O ENSINO DE QUÍMICA ORGÂNICA NA QUÍMICA NOVA NA ESCOLA PRIMEIRA PARTE DE UMA ANÁLISE DE TENDÊNCIAS Maria Eduarda de Brito CRUZ1 e José Euzébio SIMÕES NETO2 1 Unidade Acadêmica de Serra Talhada, Universidade Federal Rural de Pernambuco UFRPE, Serra TalhadaPE. E-mail: [email protected] Telefone: (87)3831 2053. 2 Unidade Acadêmica de Serra Talhada, Universidade Federal Rural de Pernambuco UFRPE, Serra TalhadaPE. E-mail: [email protected]. Telefone: (87)3831 2053. RESUMO A parte da química que estuda os compostos do elemento químico Carbono, com exceção dos compostos de transição, é denominada Química Orgânica. Esta parte da química exige um alto grau de abstração, e o trabalho com seus conceitos no Ensino Médio é um problema de relevância, sendo comumente tratado na literatura. O objetivo deste trabalho é fazer um levantamento inicial dos trabalhos sobre o ensino da química orgânica, utilizando como base a Revista Química Nova na Escola, publicação da Sociedade Brasileira de Química, e que serve de referência tanto para os pesquisadores da área como para professores da educação básica. Os artigos analisados foram classificados de acordo com a tipologia: ano de publicação, local de origem, tópico abordado e natureza da pesquisa. Observamos uma boa ocorrência de artigos relacionados com esta parte da química, principalmente dos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Pernambuco. Ainda, observamos que a maior parte dos artigos abordam o tópico de funções orgânicas, com ações, na maior parte das vezes, experimentais ou de contextualização. PALAVRAS CHAVE: Ensino de Química, Química Orgânica, Química Nova na Escola, SBQ, Análise de Tendências. 1 INTRODUÇÃO Chamamos de Química Orgânica a parte da Química que estuda os compostos do elemento químico Carbono (C, Z=6), em sua grande maioria (excluindo os chamados compostos de transição, como por exemplo, CO e CO 2). A química orgânica surgiu mediante proposta didática de divisão desta ciência, feita por Torben Olof Bergman (1735-1784), químico sueco, no ano de 1777. Para ele, a química se dividia em duas: orgânica (que estudava os compostos do corpo dos seres vivos) e inorgânica (que estuda os minerais). A mudança na definição da química orgânica veio apenas com Antoine Laurent Lavoisier (1743-1794), que verificou a presença do elemento químico carbono em todos os compostos até então dito orgânicos. (SIMÕES NETO, 2009). A primeira das teorias para o entendimento dessa classe de compostos foi proposta pelo químico sueco J. J. Berzelius (1779 – 1848), no ano de 1808, a chamada Teoria da Força Vital, ou como preferem alguns autores, Vitalismo. Segundo esta teoria, os compostos orgânicos só podem ser formados no interior dos corpos dos seres vivos, pois estes possuem uma força vital, única possível de fabricar tal classe de compostos. Essa teoria perdurou até 1828, quando o alemão Friedrich Wöhler (1800 – 1882), partindo do cianato de amônio, conseguiu, por aquecimento, obter a uréia, composto orgânico. (SOLOMONS e FRYHLE, 2000) NH2 NH4OCN O C NH2 Figura 01: Síntese da Uréia a partir de Composto Inorgânico. Esse experimento, aliado com outros semelhantes, derrubou a teoria do vitalismo e modificou a forma de ver e agir na química orgânica. O caminho ficou livre para outro alemão, Friendrich August Kekulé (1829-1896) lançar as bases da moderna química orgânica, baseada na tetravalência e na capacidade de formar ligações do átomo de carbono. Por apresentar uma diversidade enorme de compostos, com diferenças de propriedades enormes, devido as conexões entre os átomos, criando diversos grupos funcionais (tais como carbonilas, carboxílas e nitrilas), o estudo da química orgânica exige muita abstração e raciocínio espacial (SIMÕES NETO