X Encontro Nacional de Educação Matemática
Educação Matemática, Cultura e Diversidade
Salvador – BA, 7 a 9 de Julho de 2010
INVESTIGAÇÃO MATEMÁTICA NA SALA DE AULA: EXPERIÊNCIA COM
ALUNOS DO ENSINO MÉDIO SOBRE SUCESSÕES NUMÉRICAS
Lisie Pippi Strapason
Centro Universitário Franciscano - UNIFRA
[email protected]
Vanilde Bisogni
Centro Universitário Franciscano - UNIFRA
[email protected]
Resumo: Neste trabalho, relatamos os resultados de uma experiência realizada com
alunos do primeiro ano do Ensino Médio de uma escola pública do estado do Rio
Grande do Sul, tendo como foco a investigação matemática como prática de sala de
aula.A tarefa de investigação propunha explorar os conceitos de sucessões numéricas. A
partir da proposição de uma situação problematizadora, foi analisado o processo seguido
pelos alunos na busca de respostas ao problema. A metodologia de pesquisa usada
integrou uma componente de experiência de ensino, observação participante e análise de
documentos produzidos pelos alunos. Concluiu-se que a incorporação de atividades
investigativas no cotidiano de sala de aula, nesse nível de ensino, aponta para uma
efetiva compreensão do conteúdo estudado, que se apresenta como um objeto
matemático com significado para os alunos.
Palavras-chave: Investigação matemática; Sucessões numéricas; Ensino e
aprendizagem de matemática.
Introdução
Situações que permitam explorar e descobrir a Matemática são ferramentas
importantes para introduzir e aprofundar conceitos matemáticos e é fundamental que
sejam propostas aos alunos pelos seus professores. Uma das formas, entre outras, que
permitem essa exploração e descoberta é a proposição, em sala de aula, de atividades
investigativas para o estudo de determinados conteúdos.
De acordo com Frota e Gazire (2009, p.1305) “o entendimento do que seja
investigação matemática decorre de um conjunto relevante de trabalhos que podem ser
agrupados como pesquisa sobre Resolução de Problemas ou sobre Atividades
Investigativas”. Como referenciais desses trabalhos, as autoras referem-se a textos de
Polya (1977), Ponte (2003) e Frota (2005, 2007), entre outros. Os conceitos de
Resolução de Problemas e de Investigação Matemática possuem uma fronteira muito
tênue, com mais pontos em comum do que diferenças. Porém, mais importante do que
procurar a distinção entre problema e investigação, é apresentar aos alunos um conjunto
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de atividades que envolvam os conceitos matemáticos, de modo que tenham
oportunidade de experimentar, discutir, formular, conjecturar, generalizar, provar,
comunicar suas idéias e tomar decisões.
A concepção de investigação matemática que adotamos neste trabalho é aquela
definida por Frota e Gazire (2009):
[...] uma situação problematizadora dispara o processo investigativo, a busca
de métodos e processos e do levantamento de estudos teóricos na busca de
uma solução. De acordo com essa concepção, uma aula de Matemática é
sempre organizada a partir de uma situação problematizadora, que pode se
configurar , por exemplo, na forma de uma pergunta , um problema, uma
atividade investigativa, uma tarefa exploratória ( p. 1306).
Portanto, organizar o trabalho de sala de aula fazendo uso de atividades
investigativas permite, tanto ao professor quanto aos alunos, a liberdade de criação, a
oportunidade de questionar e de conjecturar, de utilizar e comparar diferentes
representações mentais, e possibilita a busca de diferentes métodos de resolução das
atividades propostas. Isso também está de acordo com o que preconiza Pereira (2004),
de que essas atividades colaboram para o desenvolvimento de competências,
capacidades e valores nos alunos e contribuem para estabelecer uma relação de
confiança entre professor e estudantes.
