UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE UNIDADE ACADÊMICA ESPECIALIZADA EM CIÊNCIAS AGRÁRIAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS FLORESTAIS RODRIGO FERREIRA DE SOUSA USO SUSTENTÁVEL DA Copernicia prunifera (Miller) H. E Moore NO SEMIÁRIDO POTIGUAR: VALORIZAÇÃO DE SABERES E CONSERVAÇÃO DOS RECURSOS GENÉTICOS Macaíba, 2014 1 RODRIGO FERREIRA DE SOUSA USO SUSTENTÁVEL DA Copernicia prunifera (Miller) H. E Moore NO SEMIÁRIDO POTIGUAR: VALORIZAÇÃO DE SABERES E CONSERVAÇÃO DOS RECURSOS GENÉTICOS Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Florestais da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como pré-requisito para obtenção do título de Mestre. Orientador: Prof. Dr. Fábio de Almeida Vieira Macaíba, 2014 2 Divisão de Serviços Técnicos Catalogação da Publicação na Fonte. Unidade Acadêmica Especializada em Ciências Agrárias Campus Macaíba Biblioteca Setorial Professor Rodolfo Helinski Sousa, Rodrigo Pereira de. Uso sustentável da Copernicia prunifera (Miller) H. E Moore no semiárido potiguar: valorização de saberes e conservação dos recursos genéticos / Rodrigo Ferreira de Sousa. - Macaíba, RN, 2014. 78 f. Orientador (a): Prof. Dr. Fábio de Almeida Vieira. Dissertação (Mestrado em Ciências Florestais). Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Unidade Acadêmica Especializada em Ciências Agrárias Campus Macaíba. Programa de Pós- Graduação em Ciências Florestais. 1. Carnaúba - Dissertação. 2. Estrutura Genética - Dissertação. 3. Diversidade Genética - Dissertação. I. Vieira, Fábio de Almeida. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Unidade Acadêmica Especializada em Ciências Agrárias Campus Macaíba. IV. Título. RN/UFRN/BSPRH CDU: 633.9 3 USO SUSTENTÁVEL DA Copernicia prunifera (Miller) H. E Moore (CARNAÚBA) NO SEMIÁRIDO POTIGUAR: VALORIZAÇÃO DE SABERES E CONSERVAÇÃO DOS RECURSOS GENÉTICOS RODRIGO FERREIRA DE SOUSA Dissertação avaliada e aprovada pela banca examinadora: Orientador: ______________________________________________________________ Prof. Dr. Fábio de Almeida Vieira - UFRN Examinadores: ___________________________________________________________________ Prof.a Dr. Cristiane Gouvêa Fajardo - UFRN ____________________________________________________________________ Prof. Dr. Malcon do Prado Costa - UFRN ___________________________________________________________________ Prof. Dr. Anderson Marcos de Souza – UNB Data de aprovação: / / Macaíba, 2014 4 DEDICO Ao nosso Senhor Jesus Cristo, ao meu pai Pedro Francisco de Sousa e minha mãe Matilde Ferreira de Sousa. 5 AGRADECIMENTOS Primeiramente a Jesus, por ter me concedido o dom da vida, me amparado em todos os momentos que precisei e por ter colocado em minha vida dois anjos aos quais chamo de pai e mãe. Aos meus pais Pedro Francisco de Sousa e Matilde Ferreira de Sousa, por tudo que eles fizeram e fazem por mim, pelo amor e carinho que me foi dado em todos os anos da minha vida e por me apoiarem em todos os momentos de dificuldade. Amo muito vocês! A minha amiga, namorada, companheira Joama Alves de Sousa por está comigo, me dando força, carinho e tornando minha vida melhor em todos os momentos. Mesmo estando distante geograficamente sempre esteve comigo. Amo-te demasiadamente! Ao meu orientador e amigo, Dr. Fábio de Almeida Vieira, pela paciência e pelos ensinamentos transmitidos ao longo desses dois anos. Agradeço aos meus avôs maternos, Pedro Ferreira de Lima e Luiza Mônica de Sousa Lima e meus avôs paternos, Francisco José de Sousa (in memorian) e Regina Maria de Sousa (in memorian) pelo carinho e apoio a mim concedido. A todos que fazem parte do Laboratório de Genética e Melhoramento Florestal (LABGEM) - UAECIA - UFRN, pela amizade, companheirismo e apoio a mim dedicado, só assim foi possível à realização desse trabalho, a todos vocês meu muito OBRIGADO! A todos os meus tios, tias, primos e primas, que de alguma forma contribuíram para que fosse possível a realização dessa etapa na minha vida. A todos os meus amigos e amigas que me deram forças e incentivos para que eu continuasse seguindo os meus objetivos. Aos funcionários da EAJ, pela atenção e amizade que foi construída durante esses anos. A todos os professores e professoras que de forma direta ou indireta, contribuíram para o meu crescimento profissional. Aos moradores da Agrovila Picada, Ipanguaçu, RN, por terem contribuído com a pesquisa. Enfim, agradeço a todos que de alguma forma contribuiu para que eu pudesse realizar mais uma importante etapa da minha vida. 6 "ÁRVORE DA VIDA" Carnaubeira é árvore da vida Tudo dela na vida se aproveita Desde a famosa cera derretida Até o chapéu de palha que enfeita O seu tronco em casa faz escora Também caibro sustentando o telhado Tu resistes à intempérie a toda hora Ao rachado solo tão seco ou alagado Eu convivi no meu tempo de infância Contigo na minha terra em abundância Catuana em meio a imensos carnaubais Saudade dói e corta feito navalha Lembro a safra o corte de tua palha Transportada em comboio de animais. (Pedro Sampaio) 7 “Porque para mim tenho por certo que as aflições deste tempo presente não são para comparar com a glória que em nós há de ser revelada.” (Romanos 8: 18) “Talvez não tenha conseguido fazer o melhor, mas lutei para que o melhor fosse feito. Não sou o que deveria ser, mas Graças a Deus, não sou o que era antes.” (Marthin Luther King) “É muito melhor lançar-se em busca de conquistas grandiosas, mesmo expondo-se ao fracasso, do que alinhar-se com os pobres de espírito, que nem gozam muito nem sofrem muito, porque vivem numa penumbra cinzenta, onde não conhecem nem vitória, nem derrota.” (Theodore Roosevelt) “Por vezes sentimos que aquilo que fazemos não é senão uma gota de água no mar. Mas o mar seria menor se lhe faltasse uma gota.” (Madre Teresa de Calcutá) 8 SUMÁRIO APRESENTAÇÃO......................................................................................................................................10 RESUMO ................................................................................................................................................... 11 ABSTRACT ............................................................................................................................................... 12 INTRODUÇÃO.......................................................................................................................................... 13 REFERÊNCIAS ......................................................................................................................................... 16 Capítulo 1: ETNOECOLOGIA E ETNOBOTÂNICA DA PALMEIRA CARNAÚBA [Copernicia prunifera (MILL) H. E. MOORE] NO SEMIÁRIDO POTIGUAR ........................................................... 19 RESUMO ................................................................................................................................................... 19 ABSTRACT ............................................................................................................................................... 19 INTRODUÇÃO.......................................................................................................................................... 20 MATERIAL E MÉTODOS ........................................................................................................................ 21 RESULTADOS E DISCUSSÃO................................................................................................................ 22 CONCLUSÃO............................................................................................................................................ 30 AGRADECIMENTOS ............................................................................................................................... 31 REFERÊNCIAS ......................................................................................................................................... 31 Capítulo 2: SELEÇÃO DE MARCADORES ISSR PARA Copernicia prunifera (MILL) H. E. MOORE: ESTRUTURA E DIVERSIDADE GENÉTICA EM UMA POPULAÇÃO NATURAL........................... 35 RESUMO ................................................................................................................................................... 35 ABSTRACT ............................................................................................................................................... 35 INTRODUÇÃO.......................................................................................................................................... 36 MATERIAL E MÉTODOS ........................................................................................................................ 38 RESULTADOS E DISCUSSÃO................................................................................................................ 40 CONCLUSÃO ..................................................................................................................... 46 AGRADECIMENTOS ............................................................................................................................... 47 REFERÊNCIAS ......................................................................................................................................... 47 Capítulo 3: DIVERSIDADE E ESTRUTURA GENÉTICA EM DIFERENTES ESTÁGIOS DE DESENVOLVIMENTO DE Copernicia prunifera (MILL) H. E. MOORE NO SEMIÁRIDO POTIGUAR ................................................................................................................................................ 51 RESUMO ................................................................................................................................................... 51 ARSTRACT ............................................................................................................................................... 51 INTRODUÇÃO.......................................................................................................................................... 52 MATERIAL E MÉTODOS ........................................................................................................................ 53 RESULTADOS E DISCUSSÃO................................................................................................................ 58 CONCLUSÃO.......................................................................................................................................... 667 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................................................... 68 IMPLICAÇÕES PARA A CONSERVAÇÃO............................................................................................69 REFERÊNCIAS ......................................................................................................................................... 70 ANEXO I.....................................................................................................................................................76 9 APRESENTAÇÃO A presente dissertação está organizada em três capítulos, os quais compõem os artigos produzidos dos trabalhos realizados com Copernicia prunifera (Miller) H. E Moore. O primeiro capítulo “Etnoecologia e etnobotânica da palmeira carnaúba [Copernicia prunifera (Mill) H. E. Moore] no semiárido potiguar”, foi enviado para a Revista Cerne e aborda o conhecimento que uma população rural extrativista possui, em relação às formas de uso e interações da espécie com o ambiente o qual está inserida. O segundo capítulo corresponde ao manuscrito “Seleção de marcadores ISSR para Copernicia prunifera (Mill) H. E. Moore: Estrutura e diversidade genética em uma população natural”, preparado para envio à revista Pesquisa Florestal Brasileira. Esta parte trata da seleção de primers ISSR que possibilitem aferir parâmetros de diversidade genética na população estudada. O terceiro e último capítulo se refere ao artigo “Diversidade e estrutura genética em diferentes estágios de desenvolvimento de Copernicia prunifera (Mill) H. E. Moore no semiárido potiguar”, será submetido ao periódico Biochemical Systematics and Ecology e teve como objetivo determinar os níveis de agregação espacial e avaliar a diversidade genética entre os estágios de vida de uma população natural de C. prunifera, servindo para subsidiar planos de conservação da espécie. 