AU TO RA L UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO TO DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS ID O PE LA LE I DE DI R EI INSTITUTO A VEZ DO MESTRE EG DA INSERÇÃO DA CULTURA MARIA IVANILDES GONÇALVES DA SILVA BRAGA DO CU M EN TO PR OT NEGRA NO CURRÍCULO ESCOLAR ORIENTADOR: PROF. MARCO ANTÔNIO LAROSA PEÇANHA FEVEREIRO/ 2007 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS DA INSERÇÃO DA CULTURA NEGRA NO CURRÍCULO ESCOLAR MARIA IVANILDES GONÇALVES DA SILVA BRAGA Trabalho monográfico apresentado como requisito parcial para obtenção do Grau de Especialista Docência do Ensino Superior PEÇANHA FEVEREIRO/2007 EPÍGRAFE “Não somos iguais, somos diferentes, e não há na vida nenhuma qualidade tão universal como a diferença.” Montaigne DEDICATÓRIA Às minhas filhas, Paula Cristina e Fernanda Emmanuelle; aos meus irmãos, Cláudio, Maria Helena e Heleide , que não mediram esforços para me apoiar, incentivando-me sempre, estudando e pesquisando o tema comigo e, em especial , ao meu irmão Cláudio, que, além de fazer tudo acima citado, revisou o produto e, principalmente, presenteou-me com suas experiências e as de seus colegas neste campo. AGRADECIMENTOS “Nem olhos viram, nem ouvidos ouviram, o que Deus preparou para nós, um futuro certo cheio de esperança e paz...”. Compartilhar sonhos e crer que são possíveis determina a vitória. Realizar qualquer trabalho não é uma tarefa fácil e, mesmo que o fosse, nunca se faz só. Com este não foi diferente. Dentre os muitos que dele participaram, ressalto: Deus, que me fortalece e ilumina com Suas palavras: “não temas porque Sou contigo. Eu te criei e te fiz mais do que um vencedor”; minhas filhas, Paula Cristina e Fernanda Emmanuelle, meus pais, e todos os meus irmãos, pelo incentivo a caminhar. Não há palavras suficientes para expressar o quanto foram importantes. Cada um, a sua maneira, deu-me amor, apoio, compreensão. É um momento de glória e reconhecimento: a vocês a minha eterna gratidão! É muito bom saber que posso contar com vocês. RESUMO O presente trabalho tem como objetivo discutir a introdução da cultura afro-brasileira e africana no currículo, mais precisamente a sua presença e necessidade na aprendizagem; estudar teorias que apresentam hipóteses favoráveis e contrárias ao seu objetivo; visitar obras de autores renomados na área; apresentar problemas relativos à aprendizagem do aluno devido à utilização de linguagem de nível inadequado na mesma; apontar falhas na utilização dos elementos da comunicação em sala de aula; enumerar sucessos na utilização da teoria que propõe e afirmar a possibilidade de se rever a eficiência da educação. Utilizou como metodologia a documentação indireta bibliográfica, obtendo textos de enciclopédias, dicionários e livros da Biblioteca Pública Estadual de Minas Gerais, da Biblioteca Pública Municipal de Belo Horizonte, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), da Biblioteca Pública Municipal de Contagem, jornais, revistas e documentos particulares de profissionais da área. Concluiu-se que há falhas enormes na educação e uma delas, talvez a principal, é a necessidade de um preparo adequado para os profissionais envolvidos. E que a mesma se dá pelo uso indevido de material e preparo de conteúdos inacessíveis ao aluno, o que resulta em uma aprendizagem ineficiente. Faz-se necessário utilizar o nível do aluno, os seus conhecimentos e a sua cultura, propiciando maior convívio entre os mesmos e entre alunos e professores, tendo como objetivo de conquistar o respeito e a confiança no meio do que a educação se propõe. METODOLOGIA O presente trabalho foi realizado a partir de uma documentação indireta, envolvendo a pesquisa bibliográfica. Para esta foram obtidos textos de enciclopédias, livros e dicionários da Biblioteca Pública Estadual de Minas Gerais, jornais, revistas e documentos particulares de profissionais da área. Também foram consultados jornais e revistas. Uma pesquisa de campo foi feita: realizou-se uma visita à comunidade dos Arturos, em Contagem (MG), em 22 de março de 2006, com o propósito de conhecer as atividades de preservação da cultura negra lá executadas e realizar a seguinte entrevista: • Como é feito para que não se esqueçam as tradições e os costumes africanos durante tantas gerações. • Qual o maior desafio, na sua opinião, vivenciado pelos negros brasileiros hoje em dia, e quais as sugestões para combatê-lo ou amenizá-lo. • O combate ao preconceito racial no Brasil existe? Como está sendo feito? Haveria uma maneira diferente de ser realizado? Qual? • O Brasil é um país racista? Como eles vêm as oportunidades criadas pelo governo em relação ao negro? Por exemplo, a questão do número de vagas reservadas aos negros nas faculdades, nas empresas, etc. ÍNDICE Epígrafe ..................................................................................................... III Dedicatória .................................................................................................. IV Agradecimentos .......................................................................................... V Resumo ........................................................................................................ 07 Metodologia.................................................................................................. 08 Índice .......................................................................................................... 09 Introdução .................................................................................................... 10 Capítulo I - Fundamentação teórica ............................................................. 14 Capítulo II - A introdução do estudo da cultura afro brasileira e africana no currículo Escolar ...................................................................... 22 Capítulo III - Eliminando o preconceito ........................................................ 32 Capítulo IV - Onde, quando e o quê estudar ................................................ 41 Conclusão Anexo I ................................................................................................. 56 Anexo II ................................................................................................ 58 Apêndices .................................................................................................. 62 Apêndice I ............................................................................................ 62 Apêndice II ........................................................................................... 70 INTRODUÇÃO A cultura afro brasileira e africana foi introduzida no currículo escolar por ordem do governo federal, desde março de 2003. Esse assunto levanta várias dúvidas e controvérsias como, por exemplo, a importância dessa introdução, como ela será vivenciada, sem se tornar um preconceito e ainda de qual(is) área(s) ou conteúdo(s) específico(s) ela deverá fazer parte. A lei de Diretrizes e Bases (LDB) 9.394/96 foi alterada pelo governo federal, que sancionou, em março de 3003, a lei nº 10.639/03-MEC. Com a intenção de corrigir injustiças, eliminar discriminações e promover a inclusão social e a cidadania para todos, esta lei instituiu a obrigatoriedade do ensino da História da África e dos africanos no currículo escolar do ensino fundamental e médio, com o intuito de resgatar historicamente a contribuição dos negros na construção e formação da sociedade brasileira. O governo pretende, com esta medida, combater o racismo e promover a igualdade de oportunidades entre diferentes grupos étnicos que compõem a rica nação brasileira, e também romper com os entraves que impedem o desenvolvimento pleno da população negra brasileira. Garantir o exercício desta lei e forjar um novo modo de desenvolvimento com a inclusão é um desafio que impõe ao campo de educação decisões inovadoras e que merece um estudo detalhado sobre o assunto, competindo a cada educador conhecê-lo, questioná-lo e adequá-lo ao seu contexto profissional. Ou seja, para cada área ou conteúdo, para cada turma, uma estratégia. Na presente pesquisa, o autor se propõe a estudar o ponto de partida para a execução de tal Lei. Estabelece a cultura popular como tal, vez que é ela de que o aluno dispõe, e apresenta como arma que o mesmo utilizará para evoluir. Visita obras de estudiosos do assunto, projetos de professores renomados ou não, mas cujos resultados lhes conferem credibilidade. Cita textos dignos de estudo e discute opiniões contrárias à idéia. É objetivo do trabalho investigar e valorizar identidade, história e cultura dos afro brasileiros, garantindo-lhes igualdade e valorização das raízes africanas da nação brasileira; pesquisar os princípios e fundamentos para a execução e avaliação da educação afim de formar cidadãos atuantes e conscientes no seio da sociedade multicultural e pluriétnica do Brasil, buscando relações étnicos-sociais, rumo à construção de uma nação democrática, questionando as condições materiais e financeiras, assim como conteúdos e competências, atitudes e valores a serem estabelecidos em situações de discriminação, valorização e respeito à diversidade. O Brasil, ao longo de sua história, estabeleceu um modelo de desenvolvimento excludente, impedindo que milhões de brasileiros tivessem acesso à escola ou nela permanecessem. Ao analisar os dados que apontam a desigualdade entre brancos e negros, na educação, constata-se a necessidades de políticas específicas que revertam tal quadro. O ponto mais polêmico desta questão está nas cotas dos vestibulares. Faz-se necessário, melhorar o ensino médio e fundamental gratuito e, de quebra, auxiliar a população de baixa renda. É importante que os negros se reconheçam parte da cultura nacional, expressem visões de mundo próprias, manifestem-se, com autonomia individual e coletiva, pensamentos. Faz-se necessário, que haja punição às manifestações de racismo, garantias de que a lei criminal seja para todos, incluir em propagandas, livros didáticos e manifestações artísticas. Encarar o racismo de frente, pois a forma mais eficiente de reforçar o preconceito, é achar que ele não existe, que é natural, e o principal problema não se encontra em lutas sangrentas entre brancos e negros, mas bem velada, nos detalhes do dia-a-dia, nas piadinhas sem conseqüências. A cultura africana oferece elementos relacionados a todas as áreas do conhecimento.”Não podemos esperar mais para virar essa página na nossa história.”, diz OLIVEIRA, (s/d) professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense. “Cada professor pode colocar um pouco de África em seu plano de ensino.” Necessidade de buscar ações afirmativas são apenas parte de uma grande tarefa. Buscar medidas que respeitem o negro, o valorize e o trague para a margem da sociedade, vivendo uma democracia racial ,esquecendo definitivamente que raças humanas existe é a louvável missão onde o estudo sobre as representações do corpo negro no cotidiano escolar poderá ser uma contribuição não só para o desvelamento do preconceito e da discriminação racial na escola como, também, poderá nos ajudar a construir estratégias pedagógicas alternativas que nos possibilitam compreender a importância do corpo na construção da identidade étnico-racial de alunos, professores negros, mestiços e brancos e como esses fatores interferem nas relações estabelecidas entre esses diferentes sujeitos no ambiente escolar. Não pode deixar de lembrar que a sociedade e a escola brasileira da atualidade tem construído representações sociais mais positivas sobre o negro e a sua estética. É transformação, sem dúvida, que não se dá por honra e glória da educação escolar. Ao pesquisar um pouco mais, encontra-se a ação da comunidade negra organizada em movimentos sociais, dos grupos culturais negros, das comunidades-terreiro como partes importantes no processo de denúncia contra o racismo e de afirmação de identidade negra. Encontrará também famílias negras que, atentas aos dilemas de seus filhos e filhas, enfatizam de forma positiva e de diversas maneiras a herança cultural negra. São grupos e famílias que sempre pressionaram a escola e cobraram desta instituição uma responsabilidade social e pedagógica diante da questão racial, não se limitando apenas à escola. Atinge a sociedade como um todo e, tem tornado possível uma lenta inserção social do negro em alguns setores do mercado de trabalho, a sua presença (mesmo tímida) nos meios de comunicação e nos veículos publicitários e a sua entrada em maior número na educação básica. Soma-se aos outros grupos sociais que lutam pela democratização da sociedade, a comunidade negra tem conseguido mudar, aos poucos, a situação do negro no Brasil. Mas ainda há muito que avançar. Para criar uma relação que propicia o conhecimento, o alicerce é o respeito e a admiração. Surgem no decorrer do assunto questões como: § Capítulo I - Fundamentação teórica. O governo federal, a partir da eleição do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, redefiniu o papel do Estado como propulsor das transformações sociais, e sancionou, em março de 2003, a lei nº 10.639/03-MEC que altera a LDB e estabelece as Diretrizes Curriculares, que introduz o estudo da cultura afro brasileira e africana no currículo escolar; § Capítulo II – A introdução da cultura afro brasileira e africana no currículo escolar. A Seppir ( Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Social), considera importante estabelecer parcerias para o cumprimento da lei 10.639/03-ME, fazendo-se, assim, necessário um reconhecimento de que o problema existe para, depois, combatê-lo; § Capítulo III – Eliminando o preconceito. No Brasil, as pessoas tendem a negar e disfarçar o preconceito, tornando-o assim mais vergonhoso. A diversidade cultural é uma questão de admiração e respeito, devendo ser do conhecimento de todos;. § Capítulo IV – Onde, quando e o quê estudar. A riqueza da cultura africana oferece elementos que deverão ser usados em todas as áreas de conhecimento, resgatando