Residência Pediátrica 2011;1(1):26-7.
RESIDÊNCIA PEDIÁTRICA
ÉTICA MÉDICA
A sociedade brasileira tem um novo Código de Ética Médica
Sidnei Ferreira
partir do dia 13 de abril de 2010, ou seja, na vigência do novo
CEM, sob sua égide será analisado.
A entrada em vigor do CEM atualizado foi amplamente
divulgada pelas assessorias de imprensa dos CRM e do CFM.
Entretanto, sem surpresa para quem milita pela melhoria da
assistência médica no país e pela dignidade da nossa profissão,
o enfoque dado pela imprensa não foi pelo prisma da grande
mudança, da modernização, da coragem de abordar temas
como pesquisa médica em menores, procriação medicamente
assistida, publicações científicas, docência, uso de placebo, genoma humano, relações comerciais, auditoria, perícia médica,
cuidados paliativos, terapêuticas inúteis ou obstinadas, entre
tantos outros temas. Tampouco a pujança que o Código traz
em seus 25 princípios fundamentais do exercício da Medicina,
10 normas diceológicas, 118 normas deontológicas e cinco
disposições gerais, tornando-o um dos códigos de ética médica
mais completos e bem elaborados do mundo.
O aspecto em destaque na imprensa foi, por exemplo,
a falta do médico ao plantão, a letra ilegível e suas punições.
Como se o Código tivesse sido elaborado somente para punir
e não, também, e principalmente, para orientar, normatizar
e prevenir denúncias e erros. Grave, é a falta de médicos nas
unidades de saúde devido aos salários indignos, condições de
trabalho inaceitáveis, falta de concurso público, e não a falta
de médicos ao trabalho.
Temos um CEM moderno, elaborado após ampla e
democrática discussão. Caberá aos Conselhos Regionais e ao
Conselho Federal analisar e julgar os casos omissos ou polêmicos, elaborando pareceres e resoluções, muitas das quais
farão parte do próximo CEM que será elaborado, esperamos,
não antes dos próximos 20 anos.
Abaixo tentaremos introduzir os conceitos éticos contidos no CEM por meio de casos reais, totalmente modificados
para que não possa ser possível a identificação dos envolvidos.
Baseado no CEM, responda:
Caso 1
Adolescente de 17 anos procura seu médico e lhe pede
uma receita de anticoncepcional, pois deseja manter relações
sexuais com o seu namorado. Ela solicita que o médico não
A sociedade brasileira tem um novo Código de Ética
Médica (CEM). Na verdade, tem um CEM moderno, atualizado
e que, muito provavelmente, se mostrará eficaz e justo com
o passar do tempo.
Foram dois anos de consulta pública, durante os quais
2.677 sugestões de médicos e entidades da sociedade civil
foram enviadas e analisadas pelas Comissões Nacional e Estaduais de Revisão do Código de Ética Médica, que organizaram
e discutiram cada proposta de mudança. Quarenta e quatro
por cento das proposições foram oferecidas pelos Estados de
São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.
A metodologia de trabalho envolveu reuniões das
Comissões Estaduais, que organizavam por tema as idéias
recebidas, discutiam e as remetiam à Comissão Nacional para
análise. Para tratar os assuntos com anseios de mudanças
encaminhados pelas comissões estaduais, foram realizadas
três Conferências Nacionais.
Cada médico e cada entidade médica com registro no
país tiveram oportunidade de se pronunciar por mudanças
ou por textos inteiramente novos. Cada tema enviado foi
exaustivamente discutido nas Conferências Nacionais, com
debates nos grupos de trabalho e nas plenárias. Foi um trabalho exaustivo, porém gratificante. Nenhuma ideia ficou de
fora, nenhum tema ficou sem discussão, nenhum desgosto
restou, creio eu, naqueles que trabalharam pelo CEM, vigente
desde 13 de abril de 2010.
Os trâmites legais foram cumpridos, como por exemplo,
o vacatio legis, prazo legal que uma lei tem para entrar em
vigor, de sua publicação até o início da sua vigência. O prazo
estipulado foi de 180 dias, de 13 de setembro de 2009 a 12
de abril de 2010.
Uma das repercussões da vigência do novo CEM se
relaciona ao princípio do tempus regit actum, ou seja, o tempo
rege o ato, no sentido de que as coisas jurídicas se regem pela
lei da época em que ocorreram. A lei penal não retroagirá,
salvo para beneficiar o réu. Assim será com o novo CEM. Só
retroagirá para beneficiar, mesmo nos casos transitados em
julgado. O que ocorreu antes da sua vigência, será avaliado
sob a visão do CEM antigo. Nestes casos, o novo CEM só será
usado para benefício do acusado. Em suma, o que ocorrer a
Pediatra. Pneumologista pediátrico. Prof. Assistente do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Diretor da Sociedade Brasileira de Pediatria.
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diga nada a seus pais, já que os mesmos jamais aceitariam a
sua decisão. Este atende ao seu pedido.
Agiu corretamente o colega ou não?
Comentário: O adolescente tem a prerrogativa de comparecer à consulta médica sem estar acompanhado de seus
responsáveis e o médico de atendê-lo, desde que conclua que
o paciente tem discernimento suficiente para tal.
É dever do médico, neste caso, atender ao adolescente
e manter o sigilo médico, profissional. O sigilo só poderá ser
quebrado se o pediatra avaliar que seu paciente não tem capacidade de discernimento ou quando a não revelação possa
acarretar dano ao paciente. É o que diz o artigo 74, abaixo.
É claro que o pediatra deverá sempre tentar uma solução
conjunta, convencendo o adolescente de que o melhor para
ele é a participação e ajuda dos seus responsáveis na solução
do problema.
Confira a sua resposta
Capítulo IX - Sigilo Profissional - “É vedado ao médico”
Art. 73. Revelar fato de que tenha conhecimento em
virtude do exercício de sua profissão, salvo por motivo justo,
dever legal ou consentimento, por escrito, do paciente.
Parágrafo único. Permanece essa proibição: a) mesmo
que o fato seja de conhecimento público ou o paciente
tenha falecido; b) quando de seu depoimento como
testemunha. Nessa hipótese, o médico comparecerá
perante a autoridade e declarará seu impedimento; c)
na investigação de suspeita de crime, o médico estará
impedido de revelar segredo que possa expor o paciente
a processo penal.
Art. 74. Revelar sigilo profissional relacionado a paciente menor de idade, inclusive a seus pais ou representantes
legais, desde que o menor tenha capacidade de discernimento, salvo quando a não revelação possa acarretar dano ao
paciente.
Caso 2
A mãe de um adolescente de 17 anos, cliente do mesmo
médico desde os três anos, pede que este faça um atestado
com data do dia anterior, dispensando o adolescente das atividades físicas daquele dia, por motivo de doença, para ser
apresentado no colégio, pois faltara às atividades escolares
para estudar. O último atendimento no consultório havia sido
há uma semana.
Qual a conduta adequada nesse caso?
Comentário: Mesmo conhecendo o paciente, não
deve o médico atestar ato que não praticou. Inúmeros são os
casos de denúncias à Justiça e ao Conselho por este motivo.
O médico, com boa fé e na intenção de ajudar seus pacientes
e familiares, tem por hábito fazê-lo. Os riscos são grandes,
ocorrendo o envolvimento, muitas vezes, em crimes graves.
Confira a sua resposta
Capítulo X - Documentos Médicos - É vedado ao
médico.
Art. 80. Expedir documento médico sem ter praticado
ato profissional que o justifique, que seja tendencioso ou que
não corresponda à verdade.
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