10 RESUMO Copernicia prunifera (Arecaceae), popularmente conhecida como carnaúba, é nativa da região nordeste do Brasil, com ocorrência ao longo das margens de rios e áreas alagadiças. Por ser versátil em relação às formas de usos, essa palmeira ficou conhecida como “árvore da vida”, sendo o pó cerífero o principal produto extraído da C. prunifera. Este estudo teve como objetivos investigar aspectos etnoecológicos e etnobotânicos da C. prunifera em uma comunidade extrativista, selecionar primers ISSR (Inter Simple Sequence Repeat) para estudos de genética de populações, e estudar a diversidade e a estrutura genética de uma população natural no Estado do Rio Grande do Norte, Brasil. Foram entrevistados 11 moradores considerados informantes-chaves na região de Ipanguaçu/RN, onde 73% dos informantes relataram a ocorrência de um morfotipo diferente de carnaúba, conhecida como “carnaúba branca”. Dos entrevistados, 82% afirmaram que a espécie possui dispersão realizada por morcegos. Na etnobotânica, o pó cerífero foi citado por todos como o produto mais importante extraído da C. prunifera e a folha a parte mais usada (45%), seguida dos frutos (29%), caule e raiz (ambas com 13%). Na seleção de primers ISSR, dos 17 que foram testados, 12 amplificaram o DNA e, destes, sete foram selecionados para caracterizar a estrutura genética de 37 indivíduos remanescentes. O primer que obteve a maior porcentagem de locos polimórficos (LP%) foi UBC 841 (16,36%), já o primer que teve a menor LP% foi UBC 827 (8,18%). No estudo de diversidade e estrutura genética dos indivíduos de uma população natural (regenerantes = 62, jovens = 20, adultos = 19) foram utilizados sete iniciadores ISSR que permitiram a visualização de 93 locos, com 100% de polimorfismo. Os regenerantes foram os que mais se destacaram em relação à diversidade genética (He = 0,411 e Ho = 0,599), seguido pelos jovens (He = 0,394 e Ho = 0,579) e adultos (He = 0,267 e Ho = 0,427). A AMOVA mostrou que a maior variação genética ocorre dentro dos estágios de vida (93,42%) quando comparado entre eles (6,58%). O dendograma (UPGMA), com base na identidade genética de Nei, mostrou maior semelhança genotípica entre os jovens e regenerantes (0,979). No teste de hipótese para o gargalo genético (bottleneck) foi observado elevado número de locos com excesso de heterozigosidade para os dois modelos utilizados (IAM = 92 e SMM = 91), indicando redução do tamanho efetivo populacional. Todos os estágios de desenvolvimento apresentaram estruturação genética espacial (EGE), com valores de coancestrias positivos e significativos, sendo os valores de Sp de 0,04 para os regenerantes, 0,093 para os jovens, 0,15 para os adultos e 0,53 para a população geral. Essa EGE ocorre, provavelmente, devido à dispersão restrita de sementes. PALAVRAS-CHAVES: Estrutura genética, Conhecimento popular, Nordeste do Brasil Diversidade genética, Carnaúba, 11 ABSTRACT Copernicia prunifera (Arecaceae), popularly known as carnauba, is native to northeastern Brazil, occurring along the banks of rivers and wetlands. Being versatile in relation to the forms of uses, this palm tree became known as the "tree of life", with the wax powder main product extracted from C. prunifera. This study aimed to investigate ethnoecological and ethnobotanical aspects of C. prunifera community in an extractive, select primer ISSR (Inter Simple Sequence Repeat) for studies of population genetics, and to study the genetic diversity and structure of a natural population in Rio Grande do Norte, Brazil. 11 residents considered key informants in the region of Ipanguaçu/RN, where 73% of respondents reported the occurrence of a different morphotype carnauba, known as "white carnauba" were interviewed. Of the respondents, 82% stated that the species has spread made by bats. In ethnobotany, the wax powder was cited by all as the most important product extracted from C. prunifera and sheet of the most used (45%), followed by fruits (29%), stem and roots (both 13%). In selecting ISSR primers, of which 17 were tested, 12 amplified DNA and of these, seven were selected to characterize the genetic structure of 37 individuals remaining. The primer that had the highest percentage of polymorphic loci (%LP) was UBC 841 (16.36%) while the primer that had the lowest LP UBC was 827% (8.18%). In the study of genetic diversity and structure of individuals in a natural population (regenerating = 62, young = 20, adults = 19) seven ISSR primers that allowed the viewing of 93 loci, with 100% polymorphism were used. The saplings were the most outstanding in relation to genetic diversity (He = 0.411 and Ho = 0.599), followed by youth (He = 0.394 and Ho = 0.579) and adults (He = 0.267 and Ho = 0.427). The AMOVA showed that most genetic variation occurs within the stages of life (93.42%) when compared between them (6.58%). The dendrogram (UPGMA) based on Nei's genetic identity showed higher genotypic similarity between the young and saplings (0,979). In the hypothesis testing for the genetic bottleneck (bottleneck) large number of loci with heterozygosity excess for the two models used (IAM = 92 and SMM = 91) was observed, indicating a reduction of the effective population size. All stages of development showed spatial genetic structure (EGE), with values coancestry positive and significant, with values of Sp 0.04 for saplings, 0.093 for young, 0.15 for adults and 0.53 for the full population. This EGE occurs, probably due to restricted seed dispersal. KEYWORDS: Genetic structure, Genetic diversity, Carnauba, Popular knowledge, Northeast of Brazil 12 INTRODUÇÃO Copernicia prunifera (Miller) H. E Moore (Arecaceae), popularmente conhecida como carnaúba, é uma palmeira com altura entre 10 e 15 m e diâmetro entre 15 e 25 cm (HENDERSON et al., 1995). A espécie é nativa do Semiárido do Nordeste brasileiro, podendo ser encontrada nos estados do Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Bahia, Alagoas e Sergipe. A carnaúba ocorre nos vales dos rios, principalmente do Rio Parnaíba e seus afluentes, do Rio Jaguaribe, do Rio Acaraú, do Rio Apodi, Rio Açu e do médio São Francisco, que muitas vezes formam extensas planícies inundáveis, caracterizando os carnaubais. Estas áreas podem permanecer inundadas por alguns meses do ano e, posteriormente, chegam a ser submetidas ao estresse hídrico nos meses mais secos. A ocorrência periódica da inundação nos carnaubais dos vales dos rios indica que a espécie deva apresentar adaptações para suportar a diminuição do oxigênio no solo (ARRUDA; CALBO, 2004). Devido às varias alternativas de uso, essa espécie ficou conhecida como a “árvore da vida”, tendo seus produtos boa aceitação do mercado e valor econômico (GOMES et al., 2009). O principal produto de extração da carnaúba é a cera, produzida nas folhas, principalmente as mais jovens, tornando-a internacionalmente conhecida como “carnauba wax”. A cera é rica em triacantanol (TRIA), que é um álcool alifático de cadeia longa, reconhecido como um promissor composto, pois promove o crescimento de diversas culturas hortícolas (CHEN, 2002). A cera tem sido eficiente no revestimento de frutos in natura de goiaba e maracujá-amarelo (MOTA et al., 2006; RIBEIRO et al., 2005). Destacam-se ainda o uso da cera da carnaúba na composição de diversos produtos industriais como cosméticos, cápsulas de remédios, componentes eletrônicos, produtos alimentícios, ceras polidoras e revestimentos (CAVALCANTE; DINIZ, 2005; SILVA et al., 2009). A bagana (palha) é utilizada na produção artesanal de chapéus, vassouras, bolsas e outros artefatos, além do valor na proteção e resfriamento dos solos na agricultura, com significativa economia de água de irrigação e capinas (ARRUDA; CALBO, 2004; QUEIROGA et al., 2013). Além da exploração da cera, há o uso medicinal das raízes e dos frutos, que são um rico nutriente para ração animal. O extrativismo de produtos florestais não-madeireiros, como folhas e ceras, tem sido considerado uma alternativa para a conservação da biodiversidade, ajudando a proteger as áreas naturais contra usos mais destrutivos da terra, como o desmatamento e 13 a agropecuária (WADT et al., 2005). Além disso, contribui para a melhoria da qualidade de vida de muitas comunidades rurais, que passam a incrementar sua renda com a venda dos produtos coletados, sendo que o papel desses produtos é ainda maior nas comunidades mais carentes (TICKTIN, 2004). Porém, quando o extrativismo é feito de forma descontrolada e ocorre a superexploração dos produtos florestais não madeireiros, pode gerar impactos na vegetação em vários níveis, desde indivíduos até ecossistemas, sendo que as consequências ecológicas mais diretas são a alteração das taxas de sobrevivência, crescimento e reprodução dos indivíduos coletados, alterando a estrutura e a dinâmica das populações (TICKTIN, 2004). Nesse contexto, a conservação da palmeira carnaúba está diretamente relacionada à preservação dos ambientes de ocorrência da espécie. Um importante ramo da ciência que contribui nos projetos de conservação é a etnobotânica, pois agrega informações de caráter ecológico, social e econômico, que podem resultar em planos de desenvolvimento melhor adaptados às condições locais (HANAZAKI, 2003; CREPALDI; PEIXOTO, 2010). A etnobotânica é o estudo da relação homem-planta inserido em ecossistemas dinâmicos com componentes naturais e sociais, ou simplesmente o estudo contextualizado do uso das plantas (LINS NETO et al., 2010). Cunningham (2001) argumenta que o conhecimento etnobotânico quando considerado para a conservação geralmente é relacionado ao uso sustentável de um dado recurso. Outro fator importante para a conservação e manejo dos recursos florestais é conhecer as características genéticas da população estudada. A diversidade genética é a porção hereditária de uma variação possível de ser observada e mensurada (WRIGHT, 1931). Logo, quantifica o número de genótipos em uma população ou em qualquer hierarquia (VIEIRA; CARVALHO, 2009; VIEIRA et al., 2010a; VIEIRA et al., 2010b). A falta de estratégias efetivas de conservação, com base em parâmetros técnicocientíficos pertinentes a cada espécie é um dos principais entraves a serem solucionados para que programas de conservação genética possam ser efetivamente implementados (IPGRI, 1996). Nesse sentido, inferências da estrutura genética em populações florestais naturais são importantes para que se entenda como esta diversidade é distribuída e quais as características do ambiente ou da espécie que influenciam essa distribuição (NYBOM, 2004). Isso porque é cada vez mais clara a noção de que para a preservação de uma espécie é necessária à preservação de sua diversidade genética, pois somente apresentando variação genética, uma espécie tem condições de responder às pressões do ambiente, evoluir e sobreviver em longo prazo (PAUTASSO, 2009). 14 Nesses estudos, podem ser estimados vários parâmetros populacionais como a diversidade gênica, o grau de parentesco, a endogamia, o fluxo gênico, entre outros, que são de grande aplicabilidade quando se torna necessária a definição de estratégias de conservação dessa variabilidade genética (VIEIRA; CARVALHO, 2008). Portanto, o conhecimento e o entendimento da estruturação genética inter e intrapopulacional serão importantes para o manejo e conservação dos recursos genéticos da palmeira carnaúba. Mediante a junção de conceitos de ecologia e genética populacional, os marcadores genéticos vêm sendo utilizados para avaliar a variabilidade genética de populações naturais de plantas (GONÇALVES et al., 2010). A caracterização com o uso de marcadores moleculares tem sido útil, em virtude da diversidade, em nível molecular, ser bem maior que a morfológica (NYBOM, 2004). Além disso, o tempo para obtenção do polimorfismo é menor e as informações obtidas não são efeitos do ambiente. A caracterização molecular detecta diferenças na sequência de DNA e quantifica a diversidade, cuja interpretação é realizada por meio de diferentes medidas de dissimilaridade (KOSMAN; LEONARD, 2005). Entre as técnicas moleculares disponíveis, os marcadores entre repetições de sequências simples (Inter Simple Sequence Repeat - ISSR) têm sido utilizados com sucesso (ZIETKIEWICZ et al., 1994). Assim como os microssatélites, os marcadores ISSR amplificam segmentos genômicos abundantes e amplamente distribuídos ao longo do genoma dos eucariontes sem, no entanto, necessitarem de sequenciamento para a construção dos primers (GE, 2005). Este trabalho teve como propósito investigar aspectos da etnobiologia em uma comunidade extrativista da palmeira Copernicia prunifera e avaliar a diversidade e estrutura genética espacial de uma população natural da espécie em região semiárida do Estado do Rio Grande do Norte. i. Investigar aspectos etnoecológicos e etnobotânicos da palmeira carnaúba em uma comunidade extrativista; ii. Quantificar a diversidade genética de uma população natural de carnaúba, visando subsidiar a conservação in situ e melhoramento genético da espécie; iii. Determinar a estrutura genética espacial dos genótipos na população estudada. 15 REFERÊNCIAS ARRUDA, G. M. T; CALBO, M. E. R. 