FORMAÇÃO DOCENTE: ASPECTOS IMPLÍCITOS NOS RELATOS DOS PROFESSORES Carolina Augusta Assumpção Gouveia1 1 Centro de Políticas Públicas e Avaliação da Educação/CAEd-UFJF, [email protected] Resumo Este artigo apresenta um pequeno ensaio sobre as experiências em duas oficinas de apropriação de resultados ministradas por nós, nas quais observamos diferentes aspectos de formação pedagógica e de conteúdo dos profissionais de educação. Esses momentos ocorreram no contato com professores da rede de ensino integrantes de um programa de avaliação externa em larga escala. O programa, sobre o qual faremos referência, é aplicado por uma instituição responsável por operacionalizar (elaborar e desenvolver) programas estaduais e municipais e tem por o objetivo apresentar os resultados de desempenho alcançados pelos estudantes nas diferentes disciplinas e etapas de escolaridade da educação básica da rede. Com base em uma metodologia qualitativa, esta pesquisa compõe-se pela descrição das vivências nesses momentos de interação com o grupo de professores, pela seleção dos excertos relacionados à formação docente – nosso tema de pesquisa – e pela análise dos dados baseada em afirmativas e considerações apresentadas por pesquisadores da área. As experiências, constituídas por meio de relatos durante as oficinas de apropriação de resultados, fizeram-nos pensar sobre os conhecimentos apresentados pelos profissionais de educação – ao discutir os resultados das avaliações aplicadas aos estudantes – e refletir sobre as possibilidades de intervenção mais eficazes para o desenvolvimento profissional docente, voltadas para a melhoria da qualidade da educação oferecida aos estudantes da rede. Palavras-chave: avaliação externa, avaliação em larga escala, formação do professor. UM PRIMEIRO OLHAR PARA OS PROFESSORES E SUA FORMAÇÃO PROFISSIONAL Consideramos que a formação docente, tema discutido ao longo deste artigo, pode ser observada a partir de diferentes aspectos, tais como políticas públicas em educação, prática docente e formação profissional. Esses aspectos, os quais fazemos referência, representam para nós os principais caminhos percorridos pelos pesquisadores da área, ao discutir, por exemplo, a formação docente com foco no desenvolvimento de projetos e ações de governo (federal, estadual ou municipal), bem como a prática desenvolvida no dia a dia em sala de aula, em uma reflexão do próprio trabalho realizado pelo professor na busca pela melhoria da aprendizagem dos seus estudantes, ou como um processo de formação continuada, seja na pós-graduação ou nos cursos de extensão, atualização, capacitação, entre outros. Como encontramos em publicações sobre formação inicial de professores, ou formação inicial docente, grande parte dos cursos de licenciatura têm como foco o domínio mecânico, operacional e procedimental da Matemática, enfatizando estruturas abstratas, precisão da linguagem, processo rigorosamente lógico-dedutivo, de modo que seja apto a manipular/operar corretamente os entes matemáticos, e aplicá-los a situações-problema (PERIN, 2009, p.13) Esse processo de desenvolvimento do profissional de educação, entretanto, diferencia-se do objetivo almejado na formação docente daqueles em exercício, pois cobrase do professor, hoje, no decorrer da própria prática, um exercício contínuo que busque na matemática “seus conceitos, suas finalidades e as possibilidades formativas”, permitindo que o aluno/cidadão em formação constitua-se como sujeito social do mundo contemporâneo (PERIN, 2009, p.13). Porém, realizar uma prática que possa se diferir da formação – como vemos ser exercitada e/ou buscada pelos profissionais da educação – não é uma atividade simples. Mas o professor, no contexto atual, busca adequar-se às exigências da sociedade globalizada, dos quais procedimentos técnicos e operacionais não são capazes de suprir a demanda de formação do indivíduo. Contudo, os profissionais que estão na escola, muitas vezes, não conseguem adequar-se a essas requisições, pois não se formaram para trabalhar nesse ambiente de constituição do indivíduo. Sendo assim, vemos que o modo como o