SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
REVISTA
TRIMESTRAL
DE
JURISPRUDÊNCIA
Volume 150 * (Páginas 1 a 340)
Outubro de 1994
340.6
B823
Brasil. Supremo Tribunal Federal.
Revista Trimestral de Jurisprudência. Brasília.
S.T.F., 1957
340p.
1. Jurisprudência — Periódico. 2. Direito —
Jurisprudência. I. Título.
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
Ministro Luiz OCTAVIO Pires e Albuquerque GALLOTTI (20-11-84),
Presidente
Ministro PAULO BROSSARD de Souza Pinto (5-4-89), Vice-Presidente
Ministro José Carlos MOREIRA ALVES (20-6-75)
Ministro José NÉRI DA SILVEIRA (P-9-81)
Ministro SYDNEY SANCHES (31-8-84)
Ministro José Paulo SEPÚLVEDA PERTENCE (17-5-89)
Ministro José CELSO DE MELLO Filho (17-8-89)
Ministro CARLOS Mário da Silva VELLOSO (13-6-90)
Ministro MARCO AURÉLIO Mendes de Farias Mello (13-6-90)
Ministro ILMAR Nascimento GALVÃO (26-6-91)
Ministro José FRANCISCO REZEK (21-5-92)
COMISSÃO DE REGIMENTO
Ministro MOREIRA ALVES
Ministro CARLOS VELLOSO
Ministro FRANCISCO REZEK
Ministro ILMAR GALVÃO, Suplente
COMISSÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE
Ministro CELSO DE MELLO
Ministro MARCO AURÉLIO
COMISSÃO DE DOCUMENTAÇÃO
Ministro NÉRI DA SILVEIRA
Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE
Ministro ILMAR GALVÃO
COMISSÃO DE COORDENAÇÃO
Ministro SYDNEY SANCHES
Ministro PAULO BROSSARD
Ministro CARLOS VFJ T OSO
PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA
Doutor ARISTIDES JUNQUEIRA Alvarenga
COMPOSIÇÃO DAS TURMAS
Primeira Turma
Ministro José Carlos MOREIRA ALVES, Presidente
Ministro SYDNEY SANCHES
Ministro José Paulo SEPULVEDA PERTENCE
Ministro José CELSO DE MELLO Filho
Ministro ILMAR Nascimento GALVÃO
Segunda Turma
Ministro José NÉRI DA SILVEIRA, Presidente
Ministro PAULO BROSSARD de Souza Pinto
Ministro CARLOS Mário da Silva VFI d OSO
Ministro MARCO AURÉLIO Mendes de Farias Mello
Ministro José FRANCISCO REZEK
SUMÁRIO
.
Pág.
ACÓRDÃOS ÍNDICE ALFABÉTICO ÍNDICE NUMÉRICO 1
I
XXI
ACÓRDÃOS
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N° 175 — PR
(Tribunal Pleno)
(Med. Caut. na RTJ 132/1026)
Relator: O Sr. Ministro Octavio Gallotti
Requerente: Governador do Estado do Paraná — Requerida: Assembléia
Legislativa do Estado do Paraná.
Funcionalismo. Licença especial e direito a creche. Inconstitudonalidade dos itens XVIII e XXI do art. 34 da Constituição do
Paraná, por tratarem de matéria sujdta à iniciativa privativa do Chefe
do Poder Executivo (art. 61, 1°, c e d, da Carta Federal).
Correção monetária de vencimentos em atraso r do art.
27 da Carta paranaense), não incompatível com a Constituição Federal.
Banco Regional do Desenvolvimento do Extremo Sul. Natureza autárquica não caracterizada, não podendo também o Estado
dispor, isoladamente, sobre regime dos servidores da empresa (art. 46
do ADCT do Paraná), sem o concurso das duas outras unidades da
Federação, dela participantes (art. 25 da Constituição Federal).
Inconslitudonalidade do art. 55 do ADCT do Paraná, por
dilatar a exceção de dispensa de concurso para o cargo de Defensor
público, prevista no art. 22 das disposições transitórias federais, infringindo os artigos 37, II, e 134, parágrafo único, da Constituição da
República.
Compatibilidade, com o art. 132 da Carta Federal e o art.
69 do respectivo ADCT, da manutenção, pelo art. 56 da Constituição
paranaense, de carreiras especiais, voltadas ao assessoramento jurídico,
sob a coordenação da Procuradoria-Geral do Estado.
Ação direta julgada, em parte, procedente.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes au-
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri-
lama' Federal, em Sessão Plenária, na con-
fomlidade da Ata de julgamento e das notas
taquigráficas , à unanimidade de votos, julgar improcedente a ação, para declarar a
constitucionalidade do § 7° do art. 27 da
Constituição do Estado do Paraná. Tare-
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R.TJ. — 150
bém por igual votação, julgar procedente a
ação, para declarar a inconstitucionalidade
dos arts. 46 e 55 do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias. E, por maioria de votos, julgar procedente a ação para
declarar a inconstitucionalidade do inciso
XVIII e suas letras a e b, e do inciso XXI,
ambos do art. 34 da mesma Carta e julgar
improcedente a ação, para declarar a constitucionalidade do art. 56 e seus §§ 1°, 2° e
3° do ADCT da Constituição do Estado do
Paraná, vencido, em parte, o Ministro Marco Aurélio, que declarava a inconstitucionalidade, apenas, do § 3°.
Brasília, 3 de junho de 1993 — Octavio
Gallotti, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Octavio Gallotti: Perante os artigos 25, 61, 169, parágrafo único e 40, III, b, da Carta Federal, o Governador do Paraná argúi a inconstitucionalidade do inciso XVIII, e suas alíneas a e b,
da Constituição daquele Estado, de 5 de
outubro de 1989, assim redigidos:
«Art. 34. São direitos dos servidores
públicos, entre outros:
XVIII — licença especial de até seis
meses, por decênio de efetivo exercício,
com vencimentos integrais, admitida a
conversão em cinqüenta por cento em
espécie:
no caso de cargo efetivo concederse-á, a cada qüinqüênio de exercício, ao
servidor que arequerer, licença especial
de três meses, com todos os direitos e
vantagens inerentes ao cargo;
se o servidor não quiser gozar do
beneficio, ficará, para todos os efeitos
legais, com o seu acervo de serviço público acrescido do dobro da licença que
deixar de gozar.» (fls. 3/4)
Do mesmo art. 34, é impugnado o item
XXI, abaixo reproduzido, em confronto
com as normas acima indicadas, e mais
com os artigos 195, §
e 39, § 2°, da
Constituição da República, este pela ausência de remissão ao art. 7°, XXV:
«Art. 34. São direitos dos servidores
públicos, entre outros:
XXI — creche para os filhos até seis
anos de idade;» (fl. 8)
Ainda no campo dos direitos dos servidores, é apontada a inconstitucionalidade,
perante os artigos 25 e 61, § 1°, c, da Lei
Maior, do § 7° do art. 27 da Carta paranaense:
7° os vencimentos dos servidores
estaduais devem ser pagos até o último
dia do mês vencido, corrigindo-se seus
valores, se tal prazo for ultrapassado.»
(fl. 10)
Os demais dispositivos, abrangidos na
inicial, estão situados no Ato das Disposições Transitórias da Constituição do Paraná, a começar pelo art. 46:
«Art. 46. Aos servidores do Banco
Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul — BRDE, lotados no Estado do
Paraná, aplica-se o disposto no art. 36
desta Constituição». (fl. 12)
O art. 36, a que é feita a remissão, estabelece que «são estáveis, após dois anos de
efetivo exercício, os servidores nomeados
em virtude de concurso público».
Sendo os servidores do BRDE regidos
pela CLT, o Autor considera violado o art.
22, I, da Constituição Federal, além do art.
19 e seu § 1°, do ADCT de 1988, que dispôs
diversamente sobre a estabilidade dos servidores da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios.
Mencionando os artigos 134, e seu parágrafo único (parte permanente), e 22 (disposições transitórias), da Constituição da
República, o Requerente ataca o art. 55 da
Carta paranaense (ADCT):
«Art. 55. Fica assegurado aos advogados e assistentes jurídicos estáveis do
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R.TJ — 150
Quadro Único do Poder Executivo, em
exercício, na data da instalação da Assembléia Legislativa Constituinte estadual, na função de assistência judiciária
no órgão referido no art. 22 do regulamento aprovado pelo Decreto n 2 1.185,
de 19 de agosto de 1987, e nas funções
jurídicas do Departamento Penitenciário do Estado, o enquadramento no cargo inicial da carreira de defensor
público referidanos arts. 127 e 128 desta
Constituição.» (fl. 16)
Com base nos artigos 37, II, 19, § IR
(ADCT), e 132 da Constituição Federal,
impugna-se o art. 56 da estadual (ADCT) e
seus §§ 12 e 22. No g. 32 do mesmo artigo
56, configurar-se-ia equiparação vedada
pela Lei Maior (art. 37, XIII). Eis os dispositivos contra os quais afinal se insurge o
Governador do Paraná:
«Art. 56.0 assessoramento jurídico
nos Poderes Executivo, Legislativo e
Judiciário e a representação judicial das
autarquias e fundações públicas serão
prestados pelos atuais ocupantes de cargos e empregos públicos de advogados,
assessores e assistentes jurídicos estáveis que, nos respectivos poderes, integrarão carreiras especiais.
12 O assessoramento jurídico, nos
órgãos do Poder Executivo, será coordenado pela Procuradoria-Geral do Estado, visando atuação uniforme.
As carreiras de que trata este
artigo serão criadas e organizadas em
classes por iniciativa dos chefes dos respectivos poderes, no prazo de noventa
dias da promulgação desta Constituição.
ft 32 Aos integrantes dessas carreiras
aplica-se, no que couber, o disposto no
art. 125, §§ 22 e 32, desta Constituição.»
Em sessão de 9 de fevereiro de 1990, foi
deferido o requerimento de medida cantelar, quanto aos incisos XVIII (licença espe-
§r
5
cial) e XXI (creche) do art. 34 da parte
permanente da Constituição do Estado do
Paraná e, ainda, quanto aos artigos 46
(BRDE) e 55 (defensores públicos) do respectivo Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.
Foi indeferida a liminar no tocante ao *
7° do art. 27 (correção de vencimentos em
atraso) do corpo da Carta estadual e também com respeito ao art. 56, e seus parágrafos, do ADCT.
Vieram as informações da Assembléia
Legislativa, em douta exposição subscrita
pelo eminente advogado, Professor Geraldo Ataliba (fls. 225/61).
Em defesa do ato impugnado, oficiou,
às fls. 299/302, o ilustre Dr. Miguel Frauduo Pereira, pela Advocacia-Geral da
União.
Manifestou-se, finalmente, pela procedência da ação, o ilustre SubprocuradorGeral Paulo de Tarso Braz Lucas. Eis a
parte opinativa do parecer, aprovado, na
conclusão, pelo eminente Procurador-Geral da República:
«7. Quanto aos dispositivos da parte
permanente da Constituição do Estado e
que foram acima transcritos, pode-se
desde já proclamar a sua inconstitucions1~, por vulneração ao princípio
estabelecido no art. 61, § 1°, II, c, da
Carta da República, que assegura ao
Chefe do Poder Executivo a iniciativa
de leis que disponham sobre servidores,
regime jurídico, provimento de cargos,
estabilidade e aposentadoria de civis,
bem como reforma e transferência de
militares para inatividade.
8. A simples leitura dos referidos dispositivos não deixa margem paradúvida
quanto à natureza das matérias que lhes
servem de objeto, as quais dizon respeito diretamente ao regime jurídico dos
servidores do Estado. Como afirmar o
contrário, se as normas impugnadas versam exatamente sobre licença especial
dos servidores, sobre o direito a creche
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R.T.J. — 150
para os seus filhos de até seis anos de
idade e sobre a data em que devem ser
pagos os seus vencimentos, com a previsão de correção monetária na hipótese
de atraso no pagamento? Efetivamente,
é impossível fazê-lo em termos plausíveis.
Tampouco é possível afirmar,
como fez o ilustre jurista subscritor das
informações (fl. 228), que o art. 61 da
Constituição da República não estabelece princípio limitativo da ação constituinte estadual. Ora, em primeiro lugar
convém destacar que, apesar do advento
da nova ordem constitucional, nenhuma
mudança substancial se verificou no que
se refere ao dever dos Estados de se
submeterem ao princípio que foi transposto para o art. 61, 1°, H, alíneas a, c
e e, da atual Carta Magna, atinente a
iniciativa privativa do Poder Executivo
para leis que disponham sobre de-terminadas matérias.
Nem se venha argumentar que o
art. 25 da atual Cada Magna, diferentemente do art. 13 da anterior, não se
refere expressamente ao processo legislativo e, portanto, não o erigiu como
princípio federal extensível, de cumprimento obrigatório pelos Estados-Membros. Nada disso parece essencial,
principalmente se se levar em conta que
o citado art. 13 também dispunha sobre
a observância de outros princípios estabelecidos na Constituição além daqueles expressamente mencionados nos
seus incisos I a IX.
11. Era essa, por exemplo, a orientação do eminente constitucionalista Celso Bastos (Curso de Direito Constitucional, 9° ed., São Paulo, 1986, pág.
117), o qual após tecer considerações
sobre os princípios constitucionais sensíveis e os extensíveis, prelecionava, referindo-se aos 'princípios constitucionais estabelecidos', In verbis:
«Além desses princípios, autonomia estadual está limitada por certas
regras esparsas na Constituição, mas
que contribuem para dar os contornos da área de atuação dos Estados
federados. São os princípios constitucionais estabelecidos, dos quais
não daremos aqui uma relação completa, mas apenas alguns exemplos:
as vedações estabelecidas aos Estados pelos arts. 9°, 19 e 20, IR; o
princípio da igualdade dos Estados
membros que, a despeito de suas inegáveis diferenças, a múltiplos títulos,
faz com que todos disponham da
mesma soma de direitos; a obrigatoriedade de os Estados-membros se
curvarem aos direitos e garantias individuais, firmadores de uma ordem
democrática, a necessidade de se
afinarem com o disposto no capítulo
da constituição atinente à ordem econômica e social.»
12. E abordando a questão da utilidade da aludida classificação de princípios, atribuída a José Afonso da Silva e
Raul Machado Horta, concluía o citado
autor:
«Sem embargo do meritório esforço dos autores da classificação exposta, quer nos parecer que o maior
valor do trabalho realizado reside no
seu aspecto didático, e não no científico. Isto porque, embora as diversas
categorias de princípios estudadas
possam apresentar algumas diferenças (p. ex., no que diz respeito às
sanções), todas elas apresentam, a
nosso ver, traços mais fortes que as
unificam em um todo indiferenciado.
Esse conjunto de normas e princípios
é que faz nascer os limites à autonomia estadual, fixada no art. 13. O
perfil jurídico-constitucional dos Estados vai nascer exatamente da conjugação do princípio da autonomia
R.T..1 —150
com os limites a ela impostos pela
Constituição Federal.»
E essa conjugação deve-se fazer
a partir da consideração de que, num
sistema federativo como o nosso, é tradicional a simetria entre a organização
dos Estados-membros e a organização
da União Federal, esta só deixando de
servir de modelo para aqueles naquilo
que for evidentemente secundário ou
que resultar de expressa disposição em
contrário do próprio texto constitucional. Ou seja, os Estados-membros têm a
sua autonomia reconhecida, mas devem
seguir o modelo federal em sua essência, que se manifesta, entre outros, através do princípio estampado no art. 61, §
r, II, a, c e e, da Carta Magna.
E não tem relevo, por outro lado,
o fato de estarem as normas impugnadas
inseridas na Constituição do Estado do
Paraná, e não se tratarem de normas
ordinárias. O que importa é que houve
usurpação de iniciativa do Chefe do Poder Executivo Estadual, a qual não é
menos grave por emanar de um Poder
Constituinte que, sendo decorrente e
meramente autônomo, não pode, evidentemente, sobrepor-se, por via transversa, ao estabelecido pelo Poder
Constituinte originário e soberano.
15. Mas no que diz respeito a esses
mesmos dispositivos da parte permanente da Constituição do Estado, o requerente deduziu certos fundamentos
que merecem ser examinados.
16.0 primeiro deles tem a ver com o
disposto no parágrafo único e incisos do
art. 169 da Constituição Federal, in verbis:
art. 169 Parágrafo único. A concessão de
qualquer vantagem ou aumento de
remuneração,a criação de cargos ou
alteração de estrutura de carreiras,
bem como a admissão de pessoal, a
7
qualquer título, pelos órgãos e entidades da administração direta ou indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público,
só poderão ser feitas:
I — se houver prévia dotação
orçamentária suficiente para atender
às projeções de despesa de pessoal e
aos acréscimos dela decorrentes;
II — se houver autorização especifica na lei de diretrizes orçamentárias, ressalvadas as empresas públicas e as sociedades de economia mista.
O requerente sugere que tal dispositivo da Carta da República teria sido
vulnerado com a edição das normas acima mencionadas. Não parece, contudo,
que a presente ação direta deva ser julgada procedente (no que se refere a tais
normas) com base em semelhante fimdamento. Em primeiro lugar, porque,
para afirmar-se a violação do Parágrafo
Único, I e 1I do art. 169 da CF, seria
preciso, antes de mais nada, que estivesse demonstrada, de plano, a inexistência
da prévia dotação orçamentária e da autorização específica na lei de diretrizes
orçamentárias a que se referem os dois
incisos mencionados. E nada disso foi
feito, não se podendo decidir a respeito
com suporte em mera presunção, principalmente em sede de ação direta de inconstitucionalidade.
Em segundo lugar, porque não
parece racional submeter o Poder Constituinte Estadual, mesmo com todas as
limitações que lhe são inerentes, ao tipo
de restrição previsto no art. 169, que
mais parece ser dirigido ao legislador
ordinário. Ora, abstraindo a questão atinente ao ckscurnprimento do princípio
estabelecido no art. 61 da CF, que fulmina as normas em comento, como admitir que o Poder Constituinte Estadual
pudesse ficar subordinado à deliberação
prévia do legislador ordinário em maté-
8
R.TJ. —150
ria orçamentária? Enfim, no particular,
tendo em vista o aludido fundamento, a
ação não merece prosperar.
Deve igualmente ser repelido o
fundamento correspondente à alegação
de violação do art. 40, III, a e b, da
Constituição Federal pela alínea b do
inciso XVIII do art. 34 da Constituição
do Estado. A contagem em dobro do
tempo de licença especial não gozada
até pode, eventualmente, permitir a aposentadoria de servidor que conte menos
tempo de serviço do que aquele exigido
nas várias alínea« do inciso III do citado
artigo da Carta Magna, mas de forma
alguma afronta o que nelas estiver estabelecido. É que não há redução do tempo necessário para aposentadoria no
plano abstrato, de modo a que, nesse
mesmo plano em que se deve fazer o
confronto das normas, se possa vislumbrar, desde logo, a vulneração da norma
constitucional. Em outras palavras, a
norma Estadual impugnada não reduz
diretamente o tempo de serviço exigido
para a aposentadoria dos servidores,
mas apenas institui uma vantagem que,
eventualmente e in concreto, pode, de
modo indireto, resultar na redução do
tempo efetivo exigido, sem que, com
isto, se possa considerar vulnerado o
disposto do art. 40, III, e alíneas da
Constituição Federal. A norma impugnada em concreto — convém neer&
— é inconstitucional somente do ponto
de vista formal, por ter sido contrariado
o princípio previsto no art. 61 da Constituição Federal.
Quanto aos dois fundamentos
adicionais que o requerente invoca para
sustentar a sua alegação de inconstitucionalidade do art. 34, inciso XXI, da
Constituição do Estado do Paraná, cumpre desde logo rechaçar, por impertinente, aquele que diz respeito à vulneração
do art. 195, § 5°, da Constituição da
República. O direito a 'creche para os
filhos até seis anos de idade', garantido
aos servidores na citada norma constitucional do Estado, não consubstancia beneficio ou serviço de seguridade social,
mas sim vantagem outorgada ao servidor no plano da relação estatutária que
vigora entre o Estado e os seus servidores, a qual como toda vantagem deve ser
suportada pelo Estado, independentemente de fonte de custeio específico.
21. Já o outro fundamento parece ser
dotado de maior consistência, merecendo uma análise mais acurada, em que
pese a impossibilidade de subsistência
da norma estadual supramencionada emace do princípio do art. 61 da CF. Eis
como o requerente o formulou, no particular:
«Os fimdamentos para demonstrar a inconstitucionalidade do inciso
XXI da art. 34 da Constituição do
Paraná são semelhantes aos examinados acima. Também há outra manifestação de conflito com a
Constituição da República, e este se
apresenta quando a constituinte estadual dá aos funcionários do Estalo
direito que não receberam os funcionários da União na Constituição Federal. Os estados-membros estão por
igual vinculados ao molde federal na
disciplina constitucional dos direitos
de seus funcionários. É conseqüência
do sistema da organização federativa
imposta pela Constituição da República.
E esse sistema, quanto ao funcionalismo, consistiu em enunciar-lhes
os direitos selecionando-os no elenco dos chamados direitos sociais,
conferidos à generalidade dos trabalhadores. É o método do § 2° do art.
39, quando a Constituição Federal
remete ao art. 7° de seu texto, isolando ali os direitos aplicáveis aos funcionários. No entanto a Constituição
do Brasil não faz remissão ao inciso
R.TJ — 150
XXV de seu art. 7°; não dá aos funcionários da União e territórios assistência gratuita aos filhos e
dependentes em creches e pré-escolas.
O inciso XXI do art. 34 da Constituição do Paraná é reprodução parcial do inciso XXV do art. 7° da
Constituição da República. Porém
essa transposição, mediante adaptação, lhe é vedada, mesmo para instituir direito a creche com limitação de
faixa etária aos beneficiários.»
A questão é de fato relevante,
pois envolve a definição do nível de
autonomia dos Estados no estabelecimento do regime jurídico de seus servidores. É certo que tais pessoas jurídicas,
seja no plano constitucional, seja no plano de sua legislação ordinária, estão estritamente limitadas pelo disposto no
art. 37 da Constituição Federal. O que
merece umardlexão mais profunda, porém, é saber até que ponto elas estão
limitadas pelas normas do art. 39, cujo
§ por remissão a vários incisos do art.
7° da mesma Carta Magna, estende aos
servidores públicos em geral inúmeros
direitos que ali são reconhecidos aos
trabalhadores urbanos e rurais. A indagação que, em suma, se impõe, à espera
de uma resposta desse Pretório Excelso,
é a seguinte: não fosse o óbice resultante
do art. 61, § 1°, da Constituição Federal,
poderia o Constituinte estadual erigir
em favor dos seus servidores mais direitos do que aqueles previstos no modelo
Federal delineado no art. 39, § 2° da
Carta Magna?
Ao proferir o seu voto na Ação
Direta de Inconstitucionalidade n° 1221/600-SC (D7 12ó92), o Relator, Famr2
Sr. Min. Paulo Brossard, antes de concluir pela inconstitucionalidade do § 4°
do art. 30 da Constituição do Estado de
Santa Catarina (atinente à aposentadoria
voluntária especial estendida aos 'Espe-
9
ciclistas em Assuntos Educacionais'),
posicionou-se nos seguintes termos:
«Os princípios gerais estabelecidos para a administração pública (art.
37, CF) e os específicos aos servidores públicos civis (art. 39 a 41, CF)
são de observância e aplicabilidade
obrigatória aos Estados, os quais, por
isso, sobre eles não podem dispor de
forma diferentemente.»
Não obstante a ilustre fonte de
onde provém, não parece que solução
tão drástica seja a melhor. A disposição
do art. 37 da CF tem nítido caráter limitativo da atuação legislativa dos Estados, mas o mesmo não se pode dizer do
material normativo que emerge do art.
39, § 2°, da mesma Carta Magna. Aqui
o Constituinte Federal estabeleceu expressamente a competência legislativa
da União, Estados, Distrito Federal e
Municípios para instituir o regime jurídico único e planos de carreira para os
servidores das respectivas administração direta, autarquias e fundações públicas. Impôs — é verdade — o regime
único, mas ao mesmo tempo reconheceu
a competência legislativa dos Estados,
Distrito Federal e Municípios para dispor sobre esse regime único, estabelecendo os direitos e obrigações dos
servidores, desde que observados os
princípios do art. 37, e garantidos, no
mínimo, entre outros, os direitos reconhecidos no § 2° do art. 39 da Constituição Federal.
Reconhecer que aos Estados é
vedado instituir em favor dos seus servidores direitos outros além daqueles
previstos na Constituição Federal é algo
que, decididamente, parece fraturar irremediavelmente a espinha dorsal do sistema federativo, mesmo de um sistema
como o nosso onde sempre houve uma
tendência de tutela dos Estados pela
União Federal. E isto é injustificável,
seja por não resultar claramente do dis-
10
R.TJ.— 150
posto no art. 39 da Constituição Federal,
seja por tolher a autonomia dos Estados
em um plano onde o reconhecimento de
direitos adicionais não vulnera os princípios estabelecidos na Constituição Federal, e nem desfigura, em pontos essenciais, o modelo que esta lhe impôs.
Por outro lado, se se tiver de
admitir que os Estados, ao nível de sua
legislação ordinária e uma vez observado o princípio do art. 61, § P, da CF, não
podem criar novos direitos para os seus
servidores, essa mesma vedação terá que
ser estendida para a União Federal, o
que não parece racional, por impedir, a
priori, aos servidores públicos do País
a conquista de novos direitos, condenando-os à estagnação em sua luta por
melhores condições de vida.
Essas mesmas considerações são
válidas para repelir idêntico fundamento invocado pelo requerente em relação
ao disposto no § 70 do art. 27 da Constituição Federal, cujo único vício é de
natureza formal, como já foi dito anteriormente.
Impõe-se, finalmente, o exame
das normas impugnadas constantes do
Ato das Disposições Constitucionais Transitórias do Paraná. No particular, ressalta, de logo, a inconstitucionalidade do
art. 46, que mandou aplicar aos servidores do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul — BRDE, lotados no Estado do Paraná, o disposto no
art. 36 da Constituição do Estado, que
dispõe sobre a aquisição de estabilidade,
após dois anos de efetivo exercício, pelos servidores nomeados em virtude do
concurso público.
Todos os fundamentos aduzidos
pelo requerente são válidos e a norma
impugnada efetivamente contraria
não só o art. 22, I, da Constituição
Federal (e eventualmente o art. 19 do
ADCT/CF), como também, acima de
tudo, evidencia uma irracionalidade que
deve ser escoimada da Constituição do
Estado do Paraná. Ora, como admitir
que somente os empregados do BRDE
em exercício no referido Estado possam
adquirir a estabilidade, enquanto que os
atuantes nos demais Estados que o criaram fiquem a ver navios? De duas uma
Ou o Constituinte do Estado do Paraná
pode, sozinho, estabelecer regras válidas para todos os empregados do
BRDE, ou não pode estabelecer regra
alguma, principalmente se pretender
que seja válida somente para alguns deles, o que, no caso, constituiria afronta
ao disposto no art. 19,111, da Constituição Federal.
De resto, a própria controvérsia
em tomo da natureza jurídica do BRDE
já deveria por si só ter inibido a iniciativa do Constituinte Estadual. Tratandose de autarquia interestadual, se é que é
possível a existência de tal figura em
nosso ordenamento jurídico, nenhum
ato normativo que lhe diga respeito e lhe
crie obrigações pode ter validade e eficácia se não emanar de todos os Estados
que a criaram. Dever-se-ia, no caso, observar a mesma forma jurídica adotada
no processo de sua criação, sob pena até
de violar-se a autonomia dos demais
Estados (art. 18 da CF).
E por tratar-se de autarquia —
repetindo-se: se é que é possível atribuir
tal natureza ao BRDE — o Constituinte
estadual, de resto estaria violando o princípio previsto no art. 61, § P, da CF.
32. A verdade, porém, é que, cuidando-se de empresa pública, cujos empregados são regidos pela CLT, o Constituinte
Estadual violou, in caso, o art. 22, I, da
CF. E o que é pior pretendeu veladamente trazer para os seus quadros, sem o
devido concurso público, empregados
de uma empresa pública, em flagrante
mineração do princípio estabelecido no
art. 37,11, da mesma Carta Magna.
R.TJ —150
33. 0 art. 55 do ADCT do Paraná é
também inconstitucional, por violar o
disposto no art. 22 do ADCT da República, que se limitou a assegurar «aos
defensores públicos investidos na função até a data da instalação da Assembléia Nacional Constituinte o direito de
opção pela carreira, com observância
das garantias e vedações previstas no
art. 134, Parágrafo Único, desta Constituição.» A norma impugnada, como
bem o disse o requerente, foi além do
permitido, pois:
«(a) assegurou o ingresso na carreira de defensor público àqueles que
estivessem em exercício na data de
sua instalação, quando, pelo disciplinamento integrado dos artigos 134
do texto permanente e 22 das disposições transitórias da Constituição da
República, essa investidura é permitida aos que em exercício estivessem
na data de instalação da Assem-
bléia Nacional Constituinte;
(b) permitiu aos 'advogados e assistentes jurídicos nas funções jurídicas do Departamento Penitenciário
do Estado' o ingresso, sem delongas,
na carreira de Defensor Público. Neste último aspecto a inconstitucionalidade não comporta discussão, uma
vez que se foge completamente ao
padrão de excepcionalidade que foi
admitido nas disposições transitórias
da Constituição da República, já que
incontomável a condição do concurso público.»
34.0 capei art. 56 do ADCT do Paraná é igualmente inconstitucional sob
vários aspectos. Em primeiro lugar, porque, efetivamente, afronta o disposto no
art. 132 da Constituição Federal, que, de
modo, expresso reservou aos Procuradores dos Estados e do Distrito Federal
a representação judicial e a consultoria
jurídica das respectivas unidades federadas, o que s6 foi excepcionado na hi-
11
pótese prevista no art. 69 do ADCT da
República, que permitiu «aos Estados
manter consultorias jurídicas separadas
de suas Procuradorias-Gerais ou Advocacias-Gerais, desde que, na data da promulgação da Constituição, tenham órgãos distintos para as respectivas funções». Daí se extrai, de imediato, a inconstitucionalidade da expressão «executivo» inserida no caput da referida
norma, com a extensão de igual vício ao
respectivo § 1°.
Por outro lado, a norma em comento se mostra contrária ao disposto
no art. 37,11 da Constituição Federal,
pois, ao mesmo tempo em que impôs ao
legislador ordinário a criação das carreiras especiais de assessoramento jurídico, no âmbito dos Três Poderes (§ 2°),
determinou o aproveitamento dos ocupantes de cargos e empregos públicos de
advogados, assessores e assistentes jurídicos nos cargos das carreiras a serem
criados.
Esse Pretório Excelso, recentemente, ao julgar a ADIn n° 231-RJ (Rel.
Exmo. Sr. Na. Moreira Alves, DF
13-11-92, pág. 20.848) proclamou que
inciso II do art. 37 da Constituição
Federal também não permite o 'aproveitamento', uma vez que, nesse caso, há
igualmente o ingresso em outra carreira
sem o concurso exigido pelo mencionado dispositivo.
37. É preciso destacar, por último,
que pouco importa, tu casa, que os servidores públicos aproveitados sejam estáveis ou não e tenham ou não sido
aprovados em outros concursos públicos; pois o que deflui naturalmente da
interpretação do Pretério Excelso no caso
acima citado é que, para o ingresso em
classe inicial de uma carreira com fiel
observância da norma do art. 37,11, da
CF, é essencial a aprovação em concurso público especifico.
12
R.TJ. — 150
Se o caput do citado art. 56 do
ADCF do Paraná não tem, por essas
razões, condição de ser considerado
constitucional, já que não é possível escoimá-lo das expressões que o contaminam, hão de restar prejudicadas as
argüições referentes aos §§ 2° e 3° do
mesmo artigo.
Pelo exposto, opinamos por que
se julgue procedente a ação direta, declarando-se a inconstitucionalidade dos
incisos XVIII, alíneas a e b, e XXI do
art. 34 e do § 7° do art. 27 da Constituição do Estado do Paraná apenas por
vulneração do princípio inserto no art.
61, § 1°, c,da Carta da República. Devem igualmente ser declarados inconstitucionais os arts. 46, 55 e 56, caput e
§ 1°, do ADCT do Paraná, por afrontarem, respectivamente, as disposições dos
ares. 22, Ida CF, 22 do ADCT da República e 37, II do já citado corpo permanente da Carta Magna.» (fis. 307/19)
É o relatório, cujas cópias deverão ser
distribuídas aos Srs. Ministros, em obediência ao que prescreve o art. 172 do Regimento Interno do Supremo Tribunal.
VOTO
O Sr. Ministro Octavio Gallotti (Relator): O conteúdo dos incisos XVIII (licença
especial) e XXI (direito a creche), do art.
34 impugnado, incide naquilo que normalmente se insere na iniciativa privativa do
Chefe do Poder Executivo, segundo o art.
61, § 1°, II, letras a e c, da Constituição
Federal: são disposições sobre servidores
públicos e seu regime jurídico, com acréscimo, ainda que indireto, de remuneração e
efetivo aumento da despesa pública.
Há que indagar, todavia, se essa restrição, a que, sem dúvida está sujeito o processo legislativo ordinário dos Estados
(como decorrência do princípio da separação dos Poderes), deve reputar-se igualmente aplicável ao legislador constituinte
estadual, ao qual é infenso o poder de iniciativa do Poder Executivo.
Nos debates preliminares em que tem
essa delicada questão aqui aflorado, sinto
decidida inclinação para uma resposta negativa do Plenário, isto é, para o reconhecimento da liberdade da Assembléia, sempre
que se encontre deliberando sobre matéria
de natureza efetivamente constitucional,
isto é, relativa à própria estrutura do Estado.
Quando todavia venha a imiscuir-se, a
Assembléia, em minudências ou particularidades, próprias em substância do legislador ordinário, a assunção desses pormenores, pelo legislador constituinte estadual,
afigura-se usurpadora da competência de
iniciativa, inerente ao Poder Executivo.
Nessa última hipótese, vejo claramente
incidirem os pormenores que desceu a
Constituição do Paraná a especificar, e que,
no plano federal, são tratados em lei ordinária (art. 87 da Lei n° 8.112190, quanto à
licença-prêmio), ou mesmo em decreto
(Decreto n° 93.408/86, no tocante à instituição ou ao uso de serviços de creche).
Considero, portanto, inconstitucionais
os itens XVIII e XXI da Constituição do
Estado do Paraná.
Diversa é a questão relativa ao § 7° do
art. 27 da mesma Carta, que, ao estabelecer
data para o pagamento dos vencimentos
dos servidores estaduais e a correção monetária dos mesmos em caso de atraso, não
representa aumento de remuneração, mas
simples preservação do poder aquisitivo do
valor devido, visando a dar eficácia ao princípio de irredutibilidade.
Assim foi, em suma, encarada, pelo Tribunal, previsão semelhante, insculpida na
Constituição de Mato Grosso, declarada
constitucional por decisão unânime, quando do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 176, em sessão de
21 de agosto de 1992, Relator o eminente
Ministro Marco Aurélio. Em coerência
R.T..T — 150
com essa conclusão, o mesmo se impõe,
agora, em relação ao § 7° do art. 27 da Carta
paranaense.
Passo, então, ao exame do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, a começar pelo seu art. 46, que estende, aos empregados do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul — BRDE, norma
da parte permanente da Constituição estadual, concernente à estabilidade dos servidores públicos.
Sucede que a natureza autárquica do
Banco (onde residiria o pressuposto de legitimidade de norma impugnada) já foi
afastada, pelo Supremo Tribunal, em julgamento especificamente destinado ao deslinde da natureza jurídica do próprio
BRDE, havendo ficado expresso na ementa
de acórdão de Primeira Turma, no Recurso
Extraordinário n° 120.932:
— Autarquia interestadual
de desenvolvimento: sua inviabilidade constitucional.
3.0 dado diferencial da autarquia é
a personalidade de direito público (Celso Antônio), de que a podem dotar não
só a União, mas também as demais entidades políticas do Estado Federal, como
técnicas de realização de sua função administrativa, em setor especifico subtraído à administração direta.
4. Por isso mesmo, a validade da
criação de uma autarquia pressupõe que
a sua destinação institucional se compreenda toda na função administrativa
da entidade matriz.
5.0 objetivo de fomento do desenvolvimento de região composta pelos
territórios de três Estados Federados ultrapassa o raio da esfera administrativa
que qualquer um deles, isoladamente
considerado; só uma norma da Constituição Federal poderia emprestar à manifestação conjunta, mediante convênio,
de três vontades estatais incompetentes
13
um poder que, individualmente, a todos
eles falece.
6. As sucessivas Constituições da República — além de não abrirem explici-
tamente às unidades federadas a criação
de entidades públicas de administração
interestadual —, têm reservado à União,
expressa e privativamente, as atividades
de planejamento e promoção do desenvolvimento regional: análise da temática regional no constitucionalismo federal brasileiro.» (RE 120.932, Relator,
Ministro Sepúlveda Pertence, 1)1 de
30-4-92).
Nem se compreenderia como pudesse o
Estado do Paraná isoladamente dispor sobre empresa de que participa em concurso
com duas outras unidades da Federação.
Tendo pretendido fazê-lo, obrou em excesso dos limites da autonomia que lhe foi
conferida pelo art. 25 da Constituição Federal, com que é, portanto, incompatível o
art. 46 do ADCT do Paraná.
É patente a inconstitucionalidade da
norma consubstanciada no art. 55 das disposições estaduais transitórias, em apreciação, por dilatar a exceção de dispensa de
concurso público, consentida no ADCT federal (art. 22) aos ocupantes de função de
defensoria pública, até a data de instalação
da Assembléia Nacional Constituinte, de
modo a que passasse a abranger quantos
tenham vindo a satisfazer o requisito, até o
dia (ulterior) da inauguração da constituinte paranaense.
