista a utilização de equipamentos materiais, ao mesmo
tempo que indica o aspecto parcelar do trabalho médico especializado.
(Donnangelo, 1976)
o termo
especialização, usualmente, identifica tanto a repartição
do conhecimento em ramos parcelares do saber, quanto o processo de divisão
técnica do trabalho.
12
Destacando-se o processo pelo qual passa o trabalho médico,
entende-se que o pensamento médico torna a segunda condição como produto da
primeira. Assim sendo, entende-se também a especialização como uma nova
delimitação do objeto de intervenção do médico.(Schraiber, 1993)
É inegável que, ao longo do tempo, o desenvolvimento da prática
médica no Brasil, a medida em que cresce e se estrutura de modo mais complexo
enquanto prática social, tem-se acompanhado de progressivas crises na produção
e distribuição de seus serviços para a sociedade.
A forma pela qual tais serviços se ampliam, dividindo-se e
subdividindo-se em ramos médicos cada vez mais especializados, tem produzido
uma configuração do trabalho onde a organização técnica e social da prática
médica expõe situações de conflito, em que as contradições na realização do
trabalho médico são tomadas como desajustes das várias partes desse trabalho ao
conjunto de seu processo na sociedade brasileira.
Entre muitas contradições, fala-se da permanente inadequação da
formação médica, onde se produzem as expectativas de um certo padrão de
desempenho, seja na dimensão técnica, seja na dimensão social do trabalho, face
às condições reais de seu exercício, configuradas no processo singular de
estruturação de tal prática, por serem os próprios médicos os intelectuais
13
produtores e reprodutores desta concepção na elaboração da "ciência médica" e
em sua transmissão através do ensino.
É nesse espaço e tempo conjuntural, onde a prática médica
corresponde à qualificação especilizada do trabalhador, que a Residência Médica
vive intensamente esses campos de problematizações.
E mais, por seu duplo caráter - de ensino e de trabalho; por sua
transitoriedade obrigatória como momento de vida; por constituir-se em um rito de
passagem de uma identidade social - do estudante ao profissional, enquanto
trânsito de identidade ambígua; por suas origens no ensino da clínica e suas
demandas sociais no aprendizado em serviço.
Por tudo isso, talvez seja a Residência aquela dimensão da prática
médica cujos questionamentos internos e específicos reflitam com maior agudeza
as contradições próprias da estruturação do trabalho médico na sociedade
brasileira. (Schraiber, 1988)
o
termo Residência se deve à
necessidade de que os
participantes de tal programação devam residir(2) na instituição onde se
desenvolve a proposta de adestramento(3), devendo o treinando estar à disposi (2) o têrmo "residir" refere-se a fixar residência, morar, viver. (Ferreira, 1986 )
(3) A palavra "adestramento" corresponde ao ato ou efeito de adestrar(-se), ou seja, tomar(-se) hábil, capaz;
instruir (-se), amestrar(se). (Ferreira, 1986)
14
ção do hospital para proceder as práticas médico-clínicas, especializando-se,
portanto, através do treinamento em serviço médico-hospitalar.
No Brasil, a prestação de serviços médicos evoluiu para um
modelo que privilegiou a atuação profissional através de especialização, o que
obrigou o médico recém-formado a buscar sua qualificação dentro de campos cada
vez mais restritos, naturalmente melhor atingíveis através da Residência Médica.
(Bevilacqua, 1984)
Por outro lado, devido a forçosa necessidade de proceder da
melhor forma sua capacitação, o médico que ingressa em um programa de
residência médica, por não ser considerado ainda como um profissional pronto
para atuar na sua plenitude como tal, retarda por esta razão, sua inserção no
mercado de trabalho.
Analisando tais aspectos, Elias (1987) cita que:
"O processo de cap:ita.lização da med,ic,ina no
Brasi.l prop.icia a que a RH adqu.ira notár-re.l importânc.ia,
tanto no adestramento médico especia.lizado, como no
sistema de prestação de ass.istênc2'a méd2'ca, No entanto,
o seu desenr-ro.lr-r2'mento é marcado por ambigüidades,
decorrentes da 2'nterre.lação entre os p.lanos educac2'ona.l
e o de prestação de serr-r2'ços que enr-ro.lr-rem a Res2'dênc2'a,
Disto resu.lta uma situação,
também,
2'mprec2'sa da
2'dent2'dade soc2'a.l do res2'dente ", (E.l2'as, 1987)
15
Com esta análise, o autor busca caracterizar a RM como um
processo ambivalente, por não conseguir adequação na relação da proposta
educacional com a prestação de serviços.
Nesta conjuntura, o setor saúde no Brasil, de uma maneira geral,
tão
carente
de
recursos
de
toda
espécie,
tanto
quantitativa,
quanto
qualitativamente, na tentativa de minimizar parte de seus problemas, lança mão da
Residência Médica, como instrumento de política pública, visando cumprir
demandas, servindo desta como complementação de recursos para a prática
assistencial.
16
2.2 - MARCO CONCEITUAL PARA UM ESTUDO SOBRE POLíTICA PÚBLICA
O processo de formulação, implementação e avaliação das
políticas públicas, embora seja um assunto bastante complexo, diz respeito ao
reconhecimento de uma melhor forma de se tomar decisões envolvendo um
conjunto de determinantes e as respectivas consequências das decisões tomadas
visando atender o interesse público. Assim sendo, desde o surgimento, a política,
em sua expressão mais simples, caracteriza-se pela participação do cidadão nas
decisões de sua comunidade. (Barroso, 1992)
A forma de participação direta, vivenciada na antiguidade entre os
gregos e os romanos, entretanto, com o crescimento das populações, ficou
prejudicada,
passando a existir sob a forma de representatividade,
nas
democracias modernas, onde o povo elege seus representantes, denominados
políticos, para exercerem um mandato, sendo também responsáveis pelo
estabelecimento das políticas públicas.
Segundo Cota et ai (1986), as políticas públicas são propostas por
políticos, devendo serem discutidas e aprovadas, para posterior implentação pela
burocracia estatal. Referem ainda os autores que, no Brasil esta norma é burlada,
na medida em que o Poder Executivo promove planos por decreto, estabelecendo
políticas públicas a seu modo, sem passar pelo Congresso Nacional.
17
Os vários componentes de uma política pública variam de acordo
com os diferentes objetivos, tempo e sociedade, através de um processo dinâmico,
decorrente de uma atividade contínua que ocorre em uma estrutura e esta, para
ser sustentada, requer recursos e motivação.
Pode-se encontrar na literatura definições mais bem elaboradas
sobre o que seja política pública; na definição de Carl Friedrich, apresentado por
Park (In: Barroso, 1992), política pública é:
"u.m curso de ação proposto por uma pessoa,
grupo ou governo, dentro de um determ.inado amhiente,
com ohstácu.los e oportun.idades fornecidas, na qua.l a
po.l.i tica está proposta a ut.i.l.izar e superar com
esforço,
o
a.lcance de metas ou rea.l.ização de
ohjetivos. "
Assim sendo, Friedrich assinala que é essencial que no conceito
de políticas públicas existam metas, objetivos e propósitos.
Ainda para Park, uma política pública deve conter três fases, quais
sejam:
1) Planejamento e formulação (projeto político) - compreende
cursos propostos de ação objetivando agregar conhecimentos e ações para a
solução e prevenção de problemas, enquanto fornece uma qualidade de vida
compatível com a dignidade humana;
18
2) Implementação e execução - compreende a utilização de
recursos efetivos e eficientes buscando transformar valores em realidades através
de atividades governamenais;
3) Avaliação e modificação - requer métodos, estratégias e
recursos para determinar se os objetivos e resultados estão sendo alcançados,
além de utilizar mecanismo de "feedeback" para promover mudanças em políticas
ineficientes e, ao mesmo tempo fornecer conhecimento adicional para estabelecer
uma melhor política, projeto e execução.
Monteiro (1982), já define política pública como algo diretamente
associado à observação e monitoramento de eventos, recepção e emissão,
processamento e análise para a tomada de decisão, tal qual uma atividade de
controle que independe da ocorrência de produção ou consumo de bens e
serviços, ou seja, uma atividade que exige prévia detecção de necessidades,
avaliação de situação e conseqüente tomada de decisão.
o
mesmo autor considera que uma "inação"(4) é também uma
política e que, aquilo que o governo decide não fazer, pode ter um impacto tão
importante quanto teria uma ação.
(4) - Define-se como "inação", segundo Ferreira (1986), como falta de ação, inércia, e
ainda, como irresolução ou indecisão.
19
Assim sendo, se o governo protela uma decisão ou simplesmente
a ignora, tal atitude constitui-se numa política, com todas as características de
qualquer outro comportamento ativo.
Para ele, um analista, frente a uma política pública, deve estar
atento para as "pseudo-políticas", que surgem para ocultar os verdadeiros
propósitos ou objetivos de uma política, ou a camuflagem das políticas
anunciadas, devendo perceber quando uma política é formulada para provocar
reações, atuando como um sinalizador de intenções ou preocupações.
Afirma ainda Monteiro em sua análise, que uma mesma política
pode ser pensada sob vários ângulos, seja sob o ângulo agregado das decisões,
dos Conselhos, seja sob um aspecto mais operacional.
Existe diferença entre as políticas: umas são consideradas de
rotina, sem alteração de etapas, adotando-se repetições de políticas praticadas
anteriormente, e outras, que são formuladas em situações de crise, onde a
concepção do processo decisório depende de soluções adaptadas ou até mesmo
inovadoras.
Segundo Dror (In: Franco,1990), o processo de construção de
uma política pública é complexo e dinâmico, podendo estar sujeito a influência e
dependência de muitas variáveis, pois envolve muitos componentes e partes de
20
um processo aplicável a várias situações, através de níveis dierentes de
perspectivas.
Para Monteiro (1986), três grupos de indivíduos desempenham
papéis relevantes no processo de formulação e implementação de uma política
pública, sendo eles representados pelos políticos, os burocratas e os grupos de
interesses.
o primeiro grupo formado pelos cidadãos eleitos que, competindo
isoladamente ou em grupos, pelos direitos de controlar temporariamente o
governo, atenderia os reclamos da coletividade, produzindo políticas públicas. Em
um governo representativo, tais políticos, por ocasião das eleições, teriam suas
políticas revistas, podendo serem mantidos, alternados ou substituídos por outros
representantes.
o
segundo grupo é formado por membros de uma organização
com características especiais, denominada burocracia, que não deve ser
entendida como uma denominação restrita de um setor. Os indivíduos ou grupos
públicos e/ou privados, que respondem pela formulação e implementação das
políticas, são também parte efetiva da burocracia. A burocracia governamental é
formada pelos servidores públicos, sujeitos e agentes do processo de mudança e
responsáveis pela movimentação e eficiência da Administração Pública.
21
Os últimos, denominados grupos de interesses, são forças sociais
organizadas que exercem uma "atividade de pressão" direta ou indireta, sobre o
comportamento dos governantes para que estes adotem decisões favoráveis aos
seus interesses particulares ou às suas causa defendidas. (Badia, 1981)
O mesmo autor considera como exemplo de grupos de interesses
que se destacam por sua experiência, influenciando nos destinos de uma política
social, os sindicatos de classes. Outro grupo que pode exercer papel ativo ou
passivo, de acordo com as circunstâncias, na adoção de políticas que lhe dizem
respeito, são as federações ou confederações. As associações profissionais são
grupos de interesse que visam a defesa ou proteção de objetivos materiais ou
profissionais.
