REVISTA ÂMBITO JURÍDICO ®
Desconto s?diante cadastro
Depois dos programas de fidelidade, estabelecendo premiações para os consumidores fiéis que atinjam determinado número de pontos, a moda
agora no mercado de consumo é o desconto no cartão do fornecedor.
Essa prática foi adotada por quase todas as grandes redes de drogarias e supermercados e consiste em conceder descontos exclusivamente para os
consumidores que possuem o cartão do estabelecimento. Apenas aqueles que exibem o cartão ou têm o seu CPF cadastrado têm direito ao
desconto.
No começo, esses descontos eram pequenos e não faziam grande diferença no bolso daqueles que não se cadastravam. Hoje, entretanto, vemos
casos de remédios sendo vendidos pelo dobro do preço para os consumidores não cadastrados.
O direito do consumidor determina a igualdade nas contratações, o que significa que o fornecedor não pode fazer distinções, de preço e nas
condições de venda, ao seu talante ou de acordo com a aparência, o sexo, a idade, a religião, a classe social, a raça, etc.. As condições oferecidas
no mercado devem ser parecidas para todos os consumidores, ainda que não tenham que ser rigorosamente idênticas por conta de uma série de
variantes.
Qualquer discriminação, no atendimento e na venda, deve levar em conta os critérios constitucionais e legais. Vale dizer, é possível vender um
automóvel mais barato para deficientes físicos, em razão da previsão legal de isenções tributárias, assim como deve ser respeitado o direito de
preferência no atendimento dos idosos, gestantes e deficientes, a título de exemplo.
Além da distinção entre consumidores cadastrados e não cadastrados ser, no mínimo, discutível sob o ponto de vista legal, deve-se ter em mente
também que a abertura de cadastro depende da livre e espontânea vontade do consumidor.
O despropositado desconto que vem sendo concedido pelas drogarias, por exemplo, da ordem de 50%, faz com que o consumidor seja compelido a
se cadastrar. Do contrário, pagará o dobro do preço, já que, mesmo considerado o desconto concedido, estará preservada a margem de lucro do
fornecedor.
Isso significa que o consumidor se cadastra visando o desconto e não porque deseja ter seus dados armazenados pelo fornecedor, o que contraria
redação expressa do art. 43, §2° do CDC. O cadastro decorre da falta de opção do consumidor, que é refém das imposições dos fornecedores no
mercado de consumo.
E, por trás desses cadastros, vêm uma série de incômodos, como malas diretas de diversas outras empresas, oferecendo todo o tipo de produto,
alguns focados para um nicho específico do mercado, outros visando aos consumidores em geral.
Os cadastros contém informações sobre a profissão, o local da residência, sem falar que, no caso dos supermercados, permitem que seja traçado um
perfil de consumo de acordo com os produtos adquiridos e os gastos realizados, o que expõe a vida privada dos consumidores.
Afora todas essas conseqüências nocivas, alguns estabelecimentos ainda oferecem para os consumidores cartões de crédito como se fossem
cartões de desconto, o que, quase sempre sem informação prévia, sujeita o consumidor ao pagamento de anuidade e a transtornos para pedir o
cancelamento.
Entendemos que os fornecedores podem oferecer o cadastro aos consumidores, em troca de promoções, de pequenos descontos e condições de
pagamento diferenciadas, porque isso acaba diminuindo o risco de inadimplência e, consequentemente, possibilitando alguma distinção. Todavia, os
abusos que temos visto colocam o consumidor em situação de ainda maior vulnerabilidade, já que ou se sujeita ao cadastro ou paga o dobro pelo
produto que quer adquirir.
Problemas vêm sendo causados por bancos de dados e cadastro, comercializados livremente sem a anuência dos consumidores, em todo o mundo.
Sem dúvida alguma os problemas que têm sido vistos no Brasil merecem uma maior atenção do Legislativo e do Judiciário.
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