Por preterição de exigência do concurso, estabelecida na norma geral do art. 37,
II e na especial do parágrafo único do art.
134, ambos da Carta Federal, há de ser,
portanto, declarado inconstitucional o art.
46 do ADCT do Paraná, sendo certo que
subsiste o amparo direto do art. 22 do Ato
das Disposições Transitórias federais, em
relação aos servidores estaduais, capazes
de preencher os requisitos ali estabelecidos.
14
R.T.J. — 150
A propósito do art. 56, e seus parágrafos, das mesmas disposições transitórias
paranaenses, teceu, o eminente Ministro
Sepúlveda Pertence, quando do julgamento do pedido cautelar desta ação, as seguintes observações, cuja utilidade continua presente, a nortear a decisão definitiva:
(Sr. Presidente, pediria a atenção para
alguns dados deste caso.
Trata-se de assistentes, advogados ou
assessores jurídicos dos Três Poderes.
Recebemos memoriais em que demonstram, por exemplo, que os assessores
jurídicos do Judiciário são funcionários,
não só estáveis, mas concursados. Na
verdade, em relação aos do Judiciário e
do Executivo, exercem funções paralelas àquelas que exercem os Procuradores do Estado, pelo menos, no âmbito de
consultoria.
Note-se que, no parâmetro federal, a
Advocacia-Geral da União presta consultoria apenas ao Poder Executivo e,
em várias Cartas estaduais, temos visto
que, em função disso, se vem tomando
direito uniforme nos Estados a criação
de procuradorias das Assembléias. No
caso, criam-se ainda Procuradorias Judiciárias, a título de prestação de assessoria jurídica ao Tribunal. Por isso, não
há nenhum escândalo em que tenham o
mesmo tratamento dos Procuradores do
Estado, digo —leia-se, dos Consultores
do Poder Executivo.
No plano federal, declaramente, durante a elaboração da Constituinte, fiz
criticas a esse universo que se criou,
misturando o serviço do contencioso da
União com a consultoria do Poder Executivo, que, a meu ver, envolve a assessoria jurídica da administração federal:
o certo é que se criou um monstro no
plano nacional, que vai ser reptoduzido
nos Estados.
Agora, pelo menos em termos de
cautelar, não vejo como manter uma
situação privilegiada apenas para aque-
les que detenham títulos de Procuradores de Estado.
Na verdade, todo esse pessoal passará a exercer a função que a Constituição
Federal definiu como 'Advocacia de Estado'.» (fls. 207/8)
Vé-se, desde logo, que, no pertinente ao
assessoramento jurídico do Poder Legislativo e do Poder Judiciário, não há margem
alguma para a alegação, ínsita na petição
inicial, de invasão da competência natural
de Procuradoria-Geral do Estado.
É certo que não possuindo — as Assembléias e os Tribunais — personalidade jurídica própria, sua representação, em juízo, é
normalmente exercida pelos Procuradores
do Estado. Mas têm, excepcionalmente,
aqueles órgãos, quando esteja em causa a
autonomia do Poder, reconhecida capacidade processual, suscetível de ser desempenhada por meio de Procuradorias especiais (se tanto for julgado conveniente, por
seus dirigentes), às quais também podem
ser cometidos encargos de assessoramento
jurídico das atividades técnicas e administrativas dos Poderes em questão (Assembléia e Tribunais).
Poder-se-á, até, discutir a utilidade dessa prática, jamais porém — penso eu —
vir-se a considerá-la adequada às funções
da Procuradoria do Estado, integrada no
Poder Executivo.
Tenho, assim, que, só quanto ao último
(o Executivo), poderá assumir algum relevo a controvérsia sobre ser indissociável,
da Procuradoria do Estado, a tarefa de assessoramento, entregue, pela Constituição
do Paraná, a urna carreira especial, sob a
coordenação da Procuradoria-Geral do Estado.
Ainda aí, não encontro, porém, obstáculo sério à opção seguida pelo constituinte
estadual.
Devo resignar-me ao centralismo da
Constituição de 1988 que, em alguns pontos — um deles, certamente, o art. 132, ora
R.T.1 — 150
cogitado — conseguiu superar nesse desígnio, os regimes anteriores.
Nem assim, entendo, porém, que, do
citado dispositivo (o art. 132), se possa
extrair malha tão estreita, a subjugar as
Constituições estaduais, aponto de impedir
a existência (a piar da dos Procuradores) de
carreiras especiais, voltadas ao assessoramento jurídico, mas sob a coordenação da
Procuradoria-Geral, de modo a assegurar a
uniformidade de jurisprudência administrativa, onde julgo residir o escopo de norma da Carta Federal. Não em alguma reivindicação de caráter corporativo.
Note-se que o art. 69 do ADCF de 1988
até ensejou, aos Estados, manter consultorias jurídicas separadas de suas Procuradorias-Gerais; sendo, pois um minus, em relação a esse permissivo, a preservação de
assessorias em carreiras especiais, coordenadas pela Procuradoria-G=1 do Estado.
Recordo, mais, que, no modelo federal
fornecido pela recente Lei Complementar
n° 73, de 10 de fevereiro de 1993, adotou-se
a divisão tripartida de carreiras, uma delas
exclusivamente destinada à consultoria ou
assessoramento jurídico, outras duas à representação judicial da União.
Não vejo, igualmente, no art. 56, ainda
em exame, afronta à exigência do concurso
público, eis que os servidores, nele contemplados, são mantidos em cargos da mesma
natureza e, atribuições dos já exercidos.
Não há, pois, investidura em outro cargo,
suscetível de contrariar a prescrição constitucional.
Ataca-se, por fim, a equiparação de vencimentos, resultante do § 3° do art. 56, entre
os integrantes das carreiras ditas especiais
e os Procuradores do Estado.
Reservas poder-se-iam, em tese, opor a
essa declaração de isonomia, quando se
tratasse de vincular carmine de formação
jurídica, mas dotadas de natureza e atribuições diferenciadas (como as da Magistratura, do Ministério Público e a dos Pro-
15
curadores do Estado ou da União), questão
não resolvida, ainda, de modo definitivo,
pelo Supremo Tribunal, perante a Constituição de 1988.
Quando, se trate, entretanto, de cargos
com atribuições análogas ou interligadas (a
ponto de a própria inicial sustentar devessem estas obrigatoriamente aglutinadas em
uma só carreira), não vejo como se objetar
à igualdade de remuneração, entre os seus
ocupantes situados nas classes equivalentes.
Em resumo, e de acordo com todo o
exposto, julgo procedente, empane, a ação,
para declarar inconstitucionais os itens
XVIII e suas letras a e b, e XXI, ambos do
art. 34 da Constituição do Paraná, bem
como os artigos 46 e 55 do respectivo Ato
das Disposições Constitucionais Transitórias.
São declarados constitucionais o § 7° do
sat. 27 da parte permanente da Constituição
e o art. 56, e seus §§ 1°, 2° e 3°, do Ato das
Disposições Transitórias, ainda do Estado
do Paraná.
VOTO (S/ INCISOS XVIII E XXI)
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence:
Sr. Presidente, chamado à colação por V.
Ex' sobre esse tema recorrente nesses quatro anos de discussão da Constituição de 88,
vejo-me obrigado a algumas breves considerações.
2. Em decisão recente, efetivamente,
achei razoável que se estabelecesse como
critério de legitimidade do trato, pelas
constituições estaduais, de matéria que, no
processo legislativo ordinário, se submeta
à iniciativa privativa no Poder Executivo,
indagar se, concretamente, o tema versado
pela disposição constitucional estadual
pode considerar-se de estatura constitucional ou não.
3.0 princípio, para mim, é que as regras
de iniciativa privativa obviamente se dirigem ao processo legislativo ordinário, e
não se poderá opor à Assembléia Consti-
16
tuinte Estadual —por definição, no âmbito
do Estado, poder constituinte e não poder
constituído, malgrado poder constituinte,
submetido, na estrutura total da federação,
à prevalência dos princípios constitucionais da federação.
A esse princípio, segundo penso, só é
de abrir exceção quando, por seu conteúdo,
a norma questionada seja de tal modo estranha à matéria própria dela que a sua
inserção na Constituição do Estado se deva
qualificar como fraude às normas de reserva de iniciativa do processo legislativo ordinário, da Constituição Federal, que compõem o sistema positivo da separação de
poderes.
Mas, Sr. Presidente, ao admitir esse
critério, não parti de nenhuma tentativa de
conceituação a priori do que seja matéria
constitucional e do que não seja matéria
constitucional, que seria render-se a uma
distinção que hoje tem evidente sabor de
anacronismo: a que parte de um padrão de
matéria constitucional do Estado liberal
clássico, para concluir que tudo aquilo que
não diga com a estrutura dos poderes ou
com a garantia dos direitos individuais —
para recordar o célebre art. 16 da Declaração dos Direitos do Homem, da Revolução
Francesa — não seria constitucional ou
seria apenas formalmente constitucional.
Creio que, pelo menos depois do primeiro após-guerra, Sr. Presidente, unia distinção dessas soa arbitrária e anacrônica.
Não parto, assim, de um padrão apriorístico
do que seja matéria constitucional, que, ao
contrário, há de ser extraído do próprio
ordenamento positivo: por isso, não posso
negar que toda a temática, a que a Constituição Federal deu dimensões constitucionais, tenha dimensões constitucionais também na estruturação básica do ordenamento do Estado-membro.
Acentuou, no entanto, o eminente Relator que o tema específico em causa —
licença-prêmio de funcionários públicos
—não é tratado na Constituição Federal em
— 150
relação aos servidores da União; é matéria
de legislação ordinária federal. Mas, data
venia, não pode ser este o critério, até porque, então, só legitimaríamos a norma constitucional estadual rigorosamente inútil, pois
as disposições relativas ao funcionalismo público, inseridas na Constituição Federal,
por disposição expressa da mesma Constituição Federal, também se aplicam aos servidores dos Estados e dos Municípios.
Fico em que, não só na Constituição
de 88, como nos sucessivos textos constitucionais brasileiros, se tem considerado
que as linhas básicas do estatuto do funcionalismo público, incluída a garantia daquele mínimo de vantagens e de benefícios
que, a juízo político do constituinte, devam
receber consagração constitucional, constituem matéria constitucional.
E, por isso, entendo que não é exagerado, não é desarrazoado que a disciplina
da licença-prêmio, a juízo político do constituinte paranaense, tenha sido considerado
adequada, por integrar as linhas básicas do
estatuto do funcionalismo estadual, de ganhar o status de garantia da Constituição
local.
Com esses fundamentos, já me antevendo vencido, mas, chamado pelo voto de V.
Ex' a explicitar melhor a minha posição,
peço vênia para, no ponto, divergir e declarar improcedente a ação.
VOTO (S/INCISOS XVIII E XXI)
O Sr. Ministro Paulo Brossard: Sr.
Presidente, os temas constitucionais sofreram tamanho alargamento, ao longo do tempo, que hoje é difícil saber o que é e o que
não é constitucional. Segundo o critério formal, toda disposição que estiver na Constituição o será; entram aí normas de Direito
Civil, de Direito Comercial, de Direito Penal, de Direito Processual, Civil e Penal, de
Direito Tributário, de Direito Internacional, de Direito do Trabalho, e assim por
diante.
—150
O problema se apresenta sob forma diferente quando se trata de um poder constituinte subordinado, ou condicionado, ou
limitado, como é o poder dos Estados que,
sendo autônomos, não chegam a ser soberanos e, por isso mesmo, não têm poder
irrestrito quanto a sua auto-organização.
Lamento que as Constituições dos Estados se repitam monotonamente. Se urna lei
orgânica dos Estados fosse editada creio
que pouca diferença fada, tal a similitude,
para não dizer a identidade, que estas Constituições apresentam, de algum tempo a
esta data. O mesmo vale dizer em relação
aos municípios. Agora, os municípios têm
poder de auto-organização, quando até a
Constituição de 1988 sé o Rio Grande do
Sul, de 1891 a 1988, permaneceu fiel a esta
dimensão da autonomia municipal. Os demais Estados editavam a lei orgânica dos
mtmicípios. Entretanto, se conferimos as
leis orgânicas municipais do Rio Grande do
Sul vamos verificar que elas são praticamente iguais. De modo que, em verdade, a
importante atribuição que a Constituição
reservou aos municípios não teve sentido
útil. O mesmo vale dizer, mutalis mutandia, em relação aos Estados. De outro lado,
a partir de 46, depois de longo período
autoritário e centralizador, o Superno Tribunal se mostrou rigoroso na exegese da
Constituição, fulminando qualquer novidade introduzida pelo constituinte estadual.
17
vida administrativa, à vida financeira, acompanho o voto de V. Er' na sua conclusão.
VOTO (S/INCISOS XVIII E XXI)
O Sr. Ministro Néri da Silveira: Sr.
Presidente. O art. 7° da Constituição, no seu
inciso XXV, estabelece:
«Ari 7° São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que
visem à melhoria de sua condição social:
XXV — assistência gratuita aos filhos e dependentes desde o nascimento
até seis anos de idade em creches e
pré-escolas.»
O art. 39, inserido no capítulo dos servidores públicos civis, no § 2° enumaa aqueles direitos dos trabalhadores que são, desde logo, assegurados aos servidores: aplica-se aos servidores públicos o disposto no
art. 7° e incisos indicados. Efetivamente, o
inciso XXV não está entre os enumerados;
portanto, não mandou a Constituição Federal, desde logo, que se assegurasse assistência gratuita aos filhos e dependentes dos
servidores públicos, desde o nascimento
até os seis anos de idade, em creches e
pré-escolas. Não ordenou que se aplicasse,
obrigatoriamente, esse benefício.
No caso, não se trata disso, trata-se da
inserção na lei constitucional de normas de
políticasocial, incensuráveis. Em tese, mas
inexeqüíveis. Na capital, nas cidades de
porte médio, o serviço pode ser mantido.
No Estado inteiro é impossível. E como
fica o Estado que deixa de cumprir cláusula
explícita e imperativa de sua Constituição?
Penso, entretanto, que nada impediria
que os Estados, ao definirem o regime de
assistência a seus servidores, na Carta local, no uso de sua autonomia, dispusessem
a respeito de matéria que, não obstante a
Constituição Federal não haja mandado aplicar obrigatoriamente aos servidores públicos, prevê-a, todavia, relativamente aos trabalhadores em geral.
Assim, não por entender que sejam assuntos intratáveis na lei constitucional, mas
porque vejo no preceito virtual ofensa à
autonomia do Estado, autonomia que não
deve se circunscrever apenas à lei constitucional, mas, também à vida legislativa, à
Dá-se, porém, no caso concreto, que o
dispositivo, assim como está redigido, se
refere a creche até seis anos. Dir-se-á que,
embora sob a denominação de creche, aí
também se vai realizar uma assistência préescolar.
18
Posso, nesse sentido, aludir a um exemplo da Universidade Federal do Rio Grande
do Sul. Lá a assistência em apreço realizase em instituição com o nome de «creche»
e as crianças, que podem ingressar, desde
três meses de idade, nela estão autorizadas
a permanecer até seis anos, o que tem sido
muito saudado particularmente por professores jovens da Universidade do Rio Grande do Sul, diante da possibilidade de manter seus filhos, com proveito, desde os primeiros meses até o termo referido.
Dessa maneira, a Constituição estabelece esse parâmetro dos seis anos, para creches e pré-escolas. Não, vejo, pois, nenhuma inconstitucionalidade nessa disposição
da Constituição do Estado do Paraná. É
certo que a Constituição Federal, que é o
paradigma para os Estados, não manda estender, desde logo, a seus servidores esse
benefício, mas também não proíbe que o
poder público, tanto o federal quanto o
estadual, o estabeleça. Ora, se não há tal
proibição, pergunto: seria inconstitucional
se o Estado mandasse aplicar norma da
Constituição Federal, de significativa importância aos trabalhadores em geral, a
seus servidores? Penso que, no plano da sua
autonomia, pode o Estado estipular uma
garantia a seus servidores, que a Constituição Federal confere aos trabalhadores em
geral. Com a devida vênia, não cabe estabelecer limitação dessa ordem à autonomia
dos Estados, sob pena de tomar sem conteúdo a autonomia para organizar seus serviços. A Constituição de 1988 quis uma
federação diferente, quanto ao regime anterior, em termos de maior autonomia aos
Estados-membros. Desse modo, como o
direito em exame está previsto para os trabalhadores em geral e há um rol de direitos
que são obrigatoriamente aplicáveis aos
servidores públicos, não vejo inconstitucionalidade se o Estado, no exercício da sua
autonomia, resolver preceituar como obrigatória a assistência aos filhos dos servidores estaduais, nos limites de idade aludidos.
— 150
Compreendo que não cabe declarar a
inconstitucionalidade de norma de Constituição estadual que assegure aos servidores locais aquilo que é garantido aos
trabalhadores em geral.
Estado do Paraná, todos sabemos,
possui um extraordinário progresso e tem
procurado enfrentar os problemas sociais
da sua população com grandes realizações nesse sentido. Não poderia, então, o
constituinte estadual prever que os servidores do Estado do Paraná tenham esse
beneficio que é assegurado aos trabalhadores em geral?
Peço vênia para não declarar a inconstitucionalidade do dispositivo.
Quanto à licença especial, como prevista, estou de acordo com a invalidade
da norma, porque não está prevista na
Constituição para os trabalhadores em geral e é uma vantagem tradicionalmente
estatutária, definida em legislação infraconstitucional. Não houve, ainda, Constituição prevendo a licença-prêmio. Somente ao Poder Executivo caberia iniciativa de lei nesse sentido, de acordo com
as conveniências e possibilidades do erário estadual.
Do exposto, declaro a inconstituciona'idade do inciso XVIII, quanto à licençaespecial. Reconheço, entretanto, como válida, diante da Constituição Federal, a
estipulação do inciso XXI em exame, relativa à assistência de filhos menores e
dependentes de servidores estaduais, nos
termos, aí, regulados.
VOTO (S/INCISOS XVIII E XXI)
Sr. Ministro Moreira Alves: Sr.
Presidente, temos aqui, a meu ver, dois
problemas diversos.
O que o Sr. Ministro Néri da Silveira
ora coloca não me parece estar em causa
neste caso. Não nego que o Estado possa,
por lei ordinária, dar as vantagens que
entender deva dá-Ias. Na hipótese, não se
trata de pré-escola, mas de creche, não se
R.TJ — 150
aplicando princípios que dizem respeito
àquela.
Por outro lado, a iniciativa exclusiva
para a apresentação de projetos de lei que a
Constituição Federal outorga a um dos Poderes tem de ser respeitada pelos Estadosmembros, porquanto ela se insere no âmbito das funções reservadas de cada Poder,
âmbito esse que compete à Constituição
Federal delimitar, não podendo ser violado
sequer pelo Poder Constituinte decorrente,
que está sujeito à observância do princípio
da separação dos Poderes que é uma das
denominadas cláusulas pétreas. Se se admitir que o Poder Constituinte decorrente, que
é o Poda Constituinte dos Estados-membros, possa disciplinar matérias que são,
por força da Constituição Federal, objeto
de projetos de lei da iniciativa exclusiva de
um dos Poderes do Estado, estar-se-á impedindo que esse Poder se exerça plenamente no âmbito de suas atribuições, impossibilitado que se encontrará ele de, por
lei ordinária com projeto de sua iniciativa
exclusiva, modificar a disciplina com relação à qual a Constituição Federal entendeu
de lhe dar o poder de iniciativa para estabelecê-la ou alterá-la por elo como o mais
apto para avaliar as necessidades que se
apresentarem e a disponibilidade dos recursos para enfrentá-las. Com isso, o Poder
Constituinte decorrente estará cerceando
indevidamente a iniciativa do Poder Constituído outorgada pela Carta Magna Federal. E assim como o Poder Constituinte
decorrente está sujeito à observância do
princípio da separação dos Poderes, cujos
parâmetros é a Constituição Federal que
estabelece, não pode ele, também, feri-los
indiretamente, cerceando um deles de exercitar plenamente as funções que ela lhe
outorga. Por isso, Sr. Presidente, s6 admito
que o Poder Constituinte decorrente discipline matéria cuja disciplina legislativa seja
da iniciativa exclusiva de um dos Poderes
Constituídos quando ela esteja intimamente ligada à estrutura do Estado-membro e
deva inserir-se, portanto, por sua natureza,
19
no texto constitucional estadual. Não é,
evidentemente, o que ocorre no caso, porquanto livença-prêmio e berçário nada têm
que ver com a estrutura do Estado-membro.
Com essas considerações, Sr. Presidente, acompanho o voto de V. Ex'.
VOTO (VOTO S/ ART. 46)
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Sr. Presidente, também acompanho o voto de V.
Ex', dado que se trata de uma entidade que
explora a atividade econômica; a ela se
aplica, portanto, a Consolidação das Leis
do Trabalho (CF, art. 173, § 1°). Não poderia o Estado-membro legislar a respeito
sem infringência ao § 1° do art. 173 da
Constituição.
Julgo procedente a ação quanto ao art.
46 da Constituição do Paraná.
EXTRATO DA ATA
ADIn 175 — PR — Rel.: Min. Octavio
Gallotti. Recite.: Governador do Estado do
Paraná (Advs.: Wagner Brussolo Pacheco
e outros) (Adv.: Julio Cesar Ribas Boeng).
Reqda.: Assembléia Legislativa do Estado
do Paraná (Advs.: Iracema Santos Rodrigues e outros).
Decisão: Por votação unânime, o Tribunal julgou improcedente a ação, para declarar a constitucionalidade do § 7° do art. 27
da Constituição do Estado do Paraná. Também por igual votação, julgou procedente a
ação, para declarar a inconstitucionalidade
dos arts. 46 e 55 do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias. E, por maioria de votos, julgou procedente a ação para
declarar a inconstitucionalidade do inciso
XVIII e suas letras «a» e «b», e do inciso
XXI, ambos do art. 34 da mesma Carta,
vencidos os Ministros Néri da Silveira e
Sepúlveda Pertence. Ainda, após o voto do
Relator (Min. Octavio Gallotti), julgando
improcedente a ação para declarara inconstitucionalidade dos §§ 1°, 2° e 3° do art.
56 das Disposições Transitórias, o julga-
20
R.TJ. —150
mento foi adiado em virtude de pedido de
vista dos autos, formulado pelo Ministro
Néri da Silveira. Ausentes, ocasionalmente, o Ministro Paulo Brossard na votação
dos arts. 55, 56 e seus §§ 1°, 2° e 3° do
ADCT, e o Mini stro Marco Aurélio, quanto
a este último dispositivo.
Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotti, Presidente em exercício. Presentes à
Sessão os Srs. Ministros Moreira Alves,
Néri da Silveira, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence, Celso dg Mello, Carlos Venoso, Marco Aurélio, fintar Gaivão e Francisco Rezek. Ausente, justificadamente, o Sr.
Ministro Sydney Sanches, Presidente. Procurador-Geral da República, Dr. Aristides
Junqueira Alvarenga.
Brasília, 17 de março de 1993 — Luiz
Tomimatsu, Secretário.
VOTO (VISTA)
Poderes, no prazo de noventa dias da
promulgação desta Constituição.
§ 3° Aos integrantes dessas carreiras aplica-se, no que couber, o disposto
no art. 125, §§ 2° e 3°, desta Constituição.»
Verifica-se, desde logo, que os dispositivos têm como destinatários advogados,
assessores e assistentes jurídicos estáveis,
que exercem funções jurídicas, nos três
podere,s•
O eminente Relator, Ministro Octavio
GallottL teve como constitucionais os dispositivos em apreço, em longa fundamentação, onde invocou, também, a posição no
mesmo sentido adotada pelo ilustre Ministro Sepúlveda Pertence, quando do julgamento da medida cautelar.
No particular, está o voto do ilustre Relator assim deduzido:
«A propósito do art. 56, e seus pará(Art. 56 e parágrafos do ADCT da Consgrados, das mesmas disposições transitituição do Estado do Paraná)
tórias paranaenses, teceu, o eminente
Ministro Sepúlveda Pertence, quando
O Sr. Ministro Néri da Silveira: Pedi
do julgamento do pedido cautelar desta
vista dos autos, para melhor exame da maação, as seguintes observações, cuja utitéria relativa à argüição de inconstitucionalidade continua presente, a nortear a de'idade do art. 56 e parágrafos, do ADCT, da
cisão definitiva:
Constituição do Estado do Paraná de 1989,
que possuem este teor
«Sr. Presidente, pediria a atenção para alguns dados deste caso.
«Art. 56 O assessoramento jurídico
Trata-se de assistentes, advogados poderes Executivo Legislativo e Judos ou assessores jurídicos dos Três
diciário e a representação judicial das
Poderes. Recebemos memoriais em
autarquias e fundações públicas serão
que demonstram, por exemplo, que
prestados pelos atuais ocupantes de caros assessores jurídicos do Judiciário
gos e empregos públicos de advogados,
são funcionários, não só estáveis, mas
assessores e assistentes jurídicos estáconcursados. Na verdade, em relação
veis que, nos respectivos Poderes, inteaos do Judiciário e do Executivo, exergrarão carreiras especiais.
cem funções paralelas àquelas que
§ 1° O assessoramento jurídico, nos
exercem os Procuradores do Estado,
órgãos do Poder Executivo, será coordepelo menos, no âmbito de consultonado pela Procuradoria-Geral do Estaria.
do, objetivando atuação uniforme.
Note-se que, no parâmetro federal, a Advocacia-Geral da União pre-sta
§2° As carreiras de que trata este artigo
consultoria apenas ao Poder Executiserão criadas e organizadas em classe por
vo e, em várias Cartas estaduais, telei de iniciativa dos chefes dos respectivos
R.T.J —150
mos visto que, em função disso, se
vem tornando direito uniforme nos
Estalos a criação de procuradorias
das Assembléias. No caso, criamse ainda Procuradorias Judiciárias a
título de prestação de assessoria jurídica ao Tribunal. Por isso, não há
nenhum escândalo em que tenham o
mesmo tratamento dos Procuradores do Estado, digo — leia-se, dos
Consultores do Poder Executivo.
No plano federal, declaradamente, durante a elaboração da Constituinte, fiz críticas a esse universo que
se criou, misturando o serviço do contencioso da União com a consultoria
do Poder Executivo, que, a meu ver,
envolve a assessoria jurídica da administração federal: o certo é que se
criou um monstro no plano nacional,
que vai ser reproduzido nos Estados.
Agora, pelo menos em termos de
cautelar, não vejo cano manta uma
situação privilegiada apenas para
aqueles que detenham títulos de Procuradores de Estado.
Na verdade, todo esse pessoal passará a exercer a função que a Constituição Federal definiu cano 'Advocacia de Estado' (fls. 207/8).
Vê-se, desde logo, que, no pertinente ao assessoramento jurídico do
Poder Legislativo e do Poder Judiciário, não há margem alguma para a
alegação, Sita na petição inicial, de
invasão da competência natural da
Procuradoria-Geral do Estado.
É certo que não possuindo — as
Assembléias e os Tribunais — personalidade jurídica própria, sua representação, em juízo, é normalmente
exercida pelos Procuradores do Estado. Mas têm, excepcionalmente, aquela órgãos, quando esteja em causa a
autonomia do Poder, reconhecida capacidade processual, suscetível de ser
desempenhada por meio de Procura-
21
dorias especiais (se tanto for julgado
conveniente, por seus dirigentes), às
quais também podem ser cometidos
encargos de assessoramento jurídico
das atividades técnicas e administrativas dos Poderes em questão (Assembléias e Tribunais).
Poda-se-á, até, discutir a utilidade dessa prática, jamais porém —
penso eu—vir-se a considerá-la adequada às funções da Procuradoria do
Estado, integrada no Poder Executivo.
Tenho, assim, que, só quanto ao
último (o Executivo), poderá assumir
algum relevo a controvérsia sobre
ser indissociável, da Procuradoria do
Estado, a tarefa de assessoramento,
entregue, pela Constituição do Paraná, a uma carreira especial, sob a
coordenação da Procuradoria-Geral
do Estado.
Ainda aí, não encontro, porém,
obstáculo sério à opção seguida pelo
constituinte estadual.
Devo resignar-me ao centralismo
da Constituição de 1988 que, em alguns pontos — um deles, certamente,
o art. 132, ora cogitado — conseguiu
superar, nesse desígnio, os regimes
anteriores.
Nem assim, entendo, porém, que,
do citado dispositivo (o art. 132), se
possa extrair malha tão estreita, a
subjugar as Constituições estaduais,
a ponto de impedir a existência (a par
da dos Procuradores) de carreiras especiais, voltadas ao assessoramento
jurídico, mas sob a coordenação da
Procuradoria-Geral, de modo a assegurar a uniformidade de jurisprudência administrativa, onde julgo residir
o escopo de norma da Carta Federal.
Não em alguma reivindicação de caráter corporativo.
22
R.T.L —150
Note-se que o art. 69 do ADCT de
1988 até ensejou, aos Estados, manter consultorias jurídicas separadas
de suas Procuradorias-Gerais; sendo,
pois, um minus, em relação a esse
permissivo, a preservação de assessorias em carreiras especiais, coordenadas pela Procuradoria-Geral do Estado.
Recordo, mais, que, no modelo
federal fornecido pela recente Lei
Complementar n° 73, de 10 de fevereiro de 1993, adotou-se a divisão
tripartida de carreiras, uma delas exclusivamente destinada à consultoria
ou assessoramento jurídico, outras
duas à representação judicial da
União.
Não vejo, igualmente, no art. 56,
ainda em exame, afronta à exigência
do concurso público, eis que os servidores, nele contemplados, são
mantidos em cargos da mesma natureza e atribuiçôes dos já exercidos.
Não há, pois, investidura em outro
cargo, suscetível de contrariar a prescrição constitucional.
Ataca-se, por fim, a equiparação
de vencimentos, resultante do § 3° do
art. 56, entre os integrantes das carreiras ditas especiais e os Procuradores do Estado.
Reservas poder-se-iam, em tese,
opor, a essa declaração de isonomia,
quando se tratasse de vincular carreiras de formação jurídica, mas dotadas de natureza e atribuições diferenciadas (como as da Magistratura, do
Ministério Público e a dos Procuradores do Estado ou da União), questão não resolvida, ainda, de modo
definitivo, pelo Supremo Tribunal,
perante a Constituição de 1988.
Quando, se trate, entretanto, de
cargos com atribuições análogas ou
interligadas (a ponto de a própria inicial sustentar devessem estar obriga-
toriamente aglutinadas em uma só
carreira), não vejo como se objetar à
igualdade de remuneração, entre os
seus ocupantes situados nas classes
equivalentes.»
A Lei paranaense n° 9.422/90 dispôs
sobre carreira de Advogado, no âmbito do
Poder Executivo. Conforme certidão expedida pela Secretaria da Administração do
Paraná, incumbe aos ocupantes desses cargos jurídicos as seguintes atribuições:«a )
assessoramento jurídico dos órgãos do
Poder Executivo, compreendendo nesse assessoramento: 1) a análise e a emissão de
pareceres em qualquer reivindicação de servidores ativos e/ou inativos do Paraná; 2)
a elaboração de minutas de anteprojeto de
leis e de decretos; 3) a elaboração de informações em mandados de segurança; 4) a
análise e a elaboração de minutas de contratos, convênios e termos de ajuste; 5)
participação efetiva na análise dos procedimentos licitatórios do Estado e também a
elaboração dos respectivos editais; 6) a representação judicial e extra das autarquias
estaduais; 7) outras atividades correlatas».
Quanto aos assistentes jurídicos, a especificação da categoria funcional, com base
na Resolução n° 8.714, de 21-1-1986, da
Secretaria da Administração, indica este
conteúdo ocupacional: «Estudar a matéria
jurídica e de outra natureza, consultando
códigos, leis, jurisprudência e outros documentos, para adequar os fatos à legislação
aplicável. — Complementar e operar as
informações levantadas para obter o prosseguimento do processo, acompanhando-o
em todas as fases. — Examinar e emitir
pareceres sobre os processos e expedientes
administrativos, consultando códigos, leis,
e regulamentações vigentes, para determinar as disposições legais pertinentes. —
Elaborar minutas de contratos, decretos,
anteprojetos de leis e outros documentos de
natureza jurídica. —Representar a parte de
que é mandatário, comparecendo às audiências e tomando sua defesa, para plei-
R.TJ — 150
tear decisões favoráveis. — Prestar assessoramento jurídico, informando, orientando e recomendando procedimentos em atos
e assuntos administrativos. —Executa:outras tarefas correlatas».
No que concerne ao assessoramento jurídico, no ambito do Poder Judiciário, a Lei
paranaense n° 8.672/1987, criou, no Quadro de Pessoal da Secretaria do Tribunal de
Justiça, o «Grupo Ocupacional Especial —
Assessoramento e Atividades Jurídicas Superiores», com cargos de provimento efetivo, mediante concurso público de provas e
títulos, divididos em três classes (I, II e III),
privativos de Bacharéis em Direito. O último concurso ocorreu em 1988, sendo todos
os seus integrantes estáveis.
As atribuições de Assessor Jurídico do
Poder Judiciário, conforme o art. 75 do
Regulamento da Secretaria do Tribunal de
Justiça do Estado, são as seguintes:
«Art. 75. Ao Assessor Jurídico de
provimento efetivo incumbe:
I — prestar assessoramento jurídico aos dirigentes do Tribunal, Desembargadores, Secretários e Diretores
de Departamento;
II—pronunciar-se em processos
ou expedientes concernentes à administração do Tribunal de Justiça, quando
determinado;
III — integrar qualquer comissão
a critério da cúpula diretiva do Tribunal;
—secretariar as sessões dos
órgãos julgadores do Tribunal, assim
como as de Comissões;
V — integrar bancas examinadoras de concursos públicos e processos
seletivos de caráter interno para preenchimento de cargos do Quadro de Pessoal da Secretaria do Tribunal de Justiça;
23
VI — elaborar minutas de contratos a serem firmados pelo Tribunal de
Justiça;
VII —redigir minutas de atos a serem baixados pelos dirigentes do Tribunal de Justiça;
VIII — representar o Tribunal de
Justiça como preposto, em reclamações
trabalhistas, quando designados;
IX—acompanhar junto aos órgãos competentes as ocorrências que envolvam veículos do Tribunal de Justiça,
preparando os recursos cabíveis;
X — exercer outras atribuições
que lhe forem conferidas.»
De observar é, destarte, que as atribuições dos Assessores Jurídicos do Poder
Judiciário, no Paraná, correspondem, também, ao núcleo básico das carreiras jurídicas, quanto aos serviços de consultoria,
assessontmento jurídico e inclusive representação, nas hipóteses acima enumeradas.
Exame das atribuições dos cargos jurídicos providos por esses servidores estáveis está a indicar, desde logo, que a solução pretendida pelo art. 56 e seus parágrafos do ADCT da Carta paranaense não configura inconstitucionalidade, em determinando se criem, por lei, carreiras especiais
no serviço jurídico.
Em primeiro lugar, essas carreiras jurídicas não vulneram o art. 132 da Constituição Federal, pois, de explícito, no plano do
Poder Executivo, prevêem a existência da
Procuradoria-Geral do Estado, conferindolhe a coordenação do assessoramento jurídico, «objetivando atuação uniforme». Consoante bem anotou o eminente Relator, a
Constituição Federal, no art. 69 do ADCT,
estipulou ser permitido aos Estados manter
consultorias jurídicas separadas de suas Procuradorias-Gerais ou Advocacias-Gerais,
desde que, na data da promulgação da Constituição, tenham órgãos distintos para as
respectivas funções, tal como se verifica,
quanto a essas atividades de assessoramen-
24
R.T.J. — 150
to jurídico, no Paraná, anteriormente a 5 de
outubro de 1988, para atender, também, aos
serviços jurídicos das autarquias e fundações Do mesmo modo, no plano federal,
vêm de se compreender na Advocacia-Geral da União, carreiras jurídicas com denominações diversas: Advogado da União,
Assistente Jurídico, Procurador da Fazenda
Nacional. Destinam-se às diversas atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo e, ainda, à repre.sentação da União, judicial ou extrajudicialmente, a teor do art. 131 da Lei Maior de
1988.
Cuida-se, ademais, de situações jurídicas peculiares aos serviços de consultoria,
assessoramento jurídico e representação,
judicial ou extrajudicial, de autarquias e
fundações, do âmbito estadual, sobre as
quais cumpre entender, há de estar reservado, ao Estado-membro dispor, na sua autoorganização, ao ensejo em que se implanta
uma nova ordem constitucional.
De outra parte, pelo conteúdo ocupacional dessas carreiras jurídicas, no plano de
cada Poder do Estado, verifica-se existirem
situações de cargos assemelhados a justificar a aplicação, como estipula o art. 56,
3°, do ADCT em exame, dos princípios da
isonomia e das vedações próprias das carreiras jurídicas a que se refere o art. 135, da
Constituição Federal, nos limites já assentados por esta Corte, tal como o prevê,
ademais, o art. 125, § 2°, III, da Carta
Política paranaense, com a proibição, Por
igual, do exercício da advocacia fora das
funções institucionais (Constituição do Paraná, art. 125, 3°, I).
Do exposto, acompanho, no particular,
o voto do ilustre Ministro Octavio Gallotti,
dando pela improcedência da ação, quanto
ao art. 56 e seus parágrafos, do ADCT da
Lei Magna do Estado do Paraná, ora impugnados.
VOTO
(Sobre o art 56 e parágrafos do Ato das
Dispus0es Constitucionais Transitórias)
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Sr. Presidente, vários são os dispositivos da Carta
do Paraná impugnados nesta ação direta de
inconstitucionalidade, a saber: artigo 34,
inciso XVIII e alíneas a e b, e inciso XXI;
artigos 46 e 55 do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias; 7° do artigo
27 do corpo permanente da Carta e artigo
56 e §§ 1°, 2° e 3° do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias.
