ASPECTOS HISTÓRICOS E ARTÍSTICOS DAS PRAÇAS DE BURLE MARX: PRAÇA DO ENTRONCAMENTO, PRAÇA PINTO DAMASO E PRAÇA MINISTRO SALGADO FILHO. Helen Maria Palmeira Medeiros1, Ana Rita Sá Carneiro2 1 2 UFPE, Dep. Arquitetura e Urbanismo, Lab. da Paisagem, [email protected] UFPE, Dep. Arquitetura e Urbanismo, Lab. da Paisagem RESUMO Roberto Burle Marx projetou em Recife vários jardins públicos no período entre 1934-37 e 1957-58. O reconhecimento desses espaços públicos como obras de arte e por isso, como patrimônio cultural é um dos objetivos do Laboratório da Paisagem-UFPE. Este trabalho, portanto, trata da pesquisa histórica e artística de três praças públicas projetadas por Burle Marx no Recife. A Praça do Entroncamento, no bairro das Graças e a Praça Pinto Damaso, na Várzea foram foco da atenção do paisagista, embora já existissem antes de seus projetos. A Praça Ministro Salgado Filho ou, como é mais conhecida, a Praça do Aeroporto é um projeto de Burle Marx de 1957 e mantém seu desenho original até hoje. Para embasar medidas futuras de conservação, entendendo tais praças como Jardins Históricos, segundo o conceito da Carta Patrimonial de Florença (UNESCO, 1981), a pesquisa teve como objetivo produzir informações para o Inventário dos Jardins de Burle Marx. O estudo é importante para a cidade do Recife porque aos poucos seus habitantes passam a conhecer a história dos jardins públicos e passam a valorizá-los como elementos estruturadores na paisagem urbana. Palavras-Chave: jardim histórico; Burle Marx; paisagem cultural INTRODUÇÃO A presente pesquisa está inserida na pesquisa realizada pelo Laboratório da Paisagem da UFPE com o título ?A conservação da Paisagem Cultural como Patrimônio Natural e Construído nas cidades do Nordeste?. Nessa pesquisa integrada, o foco é a paisagem cultural do Recife, caracterizando-a segundo unidades de paisagem, através da análise morfológica dos espaços livres públicos e potenciais, obedecendo a critérios pré-estabelecidos que privilegiam a abordagem do patrimônio cultural. Um subprojeto volta-se para a elaboração do 'Inventário dos Jardins de Burle Marx', que envolve as cidades do Nordeste. Nesse contexto, esta pesquisa se deteve no estudo dos valores estéticos e históricos de três praças em nossa cidade - a Praça do Entroncamento, no bairro das Graças; a Praça Pinto Damaso, no bairro da Várzea e a Praça Ministro Salgado Filho, no Ibura com a finalidade de confirmar o projeto de Roberto Burle Marx.. Em Recife, Burle Marx realizou seus primeiros projetos de jardins públicos. Algumas das mais belas praças dessa cidade, tais como a Praça de Casa Forte e a Praça Euclides da Cunha (1935), são de sua autoria. No entanto, vários desses espaços estão em estado precário de conservação e precisam ter seus valores históricos e artísticos demonstrados em pesquisa para sua proteção como jardins históricos e patrimônio cultural. Até o momento não se pode confirmar com exatidão quantos espaços públicos projetados por Burle Marx foram realmente concretizados. A quantidade varia entre 11 e 13 espaços. Desses o Inventário privilegiou 8 para a primeira etapa. Essa pesquisa, portanto, tem sua relevância ao levantar informações sobre inventário de jardins históricos, incluindo a ficha modelo, e sobre a história da criação das praças de Burle Marx, dados fundamentais para o futuro tombamento desses jardins no Recife. MÉTODOS A pesquisa se pautou, de início, na análise da bibliografia sobre os jardins históricos. Em seguida, foi elaborada a ficha da Praça Euclides da Cunha, a fim de utilizá-la como parâmetro para as demais praças, já que o Laboratório da Paisagem dispunha de todas informações necessárias ao preenchimento da mesma. Durante essa etapa, foram analisadas as Cartas Patrimoniais da UNESCO, bibliografia sobre a obra paisagística de Roberto Burle Marx, além de trabalhos de alunos de conclusão de graduação e de bolsistas de pesquisas anteriores. Alguns livros de sobre a história do Recife também foram consultados. Outros modelos de inventários foram examinados, como o da professora Nelci Tinem, em João Pessoa, que realizou o levantamento das ruas do centro daquela cidade. Ou mesmo, o de Saúl Alcântara, no México, com o modelo de ficha do Horto Histórico do Museu de Virreinato. Outra etapa foi o levantamento histórico através de visitas aos acervos públicos. Os periódicos pesquisados foram: Diário da Manhã, de janeiro a março de 1934; o Jornal do Recife, de maio a outubro de 1934; o Jornal do Commercio de fevereiro de 1957; o Diário da Tarde de janeiro de 1935 e de janeiro de 1937; o Diário de Pernambuco de janeiro a agosto de 1957, de novembro de 1960 e de março de 1980; o Boletim de Engenharia, de dezembro de 1924 a julho de 1925 e junho de 1934. Nesse levantamento foram encontradas notícias esclarecedoras sobre a história dos espaços públicos no Recife. Também foi contemplada a visita a acervos iconográficos. O levantamento cartográfico foi realizado principalmente no DPSH-URB e com mapas do próprio acervo do Laboratório da Paisagem. As visitas às praças, foram importantes para complementar as informações nos mapas. As entrevistas com moradores e usuários das praças também foram realizadas, sobretudo no caso da Praça Pinto Damaso. O artista plástico Abelardo da Hora, chefe da Diretoria de Parques e Jardins da Prefeitura do Recife em 1960, também foi entrevistado. RESULTADOS Depois de estudos em bibliografia especializada, foi elaborado o modelo