Ano 6 · Nº 22 · 2014 HPV Conheça tudo sobre o vírus que pode causar o câncer de colo do útero, o tipo de câncer mais comum entre as mulheres maranhenses. 66ª SBPC Acre vai receber o maior evento científico do país. ACIMA DO PESO Saiba como driblar a obesidade, doença que atinge 17% da população brasileira. A VOZ DA INTERNET Veja como essa ferramenta têm modificado as relações entre cidadania e liberdade. COMIDA ENVENENADA Agrotóxicos podem causar danos à saúde humana e ao meio ambiente. Cada vez mais, o Maranhão destacase na área de inovação tecnológica e científica. Para impulsionar esse avanço, o Governo do Estado e a Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão (FAPEMA) criaram o PATRONAGE, um sistema de administração de bolsas e auxílios. Vantagens do novo PATRONAGE: • Pedido e acompanhamento de solicitação de bolsa ou auxílio; • Gerenciamento de avaliação; • Cadastro de consultores ad-hoc e avaliação de proposta on-line; • Relatório parcial e final do projeto; • Solicitação de Renovação de Bolsa. O PATRONAGE é um instrumento indispensável para facilitar a gestão de informação e apoio logístico aos pesquisadores. O acesso foi aprimorado e agora está muito mais fácil, inclusive para estrangeiros. 2 Revista Inovação nº 22 / 2014 www.fapema.br/patronage Editorial Expediente Em 2014, pela primeira vez, a população brasileira teve acesso gratuito a uma vacina que protege contra câncer. O Ministério da Saúde disponibilizou doses da vacina para imunizar meninas de 11 a 13 anos contra o HPV, vírus responsável por 95% dos casos de câncer de colo do útero, que apresenta a primeira maior taxa de incidência entre os cânceres que atingem as mulheres no Maranhão e a segunda no Brasil, atrás apenas do de mama. Para esclarecer alguns mitos sobre a vacina e mostrar o que está sendo desenvolvido na área científica de nosso estado sobre o assunto, a matéria de capa desta edição da Revista Inovação traz a fala de especialistas e a história de Luiza, que teve que lutar contra um câncer de colo de útero por ter descuidado da saúde. Você vai ver que a prevenção ainda é o melhor remédio para evitar essa doença tão devastadora. Falando em ciência, a cidade de Rio Branco, no Acre, se prepara para receber a 66ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que traz o tema “Ciência e Tecnologia em uma Amazônia sem Fronteiras” e tem como proposta discutir o impacto que a ciência e tecnologia podem causar no conhecimento e desenvolvimento da Amazônia. Voltando à área da saúde, preparamos uma matéria especial sobre obesidade. Os dados sobre a doença são preocupantes, já que metade da população brasileira está acima do peso. Vamos mostrar os resultados de pesquisas que apontam que a maior aliada na luta contra os efeitos da doença, que acomete as pessoas cada vez Governadora do Estado do Maranhão Roseana Sarney Murad Secretário de Estado da Ciência, Tecnologia, Ensino Superior e Desenvolvimento Tecnológico José Ferreira Costa Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão - FAPEMA Diretora-Presidente Rosane Nassar Meireles Guerra Diretora Científica Cláudia Maria Coêlho Lopes mais cedo, ainda é a alimentação saudável. Você também vai ler nesta edição que a presença de agrotóxicos na plantação pode causar riscos à saúde humana e ao meio ambiente. Pesquisas realizadas com tomates e pimentões mostram que a utilização dessas substâncias pode interferir até no metabolismo dos vegetais. E por falar em vegetais, pesquisadoras maranhenses estão investigando as propriedades de alimentos naturais, como a amora e a soja, como alternativas para o desconforto sentido pelas mulheres durante a terapia de reposição hormonal. Quer saber mais detalhes sobre essa e outras pesquisas realizadas em nosso estado? Leia a Revista Inovação. Diretora Administrativo-Financeiro Stael Chaves Pereira Coordenadora do Núcleo de Difusão Científica - NDC Nathalia Ramos Editora responsável Priscila Cardoso Redação Carol Neves, Elizete Silva, Ivandro Coêlho, Tatiana Salles, Tayna Abreu e Venilson Gusmão Design Gráfico Patrícia Nicácio e Motta Junior Fotos Venilson Gusmão, Paulo Fernandes Keller, Roberto Santos Ramos e divulgação. Fale Conosco [email protected] Tel.: (98) 2109-1433 Tel.: (98) 2109-1435 Endereço Avenida Beira Mar, nº 342 - Centro São Luís - Maranhão - Brasil CEP: 65010-070 Tel: (98) 2109-1400 Fax: (98) 2109-1411 Uma nova voz para um novo mundo Riqueza que vem das mãos Sumário Vem aí a 66ª SBPC! 06 10 16 Reposição hormonal 44 Futuro ameaçado 50 22 De olho no HPV 32 O que você está comendo? 38 Obesidades, a grande vilã da vida saudável 6 Revista Inovação nº 22 / 2014 Vem aí a SPBC! A Fundação de Amparo à Pesquisa do Maranhão apresenta a produção científica do estado na 66ª Reunião Anual da SBPC, que será realizada em julho, no Acre Por Elizete Silva A s produções científicas produzidas no Maranhão e apoiadas pela Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão (FAPEMA) poderão ser vistas na 66ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), durante o período de 22 a 27 de julho de 2014, na Universidade Federal do Acre, em Rio Branco. Quem visitar o stand da Fundação instalado na ExpoT&C vai conhecer trabalhos desenvolvidos nas mais diversas áreas. No local, além de livros, revistas e CDs com a temática Ciência, Tecnologia & Inovação, estarão expostos folders e revistas das áreas de Turismo, Cultura, Indústria e Comércio, revelando um estado com uma carta de investimentos de R$ 100 milhões e que se destaca como uma grande oportunidade para implantação de novos negócios. “A SBPC é um espaço de interação para pesquisadores, professores e estudantes. O governo do Maranhão não poderia ficar de fora de tão importante evento onde podemos mostrar as ações, produtos e serviços do estado e conhecer a produção de todas as regiões do país, já que todos os estados estarão representados, seja com stand, com palestras, minicursos ou oficinas”, disse a diretora presidente da FAPEMA, Rosane Nassar Meireles Guerra. O stand da Fundação na SBPC de 2013, realizada em Recife, recebeu milhares de pessoas durante os cinco dias do evento. O público maior de visitan- Revista Inovação nº 22 / 2014 7 Universidade Federal do Acre, onde será realizada a 66ª edição da SBPC. tes ocorreu durante o lançamento de livros de pesquisadores maranhenses apoiados pela FAPEMA. Dentre os livros lançados, destaque para o livro Pesquisadores do Maranhão, organizado pelo Núcleo de Difusão Científica da FAPEMA. A publicação traz o resumo de projetos de pesquisas que receberam o financiamento da Fundação por meio de editais como o Universal, PPP e Maranhão Faz Ciência entre 2012 e 2013. “Esperamos uma visitação ainda maior este ano no nosso stand”, salientou a presidente. SEM FRONTEIRA O tema da SBPC deste ano, “Ciência e Tecnologia em uma Amazônia sem Fronteiras”, tem como proposta a discussão sobre como a ciência e a tecnologia podem causar impacto no conhecimento e desenvolvimento da Amazônia. “O estado do Maranhão, por também fazer parte da Amazônia Legal, juntamente com o Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins e parte do Mato Grosso, tem todo o interesse em participar dos debates que surgirão a partir do tema proposto”, reforçou Rosane Guerra. APOIO Em 2013, o stand da FAPEMA, instalado na ExpoT&C, expôs as produções científicas produzidas no Maranhão. Este ano, a experiência será repetida. Como contribuição para o sucesso do evento, a FAPEMA está apoiando, por meio de edital, a participação de alunos com o financiamento de parte das despesas com passagem, alimentação e inscrição no evento. Ano passado, o Maranhão foi o segundo estado com maior número de inscritos na SBPC realizada em Recife, perdendo apenas para o estado sede do encontro. NOVIDADES 8 Abertura oficial da 65ª SPBC, realizada em Recife. A edição teve recorde Revista Inovação nº 22 / 2014 de público. A SBPC deste ano inova ao abrir um espaço maior para a participação da família. A ideia da abertura do evento na terça-feira e o encerramento no domingo – nas outras edições a abertura era no domingo e o encerramento na sexta-feira – visa, exatamente, dar oportunidade para as famílias conhecerem o que está sen- SOBRE A SBPC Realizada desde 1948, com a participação de representantes de sociedades científicas, autoridades e gestores do sistema nacional de ciência e tecnologia, a Reunião Anual da SBPC é um importante fórum para a difusão dos avanços da ciência nas diversas áreas do conhecimento e um fórum de debates de políticas públicas para a ciência e tecnologia. A programação científica é, geralmente, composta por conferências, simpósios, mesas-redondas, encontros, sessões especiais, minicursos e sessões de pôsteres. Também são realizadas outras atividades, como a SBPC Jovem (programação voltada para estudantes do ensino básico), a ExpoT&C (mostra de ciência e tecnologia) e a SBPC Cultural INSCRITOS NOS ÚLTIMOS 5 ANOS: (apresentação de atividades artísticas regionais e discussões sobre temas relacionados à cultura). A cada ano, a Reunião Anual da SBPC é realizada em um estado brasileiro, sempre em universidade pública. O evento reúne milhares de pessoas - cientistas, professores e estudantes de todos os níveis, profissionais liberais e visitantes. Ano Edição da Reunião Local Nº de Inscritos 2010 62ª Natal (RN) 8.853 2009 2011 2012 2013 61ª 63ª 64ª 65ª O Ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, Marco Antonio Raupp, entre o Secretário da Ciência, Tecnologia, Ensino Superior e Desenvolvimento Tecnológico do Maranhão, José Ferreira Costa, e a Presidente da FAPEMA, Rosane Guerra, na 65ª SPBC. Lançamento do livro “Pesquisadores do Maranhão”, organizado pelo Núcleo de Difusão Científica da FAPEMA. Manaus (AM) Goiânia (GO) São Luís (MA) Recife (PE) 6.215 9.022 11.913 22.930 do exposto e apresentado no evento já que os passeios em família geralmente acontecem nos fins de semana. O Dia da Família na Ciência promete atrair um grande número de pessoas. Outra novidade, a SBPC Indígena que inclui debates acerca do universo indígena como “Ciência e Educação Indígena”, “Saúde Indígena”, além da realização de rituais e apresentações musicais de povos indígenas do Brasil, Bolívia e Peru, também deve ser uma atração de sucesso do evento. Nesta edição, também será promovida a reunião das principais associações científicas dos Estados Unidos, da China, da Europa e da Índia, além de pesquisadores renomados da América Latina, para participarem de debates sobre temas de impacto em política científica. Entre as Instituições estão a Associação Americana para o Avanço da Ciência (AAAS), a Associação Chinesa para a Ciência e a Tecnologia (CAST, na sigla em inglês), a Associação Europeia para Ciência (EuroScience) e o Congresso de Associações de Ciência da Índia (ISCA). Como em anos anteriores, o acesso é livre e gratuito em todas as atividades da reunião, exceto minicursos: conferências, mesas-redondas, encontros, sessões de pôsteres, atividades culturais (SBPC Cultural), atividades para estudantes do ensino básico ou técnico (SBPC Jovem) e exposições (ExpoT&C). Revista Inovação nº 22 / 2014 9 CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS Uma nova voz para um novo mundo 10 Revista Inovação nº 22 / 2014 Como as interações entre o virtual e o real têm modificado as relações de cidadania e liberdade Por Tayna Abreu Fotos divulgação A década de 10 do séc. XXI vem, mais que as anteriores, quebrando antigos paradigmas e com uma rapidez impressionante. Não seria exagero afirmar que vivemos em outro mundo, completamente diferente daquele em que a internet foi criada, nos anos 1990. Se, por um lado, o mundo offline parece em perigo, por outro, é justamente online que as pessoas estão buscando voz para as suas questões do dia a dia. Desde novas formas de comércio, prestação de serviços, passando pela busca de direitos e, mais recentemente, ampla participação política, a internet tem tomado a frente em questões até então resolvidas no mundo físico. O pesquisador Francisco Paulo Marques desenvolveu no Maranhão o projeto Internet, participação e representação política um estudo dos mecanismos de participação presentes nos websites de parlamentares brasileiros, onde investiga como o parlamento faz uso da internet. Revista Inovação nº 22 / 2014 11 Para Marques, duas questões devem ser debatidas quando se trata do uso da internet. Questões essas que refletem preocupações das Ciências Sociais e Humanas. “De um lado, a inquietação com as consequências promovidas pelas tecnologias digitais de comunicação e, de outro lado, a preocupação revelada por uma reinterpretação das teorias da democracia. Mais exatamente, refere-se à reflexão sobre