V. Ex.°, no voto proferido, concluiu
pela inconstitucionalidade dos dispositivos
do artigo 34, bem como dos artigos 46 e 55
do Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias, e declarou constitucionais o §
7° do artigo 27 do corpo permanente e o
artigo 56 e parágrafos do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Creio
que o Ministro Néri da Silveira o acompanhou.
O Sr. Ministro Octavio Gaifona (Presidente e Relator): Já foi completada a votação quanto a todos eles, exceto o artigo
56 e seus três parágrafos, que estão agora
em julgamento. Da Ata, consta que V. Ex.a
estaria ausente apenas quando do exame
desses três dispositivos. Sobre os demais,
V. Ext votou.
O Sr. Ministro Marco Aurélio: E o
7° do artigo 27? Em relação a esse artigo já
houve a proclamação, também?
O Sr. Ministro Octavio Gallotti (Presidente e Relator): Quanto a este, foi julgada a ação improcedente, para declarar-se a
sua constitucionalidade. E foi unânime a
votação.
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Sr. Presidente, o artigo ern julgamento, então, tem a
seguinte redação:
Art. 56. O assessoramento jurídico
nos Poderes Executivo, Legislativo e
Judiciário e a representação judicial das
autarquias e fundações públicas serão
prestadas pelos atuais ocupantes de cargos e empregos públicos de advogados,
assessores e assistentes jurídicos está-
R.TJ— 150
vais que, nos respectivos Poderes integrado carreiras especiais.
§ 1° O assessoramento jurídico, nos
Órgãos do Poder Executivo, será coordenado pela Procuradoria-Geral do Estado, objetivando atuação uniforme.
§ 2° As carreiras de que trata este
artigo serão criadas e organizadas em
classes por lei de iniciativa dos chefes
dos respectivos Poderes, no prazo de
noventa dias da promulgação desta
Constituição.
§ 3° Aos integrantes dessas carreiras
aplica-se, no que couber, o disposto no
artigo 125, §§ 2° e 3°, desta Constituição.
Sr. Presidente, tive dúvidas quanto ao
dispositivo, em face da regra inserta no
artigo 19 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Carta de 1988. Tive
dúvidas em relação ao aproveitamento, em
carreiras, de servidores que pudessem ser
tidos como não estáveis; de servidores que,
à época da promulgação da Cada de 1988,
não contavam com cinco anos de serviços
prestados. Acontece — e o Ministro Néri
da Silveira ressaltou esse aspecto —que no
caput do artigo 56 alude-se «aos estáveis»
ao dispor-se sobre «atuais ocupantes de
cargos e empregos públicos de advogado,
assessores e assistentes jurídicos estáveis».
Então, fica afastada a possibifidadqe de se
cogitar de inconstitucionalidade, frente ao
citado dispositivo. O outro preceito que me
pareceu um pouco ambíguo é o preceito do
§ 3° do artigo 56, no que remete ao artigo
125, §§ 2° e 3°, &Carta, com a cláusula aio
que couber».
Temos nos autos a Carta do Estado do
Paraná, e os §§ 2° e 3° cuidam da disciplina
dos vencimentos, da inamovibilidade e
também da impossibilidade de os beneficiários da norma, no caso que estamos examinando, perceberem quantitativo inferior
àquele atribuído às carreiras a que se refere
o artigo 135 da Constituição Federal, que
25
trata, creio, das carreiras que se integram
no capítulo no qual está inserido.
«Artigo 135. Às carreiras disciplinadas, neste Título aplicam-se o princípio
do artigo 37, XII, e o artigo 39, § 1°.»
No título, Sr. Presidente, temos várias
carreiras, inclusive a carreira da magistratura.
O Sr. Ministro Néri da Silveira: Sr.
Ministro, no meu voto, já fiz menção, exatamente, a esse ponto: o Tribunal já fixou
uma exegese, entendendo que, no caso, a
vinculação é aos Procuradores do Estado.
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Sr. Presidente, diante do esclarecimento em boa
hora prestado pelo Ministro Néri da Silveira, não tenho dúvidas em acompanhar V.
Ex.` concluindo, portanto, pela constitucionalidade do dispositivo. Realmente, quando editada a Carta do Estado do Paraná,
havia uma situação concreta ligada a estáveis que prestavam o assessoramento jurídico, que normalmente é desenvolvido pelos Procuradores do Estado. Por isso, entendo que não há conflito entre os diversos
preceitos do artigo 56 e a Carta de 1988.
Retifico o meu voto somente em relação
ao § 3°. Aos integrantes dessas carreiras
aplica-se, no que couber, a norma do artigo
125, §§ 2° e 3°, desta Constituição Federal.
O § 2° é explícito no que revela uma isonomia, consideradas a magistratura e °Ministério Público. Ainda que assentemos, aqui,
que a isonomia consagrada nesse § 3° tem
como paragonados os Procuradores, a regra
é inconstitucional, porque, indiretamente
pelo efeito vinculativo, eles, assessores, passaram a perceba o mesmo que um magistrado, um membro do Ministério Público.
Peço tia ao Ministro Néri da Silveira,
no que sustentou a constitucionalidade do
dispostivo, para fulminá-lo.
EXTRATO DA ATA
ADIn 175 — PR —Rel.: Min. Octavio
Gallotti. Reqte.: Governador do Estado do
Paraná (Advs.: Wagner Bmssolo Pacheco,
26
R.T.J. —150
Júlio Casar Ribas Boeng e outros). Reqda.:
Assembléia Legislativa do Estado do Paraná (Advs.: Iracema Santos Rodrigues e outros).
Decisão: Prosseguindo-se no julgamento, o Tribunal, por maioria de votos, julgou
improcedente a ação, para declarar a constitucionalidade do art. 56 e seus $$ 1°, 2° e
3° do ADCT da Constituição do Estado do
Paraná, vencido, em parte, o Ministro Marco Aurélio, que declarava a inconstitucionalidade, apenas, do § 3°.
Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotti. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Néri da Silveira, Paulo Brossard, Saravada Pertence, Celso de Mello, Carlos Velloso, Marco Aurélio, limar Gaivão e Francisco Rezek. Ausentes, justificadamente,
os Srs. Ministros Moreira Alves e Sydney
Sanches. Vice-Procurador-Geral da República, Dr. Moacir Antonio Machado da
Silva.
Brasília, 3 de junho de 1993 — Luiz
Tomimatsu, Secretário.
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N° 266 — RJ
(Tribunal Pleno)
(Medida Cautelar na RTJ 139/413)
Relator: O Sr. Ministro Octavio Gallotti
Requerente: Governador do Estado do Rio de Janeiro —Requeridos: Governador e Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro
Embora, em princípio, admissível a «transposição» do servidor para cargo idêntico da mesma natureza em novo sistema de classificação, o mesmo não sucede com a chamada «transformação» que, visto
implicar em alteração do título e das atribuições do cargo, configura novo
provimento, a depender da exigência de concurso público, inscrita no
art. 37, II, da Constituição.
Ação direta julgada, em parte, procedente, para declarar a
inconstitucionalidade da expressão «e transformação», contida no caput
do art. 1° da Lei fluminense n° 1.643-90.
ACÓRDÃO
RELATÓRIO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata de julgamento e das notas
taquigráficas, à unanimidade de votos, julgar procedente, em parte, a ação, para declarar a inconstitucionalidade da expressão
«e transformação», contida no «caput» do
art. 1° da Lei n° 1.643, de 4 de abril de 1990,
do Estado do Rio de Janeiro.
O Sr. Ministro Octavio Gallotti: Esta
ação direta tem, como objeto, o art. 1°, e seu
parágrafo único, da Lei n° 1.643, de 4 de
abril de 1990, do Estado do Rio de Janeiro,
redigidos como segue:
Brasília, 18 de junho de 1993 — Octavio
Presidente e Relator.
«Art. 1° — Os certificados de aprovação do Programa de Aperfeiçoamento
e Atualização do Servidor Público, realizado na Fundação Escola de Serviço
Público do Rio de Janeiro, antes da vigência da presente lei, terão validade
para enquadramento mediante transpo-
R.TJ —150
sição e transformação de cargos ou empregos em cargos de Categorias Nacionais de 1° e 2° graus —Parte Permanente dos Quadros de Pessoal das Secretarias de Estado, Órgãos equivalentes a
autarquias.
Parágrafo único. O disposto no caput deste artigo aplicar-se-á apenas para
comprovação de conhecimento equivalente ao exigido para o desenvolvimento
de atribuições das categorias funcionais
correspondentes, não assegurando direito e prosseguimento de estudo no ensino regular.»
Ao relatar o requerimento de medida
cautelar, que veio a ser deferido pelo Plenário, em sessão de 25-4-90, assim tive
oportunidade de resumir a questão:
«É quádruplo o fundamento da im-o.
Reside, primeiramente, no art. 22,
XXIV, da Constituição Federal, dado
que o legislador estadual estaria conferindo escolaridade em hipóteses estranhas às previstas na legislação federal,
porquanto a Fundação Escola de Serviço Público não é entidade do sistema
regular de ensino, nem está habilitada a
expedir diplomas daquela natureza.
O segundo fundamento está na invasão da reserva de iniciativa assegurada,
ao Governador, pelo art. 61, § 1°, R, c,
combinado com o art. 2°, também da
Carta da República, no que toca ao regime jurídico dos servidores públicos.
Em terceiro lugar, invoca-se o art. 37,
II, da Constituição Federal, porque a
transformação autorizada no dispositivo
atacado, podendo dar-se, segundo a legislação estadual, em cargo de atribuições diversas (v.g., de datilógrafo para
médico), implica preterição da exigência de concurso público.
Contrariado, estaria, ainda, o princípio da isonomia (art. 5°), visto que a
generalidade do ftmcionalismo do Esta-
27
do, para obter melhorias, precisa cursar
as oito séries do primeiro grau e as três
do segundo, ao passo que, aos privilegiados pelo favor da lei impugnada, é
possível as mesmas melhorias, após haver realizado menos cursos de aperfeiçoamento e atualização com carga
horária muito inferior (no máximo vinte
dias).» (fl. 34)
As informações do Presidente da Assembléia Legislativa, às fls. 46/51, sustentam que a sanção, por ele aposta ao projeto
respectivo, quando no exercício eventual
da chefia do Poder Executivo, supre a falta
de iniciativa do Governador, como admitido pela Súmula n° 5, do Supremo Tribunal
Federal.
Esclarecem que as normas impugnadas
não conferem a graduação de cursos regulares do primeiro e segundo graus. Limitam-se a particularizar critérios seletivos de
treinamento, aliás previstos na Lei Complementar Federal n° 20/74 (Lei da Fusão),
posterior à Lei n° 5.692/71 (Lei de Diretrizes e Bases de Ensino), não havendo, pois,
cogitar de invasão da competência legislativa da União (art. 22, XXIV, da Constituição).
Consideram, finalmente, que a alegação
de ofensa ao art. 32, II, da Constituição faz
tabula rasa da previsão de elaboração de
planos de carreiras (CF, art. 39, capei) e
do estabelecimento de critérios preparatórios a tal objetivo (CF-ADCT, art. 24),
institutos de classificação de cargos, genericamente denominados enquadramentos
(transposição, transformação, transferência, progressão funcional, ascensão funcional» (fl. 51).
Também o ilustre Dr. Miguel Franzino
Pereira, oficiando, às fls. 54/8, como Advogado-Geral da União, manifesta-se pela
constitucionalidade dos dispositivos atacados, por ser a validade dos.cursos em questão restrita ao efeito de enquadramento fimcional, sem que se trate do provimento de
cargos correspondentes a profissões rega-
28
R.T.J. —150
lamentadas (advogado, médico, engenheiro, etc.).
Observa que não se fez prova da tramitação defeituosa da lei em questão, e «tendo
sido ela sancionada pelo Chefe do Poder
Executivo, presume-se que não tenha ocorrido o defeito apontado» (fl. 56). Nem se
enquadra, o texto impugnado, nas hipóteses de iniciativa excluída, previstas no art.
61, § 1°, 11, c, da Constituição Federal.
No tocante à exigência de concurso público, afirma que o dispositivo atacado
«não institui ou regula qualquer forma de
provimento derivado. O texto, em sua essência, cuida tão-somente de um dos requisitos para a transposição ou transformação,
que são objeto de outras leis (anexos II e
III). Se violação possa existir ao art. 37, H,
terá ela ocorrido em outros diplomas legais,
não neste em discussão.» (fl. 57).
No tocante à violação de garantia constitucional da isonomia, obtempera que, a
«valer tal argumento, cairiam por terra,
qual num jogo de dominó, todos os programas de valorização do servidor público,
estaduais e federais» (fl. 57).
No parecer de fls. 71/80, após sintetizar
as peças até ali constantes dos autos, opina,
como abaixo reproduzido, pela improcedência da ação, o eminente Professor Afonso Heariques Fretes Correia:
«7. Importa notar, antes de mais nada,
que, o que se impugna nesta ação, é, com
efeito, a própria Lei n° 1.643/90, em sua
inteireza, uma vez que a mesma se resume no artigo 1° e respectivo parágrafo
único, indicados na inicial, cuidando o
artigo 2° somente de sua entrada em
vigor.
8. Dito diploma legal está sendo atacado sob a alegação de ser formal e
materialmente inconstitucional, estando
presente o vício formal desde o início de
sua elaboração, quando, o legislador estadual, além de invadir competência reservada ao legislador federal, dispondo
sobre normas gerais de ensino (art. 22,
XXIV, da CF), prescindiu da iniciativa
do chefe do Poder Executivo, exclusiva,
ex-vi do art. 61, § 1°, 11, c, da Constituição Federal, por se tratar de norma atinente a regime jurídico de servidor
público, ferindo-se, via de conseqüência
o art. 2° da Carta, que garante a independência e harmonia entre os Poderes. Já
o vício material estaria consubstanciado
na possibilidade decorrente da mesma
lei, de ingresso em cargo público sem
concurso, contrariando o mandamento
do inc. II, do artigo 37, da Constituição
Federal.
É fácil perceber, pela clareza de
seu teor, que a lei em causa não dispõe
sobre normas gerais de ensino, assim
como não confere graduação em qualquer nível a qualquer servidor. Tampouco versa matéria relativa à educação propriamente dita, referindo-se, isso sim, a
requisito para aproveitamento de servidor na Administração Pública estadual,
inclusive com respaldo na Lei Complementar Federal n° 20/74. E é sob este
último enfoque que poderia, eventualmente, apresentar o alegado vício de
inconstitucionalidade. Isto porque, sendo norma pertinente aregime jurídico de
servidor estadual, deveria ter partido,
com efeito, da iniciativa do chefe do
Poder Executivo estadual, nos termos
do art. 61, § 1°, II, c, da Carta Federal e
em atenção ao princípio da independência e harmonia entre os Poderes (art. 2°).
Não obstante, predita lei foi sancionada pelo Governador do Estado em
exercício, nada importando, no caso, se
o mesmo estava ocupando interinamente o cargo, por ausência do titular, visto
agir com os poderes a este conferidos.
11. Cabe aqui lembrar, que o problema de ser a sanção suficiente ou não para
suprir a falta de iniciativa do Chefe do
Executivo, não tem sido pacífico, existindo opiniões antagônicas, defendendo
R.TJ — 150
ora a revogação total da Súmula n° 5,
do Colendo Supremo Tribunal Federal,
segundo a qual «a sanção do projeto
supre a falta de iniciativa do Poder Executivo», ora sua revogação, apenas parcial, para os casos de emendas que
aumentem a despesa prevista, ora, ainda, sua revificação com a promulgação
da nova Carta Política.
Em que pesem todos os argumentos a favor ou contra a vigência dessa
Súmula, tem-se que a mesma só foi afastada quanto às emendas a projetos de lei
de iniciativa exclusiva do Chefe do Executivo, que viessem aumentar a despesa
prevista, orientação esta emanada das
expressas disposições do § 1° do art. 60
da Constituição Federal de 1967, repetidas no § 1° do art. 57, da Emenda Constitucional n° 1, de 1969, nesse sentido
tendo a Suprema Corte decidido, em
várias oportunidades, destacando-se o
julgamento da Rp. n° 890/CB, com acórdão publicado na RTJ n° 69/625, que
constituiu precedente de outras hipóteses, entre as quais a Rp 1.091-GO —
RTJ 103/96 e, recentemente, o RE n°
119.103-1-MA (DJ, de 23-2-90).
Remarque-se, que, ainda hoje,
perdura a restrição quanto a aumento de
despesa em projetos de iniciativa exclusiva do chefe do Poder Executivo e naqueles sobre organização dos serviços
administrativos da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, dos Tribunais
Federais e do Ministério Público, como
se depreende do art. 63, do Estatuto
Federal em vigor, sendo nessas situações incabível a invocação da Súmula
n° 5, que só subsistiria nos casos em que
a sanção não viesse convalidar aumento
da despesa prevista.
14. Não há, todavia, nem no regime
constitucional anterior, nem no atual,
qualquer proibição expressa dessa ordem, no que respeita a simples projetos
de lei, que não acarretam aumento da
29
despesa prevista, podendo concluir que
a intervenção do Poder Executivo, manifestando positivamente sua vontade,
ainda no curso da elaboração de uma lei,
para anuir completamente a seu teor,
através da sanção, vem imprimir eficácia a esse ato legislativo em formação,
suprindo a falta de iniciativa, cuja competência fora definida pelo Texto Fundamental, neste sentido prevalecendo o
espírito da Súmula n° 5.
Na presente hipótese ainda que
na ausência de elementos mais esclarecedores sobre a tramitação do diploma
legal em pauta (Lei n° 1.643/90), mas
diante da evidente sanção do Executivo,
estampada na cópia do Texto integral à
fl. 12, parece razoável concluir que a
falta de iniciativa foi sanada, tendo em
conta que o Texto comentado só pretendeu conferir maior eficácia a mero certificado de aprovação em curso de
aperfeiçoamento e amalisstção de servidor público estadual, como forma de
propiciar melhor aproveitamento deste
pela Administração não estabelecendo
aumento ou redução da despesa prevista
Não pode, portanto, a Lei n°
1.643/90, por esse prisma, ser considerada inconstitucional.
Relativamente ao vício de inconstitucionalidade material, que estaria maculando o dispositivo, hão é preciso ir longe para constatar que o mesmo
inexiste, não tendo sido afetados, nem o
artigo 37, II, nem o artigo 5°, da Constituição Federal.
Desde logo, cumpre destacar, que
o preceito impugnado não tem o condão
de operar transposição ou transformação de cargo público, como tampouco
promover enquadramento dos servidores que aproveita. Limita-se a possibilitar, como dito, mediante valorização de
um requisito, um mais adequado aproveitamento de servidores no âmbito da
30
—150
Administração estadual. Não concede,
por si só, o direito de ingresso em qualquer cargo, seja originário ou transformado, bem como não dispensa o
destinatário de prestar concurso, quando
este se faz necessário. Tão-somente
prestigia um certificado de aperfeiçoamento que não gera outra expectativa, a
não ser a de pleitear uma possível melhoria no serviço público, sem, no entanto, dispensar outros requisitos previstos
na legislação respectiva.
Ressalta, ao menor exame, que o
dispositivo em questão não garante graduação ou escolaridade a alguém, como
não convalida diploma algum, muito
menos de nível superior, o que deflui
clara e explicitamente de seu teor, estabelecendo, inclusive, no § 1°, que não se
assegura direito a prosseguimento de
estudo no ensino regular.
Não se encontra no texto contestado qualquer nuance que leve a concluir que pelo menos se pretendeu
contornar a exigência de concurso público, com ofensa à Lei Magna, pois,
assim como ele não dispõe sobre a transformação ou transposição propriamente
ditas, também não dá direito a ingresso
direto nos cargos daí oriundos, não promovendo servidor a cargo algum; somente lhe proporciona um elemento que
poderá levá-lo a uma situação melhor,
mais condizente com sua nova formação, cujo ingresso poderá ou não depender de concurso público, do qual a Lei
n° 1.643/90 não cuida, e é somente esta
que se encontra em discussão, sendo
estranhas ao âmbito da presente ação
quaisquer indagações quanto à constitucionalidade ou não de leis que regulem
efetivas formas de movimentação de servidores estaduais, com ou sem concurso, aí compreendidas as que disponham
sobre transposição e transformação de
cargos públicos.
Finalmente, não há como admitir
que as disposições da Lei n° 1.643/90
ofendam o princípio da igualdade, já
não consagrou explícita ou implicitamente forma de desigualdade entre
iguais. Ao contrário, facultou tratamento igual a iguais, porquanto se destinam
a todos aqueles que, dentro de certas
condições definidas em lei, se dispuseram a seguir o curso de aperfeiçoamento
de que se cogita, deixando de contemplar, como é de justiça, aqueles que não
o fizeram, apesar de para tanto poderem
se habilitar. Ao que conta, não foi essa
Lei n° 1.643/90 que estabeleceu os requisitos para ingresso em tal curso, alcançando, unicamente, os servidores
que, habilitados, chegaram a se diplomar. Daí ser totalmente inoportuna a
aleg'ção de ofensa ao princípio inscrito
no artigo 5° da Lei Fundamental.
Face ao que foi exposto, é o parecer no sentido de que se julgue improcedente a ação.» (fls. 75/80)
Deste Relatório, distribuam-se cópias
aos Srs. Ministros em cumprimento ao disposto no art. 172 do Regimento Interno.
VOTO
O Sr. Ministro Octavio Gallotti (Relator): A lei impugnada versa, efetivamente,
matéria relativa ao regime jurídico de servidor público e originou-se de projeto de
iniciativa parlamentar, mas foi sancionada
pelo Governador, então em exercício. A
mconstitucionalidade formal, argüida perante o art. 61, §§ 1°, 2°, c, deve ser afastada,
em obséquio ao enunciado da Súmula n°
5, do Supremo Tribunal:
«5. A sanção do projeto supre a falta
de iniciativa do Poder Executivo»
Esse verbete, aprovado na vigência da
Constituição de 1946, subsistiu na prática
da de 1967, com a ressalva de não ser
aplicável ao caso de projeto ou emenda
causadores de aumento de despesa, dada a
proibição terminante introduzida pelo pa-
R.TJ —150
rágrafo único do art. 57 daquela segunda
Carta (a de 1967), que encontra correspondência no art. 63 da atual. Vejam-se, a
propósito dessa questão, os acórdãos na
Representação n° 1.099, e outros compendiados no voto que tive a ocasião de proferir como Relator do Recurso Extraordinário n° 119.103 e se acha publicado no volume 131 da «Revista Trimestral de Jurisprudência». (Págs. 424/7).
Não estando em causa essa hipótese especial (aumento de despesa) é, portanto, de
aplicar-se a orientação consagrada pela Súmula do Supremo Tribunal.
Não procede, por igual, a assertiva da
invasão da competência legislativa da
União sobre diretrizes e bases da educação
nacional. Não se trata aqui de regular os
cursos, diplomas ou graduações disciplinados na legislação federal de ensino (especialmente a Lei n° 5.692-71): só da edição
de norma de direito administrativo, relativa
à seleção e treinamento de servidores, cujas
funções não se compreendam entre as atividades profissionais regulamentadas pela
União.
No tocante ao princípio da isonomia
(art. 5° da Constituição), merece mais detido exame a alegação de sua contrariedade
na feição específica que lhe confere outro
dispositivo da mesma Carta, o art. 37, em
seus dois primeiros incisos, a garantir o
acesso aos cargos públicos e cuidar do provimento deles, mediante concurso.
A circunstância de não outorgar enquadramento automático, nem por si só instituir transposição ou transformação, não
basta, data venta, para imunizar a regra
impugnada do controle constitucional, sob
o prisma da exigência do concurso, como
propõe o parecer da douta ProcuradoriaGeral da República.
Precisamente por não serem, os certificados em questão, instrumentos do ensino
em geral, e sim títulos ou requisitos de
investidura em cargo público, não logro
divisar como possa, a legitimidade desse
31
provimento derivado vira ser dissociada do
pressuposto de constitucionalidade da norma que o tem como única finalidade.
Dentro dessa linha de apreciação, penso
caber, desde logo, a distinção entre as duas
espécies de provimento compreendidas no
art. 1° da Lei estadual n° 1.643/90, impugnada por meio desta ação.
A chamada «transposição» simplesmente reside na «passagem de um cargo
atual para cargo idêntico da mesma natureza, do novo sistema classificatório» (art.
14, IV, a, do Decreto-Lei n° 408/79, do Rio
de Janeiro) ou no «deslocamento de um
cargo existente para classe de atribuições
correlatas do novo sistema» (art. 9°, 1°, b,
do Decreto federal n° 70.320/72).
Já a «transformação» chega a consistir
na «alteração de titulação e atribuições do
cargo com seu ocupante» (art. 14,1V, b, do
Decreto-Lei estadual citado), ou na «alteração das atribuições de um cargo existente»
1°, a, do Decreto federal n°
(art. g',
70.320/72).
Como se vê, ao passo que a transposição
não atinge a natureza ou as atribuições essenciais do cargo, são ambas alteradas
(além da denominação), pela chamada
transformação, por meio da qual se opera
uma modificação substancial, capaz de intrinsicamente caracterizar um novo provimento do cargo.
A circunstância de cuidar-se de um segundo provimento, também conhecido
como provimento derivado, perde significado quando se atenta para que o texto do
art. 37, II, da Constituição de 1988, não
mais restringe a exigência do concurso à
primeira investidura, como sucedia na Carta revogada, em seu art. 97, 1°. Essa
importante evolução foi bem ressaltada
pelo eminente Ministro Moreira Alves,
como Relator das Ações Diretas n°s 231 e
245.
A transformação de cargos foi concebida como instrumento transitório da aplica-
32
R.T.J. — 150
ção de determinado plano de classificação
(o da Lei Federal n° 5.645, de 1970). Ao
perenizar essa prática circunstancial, a Administração Pública não só desvirtua a concepção original da medida, como a partir da
promulgação da Carta de 1988, passa a
incidir na eiva de inconstitucionalidade.
Julgo procedente, em parte, a ação, para
declarar inconstitucional a expressão «e
transformação» no art. 1° da Lei n° 1.643,
de 4 de abril de 1990, do Estado do Rio de
Janeiro.
EXTRATO DA ATA
ADIn 266 — RJ —Rel.: Min. Octavio
Gallotti. Reqte.: Governador do Estado do
Rio de Janeiro (Advs.: José Eduardo Santos
Neves e outros). Recdos.: Governador e
Assembléia Legislativa do Estado do Rio
de Janeiro.
Decisão: Após o voto do Relator, julgando procedente em parte a ação, para
declarar a inconstitucionalidade das expressões «e transformação», contidas no
«captai» do art. 1° da Lei n° 1.643, de 4 de
abril de 1990, do Estado do Rio de Janeiro,
o julgamento foi adiado em virtude do pedido de vista do Ministro Moreira Alves.
Presidência do Sr. Ministro Sydney Sandia. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Moreira Alves, Néri da Silveira, Octavio
Gallotti, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Valioso, Marco Aurélio e limar Gaivão. Procurador-Geral da República, Dr. Aristides Junqueira
Alvarenga.
Brasília, 1° de abril de 1992 — Luiz
Tomimatsu, Secretário.
VOTO (VISTA)
O Sr. 11finistro Moreira Alves: 1. Pedi
vista apenas para examinar ajurisprudência
desta Corte quanto àprimeira parte do voto
do eminente relator que afasta, no caso, a
inconstitucionalidade formal da lei em causa com base na Súmula n° 5, sob o fundamento de que tal Súmula só não é aplicável
a partir da Constituição de 1967 pela proibição introduzida pelo parágrafo único do
artigo 57 desta, que, à semelhança do disposto no artigo 63 da Carta Magna atual, se
limita às hipóteses de projeto ou emenda de
que decorra aumento de despesa.
Estando o voto do eminente relator
em conformidade com a jurisprudência da
Corte, como verifiquei do exame a que
procedi com relação a ela, também não
acolho, no caso, a argüição de inconstitucionalidade formal da lei sob exame. Tenho-a, no entanto — como S. Ex.' e pelos
fundamentos expostos em seu voto —, por
inconstitucional no tocante à expressão «e
transformação», no artigo 1°.
Também julgo, pois, procedente, em
parte, a ação, para declarar inconstitucional
a expressão «e transformação» no artigo 1°
da Lei n° 1.643, de 4 de abril de 1990, do
Estado do Rio de Janeiro.
EXTRATO DA ATA
ADIn 266 — RJ — Rel.: Min. Octavio
Gallotti. Regro.: Governador do Estado do
Rio de Janeiro (Advs.: José Eduardo Santos
Neves e outros). Reqdos.: Governador e
Assembléia Legislativa do Estado do Rio
de Janeiro.
Decisão: Por votação nnanime, o Tribunal julgou procedente, em parte, a ação,
para declarar a inconstitucionalidade da expressão «e transformação», comida no «caput» do art. 1° da Lei n° 1.643, de 4 de abril
de 1990, do Estado do Rio de Janeiro.
Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotti. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Moreira Alva, Néri da Silveira, Sydney
Sanches, Paulo Brossard, Maro Aurélio,
Binar Gaivão e Francisco Rezek. Ausentes,
justificadamente, os Srs. Ministros Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e Carlos
Valioso. Vice-Procurador-Geral da República, Dr. Moacir Antonio Machado da Sn/
va.
Brasília, 18 de junho de 1993 — Luiz
Tomimatsu, Secretário.
R.TJ — 150
33
MANDADO DE INJUNÇÃO N° 413 (AgRg) — DF
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves
Agravante: DPR — Indústria de Moda 1.2da. — Agravado: Presidente da
República
Agravo regimental.
Segundo a orientação desta Corte, o original da petição
transmitida por fac-símile, deve dar entrada no Protocolo do Tribunal
dentro do prazo do recurso.
— Não-ocorrência disso, no aum.
Agravo regimental não conhecido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na con- fremida& da ata de julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos,
não conhecer do agravo regimental.
Brasília, 11 de março de 1993 — Octa-
vio Gallotd,Presidene— Moreira Alves, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Moreira Alves (Relatar): Neguei seguimento ao presente mandado de injunção pelo seguinte despacho:
1. «Trata-se de mandado de injunção
que se impetra contra a omissão do
Exmo. Sr. Presidente da República de
fixar o índice de correção monetária a
ser aplicado em procedimentos falimentares. Alega a impetrante que 'no caso a
competência para a fixação do índice
adequado de correção monetária a ser
aplicado nos procedimentos falimentores é do Sr. Presidente daRepública, nos
precisos termos do artigo 84, IV, da
Constituição Federal de 1988' (fl. 8).
2 Sucede, porém, que de acordo com
o disposto no artigo 5°, DOM da Com-
tituição Federal, o mandado de injunção
só é cabível quando falta norma regulamentadora que toma inviável o exercicio dos direitos e liberdades constituciomis e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e cidadania. Isso
implica dizer que s6 cabe mandado de
injunção quando falta a regulamentação de texto constitucional que outorgue direito, liberdade ou prerrogativa
inerente à nacionalidade, à soberania, e
à cidadania, falta essa que inviabiliza o
exercício de qualquer um deles.
No caso, não se invoca — porque
não há—qualquer dispositivo constitucional que outorgue direito, liberdade
ou prerrogativa cujo exercício dependa,
para ser viabilizado, de regulamentação
(que só poderia fazer-se por lei) ou, pelo
menos, da iniciativa exclusiva do Exoro.
Sr. Presidente da República.
Em face do exposto, e com base no
artigo 38 da Lei o° 8.038, nego seguimento ao presente mandado de intimção, ficando, assim, prejudicada a
apreciação do pedido de liminar.» (ti.
15)
Contra essa decisão, publicada em 1° de
fevereiro do corrente ano, foi interposto
agravo regimental por meio de fax, protocolado em 8 do mesmo mês, tendo o origi-
34
R.T.J. — 150
nal dado entrada nesta Corte no dia seguinte. Nesse agravo, alega-se:
§ 1° do artigo 5° da Constituição
Federal determina que as normas defmidons dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.
O § 2° do mesmo artigo preceitua que
os direitos e garantias expressos nesta
Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela
adotados.
O artigo 5° da Constituição Federal
não pode sofrer interpretação restritiva,
porque eliminaria, justamente, direitos e
deveres individuais e coletivos, fundamentais.
O artigo 3° da Lei de Introdução ao
Código Civil dispõe que na aplicação da
lei, o juiz atenderá aos fins sociais que
ela se dirige, e às exigências do bem
comum.
O Colendo Supremo Tribunal Federal ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 483-0, declarando a
inconstitucionalidade da Lei n° 8.177,
de 1°-3-91, demonstrou a inaplicabilidade dos índices de correção monetária.
Por força do princípio da divisão dos
Poderes o Excelso Pretório não poderia
ir além, mas agora, mediante a provocação constante do Mandado de Injunção n° 413-7, pode e deve completar o
julgamento histórico, determinando a
elaboração de norma regulamentadora
sobre a correção monetária nos procedimentos falimentares.
A falta da norma regulamentadora
torna inviável o livre comércio, e conduzirá à falência de empresários brasileiros, os quais estão sendo compelidos,
diariamente, pelo Poder Judiciário, ao
pagamento da Taxa Referencial —
TR/TRD, extorsiva, inconstitucional, e
que não possui a característica de neutralidade.
A utilização de uma taxa neutra de
correção monetária é prerrogativa do cidadão brasileiro e do comerciante.
Sua inexistência coloca em perigo
direitos, liberdades e prerrogativas essenciais, garantidos na Constituição Federal.» (fls. 24/25)
Havendo mantido o despacho agravado,
trago o agravo a julgamento deste Plenário.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): 1. Publicado o despacho agravado em
1° de fevereiro do corrente ano, terminou,
em 8 do mesmo mês, o prazo para a interposição dele. Nesse dia 8 deu entrada nesta
Corte a petição de agravo, em fac-símile,
inclusive sem qualquer autenticação. Só no
dia seguinte, quando já se escoara o prazo
de interposição do recurso, é que ingressou
em nosso Protocolo a petição original.
2. Em face do exposto, e consoante a
orientação já fumada por esta Corte no
sentido de que, nesses casos, a observância
do prazo se afere da data de ingresso, no
Protocolo da Corte, do original da petição,
não conheço do presente agravo.
EXTRATO DA ATA
MI 413 (AgRg) — DF — Rel.: Min.
Moreira Alves. Agte.: DFR Indústria de
Moda Ltda. (Advs.: Álvaro Alvares da Silva Campos e outros). Agdo.: Presidente da
República.
Decisão: Por votação unânime, o Tribunal não conheceu do agravo regimental.
Votou o Presidente. Ausente, ocasionalmente, o Ministro Francisco Rezek. Procurador-Geral da República, Dr. Moacir Antonio Machado da Silva, na ausência ocasional do Dr. Aristides Junqueira Alvarenga.
Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotti, Presidente em exercício. Presentes à
R.T.J —150
35
Sessão os Srs. Ministros Moreira Alves, curador-Geral da República, Dr. Aristides
Néri da Silveira, Paulo Brossard, Sepúlve- Junqueira Alvarenga.
da Pertence, Celso de Mello, Carlos Valioso, Marco Aurélio, limar Gaivão e Francisco Rezek. Ausente, justificadamente, o Sr.
Brasília, 11 de março de 1993 — Luiz
Ministro Sydney Sanches, Presidente. Pro- Tomimatsu, Secretário.
RECLAMAÇÃO N° 433 — DF
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Ilmar Gaivão.
Reclamante: Marco Antônio da Morta Tenório — Reclamado: Presidente do
Senado Federal.
Reclamação. Alegação de descumprintento da decisão do Supremo Tribunal Federal, em mandado de segurança, que declarou a
ruindade do ato de exoneração do reclamante por ter sido editado por
autoridade incompetente. Alcance que lhe pretende impor o reclamante.
Se o acórdão no mandado de segurança, cuja autoridade está
em causa, restringiu-se a declarar a nulidade da dispensa, posto que o
agente que a praticou não tinha competência, nada impedia a renovação
do ato pela autoridade julgada competente, sem que, com isso, ocorresse
desrespeito à decisão da Corte.
A pretensão do reclamante à ampliação do julgado, para que
lhe seja reconbedda a condição de servidor, em face da natureza do
vínculo que o une ao órgão, constitui matéria estranha ao julgamento
do mandado de segurança.
Reclamação julgada improcedente.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, por seu Tribunal Pleno, na
conformidade da ata do julgamento e das
notas taquigráficas, por unanimidade de
votos, em julgar improcedente a reclamaflto.
Brasília, 5 de agosto de 1993 — Odavio Gallotti, Presidente — limar Gaivão,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro limar Gaivão (Relator): Marco Antônio da Mota Tenório ajuizou reclamação contra o Presidente do Se-
nado Federal, apontando, como decisão do
Supremo Tribunal Federal cuja autoridade
estaria sendo desafiada, o v. acórdão proferido no Mandado de Segurança n° 21.117
— DF, de que fui relator, que declarou a
nulidade do ato de sua exoneração por ter
sido editado por autoridade incompetente
para o exercício do poder de demitir servidores.
Alega o reclamante que a conseqüência
do julgado desta Corte seria a anulação do
ato de sua dispensa e a sua permanência no
cargo de assessor, de provimento efetivo,
resultante da transformação operada pela
Lei n° 8.112/90, que implantou o Regime
Jurídico Único, mas que, entretanto, isso
não ocorreu, tendo-se limitado a autoridade
36
R.T.J. — 150
reclamada a determinar que o Diretor do
Centro Gráfico do Senado Federal —
CEGRAF promovesse o ato de sua exoneração, não lhe pagando, todavia, a remuneração advinda da anulação do ato de demissão pelo Supremo Tribunal Federal.
