1
Pedagogia Social: possibilidade de empoderamento para o idoso
Rita de Cássia Oliveira1
Flávia da Silva Oliveira2
Paola Andressa Scortegagna3
Resumo
O envelhecimento populacional revela-se como um fenômeno mundial de grande
repercussão e configura um desenho demográfico que influencia diretamente a estrutura
social, política e econômica, inclusive no Brasil. Atualmente, segundo os dados do IBGE
(2009), há cerca de 20 milhões de idosos no país, representando 10,2% da população. Este
segmento etário está crescendo continuamente, o que repercutirá nos próximos anos uma
maior população idosa. Desta maneira, surge a necessidade de atender as demandas básicas
deste grupo, por meio de ações e políticas para melhoria das condições de vida, seguridade
dos direitos elementares, além do processo de empoderamento deste grupo, através de
ações educacionais pautadas na Pedagogia Social. A presente investigação tem como
problemática central a inserção do idoso em espaços educacionais que privilegiem a
Pedagogia Social, enquanto meio de educação não-formal e educação permanente,
possibilitando ao segmento um processo de empoderamento. A pesquisa teve por objetivos
refletir sobre a educação enquanto possibilidade de empoderamento dos idosos; identificar
as universidades abertas para a terceira idade como espaço de educação não-formal e de
intervenção da pedagogia social voltada para o segmento idoso. A investigação partiu de
uma pesquisa bibliográfica, documental e interpretativa. Como resultado, obteve-se que a
educação voltada para a terceira idade deve possibilitar a inserção social, o reconhecimento
dos novos papéis sociais que os idosos assumem com o passar dos anos, além de permitir
uma reflexão sobre como a sociedade estruturada em classes sociais oportuniza os meios
possíveis para que a população, em especial os idosos, das classes menos abastadas tenham
condições de sobrevivência e garantias de melhor qualidade de vida, dignidade e cidadania.
Por meio de processos educativos não-formais, pautados na Pedagogia Social, os idosos
possuem novas alternativas de atividades, atualização de conhecimentos, valorização e
elevação da auto-estima, desenvolvimento pessoal, além da conscientização política e
social. Aliado à educação não-formal e a educação permanente para o idoso, os processos
de empoderamento estruturam-se como campos de participação política, possibilitando a
superação de conflitos, estereótipos e marginalização que o segmento enfrenta, permitindo
a re-significação das relações, revisão de papéis sociais, produção e atividade no cotidiano.
Assim, o conhecimento passa a ser um instrumento eficiente e necessário para o
empoderamento, em especial, aos idosos, na tentativa de superar os desequilíbrios sociais.
Logo, o compromisso com os idosos e a velhice deve ser assumido por toda a sociedade,
visto que a longevidade é um fenômeno posto.
1
Doutora em Educação pela Universidade de Santiago de Compostela sob orientação do Prof. Dr.
José Antoniop Caride Gomez. E-mail: [email protected].
2
Mestre em Ciências Sociais Aplicadas pela Universidade Estadual de Ponta Grossa. E-mail:
[email protected].
3
Mestre
em
Educação
pela
[email protected].
Universidade
Estadual
de
Ponta
Grossa.
2
Palavras-chave: Empoderamento, Pedagogia Social, Educação Não-Formal, Educação
Permanente, Terceira Idade.
Abstract
Population aging reveals itself as a worldwide high-impact design and configure a
demographic that directly influences the social, political and economic, including Brazil.
Currently, according to data from “Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística” - IBGE
(2009), about 20 million elderly in the country, representing 10,2% of the population. This
age group is growing continuously, which will have repercussions in the coming years a
larger elderly population. Thus, the need arises to meet the basic demands of this group,
through actions and policies to improve living conditions, security of basic rights, and the
process of empowerment of this group, through educational activities guided in Social
Pedagogy. This research is problematic central insertion of the elderly in educational
activities which promote Social Pedagogy as a means of non-formal education and lifelong
learning, enabling the segment a process of empowerment. The research aimed to reflect
about education as the possibility of empowering the elderly, identifying the open
universities for the elderly as an area of non-formal education and intervention of social
education aimed at the elderly segment. The investigation started with a literature review,
documentary and interpretive. As a result, it was found that education aimed at the elderly
should enable social inclusion, the recognition of new social roles that older people take
over the years, and allows a consideration of how mainstream society into social classes
nurture possible means for the population, especially the elderly, among the less affluent
are able to guarantee survival and better quality of life, dignity and citizenship. Through
processes of non-formal education, guided by the Social Pedagogy, the elderly have a new
alternative activities, updating of knowledge, appreciation and increased self-esteem,
personal development, as well as political and social awareness. Together with the nonformal education and continuing education for the elderly, the processes of empowerment
are structured as fields of political participation, allowing for conflict resolution, gender
stereotypes and marginalization that the sector faces, allowing the redefinition of relations
review social roles, production and activity in daily life. Thus, knowledge becomes a
necessary and effective tool for empowerment, especially the elderly, in an attempt to
overcome social inequality.