A constituição de grupos de interesse é um dos instrumentos de
que dispõe o cidadão ou a comunidade para exercer ação política e encaminhar
suas demandas nos processos políticos. É na ação desses grupos que são
determinados o grau de competição ou de associação entre diferentes grupos.
O mecanismo de formulação de uma política pública desdobra-se
em procedimentos ou fases que vão se estabelecer ao longo do processo
decisório dessa política. Segundo Monteiro (1986), o processo decisório segue os
seguintes passos:
22
a)
Identificação
subdividido,
segundo
o
autor,
em
reconhecimento e diagnóstico.
o reconhecimento é a capacidade de rastreio do meio externo, o
acompanhamento das mudanças, envolvendo a definição e a construção de bases
de dados estratégicos.
o diagnóstico é a fase onde se dá o estabelecimento de qual é o
problema da política, a natureza do estímulo a ela e as relações de causa-efeito.
b) Desenvolvimento - É a fase mais complexa da política pública,
que envolve grande parte do tempo e dos recursos humanos e materiais do
processo decisório. Monteiro subdivide esta etapa em duas fases: busca e
"design".
Na primeira fase ocorre a busca de soluções e tentativas de se
encontrar políticas já disponíveis, praticadas e outras circunstâncias semelhantes.
A segunda é a fase do estabelecimento de soluções especificamente criadas para
o problema diagnosticado. É a fase do "design"da política propriamente dito.
c) Seleção - É a fase final do processo decisório, onde ocorrem
diferentes estágios de investigação e escolha de alternativas. Subdivide-se em:
peneiramento, avaliação ou escolha e autorização.
23
Na fase de peneiramento ocorre a determinação de um número
maior de alternativas para posterior escolha, onde elimina-se também as políticas
consideradas inviáveis.
Na fase de avaliação ou escolha, as políticas são formalmente
conhecidas e a escolha é feita através da barganha política.
A etapa de autorização é de responsabilidade do legislativo e pode
ser simbólica ou homologatória. Nessa fase a política torna-se mais transparente,
tanto para a sociedade como para os formuladores.
Monteiro refere, entretanto, que os processos decisórios de
política no mundo real apresentam outras complexidades além das fases
hipotéticas acima mencionadas. Explica que a tramitação de uma política em seu
processo de formação, não ocorre necessariamente de forma linear, ocorrendo
com freqüência impasses, imprevistos e limitações de natureza diversa que podem
ocasionar um alongamento indefinido de uma ou mais fases do processo, devendo
ser introduzido correções ou reajustes a essas fases, objetivando a elaboração da
política pública.
Alguns
fatores
contribuem
implementação das políticas, dentre eles:
para
o
enfraquecimento
da
24
• falta de pessoal qualificado;
• insuficiente direção e controle dos líderes políticos;
• oposição à própria política;
• corrupção e outros.
No caso da educação, segundo Durham (In: Freitag, 1994), a
arena das práticas políticas e seus atores, na medida em que são dominados pelo
centralismo burocrático, apresenta as seguintes características:
1. A ação do Estado sobre o conjunto do sistema é concebida
através da multiplicação de normas legais, que invadem os mais diversos campos
institucionais: a criação e o credenciamento das instituições, seu
status legal,
sua
estrutura interna, bem como as formas de exercício do poder institucionalizado;
2. O sistema cria uma burocracia cuja função e poder derivam da
fiscalização do cumprimento das normas, através do exame de processos;
3. Dado o caráter legal das normas e seu âmbito universal, existe
uma tendência incoercível para que o aspecto formal prevaleça sobre qualquer
juízo de valor ou julgamento de mérito;
4. O sistema todo é altamente verticalizado.
25
Para o desenvolvimento do serviço público, que tem como
finalidade promover o bem comum, é necessário o uso de recursos indispensáveis
ao funcionamento do corpo administrativo e executivo da máquina pública. Dentre
esses recursos, têm capital importância os recursos humanos que, segundo
Neblind (1962), são os
"flll1cionár.ios que agem sob a d.ireção do
governo,
trabalhando para o alcance dos obfet.ivos
soc.iais, util.izando os elementos f.inanceiros, mater.ia.is
e outros que dispõem".
Cabe, portanto, aos servidores públicos, recursos humanos da
máquina do Estado, a responsabilidade pela execução das diretrizes e ações
governamentais, sendo que, de sua capacidade, honestidade e fidelidade é que
depende em grande parte o bem comum.
A CNRM é assim entendida, dentro da burocracia governamental,
como uma organização composta por diferentes atores de diversos grupos de
interesses, públicos e privados, que têm como objetivo comum o estabelecimento
de uma política pública específica que envolve a gestão da residência médica
como forma de capacitação do profissional médico, no seu sentido mais amplo.
o conjunto dos conceitos ora apresentados servirão de base para
uma apreensão mais abrangente e analítica da trajetória histórica da RM na
sociedade brasileira, que será abordado no próximo tópico.
26
2.3 - EVOLUÇÃO E ORGANIZAÇÃO HISTÓRICA DA RESIDÊNCIA MÉDICA
o aparecimento da Residência Médica (RM) como modalidade de
instrução avançada na área médica remonta há quase dois séculos (Maciel, 1995).
Segundo Coury (In: O'Malley, 1970), desde 1802 já se achavam
instituídos os regimes de externato e internato (5) nos cursos médicos na França.
Entretanto, foi no final do século passado que a RM tomou força como modalidade
de treinamento pós-graduado em medicina.
Nos Estados Unidos da América do Norte, a RM despontou,
expressando-se no âmbito da Associação Médica Americana, entidade com grande
influência em questões relacionadas às políticas para a área de saúde na
sociedade americana.
o
sistema de especialização em Medicina, sob a forma de
Residência Médica (RM), é creditado a William Halstedt, médico americano que, a
partir de 1889, no Departamento de Cirurgia da John Hopkins University,
desenvolveu este tipo de treinamento científico, na qual o médico formado residia
no hospital por algum tempo, com atribuições de responsabilidade progressiva nos
5 - Entende-se como Internato, na atualidade, o último período do curso médico, parte integrante do currículo
de graduação em medicina, em que o estudante deve receber treinamento prático intensivo, livre de cargas
acadêmicas, em hospitais de ensino ou em instituiçõesprestadoras de serviço médico, de modo a assumir,
progressivamente, a responsabilidade do tratamento de pacientes, sob supervisão docente contínua.
(BRASIL, MEC/DAU, 1976)
27
cuidados pré e pós-operatórios e na execução de cirurgias, modificando assim o
sistema que vigorava até então, em que esta responsabilidade era atribuída ao
médico-assistente.
A partir de 1890, William Osler, também da John Hopkins
University, introduziu o mesmo modelo de especialização em Clínica Médica.
(Barbosa, 1984; Maciel, 1995)
o estabelecimento do
sistema de RM é assim, considerado um
marco histórico na especialização em Medicina de uma maneira geral, a partir da
constatação da elevação do padrão técnico do médico americano, desde o início
do século XX, tendo como consequência o grande interesse por ex-residentes para
preencherem o quadro clínico dos hospitais mais qualificados, assumindo estes as
funções de chefe de serviço e de ensino.
No Brasil, em 1945, foi implantado o primeiro programa de
Residência, na especialidade de Ortopedia, no Hospital de Clínicas de São Paulo
(HC-USP). Em 1948, no Rio de Janeiro foram implantados no Hospital dos
Servidores do Estado, os Programas de Residência em Cirurgia Geral, Clínica
Médica, Pediatria e Gineco-Obstetrícia. (Breglia, 1989)
28
A história da Residência Médica no Brasil, portanto, inicia-se na
década de 40, moldada no modelo norte americano, evoluindo genericamente, em
quatro períodos distintos:
o
primeiro
período,
identificado
como
"Romântico/Elitista",
caracterizou-se por ser um período onde a RM ainda não era sentida como
necessária para o embasamento profissional, procurada apenas por uma fração
mínima de médicos idealistas, com grande vocação para uma formação de alto
nível ou interessados em docência, geralmente formada por elementos de famílias
abastadas. Naquela época os médicos tinham uma expectativa de futuro dentro de
um modelo profissional liberal clássico, trabalhando predominantemente em seus
consultórios, sem imaginar a possibilidade de uma porção significativa de sua
atuação profissional voltada para a atividade assalariada. (Bevilacqua, 1984)
o segundo momento, que vai de 1956 a 1970, é identificado como
" Período de Consolidação" , onde a RM passou a ser encarada como uma
necessidade efetiva entre os médicos recém-formados, devido a força obtida pela
Residência, durante este período, dado o caráter estabelecido de aprimoramento
profissional pós-graduado.
A RM era oferecida predominantemente por hospitais públicos
tradicionais e pelos vinculados às faculdades e universidades públicas, expandindo
de forma gradual pelo país.
29
Sedimenta-se a idéia de adestramento profissional em serviço
hospitalar, como forma de promover a melhoria da formação profissional médica,
privilegiando o aprendizado através da prática hospitalar. Por outro lado, inicia-se
durante o segundo período um movimento de modernização das instituições, com
reorganização do trabalho médico, cujo sentido principal é o da sua divisão por
intermédio da especialização.(Elias, 1987)
o
início da década de 70 coincide com a expansão do ensino
superior (Tabela I), com a criação de um número considerável de novas escolas
médicas e, consequentemente, um número crescente de egressos, levando
forçosamente à ampliação do Sistema de Residência Médica no país. Este terceiro
período
foi
descrito
como
"de
Impacto
da
Expansão
do
Superior'. (Bevilacqua, 1984)
Tabela 1- EXPANSÃO DAS ESCOLAS MÉDICAS (1960-1990)
ANOS
N° DE ESCOLAS
1960
29
1970
71
1980
75
1990
80
Fonte: Batista, 1993
Ensino
30
É durante o terceiro momento que está ocorrendo também maiores
pressões sociais no sentido de garantir-se o acesso aos serviços de saúde,
passando-se pela criação do Instituto Nacional da Previdência Social (INPS), a
partir da unificação dos Institutos de Aposentadoria e Pensões (IAPs) das diversas
categorias profissionais, justificando-se a fusão destes na necessidade de
racionalização dos serviços, concentração dos recursos, principalmente financeiros
e na extensão da cobertura da assistência prestada, reservando-se ao Estado o
papel de organizar e financiar o Sistema, através da compra de serviços na
iniciativa privada. (Cohn, 1980)
Conseqüentemente, se dá a difusão de Programas de Residência
Médica (PRMs) em instituições privadas de grande e médio porte. O modelo
adotado enseja então, por parte do Estado, a formulação de políticas que
viabilizam o crescimento do setor hospitalar privado e, consequentemente, "a
relativa conciliação entre interesses e pressões do setor privado de produção e do
consumidor dos serviços de saúde".(Donnangelo, 1975)
Além disso, o maior interesse do Estado na racionalidade do
trabalho, com a valorização social da especialização e do título de especialista,
repercute no incremento da especialização médica, através da RM, com o aumento
do número de vagas e a viabilização da extensão dos PRMs às instituições
hospitalares privadas.
31
Ainda que sem normas gerais que a regulamentasse, observou-se
que a RM começou a despertar o interesse dos órgãos de classe. Em 1964, a
Associação Brasileira de Educação Médica (ABEM), teve como tema de seu
encontro a Residência Médica.
