Agravo de Instrumento n° 2013.014496-2
Origem:
Vara Cível da Comarca de Currais
Novos
Agravante: Estado do Rio Grande do Norte
Procurador: Miguel Josino Neto
Agravada:
Maria Eliete Dantas de Araújo
Advogado: Joel da Silva Paulo
Relator:
Desembargador Cláudio Santos
DECISÃO
Trata-se de Agravo de Instrumento, com pedido de
efeito suspensivo, interposto pelo ESTADO DO RIO
GRANDE DO NORTE, por seu procurador, contra
decisão do MM. Juiz de Direito da Vara Cível da
Comarca de Currais Novos/RN, que, nos autos da
Ação Ordinária (proc. nº 010509-70.2013.8.20.0103)
proposta contra si por MARIA ELIETE DANTAS DE
ARAÚJO, determinou o bloqueio via BACEN JUD
no valor de R$ 82.550,00 (oitenta e dois mil
quinhentos e cinquenta reais), e posterior liberação da
quantia através de alvará, para o custeio de
procedimento cirúrgico.
Alega o Agravante, em síntese, que:
a) a parte Agravada ajuizou procedimento ordinário
em face do ora Agravante, informando que é
portadora de "mesotelioma peritoneal maligno",
necessitando de tratamento cirúrgico específico, tendo
sido informada de que o respectivo tratamento não era
coberto pelo SUS
em nenhum hospital do País;
b) se dirigiu ao Natal Hospital Center e foi informada
que ali seria o único estabelecimento nesta Capital
que realizaria tal procedimento médico, sob o custo de
R$ 136.000,00 (cento e trinta e seis mil reais);
c) ante da impossibilidade econômica, veio a juízo
requerer do ora Agravante, o custeio do procedimento
médico;
d) diante disso, o MM juiz da Vara Cível da Comarca
de Currais Novos requereu que fosse certificada, pela
Secretaria correspondente, a quantidade de processos
ajuizados em desfavor da Fazenda Estadual referentes
a "tratamento médico", indicando um quantitativo de
39 (trinta e nove) processos e 1 (uma) Ação Civil
Pública;
e) na mesma data da expedição da referida certidão,
foi proferida decisão pelo Juízo originário da Vara
Cível daquela Comarca, determinando que o Estado
arcasse com as despesas do procedimento médico
solicitado pela paciente ora Agravada, sob pena do
bloqueio de verbas;
f) além da tutela de urgência, a referida decisão
determinou ainda, "a suspensão de todas as ações do
Estado (...) na mídia (publicidade/propaganda), até
que sejam materializados todos os direitos referidos
nos processos constantes às fls. 50/53;
g) o MM. Juiz justificou que a decisão "tem o escopo
de impedir que o dinheiro público não seja gasto em
setores que a população não tem interesse",
determinando, ainda, ao final: 1) a intimação da
Governadora do Estado para informar o dia, local e
nome da equipe médica responsável pela cirurgia, sob
pena de bloqueio e interposição de ação de
improbidade; 2) a intimação da Governadora para
suspender todos os serviços de publicidade e
propaganda custeados pelo Estado; 3) suspensão de
mandados de intimação as empresas de mídia para
que suspendam os serviços de publicidade e
propaganda custeados pelo estado; 4) expedição de
mandados de intimação as empresas de mídia para
que informem os serviços prestados nos últimos 12
(doze) meses, os valores pagos e os pendentes de
pagamento; 5) intimação da ora Agravada para
apresentação de 3 orçamentos; 6) intimação do
Secretário de Comunicação para que apresente relação
de todas as empresas de publicidade/propaganda que
receberam verba do Estado, providenciando a
suspensão dos repasses financeiros;
h) o MM juiz prolator da decisão concedeu algumas
entrevistas em programas de rádio, antes mesmo da
publicação da prefalada decisão;
i) no dia posterior a publicação da decisão, a SESAP
informou ao Juízo quanto à impossibilidade de
realização da cirurgia em sua rede conveniada,
acrescentando que o procedimento poderia ser
adequado para "quimioterapia intracavitária",
entretanto dependeria da aquiescência dos serviços
privados, bem assim o aprazamento da data de sua
realização também estaria vinculada a disponibilidade
do centro cirúrgico;
j) após a apresentação dos respectivos orçamentos
pela parte Agravada, opôs Embargos de Declaração
argumentando, em apertada síntese: 1) que existe a
possibilidade de realização da citada cirurgia em
hospital particular cadastrado como UNACON, por
meio do SUS, fato que afasta a determinação de
bloqueio de verbas públicas; 2) necessita de
esclarecimento a parte da decisão que determinou a
Governadora do Estado que indique a equipe médica,
uma vez que poderá ser realizado pela rede privada; 3)
necessário esclarecimento, ainda, da decisão no
sentido de explicar melhor se os serviços de
publicidade que se refiram às campanhas de cidadania
e de saúde também precisam ser suspensas, uma vez
assegurada a publicidade dos atos nos termos do art.