docente atua em sala de aula (como mostram pesquisas na área), principalmente nos primeiros anos de prática escolar, pode ter relação direta com a sua formação, os seus conhecimentos, as suas crenças e os seus valores. Temos que no ambiente escolar muitos conceitos são cobrados por meio de técnicas e reprodução de conteúdo, como podemos observar, também, no processo de formação do professor. O que podemos fazer, então, para modificar esse cenário? Como podemos observar, esse processo pode tomar caminhos diferentes! Quando formado, em contato com a sala de aula, o professor tem a possibilidade de desenvolver outros conhecimentos sobre a prática pedagógica. Esse processo pode ser dado ao estudar o conteúdo a ser apresentado aos alunos, por meio de conhecimento de novas metodologias e recursos didáticos, formação continuada, entre outros aspectos. Como apresenta Fiorentini (2003 apud FERREIRA 2009) a formação docente e, portanto, seus saberes, não é estática nem caracterizada em um determinado período ou fase da vida do professor. A formação profissional começa antes da formação “inicial” (acadêmica) e continua após sua inserção no mercado de trabalho. É influenciada por aspectos históricos, culturais, sociais, individuais, além das relações desenvolvidas com a instituição de ensino, colegas, alunos, dentre outros. (FIORENTINI, 2003 apud FERREIRA, 2009, p.21) Em nossos estudos sobre tema, percebemos que o desenvolvimento da prática dos professores pode ser influenciado, também, pela cultura docente e por experiências compartilhadas por outros professores (formados e em formação). Castro (2010), nesse sentido, profere que Se o fundamental do trabalho docente „é ensinar‟, o professor, ao desenvolver sua atividade em um contexto de „interações humanas‟, participa da apreensão e transformação do conhecimento – o que faz capaz de conceber, executar e analisar sua atividade de trabalho, tendo como interlocutores os estudantes. (CASTRO, 2010, p.85) Assim, o que podemos considerar pelas palavras da autora é a reflexão e a ressignificação da prática na própria prática do professor e a importância delas para o desenvolvimento. Ainda segundo Castro (2010), a atividade docente exige do professor uma postura crítica e questionadora de suas ações com foco na melhoria do seu trabalho. Como citamos anteriormente, acreditamos que o desenvolvimento da prática não se limita somente à prática em sala de aula, pois consideramos que o olhar reflexivo do docente, em relação ao seu trabalho e às suas atividades, precisa estar associado com as formações continuadas, os grupos de estudos e o curso de capacitações (entro outras formações) que ele participa ao longo de sua trajetória de trabalho. Nesse sentido, concordamos com as palavras de Fiorentini (2011), pois somente a participação em cursos e eventos, por exemplo, não garante um desenvolvimento do professor. Esses momentos de formação devem estar associados com a discussão dos aspectos da teoria com a nossa própria prática. Segundo o autor, domínios (ou competências) do professor de matemática não são ensinados, mas podem ser aprendidos ou desenvolvidos mediante participação em comunidades profissionais que tem como postura a análise e investigação de suas práticas de ensinar e aprender matemática. (FIORENTINI, 2011, p.10) Mas o caminho não termina aqui, além do que é percebido por pesquisadores da área, sobre a importância da formação, da reflexão e da ressignificação da prática docente, percebemos, também, iniciativas do governo em relação à prática do professor. Na pesquisa de doutorado de Richit (2010) a pesquisadora aponta ações sobre formação continuada no Brasil realizadas a partir da aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), com o desenvolvimento dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN, 1998) e o Plano Nacional de Educação (PNE, 2001). Com base nos PCN, que apresentam concepções sobre formação e atribuições do professor, podemos notar que a formação continuada é um processo que deve considerar o multiculturalismo e os conhecimentos prévios para a aprendizagem dos conteúdos (BRASIL, 