Foram prestadas informações pela autoridade reclamada, que, em sua essência,
aduz (fls. 24/27):
«A matéria objeto da presente controvérsia, em razão de manifestação
com fundamentos semelhantes, na esfera de competência administrativa, já foi,
anteriormente, objeto de apreciação por
parte dos órgãos de assessoria jurídica
do Senado Federal e do seu Centro Gráfico, tendo o Diretor Executivo do
CEGRAF, à época, exaurido a questão,
através da Exposição de Motivos n°
021/92-DE, encaminhada à esta Presidência no Processo if 009496/92-0, informando:
«Trata o presente feito de representação manifestada pelo ex-servidor Marco Antônio da Mota Temido, Assessor DAS-3, insurgindose contra o Ato n° 244/92 de sua
dispensa, desta Diretoria Executiva,
baixado de acordo com a competência expressa regulamentar, prevista
no artigo 25, III, do Ato ne 10n9, da
Comissão Diretora do Senado Federal e consoante o entendimento fumado pelo Supremo Tribunal Federal, ao julgar, em 28-5-92, o Mandado de Segurança if 21.117-2/160, impetrado pelo referido interessado.
A mencionada dispensa, procedida validamente por esta Diretoria
Executiva, ateve-se à conveniência
do respectivo ato, por se tratar de
cargo de confiança, de livre exoneração, de demissibilidscha ad nutrira,
cuja natureza e o vínculo de ex-servidor, não teve modificação em razão
da decisão do Pretório Excelso, ao
apenas anular o ato anterior impug-
nado judicialmente, originário da
digna Presidência do Senado Federal, vez que a competência expressa
para a prática do ato é da Diretoria
Executiva, na forma do Regulamento
Administrativo do Órgão.
Assim, no âmbito do seu poder
discricionário, dentro dos limites de
sua competência, definida, inclusive,
pelo próprio Supremo Tribunal Federal, esta Diretoria Executiva não
tinha como manter no cargo, de livre
exoneração, de Assessor DAS-3, o
ex-servidor, pois ausentes os pressupostos para a sua manutenção neste
cargo de confiança, havendo ipso
fato a conveniência de sua dispensa.
A decisão do Pretório Excelso,
como se vê dos termos do próprio
Oficio n° 618/P que a Presidência
daquela Corte Suprema encaminhou
ao Senado Federal, não assegurou ao
interessado a condição de servidor
em caráter efetivo para a pretendida
Inserção' no Quadro Permanente de
Pessoal do CEGRAF. Via de conseqüência, com a anulação tão-só do
ato primitivo de demissão elaborado
pela Presidência do Senado Federal,
sem qualquer indicação de outras
conseqüências jurídicas, toma evidente que o interessado apenas retomou ao cargo de Assessor DAS-3,
inapelavelmente de livre exoneração.
Considere-se que este posicionamento já restou demonstrado no Parecer da Assessoria Jurídica e na
Exposição de Motivos encaminhada,
à época, à elevada consideração da
Presidência do Senado Federal, às
fls. 5/15, do Processo 007766/92-0,
em anexo, que determinou ao Diretor-Geral da Casa que desse ciência
ao interessado do novo ato de sua
dispensa.
R.TJ —150
Por outro lado, cabe ressaltar que
até hoje não foi publicado o acórdão
relativo ao julgamento do mencionado Mandado de Segurança, sujeitando a decisão a interposição de recursos, como, por exemplo, embargos de declaração. Trata-se de um
julgamento cuja decisão ocorreu por
maioria, de apenas um voto, o que
caracteriza a complexidade da matéria contida na impetração, a impor
toda a cautela de Administração
para o rigoroso cumprimento da
determinação judicial.
A Lei n° 5.021, de 9 de junho de
1966, dispõe sobre o pagamento de
vencimentos em sentença concessiva
de mandado de segurança, a servidor
público civil. Assim sendo, após o
trânsito era julgado da referida decisão, o que até agora não ocorreu,
ainda será feita a liquidação judicial de sentença, por 'cálculo', relativa ao crédito dos estipêndios atrasados, nos termos do art. 1°, §
deste supracitado dispositivo legal.
Feitas estas considerações, não
procedem os termos da representação articulada pelo requerente já que
esta Diretoria Executiva procedeu
em restrita obediência às normas legais em vigor, aplicáveis à espécie,
atuando nos limites de sua competência regulamentar, praticando ato formal e substancialmente legítimo,
pelo critério de conveniência administrativa, prerrogativa esta definida
e proclamada pelo Supremo Tribunal
Federal ao julgar a ação mandamental do requerente.»
O mencionado acórdão, portanto,
está, ainda, pendente de publicação,
como o próprio Reclamante esclarece
no seu pedido, ressaltando que a decisão
judicial não transitou em julgado, facultando-se, em decorrência, a interpo-
37
sição de recurso por parte da AdvocaciaGeral da União, implantada atualmente.
Não há, assim, nenhum fundamento
fático ou legal a autorizar pretensão reclamatória. O Ofício n" 618/1', dessa
Excelsa Corte, de 2-6-1992, ao comunicar a anulação do Ato desta Presidência
n° 16/90, assegurou, também, ao Diretor
Executivo do CEGRAF, o exercício pleno dos atos administrativos, de sua
petência, sem qualquer restrição não
sendopertinente hipótese de
' de
demissão desmotivada, vez que relativa
a ato de dispensa de cargo em comissão,
de livre exoneração, assim definido por
lei.
Neste sentido, ao ser estabelecida a
situação funcional do Reclamante, por
ato desta Presidência, a Diretaiado CEGRAF, diante da faculdade legal, de
estrita observância à conveniência administrativa, mediante procedimento
distinto, exonerou o ex-servidor do cargo que ocupava, por se tratar, como
visto, de cargo de confiança, de livre
exoneração, dando ciência de todos os
atos praticados ao ora Reclamante.»
parecer da Procuradoria-Geral da
República opinou pela improcedência
da reclamação.
É o relatório.
VOTO
Sr. Ministro limar Gaivão (Relator): Sobre o mérito, opinou o Ministério
Público Federal, nos seguintes termos (fis.
50/51):
«O acórdão em causa ainda não foi
publicado; mas obtive cópia do oficio
enviado ao presidente do Senado pela
Presidência do Tribunal, em que se deixa claro o motivo da concessão majoritária da segurança: apenas a incompetência do impetrado, posto que cabia ao
Diretor-Executivo do CEGRAF a dispensa dos servidores do órgão. Diversamente do que pretendia o impetrante,
38
R.TJ. — 150
hoje reclamante, não há notícia de que o
Tribunal tenha aceitado a tese, por ele
defendida, de que não se tratava de emprego em comissão; da mesma forma,
não consta que tenha sido acolhido o
argumento da necessidade de motivarse o ato de dispensa. Em nenhum momento, atribuiu-se ao impetrante um inexistente direito de permanecer no cargo de provimento em comissão resultante da transformação do antigo emprego da mesma natureza.
Como o único vicio que levou à anulação do ato foi a incompetência do
agente, nada impedia sua renovação
pela autoridade julgada competente —
o Diretor-Executivo do CEGRAF.
Observo a desnecessidade da anulação da dispensa pelo Presidente do Senado, porque já feita pelo Judiciário,
bem como da reintegração formal do ora
reclamante, porque simples efeito da decisão judicial. De todo modo, consta dos
autos que o julgado foi cumprido (fl.
29), com a extensão referida no ofício
cuja cópia estou anexando a este parecer.
O pagamento das vantagens pecuniárias devidas em razão do julgamento do
mandado de segurança (Súmula n° 271,
do Supremo Tribunal Federal) será feito
de acordo com o disposto na Lei n°
5.021, de 9 de junho de 1966, e pressupõe o trânsito em julgado do acórdão.
Eventuais parcelas anteriores ao ajuizamento da segurança deverão ser reclamadas em ação própria, se não forem
pagas administrativamente.
Na verdade, a exoneração contra a
qual o impetrante se insurge é ato novo,
a ser impugnado em nova ação. Dado
que o reclamante teve ciência de tal ato
há quase um ano, noto que não é mais
viável o ataque por via de mandado de
segurança, para cujo julgamento, aliás,
o Supremo Tribunal Federal seria incompetente.
O que o reclamante pretende, na verdade, é ampliar o julgamento anterior,
para abranger questões por ele suscitadas, mas não acolhidas pelo Tribunal.
De desrespeito a tal julgado, não se
pode cogitar e, por isso, a reclamação é
improcedente.»
O acórdão do MS 21.117, cuja autoridade está em causa, restringiu-se a declarar a
nulidade da dispensa, posto que a competência, para produção do ato, não cabia ao
Presidente da Comissão Diretora do Senado, mas sim ao Diretor-Executivo, nos termos do próprio regulamento do Centro
Gráfico do Senado Federal — CEGRAF.
Só se prestou o mandado de segurança
para essa mera declaração de nulidade.
Donde, no seu julgamento, não ter sido
apreciada a natureza do vínculo que unia o
impetrante ao Centro Gráfico do Senado.
Aduzi a propósito no voto que, então, proferi:
«Tal conclusão afasta, por absolutamente irrelevante ao desfecho da controvérsia, a questão, também argüida
nas informações e no parecer da douta
Procuradoria-Geral da República, da
natureza do contrato que vinculava o
impetrante ao CEGRAF. Efetivamente, evidenciada a incompetência do impetrado para produção do ato impugnado, é de reconhecer-se a nulidade deste,
não importando saber se o vínculo que
une o impetrante ao CEGRAF é, ou não,
de natureza temporária, baseia-se, ou
não, em confiança, reveste-se, ou não,
da garantia da estabilidade».
Só cabe examinar, no juízo da reclamação, se a autoridade da decisão do Supremo Tribunal Federal foi, ou não, desrespeitada. E a conclusão a que se chega,
nesse caso, é negativa, já que a concessão
da segurança não teve o alcance que lhe
pretende impor o reclamante. Nesse ponto, entendo inteiramente procedentes as
R.T.J — 150
razões do parecer da Procuradoria-Geral da
República.
Assim sendo, julgo improcedente a reei—o.
EXTRATO DA ATA
Red. 433 — DF — Rel.: Min. limar
Gaivão. Recite.: Marco Antonio da Mota
Tenório (Adv.: Sebastião Baptista Affonso). Reciclo.: Presidente do Senado Federal.
Decisão: Por votação unânime, o Tribunal julgou improcedente a reclamação.
39
Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotti. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Moreira Alves, Néri da Silveira, Sydney
Sanches, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Venoso, Marco Aurélio e Ilmar
Gaivão. Ausentes, justificadamente, os Srs.
Ministros Paulo Brossard e Francisco Rezek. Vice-Procurador-Geral da República,
Dr. Moacir Antonio Machado da Silva.
Brasília, 5 de agosto de 1993. Luiz Tomimatsu, Secretário.
SUSPENSÃO DE SEGURANÇA N° 529 (AgRg) — RS
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Octavio Gallotti.
Agravante: Círculo de Pais e Mestres da Escola Estadual de Segundo Grau
Padre Reus — Agravados: Estado do Rio Grande do Sul e Relator do MS n° 592121768
do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul.
Diversificação de calendário escolar. Índole constitucional da
matéria questionada. Inconveniência, já assentada pelo Plenário (ADIn
748) de introduzir-se alteração de períodos letivos durante o curso dos
mesmos.
Agravo Regimental a que se nega provimento, para manter
a suspensão da segurança.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tri- banal Federal, em Sessão Plenária, na con-
formidade da ata do julgamento e das notas
taquignificas, por unanimidade de votos,
negar provimento ao agravo regimental. Brasília, 24 de junho de 1993 — Octavio Ganota Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Octavio Gallottl: A
medida liminar (cuja suspensão se requer)
houve por bem autorizar a unificação, em
determinado estabelecimento de ensino, de
calendários escolares que haviam sido diversificados pelo Decreto n° 34.185, de
21-1-92, do Governador do Rio Grande do
Sul.
Deferida a suspensão pelo despacho do
eminente Presidente Sydney Sanches (às
fls. 135/9), ingressou o presente Agravo
Regimental (fls. 166/9) onde os impetrantes, em suma, argumentam no sentido de
que não se discute, no mandado de segurança, a constitucionalidade ou a legaliti tab. do
citado Decreto estadual, mas somente a sua
aplicabilidade, ao caso concreto, dada a
comprovada inexistência de excedentes, a
justificar a implantação dos novos calendários.
Após resumir a controvérsia, opina a
douta Procuradoria-Geral da República,
ante as seguintes razões expendidas pela
40
R.TJ. — 150
ilustre Dra. Anadyr de Mendonça Rodrigues, Subprocuradora-Geral da República:
«4. Tudo posto, afigura-se desde
logo patente que as razões do Agravo
Regimental extrapolam do limitado âmbito do pedido de Suspensão de Segurança, pois — conforme remissão já
feita no Parecer de fls. 128/133 —, no
entender dessa Excelsa corte,
«Em suspensão de segurança, não
se discute o mérito do mandado de
segurança, mas, tão-só, se verifica a
ocorrência, ou não, de qualquer das
hipóteses previstas no art. 297 do
RISTE, isto é, se da liminar ou da
decisão, em mandado de segurança,
resulta ameaça de grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia pública. Compreende-se no
conceito de ordem, ut art. 297 do
RISTE, também a ordem administrativa.»
(SS 303-8-AgRg-DF, Rel. Min.
Néri da Silveira, in ni de 26-4-91,
Pág. 5094);
Estão, no entanto, limitadas unicamente ao mérito do mandado de segurança, as razões do Agravo Regimental,
quando abordam a alegada desnecessidade de aplicação do Decreto local n°
34.185, de 1992, e do sistema que instituiu, no que tange ao Colégio Padre
Reus, de Porto Alegre.
Poderia até acontecer, eventualmente, que a lesão à ordem administrativa realmente findasse por não se
consumar, caso ficasse o Colégio Padre
Reus, de Porto Alegre, excluído do sistema rotativo implantado por força do
Decreto local n° 34.185, de 1992.
7. Veja-se, contudo, que a consumação da lesão não constitui requisito de
presença essencial à concessão da Suspensão de Segurança.
De fato, nos termos do art. 4° da
Lei n° 4.348, de 1964, é suficiente, apenas, que exista a ameaça de grave lesão
aos valores que quis proteger, para ficar
legitimado o deferimento do pedido de
Suspensão de Segurança, porquanto é
cabível, nos casos
em que o cumprimento imediato do julgado ou da liminar pode
ferir ou ameaçar os interesses superiores legalmente protegidos.»
(In RTJ 118/861)
Bem por isso, em nada aproveitam
ao Agravante as argüições feitas, visto
como se mostram restritas à questão da
inconveniência e da inoportunidade de
aplicação do Decreto local n° 34.185, de
1992, e do sistema que instituiu, no que
respeita ao Colégio Padre Reus, de Porto Alegre.
Ademais, restou incólume ao ataque do Agravo Regimental o seguinte
fundamento, de que se serviu a R. decisão presidencial agravada:
«O Supremo Tribunal Federal já
decidiu que a sustação da aplicação
do artigo 3° do Decreto n° 34.185, de
30 de janeiro de 1992 — que implantou tal Calendário Escolar Rotativo
—, envolve prejuízo a interesse público, ao deferir medida cautelar, na
ADIn 748-3-RS.» (fls. 138/139)
Por fim, não é demais consignar
que perdeu seu ensejo — ante o transcurso do tempo — a alegação do Agravante atinente aos prejuízos dos alunos
que ficariam impedidos de concorrer ao
exame vestibular para ingresso em Universidades:
«Prejuízos estes que importam na
perda de um ano inteiro letivo dos
alunos que estejam nos sistemas b e
c, os quais não poderão exercer o
direito ao Concurso Vestibular vindouro, estabelecendo, assim, uma
solar discriminação destes em rela-
R.TJ —150
ção aos alunos do calendário ca»,
que terão tal oportunidade logo;»
(fls. 166/169)
12.0 parecer é, por conseguinte, de
que o Agravo Regimental não comporta
provimento.» (fls. 20W11)
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Octavlo Gallotil (Relatar): Embora os agravantes procurem reduzir a controvérsia ao ponto referente à rasoficiênciade procura de vagas parajustificar
a diversificação do calendário, é cato que
a causa comporta as implicações de ordem
constitucional suscitadas pelos próprios
impetrantes na ação cautelar inominada,
cuja &ninar acabou garantida no mandado
de segurança (art. 206, I e art. 227, fl. 79) e
pelacontestação do Estado, à fl. 90 (art. 82,
e VII).
De outro lado, no acórdão do Supremo
Tribunal que suspendeu a eficácia do Deacto legislativo estadual, de modo a restabelecer a do Decreto executivo unificador
do calendário (ADIn 748), ficou registrada
a inconveniência de introduzir-se alteração
de períodos letivos durante o curso dos
mesmos (cfr. votos dos eminentes Afirastroa Néri da Silveira, à fl. 64 e Sydney
Sanehes, à fl. 66).
41
Essa mesma razão milita agora em favor
de manter-se suspensa a segurança.
Nego provimento ao Agravo Regiamtal.
EXTRATO DA ATA
SS 529 (AgRg) — RS —
Afim
Octavio Canora. Agte.: Círculo de Pais e
Mestres da Escola Estadual de Segundo
Grau Padre Reus (Adv.: Luis Gustavo Andrade Madeira). Agdo.: Estado do Rio Grande do Sul. (Advas.: Eliana Soledade Graeff
Martins e outros). Agdo.: Relata do MS n°
592121768 do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul.
Decisão: Por votação unânime, o Tribunal negou provimento ao agravo regimental.
Presidência do Sr. Ministro Octavio (fatiara. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Moreira Alves, Néri da Silveira, Sydney
Sanches, Paulo Brossard, Sep6lveda Pertence, Carlos Velioso, Marco Aurélio, limar Gaivão e Francisco Rezek. Ausente,
justificadamente, o Sr. Ministro Celso de
Mello. Vice-Procurador-Geral da República, Dr. Moacir Antonio Machado da Silva.
Brasília, 24 de junho de 1993 — Luiz
Tomimatsu, Secretário.
QUÉRITO N° 592 (AgRg) — MG
(Tribunal Pleno)
Relata.: O Sr. Ministro Moreira Alves
Autor Ministério Público Federal — Indiciado: Wagner do Nascimento
Ação penal que se processa contra quem se torna parlamentar federal no curso desse processo.
— Esta Corte, ao julgar questão de ordem no Inquérito 571,
reviu sua orientação anterior, e passou a entender que são válidos os atos
— inclusive • denúncia —praticados antes do deslocamento da compe-
42
R.T.J. —150
tênda do Juízo, em ação penal cujo réu se torna parlamentar no curso
de seu processo.
Agravo a que se nega provimento.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos,
em negar provimento ao agravo regimental.
Brasília, 24 de março de 1993 — Sydney Sanches, Presidente — Moreira Alves, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): A Procuradoria-Geral da República
requereu fosse solicitada prévia licença à
Câmara dos Deputados para o prosseguimento de ação penal contra o Deputado
Federal Wagner do Nascimento, com a seguinte manifestação:
...» (fls. 4522/4527).
À fl. 4532, exarei este despacho:
«Solicite-se a licença a que alude o
parecer da Procuradoria-Geral da República no item 18, à fl. 4527.»
Às fls. 4547/4551, opõe-se agravo regimental contra o referido despacho, alegando-se:
«...
Havendo mantido o despacho agravado,
trago o agravo a julgamento do Plenário.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): 1. Esta Corte, ao julgar questão de
ordem no Inquérito n° 571, foi chamada, de
início, pelo relator, o eminente Ministro
Sepúlveda Pertence, a rever sua jurispru-
dência — que é a invocada pelo ora agravante quanto à nulidade da denúncia e dos
atos praticados em ação penal que se procossa contra quem se torna parlamentar
federal no curso desse processo.
Em seu voto, o eminente relator sustentou o que assim está sintetizado na ementa
do acórdão que, afinal, foi prolatado nessa
questão de ordem:
«STF: competência penal originária
por prerrogativa de função: advento da
investidura no curso do processo: inexistência de nulidade superveniente da
denúncia e dos atos nele anteriormente
praticados: revisão da jurisprudência do
Tribunal.
A perpetuatio jurisdidonis, embora aplicável ao processo penal, não é
absoluta: assim, v.g., é indiscutível que
a diplomação do acusado, eleito Deputado Federal, no curso do processo, em
que já adviera sentença condenatória
pendente de apelação, acarretou a hnediata cessação da competência da Justiça local e seu deslocamento para o Supremo Tribunal.
Daí não se segue, contudo, a derrogação do princípio tempus regit actum, do qual resulta, no caso, que a
validade dos atos antecedentes à alteração da competência inicial, por força da
intercorrente diplomação do réu, há de
ser aferida, segundo o estado de coisas
anterior ao fato determinante do seu deslocamento.
3. Não resistem à crítica os fundamentos da jurisprudência em contrário,
que se vinha firmando no STF:
a) o art. 567 do Código Processual
Penal, faz nulos os atos decisórios do
juiz incompetente, mas não explica a
R.TJ —150
43
suposta eficácia ex tone da incompetência superveniente à decisão;
virtude do referido fato superveniente. Disse, então, S. Ex.':
b) a pretensa ilegitimidade superveniente do autor da denúncia afronta,
além do postulado tempus regit actuai',
o principio da indisponibilidade da ação
penal.
«O delito imputado é anterior à investidura do acusado no mandato; desse
modo, com a extinção desse, cessou o
foro por prerrogativa de função, de que
gozava, e, em conseqüência, a competência do Tribunal, seja, na conformidade da jurisprudência, para refazer o processo ex mace, seja, como propus, para
o seu prosseguimento: nesse sentido, é
firme e, no ponto, incensurável, a orientação da Casa (v.g., mais recentemente,
Inq. 516, 1°-8-91, Celso de Mello; Inq.
186, 25-3-87, Sanches; RTJ 121/423;
APn 275,13-3-83, Buzaid, RTJ 107/15).
Enquanto prerrogativa da função
do congressista, o início da competência
originária do Supremo Tribunal Federal
há de coincidir com o diploma, mas nada
impõe que se empreste força retroativa
a esse fato novo que o determina.
Desse modo, no caso, competiria
ao STF apenas o julgamento da apelação
pendente contra a sentença condenaa5ria, se, para tanto, a Câmara dos Deputados concedesse a necessária licença.
A intercomIncia da perda do mandato de congressista do acusado, porém,
fez cessar integralmente a competência
do Tribunal, dado que o fato objeto do
processo é anterior à diplomação.
Devolveu-se, em conseqüência, ao
Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia a competência para julgar a apelação pendente, uma vez que a diplomação do réu não afetou a validade dos atos
anteriormente praticados, desde a denúncia à sentença condenatória.»
Sucedeu, porém, que, antes do término
do julgamento dessa questão, o parlamentar então em causa perdeu seu mandato,
razão por que cessou a competência desta
Corte, sem, no entanto, ficar prejudicada a
questão de ordem levantada, até porque, se
mantida a jurisprudência anterior, teria de
ser declarado nulo o processo desenrolado
na instância de origem, o que impediria a
decisão final desta Corte, no caso: a de
devolver ao Tribunal de Justiça local a competência, que passara a ser do Supremo
Tribunal Federal enquanto o réu fora deputado, para julgar a apelação pendente. Isso,
aliás, foi salientado pelo Ministro Sepúlveda Pertence, na retomada do julgamento em
2.0 que resta, pois, é apenas declinar da competência para o juízo competente.
Não obstante, estou em que a
determinação de qual seja o juízo competente, no estado do processo, traz de
volta à tona a questão inicialmente
suscitada.
De fato. Mantida a linha da jurisprudência do Tribunal, a investidura
intercorrente do acusado teria implicado a nulidade ipso Jure de todo o processo, a partir da denúncia, inclusive.
Efeito esse, parece induvidoso, que a
subseqüente perda de mandato não desfaz, uma vez que não devida à nulidade
da investidura, mas a fato posterior a ela.
Se, ao contrário, se entende, como
sustentei, que são válidas a denúncia, a
instrução e a sentença de primeiro grau,
devendo o processo retomar o seu curso
com o julgamento da apelação, cessada
para tanto a competência do Supremo
Tribunal, ressurgirá a do Tribunal de
Justiça de Rondônia.
Por isso, e dada a presença de
Ministros que não assistiram ao início
do julgamento, sinto-me, com a escusa
dos demais, na contingência de reler o
voto que então proferi (lê).
44
R.TJ. —150
7. Desse modo, altero a conclusão do
voto para atender à superveniente perda
do mandato do acusado e declinar da
competência de julgar a apelação para o
Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia: é o meu voto.» (fls. 242/243)
Portanto, esta Corte, nesse julgamento,
por unanimidade de votos, alterou sua jurisprudência anterior — que agora volta a
ser invocada —, o que determinou o requerimento da Procuradoria-Geral da República, neste caso, e o despacho ora agravado.
2. Em face do exposto, e com base nesse
precedente onde a questão foi amplamente
examinada e de cujo julgamento participei
com voto de adesão, nego provimento ao
presente agiameA
TO DA ATA
Inq 592 (AgRg) —MG. Rel.: Min. Moreira Alves. Agte.: Wagner do Nascimento
(Adv.: Paulo Alfonso Silveira). (Advs.: Carlos Mário da Silva Velloso Filho e Outros).
Agdo.: Ministério Público Federal.
Decisão: Por votação unânime, o Tribunal negou provimento ao agravo regimental. Votou o Presidente. Impedido o Ministro Carlos Velloso.
Presidência do Sr. Ministro Sydney Sanches Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Moreira Alves, Néri da Silveira, Octavio
Gallotti, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Venoso, Marco Aurélio, limar Gaivão e Francisco Reza Vice-Procurador-Geral da República,
Dr. Moacir Antonio Machado da Silva.
Brasília, 24 de março de 1993. Luiz
Tomhnatsu, Secretário.
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N° 618 — RS
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Sydney Sanches.
Requerente: Confederação Nacional das Profissões Liberais — Requerido
Governador do Estado do Rio Grande do Sul — Requerida: Assembléia Legislativa do
Estado do Rio Grande do Sul.
Ação Direta de Inconstitucionalidade. Lei n° 8.792, de
30-12-1988, do Estado do Rio Grande do Sul.
Tributário. Adicional de imposto de renda (art. 155, II, da
Constituição Federal). Artigos 146 e 24, parágrafo 3°, da parte permanente da C.F. e art. 34, parágrafos 3°, 4° e 5° do ADCT.
O adicional de imposto de renda, de que trata o inciso II do
art. 155, não pode ser instituído pelos Estados e Distrito Federal, sem
que, antes, a lei complementar nacional, prevista no «rapai» do art. 146,
disponha sobre as matérias referidas em seus incisos e alíneas, não
estando sua edição dispensada pelo parágrafo 3° do art. 24 da parte
permanente da Constituição Federal, nem pelos parágrafos 3°, 4° e 5° do
art. 34 do Ana.
Ação julgada, procedente, declarada a inconstitucionalidade
da Lei n° 8.792, de 30-12-1988, do Estado do Rio Grande do Sul.
- 150
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata de julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos,
em julgar procedente a ação, declarando-se
a inconstitucionalidade da Lei n° 8.792, de
30-12-1988, do Estado do Rio Grande do
Sul.
Brasília, 6 de outubro de 1993 — Octavio Galiotti, Presidente — Sydney Sanches, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Sydney Sanches (Relatar): O Ministério Público federal, em parecer do ilustre Vice-Procurador-Geral da
República, Dr. Moadr Antonio Machado
da Silva, aprovado pelo Exmo. Sr. Procurador-Geral, Dr. Aristides Junqudra Alvarenga, resumiu a hipótese e, em seguida,
opinou, in verbis:
«A Confederação Nacional das Profusões Liberais, com fundamento no
art. 102, I, a, e 103, IX, da Constituição
Federal, propõe a presente ação direta,
objetivando a declaração de inconstitucionalidade da Lei n° 8.792, de 30 de
dezembro de 1988, do Estado do Rio
Grande do Sul, que instituiu o 'Adicional do Imposto sobre Renda e Proventos
de qualquer Natureza', previsto no art.
155, II da Constituição Federal.
A ação, inicialmente proposta, tinha
por obj eto a declaração de inconstitucionalidade de vinte e uma leis de diferentes Estados da Federação, tendo sido,
porém, desmembrada em número correspondente ao das leis impugnadas,
para individualização dos processos respectivos, conforme decisão do Supremo
Tribunal Federal em Questão de Ordem
suscitada pelo Procurador-Geral da República, julgada em 19-9-91 (fi. 190).
Segundo a requerente, o diploma em
causa é inconstitucional, por infringên-
45
cia aos arts. 146,111, a, 151, I, 5°, R e
150, I, da Constituição Federal, tendo
em vista que (fls. 15/16):
«a) o adicional de que trata o art.
155, II, da CF é imposto novo, ine)(latindo sobre ele legislação anterior
que pudesse ter sido recebida pela
nova ordem jurídica constitucional,
de forma a atender ao art. 146, Dl, da
CF, que exige lei complementar para
definição de fatos geradores, bases
de cálculo e contribuintes dos impostos;
o § r do art. 34, ao autorizar
expressamente a regulamentação
provisória do ICMS por convênio, à
falta de lei complementar, não autoriza que se interprete o caput do artigo e o seu 3° como regras
permissivas do exercício da competência legislativa plena, independentemente de acatamento ao art. 146;
a Constituição não contém
qualquer disposição que excepcione
o adicional em tela do princípio do
art. 146, III, sequer prevendo a possibilidade de os Estados legislarem
provisoriamente sobre esse adicional, na falta de lei complementar;
o art. 24, 3°, da CF tampouco
autoriza a instituição de imposto sem
lei complementar, porque se aplica
tão-somente às hipóteses de competência concorrente, o que não se verifica na espécie, além de cuidar de
lei ordinária federal, e não de lei
complementar nacional;
ainda que se admitisse que os
Estados pudessem instituir o adicional sem lei complementar, os diplomas impugnados não definem os
elementos básicos do imposto, configurando a exigência da exação
ofensa ao princípio da legalidade.»
Em sessão Plenária realizada em
12-4-89, o Supremo Tribunal Federal
46
R.T.J. — 150
indeferiu o pedido de medida liminar,
em decisão assim ementada (fl. 71):
«Argüição de inconstitucionalidade de leis estaduais que instituíram
o adicional do imposto sobre a renda,
previsto no art 155, II, da Constituição Federal.
Medida cautelar indeferida, porquanto, não obstante o relevo do fundamento apresentado, não se
configura o pressuposto relativo à
demonstração da ineficácia de decisão a ser, porventura, proferida no
sentido de procedência da ação.»
Nas informações, o Exm° Sr. Governador do Estado (fls. 87/97) e a Assembléia Legislativa (fls. 75/80) refutam o
vício de inconstitucionalidade formal do
diploma impugnado, sustentando, no mérito, sua absoluta compatibilidade com
a Constituição Federal.
Em cumprimento ao art. 103, § 3°, da
Constituição Federal, a Advocacia-Geral da União manifesta-se em defesa da
constitucionalidade da lei impugnada
reportando-se aos argumentos expendidos pela Procuradoria-Geral da República, no RE n° 140.887-1, acrescentando
ainda que:
«a) a competência da União para
editar lei complementar em mata
tributária não exclui a competência
supletiva dos Estados (art. 24, §§ 2°
a 4° da CF), encontrando-se as normas gerais do CTN e de outras leis
em plena vigência, naquilo que não
colidam com a Carta Federal e as leis
novas pertinentes (art. 34, § 5° do
ADCI);
b) o novo imposto independe da
lei complementar referida no art.
146, III, a, da Constituição Federal,
porquanto os respectivos fato gerador, base de cálculo, sujeito passivo
e alíquota máxima já estão previstos
no art. 155,11, da Carta, não podendo
lei complementar alterar sua demição;
ainda que não houvesse tal definição, na falta de lei geral nacional,
poderiam os Estados expedir as normas necessárias, até que viesse a ser
editada a lei nacional competente,
nos termos do art. 24, §§ 3° e 4°, da
Constituição Federal, leis e»eas que
só entrariam em vigor a partir de
1°-3-89 (art. 34 §§ 3° e 4° do ADC'T);
não se cogita, no caso, de infringência do princípio da irretroatividade da lei tributária, sendo o fato
gerador do novo imposto o pagamento do IR devido à União, e não a
percepção dos lucros, ganhos e rendimentos de capital, que constitui
fato gerador do tributo federal».
Com vista dos autos, passa a Procuradoria-Geral da República a pronunciar-se sobre a controvérsia.
Argüi-se a inconstitucionalidade da
Lei n° 8.792/88, do Estado do Rio Grande do Sul, sob a alegação de que estaria
formalmente viciada, porque não constitui instrumento apto a criar imposto
novo, face ao estatuído no art. 146, 111,
a, da Constituição Federal, que exige lei
complementar federal para definir não
só os tributos e suas espécies, como os
fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes dos impostos constitucionalmente previstos.
A controvérsia em tomo da exigência
de lei complementar federal relativa a
normas gerais sobre o adicional do imposto de renda, de que trata o art. 155,
II, da Constituição Federal, foi dirimida
pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 140.887-RJ e do RE
136.215-RJ, em 18-2-93, declarando-se
a inconstitucionalidade formal da Lei n°
1.394, de 1988, do Estado do Rio de
Janeiro.
R.T.J — 150
No voto que proferiu como Relator
no RE 140.887-RJ, salientou, a respeito,
o eminente Ministro Moreira Alves:
«..., é manifesto que o adicional
previsto pela Constituição Federal,
no inc. II do art. 155, é tributo da
competência exclusiva dos Estados e
do Distrito Federal, mas não só não é
autônomo — (...) —, como também
sua disciplina pelas leis locais pode
dar margem a conflitos de competência entre Estados e a União Federal,
de outro, pelos seus inevitáveis reflexos nacionais.»
Em outras passagens, acrescenta:
«Quer se considere que o fato gerador desse adicional é o pagamento
à União a título de imposto de renda
incidente sobre lucros, ganhos e rendimentos de capital (...), quer se considere que o seu fato gerador é o
imposto de renda (...), o que é indubitavelmente certo é que a legislação
complementar de princípios gerais
terá que impor à União disciplina do
imposto de renda que permita, para
efeito de exigência, arrecadação e cobrzmça pelos Estados e pelo Distrito
Federal, se identifique o que o contribuinte do imposto de renda é devedor ou foi pagador por incidência
sobre lucros, ganhos e rendimentos
de capital, de um lado, e, de outro,
sobre rendas que não estas, como
decorrente de trabalho, tendo em vista o sistema de antecipações e de
reajustes, bem como as faixas de isenção ou de aliquotas diversificadas e
as deduções que se aplicam às rendas
englobadamente.»
(...)
«Por outro lado, (...), há uma série
de aspectos que estão a exigir normas
gerais de cunho nacional, por não se
circunscreverem ao âmbito territorial
do Estado ou do Distrito Federal.
47
..., por exemplo, nos casos de retenção do imposto de renda na fonte,
quando a fonte retentora está situada
em Estado diverso daquele em que
tem domicílio o contribuinte identificado, hipótese em que ou se criará
a obrigação de aquela fazer a retenção do adicional no Estado do domicílio do contribuinte (...) ou se terá de
criar a obrigação de aquela (a fonte
retentora) comunicar a este (o contribuinte) a retenção que está fazendo,
permitindo-se a este que efetue o pagamento do adicional no Estado em
que é domiciliado em data diversa da
em que a retenção foi efetuada (o que
também terá de resultar de norma
nacional).»
Quanto ao argumento de que a falta
de lei complementar pode ser suprida
pelos Estados, nos termos do art. 24, §
3° da Constituição Federal, ponderou o
eminente Ministro Oetavio CARMO no
voto que proferiu no RE 136.215-4/1U:
«Admito que se preste esse permissivo, entre a disciplina de outras
matérias, a possibilitar a instituição
de tributos, dispensada, a título de
formalidade, para esse fim, a prévia
edição de lei complementar. Jamais,
entretanto, quando a existência desta
se torne materialmente imprescindível, para a dirimência de conflitos de
competência entre os Estados.
É esta última — e tipicamente —
a hipótese em discussão, onde a diversidade de critérios legislativos estaduais sobre o domicílio de pessoas
físicas e jurídicas (contribuintes e
fontes de retenção), especialmente
quando possuem mais de um estabelecimento, é campo fértil de inaceitável bitributação.
Figure-se, ainda,e só para exemplificar, a transferência de domiclio,
pelo contribuinte, no primeiro dia do
ano, de são Paulo (onde o fato gera-
48
R.T.J. —150
dor — Lei n° 6.352/88 —é o mesmo
do imposto de renda), para o Rio de
Janeiro (onde o fato gerador é o pagamento do imposto de renda, Lei n°
1.394/88). A sancionar-se essa liberdade do legislador local, seria o imposto devido aos dois Estados.
O disposto no â 3° do art. 24 da
Constituição não pode, portanto, significar a abolição da lei complementar necessária à dirimência de conflitos de competência entre Unidades
da Federação. O âmbito do dispositivo está limitado, logicamente, às situações de alcance simplesmente isolado ou local, como também indica a
expressão literal da norma, em sua
parte final, quando se declara destinada a atender os Estados 'em suas
peculiaridades', sem se mostrar, assim, pertinente ao trato da matéria
tributária que haverá, fatalmente, de
compreender o inter-relacionamento
de mais de um Estado».
(...)
«Note-se que, para tornar viável a
cobrança do ICMS, o § 8°, do citado
art. 34 do ADCT, autorizou o suprimento da falta de lei complementar
pela celebração de convênio, o que,
não tendo sido previsto em relação ao
adicional estadual do imposto de renda, serve para corroborar a impossibilidade de exigência deste último,
sem a lei complementar determinada
pelo art. 146 da Constituição Federal.»
O acórdão proferido no citado RE
136.215-RJ traz a seguinte ementa
«Adicional estadual do imposto
sobre a renda (art. 155, II, da CF).