37,§ 1º da Constituição Federal; 4) imprescindível
evidenciar quais os parâmetros de razoabilidade que
levaram o Juízo a fixar multa pessoal à Governadora
do Estado no valor de 1 milhão de reais;
l) o Juiz de primeiro grau determinou a ouvida da
parte adversa, bem assim do Ministério Público,
entendendo ainda pela efetivação de bloqueio das
contas do Estado no valor informado pela paciente ora
Agravada, autorizando a expedição do respectivo
alvará, e manteve a decisão de suspensão de toda a
propaganda do Governo, até que se garanta o direito à
saúde em todos os demais processos existentes na
Vara Cível de Currais Novos;
m) existe vedação legal, constante do art. 1º, § 1º, da
Lei nº. 8.437/92, para que o Juiz de primeiro grau
conceda liminares quando impugnado ato seja de
autoridade sujeita à competência originária de tribunal
na via de mandado de segurança;
n) suscita a sua ilegitimidade passiva para figurar no
polo passivo feito, sob o argumento de que o SUS
determina a competência de cada ente federativo em
relação aos procedimentos médicos, de modo que o
Município possui gestão plena, conforme as Leis nº
8.080/90 e 8.124/90;
o) argui a existência de litisconsórcio passivo
necessário em razão da existência de interesse direto
da União no feito, por se tratar de procedimento
médico cuja responsabilidade de custeio deverá ser
pactuada pela Comissão Intergestora Tripartite do
SUS, devendo a competência ser transferida para a
Justiça Federal.
Ressalta, ainda, a ausência dos requisitos para a
concessão da tutela antecipada no processo originário,
diante da inexistência da verossimilhança das
alegações autorais, bem assim ressaltou a necessidade
de maiores esclarecimentos sobre o procedimento a
ser realizado, considerando que esse detalhamento
implica na exata definição da competência para o
atendimento, concluindo que não está afeta ao Erário
Estadual a prestação de serviços médico-cirúrgicos de
alta e média complexidade.
Destaca a violação constitucional impingida pela
decisão agravada, no que tange à suspensão dos
serviços de publicidade/propaganda, direito
consagrado à Administração Pública pelo art. 37, § 1º,
da Constituição Federal.
Enfatiza o ativismo judicial não pode ser exercido
sem limites pelos magistrados, fazendo observação
acerca da ingerência do Judiciário nas funções
intrínsecas do Poder Executivo.
Frisa que a multa pessoal fixada à Governadora é
ilegal e desarrazoada, considerando que a chamada
multa cominatória é cabível apenas quando o
obrigado a fazer é o particular, e não o agente público,
e que a sua incidência também contra a Fazenda
Pública implica em dupla sanção sobre um mesmo
fato jurídico, o que é vedado pelo ordenamento
jurídico.
Por fim, ressalta estarem presentes os requisitos
necessários para a concessão da liminar ao presente
recurso, em razão do risco de dano grave ou de difícil
reparação, requerendo, ao final, a atribuição do efeito
suspensivo ao Agravo, no sentido de impedir a
materialização da decisão recorrida. No mérito,
postula seja-lhe dado provimento, com a reforma da
decisão.
É o que importa relatar. Passo a decidir.
O recurso preenche seus pressupostos de
admissibilidade. Dele conheço.
Quanto ao requerimento de suspensão dos efeitos da
decisão agravada, imprescindível se faz observar se
restaram demonstrados os requisitos legais que
autorizam a sua concessão.
Conforme prescreve o art. 527, III, c/c o art. 558,
ambos do Código de Processo Civil pátrio, mediante
requerimento do Agravante, poderá ser atribuído
efeito suspensivo ao Agravo de Instrumento, quando
restar constatado fato que possa resultar lesão grave e
de difícil reparação, sendo relevante a fundamentação.