e BRITO LIMA, 2010). Nas palavras de Souza Júnior et al. (2009), sobre o ensino de química orgânica: O estudo de tal disciplina é, para muitos, tarefa árdua, provavelmente por não verem a relação entre determinado tópico e sua aplicação, isto provoca no aluno desestimulo e a uma antipatia pela disciplina. (SOUZA JÚNIOR et al., 2009, p. 01). Nascimento, Ricarte e Ribeiro (2007) estão em consonância com a ideia apresentada anteriormente, indicando que: ... na escola vivemos um paradoxo, pois o ensino de Química Orgânica geralmente possui uma abordagem desconectada do cotidiano do aluno, extremamente teórica. O ensino de Química Orgânica nas escolas deve ser trabalhado de forma mais dinâmica e contextualizada, tendo como objetivo despertar o interesse do aluno através da correlação entre os conteúdos abordados na disciplina, seja de cunho teórico ou prático. (NASCIMENTO, RICARTE E RIBEIRO, 2007, p. 01) Fica evidente a necessária renovação nos aspectos teóricos, metodológicos e motivacionais no ensino da química orgânica. E essa renovação é foco de trabalho de diversos grupos de pesquisas espalhados pelo Brasil. É grande o número de artigos científicos trabalhando com conceitos ligados ao ensino da química orgânica, nas mais diversas revistas da área de ensino de química no nosso país, em atenção especial, a Química Nova na Escola (QNEsc), publicação da Sociedade Brasileira de Química (SBQ), devido a força do seu nome, bem como sua grande abrangência: atende a pesquisadores da área e professores da educação básica, que tem interesse por melhorias no processo de ensino. O objetivo deste trabalho é identificar a produção científica no nosso país relativa ao ensino de química orgânica, usando como referência a produção científica na Revista Química Nova na Escola, da Sociedade Brasileira de Química, do primeiro número até o vigésimo oitavo, quando a revista deixou de ser semestral e passou a ser trimestral. 2 METODOLOGIA Para o desenvolvimento deste trabalho, escolhemos trabalhar com as primeiras edições da revista Química Nova na Escola, entre os anos de 1994 e 2007, quando a revista circulava em edições semestrais, pois trata-se da primeira parte deste levantamento (a segunda arte, análise da revista em versão trimestral constitui o objetivo de trabalho futuro). A escolha da revista foi feita mediante a importância e relevância para a área, bem como da abrangência da publicação, que não foca só nos professores do Enisno Médio e Fundamental, nem apenas nos pesquisadores - busca trazer artigos que abordem assuntos e temas de interesse de ambos os tipos de profissionais. Para o levantamento, foi feita uma pesquisa com características de uma análise de tendências rudimentar, onde os seguintes passos foram seguidos, apresentados aqui em ordem de realização: a) Busca pelos títulos. Nesta etapa, marcamos e destacamos os títulos de trabalhos que fariam referência a conceitos ou processos ligados a área de química orgânica, independente da natureza do artigo ou tópico discutido no mesmo. b) Leitura criteriosa dos resumos dos trabalhos selecionados, buscando refinar na escolha, procurando evitar a análise de trabalhos onde o ensino de química orgânica não é central, e sim, plano de fundo ou situação proposta para ações diversas. Os trabalhos selecionados foram então classificados em categorias tipológicas, visando identificar semelhanças e diferenças entre os diversos trabalhos encontrados. Das categorias sugeridas, serão apresentadas nos resultados: ocorrência anual - situar os trabalhos dentro do ano de proposição; local da produção - identificar quais grupos de pesquisa, em quais instituições e estados atuam mais em trabalhos com o ensino de química orgânica; tópicos abordados - visando identificar quais os conteúdos ou tópicos da química orgânica mais desperta nos pesquisadores a atenção; e, por fim, natureza da pesquisa - se o artigo propõe uma discussão conceitual, sugestões de propostas experimentais, relatos de experiência, sugestões de contextualização ou propostas de intervenção didática. Os resultados serão apresentados em termos de discussão e análise gráfica, na próxima seção. 