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RESUMO O objetivo do presente trabalho foi investigar aspectos etnoecológicos e etnobotânicos da carnaúba (Copernicia prunifera, Arecaceae) em uma comunidade extrativista do Assentamento Pedro Ezequiel de Araújo, Ipanguaçu, RN. Foram entrevistados 11 moradores, utilizando a técnica da indução não específica, turnê guiada e observação direta para confirmar as informações obtidas. Dos entrevistados, 81% afirmaram que o carnaubal da região, estimado em 600 ha, é uma formação vegetal natural. Na investigação etnoecológica, 73% dos informantes relataram a ocorrência de “um tipo diferente de carnaúba”, conhecida como “carnaúba branca” por apresentar estipe claro, frutos menores e ausência de espinhos no pecíolo, além de ser rara no local, em proporção 1:5.000. Sobre sua fenologia, 82% dos entrevistados observam as mudanças reprodutivas ao longo do ano, sendo os frutos dispersos por morcegos. Na etnobotânica, o pó cerífero foi citado por todos, como o produto mais importante extraído e a folha a parte mais usada (45%), seguida dos frutos (29%), caule e raiz (ambas com 13%). Foram relatadas ainda as divisões de trabalho (cortadores, aparadores, burreiros, estendedores e gancheiros) na extração do pó da carnaúba. Os resultados desta pesquisa irão contribuir para difundir os conhecimentos etnobotânicos e etnoecológicos da carnaúba, subsidiando estratégias de manejo e conservação das populações naturais. Palavras-chave: Etnobiologia, Extrativismo florestal, Árvore as vida, Arecaceae ETHNOECOLOGY AND ETHNOBOTANY PALM CARNAUBA [Copernicia prunifera (MILLER) H. E. MOORE] THE SEMI-ARID POTIGUAR ABSTRACT The objective of this study was to investigate ethnoecological and ethnobotanical aspects of carnauba (Copernicia prunifera, Arecaceae) in an extractive community nesting Pedro Ezequiel of Araujo, Ipanguaçu, RN. 11 residents were interviewed, using the technique of non-specific induction, guided tour and direct to confirm the information obtained from observation. Of the respondents, 81 % said that the carnauba palm in the region, estimated at 600 ha, is a natural plant formation. In etnoecológica research, 73% of respondents reported the occurrence of "a different kind of carnauba", known as "white carnauba" by presenting clear stipe, smaller fruits and absence of spines on the petiole, besides being rare on site, in proportion 1:5000. On phenology, 82% of respondents observed reproductive changes throughout the year, with the fruits dispersed by bats. In ethnobotany, the wax powder was cited by all as the most important product extracted and the sheet of the most used (45%), followed by fruits (29%), stem and roots (both 13%). Further divisions of labor (mowers, trimmers, burreiros, extenders and gancheiros) in the extraction of dust from the carnauba were reported. The results of this research will contribute to disseminating ethnobotanical and 19 ethnoecological knowledge of carnauba, supporting strategies for management and conservation of natural populations. Key words: Ethnobiology, Forest extraction, The life tree, Arecaceae INTRODUÇÃO O extrativismo de produtos florestais não madeireiros, como ceras e folhas, tem sido considerado uma alternativa para a conservação da biodiversidade, ajudando a proteger as áreas naturais contra usos mais destrutivos da terra, como o desmatamento e a agropecuária (WADT et al., 2005). Além disso, contribui para a melhoria da qualidade de vida de muitas comunidades rurais, que passam a incrementar sua renda com a venda dos produtos coletados, sendo que o papel desses produtos é ainda maior nas comunidades mais carentes (TICKTIN, 2004). A carnaúba (Copernicia prunifera) é uma palmeira nativa do nordeste brasileiro, com maior ocorrência nos Estados do Ceará, Piauí e Rio Grande do Norte. O termo “carnaúba” é derivado da língua indígena tupi e significa “árvore-que-arranha”. A espécie é conhecida ainda como “árvore da vida”, pois oferece uma infinidade de usos econômicos (GOMES et al., 2009). Sua principal riqueza está na cera que recobre as folhas, principalmente as mais jovens, tornando-a internacionalmente conhecida como “carnauba wax”. Nesse contexto, a conservação da palmeira carnaúba está diretamente relacionada à preservação dos ambientes de ocorrência da espécie. No Estado do Rio Grande do Norte, a carnaúba ocorre com maior frequência nos vales do Rio Açu, onde são encontrados extensos carnaubais. Esse rio é responsável pela maior bacia hidrográfica do estado, onde são encontrados 1.112 açudes, numa superfície de 17.500 km², que equivale a 32,8% do território estadual. Apesar dessa importância, os graves danos provocados por constantes desmatamentos, assoreamento, a incidência de agrotóxicos, resíduos tóxicos, o lixo urbano, o garimpo e outros impactos são resultados da ação antrópica e de reflexos negativos ambientalmente na região. Adicionalmente, vários municípios que compõem a bacia hidrográfica do Rio Açu estão sujeitos à desertificação (MMA, 2005). Devido a isso, essas áreas de ocorrência natural da carnaúba merecem ações urgentes de preservação, que podem ser estruturadas com base na caracterização do conhecimento local e formas de usos da planta pelas comunidades extrativistas. 20 A etnoecologia é frequentemente usada para designar os estudos que se referem à interação entre uma população humana local e seu ambiente natural (CASTANEDA; STEPP, 2007). Já a etnobotânica é o estudo contextualizado do uso das plantas pelas populações tradicionais (LINS NETO et al., 2010). Conforme relata Albuquerque e Andrade (2002), a estrutura das comunidades vegetais é geralmente afetada em diferentes aspectos pelos extrativistas. Sendo assim, é fundamental que seja considerado o conhecimento tradicional das populações tradicionais e os níveis de coleta praticados para então desenvolver práticas sustentáveis de manejo. O objetivo do presente trabalho foi investigar aspectos etnoecológicos e etnobotânicos da Copernicia prunifera em uma comunidade extrativista do estado do Rio Grande do Norte, servindo de subsídio para elaboração de estratégias de conservação da espécie. MATERIAL E MÉTODOS Local de estudo O estudo foi realizado na Agrovila Picada, Assentamento Pedro Ezequiel de Araújo (APEA), município de Ipanguaçu (RN). O local está inserido na microrregião do Vale do Açu, nas coordenadas 05°31’47”S, 36°48’18”W e altitude de 16 m, em região semiárida. O clima do local, segundo a classificação de Köppen, é “BSwh”, ou seja, seco, muito quente e com estação chuvosa de março a abril, com variações de 1,4 mm a 1.627,1 mm e média de precipitação anual de 585,8 mm. A temperatura média anual é de 28,1 0C e umidade relativa média anual de 70% (COSTA, 2010). Essa área foi escolhida mediante a observação da existência de reserva de carnaubeira e utilização humana constante dos recursos oferecidos pela espécie. A Agrovila Picada abriga 59 famílias, que trabalham de forma assalariada no extrativismo da carnaúba, sendo a maioria colonos, assentados da reforma agrária. Os carnaubais ocupam uma área de aproximadamente 600 hectares no assentamento, com distribuição ao longo da Lagoa de Ponta Grande. Coleta de dados etnoecológicos e etnobotânicos Após a identificação do primeiro informante-chave, foi utilizada a técnica bola de neve (“snowball”) (BERNARD, 1996), alcançando um total de 11 informantes (nove homens e duas mulheres), considerados especialistas por demonstrarem conhecimentos 21 adquiridos localmente a partir da observação, do uso ou da exploração da palmeira carnaúba. As entrevistas ocorreram ao longo do ano de 2012. Para cada entrevistado foram explicados os propósitos do estudo, sendo solicitadas as Anuências Prévias para a realização das entrevistas e, em seguida, feitas as perguntas semiestruturadas, que abordaram questões socioeconômicas (sexo, idade, escolaridade e profissão) e questões relacionadas à sua convivência e envolvimento com exploração da carnaúba (Anexo I). A etnoecologia foi investigada com base em perguntas sobre a biologia vegetativa e reprodutiva da espécie, abordando questões relacionadas, por exemplo, a fenologia (floração, frutificação e dispersão dos frutos). O estudo etnobotânico abrangeu os tipos de uso popular da espécie (folhas, raízes, frutos, estipe, etc.), assim como aspectos econômicos da exploração e comercialização da carnaúba, visando identificar as utilidades e valor econômico dos derivados da mesma. Após as entrevistas, as atividades tiveram como base também na metodologia participativa, que permite a contínua troca de saberes na dimensão ambiental, difusão de conhecimento e tecnologia, gestão e organização da produção/comercialização da palmeira carnaúba. Desse modo, realizou-se a técnica de indução não específica, sugerida por Brewer (2002), para subsidiar as entrevistas anteriores, visando recordar ou acrescentar outros elementos de interesse na investigação. Por último, realizou-se a técnica da observação direta para confirmar as informações obtidas e turnê-guiada (ALBUQUERQUE et al., 2010). RESULTADOS E DISCUSSÃO Dados socioeconômicos A maioria dos informantes da Agrovila Picada (54%) apresentou idade compreendida entre 30 e 50 anos, 27% entre 50 e 70 anos e 18% com até 30 anos. Em relação ao grau de escolaridade, 36% são analfabetos, 54% possuem ensino fundamental e 9% possui ensino médio completo. A comunidade é predominantemente formada por agricultores (81% dos entrevistados), sendo a agricultura de subsistência o modelo de produção adotado pelos informantes, 9% são servidores públicos e 9% são donas de casa. 22 Dados etnoecológicos Segundo os entrevistados, a população de carnaúba existe na região do Assentamento Pedro Ezequiel de Araújo há mais de 70 anos (81% dos informantes). Dois informantes não souberam informar com precisão o tempo de existência do carnaubal. Todos os informantes afirmaram que o carnaubal originou-se de forma natural, ou seja, não houve a interferência humana no surgimento de indivíduos de C. prunifera naquela localidade, sendo caracterizado pelos moradores como área de maior ocorrência “campo” (91%), seguido por “beira de estrada” (9%). Segundo D’Alva (2004), a palmeira carnaúba tem distribuição geográfica nos vales dos rios nordestinos. A espécie ocorre em ambientes com solos argilosos e em aluviões, onde há maior saturação hídrica e elevados teores de salinidade (HOLANDA et al., 2011). Estas áreas podem permanecer inundadas por alguns meses do ano e, posteriormente, chegam a ser submetidas ao estresse hídrico nos períodos mais secos. A ocorrência periódica da inundação nos carnaubais dos vales dos rios indica que a espécie deva apresentar adaptações para suportar a diminuição do oxigênio no solo (ARRUDA; CALBO, 2004). Quando perguntado se existia variabilidade fenotípica na espécie, os moradores afirmaram existir “dois tipos” (73%), chamadas de carnaúba comum e carnaúba branca, sendo diferenciadas pela presença de espinhos no pecíolo na carnaúba comum e ausência dessa estrutura na carnaúba branca (Figura 1). A B Figura 1: Carnaúba branca, sem espinhos nos pecíolos (A) e carnaúba comum, com espinhos nos pecíolos (B). Ipanguaçu, Rio Grande do Norte (RN). 23 Outra diferença marcante entre as duas, relatada pelos informantes, são variações no tamanho dos frutos e enfolhamento apical, onde, a carnaúba branca apresenta frutos menores e mais enfolhamentos apicais (dois) em relação à carnaúba comum. Além disso, a carnaúba branca tem suas raízes utilizadas na medicina popular, apresentando característica anti-inflamatória (18% dos informantes). Por ser rara na região de estudo (proporção informada foi de, aproximadamente, 1:5.000), 27% dos informantes disseram não conhecer variações fenotípicas da espécie, ou seja, não conhecem a carnaúba branca. Queiroga et al. (2013), em seu estudo com carnaubeira no nordeste, relatam a existência da carnaúba branca, possuindo como principais características o uso medicinal das raízes, estipe de coloração mais clara que a comum, além de ser rara na região. Os processos fenológicos, como floração e frutificação da carnaúba são observados por grande parte dos moradores (81,81%), porém, existem controvérsias em relação aos meses do ano em que isso acontece. Dois informantes disseram que o período de floração começa em agosto e estende-se até setembro. Entretanto, a maioria (nove informantes) afirmou que de outubro a novembro ocorre o período de floração e a frutificação prolonga-se até fevereiro, sendo a dispersão dos frutos feita por morcegos, (dispersão quiropterocórica). D’Alva (2004), em seu trabalho de etnobotânica da carnaúba no estado do Ceará, afirma que o aparecimento dos frutos de carnaúba ocorre entre os meses de novembro a março. Estudos sobre a fenologia da espécie C. prunifera em uma população remanescente no município de Macaíba, Rio Grande do Norte, constatou que a floração ocorre entre os meses de outubro a novembro e a frutificação estende-se até o mês março (ROCHA, 2013). Dados etnobotânicos As citações de usos foram divididas em dois grupos distintos, sendo eles: uso madeireiro (construção, tecnologia para a fabricação de cabos para ferramentas, colher, móveis, e produção de energia) e uso não madeireiro (medicinal, artesanato, extração do pó e alimento), 13% e 87% respectivamente. Esses dados mostram significativa predominância dos usos não madeireiros em relação aos usos madeireiros, possivelmente, por se tratar de uma espécie que não possui caule de boa qualidade quando comparada a tantas outras espécies encontradas no semiárido, como o angico [Anadenanthera colubrina (Vell.) Brenan] e a aroeira (Myracrodruon urudeuva Allemão). 24 Dados do presente trabalho foram comparados com achados por outros pesquisadores que estudaram a etnobiologia de palmeiras (Tabela 1), a fim de obter mais informações sobre a utilização dos representantes da família Arecaeae em diferentes regiões do país. Tabela 1: Comparação, entre os dados etnobotânicos, do presente estudo com outros trabalhos de palmeiras, em diferentes estados do Brasil. Nome científico Copernicia prunifera (Mill) H. E. Moore Astrocaryum vulgare Mart. Nome vulgar Partes Usadas Utilidade Local de estudo Autor Alimentação, Artesanato, Construção, Medicinal Ipanguaçu RN Presente estudo Carnaúba Caule, Cera, Folha, Fruto, Raiz Tucumã Folha, Fruto Alimentação, Bragança - PA Rocha e Silva. Artesanato 2005 Carnaúba Caule, Cera, Folha, Fruto, Raiz Alimentação, Artesanato, Fortaleza - CE D’Alva, 2004 Construção, Medicinal Euterpe edulis Mart. Juçara Caule, Folha, Fruto, Palmito Alimentação, Artesanato, Construção, Ritualístico Euterpe oleracea Mart. Açaí Caule, Fruto, Palmito, Raiz Alimentação, Rocha e Silva. construção, Bragança - PA 2005 Medicinal Mauritia flexuosa L. f. Buriti Folha, Fruto Artesanal Bragança - PA Rocha e Silva. 