In casu, da análise do pedido em tela, observa-se que
a parte Agravante cuidou, satisfatoriamente, de
demonstrar parcialmente a existência dos
pressupostos pertinentes a ensejar o deferimento initio
litis da liminar postulada, notadamente ante a ausência
da relevância dos fundamentos do recurso.
Em sede de preliminar, arguiu o Estado a necessidade
de litisconsórcio passivo necessário entre os três entes
políticos.
A preliminar suscitada não deve prosperar.
Isto porque "é obrigação do Estado (União, Estadosmembros, Distrito Federal e Municípios) assegurar às
pessoas desprovidas de recursos financeiros o acesso
à medicação ou congênere necessário à cura, controle
ou abrandamento de suas enfermidades, sobretudo as
mais graves. Sendo o SUS composto pela União,
Estados-membros e Municípios, é de reconhecer-se,
em função da solidariedade, a legitimidade passiva de
qualquer deles no pólo passivo da demanda" (RESP
719716/SC, DJ 05/09/2005, Min. Relator Castro
Meira). (grifei)
O Ministro Gilmar Mendes corroborou tal
entendimento, ao fixar que "União, Estados, Distrito
Federal e Municípios são responsáveis solidários pela
saúde, tanto do indivíduo quanto da coletividade e,
dessa forma, são legitimados passivos nas demandas
cuja causa de pedir é a negativa, pelo SUS (seja pelo
gestor municipal, estadual ou federal), de prestações
na área de saúde" (STA 175-AgR/CE, rel. Min.
Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, DJe 30.4.2010).
publicado no DJ 09.05.2006, p. 207).
No mesmo sentido: STJ, Resp 516359/RS,
SEGUNDA TURMA, MIN. FRANCISCO
PEÇANHA MARTINS, publicado no DJ 19.12.2005,
p. 312.
Com efeito, ao estatuir, no artigo 196 da Constituição
Federal de 1988, a solidariedade na promoção da
saúde da população, em cada nível da Federação, o
constituinte originário deixou claro que qualquer um
deles será responsável pelo alcance das políticas
sociais e econômicas que visem ao acesso universal e
igualitário das ações e serviços para a promoção,
proteção e recuperação da saúde, podendo, assim, a
conduta ser exigida de cada um deles, isoladamente,
ou de todos, conjuntamente.
Com base em tal premissa, uma vez ajuizada a ação
em face do Estado do RN, que detém – juntamente
com a União e o Município – responsabilidade
solidária sobre a garantia do direito à saúde, nos
termos proclamados pela Carta Magna, não há que se
falar em necessidade de chamamento ao processo, dos
demais Entes.
Nesse contexto, rejeito a preliminar.
O Egrégio Superior Tribunal de Justiça reafirmou esse
posicionamento, como se constata do seguinte
decisum:
“PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO.
RECURSO ESPECIAL. AUSÊNCIA DE
PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS N. 282 E
356 DO STF. SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE - SUS.
FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS.
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES
FEDERATIVOS. LEI N. 8.080/90. PRECEDENTES.
1. Aplicam-se os óbices previstos nas Súmulas n. 282
e 356 do STF quando a matéria suscitada no recurso
especial não foi debatida no acórdão recorrido e nem,
a respeito, foram opostos embargos de declaração.
2. Sendo o Sistema Único de Saúde (SUS) composto
pela União, Estados-Membros, Distrito Federal e
Municípios, impõe-se o reconhecimento da
responsabilidade solidária dos aludidos entes
federativos, de modo que qualquer deles tem
legitimidade para figurar no pólo passivo das
demandas que objetivam assegurar o acesso à
medicação para pessoas desprovidas de recursos
financeiros.
3. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa
parte, provido”. (STJ, Resp 772264 / RJ, SEGUNDA
TURMA, MIN. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA,
No que concerne ao mérito da irresignação recursal,
verifica-se que o Agravo trata de debate acerca da
possibilidade de o Estado custear cirurgia a ser
realizada na pessoa da Agravada, procedimento
imprescindível à saúde desta.
Aduz o Recorrente que não se encontram presentes os
requisitos para a antecipação da tutela no caso
presente. Da análise dos autos, fácil perceber que não
assiste razão ao Estado.