Key-words: Empowerment, Social Pedagogy, Non-Formal Education, Continuing
Education, Elderly.
3
Introdução
A terceira idade, nos últimos anos, vem assumindo cada vez mais um papel
relevante na sociedade brasileira. Apesar de todos os preconceitos que revestem a velhice,
esta faixa etária vem sendo entendida de maneira distinta no campo de pesquisa. Hoje,
percebe-se que o idoso está sendo incluído em pesquisas nas ciências humanas e sociais,
devido ao crescimento contínuo e acelerado deste contingente, o que demanda novas ações
e estudos.
Neste sentido, as Universidades Abertas para a Terceira Idade surgem como
possibilidade de inserção do idoso num espaço educacional não-formal, que visa a
integração social, aquisição de conhecimentos, elevação da auto-estima, valorização
pessoal, conhecimento dos direitos e deveres e exercício pleno da cidadania. Destaca-se
ainda, a não formalidade do currículo, que se organiza de maneira mais interativa,
caracterizando a pedagogia social.
Assim, esta investigação, volta-se para a Pedagogia Social, como meio da educação
não-formal e educação permanente, destinada ao idoso pode possibilitar que este segmento
passe por um processo de empoderamento.
A presente pesquisa teve por objetivos refletir sobre a educação enquanto
possibilidade de empoderamento dos idosos; identificar as universidades abertas para a
terceira idade como espaço de educação não-formal e de intervenção da pedagogia social
voltada para o segmento idoso. A investigação partiu de uma pesquisa bibliográfica,
documental, descritiva e interpretativa.
Em relação aos encaminhamentos metodológicos, estrutura-se esta investigação
qualitativa, utilizando a dialética materialista para análise dos dados, considerando os
movimentos e transformações na realidade, na qual o idoso se insere. Assim, busca-se
entender o objeto real, na totalidade e complexidade, inserido no contexto histórico e social
(CHEPTULIN, 2004).
O contexto atual da terceira idade no Brasil
O desenho demográfico da população mundial tem apresentado avanços
significativos do número de idosos. Este fenômeno se faz presente nas sociedades
indistintamente do grau de desenvolvimento, desta maneira, um dos grandes desafios
delineados para o século XXI é equacionar as reais necessidades deste emergente perfil
populacional, preocupando-se com a garantia de direitos e de qualidade de vida.
4
Na sociedade brasileira observa-se que o número de idosos, está aumentando
continuamente, reforçando a quebra do paradigma da juventude populacional, pois o Brasil
está envelhecendo. Segundo o IBGE (2009), há cerca de 20 milhões de idosos, o que
representa cerca de 10,2% da população. Percebe-se, então, a necessidade de uma visão
clara do que representa a velhice e o próprio processo de envelhecimento, pois há
atualmente um significativo número de idosos.
Pensar em envelhecimento pressupõe refletir sobre um processo biológico que
envolve a deterioração progressiva das condições de saúde, e este resultando na diminuição
da capacidade funcional do indivíduo. Mas, esta diminuição não depende apenas do avanço
da idade, como também das características individuais, dos estilos de vida e das condições
de trabalho (CAMARANO; PASINATO, 2008, p.7).
O processo de envelhecimento pressupõe modificações gradativas no indivíduo, as
quais não significam impossibilidade ou até a invalidez. Tais transformações ocorrem no
organismo, nas relações sociais e nos aspectos psicológicos durante toda vida. Há
progressivamente uma diminuição nas capacidades vitais, provenientes do envelhecer,
porém a pessoa não se torna incapaz, a menos que tenha alguma patologia que acarrete
algum comprometimento orgânico (FURTADO, 1997).
Segundo Oliveira (1999) a sociedade coloca o velho numa situação típica de
marginalização social, na proporção em que ergue contra ele inúmeras barreiras sociais e
desenvolve atitudes de preconceitos e discriminação social. Percebe-se, então, que o idoso
não tem um espaço de ação, nem mesmo na sociedade, onde ele se encontra cada vez mais
excluído. A sociedade impõe imperativos de produção, agilidade e modernidade. O idoso,
por questões biológicas, pode apresentar algumas limitações ou dificuldades, mas isso não
significa a incapacidade de realizar tarefas. Porém, na perspectiva atual, o idoso é
considerado muitas vezes como incômodo, por não atuar na velocidade e na maneira em
que os jovens julgam mais correta ou mais adequada.