Em 1967, em função dos interesses e necessidades sentidas, os
médicos residentes se organizam e fundam a Associação Nacional dos Médicos
Residentes (ANMR) e realizam o seu I Congresso Nacional.( Leite, 1983)
Em 1968, a ANMR, em seu 2° Congresso, praticamente ratifica o
conceito de RM, então estabelecido pela ABEM, como "uma forma de ensino de
pós-graduação, que permite ao médico recém-formado aperfeiçoar-se nos
diferentes ramos da atividade médica, trabalhando numa organização hospitalar de
bom padrão, em regime de tempo integral e devotamento exclusivo, por prazo
suficiente e sob supervisão de colegas experientes". (Barbosa, 1984)
o
Conselho Federal de Educação (CFE) também teve sua
participação no processo de regulamentação da RM e, na década de 70, fez uma
revisão da legislação em vigor, com fins de estabelecer adequada articulação entre
Residência, Mestrado e Doutorado em Medicina, colocando assim a RM como
etapa fundamental na pós-graduação médica, desempenhando esta, um duplo
papel: "servir de base para formar profissionais de alto nível e atuar na formação
32
de professor e pesquisador, como pré-requisito obrigatório para os cursos de
Mestrado e Doutorado" .(Breglia, 1989)
Os anos que se seguem são caracterizados por movimentos das
associações dos residentes em diversos Estados, notando-se predominância de
reivindicações ligadas à direitos trabalhistas, como salários, carteira assinada,
carga horária, moradia, alimentação, etc. Não se percebe preocupação ou
interesse pela discussão de outros temas pertinentes à RM e aos residentes, como
melhores condições de trabalho ou qualidade dos programas oferecidos.(ANMR,
s.d.)
Evidencia-se a esta época, entretanto, a tendência da RM não ser
mais somente treinamento em serviço, mas fundamentalmente prestação de
serviço com algum treinamento, devido a necessidade de utilização do trabalho
profissional do médico-residente para atendimento da demanda de prestação de
assistência, subordinando-se a RM à prestação de serviço.
Assim, o projeto pedagógico da RM, de aprimoramento e
capacitação do médico, passa a ser dominado pelos compromissos institucionais
de prestação de serviços, deslocando-se para um segundo plano as dimensões
educacional e pedagógica da RM.
33
Observa-se,
desta
forma
um
verdadeiro
processo
de
desvirtuamento dos programas de residência.
Ao lado de programas considerados de bom padrão, passou-se a
conviver com a criação de programas de nível e finalidade questionáveis,
iniciando-se assim a destruição do então chamado "espírito da residência",
excelente modelo de qualificação profissional, séria e competente. (Hossne, 1985)
O desvirtuamento e as distorções atingiram tal nível que, em 1977
o Governo baixou um decreto (Decreto 80.281 de 05/09/1977), através do qual foi
criada a Comissão Nacional de Residencia Médica.
Com a criação da Comissão Nacional de Residência Médica
(CNRM), a partir de 1977, a Residência passa a ser legislada em nível federal,
devido a necessidade da criação de normas e regulamentos específicos para
tentar corrigir as distorções ocorridas durante o terceiro período. Assim, este
período é conhecido como de "Atuação da CNRM' e segue-se até os dias de hoje.
A partir de então são estabelecidos diversos mecanismos na
tentativa de promover um controle de qualidade dos PRMs, através da criação de
Assessorias Técnicas (Resolução 04/81), auxiliadas por Coordenadorias Regionais
(Resolução 08/81) e Comissões Estaduais de Residência Médica (Resolução
34
01/87), dado o número crescente de novas instituições solicitando credenciamento
para seus programas de treinamento.
No ano de 1991, a CNRM respondia pelo controle de 1194
programas de residência médica, distribuídos em 190 instituições, em todo o
país.(Tabela 11)
Tabela fi - NÚMERO DE PROGRAMAS DE RM E INSTITUIÇÕES EXECUTANTES
(BRASIL, REGIÕES E ESTADOS)
BRASIL, REGIÕES E
PROGRAMAS DE RM:
ESTADOS
CREDENCIADOS ....
.....
INSTITUIÇÕES
CRED. Cf EXIGÊNCIA
-
NORTE
AMAZONAS
PARÁ
12
10
2
---
3
2
NORDESTE
MARANHÃo
PIAUÍ
CEARÁ
R.G.NORTE
PARAÍBA
PERNAMBUCO
BAHIA
101
20
31
3
7
23
7
13
30
17
---
I
I
--
4
16
6
3
4
7
7
SUDESTE
MINAS GERAIS
ESPÍRITO SANTO
RIO DE JANEIRO
SÃO PAULO
743
49
118
95
5
319
324
4
1
22
22
19
2
45
42
SUL
PARANÁ
SANTA CATARINA
R.G.SUL
189
3
31
53
11
1
1
8
3
125
1
89
-
CENTRO-OESTE
GOIÁS
M.GROSSO SUL
DISTRITO FEDERAL
23
8
58
---
--
--
--
BRASR
1134
72
Fonte: MEC/SENESU/DHERM - Relatóno Geral de ReSIdênCIa Médica, janeiro, 1991
5
15
2
2
II
190
35
A análise da distribuição do número de vagas de residência
médica, no ano de 1991, segundo as instituições que oferecem programas de RM
nas macro-regiões brasileiras, evidencia grande concentração de especialidades e
programas na região Sudeste, conforme evidencia-se na tabela 111.
Tabela III -DISTRIBUIÇÃO DAS VAGAS DE RESIDÊNCIA MÉDICA SEGUNDO A
INSTITUIÇÃO RESPONSÁVEL (BRASIL E REGIÕES, 1991)
INSTITUIÇÃO REGIÃO REGIÃO
RESPONSÁVEl NORTE
REGIÃO
NORDESTE SUDESTE
REGIÃO
REGIÃO
SUL
C.OESTE
BRASIL
80
368
3562
1017
129
5156
(94%)
(42%)
(54%)
(66%)
(26%)
(52%)
5
507
3031
527
370
4440
Instituições
(6%)
(58%)
(46%)
(34%)
(74%)
(46%)
Total Geral
85
875
6593
1544
499
9596
Hospital
de Ensino
Outras
Fonte: MEC/SENESUIDHERM - Relatóno Geral de ReSIdêncIa Médica, JaneIrO, 1991
Encontra-se em tramitação desde 1991 um projeto de lei elaborado
pela Câmara dos Deputados, propondo uma nova legislação, visando regulamentar
as especializações em Medicina, através da criação da Comissão Nacional de
Especializações Médicas (CNEM), que deve ser regida pelo Ministério da Saúde,
contando com o apoio de suas delegacias regionais para promover o suporte
administrativo, técnico e financeiro necessário para o funcionamento da CNEM.
(Jorge, 1991)
36
Com a promulgação desta Lei, entra em questionamento a
existência da CNRM, uma vez que esta nova Comissão teria como competência
primordial estabelecer normas e critérios para o credenciamento de programas de
residência médica, cursos de especialização e estágios em Medicina. (Souza,
1993)
A Residência Médica evoluiu em períodos distintos, com um prazo
de tempo relativamente curto, contrapondo-se ao ensino de graduação médica,
que no Brasil já conta com mais de 180 anos de existência, de evolução histórica
lenta, acelerada somente a partir da década de 60, quando ocorreu expansão
importante, com um aumento de 75% do número de escolas novas, somente no
período de 1966 a 1970.
As
principais
consequências
dessa
expansão
foram
o
rebaixamento do nível dos cursos, devido principalmente ao aumento da
desproporção entre o corpo docente e discente e a deterioração do ensino médico,
com a formação universitária vinculada à baixos níveis de escolaridade, o que
levou a valorização demasiada da pós-graduação, que passou então a ser
encarada como o novo "Iocus" da qualidade do ensino superior, especialmente na
área médica.
37
o
termo já consagrado "treinamento em serviço", recobre o
conteúdo conceitual, porém, na prática cotidiana, não confere à dimensão
educacional que a Residência Médica se propõe.
A organização de serviços e a configuração do mercado de
trabalho são os principais fatores que determinam os perfis das programações
curriculares da Residência na formação do profissional médico.(Elias, 1988)
Assim sendo, entende-se que, para se processarem mudanças
adequadas na Residência Médica, o campo privilegiado de intervenção é o da
organização de serviços, sem porém deixar de considerar a programação curricular
e assim, o caráter da residência enquanto atividade de pós-graduação médica ..
A preocupação maior dos que se ocupam com a Residência se
baseia na avaliação de seu desempenho e a garantia de manutenção dos padrões
mínimos de qualidade, considerando-se os objetivos básicos de ensino de pósgraduação, na linha de especialização.(Furtado, 1985)
38
2.4 - CRIAÇÃO, COMPOSiÇÃO E FUNÇÕES DA COMISSÃO NACIONAL DE
RESIDÊNCIA MÉDICA
Criada a Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM) em 05
de Setembro de 1977, através do Decreto-Lei n° 80,281, subordinada ao então
Departamento de Assuntos Universitários (DAU), hoje Secretaria de Educação
Superior (SESu), órgão do Ministério da Educação e Cultura (MEC), à época,
atualmente Ministério da Educação e do Desporto, tendo mantida a mesma sigla,
tinha
como
atribuições
fundamentais:
definir
as
normas
gerais
que
regulamentassem a RM no país, estabelecer os requisitos mínimos necessários
para o credenciamento e funcionamento de programas de residência médica,
assessorar, avaliar e sugerir modificações às instituições promotoras desta
modalidade de treinamento médico,
Assim sendo, ficam definidas as características da Residência
Médica, já em seu artigo 1o,
"A
JlJooa.lidade
JlJéd,icos~
Res.idênc.ia
do
sob
:
ensino
a
de
forJlJa
de
em
pós-graduação
curso
caracte.r1.'zada por tre1.'namento eJlJ
ded1.'cação
saúde~
eKc.lusiva~
Kech'c,ina
univers1.'tár1.'as
ou
não~
destinada
serrT1.'ço~
eJlJ
sob
a
especia.lização~
de
func1.'onando
const,itu.i
a
em regime de
institu1.'ções
de
or1.'entação
de
profiss1.'ona1.'s JlJéd1.'cOS de e.levada qua.l1.'f1.'cação ética e
prof1.'ssiona.l, " (
Bras1.'.l~
.Decreto n
#
80,
281~
1977))
39
As concepções do Estado acerca da RM encontram-se, portanto,
claras através do Decreto-Lei. O perfil da RM resultante desta regulamentação
privilegia a proposta educacional, contemplando o adestramento e a capacitação
profissional através do treinamento em serviço. Estes elementos traduzem
também a preocupação de ser resgatada idéia da RM enquanto instrumento
produtor de melhorias na prática médica e no serviço de saúde. ( Elias, 1987)
O decreto, entretanto,
nada menciona sobre a forma de
remuneração ou aplicação de leis trabalhistas à RM, não ficando, portanto,
caracterizada como exercício profissional, mas fundamentalmente como etapa
educacional da formação médica, uma vez que, em seu artigo 3°, estabelece,
quanto ao credenciamento de instituições de saúde para oferecer RM, que estas
estabeleçam convênio com Escola Médica ou Universidade, visando a mútua
colaboração
no desenvolvimento
de
programas de treinamento
médico.
(Pasqualin, 1992)
No início da década de 80, a CNRM havia praticamente
normalizado a RM, através de uma série de resoluções editadas, estabelecendo
normas, requisitos e critérios mínimos para o credenciamento de programas em
Clínica Médica, Cirurgia Geral, Ginecologia e Obstetrícia, Medicina Preventiva e
Social e Pediatria, considerados como programas de áreas básicas, portanto,
prioritários do setor saúde.