2005 Mauritia flexuosa L. f. Buriti Folha, Fruto, Caule Alimentação, Artesanato, Construção Abaetetuba PA Santos e Ferreira, 2012 Folha, Fruto, Caule Alimentação, Artesanato, Construção, Combustível, Medicinal Buíque - PE Rufino et al. 2008 Folha, Fruto, Caule Alimentação, Artesanato, Construção, Combustível, Medicinal Buíque - PE Rufino et al. 2008 Copernicia prunifera (Mill) H. E. Moore Orbignya phalerata Mart. Syagrus coronata (Mart.) Becc Babaçu Licurí Ubatuba - SP Silva e Fisch, 2012 25 De acordo com a comparação foi observado que “alimentação” e “artesanato” são as principais categorias de usos atribuídas às palmeiras. C. prunifera apresenta-se como a segunda espécie com o maior número de possibilidades de uso, ficando atrás apenas de Orbignya phalerata Mart. e Syagrus coronata (Mart.) Becc. Para a espécie humana, a família Arecaceae tem grande importância, pois seus representantes são fornecedores, principalmente, de alimentos como frutos e palmito e matéria-prima para a confecção de artesanato, tendo importante participação na renda de várias counidades extrativistas (ALVES; CARVALHO, 2010). Os informantes (82%) disseram que atualmente existem menos indivíduos de carnaúba quando comparado há tempos pretéritos, sendo as queimadas, desmatamento e o avanço das terras agrícolas e pastagens os maiores causadores desse declínio populacional. Drumond (2004) afirma que populações naturais da palmeira licuri [Syagrus coronata (Mart.) Becc. (Arecaceae)], tem sofrido forte degradação, principalmente, por práticas agrícolas inadequadas, exploração indiscriminada da vegetação nativa, queimadas e alta densidade de rebanhos bovinos em áreas da caatinga. Para Reis et al. (2011), atividades como a fruticultura irrigada e técnica de criação de camarões em viveiros (carcinicultura) tem contribuído no processo de degradação dos carnaubais. O mesmo ainda ressalta a importância da produção de mudas de carnaúba e incentivo ao reflorestamento das áreas afetadas. Foi perguntado aos informantes se eles têm observado a extinção da espécie na região, provocada pela exploração inadequada: 82% responderam não perceber o desaparecimento regional da carnaúba e 18% declararam que a área do carnaubal perde terreno, principalmente para a instalação da atividade agrícola, como plantio de milho e feijão. Todos os entrevistados afirmaram que os produtos derivados da carnaúba apresentam importância na renda local, como extração do pó e artesanato (Figura 2), porém, não possuem equipamentos especializados para a produção da cera. Para Afonso e Ângelo (2009), os habitantes das áreas rurais suprem a maior parte de suas necessidades básicas (medicamentos, alimentação, fonte de renda, entre outros) por meio da exploração dos recursos florestais madeireiros e não madeireiros. 26 A B Figura 2: Artesanato (A), e pó da carnaúba (B). Ipanguaçu, Rio Grande do Norte (RN). Em relação às partes usadas (fruto, folha, raiz, caule), todos os informantes atribuíram 31 usos, divididos em alimento, artesanato, medicinal e construção, sendo a folha quem mais se destacou (45,13% das citações), seguida pelo fruto (29,09%), caule (12,90%) e raiz (12,89%). Na Agrovila Picada, as folhas da palmeira carnaúba são utilizadas na produção de artesanato e como alimento para os animais (caprinos, ovinos, bovinos). Os frutos servem de alimento para os animais e humanos. O caule (estipe) é destinado à confecção de ripas e vigas, que são utilizadas em construções residenciais (D’AVILA, 2004; QUEIROGA et al., 2013). Nascimento (2009), em seu estudo com palmeiras em território krahò (Tocantins – TO), verificou que a maior parte das espécies de palmeiras utilizadas pelos indígenas servem, principalmente, para alimentação, construção e artesanato. Salm et al. (2011), no Distrito Federal, destacam a importância das palmeiras na alimentação, construção e geração de renda para as comunidades locais. Quando interrogados, todos os informantes afirmaram que sempre deixam parte das folhas na planta, geralmente as folhas mais novas (conhecidas popularmente como mangará) que formam o ápice. Esse método tem grande valor para a conservação da espécie, pois a remoção total das folhas culminaria com a morte do organismo. O principal produto extraído da carnaúba é o pó, com o qual é produzida a cera (através de processos industrializados), que está presente na composição de diversos produtos industriais como cosméticos, cápsulas de remédios, componentes eletrônicos, 27 produtos alimentícios, ceras polidoras e revestimentos (MELO et al., 2012; STOJAKOVIC et al., 2012). Segundo informantes, o valor econômico do pó varia de acordo com sua “origem”: quando esse produto é extraído de folhas mais velhas o valor é menor (5 R$/kg), quando comparado com o pó extraído de folhas jovens (7 R$/kg). Essa diferença de preço está relacionada com a coloração dos mesmos, pois o pó das folhas velhas apresenta coloração amarelada, enquanto o pó extraído das folhas novas apresenta coloração branca. De acordo com os moradores, o pó da carnaúba apresentou crescente demanda e aumento de preço nos últimos anos, provavelmente pela grande versatilidade de uso que esse produto possui. Fato semelhante ocorreu na fabricação de artesanato, como vassouras, chapéus e esteiras, sendo a Petrobrás, segundo os entrevistados, uma das principais parceiras na aquisição de esteiras feitas com folhas e pecíolos para o revestimento de dutos de vapor (Figura 3). A B Figura 3: Esteiras de palhas (A) e pecíolos (B) de Copernicia prunifera impermeabilizadas para o revestimento de dutos de vapor da Petrobras. Ipanguaçu, Rio Grande do Norte (RN). Afonso e Ângelo (2009), afirmam que a exploração de produtos florestais não madeireiros contribui para a criação de empregos e geração de renda nas comunidades, além de ajudar na preservação dos recursos naturais. Apesar de ter sua importância 28 econômica e cultural reconhecida, apenas 18% dos entrevistados disseram produzir mudas de C. prunifera. Mesmo assim, as informações divergiram em relação à germinação, com os seguintes relatos: a) as sementes de carnaúba demoram cerca de um mês para germinarem (9%), b) a germinação pode demorar anos para acontecer (9%). Reis et al. (2011), observaram maior velocidade de emergência e melhor qualidade de mudas de Copernicia prunifera, quando as sementes foram embebidas e cultivadas a pleno sol. Segundo o autor, as sementes emergiram 103 dias após a semeadura. O conhecimento das populações tradicionais em relação aos recursos naturais que estão inseridos em seu meio é de grande valia para o desenvolvimento de planos de manejo, conservação e sustentabilidade. As informações populares servem de complemento para o conhecimento científico, demonstrando na prática quais as ações são benéficas ou não para o meio ambiente, através da vivência e adaptação as mudanças no ecossistema (CUNHA; ALMEIDA, 2000). Para Fonseca-Kruel e Peixoto (2004), as pesquisas etnobotânicas possibilitam a obtenção de informações sobre a utilização sustentável da biodiversidade, além de utilizar o saber empírico das comunidades locais. Grupo de trabalho dos extrativistas e extração do pó da carnaúba A exploração da carnaúba oferece inúmeros riscos de acidentes por se tratar de uma atividade em que o contato com materiais cortantes e perfurantes (foice, espinhos, entre outros) é constante, além da inalação do pó no processo de batição. Foi relatado ainda que nas atividades extrativistas da carnaúba são utilizados poucos equipamentos de segurança individual (EPIs). Apesar de ser um trabalho com riscos e acidentes registrados (como cortes e perfurações, principalmente), foram citados como constituintes da vestimenta: óculos, chapéu, calça, botas e camisa de manga longa. Entretanto, muitos trabalhadores desprezam o uso de alguns itens de segurança individual, conforme os relatos. Os trabalhadores exercem funções diferenciadas no processo de extração do pó cerífero da carnaúba, que se divide em quatro etapas: corte, transporte, secagem e batição (retirada do pó) das folhas (Figura 4). A extração do pó inicia-se com o corte das folhas pelos cortadores, que são os agentes responsáveis pela derrubada das folhas com o auxílio de foice acoplada a uma vara de bambu. As folhas são recolhidas e conduzidas ao local de secagem a pleno sol 29 (área aberta), chamado de estaleiro, utilizando animais de carga (burros ou jumentos) para realizar o transporte. Como esse processo é diretamente exposto aos fenômenos climáticos como chuva, é recomendado que ele seja realizado nos meses mais secos do ano, pois as taxas pluviométricas, umidade do solo e do ar são mais baixas, além da temperatura ser mais elevada nesse período. Após a secagem, as folhas são batidas manualmente, para que ocorra o desprendimento do pó, que é, então, recolhido e comercializado. A B C Figura 4: Retirada das folhas (A), secagem das folhas (B) e batição das folhas de carnaúba (C). Ipanguaçu, Rio Grande do Norte (RN). CONCLUSÃO Os informantes da comunidade extrativista avaliada demonstraram possuir um importante conhecimento sobre a espécie C. prunifera em relação aos aspectos etnoecológicos e etnobotânicos. Considerando que a carnaúba possui grande importância cultural e econômica para os habitantes da região nordeste do Brasil, os dados apresentados nesse trabalho contêm informações relevantes na elaboração de 30 planos de manejo e conservação, como por exemplo, a época mais adequada de coletar sementes para produção de mudas. Faz-se necessário uma avaliação aprofundada em outras áreas que abriguem populações dessa espécie, a fim de confirmar a capacidade de resistência e suprimento das necessidades humanas e dos demais animais. O presente estudo mostrou ainda a necessidade de investimentos em tecnologias voltadas para os processos de extração e beneficiamento dos produtos da C. prunifera, com o objetivo, principalmente, de reduzir o desperdício do pó no processo de extração. Nesse sentido os resultados desta pesquisa irão contribuir para difundir os conhecimentos etnobotânicos e etnoecológicos da carnaúba no semiárido brasileiro. Além disso, permitiu a sistematização das informações e conhecimentos tradicionais, bem como o uso da espécie pelos humanos e outros animais da região onde se encontra inserida a população estudada. AGRADECIMENTOS Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pelo auxílio financeiro concedido, processo de nº 562828/2010-9. À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), pela bolsa de estudo (Mestrado). À colaboração da ONG Carnaúba Viva e aos extrativistas pelo acolhimento. REFERÊNCIAS AFONSO, S. R.; ÂNGELO, H. 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Os primers que tiveram maior porcentagem de locos polimórficos foram UBC 841 (16,36%), UBC 842 (15,45%), UBC 857 (12,73%), UBC 859 (10,90%), UBC 840 (10,90%), UBC 813 (10%) e UBC 827 (8,18%), totalizando 93 dos 110 locos gerados. O Conteúdo de Informação Polimórfica (PIC) de cada primer selecionado variou entre 0,057 (UBC 859) e 0,444 (UBC 841). O número ótimo de locos para se estimar confiavelmente a diversidade genética para esse trabalho foi de 76 locos, ou seja, quando a correlação atingiu 0,998 e o estresse foi inferior a 0,05. Foi encontrada alta diversidade genética, com o número de alelos observados (na = 2,00), alelos efetivos (ne = 1,46), índice de diversidade de Nei (He = 0,28) e índice de Shannon (Ho = 0,44). O valor da coancestria se manteve dentro do intervalo de confiança (P > 0,05), indicando ausência de estrutura genética espacial, independentemente da distância entre as plantas. Os marcadores ISSR se mostraram eficientes na caracterização genotípica dos indivíduos de carnaúba, servindo com subsídio para planos de manejo e conservação da espécie. PALAVRAS-CHAVES: Carnaúba, Arecaceae, Variação Genética, Nordeste do Brasil. SELECTION OF ISSR MARKERS FOR Copernicia prunifera (MILLER) H. E. MOORE: STRUCTURE AND GENETIC DIVERSITY IN A NATURAL POPULATION ABSTRACT The aim of this study was to select primers ISSR (Inter Simple Sequence Repeat) for studies of the genetic structure, and to quantify the genetic variability in a natural population of C. prunifera. 37 individuals were sampled in the municipality Macaíba, Rio Grande do Norte, Northeast Brazil. 