Os preconceitos acerca da velhice elucidam as faces da discriminação e opressão
que muitos idosos sofrem, por serem considerados sujeitos improdutivos e sem capacidade
de aprender. Nesse sentido, o idoso fica caracterizado como um peso para a sociedade, a
qual por muitas vezes o oprime, considerando que seus conhecimentos são ultrapassados e
suas experiências não tem significado. Por vezes o idoso, é visto como incapaz de
estabelecer suas aspirações, cabendo somente o que lhe é imposto ou referido. Como
afirma Freire (2005), seria, realmente, uma violência, como de fato é, que os homens, seres
5
históricos e necessariamente inseridos num movimento de busca, com outros homens, não
fossem o sujeito de seu próprio movimento.
Pedagogia Social: empoderamento, educação permanente e universidade aberta
Os idosos, na sociedade brasileira, ao sofrerem segregação caracterizam a
dependência e a marginalidade dos carentes de poder, fortalecendo o que Freire (1972)
chama de cultura do silêncio.
A valorização e respeito ao idoso surge como necessidade premente na distribuição
mais eqüitativa do poder, possibilitando uma perspectiva de rompimento com a
discriminação generalizada atribuída a este segmento. O poder e seu exercício cotidiano
assumem conceito central nos processos de transformação, desenvolvimento e promoção
da cidadania dos indivíduos.
Podem-se distinguir quatro formas básicas de poder: cultural, social, político e
econômico. Estas diferentes roupagens assumidas pelo poder não se excluem, ao contrário,
se complementam e beneficiam no seu conjunto o progresso do indivíduo, da família ou do
grupo. Compete a cada um dos grupos sociais promover o seu próprio desenvolvimento,
entendendo que desenvolvimento é a distribuição mais equilibrada do poder entre os
indivíduos na sociedade.
Afirma-se que se vive na era do empoderamento, entretanto quando se fala em
empoderamento, sugere-se que existem grupos que estão à margem do poder e que
necessitam de apoio para empoderar-se. Neste sentido todo grupo social possui poder, no
espaço direto em que está inserido.
O processo de empoderamento permite atuar sobre as discrepâncias e possibilitar o
aumento de poder daqueles grupos mais desprovidos. Neste sentido, Kleba e Wendausen
(2009) afirmam que
Os processos de empoderamento ocorrem em arenas conflitivas, onde
necessariamente se expressam relações de poder, as quais devem ser
encaradas não como algo estanque e determinado, mas plástico, flexível,
portanto modificável pela ação-reflexão-ação humanas, na medida em
que os indivíduos compreendam sua insersão histórica passada, presente
e futura e sintam-se capazes e motivados para intervir em sua realidade
(p. 742)
O poder pode ser entendido no sentido de transformação social, entre aqueles que
detêm ou não o poder, gerando uma mudança significativa em busca de uma maior
equitatividade. Por outro lado, o poder, segundo Paulo Freire, constitui um aumento da
6
conscientização e desenvolvimento da criticidade entre os marginalizados e oprimidos,
suscitando maior capacidade de intervenção e controle das situações. Entre estes grupos
marginalizados situa-se o segmento do idoso e, nesta nova postura, os idosos serão capazes
de desempenhar um papel mais ativo, fortalecendo suas habilidades e assumindo a postura
de protagonistas legítimos do próprio desenvolvimento (OAKLEY; CLAYTON, 2003).
“Tanto ‘empoderados’ como ‘desempoderados’ são categorias de atores
fundamentais
para
a
compreensão
da
dinâmica
em
qualquer
processo
de
desenvolvimento”, neste sentido “o poder define o padrão básico das relações econômicas
e sociais em um dado contexto, e portanto, tem influencia fundamental em qualquer
intervenção que potencialmente ameace a distribuição existe” (OAKLEY; CLAYTON,
2003, p. 10).
Os idosos na sociedade brasileira são considerados desempoderados porque são
vitimizados culturalmente, resultado da vulnerabilidade reforçada por preconceitos e
estereótipos negativos relativos à velhice. Entretanto os idosos organizam-se e mobilizamse para adquirir maior reconhecimento social, e assim passam constituírem um desafio às
estruturas existentes.