40
Entende-se desta forma que a atuação do Estado ao implementar
a regulamentação da RM, se propõe a agregar os aspectos educacionais à
prestação de serviços em saúde, na tentativa de absorver as ambigüidades
decorrentes da prática de treinamento em serviço.
A CNRM, como órgão de deliberação coletiva, conta em sua
composição regular com um plenário de representantes dos Ministérios da
Educação, da Previdência Social e da Saúde, bem como do Conselho Federal de
Medicina, da Associação Médica Brasileira, da Federação Nacional dos Médicos e
da Associação Nacional dos Médicos Residentes, podendo eventualmente
convidar outras entidades para exame de assuntos específicos.{Brasil, MEC, § 1°,
Art. 2°, 1977)
Além desses representantes, conta a CNRM com:
- uma Presidência , exercida pelo Secretário Nacional de
Educação Superior do MEC, autoridade superior em matéria administrativa da
Comissão e, nos seus impedimentos, pelo Secretário Executivo da CNRM;
-uma Secretaria Executiva, que tem como atribuições principais
dirigir, coordenar, orientar e supervisionar as atividades de apoio técnicoadministrativo da CNRM, devendo esta ser dirigida por um médico;
41
• uma Assessoria Técnica, que tem como principais competências
colaborar em estudos e pesquisas de interesse da CNRM, bem como orientar os
trabalhos de avaliação,
controle e acompanhamento dos Programas de
Residência Médica (PRMs), constituída por membros efetivos, médicos, dentre os
servidores que compõem o quadro da CNRM;
• uma Seção de Estatística, Documentação e Divulgação;
• uma Seção de Protocolo e Arquivo; e
• uma Seção de Serviços Gerais. (MEC, Res. n° 01 n8).
Os PRMs devem reger-se por regulamento próprio, onde esteja
previsto dentre outros requisitos, a existência de uma Comissão de Residência
Médica (COREME), em cada instituição que ofereça Residência Médica, integrada
por representantes da institução e dos residentes, com a atribuição de planejar,
coordenar, supervisionar as atividades pertinentes aos vários programas da
instituição. (MEC, Res. n° 04n8)
Em 07 de julho de 1981 é regulamentada a Residência Médica,
através da homologação da lei Federal de n° 6.932, aprovada pelo Congresso
Nacional, que dispõe sobre as atividades do médico residente. (Brasil, lei n° 6932,
1981) A lei estabelece entre outras determinações:
42
• a diversidade de atores na composição da CNRM;
• o uso da expressão "Residência Médica" somente para
programas devidamente credenciados pela CNRM;
• a remuneração sob a forma de bolsa de estudos de valor, à
época, equivalente ao vencimento inicial da carreira de médico, de 20 horas
semanais, estipulado pelo Departamento de Administração do Serviço Público
(DASP),
acrescido de um adicional de 8%,
a título de compensação
previdenciária;
• a regulamentação da jornada de atividades, férias, folgas e
licenças; e
• a concessão de título de especialistas aos médicos residentes
dos programas credenciados.
A
demanda
dos
médicos
residentes,
representados
pela
Associação Nacional dos Médicos Residentes (ANMR), por regulamentação de
questões trabalhistas, entretanto, é contemplada parcialmente, não sendo
reconhecido o residente como assalariado e sim como autônomo, vinculado ao
sistema previdenciário.
43
Além disso, são criadas pela mesma lei, as Coordenadorias
Regionais da Secretaria Executiva da CNRM das Regiões Norte/Nordeste,
Sudeste e Sul/Centro-Oeste, competindo a cada uma manter contato permanente
com os PRMs de sua região, funcionando como consultorias regionais e
interlocutoras dos mesmos junto à CNRM. (MEC, Res. n° 08/81)
Face ao número crescente de programas credenciados em todo o
território nacional, já em meados da década de 80, as Coordenadorias Regionais
não davam mais conta de suas atribuições, entendendo a CNRM, portanto, ser
necessário estabelecer novos critérios de controle do sistema de residência
médica em todo o país.
Com a criação das Comissões Estaduais de Residência Médica,
em 1987, entendia a CNRM estar atendendo ao incremento da demanda de novos
programas, competindo a essas Comissões, uma vez implantadas, prestarem
assessoria
aos
PRMs
dos
Estados,
acompanhando
os
processos
de
credenciamento, funcionando essas agora como consultorias estaduais e
interlocutores dos mesmos junto à CNRM. (MEC, Res. n° 01187)
Dessa forma, baseando-se ou não nas orientações emanadas na
implantação do Sistema Único de Saúde (SUS), através dos preceitos de
descentralização, a CNRM encontra-se até o momento promovendo tal processo,
44
apresentando, entretanto, dificuldades de diversas naturezas para a efetiva
estadualização de suas ações
Vale ressaltar que a criação da CNRM e as várias resoluções que
regulamentam a RM foram produto da interação das instituições governamentais
com as associações de representantes da classe médica. Nesta época, as
transformações que estão ocorrendo no setor saúde, no tocante à organização de
serviços, no mercado de trabalho e na prática médica, repercutem em diversos
setores sociais.
No que diz
respeito
à área educacional médica, essas
transformações promovem novas necessidades referentes à capacitação do
especialista. Desta forma, observa-se o estabelecimento de um tipo de relação
progressivamente mais estreita entre as instituições promotoras da RM e o
conjunto de políticas públicas que dão forma à ação governamental no setor
saúde.
Após a exposição dos principais pontos entendidos como de
importância para uma reflexão teórica sobre o tema em questão, segue-se a
apresentação da configuração metodológica utlizada na abordagem temática
proposta.
45
CAPíTULO 111 - METODOLOGIA
De origem grega, a palavra método conserva sua validade, com o
significado de caminhar para chegar a um fim. Segundo Galliano (1979), método
é:
um
conjunto
de
ordenadamente dispostas,
a serem vencidas na
investigação da verdade, no estudo de uma ciência
ou para alcançar um fim determinado . .. "
"~o ••
A metodologia utilizada no desenvolvimento desta pesquisa se
refere à própria escolha e inflexão da mesma, através do método de pesquisa
qualitativa, onde foram ouvidos os representantes da Comissão Nacional de
Residência Médica, no Ministério da Educação e do Desporto.
Porque a Pesquisa Qualitativa?
Segundo Minayo (1992), entende-se como Metodologias de
Pesquisa Qualitativa, aqueles meios de investigação capazes de incorporar a
questão do significado e da intencionalidade como inerentes aos atos, às relações
e às estruturas sociais, sendo estas últimas tomadas, tanto no seu advento,
quanto na sua transformação como construções humanas significativas.
46
Considera também a autora que, a qualidade e a quantidade dos
fatos e das relações sociais são propriedades inseparáveis e interdependentes
utilizadas na apreensão da realidade.
Desde o início da coleta do material, quem comanda toda a
atividade é o pesquisador, que faz o relato de acordo com suas preocupações e
não com as intenções do narrador, pois é devido a seus interesses específicos
que se determina a obtenção do relato, através do recorte do material segundo
suas finalidades, a fim de aproveitá-lo da maneira que melhor lhe convenha para o
cumprimento dos objetivos por ele estabelecidos. (Queiroz, 1987)
Muito se tem investigado e escrito, inclusive como temas de teses,
na área da saúde, quase sempre, porém, sob a forma de quantificação de dados.
Embora importantes, esses achados de medição e demonstração, que têm como
base gráficos e tabelas, não conseguem dar conta de alguma coisa a mais que
parece faltar quando se trata de lidar com instituições e pessoas, ao mesmo
tempo, objetos e sujeitos da pesquisa. (Zaborowski, 1990)
Entretanto, entendendo o homem como sujeito de suas ações,
não basta reduzir as situações por ele vividas à dados empíricos. É mister
procurar os significados a ele atribuído. A realidade ultrapassa os fenômenos
percebidos pelos sentidos, fazendo-se necessário trazer para o interior da análise
47
a visão do subjetivo e do objetivo, o próprio sistema de valores do pesquisador,
bem como os fatos e seus significados, a ordem e os conflitos. (Minayo, 1992)
Para Demo (1994), em ciências sociais, não é realizável a
objetividade, mas é a objetivação o critério interno mais importante da
cientificidade obtido pelo uso de um instrumental teórico e técnico adequado.
Através desse instrumental, que garante a qualidade científica do trabalho, podese dar um passo adiante na tentativa de compreensão da realidade em que estão
inseridos os atores sociais envolvidos com a questão da gerência da Residência
Médica no Brasil e os problemas advindos desse processo.
Buscando-se, portanto, o uso de material instrumental adequado,
este trabalho procurou aproveitar alguns dados quantitativos que serviram de base
para uma abordagem mais ampla da questão, tendo como ênfase, entretanto, a
análise dos dados qualitativos, com os quais se pretende um aprofundamento
maior do estudo.
Fizeram parte da pesquisa, membros representantes, assessores
técnicos, assessores regionais e a secretária executiva da CNRM.
Quanto à investigação de campo, para pesquisar personagens
partícipes desse processo, foi utilizada a busca das informações através de
48
entrevistas semi-estruturadas pessoais, coletando narrativas dessas vidas de
trabalho.
Foram utilizadas também as pesquisas: bibliográfica, através do
levantamento de material publicado, necessário para a compreensão teórica do
tema, e a documental, por intermédio da utilização de material não publicado
sobre o assunto, ambas como informações já existentes, complementares ao
objeto de estudo. (Vergara, 1990)
Da revisão bibliográfica foram coletadas informações gerais sobre
o tema em livros, dicionários, artigos de periódicos especializados, teses e
dissertações. Além de se pesquisar em bibliotecas relacionadas à área de
administração pública, foi feito a "garimpagem" sobre o tema em bibliotecas
especializadas nas áreas de saúde pública e de educação.
Da pesquisa documental foi feita a revisão de leis, decretos,
portarias e e outros documentos oficiais constantes do Diário Oficial da União.
O trabalho de campo realizado por intermédio de entrevistas é
capaz de produzir reflexões, que, neste caso, percorreu a constituição da própria
atividade desenvolvida pelos entrevistados frente a CNRM.
49
Partindo-se do pressuposto de que ao entrevistar, desde logo,
duas pessoas estão interagindo, dialogando, estabelecendo perguntas no seu
diálogo, Kierkegaard (In: Nogueira, 1994) explica as finalidades da pergunta:
"~o • •
perguntar
designa
em
parte
a
relação do ind.iv.íduo com um outro indiv.íduo. - No
primeiro caso,
o esforço é para liberar o
fenômeno de toda e qualquer relação finita com o
sujeito. Ao perguntar, eu não sei nada e me
re.laciono de forma puramente receptiva com o meu
objeto . .. - No segundo caso,
o objeto é uma
divergênc.ia a ser ajustada entre aquele que
pergunta
e
aquele
que
responde
e,
o
desenvolvimento do pensamento se consuma nesse
passo alternado ( alterno pede), neste c.laudicar
de ambos os lados. . . "
As entrevistas foram gravadas com o consentimento dos mesmos,
sendo escolhida uma abordagem que, mesmo tendo por base um roteiro
preliminar, buscou-se estimular uma narrativa mais livre do entrevistado, evitandose ao máximo a interferência do pesquisador.
Foram fornecidos como elementos de discussão para as
entrevistas, duas linhas básicas:
-a primeira, refere-se à visão do entrevistado sobre a residência
médica na atualidade; e,
50
• a segunda, sobre o papel da CNRM frente a gestão da RM.