3 RESULTADOS E DISCUSSÃO Depois do levantamento, os trabalhos de relevância a serem considerados em nossa análise, os seguintes artigos foram considerados: - Xampus (Barbosa e Silva, 1995) - Perfumes - Uma Química Inesquecível (Dias e Silva, 1996) - Hálito Culpado: O Princípio do Bafômetro (Braathen, 1997) - Os Feromônios e o Ensino de Química (Quadros, 1998) - Polimeros Condutores (Faez, Reis, Freitas, Kosima, Rugotri e De Paoli, 2000) - Nobel 2000: Polímeros Condutores (Rocha-Filho, 2000) - Sabões e Detergentes como tema Organizador de Aprendizagens no Ensino Médio (Verani, Gonçalves e Nascimento, 2000) - Uma Abordagem Alternativa para o Ensino da Função Álcool (Rodrigues, Aguiar, Santa Maria e Santos, 2000) - Recomendações da IUPAC para Nomenclatura em Moléculas Orgânicas (Rodrigues, 2001) - Ácidos Orgânicos - Dos Primórdios da Química Experimental a sua Presença em Nosso Cotidiano (Fiorucci, Soares e Carvalheiro, 2002) - Polímeros Superabsorventes e as Fraudas Descartáveis: Um Material Alternativo para o Ensino de Polímeros (Marconato e Franchetti, 2002) - Origem, Produção e Composição Química da Cachaça (Pinheiro, Leal e Araújo, 2003) - As Drogas no Ensino de Química (Martins, Santa Maria e Aguiar, 2003) - Perfumes e Essências: Utilização de um Vídeo na Abordagem das Funções Orgânicas (Marcelino-Jr, Barbosa, Campos, Leão, Cunha e Pavão, 2004) - A Bioquímica como Ferramenta Interdisciplinar: Vencendo o Desafio da Integração de Conteúdos no Ensino Médio (Correia, Sazzani, Marcondes e Torres, 2004) - Confirmando a Esterificação de Fischer por meio dos Aromas (Costa, Ornelas, Guimarães e Merçon, 2004) - O Conceito de Oxidação-Redução nos Livros Didáticos de Química Orgânica no Enisno Médio (Mendonça, Campos e Jofili, 2004) - Metátese em Síntese Orgânica e o Prêmio Nobel da Química de 2005 - Do Plástico a Indústria Farmacêutica. (Ferreira e Silva, 2005). - Química Pré-Biótica: Sobre a Origem das Moléculas Orgânicas na Terra (Murta e Lopes, 2005) - Utilizando uma Cuscuzeira na Extração do Óleo Essencial do Alecrim da chapada (Lippia Gracillis) - Uma Planta da Caatinga (Marcelino-Jr., Barbosa, Campos, Santos, Lacerda e Silva, 2005) - Preparo e Emprego do Reagente de Benedict na Análise de Açúcares: Uma Proposta para o Ensino de Química Orgânica (Oliveira, Merçon, Santa Maria e Aguiar, 2006) - Produtos Naturais no Ensino de Química: Experimentação para o Isolamento de Pigmentos do Extrato de Paprica (Silva, Alves, Morel e Dalcol, 2006) - Proteínas: Hidrólise, Precipitação e um Tema para o Ensino de Química (Francisco-Jr. e Francisco, 2006) - Ácidos Carboxílicos e Sobrevivência: Uma Experiência de Sala de Aula (Peixoto e Oliveira, 2007). Dentro desse universo, discutiremos agora as categorias propostas em nossa metodologia. a) Ocorrência Anual Até o ano de 2007, duas revistas eram publicadas anualmente. A quantidade de artigos em cada revista varia bastante, mas a química orgânica aparece quase que anualmente. A figura 02 mostra a evolução da ocorrência anual de trabalhos sobre o Ensino de Química Orgânica: Figura 02: Evolução da ocorrência de trabalhos sobre o Ensino de Química Orgânica na QNEsc. Podemos observar dois picos, nos anos de 2000 e 2004, onde quatro artigos acerca do ensino de química orgânica foram publicados, dando a média, para cada ano, de dois artigos por