A robustez do direito invocado pela Demandante, ora
Agravada, encontra-se evidenciada, uma vez que, ante
a impossibilidade material de o cidadão adquirir
medicamentos, fazer exames, ou utilizar quaisquer
outros meios terapêuticos para restabelecer sua saúde
ou prolongar sua vida, em razão do seu alto custo,
deverá o Poder Público providenciar os meios
necessários, porquanto se trata de direito fundamental
emanado de norma constitucional auto-aplicável, e,
como tal, independe de regulamentação, passível,
pois, de aplicação imediata.
Importante frisar que os arts. 6º e 196 da Constituição
Federal e os arts. 8º, 125, caput, e 126, todos da
Constituição Estadual, asseguram a todos os
brasileiros o direito à saúde, cabendo ao Poder
Público, em quaisquer de suas esferas de governo,
prover os meios para garantir a efetividade de tais
direitos, não sendo razoável a alegação de que não
haveria ressarcimento, por parte do Ministério da
Saúde, com relação ao custo dos medicamentos
necessitados, bem como a assertiva de que inexiste
previsão no orçamento, haja vista que os valores
fixados constitucionalmente para as ações públicas de
saúde, a serem efetivadas pelos Estados,
insofismavelmente, estão consignados na lei
orçamentária anual.
Assim sendo, afasta-se a possibilidade de alegação de
afronta aos princípios da reserva do possível, bem
assim da legalidade orçamentária.
Ademais, o procedimento cirúrgico solicitada pela
Autora, ora agravada, é essencial ao tratamento da
patologia que a acomete, e sua não-realização coloca
em risco a sua saúde.
Desta forma, inexiste qualquer razão para sonegar à
parte Autora, os procedimentos necessários ao
tratamento da doença que a acomete, conforme
relatório médico anexado aos autos (fl. 69/70).
De fato, o ente estatal tem o dever constitucional de
garantir a saúde de todos, “mediante políticas sociais
e econômicas que visem à redução do risco de doença
e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário
às ações e serviços para sua promoção, proteção e
recuperação.” (art. 196, CF)
Nessa linha, é dever do Poder Público, por intermédio
da União, Estados e Municípios, solidariamente,
prestar a assistência necessária à promoção, proteção
e recuperação da saúde de todas as pessoas que se
utilizem do Sistema Único de Saúde, inclusive o
fornecimento gratuito de medicamentos e a realização
de procedimentos terapêuticos.
Não basta, portanto, que o ente estatal meramente
proclame o reconhecimento formal de um direito.
Torna-se essencial que, para além da simples
declaração constitucional desse direito, seja ele
integralmente respeitado e plenamente garantido,
especialmente naqueles casos em que este - como o
direito à saúde - se qualifica como prerrogativa
jurídica de que decorre o poder do cidadão de exigir
do Estado a implementação de prestações positivas
impostas pelo próprio ordenamento constitucional.
Cumpre assinalar, finalmente, que a essencialidade do
direito à saúde fez com que o legislador constituinte
qualificasse, como prestações de relevância pública,
as ações e serviços de saúde (CF, art. 197), em ordem
a legitimar a atuação do Ministério Público e do Poder
Judiciário naquelas hipóteses em que os órgãos
estatais, anomalamente, deixassem de respeitar o
mandamento constitucional, frustrando,
arbitrariamente, a sua eficácia jurídico-social, seja por
intolerável omissão, seja por qualquer outra
inaceitável modalidade de comportamento
governamental desviante, de modo que a decisão
vergastada não infringiu os comandos constitucionais
e legais apontados no recurso, sendo falacioso dizer
que houve ofensa ao princípio da autonomia estatal.
Neste contexto, a matéria posta em debate na presente
ação não enseja maiores controvérsias, uma vez que já
pacificada na jurisprudência dos Tribunais Superiores
e desta Corte de Justiça.
O Supremo Tribunal Federal, sobre o tema, assim se
manifestou:
"EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO
DE INSTRUMENTO. CONSTITUCIONAL.
DIREITO À SAÚDE. MEDICAMENTOS.
FORNECIMENTO A PACIENTES CARENTES.
OBRIGAÇÃO DO ESTADO.
I - O acórdão recorrido decidiu a questão dos autos
com base na legislação processual que visa assegurar
o cumprimento das decisões judiciais.