Assim
sendo,
os
temas
básicos
das
entrevistas
foram
considerados "conversas com finalidade", termo usado por Parga Nina (Minayo,
1989), onde ocorre uma orientação geral do tema, com um desdobramento livre
por parte do entrevistado.
Ao selecionar-se os entrevistados, levou-se em consideração que
todos deveriam ser membros efetivos da CNRM.
As entrevistas foram realizadas durante a ocorrência da última
reunião ordinária de 1995, da Comissão Nacional, nos dias 8, 9 e 10 de novembro,
situação esta bastante oportuna e propositalmente estratégica, pois conseguiu-se
realizar de uma só vez todas as entrevistas, com os membros representantes à
disposição da CNRM, reunidos em Brasília, não havendo, portanto necessidade
de deslocamento do pesquisador aos diversos estados de onde se originavam os
entrevistados.
Constituíram-se as narrativas de 10 (dez) depoimentos, resultando
em 3 (três) horas de material registrado. Para se chegar a esse número, utilizouse o critério de exaustão, isto é, quando se verifica uma certa reincidência de
informações, entendendo-se, entretanto, que o conjunto de informantes possa ser
diversificado para possibilitar a apreensão de semelhanças e diferenças,
8/BLlDTRA
fUNDACÃO GETOlIO VU&&I
51
contemplando dessa forma a visão das experiências e expressões que se
pretende objetivar com a pesquisa.
Desta forma, considera-se que a validade da pesquisa qualitativa,
portanto, está baseada na sua capacidade de objetivar o objeto, e não no número
de entrevistas realizadas. (Zaborowski, 1990)
Na visão de Schraiber (1993), a opção de se obter depoimentos
pessoais, para deles extrair a história social, implica em estudarmos uma realidade
coletiva através da observação de seus vividos singulares, tomando-se desta
forma essas vivências singulares como meios de aproximação da totalidade em
que esses atores estão inseridos, representando assim o coletivo a que
pertencem.
Ressalta-se que a representatividade em pesquisa qualitativa é
diferente da utilizada em abordagens quantitativas. Por seu critério não ser
numérico, considera como amostra ideal aquela que reflete a totalidade em suas
múltiplas dimensões, e assim define claramente o grupo social mais relevante para
sua realização.
A formulação das entrevistas é também um processo de
aprendizado para o pesquisador, tendo em vista encontrar formas eficazes de
52
participar, até certo ponto, das concepções e do modo de pensar a realidade que
os entrevistados possuem.
A entrevista não é só uma forma de entender e captar o outro,
mas de se fazer entender. Por ser um modo de contar e um modo de lembrar, a
entrevista produz sempre uma interpretação daquele que relata, baseado na
experiência pessoal, no interior de possíveis históricos bem determinados.
(Schraiber, 1993)
Por se poder coletar informações a partir de entrevistas é que
torna-se possível estabelecer uma relação mais próxima com os atores sociais
que envolvem o objeto de estudo e desta forma trazer para o interior da análise,
os fatos e seus significados, a partir do próprio sistema de valores do pesquisador.
Assim sendo, da coleta dos dados nas três etapas, buscou-se
identificar e, a partir daí, poder analisar com mais profundidade as relações das
políticas de recursos humanos para a área da saúde, pertinentes à RM, adotadas
pela CNRM, enquanto gestora do sistema de residência médica no Brasil, durante
o períOdo que vai desde o períodO que antecede e justifica a sua criação em 1977
até o final do ano de 1995.
53
CAPíTULO IV - ANÁLISE DOS DADOS
Neste capítulo foi desenvolvido o trabalho de campo, onde foram
apresentados e analisados os dados encontrados. Foi subdividido em três partes.
Na primeira parte mostrou-se o cenário aonde foram realizadas as
entrevistas. Na segunda, procurou-se identificar os atores e suas respectivas
inserções neste cenário. Já no terceiro momento buscou-se interpretar as
postulações apresentadas por esses atores, sobre a Residência Médica
propriamente dita, na atualidade e, o papel da Comissão Nacional de Residência
Médica, enquanto gestora deste sistema de especialização médica no país.
4. 1 - O CENÁRIO
É interessante dar-se uma visão panorâmica da ambiência onde
foram realizadas as entrevistas.
Trata-se da Esplanada dos Ministérios que, como o próprio nome
diz, reúne em um grande espaço plano e descoberto, um conjunto de edifíçios
distribuídos aos pares, organizados um ao lado do outro, separados por um
imenso gramado, compondo uma estrutura de beleza plástica impressionante,
concebido para abrigar a direção maior do poder executivo federal.
54
Situada em Brasília, capital da república, cidade de desenho
arquitetônico arrojado e monumental, a esplanada dos ministérios faz parte assim,
do contexto representativo da administação pública brasileira, idealizado sob a
forma de um aeroplano, conhecido como Plano Piloto, que tem como base de
comando, em sua extremidade frontal, a estrutura composta pelo Palácio do
Planalto, que desempenha a função do poder executivo máximo, através da
Presidência da República; pelo Congresso Nacional, representado pelo Senado
Federal e pela Câmara dos Deputados, organizações maiores da estrutura
legislativa; e, pelo Supremo Tribunal Federal que identifica a representação última
do poder judiciário.
A Comissão Nacional de Residência Médica, ocupando parte do
segundo andar da sede do Ministério da Educação e do Desporto, vinculada
organicamente à Secretaria Nacional de Educação Superior, responde pela
gerência de 2054 programas em todo o país, contando com 12.455 médicos
residentes ligados a essa estrutura, distribuídos em 278 hospitais autorizados a
funcionar dentro do sistema de RM (6).
A presidência da CNRM é ocupada pelo próprio Secretário Nacional de Educação
Superior, entretanto os trabalhos da Comissão são efetivamente exercidos pela
Secretaria Executiva da CNRM e sua Assessoria Técnica.
(6) Esses dados correspondem ao total de médicos-residentes, programas credenciados e hospitais
autorizados a funcionar no ano de 1994, conforme informação repassada pela própria Secretaria Executiva
da CNRM.
55
Os membros representantes da CNRM, em geral, não residem em
Brasília;
deslocam-se
para
lá
quando das
reuniões
ordinárias,
ou
em
excepcionalidades, pois coordenam programas de residência médica de diversas
instituições, distribuídas em todo o país. Desta forma, permanecem reunidos por
três dias, geralmente a cada bimestre, perfazendo um total de seis reuniões
anuais.
As reuniões plenárias são preparadas pelos assessores técnicos
da Secretaria Executiva e, habitualmente, é nessa ambiência onde acontecem as
discussões e análises sobre a inclusão de novos programas ou sobre a
manutenção de programas já existentes que mereçam renovação do seu
credenciamento, ou ainda sobre outros temas de relevância relacionados à gestão
da Residência Médica.
Quando da realização das entrevistas, no início do mês de
novembro de 1995, além da pauta ordinária, estava acontecendo naquele palco
político uma discussão bastante especial que tratava da própria existência da
CNRM e a sua manutenção como gestora do sistema de residência médica no
país.
Ocorria portanto, naquele momento, a necessidade de se rever a
gestão da residência médica e sua efetiva representatividade, por encontrar-se o
56
poder ali representado em situação de emergente instabilidade, devido a
reapresentação de um projeto formulado pela Câmara dos Deputados, que dispõe
sobre as atividades de pós-graduação "lato sensu" na área da saúde, entendo-se
como tal, além da RM, as atividades de aperfeiçoamento, estágios e outros formas
de especialização. ( Jorge, 1991 )
Esse projeto, que tramita desde 1991, apresenta uma proposta de
reformulação da gerência dessas modalidades de treinamento no setor saúde,
criando uma nova Comissão, que seria responsável por todas as atividades
docente-assistenciais desenvolvidas pela área, fazendo com que a CNRM
deixasse de cumprir sua principal finalidade, qual seja, a de responder
administrativamente por este tipo de especialização médica, perdendo assim,
portanto, a sua própria razão de ser e de continuar a existir.
É
nesse
contexto
que
foram
procedidas
as
entrevistas,
encontrando-se os sujeitos da pesquisa sob forte sentimento de tensão, uma vez
que o trabalho até aí realizado poderia sofrer reformulaçães e, passando para uma
nova forma de gestão, conseqüentemente, corria o risco de ver transferidgerência
da RM para outra pasta, menos específica e mais geral.
57
4.2 - OS ATORES
Após essa visão geral sobre a ambiência em que se encontra a
CNRM, serão agora apresentados os representantes da Comissão.
Ressalte-se que todos os membros representantes da CNRM,
assessores técnicos e regionais, bem como a secretária executiva são médicos,
excessão feita apenas ao Presidente da Comissão, pois, por ser o mesmo
Secretário Nacional de Educação Superior, necessariamente não deverá ser
médico. Obrigatoriamente conta-se com a participação de um médico residente,
em geral, o presidente da Associação Nacional dos Médicos Residentes (ANMR),
ou seu representante legal, como membro efetivo na Comissão Nacional.
Foram entrevistados dez membros da CNRM, dentre esses:
• a secretária executiva;
• três assessores técnicos;
• cinco assessores regionais (7); e
• o representante da federação nacional dos médicos.
(7) Dos cinco assessores regionais entrevistados, dois representavam também a presidência das Comissões
Estaduais de Residência Médica do Rio de Janeiro e de São Paulo.
58
4.3 - A INTERPRETAÇÃO DOS ATORES
Por serem os membros efetivos da CNRM, todos representantes
de funções dentro de uma mesma profissão, já de saída apresentam um recorte
peculiar na sua formação, enquanto organização administrativa.
Inserindo-se direta ou indiretamente no contexto da educação
médica de pós-graduação, seja sob o ponto de vista das instituições universitárias
de ensino superior, seja sob a visão das organizações hospitalares de natureza
assistencial, esses atores deslocam suas análises para os pontos de maior
interesse por área de atuação.
No que diz respeito à primeira etapa da entrevista, qual seja, a
situação da Residência Médica na atualidade, de uma maneira geral, grande parte
dos entrevistados concordou com a RM constituindo-se como a melhor
modalidade de treinamento médico especializado vigente no país.
" ... A Residênc.ia Nédica é um programa
de pós-graduação, em n.ível de especialização,
aliás reconhecido por todos os pa.íses que a
oferecem . ..