e enaltecendo a memória africana, sendo necessárias, assim, melhores informações por parte dos profissionais da educação. CAPÍTULO I FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA APRESENTAÇÃO DO SEPPIR O Brasil, Colônia, Império e República, teve, historicamente, no aspecto legal, uma postura ativa e permissiva diante da discriminação e do racismo que atinge a população afro descendente brasileira até hoje. O Decreto nº 1.331, de fevereiro de 1854, estabelecia que, nas escolas públicas do país, não seriam admitidos escravos, e a previsão de instrução para adultos negros dependia da disponibilidade de professores. O Decreto nº 7.031-A, de 06 de setembro de 1878, estabelecia que os negros só podiam estudar no período noturno e diversas estratégias foram montadas no sentido de impedir o acesso pleno dessa população aos bancos escolares. Após a promulgação da Constituição de 1988, o Brasil busca efetivar a condição de um Estado democrático de direito com ênfase na cidadania e na dignidade da pessoa humana; contudo ainda possui uma realidade marcada por posturas subjetivas e objetivas de preconceito, racismo e discriminação aos afro-descendentes, que, historicamente, enfrentam dificuldades para o acesso e a permanência nas escolas. A educação constitui-se em um dos principais ativos e mecanismos de transformação de um povo e é papel da escola, de forma democrática e comprometida com a promoção do ser humano na sua integralidade, estimular a formação de valores, hábitos e comportamentos que respeitem as diferenças e as características próprias de grupos e minorias. Assim, a educação é essencial no processo de formação de qualquer sociedade e abre caminhos para a ampliação da cidadania de um povo. Nesse sentido, ao analisar os dados que apontam as desigualdades entre brancos e negros na educação, constata-se a necessidade de políticas especificas que revertam o atual quadro. Os números são ilustrativos dessa situação. Veja-se: pessoas negras têm menor numero de anos de estudos do que pessoas brancas (4,2 anos para os negros e 6,2 anos para brancos); na faixa etária de 14 a 15 anos, o índice de pessoas negras não alfabetizadas é 12% maior do que o de pessoas brancas na mesma situação; cerca de 15% das crianças brancas entre 10 e 14 anos encontram-se no mercado de trabalho, enquanto 40,5% das crianças negras, na mesma faixa etária, vivem essa situação. O governo federal, a partir da eleição do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, passou a redefinir o papel do Estado como propulsor das transformações sociais, reconhecendo as disparidades entre brancos e negros na sociedade brasileira e a necessidade de intervir de forma positiva, assumindo o compromisso de eliminar as desigualdades raciais, dando importantes passos rumo à afirmação dos direitos humanos básicos e fundamentais da população negra brasileira. Nesse contexto, o governo federal sancionou, em março de 2003, a Lei nº 10.639/03-MEC, que altera a LDB e estabelece as Diretrizes Curriculares para a implementação da mesma. Esta Lei instituiu a obrigatoriedade do ensino da História da África e dos africanos no currículo escolar dos ensinos fundamental e médio. A decisão resgata historicamente a contribuição dos negros na construção e formação da sociedade brasileira. Também criou, em 21 de março de 2003, a Seppir (Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial) e instituiu a Política Nacional de Promoção da Igualdade Racial. Desta forma, recolocou a questão racial na agenda nacional e a importância de se adotarem políticas públicas afirmativas de forma democrática, descentralizada e transversal. O principal objetivo destes atos é promover alteração positiva na realidade vivenciada pela população negra e evoluir rumo a uma sociedade democrática, justa e igualitária, revertendo os perversos efeitos de séculos de preconceito, discriminação e racismo. O governo federal, por meio da Seppir, assume o compromisso histórico de romper com os entraves que impedem o desenvolvimento pleno da população negra brasileira. O principal instrumento para isto é o encaminhamento de diretrizes que nortearão a implementações de ações afirmativas no âmbito da administração pública federal. Além disso, busca a articulação necessária com os estados, os municípios, as ONGs (Organizações Não-Governamentais) e a iniciativa privada para efetivar os pressupostos constitucionais e os tratados internacionais assinados pelo Estado Brasileiro. Para exemplificar esta intenção, cabe ressaltar a parceria da Seppir com o MEC por meio de suas secretarias e órgãos que estão imbuídos do mesmo espírito, ou seja, construir as condições reais para as mudanças necessárias. Por isso, a Seppir, no exercício de sua missão, considera importante estabelecer parcerias para o cumprimento desse desafio, que é combater, de uma vez por todas, o racismo e promover a igualdade de oportunidades entre os diferentes grupos étnicos que compõem a rica nação brasileira. Assim a sala de aula deve ser, essencialmente, o que se propõe, ou seja, uma sala “de aula”, não de ensino, onde não se ensina nada a outrem, mas trocam-se experiências. E estas, quanto mais diversas, melhores. Senão se torna uma repetição, bloqueando o crescimento, restringindo-se ao novo, privilegiando-o. Fica-se, em tal situação, sem norte, o que leva à incorreta afirmação de que “o aluno não aprende”, de que “o aluno não tem cultura”. Este é o problema: a aceitação da cultura alheia, e o conseqüente desprezo do popular na cultura, mais notadamente, na linguagem, dentro da sala de aula. Partindo-se do princípio de o quê se “ensina”, pode-se desmembrá-lo em várias questões, quais sejam: • A importância do estudo da cultura afro brasileira e africana. É inegável que se conhece a importância da cultura negra na história brasileira. Todavia a sua forma de apresentação nos meios educacionais reflete um preconceito, um desprezo, incoerentes com a realidade. Quando se refere a “estudar”, na verdade quer-se dizer “apresentar”, pois este é o problema. Sempre se diz em sala de aula a respeito da inquestionável presença do negro na formação cultural do brasileiro, porém o preconceito também se faz presente em várias inserções, propositadamente ou não. Segundo GENTILE, Paola, (2005), “Os diversos povos que habitavam o continente africano muito antes da colonização feita pelos europeus, eram bambambãs em várias áreas: eles dominavam técnicas de agricultura, mineração, ourivesaria e metalurgia; usavam sistemas matemáticos elaboradíssimos para não bagunçar a contabilidade do comércio de mercadorias; e tinham conhecimentos de astronomia e de medicina que serviram de base para a ciência moderna. A biblioteca de Tumbuctu, em Mali, reunia mais de 20 mil livros, que ainda hoje deixariam encabulados muitos pesquisadores de beca que se dedicam aos estudos da cultura negra. Infelizmente, a imagem que se tem da África e de seus descendentes não é relacionada com a produção intelectual nem com a tecnologia. Ela descamba para moleques famintos e famílias miseráveis, povos doentes e em guerra ou paisagens de safáris e mulheres de cangas coloridas. (...) O pouco caso com a cultura africana se reflete na sala de aula. O segundo maior continente do planeta aparece em livros didáticos somente quando o tema é escravidão, deixando capenga a noção de diversidade de nosso povo e minimizando a importância dos afro-descendentes.” (GENTILE, revista Nova escola, novembro de 2005, p.42) O negro foi visto sempre como indolente, preguiçoso, caprichoso, sensual, incapaz de raciocinar. Já o branco era o empreendedor, o disciplinado, o inteligente e, por serem “superiores”, sentiam-se no direito de explorar os “inferiores”, justificando assim o domínio colonial e a exploração do europeu sobre outros povos. As desvantagens sociais, políticas, econômicas ou culturais, passaram a ser atribuídas a desigualdades inatas entre os homens. O termo ”inata”, é muito usada nos discursos racistas e, segundo eles, determinavam que os grupos nascem com características diferentes e que os habilitavam apenas para serem dominados e explorados. Ainda segundo GENTILE, “O ensino de História sempre privilegiou as civilizações que viveram em torno do Mar Mediterrâneo. O Egito estava entre elas, mas raramente é relacionado à África, tanto que junto com outros países do norte do continente pertence à chamada África Branca, termo que despreza os povos que ali viveram antes das invasões dos persas, gregos e romanos.” (GENTILE, revista Nova escola, novembro de 2005, p.42) • formas de amenizar e eliminar o preconceito. Coerente com o item anterior, não é o suficiente estudar a cultura afrobrasileira e africana e conferir-lhe a devida importância. Faz-se necessário, concomitantemente, estudar e praticar formas de amenizar e, conseqüentemente, eliminar o preconceito que se vive na sociedade e se reproduz na educação. Segundo LOURENÇO, Cibele de, pesquisadora e professora da Bryant University, de Rhoad Island, nos Estados Unidos, “boa parte da origem do preconceito é resultado do pensamento dos colonizadores. Eles precisavam justificar o tráfico das pessoas e a escravidão nas colônias e para iss isso ‘animalizaram’ os negros”. Ela conta que “ no século XVI, alguns zoológicos europeus exibiram negros e indígenas em jaulas, colocando na mesma baia indivíduos de grupos inimigos, para que brigassem diante do público. Além disso, a Igreja na época considerava civilizado somente quem era cristão”. ( Lourenço, revista Nova escola, novembro de 2005, p.44) A definição de racismo é, simultaneamente, simples e complexa. Pode o mesmo ser visto como uma ideologia que defende a hierarquia entre grupos humanos, classificando-os em raças inferiores e superiores, e tem como ideologia o conjunto de idéias utilizadas para explicar determinada realidade, no caso, as desvantagens dos negros em relação aos brancos. Esta ideologia racial nasceu quando os europeus necessitaram de justificativas para exploração de povos “diferentes”. “O preconceito racial contraria uma regra básica nas relações entre quaisquer seres humanos: a afeição. Isto significa que, ao se relacionarem, as pessoas devem se tratar com consideração e respeito, aceitando as diferenças, já que todos são humanos. O preconceito racial é um conceito negativo que uma pessoa ou um grupo de pessoas tem sobre outra pessoa ou grupo diferente. È uma espécie de idéia preconcebida, acompanhada de sentimentos e atitudes negativas de um grupo contra outro. Além disso, é algo como uma predisposição – que não necessariamente resulta em ação, em prática.” Segundo BENTO, (2003) “em países como o Brasil – onde o preconceito racial é considerado vergonhoso, condenável – as pessoas tendem a negar e disfarçar seus preconceitos” (BENTO, 2003, p.37). Os meios de comunicação são considerados formadores de opinião. Dependendo do tipo de imagem que divulgam, podem estimular as pessoas a terem uma posição negativa ou positiva em relação a acontecimentos ou a grupos d pessoas. Cabe aqui chamar a atenção para um ponto importante: se se perguntar a crianças, adolescentes e adultos brancos o nome de um herói de filmes sobre a África, certamente citarão Tarzan. Mas a África, onde Tarzan vive suas aventuras, é um continente negro. Só que, para protagonizar o herói daquela região, escolheu-se um branco. Sem uma memória positiva, sem conhecer figuras de destaque de seu povo, as conquistas importantes no campo das artes, das ciências, as crianças negras têm muita dificuldades em formar uma imagem igualmente positiva de seus iguais. Suas famílias muitas vezes também não formaram uma imagem positiva sobre o grupo negro e acabaram por produzir o preconceito em casa . • área ou disciplina especifica em que se inserirá o conteúdo Todo local, área e conteúdo é propício à aprendizagem. Assim como todo momento. Se a aprendizagem se dá pela apreensão de conhecimentos alheios, e estes momentos se dão pelo contato com outrem, e também se dão em tempo integral, a aprendizagem, então, também se dá ininterruptamente, independentemente do lugar. Ou seja, corrige-se e amplia-se o outro e a si mesmo constantemente. A cultura africana oferece elementos relacionados a todas as áreas de conhecimento. Se a escola não inclui esses conteúdos no planejamento, cada professor deve colocar um pouco de África em seu plano de ensino. Pode-se espalhar numa sala de aula desde a capoeira embalada pelo berimbau até as influências musicais do batuque e a ginga do samba e dos instrumentos como cuícas, atabaques e agogôs, passando pela culinária, enriquecida com vatapá, o caruru e outros quitutes, o conhecimento da tecnologia africana, os problemas enfrentados, a idéia de que são todos africanos, até as palavras africanas. Resgatar a memória de um povo significa não só resgate de si mesmo e livrá-los das armadilhas da negação e do esquecimento, como também reafirmar a presença ativa deste povo na história pan-africana e na realidade universal dos seres humanos. O homem branco, considerado durante muito tempo pela sociedade e por ele mesmo o resultado da mistura de três raças, quais sejam: índio, branco e negro, foi escolhido pela sociedade como o elemento ideal para constituir e representar a nação brasileira. É comum que a história oficial do Brasil seja contada a partir das experiências e da visão de mundo das pessoas que exercem ou servem ao poder. A valorização cultural derruba a história dos senhores de escravos, paternalistas, dos escravos dóceis e passivos, e toma conhecimento da violência escravocrata e pára de negar a luta negra que há muito foi negada. Os eventos não podem ser idealizados nem naturalizados como se fossem previsíveis, algo comum. Ouvindo seus realizadores, vê-se que têm histórias peculiares, demandam esforços de superação existenciais, intelectuais e políticos, instituindo novos sujeitos e valores e impondo a nova ética em muitas escolas. A tendência a sua naturalização constitui uma grosseira mistificação e menosprezo à