os modos de se fortalecer a participação política da esfera da cidadania”, explicou. “Considere-se ainda que, se, por um lado, a existência de ferramentas de comunicação digital, bem como seu uso por agentes políticos, sobretudo em épocas eleitorais, não é mais um fenômeno tão recente, por outro lado, ainda são escassos os estudos brasileiros que procuram dar conta disso”, comentou Francisco Marques, que recebeu apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão (FAPEMA) para realizar a pesquisa. A forma como se dá esse uso já é, entretanto, questionada abertamente na própria internet, e a queixa se refere ao modo ultrapassado de lidar com comunicação. Sites especializados em discutir as preocupações recentes em comunicação questionam o status de “político 2.0” e o “efeito manada” que levou muitos às redes sociais e à criação de sites. Para o especialista em marketing digital, Gabriel Rossi, as duas redes com maior expressão atualmente, Facebook e Twitter, têm papel decisivo no uso e na forma de uso da internet, principalmente em ano de eleições. “O Twitter, por exemplo, possui duas funções na política. A primeira é munir jornais, revisas e grandes portais com informação sobre os candidatos. A segunda é a comunicação mais direta e humana com o eleitorado”, explicou Rossi em entrevista ao Portal TechTudo. O jornalista Marcelo Tonetto, do Observatório da Imprensa, lembra que o boom da internet como forma de interação entre o político e o É visível um crescente aumento na percepção de que o meio virtual é sim um local onde o cidadão pode expressar suas ideias, podendo estas serem ouvidas por aqueles que devem intervir. Diego Lira, jurista 12 Revista Inovação nº 22 / 2014 eleitor começou nos Estados Unidos, com a campanha de Barack Obama para se tornar presidente. Já no Brasil, “as eleições presidenciais de 2010 inauguraram uma nova era nas campanhas políticas do Brasil: a das redes sociais”, afirmou. Tonetto explica que, na época, os principais candidatos à presidência do Brasil, José Serra e Dilma Rousseff, trilharam um “caminho sem volta” ao estreitar “seus vínculos com milhões de anônimos e foram pautados por eles, descentralizando o foco das campanhas”. Fato esse que o jornalista chama de “vitória democrática”. Já Francisco Marques lembra que hoje as próprias instituições do Estado vêm procurando incrementar seu relacionamento com os cidadãos através da Internet. “A rede é hoje o lugar do debate. E é nela que se apoiam figuras políticas, seja prestando serviços e informações, seja colhendo sugestões de aprimoramento quanto à elaboração e execução de políticas públicas”, disse. O teórico João Pissarra Esteves, por sua vez, afirma que “desde a emergência da internet que lhe são associadas possibilidades políticas fantásticas, mas se a dado momento esse entusiasmo inicial esmoreceu, logo a seguir o mesmo foi retomado ainda mais vigorosamente, com a Web 2.0, em função de suas características participativas, interativas e pluralistas”. através da Internet relacionados à jurisdição são os juizados virtuais e as petições de requerimento coletivo. Lira explica que, enquanto os primeiros são ambientes virtuais onde advogados e leigos podem fazer petições, as petições coletivas são requerimentos que angariam pessoas em prol de uma causa. “Antes da Internet, para que a população pudesse apresentar um projeto de lei ou até mesmo requisitar um direito coletivo, era necessário que milhares de assinatu- percepção de que o meio virtual é sim um local onde o cidadão pode expressar suas ideias, podendo estas serem ouvidas por aqueles que devem intervir”, finalizou. ALTO-FALANTE Outro sintoma de que a Internet tem afetado as relações de poder, está na dinâmica consumidor – empresa. Antes restrita aos canais de reclamação da própria “acusada”, hoje as reclamações por serviços mal prestados ou mercadorias com defeito, para citar CIDADANIA E os mais comuns, têm tomado DIREITOS proporções que preocupam grandes e pequenas empresas, Lado a lado com a explodos setores público e privado. são do uso da Internet para Sites como o Reclame Aqui, fins políticos, está a busca criado exatamente por um por direitos e celeridade na cliente comum e frustrado, concessão destes. Outra esfuncionam como verdadeiros pera de importância na conalto-falantes na hora do consudução da cidadania também midor exigir reparos. Lançado Maurício Vargas, criador do site está, pouco a pouco, entranem 2001, hoje o site aparece do na escala virtual, o Poder como a ferramenta mais rápiJudiciário. ras fossem tomadas pessoalmente, da na hora de fazer uma reclamaO jurista maranhense Die- o que certamente gerava imensos ção, chegando a cerca de 500 mil go Lira, falou com exclusividade transtornos. Hoje temos sites es- consultas diárias de consumidores, para a Revista Inovação, sobre pecíficos onde tais petições podem bem mais que canais mais “ortodoessa nova realidade. Para ele, os ser preenchidas com segurança em xos” como o Procon. meios jurídicos tem que acompa- instantes, facilitando que os cla“As empresas começaram a finhar o passo dessa nova realidade mores populares cheguem aos res- car preocupadas com sua imagem 2.0. “Justamente por conta disso é ponsáveis”, contou. e passaram a responder aos consuque nos últimos 15 anos é notáQuestionado sobre se essa nova midores via Reclame Aqui. A repuvel o avanço dos Tribunais sobre realidade afeta de fato a busca de tação está sendo vista como mais meios alternativos de processo, es- direitos ou se as relações de poder importante que o preço”, explicou pecialmente quanto aos processos continuam inalteradas, Diego Lira o criador do site, Maurício Varrealizados em juizados virtuais”, é enfático ao afirmar que a voz que gas, em recente entrevista à revista justificou. move a Internet move o mundo. “É Época. A jornalista Raquel Soares, que Bons exemplos de movimentos visível um crescente aumento na As empresas começaram a ficar preocupadas com sua imagem e passaram a responder aos consumidores via Reclame Aqui. A reputação está sendo vista como mais importante que o preço. Revista Inovação nº 22 / 2014 13 Câmara dos Deputados, durante aprovação do projeto do Marco Civil da Internet, considerado a “Constituição da Web”. MARCO CIVIL Após as denúncias de espionagem mundial na internet promovida pela Agência Nacional de Segurança Americana, NSA, o governo brasileiro deu o start na aprovação do Marco Civil da Internet, com a lei nº 12.965. O objetivo do Marco, que vinha sendo discutida desde 2009, é proteger os cidadãos brasileiros no ambiente digital e regulamentar os direitos e deveres de provedores de sinal, governo e consumidores. Confira os pontos chave: - Neutralidade da rede: onde todas as informações devem ser tratadas da mesma forma e com mesma velocidade de conexão. - Segurança de informações: já que a obtenção de dados de conexão só será possível mediante pedido judicial. Pesquisa apoiada pelo edital UNIVERSAL/FAPEMA 004/2010, sob protocolo: 1114/2010 14 Revista Inovação nº 22 / 2014 trabalha diariamente em um portal de notícias maranhense, explica que a força das reclamações e de tudo o que se diz hoje é muito maior, graças à dispersão em redes sociais. “Hoje os consumidores costumam chegar à reputação de uma empresa nos sites de reclamação, antes mesmo de efetuar a compra. E isso tudo graças à Internet e às novas formas de comunicação que têm mudado questões de direito e participação”, argumentou, acrescentando que “se antes foi a fonte de notícias que mudou, passando cada vez mais a ser a Internet em detrimento de outros meios, hoje a Internet é também responsável por uma nova dinâmica de mercado”. Além das reclamações com empresas, outro tipo de manifestação tem começado no mundo virtual. Reuniões em grupos do Facebook e do Twitter resultaram na chamada Primavera Árabe, e mais recentemente, nas manifestações do “Vem Pra Rua” no Brasil. Se, no Oriente Médio, o estopim das manifestações, que começaram na Tunísia e se espalharam pela Líbia, Egito, Argélia, Síria, entre outros, foi o caso do jovem Mohamed Bouazizi, vendedor de frutas morto pela polícia por se recusar a pagar propina, no Brasil, a população foi às ruas para protestar, primeiro contra o aumento das passagens de transporte coletivo e, mais tarde, por melhorias na vida social como um todo. E o que liga esses dois episódios recentes na busca por cidadania e direitos é a interação nas redes sociais, possível apenas com a evolução para a Web 2.0. Esse fenômeno dos novos meios de comunicação é explicado por especialistas como uma nova forma de democracia. “É uma nova perspectiva para os media, dessa vez a serviço da democracia, como base de reforço da discussão aberta, da deliberação dos cidadãos”, explicou Pissarra Esteves, ao exemplificar o modelo de democracia deliberativa do teórico alemão Habermas. Revista Inovação nº 22 / 2014 15 CIÊNCIAS HUMANAS e u q a z e u q i R m das mãos ve ato n a s e t r riti o do a u c i b e m d ô n a e eco a fibr l d a r r i t u r t l a oap ciocu o d i s z r u o l d a o V e é pr s n e h n mara Por Ivandro Coêlho Fotos Paulo Fernandes Keller e divulgação P ara muita gente, o artesanato é uma atividade de valor meramente estético e cultural. Os dados, porém, desmentem esse pensamento, mostrando que o artesanato é mais que um patrimônio cultural imaterial: trata-se de uma fonte de renda para milhares de famílias e envolve uma rede de relações de trabalho e de produção. Estima-se que há 8,5 milhões de artesãos ativos no Brasil. Nesta economia produzida de forma artesanal, seriam movimentados R$ 52 bilhões ao ano. A renda média da atividade seria de R$ 515,00. De acordo com o SEBRAE, somente no Maranhão, existem cerca de 50 mil famílias vivendo dessa atividade, praticada em sua maioria por mulheres. Entre os diversos tipos artesanato encontrados em nosso estado, destaca-se o artesanato feito à base da fibra de buriti palmeira típica da região, da qual se extrai o material utilizado para a confecção da maior parte dos produtos fabricados pelas artesãs (bolsas, chapéus, sacolas, toalhas, caminhos de mesa etc). A matéria -prima - a fibra de buriti - é parte do ecossistema natural (buritizais) e também da cultura local. Para produção de suas peças, as artesãs utilizam técnicas manuais como crochê, ‘ponto batido’ e macramê, entre outras. A produção de artesanato à base de fibra de buriti no Ma- Revista Inovação nº 22 / 2014 17 ranhão ocorre de forma predominante em grupos de produção familiar e de vizinhança, seja no ambiente rural intercalado com a agricultura familiar, seja no ambiente semi-rural ou próximo de área urbana, intercalado com pequenos trabalhos informais. “Trata-se de uma importante fonte de renda para trabalhadores das classes populares. Em geral, é fonte de renda complementar para grande parte de famílias de artesãs”, explicou o professor Paulo Fernandes Keller, do departamento de Sociologia da Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Doutor em Ciências Humanas (Sociologia), Paulo Keller, desde 2008, vem estudando o artesanato maranhense sob diversos ângulos – passando por questões socioculturais até as relações do trabalho artesanal com o mercado. Para ele, 18 Revista Inovação nº 22 / 2014 a atividade artesanal não envolve apenas um lado estético, mas está inserida também numa economia. “Como vivem esses profissionais, que transformações ocorrem nessa atividade e que consequências essas transformações trazem são nossas preocupações constantes”, disse o pesquisador. Em sua pesquisa mais recente, intitulada Trabalho e economia do artesanato: o caso da produção artesanal à base de fibra de buriti no Maranhão, Paulo Keller está desenvolvendo uma investigação social do trabalho e da economia do artesanato no Maranhão contemporâneo, incluindo as condições e formas de organização dessa atividade, a partir de estudos de casos selecionados (grupos de produção artesanal na região do arranjo produtivo e criativo do turismo e arte- sanato de São Luís). O projeto já foi realizado em Barreirinhas e Tutóia. Atualmente a equipe do professor Keller está visitando grupos de São Luís e Alcântara. “Partimos da perspectiva de que o trabalho artesanal, enquanto atividade econômica, encontra-se enraizado na vida sociocultural e institucional da sociedade. Assim, investigamos os artesãos e sua imersão em redes de relações sociais de produção que são parte da cadeia produtiva ou da cadeia de valor do artesanato, assim como sua imersão em redes socioculturais e institucionais”, contou o pesquisador. Para empreender essa análise, Keller utiliza instrumentos teóricos da sociologia do trabalho e da sociologia econômica, observando as especificidades do trabalho artesa- nal enquanto produtor de cultura e de mercadoria inserido numa economia popular. A pesquisa envolve alunos de graduação e pós-graduação do Curso de Ciências Sociais da UFMA, e conta com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão (FAPEMA) e do CNPQ. CADEIA PRODUTIVA No caso de Barreirinhas, depois de fazerem uma análise das relações de trabalho e de produção das artesãs cooperadas da Artecoop, o professor Paulo Keller e sua equipe chegaram à conclusão de que ali não há trabalho assalariado, por ser uma forma de trabalho autônomo ou por conta própria. Contudo, as artesãs, como trabalhadoras coo- Revista Inovação nº 22 / 2014 19 Etapas produtivas do artesanato a base de fibra de buriti 1 Extração do ‘olho’ do buriti 2 Extração do linho ou fibra 3 Beneficiamento da fibra 4 Tingimento da fibra 5 Produção ou confecção das peças utilizando diversas técnicas Os saberes e as habilidades destas trabalhadoras são transmitidos de geração para geração no seio das famílias e na comunidade local. As atividades de extração do ‘olho’ (broto) da palmeira do buriti na região dos Lençóis Maranhenses são realizadas em sua grande maioria por homens como uma atividade econômica secundária e informal. Existe uma clara divisão sexual do trabalho nesta produção artesanal: os homens extraindo a matéria-prima da natureza (extração do ‘olho’ do buriti) e as mulheres produzindo o artesanato (extração e beneficiamento da fibra e confecção do produto). 