. . . nós achamos que a RN, na atualidade
é
sem
dúvida
nenhuma
o
melhor
meio
de
especialização médica . .. "
59
,um
especialista,
quando
na
formação pela RN, é uma pessoa que tem mais
cr.i tério, que tem mais fundamento, eles são mui to
mais precisos no diagnóstico, , , "
", , ,A RN,
prá mim, é fundamental, pelo
forma
mão-de-obra
ela
motivo:
seguinte
especializada, com capacidade de incorporação de
tecnologias e saberes na área médica, , , "
,eu vejo a RN como uma necessidade
importante na formação do médico, " esse programa
de especialização que é o mais importante., do
ponto de v.ista da profissionaIização, , , "
,nós acredi tamos que a RN é uma
instituição
que
já
está
consolidada
no
Bras.il, , ,esta si tuação de haver cada vez mais uma
disseminação de programas de RN por todo o
Brasil, traduz mui to bem este tipo de si tuação,
em que a formação de recursos humanos como
especialistas e que nós acreditamos que seja a
melhor maneira de formar especialistas que existe
no momento, a maior e a melhor, , , "
"",bem, sintetizando, eu acredito que
a insti tuição RN forma recursos humanos de boa
qualidade, na maioria dos locais, Creio que não é
mui to fácil que se encontrem locais,
mesmo
aqueles que possam ser considerados de menor
qualidade, onde não haja uma formação razoável
60
dos médicos e onde eles não tenham uma formação
de atividade prática boa . .. "
formação de
" ... eu creio que a
recursos humanos para trabalhar na assistência,
que é a finalidade fundamental da RN, é alcançada
na maior parte dos programas . .. "
, ' ... eu
vejo
a
RN
como
uma
forma
extremamente importante, na formação de recursos
qualidade
para
as
humanos
de
primeira
necessidades do pa.ís . .. "
, ' ... a
RN
é
um
programa
de
pós-
graduação em n.ível de especialização,'. .. para que
ela possa ser desenvolv.ida, esse grupo da RN
estabeleceu uma porção de critérios, uma porção
de normas, estabelecendo um curriculum m.ínimo
para inúmeras especialidades e para as áreas
preferenciais de cl.ínica médica, cirurgia geral,
obstetr.ícia, pediatria e medicina preventiva e
social, então isso é o básico . .. "
Algumas outras análises foram feitas, não tanto pelo ponto de
vista da importância, mas pela visão da necessidade de reestruturação do sistema
de residência, devido distorções que se procederam na RM.
61
transformou
se
em
RN
um
graduação,
compl emen to
da
que
deveria
ser
terminal e que não é.
O médico procura a
residência para completar o aprendizado dele, em
grande parte das vezes . .. "
.. a
que que é a RN no Brasil,
a tualmen te? É compl emen to de graduação? É um
curso de especialização? .. "
.o
" ... algumas regras gerais existentes
não se aplicam a todos os locais ... tem que ter
uma regra que não seja extremamente fixa, tem que
ter um certo grau de maleabilidade . ..
" ... eu acho que existe um excesso de
exigênc.ias que são relacionadas com certos
preciosismos técnicos que ficam só na teoria ... e
que de repente, começa a ser uma exigência geral
e que não é conseguida em quase nenhum lugar . .. "
vem
.. a
RN
ser
um
a
complementador, infelizmente, não deveria,
é, na formação do médico . .. "
papel
mas o
... um dos papéis da RN é al terar essa
formação inadequada, esse vício de medicina feita
em ponta . .. "
62
, 'eu acho que não se pode esquecer toda
a relação da RN com a graduação, em grande parte
ela é muito menos um processo de especialização e
mui to mais de complementação, de suplência das
deficiências que a graduação têm ...
" ... algumas especialidades evoluiram
mui to, algumas incorporaram tecnologia durante
esse tempo todo. Então, há 20 anos atrás não
tinha tomogra fia,
como tem hoje,
não tinha
ul trassom, não tinha nada disso e, os programas,
como são antigos, não contemplam essas novidades.
Isso modificou o trabalho médico, modificou a
relação profissional no campo da saúde.
não
é? .. eu acho que isso está merecendo um trabalho
de revisão ampla. . . "
Na discussão sobre a questão da promoção de qualidade nos
programas de RM, constata-se o reconhecimento, por parte dos entrevistados, da
necessidade de serem desenvolvidos alguns aspectos para que seja alcançada tal
meta.
" .. . para se falar de RN precisa ser
levado em consideração três fatos, para que ela
possa ser desenvolvida. Primeiro é a melhor.ia da
infra-estrutura hospitalar,' segundo, você tem que
ter uma dinâmica hospi talar mui to forte/
e
terceiro, nós temos o aspecto pedagógico da
RN. .. então,
a nossa or.ientação é não aceitar
programa
nenhum
que
disponha
não
de
63
infraestrutura,
de dinâmi ca..
que não
tenha
pessoal qualificado e não tenha uma proposta
adequada . .. isso é muito importante na RN. .. "
, ' ... a perspec ti va da gen te é
ter a RN
como um espaço que atenda as necessidades reais
de saúde da população . .. "
pre tende-se
num
sistema
de
checagem e de avaliação constante, assegurar que
esses programas tenham qualidade, ou seja, que
atenda o paciente da melhor maneira possível e
prepare o indivíduo adequadamente para esse atual
sistema de saúde . .. "
.o
que
se
discu ti u
no
Forum
Nacional sobre RN, em 1.9.93, foi a qualidade do
ensino, a qualidade dos programas oferecidos aos
médicos-residentes. Esse tema foi escolhido pelos
próprios residentes ... porque hoje o residente
sabe reconhecer o programa,
ele é que está
fazendo essa avaliação . .. "
eu acho que eles têm discutido e
brigado pelos direitos deles e,
também pelos
deveres,
mas a qualidade está em primeiro
lugar . ..
64
Com relação ao papel da RM frente ao mercado de trabalho, os
entrevistados não souberam informar dados precisos sobre a inserção do médicoresidente como profissional na área da saúde.
", . ,nós desconhecemos qual é o mercado
de trabalho", não sabemos quantos espec.iaIistas
nem quantos .indiv.íduos de formação geral nós
prec.isamos nesse pa.ís, , , "
", , ,eu não sei quantos c.irurg.loes eu
prec.iso,
não se.i quantos plást.icos,
quantos
pneumolog.istas, nem quantos méd.icos de fam.íl.ia eu
prec.iso, eu não se.i de nada, , , "
Sabe-se, entretanto, que o mercado de trabalho médico tem
privilegiado a formação de profissionais cada vez mais diferenciados, fomentando
a capacitação de superespecialistas, para atender as demandas exigidas pela
tecnologia cada dia mais sofisticada desenvolvida em diversas áreas da medicina,
objetivando assistir, primordialmente as camadas sociais mais favorecidas.
Desta forma, várias interpretações foram apresentadas, podendose destacar:
", , ,eu penso a RN como o espaço
estratég.ico de governo para garant.ir que o
s.istema seja v.iável, def.in.indo a conformação do
mercado prof.iss.ional na área méd.ica, que é a área
65
que decide sobre incorporação tecnológica,
todo o processo de a tenção à saúde. . . "
sobre
"então
realmente
isso
tem
um
desajuste entre o que a RN quis, quer, o que as
sociedades de especialidades pretendem e o que a
população necessi ta . .. "
" ... o mercado está privilegiando o
superespeciaIista e isso é uma coisa que a gente
tem que pensar, se a saúde e a educação tem que
ser regulada pelo mercado ou não, ou até que
ponto o mercado pode influenciar a saúde e a
educação. . . "
... o profiss.ional cada vez mais se
superespecializa e isso é uma faca de dois gumes,
porque inclusive,
favorece
a
instalação da
prole tariza ção , quer dizer,
cada vez mais a
pessoa domina uma área menor da profissão e está
mais afei to às oscilações do mercado, menos livre
do que seria se tivesse um dom.ínio maior de uma
área mais geral . .. "
" ... com
o
surgimento
da
RN nós
paral.isamos os processos de especialização e
estágios que eram formas de escravidão ou formas
de mercado de trabalho extremamente barato ...
mercado paralelo explorativo e tudo o mais . .. "
66
", , ,algumas especial idades evol uiram
muito e isso modificou o trabalho médico, isso
modificou a relação profissional no campo da
saúde, , ,e eu acho que isso está merecendo um
trabalho de rev.isão ampla, , , "
Um outro fator considerado de importância, relatado durante as
entrevistas, se deve à questão relacionada ao incremento do número de
especialidades, havendo questionamentos quanto à criação de novos programas.
, , ,é um conjunto de interesses que
motiva diversos atores a definir pela criação de
um novo programa de RN ou pela ampliação de vagas
e um desses fatores pode não ter haver com os
in teresses de a tenção à
saúde e
s.im com
interesses pontuais de grupos econômicos da área
da saúde, , , "
", .. nesses
atores
eu
colocaria
sociedades de especialidades, uma boa parte delas
têm um comportamento ético, preocupado com o
desenvolvimento cient.ífico, mas outras têm mesmo
um atrelamento d.ireto à medicina de grupo, à
indústr.ia de equipamentos e medicamentos, que
servem de ve.ículos para defender interesses
desses agrupamentos de cunho mais econômico, para
definir que tipo de profissional vai se colocar
no mercado e qual é o perfil de consumo que vai
se estabelecer . . , "
67
", , ,no final da década de 60 e in.í cio da década
de 70, com a criação de novas faculdades, isso representou um
momento de crescimento grande das especialidades, estimulado,
inclusive,
por
uma
pol.ítica
de
governo
que
tinha
como
pretensão tornar o mercado médico mais especializado, , , "
Sobre os critérios de ampliação do tempo da especialização (8) e
dos conteúdos programáticos desses novos programas, diversos depoimentos
foram proferidos.
", , ,o
marco
concei tual
diferente
completamente
do
estrutural,', , ,então,
nosso
é
marco
veja bem, as especialidades vão surgindo de
acordo com a aspiração do corporativismo e não
conforme as necessidades do mercado, , , "
", , ,porque de .1.987 para cá, as coisas
quase
que
dupli caram
em
número
de
programas, ,existe uma alternativa de um ano
foram
opcional,
porque
quando
criadas
as
resoluções era para, digamos., sedimentar algum
conhecimen to e a.í você podia pedir um ano
opcional, , , "
(8) Desde a criação da CNRM, foi estabelecido que os programas de RM podem ter um 3° ano opcional, de
acordo com a conveniência e possibilidade da Instituição que pretenda oferecê-lo, objetivando o
aprofundamento dos conhecimentos e habilidades do residente. (Brasil, MEC, Resolução 05/79)
68
", , ,Só
que
o
negócio
f.icou
descaracterizado, o cara pede um R4 e um R5 em
Cardiologia,
para
fazer
só
processos
não
invasivos, quer d.izer, é um negócio mui to fora da
realidade, , , "
, ,aqui tem universidade que tem R5
de Otorrino, por exemplo, Não existe isso, é
brincadeira, ,
, " , ,porque tinha cara que
profissão,
virou
quase
como
profissional, tipo R4, R5, sabe", "
fazia isso
residente
", , ,então eu acho que está havendo uma
inversão de valores e aqui dentro da Comissão a
gente observa a busca tremenda que tem havido por
programas opcionais de RJ, R4 e R5, tem programa
que o residente para concluir demora cinco anos,
o que é quase o curso de graduação outra vez, , , "
,é uma coisa que tem preocupado
mui to a
Comissão,
ul timamente,
esse número
exagerado de RJ, R4 e R5 que vem se fazendo, que
isso vai contra o perf.il do méd.ico que se
pretende formar, o governo tem que pensar se é
negócio para ele bancar tanta bolsa para formar
um superespeciaIista que não interessa a esse
própr.io governo, , ,
69
Com relação à proposta de ensino da residência médica, é
conhecida a intenção de diversas escolas médicas em aproveitar o período
dedicado à RM, para servir como pré-requisito à pós-graduação "strito sensu"
(Mestrado e Doutorado) e, assim, estimular a formação de pesquisadores, bem
como encurtar a etapa discente, preparando profissionais para a carreira
acadêmica.