Inadmissibilidade do RE, porquanto a ofensa à
Constituição, se existente, seria indireta. II - A
disciplina do art. 100 da CF cuida do regime especial
dos precatórios, tendo aplicação somente nas
hipóteses de execução de sentença condenatória, o
que não é o caso dos autos. Inaplicável o dispositivo
constitucional, não se verifica a apontada violação à
Constituição Federal. III - Possibilidade de bloqueio
de valores a fim de assegurar o fornecimento gratuito
de medicamentos em favor de pessoas
hipossuficientes. Precedentes. IV - Agravo regimental
improvido." (AI 553712 AgR, Relator: Min.
RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma,
julgado em 19/05/2009)
No mesmo sentido, RE 264.269/RS, Rel. Min.
Moreira Alves, DJ 11/04/2000; RE 273.834/RS, Rel.
Min. Celso de Mello, DJ 02.02.2001; RE-AgR
271286/RS, Relator Min. Celso de Mello, DJ
24/11/2000.
Ainda nesse diapasão, cito julgados do Superior
Tribunal de Justiça:
"EMENTA: ADMINISTRATIVO - MOLÉSTIA
GRAVE - FORNECIMENTO GRATUITO DE
MEDICAMENTO - DIREITO À VIDA E À SAÚDE
- DEVER DO ESTADO – MATÉRIA FÁTICA
DEPENDENTE DE PROVA.
1. Esta Corte tem reconhecido aos portadores de
moléstias graves, sem disponibilidade financeira para
custear o seu tratamento, o direito de receber
gratuitamente do Estado os medicamentos de
comprovada necessidade. Precedentes.
2. O direito à percepção de tais medicamentos decorre
de garantias previstas na Constituição Federal, que
vela pelo direito à vida (art. 5º, caput) e à saúde (art.
6º), competindo à União, Estados, Distrito Federal e
Municípios o seu cuidado (art. 23, II), bem como a
organização da seguridade social, garantindo a
"universalidade da cobertura e do atendimento" (art.
194, parágrafo único, I).
3. A Carta Magna também dispõe que "A saúde é
direito de todos e dever do Estado, garantido mediante
políticas sociais e econômicas que visem à redução do
risco de doença e de outros agravos e ao acesso
universal e igualitário às ações e serviços para sua
promoção, proteção e recuperação" (art. 196), sendo
que o
"atendimento integral" é uma diretriz constitucional
das ações e serviços públicos de saúde (art. 198).
4. O direito assim reconhecido não alcança a
possibilidade de escolher o paciente o medicamento
que mais se adeqüe ao seu tratamento.
5. In casu, oferecido pelo SUS uma segunda opção de
medicamento substitutivo, pleiteia o impetrante
fornecimento de medicamento de que não dispõe o
SUS, sem descartar em prova circunstanciada a
imprestabilidade da opção ofertada.
6. Recurso ordinário improvido. (STJ, RMS 28338 /
MG, Relatora: Min. Eliana Calmon, Segunda Turma,
DJe 17/06/2009). (destaquei)
No mesmo sentido, RESP 684646/RS, Rel. Min. Luiz
Fux, DJ 30.05.2005; RMS 11129/PR, Rel. Min.
Francisco Peçanha Martins, DJ 18.02.2002; RESP
249026/PR, Rel. Min. José Delgado, DJ 26/06/2000;
RMS 11183/PR, Rel. Min. José Delgado, DJ
04/09/2000.
No que respeita ao entendimento desta Corte,
menciono os seguintes precedentes, inclusive desta
Relatoria: AI nº 2005.005867-3, Rel. Des. Cláudio
Santos, DJ 14/03/2006; MS nº 2005.005853-2, Relª:
Desª. Judite Nunes, DJ 21/03/2006; MS n.º
2005.005846-0, Rel. Des. Dúbel Cosme, DJ
21/03/2006; MS nº 2005.005194-7, Rel. Des. Dúbel
Cosme, DJ 21/03/2006, MS.2006.000707-1, Rel. Des.
Cláudio Santos, DJ 10/08/2006.
Contudo, quanto à implementação das providências
necessárias ao cumprimento da decisão agravada,
vislumbra-se que elas foram tomadas sem a
observância de determinados parâmetros de
legalidade.
Na realidade, não se sustenta a alegação do Estado,
quanto à impossibilidade de fixação de multa
cominatória (astreinte) em face da Fazenda Pública,
com espeque no art. 461, § 4º, do CPC, cuja medida
não é direcionada apenas ao particular, como sugere o
ente estatal,
A respeito da matéria, o Superior Tribunal de Justiça
tem entendimento sedimentado. A conferir:
ADMINISTRATIVO. MILITAR. ACIDENTE DE
SERVIÇO. INCAPACIDADE PARCIAL.