1998 apud RICHIT, 2010). Como aponta a pesquisadora, a sociedade de hoje requer dos sujeitos mais do que saberes e competências. Espera que sejam capazes de promover seu aprendizado contínuo e esse deve ser o papel da escola. (RICHIT, 2010, p. 42) Com isso, acreditamos que esse olhar dos pesquisadores e das instituições escolares sobre a reflexão e a ressignificação da prática, tem aumentado a partir de ações do governo e da importância observada pelos centros de pesquisa na área. Neste artigo, entretanto, não conseguiremos discutir a formação nesses diferentes aspectos supracitados, mas optaremos por percorrer o caminho da formação docente como prática de sala de aula, de reflexão da própria prática. De modo algum, fazemos uma escolha pela importância dada a este aspecto da formação, mas por ser o caminho percorrido por nós ao vivenciarmos as experiências com os professores nas oficinas de apropriação de resultados realizadas pela instituição responsável por essas avaliações. AS EXPERIÊNCIAS OBSERVADAS AO LONGO DAS OFICINAS DE APROPRIAÇÃO DE RESULTADOS Viajar para ministrar oficinas de apropriação de resultados dos sistemas de avaliação estaduais e municipais em diversos lugares do Brasil significa, em todos os momentos, viver experiências de formação. Além disso, em meio a relatos, práticas e situações vivenciadas nas cinco regiões do país, que se tornaram inesquecíveis por serem singulares, temos a possibilidade de observar e tecer algumas reflexões sobre a formação e prática dos profissionais da educação que participam desses momentos de formação. Nesse contexto percebemos que os aspectos relacionados à formação docente, os quais são discutidos desde a formação inicial, mostram-se imprescindível, também, na formação em serviço, nos cursos de atualização e de capacitação. Pensando nesses aspectos, o que faremos neste momento é apresentar um pequeno ensaio, que busca relatos e modos de agir dos professores participantes dos momentos de formação presenciados por nós. Em relação à experiência vivenciada nesses momentos com os professores, faremos referência àquelas ações apresentadas por eles que nos chamaram atenção em relação à nossa própria prática - o que para outros pesquisadores poderiam passar despercebidas. Em todas as formações ministradas para professores nas diferentes regiões do país, percebemos que o contato com eles tem auxiliado o nosso trabalho, também como professores e como formadores. Em cada evento, acompanhamos professores que relatam suas angústias, seus desafios e, juntos, buscamos discutir e refletir a prática sobre diversos aspectos, seja com foco na prática pedagógica ou sobre o próprio ambiente de trabalho, isto é, o ambiente escolar. É o contato, entre professor-professor e professor-formadora, que acreditamos trazer elementos para o ambiente escolar e para a formação de cada indivíduo envolvido no ambiente escolar. Juntos, ao discutir e “investigar colaborativamente novas formas de ensinar e aprender matemáticas nas escolas”, estudantes, professores e currículo saem ganhando (FIORENTINI, 2011, p.14). Segundo o autor, o estudante ganha condições de compreender as relações matemáticas, o currículo ganha novos modos de aplicação no ambiente escolar e, o professor tem seu desenvolvimento profissional. Em nossas experiências, quando saímos do espaço físico onde trabalhamos e vamos descobrir “novos lugares”, temos como tarefa e objetivo possibilitar que diferentes profissionais, gestores e professores das redes estaduais e municipais, conheçam um pouco mais sobre a avaliação educacional externa e em larga escala, seus dados e sua análise pedagógica de resultados. Em cursos com duração aproximada de 12 horas, buscamos organizar e selecionar os materiais a serem disponibilizados para os cursistas, bem como elaborar o discurso apropriado para cada público, permitindo que, nesse curto período de capacitação, os profissionais de educação tenham motivos para querer melhorar a aprendizagem dos seus estudantes e, com isso, repensar, discutir e desenvolver ações que possam ser aplicadas em seu espaço escolar. Os momentos apresentados