20 Revista Inovação nº 22 / 2014 peradas, produzem uma mercadoria (objeto artesanal) que tem valor (mercantil, cultural e simbólico) e que circula ao longo da cadeia de valor do artesanato. Ou seja, embora operem de forma informal e precária, mesmo assim atendem a mercados que funcionam segundo a lógica econômica capitalista. “Existem práticas cooperativas na produção artesanal que ocorrem predominantemente no ambiente doméstico (sistema de produção domiciliar), entre as artesãs e seus familiares (filha e marido, principalmente), assim como no ambiente comunitário e de vizinhança (pequena oficina coletiva), entre as artesãs de povoado. As artesãs da Artecoop estão enraizadas nestas redes de produção locais e cooperam, sobretudo, na comercialização de seus produtos”, afirmou o professor. RESULTADOS Os principais resultados desse estudo são artigos científicos publicados em congressos nacionais e internacionais, entre eles o VI Congresso Latino-Americano de Estudos do Trabalho – ALAST, realizado em julho de 2013 na Universidade de São Paulo – USP, e o 2nd ISA Forum of Sociology – International Sociological Association, ocorrido em agosto de 2012 na Universidade de Buenos Aires, Argentina. Atualmente a equipe de professor Keller está produzindo um vídeo estabelecendo relação entre o trançado da fibra de buriti e as redes de relações sociais presentes na economia do artesanato. O título provisório do documentário é A trama do trabalho artesanal. De acordo com o professor Paulo Keller, o que chamou a atenção no trabalho sobre os artesãos e artesãs maranhenses foi a relativa invisibilidade, a carência de dados estatísticos e a importância deles tanto para a cultura (nacional e regional) como para a economia de muitas famílias. Uma das metas futuras do projeto é realizar atividades de extensão e contribuir para maior valorização do artesão e de suas associações e cooperativas. Entre as sugestões, estão maior integração das associações de artesãos no APL – Arranjo Produtivo Local Turismo e Artesanato de São Luis (Região dos Lençóis e Alcântara). Para ele, hotéis e pousadas localizados nessas áreas poderiam atuar como parceiros dos artesãos, utilizando o artesanato na decoração dos seus ambientes ou oferecendo espaços para venda de artesanato. “Seria uma forma de garantir maior dinamismo a essa economia, de forma a superar um dos maiores gargalos desta cadeia que é a comercialização”, declarou o pesquisador. Para Keller, a pesquisa Economia do Artesanato: Fibra de Buriti poderá trazer maior visibilidade para o trabalho artesanal. “Além disso, poderá contribuir para se valorizar não apenas o produto artesanal enquanto mercadoria, mas também para valorizar o trabalho e as relações sociais de produção do artesanato”, finalizou. Pesquisa apoiada pelo edital UNIVERSAL/FAPEMA 001/2012, sob protocolo: 461/2012 Revista Inovação nº 22 / 2014 21 CIÊNCIAS DA SAÚDE 22 Revista Inovação nº 22 / 2014 De olho no HPV Vacina, prevenção, diagnóstico precoce, conscientização. Saiba o que é possível fazer para evitar as consequências do Papiloma Vírus Humano. Por Venilson Gusmão Fotos Venilson Gusmão e divulgação U m inimigo que você não vê, mas suas ações são devastadoras. Essas características são do Papiloma Vírus Humano (HPV), doença sexualmente transmissível mais comum entre homens e mulheres. Há mais de 200 sorotipos diferentes de vírus e alguns deles são considerados oncogênicos, que apresentam maior probabilidade de ocasionar ou contribuir para o surgimento de um tumor canceroso. Dentre as possibilidades de câncer que o HPV pode provocar, os mais comuns são: câncer de pênis, de canal anal, de vulva, cabeça e pescoço e o câncer de colo de útero, tipo que mais mata no Maranhão. Para se ter a dimensão dessa gravidade, em 2011, segundo o Instituto Nacional do Câncer (INCA), o câncer do colo uterino fez 5.160 óbitos no Brasil e a previsão para 2014 é de 15.590 novos casos desse mesmo tipo de câncer. Esses dados alarmantes também foram analisados no estudo da pesquisadora Flávia Castello Branco Vidal Cabral, que é doutora em Biologia Humana e Experimental. Com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvi- Revista Inovação nº 22 / 2014 23 A pesquisadora Flávia Cabral manipula o NanoVue, aparelho que quantifica o DNA extraído da amostra e avalia também sua qualidade. mento Científico e Tecnológico do Maranhão (FAPEMA), ela realizou uma investigação sobre o Impacto da infecção pelo Papiloma Vírus Humano na tumorigênese dos carcinomas de colo de útero, pênis, cabeça e pescoço na população maranhense, interpretando dados nacionais e internacionais. “Analisamos se o HPV está presente em tumores de colo do útero, cabeça, pênis e pescoço. A maioria das pessoas sabe do grande envolvimento entre o HPV e o câncer do colo de útero, mas esquece que o HPV também é um agente etiológico (causador de doenças), como câncer de pênis, alguns tumores de cabeça e pescoço, tumores orais e de boca. O nosso trabalho consiste em analisar amostras frescas ou amostras antigas, parafinadas, de tumores retirados de mulheres. Depois, avaliamos se há ou não infecção por HPV”, explicou Flávia Cabral. A análise em tumores de pênis também é feita dessa mesma forma. Quanto aos de cabeça e pescoço, a pesquisa analisa, principalmente, tumores de laringe em crianças. “Estudos internacionais apontam que durante o parto normal de mulheres que tenham condilomas, que são verrugas na vagina, às vezes podem transmitir os vírus para as crianças e aí algumas delas podem desenvolver papilomas de laringe, causados por HPVs, de baixo risco, do tipo 6 e 11, principalmente”, comentou a pesquisadora, salientando que, durante o estudo, foram analisadas quatro ocorrências no hospital Materno Infantil. Em muitos desses casos, as crianças precisam sofrer procedimentos dolorosos como traqueostomia para retirada dos papilomas na laringe. Vale ressaltar que essas crianças submetidas à cirurgia têm geralmente meses ou poucos anos de idade. [...] o câncer de colo de útero é mundialmente o terceiro mais comum entre as mulheres. Já em países em desenvolvimento, ele já vai para segundo lugar. Em regiões pobres como a nossa, no Nordeste, mais especificamente no Maranhão, o câncer de colo de útero sobe para primeiro lugar. Flávia Cabral, doutora em Biologia Humana e Experimental 24 Revista Inovação nº 22 / 2014 DNA extraído das amostras tumorais congelados a oitenta graus negativos. Todas as amostras de tumores que foram extraídas dos pacientes ficam armazenadas no Biobanco de Tumores e DNA do Maranhão (BTMA), que é o centro de pesquisa sobre câncer do Hospital Universitário da Universidade Federal do Maranhão (HU-UFMA). Dentro do espaço físico do BTMA, há um laboratório, onde são feitas as pesquisas não apenas sobre HPV relacionado a neoplasias genitais, como também câncer de mama, câncer de pênis, cavidade oral e região anal. Flávia Cabral diz que o procedimento feito em todos os tipos de tumores permite extrair o DNA do tumor, conseguindo-se, assim, obter não só o código genético humano, mas também o DNA viral. Para verificar a existência do vírus no tumor, o estudo utiliza o método PCR, que é uma reação em cadeia da polimerase com um alvo específico para detectar o vírus. Se o vírus estiver no material em análise, o resultado dará positivo, ou seja, poderá se afirmar se aquele tumor está com infecção por HPV ou não. Nos tumores de colo de útero, praticamente 100% dos tumores têm e são causados pelo HPV. Isso já é mundialmente conhecido. Segundo a pesquisadora, a comparação com os dados nacionais Manipulação de amostras por meio do método PCR, uma reação em cadeia da polimerase para verificar a existência do vírus. é importante, porque é possível observar como as regiões Norte e Nordeste, que são consideradas as mais carentes do Brasil, estão em relação às doenças por câncer e destinar a merecida atenção à realidade local. “Segundo dados do INCA, o câncer de colo de útero é mundialmente o terceiro mais comum entre as mulheres. Já em países em desenvolvimento, ele já vai para segundo lugar. Em regiões pobres como a nossa, no Nordeste, mais especificamente no Maranhão, o câncer de colo de útero sobe para primeiro lugar. Sendo assim, diz-se que o câncer de colo de útero é um câncer de países pobres, porque é um tumor totalmente evitável, que depende de um programa de saúde bom para isso. Se descoberto no início, as lesões do câncer do colo de útero são retiradas e não evoluem de jeito nenhum para um tumor”, afirmou Flávia Cabral, acrescentando que o exame de rastreio da doença é o Papanicolau, que é um teste muito simples, rápido e gera um resultado confiável. Para avaliar a presença do HPV no câncer de pênis, foram utilizados cerca de 80 tumores de homens, cuja participação do vírus ficou evidente. Mais de 60% dos tumores são causados pelo HPV e, comparando esse resultado com dados internacionais, o nível é muito alto. Segundo a pesquisadora, o câncer de pênis está totalmente relacionado ao comportamento cultural da população e a seus hábitos de higiene. “Por exemplo, a taxa de câncer de pênis em Israel é menor que 1%, porque a circuncisão é um procedimento considerado higiênico, evitando o acúmulo de sujeira no pênis. A prevalência aumenta quando os hábitos de higiene são mais precários. A diferença cultural também é grande e isso, de novo, a gente relaciona ao nível socioeconômico: quanto mais pobre e menos educação tem a população há maior probabilidade de tumores de pênis”, revelou Flávia. Alguns cientistas afirmam também que o sexo oral é um dos comportamentos de risco para o surgimento do câncer de boca. Nesse segmento, um estudo de detecção do HPV-DNA oral e sua associação com o DNA-HPV genital, feito em conjunto com outros Banco de Tumores, analisou a cavidade oral de mulheres que tinham lesões no colo do útero. A intenção era saber se mulheres com essas lesões também tinham HPV na boca. O resultado foi o seguinte: as mulheres avalia- das, que tinham lesões de colo de útero, também apresentavam HPV bucal e, embora não apresentassem lesões na boca, o Papiloma estava presente. “Os dados dos cânceres de cavidade oral no Maranhão são semelhantes aos internacionais. Isso porque cerca de 20% dos tumores de boca são causados por HPV e o restante é causado, principalmente, pelo consumo frequente de bebida alcoólica e tabagismo”, disse a doutora Flávia Cabral. VACINAÇÃO De acordo com o médico oncologista do Hospital Aldenora Belo e coordenador do Serviço de Oncologia Clínica do Instituto Maranhense de Oncologia Aldenora Belo (IMOAB), Ronald Coelho, todo o câncer de colo uterino na fase inicial é curável. Nas fases avançadas da doença, no entanto, a maioria dos tratamentos tem a intenção de aliviar os sintomas, são os chamados tratamentos paliativos. Quando um câncer de colo uterino não é operável, que é uma modalidade de tratamento curativo, ele ainda pode ser tratado com radioterapia e quimioterapia. Entretanto, segundo o médico, quando a doença apresenta estágios mais Revista Inovação nº 22 / 2014 25 GRAVIDADE O Papiloma Vírus Humano pode ser de alto ou baixo risco oncogênico. É considerado de alto risco quando o vírus é capaz de transformar a lesão num câncer. Já o de baixo