Impossibilidade de sua cobrança,
sem prévia lei complementar (art. 146
da CF.). Sendo ela materialmente
indispensável à dirimência de conflitos de competência entre os Estados
da Federação, não bastam, para dispensar sua edição, os pemiissivos inscritos no art. 24, â 3°, da constituição
e no art. 34, e seus parágrafos, do
ADCT.
Recurso extraordinário provido
para declarar a inconstitucionalidade
da Lei n° 1.394, de 2-12-88, do Estado do Rio de Janeiro, concedendo-se
a segurança.»
Os fundamentos expostos demonstram a obrigatoriedade da edição de lei
complementar nacional, que, definindo
aqueles elementos essenciais ao adicional em causa, propiciará aos Estados os
meios para a efetiva criação desse tributo, nos limites de sua jurisdição.
Ressalte-se, porém, que a exação, se
estabelecida, só poderá prevalecer até
1996, uma vez que dito tributo foi extinto pela Emenda Constitucional n° 3, de
1993, que, em seu art. 3° dispõe:
«A eliminação do adicional ao
imposto de renda, de competência
dos Estados, decorrente desta Emenda Constitucional, somente produzirá efeitos a partir de 1° de janeiro de
1996.»
A ausência de lei complementar
compromete, portanto,a validade da Lei
n° 8.792, de 1988, do Estado do Rio
Grande do Sul.
Em inclusão, o parecer é no sentido
de que se julgue procedente a ação, declarando-se a inconstitucionalidade da
Lei n° 8.792 de 30 de dezembro de 1988,
do Estado do Rio Grande do Sul.»
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Sydney Sambes (Relato): 1. O acórdão precedente, a que se referiu
o parecer da Procuradoria-Geral da República e de que foi relator o eminente Minis-
R.T.J —150
tro Octavio Oanani (RE n° 136.215/IU,
julgado unânime do Plenário do STF, em
data de 18-2-1993) foi publicado no DJ de
16-4-1993, Ementário n° 1.699-5 e ficou
assim ementado:
«Adicional estadual do imposto sobre a renda (art. 155, E, da CF).
Impossibilidade de sua cobrança,
sem prévia lei complementar (art. 146
da CF). Sendo ela materialmente indispensável à dirimência de conflitos de
competia entre os Estados da Fede bastam, para dispensar sua
raçóo
edição os pemrissivos inscritos no art.
24, § 3°, da Constituição e no art. 34, e
seara parágrafos, do ADCT.
Recurso extraordinário provido para
declarar a inconstitucionalidade da Lei
n° 1394, de 2-12-88, do Estado do Rio
de Janeiro, concedendo-se a segurança*.
2. Na mesma data (18-2-1993), o E
Plenário, julgando o RE 140.887, também
por votação tmânime, declarou a inccestituciondidade da mesma Lei 1.394, de 212-88, do Estado do Rio de Janeiro, tendo
sido o v. acórdão, (de que foi relator o
eminente Ministro Moreira Alves), publicado no DJ de 14-5-93, Ementário n°
1.703-23, com a seguinte ementa:
«Adicional do imposto de renda, em
favor dos Estados-membros. Incoruttitucionalidade da Lei 1.394, de 2-12-88, do
Estado do Rio de Janeiro.
Os Estados e o Distrito Federal só
podem instituir tributos, independentemente da Lei Complementar nacional
tributária a que alude o artigo 146 da
Constituição Federal, com relação a tributos autônomos, de sua competência, e
tributos esses que não possam ter ieflexos em outros Estados, no Distrito Federal e na própria União.
— Sentido e alcance dos §§ 3°, 4° e
5° do artigo 34 do ADCT, bem como do
49
§ 3° do artigo 24 da parte permanente da
Constituição Federal.
O adicional previsto pela Carta Magna, no inciso II do art. 155, é tributo da
competência exclusiva dos Estados e do
Distrito Federal, mas não só não é 'autônomo' — como adicional que é, está
inequivocamente vinculado ao imposto
de renda como instituído e disciplinado
pela União —, senão também sua disciplina pelas leis locais pode dar margem
a conflitos de competência entre Estados e Distrito Federal, de um lado, e
entre estes e a União Federal, de outro,
pelos seus inevitáveis reflexos nadoRecurso extraordinário conhecido e
provido, declarando-se a inconstitucionalidade da Lei n° 1.394, de 2-12-88, do
Estado do Rio de Janeiro.»
3. Adotando os fundamentos deduzidos
nesses precedentes e mais os do parecer do
Ministério Público federal, transcrito no
relatório, declaro a inconstitucionalidade
da Lei 8.792, de 30-12-1988, do Estado
do Rio Grande do Sul.
EXTRATO DA ATA
e
ADIn 618 — RS — Rel.: Min. Sydney
Sanches. Reqte.: Confederação Nacional
das Profissões Liberais. (Advs.: Luiz Carlos Bettiol e outro). Reqdos.: Governador
do Estado do Rio Grande do Sul e Assembléia Legislativa do Estado do Rio Grande
do Sul.
Decisão: Por votação unânime, o Tribunal julgou procedente a ação, para declarar
a inconstitucionalidade da Lei n° 8.7932, de
30-12-88, do Estado do Rio Grande do Sul.
Votou o Presidente.
Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotti. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Moreira Alves, Néri da Silveira, Sydney
Sanches, Sepúlveda Pertence, Carlos Velloso, Marco Aurélio, Binar Galvão e Francisco Rezek. Antes, justificadamente,
os Srs. Ministros Paulo Brossard e Celso de
R.T.J. —150
50
Mello. Procurador-Geral da República, Dr. Aristides Junqueira Alvarenga.
Brasília, 6 de outubro de 1993 — Luiz
Tomimatsu, Secretário.
AÇÃO DIRETA DE INICONSTITUCIONAL1DADE N° 683 — SC
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio.
Requerente: Procurador-Geral da República—Requerido Tribunal Regional
do Trabalho da 12' Região.
Ação Direta de Inconstitucionalidade. Objeto. Resolução de
órgão do Poder Judiciário. Normatividade. Reajuste de vencimentos do mis
de abril de 1990. Índice inflacionário do período de 15 de fevereiro a 15 de
março de 1990. Ganha contornos normativos decisão de tribunal que,
presente alteração na política de revisão geral de vencimentos perpetrada em data anterior ao mês alusivo ao das remunerações, determina a
observância de índice resultante de legislação revogada, fazendo-o de
forma linear, ou seja, em relação a todo corpo de servidores. É o caso do
ato de tribunal no que implicou abandono da legislação em vigor na data
da aquisição do direito aos vencimentos— Medida Provisória n° 154/90,
transformada na Lei n° 8.030/90, e dispôs sobre a aplicação de índice que,
à época, carecia de sustentação legal. Descabe confundir período a ser
pesquisado para efeito de fixação do índice inflacionário com a aquisição
do direito em si à percepção dos vencimentos devidamente corrigidas.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por maioria de votos, em julgar procedente a ação, para declarar a inconstitucionalidade da Decisão Administrativa n° TRT/SC/PA-MAD-0006/91
(Acórdão-TP-n° 3.374/91), do Tribunal Regional do Trabalho da Décima Segunda Região.
Brasília, 24 de junho de 1993 —Octavio Gallotti, Presidente — Marco Aurélio, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Valhome, em parte, do que tive oportunidade de
consignar quando procedi ao relato do pedido de concessão de liminar:
«O Procurador-Geral da República
ajuíza esta ação direta de inconstitucionalidade contra ato normativo do Tribunal Regional do Trabalho da Décima
Segunda Região, que implicou a concessão de diferenças salariais relativas
ao Índice de Preços ao Consumidor de
março de 1990, no percentual de 84,32%.
Alude, na inicial, à contrariedade aos
arts. 5°, inciso XVI, 37, incisos X e XV,
95, inciso III, e 96, inciso II, alínea d, da
Constituição Federal e pleiteia a concessão de cautelar que importe na suspensão da eficácia do referido ato.»
Em Sessão de 11 de março de 1992, esta
Corte concedeua liminar pleiteada, dizendo do concurso dos pressupostos que lhe
são próprios (fls. 33 a 37).
O Presidente do Tribunal Regional do
Trabalho da Décima Segunda Região, Juiz
Airton Minoggio do Nascimento, prestou
R.T.J — 150
as informações de fls. 43 a 49, evocando,
em síntese, a circunstância de a Medida
Provisória n° 154, de 16 de março de 1990,
já haver apanhado situação constituída, bem
como aduzindo que o ato praticado quanto
ao servidor Antonio Ramos revela-se com
contornos concretos, não cabendo, assim,
contra ele, a ação direta de inconstitucionalidade, que fica reduzida à decisão proferida no que implicou a normatização do reajuste de 84,32%. Com as informações vieram as peças de fis. 50 a 72.
A Advocacia-Geral da União argüiu o
descabimento da ação direta de incoanitucionalidade, agasalhando a tese do Requerido, no sentido de que o ato que se pretende
ver fulminado tem efeitos concretos. É levantada questão sobre o alcance do disposto no ã 3° do art. 103 da Constituição Federal, considerados os seguintes pontos:
a legitimidade para a propositura da
ação direta de inconstitucionalidade alcança o Presidente da República Logo, difícil
é conceba que, em tais hipóteses, deva o
Advogado-Geral da União, necessariamente, sustentar a valia da norma;
ao Advogado-Geral da União cumpre
observar o postulado imanente da fidelidade constitucional e isto fica seriamente comprometido a partir do momento em que se
assente o dever de, em qualquer hipótese,
defender o ato;
c) os precedentes desta Corte — dos
quais são exemplos os acórdãos proferidos
nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade
na 96 e 72, relatadas, respectivamente,
pelos ministros Moreira Alves e Sepúlveda Pertence, publicados nas Revistas Trimestrais de Jurisprudência nos 131/470 e
131/958 — devem merecer temperamentos, isto quanto ao fato de o Advogado-Geral da União atuar, em tal espécie de ação,
como curador especial, não se lhe podendo
impor «uma conduta empedernida e insensível, que acabaria por desqualificar a seriedade de sua própria posição institucional»;
51
d) há de se reconhecer a possibilidade de
o Advogado-Geral da União, na hipótese
de inconstitucionalidade manifesta, assumir posição contra o ato, mormente quando
existentes julgamentos sobre o tema emanados da Suprema Corte.
O pronunciamento é conclusivo no que
tange à inadmissibilidade da ação e vem
subscrito pelo Procurador da República Dr.
Gilmar Ferreira Mendes e pelo Subprocurador-Geral da República, Dr. Artur Castilho Neto.
Observada a óptica da maioria, em relação à qual guardo reserva, no sentido da
necessidade de remessa dos autos da ação
direta de inconstitucionalidade ao Procurador-Geral da República, ainda que este a
tenha proposto, veio à balha a peça de fls.
82 a 89, propugnando-se pela declaração
de inoonstitucionalidade da resolução administrativa atacada. Em síntese, ressaltase o leading case decorrente da apreciação
do Mandado de Segurança n° 21.216-1DF-, no qual esta Corte afastou a possibilidade de considerar existente, em tal hipótese, o direito adquirido dos servidores quanto
à aplicação do percentual de 84,32% aos
salários como decorrente da inflação calculada até 15 de março de 1990.
Recebi os presentes autos para exame
em 22 de abril de 1993, liberando-os em 26
seguinte, determinando a remessa de cópias desse relatório aos demais integrantes
da Corte.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Da natureza do ato atacado. A decisão da Corte de origem (fia. 6 a 11) resultou
realmente de requerimento formulado por
determinado servidor. A partir de interpretação dada às Leis n°57.730/89, 7.788'89 e
8.030/90, concluiu-se pela existência de
direito adquirido ao reajuste de vencimentos com base na variação do índice de Preços ao Consumidor no período de 15 de
52
RTJ. —150
fevereiro a 15 de março de 1990, considerados os vencimentos do mês de abril. Em
passo seguinte, emprestou-se à decisão, explicitamente, caráter normativo. Este último fato colou à deliberação, como um todo,
contornos ensejadores da ação direta de
inconstitucionalidade. Este enquadramento mais se robustece quando se constata que
o Tribunal a quo teve presente que diploma
legal de 15 de março de 1990 alterou a
política de revisão dos vencimentos e, mesmo assim, assentou a observância do percentual de 84.32%, muito embora já não
houvesse norma que a respaldasse. Neste
sentido decidiu o Pleno desta Corte na apreciação do pedido de liminar na Ação Direta
de Inconstitucionalidade n° 666, oportunidade em que fiquei vencido de forma isolada, razão pela qual coloco em plano secundário o convencimento pessoal. Rejeito
a preliminar apontada pela Advocacia-Geral da União.
Quanto às questões levantadas pelo órgão sobre a regra do § 3° do artigo 103 da
Constituição Federal, a elucidação não cabe,
em si, no âmbito do julgamento desta ação
direta de inconstitucionalidade, no que tem
objeto específico. O desempenho funcional
da Advocacia-Geral da União é estranho a
este último, valendo notar que compete ao
próprio órgão em tal campo emprestar ao
§ 3° do artigo 103 o alcance que entenda
mais adequado, isto em face à expressão
«que defenderá o ato ou texto impugnado».
Evidentemente, não se pode, em interpretação meramente gramatical, verbal, caminhar para conclusão geradora de perplexidade. De qualquer forma, o tema não é
passível de decisão, em si, nesta ação direta
de inconstitucionalidade, razão pela qual o
registro da liberdade técnica do Órgão exsurge como simples opinião.
Relativamente à matéria de fundo, verifica-se que o ato impugnado ao qual se
emprestou efeitos normativos revela o extravasamento do campo reservado à atuação do Tribunal autor, que acabou não por
reconhecer a existência de direito adquirido
dos servidores, mas por criar reajuste a
lebre da ordem jurídica em vigor. A partir
de confusão entre período a ser pesquisado
na fixação de índice inflacionário com o
alusivo à aquisição do direito ao reajuste,
acabou por legislar. À época da edição da
Medida Provisória n° 154/90, transformada
na Lei n° 8.038/90, não tinham os servidores do Tribunal Regional do Trabalho da
Décima-Segunda Região, nos respectivos
patrimônios, o direito aos vencimentos do
mês de abril. A Medida Provisória entrou
em vigor em 16 de março de 1990 e somente em 1° de abril teve início °período concernente aos vencimentos que, indevidamente, foram alcançados pelo ato impugnado.
Neste sentido decidiu esta Corte ao enfrentar, no Mandado de Segurança n°
21.216/90, pleito dos respectivos servidores, oportunidade na qual o ilustre Relator,
Ministro Octavio Gallotti, salientou que a
referida medida teria contornos retroativos,
caso houvesse apanhado a remuneração
correspondente adias, à época da edição, já
trabalhados. Julgo procedente o que ora
pleiteado e declaro, assim, a inconstitucionaliclade do ato de fls. 6 a 11 que, emanado
do Tribunal Regional do Trabalho da
Décima-Segunda Região, ganhou o n°
TRT/SC/PA-MAD-006/91.
É o meu voto.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Sr.
Presidente, quando do julgamento do MS
n° 21.216, do Distrito Federal, sustentei a
tese no sentido de que quando veio a lume
a Medida Provisória n° 154, de 15-3-90,
publicada no Diário Oficial de 16-3-90, que
acabou se convertendo na Lei n° 8.030, de
12-4-90, o acontecimento que a lei elegeu
para dar nascimento ao direito ao reajuste já
ocorrera por inteiro, vale dizer, já ocorrera
a variação do IPC de 15-2-90 a 15-3-90.
Sustentei, então, a existência de direito
R.T.1 —150
adquirido dos servidores ao reajuste correspondente à inflação ocorrida
53
15-2-90 a 15-3-90, conforme divulgado
pelo IBGE, cumprindo ao empregador o
pagamento, no mês seguinte, ou no mês
Sr. Presidente, para ganharmos tempo,
de abril. Porque, vale repetir, a Medida
não vou ler os termos do mencionado voto,
Provisória 154, que entrou em vigor no
já que a Casa o conhece. Vou, entretanto,
dia 16-3-90, encontrou condição aperinclui-lo no voto que ora estou proferindo,
feiçoada,
fato gerador do direito já ocordado que não estou convencido do seu derido, por inteiro.
sacerto, mesmo porque restei vencido na
companhia honrosa dos Ministros Paulo
A partir de 16-3-90, alei nova alterou
Brossard e Sepúlveda Pertence. Assim o
a regra, deixou de considerar o fato atrás
voto que proferi:
mencionado como capaz de dar nascimento a direito subjetivo. A lei nova,
«Sr. Presidente, ao que ouvi e apreenentretanto, vale para o futuro, não pode
di, a Lei n° 7.830, de 28-9-89, estabeleretroagir (Constieiçan, art. 5°, XXXVI).
ceu, no art. 1°, que os vencimentos dos
A partir de abril de 1990, desde que
servidores seriam reajustados, trimesos servidores trabalhassem, vale dizer,
tralmente, em percentual igual à variadesde que realizassem a condição pano
ção acumulada do IPC, verificada nos
recebimento do reajuste, reajuste a que
três meses anteriores, drvinridas as anfizeram jus no dia 15-3-90, deveriam
tecipações do art. 2°, dando-se o primeirecebê-lo, porque é necessário distinro reajuste trimestral cm outubro de 1989.
guir a condição ou o fato que deu nasciO artigo 2° estatuiu, a seu turno, que
mento ao direito ao reajuste da condição
sempre que a variação do IPC verificada
para recebimento deste: a condição esno mês anterior fosse superior a cinco
colhida pela lei para dar nascimento ao
por cento, os estipêndios dos servidores
direito, ou o fato gerador deste, é a vaseriam reajustados, a titulo de antecipariação do IPC calculada na forma do art.
ção, pelo percentual correspondente a
10 daLei n° 7.730, de 31-1-89, verificaeste excedente (Lei rf 7.830/89, arts. 1°
da no dia 15-3-90; a condição para o
e 2°). A Lei n° 7.974, de 22-12-89 tamrecebimento do reajuste, direito ao reabém dispôs a respeito do tema. A Lei n°
juste adquirido no dia 15-3-90, é ter o
7.730, de 31-1-89, art. 10, determinou
servidor trabalhado no mês de abril de
que «O IPC, a partir de março de 1989,
1990, trabalhado ou ter continuado vinserá calculado com base na média dos
culado ao emprego.
preços apurados entre o início da 2' (segunda) quinzena do mês anterior e o
Do exposto, apesar de compreender
término da P (primeira) quinzena do
a extensão desta decisão, desde que ocormês de referência».
rido o fato gerador do direito subjetivo,
não posso deixar de deferir o mandado
Posta assim a questão, Sr. Presidende segurança, com a vênia do eminente
te, verifica-se que quando veio a lume
Ministro Relator.
a MP n° 154, de 15-3-90, publicada no
Defiro o svrit».
DO de 16-3-90, que acabou se convertendo na Lei n° 8.030, de 12-4-90, a
Com a vênia do Sr. Ministro Relator,
condição escolhida pela lei para dar nas- julgo improcedente a ação direta de incemcimento ao direito subjetivo dos servi- titucionalidade.
dores, ou o acontecimento que a lei
EXTRATO DA ATA
elegeu para dar nascimento ao direito ao
reajuste, já ocorrera, por inteiro, vale
ADIn 683 — SC —Rel.: Min. Marco
dizer, já ocorrera a variação do 1PC, de Aurélio. Reqte.: Procurador-Geral da Re-
54
R.TJ.— 150
pública. Reqdo.: Tribunal Regional do Trabalho da 12' Região.
Decisão: Por maioria de votos, o Tribunal julgou procedente a ação, para declarar
a inconstitucionalidade da Decisão Administrativa n° TRT/SC/PA-MAD-0006/91
(Acórdão-TP-n° 3.374/91), do Tribunal
Regional do Trabalho da 12' Região, vencidos os Ministros Carlos Velloso e Sepúlveda Pertence, que a julgavam improcedente e constitucional o ato impugnado.
Votou o Presidente.
Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotti. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Moreira Alves, Néri da Silveira, Sydney
Sanches, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence, Carlos Velloso, Marco Aurélio, limar Gaivão e Francisco Rezek. Ausente,
justificadamente, o Sr. Ministro Celso de
Mello. Vice-Procurador-Geral da República, Dr. Moacir Antonio Machado da Silva.
Brasília, 24 de junho de 1993. Luiz Tomimatsu, Secretário.
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N° 807 — RS
(Questão de Ordem)
(Tribunal Pleno)
Relator. O Sr. Ministro Celso de Mello.
Requerente: Procurador-Geral da República — Requeridos: Governador do
Estado do Rio Grande do Sul e Assembléia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul.
Ação Direta de Inconstitacionalidade. Legitimidade ativa. Impossibilidade de o Governador do Estado, que já figura como órgão
requerido, passar à condição de litisconsorte ativo. Medida cautelar não
requerida pelo autor. Pedido ulteriormente formulado pelo sujeito passivo
da relação processuaL Impossibilidade. Não-conhecimento.
— O órgão estatal que já figure no pólo passivo da relação
processual não pode ostentar, simultaneamente, a condição de litisconsorte ativo no processo de controle abstrato instaurado por iniciativa de
terceiro.
A circunstância de o Governador do Estado poder questionar, autonomamente, a validade jurídica de uma espécie normativa local
em sede de ação direta, fazendo instaurar, por iniciativa própria, o
concernente controle concentrado de constancionalidade, não lhe confere a prerrogativa de, uma vez iniciada a fiscalização abstrata por qualquer dos outros ativamente legitimados — e constando ele como órgão
requerido na ação direta —, buscar a sua inclusão no pólo ativo.
—O órgão do Poder Público que formalmente atue como
sujeito passivo no processo de controle normativo abstrato não dispõe de
legitimidade para requerer a suspensão cautelar do ato impugnado,
ainda que tenha expressamente reconhecido a procedência do pedido.
R.TJ —150
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos,
resolvendo questão de ordem, em indeferir
a admissão do Governador do Estado do
Rio Grande do Sul como litisconsorte ativo, e não conhecer do pedido de medida
canelar.
Brasília, 27 de maio de 1993 —Octavio
Gallotii, Presidente — Celso de Mello,
Relator.
RELATÓRIO
55
requerida pelo Autor — da eficácia das
normas impugnadas.
Para apreciação desse pedido, submeto
o processo, em questão de ordem, ao Plenário da Corte.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): A nova Carta Política, ao ampliar o rol
das pessoas ativamente legitimadas para o
exercício da ação direta de inconstitucionalidade, tornou viável, a partir da institucionalização dessa legitimidade concorrente,
a formação de litisconsórcio ativo no processo objetivo de controle normativo absO Sr Ministro Celso de Mello: O Pro- trato, desde que, para efeito de sua instaucurador-Geral da República ajuizou a pre- ração, os litisconsortes disponham, autosente ação direta de inconstitucionalidade, nomamente, de qualidade para agir.
impugnando os arts. 6°, caput e seu paráNada impede, portanto, que, em tese,
grafo único, e 7° do ADCT da Constituição Governador de Estado e o Procurador-Gedo Estado do Rio Grande do Sul, bem assim ral da República figurem no pólo ativo da
a Lei n° 9.123/90, que regulamentou os relação processual que se estabelece com o
dispositivos da Carta estadual.
ajuizamento, perante o Supremo Tribunal
Figuram, como sujeitos passivos da re- Federal, da ação direta.
lação processual em causa, o governador e
Quando, no entanto, o ato normativo
a Assembléia Legislativa do Estado, por- impugnado em sede de fiscalização abstraquanto deles emanaram os atos normativos ta tiver emanado também do Chefe do Poora questionados.
der Executivo —a lei, sendo ato estatal
Requisitadas as informações de praxe, subjetivamente complexo, emerge da conprestou-as a Assembléia Legislativa esta- jugação das vontades autônomas do Legisdual, sustentando a legitimidade constitu- lativo e do Executivo — e este figurar, em
conseqüência, no pólo passivo da relação
cional das normas impugnadas.
processual, tomar-se-á juridicamente imO Governada do Estado, contudo, não possível o seu ingresso em condição subjeobstante a sua condição formal de sujeito tiva diversa daquela que já ostenta no propassivo da presente relação processual, eis cesso. Vale dizer, o órgão estatal responsáque sancionou o projeto que se converteu vel pela edição do ato questionado não
na Lei n° 9.123/90, pleiteia o seu ingresso pode, em processo de controle abstrato já
nesta causa, na qualidade de litisconsorte instaurado por terceiro, figurar como seu
ativo o Procurador-Geral da República.
litisconsorte ativo.
O Chefe do Poder Executivo estadual,
A circunstância de o Governador do Esque expressamente reconheceu o pedido tado poder questionar, autonomamente, a
formulado pelo Procurador-Geral daRepú- validade jurídica de uma espécie normativa
blica —, e, em conseqüência, manifestou- local em sede de ação direta, fazendo insse pela procedência integral da ação —, taurar, por iniciativa própria, o concernente
postula, ainda, a suspensão cautelas—não controle concentrado de constitucionalida-
56
R.TJ. — 150
de, não lhe confere a prerrogativa de, uma
vez iniciada a fiscalização abstrata por
qualquer dos outros ativamente legitimados, buscar a sua inclusão no pólo ativo.
O reconhecimento pelo Governador do
Estado do pedido formulado pelo Procurador-Geral da República — ato processual
que, embora possível, nenhuma eficácia
jurídica possui em sede de controle abstrato, onde se controverte sobre situações normativos indisponíveis — não legitima a
novação subjetiva da relação processual,
tal como pretendida pelo órgão público de
que também emanou o ato impugnado.
A circunstância de o Procurador-Geral
da República haver impugnado a validade
jurídica de normas inscritas no ADCI' local
— estatuto promulgado pela Assembléia
Legislativa do Estado — não autoriza a
pretendida inversão da posição formal do
Governador, eis que este, por haver sido
co-participe do processo de formação da
Lei n° 9.123/90 (ato igualmente questionado nesta sede), já ostenta a necessária condição de sujeito passivo da relação processual.
Não pode o Chefe do Executivo, desse
modo, pretender figurar, simultaneamente,
numa mesma relação processual, nas antagônicas posições de sujeito ativo e de
sujeito passivo, quando se tratar de ação
direta de inconstitucionalidade ajuizada por
terceiro.
Assim, indefiro o postulado ingresso do
Governador do Estado — que figura como
órgão requerido na presente ação direta —
na condição de litisconsorte ativo do Procurador-Geral da República.
Resta, ainda, uma indagação: pode o
sujeito passivo da relação processual instaurada com o ajuizamento de ação direta
de inconstitucionalidade requerer a suspensão cautelar da eficácia das normas impugnadas, quando não o fez o próprio Autor?
Entendo que não. Tenho para mim que
não se revela lícito ao órgão de que emanou
o ato questionado, na hipótese em que figure ele como requerido em sede de ação
direta, deduzir a pretensão de ordem coutelar, ainda que expressamente reconheça a
procedência do pedido formulado por terceiro.
Somente aquele que fez instaurar o processo de controle normativo abstrato, e nele
figure, validamente, como autor, dispõe de
legitimidade ativa para requerer a concessão de medida cautelar em ação direta de
inconstitucionalidade.
Disso decorre que o órgão estatal requerido, que se situa no pólo passivo da relação processual, não possui qualidade para,
em sede de fiscalização abstrata de constitucionalidade, formular pedido de suspensão cautelar da eficácia do ato impugnado.
Isto posto, e resolvendo este segundo
ponto da questão de ordem ora suscitada,
não conheço do pedido de medida cautelar
deduzido pelo Governador do Estado do
Rio Grande do Sul, em face de sua absoluta
ilegitimidade ativa para, neste processo
em que figura como órgão requerido,
deshivir semelhante pretensão.
É o meu voto.
EXTRATO DA ATA
ADIn 807 (Questão de Ordem) — RS
— Rel.: Min. Celso de Mello. Reqte.: Procurador-Geral da República. Reqdos.: Governador do Estado do Rio Grande do Sul
e Assembléia Legislativa do Estado do Rio
Grande do Sul.
Decisão: Apresentado o feito em mesa,
o julgamento foi adiado em virtude do
adiantado da hora. Plenário, 5-5-93.
Decisão: Por votação unânime, o Tribunal, resolvendo questão de ordem proposta
pelo Relator, indeferiu a admissão do Govemador do Estado do Rio Grande do Sul
como litisconsorte ativo, e não conheceu do
pedido de medida cautelar por ele formula-
R.TJ —150
do. Votou o Presidente. Ausente, ocasionahnmte, o Ministro Carlos Velloso.
Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotd. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Moreira Alves, Nézi da Silveira, Paulo Brossa* Sepdveda Pertence, Celso de Mello,
Carlos Veiloso, Marco Aurélio, limar Gal-
57
vão e Francisco Rezei Ausente, justificademente, o Sr. Ministro Sydney Sandra.
Vice-Procurador-Geral da República, Dr.
Moacir Antonio Machado da Silva.
Brasília, 27 de maio de 1993 — Luiz
Tondmatsn, Seaetído.
AÇÃO DIRETA DE 1NCONSTTTUCIONALIDADE br 895 — RS
(Medida Cautelar)
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro limar Gaivão
Requerente: Governador do Estado do Rio Grande do Sul — Requerido:
Assembléia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul
Constitucional. Dispensa de servidor público para exercício de
mandato em entidade representatim. Matéria de iniciativa legislativa reservada (aM 61, 51; H C, da CF). Aplicação da regra dos estados-membros. Precedentes.
Apurada a relevinda jurídica do pedido fundado em alegação de inconstitudonalidade formal, e o justificado recdo de grave lesão
ao cumprimento do calendário escolar se mantida a legislação impugnada, é de se deferir a medida cautelar requerida.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, por seu Tribunal Pleno, na
conformidade da ata do julgamento e das
notas taquigráficas, por unanimidade de
votos, em referendar o despacho do Mmistro limar Gaivão, que deferira medida cautelar para suspender, até a decisão final da
ação, a eficácia da Lei n° 9.536, de 10-3-92,
do Estado do Rio Grande do Sul. Votou o
Presidente.
Brasília, 8 de setembro de 1993 — Octudo Gallotd, Presidente — limar Gelvão, Relator.
RELATÓRIO
pedido de medida liminar, tendente à suspensão da Lei n° 9536092, do Estado do
Rio Grande do Sul, com o seguinte teor:
art. 1° — Fica acrescentado à Lei
n° 9.073, de 15 de março de 1990, o
seguinte artigo, que será o quinto, renumerando-se os demais:
Art. 5° —Fica garantida a dispensa de, no mínimo, um representante
por ciramsaição regional, nos casos em que as entidades adotarem
esta forma de estrutura e congregaran mais de quinhentos associados
das respectivas regiões.
O Sr. MInktiro limar Gaivão (Rela-
Art. 2" —Estalei entra em vigor na
data de sua publicação.
tar): Às vésperas do último recesso, vieram-me conclusos os autos da presente ação
direta, em que se encontrava formulado
Art. 3° — Revogam-se as disposições em contrário.»
58
R.TJ. — 150
No dia 1° do corrente, proferi despacho,
ad referendum do egrégio Plenário, nos
seguintes termos:
«O Governador do Rio Grande do
Sul propõe ação direta de inconstitucionalidade da Lei Estadual n° 9.536, de 10
de março de 1992, pela qual, em acréscimo ao disposto na Lei n° 9.073, de 15
de março de 1990, foi estendida aos
servidores públicos, integrantes de entidades de classe ou sindical, com organização regional, a garantia de dispensa de
suas atividades para o exercício nelas de
mandato eletivo.
Afirma que a referida lei, além de
contrária ao interesse público, é inconstitucional, por usurpação de competência, uma vez que originada de projeto de
lei proposto por membro da Assembléia
Legislativa, quando a matéria relativa
ao afastamento de servidores públicos é
afeta à iniciativa legislativa própria do
Chefe do Poder Executivo, de conformidade com o art. 61, § 1°, II, c, da Constituição Federal.
Pleiteia a concessão de medida cautelar, assinalando que a execução da legislação impugnada implica conturbar a
Administração Estadual, particularmente
na área do magistério, dado o número de
afastamentos em causa, com grave prejuízo ao desenvolvimento das atividades letivas nos diversos estabelecimentos de ensino espalhados pelo território
gaúcho.
Vislumbro configurada, na hipótese,
a relevância e plausibilidade jurídica no
pedido do Autor, tendo em vista o documento de fl. 16 e, ainda, que a matéria
concernente à dispensa ou licença de
servidores públicos é afeta ao quadro
das normas que devem disciplinar o regime jurídico da categoria e, pois, inserida na competência privativa do Chefe
do Poder Executivo, para efeito de iniciativa legislativa, a teor do que dispõe
o art. 61, § 1°, II, c, da Constituição
Federal, cuja aplicação aos Estadosmembros decorre de ser tal regra um
desdobramento necessário do princípio
da separação dos Poderes (ADIMC n°
757, de que fui relator).
Concorre, outrossim, o requisito do
perimiam in mora, considerando a circunstância de que, somente no caso dos
profissionais da área de educação, a execução daquelas normas resulta no afastamento de elevado número de professores das atividades de ensino, com evidente prejuízo ao cumprimento do calendário escolar.
Com efeito, composta a diretoria de
cada um dos quarenta e dois núcleos
regionais do sindicato dos professores
do Rio Grande do Sul de oito membros
(documentos de fls. 20/21, e 25-v), a
aplicação das regras de dispensa de servidores para o exercício de mandato eletivo redunda em subtrair da atividade de
ensino, na rede pública, cerca de trezentos e trinta e seis professores, evidenciando o justo receio manifestado pelo
Autor quanto à ocorrência de dano irreparável.
Por todo o aposto, concedo, ad referendum do egrégio Plenário, a medida
cautelar requerida para efeito de suspender, até o julgamento final da ação direta,
a execução da Lei n° 9.536/92, do Estado do Rio Grande do Sul.
Providenciem-se as devidas comunicações, solicitando-se informações à autoridade requerida»
Para a apreciação desta decisão, submeto-a, na forma regimental, ao egrégio Plenário.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro limar Gaivão (Relator): Ao deferir a medida cautelar, consignei que o fundamento da ação direta era
juridicamente relevante e plausível em face
R.T.J —150
do que dispõe o art. 61, § 1°, II, c, da
Constituição Federal, e, por outro lado, que
havia o perleulum in mora em face do
considerável contingente de professores
que estariam sendo beneficiados com a dispensa ou licença de suas atividades profissionais, em prejuízo do normal desenvolvimento do calendário letivo nos estabelecimentos de ensino da rede pública do Estado
do Rio Grande do Sul.
Acrescento, nesta oportunidade, com
vistas a apenas reforçar o argumento em
torno da situação de perieulunt In mora,
que a legislação impugnada permite elevar
o número de dispensa de professores para
além daquele indicado no despacho, através de atos de iniciativa exclusiva da própria entidade sindical.
Com efeito, basta atentar para a circunstância de que a Lei n° 9.073/90, em cujo
contexto foi inserida a legislação ora impugnada, permite que, em caso de representação sindical, o número de dispensas atinja
o limite de até onze, o que não foi alcançado
no caso particular das representaçõesregionais do sindicato dos professores, podendo
vir a sê-lo, todavia, mediante simples alteração do respectivo estatuto, de modo que,
elevado dos atuais oito para onze o número
de diretores de cada núcleo regional, restariam beneficiados pela dispensa remunerada das atividades de ensino, em tese, nada
menos do que quatrocentos e sessenta e
dois professores.
E mais, é possível ainda que o próprio
sindicato, como prevê o at. 23, 1°, do seu
estatuto, venha a criar, observando a congregação mínima legal de quinhentos associados por área, novos núcleos regionais
para atender «às necessidades de mobilização e organização da categoria», o que implicaria elevar ainda mais o atual número
de afastamentos remunerados de ptufessores.
59
É óbvio que estes últimos números se
revelam como projeções ou possibilidades,
sendo certo que, de concreto, há apenas a
garantia de afastamento dos referidos trezentos e trinta e seis professora da rede
pública de ensino. De qualquer modo é o
quanto me pareceu suficiente para ver caracterizado o perimiam in mora, que conduziu-me ao deferimento da medida liminar.
Por isso, Sr. Presidente, meu voto é no
sentido de que seja mantido o despacho que
suspendeu, cautelarmente, a eficácia da Lei
n° 9336/92 até o julgamento final da presente ação direta.
EXTRATO DA ATA
ADln 895 (Medida Cautelar) —RS —
Rel.: Min. limar Gaivão. Repte.: Governador do Estado do Rio Grande do Sul (Advs.:
Gabriel Pauli Fadei e outra). Reqda.: Assembléia Legislativa do Estado do Rio
Grande do Sul (Advs.: Regis Amoldo Ferretti e outros).
Decisão: Por votação unânime, o Tribunal referendou o despacho do Ministro
mar Gaivão, que deferira medida canelar
para suspender, até a decisão final da ação,
a eficácia da Lei n° 9.536, de 10-3-92, do
Estado do Rio Grande do Sul. Votou o
Presidente.
Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotti. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Moreira Alves, Néri da Silveira, Sydney
Saches, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Venoso, Marco Aurélio e limar Gaivão. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Francisco Rezek. Procurador-Geral da República, Dr.
Aristides Junqueira Alvarenga
Brasília, 8 de setembro de 1993 —Luiz
Tominatsu, Secretário.
60
— 150
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N° 900 — DF
(Questão de Ordem)
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Sydney Sanches
Requerente: Associação Brasileira dos Inquilinos — Requeridos: Presidente
da República e Congresso Nacional
Ação direta de inconstitucionalidade. Legitimidade ativa.
Associação Brasileira de Inquilinos (art. 103, IX, da Constituição Federal).