neste artigo referem-se a dois cursos de formação sobre avaliação externa, em que participaram professores integrantes do sistema educacional de um estado do Brasil, em 2015. Além disso, é importante relatar que esses cursos aconteceram em dois diferentes municípios do estado, em um período onde já havia passado mais de um ano da aplicação dos testes de proficiência. Entretanto, esse atraso não se decorreu por falta de organização da instituição aplicadora das avaliações ou da secretaria de educação. Os locais onde aconteceriam os eventos sofreram alguns danos causados por questões climáticas, apresentando restrição para deslocamento e acesso de pessoas em alguns locais. Com uma grande quantidade de chuva no estado, algumas regiões estavam inundadas, com municípios isolados pela água. Além disso, dentro dos próprios municípios, tínhamos estudantes e professores sem acesso às suas casas e escolas, e, portanto, alunos sem aulas, sem ambiente para estudo, sem possibilidades de desenvolvimento de conhecimentos escolares. Esse foi o contexto anterior às experiências de formação em Avaliação Externa vividas no estado, que apresentaremos a seguir. Quando buscamos a qualidade da educação por meio da formação docente, gestão de escola e de rede, infraestrutura, metodologias e recursos didáticos, entre outros elementos, muitas vezes não consideramos dados importantes como as questões climáticas, tal como apresentamos. Essas questões, mesmo que eventuais, também devem ser consideradas na apresentação da qualidade educacional dos estudantes de uma rede, município e/ou escola, pois podem interferir no desenvolvimento dos estudantes. Assim, ao falar em qualidade educacional, e apresentar os resultados das avaliações externas aplicadas pelo estado, também consideramos outros fatores, além do rendimento/desempenho. Como Chirinea (2010) aponta, os fatores associados aos testes de desempenho, como sociais, culturais e econômicos, permitem, assim, emitir um julgamento adequado aos resultados encontrados em uma avaliação. Para a autora, a exposição de um resultado de qualidade não vai existir por si só, porque dependerá dos entraves sociais como o capital econômico, cultura e social das famílias, os quais darão à avaliação, validade e credibilidade. Felizmente, esses problemas climáticos, em 2015, não existiram com tanta intensidade como àqueles vividos em 2014 e pudemos, assim, organizar o curso e conhecer um pouco mais sobre os professores e o trabalho desenvolvido na rede de ensino do estado em que estivemos. Isto é, pudemos discutir sobre a qualidade da educação apresentada pelas escolas do estado, suas possibilidades de mudanças e seus limites, prejudiciais ao trabalho das escolas e ao desenvolvimento dos estudantes. Para essa formação, em particular, tínhamos um receio diferente em relação às demais oficinas que havíamos ministrado até o momento, pois não sabíamos como seríamos recebidos para apresentar os resultados de uma avaliação que tinha sido realizada há algum tempo. E, felizmente, essa foi a primeira surpresa! Não detectamos nenhum problema ou questionamento sobre o retorno dos resultados, pelo contrário, encontramos profissionais estavam dispostos a escutar o que era proposto naquele momento. O início da formação com os professores contou com um público de mais de 80 profissionais da rede estadual de educação, a maioria formada por professores de língua portuguesa e matemática de ensino fundamental e ensino médio, e alguns pedagogos e profissionais com formações em outras áreas. Buscamos discutir, nas primeiras quatro horas, as possibilidades e os avanços da avaliação externa, tomando como foco o sistema implementado no estado deles. Em meio a nossa fala, percebemos muitos relatos de insatisfação das condições de trabalho e salário, como sempre nos deparamos nesses encontros. Além disso, uma quantidade significativa de reclamações referia-se aos alunos que chegavam do sistema de ensino da rede municipal e ingressavam na rede estadual no 6º ano do ensino fundamental sem ter desenvolvido conhecimentos básicos em matemática e língua portuguesa. Para esses