REFORMA. DIREITO RECONHECIDO.
ANTECIPAÇÃO DE TUTELA CONCEDIDA.
REQUISITOS. ART. 273 DO CPC. REEXAME.
SÚMULA 7/STJ. FIXAÇÃO DE ASTREINTES
CONTRA A FAZENDA PÚBLICA.
POSSIBILIDADE.
1. Não se conhece da alegada ofensa ao art. 535 do
CPC quando a parte limita-se a apresentar alegações
genéricas no sentido de que o Tribunal de origem não
apreciou todas as questões levantadas, sem indicar
concretamente em que consistiu a suposta omissão.
Aplicação da Súmula 284/STF.
2. É remansosa a orientação do STJ de que o militar,
ainda que temporário, quando demonstrada a sua
incapacidade para o serviço castrense, faz jus a
reforma remunerada, desde que demonstrado o nexo
de causalidade entre a moléstia sofrida e a prestação
do serviço militar.
3. Hipótese em que o Tribunal a quo, com base na
prova dos autos, consignou estarem presentes os
elementos constitutivos da incapacidade laborativa em
razão do serviço prestado às Forças Armadas. A
revisão desse entendimento implica reexame de
provas, obstado pelo teor da Súmula 7/STJ.
4. A alteração do julgamento da instância ordinária,
soberana na análise dos elementos fático-probatórios
dos autos, acerca dos requisitos que autorizam a
antecipação da tutela (art. 273 do CPC), esbarra
também no óbice da Súmula 7/STJ.
5. É cabível, mesmo contra a Fazenda Pública, a
cominação de multa diária (astreintes) como meio
executivo para cumprimento de obrigação de fazer ou
entregar coisa (arts. 461 e 461-A do CPC).
6. Agravo Regimental não provido.
(AgRg no Resp 1273092/PE, Rel. Ministro HERMAN
BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em
28/02/2012, DJe 12/04/2012)
No entanto, num exame perfunctório, próprio desta
fase, verifico que as diversas determinações judiciais,
contidas no aludido decisum de primeiro grau,
extravasaram o ambito de atuação jurisdicional.
Na realidade, as deliberações judiciais endereçadas à
Exmª. Srª Governadora do Estado conflitam, num
primeiro exame, com a regra normativa inserta no art.
1º, § 1º, da Lei n. 8.437/092, que veda a concessão de
liminares em face de ato de autoridade sujeita à
competência originária de tribunal na via do mandado
de segurança.
Nesse contexto, como a determinação judicial está
corporificada na pessoa da Governadora, em face de
omissão estatal a si imputada, há de se lhe afastar tais
provimentos.
Nesse sentido, colho os seguintes precedentes do E.
Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
CONSTITUCIONAL. COMPETENCIA. ATO
ADMINISTRATIVO EMANADO DE PLENARIO
DE TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO.
AÇÃO CAUTELAR INOMINADA.
INCOMPETENCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. ART.
1O., DA LEI N. 8.437/92, ART. 109, VIII DA CF/88
E ART. 21, VI, DA LOMAN.
- NOS TERMOS DO ART. 1O., PAR. 1O., DA LEI N.
8.437/92, A COMPETENCIA DO JUIZO DE
PRIMEIRO GRAU EM SEDE DE PROVISÃO
CAUTELAR DEVE SER AFASTADA QUANDO SE
BUSCA ATACAR ATO DE AUTORIDADE
SUJEITO A APRECIAÇÃO ORIGINARIA DE
TRIBUNAL, MEDIANTE A IMPETRAÇÃO DE
AÇÃO MANDAMENTAL.
(...)
- CONFLITO CONHECIDO. COMPETENCIA DO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 16A.
REGIÃO, O SUSCITANTE.
(CC 14.710/MA, Rel. Ministro VICENTE LEAL,
TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 09/04/1997, DJ
19/05/1997, p. 20551)
AGRAVO REGIMENTAL. MANDADO DE
SEGURANÇA. INDEFERIMENTO DA INICIAL.
OMISSÃO DA INSTITUIÇÃO DE ENSINO
SUPERIOR - IES. INSCRIÇÃO TARDIA NO
ENADE/2010. AUTORIDADES COATORAS. INEP
E MINISTRO DA EDUCAÇÃO. PEDIDO
ALTERNATIVO DE DISPENSA DA PROVA.