Percebe-se então que os idosos encontram-se numa situação de vulnerabilidade, a
qual segundo Castel (1998) conjuga a precariedade das condições de trabalho e a
fragilidade das bases de coesão social. As pessoas idosas defrontam-se com os efeitos desta
vulnerabilidade social, pois são consideradas socialmente como improdutivas e muitas
vezes não tem acesso ao mercado de trabalho e mantém na informalidade. A segunda
dificuldade enfrentada refere-se a dificuldade de muitos idosos em possuírem uma
autonomia econômica, social e até mesmo simbólica, o que resulta em diversos tipos
preconceitos, tanto na família, como na sociedade.
Conforme aponta Katzman (2005), vulnerabilidade não significa pobreza, mas a
inclui. A pobreza faz referência a uma situação de carência efetiva e vivenciada no atual
momento, enquanto a vulnerabilidade transcende tal condição, projetando no futuro a
possibilidade de padecer, a partir das debilidades enfrentadas no presente. Sobre esta
perspectiva é que se encontram muitos idosos, estão em situação de vulnerabilidade social,
além de sofrerem com a perda de laços afetivos, serem vítimas da exclusão,
marginalização e inúmeras violências (físicas e psicológicas).
Com esta afirmação, não significa, que para o grupo de idosos adquirir poder,
necessariamente precisa ocorrer uma redução de poder por parte de outros grupos, mas
7
certamente, o empoderamento deste grupo resultará em conseqüências sobre o poder
exercido pelos demais grupos.
“O poder também está relacionado com o conhecimento o qual consiste em uma
fonte de poder e uma forma de adquiri-lo” (OAKLEY; CLAYTON, 2003, p. 11). Assim,
todo conhecimento adquirido pode interferir e alterar as relações existentes, na medida em
que este legitima a autoridade. Contrapondo-se a isto, a ausência de conhecimento implica
em carência de poder.
O conhecimento passa a ser um instrumento eficiente e necessário para o
empoderamento, em especial, para os idosos, na tentativa de superar os desequilíbrios
sociais.
As Universidades Abertas para a Terceira Idade (UATI) tem sido disseminadas nas
diferentes universidades pelo mundo como uma estratégia de empoderamento do idoso,
uma educação não-formal e educação permanente ao mesmo tempo que os instrumentaliza
com conhecimentos, informações, possibilitando e legitimando o exercício pleno da
cidadania.
Este empoderamento em diferentes níveis, social, cultural, econômico e político a
longo prazo possibilitará reequilibrar a estrutura de poder dentro da sociedade e contribuir
para elaborar um outro paradigma de velhice.
O empoderamento é um processo dinâmico é um processo dinamico em
desenvolvimento, centrado na comunidade local e que envolve a
dignidade recíproca, a reflexão crítica, a participação e o cuidado do
grupo, através do qual aqueles carecem da possibilidade de compartilhar
os recursos existentes ganham maior acesso e controle sobre tais recursos,
através do exercício de ampliação do equilíbrio de poder (VAN DER
EIKEN, 1990 apud OAKLEY; CLAYTON, 2003).
O empoderamento no Brasil, nos anos de 1990, constituiu como objetivo a busca da
promoção do desenvolvimento social, abrindo assim espaço para a consolidação de
diferentes intervenções práticas voltadas para o idoso, entre elas as UATI.
Estas uatis privilegiam a educação não-formal caracterizando-se pelo encontro de
gerações, a não-obrigatoriedade de freqüência, a ocorrência de ações e experiências em
espaços e tempos mais flexíveis não restritos aos fixados por órgãos reguladores (SILVA,
2006).
A educação não-formal, ao contrário da educação formal, caracteriza-se
por não ter a preocupação de desenvolver um currículo pré-definido, um
currículo que se faz principalmente baseado em desejos, necessidades e
interesses das pessoas que constituem os grupos envolvidos em ações e
práticas desse campo educacional (SILVA, 2006, p. 9).
8
Segundo Gohn (2006) a educação não-formal representa várias dimensões, como a
aprendizagem dos direitos numa perspectiva política, desenvolvimento de potencialidades,
exercício de práticas comunitárias e sociais, aprendizagem que capacite para uma leitura de
mundo, transmissão de informações, como também a formação política, social e cultural. A
educação não-formal acontece em compartilhamento de experiências, em espaços e ações
coletivas e cotidianas.
Nesta perspectiva da educação não-formal, as UATI buscam “oferecer
possibilidades de experiências e vivências para que se público faça novas escolhas e
opções pessoais e sociais [...]” (SILVA, 2006, p.9), além de oferecer conhecimentos,
informações dentro de umas perspectiva de educação permanente.