professores, o sistema de avaliação do estado, ao aplicar testes de desempenho para alunos 6º ano, transferiam uma responsabilidade para professores da rede estadual, que relatavam sobre esta cobrança por parte da equipe da secretaria de educação. Entretanto, nesse contexto, pudemos notar que muitos professores preocupavam-se apenas em culpar outros sistemas educacionais (nesse caso, a rede municipal de ensino, que é responsável pela formação dos estudantes até o 5º ano do ensino fundamental), sem se atentar às possibilidades de desenvolvimento dos estudantes, que agora eram de responsabilidade do estado, isto é, deles! É certo que a rede municipal deveria rever suas ações de gestão e pedagógica, dados os questionamentos apresentados pelos professores da rede estadual. É importante, também, que esses problemas sejam relatados, para que os professores e os gestores responsáveis pela alfabetização das crianças possam repensar as suas propostas de ensino. Sendo assim, não retiramos, em nenhum momento, a responsabilidade desses profissionais da educação com uma aprendizagem significativa para as crianças das etapas iniciais de ensino. Entretanto, alguns estudantes já haviam passado pela rede municipal e, agora, era a rede estadual que estava responsável pela sua formação. Consideramos, desse modo, que os problemas de defasagem, identificados pelos professores do estado, em relação ao desenvolvimento apropriado dos conhecimentos para determinada etapa de escolaridade e disciplina, deveriam ser sanados por eles. Se os estudantes estão ingressando no 6º ano com desenvolvimento cognitivo abaixo do esperado e chegam no 3º ano do ensino médio ainda com problemas de aprendizagem, os professores do estado também são responsáveis por esse resultado, procurando assim, desenvolver e repensar propostas educacionais para os estudantes que apresentam domínio de habilidades e competências aquém do esperado. Sendo assim, se são recebidos estudantes com desenvolvimento de habilidades e competências abaixo do esperado, o que fazer? Como possibilitar uma formação mais apropriada para eles? Essa é uma discussão sempre muito difícil em nossas oficinas e cursos, pois nosso foco não é a formação docente ou responsabilização, mas a atenção de profissionais da rede para reflexão sobre todos esses contextos. Consideramos, a partir do momento em que recebemos os alunos, sermos responsáveis por eles e, desse modo, devemos fazer o possível para que tenham a melhor educação, com qualidade suficiente para a sua formação como cidadão e para o seu desenvolvimento profissional. Para nós, essa constitui uma responsabilidade da atividade docente, pois como vemos em pesquisas da área, esse é um tipo de trabalho que “exige o compromisso e responsabilidade social, o que faz o docente assumir uma postura questionadora e crítica de suas ações para melhoria do trabalho” (CASTRO, 2010, .85). Sendo assim, ao buscar seguir um cronograma pré-determinado sobre conceitos que os estudantes devem desenvolver em determinadas etapas de escolaridade, cabe ao profissional da educação questionar se o estudante “chegou” em sua sala de aula com os conceitos (pré-requisitos) já desenvolvidos para dar continuidade ao trabalho organizado anteriormente ou pensar em novas propostas de trabalho em sala de aula para a turma. Mas esse é um assunto que pode ser, ainda, muito explorado. Entretanto, gostaríamos de limitar nossas palavras sobre as responsabilidades dos profissionais das redes, neste momento, e apresentar, a seguir, outros dois momentos que nos chamaram a atenção nessas oficinas. São acontecimentos em “segundo plano”, que não versam sobre os conceitos da avaliação, mas que revelam um pouco sobre o lugar, as pessoas, as expectativas e os sentimentos de cada um dos profissionais da educação envolvidos nesse sistema. Ao iniciar a oficina com o grupo de professores que trabalhariam resultados de matemática, perguntamos quem eram formados em matemática. Para nossa surpresa, em uma turma de mais de 20 participantes, poucos se manifestaram e sem entender, questionamos sobre a atuação deles na escola. Nesse