complexidade de conflitos que ocorrem em unidades escolares, trazendo prejuízos à formação da consciência social e à vida de todos(as). É um truísmo falar no orgulho nacional em resolver problemas com o “jeitinho brasileiro”. É imprescindível aplicar a essas questões “sabidamente problemáticas” à consciência social. Não cabe aqui comentar a respeito do desinteresse pela temática questão racial/educação nas faculdades de educação e de formação de professores. Se a exigência do “politicamente correto” impõe a abordagem da pluralidade cultural e o multiculturalismo, é fácil advinhar que, em geral, a questão racial fica sendo “aquele” sub-tema, talvez abordado em certos momentos, sem “histórico” ou textos adequados, sem maiores cuidados na preparação e, no máximo, com referências episódicas ao que ocorre no país. É comum, então, se alegar desconhecimento ou que não é oportuno, por gerar constrangimentos, ou porque professores não tiveram formação para isso. Vale toda sorte de subterfúgios para tergiversar. Quase sempre o que há é desimportância em relação ao tema para o exercício do magistério. CAPÍTULO II A INTRODUÇÃO DO ESTUDO DA CULTURA AFRO BRASILEIRA E AFRICANA NO CURRICULO ESCOLAR O Estado e a sociedade tomam, através de uma emenda na Lei 9394/96 de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), medidas que visam ressarcir os descendentes e africanos negros dos danos psicológicos, materiais, sociais, políticos e educacionais sofridos sob o regime escravista, bem como em virtude das políticas explicitas ou tácitas de branqueamento da população, de privilégios exclusivos para grupos com poder de governar e de influir na formulação de políticas, no pós-abolição. Visa também a que tais medidas se concretizem em iniciativas de combate ao racismo e a toda sorte de discriminações. Segundo GENRO, Tarso (Junho, 2005): “Políticas de reparações voltadas para a educação dos negros devem oferecer garantias a essa população, de ingresso, permanência e sucesso na educação escolar, de valorização do patrimônio histórico-cultural afro-brasileiro, de aquisição das competências e dos conhecimentos tidos como indispensáveis para continuidade nos estudos, de condições para alcançar todos os requisitos tendo em vista a conclusão de cada um dos níveis de ensino, bem como atuar como cidadãos responsáveis e participantes, além de desempenharem com qualificação uma profissão”. (GENRO, Junho 2005, p.11.) Esse é mais um desafio proposto não só aos professores, mas também aos centros de formação de professores. Além dele, há outros, dentre os quais: o que se sabe sobre história e cultura afro-brasileira? o que se sabe sobre história da África? como não reproduzir leituras e discussões estereotipadas sobre o negro e sua cultura? que tema se deverá privilegiar dentro do vasto campo de estudo sobre a cultura afro-brasileira? São questionamentos novos que os docentes e os cursos de formação de professores começarão a se fazer. Considera-se, assim, que existem diferentes e diversas formas e modelos de educação, e que a escola não é o lugar privilegiado onde ela acontece e nem o professor é o único responsável pela sua prática. Essa reflexão é importante para se repensar os processos educativos, quer sejam escolares ou não-escolares. Muitas vezes as práticas educativas que acontecem paralelamente à educação escolar, desenvolvidas por grupos culturais, ONG's, movimentos sociais e grupos juvenis, precisam ser considerados pelos educadores escolares como legítimas e formadoras. Elas também precisam ser estudadas nos processos de formação de professores. O trabalho aqui proposto visa estudar o resgate da importância da cultura afro-brasileira para a construção do sentido de brasilidade, esta compreendida como a essência mesma da possibilidade da vivência intercultural, através da citada emenda à Lei 9394/96. Esta perspectiva é resultado de uma multiplicidade de inter-influências, produzindo um campo eminentemente educativo no qual os desdobramentos não são unívocos, mas múltiplos e complexos. Esta complexidade e a integralidade diz respeito aos sujeitos destas vivências. Ainda segundo GENRO, “Esse reconhecimento implica justiça e iguais direitos sociais, civis, culturais e econômicos, bem como valorização da diversidade daquilo que distingue os negros dos outros grupos que compõem a população brasileira. Isto requer mudanças nos discursos, raciocínios, lógicas, gestos, posturas, modo de tratar as pessoas negras. Requer também a adoção de políticas educacionais e de estratégias pedagógicas de valorização da diversidade, a fim de superar a desigualdade étnico-racial presente na educação escolar brasileira nos diferentes níveis de ensino.” (GENRO,Junho 2005, p.12.) Verifica-se uma construção discursiva da nação brasileira como comunidade plural e multicultural, forçada a reconhecer diferenças culturais apagadas no âmbito da vigência do discurso da mestiçagem. Tais transformações são operadas com o concurso de fenômenos que se dão fora das fronteiras nacionais: ensinar aos alunos as contribuições dos diferentes grupos culturais na identidade nacional, mudar o currículo e a instrução básica, refletindo as perspectivas e experiências dos diversos grupos culturais, étnicos, raciais e sociais, realçar a convivência harmoniosa dos diferentes grupos, o respeito e a aceitação dos grupos específicos na sociedade, o enfoque sobre a redução de preconceitos e a busca de igualdade de oportunidades educacionais e de justiça social para todos, o enfoque social que estimula o pensamento analítico e crítico centrado na redistribuição do poder, da riqueza e dos outros recursos da sociedade entre os diversos grupos, etc. Compreender a cultura do “outro” é, antes de mais nada, olhar para si mesmo, descobrir-se, redescobrir sua própria identidade e raízes, examinar sua história. A cultura afro-brasileira está no centro desta redescoberta, na medida em que conseguiu penetrar profundamente na formação nacional, terminando por transformar-se em signo, símbolo e memória da diversidade de influências culturais e étnicas. A noção de cidadania tem evoluído muito no tempo e no espaço. Das premissas formais da questão legal de o quê o cidadão deve ser, o conceito foi moldado pelas estratégias de classes dominantes e pelas inúmeras lutas sociais. É um erro grosseiro considerar cidadania como um caráter único. Este permanece estático na história brasileira. Sob o prisma da Intercultura, as práticas afro-brasileiras apresentamse como um campo híbrido de construção de identidade no qual emergem novas estratégias de organização que apontam novas perspectivas para a educação intercultural. Entender a importância da simbologia do corpo negro, a manipulação do cabelo e dos penteados usados pelos negros de hoje como formas de recriação e ressignificação cultural daquelas construídas pelos negros da diáspora poderá ser um bom tema de estudo e debate dentro da discussão sobre história e cultura afro-brasileira. Mas, para isso, será preciso que os educadores alterem suas lógicas escolares e conteudistas, dialoguem com outras áreas, valorizem a produção cultural negra constituída em outros espaços sociais e políticos. Será preciso também ouvir e aprender as estratégias, práticas e acúmulos construídos pelo movimento negro e pelos movimentos culturais negros. O campo da formação de professores deverá se abrir para dialogar com outros espaços em que negros constroem suas identidades. Muitas vezes, serão espaços considerados pouco convencionais pelo campo da educação, como por exemplo, os salões étnicos. O atual contexto de implementação da Lei 10.639 é um momento propício para a introdução no campo da formação de professores, quer seja inicial, quer seja em serviço, de estudos e leituras sobre a relação corpo, cultura e identidade negra. O desafio está colocado. Resta agora entender que mais do que um desafio, a discussão sobre raça negra e educação, nos seus múltiplos desdobramentos, é um dever dos educadores e também daqueles responsáveis pela condução dos processos de formação docente. Apesar de se levar em conta essa dimensão mais ampla e mais geral do processo educativo, pretende-se privilegiar a educação que acontece no interior da instituição escolar, tentando, porém, compreendê-la inserida no processo cultural e articulada com outros espaços educativos não-escolares. A escola é vista, aqui, como uma instituição em que se aprende e compartilha não só conteúdos e saberes escolares, mas também valores, crenças e hábitos, assim como preconceitos raciais, de gênero, de classe e de idade. É essa visão do processo educativo escolar e sua relação com a cultura e a educação – de uma maneira mais ampla – que permite aproximar e tentar compreender melhor os caminhos complexos que envolvem a construção da identidade negra e sua articulação com os processos formativos dos professores e das professoras. É também essa visão que possibilita compreender a presença da dimensão educativa em diferentes espaços sociais e não somente no interior da escola. Construir uma identidade negra positiva em uma sociedade que, historicamente, ensina ao negro, desde muito cedo, que para ser aceito é preciso negar a si mesmo, é um desafio enfrentado pelos negros brasileiros. É importante lembrar que a identidade construída pelo negro se dá não só por oposição ao branco, mas também pela negociação, pelo conflito e pelo diálogo com este. As diferenças implicam processos de aproximação e distanciamento. Nesse jogo complexo, vai-se aprendendo, aos poucos, que as diferenças são imprescindíveis na construção da identidade. Segundo LANDES, Ruth , (A cidade das mulheres, 1961, p. 41) "O Brasil precisa ser corretamente conhecido, especialmente a sua situação política, e já que vai estudar os negros, devo dizer que o nosso atraso político, que tornou esta ditadura necessária, se explica perfeitamente pelo nosso sangue, negro, infelizmente por isso estamos tentando expurgar esse sangue; e construirmos uma nação para todos limpando a raça brasileira." ( LANDES, 1961, p. 41) É por isso que, no primeiro parágrafo do artigo 26, da Lei 10.639, de 09 de janeiro de 2003, que altera a Lei 9394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), explicita-se que o conteúdo programático a ser desenvolvido pelas escolas no cumprimento da mesma deverá incluir o estudo da história da África e dos africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação nacional, resgatando sua contribuição nas áreas social, econômica e política pertinentes à história do Brasil. Sendo entendida como um processo contínuo, construído pelos negros nos vários espaços – institucionais ou não – nos quais circulam, pode-se concluir que a identidade negra também é construída durante a trajetória escolar desses sujeitos. Nesse percurso, os negros deparam-se, na escola, com diferentes olhares sobre o seu pertencimento racial, sobre a sua cultura, sua história, seu corpo e sua estética. Muitas vezes esses olhares chocam-se com a sua própria visão e experiência da negritude, tanto no complexo campo das identidades e das alteridades, das semelhanças e diferenças como diante das diversas maneiras como estas são tratadas pela sociedade. Compreender a complexidade na qual a construção da identidade negra está inserida, sobretudo quando se leva em consideração a corporeidade e a estética, é uma das tarefas e desafios colocados para os educadores. Deveria, também, ser uma das preocupações dos processos de formação de professores quando estes discutem a diversidade étnico-cultural. Os professores trabalham cotidianamente com o seu próprio corpo. O ato de educar envolve uma exposição física e mental diária. Porém, ao mesmo tempo em que se expõem, também lidam com o corpo de seus alunos e de seus colegas. Esses corpos são tocados, sentidos. A relação pedagógica não se desenvolve só por meio da lógica da razão científica, mas também pelo toque, pela visão, pelos odores, pelos sabores, pela escuta. Estar dentro de uma sala de aula significa colocar a postos, na interação com o outro, todos os sentidos. O estudo sobre as representações do corpo negro no cotidiano escolar poderá ser uma contribuição não só para o desvelamento do preconceito e da discriminação racial na escola como também poderá ajudar a construir estratégias pedagógicas alternativas que possibilitem compreender a importância do corpo na construção da identidade étnico-racial de alunos, professores negros, mestiços e brancos e como esses fatores interferem nas relações estabelecidas entre esses diferentes sujeitos no ambiente escolar. Na escola, não só se aprende, mas também se reproduzem representações sobre o cabelo crespo e o corpo negro. Quais serão essas representações? Em que momentos aparecem e como elas aparecem? Como os sujeitos negros e brancos vivem esses processos dentro e fora da escola? Como tais representações se manifestam no currículo? Muitas vezes, esses processos delicados e tensos passam despercebidos pela escola, pelos profissionais da educação, e não constituem motivo de debates e estudos nos cursos de formação de professores. O estudo sobre o corpo e o cabelo como ícones da identidade negras presentes nos processos educativos escolares e não-escolares poderá apontar outros caminhos além da denúncia da reprodução de preconceitos e estereótipos. Ver a manipulação do cabelo do negro como continuidade de elementos culturais africanos ressignificados no Brasil poderá pôr todos em contato com a história, memória e herança cultural africana presente na formação cultural afro-brasileira. Muitos estudos poderão e deverão fazer parte dos processos de formação de professores. A sua incorporação nos currículos e nos processos pedagógicos de formação docente faz parte de lutas e reivindicações históricas do movimento negro brasileiro que, há anos, tem demandado o ensino da história da África e da cultura afro-brasileira nos currículos escolares. Segundo FLEURI, Reinaldo Matias. (Educação Intercultural e complexidade, 1999, p.4), “na