As UATIs possibilitam também aos idosos ascenderem em três grandes áreas de
empoderamento 3 grandes áreas do empoderamento: o poder como maior confiança na
capacidade pessoal para levar adiante algumas formas de ação; o poder como aumento das
relações efetivas que as pessoas desprovidas de poder podem estabelecer com outras
organizações; o poder como resultado da ampliação do acesso dos recurso econômicos,tais
como credito e insumos.
Ao se pensar a educação como uma ação permanente e que o processo de
aprendizagem ocorre durante toda a vida do homem, não evidencia apenas uma evolução
do pensamento pedagógico, trata-se de uma necessidade de constante atualização num
ambiente globalizado onde as mudanças são rápidas e contínuas, permitindo que o homem
evolua segundo estes preceitos (OLIVEIRA, 1999).
Desta maneira, a educação enquanto prática social permite que o homem
constantemente aprenda, tornando-se possível pensar numa transformação cultural e na
própria sociedade. Para Pinto (1989, p. 39), “a educação não é uma conquista do
indivíduo”, mas sim “uma função da sociedade e como tal dependente de seu grau de
desenvolvimento. Onde há sociedade há educação: logo, esta é permanente”.
A evolução social decorre da ação educacional. Assim, a educação para a
transformação implica num caráter permanente, tanto para que a sociedade possa se
desenvolver, quanto para que o indivíduo possa estar integrado a este desenvolvimento.
Nesse ponto, Gadotti (1984, p. 69) afirma que, “a educação permanente visa uma
educação rearranjada, refletida e integrada no seu todo. Ela sustenta a idéia de um controle
de todos os recursos educativos possíveis de uma sociedade e de sua execução”. A
9
estrutura educacional começa a ser pensada num outro viés, emergindo do pensamento
escolar, não o descaracterizando, mas assegurando que o processo de aprendizagem não se
efetiva apenas nos bancos escolares.
Nesta perspectiva, “imprescindível é reconstruir uma completa e compreensível
imagem da educação ao longo da vida nas diferentes sociedades, levando-se em conta as
crescentes aspirações e demandas para atuar com mais autonomia e competência”
(PALMA, 2000, p. 103). A sociedade atual está exigindo uma nova postura do homem,
com mais capacidades e conhecimentos, e este desenvolvimento somente poderá ocorrer
por meio de uma ação educacional consciente e que aconteça de maneira permanente,
permitindo a atualização constante.
Assim, “a preocupação básica que orienta o desdobramento de educação
permanente e desenvolvimento cultural não se refere à contínua maturação humana, mas
ao desenvolvimento socioeconômico e cultural” (PAIVA, 1985, p. 48). Possibilita-se,
então, que o homem, no espaço histórico, cultural, político e social em que está inserido,
consiga evoluir junto com a sociedade, e esta evolução individual reflete diretamente na
constante evolução social.
Por meio da educação, o homem se humaniza, se caracteriza, torna-se social e
consciente. “A educação é um processo contínuo e permanente que dá ao ser humano o
sentido da vida, pela possibilidade que estabelece na medida em que promove maior
compreensão sobre o mundo” (HERÉDIA, 2006, p. 126).
A educação permanente representa uma necessidade de ampliação da participação
ativa do homem no contexto social e cultural, visando uma melhoria nas relações
interpessoais, na qualidade de vida, na compreensão de mundo e na esperança de futuro
melhor e mais digno. Pela educação permanente assume-se uma nova concepção de vida
humana, cujo principio central é só aprender, mas principalmente viver para aprender,
estando integrado e interagindo com quem se encontra ao seu redor (OLIVEIRA, 2007).
A educação deve desenvolver o sujeito como um todo, permitindo que este esteja
integrado a sociedade, com uma participação ativa e consciente. Pensar num
desenvolvimento integral permite refletir numa educação permanente que vise a superação
da marginalização social, possibilitando uma formação contínua, que tenha como princípio
elementar a prática social e o desenvolvimento do homem em sua totalidade.
Conforme Toni (2006), “pensar a educação é entender que o ser humano, de
maneira flexível e adaptativa, aprende desde o nascimento até a morte” (p.139). O sujeito
10
no processo de aprendizagem “utiliza saberes já adquiridos, os quais, somados aos que vai
experienciando e vivenciando em seu cotidiano, o tornam um ser aprendente” (p. 139).