17 ISSR primers were tested, of which 12 amplified DNA and of these, seven were selected to characterize the structure and genetic diversity of the population. The primers that had the highest percentage of polymorphic loci were UBC 841 (16.36%), UBC 842 (15.45%), UBC 857 (12.73%), UBC 859 (10.90%), UBC 840 (10.90%), UBC 813 (10%) and UBC 827 (8.18%), totaling 93 of the 110 loci generated. The polymorphic information content (PIC) of each selected primer ranged from 0.057 (UBC 859) and 0.444 (UBC 841). The optimal number of loci to reliably estimate the genetic diversity for this work was 76 loci, ie, 35 when the correlation reached 0.998 and the stress was less than 0.05. High genetic diversity was found, with the number of observed alleles (na = 2.00), effective alleles (ne = 1.46), Nei's diversity index (He = 0.28) and Shannon index (Ho = 0.44). The value of the coancestry remained within the confidence interval (P > 0.05), indicating no spatial genetic structure, regardless of the distance between plants. ISSR markers were efficient in genetic characterization of individuals’ carnauba serving with allowance for management and conservation of the species. KEYWORDS: Carnauba, Arecaceae, Genetic variation, Northeast Brazil INTRODUÇÃO Copernicia prunifera ou carnaúba é uma espécie da família Arecaceae, nativa do nordeste brasileiro, tendo sua distribuição próxima de rios e áreas inundáveis (RODRIGUES et al. 2013). Apresenta-se adaptada a baixos índices pluviométricos, solos salinizados e com pouco oxigênio (ARRUDA; CALBO, 2004). Por ser bastante versátil em relação às formas de uso, essa palmeira tem grande importância econômica e cultural na região onde ocorre (LORENZI et al., 2010; RODRIGUES et al. 2013), sendo o pó cerífero o principal produto de exploração e comercialização. No estado potiguar os municípios de Assú e Mossoró destacam-se com indústrias de beneficiamento da cera de carnaúba, já os municípios Apodi, Upanema e Felipe Guerra são os maiores produtores de pó de C. prunifera (QUEIROGA et al. 2013). O pó cerífero desempenha um papel fundamental na planta, pois auxilia na redução da transpiração e protege contra a invasão de patógenos (TAIZ; ZEIGER, 2009). As folhas palmadas servem de forragem, cobertura de abrigos para humanos e outros animais e na confecção de artesanato; os frutos são consumidos por animais domésticos e selvagens. O caule em forma de estipe pode atingir de 10 a 15 metros de altura e diâmetro entre 15 e 25 centímetros, é empregado na construção civil e rural, como construção de casas, currais, entre outros. As raízes são fasciculadas e possuem propriedades medicinais (QUEIROGA et al. 2013; RODRIGUES et al. 2013). Entretanto, atividades econômicas como expansão das terras agrícolas, carcinicultura e pecuária tem causado fragmentação nas populações naturais de carnaúba (REIS et al., 2011), sendo assim, se faz necessários estudos que possibilitem a conservação ecológica e genética dessas populações afetadas. O conhecimento dos níveis de variabilidade genética e da distribuição espacial dos genótipos dentro das populações são aspectos fundamentais quando se pretende a 36 conservação in situ de uma espécie. A persistência de populações viáveis, do ponto de vista evolutivo das florestas tropicais, é crucial para a preservação dos ecossistemas e da diversidade biológica global (SILVA et al., 2011). A estimativa da variabilidade genética em populações naturais é base para resolução de numerosos problemas no campo da genética de populações, tais como endogamia, processos evolutivos, entre outros (VIEIRA; CARVALHO, 2008). Nesse contexto, os marcadores moleculares são utilizados em trabalhos que visam identificar a variabilidade genética entre populações e entre indivíduos de uma mesma população (CAIXETA et al., 2003; SOUZA et al., 2008), pois são capazes de detectar polimorfismo dos ácidos desoxirribonucleicos (BRANDÃO et al, 2011; FERREIRA; GRATTAPAGLIA, 2008; NYBOM, 2004; SILVA et al. 2011). Entre os principais marcadores moleculares está o ISSR (Inter Simple Sequence Repeat), muito utilizado por ser de baixo custo, quando comparados aos SSR (microssatélites) e também eficiente na detecção de polimorfismo (SANTANA et al.; 2011). Esses marcadores são fragmentos de DNA amplificados pela PCR (Reação da Polimerase em Cadeia) (FALEIRO, 2007; SANTANA et al., 2011; SILVA et al., 2011). Os primers são oligonucleotídeos sintéticos, iniciadores da replicação do DNA, constituídos geralmente com 15 a 20 bases nitrogenadas em uma fita simples. Os marcadores entre repetições de sequências simples (ISSRs) utilizam um primer composto por repetições di-, tri-, tetra- ou pentanucleotídicas, com ou sem uma sequência de ancoragem de 1 a 3 nucleotídeos (a ausência da sequência de ancoragem diminui a reprodutibilidade e especificidade do primer) que tem os microssatélites como sequência alvo (ZIETKIEWICZ et al., 1994). Durante a amplificação do DNA genômico via PCR, o primer único - só uma das fitas de DNA é amplificada - de ISSR produz múltiplos fragmentos de tamanhos variados (bandas), cujo padrão é analisado após separação por eletroforese para avaliar a diversidade genética. Devido à herança dominante, a presença do fragmento (banda) pode representar o homozigoto dominante ou o heterozigoto, enquanto a ausência pode ser infligida o estado homozigoto recessivo, à ocorrência de inserções/deleções, ou à adição ou perda de um sítio de reconhecimento do primer (ZIETKIEWICZ et al., 1994). Diante do exposto, o presente trabalho tem como objetivo selecionar primers ISSR para estudos da estrutura e diversidade genética de uma população natural da C. prunifera. 37 MATERIAL E MÉTODOS Local de estudo e amostragem Para a distribuição genética espacial, foi demarcada uma parcela com dimensões de 20 m x 40 m, onde foi tomada nota das distâncias de cada indivíduo em relação às coordenadas cartesianas X e Y da parcela. A amostragem foi realizada em uma população remanescente, nas coordenadas 5°53’57”S, 35°22’59”W, no município de Macaíba/RN, Brasil. O fragmento onde a população está inserida ocupa uma área de, aproximadamente, 800,0 m². Foram amostrados todos os 37 indivíduos contidos na parcela, os mesmos foram mapeados para análise da diversidade e estrutura genética espacial. As amostras foliares foram acondicionadas em tubos plásticos de 2 ml contendo CTAB 2X (cationic hexadecyl trimethylammonium bromide), identificados, e encaminhados ao Laboratório de Genética e Melhoramento Florestal – UFRN, Macaíba/RN. Em seguida estas foram armazenadas em freezer a -20ºC, até o momento da extração do DNA. Extração do DNA e PCR O DNA foi extraído pelo método de CTAB de Doyle e Doyle (1987), com modificações. No protocolo, utilizou-se 100 mM de Tris pH 8,0; 1,4 M de NaCl; 20 mM de EDTA pH 8,0; 2% (p/v) CTAB; 1% (p/v) PVP-40 e 0,2% (v/v) de βmercaptoetanol pré-aquecido a 65ºC em banho maria. Após a extração, o DNA estoque foi armazenado em freezer a -20°C. A concentração de DNA total foi estimada em gel de agarose 0,8% e brometo de etídio a 0,2 μg.mL-1. Em seguida o DNA foi diluído e mantido em geladeira até o momento do uso. Posteriormente, realizou-se a reação da polimerase em cadeia (PCR), utilizando 17 primers ISSR da Universidade de British Columbia (UBC primer set #9, Vancouver, Canadá), com comprimento entre 14 e 18 bases nitrogenadas e %CG entre 43 e 67%. A temperatura de anelamento utilizada foi de 47ºC. O mix de PCR foi constituído de Buffer (10 x), BSA (1,0 mg/ml), MgCl2 (50 mM), dNTP (2,5 mM), primer (2 µM), Taq polimerase (U/µl), DNA (diluído 1:50) e água ultra pura. As reações de PCR foram feitas em Termociclador automático Veriti com bloco de 96 poços, no qual as amostras, inicialmente, foram desnaturadas a 94ºC, por 5 38 minutos, seguidas por 37 ciclos de amplificação, tendo cada ciclo submetido às amostras a 94ºC, por 15 segundos, em seguida a 47ºC, por 30 segundos e, por fim, a 72ºC, por 1 minuto. Após os ciclos, o processo foi finalizado a 72ºC, por 7 minutos e resfriamento a 4ºC. Eletroforese Os produtos da PCR foram submetidos à eletroforese em cuba horizontal, em gel de agarose 1,5% (p/v), em tampão TBE 0,5X (Tris-Borato EDTA), a uma voltagem de 120 V, por duas horas e meia. Foi utilizado o marcador de peso molecular (Ladder) de 100 pares de bases. Decorrido o tempo de eletroforese, os géis foram retirados da cuba e fotografados sobre fonte de luz ultravioleta com auxílio do equipamento E-Box VX2, revelando os fragmentos de DNA corados com GelRedTM. Identificação do número ótimo de locos Os primers com maior número de fragmentos e boa resolução foram selecionados, descartando-se os resultados dos primers que apresentaram bandas com fraca intensidade ou baixa definição. Com o intuito de verificar a quantidade ótima de fragmentos polimórficos para os estudos de genética de populações da C. prunifera, realizou-se a análise de bootstrap (MANLY, 1997). Para cada par de plantas, foi obtida a similaridade genética estimada a partir de simulações com reamostragens de diferentes tamanhos (1, 6, 11,...,93 bandas), com 10.000 permutações por meio do software GENES (CRUZ, 2001). Foram obtidas várias estimativas de correlação (r) entre os valores da matriz de similaridade genética original e a matriz de similaridade genética simulada, com base nos diferentes números de bandas. Além disso, obteve-se o valor de estresse (E), que indica o ajuste entre a matriz original e a matriz simulada. Quando o valor de estresse assume valor inferior a 0,05, o número de fragmentos é considerado suficiente para as análises (KRUSKAL, 1964). Valor de PIC Diversidade genética O PIC (conteúdo de informação polimórfica) foi calculado para testar a eficiência dos primers ISSR em apontar o polimorfismo entre dois indivíduos, tendo 39 como indicadores a ausência ou presença de bandas. Para isso, foi utilizada a formula proposto por Anderson et al. (1993): onde: Pij é a freqüência do alelo "j" no marcador "i". Para analisar a diversidade genética dentro da população estudada, foi utilizado o programa POPGENE versão 1.3 (YEH et al. 1997), onde foram analisados o número de alelos observados (na), número de alelos efetivos (ne), diversidade genética de Nei (He) e Índice de Shanon (I). Estrutura genética espacial Os indivíduos foram classificados em adulto (quando apresentava evento reprodutivo) com altura média de 8,11 metros, jovem (com altura acima de um metro de altura e sem evento reprodutivo) com altura média entorno de 4,05 metros e regenerante com altura variando entre 0,20 – 1,00 metro de altura. Para determinar a EGE, foi calculado o coeficiente de coancestria (θxy) proposto por Loiselle et al. (1995), utilizando o programa SPAGeDi (HARDY; VEKEMANS; 2002). Esse coeficiente consiste na probabilidade de que dois alelos homólogos, retirados aleatoriamente de dois indivíduos sejam idênticos por descendência, ou seja, são cópias de um mesmo alelo de um antecessor recente (SEBBENN; SEOANE, 2005). RESULTADOS E DISCUSSÃO Números de locos O método de extração do DNA proposto por Doyle e Doyle (1987), mostrou-se eficiente na detecção de polimorfismo para a espécie em estudo. Dos 17 primers ISSR testados, 12 primers apresentaram sucesso na PCR, ou seja, amplificaram o DNA da carnaúba. Esses primers geraram um total de 110 bandas (locos), variando entre 3 e 18 bandas, com média de 9,17 bandas por primer. Santana et al. (2011), selecionaram 25 marcadores ISSR para trabalhar com umbu (Spondias sp.) e obteve 249 fragmentos (bandas), onde a quantidade de bandas por inicializador variou entre 5 e 16, obtendo a média de 10 fragmentos por primer. Entretanto, para o presente estudo, foram selecionados sete primers ISSR com base na melhor resolução dos fragmentos e 40 também no maior número de locos, visando à otimização da genotipagem para os demais indivíduos da espécie. Os primers que tiveram maior porcentagem de locos foram UBC 841 (16,36%), UBC 842 (15,45%), UBC 857 (12,73%), UBC 859 (10,90%), UBC 840 (10,90%), UBC 813 (10%) e UBC 827 (8,18%), totalizando 93 dos 110 locos gerados (Tabela 1). Tabela 1. Sequência de nucleotídeos dos primers ISSR, número de locos e o valor de PIC de cada primer. Número de Sequencia (5’ – 3’) PIC Primer ISSR Locos UBC 813 (CT)8-T UBC 827 (AC)8G UBC 840 (GA)8-YT UBC 841 (GA)8-YC UBC 842 (GA)8-YG UBC 857 (AC)8-YG UBC 859 (TG)8-RC CTCTCTCTCTCTCTCTT 11 0,280 ACACACACACACACACG 9 0,264 GAGAGAGAGAGAGAGAYT 12 0,393 GAGAGAGAGAGAGAGAYC 18 0,444 GAGAGAGAGAGAGAGAYG 17 0,419 ACACACACACACACACYG 14 0,079 TGTGTGTGTGTGTGTGRC 12 0,057 13,28 0,277 Média R = purina (A ou G) e Y = pirimidina (C ou T) Santos et al. (2013) testaram 10 primers UBC em progênies F2 de Arachis hypogaea L. (amendoim) e obtiveram um total de 108 bandas, sendo que os primers que mais se destacaram em relação ao número de bandas foram UBC 818 (12, 96%) e UBC 842 (11, 11%). Duarte (2011) trabalhou com a espécie Ficus bonijesuslapensis R.M. Castro e selecionou nove primers, sendo oito do tipo UBC. Com isso, detectou 75 locos, onde observou o número mínimo de loco nos primers JOHN e UBC 825 (5 locos cada) e o número máximo de locos no primer UBC 857 (18 locos). Fica clara a eficiência do primer UBC 842 e UBC 857 na detecção de bandas em diferentes espécies, tornando-o potencialmente aceito em outros trabalhos genéticos. 41 Número ótimo de locos O número ótimo de locos para se estimar confiavelmente a diversidade genética para esse trabalho foi de 76 locos. A figura 1 mostra o aparecimento dos locos utilizando o primer UBC 827. L 71- 72- 73- 74- 76- 77- 78- 79- 80 Figura 1. Padrão de fragmentos ISSR resultantes da amplificação do primer UBC 827 de 12 plantas de Copernicia prunifera. L = Ladder, com cem pares de bases nitrogenadas. A partir desse número (76 locos) a correlação atingiu 0,998 (máximo = 1) e valor de estresse de 0,043 (Figura 2). Segundo KRUSKAL (1964) quando o valor de estresse é igual ou menor que 0,05 as estimativas são de alta exatidão. Como neste estudo o número de locos encontrado (n = 93) foi bem acima do estabelecido com número ótimo (n = 76), pode-se inferir que as estimativas de diversidade genética que foram obtidas entre os indivíduos de C. prunifera apresentaram excelente precisão. Ferreira (2011) estimou 41 bandas para inferir com confiança a diversidade genética de Annona crassiflora Mart. Brandão (2008) utilizou marcadores moleculares UBC para caracterizar a diversidade genética de Myrcia splends (Sw.) DC. e estimou em 55 bandas como número ótimo. Torezan et al. (2005) observaram que 50 bandas eram suficientes para estimar a variabilidade genética de Aspidosperma polyneuron Mueller Argoviensis Mart. 42 Figura 2. Estimativas das correlações (A) entre as similaridades genéticas obtidas pela análise bootstrap para números crescentes de marcadores ISSR polimórficos e valores de estresse (B), que indicam o número mínimo ideal de bandas para as análises genéticas de Copernicia prunifera (76 bandas). Valor de PIC O PIC de cada inicializador utilizado foi calculado e variou ente 0,057 e 0,444 (Tabela 1). O mesmo serve para definir o quão eficiente é o marcador molecular em relação à detecção de polimorfismo entre indivíduos (RESENDE et al., 2009; DUARTE, 2011). Segundo Botstein et al. (1980), os marcadores moleculares são classificados como satisfatório em conteúdo informativo quando apresentam PIC superior a 0,5, mediamente informativos com valores que vão de 0,25 a 0,5 e pouco informativo com valores inferiores a 0,25. Seguindo essa classificação, a maior parte dos marcadores moleculares do presente trabalho é tida como mediamente informativos (cinco marcadores), os demais são pouco informativos (dois marcadores). Oliveira et al. (2010) utilizando sete marcadores SSR na espécie Euterpe oleracea Mart. (açaí) encontraram valores de PIC variando entre 0,60 e 0,86, sendo esses marcadores muito informativos de acordo com a classificação de Botstein et al. (1980), superando os marcadores ISSR utilizados no presente trabalho. Ferreira (2011), trabalhando com Annona crassiflora, selecionou 10 primers, onde todos foram classificados como medianamente informativos, pois os valores de PIC para cada primer variou entre 0,34 e 0,47. 