revista, algo bem relevante. O ano de 1999 foi o único em que não tivemos artigos relacionados a nosso tema em nenhuma dos dois volumes publicados. b) Local de Produção Numa distribuição por regiões, o sudeste do país é o principal responsável por trabalhos o ensino de química orgânica, com dezesseis trabalhos, sendo a metade só do estado de São Paulo. O Nordeste aparece com três publicações, todas da Universidade Federal Rural de Pernambuco, enquanto que Centro-oeste e Sul aparecem com duas publicações sobre o tema, cada. Nenhum tem origem na região norte. A figura 02 mostra a distribuição por estados: Figura 03: Distribuição por Estados dos Artigos sobre Ensino de Química Orgânica na QNEsc. c) Tópicos Abordados Consideramos para fins de classificação os seguintes tópicos, para o tratamento didático da química orgânica: Introdução a Química Orgânica (Carbono, cadeias carbônicas e conceitos básicos), Funções Orgânicas (Reconhecimento, propriedades e nomenclatura), Isomeria, Reações Orgânicas, Bioquímica e Polímeros. A figura 04 demonstra a divisão por tópico abordado nos artigos. Destaque para as funções orgânicas, com doze trabalhos, e reações orgânicas, com sete artigos. Entendemos que números tão maiores estão relacionados com a importância do tema, bem como a extensão dos conteúdos, maiores e mais ramificados que os outros. Figura 04: Tópicos Abordados nos Artigos Sobre Ensino de Química Orgânica na QNEsc Nenhum trabalho tratou dos temas relativos ao tópicos de introdução a química orgânica e isomeria. d) Natureza da Pesquisa Nesta etapa, observamos qual a natureza da pesquisa que deu origem ao artigo, trabalhando com as seguintes classificações, dentro de uma tipologia sugerida: discussão conceitual, sugestões de propostas experimentais, relatos de experiência, sugestões de contextualização ou propostas de intervenção didática. A figura 05 mostra a divisão de trabalhos dentro de cada classificação. Figura 05: Natureza da Pesquisa nos Artigos Sobre Ensino de Química Orgânica na QNEsc Dois artigos foram publicados como divulgação de conceitos que garantiram, nos anos de 2000 e 2005, o Prêmio Nobel da Química. 4 CONCLUSÃO Pudemos observar que em praticamente todos os anos, com exceção de 1999, artigos relacionados com o ensino da química orgânica foram publicados em ao menos um volume da revista Química Nova na Escola, o que mostra a necessidade e relevância da ações e propostas diferenciadas para o trabalho nesta área da química. O estado de São Paulo trás a maior contribuição entre todos com relação a pesquisas nesta área. Destaque também para Pernambuco, onde três artigos, todos do mesmo grupo na Universidade Federal de Pernambuco, foram analisados. Como perspectivas futuras, essa pesquisa pode ser ampliada, em duas frentes: continuar a análise, com os números mais recentes da revista, a partir do ano de 2008, quando passou a ser trimestral e utilizando pressupostos teóricos de análise de tendências, para uma catalogação mais sólida. REFERÊNCIAS SIMÕES NETO, J. E. Química Orgânica. 2 ed. Recife: Edição Própria, 2009. SOLOMONS, G.; FRYHLE, C. Química Orgânica. Volume 1. 7. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2000. SOUZA-JR., J. A.; SILVA, A. L.; MAGNO, A.; SANTOS, M. B. H.; BARBOSA, J. A. A importância do Monitor no Ensino de Química Orgânica na Busca da Formação do Profissional das Ciências Agrárias. In: XI Encontro de Iniciação à Docência da UFPB, 2009, João Pessoa. Anais do XI Encontro de Iniciação à Docência da UFPB, João Pessoa, 2009. NASCIMENTO, T.L; RICARTE, M.C.C.; RIBEIRO, S.M.S. Repensando o Ensino de Química Orgânica à Nível Médio. In: 47º Congresso Brasileiro de Química, 2007, Natal. Anais do 47º Congresso Brasileiro de Química, Natal, 2007.