- Perda do objeto em relação ao pedido de
participação no Enade/2010, tendo em vista a
realização da prova após a impetração.
- A impetração do mandado de segurança não
dispensa um mínimo de instrução do feito até mesmo
para verificar o interesse de agir - agora relativa à
dispensa da prova, o ato coator, a autoridade coatora e
o Juízo competente.
- Ausência, no caso, de demonstração da prática de
qualquer ato ou de omissão por parte do Ministro da
Educação.
Agravo regimental improvido.
(AgRg no MS 15.839/DF, Rel. Ministro CESAR
ASFOR ROCHA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em
23/02/2011, DJe 01/04/2011)
AGRAVO REGIMENTAL EM RECLAMAÇÃO.
ANTECIPAÇÃO DE TUTELA POR JUIZ FEDERAL
EM AÇÃO ORDINÁRIA AJUIZADA CONTRA A
UNIÃO. USURPAÇÃO DA COMPETÊNCIA DO
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.
INOCORRÊNCIA.
(...)
2. Embora competente para o julgamento da ação
ordinária, o magistrado sofre efetiva limitação no
exercício do poder de cautela quando o ato
impugnado é de autoridade sujeita, na via de mandado
segurança, à competência originária de tribunal, por
força do artigo 1º, parágrafo 1º, da Lei nº 8.437/92,
importando em efetiva usurpação da competência
desta Corte, impugnável por meio da Reclamação
prevista no artigo 105, inciso I, alínea "f", da
Constituição Federal, o deferimento de tutela
antecipada pelo juízo de primeiro grau quando o ato
impugnado é do Conselho da Justiça Federal.
Precedente da Corte Especial (Rcl nº 1.526/DF,
Relator Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, in
DJ 7/3/2005).
(...)
4. Agravo regimental improvido.
(AgRg na Rcl 4299/SP, Rel. Ministro HAMILTON
CARVALHIDO, CORTE ESPECIAL, julgado em
17/12/2010, DJe 15/02/2011)
De outra parte, com bem enfatizado pelo Agravado, os
atos de execução das políticas públicas são cometidos
diretamente aos Secretários de Estado, de modo que o
cumprimento das deliberações tomadas pelo Juiz são
da alçada do Secretário da Saúde, a quem devem ser
direcionados os provimentos liminares, e não à Chefe
do Poder Executivo.
No que concerne à suspensão da publicidade do
Governo, em cognição sumária, vislumbro ter havido
excesso na decisão combatida, porquanto, entre as
medidas necessárias e adequadas visando ao
cumprimento da decisão judicial, previstas no art.
461, § 4º do CPC, reputo como suficiente para a
efetivação da tutela específica concedida à Agravada o
bloqueio de valores para o custeio do procedimento
cirúrgico e demais despesas correlatas, o que, aliás, já
fora determinado na decisão de fls. 170/171.
Por outro lado, não cabe ao Julgador manter a
suspensão de toda a propaganda institucional do
Governo, sob o argumento de ausência de garantia do
direito à saúde em outros processos com idêntica
matéria, que tramitam naquela Comarca.
Como se sabe, a propaganda governamental está
prevista no art. 37, § 1º, CF, estatuindo tal regra
constitucional que "a publicidade dos atos, programas,
obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos
deverá ter caráter educativo, informativo ou de
orientação social, dela não podendo constar nomes,
símbolos ou imagens que caracterizem promoção
pessoal de autoridades ou servidores públicos".
No dizer do constitucionalista ALEXANDRE DE
MORAES, "(...) o princípio da publicidade dos atos
estatais, e mais restritamente dos atos da
Administração, é indispensável para imprimir e dar
um aspecto de moralidade à Administração Pública ou
à atuação administrativa, visando ao referido
princípio, essencialmente, proteger tanto os interesses
individuais, como defender os interesses da
coletividade, mediante o exercício do controle sobre
os atos administrativos".
Vê-se do texto constitucional, que há um poder-dever
de publicização dos atos, programas, obras, serviços e
campanhas dos órgãos públicos, os quais deverão ter
caráter educativo, informativo ou de orientação social.