Em Ponte et al. (2005) e Fiorentini e Cristóvão (2006), os autores relatam
resultados de pesquisas que registram experiências, bem sucedidas, sobre a utilização
dessa metodologia, em diferentes níveis de ensino. De acordo com Fiorentini e
Cristóvão (2006), o sucesso de uma aula investigativa depende fundamentalmente do
planejamento da tarefa e da necessidade de:
construir, gradativamente, uma cultura com a turma para desenvolver o
trabalho investigativo, habituando os alunos ao trabalho em grupo, às
discussões e explorações, ao levantamento e teste de conjecturas, à tentativa
de provar ou argumentar a validade das mesmas, à elaboração dos relatórios
das investigações e à socialização e negociação dos resultados (p.28).
Os mesmos autores, ao definirem as aulas investigativas, assim expressam sua
importância:
As aulas exploratório-investigativas são aquelas que mobilizam e
desencadeiam, em sala de aula, tarefas e atividades abertas, exploratórias e
não diretivas do pensamento do aluno e que apresentam múltiplas
possibilidades de alternativa de tratamento e significação (p.29).
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A utilização de atividades investigativas no Ensino de Matemática vem ao encontro,
também, do que preconizam os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998):
[...], a matemática pode dar sua contribuição à formação do cidadão ao
desenvolver metodologias que enfatizem a construção de estratégias, a
comprovação e justificativa de resultados, a criatividade, a iniciativa pessoal,
o trabalho coletivo e a autonomia advinda da confiança na própria capacidade
para enfrentar desafios (p.27).
Ao trabalhar, na sala de aula, utilizando-se atividades investigativas, oportunizase ao aluno uma vivência de um ambiente de aprendizagem no qual a figura central
deixa de ser o professor, mas volta-se para o aluno. Ao propor atividades dessa
natureza, possibilita-se ao estudante uma mudança da postura passiva para um
posicionamento crítico e atuante. A utilização dessa metodologia faz com que o
professor desempenhe um papel de moderador das atividades, em que os alunos passam
a ser o centro de todo o processo. Ela exige do professor uma capacidade de reagir e
interagir em situações improvisadas, nas quais ele deixa de ter controle dos métodos e
processos que os alunos utilizam, ou seja, não tem um caminho pré-determinado; em
conseqüência, professor e alunos se transformam, interagindo entre si.
Neste trabalho, tem-se como objetivo descrever os resultados de uma experiência
realizada no segundo semestre de 2009, com alunos do 1º ano do Ensino Médio de uma
escola pública, no estado do Rio Grande do Sul, no estudo de sucessões numéricas,
utilizando-se a investigação matemática como metodologia de trabalho na sala de aula.
A experiência realizada procurou romper com a forma de ensinar, na qual
primeiramente o aluno aprende os conceitos e técnicas para, posteriormente, aplicá-las
na resolução de problemas e exercícios.
Procedimentos Metodológicos
O trabalho aqui relatado foi desenvolvido com uma turma composta de 27 alunos
do primeiro ano do Ensino Médio, sendo dois desses alunos portadores de necessidades
especiais, com surdez completa; Uma das autoras foi a professora responsável pela
disciplina. A experiência foi desenvolvida na sala de aula, com os alunos dispostos em
grupos de até quatro estudantes, reunidos de acordo com suas preferências pessoais.
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Para a obtenção dos dados e posterior análise, foram utilizados como instrumentos
de pesquisa a observação participante e a análise dos documentos produzidos pelos
alunos.
Em geral, nesse nível de ensino, os alunos estudam os conteúdos de progressões
aritméticas e geométricas, introduzidos sem que eles tenham ideia do comportamento
dos elementos que formam essas sequências. A experiência na sala de aula teve início
com a apresentação da proposta de trabalho, envolvendo as etapas de uma aula
investigativa, conforme descritas em Ponte
et
al. (2005). Segundo os autores, a
primeira etapa é a exploração e formulação de questões ou de situações-problema
desencadeadoras da atividade investigativa; a segunda refere-se à formulação de
conjecturas sobre essa questão ou situação-problema; a terceira inclui a realização de
testes e refinamento de conjecturas e a última etapa está relacionada com a
argumentação ou demonstração, que valida ou refuta o resultado e a avaliação do
trabalho realizado.