43 Diversidade Genética O valor médio dos alelos observados foi de 2,00, alelos efetivos 1,46 e índice de diversidade de Nei igual a 0,288. Pádua (2011) utilizando marcadores ISSR analisou a diversidade genética em 10 populações naturais de Eremanthus erythopappus (DC.) Macleish no Estado de Minas Gerais e obteve valores médios de 1,79 para alelos observados, 1,53 alelos efetivos e 0,30 para a diversidade genética de Nei, ou seja, as populações de E. erythopappus e a população de C. prunifera do presente trabalho apresentaram diversidade genética semelhante. O índice de Shannon no presente trabalho foi de 0,44. Segundo Pádua (2011) o valor desse índice pode variar entre 0 e 1, sendo que quanto mais próximo de 1 mais diversificada genotipicamente é a população. Tomando por base essa definição, podemos observar que a população estudada possui diversidade genética intermediária. Roncal et al. (2006) estudando a variabilidade genética de uma população de Geonoma macrostachys Mart. (Arecaeae), por meio de marcadores ISSR, encontraram valores inferiores para diversidade de Nei (0,227) e para o índice de Sannon (0,323), quando comparados com os valores encontrados no presente trabalho. Essa menor diversidade pode está relacionada com o isolamento geográfico que a população estudada de G. macrostachys apresenta. Estrutura genética espacial Na parcela foram identificados nove indivíduos adultos (com evento reprodutivo) com altura média de 8,11 metros, cinco indivíduos jovens (sem eventos reprodutivos) com altura média de 4,05 metros e 23 regenerantes (com altura variando entre 20 cm e 1,07m). A figura 3 ilustra a distribuição dos indivíduos na parcela. 44 40,00 35,00 Metros (Y) 30,00 25,00 20,00 Regenerantes Jovens 15,00 10,00 2,00 6,00 2 4,00 4 6 8,00 8 10,00 10 12,00 12 14,00 14 16,00 16 18,00 18 20,00 20 Metros (X) Figura 3: Distribuição dos indivíduos de C. prunifera na parcela (20 m x 40 m). Os resultados estatísticos não apontaram grau de parentesco entre os indivíduos, independentemente da distância geográfica entre eles (Figura 4). O pico de maior proximidade genética (coancestria) foi registrado na distância de quatro metros, enquanto que o pico de divergência genética foi observado na distância 14 metros, entretanto, todos não significativos. 0,08 0,06 Coancestria 0,04 0,02 0,00 -0,02 2 4 5 7 14 23 -0,04 -0,06 -0,08 Distância (m) Figura 4: Relação entre grau de parentesco (coancestria) e as classes de distância entre os indivíduos. ----- Intervalo de confiança; Valor de coancestria. 45 Possivelmente o sistema de dispersão por morcegos (QUEIROGA et al. 2013) esteja contribuindo diretamente para a falta de estruturação genética espacial dentro da população estudada, podendo a C. prunifera ter suas sementes dispersas aleatoriamente por dezenas ou centenas de metros. Porém, a ausência de estruturação genética espacial observada na população não significa que não existam indivíduos aparentados. Ferreira (2011) encontrou coeficiente de coancestria significante na classe de distância compreendida entre 98 e 288 metros em uma população de Annona crassiflora no Estado de Minas Gerais-Brasil. Brandão et al. (2011) encontrou valor de coancestria positivo na classe de distância correspondente a 70 metros para populações de Myrcia splendens (SW.) DC. em sistema de fragmentos-corredores na região sul de Minas Gerais. Esses dados mostram que os indivíduos das duas populações das espécies distintas citadas acima são mais aparentados das árvores mais distantes, ou seja, quanto mais próximos espacialmente forem os indivíduos, menos aparentados eles serão, enquanto que no presente trabalho a distribuição genética espacial dos indivíduos foi aleatória para todas as classes de distância. Os fatores que podem levar uma população a apresentar estrutura genética espacial significativa são, principalmente, o efeito fundador (população originada por um ou poucos genótipos), deriva genética (oscilação aleatória das frequências alélicas ao longo do tempo) e dispersão restrita de sementes (DEFAVARI et al. 2009). Diante do exposto, se faz necessário a realização de estudos que determinem a variação genética espacial entre populações e entre estágios de desenvolvimento (regenerantes, jovens e adultos) dentro das populações. CONCLUSÃO Os marcadores ISSR deste estudo se mostraram eficientes para a quantificação da diversidade genética da C. prunifera, e para identificar o polimorfismo entre os indivíduos na população. Com isso, foi possível a obtenção de vários parâmetros, como diversidade e estrutura genética, utilizados na definição de estratégias de conservação das populações naturais. A população estudada apresentou diversidade genética elevada e EGE aleatória, mostrando não haver relação de parentesco significativo entre os indivíduos independentemente da distância entre eles. 46 AGRADECIMENTOS Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pelo auxílio financeiro concedido, processo de nº 562828/2010-9. REFERÊNCIAS ANDERSON, J. A.; CHURCHILL, G. A.; AUTRIQUE, J. E.; TANKSLEY, S. D.; SORRELLS, M. E. Optimizing parental selection for genetic linkage maps. Genome, v. 36, p. 181-186. 1993. ARRUDA, G. M. T.; CALBO, M. E. R. Efeitos da inundação no crescimento, trocas gasosas e porosidade radicular da carnaúba (Copernicia prunifera (Mill.) H.E. Moore). Acta Botânica Brasileira, v. 18, n. 2, p. 219-224. 2004. BOTSTEIN, D.; White R. L.; Skolnick, M.; Davis R. W. Construction of a genetic linkage map in man using restriction fragment length polymorphisms. The American Journal of Human Genetics, v. 32, p. 314-331. 1980. BRANDÃO, M. M.; VIEIRA, F. 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Genomics, 20: 176-183. 1994. 50 Capítulo 3: DIVERSIDADE E ESTRUTURA GENÉTICA EM DIFERENTES ESTÁGIOS DE DESENVOLVIMENTO DE Copernicia prunifera (Miller) H. E. Moore NO SEMIÁRIDO POTIGUAR Rodrigo Ferreira de Sousa, Cristiane Gouvêa Fajardo, Fábio de Almeida Vieira RESUMO O objetivo deste trabalho foi estudar a diversidade e estrutura genética em diferentes estágios de desenvolvimento de uma população natural de Copernicia prunifera, em uma população remanescente (n = 101) em região semiárida do Nordeste do Brasil. Com o uso de sete marcadores moleculares ISSR foi possível analisar 93 locos com 100% de polimorfismo. Os indivíduos amostrados foram classificados em regenerantes (n = 62), jovens (n = 20) e adultos (n = 19), com base nas classes de altura e eventos reprodutivos. Os regenerantes apresentaram maior diversidade genética (He = 0,411 e Ho = 0,599), seguido pelos jovens (He = 0,394 e Ho =0,579) e adultos (He = 0,267 e Ho = 0,427). A AMOVA mostrou que a maior variação genética ocorre dentro dos estágios de vida (93,42%) quando comparado entre eles (6,58%). Houve redução recente no tamanho populacional (bottleneck), conforme o número de locos com excesso de heterozigosidade para os dois modelos utilizados (IAM = 92 e SMM = 91). Todos os estágios de desenvolvimento apresentaram estruturação genética espacial (EGE), com valores de coancestrias positivos e significativos, sendo os valores de Sp de 0,040 para os regenerantes, 0,093 para jovens, 0,156 para adultos e 0,53 para a população geral. A EGE aumenta no sentido de regenerantes para adultos, indicando que as plantas adultas foram geradas de progenitores aparentados. Os dados do presente estudo podem ser úteis na elaboração de plano de manejo e conservação efetiva da espécie. PALAVRAS-CHAVES: Carnaúba, Genética de populações, Variabilidade genética, Estágios de vida DIVERSITY AND GENETIC STRUCTURE IN DIFFERENT STAGES OF DEVELOPMENT OF Copernicia prunifera (Miller) H. E. Moore IN SEMI-ARID POTIGUAR ARSTRACT The objective of this work was to study the genetic diversity and structure in different stages of development of a natural population of Copernicia prunifera, in a remnant population (n = 101) in the semiarid region of northeast Brazil. Using seven ISSR molecular markers was possible to analyze 93 loci with 100% polymorphism. The sampled individuals were classified as regenerating (n = 62), young (n = 20) and adults (n = 19), based on the height classes and reproductive events. Saplings had higher genetic diversity (He = 0.411 and Ho = 0.599), followed by youth (He = 0.394 and Ho = 0.579) and adults (He = 0.267 and Ho = 0.427). The AMOVA showed that most genetic variation occurs within the stages of life (93.42%) when compared between them (6.58%). There was a recent reduction in population size (bottleneck), as the number of loci with heterozygosity excess for the two models used (IAM = 92 and SMM = 91). All stages of development showed spatial genetic structure (EGE), with values coancestry 51 positive and significant, with values of Sp 0.040 for saplings, 0.093 for youth, 0.156 for adults and 0.53 for the full population. The EGE increases towards regenerating adult, indicating that the plants were generated from adult related progenitors. Data from this study may be useful in designing effective management and conservation of the species plan. KEYWORDS: Carnauba, Population genetics, Genetic variability, Stages of life INTRODUÇÃO As populações existem em ambientes que variam no tempo e espaço, sofrendo interferência de diversos fatores, como clima, desastres naturais, ataques de patógenos, herbívoros, entre outros. Essas interferências podem ter influência direta nas alterações da estrutura e diversidade genética, além da distribuição geográfica das espécies (WHITE; WALKER 1997). A distribuição genética das espécies expressa um padrão e esse pode revelar parte da sua biologia, como forma de dispersão dos frutos, polinizadores, entre outras características (MORAES et al., 2004; GUSSON et al., 2005; GONÇALVES et al., 2010). Populações pouco diversificadas geneticamente apresentam alta vulnerabilidade para fatores maléficos como doenças e patógenos que podem dizimá-las, enquanto que populações com maior número de genótipos diferentes em sua composição apresentamse mais resistentes em relação a esses deletérios (FALK et al. 2001; SILVA, 2010). A diversidade genética é o fator primordial para que as espécies possam evoluir ao longo do tempo e se adaptar as mudanças ambientais. A atual composição genética de uma população influência a forma de como os seus membros irão se adaptar as mudanças ambientais futuras (VALLE et al. 2013). O conhecimento da diversidade e estrutura genética de uma espécie é fundamental no que tange ao manejo, conservação ou domesticação da mesma (FALK et al., 2001; VALLE et al. 2013). Uma forma de se acessar informações sobre a estrutura genética populacional é empregando-se marcadores moleculares, por exemplo, do tipo ISSR (Inter Simple Sequence Repeat). O polimorfismo detectado por essa técnica possui natureza binária, comportando-se de maneira dominante pela detecção de apenas um alelo por loco (FERREIRA; GRATTAPAGLIA, 2008). Através da análise feita com os marcadores ISSR’s é possível observar quão diversificada é a população bem como sua estrutura genética em determinado local. Do ponto de vista conservacionista essas observações podem contribuir de forma direta na 52 elaboração de planos que visem o desenvolvimento de técnicas como reflorestamento e manejo, que possam permitir a perpetuação da espécie, além de dar condições de se fazer uma regeneração em áreas degradadas (SEBBEN, 2002; SOUZA et al., 2010, FALEIRO, 2007; GOÇALVES et al., 2010). Quando se pretende elaborar um plano de conservação in situ de uma espécie como C. prunifera, por exemplo, é imprescindível que se tenham o conhecimento de vários fatores como os níveis de variabilidade genética e a distribuição espacial dos genótipos dentro das populações estudadas. Os trabalhos já realizados sobre estrutura genética mostram que os indivíduos mais próximos tendem a ser mais aparentados e que geralmente há maior diversidade genética dentro dos estágios de vida quando comparado entre eles (LACERDA; KAGEYAMA. 2003; ROSSATO et al. 2007; REIS et al. 2009) Diante do exposto o presente trabalho teve como objetivo determinar o padrão de distribuição e variabilidade genética espacial entre os estágios de vida (regenerantes, jovens e adultos) de uma população de carnaúba utilizando marcadores moleculares ISSR’s. MATERIAL E MÉTODOS Local de estudo Foi estudada uma população natural de carnaúba localizada no município de Macaíba (5°53’57”S, 35°22’59”W) (Figura 1), Rio Grande do Norte, que se encontra na Mesorregião Leste Potiguar. A região apresenta pluviosidade média de 1243,5 mm/ano (EMPAR, 2007) e solos, predominantemente, do tipo Latossolo Vermelho-Amarelo e Podzólico Vermelho-Amarelo (MME, 2005). 