momento, muitos se apresentaram como professores de matemática. No intervalo da oficina, uma professora, integrante da equipe da Gerência Regional de Educação, explicou serem poucos professores formados em matemática, a maioria deles formados em outras áreas, como administração de empresas. Para ela, esse foi o motivo pelo qual eles não responderam ao questionamento inicial que fizemos sobre a formação docente, expondo-se apenas quando questionados sobre o trabalho na escola. Inicialmente, a formação dos professores que estão na escola poderia não ser um problema, já que muitos desses profissionais apresentam curso superior completo. Entretanto, diferente da formação de administrador ou qualquer outra graduação na área de exatas, a formação inicial de professores busca associar conteúdos específicos com a disciplinas pedagógicas possibilitando, assim, ao profissional em formação produzir, em sua prática, um “trabalho de forma contextualizada e não de maneira mecânica”. Além disso, essa formação permite ao profissional da educação “trabalhar de forma a atender as especificidades da prática docente, tornando a matemática interessante, atrativa, relevante, útil, atual e integrada ao mundo de hoje”. (PERIN, 2009, p.14) Sem essa formação inicial de professores de matemática, pudemos perceber, posteriormente, muitas dúvidas no desenvolvimento das atividades, as quais requisitavam conhecimentos sobre conteúdos e práticas pedagógicas fundamentais para a educação básica. Assim, em momentos de divulgação e apropriação de resultados do sistema de avaliação da rede estadual, não pudemos deixar de abordar questões de formação para os profissionais presentes, seja ela inicial ou continuada. Um professor, como profissional da educação, deve buscar conhecimentos que auxiliem o trabalho de formação dos seus estudantes. Em cada turma, a cada ano, tem-se dos estudantes demandas diferentes, que surgem da interação e do interesse do grupo. Quando nos referimos a esses interesses, não questionamos o currículo proposto pelo estado, mas as formas de trabalho que se adequam a cada grupo de estudantes, à realidade e às possibilidades de intervenção docente. Com base nessas questões, o “problema” da formação poderia ser o foco de discussão dessas oficinas, mas outros elementos também se apresentavam de modo singular nesse ambiente. Durante o início das atividades com o grupo de matemática, estávamos em um laboratório com uma lousa digital, que seria utilizada para auxiliar na nossa apresentação de slides. Não sabemos informar quando esse recurso tinha chegado à escola, mas dentre a equipe responsável, com educadores da escola e servidores alocados na regional da rede estadual de educação, a qual pertence ao município onde ministrávamos a oficina, ninguém conseguiu ligar o equipamento e a lousa digital serviu apenas de pano de fundo para a projeção. Sabemos que o conhecimento e o uso sobre as possibilidades de intervenção pedagógica com base no uso de diferentes recursos, como material manipulativo, artefatos tecnológicos, jogos entre outros, faz-se importante no desenvolvimento dos estudantes. No processo de formação docente, além de compreender conceitos matemáticos, o professor deve saber adequar o melhor recurso pedagógico para que os estudantes aprendam de modo significativo. Segundo Castro (2010, p. 182) O livro didático é considerado por muitos uma “muleta” de trabalho para o professor, quando “o que se pretende é que o aluno chegue à conclusão de que a melhor versão é a que dá o livro didático, então bastará este elementos” (ZABALA, 1998, p.170). Ao mesmo tempo, o livro ainda representa o lugar onde se encontram os conhecimentos que são trabalhados em sala de aula e é o instrumento a que o professor tem maior acesso. Entretanto, faz-se necessário que, além do livro didático e o quadro de giz, outro recurso muito utilizado pelos professores, buscar outros recursos didáticos para sala de aula, o que permite, em cada momento, desenvolver conceitos dos estudantes. Nesse contexto tem-se o processo de formação docente que, segundo Ponte (1994 apud PERIN, 2009, p.41) depende