Composições Narrativas Contos Populares As bruxas Antigamente, quando nós éramos pequeninas, que fazíamos os serões, os nossos abós diziam-nos sempre alguma coisa. Mas isto, que ela me contou, a minha abó, era berdadeiro, mesmo. A abó…, o abô dela, da minha abó, já na altura, naquelas alturas diziam que havia muitas bruxas e labisomes… naquela altura habia. E então habia as horas de rega, habia as horas de rega p’ra regarem. Como ó pobo tinha… regaba daquela força, regabam mais pessoas, num é …tinham aquelas horas. E então, uma altura, o meu abô, da minha abó, foi lá regar das duas às quatro horas. Chegaba lá, a poça estaba sempre bazia. E ele começaba a ralhar e começabam-se a rir, a bater palmas, dentro duma mina, que tinha. E então eles diziam que eram as bruxas. Ao outro dia tornaba lá, era na mesma. E ele disse: - Não, desta bez elas pouco de mim num bão fazer. Pegou numa navalhinha que lebaba. E disse assim: - Eu bou fazer e acontecer. Andavam a dançar e a bater as palmas, dizia ele, e ele pegou numa navalhinha e picou uma. E ficou ali aquela menina, nua, porque as bruxas que andabam sempre nuas, num sabiam, porque elas saíam de casa e àquela hora tornabam, num é, mas não sabiam que eram. E então ele pegou num casaco, bestiu-a e trouxe-a p’ra casa e deitou-a a dormir com a filha. E aquela filha… E depois ela disse de donde era. Era de Lamego. E eles foram lá levála, que antigamente nem havia carros, e elas tinham um burro. Quase todos tinham, assim, um burrito, e foram lá levá-la. E depois os pais até ficaram muito agradecidos, que num sabiam, já andabam todos aflitos por num saber da filha, e até lhe deram coisas, depois, para eles trazerem, que eram pobres e … ficaram todos contentes. E quebrou-lhe o fado, porque depois de serem picadas, quebrou-lhe o fado. Mas… foi a essa, porque continuava, continuou muito tempo a ser essa coisa das bruxas. Corina Gomes Pereira Silva, 68 anos, Bertelo Os labisomes Conforme havia as bruxas, num é, também habia os labisomes… As bruxas, pronto, ficabam assim… eram… como eram. Os labisomes diz que eram transformados em cabalos, mesmo. E, às bezes, os antigos diziam mesmo, de noite, sentiam aqueles barulhos e nós aqui, num é, que estamos aqui numa laguinha, que vai ter ao rio, chamamos-lha ribeira, e depois eles diziam: - Por aquela ribeira abaixo, aqueles cascos dos cabalos até faziam lume. E eram os labisomes. Mas era só de noite, porque àquela hora demarcada, amanhecendo o dia, transformavam-se na pessoa que eram. Ao outro dia podiam virar outra bez ao mesmo labisome, mas naquele dia… ficabam até amanhecer. De noite, só de noite é que era. Logo que lá está, mas muitos já sabiam, agarrabam aquelas agulhetas que primeiro pica… espicaçabam os bois e os cabalos e assim, logo, ao eles passarem, aqueles mais robustos que num tinham medo, com aquele ferrão que os picassem, ficabam na mesma pessoa; ficaba homem como ficou… como ficaba a bruxa. Maria Natália Gomes da Silva, 62 anos, Bertelo Era a olibeira… Uma altura, o meu pai era enxertador, e andaba na Cumieira, nas enxertias, depois… nas enxertias, era a de comer, e comiam também à noite. Entretinham-se mais um bocadinho, comiam… e vinha mais tarde. E era na altura… naquela altura havia… ele dizia que havia as bruxas. E depois ele vinha a pé da Cumieira p’ra baixo, de noite. Beio uma noite, que era muito luar, chegou ali ao Carbalhal, biu no meio da estrada uma meda de sombras a dançar, e ele: - Ai, que estão ali as bruxas! Como hei-de fazer? Se bou p’r’ó caminho de Santa Bárbara, estão elas ali; se bou por aqui, estão elas ali. Como bou fazer? Mas ainda parou, com medo. Conforme binha o vento, mais elas dançabam. Diz ele assim: - Eu tenho que passar, seja como for. Afinal, ao passar, eram… o luar… era uma olibeira, que fazia o luar. Conforme binha o vento, dançaba no meio da estrada, e ele cheio de medo. Estaba a ber se tornaba p’ra trás… e num era, era a olibeira. Maria Natália Gomes da Silva, 62 anos, Bertelo O Morto da Beiga Antigamente, foi muito antigamente, mas pronto, ainda é de lembrança dos meus pais e assim. Na Veiga, morreu um homenzinho. Morreu um homem e foram todos ao funeral. Primeiro era o caminho belho, num havia carros p’ós lebar, tinham que os lebar a subir a costa, sempre ao ombro. Quando chegaram ao cemitério, abrem o caixão p’ra… p’ra dizer o responso, o home pôs-se a pé, começou a fugir. Por isso lhe chamaram o Morto da Beiga, que ainda hoje é a família dos Mortos da Beiga. E é o morto-bibo. Toda a gente lhe chamaba o morto-bibo, porque chegou lá estaba morto… estaba bibo! Maria Natália Gomes da Silva, 62 anos, Bertelo