atividade didática e formativa ressaltam-se as formas e conteúdos da cultura interiorizada pelos indivíduos na vida cotidiana, variedade dos canais e das experiências com que estabelecem contato de acordo com sua posição social...” (FLEURI, Educação Intercultural e complexidade, 1999, p.4) Portanto, coloca-se como um desafio para a prática pedagógica compreender a visão de mundo dos sujeitos envolvidos, bem como a relação entre tal visão e os modelos transmitidos através de situações educativas. A sociedade em evolução, em formação e os costumes sociais e culturais é que definem os comportamentos, os valores e as novas estruturas que se formam, na construção de um novo processo de vivência, convivência e sobrevivência. Desta maneira, indivíduos ou alguns grupos tentam se sobrepor a outros, no sentido de adequar as variadas culturas, seus modos e costumes ao centro de sua cultura, quando da formação de um novo espaço social. Uma nova comunidade em processo de mudanças e transformações, neste sentido, se constrói, se estrutura conforme estes valores, as condutas e os costumes propostos pelas ideologias de superioridade de um único grupo e de uma só cultura, na formação desta nova comunidade. É importante lembrar que a identidade construída pelo negro se dá não só por oposição ao branco, mas também pela negociação, pelo conflito e pelo diálogo com este. As diferenças implicam processos de aproximação e distanciamento. Nesse jogo complexo, vai-se aprendendo, aos poucos, que as diferenças são imprescindíveis na construção da identidade. Acreditar na necessidade de estabelecer relações com os valores e instituições do Estado, valorizando a sua identidade e mostrando a tradição comunitária herdada de seus ancestrais, como uma nova forma de educação, permitirá a promoção da autopercepção e auto-estima das pessoas envolvidas, ajudando-as a participar da sociedade global, não apenas adquirindo conhecimento técnico e informativo, mas mobilizando os valores comunitários. A maioria dos afrodescendentes brasileiros são originários das comunidades remanescentes de quilombos e, atualmente, vive à margem da sociedade e da assistência pública; sobrevive praticando a agricultura tradicional, valendo-se de ferramentas e conhecimento ancestral. Em função do isolamento e da falta de assistência pública, em pleno século XXI, ainda não tem acesso pleno ao crédito (para assegurar a agricultura), infra-estrutura, assistência técnica e a outros serviços públicos, o que torna essa comunidade quilombola alvo permanente de problemas sociais. A cultura afro-brasileira se encaixa no universo da cultura popular, ao mesmo tempo em que se destaca por sua especificidade: a luta contra o preconceito racial e a busca da auto-afirmação são situações que o homem negro enfrenta para definir sua identidade social. Esse mundo encaixado revela o conflito entre diferentes visões de mundo e delineia a existência de um modelo cultural alternativo: a cultura popular. Segundo GENRO, “Políticas de reparações e de reconhecimentos formarão programas de ações afirmativas, isto é, conjuntos de ações políticas dirigidas à correção de desigualdades raciais e sociais, orientadas para oferta de tratamento diferenciado com vistas a corrigir desvantagens e marginalização criadas e mantidas por estrutura social excludente e discriminatória. Ações afirmativas atendem ao determinado pelo Programa Nacional de Direitos Humano (Criado pelo Ministério da Justiça, Brasília,1996), bem como os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, como o objetivo de combate ao racismo e a discriminação, tais como: a Convenção da UNESCO de 1960, direcionada ao combate ao racismo em todas as formas de ensino, bem como a Conferência Mundial de Combate ao Racismo, Discriminação Racial, xenofobia e Discriminação Correlatas de 2001.” ( GENRO, 2005, 12) Assim sendo, a educação das relações étnico-raciais impõe aprendizagens entre brancos e negros, trocas de conhecimentos, quebras de desconfianças, projetos conjuntos para construção de uma sociedade justa, igual e equânime. Para tal faz-se necessária uma reeducação das relações étnico-raciais no Brasil, fazendo emergir as dores e os medos que têm sido gerados. É preciso entender que o sucesso de uns tem o preço da marginalização e da desigualdade imposta a outros. E então decidir que sociedade se quer construir daqui para frente. Segundo FRANTZ, Fanon. ( Os condenados da Terra, 1979, p. 46) “Os descendentes dos mercadores de escravos, dos senhores de ontem, não têm, hoje, de assumir culpa pelas desumanidades provocadas por seus antepassados. No entanto, têm eles a responsabilidade moral e política de combater o racismo, as discriminações e, juntamente com os que vêm sendo mantidos à margem, os negros, construir relações raciais e sociais sadias, em que todos cresçam e se realizem enquanto seres humanos e cidadãos. Não fossem por estas razões, eles a teriam de assumir, pelo fato de usufruírem do muito que o trabalho escravo possibilitou ao país.” (FRANTZ, 1979, p.46) É importante tomar conhecimento da complexidade que envolve o processo de construção da identidade negra em no país, processo esse marcado por uma sociedade que, para discriminar os negros, utiliza-se tanto da desvalorização da cultura de matriz africana como dos aspectos físicos herdados pelos descendentes africanos. Nesse processo complexo, é possível, no Brasil, que alguma pessoas de tez clara e traços físicos europeus, em virtude de o pai ou a mãe, se negro(a), se designarem negros: que outros, com traços físicos africanos, se digam brancos. É preciso lembrar que o termo negro começou a ser usado pelos senhores para designar pejorativamente os escravizados e este sentido negativo da palavra se estende até hoje. Contudo, o Movimento Negro Unificado, ressignificou esse termo, dando-lhe um sentido político e positivo. Podem ainda ser lembrados os motes muito utilizados no final dos anos 1970 e no decorrer dos anos 1980,1990; “Negro é lindo!” “Negra, cor da raça brasileira!”, “ Negro que te quero negro!” “100% Negro!”, “ Não deixe sua cor passar em branco!”. Este último utilizado na campanha do censo de 1990. Pedagogias de combate ao racismo e a discriminação precisam estar atentas para que todos, negros e não negros, além de ter o acesso a conhecimentos básicos tidos como fundamentais para a vida integrada à sociedade, exercício profissional competente, recebam formação que os capacite para forjar novas relações étnico-raciais. Foi atribuída aos estabelecimentos de ensino a responsabilidade de acabar com o modo falso e reduzido de tratar a contribuição dos africanos escravizados e de seus descendentes para a construção da nação brasileira; de fiscalizar para que, no seu interior, os alunos negros deixem de sofrer os primeiros e continuados atos de racismo de que são vítimas. CAPÍTULO III ELIMINANDO O PRECONCEITO A linguagem do silêncio marca muito as relações raciais. É comum as pessoas, ao se referirem aos negros, ao invés de utilizarem tranqüilamente o termo “negro”, usarem a expressão “pessoa de cor”, tentando mostrar gentileza, polidez, silenciando-se sobre algo que consideram negativo - a cor negra -, enquanto todos sabem que branco também é cor. No entanto, não se utiliza a palavra cor para falar de brancos, como se só tivessem uma cor aqueles que não são brancos – os índios, os chineses, os japoneses, os negros, etc. Para essas pessoas, a palavra “negro” é considerada algo ruim, tão ruim que há uma necessidade de silenciar, amenizar o impacto causado por ela: ele não é negro, é de cor. Não bastando isso, a associação entre palavras e expressões é outro processo muito utilizado. A linguagem do dia-a dia cuida de associar o negro a coisas ruins: “a coisa está preta”, “o período negro da ditadura militar”, “uma página negra na nossa história”, e assim várias outras. Associam ainda o negro ao diabo ou a outro animal como o macaco, muito usado, principalmente, em divergências entre um negro e um branco. E assim acha–se justificado, por alguns, negar a uns grupos de pessoas, sua condição de humano, deixando-o em desvantagem, com tratamento desigual, repleto de injustiças, e ainda abrindo caminho para piadinhas e brincadeirinhas que nunca são neutras e que conduzem ao caminho do racismo e do preconceito. Na maioria das vezes, a discriminação racial apresenta semelhanças com o preconceito, pois ambos partem de idéias, sentimentos e atitudes negativos de um grupo contra o outro. No entanto há uma significativa diferença entre eles: a discriminação racial implica sempre a ação de uma pessoa ou de um grupo de pessoas contra outra pessoa ou grupo de pessoas, ou seja, a discriminação implica outra ação e, em muitos casos, é motivada pelo preconceito. Já este é um conceito negativo sobre algo diferente. É uma idéia preconcebida, acompanhada de sentimentos e atitudes negativos. Quando há preconceito em relação a um determinado grupo de pessoas e alguém fala sobre este grupo, imediatamente surgem na mente do ouvinte imagens negativas, não deixando assim que o membro estereotipado seja avaliado corretamente. É em um contexto histórico que se deve entender a chamada identidade negra, aqui no Brasil, num país onde quase não houve um discurso ideológico articulado sobre a identidade “amarela” e a identidade “branca”, justamente porque os que coletivamente são portadores das cores da pele branca e amarela não passaram por uma história semelhante à dos brasileiros coletivamente portadores da pigmentação escura. Essa história já faz parte do Brasil: foram seqüestrados, capturados, arrancados de suas raízes e trazidos amarrados aos países do continente americano, incluindo o Brasil, sem saber por onde estavam sendo levados. É uma história completamente diferente da dos imigrantes europeus, árabes, judeus e orientais que, voluntariamente, saíram de seus respectivos paises, de acordo com as conjunturas econômicas e históricas internas e internacionais que influenciaram suas decisões para emigrar. Evidentemente, também sofreram rupturas que teriam provocado alguns traumas, o que explicaria os processos de construção das identidades particulares como a “italianidade brasileira”, a identidade gaúcha, etc. Mas, em nenhum momento, a cor de sua pele foi objeto de representações negativas e de construção de uma identidade idem que, embora inicialmente atribuída, acabou sendo introjetada, interiorizada e naturalizada pelas próprias vitimas da discriminação racial. Segundo CHIEVANATO, Júlio José, (O negro no Brasil. Da senzala à guerra do Paraguai São Paulo: Brasiliense, 1980, p.85). "o racismo não tem a ver diretamente com a questão das diferenças. O que leva ao racismo não parece ser a incapacidade para suportar a diferença, pelo contrário, o que leva ao racismo é ver o deferente tornar-se o mesmo com direitos iguais. É ver o outro como muito parecido, por isso sentir-se ameaçado na sua identidade, como também no seu espaço, na sua hierarquia social.” (CHIEVANATO, 1980, p.85). Dizendo de outra forma, o que assusta a “sociedade branca” é o negro poder mostrar-se com todo seu potencial de ser. É imperativo básico, distinguir as culturas africanas como aquelas que existem e resistem, independentemente do tempo e espaço físico. Partindo deste princípio, faz-se necessária a apreensão da realidade sócio cultural brasileira e, ao mesmo tempo, o propósito de compreender a configuração da cultura africana, recriada pelo contingente escravizado, expatriado para o Brasil. Segundo RIBEIRO Matilde, (Diretrizes Curriculares Nacionais para a educação das Relações Étnico-Raciais, 2005, p.16) “É um grande equivoco afirmar que os negros se discriminam entre si e que são racistas também. Esta constatação tem de ser analisada no quadro da ideologia do branqueamento que divulga a idéia e o sentimento de que as pessoas brancas seriam mais humanas, teriam inteligência superior e, por isso, teriam o direito de comandar e de dizer o que é bom para todos. Cabe lembrar que, no pós-abolição, foram formuladas políticas que visavam ao branqueamento da população pela eliminação simbólica e material pela presença dos negros. Nesse sentido, é possível que pessoas negras sejam influenciadas pela ideologia do branqueamento e., assim, tendam a reproduzir o preconceito do qual são vítimas. O racismo imprime marcas negativas na subjetividade dos negros e também na dos que os discriminam.”