risco causa lesão, mas com menos risco de se transformar num câncer. Um exemplo de HPV de baixo risco é o de laringe, observado em crianças. O HPV de alto risco é o que causa o câncer de colo de útero, principalmente, o tipo 16 e 18. Esses são os dois de alto risco que causam mais de 70% dos tumores de câncer de útero. A vacina inclui a imunização a esses dois tipos de HPV e também aos tipos 6 e 11, que causam os papilomas genitais (verrugas). Pesquisa apoiada pelo edital UNIVERSAL/FAPEMA 001/2012, sob protocolo: 612/2012 26 Revista Inovação nº 22 / 2014 avançados, não é possível erradicá-la, mesmo recorrendo a esses tratamentos. “Uma fotografia muito cruel disso tudo é a estatística de morte por câncer no Hospital Aldenora Belo, único CACON (Centro de Alta Complexidade em Oncologia) do estado: de cada três cânceres que o hospital atende, um é de colo uterino; e de cada quatro mortes que ocorrem no hospital, uma é causada pelo câncer de colo de útero. Então, quando ouvimos a notícia da vacinação contra HPV há oito ou nove anos, e quando essa vacina foi lançada e oferecida pelo Ministério da Saúde para meninas de 11 a 13 anos, o sentimento foi de muita alegria, embora saibamos que os resultados não serão vistos imediatamente”, afirmou. Desde a infecção até o desenvolvimento do câncer de colo uterino, existe um intervalo variável de acordo com cada caso, mas o tempo estimado é de algo em torno de 10 anos até o desenvolvimento da doença. “O que se conclui é que mulheres que iniciam a vida sexual muito precocemente, como meninas de 11 a 13 anos, provavelmente teriam essa doença por volta dos 20, 25 ou 30 anos. Então, o impacto da vacinação que está acontecendo agora só será sentido daqui a uma ou duas décadas. Esperamos que, daqui a 20 anos, quando estivermos olhando as estatísticas, tenhamos uma mudança drástica desses números. Sabemos que essa doença não será varrida totalmente do mapa, mas ela terá uma diminuição muito significativa”, observou o médico. No Brasil, existem basicamente duas formulações comerciais das vacinas para prevenir o HPV, uma se chama Engerix, que age contra dois dos principais sorotipos do vírus (16 e 18) e, por isso, é chamada de bivalente. A outra vacina é a Gardasil, que é tetravalente (previne contra os sorotipos 6,11,16 e 18) e está sendo oferecida pelo Ministério da Saúde nos postos de atendimento médico de todo o país. “Essa vacina é importante para a saúde da mulher de uma forma geral. Mesmo que a paciente não tenha câncer, o aparecimento de uma verruga genital, dependendo do volume, pode mutilar a mulher, deformando a anatomia da vulva, vagina, ânus e períneo”, enfatizou o doutor Ronald Coelho. A vacina contra o HPV está sendo oferecida para meninas na faixa etária de 9 a 13 anos. Entretanto, sua implantação vem sendo realizada de maneira gradativa. Em 2014, o público alvo foi formado por meninas de 11 a 13 anos. Em 2015, as beneficiadas serão garotas de 9 a 11 anos e, a partir de 2016, serão vacinadas pré-adolescentes de 9 anos de idade. Lidiane Oliveira, mãe de Maria da Glória, revela que esclareceu a sua filha as razões da vacinação e acredita que o futuro das crianças será de dias mais saudáveis. “Falei que a vacina doía, mas que valia a pena para o resto da vida. Você tem que explicar para seu filho o porquê da vacinação, não adianta esconder. A prevenção é o segredo de tudo, porque, quando você começa desde cedo, tudo tem jeito”, comentou. A meta da vacinação contra HPV definida pelo Ministério da Saúde é atingir pelo menos 80% do grupo alvo, que em 2014 é de 5,2 milhões de adolescentes de 11 a 13 anos. A estratégia orientada [...] mulheres que iniciam a vida sexual muito precocemente, como meninas de 11 a 13 anos, provavelmente teriam essa doença por volta dos 20, 25 ou 30 anos. Então, o impacto da vacinação que está acontecendo agora só será sentido daqui a uma ou duas décadas. da para os pais que não precisarão se deslocar até um posto de saúde. Além disso, prevenção é sempre um bom negócio”, argumentou. Fernanda falou que, embora sua filha ainda não tenha despertado para sexualidade, já conversou com ela sobre doenças sexualmente transmissíveis, gravidez e a importância da prevenção. “Luana é uma multiplicadora. Quando aprende alguma coisa na escola, chega em casa contando para todo mundo e acaba conscientizando toda a família sobre alguns temas. E com o assunto HPV não foi diferente”, contou. O doutor Ronald Coelho explica que é possível que ocorram efeitos colaterais, mas os ganhos são muito maiores. “Você pode ter uma reação adversa assim como pode acontecer com qualquer outra medicação ou vacinação. A questão é do ponto de vista da saúde pública, já que não existe nenhuma intervenção que tenha um impacto tão importante sobre o câncer como a vacinação contra o HPV”, defendeu o oncologista. Luana e Maria da Glória, no O Ministério da Saúde estaentanto, não sentiram reações beleceu essa faixa etária para após a aplicação da vacina. As vacinação porque, segundo esduas garotas também concorRonald Coelho, médico oncologista tudos, essas meninas não codam que a dor momentânea meçaram a vida sexual, não tida injeção foi pequena diante veram o contato com o HPV e, pelo Ministério da Saúde e adotada de seus benefícios. “Não tive neainda, porque é nessa faixa etária pelas secretarias municipais e esta- nhum efeito colateral. Só a picada que a vacina tem uma melhor resduais foi a imunização no ambien- que doeu um pouco, mas é melhor posta, além de maiores chances de te escolar. sentir essa dor agora que contrair proteção contra lesões que podem a doença futuramente”, destacou Luana Coelho, de 11 anos, por provocar o câncer uterino. exemplo, ouviu falar da doen- Luana. Para garantir proteção contra o ça pela primeira vez durante uma Segundo uma pesquisa feita HPV, a imunização deve ser feita, aula em que a professora propôs pela Universidade de Toronto, no necessariamente, em três doses. A uma atividade, explicando mais Canadá, aplicar a vacina em menisegunda aplicação ocorrendo 6 me- detalhes da doença, seus sintomas, nos poderia ajudar muito a preveses após da primeira, e a terceira, 5 causas e formas de prevenção, ennir a doença no mundo. O trabalho anos depois. focando principalmente a vacina. foi divulgado na revista internaMaria da Glória Oliveira, 11 “Quando a vacina chegou à es- cional Sexually Transmitted Infecanos, já recebeu a primeira das três cola, levei uma autorização para tions. “Os homens são, em grande doses da vacina contra o HPV. Ela minha mãe assinar, ela imedia- parte, os vetores dessa infecção, já sabe bem o principal benefício da tamente concordou”, comenta a que, historicamente, possuem mais vacina. “É importante porque pre- garota. Fernanda Coelho, mãe de parceiros sexuais. Dessa forma, vine o câncer do colo do útero”, Luana, achou ótima a iniciativa da com a vacinação de homens, diafirmou. vacinação na escola. “Muito cômo- minuiriam a transmissão do vírus, Revista Inovação nº 22 / 2014 27 Luciane Brito é coordenadora geral do Banco de Tumores e DNA do Maranhão e coordenadora do Núcleo de Pesquisa em HPV. Por meio de entrevistas, ela traça um perfil das pacientes e, com a ajuda de exames, investiga a relação entre as neoplasias e o HPV. interrompendo essa cadeia, e o índice de câncer de pênis, ânus e orofaringe entre eles”, afirmou Ronald Coelho. PREVENÇÃO Algumas mulheres, no entanto, não tiveram a oportunidade de imunização e contraíram o HPV. Observando essa realidade, a doutora em Medicina na área de Mastologia e coordenadora geral do Banco de Tumores e DNA do Maranhão, Luciane Maria Oliveira Brito, realizou o estudo sobre Associação do Papilomavírus Humano e as Neoplasias Genitais, que investiga se as mulheres que possuem alteração sugestiva de neoplasia no exame preventivo estão infectadas pelo HPV. “A neoplasia é uma proliferação anormal do tecido, que foge parcial ou totalmente ao controle do organismo e tende à autonomia e à perpetuação, com efeitos agressivos sobre o hospedeiro”, explicou. 28 Revista Inovação nº 22 / 2014 Foi utilizada uma amostra constituída por mulheres atendidas no Ambulatório de Ginecologia do Centro de Pesquisa Clínica do Hospital Universitário da UFMA (CEPEC/HUUFMA). Estas mulheres foram submetidas a uma entrevista com questionamentos sobre variáveis sociodemográficas e ao exame ginecológico, com coleta de material do colo uterino. Em seguida, este material foi encaminhado para análise do DNA viral no laboratório de pesquisa multiusuário do Banco de Tumores do Maranhão. A identificação molecular do HPV foi realizada por meio da reação em PCR e as amostras positivas foram submetidas ao sequenciamento para determinar o tipo de HPV presente na amostra. “Uma vez conhecendo o perfil das mulheres maranhenses que estão sendo infectadas por este vírus e o comportamento sexual, novas campanhas preventivas podem ser traçadas e executadas, visando à mudança do comportamento de risco e estimulando a detecção precoce da infecção por meio do exame preventivo de câncer de colo do útero”, enfatizou Luciane Brito. Os resultados encontrados destacaram que a prevalência do HPV de alto risco para câncer foi mais frequente que o de baixo risco, demonstrando a associação entre a lesão do colo e o HPV de alto risco. “Dentre os fatores de risco significantes, foram identificados a idade (30 a 49 anos), frequência de visitas ao ginecologista (mulheres que nunca foram ao ginecologista) e a ausência de métodos contraceptivos, demonstrando a necessidade da instalação de medidas educativas e exames de triagem”, relatou a pesquisadora. Como forma de prevenir esse problema de saúde pública, algumas estratégias são apontadas. “Uma das principais medidas é a educação popular preventiva em saúde pública, informando sobre os fatores de risco que contribuem para desencadear essa doen- ça, como alcoolismo, tabagismo, comportamento sexual de risco, nutrição deficiente, dentre outros, somada à estimulação da população para a procura de atendimento ginecológico para detecção da infecção pelo HPV em sua fase inicial”, afirmou a coordenadora geral do Banco de Tumores e DNA do Maranhão. sia favorece o processo de cura”, observou Luciane Brito, que também é coordenadora do Núcleo de Pesquisa em HPV. Com o intuito de ajudar mulheres na detecção do HPV, os tipos do vírus e tratamento de lesões de baixo e alto grau, os profissionais do Banco de Tumores promovem exames e aplicação As demais pesquisas produzidas de questionário para identificar no Banco de Tumores têm contri- os fatores de risco. A partir desse buído de forma significativa para a diagnóstico, as mulheres são ensaúde oncológica no Maranhão ao caminhadas ao Centro de Pesquiestudarem outros tipos de câncer, sas Clínicas (CEPEC-UFMA) para prevalência, fatores associados e receber o devido atendimento terapêutica aplicada. “Em um dos médico. “Fazemos análise clínica, contrabalhos realizados, 105 mulheres foram avaliadas quanto à presença versamos com a paciente e ela do HPV. Destas, 58% apresenta- pode levar o seu parceiro tamram HPV no colo uterino e 38% na bém, já que fazemos um estudo cavidade oral. A detecção precoce do câncer de pênis e encaminhada infecção pelo HPV nestas mu- mos para os urologistas que estão lheres contribuiu para o combate atrelados ao nosso projeto. No ao câncer, visto que a terapêutica caso das pacientes, encaminhaaplicada na fase inicial da neopla- mos para tratamento no IMOAB”, contou Luciane Brito. As datas para realização do exame preventivo devem ser pontuais, haja vista que muitas O Banco de Tumores oferece mulheres adoecem por falta de assistência méatendimento, com realização de dica, desinformação exames e aplicação de questionário, ou por negligência ao para mulheres que apresentem verpriorizarem outras atirugas na região da vagina ou ânus, e vidades. E quando se a partir desse diagnóstico, promove trata de saúde, o tempo o encaminhamento das pacientes ao é implacável, ou seja, deixar passar o moCentro de Pesquisas Clínicas (CEPEmento de ir ao médico C-UFMA) para receber o devido trae fazer os exames nas tamento. datas previstas pode ser Os encontros com os pacientes a circunstância mais fasão feitos todas as quintas-feiras no vorável para um grande perigo. CEPEC, que fica próximo ao Hospital Universitário Presidente Dutra. O Situação parecida viveu Luiza, nome ficagendamento pode ser feito pelos tício da administradotelefones do Banco de Tumores (98 ra, pós-graduada, de 47 2109 1273) ou do Centro de Pesquianos, que, para presersas Clínicas (98 2109 1294). var sua imagem, teve sua identidade mantida em sigilo. Ela conta um Pesquisa apoiada pelo edital pouco dos momentos de UNIVERSAL/FAPEMA 