Nesta experiência, as etapas não aconteceram de forma estanque e ordenada, em
alguns momentos aconteceram de forma simultânea. Na etapa de avaliação, inseriu-se a
comunicação dos resultados do trabalho desenvolvido pelos grupos de alunos, em forma
oral e escrita.
Ao final de cada aula os alunos escreveram suas reflexões e informações a
respeito do caminho de busca de solução do problema e destacaram os pontos que
consideraram mais significativos.
Relato da Experiência
A experiência, aqui descrita, foi composta de duas atividades investigativas que
tiveram como objetivo a introdução dos conceitos relacionados com sucessões
numéricas, por meio da construção de um modelo matemático que traduzisse a situação
proposta. A tarefa consistiu na construção de polígonos com fósforos, conforme
proposto em Pereira e Saraiva (2005). Caixas de fósforos foram colocadas à disposição
dos grupos de alunos, de modo que pudessem manipulá-los para criar as soluções.
As situações propostas foram as seguintes:
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Observem os desenhos abaixo, continuem a construção das sequências dos polígonos
e tentem encontrar uma fórmula que determine o comportamento dos polígonos, nos
seguintes casos:
1)
2)
Ao final do trabalho, foi solicitado aos alunos que elaborassem um relatório em
que constassem os passos da investigação e uma opinião sobre o trabalho realizado.
Inicialmente, a professora responsável pela disciplina explicou aos alunos a
atividade que seria realizada e, a seguir, deixou-os livres para trabalharem. Durante a
realização das tarefas, a professora acompanhou os trabalhos dos grupos, questionando,
sugerindo que pensassem em algum esquema ou gráfico para melhor compreender o
processo, estimulando-os a prosseguirem na exploração da atividade e na escrita dos
resultados, contribuindo, desse modo, para o desenvolvimento da capacidade de
abstração.
No momento seguinte, observou-se uma agitação nos grupos e ficou evidente a
expectativa quanto à tarefa que seria realizada.
Transcorrido algum tempo e de acordo com o registro da professora, os alunos
manifestaram-se com perguntas e afirmações:
Aluno A: o primeiro elemento é 4, o segundo é 8 depois 12 e depois 16 . Então o
próximo é 20?
Professora: o problema é um desafio e diz que devemos procurar construir os
próximos elementos. Como você chegou à conclusão de que o próximo elemento é 20?
Aluno A: porque do que temos está aumentando de 4 em 4.
Professora: faça um esquema mostrando isso e pense no elemento seguinte.
A compreensão do problema foi uma das etapas mais difíceis. Primeiramente,
porque os alunos não estão habituados a formular problemas e, muitas vezes, nem
mesmo os professores. De modo geral, as questões ou os problemas propostos aos
alunos são buscados nos livros textos e o caminho para obtenção da resposta é
conhecido. Uma atividade de investigação é uma questão desafiadora, é uma situação
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instigante e não existe uma resposta pronta; ela exige uma pesquisa mais aprofundada,
muitas vezes de forma interdisciplinar, para elaborar as conjecturas de solução.
Superada a fase do impacto inicial, o passo seguinte dado pelos alunos e
orientados pela professora foi explorar as sequências, levantar hipóteses e buscar
subsídios para resolver o problema proposto.
Após alguns minutos, os alunos começaram a discutir. O fato de procurar
descobrir os próximos elementos animou-os, estabelecendo-se calorosas discussões em
cada grupo.
Aluno B: como chegar em uma lei de formação geral?
Professora: tentem desenhar os próximos passos e observem o que acontecer.
Aluno B: os elementos vão aumentando de 4 em 4.
Professora: então qual é o termo geral?
Alguns alunos, mais atentos e participativos, observaram que a sequência
formada era crescente.
A seguir apresentamos as soluções apresentadas pelos grupos 1 e 3, para a
primeira atividade. Os nomes dos alunos que aparecem no relatório são fictícios.