Uma associação de inquilinos — reunindo pessoas ligadas,
apenas, pelo interesse contingente de estarem na mesma posição jurídica
de partes, em relações distintas de contratos de locação, mas sem integrar
a mesma categoria econômica ou profissional —não é entidade de classe,
legitimada à propositura de ação direta de inconstitucionalidade, prevista no art. 103, IX, da Constituição Federal.
Ação não conhecida, por ilegitimidade ativa «ad causam».
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos,
resolvendo questão de ordem proposta pelo
Relator, em não conhecer da ação por falta
de legitimidade ativa da requerente.
Brasília, 23 de setembro de 1993 —
Octavio Gallotti, Presidente — Sydney
Sanches, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Sydney Sanches (Relato* 1. Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade dos artigos 77 e 78, parágrafo
único, da Lei n° 8.245, de 18-10-1991, proposta pela Associação Brasileira de Inquilinos, com base no art. 103, inc. IX, da
Constituição Federal, sob alegação de que
tais dispositivos ofendem o inc. XXXVI do
art. 5° da Constituição Federal, segundo o
qual «a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada».
2. À fl. 6, como relator, determinei à
Autora que juntasse procuração outorgada
ao advogado signatário da inicial e comprovasse o teor de seu estatuto, bem como o
respectivo registro no cartório competente,
o que foi feito às fls. 10/24.
Determinei, ainda, à fl. 25, que a
Autora apresentasse a relação de seus associados, com indicação, inclusive, de residência e domicilio, não tendo sido cumprido o despacho.
Trago, então, os autos à consideração
do Eg. Tribunal para o exame de questão
de ordem, relacionada com a legitimação para a propositura da ação (art. 21, inc.
BI, do RISTF).
É o relatório.
VOTO (QUESTÃO DE ORDEM)
O Sr. Ministro Sydney Sanches (Relator): 1. A autora é uma «sociedade civil,
sem fms lucrativos», com sede na cidade
do Rio de Janeiro (art. 2° do estatuto, fl. 14).
O art. 1° aponta como sua área de atuação «todo o território brasileiro» (fl. 14).
Pode filiar-se a ela quem «comprovar,
mediante contrato, a condição de inquilino» (art. 9°, inc. II, fl. 15).
R.TJ —150
Como constou do relatório, havendo
o Relatar determinado que a autora apresentasse a relação de seus associados, com
indicação, inclusive, de residência e domicílio, não cumpriu ela o despacho.
Ora, inquilino ou locatário é uma das
partes da relação jurídica contratual de locação.
O inquilino ou locatário, enquanto tal,
não integra uma classe, no sentido de categoria profissional ou econômica E este é o
significado que se deve atribuir ao vocábulo classe, empregado no inc. IX do art. 103
da Constituição Federal.
Matada mutandis, é de ser lembrado precedente na ADIn n° 034, de que foi
Relator o eminente Ministro Octavio Gallotti (RTJ 128/481, julgada em 5-4-1989):
«Requerente: Associação dos Empregados da CAEEB — ASEC — Requerido: Presidente da República
Ação direta de inconstitucionalidade.
Não se caracteriza, como «entidade de classe», a conferir legitimidade
para a propositura de ação direta de inconstitucionalidade, nos termos do art.
103, IX, da Constituição, a simples associação de empregados de determinada empresa, por não congregar uma categoria de pessoas intrinsecamente distinta das danais, mas somente agrupadas peio interesse contingente de estarem a serviço de determinado empregador.
Processo extinto, por ilegitimidade
de pane, sem julgamento de mérito.»
Observo que os inquilinos também
não congregam uma categoria de pessoas,
intrinsecamente distinta das demais categorias e somente se agrupam pelo interesse
contingente de estarem na mesma posição
jurídica de partes, em relações distintas de
contratos de locação.
61
De sorte que uma associação de inquilinos não é, propriamente, uma entidade de
classe, para os efeitos do art. 103, IX, da
Constituição Federal.
Aliás, na Aia n° 501, Relator o
eminente Ministro Moreira Alves, uma entidade que congrega aposentados e pensionistas, de diversas categorias profissionais,
não foi considerada como «entidade de
classe» (RTJ 136/1061, julgada em 15-51991).
Já na ADIn n° 42, Relator o eminente
Ministro Paulo Brossard, exigiu o Tribunal, para efeito de caracterização de uma
entidade de classe, a «unidade, em caráter
permanente, de interesse daqueles que empreendem atividade profissional idêntica» (DJ, 2-4-1993, n° 63, pág. 5611).
Por outro lado, a CUT e a CGT também não fixam consideradas entidades de
classe, para os efeitos do art. 103, IX, da
Constituição Federal, por reuniram trabalhadores das mais diversas categorias e não
de uma só (ADIn n° 271, Relator Ministro
Moreira Alves; ADIn n° 335, Relator Ministro Néri da Silveira; ADIn n° 334, Relatar Ministro Moreira Alves; ADIn n° 928,
Relator Ministro Sydney Sanches).
Por todas essas razões, a Associação
Brasileira dos Inquilinos, também não pode
ser considerada uma entidade de classe,
para os efeitos do art. 103, IX, da Constituição Federal, faltando-lhe legitimidade
para a propositura da ação, já por essa razão.
Mesmo, porém, que os inquilinos
pudessem ser considerados como integrantes de uma «classe», para os efeitos do inc.
IX do art. 103 da Constituição Federal, nem
por isso teria a autora legitimidade para a
propositura da ação.
É que não basta haver apontado, no estatuto, como área de sua atuação, todo o
território brasileiro.
62
R.T.J. —150
Toma-se indispensável a prova de que
se trata de uma entidade de âmbito efetivamente nacional.
Nesse sentido, podem ser invocados,
mutatis mutandis, os seguintes precedentes:
r RTJ 136/479:
ação Direta de Inconstitucionalidade n° 386-SP
(Medida Liminar)
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Sydney Sanches
Requerente: Associação Brasileira das
Indústrias de Sucos Cítricos — ABRASSUCOS — Requerida Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo.
Ação Direta de Inconstitucionalidade. Legitimidade ativa. Entidade de classe
de âmbito nacional (art. 103, IX, da
Constituição Federal).
Não é entidade de classe de âmbito
nacional, para os efeitos do inciso IX
do art. 103 da Constituição, a que reúne empresas sediadas no mesmo Estado, nem a que congrega outras de
apenas quatro Estados da Federação.
Ação não conhecida, por ilegitimidade ativa ad causam».
(Nesse precedente ficou ressaltado
pelo Relator e condutor do acórdão:
<Tara que a entidade de classe tenha
âmbito nacional, não basta que o declare
em seus estatutos. É preciso que esse
âmbito se configure de modo inequívoco» (RTJ 136/485, item 3). E no voto do
Ministro Moreira Alves foi salientado
que o âmbito nacional pode ser reconhecido, se houver filiados em pelo menos
nove Estados da Federação, àsemelhança do que acontece, por força de lei, com
os Partidos Políticos, para que sejam
considerados de caráter nacional —RTJ
136, pág. 492 —, critério, aliás, que
passou a ser seguido pela Corte, em
outros julgados).
2° RTJ 129/957
ação Direta de Inconstitucionalidade n° 39/RJ
(Questão de Ordem)
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves
Requerente: Sindicato dos Bancos
do Estado do Rio de Janeiro — Requeridos: Governador e Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro.
Ação direta de inconstitucionalidade. Questão de ordem sobre legitimação
para propô-la.
Sindicato de Bancos, que tendo base
territorial em alguns Estados-membros,
só congrega, como associados, os Bancos em funcionamento nesses Estados
que satisfaçam as exigências da legislação sindical, não tem âmbito nacional,
e, portanto, não se enquadra na hipótese
prevista no artigo 103, IX, in fine, da
Constituição.
Julgou-se extinto o processo sem julgamento do mérito, por falta de legitimação ativa.» (julgada em 27-4-1989).
Ora, a Autora tem sede na cidade do
Rio de Janeiro e, embora instada pelo Relator, não apresentou a relação de seus filiados, com indicação do respectivo endereço, de modo a possibilitar a constatação
de que tenha filiados fora do Estado do Rio
de Janeiro e, menos ainda, em nove Estados
da Federação, como tem exigido a referida
jurisprudência do Tribunal, com aplicação
analógica da Lei Orgânica dos Partidos Políticos, que só considera nacionais os que
estejam organizados em pelo menos nove
unidades federativas.
Por todas essas razões, não sendo a
autora, propriamente, uma entidade de
classe, nem comprovando que opere em
âmbito nacional, falta-lhe legitimidade
R.T.J — 150
para a propositura da ação direta de inconstitucionalidade.
Isto posto, resolvendo a questão de ordem, não conheço da ação, por ilegitimidade ativa ad causam.
63
te, já não posso partir para tal presunção, e,
por esse segundo fundamento, concluo pela
carência da ação proposta em face da ilegitimidade.
VOTO (PRELIMINAR)
VOTO (QUESTÃO DE ORDEM)
O Sr. tfro Marco Aurélo: Sr. Presidente, quanto à caracterização dessa associação como uma entidade de classe, o quadro é mais favorável do que aquele revelado nas ações diretas de inconstitucionalidade que envolveram a CUT, a CGT e também a UNE, porque, a meu ver, o que
qualifica urna associação de classe é a existência de interesses comuns aos integrantes. Pouco importa que, na espécie, não
tenhamos, aí, uma categoria, em si, profissional. O que cabe perquirir é se a associação, na verdade, atua em prol de um segmento da sociedade. Não tenho a menor
dúvida de que a Associação Brasileira dos
Inquilinos assim o faz.
Agora, surge o problema alusivo à abrangência. Afitara o nobre Relator que instou
a Associação a comprovar a abrangência
' tano inciso IX do artigo 103 da Carta
previu
de 1988, e que a Requerente quedou silente,
não trazendo aos autos essa comprovação.
Indaga-se: basta, na espécie, a designação,
a nomenclatura da entidade «Associação
Brasileira dos Inquilinos»? Caminharia, de
início, nesse sentido, frente até mesmo ao
princípio da razoabilidade, presumindo o
que normalmente ocorre, o quotidiano, o
ordinário e não o excepcional. Não posso
presumir que uma associação, que se diga
brasileira, não tenha abrangência maior a
ponto de alcançar várias unidades da Federação.
Todavia, diante da postura adotada pelo
Relator e do silêncio da própria Reguem-
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Sr.
Presidente, já não tenho esperanças nesta
geração: mas, quem sabe os nossos sucessores, um dia, darão ao conceito de entidade de classe do art. 103, IX — até hoje
quase só reconhecida à UDR —, um sentido menos «celetista».
Acompanho o eminente Relator, na extensão do voto do eminente Ministro Marco Aurélio, e não conheço da ação.
EXTRATO DA ATA
ADIn 900 (Questão de Ordem) — DF
— ReL: Mn. Sydney Sanches. Reqte.: Associação Brasileira dos Inquilinos (Adv.:
Mário J. Damasceno). Reqdos.: Presidente
da República e Congresso Nacional.
Decisão: Por votação unânime, o Tribunal, resolvendo questão de ordem proposta
pelo Relator, não conheceu da ação por
falta de legitimidade ativa da requerente.
Votou o Presidente.
Presidência do Sr. Ministro Octavio
lotti. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Néri da Silveira, Sydney Sanches, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence, Celso de
Mello, Marco Aurélio, Ilmar Gaivão e Francisco Rezek. Ausentes, justificadamente,
os Srs. Ministros Moreira Alves e Carlos
Venoso. Procurador-Geral da República,
Dr. Aristides Junqueira Alvarenga.
Brasflia, 23 de setembro de 1993 —
Luiz Tomimatsu, Secretário.
R.TJ. —150
64
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N' 928 — DF
(Medida Cautelar)
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Sydney Sanches
Requerente: Confederação Geral dos Trabalhadores —CGT —Requeridos.:
Presidente da República e Congresso Nacional
Ação direta de inconstitudonalidade.
Legitimidade ativa.
Confederação Sindical.
— Confederação Geral dos Trabalhadores — CGT.
Art. 103, IX, da Constituição Federal.
A CGT, embora se autodenomine Confederação Geral dos
Trabalhadores, não é, propriamente, uma Confederação Sindical, pois
não congrega federações de sindicatos que representem a maioria absoluta de um grupo de atividades ou profissões idênticas, similares ou
conexas.
Também não é propriamente, uma entidade de classe, pois
não congrega apenas os integrantes de uma determinada atividade ou
categoria profissional ou econômica.
É, sim, uma Central Geral dos Trabalhadores, ou seja de
todas as categorias de trabalhadores.
Não sendo, assim, uma Confederação Sindical, nem uma
entidade de classe de âmbito nacional, não tem legitimidade para a
propositura de ação direta de inconslitudonalidade (art. 103, IX, da
Constituição Federal).
Precedentes.
Ação não conhecida, por ilegitimidade ativa «ad-causam».
ACÓRDÃO
RELATÓRIO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquignlficas, por maioria de votos, o Tribunal não conheceu da ação, por ilegitimidade ativa da requerente, ficando, em conseqüência prejudicado o requerimento de
medida cautelar, vencidos os Ministros
Marco Aurélio e Sepülveda Pertence, que
dela conheciam.
Brasília, 1° de setembro de 1993 — Ottani° Gallotli, Presidente — Sydney Sanches, Relator.
O Sr. Ministro Sydney Sanches (Relator): 1. Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade do art. 2°, caput, e seu parágrafo 2', da Emenda Constitucional 3, de
17-3-1993, e da Lei Complementar n° 77,
de 13-7-93, proposta pela Confederação
Geral dos Trabalhadores — CGT, com
base nos artigos 103, IX, e 102, 1, a e p, da
Constituição Federal.
e
2. Na inicial, alega e pleiteia a autora o
seguinte (fls. 2/20):
«Ação Direta de Inconstitudonalidade com Pedido de Liminar
R.T.J - 150
No que concerne ao art. 2°, capei, e
respectivo parágrafo 2°, da Emenda à
Constituição n° 3/93, promulgada em 17
de março de 1993, e à Lei Complementar e 77, sancionada em 13-7-93, por
ofensa aos preceitos constitucionais insculpidos nos arts. caput, 145, parágrafo 1° 150, inciso IV, e, em especial
com viola
ção dos princípios da anualidade (art. 165, parágrafo 2°), e da anterioridade (art. 150,111, letra b), em combinação com o art. 60, parágrafo 4°, IV,
que veda a deliberação congressual acerca de proposições legislativas que contrariem as limitações constitucionalmente impostas ao poder constituinte
derivado.
A tramitado da emenda n' 393
1. Em 9-12-92, foi aprovado pela
Comissão Especial constituída para os
fina do art. 202, parágrafo 2°, do Regimento Interno da Câmara dos Deputados o parecer do Relator designado para
apreciar proposta de emenda à Constituição (n° 48/91), favorecendo substitutivo que, apar de prever nova incidência tributária sobre movimentação financeira, o fez com total descaso pelos
direitos e garantias individuais constitucionalmente assegurados pelos arts. 5°,
caput, e inciso LV, 145, parágrafo 1°.
150, inciso IV, da Constituição Federal.
A matéria, em que pese a manifesta
violação à norma limitadora do poder
constituinte derivado, foi levada ao Plenário da Câmara dos Deputados, onde
contou com a aprovação por maioria
qualificada, em dois turnos, nas sessões
realizadas em 21-1-93 e 2-2-93, a desfruta:ira:acido pronunciamento de parcomo o Deputado José Maria Eymael denunciando a grave ofensa
aos postulados do Estado de Direito.
Posteriormente, no âmbito do Senado Federal, foi a proposta de emenda
igualmente aprovada em dois tomos, nas
sessões de 18-2-93 e 10-3-93 apesar das
65
advertências feitas por parlamentares de
distintos partidos políticos como o Senador Bisol que qualificou a emenda de
verdadeiro ato institucional, e pelo SenadorJosaphat Marinho que ressaltou
a ameaça às liberdades democráticas
contida na deliberação então aprovada
(cf. doc. fls.).
2. A redação do substitutivo cuja tramitado legislativa iniciara-se na Câmara dos Deputados, em 9-12-92, que
acabou por ser aprovado em ambas as
Casas do Congresso Nacional e promulgado pelas Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal em 17-3-93,
a par de violar implicitamente preceitos
constitucionais diversos que abrigam
direitos e garantias do cidadão em geral
e do contribuinte em particular (arts. 5°,
capei, e inciso LV, 145, parág. 1°, 150,
inciso IV), contempla disposição que
pretende abolir de forma expressa garantia constitucionalmente assegurada
aos contribuintes, verbis:
Art. 2° - A União poderá instituir, nos termos da lei complementar,
com vigência até 31 de dezembro de
1994, imposto sobre movimentação
ou transmissão de valores e de créditos e de direitos de natureza financeira
Parágrafo 2° - Ao imposto de
que trata este artigo não se aplica o
art. 150, 111, b, e IV, nem o disposto
no parágrafo 5° do art. 153 da Constituição.
Tais disposições configuram ofensa
expressa ao dispositivo inserto no art.
CO, parágrafo 4°, IV, da Lei Maior, razão
pela qual são fulminadas de inconstitucionalidade.
A Lei Complementar n° 77/93, sancionada em 13-7-93, ao instituir o tributo de que trata o art. 2°, caput, da malsinada Emenda n° 3/93, encontra-se igual-
66
R.TJ. 150
mente inquinada de vício insanável,
mormente ao pretender iniciar a cobrança no presente exercício (art. 28).
Do Direito
Do Regime Constitucional das Garantias Individuais
Dispõe a Constituição do Brasil,
no seu artigo 1°, constituir-se a República Federativa do Brasil em Estado Democrático de Direito.
É objetivo fundamental daRepública
construir uma sociedade livre, justa e
solidária (art. 3°, I, da Constituição).
O surgimento das Constituições está
vinculado às garantias fundamentais
dos cidadãos contra o arbítrio e a surpresa na exigência de tributos.
A Carta Magna, o BID of wrights, a
Pelition of wrights são momentos marcantes da elaboração institucional dessas garantias.
Para que possam prevalecer os princípios fundamentais do Estado de Direito afirmou a Constituição brasileira a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade e instituiu garantias a esses
direitos.
Multiplicam-se as garantias, desde as
77 figuras do art. 5°, no Título II, da
Constituição.
O parágrafo 2° do artigo 5° ilumina a
significação dos direitos e garantias constitucionais, verbis:
«Parágrafo 2° — Os direitos e garantias expressos nesta Constituição
não excluem outros decorrentes do
regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais
em que a República Federativa do
Brasil seja parte.»
Dentre as garantias constitucionais, assinalam-se aquelas que, na linha
herdada da evolução das Constituições
britânicas, desde João sem Terra, garan-
tem os contribuintes contra o excesso e
surpresas na imposição de tributos.
Foi com esse objetivo que, ressalvando expressamente quaisquer outras garantias asseguradas ao contribuinte, dispôs seu inciso III, letra b, o art. 150, da
Constituição do Brasil:
Art. 150 — Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
11I — cobrar tributos:
b) no mesmo exercício fmanceiro
em que haja sido publicada a lei que
os instituiu ou aumentou.»
Essa norma consagra, em nosso país, o
princípio a que os constitucionalistas e tributadstas, em todo o mundo, denominam
«princípio da anterioridade»: para que
possa ser cobrado tributo, em um exercício, deve alei que o instituiu ou aumentou ter sido publicada em ano anterior.
Essa garantia, contra a tributação
apressada e não fundada em planejamento maduro, é fundamental à segurança econômica dos cidadãos: torna-se
inviável a atividade econômica e racional, se está submetida a surpresa de alteraçô«s tributárias de efeito imediato.
A par desta, a Constituição Federal
de 1988 cuidou igualmente, na melhor
tradição de nosso Direito, do princípio
da anualidade, que veda a cobrança de
tributos que não se encontrem previstos
na lei orçamentária. Com efeito, o art.
165, parágrafo 2°, da Constituição Federal, exige que a lei de diretrizes orçamentárias disponha sobre as alterações
na legislação tributária, tendo o Plenário
do Tribunal de Justiça do Estado da
Bahia se pronunciado claramente quanto à ilegalidade da cobrança de tributos
R.TJ —150
não previstos na lei orçamentária, (cf.
Acórdão às fls.).
O princípio em questão assegura ao
contribuinte que este não será surpreendido por normas impositivas cujo conhecimento prévio poderia tê-lo feito
agir diferentemente. É o princípio da
previsibilidade da ação estatal a que se
refere o festejado Mestre Geraldo AtaOba, traduzindo o postulado da «certeza
pronta e definitiva sobre a quantia da
dívida tributária» (O Princípio da Irretroatividade das Leis em Matéria Tributária, in Resenha ABDF n° 7, pág. 58).
Ademais deste, a Constituição Federal cuidou de proteger o cidadão em
geral e o contribuinte de impostos, em
particular, em diversas outras disposições que buscam delimitar o poder de
tributar, por parte do Estado, através de
um conjunto de regras que se convencionou chamar de Estatuto do Contribuinte.
Assim é que, no art. 5', captai, reconheceu a Constituição Federal o princípio da igualdade de todos perante a lei.
Tal princípio se traduz em tratar igualmente os iguais, e desigualmente os desiguais, como já manifestado de forma
lúcida e contundente por nossos Tribunais.
A tributação do trabalhador brasileiro, cujos legítimos interesses são representados por esta Confederação Geral
dos Trabalhadores — CGT, constitui,
com efeito, grave ofensa ao princípio da
isonomia, mormente ao considerar que
o poder constituinte originário previu,
no conjunto de incidências elencadas no
capítulo constitucional acerca do Sistema Tributário Nacional, impostos que
sequer foram instituídos pelo legislador
ordinário, que preferiu usurpar, através
do poder constituinte, exercendo-o ao
arrepio da vedação constitucional para
criar novo tributo.
67
Assim é que o imposto sobre grandes
Ramas previsto constitucionalmente no
art. 153, VII, cuja instituição chegou a
ser proposta perante o Congresso Nacional pelo atual Ministro da Fazenda,
o então Senador Fernando Henrique
Cardoso, remanesce letra morta até o
presente, optando o Congresso Nacional
por gravar tributariamente, ainda esta
vez, o sofrido trabalhador brasileiro.
É para pôr cobro a esta grave iniqüidade que a CGT move a presente ação.
Também, os arts. 145, parágrafo 1°,
e 150, inciso IV, da Lei Maior, ao estabelecerem o princípio da progressividade dos tributos, tendo em vista a capacidade econômica dos contribuintes, e o
princípio do não confisco, criam, igualmente, exercício da atividade econômica, protegendo o indivíduo contra os
abusos do poder constituído.
De resto, o sistema constitucional brasileiro, em matéria tributária constitui
um sistema fechado, com previsão expressa de cada um dos impostos de competência da União, dos Estados e Municípios, ressalvada à União, a competência residual, cujo exercício pressupõe a
instituição de imposto obrigatoriamente
de caráter não cumulativo (art. 154,1, da
CF).
Ora, se foi por desejo expresso do
poder constituinte originário que se vedou a instituição de novos impostos de
caráter não cumulativo, não há como pretender quebrar tal sistemática por meio
de emenda aprovada pelo poder derivado, sem ofender a disposição contida no
art. 60, parágrafo 4°, IV, da Carta Magna.
Da intangibilidade das Garantias
Individuais no Sistema Constitucional Vigente
5.0 legislador constituinte de 1988
insculpiu dentre as proibições de natureza material às modificações ulterio-
68
R.TJ. — 150
do texto constitucional as normas
atinentes aos direitos e garantias individuais (art. 60, parágrafo 4°, IV).
«Artigo 60 — A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:
Ao fazê-lo, tomou nulas as deliberações congressuais relacionadas com
emendas à Constituição na parte em que
abolissem tais direitos.
Parágrafo 4° —Não será objeto de
deliberação a proposta de emenda
tendente a abolir:
tas
Importa, a este ponto, traçar a distinção entre o exercício do poder constituinte originário e aquele poder derivado que exerce o Congresso Nacional.
Distinguindo entre as duas figuras,
com o brilho sempre presente em seus
votos, o eminente Ministro Celso de
Meio delineou nitidamente contornos
de exigência da constitucionalidade:
«O Congresso Nacional, no exercício de sua atividade constituinte
derivada e no desempenho de sua
função reformadora, está juridicamente subordinado à decisão do poder constituinte originário que, a par
de restrições de ordem circunstancial, inibitória do poder reformador
(CF, art. 60, parágrafo 11, identificou, em nosso sistema constitucional, um núcleo temático intangível e
imune à ação revisora da instituição
parlamentar.
As limitações materiais explícitas, definidas no parágrafo 4° do art.
60 da Constituição da República, incidem diretamente sobre o poder de
reforma conferido ao Poder Legislativo da União, inibindo-lhe o exercício nos pontos ali discriminados. A
irreformabilidade desse núcleo temático, acaso desrespeitada, pode
legitimar o controle normativo
abstrato, e mesmo a fiscalização jurisdicional concreta, de constituemnalidade» (ADIn 466-2).
6. De fato, dispõe o artigo 60 da
Constituição, em seu parágrafo 4°, IV:
IV — os direitos e garantias individuais.»
Emenda tendente a abolir direitos e
garantias individuais não pode ser objeto de deliberação.
Não cuida, esse dispositivo constitucional, da evidente necessidade de que
obedeçam à Lei Maior todas as deliberações.
São mais enérgicas as disposições
daquele inciso IV: nunca poderia o Congresso Nacional, nunca poderia qualquer de suas Casas, deliberar sequer
sobre a emenda que tendesse a abolir
direito ou garantia individual.
Nem se poderia distinguir entre o conjunto dos direitos, o conjunto das garantias, e uma detenninada garantia ou um
determinado direito em particular.
O sistema de disposições constitucionais que tutela as garantias e direitos
dos cidadãos e, em matéria tributária,
especialmente os dos contribuintes, seria ferido se se tomasse objeto de deliberação medida que visasse a abolir
determinada garantia.
Nesse sentido, tem concluído esta E.
Corte Suprema, como decorre do citado
voto da lavra do Ministro Celso de Mello, que deslinda o tema coto sua habitual
clareza:
«Emendas à Constituição — que
não são normas constitucionais originárias — podem, assim, incidir,
elas próprias, no vício da inconstitucionalidade, configurado pela inobservância de limitações jurídicas
R.TJ — 150
superiormente estabelecidas no texto
constitucional por deliberação do órgão exercente das funções constituintes primárias ou originárias,
como tem reconhecido a doutrina,
expressa no magistério de Otto Bacho?, «Normas Constitucionais Inconstitucionais?», págs.52/54,1977 ,
Atlântica Editora, Coimbra; Jorge
Miranda, «Manual de Direito Constitucional», tomo II/287-294, item n°
72, 2' ed., 1988, Coimbra Editora;
Maria Helena Dinis, «Norma Constitucional e seus efeitos», pág. 97,
1989, Saraiva; J. J. Gomes Canonlho, «Direito Constitucional», págs.
756-758, 4' ed., 1987, Almedina;
José Afonso da Silva, «Curso de
Direito Constitucional Positivo»,
págs. 5W60, 5' ed., 1989, RT, entre
outros» (ADIn 466-2, às fls.).
7. Nem se poderia negar validade a
essa garantia constitucional, pela circunstância de que alguns tributos foram
dela excluídos.
É cariai que as exceções a este direito
e garantia individual do contribuinte só
poderiam ser estatuídas pelo poder constituinte originário, como efetivamente o
foram no artigo 150, parágrafo 1°, da
Carta em vigor.
Não pode o poder constituinte derivado instituir novas exceções não originariamente previstas —estas são numeras dausus.
O princípio prevalece, salvo as exceções que o poder originário instituiu.
Assim em relação aos demais direitos e
garantias individuais, que não os de natureza tributária.
Com efeito, a exceção ao princípio da
intangibilidade do direito adquirido (art.
5°, XXXVI, da Constituição Federal),
só se sustenta quando abrigada no texto
constitucional originário (art. 17 do
ADCT), não podendo, em nenhuma hipótese, ser excepcionada por meio de
69
emenda à Constituição, como de resto,
reconheceu a Câmara dos Deputados ao
acolher o pronunciamento do Impetrante suprimindo o ert. 9'' da proposta de
emenda em questão que visava excluir
indevidamente direito adquirido (fls.
usque).
Nesse sentido, a lição, entre tantos
outros, de Michel Temer:
«Evidentemente, se uma emenda constitucional trouxer modificação, por exemplo, do sistema tributário, vulnerando princípios, ou
em desobediência à forma determinada para sua produção, não se admite sua introdução na Constituição. Se vier a introduzir-se é passível
de declaração de inconstitucionalidade.» (Grifamos) («Elementos de Direito Constituciamb., Malheiros Editores, 9° ed., 1992, pág. 135).
Ao visar à supressão de garantia
constitucional assegurada ao cidadão no
art. 150,M, b, da Constituição Federal,
para fins da incidência que a emenda à
Constituição instituiu no caput do art.
2°, defronta-se o legislador dotado de
poderes constituintes derivados com óbice intransponível, contido no art. 60,
parágrafo 4°, inciso IV da Constituição
Federal.
Admitir que a União, no exercício de
sua competência residual, ainda que por
emenda constitucional, pudesse excepcionar a aplicação desta garantia individual do contribuinte, implica em conceder ao ente tributante poder que o constituinte expressamente lhe subtraiu ao
vedar a deliberação de proposta de emenda à constituição tendende a abolir os
direitos e garantias individuais constitucionalmente assegurados.
Além de afrontar a Constituição
instituindo um imposto cuja cobrança
não se sujeitaria à anterioridade, com
violação expressa da norma contida no
art. 60, parágrafo 4°, inciso IV, da Coes-
70
R.T.J. —150
tituição Federal, a promulgação da
Emenda n° 3/93, acompanhada da Lei
Complementar n° 77/93 acarreta implícita violação às disposições contidas no
art. 5°, caput e inciso 145, parágrafo 1°,
e 150, inciso IV, da Lei Maior.
Do pedido liminar.
Face à demonstrada incompatibilidade da Emenda Constitucional n° 3, de
1993, no seu art. 2°, caput, e respectivo
parág. 2°, por evidente desrespeito à disposição contida no art. 60, parágrafo 4°,
IV, da Constituição, e tendo em vista a
iminência da cobrança do tributo prevista na Lei Complementar n° 77/93 para
iniciar-se a partir desta data, 26-8-93,
requer a Autora a concessão de medida
liminar, mediante a suspendo da eficácia da Emenda Constitucional n° 3, de
1993, em seu art. ?, bem como a decorrente suspensão da eficácia das disposições contidas na Lei Complementar n°
77/93, de modo a evitar, assim, que se
empreenda a supressão de garantia individual assegurada pela nastituição Federal, como exposto anteriormente, com
a possibilidade de grave e irreparável
lesão.
Neste sentido, a 2° Seção do Tribunal
Regional Federal da ?Região concedeu
liminar, nos termos do voto da Juíza
Relatora Diva Malerbi, do qual cabem
ressaltar os trechos abaixo, pela excepcional, ainda que habitual, lucidez de
seus fundamentos, verbis:
«A razoabilidade da tese se sustenta no fato de a doutrina e a jurisprudência pátrias reconhecerem, sob
a denominação de estatuto do contribuinte, todos os desdobramentos que
mereceram, no capitulo do sistema
tributário, os direitos e garantias individuais, notadamente aqueles decorrentes dos princípios da igualdade
e da legalidade, por serem estes os
disciplinadores das relações jurídicas entre Estados e particulares, re-
tratando não só a certeza do direito
como a segurança de que a ação estatal de tributar seguirá o devido processo legal, este constitucionalmente
pré-definido.
«O princípio da anterioridade encontra raízes imediatas na certeza e
segurança das relações entre Estado
e contribuinte, traduzindo-se na garantia individual do conhecimento
prévio das leis que irão instituir ou
agravar as prestações tributárias no
exercício financeiro seguinte, e, ainda, na garantia individual de que, durante esse mesmo lapso de tempo,
nem mesmo as leis em vigor poderão
cobrar eficácia sobre as atividades
econômicas dos particulares.
«Por isso mesmo, costuma-se afirmar, o núcleo essencial da garantia
individual da irretroatividade, em
matéria tributária, é qualificado, redobrado, pois a Constituição determina — e o princípio da anterioridade predica — que a lei tributária eficaz sempre será aquela que estiver
em vigor até o último dia do ano
anterior àquele em que se iniciarem
os fatos geradores das obrigações tributárias.
«A tese da inconstitucionalidade
da lei de emenda se sustenta porque,
embora se entenda que, em geral, os
limites materiais do poder reformador se refiram sempre a princípios,
independentemente das manifestações concretas que recebam expressão no texto constitucional, parece
indisputável, hoje, que o mesmo não
se passa com os direitos e garantias
individuais. É entendimento dominante que o núcleo essencial dos direitos e garantias individuais é aquele
definido pelo constituinte e que mesmo o sistema geral do regime do seu
exercício e as suas formas de proteção devem ser considerados como
R.TJ —150
incluídos na garantia material que a
Constituição consagra na cláusula
pétrea. Nesse sentido, aliás, a disposição do parágrafo 2° do artigo 5°, de
que os direitos e garantias expressos
na Constituição não excluem outros
decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados ou, ainda, a da
cabeça do artigo 150 que, ao tratar
das limitações ao poder de tributar,
ali afirma que as garantias deduzidas
não excluem outras garantias igualmente asseguradas aos contribuintes.
«Sob a égide da Constituição de
1988 predomina o entendimento de
que exceções ao princípio da anterioridade são apenas e tão-somente
aquelas previstas pelo constituinte de
1988, por constituir garantia individual em proteção de certeza do direito e segurança nas relações jurídicas.
«As regras estatuidoras de limites
ao poder de emendar se afiguram,
assim, no direito vigente, como 'superconstitucionais' , por atestarem a
superioridade do poder constituinte
originário e, por isso, sua violação,
mesmo em se tratando de legislador de
emenda, deve ser tida como incidindo
sobre a própria garantia da Constituição de 1988» (doc. fls.).
Caso julgada excessiva a amplitude
da liminar ora requerida, reitera, desde
logo, a Autora o pedido a este respeito,
requerendo que seja, neste caso, deferida liminar, tão-somente, para suspender
a eficácia da Emenda n° 3/93 e da Lei
Complementar n° 77/93 no trecho em
que excluem a aplicação do art. 150, IR,
b, da Constituição Federal, para fins de
incidência do IPMF (art. 2°, parágrafo
2°, da Emenda e art. 28 da Lei Complementar), como tem ocorrido em diversas
impetrações levadas a efeito contra a
incidência inquinada de inconstitucionandaia (cf. docs. fls.).
71
Requer, outrossim, a citação dos Presidentes das Mesas do Senado Federal e
da Câmara dos Deputados, do Procurador-Geral da República e do AdvogadoGeral da União para a defesa dos dispositivos impugnados.
Requer fmalmente seja declarada definitivamente a inconstitucionalidade do
art. 2°, caput, e respectivo parágrafo 2°,
da Emenda Constitucional n° 3/93, bem
como da Lei Complementar n° 77/93,
por contrários às disposições dos arts.
5°, caput, 145, parágrafo 1°, 150, III, b,
e IV, 165, parágrafo 2°, todos da Constituição Federal.
Termos em que,
Pede deferimento.
Brasília, 26 de agosto de 1993.
Ass.: André Martins de Andrade
OAB/DF n° 1.103 — A».
A inicial veio instruída com os documentos de fls. 21/83.
Havendo requerimento de medida cautelar, trago os autos à consideração do Eg.
Plenário (art. 170, parágrafo 1°, do RISTF).
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Sydney Sanches (Relatar): 1.0 Eg. Plenário, em data de 24-91992, por maioria de votos, vencidos os
Ministros Sepúlveda Pertence e Marco Aurélio, não tomou conhecimento da ADIn n°
271, proposta pela Central única dos Trabalhadores — CUT, e de que foi Relator o
Ministro Moreira Alves, ficando a essência
do julgado assim expressa na ementa:
«Ação direta de inconstitucionalidade. Central única dos Trabalhadores
(CUT). Falta de legitimação ativa.
— Sendo a autora constituída por
pessoas jurídicas de natureza vária, e
que representam categorias profissionais
diversas, não se enquadra ela, na expressão «entidade de classe de âmbito nacional», a que alude o artigo 103 da Constituição, contrapondo-se às confedera-
72
R.TJ. — 150
ções sindicais, porquanto não é uma entidade que congregue os integrantes de
uma determinada atividade ou categoria
profissional ou econômica, e que, portanto, represente, em âmbito nacional,
uma classe.
— Por outro lado, não é a autora —
e nem ela própria se enquadra nesta
qualificação — uma confederação sindical, tipo de associação sindical de grau
superior devidamente previsto em lei
(CLT artigos 533 e 535), o qual ocupa o
cimo da hierarquia de nossa estrutura
sindical e ao qual inequivocamente alude a primeira parte do inciso IX do artigo 103 da Constituição.
Ação direta de inconstitucionalidade
que não se conhece por falta de legitimação da autora.»
Na mesma data (24-9-1992), o Eg.
Plenário, também por maioria de votos,
vencido o Ministro Marco Aurélio, não
tomou conhecimento da ADIn n° 335, proposta igualmente pela CUT, por considerála, ainda uma vez, parte ilegítima para a
ação.
Foi Relator o eminente Ministro Néri da
Silveira.
Eis a ementa desse julgado:
«Ação Direta de Inconstitucionalidade. Central Única dos Trabalhadores —
CUT. Na ADIn n° 271, o Plenário do
STF, decidiu que a entidade em referência não possui legitimidade ativa à demanda de inconstitucknalidade, ut, art.
103, inciso IX, da Constituição. À vista
do precedente, não se conhece da ação,
prejudicado o pedido de cautelar» (DJU
de 2-4-1993, pág. 5612, Ementário n°
1.698-02).
E na sessão de hoje, em julgamento
que precedeu, imediatamente, a este, o Eg.
