José Aguiar, Estudos cromáticos nas intervenções de conservação em Centros Históricos, Évora, UE-LNEC, 1999 (tese de
doutoramento) Anexo 3:
ANEXO 3
Documento de Nara sobre a autenticidade,
Nara (Japão), 1994
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Tradução de José Aguiar e Ana Paula Amendoeira .
Preâmbulo
Nós, os especialistas reunidos em Nara (Japão), desejamos saudar a generosidade e a visão das
autoridades japonesas que nos forneceram a oportunidade deste encontro, no qual pudemos colocar em
questão o pensamento convencional em matérias de conservação do património cultural, instaurando um
debate sobre as vias e os meios de alargar os nossos horizontes na perspectiva de assegurar um maior
respeito, na prática da conservação, pela diversidade das culturas e dos patrimónios.
Também desejamos salientar o valor do quadro de discussão proposto pelo Comité do Património
Mundial no seu desejo de aplicar o teste da autenticidade, de acordo com formas que garantam o total
respeito para com os valores culturais e sociais de todas as sociedades, no exame do valor excepcional
do património cultural proposto para inscrição na Lista do Património Mundial.
O Documento de Nara sobre a Autenticidade é concebido no espírito da Carta de Veneza, 1964,
fundando-se nesta e constituindo seu prolongamento, como resposta à expansão do interesse e
preocupações para com o património cultural no nosso mundo contemporâneo.
Num mundo que está crescentemente sujeito às forças da globalização e da homogeneização, e num
mundo onde a procura da identidade cultural por vezes se exprime ligada a um nacionalismo agressivo e
à supressão de culturas minoritárias, a contribuição essencial do conceito de autenticidade na prática da
conservação consiste em clarificar e pôr em destaque a memória colectiva da humanidade.
Diversidade cultural e diversidade patrimonial
A diversidade das culturas e do património cultural no nosso mundo é uma fonte insubstituível de riqueza
espiritual e intelectual para toda a humanidade. A protecção e a promoção da diversidade cultural e
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Texto base, tal como foi adoptado pelos 45 participantes, originários de 30 países (nenhum português), na Conferência de Nara
sobre Autenticidade em Relação com a Convenção do Património Mundial. O encontro realizou-se em Nara, Japão, entre 1 e 6 de
Novembro de 1994, a convite do governo do Japão e do município de Nara, que organizaram o evento em cooperação com a
UNESCO, ICCROM e ICOMOS. A versão final do Documento de Nara foi editada por Raymond Lemaire e por Herb Stovel. As
versões inglesas e francesa, revelam, no detalhe, algumas diferenças ainda substanciais de conteúdo. Nesta tradução livre, utilizouse como base a versão inglesa, mais curta, pragmática e precisa. Cf. AA.VV, Nara Conference on Authenticity, Japan 1994,
UNESCO/ICCROM/ICOMOS, Tapir Publishers, Trondheim, 1994, pp. xxi-xxv. Ver também Nara, ICOMOS, 1 a 5 de Novembro,
em Icomos Nouvelles, 1995; e ainda ICCROM, Viewpoints: the debat on authenticity, em ICCROM Newsletter, ICCROM, Roma,
1995.
José Aguiar, Estudos cromáticos nas intervenções de conservação em Centros Históricos, Évora, UE-LNEC, 1999 (tese de
doutoramento) Anexo 3:
patrimonial do nosso mundo deve ser activamente promovida como um aspecto essencial do
desenvolvimento humano.
A diversidade do património cultural existe no tempo e no espaço, e exige respeito pelas outras culturas e
por todos os aspectos do seu sistema de crenças. Nos casos onde os valores culturais pareçam estar em
conflito, o respeito pela diversidade cultural exige o reconhecimento da legitimidade dos valores culturais
de todas as partes.
Todas as culturas e sociedades exprimem-se por formas particulares e através de meios tangíveis e
intangíveis de expressão, que constituem o seu património, e estas devem ser respeitadas.
É importante sublinhar um princípio fundamental da UNESCO: o facto de que o património cultural de
cada um é o património cultural de todos. A responsabilidade pelo património cultural e pela sua gestão
pertence, em primeiro lugar, à comunidade cultural que o gerou, e subsequentemente, àquela que o
preserva. No entanto, no exercício destas responsabilidades, a adesão às cartas e convenções
internacionais desenvolvidas para a conservação do património cultural obriga à consideração dos
princípios e das responsabilidades que delas advêm. A ponderação das exigências para com o seu
próprio património com as de outras comunidades culturais é, para cada comunidade, altamente
desejável, desde que esta comparação não ponha em causa os seus valores culturais fundamentais.
Valores e autenticidade
A conservação do património cultural em todas as suas formas e períodos históricos fundamenta-se nos
valores atribuídos a esse património. A nossa capacidade para compreender esses valores depende, em
parte, do grau de credibilidade e veracidade das fontes de informação a seu respeito. O conhecimento e a
compreensão destas fontes de informação, por relação com as características originais e subsequentes
do património cultural, e do seu significado, é um requisito básico para avaliar todos os aspectos da
autenticidade
A autenticidade, tal como foi considerada e afirmada na Carta de Veneza, surge como o factor qualitativo
essencial quanto à qualificação dos valores patrimoniais. O entendimento da autenticidade desempenha
um papel fundamental em todos os estudos científicos sobre património cultural, no planeamento da
conservação e do restauro, assim como nos procedimentos utilizados para a inscrição na Lista do
Património Mundial e outros inventários do património cultural.
Todos os juízos sobre os valores atribuídos ao património assim como da credibilidade das fontes de
informação podem diferir de cultura para cultura, e mesmo no seio da mesma cultura. Não é portanto
admissível basear juízos de valor e de autenticidade em critérios fixos. Pelo contrário, o respeito devido a
José Aguiar, Estudos cromáticos nas intervenções de conservação em Centros Históricos, Évora, UE-LNEC, 1999 (tese de
doutoramento) Anexo 3:
todas as culturas exige que cada obra seja considerada e julgada dentro do contexto cultural a que
pertence.
Em consequência, é da mais alta importância e urgência que, dentro de cada cultura, seja reconhecida a
natureza específica dos seus valores patrimoniais assim como a credibilidade e a fiabilidade das fontes
de informação que lhes dizem respeito.
Dependendo da natureza do património cultural e do seu contexto cultural, a avaliação da autenticidade
poderá estar ligada ao valor de uma grande variedade de fontes de informação. Aspectos destas fontes
podem compreender concepção e forma, materiais e substância, uso e função, tradição e técnicas,
situação e implantação, espírito e sentimento, e outros aspectos internos ou externos à obra. A utilização
dessas fontes permite a determinação, sob os aspectos artístico, histórico, social e científico, das
dimensões específicas do objecto patrimonial em exame.
Definições
Conservação é toda a operação que vise compreender uma obra, conhecer a sua história e o seu
significado, assegurando a sua salvaguarda material e, se necessário, o seu restauro e valorização.
Fonte de informação: conjunto de fontes documentais, escritas, orais e figurativas, que permitem
conhecer a natureza, as especificidades, o significado e a história de uma obra.
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ANEXO 3 Documento de Nara sobre a autenticidade, Nara (Japão