Figura 1-Solução do grupo 1
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Figura 2-Solução do grupo 3
Como podemos observar, o grupo 1 não chegou à formulação do termo geral,
mas conseguiu concluir que era uma sequência crescente. No relato escrito, o grupo se
manifestou dizendo que era uma atividade diferente e muito boa para testar o raciocínio.
O grupo 3 construiu passo a passo o termo geral da sequência e, em seu relato, os alunos
afirmaram que a atividade foi muito produtiva e que testou o seu raciocínio.
A preocupação com a generalização da solução do problema investigado foi uma
característica observada pela professora, pois esse comportamento matemático não era
esperado, uma vez que os alunos nunca haviam se manifestado desse modo, em aulas
anteriores. Acreditamos que essa atitude foi fruto da experiência que os alunos estavam
vivenciando, pois se sentiram desafiados com as tarefas propostas.
Um novo passo foi dado quando os alunos conjecturaram acerca da
possibilidade de, com os palitos de fósforos, construir outros exemplos de sequências. A
partir desse momento, os grupos começaram a brincar com os palitos e diferentes
sequências foram construídas, envolvendo outros polígonos regulares. Os alunos
conseguiram determinar o termo geral de cada sequência construída e estudaram suas
propriedades.
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Considerações Finais
De acordo com as observações da professora responsável pela disciplina e
registradas em seu diário de campo, durante o desenvolvimento das tarefas, a maioria
dos grupos evidenciou a capacidade de fazer generalizações e relacionar os conteúdos
com a geometria. De acordo com os resultados encontrados nas experiências descritas
por Ponte et al. (2005) e nos trabalhos descritos em Fiorentini e Cristóvão (2006), a
capacidade de estabelecer conexões e de fazer representações está associada à
capacidade de abstração, a qual cresce na medida em que os alunos alcançam
maturidade matemática. No relato da professora responsável pela disciplina, foi
registrado que, no início da tarefa, os alunos ficaram desestabilizados, mas na medida
em que avançaram nas discussões, foi possível sentir que os alunos estavam mais
seguros em suas afirmações e perguntas, ou seja, estavam mais autônomos.
Por outro lado, observou-se uma forte tendência em associar a ideia de sucessão a
uma relação que varia na medida em que o número de polígonos aumenta. Ou seja, nas
tentativas de resolução, os alunos evocaram o conceito de sucessão associado a uma
representação geométrica dos polígonos. A relação entre um conceito da análise e seu
aspecto geométrico facilitou a compreensão do conceito de sucessão que, em geral, é
considerado complexo pelos alunos. Esse aspecto também foi mencionado por Pereira
(2004, p.7), quando descreve uma experiência sobre sucessões com alunos do 11º ano
de escolaridade em Portugal. As representações geométricas criaram, de fato, uma
imagem mental que permitiu testar, generalizar e validar as conjecturas feitas pela
professora e pelos alunos.
A experiência aqui relatada revelou, também, que os alunos conseguiram
perceber que uma sucessão é uma função, embora isso não tenha sido descrito de forma
explicita. Em todos os trabalhos, os alunos construíram as sucessões associando a cada
n um único valor. Neste sentido, a representação geométrica e a possibilidade de
manipulação com os palitos de fósforos contribuíram fortemente para a compreensão do
conceito.
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A criatividade foi outra capacidade que apareceu de forma explícita durante o
desenvolvimento das tarefas. Isso ficou evidente nas argumentações e nas explicações
dadas na construção das sequências.
A socialização dos resultados obtidos em cada etapa das tarefas propostas
permitiu a discussão de diferentes estratégias e a proposição de novas perguntas,
hipóteses e conjecturas. Os alunos com necessidades especiais inseriram-se em grupos
distintos e participaram ativamente das discussões, sugerindo
estratégias e
comunicando-se com os demais estudantes, de forma eficiente.
O trabalho permitiu a criação de um ambiente de confiança entre os alunos e a
professora e, na medida em que as etapas foram sendo vencidas, observou-se que os
alunos estavam mais independentes e autônomos.
Referências
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Acesso em: 02 março 2010.
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