Plenário, por maioria, não conheceu da
ADIn n° 334, por ilegitimidade ativa da
Confederação Nacional dos Trabalhadores
—CGT, que é também a autora da presente
ADIn n° 928, de que sou agora o Relator.
4.O voto do eminente Ministro Moreira
Alves, Relator e condutor do acórdão na
ADIn n° 334, proposta pela CGT, assim se
deduziu:
«Voto
O Sr. Ministro Moreira Alves (Rektor):
1. Há, na espécie, que se examinar,
preliminarmente, a questão da legitimação da autora.
Corno se vê do disposto no parágrafo
único do artigo 23 dos seus estatutos,
podem a ela filiar-se as seguintes pessoas jurídicas:
'a) Sindicatos;
Federações;
Confederações;
d) Associações Profissionais, associações pré-sindicais, associações
de categorias impedidas de sindicalização, e associações de funcionários
e servidores públicos de âmbito municipal, estadual e nacional, desde
que não implique em dupla representação'.
À autora, no tocante à sua legitimação ativa, aplicam-se as considerações
que fiz no voto que proferi, na Ação
Direta de Inconstitacionalidade n° 271,
sobre a mesma questão referente à Central Única dos Trabalhadores, e que são
estas:
'0 Sr. Ministro Moreira Alves (Relato*
1. No caso, há que se examinar, preliminarmente, a questão da legitimação
da autora, que se qualifica como entidade de classe de âmbito nacional.
Ora, do exame de seus estatutos verificando-se que, pelo artigo 1°, é ela
uma entidade civil que pode congregar
um número ilimitado de pessoas jurídi-
R.TJ —150
cas, que, em face do artigo 34, são as
seguintes:
sindicatos;
associações profissionais por ramo
de trabalho, associações pré-sindicais,
associações de categorias sem sindicatos, não podendo existir dupla representação;
federações; e
confederações.'
Como se vê, trata-se, em verdade de
pessoa jurídica que é constituída por
ages sindicais ou não (assim, associações profissionais, associações pré-sindicais e associações de categorias sem
sindicatos) representativos de quaisquer
categorias profissionais de trabalhadores, uma vez que visa a representar os
trabalhadores em geral, consoante o disposto no artigo 10 de seus Estatutos, o
qual reza:
'Todos os setores da classe trabalhadora devem estar tepeesentados na CUT
levando-se em consideração o seu peso
no conjunto produtivo, sua importância
estratégica e sua capacidade de luta já
demonstrada. Toda a representáção deve
smescolhidadentrodeumprocessolivre
e democrático'.
Sendo constituída por pessoas jurídicas de natureza vária, e que representam
categorias profissionais diversas, não se
enquadra ela na expressão 'entidade de
classe de âmbito nacional', a que alude
o artigo 103 da Constituição, contrapondo-a às confederações sindicais, porquanto não é urna entidade que congregue os
integrantes de uma determinada atividade ou categoria profissional ou econômica, e que, portanto, represente, em
âmbito nacional uma classe, em contaposição às confederações sindicais — a
que também se refere a Constituição
Federal — que, além de atuarem na esfera nacional, como associações sindicais que se encontram no topo da hierar-
73
quia sindical, congregam, pelas federações que as constituem, a representação
de atividades ou categorias profissionais ou econômicas diversas, diferentemente, aliás do que ocorre com os sindicatos e as federações sindicais (aqueles representando cada um u'a mesma
categoria, e estas congregando sindicatos que representem a maioria absoluta
de um grupo de atividade ou profissões
idênticas, similares ou conexas).
Por outro lado, não é a Central única
dos Trabalhadores — e nem ela própria
se enquadra nesta qualificação — uma
confederação sindical, tipo de associação sindical de grau superior devidamente previsto em lei (C12 artigos 533
e 535), o qual ocupa o cimo da hierarquia de nossa estmtura sindical e ao qual
inequivocamente alude a primeira parte
do inciso IX do artigo 103 da Constituição.
Centrais, como a Central Única dos
Trabalhadores, são organismos de coordenação de entidades sindicais ou não
de atividades ou de categorias profissionais diversas, que não integram a hierarquia das associações sindicais, e que
têm sido admitidas em nosso sistema
jurídico por considerações sintetizadas
na Portaria 125, de 3-4-1963, do /vfinistério do Trabalho, e que continuam
válidas em face da atual Constituição: a
liberdade de associação constitucionalmente garantida e 'que a CLT não proíbe nem poderia proibir, em face de mandamento constitucional, a assistência de
organismos de coordenação entre as entidades sindicais, para o trato de problemas que não se limitam pela competência de cada uma delas em particular
(artigo 511), porque envolvem interesses de todos em geral' (apud Buena
Magno, Organização Sindical Brasileira, 47, pág. 168, Editora Revista
dos Tribunais, São Paulo, 1982).
e
74
RTJ. — 150
Não vingou, em nosso sistema jurídico, a orientação adotada pelo anteprojeto de Código do Trabalho do Prof.
Evaristo de Moraes Filho que transformava as Centrais sindicais em entidades
de cúpula da estrutura hierárquica sindical, corno confederações gerais, consoante o preceituado no artigo 712 do referido anteprojeto: 'As confederações poderão unificar-se em confederação geral
dos empregadores, confederação geral
dos profissionais liberais ou confederação geral dos trabalhadores autônomos'.
Por isso mesmo, além de não serem
elas uma espécie de confederação, podem
as centrais sindicais multiplicarem-se com
base no princípio da liberdade de associação, o que, aliás, hoje ocorre, com aexistência de algumas centrais de trabalhadores.
A atual Constituição, não só consagrou, no artigo 8°, II, o princípio da
unidade sindical, vedando a criação de
mais de uma organização sindical, em
qualquer grau, representativa de categoria profissional ou econômica na mesma
base territorial, mas também manteve a
hierarquia dos entes sindicais já estabelecida na CLT (sindicatos, federações e
confederações), como deflui claramente
dos artigos 111, parágrafo 2°, e 105, III,
nos quais se outorga o poder de indicar
os nomes dos representantes classistas
para integrarem as listas tríplices para a
escolha de membros do Tribunal Superior do Trabalho às confederações nacionais de trabalhadores ou empregadores, conforme o caso, e, para o mesmo
fim, com relação aos Tribunais Regionais do Trabalho, às federações e aos
sindicatos com base territorial na região.
Não integram, portanto, as centrais
sindicais a pirâmide em que se estrutura
a organização sindical, e em cujo ápice
se encontram as confederações nacionais, a que alude a Constituição no artigo 103, IX, primeira parte.
E — note-se —, ao contrário do que
ocorre com relação à legitimação para
ilupchan o mandado de segurança coletivo, em que o artigo 5°, LXX, b, da
Constituição a confere à organizações
sindicais (o que abarca sindicatos, federações ou confederações, conforme a
vinculação dos membros atingidos pela
ilegalidade) bem como às entidades de
classe (o que mostra que estas são entidadesnão- sindicais), no que diz respeito
à legitimação para propor a ação direta
de inconstitucionalidade não mais se alude, genericamente, a organização sindical, mas apenas a uma espécie dela —
hierarquicamente superior, que é a confederação —, a que não pertence a autora.
Em face do exposto, e por não se
enquadrar a autora em qualquer dos incisos do artigo 103 da Constituição Federal, não tem ela legitimação para propor ação direta de inconstitucionalidade, razão por que não conheço da presente ação.'
Com base na argumentação acima
transcrita, não conheço da presente ação
direta de inconstitucionalidade por falta
de legiffinatio ad causam da autora».
Participei do julgamento das ADIns
n°s 271, 335 e 334, formando a maioria
pelo não conhecimento, por ilegitimidade
ativa da CUT e da CGT.
Valho-me dos fundamentos apresentados pelos integrantes da maioria, nesses
precedentes, para concluir, aqui, no mesmo
sentido.
7. Apenas acrescento que a CGT, embora se autodenomine uma Confederação
Geral dos Trabalhadores, não é, propriamente, uma confederação sindical, pois
não congrega apenas federações de sindicatos que representem a maioria absoluta
de um grupo de atividades ou profissões
idênticas, similares ou conexas.
—150
Também não é a CGT, propriamente, uma entidade de classe, pois não congrega apenas os integrantes de uma determinada atividade ou categoria profissional ou econômica.
Na verdade, é a CGT urna Central
Geral de Trabalhadores, ou seja, de todas
as categorias de trabalhadores. Não é, então, uma Confederação Sindical de uma só
e mesma classe de trabalhadores.
Com efeito, dispõe o art. 8° de seus
estatutos (fl. 30).
«Art. 8° — Podem filiar-se à CGT
todas as organizações de trabalhadores
que estejam de acordo com os princípios, objetivos e condições estabelecidas neste Estatuto.
Parágrafo único. A CGT aceitará [inações individuais de trabalhadores,
de grupos de trabalhadores e de entidades não sindicais de trabalhadoMS,
10. Por todas essas razões e pelo mais
que ficou dito nos votos que compuseram
a maioria, no julgamento das ADIns n°s
271, 335 e 334, não conheço, também, da
presente ADIn n° 928, por ilegitimidade
ativa da autora e, em conseqüência, julgo
prejudicado o requerimento de medida
cautelar.
VOTO (MEDIDA CAUTELAR)
O Sr. hanistro Marco Aurélio: Sr. Presidente, apenas duas palavras sobre a matéria, afunde que não pese qualquer dúvida
quanto ao motivo pelo qual concluí, nos
processos anteriores, envolvendo a Central
Única dos Trabalhadores e a própria Central Geral dos Trabalhadores, pela legitimação para a propositura da ação direta de
inconstitucionalidade.
Sr. Presidente, creio que ninguém desconhece que o sistema sindical brasileiro é
o confederativo; que a organização sindical
faz-se mediante entidades que estão em três
75
e não em quatro patamares: os sindicatos,
as federações e as confederações.
Quando abri a divergência para concluir
pela legitimação da Central Geral dos Trabalhadores e, no processo seguinte, pela
legitimação da Central Única dos Trabalhadores, eu o fiz enquadrando essas entidades
não na primeira parte do último inciso do
artigo 103, da Constituição Federal, mas na
segunda parte. Reconheci o que penso ser
a realidade. Reconheci estar diante de entidades, ou melhor, de associações de classe
de âmbito nacional e aí citei um rol de
diplomas legais que prevêem aparticipação
dessas Centrais Sindicais, como associações de classe, em determinados Conselhos. Mencionei a Lei n° 7.998, de 21 de
janeiro de 1990, que, no artigo 18, cuida da
participação no Conselho Deliberativo do
Fundo de Amparo ao Trabalhador. Fiz alusão à Lei ri' 8213, de 24 de julho de 1991,
em que as Centrais são citadas como integrantes do Conselho Nacional de Previdência Social eme referi, ainda, à Lei n° 8.212,
de 1991, que dispõe sobre a participação
das Centrais no Conselho Nacional de Seguridade Social e no Conselho Gestor do
Cadastro Nacional do Trabalhador. .
Sr. Presidente, mesmo que estivesse —
penso que terei que admitir isso, em face
dos pronunciamentos do Plenário — diante
de uma situação ambígua, quanto à configuração da associação prevista constitucionalmente, teria que caminhar para apostura
que viabilizasse o exercício do direito da
ação. Continuo convencido que as restrições à legitimação para a propositura da
ação direta de inconstitucionalidade estão
contidas na própria Carta e não alcançam
as Centrais que tenho como representantes
dos trabalhadores. Vejo, no âmbito dos trabalhadores, na presença dos trabalhadores,
a existência de uma verdadeira classe.
Mantenho o ponto de vista, como esclarecimento atinente ao fato de também não
enquadrar as Centrais como entidades sindicais.
76
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Venoso: Sr. Presidente, na ADInn° 334 votei pela legitimidade da Central Geral dos Trabalhadores
para propor ação direta de inconstitucionalidade. Quedei-me, entretanto, vencido.
Ressalvando o ponto de vista pessoal,
adiro ao voto do Sr. Ministro Relator.
VOTO
O Sr. Ministro Celso de Mello: A presente causa suscita questão de alto relevo,
referente à pertinência subjetiva das Centrais
Sindicais para o exercício do poder de agir
nas ações diretas de inconstitucionalidade.
Dentre os ativamente legitimados ad causam para o controle concentrado de constitucionalidade de leis e atos normativos
federais e estaduais, encontram-se as Confederações Sindicais, consoante preceitua o
art. 103, IX, da Constituição Federal.
A organização sindical constitui uma
das dimensões em que se projeta, em nosso
sistema jurídico, a liberdade sindical. O
delineamento da estrutura organizacional
das entidades sindicais deriva, essencialmente, da própria Constituição, que impõe
as formas diversas de sua composição.
Manteve-se, desse modo, sem maiores
alterações, no que pertine à organização
sindical, um modelo jurídico heterônomo, que se traduz na submissão das entidades sindicais a tipos estruturahnente hierarquizados, cuja definição resulta de prévia
decisão estatal.
Inobstante a nova Constituição do Brasil haja elastecido os domínios da liberdade
sindical — e isso traduz uma realidade
histórica e jurídico-social de alcance inquestionável —, não se pode desconhecer,
dentro da perspectiva em que se analisa o
fenômeno da organização sindical, que foi
preservada, nesse plano, a sua estrutura
básica, em cujo âmbito se hierarquizam
entidade» de graus diversos.
— 150
Há, pois, uma tipiddade constitucional a ser necessariamente observada no
domínio temático da organização sindical,
que nela permite identificar 3 (três) tipos
insuprimíveis de entidades sindicais: o sindicato, a federação e a confederaçâo.
Amaury Mascaro Nasdmento («Direito
Sindical», pág. 136, 1989, Saraiva), em autorizado magistério, acentua que «A Constituição Federal de 1988 preserva o sistema
confederativo da organização sindical brasileira, mantendo a sua estrutura básica,
que vem desde 1930, com apermissão legal
da criação de entidades sindicais cujas formas são fixadas também pelo legislador, e
que são três, sindicatos, federações e confederações, hierarquicamente dispostas...».
Note-se, portanto, que as centrais sindicais, no contexto normativo referido, parecem constituir entidades institucionalmente estranhas ao sistema confederativo,
inobstante existam Autores ilustres, como
Evaristo de Moraes Filho («Sindicato —
organização e funcionamento», in LTR,
vol. 44(9) — 1065, 1980), Segadas Manna («Instituições de Direito do Trabalho»,
vol. 2/1024, 8' ed., Freitas Bastos) e o próprio Amaury Mascaro Nascimento (op
cit., págs. 141/142), que reconhecem a possibilidade de sua integração jurídica no plano da organização sindical.
Arnaldo Susseldred, ao analisar o tema
das Centrais Sindicais, expendeu magistério irrepreensível, verbis:
«A Constituição de 1988 conservou
a estrutura da organização sindical adotada no Brasil desde 1939 (Lei n° 1.402)
e mantida pela Consolidação das Leis do
Trabalho (CLT — 1943). Daí ter elevado a nível constitucional:
a) o princípio da unicidade de representação sindical, com o que ficou 'vedada a criação de mais de uma
organização sindical, em qualquer
grau, representativa de categoria econômica ou profissional, na mesma
base territorial' (art. 8°, n° II);
RTJ-150
77
b) o 'sistema confederativo de representação sindical' (art. 8°, n° IV).
qualquer grau' da sua estrutura hierárquica.
Destarte, a nova Carta Magna recepcionou, por evidente compatibilidade,
as normas da CLT concernentes à unicidade sindical compulsória e à estruturação do sistema confederativo sindical.
Aliás, o colendo Supremo Tribunal Federal já decidiu que
E as chamadas centrais sindicais
(CUT, CGT e US1)?
'o citado inciso II do art. 8° da
Constituição estabelece o princípio
da unicidade sindical em qualquer
grau, ou seja, no plano dos sindicatos, das federações e das confederações. Representa, assim, uma limitação à liberdade de organização de
confederações' (Ac. do Pleno, de
3-5-89, no MS n° 20.829-5, rel. Ministro Célio Borja, ementa in DJ de
23-6-89).
Esse sistema configura a seguinte estruturação hierárquica sindical:
cada categoria formada por atividades econômicas (empresas) ou
profissionais (trabalhadores) específicas é representada, em determinada
base territorial, por um sindicato. Excepcionalmente, o sindicato pode
aglutinar atividades similares ou conexas;
cada grupo de atividades idênticas, similares ou conexas, numa
área geográfica, em regra estadual,
pode formar a respectiva federação
sindical;
c) cada ramo da economia nacional (indústria, comércio, agricultura,
etc.), no plano dos empresários e no
dos trabalhadores, pode constituir a
correspondente confederação sindical.
Este é o sistema confederativo sindical referido na Constituição, que tem
como pressuposto fundamental a unicidade obrigatória de representação 'em
É inquestionável, em face do exposto, que elas não Integram esse sistema,
não possuindo, portanto, natureza
sindical. Basta ter-se em conta que existem três e o princípio do monismo sindical é compulsório 'em qualquer grau'
da organização sindical (art. 8°, n° 11,
da Constituição). Aludindo a esse inciso, escreveu Eduardo Saad:
«Semelhante dispositivo constitucional não deixa espaço para que as
centrais sindicais se organizem legitimamente. Numa palavra, é inadmissível que haja pluralismo na
cúpula sindical (CUT, CGT, etc.) e
unitarismo nos planos inferiores»
(«Constituição e Direito do Trabalho», SP, LTr, r ed., 1989, pág. 180).
(Grifei)
O modelo jurídico de integração das
entidades sindicais brasileiras decompõese, como visto, numa tríade sindical, organizada, hierarquicamente, pelos sindicatos,
federações e confederações, que representam, observados os limites da liberdade
sindical, os elementos típicos de sua coes-o.
Dispenso-me, no momento, de analisar
a questão pertinente à possibilidade jurídica de existência, ou não, em nosso sistema
de direito positivo, das centrais sindicais,
cujo escopo maior — acentua a doutrina
— reside na necessidade de mobilização, de ação conjunta, na defesa de interesses que não são apenas de uma categoria»,
eis que, «Para que esse objetivo possa ser
alcançado, não bastam as confederações; é
preciso um órgão acima delas, coordenando-as» (Amaury Mascaro Nascimento,
op. cit., págs. 141/142).
78
R.TJ.— 150
Basta-me, no entanto, a relevante circunstância de que as hipóteses de legitimidade ativa ad causam, no exercício da
ação direta de inconstitucionalidade, são de
direito estrito e, portanto, inextensíveis a
outras situações. Não há confundir confederações com centrais sindicais.
As Confederações distinguem-se claramente das Centrais Sindicais, pois aquelas associações degrau superior, posicionadas no ápice dapidirnide sindical, representam, enquanto uniões compostas que são,
uma só categoria econômica ou profissional, enquanto que estas — as centrais sindicais — apresentam-se superpostas às
próprias categorias.
É certo que já se verifica, quer no plano
do direito comparado, quer no plano do
direito positivo nacional, uma clara tendência no sentido da institucionalização da central sindical, que constitui verdadeira Confederação geral de todas as categorias.
Ocorre, porém, que, em face do vacuum
legis existente, e da própria omissão do
legislador constituinte que, embora podendo fazê-lo, deixou de integrar, na estrutura organizacional do sindicalismo brasileiro, as centrais sindicais, não há como
equipará-las, para efeito de titularidade
ativa da ação direta de inconstitucionalidade, às, confederações sindicais, nem como
torná-las categorias redutíveis à noção de
associações sindicais de grau superior,
nem, tampouco, qualificá-las — como entes híbridos que são — como entidades de
classe de âmbito nacional.
A jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal tem restringido, no que concerne
às entidades de classe de âmbito nacional
— e para os fins do art, 103, IX, da
Constituição Federal —o sentido conceituai dessas pessoas jurídicas de direito privado, descaracterizando-as como tais
quando concomitantemente integradas, tal
como no caso ocorre, por associações de
natureza sindical e por entes de caráter
não-sindical (ADIn 57, Rel. Min. limar
Gaivão; ADIn 67, Rel. Min. Moreira Alves; ADIn 433, Rel. Mia Moreira Alves;
ADIn 444, Rel. Min. Moreira Alves; ADIn
530, Rel. Min. Moreira Alves; ADIn 705,
ReL Min Celso de Mello).
Sendo assim, peço vênia para declarar
a ilegitimidade ativa ad causam da autora e, em conseqüência, não conhecer da
presente ação.
É o meu voto.
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Sr.
Presidente, para efeito de documentação
integrarei ao meu voto o que proferi na
Ação Direta de Inconstitucionalidade
271, e ao qual me reportei na Ação Direta
de Inconstitucionalidade n° 334.
2. Como eminente Ministro Marco Aurélio desejo realçar dois pontos fundamentais do voto que então proferi —e creio que
os Colegas prestar-me-ão o beneficio do
reconhecimento de que eu também sei que
as centrais sindicais não integram o sistema
sindical confederativo da CLT. Tentei longamente demonstrar, no entanto, que isso
não lhes ilide a legitimidade como associações civis de classe. E ponderei:
a unicidade e o sistema confederativo são restrições constitucionais às
organizações sindicais stricto sensu,
nada tendo a ver com a irrestrita liberdade de associação para fins lícitos, entre
os quais os de defesa de interesses econômicos ou profissionais de uma categoria específica ou de urna pluralidade
delas.
A plena liberdade da constituição e
das atividades de tais associações, é óbvio, não as converte em entidades sindicais.
O sindicato é também uma associação. Peculiar, no entanto, como se sabe,
pelas prerrogativas que o ordenamento
lhe reconhece e que ultrapassam as raias
—150
da esfera de ação aberta às associações
civis em geral.
A principal dessas prerrogativas sindicais especificas — que tem sua manifestação mais eloqüente no mecanismo
das convenções coletivas —, é o poder
de representação de que são dotados ou,
nos tenros da constituição (art. 8°, III),
de 'defesa dos direitos e interesses co-
letivos ou individuais da categoria,
inclusive em questões judiciais e administrativas'.
'Em primeiro legar' —assinalaRus-
somano (A Natureza Jurídica do Sindicato, em Relações Coletims de »abelha cit.. págs. 219, 225) —, 'o poder de
representação dos interesses individuais de sais associados; mas, indo
além, representa, igualmente, os interesses coletivos da categoria profissional' (...)
claro'— prossegue —
'que, pelo fato de representar e defender, inclusive perante o Estado, os interesses coletivos da categoria, o sindicato não se transforma em pessoa de
direito público (...). É conveniente, não
obstante, pôr em relevo que essa re-
presentação de interesses coletivos é
necessária, portanto, de natureza jurídica distinta da mera representação
dos interesses particulares dos assodados'.
O saudoso Hahnemann Guimarães
(MS 767, RF 118/408), em acórdão recentemente lembrado por Xavier de Albuquerque (LTr 5.311/1.278), chega a
ver, no papel dos sindicatos na convenção coletiva, 'o exercício do poder
normativo, que constitui, sem dúvida,
espécie do poder público de regulamentação', que recebe por delegação
do Estado.
É patente que dessas prerrogativas e
poderes jurídicos peculiares não dispõem
— nem podem dispor, na ordem positiva brasileira —, as centrais sindicais: é
quanto basta para que, de um lado, não
79
sejam 'entidades sindicais', em sentido
próprio, mas, de outro, que sejam associações civis, de constituição e funcionamento garantidos pela Constituição.
Aludindo à representatividade das
entidades componentes do sistema confederativo imposto na Constituição,
anota, assim, Octávio Bueno Magano
(A organização sindical na nova Constituição, Ltr 53-1/38, 43) que se trata de
'representação legal, de que não gozam as centrais sindicais. Não é que
estas não possam existir', esclarece,
porém. 'Ao contrário, a existência deles é perfeitamente compatível com a
nova Constituição. Contudo, não gozam de representação legal'.
Com esse sentido, parece, é que o
juiz e professor Roberto A. O. Santos (A
Autonomia Sindical na Constituição
Brasileira de 1988, em Relações Coletivas de Trabalho, cit., págs. 279, 281)
anotou, com razão, ter a Constituição
facultado 'a criação de organismos
coordenadores de interesses pluriterritoriais e pluriprofissionais' , chave em que cabe inserir as centrais sindicais.
A liberdade de criação, pelas entidades sindicais, dessas associações
civis votadas à coordenação e mobilização de suas atividades corresponde,
na cúpula do sistema, à liberdade de
associação profissional ou empresarial, que, desde a CLT, sempre conviveu, na base, com a unicidade sindical
(Haddock Lobo e Prado Leite, Comen-
tários à Constituição Federal, Eds.
Trabalhistas, P/264).
'A existência de um sindicato' —
explica Roberto A. O. Santos (ob. loc.
cita., pág. 290) —, 'não esgota o total
de possibilidades de representação
privada de direitos e interesses de
grupos sociais, mesmo que profissionais ou econômicos (...) Em outras
palavras' — conclui, após lembrar a
80
RTJ. —150
legitimação representativa, inclusive
processual, de que a Constituição dotou
as entidades associativas (art. 5°, XXI)
—,'podem coexistir ao lado do sindicato várias associações profissionais,
com direito a representar seus próprios associados, só não lhe sendo
lícito estender tal faculdade ao conjunto da categoria profissional'.
Do mesmo modo, entendo eu que,
assim como ao trabalhador se faculta,
paralelamente à sindicalização, a constituição de associações profissionais, às
entidades sindicais não se pode negar
liberdade de associar-se a coordenação
da defesa de interesses comuns, independentemente de sua integração paralela no sistema confederativo, a cujos
integrantes se reservam com exclusividade os poderes jurídicos de representação sindical.
As centrais, por isso, não exercem
atividade sindical, embora exerçam, sobre ela, inequívoca influência de fato.
Não me aventuro ao cometimento sociológico de identificar as causas dessa
influência, de que resulta o fato, igualmente notório, do grau crescente de preferência das autoridades públicas, como
das entidades sindicais, pelo diálogo
com as centrais sindicais, em detrimento
das entidades de cúpula, as confederações, dos diversos subsistemas confederativos da classe trabalhadora. Parece
evidente, no entanto, que não se trata de
uma questão de simpatia ou de tolerância, mas de eficácia, à qual não será
estranha a circunstância de que, até agora, o problema básico da relação de trabalho, a questão salarial, se resolve
primordialmente entre nós mediante
normas estatais impositivas do Poder
central — em relação às quais é homogêneo o interesse de todos os trabalhadores dependentes — e não pelos
mecanismos de negociações coletivas
descentralizadas entre as diferentes ca-
tegorias de atividade econômica, que
serve de princípio reitor da estrutura
sindical formal.
Superar, em função dos interesses
globais da classe-matriz dos trabalhadores, a subdivisão em categorias é a razão
de ser das centrais sindicais. O que, aztreteira), não gera problemas jurídicos
de monta, se se tem em conta que elas
são associações, que como tal se legitimam.
Com efeito, ao contrário do que se
impôs à organização dos sindicatos, às
associações de qualquer grau nada autoriza circunscrever compulsoriamente a
uma base social limitada a determinada
categoria econômica ou profissional:
aos associados, pessoas físicas ou pessoas jurídicas, incluídas as entidades
sindicais, é que incumbe demarcar livremente o âmbito do agrupamento social
a congregar.
O que resta saber é se as centrais
sindicais — sendo associações civis licitamente constituídas por entidades
sindicais e associações profissionais —
serão, elas próprias 'entidades de das:
se de âmbito nacional', para legitimarse à ação direta, coneorrentemente às
confederações sindicais.
Entendeu que não o eminente relator: em síntese, porque, 'sendo constituída por pessoas jurídicas de natureza vária (-.) não é uma entidade que
congregue os integrantes de uma determinada atividade ou categoria
profissional ou econômica'.
Lamento dissentir, com todas as vênias.
Que o sistema sindical brasileiro se
desdobre compulsoriamente pelos diversos subsistemas confederativos, setorizado, cada um deles, à base de um
determinado compartimento social, demarcado por categoria ou grupo de categorias profissionais ou econômicas
R.TJ — 150
similares ou conexas, é um fato. Isso,
porém, data venta, não apaga a evidência de que, sobre tais subdivisões, sobrepaire a salame dfristo determinada pelo
sistema de produção capitalista, isto é, a
repartição fundamental dos agentes
econômicos entre os trabalhadores, de
um lado — ou seja, todos os que vivem, mediante relação de emprego ou
não, da colocação profissional de sua
força de trabalho a serviço de outrem
—, e, do lado oposto, os que, remunerando-o, se beneficiam do trabalho
alheio, posto à disposição dos seus
fins, econômicos ou não.
Não me convenço, data venta, de
que, na sociedade capitalista, aos trabalhadores em geral se possa negar a
qualificação de classe, a maior delas.
A própria CLT, aliás, ao distinguir as
categorias econômicas das categorias
profissionais, deixou clara a homogeneidade básica que, independentemente dos diferentes setores de atividade a que se dediquem, reúne e identifica, de um lado, os empregadores,
de outro, os trabalhadores.
Portanto, o caráter de classe que se
atribui, sem contestação, às diferentes
categorias econômicas ou profissionais
específicas, parte, embora não se esgote,
da pertinência de cada uma delas a uma
categoria maior, oriunda da divisão básica de toda a sociedade, em função do
papel de cada um no processo produtivo, e que é, à evidência, a mais elementar das diferenciações de classe: o atributo classista das partes, as categorias,
lhe advém fundamentalmente do todo
de que participam.
Não importa a existência de outras
centrais sindicais, igualmente de âmbito
nacional: a unicidade, que se impõe às
entidades sindicais, por força de restrição constitucional explícita, não se pode
estenda às chamadas centrais sindicais,
que são associações civis, de formação
81
dominada pelo princípio, também constitucional, de liberdade plena.
Reputo irrelevante, de sua vez, que as
entidades sindicais filiadas à CUT o sejam paralelamente — diretamente as federações, indiretamente os sindicatos —,
a confederações nacionais: ao argumento, que, em substância, já viera à tona na
ADIn n° 42-0, relativa à ABRASCA,
opus, naquele precedente, as razões —
aplicáveis, mutilas mutandis, à espécie
— da minha convicção, que segue inabalada: que, para ser fiel às inspirações
pluralistas e participacionistas do art.
103, IX, da Constituição, ao conceito de
'entidade de classe de âmbito nacional' é preciso emprestar toda a abrangência que ele comporte sem violência,
de modo a estender a legitimação ao
maior plexo possível de associações representativas de estrutura plural da sociedade.
Nesse quadro, não creio se possa
fazer abstração da realidade e da representatividade das centrais sindicais.»
3. Disso continuo convencido, Sr. Presidente. E, com as escusas da douta maioria entendo que essa orientação, que agora se fuma, sobre as centrais sindicais, é
uma das mais preocupantes na constrição
progressiva do raio de legitimação de entidades da sociedade civil ativa para ação
direta de inconstitucionalidade.
Peço vênia, portanto, ao eminente Relator e aos que o acompanham e o acompanharão, para rejeitar a preliminar e conhecer da ação direta.
EXTRATO DA ATA
ADIn 928 (Medida Cautelar) — DF —
Rel.: Min. Sydney Sanches. Repte.: Confedanação Geral dos Trabalhadores —CGT
(Adv.: Andre Martins de Andrade). Reqdos.: Presidente da República e Congresso
Nacional.
Decisão: Por maioria de votos, o Tribunal não conheceu da ação, por ilegitimida-
82
R.T.J. — 150
de ativa da requerente, ficando, em conseqüência, prejudicado o requerimento de
medida cautelar, vencidos os Ministros
Marco Aurélio e Sepúlveda Pertence, que
dela conheciam. Votou o Presidente.
Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotti. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Moreira Alves, Néri da Silveira, Sydney
Sanches, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Velloso, Marco Aurélio, limar
Gaivão e Francisco Rezek. Ausente, justificadamente, o Ministro Paulo Brossard.
Procurador-Geral da República, Dr. Aristides Junqueira Alvarenga.
Brasília, 1° de setembro de 1993 —Luiz
Tomimatsu, Secretário.
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N° 944 — DF
(Medida Cautelar)
(Tribunal Pleno)
Relato': O Sr. Ministro Sydney Sanhas
Requerente: Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria — Requeridos: Presidente da República e Congresso Nacional
Ação direta de inconstitucionalidade. IPMF (Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira) (Lei Complementar n° (177, de
13-7-1993). Legitimidade ativa. Medida cautelar.
A Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria
tem legitimidade para propor ação direta de inconstitucionalidade (art.
103, IX, da Constituição Federal).
Julga-se prejudicada medida cautelar de suspensão da Lei
impugnada, se esta já se encontra suspensa, até 31-12-1993, por decisão
do Tribunal, em outra ação direta de inconstitucionalidade.
3. Ressalva do exame do requerimento de cautelar, quanto
ao exercido de 1994, se, até 31-12-1993, não tiver sido, a ação, julgada
pelo mérito.
ACÓRDÃO
RELATÓRIO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos,
em julgar prejudicado o requerimento de
medida cautelar, até 31-12-93, com a mesma ressalva feita na ADIn 939-7, julgada
em 15-9-93.
O Sr. Ministro Sydney Sanches (Relator): 1. Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade da Lei Complementar n° 77,
de 13-7-1993, que instituiu o «Imposto Provisório sobre a Movimentação ou Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos
de Natureza Financeira — IPMF.»
2. Foi proposta pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria, com
base no inc. IX do art. 103 da Constituição
Federal, alegando-se, na inicial, que a lei
impugnada viola o princípio constitucional
da anterioridade (art. 150, IR, b) assim
Brasília, 22 de setembro de 1993 —
Octavio Gallotti, Presidente — Sydney
Sanches, Relator.
R.TJ —150
como aquele que coíbe a bitributação (fls.
215).
3. Havendo requerimento de medida
cautelar, trago os autos à consideração do
eg. Plenário (art. 170, § 1°, do RISTF).
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Sydney Sanches (Relator): 1. A Confederação Nacional dos
Trabalhadores na Indústria é entidade sindical de grau superior, conforme consta do
art. 1° de seu estatuto (fl. 10), «coordenadora dos interesses profissionais dos trabalhadores na indústria em todo o território
nacional, na conformidade do regime instituído pela Consolidação das Leis do Trabalho», e como tal reconhecida pelo Decreto
federal n° 21.978, de 25-10-1946 (fl. 7).
Conheço, pois, da ação por ela proposta,
em face do que dispõe o art. 103, inc. IX,
da Constituição Federal.
Mas julgo prejudicado, si et in quantum, ou seja, até 31-12-1993, o requerimento de medida cautelar.
É que, nos autos da ADIn n° 939,
proposta pela CNTC (Confederação Nacional dos Trabalhadores no Comércio), a
lei impugnada (LC n° 77/1993) já foi suspensa pelo Eg. Plenário (juntamente com o
art. 2° e seus parágrafos da Emenda Constitucional n° 3/93), até o dia 31-12-1993,
em proveito de todos os contribuintes.
4. É cato que, naquele feito, a suspensão foi até 31-12-1993, porque a maioria
levou em conta apenas o princípio da anterioridade, previsto no art. 150, III, b, da
Constituição Federal, que, a um primeiro
exame, teve por indevidamente excepcionado pelo parágrafo 2° do art. 2° da Emenda
Constitucional n° 3/1993, em face do que
dispõe o art. 60, § 4°, inc. IV, da Constituição. Lá não foram levadas em consideração, pela maioria, as demais alegações da
inicial, no sentido de outras violações à
83
Constituição Federal, inclusive a relativa
ao princípio que coíbe a bitributação, aqui
reiterado.
Mas, em se tratando de ADIn, em cujo
processo, de natureza objetiva, a causa de
pedir, segundo a jurisprudência, não vincula o Tribunal, que pode adotar todo e qualquer outro fundamento, para julgá-la procedente, ou improcedente, se for o caso, e
também, para deferir ou indeferir a medida
cautelar, é de se entender que, a que foi aqui
requerida, está prejudicada, ao menos até
31.12.1993, já que a Corte se reservou para
examinar as demais alegações, quanto ao
exercício de 1994, se até o recesso judiciário, a iniciar-se a 19-12-1993, não tiver
julgado o mérito da ação
Em suma, conheço da ação, mas com a
referida ressalva, julgo prejudicada a medida cautelar, até 31-12-1993.
5. A seguir, serão colhidas informações
das Presidências da República, da Câmara
dos Deputados e do Senado Federal e manifestações do Advogado-Geral da União e
do Procurador-Geral da República.
EXTRATO DA ATA
ADIn 944 (Medida Cautelar) — DF —
Rel.: Min. Sydney Sanches. Reqte.: Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria (Advs.: Pedro Luiz Leão Valioso
Ebert e outros). Reqdos.: Presidente da República e Congresso Nacional.
Decisão: Por votação unânime, o Tribunal julgou prejudicado o requerimento de
medida cautelar, até 31-12-93, com a mesma ressalva feita na ADIn 939-7, julgada
em 15-9-93. Votou o Presidente.
Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotti. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Moreira Alves, Néri da Silveira, Sydney
Sanches, Paulo Brossard, Sepálveda Pertence, Celso de Mello, Marco Aurélio, Binar Gaivão e Francisco Rezek. Ausente,
justificadamade, o Sr. Ministro Carlos Vel-
R.TJ. —150
84
loco. Vice-Procurador-Geral da República, Dr. Moacir Antonio Machado da Silva.
Brasília, 22 de setembro de 1993 —
Luiz Tomimatsu, Secretário.
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N° 947 —DF
(Medida Cautelar)
(Tribunal Pleno)
Relatar. O Sr. Ministro Sydney Sanches
Requerente: Confederação Nacional dos Diretores Lojistas — Requeridos:
Presidente da República e Congresso Nacional
Ação direta de inconstitudonalidade. Legitimidade ativa
(art. 102, IX, da Constituição Federal).
Confederação Nacional dos Diretores Lojistas.
IPMF.