Para que a educação permanente ocorra satisfatoriamente, há necessidade de que
esta seja organizada e pensada para que atinja seus fins. Segundo Furter (1976, p. 127),
a necessidade de uma educação contínua, que seja uma constância na
vida humana e que permita viver plenamente o mundo planetário, não
pode ser preenchida por um simples prolongamento da educação, nem
por um maior alastramento do campo escolar. Deve tomar a forma de
uma educação permanente, a partir da qual deverá ser pensada toda
educação, e que obrigará os educadores a inventar novas técnicas e novos
métodos adequados.
A partir do momento em que a educação permanente fixar seus propósitos e
estruturar-se de maneira democrática, um grande salto qualitativo irá ocorrer na educação.
O homem aprende durante toda sua vida, seja em espaços escolarizados ou não, assim,
possibilitar que a educação traga mais qualidade para as aprendizagens é fundamental.
A educação permanente possibilita o desenvolvimento do capital humano
(MOODY, 2008). Desta maneira, a mesma deve estar vinculada para que realmente este
capital se desenvolva, independente da classe social ou situação de marginalização em que
o individuo esteja inserido, permitindo que o desenvolvimento intelectual, social, cultural e
político ocorram.
Logo, numa perspectiva de educação permanente, torna-se imprescindível pensar
esta para o idoso. Segundo Saraiva (2004, p. 31), o conceito de educação permanente,
como formulado originalmente, era uma crítica à idéia que separava em
etapas ao longo da vida os períodos de formação (correspondentes à
infância e a juventude), trabalho produtivo (idade adulta) e tempo livre
(velhice, tempo posterior à aposentadoria), substituindo-se pela educação
permanente, trazendo a idéia de contínua atualização de conhecimentos.
Essa atualização é necessária frente ao ritmo acelerado da mudança social
e tecnológica, além de diminuir o fosso cultural da terceira idade, já que,
devido à redução dos índices de natalidade e elevação da expectativa de
vida, a população tende ao envelhecimento.
Então, percebe-se a necessidade de uma ação educacional voltada para terceira
idade, num caráter de educação permanente. Nota-se que quando a educação torna-se
permanente na vida dos idosos, é possível encontrar um novo sentido em viver, mesmo
quando já se encontram desacreditados pela própria sociedade.
Neste sentindo, a educação permanente é considerada atualmente como “um
processo que não se conclui nunca, estendendo-se por toda a vida dos sujeitos. Significa
dar oportunidade de aprendizagens contínuas, objetivando a atualização do ser humano,
11
atendendo suas necessidades de interação e aprimoramento do saber” (TEODORO, 2006,
p. 43).
Mosquera (1975, p. 141) conclui que “educação permanente é universal no seu
caráter e essencial à completa democratização da aprendizagem, caracterizada pela sua
flexibilidade e diversidade em conteúdos, apreendendo elementos, técnicas e finalidades
abertas ao tempo e ao espaço”.
Para que de fato ocorra uma organização dos idosos em busca da consolidação de
seus direitos é fundamental e urgente que a instrumentalização e a educação sejam
possibilitadas a todos. Conhecer os próprios direitos é preceito elementar para que se
reclame melhores condições de sobrevivência e uma melhor qualidade de vida.
Nestes condicionantes, a educação apresenta-se como propulsora da transformação
social, pois é através dela que além da aquisição de conhecimentos, o processo de
socialização se intensifica, e a formação de um sujeito crítico e reflexivo se consolida.
A partir do momento em que o idoso é considerado como um sujeito capaz de
desenvolver atividades e desempenhar novos papéis sociais percebe-se que a visão sobre a
velhice começa a ser alterada, pois o idoso incapaz, inútil e sem utilidade, passa a ser um
novo agente social. “Gradualmente, a visão de idosos como um subgrupo populacional
vulnerável e dependente foi sendo substituída pela de um segmento populacional ativo e
atuante que deve ser incorporado na busca do bem-estar de toda a sociedade”
(CAMARANO; PASINATO, 2004, p. 257-258).
Nesta perspectiva, quando o idoso se percebe como possibilitador de mudanças e
que tem condições de atuar em prol de seus direitos, o contexto social da velhice muda.
Percebe-se que “os velhos como coletivo social, tornam-se muito mais ameaçadores do que
a velhice como fenômeno biológico” (FONTE, 2002, p. 12).
O papel da identidade do idoso se refere a “aquilo que o faz reconhecer-se por
reconhecimento do outro (STANO, 2007, p. 10). Assim, a identidade estabelece-se pela
atividade. Percebe-se então que se estabelece ”a transformação de uma abordagem
historicamente centrada nos aspectos individuais e biológicos da velhice para uma
perspectiva que identifica as pessoas idosas como um setor social de crescente
importância” (FONTE, 2002, p. 9).