Servem, pois, à cidadania a ampla divulgação dos atos
de Governo, pois dão densidade aos princípios da
legalidade moralidade, publicidade e eficiência,
permitindo, assim, o controle das políticas públicas e
estimulando a participação da cidadania na
consecução e no controle dos programas
governamentais. O que se veda, isto sim, é a
promoção pessoal de autoridades e servidores.
Registre-se, por pertinente, que, se houver excessos na
publicidade governamental, cabe aos órgãos de
controle, precipuamente o Ministério Público, coibir
os abusos, responsabilizando aqueles que se
desviaram da finalidade institucional ou causaram
prejuízos aos cofres públicos.
Aliás, reconheça-se que há importantes ações de
cunho social veiculadas pela publicidade institucional,
direcionadas à políticas públicas, dentre as quais as de
saúde, não sendo razoável, nesse contexto, admitir-se
a suspensão de toda a propaganda institucional do
Governo.
E mais se avulta a desproporcionalidade do
provimento jurisdicional atacado, ao se considerar que
tal medida foi tomada apenas para garantir um
tratamento médico orçado em R$ 136.000,00 (cento e
trinta e seis mil reais), cujo bloqueio já foi, inclusive,
realizado na conta do Tesouro.
Ora, da mesma forma como determinou o bloqueio de
valores para assegurar a realização de procedimento
cirúrgico requerido na ação originária, poderá o Juiz
assim o fazê-lo novamente quanto aos demais feitos
em que deduzidos pleitos similares.
Ademais, tal determinação extrapola o limite de
atuação jurisdicional no caso concreto, na medida em
que malfere os limites objetivos e subjetivos da lide
originária, posto que espraia seus efeitos para outras
causas, com a pretensão oculta de lhe emprestar
efeitos erga omnes, o que não se compadece com o
nosso sistema jurídico-processual.
Quanto ao periculum in mora, este se encontra
patenteado, ante a paralisação da publicidade de
diversas ações, programas educativos, serviços e
campanhas de interesse da coletividade, o que é
suficiente para caracterizar a lesão grave e de difícil
reparação.
Ante o exposto, defiro parcialmente o pedido de
liminar, nos seguintes termos:
a) direcionar para o Secretário de Saúde a
determinação, contida no item "a" da decisão
agravada, para que seja informado, no prazo de cinco
dias, o dia, local e nome da equipe médica
responsável pela cirurgia a ser realizada na parte
autora, excluindo a responsabilização da Governadora
pelo bloqueio de verba pública para a realização do
procedimento na rede privada;
b) revogar a determinação para que seja suspensa toda
a propaganda paga pelo Estado, bem como a multa
pessoal ali cominada, em caso de descumprimento;
c) suspender os efeitos dos mandados de intimação
endereçados às empresas de comunicação ali
relacionadas, que determinou a suspensão imediata da
veiculação de todos os serviços de
propaganda/publicidade pago pelo Estado do Rio
Grande do Norte, bem assim a multa por
descumprimento ali cominada;
d) suspender a determinação judicial no sentido de
que os órgãos de imprensa referidos na decisão
agravada enviem ao Juízo de primeiro grau
demonstrativo informando os serviços prestados nos
últimos doze meses, os valores pagos e os que estão
pendentes de pagamento, bem como a multa
cominatória ali fixada;
e) suspender a intimação pessoal do Secretário de
Comunicação Social do Estado para que envie ao
Juízo originário a relação de todas as empresas que
recebem valores do Estado do Rio Grande do Norte
para veicular propaganda/publicidade, assim como
que determinou a suspensão dos repasses financeiros
àquelas;
f) determinar que o Secretário de Saúde do Estado
faça o acompanhamento do cumprimento da medida
liminar concedida em favor da Agravada, envidando
esforços para solucionar a controvérsia.
Oficie-se ao Juízo a quo, com urgência, enviando-lhe
cópia do inteiro teor desta decisão, solicitando-lhe as
informações cabíveis, as quais deverão ser prestadas
no prazo legal.
Intime-se o Secretário Estadual de Saúde, nos termos
acima expostos.
Intime-se a Agravada, para, querendo, responder ao
Agravo, dentro do prazo legal, facultando-lhe juntar
cópia dos documentos que entender conveniente.
Oportunamente, encaminhem-se os autos à
Procuradoria de Justiça, para os fins pertinentes.
Após, voltem-me conclusos.
Publique-se.
Natal, 30 de agosto de 2013.
Desembargador CLÁUDIO SANTOS
Relator
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Agravo de Instrumento n° 2013.014496