(RIBEIRO, 2005, p.16.) Os meios de comunicação são considerados formadores de opinião. Dependendo do tipo de imagem que divulgam, podem estimular as pessoas a terem uma posição negativa ou positiva em relação a acontecimentos ou a grupos de pessoas. Justamente os meios de comunicação tem estimulado sobremaneira o preconceito na sociedade, em particular sobre os negros. Na televisão, por exemplo, as crianças norte-americanas, tomam contato com a história dos seus antepassados no Velho Oeste, através de filmes de cowboy. Para ela, é uma forma de transmitir de geração em geração as tradições, os hábitos, os costumes, enfim, a cultura de diferentes povos. Também é através da televisão brasileira que as crianças puderam conhecer melhor, dentre outras, as histórias do Sítio do Pica pau Amarelo, de Monteiro Lobato, que mostra as crenças, costumes, hábitos da cultura brasileira. Tantos os seriados nacionais quanto os internacionais raramente trazem negros em papéis importantes. Num país onde metade, ou mais, da população é negra, o significado dessa situação para a criança negra e branca é mostrar para crianças e adolescentes brancas e negras sempre heróis brancos; significa dizer a eles que a coragem, a inteligência, o destemor e o senso de justiça são qualidades de apenas um grupo. Assim, crianças negras e brancas acabam formando idéias distorcidas sobre os grupos aos quais pertencem. As negras se vêem e se sentem numa condição de inferioridade; as brancas, de superioridade. Estudos revelam que, no espaço escolar, a criança branca é o principal agente discriminador de crianças negras. Do total de crianças brancas, 44% assume que discrimina as negras. Em situações de brigas e conflitos, as palavras negro e preto sempre surgem como xingamento. Além disso, nas conversas e brincadeiras, alguém sempre se lembra de uma piadinha sobre negros. Geralmente as crianças não nascem racistas, ou com sentimentos de superioridade ou inferioridade, pois o racismo é construído nas relações que estabelecem na sociedade. Uma vez que a escola é uma das instituições que faz parte da sociedade, ela também reproduz o racismo. Em 1994, o Ministério da Educação divulgou um estudo que atestava que os livros didáticos estimulavam o preconceito. A notícia estampada nos principais jornais do país, partiu de um estudo realizado pelo próprio Ministério da Educação, confirmando uma situação há muito detectada pelo movimento negro e por estudiosos da área da Educação. Alguns historiadores chegaram a mostrar que, nas poucas vezes em que apareciam, os negros estavam associados a figuras demoníacas, desumanizadas, ou eram mostrados realizando tarefas subalternas e desvalorizadas. Um dos mais importantes veículos de reprodução do preconceito e do racismo na escola é o conteúdo dos livros de História. Durante muitos anos a história do Brasil foi deturpada, as pessoas fixaram imagens, idéias e desenvolveram sentimentos negativos sobre povos cujos feitos e méritos foram negados ou deturpados pelos historiadores, sendo essa uma das principais conseqüências negativas do preconceito e da discriminação racial no sistema escolar: a destruição histórica e social que determinado grupo fez do outro. Um importante estudioso das relações coloniais, o francês Albert Memmi, descreveu esse processo. O que ele mostra não é muito diferente do que se vê no Brasil. Ver a história do Brasil contada a partir de experiências e da visão de mundo de pessoas que exerceram ou serviram ao poder era considerada normal. Era a maneira mais fácil de explicar e usada na maioria das vezes para suavizar e amenizar a escravidão; os senhores se escravos, paternalistas; os escravos, dóceis e passivos. Toda a violência escravocrata e a luta negra eram negadas, ao contar a história do país, em que o homem branco, considerando-se o resultante da mistura de três raças, foi escolhido como elemento ideal para constituir e representar a nação brasileira. Os fatos históricos relatados nunca tinham como figura principal os descendentes de africanos. De outro lado, furtos, desvios e outros crimes que envolveram figuras ilustres, como o Barão de Iguape e o Conselheiro Vergueiro, foram cuidadosamente ocultados. D.Pedro I e Duque de Caxias, são considerados heróis pelos seus feitos e lutas, e nem se ouve falar em autoritarismo e a quantidade de sangue derramada, enquanto que a luta dos negros pela liberdade, como a de Zumbi, por exemplo, era, muitas vezes, considerada ato de rebeldia por parte de muitos historiadores. Aqui no Brasil, crianças brancas e negras aprendem sobre figuras e fatos importantes de brancos – como Pedro Álvares Cabral e Tiradentes. Porém pouco ou nada sabem sobre os descendentes de africanos, povo que compõe metade da população brasileira. Se perguntar a uma criança branca quais são seus heróis, líderes, sábios, ela saberá apontar alguns. A criança negra, no entanto, terá dificuldade para identificar heróis negros, porque a memória de seu grupo foi omitida ou deturpada. Poucas crianças sabem que um dos principais escultores do Brasil, o Aleijadinho, era negro, bem como o escritor Machado de Assis e o advogado Luís Gama, os engenheiros Teodoro Sampaio e André Rebouças e tantos outros personagens importantes do país. As estátuas, os monumentos, não mostram os efeitos do povo negro. As festas na escola raramente comemoram fatos históricos do povo negro. A forma como o negro é tratado pela Educação pode levar a pelo menos duas conseqüências danosas: • A criança negra não se reconhece no espaço escolar, e esse fato influencia no aumento dos índices de atraso e evasão escolar dos negros. Fúlvia Rosemberg (1985) afirmou que os maiores índices de atraso e evasão escolar entre as crianças negras devem-se aos mecanismos de discriminação racial presentes no sistema escolar. • A criança negra forma uma idéia negativa sobre si própria e sobre seus iguais. Sem uma memória positiva, sem conhecer figuras de destaque de seu povo e conquistas importantes no campo das artes, das ciências, a criança negra tem muita dificuldade em formar uma imagem idem de seus iguais. Conseqüentemente, não forma também uma imagem positiva de si próprias, como negras. Suas famílias, muitas vezes, não conseguiram também formar a imagem positiva de seu grupo negro e acabaram por reproduzir o preconceito em casa. Por essa razão, estudiosos de povos que foram colonizados, escravizados mostram que esse povo não tem um bom conceito de si e não se valorizam, chegando a negar a sua cor, e se sentem envergonhados ao se compararem ao grupo valorizado pela sociedade, no caso do Brasil, o branco. Por conviver em uma sociedade, que os discrimina, que os associa sempre a uma imagem negativa, muitos negros, internalizam uma imagem ruim sobre seu povo e sobre si próprios, negando sua cor, criticando outros negros e se esforçando para parecerem brancos. Chegam a se sentir inferiores e perdem a autoconfiança, forjando assim o efeito mais perverso do racismo. A lei proíbe a discriminação racial. Por isso o verdadeiro motivo para a rejeição a um negro, em geral, é disfarçado com hipocrisia como: “Escolhemos outro candidato com melhor qualificação”; “ A empresa resolveu adiar a contratação”; “Aguarde nosso contato”, e outra preciosidades. Ai, esta a marca do racismo brasileiro: o disfarce, a dissimulação, a ardilosidade. À medida que a lei obriga o convívio com os negros, as pessoas começam a mudar a forma de se afastar, sem deixar que a lei o flagre em infração. Mais recentemente, contudo, estudo da História social, tem recuperado a importância do negro como agente ativo no processo de formação da sociedade brasileira, e ao contrario do método usado no passado, procura-se recuperar o processo histórico, englobando a maioria das pessoas, as diferentes formas de pensamento e de praticas de pessoas comuns. A ampliação da autoconsciência e também da consciência sobre o racismo, por influência de alguns movimentos negros e da convivência com outros negros e brancos anti-racistas, tem feito com que os negros tenham cada vez mais orgulho de sua raça. A educação é, como outras, uma fração do modo de vida dos grupos sociais que a criam e recriam, entre tantas outras invenções de sua cultura, em sua sociedade. Formas de educação que produzem e praticam, para que elas reproduzam, entre todos os que ensinam/aprendem, o saber que atravessa as palavras da tribo, os códigos sociais de conduta, as regras do trabalho, os segredos da arte ou da religião, do artesanato ou da tecnologia que qualquer povo precisa para reinventar, todos os dias, a vida do grupo e a de cada um de seus sujeitos, através de trocas sem fim com a natureza e entre os homens, trocas que existem dentro do mundo social onde a própria educação habita, e desde onde ajuda a explicar – às vezes a ocultar, a necessidade da existência de sua ordem. A constituição de 1988, que passou à história como uma constituição cidadã, celebrou a transição para a democracia e marca, além disso, o surgimento de uma sociedade civil forte e independente dos Estados no Brasil. Os mais diversos movimentos sociais estiveram representados na constituinte e lograram, de alguma maneira, que o novo texto constitucional contemplasse suas demandas. Para o MNU (Movimento Negro Unificado), o momento da Constituinte continha, alem disso, um sentido especial, porque era o ano em que se comemorava os 100 anos de abolição de escravatura, fato que propiciava ao movimento anti-racista uma legitimidade e um contexto político particularmente favorável às suas mobilizações. Foi também neste ano, 1988, que o presidente José Sarney, cria a Fundação Palmares, o primeiro órgão no âmbito federal especializado no atendimento de demandas especificas da população afro-descendente. O estabelecimento de ensino terá que criar ações educativas de combate ao racismo e a discriminação , uma consciência política e histórica da diversidade, e um maior fortalecimento de identidades e de direitos, que mostrem exigências de mudanças de mentalidades, de maneiras de pensar e agir dos indivíduos em particular, assim como das instituições e de suas tradições culturais. Segundo RIBEIRO Matilde, (Diretrizes Curriculares Nacionais para a educação das Relações Étnico-Raciais, 2005, p.16) “ Mais um equivoco a superar é a crença de que a discussão sobre a questão racial se limita ao Movimento Negro e a estudiosos do tema e não à escola. A escola, enquanto instituição social responsável por assegurar o direito da educação a todo e qualquer cidadão, deverá se posicionar politicamente, como já vimos , contra toda e qualquer forma de discriminação. A luta pela superação do racismo e da discriminação racial, é, pois, tarefa de todo e qualquer educador, independentemente do seu pertencimento étnicoracial, crença religiosa ou posição política. O racismo, segundo o Artigo 5º da Constituição Brasileira, é crime inafiançável e isso se aplica a todos os cidadãos e instituições, inclusive, à escola.”(RIBEIRO, 2005, p.16.) Mais um ponto que pode se esclarecer é o criado pela democracia racial de que a ideologia do branqueamento só atinge os negros. São processos estruturantes e constituintes da formação histórica e social brasileira, e estão no imaginário social , atingindo negros, brancos e outros grupos étnicos-raciais. As formas, os resultados e os níveis desses processos incidem de maneira diferente sobre os diversos sujeitos e interpõem diferentes dificuldades nas suas trajetórias de vida escolar e social. Por isso, a construção de estratégias que visem ao combate do racismo é uma tarefa de todos os educadores, independentemente do seu pertencimento étnico-racial. CAPÍTULO IV ONDE, QUANDO E O QUÊ ESTUDAR Por mais que se diga que a perfeição não existe, pode-se questionar. Ela existe e deve ser perseguida. O problema é que ela não se mantém estática, sempre avançando, de que surge o desafio de sua busca permanente. E, principalmente quando o objeto de ações é o ser humano, maior se torna essa mobilidade, essa inconstância. E quando o meio de se atingir o ser humano é a educação, percebe-se uma relação mais intrínseca, cujos pólos se interligam, sendo eles causa e conseqüência, alternando-se nestas funções, num círculo vicioso. Assim, uma corrente se forma entre ambos, cujos elos serão o educando, entendendo-se este termo como aluno e/ou professor, pois este também se educa permanentemente, no ato de educar o próximo. Como se trata de evolução constante na educação, o “educador”, strictu sensu, ou seja, o professor, deve-se educar(-se) para educar. Ou seja, aprender, não necessariamente a, mas para ensinar. Ou seja, ensina-se para que o conhecimento seja colocado em prática, o mesmo se dando, por extensão, com a aprendizagem: aprende-se para ensinar. E, divagando mais ainda, aprendese a aprender. Se a aprendizagem não tiver utilidade – não for exposta, não se dará como tal, ou seja, não terá praticidade. Conhecimento arquivado não se dá nem mesmo com enciclopédias, já que estas são consultadas. Sem dúvida, para assumir tais responsabilidades implica um compromisso com o entorno sociocultural da escola, da comunidade onde esta se encontra e a que serve, compromisso com cidadãos atuantes e democráticos, capazes de compreender as relações sociais e étnico-raciais de que participam e ajudam a manter e/ou a reelaborar, de decodificar palavras, fatos e situações a partir de diferentes perspectivas, de desempenhar-se em áreas de competências que lhes permitam continuar e aprofundar seus estudos com diferentes níveis de formação. Segundo as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura-Brasileira e Africanas, p. 18, “ Caberá, aos sistemas de ensino, às mantenedoras, à coordenação pedagógica dos estabelecimentos de ensino e aos professores, com base no parecer, estabelecer conteúdos de ensino, unidades de estudos, projetos e programas, abrangendo os diferentes componentes curriculares. Caberá, aos administradores dos sistemas de ensino e das mantenedoras prover as escolas, seus professores e alunos de material bibliográfico e de outros materiais didáticos, além de acompanhar os trabalhos desenvolvidos, a fim de evitar que questões tão complexas, muito pouco tratadas, tanto na formação inicial como continuada de professores, sejam abordadas de maneira resumida, incompleta, com erros.”(Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação da Reações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e CulturaBrasileira e Africana, p. 18, 2005. ) O ensino de Historia e Cultura Afro-Brasileira e Africana, evitando distorções, envolverá articulações entre passado, presente e futuro no âmbito de experiências, construções e pensamentos produzidos em diferentes circunstâncias e realidades do povo negro. É um meio privilegiado para a educação das relações étnico-raciais e tem por objetivos o reconhecimento e valorização da identidade, história e cultura dos afro-brasileiros, garantia de seus direitos de cidadãos, reconhecimento e igual valorização das raízes africanas da nação brasileira, ao lado das indígenas, européias, asiáticas. A questão recorrente a como ir além de posturas denunciadoras do preconceito contra a identidade negra e incorporar elementos para sua construção positiva, em políticas e práticas educacionais remete à necessidade de compreensão dos mecanismos que participam da construção da identidade negra, de forma a incorporá-los dentro de um quadro educacional que busque ir além da homogeneização cultural ou "cegueira racial", mas que, ao mesmo tempo, não recaia em perspectivas meramente folclóricas, em que a diversidade cultural (incluindo a diversidade racial) sejam tratadas de forma "exótica", circunstancial. No caso do IBGE, o padrão utilizado para definir e identificar a população negra parece ser o da cor, entendida como sinônimo de raça, com as tonalidades que variam entre preta, parda, branca ou amarela, em contraste com o universo de 136 tonalidades com as mais variadas terminologias, empregadas pela população propriamente dita (Schwarcz, 2001). Para complexificar a discussão, é importante notar que a categoria raça pressuposto da determinação biológica - foi derrubada pelos resultados do projeto GENOMA (destinado ao mapeamento e deciframento do código genético humano), destituindo-se o conceito de seu status de cientificidade e neutralidade biológica. Entretanto, é interessante notar que alguns autores, tais como Guimarães (1999), defendem seu uso e incorporação pelas Ciências Sociais, a partir de sua compreensão como categoria socialmente construída e não biologicamente pré-determinada. Nesse sentido, similarmente aos pressupostos multiculturais, a idéia da categoria racial como construção, remete-a a um outro patamar: ser negro, embora possa ter componentes biológicos, não se esgota nos mesmos - é parte de uma construção identitária, em que a identificação racial é social e culturalmente construída. O ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana se fará por diferentes meios, em atividades curriculares ou não, em que se explicitem, busquem compreender e interpretar, na perspectiva de que formulem diferentes formas de expressão e de organização de raciocínios e pensamentos de raiz da cultura africana, promovendo oportunidades de diálogos em que se conheçam, se ponham em comunicação diferentes sistemas simbólicos e estruturas conceituais, bem como se busquem formas de convivência respeitosa, alem da construção de projeto de sociedade em que todos se sintam encorajados a expor, defender sua especificidade étnico-racial e a buscar garantias para que todos os façam , incentivando atividades em que pessoas, estudantes, professores, servidores, integrantes da comunidade externa aos estabelecimentos de ensino, de diferentes culturas interatuem e se interpretem reciprocamente, respeitando os valores, visões do mundo, raciocínios e pensamentos de cada um. O que se deve ensinar na Escola – e demais ambientes onde a aprendizagem ocorra – é o respeito a si mesmo. Esse respeito anuncia a sua constante evolução, que se dá através de troca. Troca de informações, sobretudo. Está-se no tempo da informação, do conhecimento. E informação ocorre em via de mão dupla, como já se disse. Neste processo, a crítica e a auto-crítica são fundamentais. Todavia, há limites para ambas. O que traça tais limites são o respeito e a admiração. A si e ao outro. Ao que é seu e ao que é de outrem. Que isso é conseqüência de políticas mal formuladas pelas áreas responsáveis, tanto em esferas municipais, quanto estaduais e federais, não se questiona. Todavia, há nuances da “performance” da educação que se referem especificamente ao professor; há determinados “erros” que compete ao professor corrigir. Se tal não lhe foi passado quanto de sua habilitação para o exercício do Magistério - devidamente questionada -, o aperfeiçoamento na área de atuação é de sua responsabilidade. Daí provém o chamado “sacerdócio” do magistério, tão impropriamente questionado. É-se profissional, acima de tudo; porém, exatamente por sê-lo, cobra-se do mesmo uma maior dedicação, uma busca constante de evolução, devidas, especialmente, à sua área de atuação: a formação do ser humano. Não obstante, ter-se-á uma escala crescente, avassaladora, de seres incompetentes, que se reproduzirão. Faz-se necessário “quebrar” tal corrente. Este papel é dos governos, sem, entretanto, descartar a fundamental participação do professor. O ensino de Historia Afro-Brasileira, se desenvolverá no cotidiano das escolas, nos diferentes níveis e modalidades de ensino, como conteúdos de disciplinas, particularmente Educação Artística, Literatura e História do Brasil, sem prejuízo das demais, em atividades curriculares ou não, trabalhos em sala de aula, nos laboratórios de ciências e de informática, na utilização de sala de leitura, biblioteca, brinquedoteca, áreas de recreação, quadra de esportes e outros ambientes escolares. Abrangerá, entre outros conteúdos, iniciativas e organizações negras, incluindo a historia dos quilombos, a começar pelo de Palmares, e de remanescentes de quilombos que tem contribuído para o desenvolvimento de comunidades, bairros, localidades, municípios e regiões, com destaque para acontecimentos e realizações próprias de cada região e localidade. Algumas datas significativas serão devidamente assinadas. O 13 de maio, Dia Nacional de Denuncia contra o racismo, será tratado como o dia de denúncia das repercussões das políticas de eliminação física e simbólica da população afro-brasileira no pós-abolição, e de divulgação dos significados da Lei Áurea para os negros. O dia 20 de novembro, Dia Nacional da Consciência Negra, também será lembrado, entendendo-se consciência negra em termos explicitados anteriormente. Entre outras datas de significado histórico e político, será assinalado o dia 21 de março, Dia Internacional de Luta pela eliminação da Discriminação Racial. Em historia da África, tratada em perspectiva positiva, não só de denúncia da miséria e discriminações que atingem o continente, nos tópicos pertinentes se fará articuladamente com a historia dos afrodescendentes no Brasil e serão abordados temas relativos ao papel dos anciãos e dos griots como guardiões da memória histórica, à historia da ancestralidade e religiosidade africana, aos núbios e aos egípcios, civilizações que contribuíram decisivamente para o desenvolvimento da humanidade, às civilizações e organizações políticas pré-coloniais, como o reino de Mali, do Congo e do Zimbabwe, ao tráfico e à escravidão do ponto de vista dos escravizados, ao papel de europeu, de asiáticos e também de africanos no tráfico. Será destacado no ensino de Cultura Afro-Brasileira o jeito próprio de se viver e pensar manifestado tanto no dia-a-dia quanto em celebrações como congadas, moçambiques, ensaios, maracatus, rodas de samba, entre outras. Abrangerá ainda as contribuições do Egito para a ciência e filosofia ocidental, as universidades africanas de Timbuktu, Gao, Djene que floresciam no século XVI, as tecnologias de agricultura, de beneficiamento de cultivo, de mineração edificações trazidas pelos escravizados, bem como a produção cientifica, artística (artes plásticas, literatura, música, dança, teatro ), política, na atualidade. Esse estudo se fará por diversos meios, inclusive, a realização de projetos de diferentes natureza, no decorrer do ano letivo, com vistas a divulgação e ao estudo de participação dos africanos e de seus descendentes em episódios da história do Brasil, na construção econômica, social e cultural da nação, destacando-se a atuação de negros em diferentes áreas do conhecimento, de atuação profissional, de criação tecnológica e artística, de luta social, tais como: Zumbi, Luiza Nahim, Aleijadinho, Padre Mauricio, Luiz Gama, Cruz e Souza, João Cândido, André Rebouças, Teodoro Sampaio, José Correa Leite, Solano Trindade, Antonieta de Barros, Edison Carneiro, Lélia Gonzáles, Beatriz Nascimento, Milton Santos, Guerreiro Ramos, Clóvis Moura, Abdias do Nascimento, Henrique Antunes Cunha, Tereza santos, Emmanuel Araújo, Cuti, Alzira Rufino, Inaicyra Falcão dos Santos, entre outros). Em se tratando de episódios mundiais. Citar-se-ão entre outros: rainha Nzinga, Toussaint-L’Ouverture, Martin Luther King, Malcom X, Marcus Garvey, Aimé Cesaire, Léopold Senghor, Mariama Ba, Amílcar Cabral, Cheik Anta Diop, Steve Biko, Nelson Mandela, Aminata Traoré, Christiane Taubira ). Para que este estudo seja feito com qualidade, os sistemas de ensino e os estabelecimentos de educação Básica, nos níveis de Educação Infantil, Educação Fundamental, Educação Media, Educação de Jovens e Adultos, Educação Superior, precisarão providenciar um registro da história não contada dos negros brasileiros, tais como em remanescentes de quilombos, comunidades e territórios negros urbanos e rurais, apoio sistemático aos professores na elaboração de planos, projetos, seleção de conteúdos e métodos de ensino, cujo foco principal seja a História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, mapeamento e divulgação de experiências pedagógicas de escolas, estabelecimentos de ensino superior, secretarias de educação, assim como levantamento das principais dúvidas e dificuldades. Também será necessário encaminhamento de medidas para resolver os problemas enfrentados pela administração dos sistemas de ensino e por Núcleos de estudos AfroBrasileiros; instalação de grupo de trabalho para discutir e coordenar planejamento e execução de cursos de formação de professores e outros profissionais da educação, para atender ao disposto no parecer, análise das relações sociais e raciais no Brasil, de conceitos e de suas bases teóricas, tais como o racismo, discriminações, intolerância, preconceito, estereotipo, raça, etnia, cultura, classe social, diversidade, diferença, multiculturalismo, incluindo praticas pedagógicas, materiais e textos didáticos, na perspectiva da reeducação das relações étnico-raciais e do ensino e aprendizagem da História e Cultura dos Afro-Brasileiros e dos Africanos. Faz-se necessário, segundo as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação da Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e CulturaBrasileira e Africana, p.24, Previsão, nos fins, responsabilidades e tarefas dos conselhos escolares e de outros órgãos colegiados, do exame e encaminhamento de solução para situação de racismo e de discriminações, buscando-se criar situações educativas em que as vitimas recebam apoio requerido para superar o sofrimento e os agressores, orientação para que compreendam a dimensão do que praticaram e ambos, educação para o reconhecimento, valorização e respeito mutuo. (Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação da Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e CulturaBrasileira e Africana, p.24,2005). Também é necessário um maior incentivo por parte dos sistemas de ensino a pesquisas sobre processos educativos orientados por valores, com uma nova visão do mundo, conhecimentos afro-brasileiros e indígenas com o objetivo de ampliação e fortalecimento de bases teóricas para a educação brasileira, em que ocorrerá uma coleta de informações sobre a população negra, com vistas à formulação de políticas públicas de estado, comunitárias e institucionais.; divulgação de bibliografia afro-brasileira e de outros materiais como mapas da diáspora, da África, de quilombos brasileiros, fotografias de territórios negros urbanos e rurais, reprodução de obras de artes afro-brasileira e africana a serem distribuídos nas escolas da rede, com vistas à formação de professores e alunos para que aja o combate à discriminação e ao racismo; adequação dos mecanismos de avaliação das condições de funcionamento dos estabelecimentos de ensino, tanto da educação básica quanto superior, ao disposto no parecer, com a inclusão de formulários, preenchidos pelas comissões de avaliação, nos itens relativos a currículo, atendimento aos alunos, projetos pedagógicos, plano institucional de quesitos que contemplem as orientações exigidas pela lei. Segundo SANTOS, Rafael Sânzio Araújo, coordenador do Centro de Cartografia Aplicada e Informação Geográfica da UnB (revista Nova Escola, novembro de 2005). A África pode ser estudada e mostrada não como um país, e sim como um continente . “há uma tendência em falar da África como se todos que ali vivem tivessem os mesmos hábitos e tradições”, e para comprovar o que afirma, sugere que, durante a aula, o professor localize em mapas os diversos povos que vieram para o Brasil e as riquezas de cada região, como as minas de ouro e diamante. Com esta exploração feita nos mapas, a turma entenderá melhor um dos motivos da exploração. A cultura africana oferece elementos relacionados a todas as áreas do conhecimento. Sendo assim fica fácil, para cada professor levar um pouco da África para sua sala de aula, ou em seu plano de ensino. Pode-se sugerir material que poderão ser incluídos nas áreas de Geografia, Atualidades, História, Ciências Naturais, Matemática, Língua Estrangeira e Portuguesa sem falar nas Artes e a Educação Física. No infográfico da revista Nova Escola de novembro de 2005, págs 46 e 47, o professor do Ensino Médio Jorge Euzébio Assumpçãp, do Colégio Estadual Presidente Arthur da Costa e Silva, em Porto Alegre, afirmou que o continente africano era dividido em reinos antes da chegada dos europeus. Livros, internet e textos produzidos pelo professor Assumpção, são fonte para estudantes perceberem a estrutura social e política dos diversos povos. O reino do Congo, por exemplo, era dividido em aldeias familiares, distritos e províncias e todos os governadores eram conselheiros do rei. No império de Gana, os monarcas se reuniam todos os dias com os súditos para papear, ouvir reclamações e tomar decisões. “ A tradição oral era forte nas culturas africanas, mas os povos também sabiam ler, escrever e viviam em cidades desenvolvidas”, destaca Assumpção. Ao falar sobre os diversos povos, é possível destacar as contribuições de cada um para a economia do Brasil Colônia. “Eles trouxeram para cá a melhor tecnologia dos trópicos”, informa Rafael. Tanto que os donos das terras encomendavam aos mercadores mão-de-obra especializada para a atividade de seus domínios. Muita gente não sabe mais instrumentos como a enxada, o arado e algumas técnicas de irrigação vieram para o Brasil com os negros. Durante os séculos XIV e XV, foram trazidos para o Brasil, alguns habitantes do Império de Mali, com técnicas de plantio e de irrigação por canais, o que favoreceu a expansão da agricultura, principalmente durante os ciclos da cultura de açúcar e do café. Há 7 milhões de anos houve a separação entre