Entretanto, é através desta “rebeldia” que o idoso passa a integrar-se cada vez mais
e buscar novas alternativas de participação e integração dentro da sociedade. “A
participação cidadã é lastreada num conceito amplo de cidadania, que não se restringe ao
12
direito ao voto, mas constrói o direito à vida do ser humano como um todo” (GOHN, 2003,
p. 18).
Considerações finais
A educação ocupa papel fundamental na formação crítica do idoso, para que tenha
condições de manter-se ativo e consciente da sua própria velhice. Nesta mesma
perspectiva, é também através da ação pedagógica que se oportuniza uma maior inserção
social, além da formação do idoso enquanto um ator social, que mobilizado em rede terá
possibilidade de articulação e passará a exigir mais respeito e dignidade, e um
compromisso sóciopolítico a propósito dos seus direitos.
Nesta esfera, percebe-se que a educação além de propor e ser agente da ação que
transforma, é um direito elementar de todo ser humano, independente da idade, numa
percepção educacional permanente. Assim, o idoso tem direito à educação, não apenas
como instrumentalização ou compensação, mas como espaço de questionamento, decisões,
capacitação e acima de tudo, diálogo.
Assim, as UATI fundamentam-se na concepção de educação permanente, educação
não-formal e auto-realização do idoso. Estruturam-se numa abordagem multidisciplinar,
priorizando o processo de valorização humana e social da terceira idade, analisando
constantemente a problemática do idoso nos diversos aspectos; biopsicológicos,
filosóficos, político, espiritual, religioso, econômico e sociocultural. Preocupa-se em
proporcionar ao idoso uma melhor qualidade de vida, tornando-o mais ativo, alegre,
participativo e integrado à sociedade. Segundo Silva (2006), tanto a arte, como a cultura e
o esporte são meios para a educação não-formal, os quais possibilitam aos sujeitos o autoconhecimento, além da percepção de pertencimento e inserção na sociedade.
Dentro dessa perspectiva da educação permanente e educaçõa não-formal e sendo a
universidade um lugar por excelência para o aprimoramento, a busca do conhecimento e
também a democratização do saber, timidamente surge em seu âmago um espaço
educacional para essa clientela. As universidades ampliam sua função social, “buscando
integrar aqueles que se encontram à margem do processo de desenvolvimento”
(OLIVEIRA, 1999, p.240).
Os diferentes programas oferecidos pelas Instituições de Ensino Superior são
formas alternativas de atendimento ao idoso, visando além da valorização dessa clientela,
13
maior conscientização da sociedade em geral a respeito do processo de envelhecimento da
população do nosso país que é uma realidade (BOTH, 2000).
Com a inserção do idoso na comunidade universitária, a integração entre gerações
ocorre necessariamente, fomentando debates sobre as questões que envolvam essa faixa
etária, analisando preconceitos e discriminações ora sustentados socialmente e que se
apresentam sem fundamentação científica.
O próprio idoso, ao se conscientizar de seu espaço na sociedade, terá de si mesmo
uma visão mais otimista, considerando-se produtivo, útil, capaz de muito ainda colaborar
para a sociedade na qual está inserido.
Assim, as UATI se constituem como espaços de educação não-formal, considerada
como um núcleo fundamental da Pedagogia Social, a qual caracteriza-se por transitar em
espaços sociais nos quais os contornos educativos não são bem delimitados. Nestes
espaços, o processo de empoderamento torna-se possível para os idosos, pois por meio da
aquisição de conhecimentos e aprendizagem políticas de direitos, este grupo ultrapassa
uma realidade de exclusão e marginalização, para a constituição de um grupo social e
políticamente ativo.
Referências
BOTH, A. Identidade existencial na velhice: mediações do estado e da universidade.
Passo Fundo: UPF, 2000.
CAMARANO, A. A; PASINATO, M. T. Envelhecimento funcional e suas implicações
para a oferta de trabalho brasileira. Texto para discussão n. 1326. Rio de Janeiro: IPEA,
2008.
CAMARANO, A. A; KANSO, S; LEITÃO e MELLO, J. Como vive o idoso brasileiro?
In: CAMARANO, A. A. Os novos idosos brasileiros: muito além dos 60? Rio de Janeiro:
IPEA, 2004a. p. 25-74.
CASTEL, R. As metamorfoses da questão social: uma crônica do salário. Petrópolis:
Vozes,1998.