004/2010, aflição ao descobrir que sob protocolo: 1240/2010 tinha um câncer de útero em 2009. ATENDIMENTO [...] conhecendo o perfil das mulheres maranhenses que estão sendo infectadas por este vírus e o comportamento sexual de risco, novas campanhas preventivas podem ser traçadas e executadas, visando à mudança do comportamento de risco e estimulando a detecção precoce da infecção por meio do exame preventivo de câncer de colo do útero. Luciane Brito, coordenadora do Núcleo de Pesquisa em HPV “Sempre fazia meu preventivo anualmente, claro que sempre atrasava uns dois ou três meses, afinal minha vida sempre foi muito corrida. Trabalhava muito tempo sentada e apareceu uma dor do lado direito do abdômen inferior. Chegou a época de fazer preventivo e comecei a adiar, estava sempre muito atarefada. Então, fui a uma consulta e, diante das minhas queixas de um corrimento meio rosado e dor, a médica me atendeu, coletou algumas amostras e quando, mostrei o resultado, ela me tranquilizou dizendo que era apenas um pico ovulatório”. Luiza relata que passou por um tratamento rotineiro e que voltou a sua rotina, bastante aliviada por sinal. Porém, com o passar dos dias, observou que a dor só aumentava, a perna direita começava a doer e parecia que tinha um caroço interno mais ou menos do tamanho de um limão médio. “Estava preocupada, já tive casos de câncer na família e sei que a genética às vezes é um fator de risco determinante”. A administradora ficou ainda mais preocupada e resolveu fazer novos exames e procurar uma nova Revista Inovação nº 22 / 2014 29 opinião médica. “Após os exames, a médica me informou que o caso era cirúrgico e que iria fazer o laudo imediatamente. A essa altura, já não comia, dormia, trabalhava e nem pensava em outra coisa”, lembrou. A médica disse que Luiza estava com vários tumores nas trompas, no ovário, no útero e a indicação realmente era cirúrgica e urgente. Pelos marcadores e pelo ultrassom, Luiza estava com câncer. “Não ouvi nada do que a médica falou, só ouvi a palavra câncer. Fiquei revoltada, culpada, indignada. Por que comigo? Por que a médica anterior não diagnosticou antes? E eu que deveria ter trabalhado menos e me cuidado mais? Meu mundo desabou, meu futuro acabou, nada mais tinha graça, e minha esperança sumiu por completo”, disse Luiza, que na época estava com 43 anos. Ela fez a cirurgia para retirada dos tumores, passou dez dias internada, tendo um pós-operatório com fortes dores abdominais. E como é de praxe nesses casos, mandaram os tecidos retirados na cirurgia para verificação do nível 30 Revista Inovação nº 22 / 2014 da doença. “Foi então que o médico me deu a notícia que eu teria que fazer quimioterapia. Foi um choque e tanto, imaginei que não fosse necessário. Tinha tanto medo da quimioterapia que consultei quase todos os especialistas de São Luís para saber se realmente era necessário, e todos me disseram que sim”, apontou a administradora. Depois do tratamento, Luiza voltou à rotina normal de trabalho, mas não como antes. “Aprendi a dizer não e a respeitar minhas vontades e meus limites em detrimento da dos outros”, ensinou. Hoje, depois de curada, a administradora faz acompanhamento médico de ano em ano. Ela revela que, após essa fase difícil, se sente temerosa com a doença. “Diria que a realidade de quem teve a doença e sobreviveu é a insegurança e o medo de que a doença volte”. ATENÇÃO REDOBRADA A rotina corrida das mulheres modernas tem sido um obstáculo quando o assunto é prevenção. Muitas alegam falta de tempo e acabam adiando a visita ao médico. As alterações das células que podem desencadear o câncer, no entanto, podem ser descobertas muito facilmente no exame preventivo, conhecido como Papanicolau, que deve ser realizado periodicamente por toda mulher que tem ou teve vida sexual ativa, principalmente na faixa entre 25 e 64 anos. Os dois primeiros exames devem ser feitos com intervalo de um ano. Se esses resultados forem normais, a frequência do exame pode aumentar para cada dois anos. Na maioria dos casos, a infecção é combatida espontaneamente pelo sistema imunológico e muitas mulheres nem ficam sabendo do contato com o vírus. No entanto, quando o pior acontece e as lesões se agravam, o tratamento é muito mais sofrido e, às vezes, pode não trazer os resultados esperados. O velho ditado cai muito bem quando o assunto é câncer de colo de útero, afinal, prevenir é melhor que remediar. Proteja sua criação Objetivo: Proteger os sinais que individualizam os produtos e serviços de outros iguais ou semelhantes de uma determinada empresa distinguindo-os de seus concorrentes. Objetivo: Proteger uma invenção e garantir ao titular os direitos exclusivos para usar sua invenção por um período limitado de tempo, sendo invenção definida como uma nova solução para um problema técnico. Objetivo: Proteger o aspecto ornamental ou estético de um objeto. Pode consistir de características tridimensionais, como a forma ou a superfície do objeto, ou de características bidimensionais, como padrões, linhas ou cores. Objetivo: Proteger a qualidade e reputação dos produtos, vinculando qualquer expressão ou sinal utilizado para indicar a origem do produto (uma região, lugar específico ou, excepcionalmente, um país). Objetivo: Proteger todas as obras do domínio literário, científico e artístico, qualquer que seja o modo ou a forma de expressão. COORDENAÇÃO DE INOVAÇÃO E EMPREENDEDORISMO (98) 2109 1400 / (98) 2109 1445 e-mail: [email protected] www.fapema.br Revista Inovação nº 22 / 2014 31 CIÊNCIAS EXATAS E DA TERRA á est ê O que voc ? comendo Presença de agrotóxicos pode causar alterações químicas em vegetais, gerando riscos à saúde humana e ao meio ambiente. Por Elizete Silva Fotos Divulgação A pontado pelo Ministério da Saúde como a segunda maior causa de intoxicação depois de medicamentos, os agrotóxicos são utilizados em grande escala no Brasil sem levar em consideração a existência ou não de autorização do Governo Federal para o uso em determinados alimentos, o que representa um risco para a saúde e para o meio ambiente. Esses efeitos nocivos, no entanto, ainda são desconhecidos para muitos agricultores, o que tem levado pesquisadores a se debruçarem sobre estudos que possam contribuir para a utilização desses produtos químicos de forma mais responsável. O controle do uso, comércio, armazenamento, transporte interno e da destinação final das embalagens de agrotóxicos no Maranhão cabe à Agência Estadual de Defesa Agropecuária do Maranhão (AGED). “Todo o comércio de agrotóxico tem que ser registrado na AGED. Hoje nós temos 424 estabelecimentos registrados, 48 prestadoras de serviço na aplicação de agrotóxicos e 1.338 produtos cadastrados”, contou a coordenadora de Defesa Sanitária Vegetal da AGED, Filomena Matos. Antes de serem comercializados, os agrotóxicos passam por três Ministérios: Agricultura, Saúde e Meio Ambiente. Para receber o certificado de registro do Ministério da Agricultura, o pro- Os agrotóxicos podem ser divididos em duas categorias Agrícolas: Destinados ao uso nos setores de produção, no armazenamento e beneficiamento de produtos agrícolas, nas pastagens e nas florestas plantadas - cujos registros são concedidos pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, atendidas as diretrizes e exigências dos Ministérios da Saúde e do Meio Ambiente. Não-agrícolas: Destinados ao uso na proteção de florestas nativas, outros ecossistemas ou de ambientes hídricos - cujos registros são concedidos pelo Ministério do Meio Ambiente/Ibama, atendidas as diretrizes e exigências dos Ministérios da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e da Saúde. Destinados ao uso em ambientes urbanos e industriais, domiciliares, públicos ou coletivos, ao tratamento de água e ao uso em campanhas de saúde pública - cujos registros são concedidos pelo Ministério da Saúde/Anvisa, atendidas as diretrizes e exigências dos Ministérios da Agricultura e do Meio Ambiente. 34 Revista Inovação nº 22 / 2014 duto precisa antes ter o “ok” dos dois outros Ministérios. “Depois desse processo, a empresa fabricante envia para o estado a solicitação para cadastramento do produto. Todos os 1.338 produtos que temos cadastrados são aqueles aptos a serem comercializados no Maranhão”, detalhou a representante da AGED. Ela explica que, se durante as fiscalizações do órgão, forem encontrados no comércio algum produto que não esteja na lista de produtos cadastrados no Estado, o estabelecimento será automaticamente autuado. “Além da fiscalização, compete à AGED desenvolver ações educativas de divulgação e de esclarecimento que assegurem o uso correto de agrotóxicos e afins e a destinação adequada de resíduos e embalagens vazias”, completou. USO INDEVIDO Todos esses cuidados, no entanto, não têm sido suficientes para evitar o uso indevido de agrotóxicos em muitas lavouras maranhenses. A presença de agrotóxicos tem gerado alterações químicas em vegetais no Sul do estado, segundo constatou uma pesquisa coordenada pelo professor Alan Bezerra Ribeiro, da Universidade Federal do Maranhão, campus Imperatriz. O trabalho financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão (FAPEMA) demostrou que o cultivo de vegetais como pimentão e tomate, na maioria das vezes, é feito com o uso abusivo de agrotóxicos. A pesquisa adotou como uma de suas bases os dados divulgados pela Agência Nacional de Saúde (ANVISA) sobre o monitoramento de agrotóxicos em alimentos feito pelo Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxico em Alimentos (PARA) de 2008. O relatório constatou que o pimentão é um dos vegetais mais contaminados com esses resíduos, com 64% das amostras analisadas. Além deste, o tomate também foi um dos que obtiveram alto índice de contaminação, com 18% das amostras analisadas contaminadas. Diante deste fato, o pesquisador tomou como elementos de análise pimentões e tomates cultivados pelos profissionais de Agronomia da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA), campus Imperatriz, que atuaram em parceria no projeto. Uma parte dos vegetais foi plantada com o uso de agrotóxicos e a outra parte não recebeu essas substâncias. Essa estratégia foi adotada para que fosse possível perceber as alterações ocorridas nos vegetais com agrotóxicos. N DICAS PARA EVITAR OU DIMI UIR A INGESTÃO DE AGROTÓXICOS 1 Dê preferência a frutas e verduras da época. Fora da estação adequada, é quase certo que a fruta, verdura ou legume tenha recebido cargas maiores de agrotóxicos. É por isso que, quando você não encontra tomate, cebola ou outros produtos na feira orgânica, é porque não está na época deles. Escolha outro alimento que os substitua em termos nutricionais. 2 Procure sempre descascar as frutas. Os resíduos de agrotóxicos concentram-se especialmente nas cascas das frutas. Nesse caso, é importante descascá-las, principalmente os pêssegos e maçãs. 3 Lave bem as frutas e verduras. Use água corrente durante pelo menos um minuto, limpando sua superfície. Ou coloque-as numa solução de água (1 litro) com um pouco de vinagre (4 colheres de sopa), durante 20 minutos. Mas atenção: como a atuação da maior parte dos agrotóxicos é sistêmica (quando aplicado às plantas, circulam através da seiva e por todos os tecidos), descascar e lavar as frutas não garante a eliminação total dos resíduos, somente sua diminuição. 4 Retire as folhas externas das verduras. Em geral, ali se concentram mais agrotóxicos. Com sua retirada, a carga mais pesada é eliminada. 5 Diversifique nas hortaliças e frutas. Além de propiciar boa mistura de nutrientes, reduz a chance de exposição ao mesmo agrotóxico usado pelo agricultor. 