a linhagem do macaco e do que viria a ser o homem mais tarde. Os fósseis mais antigos de nossos ancestrais humanos foram encontrados no Vale da Grande Fenda, formação que atravessa a Etiópia o Quênia e a Tanzânia. Milhões de anos depois, o Homo Erectus partiu dessa região e povoou a Ásia e a Europa, onde se transformou em homem de Neanderthal. Os que continuaram na África evoluíram para a espécie sapiens, que mais uma vez migrou, dizimando ou substituindo os neandertais e os hominídeos asiáticos. E assim o planeta foi povoado. A importância de mencionar isso ao abordar a evolução das espécies, em Ciências Naturais está no fato de esclarecer que biologicamente todos os seres humanos são parecidos e as pequenas diferenças físicas não interferem na capacidade intelectual, ajudando também a desmontar o falso embasamento cientifico que subdividiu a humanidade em raças, no século XIX, e que perduram até hoje. Ao conhecer a cultura egípcia, os alunos logo começam a se maravilhar com as gravuras que retratam a construção de monumentos, como as pirâmides, encantando-se com os triângulos, tentando estimar a quantidade de pessoas que trabalharam na obra e de tijolos usados. Essa interpretação feita pelos alunos é pura Matemática, onde alguns símbolos egípcios ajudam a ler imagens e onde pode ser usado como interdisciplinar, no estudo do corpo humano. Na área de Língua Estrangeira, o Reggae, pode ser muito bem aproveitado, através de letras de músicas do afro-descendente jamaicano Bob Marley, por exemplo, e de outros cantores negros e textos em inglês sobre a vida de lideranças como os americanos Malcom X e Martin Luther King, fazendo com que o aprendizado se aproxime cada vez mais dos afrodescendentes. Os falares africanos no Brasil, têm muita influência. Então, no estudo da Língua Portuguesa pode-se pesquisar um pouco as centenas já incorporadas ao nosso vocabulário, além, é claro, as lendas e históricas africanas que tratem da diversidade e que não são poucas, as milhares de 47 poesias que trata a cultura negra com leveza e beleza como “O laço de fita” e “O navio negreiro” do grande “poeta dos escravos”, Castro Alves. Vários são os livros como “Menina bonita do laço de fita”, de Ana Maria Machado, e “O passaro-da-chuva”, de Kersti Chaplet , que poderão ser usados para atividades de leitura e escrita. Pessoa da comunidade podem ser convidadas a contar histórias de sua vida, informações que poderão ser transformadas em textos. Como a cultura dos povos africanos é pouco conhecida entre nós, é fácil se deslumbrar com o diferente e esquecer de dar valor às culturas africanas em sua essência o que muitas vezes, torna-se um desafio não revelar o preconceito e nem cair no encantamento do exótico. Na disciplina de Artes e Educação Física, usam-se muitos elementos da cultura dos povos africanos, trabalhando também conceitos de arte abstrata e geometria , através das danças, mitos , adereços e mascaras, relacionando essas produções às manifestações artísticas do continente europeu. Para disciplina que se dedica à educação do corpo, brincadeiras que privilegiam as competições em equipe, como exemplo tem oiitop, o mbube-mbube (ou o tigre e o impala ) a mamba, e jogos como o yote e a mancala. Pode se iniciar contando a história do jogo e os valores da cultura africana presentes em cada um. A cada órgão normativo cabe, pois, a tarefa de adequar o proposto no parecer à realidade de cada sistema de ensino. E, a partir daí, deverá ser competência dos órgãos executores, administrações de cada sistema de ensino, das escolas, definir estratégias que quando postas em ação, viabilizarão o cumprimento efetivo da Lei de Diretrizes e Bases que estabelece a formação básica comum, o respeito aos valores culturais, como princípios constitucionais da educação tanto da dignidade da pessoa humana, garantindo-se a promoção do bem de todos, sem preconceitos, a prevalência dos direitos humanos e repúdio ao racismo . CONCLUSÃO Cumprir a lei é responsabilidade de todos e não apenas do professor em sala de aula. No plano político, a questão racial, ocupa um espaço crescente na mídia e nos debates públicos. De simples contravenção penal, o racismo passou a ser considerado crime. Nas Universidades, cresce o número de professores e pesquisadores negros que se ocupam de revisar e criticar as produções cientificas que serviram somente à reprodução do racismo. Agora já é uma realidade: a cultura africana faz parte do currículo. O pouco caso que se fazia com o segundo maior continente do planeta, e que se refletia em sala de aula e deixava de lado a noção de diversidade de nosso povo, minimizava a importância dos afro-descendentes, agora é passado. Sabe-se que uma norma apenas não muda a realidade de imediato, mas pode ser um impulso para trabalhar em sala de aula um conteúdo novo, rico em conhecimentos, valores e assim reparar um pouco das injustiças que se tem cometido até agora, diminuindo o preconceito e a discriminação em nossa sociedade. Educar é um ato, acima de tudo, de responsabilidade social. Acima da pessoal. Encontra-se em jogo o futuro de pessoas, senão de nações.Todo profissional da educação deve ser, acima de tudo, ousado e comprometido. Não pode se ater a teorias que lhe foram repassadas quando de sua formação. Estas sempre se encontram ultrapassadas, inadequadas sempre para o momento de sua aplicação. É preciso estudar sempre,repensar, ampliar conceitos, fazendo de sua formação apenas a base para a aquisição de novos comportamentos no exercício do magistério, de acordo com a especificidade de cada sociedade em que o mesmo é exercido. Cada uma tem diferentes características, comportamentos. E necessidades. Educa-se diversamente, para as diversidades. Hoje, não interessa o nível que cada cidadão irá alcançar. Cultura não é pode ser considerado algo concreto, mensurável. Muito mais que isso, o conteúdo a ser ministrado, deve-se não só estabelecer objetivos finais variados, mas também pontos de partida e caminhos idem. E, para tal, é essencial usar o conhecimento de que o aluno dispõe. E quanto mais diversificado, mais natural em sua vida, mais autêntico, próprio e efetivo. A valorização de sua cultura cria no aluno a vontade de preservá-la; para preservá-la, precisa conhecê-la mais; para conhecê-la mais, precisa discuti-la, expô-la, compará-la. Compete à Escola incentivar a preservação da cultura própria de cada um, pois, denegrindo-a, torna-se incoerente, já que prega autenticidade, respeito, convivência, e não pode, então, exercitar segregação, discriminação, preconceito, criticando a ditadura em seus mais variados aspectos, mas, paradoxalmente, ministrando conteúdos “importados”, usando nível de linguagem inacessível ao aluno, desconhecido até mesmo dos professores, haja vista os erros gramaticais que os mesmos cometem, na ânsia de “falar bonito e bem”, em um arroubo de hipercorreção. Mas não é apenas o respeito à cultura popular o que se prega neste trabalho; é a sua real utilização como estratégia de ensino/aprendizagem. Assim, conclui-se que a educação é a mola que move e sustenta o progresso: individual e coletivo. É a arma de que se dispõe para enfrentar as barreiras sócio-econômico-políticas que tanto afligem o mundo na atualidade. Quaisquer problemas devem e podem ser enfrentados e extirpados através da educação. Então, esta merece estudos mais práticos e menos teóricos; mais efetivos e menos “belos”; mais simples e menos “chamativos”; mais respeitosos e menos preconceituosos. Para tanto, fazem-se necessários não alunos “diferentes”, como tanto se prega em outros termos, mas profissionais “diferentes”, realmente pensadores, paradoxalmente apaixonados e racionais. Que trabalhem com projetos, ou seja, a cada ação se movam a partir de estratégias bem pensadas, discutidas, definidas, que sejam objeto de avaliação constante quanto a sua aplicabilidade e efetividade. Que sejam desafiadores, questionadores. Que ousem enfrentar a pecha de incompetentes, de descompromissados, mercenários. Que se coloquem no mesmo patamar do aluno: educandos. BIBLIOGRAFIA AGIER, Michel . Espaço urbano, família e status social. O novo operariado baiano nos seus bairros. 1990.Cadernos CRH (Salvador) AZEVEDO, Thales. Cultura e situação racial no Brasil. 1966. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira. BENTO,Maria Aparecida Silva. Cidadania em Preto e Branco. Ática. 3ªed. 2003 BERGERON, Louis. Níveis de Cultura e Grupos Sociais. Martins Fontes, Lisboa(PORT), 7ª, 1967 BOSI, Alfredo. Cultura Brasileira. Temas e Situações. Ática. 1987. 8ªed. São Paulo CARNEIRO, Manuela. Negros e estrangeiros. Brasiliense. 1985. São Paulo CHOR Maio, Marcos e Ricardo Ventura Santos. Raça, ciência e sociedade. eds. 1996. Rio de Janeiro: Ed. da Fiocruz. DANTAS, Beatriz Góis. Vovó Nagô e Papai Branco. Uso e abuso da África no Brasil.1988. Rio de Janeiro: Graal. GUIMARÃES, A. S. A. Racismo e Anti-Racismo no Brasil. 1999. São Paulo: Ed. 34. HALL, S. A Identidade Cultural na Pós-Modernidade. Tradução Tomaz Tadeu da Silva & Guacira Lopes Louro. 1997. Rio de Janeiro: DP&A Editora. NABUCO, Joaquim. A Escravidão. Nova Fronteira. 1999. São Paulo. SILVA, Vagner Gonçalves. Orixás da metrópole. 1995. Petrópolis: Vozes. VASCONCELOS, Gilberto F. cultura no Período Colonial. Brasiliense. 1983.5ªed. São Paulo. DIRETRIZES Curriculares Nacionais para a Educação das Relações ÉtnicoRaciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Brasília (DF), 2005. REIS, João. Rebelião escrava no Brasil: a história dos levantes dos malês 1986. S.Paulo: Brasiliense. REVISTA RAÇA BRASIL – Símbolo Ed., São Paulo, 88, 2005. REVISTA NOVA ESCOLA – Ed. Abril, Fundação Victor Civita, 187, 2005. RODRIGUES, Raymundo Nina. Os Africanos no Brasil. 1932. São Paulo: Editora. Ática TRINDADE, A Multiculturalismo: mil e uma faces da escola. 1999. Rio de Janeiro: DP&A Editora. ANEXO I UM JOGO DE TABULEIRO QUE VEIO DA ÁFRICA O kalah, desenvolve a atenção, a concentração e a capacidade da criançada, pois uma jogada errada se transforma em vantagem para o adversário. A capacidade de antecipação é outra importante competência que os alunos adquirem. O objetivo dos competidores é acumular o maior numero de sementes, mas nem sempre a melhor jogada é a que possibilita conseguir uma grande quantidade delas de uma só vez . Pode ser jogado individualmente ou até por quatro pessoas, e é composto pelo mesmo tipos de peças – um tabuleiro de madeira com covas e sementes populares da África. É indicado para crianças a partir de 6 anos de idade. Durante a brincadeira, os pequenos vão ficar craques na contagem, já que precisam controlar as sementes a cada jogada. Depois de assimilar as regras, deverão ser criadas situações-problemas para os participantes, como dispor as peças no tabuleiro e perguntar qual é a próxima jogada. Regras do jogo: A cada jogada participam duas crianças uma sentada de frente para a outra e tendo o tabuleiro entre elas. Cada jogador fica com um lado do tabuleiro e com um potinho à sua direita (chamada de casa de acumulação ou reservatório). São colocadas três sementes em cada cova. O primeiro jogador pega as sementes de uma delas e as redistribui, uma por cova, no sentido antihorário. Sempre que o percurso incluir o próprio reservatório, ele deposita aí uma semente - que passa a pertencer apenas a ele. Ao passa pelo reservatório adversário, o jogador não coloca sementes. Toda vez que a ultima semente cair no reservatório da própria criança, ela joga de novo. Ela pode partir de qualquer cova de seu campo. Há outra maneira de se apropriar de sementes. Quando a ultima semente do monte que está sendo distribuído cair em uma cova vazia do próprio campo, o jogador pode pegar todas as sementes que estão na cova da frente, no campo do adversário. O jogo termina quando as sementes já estiverem nos reservatórios dos jogadores ou quando não houver mais sementes no próprio campo para jogar. Vence quem acumular mais sementes. ANEXO II VISITA À COMUNIDADE DE ARTUROS DATA: 01/03/2006 ~ 28/04/2006 LOCAL: Contagem, B.H. PÚBLICO-ALVO: Alunos do ensino Fundamental e médio da E.E. Dr. Antônio da C. Pereira. DISCIPLINAS ENVOLVIDAS: História e Geografia PROFESSORA RESPONSÁVEL: Maria Ivanildes Gonçalves da Silva Braga COORDENADOR DA OFICINA: Erlane JUSTIFICATIVA A história da escravidão em Minas Gerais se caracterizou pela força da presença da Igreja, criando-se aqui uma religiosidade negra de confraria. Num contexto em que o poder eclesiástico se aliava tão definitivamente à ação do Estado, o negro oprimido parecia fadado a perder seu universo mítico, adotando o modelo europeu de conceptualização do mundo. Mas a resistência cultural do homem negro criou espaços para a permanência e a reelaboração de seus valores simbólicos, reinstalando-se nas Minas Gerais uma vivência de África: ao viver o sagrado, em suas festas e ritos, o negro mineiro se alimenta de suas raízes ancestrais. Os autores demonstram essa resistência, às vezes tão sutilmente dissimulada, através do estudo da Comunidade dos Arturos, situada em Contagem (MG). O perfil do negro Arturo revela uma experiência histórica enriquecida pela religiosidade. Nas celebrações rituais e no cotidiano, os Arturos vivenciam o percurso da fragmentação social (o escravismo e suas heranças) e a conquista da plenitude existencial (quando o sagrado reintegra o homem ao seu grupo social). A base interdisciplinar que orienta a coleta e a análise dos dados soma-se à visão de mundo dos informantes para organizar um arcabouço teórico capaz de enfocar os diversos aspectos da cultura popular como um modelo alternativo, sistemático e significativo, experimentado pelo homem das camadas sociais subalternas. A cultura afro-brasileira se encaixa no universo da cultura popular, ao mesmo tempo em que se destaca por sua especificidade: a luta contra o preconceito racial e a busca da auto-afirmação são situações que o homem negro enfrenta para definir sua identidade social. Arturos, uma comunidade formada há 110 anos. São todos descendentes de Artur