CHEPTULIN. A. A dialética materialista. São Paulo: Alfa-Ômega, 2004.
FONTE, I. B. Diretrizes internacionais para o envelhecimento e suas conseqüências no
conceito de velhice. Encontro da Associação Brasileira de Estudos Populacionais, 12,
2002, Ouro Preto, Anais do XII Encontro da Associação Brasileira de Estudos
Populacionais, ABEP, 2002.
14
FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996.
FURTADO, E. S. Terceira Idade: enfoques múltiplos. Motus Corporis, Rio de Janeiro, v.
4, n. 2, p.121-147, nov. 1997.
FURTER, P. Educação e vida. Petrópolis: Vozes, 1976.
GADOTTI, M. A educação contra a educação. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1984.
GOHN, M. G. Movimentos sociais no inicio do século XXI: antigos e novos atores
sociais. Petrópolis: Vozes, 2003
______. Educação não-formal na pedagogia social. Congresso Internacional de Pedagogia
Social, 1, 2006, São Paulo, Anais do 1º Congresso Internacional de Pedagogia Social,
USP, 2006.
HERÉDIA, V. B. M. A família, a educação e o envelhecimento humano: desafios para a
sociedade. In: CASARA, M. B.; CORTELLETTI, I. A.; BOTH, A. Educação e
envelhecimento humano. Caxias do Sul: EDUCS, 2006. p. 109-132.
IBGE. Projeção da População por Sexo e Idade para o Período 1980 – 2050. Diretoria
de Pesquisas. Coordenação de População e Indicadores Sociais. Revisão 2008, Rio de
Janeiro: Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2009.
KAZTMAN, R. Vulnerabilidad y Exclusión social: una propuesta metodológica para el
estudio de las condiciones de vida de los hogares. Chile: CEPAL, 2005.
KLEBA, M. E; WENDAUSEN, A. Empoderamento: processo de fortalecimento dos
sujeitos nos espaços de participação social e democratização política. Saúde Social, São
Paulo, vol. 18, n. 4, p. 733-743, 2009.
MOODY, H. R. The new aging enterprise. Occasional papers. Washington, Academic
Affairs, n. 4, p. 1-50. may. 2008.
MOSQUERA, J. J. M. Educação: novas perspectivas. Porto Alegre: Sulina, 1975.
OAKLEY, P; CLAYTON, A. Monitoramento e avaliação do empoderamento.
Tradução de Zuleika Arashiro e Ricardo Dias Sameshima. São Paulo, Instituto Pólis, 2003.
OLIVEIRA, R. C. S. Terceira Idade: do repensar dos limites aos sonhos possíveis.
Campinas: Papirus, 1999.
______. O processo histórico do estatuto do idoso e a inserção pedagógica na universidade
aberta. Revista HISTEDBR Online, Campinas, n. 28, p. 278-286, dez. 2007.
15
PAIVA, V. Educação Permanente: ideologia educativa ou necessidade econômico-social?
In: PAIVA, V.; RATTNER, H. Educação permanente e capitalismo tardio. São Paulo:
Cortez, 1985. p. 7-63.
PALMA, L. T. S. Educação permanente e qualidade de vida: indicativos para uma
velhice bem-sucedida. Passo Fundo: UPF, 2000.
PINTO, A. V. Sete lições sobre a educação de adultos. São Paulo: Cortez, 1989.
SARAIVA, I. S. Educação de jovens e adultos: dialogando sobre aprender e ensinar.
Passo Fundo: UPF, 2004.
STANO, R. C. M. T. Questões do envelhecimento e suas relações com o processo de ensino-aprendizagem. A terceira idade, São Paulo, v. 18, n. 40, p. 7-14, out.2007.
SILVA, R. Fundamentos teóricos e metodológicos da pedagogia social no Brasil.
Congresso Internacional de Pedagogia Social, 1, 2006, São Paulo, Anais do 1º Congresso
Internacional de Pedagogia Social, USP, 2006.
TEODORO, M. F. M. UNATI/UERJ: uma proposta de educação permanente para o
cidadão idoso. 2006, 175 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de
Educação, Universidade Católica de Petrópolis, Petrópolis, 2006.
TONI, I. M. Educação e psicologia : interações e estratégias para uma velhice bemsucedida. In: CASARA, M. B.; CORTELLETTI, I. A.; BOTH, A. Educação e
envelhecimento humano. Caxias do Sul: EDUCS, 2006. p. 133-150.
Download

Rita de Cássia Oliveira