6 Dê preferência aos produtos nacionais e de sua região. Alimentos que percorrem longas distâncias, normalmente, são pulverizados depois da colheita e possuem um nível maior de contaminação. Revista Inovação nº 22 / 2014 35 O estudo mostrou que o uso de agrotóxicos modifica compostos químicos naturais que são fontes de nutrientes para o ser humano. “Estamos observando quais as reações causadas nesses alimentos e já constatamos que pelo menos três substâncias que não são naturais a eles estão sendo produzidas por causa dos agrotóxicos”, contou Alan Ribeiro. Logo após o cultivo do pimentão e do tomate, a equipe realizou análises laboratoriais, utilizando a técnica de cromatografia, que consiste na separação das substâncias presentes no alimento. Com essa separação, será possível realizar uma análise mais detalhada de cada substância para que se percebam os impactos que elas podem causar no ser humano e no meio ambiente. Os pesquisadores, que integram o grupo de pesquisa Estudos químicos, físicos e biológicos de produtos de interesse da indústria de alimentos, pretendem estender os estudos, analisando outros vegetais que também contenham alto índice de agrotóxicos. LEGISLAÇÃO O Brasil é o maior consumidor de produtos agrotóxicos no mundo. Em decorrência da significativa importância, tanto em relação à sua toxicidade quando à escala de uso no país, os agrotóxicos possuem uma ampla cobertura legal no Brasil, com um grande número de normas legais. O referencial legal mais importante é a Lei nº 7802/89, que rege o processo de registro de um produto agrotóxico, regulamentada pelo Decreto nº 4074/02. Segundo a legislação vigente, agrotóxicos “são produtos e agentes de processos físicos, químicos ou biológicos, utilizados nos setores de produção, armazenamento e beneficiamento de produtos agrícolas, pastagens, proteção de florestas, nativas ou plantadas, e de outros ecossistemas e de ambientes urbanos, hídricos e industriais”. A substância visa a alterar a composição da flora ou da fauna, a fim de preservá-las da ação danosa de seres vivos considerados nocivos. Também são considerados agrotóxicos as subs36 Revista Inovação nº 22 / 2014 REGISTRO Os agrotóxicos, para serem produzidos, exportados, importados, comercializados e utilizados devem ser previamente registrados em órgão federal, de acordo com as diretrizes e exigências dos órgãos federais responsáveis pelos setores da saúde, do meio ambiente e da agricultura. O Ibama realiza a avaliação do potencial de periculosidade ambiental de todos os agrotóxicos registrados no Brasil. Segundo a Lei 7802/89, artigo 3º, parágrafo 6º, no Brasil, é proibido o registro de agrotóxicos: a) Para os quais o Brasil não disponha de métodos para desa- tivação de seus componentes, de modo a impedir que os seus resíduos remanescentes provoquem riscos ao meio ambiente e à saúde pública; b) para os quais não haja antídoto ou tratamento eficaz no Brasil; c) que revelem características teratogênicas, carcinogênicas ou mutagênicas, de acordo com os resultados atualizados de experiências da comunidade científica; d) que provoquem distúrbios hormonais, danos ao aparelho reprodutor, de acordo com procedimentos e experiências atualizadas na comunidade científica; e) que se revelem mais perigosos para o homem do que os testes de laboratório, com animais, tenham podido demonstrar, segundo critérios técnicos e científicos atualizados; f) cujas características causem danos ao meio ambiente. tâncias e produtos empregados como desfolhantes, dessecantes, estimuladores e inibidores de crescimento. PLANO NACIONAL DE AGROECOLOGIA Em outubro do ano passado, a presidente Dilma Rousseff lançou o Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Planapo) que tem como objetivo articular políticas e ações de incentivo ao cultivo de alimentos orgânicos e agroecológicos, com investimento inicial de R$ 8,8 bilhões, divididos em três anos. Como resultados, espera-se o fortalecimento da produção orgânica e de base agroecológica em 182 mil unidades familiares de produção; a adequação de 28 mil unidades de produção aos regulamentos da produção orgânica; fortalecimento de 30 redes locais e apoio produtivo a 450 em- preendimentos de agroecologia; implantação de 60 mil unidades de acesso à água para produção no Programa Segunda Água em propriedades de produção agroecológica e duplicação dos recursos do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) para aquisição de produtos orgânicos ou de base agroecológica; entre outros objetivos. No Planapo, estão envolvidos os Ministérios do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA); Secretaria-Geral da Presidência da República; ministérios da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa); Saúde, Educação (MEC); Ciência, Tecnologia e Informação (MCTI); Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS); Meio Ambiente (MMA); da Pesca e Aquicultura (MPA) e da Fazenda. Pesquisa apoiada pelo edital UNIVERSAL/FAPEMA 010/2009, sob protocolo: 1154/2009 Revista Inovação nº 22 / 2014 37 CIÊNCIAS DA SAÚDE 38 Revista Inovação nº 22 / 2014 Obesidade, a grande vilã da vida saudável Metade da população brasileira está acima do peso, sendo que 17% sofre de obesidade. Pesquisas apontam que a maior aliada na luta contra os efeitos da doença, que acomete as pessoas cada vez mais cedo, ainda é a alimentação saudável. Por Carol Neves Fotos divulgação e acervo pessoal D esde os 5 anos de idade, Aline Chaves, hoje com 35, sofria com esse problema. Ultimamente já sentia muita dificuldade para fazer atividades básicas como caminhar, pegar um ônibus ou sentar na pequena cadeira de uma lanchonete. Com muitas dores na coluna, inchaço nos joelhos e tornozelos, ela também passava por certos constrangimentos por causa de sua condição física. Assim como Aline, 17% da população brasileira também encara as dificuldades e limitações trazidas pela obesidade. De acordo com dados do Ministério da Saúde por meio da pesquisa Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico – Vigitel, mais da metade dos brasileiros estão acima do peso considerado ideal. Segundo estudos realizados, pela primeira vez na história, o número de pessoas com excesso de peso supera o de desnutridos. Outro dado alarmante revela que a obesidade em crianças e adolescentes cresceu 240% nas últimas duas décadas. A obesidade é uma doença crônica endócrino-metabólica, que pode ser agravada por fatores ambientais. Ela resulta em um desequilíbrio nutricional e acúmulo de tecido gorduroso, localizado ou generalizado, podendo ter como fatores de intensificação a idade, renda familiar, escolaridade, con- sumo de bebidas alcoólicas, comportamento alimentar impróprio e sedentarismo. Estudos afirmam que as tendências nutricionais têm passado por mudanças. Observa-se o maior consumo de alimentos com alta densidade energética, como carnes e laticínios, que concentram altos níveis de gorduras. Em paralelo a esse quadro, verifica-se o baixo consumo de frutas, verduras, hortaliças e legumes, que, em conjunto com atividades físicas, podem resultar numa vida mais saudável. Essas informações podem servir como uma das explicações para o aumento do número de pessoas com excesso de peso. A mais recente Pesquisa de Orçamentos FaRevista Inovação nº 22 / 2014 39 miliares - POF (2008-2009), realizada em parceria com o Ministério da Saúde e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, aponta para esse crescimento, afirmando que, de 1974 para cá, o excesso de peso em homens com mais de 20 anos, quase triplicou, passando de 19% em 1974-75 para 50% em 2008-2009. Nas mulheres, o aumento foi de 29% para 48%. Já a obesidade nos homens passou de 3% para 12% e, nas mulheres, de 8% para 17%, no mesmo período. No Maranhão, apesar de São Luís ter sido a capital a apresentar Excesso de Peso 1974/ 1975 2008/ 2009 1974/ 1975 2008/ 2009 Fonte: Pesquisa de Orçamentos Familiares - POF (2008-2009) 40 Revista Inovação nº 22 / 2014 16,9% 12,4% 8% 2,8% 48% 50,1% 28,7% 18,5% Obesidade menor índice de obesidade (13%) dentre todas as demais capitais segundo a Vigitel, pesquisadores têm se preocupado com essa doença, caracterizada como um grave problema de saúde pública. A exemplo, podemos citar a pesquisadora Camila Guimarães Polisel, que coordena um estudo apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão (FAPEMA). O trabalho tem como foco principal conhecer o perfil clínico e laboratorial de adolescentes obesos em escolas públicas de São Luís. O projeto, que teve início em novembro de 2012 e tem término previsto para novembro de 2014, conta com a participação de 347 adolescentes, de 11 a 18 anos, que estão regularmente matriculados em escolas da rede pública. A pesquisa visa auferir, entre outros fatores, o índice de massa corporal (IMC), a circunferência abdominal (CA), a relação cintura-quadril e a glicemia de adolescentes obesos. A intenção, é correlacionar esses índices com a obesidade, para estimular a prevenção e o controle dos principais fatores de risco para o desenvolvimento de doenças cardiovasculares, levando-se em consideração que a obesidade é fator facilitador dessas doenças. O trabalho fez a separação de três grupos de adolescentes. Os eutróficos (peso normal), os com sobrepeso e os obesos. Do total, quase a metade (49%) estava acima do peso adequado. A hipertensão arterial nos estágios 1 e 2 foi detectada em 4%. A maioria dos eutróficos (72%) não apresenta fatores de risco cardiovascular. Em contrapartida, os outros dois grupos têm 42% de adolescentes com riscos de desenvolver doenças no coração. Além disso, os que estão com excesso de peso apresentaram glicemia alterada e resistência à insulina. Elevações nos triglicerídios e LDL (colesterol ruim) foram observadas em todos os grupos. De acordo com o estudo, o fator de risco mais prevalente no grupo À esquerda, Aline Chaves antes da cirurgia. À direita, com 36 quilos a menos após seis meses da cirurgia bariátrica. com excesso de peso foi a circunferência abdominal (CA) alterada, constatada em 60% dos participantes. Segundo o gastroenterologista Gutemberg Fernandes de Araújo, a CA alterada representa uma grande quantidade de gordura visceral no abdômen. “Isso pode resultar numa maior probabilidade para o desenvolvimento de doenças cardiovas- culares”, explicou. Segundo a coordenadora, o projeto é relevante, sobretudo, pela detecção de alterações não só nos obesos. “O estudo demonstra a importância do diagnóstico precoce de fatores de risco cardiovascular, bem como a necessidade em se adotar ações educativas que tenham como objetivo estimular mudanças no estilo de vida dos adolescentes, especialmente aquelas relacionadas com o desenvolvimento de hábitos alimentares mais saudáveis, prática de atividades físicas e controle do peso corporal, medidas que podem prevenir o desenvolvimento de obesidade e das comorbidades associadas”, declarou Camila Polisel. Aline Chaves, que apareceu no início desta repor- tagem, estava incluída nas estatísticas de obesidade no Brasil. Vinda de uma família de pessoas que também enfrentam o problema, Aline, que nasceu em Fortaleza, no Ceará, veio para São Luís trabalhando como missionária. As atividades que tinha que desenvolver por conta de sua profissão exigiam um bom condicionamento físico, pelo fato de ter que visitar vários lugares e caminhar bastante. A partir daí, começou a sentir as consequências de estar muito acima do peso (chegou a pesar 120 kg, com 1,58 cm de altura), sendo diagnosticada com obesidade mórbida. As dores no corpo se tornaram cada vez mais frequentes e sua pressão arterial começou a oscilar. “A minha família toda tem pressão alta e diabetes. Eu fiquei no limite dessas doenças, já sabendo que eu iria desenvolvê-las”, disse. A vida de Aline teve que se adequar à doença, como conta. “Eu pensava várias vezes se deveria ou não sair com meus amigos. Eles caminhavam mais rápido e eu Revista Inovação nº 22 / 2014 41 não conseguia acompanhar e sempre ficava pra trás. Alguém sempre tinha que voltar pra ficar comigo e eu poder continuar”. Aline declarou que a junção de situações semelhantes a essa faziam com que sua autoestima diminuísse cada vez mais. O Dr. Gutemberg Araújo, afirma que, além de outras complicações, as pessoas obesas têm uma maior propensão a desenvolver doenças psicológicas e psiquiátricas ao enfrentar o preconceito da sociedade. Sobre as demais consequências da doença, o médico, que é especialista em cirurgia bariátrica e metabólica, afirmou que “a obesidade é considerada fator de risco para uma série de doenças, tais como, hipertensão, doenças cardiovasculares, diabetes, sendo que a união dessas doenças pode ocasionar na síndrome metabólica, que, por sua vez, pode resultar em derrames cerebrais e infartos. Quando o nível 42 Revista Inovação nº 22 / 2014 de obesidade atinge o que consideramos mórbida (IMC maior que 40) surgem as outras doenças associadas como a apneia do sono, doenças articulares, infertilidade, maior propensão ao câncer, sobretudo de mama, útero e intestinal”, detalhou. DE OLHO NO CARDÁPIO Ainda sobre a obesidade, uma pesquisa ligada à Universidade Federal do Maranhão (UFMA) trata da influência de fatores sociodemográficos e nutricionais na ocorrência da doença em pacientes adultos atendidos em unidades básicas de saúde em São Luís. O trabalho tem a coordenação da professora mestre e nutricionista Deysianne Costa das Chagas, e a equipe é composta por graduandos, professores e profissionais de Nutrição. O estudo realizado com maiores de 18 anos já atendeu 440 pacientes com excesso de peso nas unidades de saúde dos bairros da Vila Janaína, Radional e Anjo da Guarda, na capital maranhense. Já foi observado que, em geral, as pessoas consomem dietas balanceadas em termos