" ... a nossa proposta, desse grupo que
está há mui to tempo aqui na CNRN, é assegurar a
qualidade do treinamento, como um programa de
pós-graduação, como um pré-requisito para a pósgraduação stricto sensu, de tal maneira que a
etapa do mestrado, na área relacionada com o
ciclo profissionalizante do curso de medicina,
seJa eliminada . .. "
" ... eu sempre defendi que a residência
fosse o núcleo da pós-graduação... ela dever.ia
ser vista como núcleo mesmo, pois qualquer passo
antes
teria
que passar por esta
experiência . .. "
... eu vejo a RN, que é uma formação
de pós-graduação lato sensu, como o caminho para
o stricto sensu e eu não cons.igo imaginar nenhuma
forma outra de se chegar ao stricto sensu sem
passar pelo processo da RN. . . "
" ... vamos pr.ivilegiar a quaIidade de
determinados programas que têm alguma tradição de
70
pesquisa,
daquelas
insti tuições
mais
tradicionais,
insti tuições
universi tárias
de
ensino, e a.í nós podemos queimar essa etapa, o
que já está sendo feito na antiga Escola Paulista
de Nedicina e na Federal de Ninas, onde eu tenho
acompanhado e isto já está sendo poss.ível para
de terminados indi v.íduas, em de terminadas teses de
dou tarado. . . "
, ' ... eu
pesquisa mesmo,
pesquisar . .. "
acho
que
porque
a
RN
ninguém
tem
que
ter
aprende
sem
A segunda parte da entrevista diz respeito ao papel da CNRM
frente à gestão da Residência Médica no país.
De uma maneira geral, houve unanimidade com referência à
manutenção da Comissão, enquanto órgão normativo central e consultor, que
estabelece diretrizes comuns, norteadoras do funcionamento dos programas em
todo o país, dentro de uma visão macro da política nacional do sistema de
residência médica.
, ,
CNRN é um órgão, digamos assim,
de
instituição de pol.í ti cas,
na busca
da
qualidade, em n.ível nacional, dos programas de
RN... o papel da comissão é incontestável e
realmente é um local de discussão, de pensar
.. . A
71
grande em termos de RN, , ,um órgão coleg.iado, com
caráter normat.ivo no estabelecimento de poIít.icas
de educação,
que no caso da res.idência é
cons.iderada uma modal.idade de tre.inamen to, , , "
",a CNRN, na m.inha op.in.ião, tem um
papel
fundamental,
que
é
o
papel
de
normat.izar, , ,um outro fator .importante, a CNRN
tem o papel .important.íss.imo de def.in.ir mercado de
trabalho médico no Bras.il, , , "
, , ,a CNRN duran te esses anos todos,
eu
acho
que
ela
teve
um
papel
de
res.istênc.ia, , ,aqu.i no NEC é ev.idente que não
houve nenhuma cont.inu.idade adm.in.istrat.iva, , ,então
das poucas co.isas estáve.is aqu.i,
dentro do
N.in.is tér.io ,
era
essa
Com.issão, que
manteve
m.in.imamente uma un.idade, sobretudo porque ela é
uma Com.issão representat.iva,
quer d.izer,
ela
func.iona no NEC mas ela não é do NEC , ,ela tem
represen tação não só do NEC mas também do
N.in.istér.io da Saúde,
do Conselho Federal de
Ned.i c.ina,
da Assoc.iação Nacional dos Néd.icos
Res.iden tes, da Federação Nac.ional dos Néd.i cos,
enf.im,
ela
é
bastante
representat.iva,
um
coleg.iado,
Nesse
sent.ido
ela
é
bastante
democrát.ica, , , "
72
Consideraram, entretanto, que há necessidade premente de
serem revistas as normas existentes, procurando promover flexibilidade aos
critérios atuais de gestão .
uma
coisa
que precisa ser
pensada que a CNRN começou em 1.977 e, de lá prá
cá
o
número
de
programas
têm
aumen tado
assustadoramente, quer dizer, cada vez f.ica mais
di fícil, no n.ível central se controlar tantos
programas. . . "
. . .é
" ... eu acho que é primord.ial essa
rev.isão, que seja uma rev.isão participativa, onde
as sociedades possam dar o seu aval ... "
" ... eu acho que cabe à CNRN rever qual
é o seu papel enquanto espaço de gestão, para dar
conta da nova missão da RN... a perspectiva da
gen te é ter a .RN como um espaço que a tenda às
reais necessidades de saúde da população . .. "
" ... eu acho que hoje, a CNRJIf, enquanto
estrutura capaz de dar conta de toda a gestão do
sistema de RN, ela sozinha se torna um aparelho
burocrático e cartorial, que não consegue dar
conta de uma gestão que busca a qualidade dos
programas e a aproximação desses programas à
realidade e à necessidade da população . .. "
73
"" ,a CNRN tenta controlar esses mil e
tantos programas de RN, ou mais do que isso, que
tem nesse pa.ís de proporções continentais, com
essas normas que estão sendo modificadas, de
acordo com o passar dos anos, Essa gerênc.ia é
centralizada e, com normas únicas para o Brasil
todo, o que também é inadministrável , , , "
,porque
hoje
tudo
é
Bras.ília:
credenciar,
recrecredenciar,
autorizar,
enfim
fica
verificação
programas,
de
uma
sobrecarga aqui, quando muita coisa deveria ser
fei to nas regiões, não desvirtuando a RN, quer
dizer,
a mola mestra ficaria aqui, mas que
fossem
algumas
caracter.ísticas
regionais
obedecidas, , "
CNRN
precisa
,a
urgen temen te
modernizar as suas atividades,
sem
dúvida
nenhuma, e acredito que o mais urgente seja a
agilidade,
a
descentralização
e
a
profissionaIização da equipe, , , "
,têm normas demais que não são
seguidas
nós
precisamos
atender
e
as
pecuIiaridades, ou seja., exigências no Norte e 110
Nordeste, que em determinadas insti tuições, não
podem ser as mesmas do Rio Grande do Sul, as
coisas são distintas, Nos Estados, o produto
interno é completamente distinto, , , "
74
", , ,é claro
uma
regra
única
diferentes, , ,
que nós não podemos
porque
as
pessoas
ter
são
Desde 1987 foi regulamentada a criação das Comissões
Estaduais de Residência Médica através de resolução ministerial. A partir de
então, iniciou-se de forma incipiente o processo de descentralização dos trabalhos
da CNRM,
entretanto não foram estabelecidos critérios para o efetivo
funcionamento dessas Comissões, ou seja, foi legitimada a existência das
mesmas, sem porém ser discutido qual seria o seu papel, ou que nível de
autonomia seria atribuído ao funcionamento dessas Comissões.
Assim sendo, foram se formando as Comissões em alguns
Estados, de forma dispersa, sem um controle sobre o seu funcionamento, ou que
tipo de atividades lhes corresponderia, encontrando-se dificuldades de natureza
política ou estrutural no que concerne à sua existência ou manutenção.
Sob esse aspecto, as análises feitas pelos entrevistados seguem
a idéia comum de reconhecer a necessidade da implantação e implementação das
Estaduais, sendo ressaltados alguns pontos:
", , ,o meu enfoque é
ass.im, a CNRN em
funções espec.í fi cas, de uma visão macro, de uma
visão pol.ítica nacional, O fortalecimento das
75
Comissões Estaduais, na orientação, na seleção
dos programas, de comum acordo com o aparelho
formador
e
o
aparelho
empregador
e
das
consul torias necessárias para a CNRJIf. .. "
" .. existe
a
proposta
de
descentralização da RJIf, estamos reforçando cada
vez mais as Comissões Estaduais para que elas
organizem a RJIf nos seus Estados e a CNR}If, dessa
forma, possa ficar com tempo mais livre para
trabalhar com outros aspectos da RJIf, deixando
essa prática de gerência e fiscalização para as
Estaduais . .. "
A CNRJIf ficaria mais como um órgão
normativo, regulamentador e as Estaduais mais
como executores . .. "
, 'eu
acho
assim,
que as comissões
estaduais vão primeiro fortalecer mais a CNRJIf/
elas vão corrigir algumas eventuais diferenças,
enfim dar mais força prá CNRJIf desafogar os
serviços e que aqui possa ficar com aquela visão
mais geral, mais pol.ítica, mais normativa . ..
. têm sido formadas as Comissões
Estaduais de RJIf, ligadas à CNRJI1., na tentativa de
descentralizar os trabalhos e
fazê-los mais
eficientes . .. as Comissões Estaduais estão muito
mais perto dos programas que a gente está aqui em
Bras.ília . .. "
76
" ... do ponto de vista do sistema de
direção, a gente está modificando este perf.il,
quando a gente passa a ter uma Comissão Nacional,
com Comissões Estaduais com autonomia gerencial,
para
fazer
parte
do
processo
de
gestão
dividido . .. "
Quanto a análise sobre a definição de credenciamento de
programas
pela
CNRM,
os
entrevistados
apresentaram
as
seguintes
interpretações:
, ' ... mas a CNRN não pode abrir mão é do
credenciamento de programas de RN (.9), porque se
ela deixar as Estaduais com o poder de credenc.iar
pela primeira vez, ela perde a razão de ser, de
existir, ela pode ser transformada num simples
escritoriozinno . .. "
... a
CNRN fica
com o papel de
normatizar,
de definir a poIítica,
definir
diretrizes e fazer o primeiro credenciamento . .. "
... o credenciamento tem que f.icar
centralizado até prá voce def.inir o perfil de RN
no pa.ís, quais os novos programas que devem ser
cr.iados. . . "
77
No que diz respeito ao papel da CNRM como gestora da principal
modalidade de especialização frente a outros atores, promotores de outras formas
de capacitação na área médica, os entrevistados ressaltamalguns pontos
cosiderados polêmicos:
" ... eu
acho
que
agora,
misturar
estágio de pequena, média e longa duração com RN.
porque os médicos que fazem estágios de dois
meses, um mes, dois dias, não recebem nada. é
misturar coisas trabalhistas com programa de
treinamento de pós-graduação, de espec.ialização,
tipo treinamento em serviço, já determ.inado por
uma lei, que é a lei da residência médica; as
outras,
eu
acho
que
tem
que
ser
até
discipl inadas,
quem . .. "
eu
não
sei
por
onde"
nem por
" .. . para
nós RN é
uma
coisa
e
especialização é outra, eu acho que até tem que
ser discutido, mas a outro n.ível, em outro local,
com outras pessoas, eu acho que não dá para
misturar as duas coisas . .. "
" ... nós, incl usive, estamos remetendo
aquela outra discussão de especializações e
outras coisas pro âmbito do Conselho Nacional de
Saúde,
que
também eu acho que
tem mui ta
capacidade
de
legislar
sobre
outras
especi al izações . ..
78
" ... a
mim me
preocupa
também
esses
cursos de especializações e esses estágios, mas
existem resoluções e leis que norteiam,' existe
uma lei do antigo Conselho Federal de Educação, a
.12/83,
que
é
espec.ífica
para
cursos
de
especialização e que prevê, inclusive, sobre a
concessão
de
bolsas
para
cursos
de
espec.ialização/ se você for a CAPES, vai ficar
surpreso
com
a
quantidade
de
cursos
de
especialização na área médica, na região sudeste
e nordeste em competição com a RN. .. os estágios
têm alei 3.9.9.9/6.1, que ainda não foi revogada e
que os regulamenta . .. "
Um outro ponto importante das entrevistas recaiu sobre a
avaliação do projeto de lei da Câmara dos Deputados, de n° 1.394 de 1991,
elaborado peo Deputado Eduardo Jorge, que prevê a criação de uma nova
Comissão, que responderia pelas diversas atividades de pós-graduação "lato
sensu" da área da saúde, compreendendo neste universo a gestão de
modalidades de treinamento, tais como: aperfeiçoamento, estágios e outras
formas de especialização, além da residência médica.