53 Fonte: Rocha, T. G. F. 2013 Figura 1: Localização geográfica do município de Macaíba e distribuição espacial de todos os indivíduos de C. prunifera na população estudada, RN – Brasil. Segundo a classificação de Köpen o clima dessa região é uma transição entre As’ e BSh’, com verão seco e inverno chuvoso. A vegetação local é predominantemente Caatinga (arbórea e arbustiva) e vegetação de transição com a Mata Atlântica (MME, 2005), onde é possível detectar um elevado grau de atividades antrópicas, como desmatamento e construção de estrada. Essa população remanescente de carnaúba foi escolhida porque que apresenta nitidamente os três principais estágios de sucessão ecológica: regenerante (com altura variando entre 0,20-1,00 metro), jovem (com altura superior a 1,00 metro e sem evento 54 reprodutivo) e adulto (com evento reprodutivo), e por está inserida em área sujeita a desertificação (FREIRE, et al. 2011), sendo prioritária para a conservação. Espécie alvo do estudo Copernicia prunifera tem sua distribuição natural no nordeste brasileiro, possui caule ereto, único e com uma característica peculiar que são as bainhas ou bases remanescestes das folhas que caíram (RODRIGUES et al. 2013). O mesmo é empregado na construção civil e rural, como construção de casas, currais, entre outros. As folhas são palmadas, perenes, numerosas (45-60 folhas por individuo) e a copa é arredondada. A inflorescência apresenta-se ramificada e mais longa que as folhas. Os frutos são esféricos, quando maduros possuem epicarpo escuro e liso, tendo sua dispersão realizada por morcegos. As raízes são fasciculadas e possuem propriedades medicinais (QUEIROGA et al., 2013; RODRIGUES et al., 2013; TAVEIRA et al., 2014). Amostragem Foram amostrados 101 indivíduos de carnaúba, onde todos foram georeferenciados espacialmente para análise de estrutura genética. Em conjunto, foi demarcada uma parcela medindo 20 m (Leste-Oeste) x 40 m (Norte-Sul), que englobou todos os indivíduos amostrados, dos quais foram tomadas as distâncias dos eixos x e y da parcela. As amostras foliares foram coletadas, colocadas em tubos eppendorf (2 ml) contendo CTAB 2 X, identificadas e conduzidas para o Laboratório de Genética e Melhoramento Florestal – UFRN, Macaíba/RN. Em seguida estas foram armazenadas em freezer a -20ºC, até o momento da extração do DNA. Extração do DNA, PCR e eletroforese A extração do DNA foi realizada utilizando o método CTAB, proposto por Doyle e Doyle (1987), em seguida o material extraído foi armazenado em freezer a -20 º C até a hora do uso, seguindo a metodologia descrita no capítulo 2. Foi realizada a amplificação dos fragmentos de DNA pela Reação da Polimerase em Cadeia (PCR), utilizando Termociclador automático Veriti, com bloco de 96 poços (capítulo 2). Os produtos da PCR foram submetidos à eletroforese em cuba horizontal, em gel de agarose 1,5% (p/v), em tampão TBE 0,5X (Tris-Borato EDTA), a uma 55 voltagem de 120 V, por duas horas e meia. Foi utilizado o marcador de peso molecular (Ladder) de 100 pares de bases. Decorrido o tempo de eletroforese, os géis foram retirados da cuba e fotografados sobre fonte de luz ultravioleta com auxílio do equipamento E-Box VX2, revelando os fragmentos de DNA corados com GelRedTM. Análise dos dados Diversidade genética Para analisar a diversidade genética dentro da população estudada, foi utilizado o programa POPGENE versão 1.3 (YEH et al. 1997), onde foram analisados o número de alelos observados (na), número de alelos efetivos (ne), diversidade genética de Nei (He) e Índice de Shanon (Ho), para cada estágio de vida. Estrutura genética populacional O programa ALERQUIM 3.1 (EXCOFFIER et al., 2007) foi utilizado para calcular a Análise de Variância Molecular (AMOVA) entre os estágios de vida da população estudada. Essa análise é um método de estimar a diferenciação populacional a partir de dados moleculares e testes de hipóteses sobre tal diferenciação. Os marcadores moleculares, no caso os ISSR’s, foram os responsáveis por fornecer dados para a realização da AMOVA (EXCOFFIER et al. 1992). O programa NTSYS (ROHLF, 1993) foi utilizado para produzir um dendograma usando a média aritmética não ponderada para agrupamento aos pares (UPGMA), correlacionando os diferentes estágios de vida detectados na população em relação à identidade genética de Nei (1978). Estrutura genética espacial Para a estrutura genética espacial (EGE), foi estimado o valor de coancestria entre os pares de indivíduos para as diferentes classes de distância, para o número total de plantas e para cada um dos três estágios: regenerantes, jovens e adultos (HARDY, 2003), com o uso do programa SPAGeDi, versão 1.2g (HARDY; VEKEMANS, 2002). Para analisar a intensidade da EGE nas diferentes classes de desenvolvimento de vida dos indivíduos de C. prunifera foi calculada a estatística Sp através da fórmula Sp = blog/(1 - Fij(1)), onde -blog é a inclinação da curva de regressão do coeficiente de 56 coancestria e Fij(1) é a medida do coeficiente de coancestria da primeira classe de distância (Fij). Detecção de gargalos genéticos Foi realizada uma análise para detectar se houve redução no tamanho efetivo populacional, e consequentemente redução da diversidade genética, a partir de dados de frequências alélicas através do programa Bottleneck versão 1.2 (CORNUET; LUIKART, 1996), utilizando os modelos IAM (Modelo de Alelos Infinitos) e SMM (Modelo de Passos de Mutação). Esse dois modelos foram usados para calcular a heterozigosidade esperada da população em equilíbrio de mutação-deriva, e a partir desse ponto, comparar com o nível de heterozigosidade encontrada no presente trabalho. O modelo de mutação para os locos ISSR é intermediário entre o IAM e o SMM, sendo assim ambos foram utilizados. Foi empregado o teste do sinal (α = 0,05) para apontar gargalo genético recente significativo tendo como base a frequência dos alelos (CORNUET; LUIKART, 1996). 57 RESULTADOS E DISCUSSÃO Aspectos demográficos Dos 101 indivíduos amostrados 62 foram classificados como regenerantes (com altura entre 0,20-1,00 metro), 20 como indivíduos jovens (com altura superior a um metro e sem eventos reprodutivos) e 19 como adultos (com eventos reprodutivos) (Figura 2 e 3). Vários trabalhos apontam uma diminuição significativa do número de indivíduos da fase regenerantes para a fase adulta. Essa redução pode ser consequência de efeitos como ataques de herbívoros, fungos, seleção natural, entre outros (RUSCHEL et al., 2006; VIEIRA et al., 2008; REIS et al. 2009). Metros Todos os indivíduos 40 35 30 25 20 15 10 5 0 0 5 10 Metros 15 20 Figura 2: Posição e distribuição espacial dos três estágios de desenvolvimento da Copernicia prunifera. Macaíba, RN. 58 Indivíduos regenerantes (A) 39 Metros (Y) 34 29 24 19 14 0 5 10 Metros (X) 15 20 Metros (Y) Indivíduos jovens (B) 40 35 30 25 20 15 10 5 0 0 5 10 15 20 Metros (X) Metros (Y) Indivíduos adultos (C) 40 35 30 25 20 15 10 5 0 0 5 10 15 20 25 Metros (X) Figura 3: Posição e distribuição espacial dos regenerantes (A), jovens (B) e adultos (C) de Copernicia prunifera. Macaíba, RN. 59 Polimorfismo genético Dos 17 primers testados, 12 amplificaram o DNA da carnaúba. Desses, sete (7) foram selecionados (Tabela 1) e detectaram 93 locos com 100% de polimorfismo. Srivashtav et al. (2013) utilizaram dois marcadores moleculares ISSR para avaliar a diversidade genética da espécie Phoenix dactylifera L. (Arecaceae) em uma região da Índia. No total encontraram 13 locos, sendo 10 polimórficos e 3 monomórficos. No presente trabalho os marcadores ISSR foram mais eficientes na caracterização genética, pois os sete iniciadores selecionados apresentaram 100% de polimorfismo. Roncal et al. (2006) avaliaram a distinção taxonômica de duas variedades de Geonoma macrostachys Mart. (Arecaeae) na região amazônica utilizando marcadores ISSR e observaram 99 locos, dos quais 51,52% foram polimórficos. Os marcadores utilizados no presente estudo foram mais eficientes na detecção de polimorfismo quando comparados com os utilizados por Roncal et al. (2006). Tabela 1. Sequência de nucleotídeos dos primers ISSR, número de locos e o valor de PIC de cada primer. Número de Sequencia (5’ – 3’) PIC Primer ISSR Locos UBC 813 (CT)8-T UBC 827 (AC)8G UBC 840 (GA)8-YT UBC 841 (GA)8-YC UBC 842 (GA)8-YG UBC 857 (AC)8-YG UBC 859 (TG)8-RC CTCTCTCTCTCTCTCTT 11 0,280 ACACACACACACACACG 9 0,264 GAGAGAGAGAGAGAGAYT 12 0,393 GAGAGAGAGAGAGAGAYC 18 0,444 GAGAGAGAGAGAGAGAYG 17 0,419 ACACACACACACACACYG 14 0,079 TGTGTGTGTGTGTGTGRC 12 0,057 13,28 0,277 Média R = purina (A ou G) e Y = pirimidina (C ou T) Diversidade genética Na tabela 2 estão expostos os valores dos índices de diversidade genética da população integral, dos regenerantes, dos indivíduos jovens e dos indivíduos adultos de carnaúba. 60 Tabela 2: Medidas de diversidade genética para os estágios de vida da Copernicia prunifera. Macaíba, RN n Locos polimórficos/% Na Ne He Ho Regenerantes 62 93/100% 2,00 1,728±0,219 0,411±0,079 0,599±0,086 Jovens 20 93/100% 2,00 1,689±0,242 0,394±0,095 0,579±0,108 Adultos 19 93/100% 2,00 1,397±0,215 0,267±0,114 0,427±0,146 Todos 101 93/100% 2,00 1,667±0,209 0,390±0,079 0,576±0,088 Tamanho da amostra (n), Número de alelos observados (Na), Número de alelos efetivos (Ne), Índice de Nei (He), Índice de Shannon (I). Os valores representam a média ± erro padrão. Os valores dos alelos observados, locos polimórficos e porcentagem de locos polimórficos foram iguais para a população integral e para os três estágios de desenvolvimento. Os regenerantes foram os que mais se destacaram em termos de maior diversidade genética (He = 0,411 e I = 0,599), seguidos pelos jovens e adultos. Os menores índices de diversidade foram encontrados na classe adulta (He = 0,267 e I = 0,427), possivelmente pelo fato de serem remanescentes de uma população que sofreu um gargalo genético. Tal fato foi comprovado pelo teste de gargalo genético (bottleneck). As diferenças significativas entre os níveis de diversidade genética das gerações dentro da população pode ser consequência da seleção natural, deriva genética ou entrada de genótipos oriundos de outras localidades. Vieira et al. (2012) relatam que perturbações ambientais, dispersão de sementes limitada próximo à planta-mãe e baixa densidade de adultos reprodutivos podem determinar os diferentes níveis de parentesco entre os indivíduos e entre os estágios de vida, bem como o grau de diversidade genética da população. Conte et al. (2003), utilizando aloenzimas, verificaram a variabilidade genética dos estágios de desenvolvimento de uma população de Euterpe edulis Mart. e observaram não haver diferenças significativas entre os valores do índice de diversidade genética de Nei entre os regenerante, jovens e adultos. Os autores atribuíram à semelhança de diversidade genética entre os níveis de desenvolvimento ao elevado número de indivíduos adultos na população que é suficiente para opor-se à perda natural da variabilidade por deriva genética. A diferença significativa dos níveis de diversidade genética entre os estágios de vida da população pode está associado a entrada de genótipos oriundos de outras 61 populações ou ao cruzamento ao acaso entre os indivíduos adultos da população estudada. Em um estudo genético utilizando marcadores ISSR’s, realizado com a palmeira G. macrostachys na floresta tropical peruana, os pesquisadores encontraram os seguintes valores: diversidade genética de Nei (0,227) e índice de Shannon (0,323) (RONCAL et al., 2006). Analisando os parâmetros de diversidade genética percebe-se que a população de C. prunifera do presente estudo apresenta-se mais diversificada quando comparada com a população de G. macrostachys. Estrutura genética A análise de variância molecular (AMOVA) indicou que há maior variação genética dentro dos estágios de desenvolvimento (93,42%) do que entre os mesmos (6,58%) (Tabela 3). Diversos estudos corroboram com os dados do presente trabalho (SEOANE et al. 2005; REIS et al. 2009; BUTTOW et al. 2010). A maior variação molecular dentro dos estágios de desenvolvimento pode ser explicada por fatores como mutações, fluxo gênico, seleção natural, entre outros. A maior variação genética dentro dos estágios de vida do presente estudo pode está ligada ao fato dos jovens e regenerantes serem resultados dos cruzamentos entre os adultos da população estudada e/ou entrada de genótipos oriundos de outras populações de C. prunifera. Tabela 3: Análise de variância molecular (AMOVA) da população geral e entre os estágios de desenvolvimento de Copernicia prunifera. 124,090 Componentes da variância 1,48111 Porcentagem de variação 6,58 98 2059,336 21,01363 93,42 Total 100 2183,426 22,49474 Índice de fixação Fst: 0,0658 Fonte de variação GL SQ Entre estágios de vida 02 Dentro dos estágios de vida GL: grau de liberdade, SQ: soma dos quadrados dos desvios. Dendrograma Utilizando a identidade genética de Nei foi possível observar que os três estágios de vida são próximos geneticamente. A maior similaridade genotípica foi observada entre os jovens e regenerantes (Figura 4). 