quantitativos. O aspecto qualitativo, no entanto, não é adequado. “Conseguimos ver, por exemplo, que a quantidade de gordura consumida estava dentro das recomendadas pelo Ministério da Saúde, só que essa quantidade era composta, na grande maioria, por gorduras saturadas, que é a gordura que não faz bem à saúde”, contou Deysianne Chagas. Sabe-se que o comportamento alimentar das pessoas é uma das principais influências para o aumento da massa corporal. A alimentação de Aline Chaves, por exemplo, era composta de grandes quantidades de arroz, feijão, macarrão e chocolates, o que piorou TABELA 1 Conheça a classificação do excesso de peso e o risco para a saúde. IMC Classificação Risco para a saúde Menor que 17 Magreza excessiva Aumentado 17 a 18,5 Magreza Moderado 18,6 a 24,9 Peso normal Normal 25 a 29,9 Sobrepeso Pequeno 30 a 34,9 Obesidade classe I Moderado 35 a 39,9 Obesidade classe II Aumentado Acima de 40 Obesidade classe III ou Obesidade mórbida Muito aumentado seu estado de saúde. Mas, em outubro de 2013, ela começou a deixar a obesidade no passado quando decidiu fazer a cirurgia bariátrica, conhecida como redução de estômago. A decisão pelo procedimento cirúrgico se deu pelo intenso sofrimento que a doença trouxe a sua vida. Após a realização de uma série de exames, Aline foi submetida à cirurgia. Ela conta como se sente hoje, seis meses depois da cirurgia, já tendo perdido 36 quilos. “As dores no joelho passaram, as pernas não incham mais. Ainda sinto um pouco de dor na coluna, porque meu corpo carregava 36 kg a mais. A coluna tem que se adaptar agora. Hoje, todas as minhas taxas estão dentro do padrão e até melhores do que meu médico esperava”, comemorou. VIGITEL 2013 Diante da insistente tendência de crescimento dos índices relacionados ao excesso de peso e obesidade, os dados da mais recente pesquisa Vigitel, revelaram que, pela primeira vez em oito anos consecutivos, esses índices no Brasil permaneceram estáveis. Os números indicam que 51% dos brasileiros estão acima do peso, enquanto 18% estão obesos. Porém, apesar desse avanço, a pesquisa também mostrou que a população ainda permanece com hábitos alimentares inadequados, o que mantém a necessidade de combate e prevenção da doença. Os números constatam que 17% dos brasileiros trocam o almoço ou jantar por lanches, como pizzas, sanduíches ou salgados diariamente. Além disso, o consumo de gordura saturada chega a 31%. De todos os entrevistados, 23% ingerem refrigerantes, no mínimo, 5 dias por semana. A pesquisa também constatou que São Luís ainda é a capital com menor porcentagem de indivíduos com excesso de peso e obesidade, 42% e 13% respectivamente. Para a nutricionista Deysianne Chagas, os resultados das últimas pesquisas preocupam. “Os últimos levantamentos comprovam que mais da metade dos adultos brasileiros estão com excesso de peso. Apesar de São Luís não estar na ponta inicial, isso ainda é sério. A gente vê que se não for feito nada, se a educação nutricional não começar desde a infância, esses índices só tendem a piorar”, finalizou. fica o excesso de peso em adultos. “A medida de massa corporal mais utilizada tem sido o peso isolado ou peso ajus tado para a altura. Para obtê-lo em adultos, o parâmetro utilizado mais comumente é o do índice de massa corporal (IMC)”. Para chegar ao IMC, basta pegar o peso em quilos e dividir pelo quadrado da altura em metros. “Por meio desta conta, classificamos as pessoas como saudáveis de 18,5 a 24,9. A partir de 25, existe excesso de peso. A partir de 30, denominase obesidade”, afirmou. Diante da realidade mundial em relação ao excesso de peso e à obesidade, é necessário que toda a população brasileira compreenda que esse é um mal que, se não for tratado com a devida seriedade e atenção, pode trazer graves riscos à saúde. Sendo assim, mudanças para hábitos alimentares mais saudáveis, com a ingestão de frutas, legumes e hortaliças e a redução de alimentos ricos em gorduras, juntamente com a prática de atividades físicas pode, sim, salvar muitas vidas. CALCULANDO O IMC O Dr. Gutemberg Araújo explica como ocorre o cálculo que veri- Pesquisa apoiada pelo edital AEXT/FAPEMA 019/2012, sob protocolo: 1614/2012 Revista Inovação nº 22 / 2014 43 CIÊNCIAS BIOLÓGICAS 44 Revista Inovação nº 22 / 2014 Reposição hormonal Amora e soja podem ser alternativas naturais para diminuir desconforto de mulheres na menopausa Por Tatiana Salles Fotos arquivo pessoal e divulgação O s quarenta anos trazem consigo a maturidade, mas também alguns desconfortos sentidos literalmente na pele e no corpo da mulher, a famosa fase da menopausa. A menopausa é um período de transição em que a mulher passa da fase reprodutiva para a fase de pós-menopausa. Dessa forma, a menopausa ocorre durante o climatério (transição do período reprodutivo ou fértil para o não reprodutivo). Nesse período, há uma diminuição das funções ovarianas, fazendo com que os ciclos menstruais se tornem irregulares, até cessarem por completo. Revista Inovação nº 22 / 2014 45 Estatisticamente, a menopausa ocorre em média aos cinquenta anos. O climatério tem início por volta dos quarenta e se estende até os 65 anos. Essa fase se dá em função do desequilíbrio hormonal, que causa modificações no funcionamento fisiológico e psicológico da mulher, que tende a ficar mais irritada, com sintomas depressivos e sentir mal-estar. Mas nem tudo está perdido. Para amenizar esse período de desconforto e manter uma boa saúde, há uma alternativa: a Terapia de Reposição Hormonal (TRH). Segunda a ginecologista da Secretaria de Estado da Saúde do Maranhão, Ana Maria Nogueira Silva, a TRH é um tratamento que tem o objetivo de aliviar vários desconfortos causados pela menopausa. “A menopausa é uma fase natural da vida de todas as mulheres. É nesse período que o corpo feminino para de produzir os hormônios estrógeno e progesterona e, por isso, a Terapia de Reposição Hormonal é indicada”, explicou. A reposição hormonal é uma terapia que deve começar no climatério, ou seja, na fase de transição do período fértil para o não-fértil, a fim de amenizar as alterações no corpo provocadas pela diminuição dos hormônios femini- 46 Revista Inovação nº 22 / 2014 nos. A Terapia de Reposição Hormonal feminina consiste na utilização de hormônios (sintéticos ou naturais) para substituir o estrógeno e a progesterona que os ovários deixam de produzir nesse período. “O tratamento geralmente é realizado com dosagens relativamente baixas de estrógenos, por via oral ou transdérmica, que são adesivos sobre a pele ou gel”, disse Ana Maria Nogueira. Algumas recomendações sobre a reposição hormonal, no entanto, devem ser levadas em consideração como a não indicação para mulheres com câncer de mama ou endométrio, pacientes com trombose e problemas de coagulação, pessoas que já tiveram infarto ou derrame cerebral e pessoas com doenças graves do fígado, por exemplo. Quanto à indicação, a médica diz que, de acordo com o Comitê de Nomenclaturas da Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia, o tratamento é indicado para mulheres que deixaram de produzir os hormônios estrógeno e progesterona. “Para mulheres que retiraram o útero, no entanto, não há necessidade de reposição de progesterona, uma vez que a função da substância é evitar o risco de cancro do útero associado aos estrógenos”, afirmou, lembrando que o tratamento existe para aliviar os sintomas e não para inter- romper o processo da menopausa. A psicopedagoga Dolores Melo revela que sentiu muitos desses incômodos a partir dos 45 anos. Nesse momento, ela procurou ajuda médica para iniciar o tratamento de reposição hormonal. Só então começou a sentir alguma melhora. “Sentia muito calor, corpo quente, ressecamento da pele, então busquei acompanhamento médico e usei os discos adesivos. Isso ajudou bastante para acabar com os desconfortos”, lembrou. DE MULHER PRA MULHER Os sintomas variam de mulher para mulher. Enquanto algumas sentem muitas manifestações da menopausa, outras, nem tanto, como é o caso da operadora de marketing, Maria das Graças da Anunciação, de 57 anos. Ela parou de menstruar aos 47 anos e diz nunca ter sentido os sintomas relatados pela maioria das mulheres. A esse fato, Maria das Graças atribui o cuidado com alimentação balanceada que teve desde a adolescência. Ela conta que não consome frituras e carnes gordurosas. “Nunca fiz reposição hormonal, mas sempre tive cuidado com alimentação. Consumo alimentos a base de soja e seus derivados, abuso das frutas, legumes, fibras e folhas. Acho que isso contribui bastante. Me sinto bem até hoje”, falou, satisfeita. A soja e seus derivados são ótimas opções para uma reposição hormonal natural, podendo ser utilizados por todas as mulheres sem restrições e sem provocar efeitos colaterais ou interações medicamentosas. No entanto, segundo a médica Ana Maria Nogueira, os alimentos são importantes para manter o equilíbrio hormonal, mas às vezes é necessário fazer uma reposição dos hormônios. “Para isso, um médico deve ser con- CONTRAINDICAÇÕES ABSOLUTAS DA REPOSIÇÃO HORMONAL • Insuficiência hepática • Câncer de mama • Câncer de endométrio • Triglicerídeos altos, acima de 750mg/dl pelo risco de pancreatite • Porfiria • Sangramento genital anormal de causa desconhecida • Trombose venosa profunda • Doença coronariana Mulheres que tenham sido diagnosticadas com estas doenças não podem realizar a terapia de reposição hormonal clássica pelo risco de aumento da gravidade de suas doenças, mas podem recorrer à terapia de reposição hormonal natural para vencer os incômodos da menopausa, pois existem alternativas fitoterápicas para isto. CONTRAINDICAÇÕES RELATIVAS DA REPOSIÇÃO HORMONAL • Fumar • Hipertensão arterial tratável • Diabetes • Dislipidemia Estas situações merecem alguma atenção por parte do médico, pois os medicamentos utilizados na terapia de reposição hormonal podem trazer riscos para a paciente. Se forem utilizados na apresentação e na quantidade correta, podem trazer mais benefícios que malefícios, e isto fica a critério da mulher e do médico. Pesquisa apoiada pelo edital UNIVERSAL/FAPEMA 030/2010, sob protocolo: 405/2011 Revista Inovação nº 22 / 2014 47 Equipe da pesquisa que analisa o uso da amora como repositora hormonal durante a menopausa. Elaine, Caroline, Marilene, Selma e Renata. sultado, a fim de que seja realizada a intervenção de acordo com o caso”, alertou. Já para a relações públicas Dalete Sampaio, a chegada da menopausa não foi tão tranquila. “Minha menstruação vinha a cada dois meses e, com o tempo, o espaçamento foi aumentando. Eu tinha insônia, sentia ondas de calor, suava até mesmo em lugares refrigerados, era muito desconcertante”, contou. Foi então que Dalete procurou um médico, realizou exames de praxe e iniciou um tratamento com uso de creme. Porém, sem sucesso. “Usei o creme não gostei. Resolvi procurar outro especialista que me aconselhou remédios naturais. Hoje estou bem e raramente sinto uma pequena onda de calor”, observou. Marilene Oliveira da Rocha Borges, que investiga os efeitos dos fitoestrogênios ou fitohormônios como alternativa natural à terapia de reposição hormonal. 