" ... a.í passa
a
ser uma
Comissão
Nacional de Estágio, Especialização e outras
coisas. Isso complica, eu acho qur tem lei demais
nesse pa.ís. Tem leis que dão certo e leis que
nunca dão certo, não é isso 7 ...
79
, ,é uma coisa assim mais concreto,
mais pé no chão esse novo projeto, Pode ser que
vá desagradar muita gente, mas eu pessoalmente
acho que ele é mais abrangente, em termos do
médico concluir a espec.ialização, , ,
, " , ,porque tem um proje to de 1 ei que
está em trami tação no Congresso Nacional que
ampl i a
a
composi ção da
CNRJ.[ trazendo novos
atores, atores que são gestores dos serviços de
saúde, atores que são os usuários, que antes não
tinha, a tores que vão ser obje to do processo de
formação, que são os estudantes, , ,
", , ,há
um
novo
projeto
de
lei
colocando normas que vão ser discutidas pela
categoria, não vão ser feitas em gabinetes, não
vão
vontades
de
grupos
ser
acolhidas
as
corporativos de especialidades,
mas sim uma
discussão mais ampla" ,Nós recebemos e
nós
transmi timos juntos com os residentes todo esse
sistema
negociaçào
para
uma
nova
de
formulação, , , "
", ' ,então,
eu acho que
com esse
projeto, se vier realmente se tornar a nova lei
da RJ.-l eu acho que em vár.ios aspectos a gente vai
conseguir andar e andar bem, , , "
", , ,então o que está acontecendo hoje
é isso, existe uma proposta de lei que moderniza,
descentraliza,
de
certa
forma
agiliza
os
trabalhos da CNRN, mas sem perder aquele cordão
umbilical que eu acho que tem que existir, , ,a não
ser desse jei to não tem razão nem da CNRN
existir, , , "
80
Entretanto, desde a data de realização das entrevistas, em
novembro de 1995, até o mês de junho do corrente ano, não ocorreu qualquer
modificação no cenário estabelecido aquela época, onde parecia estar se
processando um momento decisivo na história da pós-graduação médica.
Encontra-se em processo de discussão um pedido exarado pelo
grupo de assessores técnicos da CNRM, encabeçados pela própria secretária
executiva, para ser inserido no substitutivo daquele projeto de lei o direito da
Comissão poder permanecer respondendo por sua pasta, através da revisão e da
modernização da estrutura, com a descentralização das atividades da CNRM, o
que parece ter ressonância junto ao representante do legislativo.
Nesta pesquisa, voltada para a compreensão do processo sóciopolítico-educacional que envolve a gestão da Residência Médica, tendo ouvido
diversos atores engajados neste projeto, faz-se necessário refletir sobre as
palavras de Maciel (1995), quando recomenda que:
"Temos de decidir, com objetividade e
franqueza,
se buscamos competência ou diploma.
Temos de pensar também no que custa a carreira
médica,
em
tempo,
dinheiro
e
oportunidades.
Busquemos os caminhos mais adequados e procuremos
afastar os empecilhos de leis e regulamentos que
estorvam nossa marcha. Não caiamos na tentação de
remendar a Educação Nédi ca para a tender disposições
que não se adaptam a ela. "
81
CAPíTULO V - CONSIDERAÇÕES FINAIS
Após a análise dos dados levantados pela pesquisa, faz-se
necessário repensar e tecer alguns comentários sobre o papel da CNRM,
enquanto gestora da Residência Médica no processo da especialização médica.
Dentre as vantagens de se ter um sistema hierarquizado, ainda
que com normatização centralizada, a CNRM, nos seus 18 anos anos de
existência, buscou promover a uniformidade das ações, através de critérios
balizadores pertinentes a essa forma de pós-graduação médica, baseando-se na
discussão entre uma diversidade importante de instituições que respondem pelo
componente especialização médica no Brasil.
A Comissão Nacional de Residência Médica encontra-se na
atualidade procurando resgatar a sua própria identidade, como gerência de
recursos humanos do setor saúde, tendo em vista a dinâmica das políticas
relacionadas ao setor que pretendem unificar as diversas formas de capacitação
Lato Sensu, dentro de uma mesma estrutura orgânico-funcional na área da saúde.
Devido a interface que se procede com o setor educação, a
CNRM, objetivando distinguir a Residência Médica das outras modalidades de
treinamento da área da saúde, dadas as especificidades que envolvem tal
82
atividade, entende-se que tal projeto inviabiliza a gerência da Residência Médica e
dilue o poder da mesma.
No que diz respeito às desvantagens, insere-se a CNRM no
escopo das instituições envolvidas com a política educacional, que, embora
representada por atores do mais elevado conceito acadêmico-profissional, incorre
no perigo da omissão ou da não discussão sobre questões consideradas de
relevada importância, dentre elas destacando-se a preparação do profissional
médico para esta modalidade de ensino, o não reconhecimento curricular desses
profissionais e sua prática de ensino frente a academia e as questões de natureza
trabalhista que envolvem o médico-residente.
Ressalta-se ainda a omissão da CNRM com relação a inserção do
médico-residente no mercado de trabalho, a não execução por parte da Comissão,
de um diagnóstico epidemiológico situacional e, a partir daí, a não implementação
de estratégias voltadas para viabilizar as demandas efetivas do setor.
Por se tratar de uma organização voltada para a gestão da
educação médica, é pertinente identificar a CNRM dentro da estrutura de
acompanhamento e avaliação do processo educacional, merecendo desta forma
permanecer como parte integrante do grupo de trabalho da Secretaria de
Educação Superior, do Ministério da Educação e do Desporto, nos mesmos
moldes de outras comissões lá existentes, que avaliam o contexto da estrutura
83
educacional como um todo. Não é porque a Comissão trata de assuntos
relacionados à área medica que tem que obrigatoriamente estar na pasta da
saúde.
É
de
fundamental
importância
legitimar
o
processo
de
descentralização da gestão da Residência Médica nos Estados, através da
implantação
de
novas
Comissões
Estaduais
de
Residência
Médica
e
implementação das atividades já desenvolvidas pelas existentes. buscando assim
reestabelecer a credibilidade da CNRM frente aos diversos atores que elaboram a
política de RM nas diversas instituições seja de natureza acadêmica ou
assistencial.
Dada a impossibilidade de continuar procedendo toda gestão da
RM de forma centralizada,
devido ao grande número de programas já
estabelecidos, cabe à CNRM estimular maior participação das entidades que
compõem o sistema de RM, no nível estadual, na elaboração de um novo projeto
que compreenda o diagnóstico situacional de cada região e suas peculiaridades,
para que desta forma, possa efetivar uma gestão mais sensível sobre as questões
que envolvem a necessidade de formação de recursos humanos para o setor.
É primordial que a CNRM continue promovendo normas e critérios
que estabeleçam um padrão de assistência médica à população, compatível com
84
os recursos utilizados para a capacitação do profissional através desta modalidade
de treinamento de pós-graduação médica.
Tendo em vista as características inerentes à CNRM de fomentar
a capacitação do profissional médico, dentro da perspectiva educacional, cabe a
ela, em consonância com os diversos atores do componente educacional voltados
para a área da saúde, contribuir na reestruturação da profissão médica, através da
reavaliação da inserção deste profissional na área da saúde, estimulando a
promoção de pesquisas ligadas ao setor, objetivando cada vez mais o
aperfeiçoamento desta modalidade de desenvolvimento de recursos humanos
para o mercado de trabalho.
Concorda-se ainda com a manutenção da CNRM como órgão
principal, normativo e legitimador da especialização médica, cabendo a ela
estabelecer os critérios de acompanhamento e avaliação dos programas de
residência médica, em nível nacional, partilhando com as Comissões Estaduais as
propostas descentralizadas de gestão participativa.
Deve também ser ressaltada a necessidade da CNRM rever a
política de valorização do profissional que atua como preceptor de RM,
principalmente aquele vinculado à area de assistência, procurando estimular a
motivação para que este profissional tenha sua função reconhecida frente à
proposta acadêmica que envolve o sistema de residência médica.
85
No que diz respeito à proposta educacional da RM, é importante a
participação da CNRM nas propostas atuais acadêmicas de considerar a
residência como pré-requisito para ingresso na capacitação "stricto sensu".
Desta forma, considera-se fundamental a revisão que tenha como
princípio um melhor aproveitamento do modelo de capacitação em nível de pósgraduação médica, dado que a residência médica, como forma tradicional de
especialização requer vários anos de treinamento, contrapondo-se a outras áreas
do conhecimento, inclusive dentro do setor saúde, onde os profissionais com
muito menos tempo de atividade pós-graduada recebem titulação curricular
superior ao título outorgado ao médico-residente.
Vislumbrando a residência médica dentro do binômio "saúde /
educação", tendo em vista seu caráter de treinamento voltado para o serviço, com
o treinando "fazendo para aprender, mesmo com todas as distorções ainda
existentes, com as idas e vindas desta modalidade de especialização médica,
acredita-se ser ainda este o campo mais favorável para serem estimuladas novas
formas de aproveitamento da capacitação médica, no seu sentido verdadeiro,
voltadas para a realidade brasileira, contribuindo assim para um melhor
desempenho desta atvidade primordial do setor saúde.
Já existem propostas educacionais estimulando a inserção da RM
na proposta de pós-graduação "stricto sensu" como pré riquisito.
86
De acordo com o depoimento da Diretora da Faculdade de
Ciências da Saúde, Prof Paulina Fernandes (1996), os programas de Residência
Médica do Hospital Universitário de Brasília já estão prevendo, dentre as
atividades curriculares da RM, uma programação complementar que inclui
pesquisa, onde o residente poderia aprofundar seu treinamento, objetivando a
continuação do curso de pós-graduação em nível stricto sensu (Mestrado) e, uma
vez cumprindo os créditos obrigatórios, poderia inclusive, ao término dessa etapa
ingressar diretamente na etapa do doutoramento.
Na nova proposta apresentada pela CNRM, que modifica o
substitutivo do Projeto de Lei apresentado na Câmara dos Deputados, a própria
0
CNRM sugere, já no seu artigo 1 que a RM possa constituir-se em etapa inicial
,
para a pós-graduação "stricto sensu", a critério de cada Instituição que ofereça
esta miodalidade de treinamento.
De comum acordo com as recomendações feitas por Chaves &
Rosa (1990), entende-se que deva ser estimulada a proposta de ensino baseada
no "aprender fazendo", por ser esta mais eficiente que o mero receber informação
passivamente.
A estratégia educacional do treinamento em serviço possibilita a
prática de ações de complexidade crescente como um dos meios mais eficazes de
promoção do aprendizado,
desenvolvendo-se de modo a
relacionar as
87
necessidades de saúde da população, o perfil epidemiológico e o perfil profissional
demandado.
o
perfil do médico residente deve corresponder ao perfil
ocupacional do médico que se espera ter a partir da reestruturação da nova
Comissão Nacional de Residência Médica, para que este esteja preparado para a
tão carente prestação de serviços da área da saúde brasileira.
88
CAPíTULO VI - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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89
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Comissão Nacional de Residência Médica. Resolução 01/78. Estabelece o
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complementação por 3° ano opcional. Diário Oficial da República Federativa
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Assessoria Técnica da CNRM. Diário Oficial da República Federativa do
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90
BRASIL; Ministério da Educação e Cultura. Secretaria de Educação Superior.
Comissão Nacional de Residência Médica. Resolução 01/87. Cria as Comissões
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