de diversas condições que se refere sobretudo ao próprio sujeito, ao seu contexto institucional e aos recursos disponíveis, incluindo recursos humanos e materiais (interiores e exteriores a escola). Bastará referir, mais uma vez, o papel determinante que cada professor tem no seu próprio desenvolvimento profissional e a importância de se conjugarem condições institucionais e recursos adequados para que este desenvolvimento possa ter lugar em condições favoráveis. Sendo assim, se na oficina que ministrávamos o equipamento não pôde ser utilizado, pela falta de conhecimento dos participantes presentes no curso, qual a usabilidade daquele recurso pedagógico na escola? Como o processo de formação inicial e continuada insere-se nesse processo? Como fizemos naquele momento, o recurso tinha sido subutilizado, pois não considerávamos sua potencialidade de uso no contexto escolar. CONSIDERAÇÕES FINAIS Com essas explicitações, nossa intenção, nesse momento, não era apresentar insatisfação e angústia de educadores, que sempre estão presentes em nossos momentos de formação. Por meio desse primeiro relato sobre as oficinas de apropriação de resultados, desenvolvidas por nós, buscamos perceber momentos que permitam conhecer quem são esses educadores, o que pensam, quais são suas limitações, suas angústias, isto é, relatos encontrados em meio ao trabalho que realizamos ao apresentar os resultados das avaliações. Não nos propusemos a inserir questionamentos a esses professores, para nossa coleta dos dados, mas observar momentos que a formação docente pode influenciar o trabalho pedagógico presente nas escolas. Para nós, esses excertos apresentados representam alguns acontecimentos que possibilitam conhecer um pouco do contexto, da formação, da oportunidade de trabalho e das expectativas do grupo. Como podemos observar a partir dos relatos, a formação docente está relacionada a diferentes aspectos e, no contato com professor, isso pode ser observado de modo prático, relacionando ao que pesquisados da área tem apresentado ao longo dos anos em pesquisas sobre o tema. Na rede de ensino que apresentamos, podemos perceber um pouco dos limites e possibilidades dos professores no trabalho em sala de aula. Esse poderia ser o caminho inicial para que gestores possam desenvolver políticas de formação e de intervenção educacional nas escolas, permitindo um trabalho de qualidade para todos os agentes envolvidos: professores com formação, reconhecimento e ambiente adequado de trabalho, e alunos com possibilidades de aprendizagem significativas, com recursos e metodologias adequadas em sala de aula. REFERÊNCIAS CASTRO, F.C. O Trabalho do Professor de Matemática: a confluência da experiência profissional com a formação acadêmica. 290.f. Tese (Doutorado em Educação Matemática) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2010. CHIRRINÉA, A.M. O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) e as Dimensões Associadas à Qualidade da Educação na Escola Pública Municipal. 121.f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista, Marília, 2010. FERREIRA, C. M. da S. Um Estudo Exploratório da Construção de Saberes Docentes Provenientes de Interações Discursivas no Estágio Curricular. 137.f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2009. FIORENTINI, D. Formação de professores a partir da vivência e da análise de práticas exploratório-investigativas e problematizadoras de ensinar e aprender matemática. In: CONFERÊNCIA INTERAMERICANA DE EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, XIII, 2011, Recife. Cómo debe ser la formación de profesores para seguir una estrategia de resolución de problemas en la Educación Matemática? Recife, XIII CIAEM, 2011. PERIN, A. P. Dificuldades Vivencidas por Professores de Matemática em Início de Carreira. 142.f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Metodista de Piracicaba, Piracicaba, 2009. RICHIT, A. Apropriação do Conhecimento Pedagógico-Tecnológico em Matemática e a Formação Continuada de Professores. 280.f. Tese (Doutorado em Educação Matemática). Universidade Estadual Paulista – UNESP, Rio Claro, 2010.