48 Revista Inovação nº 22 / 2014 A ginecologista acrescenta à lista de desconfortos sentidos durante a menopausa outros sintomas que podem variar de mulher para mulher, como insônia, diminuição do desejo sexual, osteoporose, ressecamento vaginal, dor durante o ato sexual e diminui- ção da memória. Ela explica que, além de suavizar essas reações, o tratamento de reposição hormonal traz outros benefícios. “Com o tratamento, as doenças cardiovasculares e osteoporose podem ser prevenidas, já que melhora o cálcio no esqueleto, age beneficamente nos níveis de colesterol bom (HDL) e diminui a possibilidade de doença coronariana”, pontuou. PESQUISAS NO MARANHÃO No Maranhão, existem trabalhos na busca de tratamentos alternativos de reposição hormonal. As pesquisadoras Marilene Oliveira da Rocha Borges e Selma do Nascimento Silva, desenvolvem respectivamente os estudos Efeito de fitoestrógenos na reposição hormonal em ratas ootorectomizadas e Efeito de Morus Nigra L (amora) como terapia de reposição hormonal em ratas oofectomizadas. As pesquisas são apoiadas pela Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão (FAPEMA). A pesquisa da professora Marilene Borges, que é doutora em Farmacologia, aborda a utilização de fitoestrogênios ou fitohormônios como alternativa natural para mulheres com contraindicação, medo ou receio de usar a terapia de reposição hormonal. Já a pesquisadora Selma Silva, analisa em seu trabalho o uso da amora como repositora hormonal durante a menopausa. Marilene Oliveira Borges explica que a terapia de reposição hormonal é uma forma eficaz para o tratamento das condições relacionadas com a pósmenopausa, entretanto está relacionada à presença de efeitos indesejáveis, que levam muitas vezes ao abandono pelas mulheres. “Por causa das mulheres que temem esse tratamento, tem sido cada vez mais frequente a busca de alternativas seguras para tratamento desses sintomas, como os fitoestrógenos”, falou. Os fitoestrógenos são compostos naturais de origem vegetal cuja estrutura e função se assemelham ao estradiol, o hormônio ovariano feminino. Mas, segundo a doutora Marilene Borges, apesar do emprego dos fitoestrógenos ter se difundido muito nos últimos anos, os estudos científicos que comprovam o seu benefício ainda são contraditórios, o que motivou o estudo das pesquisadoras. “Queremos avaliar o efeito das isoflavonas de soja e da amora utilizadas pela população feminina a fim de contribuir para o conhecimento sobre suas propriedades benéficas nos sintomas do climatério”, explicou. Os estudos das pesquisado- ras foram experimentais, realizados em animais. Segundo Marilene Borges, nesses animais foram investigados os efeitos dos produtos naturais no peso corporal e consumo de alimento, no esfregaço vaginal, na concentração hormonal e bioquímica do sangue e na histomorfometria da mama e útero. “Mostraram os nossos resultados que a administração oral de isoflavonas de soja, durante noventa dias consecutivos, diminuiu o peso corporal e a gordura total dos animais. Não alterou a concentração endógena do estradiol, glicose, colesterol total e triglicérides, porém aumentou o HDL, que é o colesterol bom, mostrando um efeito benéfico das isoflavonas no metabolismo dos animais”, detalhou. A pesquisa mostra, ainda, que as isoflavonas de soja não alteraram, na dose empregada, a histomorfometria endometrial e mamária indicando que o uso delas, pelo período do tratamento de noventa dias, não estimulou o útero e as mamas, o que também é bom para um tratamento de longo prazo. “Os resultados obtidos com as isoflavonas vem de encontro a outros estudos empregando doses e tempos de tratamento diferentes”, considerou a pesquisadora. Já na pesquisa de Selma do Nascimento Silva, doutora em Biotecnologia de Produtos Naturais, a outra espécie vegetal estudada, as folhas de amora, apesar da dose de seu extrato hidroalcoólico ter induzido redução do peso corporal dos animais, foi observado que esta dose estimula o útero. “Vimos aumento no peso do útero e efeitos proliferativos na análise dos tecidos uterinos”, disse. Ela explicou que esse efeito é visto com cautela. “A estimulação uterina não deve ser desejada em um tratamento para reposição hormonal”, ponderou. O extrato das folhas da amora também diminuiu a concentração de triglicerídeos no sangue. Os resultados apresentados pelas pesquisadoras mostraram os efeitos benéficos que o consumo dos fitoestrógenos avaliados (isoflavonas de soja e amora) promovem após a menopausa, mas as pesquisadoras fazem uma ressalva. “Assim como para todos os produtos naturais utilizados pela população, devem ser considerados a dose e o tempo de tratamento empregados e, ainda, a avaliação da toxicidade, fatores importantes para o uso racional e seguro dos produtos”, concluíram. Pesquisa apoiada pelo edital UNIVERSAL/FAPEMA 004/2010, sob protocolo: 1156/2010 Revista Inovação nº 22 / 2014 49 CIÊNCIAS BIOLÓGICAS Futuro o d a ç a ame Sustentabilidade da pesca artesanal no Maranhão é avaliada a partir da experiência no município de Guimarães Por Ivandro Coêlho Fotos Roberto Santos Ramos A pesca artesanal é uma prática milenar que vem garantindo alimento e renda para diversas comunidades costeiras e ribeirinhas, além de abastecer os centros urbanos que utilizam recurso pesqueiro, principalmente no setor de alimentos. No Maranhão, essa atividade está atualmente marcada por problemas e incertezas quanto ao futuro, devido, principalmente, à exploração predatória dos recursos naturais e às fragilidades das políticas governamentais voltadas para a pesca. Foi partindo dessa observação que o professor Roberto Santos Ramos, da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), decidiu empreender um diagnóstico de cunho social, econômico, tecnológico e ambiental da atividade pesqueira no município de Guimarães, localizado no litoral ocidental do estado. O objetivo do estudo foi avaliar a sustentabilidade da pesca artesanal praticada naquela localidade e, a partir daí, apontar subsídios para uma política de gestão e manejo ambiental pesqueiro na região. Revista Inovação nº 22 / 2014 51 Embora a pesquisa esteja focada na cidade de Guimarães, as informações obtidas também podem ser utilizadas para analisar outros municípios do litoral maranhense que desenvolvem essa atividade, tanto em relação à precariedade da assistência técnica, social, econômica e operacional oferecida, como pelo grande aumento das taxas de exploração dos peixes, impulsionadas pelas demandas de segurança alimentar e produção econômica. “A pesquisa é fundamental para explicar os fenômenos de esgotamento de recursos pesqueiros, além ensejar a reflexão sobre a pesca predatória e sobre todas as nuances voltadas para as pescarias”, esclareceu o professor Roberto Ramos, que atualmente leciona no campus de Pinheiro/UFMA, no curso de Licenciatura em Ciências 52 Revista Inovação nº 22 / 2014 Naturais, e desenvolve atividades junto ao Grupo de Estudos Socioambientais das Zonas Úmidas da Baixada Maranhense (GES-BM). O interesse do professor Roberto Santos Ramos pela pesca artesanal e pela cidade de Guimarães tem raízes na própria experiência pessoal e familiar do pesquisador. No início da década de 80, Ramos fez várias viagens de barco com seu pai, Manoel Leonardo Ramos, saindo da rampa Campos Melo, em São Luís, com destino à cidade de Guimarães. Nessas viagens, o porto era sempre o lugar mais movimentado, não só pelas viagens comerciais de barco, mas pelo descarregar das embarcações que chegavam de longas distâncias em busca do peixe. Esse cenário encantou o menino e futuro pesquisador. O estudo do professor Roberto Ramos tem como base os resultados de uma dissertação apresentada junto ao Programa de Pós-Graduação (mestrado) em Sustentabilidade de Ecossistemas da UFMA, que depois deu origem ao livro intitulado A sustentabilidade da pesca artesanal do município de Guimarães: desafios emergentes. A publicação da obra foi patrocinada pela FAPEMA, por meio do Programa de Apoio à Publicação, e foi editada e publicada pela Editora da Universidade Federal do Maranhão (EDUFMA). DIAGNÓSTICO Uma das constatações da pesquisa é de que há um aumento do esforço de pesca nas capturas (maior tempo no mar, maior comprimento das redes, embarcações de maior potência, mais pescado- TIPOS DE EMBARCAÇÃO Bote: Embarcação que varia de pequeno a médio porte, o comprimento varia de 6 a 10 metros. Possui a proa (frente da embarcação) fechada, pois utiliza uma peça chamada beque de proa que faz parte da armação da embarcação. Utiliza como petrechos, a serreira e a pescadeira (camurim, pirapema, gurijuba etc). Abarca até 1000 metros de rede. Normalmente é motorizado. Sua autonomia em alto mar varia numa média de 7 dias. Biana boca fechada: Formato da proa achatada. Segundo pescadores, é a melhor embarcação para o mar. Ela acompanha a onda, portanto tem mais velocidade. Possui toldo (espécie de cabine), por isso se diz que ela é fechada. Usa-se como principais petrechos espinhel, zangaria, pescadeira e serreira. Pode abarcar como tamanho de rede de 1000 a 1500 metros. Usa-se como propulsão o motor e a vela. Sua autonomia de viagem varia em torno de 8 dias. Copama: Embarcação de médio porte de tamanho fixo. Constituído de fibra de vidro. Utiliza como petrechos pescadeira e serreira. Pode abarcar até 2000 metros de rede. Como propulsão, usa-se motor de centro variando de 20 a 40 hp. Sua autonomia de pesca em alto mar varia de 6 a 8 dias. Biana boca aberta: Possui as mesmas características da biana boca fechada, só que sem o toldo. O petrecho mais utilizado é a malhadeira com a metragem chegando até 1500 metros. Bastardo (curicaca): Embarcação de pequeno porte com média de 5 metros de comprimento. Utiliza todos os tipos de petrechos de pesca. Podendo abarcar até 500 metros de rede. Sua autonomia de pesca é normalmente de um dia. Canoa: Embarcação de pequeno porte. Utiliza comumente como artes de pesca, a sajubeira, espinhel, guizo (pulsar), pesca de linha, curral. Não se distancia da costa, ficando normalmente em águas mais paradas no estuário. É propulsionada a remo, utiliza a volga como suporte. Suporta de 100 a 500 quilos de peixe. Revista Inovação nº 22 / 2014 53 sultados abaixo do potencial produtivo da região, comprometendo a sua sustentabilidade ambiental, social, econômica e tecnológica. PESCADORES E COOPERATIVAS No Maranhão, existem cadastrados no Ministério da Pesca e Aquicultura, aproximadamente 100.000 pescadores. Ao longo de décadas, diversas instituições dedicadas à promoção do chamado “desenvolvimento” suscitaram entre os pescadores a constituição de sociedades cooperativas, no entanto, estas organizações não perduraram por muito tempo. Os efeitos dessas políticas são percebidos até hoje, sendo que muitos pescadores tornaram-se avessos a novas iniciativas dessa natureza. Observando essa realidade, o pesquisador o engenheiro de pesca e mestre em Sustentabilidade de Ecossistemas, Tito Carvalho Tsuji, também se debruçou sobre a pesca artesanal no Maranhão. Prestes a lançar o livro Pescadores e cooperativas: um olhar sobre pescarias e sustentabilidade com o apoio da FAPEMA, ele analisou as iniciativas de constituição de cooperativas de pescadores no Maranhão. “Parti do ponto de vista dos pescadores envolvidos com as res envolvidos, etc). “Mas isso necessariamente não significa maior produção, pois as capturas principalmente em larga escala, de um modo geral, ultrapassam o nível ótimo de sustentabilidade dos estoques pesqueiros, comprometendo, assim, a capacidade de renovação dos estoques”, alertou o pesquisador. 54 Revista Inovação nº 22 / 2014 cooperativas, ou seja, centrei a observação buscando desvendar, de sua lógica, de sua ótica, os motivos do insucesso desses empreendimentos. É possível dizer que os pescadores sócios das cooperativas vêm de um contexto cheio de transformações. Nascidos em comunidades tradicionalmente pesqueiras, estes pescadores aprenderam seu ofício com seus familiares e integrantes de suas comunidades, num processo que envolve prática e oralidade, que lhes confere um conhecimento profundo sobre os ambientes onde estão inseridos. Entre os anos 60 a 80 esses pescadores vivenciaram transformações, produzidas pelo cenário político econômico que o Estado atravessava e que introduziram modificações em seus sistemas de pesca, que passou a depender do mercado para a venda de sua produção e aquisição dos instrumentos de trabalho”, explicou Tsuji. Pesquisa apoiada pelo edital APUB/FAPEMA 010/2012, sob protocolo: 98577/2014 De acordo com o professor Antônio Carlos Leal de Castro, que prefaciou o livro, as informações obtidas nessa pesquisa confirmam a hipótese de que a prática da atividade pesqueira artesanal nos moldes atuais no município de Guimarães (sem controle, sem organização social para atividade e sem ordenamento) produzem re- “Os resultados alcançados refletem com propriedade a problemática vivenciada pelos pescadores no seu cotidiano, a etnobiologia, o conhecimento tradicional e a ausência de políticas públicas para o setor. Fatores que se agregam e definem a dinâmica pesqueira da região da bacia hidrográfica de Cumã e, por extensão, de todo o litoral ocidental maranhense”, declarou. ALTERNATIVAS Uma das saídas viáveis para superar os desafios que se impõem diante das altas taxas de exploração do recurso pesqueiro, segundo o professor Roberto Ramos, são os cultivos como forma de diminuir a pressão sobre os estoques naturais. Além disso, é preciso identificar novas espécies de valor econômico e incentivar a conquista de novos mercados, a fim reabilitar os estoques comprometidos ou os que diminuíram as capturas, entre elas cambéua, cangatã, pescada, tainha e xaréu. O professor defende ainda que as políticas pesqueiras devam se adequar à realidade local e que aproveitem o conhecimento tradicional. “O reconhecimento dos múltiplos saberes e sua respectiva integração com o conhecimento científico é justo, oportuno e necessário para fazer valer a pluralidade e, junto a ela, o saber tradicional, o que certamente garantirá a permanência das comunidades locais e a sustentabilidade dos seus territórios e modos de vida”, assegurou o pesquisador. Pesquisa apoiada pelo edital APUB/FAPEMA 010/2012, sob protocolo: 23862/2014