de Inventário, ou seja, a ficha para cada jardim, que será utilizado para todos os jardins de Burle Marx contabilizados pelo Laboratório da Paisagem. Além de texto explicativo, constam no inventário mapas, plantas, croquis e fotos. Na Revista de Pernambuco de 1925, anuncia-se a inauguração do Parque do Entroncamento. Seguindo a descrição do parque, percebemos que o traçado pouco mudou na praça. Embora exista o desenho de Burle Marx de 1936 para a praça, a pesquisa concluiu que esse espaço não sofreu intervenções de Burle Marx. A única informação que sinalizava a possível realização do projeto do paisagista era esse desenho, mas nenhuma informação adicional foi encontrada. A planta baixa do projeto de 1925 confirma que as palmeiras imperiais existentes na praça já faziam parte do projeto original e o traçado daquele desenho se assemelha bastante ao encontrado atualmente. À semelhança da Praça do Entroncamento, apesar de ter sido alvo das intenções do paisagista, a Praça da Várzea não teve seu projeto realizado. Em levantamento iconográfico realizado no Museu da Cidade do Recife e em conversa com moradores, descobrimos que era na porção menor da praça onde ficava a antiga estação de bondes da Várzea. Assim, a praça sempre foi dividida em duas partes: uma menor onde ficava a estação e outra maior onde era a praça, propriamente dita. Os bondes elétricos foram inaugurados no Recife em 13 de maio de 1914 e só em 1934 Burle Marx chega ao Recife, permanecendo até 1937 e retornando depois, permanece de 1957 a 1958. Portanto, o paisagista já encontrou a praça dividida em duas porções e a intenção de transformá-la em uma só estava em seu projeto. No entanto, a praça continua dividida em duas porções tal como em 1914, só que agora sem a estação. Além disso, as entrevistas com moradores antigos mostram que o desenho de Burle Marx nunca foi concretizado. Em seu desenho, o paisagista propôs fontes e pérgolas, elementos marcantes em espaços públicos. Mas quando conversamos com moradores antigos, ninguém lembrava desses elementos, mas sim dos coretos que de fato existiram nas praças por volta de 1940. A praça do aeroporto foi a única da pesquisa que irá fazer parte do inventário dos jardins de Burle Marx no Recife. A praça foi construída em 1957 a partir do projeto original de Roberto Burle Marx. Uma das ameaças mais fortes à preservação desse projeto é a manutenção da vegetação que juntamente com o traçado, é um dos elementos mais representativos da obra de Burle Marx presente naquele jardim e sua descaracterização implica na desvalorização do projeto. DISCUSSÃO E CONCLUSÃO A pesquisa nas três praças ressalta a importância dos espaços públicos do Recife, sobretudo o valor histórico que há nelas porque revelam a própria história da cidade. Embora não façam parte do Inventário dos Jardins de Burle Marx no Recife, as praças da Várzea e do Entroncamento apontam a necessidade de maiores cuidados com a conservação de sua paisagem porque pelas suas qualidades históricas constitui também um patrimônio na vida dos moradores. A Praça Pinto Damaso está inserida na Zona Especial de Preservação do Patrimônio Cultural e Histórico da Praça da Várzea. No entanto, algumas construções no seu entorno, do século XIX e do início do século XX, estão em precário estado de conservação. A praça é um agradável espaço público bastante apropriado pela comunidade que a utiliza diariamente em todos os horários. Como elemento de valorização do conjunto histórico pode ser prejudicada pela presença de ambulantes e comércio de rua, o que sem maiores cuidados, pode constituir ameaça à preservação de um conjunto arquitetônico importante para cidade. Já a Praça do Entroncamento, construída em 1925, tem seu traçado e elementos principais mantidos até hoje. Entretanto, a verticalização das edificações no entorno desequilibra as relações espaciais e visuais com a praça. É necessário fortalecer a identidade da população com esses espaços e ainda mais despertar o desejo da preservação da memória da cidade do Recife. Finalmente, a Praça Ministro Salgado Filho é uma das praças mais belas do Recife, com seu desenho original mantido até hoje e com princípios modernos de concepção. Mas é importante investigar o valor artístico e histórico desse espaço público para garantir sua proteção como patrimônio cultural. É preciso proteger os espaços públicos como são protegidas as edificações. Nunca é demais relembrar o ocorrido com a Praça Euclides da Cunha, que perdeu totalmente seu desenho original ao longo dos anos, fato que não teria ocorrido se seu valor artístico já tivesse sido destacado. O estudo das praças de Burle Marx tem marcado uma nova fase da vida do Recife, pois aos poucos seus habitantes passam a conhecer a história dos jardins e passam a valorizar esse elemento estruturador de tantas funções relevantes na paisagem urbana. REFERÊNCIAS [1] ALCANTARA, Saúl. Plano Mestre para a recuperação Monumental e Ambiental do Horto Histórico do Museu Nacional de Virreinato, Tepotzotlan, Estado do México. [2] CURY, Isabelle (org).Cartas Patrimoniais. Rio de Janeiro: IPHAN, 2000. [3] DELPHIM, Carlos Fernando. Manual de Intervenção de Jardins Históricos. Rio de Janeiro: IPHAN, 2005. [4] MARX, Roberto Burle. Arte e Paisagem: Conferências escolhidas. São Paulo: Nobel, 1987. [5] SÁ CARNEIRO, Ana Rita. MESQUITA, Liana de Barros. Espaços Livres do Recife. Recife: Prefeitura da Cidade do Recife. Universidade Federal de Pernambuco, 2000.