62 Figura 4: Dendrograma de UPGMA utilizando a identidade genética de Nei para representar graficamente a relação entre os diferentes níveis de desenvolvimento da Copernicia prunifera, Macaíba, RN. ADT: adultos, JOV: jovens, REG: regenerante. Seoane et al. (2005) analisaram a estrutura genética entre gerações de Euterpe edulis Mart. utilizando marcadores microssatélites (SSR) e constataram que as plântulas e os adultos não foram divergentes geneticamente, enquanto que as progênies/adultos e progênies/plântulas apresentaram divergência significativa entre elas. Segundo os autores essas alterações podem ser causadas por seleção natural, deriva genética e migração. A proximidade entre os estágios de vida da população de C. prunifera acontece porque os jovens e regenerantes possuem as bases genéticas proveniente dos adultos, ou seja, o grupo dos adultos foram os responsáveis, pelo menos em parte, pela existência dos jovens e regenerantes. Testes de gargalo genético (bottleneck) No modelo IAM, o número esperado de locos com excesso de heterozigosidade foi de 37,09, enquanto que os resultados mostraram 92 locos com excesso de heterozigosidade, ou seja, o valor observado foi maior que o dobro do esperado e significativo pelo teste do sinal (P < 0,0001). Para o SMM o valor esperado de locos com excesso de heterozigosidade foi de 42,59, porém o valor observado foi bem superior (91 locos), ocorrendo também diferença estatística significativa pelo teste do sinal (P < 0,0001). A análise de gargalo genético apontou que a população sofreu uma forte redução do tamanho efetivo populacional, possivelmente consequência da ação humana no local, como a construção de uma rodovia que separa a população em dois 63 grupos de plantas remanescentes. Além disso, foi detectado corte de plantas de C. prunifera e de outras espécies na área estudada. Segundo Deshpande et al. (2001), uma possível explicação para os elevados números de locos com excesso de heterozigosidade está no fato dos marcadores ISSR tenderem a gerar mais polimorfismo quando comparado com outros marcadores como AFLP e RAPD, por exemplo. Neste caso, o uso simultâneo de diferentes marcadores moleculares poderia elucidar esta hipótese. Estrutura genética espacial Os estágios de desenvolvimento regenerantes e jovens apresentaram relação positiva de parentesco até a primeira classe de distância, enquanto que a população integral e o estágio adulto apresentaram relação significativa de parentesco até a segunda classe de distância (Figura 5 e 6). Sendo assim, a similaridade genética foi maior quando os indivíduos se localizavam até, aproximadamente, 8 metros de distância entre si. Os regenerantes apresentaram relação negativa de parentesco na quarta classe de distância (aproximadamente 13 metros). Nos intervalos seguintes a distribuição ocorreu de forma aleatória. Nos jovens e adultos a divergência genética entre os indivíduos foi significativa na terceira classe de distância, sendo que os jovens apresentaram dissimilaridade novamente aos 33 metros (sexta classe de distância). População integral 0,25 Coancestria 0,15 0,05 -0,05 5 9 12 15 18 38 -0,15 -0,25 Distância (m) Figura 5: Correlograma do coeficiente de coancestria da População integral de Copernicia prunifera. Macaíba, RN. . ----- Intervalo de confiança; Valor de coancestria. 64 Regenerantes (A) 0,25 Coancestria 0,15 0,05 -0,05 4 6 10 13 16 24 -0,15 -0,25 Distância (m) Coancestria 0,25 Jovens (B) 0,15 0,05 -0,05 4 10 17 21 26 33 18 36 -0,15 -0,25 Distância (m) 0,25 Adultos (C) Coancestria 0,15 0,05 -0,05 4 8 12 14 -0,15 -0,25 Distância (m) Figura 6: Correlogramas dos coeficientes de coancestria dos regenerantes (A), jovens (B) e adultos (C) de Coperncia prunifera. Macaíba, RN. ----- Intervalo de confiança; Valor de coancestria. Os resultados da estatística Sp mostraram haver estruturação genética na população integral bem como no estágios de desenvolvimento (P < 0,05) (Tabela 4). Na primeira classe de distância o valor de Sp é mais elevado na categoria dos indivíduos adultos (0,156), seguida pelos jovens (0,093) e regenerantes (0,040). 65 Tabela 4: Caracterização da estrutura genética espacial de Copernicia prunifera na população geral e nos estágios de desenvolvimento, incluindo para cada população o n (número de indivíduos amostrados), o coeficiente de coancestria (Fij) para primeira classe de distância, Blog, estatística Sp, erro padrão (SE) e valor de significância (P). n Fij Blog Sp SE P Regenerantes 62 0,069 -0,036 0,040 0,003 0,000 Jovens 20 0,172 -0,077 0,093 0,007 0,000 Adultos 19 0,211 -0,123 0,156 0,010 0,000 Pop. Geral 101 0,083 -0,048 0,053 0,004 0,000 Seoane et al. (2005) investigaram o sistema de reprodução de duas populações de E. edulis, sendo uma fragmentada e outra contínua, utilizando marcadores de microssatélites e encontraram maior valor de coancestria entre as progênies da segunda população (Fij = 0,222), quando comparado com o valor da primeira (Fij = 0,193). Brandão et al. (2011), utilizaram 10 primers ISSR para caracterizar a distribuição genética de Myrcia splendens (SW.) DC., em sistema fragmento-corredor na região sudeste do Brasil e encontraram valor positivo de coancestria em dois corredores de vegetação, nos intervalos de 20 e 70 metros de distância. Diversos autores relataram que a estruturação genética entre os estágios de vida de uma população pode ser um modelo comum das espécies arbóreas tropicais, sendo assim, a C. prunifera enquadra-se nesse modelo, pois é uma espécie arbórea nativa da região tropical do planeta (SEOANE et al., 2001; SOUZA et al., 2003; SEAONE et al. 2005). Uma possível explicação para a EGE ser encontrada nas primeiras classes de distância está na dispersão restrita de sementes, onde grandes números de frutos são encontrados caídos próximos às plantas-mães (DEFAVARI et al. 2009). No presente trabalho observou-se que a EGE aumenta no sentido de regenerantes para adultos, sugerindo que as plantas adultas são oriundas de progenitores aparentados. Resultados semelhantes foram encontrados por Latouche-Halle et al., (2003) e Kalisz et al. (2001), onde este último encontrou ainda menor índice de diversidade genética para os adultos, corroborando com a hipótese de que a maior estruturação genética espacial está inversamente relacionada com a diversidade genética. De fato, os estágios primários da C. prunifera apresentaram maior He e menor 66 EGE, já o estágio final de desenvolvimento (adultos) possuem menor He e maior EGE (Tabelas 1 e 3). CONCLUSÃO Entre os níveis de desenvolvimento de C. prunifera, os regenerantes apresentaram-se como os mais diversificados geneticamente. A maior variação genotípica foi encontrada dentro dos estágios de vida. Os estágios mais semelhantes geneticamente foram os jovens e os regenerantes. A análise de gargalo genético apontou que a população estudada sofreu uma grande redução populacional e consequentemente uma redução em termos de genótipos. Foi encontrada estruturação genética espacial até a segunda classe de distância para todos os níveis de desenvolvimento, mostrando que os indivíduos apresentam forte relação de parentesco em curtas distâncias. 67 CONSIDERAÇÕES FINAIS As informações de cunho genético contidas nesse estudo são inéditas para o gênero e para a espécie Coperncia prunifera, tendo grande importância para o conhecimento mais aprofundado da família Arecaceae, pois até o momento são poucos os estudos que utilizaram marcadores ISSR em espécies de palmeiras. Os dados obtidos no presente trabalho poderão contribuir de forma efetiva para a elaboração de planos de conservação e manejo adequado da Copernicia prunifera, levando em consideração os aspectos ecológicos e genéticos da espécie. A preservação dessa palmeira no Rio Grande do Norte é de fundamental importância, pois, além das relações ecológicas que ela exerce com o meio ambiente natural, a mesma é fonte de renda para muitas famílias rurais, sendo um fator importante no desenvolvimento econômico e social do município de Ipanguaçu e de várias outras cidades do estado potiguar. Com base no estudo de etnobotânica observou-se a necessidade de investimentos em tecnologias visando maior otimização na retirada e beneficiamento dos produtos da carnaúba, bem como a redução do desperdício do pó no processo de extração. Mais estudos de cunho genético ecológico devem ser feitos com a carnaúba, tanto no Rio Grande do Norte como em todo o nordeste, a fim de subsidiar medidas de preservação e detectar as principais populações para conservação in situ. 68 IMPLICAÇÕES PARA A CONSERVAÇÃO Conhecer a diversidade e a distribuição genética espacial da espécie ou população é um fator de extrema importância quando se pensa em elaborar planos de conservação. A partir dessas informações é possível, por exemplo, selecionar matizes para a produção de mudas com níveis elevados de diversidade genética (LOWE et al., 2005). O plano de conservação deve garantir que o tamanho e a estrutura da população (ex: número de indivíduos em idade reprodutiva) contenha diversidade genética capaz de mantê-la de forma contínua em longo prazo dentro do seu ambiente de ocorrência (HARRIS; JOHNSON, 2004). Embora não esteja na lista das espécies ameaçadas de extinção, a C. prunifera vem cada vez mais perdendo espaço para práticas agrícolas e a criação de camarão no estado potiguar (REIS et al., 2011). Na área onde foi desenvolvido o presente trabalho existem evidências de ações antrópicas maléficas para o desenvolvimento da espécie, como corte dos indivíduos e construção de rodovia. Com base nos resultados obtidos no presente estudo, recomenda-se selecionar as matrizes com, no mínimo, 12 metros de distância entre si, desse modo à probabilidade das matrizes serem aparentadas (geneticamente semelhantes) é bastante reduzida, contribuindo com a diversificação molecular da população. Além das informações genéticas, é importante levar em consideração as informações etnoecológicas sobre a carnaúba, pois a comunidade humana estudada demonstrou possuir informações relevantes, como: época de floração, frutificação e dispersor dos furtos. É necessário mais estudos sobre a espécie Coperncia prunifera em vários locais da região nordeste que envolvam o sistema reprodutivo, pois o mesmo influencia diretamente na diversidade e distribuição genética da espécie. 69 REFERÊNCIAS BRANDÃO, M. M.; VIEIRA, F. A.; CARVALHO, D. Fine-scale genetic structure of Myrcia splendens (Myrtaceae). Revista Árvore, v. 35, n. 5, p. 957-964. 2011. BUTTOW, M. V.; CASTRO, C. M.; SCHWARTZ E.; TONIETTOM, A.; BARBIERI, R. L. Caracterização molecular de populações de Butia capitata (Arecaceae) do sul do Brasil através de marcadores AFLP. Revista Basileira de Fruticultura, v. 32, n. 1, p. 230-239. 2010. CONTE, R.; NODARI, R. O.; VENCOVSKY, R.; REIS, M. S. Genetic diversity and recruitment of the tropical palm, Euterpe edulis Mart., in a natural population from the Brazilian Atlantic Forest. Heredity, v. 91, p. 401–406. 2003. CORNUET, J. M.; LUIKART, G. 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POPGENE, theuser-friendly shareware for population genetic analysis molecular biology and biotechnology center. Edmonton. 1997. 75 ANEXO I UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA PARA O LEVANTAMENTO ETNOBOTÂNICO DA Copernicia prunifera, A CARNAÚBA NO MUNICÍPIO DE IPANGUAÇU/RN. QUETIONÁRIO Data: ______/______/_______ Local: ASSENTAMENTO AGROVILA PICADA- IPANGUAÇU- RN Entrevistado:____________________________________________________ Sexo: Feminino ( ) Masculino ( ) Idade: ( ) até 30 ( ) De 30 a 50 ( ) De 50 a 70 ( ) + de 70 anos Nível de escolaridade: ( ( ) Analfabetos ( ) Fundamental incompleto ( ) Fundamental completo ) Ensino Médio completo ( ) Superior completo Profissão:_________________________________ 1. Há quanto tempo às populações de carnaúba estão nesse local? ( ) 10 anos ( ) entre 10 a 20 anos ( ) entre 20 a 30 anos ( ) entre 40 a 50 anos ( ) entre 50 a 60 anos ( ) entre 60 a 70 anos ( ) + de 70 anos ( ) Não souberam responder com precisão. 2. Qual a origem da população? ( ) semeada ( ) espontânea. 3. Como é a área? ( ) campo ( ) beira de caminho ( ) beira de mata ( ) interior de mata ( ) jardim ( ) horta ( ) pomar 4. Variabilidade fenotípica (existem tipos diferentes de carnaúba)? ( ) Sim ( ) Não ( ) Não souberam responder 5. Se responderam sim, quais são suas principais diferenças entre eles? ( ) Quanto ao tronco ( ) Quanto as folhas ( ) Quanto a raiz ( )Quanto aos frutos ( ) Quanto as flores ( ) NDA 6. Costuma avaliar a época de floração e frutificação das Carnaúbas? ( ) Sim ( ) Não ( ) Não acha interessante avaliar ( ) Não sabe pra que serve 7. O método de exploração convencional da carnaúba tem gerado ameaças à sobrevivência das espécies, como por exemplo, fazer a retirada de folhas novas para a produção de coberturas em carnaúba. Tem observado a extinção da espécie na região, através da exploração errada? ( ) Sim ( ) Não ( ) Não souberam responder 76 8. Se responderam sim, quais os tipos de exploração que tem conhecimento que estão levando a ameaça da espécie na localidade? 9. Existe alguma importância na renda local dos produtos derivados da carnaúba, como por exemplo, a cera de carnaúba, os produtos artesanais e etc? ( ) Sim ( )Não ( ) Não souberam responder 10. Existe algum subsídio através de cooperativas da região, para a produção de produtos derivados da carnaúba para o artesanato? ( ) Sim ( )Não ( ) Não souberam responder 11. Quanto ao uso da carnaúba, qual o seu conhecimento, e se explora a carnaúba qual a parte da planta que costuma mais explorar para a produção de produtos? COMESTIVEL ARTESANAL MEDICINAL FOLHA FRUTO RAIZ ESTIPE 12. Ao explorar a carnaúba corta tudo ou deixa um pouco em pé? ( ) Corta tudo ( ) deixa um pouco em pé ( ) Não costumo explorar a carnaúba 13. Tem algum conhecimento a respeito dos riscos de poda das folhas de carnaúba? ( ) Sim ( )Não ( ) Não souberam responder 14. Ao explorar a carnaúba, é utilizado algum equipamento de proteção, como por exemplo, óculos de proteção para os olhos? ( ) Sim ( )Não ( ) Não souberam responder 15. Existe alguma variação de preços na venda dos produtos derivados da carnaúba na região? ( ) Sim ( )Não ( ) Não souberam responder 16. Nos últimos anos houve alguma desvalorização dos produtos da carnaúba, como por exemplo, a cera de carnaúba? ( ) Sim ( )Não ( ) Não souberam responder 17. Em relação a produção de mudas. Já plantou? ( ) Sim ( )Não 18. E em relação ao seu crescimento, quanto tempo demora para crescer? 77 ( )dias ( ) meses ( )anos 19. Hoje em dia tem mais ou menos carnaúba do que antigamente? ( ) Existe mais carnaúba ( )Existe pouca carnaúba ( ) Não souberam responder 20. A carnaúba atrapalha alguma atividade agropecuária, por exemplo, intoxicação do gado? ( ) Sim ( )Não ( ) Não souberam responder 21. Algum animal se alimenta da carnaúba, dos frutos? Quais animais? ( ) Sim ( )Não 78