Camilo Silvério. Filho de escravos, criou a família em uma pequena vila, na cidade de Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte. Hoje, 430 pessoas ainda vivem aqui. E mantêm as tradições do Congado e da cultura negra. As festas nos Arturos representam uma transição entre dois mundos: o profano e o sagrado. No mundo cotidiano, os homens e as mulheres enterram-se no duro trabalho para sobrevivência, mas, no mundo festivo, a comunidade tem uma consciência coletiva sobre os Cosmos e as figuras religiosas. O homem religioso que festeja retorna ao tempo das origens, reveste-se da força da criação e, penetrando a eternidade, reencontra a plenitude. Alimentando na fonte primordial, ele agrega em si a força dos antepassados e, quando retorna ao tempo profano, tem condições de reintegrar-se temporariamente no cotidiano. O projeto que se propõe tem como escopo a comunidade a que se referiu, e como objetivo exatamente, não o resgate, mas o renascimento da valorização das festas e culturas afro, assim como outras manifestações artísticas injustamente marginalizadas, no currículo de cada graduando. Apesar das dificuldades, ou mesmo graças a elas. OBJETIVO GERAL Apreciar e valorizar a cultura afro-brasileira inserida em contextos variados. OBJETIVOS ESPECÍFICOS • Incentivar os alunos a executarem o projeto. • Inserir o estudo da cultura afro-brasileira no dia-a-dia dos alunos. • Valorizar o trabalho de uma comunidade afro. • Conhecer a história da comunidade de Arturos. • Incentivar a busca da auto-afirmação que o homem negro enfrenta para definir sua identidade social. • Reconhecer a luta contra o preconceito racial . • Valorizar a cultura afro-brasileira pela perspectiva mais educada e libertada. • Exercitar o resgate da auto-estima. • Provocar o auto-conhecimento em relação à cultura africana. ANTECEDENTES DO PROJETO “Visita a Comunidade de Arturos” Durante as três semanas que antecedem a apresentação do Projeto, para • os alunos do ensino fundamental e médio da E.E.Dr. Antonio da Cunha Pereira, de Peçanha, haverá um trabalho de pesquisa de campo, associado, e intercalado, ao estudo teórico do conteúdo formal sobre a África e a cultura afro. Este trabalho será valorizado em 10 (dez) créditos. ESTRATÉGIAS Ø DA PESQUISA DE CAMPO • Conhecer com a turma a história de Arturos. • Pesquisar sobre sua vida e costumes. • Estabelecer os critérios de avaliação da pesquisa, quais sejam. Ø Observação dos critérios da realização da pesquisa. Participação em todas as etapas da pesquisa. ü Efetiva participação na socialização dos resultados da pesquisa. ü Conhecimento adquirido em relação a: • o costumes o crenças o hábitos o brincadeiras Paralelamente ao trabalho de pesquisa, questionar a utilização da cultura afro nas demais disciplinas. • Comentar o trabalho anterior, acentuando sua complexidade, provocando o auto-conhecimento. • Trabalho dirigido, através da historia de alguns personagens de Arturos, incentivando a imaginação, através da produção individual. • Uso da música, e a dança no dia-a-dia de cada integrante. • Exibição de duas fitas de vídeo, destacando a cultura afro. • Relatar fragmentos da história nacional, mundial, traçando a comparações. PROVIDÊNCIAS • Providenciar a apresentação do Projeto para cada turma de alunos participantes. • Apresentar o Projeto para a Coordenação Escolar. • Enviar convites aos demais professores da escola. • Providenciar material e local para a exposição dos trabalhos realizados. • Providenciar o que será questionado. VALORAÇÃO A valoração do Projeto se dará em: • crédito de 10 (vinte) pontos de trabalho para cada participante. AVALIAÇÃO • a avaliação ocorrerá no decorrer do trabalho. APÊNDICE I TRAGÉDIA NO LAR Castro Alves Na Senzala, úmida, estreita, Brilha a chama da candeia, No sapé se esgueira o vento. E a luz da fogueira ateia. Junto ao fogo, uma africana, Sentada, o filho embalando, Vai lentamente cantando Uma tirana indolente, Repassada de aflição. E o menino ri contente... Mas treme e grita gelado, Se nas palhas do telhado Ruge o vento do sertão. Se o canto pára um momento, Chora a criança imprudente ... Mas continua a cantiga ... E ri sem ver o tormento Daquele amargo cantar. Ai! triste, que enxugas rindo Os prantos que vão caindo Do fundo, materno olhar, E nas mãozinhas brilhantes Agitas como diamantes Os prantos do seu pensar ... E voz como um soluço lacerante Continua a cantar: "Eu sou como a garça triste "Que mora à beira do rio, "As orvalhadas da noite "Me fazem tremer de frio. "Me fazem tremer de frio "Como os juncos da lagoa; "Feliz da araponga errante "Que é livre, que livre voa. "Que é livre, que livre voa "Para as bandas do seu ninho, "E nas braúnas à tarde "Canta longe do caminho. "Canta longe do caminho. "Por onde o vaqueiro trilha, "Se quer descansar as asas "Tem a palmeira, a baunilha. "Tem a palmeira, a baunilha, "Tem o brejo, a lavadeira, "Tem as campinas, as flores, "Tem a relva, a trepadeira, "Tem a relva, a trepadeira, "Todas têm os seus amores, "Eu não tenho mãe nem filhos, "Nem irmão, nem lar, nem flores". A cantiga cessou. . . Vinha da estrada A trote largo, linda cavalhada De estranho viajor, Na porta da fazenda eles paravam, Das mulas boleadas apeavam E batiam na porta do senhor. Figuras pelo sol tisnadas, lúbricas, Sorrisos sensuais, sinistro olhar, Os bigodes retorcidos, O cigarro a fumegar, O rebenque prateado Do pulso dependurado, Largas chilenas luzidas, Que vão tinindo no chão, E as garruchas embebidas No bordado cinturão. A porta da fazenda foi aberta; Entraram no salão. Por que tremes mulher? A noite é calma, Um bulício remoto agita a palma Do vasto coqueiral. Tem pérolas o rio, a noite lumes, A mata sombras, o sertão perfumes, Murmúrio o bananal. Por que tremes, mulher? Que estranho crime, Que remorso cruel assim te oprime E te curva a cerviz? O que nas dobras do vestido ocultas? É um roubo talvez que aí sepultas? É seu filho ... Infeliz! ... Ser mãe é um crime, ter um filho - roubo! Amá-lo uma loucura! Alma de lodo, Para ti - não há luz. Tens a noite no corpo, a noite na alma, Pedra que a humanidade pisa calma, - Cristo que verga à cruz! Na hipérbole do ousado cataclisma Um dia Deus morreu... fuzila um prisma Do Calvário ao Tabor! Viu-se então de Palmira os pétreos ossos, De Babel o cadáver de destroços Mais lívidos de horror. Era o relampejar da liberdade Nas nuvens do chorar da humanidade, Ou sarça do Sinai, - Relâmpagos que ferem de desmaios... Revoluções, vós deles sois os raios, Escravos, esperai! ... Leitor, se não tens desprezo De vir descer às senzalas, Trocar tapetes e salas Por um alcouce cruel, Que o teu vestido bordado Vem comigo, mas ... cuidado ... Não fique no chão manchado, No chão do imundo bordel. Não venhas tu que achas triste Às vezes a própria festa. Tu, grande, que nunca ouviste Senão gemidos da orquestra Por que despertar tu'alma, Em sedas adormecida, Esta excrescência da vida Que ocultas com tanto esmero? E o coração - tredo lodo, Fezes d'ânfora doirada Negra serpe, que enraivada, Morde a cauda, morde o dorso E sangra às vezes piedade, E sangra às vezes remorso?... Não venham esses que negam A esmola ao leproso, ao pobre. A luva branca do nobre Oh! senhores, não mancheis... Os pés lá pisam em lama, Porém as frontes são puras Mas vós nas faces impuras Tendes lodo, e pus nos pés. Porém vós, que no lixo do oceano A pérola de luz ides buscar, Mergulhadores deste pego insano Da sociedade, deste tredo mar. Vinde ver como rasgam-se as entranhas De uma raça de novos Prometeus, Ai! vamos ver guilhotinadas almas Da senzala nos vivos mausoléus. - Escrava, dá-me teu filho! Senhores, ide-lo ver: É forte, de uma raça bem provada, Havemos tudo fazer. Assim dizia o fazendeiro, rindo, E agitava o chicote... A mãe que ouvia Imóvel, pasma, doida, sem razão! À Virgem Santa pedia Com prantos por oração; E os olhos no ar erguia Que a voz não podia, não. - Dá-me teu filho! repetiu fremente o senhor, de sobr'olho carregado. - Impossível!... - Que dizes, miserável?! - Perdão, senhor! perdão! meu filho dorme... Inda há pouco o embalei, pobre inocente, Que nem sequer pressente Que ides... - Sim, que o vou vender! - Vender?!. . . Vender meu filho?! Senhor, por piedade, não Vós sois bom antes do peito Me arranqueis o coração! Por piedade, matai-me! Oh! É impossível Que me roubem da vida o único bem! Apenas sabe rir é tão pequeno! Inda não sabe me chamar? Também Senhor, vós tendes filhos... quem não tem? Se alguém quisesse os vender Havíeis muito chorar Havíeis muito gemer, Diríeis a rir - Perdão?! Deixai meu filho... arrancai-me Antes a alma e o coração! - Cala-te miserável! Meus senhores, O escravo podeis ver ... E a mãe em pranto aos pés dos mercadores Atirou-se a gemer. - Senhores! basta a desgraça De não ter pátria nem lar, De ter honra e ser vendida De ter alma e nunca amar! Deixai à noite que chora Que espere ao menos a aurora, Ao ramo seco uma flor; Deixai o pássaro ao ninho, Deixai à mãe o filhinho, Deixai à desgraça o amor. Meu filho é-me a sombra amiga Neste deserto cruel!... Flor de inocência e candura. Favo de amor e de mel! Seu riso é minha alvorada, Sua lágrima doirada Minha estrela, minha luz! É da vida o único brilho Meu filho! é mais... é meu filho Deixai-mo em nome da Cruz!... Porém nada comove homens de pedra, Sepulcros onde é morto o coração. A criança do berço ei-los arrancam Que os bracinhos estende e chora em vão! Mudou-se a cena. Já vistes Bramir na mata o jaguar, E no furor desmedido Saltar, raivando atrevido. O ramo, o tronco estalar, Morder os cães que o morderam... De vítima feita algoz, Em sangue e horror envolvido Terrível, bravo, feroz? Assim a escrava da criança ao grito Destemida saltou, E a turba dos senhores aterrada Ante ela recuou. - Nem mais um passo, cobardes! Nem mais um passo! ladrões! Se os outros roubam as bolsas, Vós roubais os corações! ... Entram três negros possantes, Brilham punhais traiçoeiros... Rolam por terra os primeiros Da morte nas contorções. Um momento depois a cavalgada Levava a trote largo pela estrada A criança a chorar. Na fazenda o azorrague então se ouvia E aos golpes - uma doida respondia Com frio gargalhar! ... APÊNDICE II LAVAGEM CEREBRAL Gabriel, O Pensador Racismo preconceito e discriminação em geral É uma burrice coletiva sem explicação Afinal que justificativa você me dá para um povo que precisa de união Mas demonstra claramente Infelizmente Preconceitos mil De naturezas diferentes Mostrando que essa gente Essa gente do Brasil é muito burra E não enxerga um palmo à sua frente Porque se fosse inteligente esse povo já teria agido de forma mais consciente Eliminando da mente todo o preconceito E não agindo com a burrice estampada no peito A "elite" que devia dar um bom exemplo É a primeira a demonstrar esse tipo de sentimento Num complexo de superioridade infantil Ou justificando um sistema de relação servil E o povão vai como um bundão na onda do racismo e da discriminação Não tem a união e não vê a solução da questão Que por incrível que pareça está em nossas mãos Só precisamos de uma reformulação geral Uma espécie de lavagem cerebral Não seja um imbecil Não seja um Paulo Francis Não se importe com a origem ou a cor do seu semelhante O quê que importa se ele é nordestino e você não? O quê que importa se ele é preto e você é branco? Aliás branco no Brasil é difícil porque no Brasil somos todos mestiços Se você discorda então olhe pra trás Olhe a nossa história Os nossos ancestrais O Brasil colonial não era igual a Portugal A raiz do meu país era multirracial Tinha índio, branco, amarelo, preto Nascemos da mistura então porque o preconceito? Barrigas cresceram O tempo passou... Nasceram os brasileiros cada um com a sua cor Uns com a pele clara outros mais escura Mas todos viemos da mesma mistura Então presta atenção nessa sua babaquice Pois como eu já disse racismo é burrice Dê a ignorância um ponto final: Faça uma lavagem cerebral Negro e nordestino constróem seu chão Trabalhador da construção civil conhecido como peão No Brasil o mesmo negro que constrói o seu apartamento ou quelava o chão de uma delegacia É revistado e humilhado por um guarda nojento que ainda recebe osalário e o pão de cada dia graças ao negro ao nordestino e atodos nós Pagamos homens que pensam que ser humilhado não dói O preconceito é uma coisa sem sentido Tire a burrice do peito e me dê ouvidos Me responda se você discriminaria Um sujeito com a cara do PC Farias Não você não faria isso não... Você aprendeu que o preto é ladrão Muitos negros roubam mas muitos são roubados E cuidado com esse branco aí parado do seu lado Porque se ele passa fome Sabe como é: Ele rouba e mata um homem Seja você ou seja o Pelé Você e o Pelé morreriam igual Então que morra o preconceito e viva a união racial Quero ver essa musica você aprender e fazer A lavagem cerebral O racismo é burrice mas o mais burro não é o racista É o que pensa que o racismo não existe O pior cego é o que não quer ver E o racismo está dentro de você Porque o racista na verdade é um tremendo babaca Que assimila os preconceitos porque tem cabeça fraca E desde sempre não para pra pensar Nos conceitos que a sociedade insiste em lhe ensinar E de pai pra filho o racismo passa Em forma de piadas que teriam bem mais graça Se não fossem o retrato da nossa ignorância Transmitindo a discriminação desde a infância E o que as crianças aprendem brincando É nada mais nada menos do que a estupidez se propagando Qualquer tipo de racismo não se justifica Ninguém explica Precisamos da lavagem cerebral pra acabar com esse lixo que é uma herança cultural Todo mundo é racista mas não sabe a razão Então eu digo meu irmão Seja do povão ou da "elite" Não participe Pois como eu já disse racismo é burrice Como eu já disse racismo é burrice Como eu já disse racismo é burrice Como eu já disse racismo é burrice Como eu já disse racismo é burrice E se você é mais um burro Não me leve a mal É hora de fazer uma lavagem cerebral Mas isso é compromisso seu Eu nem vou me meter Quem vai lavar a sua mente não sou eu É você