A Confederação Nacional dos Diretores Lojistas não é
entidade sindical, mas, sim, entidade dv11, mais precisamente uma associação de associações», que, segundo os critérios jurisprudenciais do
Supremo Tribunal Federal, na interpretação do inciso IX do art. 103 da
Constituição Federal, não é propriamente, uma «entidade de classe» e,
por isso, não está legitimada à propositura de ação direta de inconstitudonalidade.
Ação não conhecida, por Ilegitimidade ativa ad causam»,
prejudicado o requerimento de medida cautelar.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos,
acordam os Ministros do Supremo Tribunal
Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em não
conhecer da ação, por ilegitimidade ativa
da requerente.
Brasília, 14 de outubro de 1993 — Octavio Gallotti, Presidente — Sydney Sanches, Relator.
RELATÓRIO (MEDIDA CAUTELAR)
O Sr. Ministro Sydney Sanches (Relatar): 1. Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade da Emenda Constitucional
n° 3/93, que autorizou a instituição do Imposto Provisório de Movimentação Financeira — IPMF, bem como da Lei Comple-
mentar n° 77, de 13-7-1993, que efetivamente o instituiu.
Foi proposta pela Confederação Nacional dos Diretores Lojistas, com base nos
arts. 103, I, a, e 103, IX, da Constituição
Federal.
Na inicial, alegou a autora que os
diplomas impugnados violaram princípios
que estabelecem garantias individuais intocáveis (art. 60, parágrafo 4°, inc. IV, art.
150,111, b, IV, art. 5°, incisos LIV, XXII e
XXXV, art. 170,11), assim como o princípio que coíbe a bitributação, além de afrontar garantia decorrente de tratado internacional sobre o cheque (art. 5°, parágrafo 2°,
da Constituição Federal, Decreto n° 57.595,
de 7-1-1966, e Lei Uniforme sobre Cheques, no que concerne ao número permitido
de endossos).
R.TJ — 150
Foram apensados a estes os autos de
Petição 771, pela qual a autora requer
medida rima-lar de suspensão dos diplomas
impugnados.
Trago, pois, os autos à consideração
do E Plenário, para o exame do requerimento de medida cautelar (art. 170, parágrafo 1°).
É o relatório.
VOTO (MEDIDA CAUTELAR)
O Sr. Ministro Sydney Sanches (Relatar): 1. À fl. 76v. destes autos principais,
despachei, como Relator, In verbis:
«Em face do que dispõem o art. 19 e
respectivo parágrafo único de seus estatutos (fl. 29), esclareça a Autora se `Diretores Lojistas' são pessoas físicas ou
jurídicas, relacionando-as.
Deve, outrossim, comprovar que as
Federações referidas às fls. 46/49 estão
filiadas a ela, 'Confederação'.»
2. Às fls. 78/79, disse a autora o seguinte:
«1. Quanto a primeira parte do
despacho de V. Ex.', esclarece a Autora
que 'Diretores Lojistas', na forma como
está no caput do art. 19, não são pessoas
físicas e tampouco jurídicas.
II. Com efeito, os 'Clubes de
Diretores Lojistas', estes sim são pessoas jurídicas de direito privado, entidades civis, sem fins lucrativos, e os
sócios, em número máximo de 200 (duzentos), em cada clube, com direito a
voto; afora sócios em outras categorias,
sem direito a voto, são, via de regra,
empresas lojistas, ou seja pessoas jurídicas.
Quanto à relação dos 'Clubes de Diretores Lojistas', existentes em todo o
Brasil, somam mais de 450 (quatrocentos e cinqüenta), e sua completa relação
está acostada à peça exordial.
85
No que patine a segunda
parte do despacho de V. Ex.', esclarece
a Autora, que as Federações de Diretores Lojistas, para serem filiadas à Confederação Nacional dos Diretores Lojistas, devem cumprir fielmente o que
dispõe o artigo r e suas alíneas do estatuto da ora Autora, cabendo a ela Confederação, a decisão da filiação, uma vez
atendidos os requisitos estatutários.
IV. Destarte, a pura e simples
declaração da Autora, é prova o bastante
para comprovação da filiação. Por esta
razão, acosta-se a presente, declaração
firmada neste sentido, que serve de comprovação de filiação para as federações
relacionadas às fls. 46/49.
Assim sendo e cumprido integralmente o despacho de V. Ex.', requer
o prosseguimento do feito em seus
ulteriores termos.
E. Deferimento
Distrito Federal, 27 de setembro de
1993 — Jacques Malka Y. Negri,
OAB/RJ — 60.011»
3. Com a petição de fls. 78/79 os documentos de fl. 80, deste teor
«Declaração
Declaramos para fazer prova junto ao
Supremo Tribunal Federal, que as Federações de Diretores Lojistas, abaixo relacionadas, estão filiadas à nossa Confederação, tendo sido cumprido pelas
respectivas Federações, integralmente,
as disposições estatutárias, principalmente as do artigo sétimo e suas respectivas
alíneas.
Relação das Federações de Diretores Lojistas filiadas à Confederação Nacional dos Diretores Lojistas:
Federação dos Diretores Lojistas de
Magoas; Federação dos Diretores Lojistas da Bahia; Federação dos Diretores
Lojistas do Ceará; Federação dos Diretores Lojistas do Espírito Santo;Federa-
86
R.TJ. — 150
ção dos Diretores Lojistas de Goiás; Federação dos Diretores Lojistas de Mato
Grosso; Federação dos Diretores Lojistas de Minas Gerais; Federação dos Diretores Lojistas do Pará; Federação dos
Diretores Lojistas da Paraíba; Federação dos Diretores Lojistas do Paraná;
Federação dos Diretores Lojistas de Pernambuco; Federação dos Diretores Lojistas do Piauí; Federação dos Diretores
Lojistas do Rio de Janeiro; Federação
dos Diretores Lojistas do Rio Grande do
Norte; Federação dos Diretores Lojistas
do Rio Grande do Sul. Federação dos
Diretores Lojistas de Santa Catarina; Federação dos Diretores Lojistas de São
Paulo; Federação dos Diretores Lojistas
de Sergipe.
Clubes dos Diretores Lojistas Equiparados:
Clube de Diretores Lojistas de Manaus; Clube de Diretores Lojistas de
Macapá; Clube de Diretores Lojistas de
Brasília; Clube de Diretores Lojistas de
São Luís; Clube de Diretores Lojistas
de Campo Grande; Clube de Diretores
Lojistas de Porto Velho.
Rio de Janeiro, 24 de setembro de
1993.
Confederação Nacional dos Diretores Lojistas.
José Moura de Aguiar, GerenteAdministrativo»
A autora, embora se denomine «Confederação», não é entidade sindical, mas
«entidade civil», como consta do art. 1° de
seu estatuto (fi. 27)
Congrega Federações constituídas de Clubes de Diretores Lojistas e seus associados
(art. 2°, letra a, fi. 27).
Estes, os «Clubes de Diretores Lojistas»,
são constituídos de empresas que se dedicam
ao comércio lojista (art. 19, fl. 29).
Na verdade, os Clubes, as Federações
e a Confederação têm personalidades jurídicas distintas, com direção própria, como
se vê do estatuto (fls. 27/38), os primeiros
filiando-se às segundas e estas à terceira.
Então, a Confederação é uma entidade civil, de caráter associativo, que reúne
em seus quadros outras entidades civis (as
Federações), que, por sua vez, congregam
outras mais (os Clubes). Ou, inversamente,
os clubes se reúnem em Federações, que
integram a Confederação.
Esta, por conseguinte, não tendo caráter
sindical, é uma entidade civil a que se filiam outras entidades civis. É, uma associação integrada por outras associações.
Ora, o Plenário desta Corte, no julgamento da ADIn n° 591, de que foi Relator
o eminente Ministro Moreira Alves, negou
legitimidade ativa à União dos Auditores
Fiscais do Tesouro Nacional — UNAFISCO Nacional, dentre outras razões porque
é «uma associação de associações e, portanto, representa estas e não os membros de uma classe». (RTJ 138/81).
A Confederação Democrática dos
Trabalhadores no Serviço Público Federal,
que não é entidade sindical, tambémnão foi
considerada, peloPlenáriodestaCorte, como
«entidade de classe de âmbito nacional,
porque não tem como associados os membros da classe que são os servidores públicos federais, mas sim pessoas jurídicas»
(ADIn 433 Relator Ministro Moreira Alves
—RTJ 138/421).
Na ADIn n° 137, ficou entendido que
entidade de classe de âmbito nacional, para
os efeitos do art. 103, IX, da CF, deve ser
integrada por pessoas físicas e da mesma
atividade econômica ou categoria profissional e não por pessoas jurídicas que as
representem (RTJ 137/82).
10. Ao ensejo do julgamento da ADIn
n° 108, Relator o eminente Ministro Celso
de Mello, ficou assentado na ementa (RTJ
141/3):
«O Supremo Tribunal Federal tem
salientado, em sucessivos pronunciamentos a propósito do tema, que não se quali-
R.T.J —150
ficam como entidades de classe aquelas
que, congregando pessoas jurídicas, apresentam-se como verdadeiras associações de associações. Em tais hipóteses,
tem-se-lhes negado a qualidade reclamada pelo texto constitucional, pois pessoas jurídicas, ainda que coletivamente
representativas de categorias profissionais ou econômicas, não formam classe
alguma. Precedentes.»
Nesse julgado há referência a outro,
de que foi Relator o eminente Ministro
Paulo Brossard, ou seja, a ADIn 511, ajuizada pela FENAFISCO — Federação Nacional do Fisco Estadual, à qual «não se
reconheceu — precisamente por ser assodação de associações — a qualidade de
entidade de classe para o efeito de propositura da ação direta de inconstitucionalidade» (RTJ 141/5).
Por todas essas razões e pelas que
foram deduzidas em tais precedentes, não
conheço da presente ação, por ilegitimidade ativa ad causam, julgando prejudicado
o requerimento da medida cautelar.
VOTO (MEDIDA LIMINAR)
PRELIMINAR
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Sr. Presidente, fiquei convencido, na espécie, com
as ponderações feitas pelo Ministro Francisco Rezek. Temos uma Confederação específica, como entidade sindical, que é a
87
Confederação Nacional do Comércio, e que
congrega os lojistas porque estes estão no
comércio. Tanto quanto possível, devemos
adotar uma interpretação que homenageie
o sistema sindical brasileiro.
Acompanho o eminente Relator, não conhecendo da ação.
EXTRATO DA ATA
ADIn 947 (Medida Cautelar) — DF —
Rel.: Min. Sydney Sanches. Reqte.: Confederação Nacional dos Diretores Lojistas.
(Advs.: Paulo Elisio de Souza e outros)
Reqdos.: Presidente da República e Congresso Nacional.
Decisão: Em votação unânime, o Tribunal não conheceu da ação, por ilegitimidade ativa da requerente. Votou o Presidente.
Ausente, ocasionalmente, o Ministro Sepúlveda Pertence.
Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotti. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Moreira Alves, Néri da Silveira, Sydney
Sanches, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Velloso, Marco Aurélio, limar
Gaivão e Francisco Rezek. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Paulo Brossarcl. Vice-Procurador-Geral da República,
Dr. Moacir Antonio Machado da Silva.
Brasília, 14 de outubro de 1993 —Luiz
Tomimatsu, Secretário.
MANDADO DE SEGURANÇA br 20341 — DF
(Questão de Ordem)
(Tribunal Pleno)
(MS na RTJ 148/88 e MS (AgRg) na RTJ 141/803)
Relator. O Sr. Ministro Néri da Silveira
Impetrantes: José Ignácio Ferreira e outros — Aut. Coatora Presidente da
Câmara dos Deputa tos — Lit. Passivos: José Samey e outros
Mandado de Segurança. Acórdão. Ementa. A ementa deve
constituir uma síntese da decisão. Prevalecerão as notas taquigráficas
autenticadas, se o seu teor não coincidir com a ementa do acórdão.
88
R.TJ. —150
Hipótese em que a ementa foi redigida pelo Relator, com base no voto
por ele proferido, porque ainda não haviam sido iiberadas as notas
taquigráficas referentes aos dentais votos que compuseram a maioria.
Posterior afastamento definitivo do Relator, em virtude de aposentadoria, por implemento de idade. Devendo o Ministro que presidiu o julgamento subscrever o acórdão (RLSTF, art. 94), se verificar que o conteúdo
da ementa não corresponde aos votos da maioria, expressos nas notas
taquigráficas devidamente autenticadas, mas, apenas, ao do Relator,
pode submeter ao Tribunal, em Questão de Ordem, o fato, para que se
corrija a ementa do acórdão, ainda não publicado oficialmente, embora
já assinado pelo Relator, lavrando-se, então, novo arcaico. Significado da
ementa e de sua publiddade. Questão de Ordem resolvida pelo Tribunal.
Estando afastado definitivamente da Corte o Relator, por motivo de
aposentadoria, designa-se, como Relator para o acórdão, o Ministro que
tiver proferido o primeiro voto vencedor, após o Relator, de acordo com
o art. 38, inciso IV, letra b, do Regimento Interno do STF.
ACÓRDÃO
Trata-se de mandado de segurança impetrado por parlamentares federais contra o
Vistos, relatados e discutidos estes au- ato do Sr. Presidente da amara dos Deputos, acordam os Ministros do Supremo Tri- tados, ao determinar o arquivamento da
bunal Federal, em Sessão Plenária, na con- denúncia que os impetrantes apresentara
formidade da ata de julgamento e das figurando como denunciados o então Prenotas taquigráficas, à unanimidade, resol- sidente da República, 1k. José Sarney, e,
ver questão de ordem, suscitada pelo Mi- «por conexão, conforme esclarecem, connistro Néri da Silveira, que presidiu o jul- tra Ministros de Estado e o Sr. Consultorgamento do MS n° 20.941-1 e designar o Geral da República, pela prática de crime
Ministro Sepúlveda Pertence para redigir o de responsabilidade» (fi. 627).
acórdão, em face da aposentadoria do então
Relator, Ministro Aldir Passarinho. Impedido o Sr. Ministro Celso de Mello.
A decisão da Corte está assim registrada,
ás fi. 817: «Preliminarmente, o Tribunal
Brasília, 27 de agosto de 1992 — Syd- rejeitou
a argüição de falta de jurisdição
ney Sanches, Presidente—Na da Silvei- para conhecer
do Mandado de Segurança,
ra, Relator.
vencidos os Srs. Ministros Sepúlveda Pertence, Paulo Brossard e alio Borja. O
RELATÓRIO
Tribunal, a seguir, rejeitou a preliminar de
O Sr. Ministro Néri da Silveira (Rela- ilegitimidade ativa dos impetrantes, vencitor): Sr. Presidente. Ontem, à tarde, foram dos os Srs. Ministros Sepúlveda Pertence e
recebidos, em meu Gabinete, para a assina- alio Borja. No mérito, o Tribunal indefetira do acórdão referente ao julgamento riu o Mandado de Segurança, vencidos os
concluído em 9 de fevereiro de 1990, que Srs. Ministros Octavio Gallotti, Sydney
presidi, os autos do Mandado de Segurança Sanches, Moreira Alves e Presidente.» Parn° 20.941-1-DF, relator o ilustre Ministro ticiparam do julgamento, por ma presidiAldir Passarinho; impetrantes: José Igná- do, os Srs. Ministros Moreira Alves, Aldir
cio Ferreira e outros; autoridade coatora: Passarinho (relator), Sydney Sanches, 0oPresidente da Câmara dos Deputados, e tavio Gallotti, Carlos Madeira, CélioBcaja,
litisconsortes passivos: o então Presidente Paulo Brossard e Sepúlveda Pertence. Auda República, Dr. José Sarney e outros.
sente, justificadamente, o Sr. Ministro
- 150
Francisco Reza, havendo afirmado impedimento o Sr. Ministro Celso de Mello.
Antes de afastar-se do Tribunal, em virtude de aposentadoria, por implemento de
idade, a 21 de abril de 1991, o Sr. Ministro
Aldir Passarinho, relatar e integrante da
corrente majoritária, com o zelo que tanto
distinguiu sua atuação de magistrado, não
só liberou para a Secretaria o relatório e
votos proferidos no julgamento do feito,
devidamenterubricados, como, também, S.
Ex' elaborou a ementa do acórdão respectivo, assinando-o, desde logo, o que também foi entregue à Secretaria.
Dá-se, porém, que, ao fazê-lo, ainda não
haviam sido devolvidos, com a autenticação prevista no Regimento Interno, todos
os votos dos participantes do julgamento.
Observo que as notas taquigráficas relativas ao julgamento, em sua totalidade, somente agora vêm de ser reunidas e ocupam,
no 4° voL, de fls. 648 a 819, o que torna
possível, nos termos do Regimento Interno,
a publicação do acórdão.
Em virtude desse fato, a ementa do acórdão, à época mencionada, redigida pelo
ilustre Ministro Aldir Passarinho, como relator, seguiu a linha e conteúdo do voto
proferido por S. Ex.'.
Com efeito, a ementa do acórdão, que,
ontem, veio à minha assinatura, já firmado
pelo relator, possui este teor (fl. 818):
«Ementa: Mandado de Segurança.
Processo de impeachment contra °Presidente da República e Ministros de Estada Arquivamento pelo Presidente da
Câmara dos Deputados. Pedido de processamento. Lei n° 1.079, de 1950. Alteração no processo, com o advento da
nova Constituição Federal, a de 1988.
A Lei n° 1.079/50 estabelecia, na
conformidade do disposto na Carta de
1946, então vigente, que nos processos
de responsabilidade contra o Presidente
da República e os Ministros de Estado,
o recebimento da denúncia e a decreta-
89
ção da acusação cabia à Câmara dos
Deputados, após regular processo que
ali corria, tudo na conformidade do disposto nos seus arts. 14 a 23, competindo
ao Senado Federal o julgamento, segundo o disposto nos arts. 24 a 37 da nova
lei, funcionando, como está apresso no
art. 80 desta, aquela primeira Casa do
Congresso, como tribunal de pronúncia,
e a segunda como tribunal de julgamento.
A nova Constituição Federal alterai
profundamente a competência da Câmara dos Deputados, e do Senado Federal
para o processo e julgamento, nos crimes de responsabilidade, do Presidente
da República e Ministros de Estado,
passando a este último a atribuição para
as duas fases, e não somente para o
julgamento (art. 52,1, da CF). A Câmara
dos Deputados, entretanto, não ficou
alheia à questão, passando a caber-lhe a
autorização para a instauração, no Senado Federal, do processo, conforme o seu
art. 51, 1. Indispensável, contudo que,
não mais podendo prevalecer, em relação à Câmara dos Deputados, as normas
contidas nos arts. 14 a 23 da Lei n°
1.07W50, que cuidam do processamento, ali, dos aludidos crimes de responsabilidade, ante a nova Carta Política, que
estabeleça tal Casa o procedimento a ser
ali adotado para que haja a autorização
para ser instaurado o processo para a
apuração dos crimes daquela natureza,
atribuídos ao Presidente da República e
aos Ministros de Estado, pois não se
torna cabível,ante os princípios constitucionais assecuratórios da ampla defesa, que seja concedido tal autorização
sem que se possam defender aquelas
altas autoridades. É que a instauração do
processo, no Senado Federal, que não
poderá negá-la, importa em imediato
afastamento do Presidente da República
de suas funções, segundo dispõe o art.
86, § 1°, I, da nova Constituição Federal.
90
R.TJ. — 150
Inexistindo, na Câmara dos Deputados, normas específicas para o procedimento a ser ali adotado, para que
possa ser concedida a autorização para
a instauração do processo, para a apuração do crime de responsabilidade,
pois as previstas na Lei n° 1.079/50 já
não lhe são aplicáveis, e nem cabendo ao Supremo Tribunal Federal fixálas, é de indeferir-se o mandado de
segurança impetrado para que seja autorizado, por aquela Casa do Congresso, a instauração do processo, pelo
Senado Federal. Os órgãos competentes da Câmara é que deverão decidir
como proceder a respeito, à falta de lei
que disciplina a matéria, no que lhe diz
respeito.»
A parte mais significativa da ementa
afirma, destarte, que, não mais podem prevalecer, em relação à Câmara dos Deputados, as normas contidas nos arts. 14 a 23 da
Lei n° 1.079/50, «que cuidam do processamento, ali, dos aludidos crimes de responsabilidade, ante a nova Carta Política», sendo indispensável que estabeleça tal Casa «o
procedimento a ser ali adotado» a fim de
que haja a autorização destinada a instaurar
o processo para a apuração do crime de
responsabilidade do Presidente da República e Ministros de Estado, com vistas a
assegurar-lhes ampla defesa. Afirmando
inexistir, na Câmara dos Deputados, tais
normas específicas, conclui-se na ementa
por indeferir o mandado de segurança Ora,
essas disposições da ementa correspondem, efetivamente, ao que se vê do voto do
ilustre Ministro Aldir Passarinho, em especial, às fls. 681/683:
«Assim, ainda a admitir-se que somente haveria necessidade de a lei dispor sobre as normas processuais para o
andamento da questão, no Senado, já
que a Carta Magna estabelece que ali é
que será instaurado o processo de impeachment, então, mesmo assim, terse-á como indeclinável que na Câmara
dos Deputados haja um prévio procedimento instrutório para asseguração da
apuração dos fatos e a garantia de pelo
menos uma defesa preliminar, sendo,
após, levado o assunto à deliberação
daquela Casa do Congresso para autorizar, ou não, a instauração do processo
no Senado Federal, dada as implicações
de octana gravidade e significação decorrentes dessa instauração. Já assinalava o
Prof. Paulo Brossard, hoje ilustre Ministro
desta Casa, na obraj á referida, Olmpeachment, que `o fato de ser umprocesso político não significa que ele deva ou possa
marchar à margem da lei' (pág. 146).
De qualquer sorte, e isso é que, na
oportunidade, é imperioso salientar — e
dentro dos lindes que ao Supremo Tribunal Federal compete pronunciar-se —
não mais cabendo a aplicação da Lei n°
1.079/50 quanto ao processamento da
denúncia, na Câmara dos Deputados, e
nada havendo, no seu Regimento Interno, quanto ao procedimento a ser ali
adotado, tenho como absolutamente incabível, por isso mesmo, e mais pelas
razões antes expostas, que possa ser ordenado por esta Corte que, de plano, seja
a denúncia diretamente levada ao Plenário daquela Casa do Congresso, ou tenha
determinado andamento administrativo.
O pedido formulado, como inicialmente se viu, cifra-se à exigência de que
haja o cumprimento da Lei n° 1.079/50
e dos arts. 51, I, e 86, da Constituição
Federal, à consideração de que o arquivamento da denúncia, pelo Presidente
da Câmara, em exercício, fora ilegal.
A Lei 1.079/50, como se viu, não
se torna suscetível de aplicação à fase
inicial da tramitação da denúncia, na
Câmara dos Deputados, e o cumprimento dos arts. 51, I e 86 da Constituição
Federal dependem da normatização do
procedimento cabível, ainda que seja
por deliberação interna a ser ali — e só
ali — adotada, pois não cabe ao judiciã-
—150
rio dizer como deve desenvolver-se o
procedimento no âmbito daquela ilustre
Casa do Congresso, o que envolve, inclusive a questão relativa ao de,sarquivamento da denúncia. Creio, entretanto,
que à falta de norma disciplinadora de
como proceder o desarquivamento da
denúncia poderia ser objeto de recurso
para o Plenário da Câmara que poderia,
então, estabelecer as diretrizes administrativo-processuais a ser obedecidas.
Pelo exposto, indefiro a segurança.»
Devendo constituir a ementa do acórdão
síntese do que foi decidido, ou pela unanimidade, ou pela maioria da Corte, como
ocorreu na espécie, não cabe expressar,
tão-só, o conteúdo do voto do relator, se a
fundamentação deste não é coincidente com
a dos demais, ou com a daqueles que, com
ele, compuseram a maioria, no julgamento.
Seguramente, pelas circunstâncias antes
referidas, em que o ilustre relator houve por
bem, com louvável zelo, deixar elaborada
aementa, ao afastar-se da Cate, a 21-4-1991,
verifico não corresponder, entretanto, seu
enunciado ao que se contém nos votos da
maioria que, com S. Ex.•, indeferiu o mandado de segurança.
Assim, o ilustre Ministro Sepúlveda
Pertence, que também denegou, no mérito,
o writ, e às fls. 771/776, expressamente,
discordou do Relator, no ponto indicado,
como se lê, de forma particular, às fls.
775/776:
«Esse é o ponto nuclear do voto de S.
Ex.', que, por isso, preferiu à falta da
segurança da existência desse devido
processo legal, entender que, enquanto
não regulamentado, era impossível
atender à pretensão dos impetrantes e
conceder a segurança.
Mas, data vertia, se essa é a preocupação de S. Ex.' e se, hoje, a própria
Câmara já adotou a Lei n° 1.079, não
vejo como descartá-la. A preocupação
do Relator é com a garantia da defesa
91
prévia. Ora, o que poderiam dizer os que
admitem uma profunda minimização do
papel da Câmara no processo de impeachment, segundo a Constituição vigente, é que era preciso menos defesa do
que assegurava a Lei n° 1.079. Então, o
que se pode queixar é que a Lei n° 1.079,
daria defesa demais, não, de menos.
Por isso, não é por esse fundamento
que se pode afastar a Lei n° 1.079, que a
Câmara adotou: ainda os que admitam,
como o Relator chega a aventar, que,
sendo, o processo, hoje, integralmente
desenvolvido no Congresso, a matéria
teria passado a ser regimental, hão de
convir em que o Regimento adotou a Lei
n° 1.079, fazendo-a, quando fosse o caso,
conteúdo de disciplina regimental do impeachment.
De tal modo, seja por força do Regimento, seja por força da lei, não faltam,
no arsenal da Câmara, instrumentos normativos para assegurar a defesa. O que
pode existir é excesso de oportunidade
de defesa, para os que entendem que a
função da Câmara se resumiu a um simples juízo discricionário de autorização.
De qualquer modo, o de que se cuida
é da fase liminar, vestibular, do procedimento, e nisso não vejo em que a alteração do sistema constitucional possa afetar a Lei n° 1.079.
Para mim, a Lei n° 1.079 é compatível com a Constituição. E me gratifica
essa convicção, que não impõe à alta
responsabilidade do STF afirmar que,
enquanto não sobrevier lei nova, não
haveria hnpeachment.
De modo, Sr. Presidente, que, nesse
ponto, não posso acompanhar a fundamentação do voto do Relator.»
E, em debate, à fl. 785, com o ilustre
Relator, afirmou o Ministro Sepúlveda Pertence:
92
R.T.J. —150
«E isto está assegurado pela recepção
da Lei n° 1.079, com as adaptações necessárias».
Já, em seu douto voto, sobre o mérito, o
eminente Ministro Paulo Brossard, após brilhante exposição acerca do impeachment,
recordando inchnive posição adotada em obra
de merecida reputação doutrinária, de sua
autoria, indeferiu o mandado de segurança,
sem considerar, especificamente, a questão
aludida, fundamentando sua decisão, em
outros termos, cuja síntese se vê às fls.
791/792r
«Mas, chamado a votar o mérito do
mandado de segurança, como o Relator,
como o Ministro Sepúlveda Pertence,
concluo pelo indeferimento da segurança, ou melhor, dele não tomo conhecimento.
Deferi-lo, importaria em desarquivar
o processo, e reformar a decisão do Presidente da Câmara, da qual não houve
recurso para o Plenário.
Não examino o acerto ou desacerto
dessa decisão do Presidente da Câmara
que, como o Ministro Sepúlveda Pertence salientou, tem atribuições que
não são meramente burocráticas. Ele
exerce singular magistratura.
Entendo que o Tribunal não poderia
desarquivar o processo.
No caso vertente, digo mais, não vejo
direito líquido e certo a ser protegido.»
O ilustre Ministro alio Borja, à sua
vez, que também teve seu pronunciamento
somado àmaioria, quanto ao julgamento do
mérito, indeferindo o writ, ressaltou que «o
ato de autorização é ato discricionário» (fl.
794), acrescentando (fl. 794):
«Os votos dos Deputados na apreciação do pedido de autorização não são
vinculados a nenhuma lei. Contra eles
nada se pode; pode-se informar ao Plenário da Câmara as circunstâncias em
que os fatos noticiados se produziram,
que elementos abonam a autenticidade
dessa untais, mas cada um votará como
entender, e não haverá apelo dessa decisão; portanto, trata-se, data venta das
opiniões em contrário, de uma decisão
política. A informação que se colhe para
deliberação não vincula. Se todas as informações convergirem no sentido da
inocência do Presidente da República,
da não autoria dos fatos que lhe são
imputados, a Câmara., por sua maioria
de 2/3, maioria qualificada, pode dizer
que, não obstante a denúncia deve ser
apreciada pelo Senado. E passa-a ao Senado. Instaura-se o processo.»
O que quero dizer é a Constituição
não mandou que a lei disciplinasse o
processo na Câmara dos Deputados. Mandou, sim, que a lei regulasse o processo
de julgamento, e, este, se passa no Senado.
Há outra circunstância, Sr. Presidente, eu apenas superficialmente, no voto
que trouxe escrito, a ela aludi. Tendo
sido eu responsável por uma das Câmaras sei que o Presidente de qualquer
delas é também garante das instituições.
Ele não é um batedor de carimbos, ele
não é um verificador da mera regularidade formal dos processos, ele tem sobre seus ombros o dever de velar por que
não se abata nenhuma desgraça sobre a
República A atividade política é sui
generis; as aproximações que fazemos
do processo de impeachment com o
processo penal, com ação penal, ajudam, por certo a compreendê-lo e darlhe ordem e disciplina, mas não nos
podem levar a identificá-los de forma
absoluta.
Voltando ao ponto do debate, afirmo
que me recuso a afirmar a competência
do Presidente da Câmara para negar autorização para o processo por crime de
responsabilidade do Presidente e seus
Ministros. A Constituição é clara, está
no art. 51, I, que a competência para
autorizar o processo é do Plenário da
- 150
Câmara dos Deputados, falando por 2/3
de seus membros. Não tenho a menor
dúvida.
Competente para autorizar o Senado
a processar é o Plenário da Câmara dos
Deputados e só ele. Entretanto, falece
aos impetrantes o direito de pleitear a
nulidade do ato do Presidente da Câmara, isso porque a sua intervenção no
processo terminou com o oferecimento
das infonnações a respeito da atividade
dita criminosa do Presidente da República. Passa, sim, a regularidade do processo a ser o cuidado, o oficio, o mister,
a preocupação dos Membros da Câmara
dos Deputados. A autorização para o
processo de impeachment é, assim, matéria na qual só os seus membros intervêm. Se se facultasse aos nobres Senadores que impetram este writ, participar
de urna deliberação que pertence exclusivamente à Câmara dos Deputados, estaríamos, a meu ver, violando o mais
fundamental dos princípios de organização do Congresso Nacional que é o do
bicameralismo.
Por isso, a Câmara não pode dar aos
seus ilustres informantes o status de
parte na sua deliberação. O mesmo ocorrerá no Senado, tanto assim que a
acusação cabe, ali, a uma comissão designada dentre os seus membros. Nem
da acusação, nem do julgamento podem
participar os Deputados.
Sr. Presidente, entendo, portanto, que
não há direito líquido e certo dos impetrantes.
Pedindo vênia aos eminentes Colegas que pensam contrariamente, no mérito, indefiro a impetração.»
Certo está que, no início de seu voto
sobre o mérito, afirmara (fl. 793):
«Sr. Presidente, no voto escrito que
ali, esta tarde, ao Colendo Plenário, disse que, em outra causa pendente de julgamento, afirmei a nalureza discricioal-
93
ria e política da autorização prevista no
art. 51, I, da Constituição, entendendo
que, por isso, já não mais se lhe aplicam
as regras processuais e procedimentais
da Lei n° 1.079, de 1950.
Os jovens publicistas que hoje pontificam neste País esqueceram-se de alguns princípios fundamentais da orgrmiração política nacional, entre eles o bicameralismo, que pede que as Câmaras
tenham, urna em relação a outra, autonomia e independência»
Vou prosseguir na leitura, Sr. Presidente:
«Penso, portanto, que tendo exercido
os nobres impetrantes a faculdade escrita no art. 14 da Lei a° 1.079, de 1950, de
noticiar fatos que têm como criminosos,
o processamento ulterior da noticia ou
denúncia submete-se, exclusivamente,
ao Regimento Interno da Câmara dos
Deputados.»
De qualquer sorte, não parece existir
coincidência de fundamentação, no ponto
indicado na ementa e nos termos em que se
expressa o voto do Sr. Ministro alio Boria
O Sr. Ministro Carlos Madeira, a seguir,
entendeu que os impetrantes careciam de
direito líquido e certo, quanto ao desarquivamento do processo, «porque foi um ato
discricionário do Presidente da Câmara,
dentro do exercício de seus poderes» (fl.
797). É exato, entretanto, que, em continuação, asseverou (fl. 797):
«Deixo de estender considerações
em torno do processamento, porque, na
realidade, considero derrogada parte da
Lei n°1.079, que está em desacordo com
a Constituição. E tão em desacordo está
que a Constituição o comprova: manda
que se faça nova lei estabelecendo o
processo de responsabilidade do Presidente da República. O parágrafo único
do art. 85 — o Ministro Gálio Beija já
alertou — manda que o Congresso Na-
94
R.T.J. —150
cional elabore nova lei, porque essa lei
está derrogada, pelo menos na parte do
processo na Câmara.»
Os votos, em prosseguimento dos Srs.
Ministros Octavio Gallotti (fls. 798/799),
Sydney Sanches (fls. 800801), Moreira Alves (fls. 803/804) e o que, por último, proferi (fls. 808/816), embora sejam os quatro
votos vencidos, que deferiam o mandado
de segurança, para cassar o ato do Presidente da Câmara dos Deputados, ao determinar
o arquivamento, em todos eles, há Posição
diversa da que expressa a ementa do acórdão, quanto ao procedimento na Câmara
dos Deputados.
Em virtude dessas observações, quanto
ao julgamento e às respectivas notas taquigráficas autenticadas, tendo em conta que
o eminente Ministro Aldir Passarinho, com
pesar para todos nós, não mais integra a
Corte, — entendi de trazer a matéria, em
Questão de Ordem, ao Tribunal. Penso que
o dever de aposição da assinatura no acórdão, por parte de quem presidiu a sessão de
julgamento (RI, art. 94), autoriza levar, previamente, ao relator e, em suafalta, àCorte,
ponderação dessa ordem para que se reexamine o enunciado da ementa, a fim de que
esta sempre seja formulada e publicada,
guardando exata correspondência com o
que ficou decidido e nos limites do julgamento.
Acresce referir, no caso concreto, que a
imprensa, nos últimos dias, tem feito alusão a este julgado do Tribunal, embora não
publicado. Importa, pois, que o acórdão,
pelo uso e divulgação que decerto terá,
possua também ementa precisa, destinada,
inclusive, à publicação oficial, prevista no
Regimento Interno, no Diário da Justiça,
resumindo-se, nela, com exatidão, o que foi
efetivamente decidido.
É a Questão de Ordem que entendo de
meu dever submetê-la ao Plenário, ao ensejo em que me são presentes os autos, para
assinatura do acórdão.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Néri da Silveira (Relator): Dispõe o Regimento Interno deste Tribunal, em seu art. 93, que as conclusões do
Plenário e das Turmas, em suas decisões,
constarão de acórdão, no qual o Relator se
reportará às notas taquigráficas do julgamento, que dele farão parte integrante. Subscrevem o acórdão o Ministro que presidiu
o julgamento e o Relator que o lavrou (RI,
art. 94), fazendo-se a publicação do aresto,
por suas conclusões e ementa, para todos
os efeitos, no Diário da Justiça (RI, art. 95).
Estabelece, ainda, o art. 96, do RI, que,
em cada julgamento, «as notas taquigráficas registrarão o relatório, a discussão, os
votos fundamentados, bem como as perguntas feitas aos advogados e suas respostas, e serão juntas aos autos com o acórdão,
depois de revistas e rubricadas», estipulando o § 2° do art. 96 do RI, verbis:
2°.
Prevalecerão as notas taquigráficas autenticadas, se o seu teor não coincidir com o
acórdão».
4
Todos sabemos que a ementa do acórdão não é, em princípio, parte componente
do julgado. Este se expressa pelo conteúdo
dos votos dos membros da Corte, que do
julgamento participaram. De ordinário, sequer erro, defeito ou imprecisão da ementa
ensejam embargos de declaração, precisamente, porque a ementa não integra o aresto. No RE n° 88.060, DJ de 1-6-1979, esta
Corte decidiu: «Para simples correção de
ementa, não cabem embargos de declaração; prevalecem as notas taquigráficas».
Dá-se, porém, que os Tribunais que adotam, em seus acórdãos, ementas, estas hão
de constituir uma súmula ou síntese fiel do
que foi decidido. Seus enunciados são publicados no Diário da Justiça, passam a
integrar repositórios de jurisprudência e,
por vezes, constituem instrumento utilíssimo de sua divulgação e pesquisa.
No caso concreto, cuida-se de acórdão
volumoso, com cerca de 170 páginas, sobre
R.T.J —150
matéria constitucional da maior importância
Penso que é de nosso dever evitar que a
publicação oficial dessa decisão se faça, de
faina equivoca ou em termos a não traduzir a exata compreensão do julgado.
Na impossibilidade de, ao eminente Ministro Aldir Passarinho, por não mais integrar o Tribunal, caber reapreciar, como estou disso certo o faria, o teor da ementa do
acórdão, já agora podendo compulsar todos
os votos que se proferiram nesse longo
julgamento, — penso que, admitida pelo
Plenário, a presente Questão de Ordem, os
autos devem ser conclusos ao ilustre Ministro Sepúlveda Pertence, que, pela ordem,
foi o primeiro voto, logo após o relator,
dentre os que formaram a maioria, a fim de
S. Ex.', designado relator para o acórdão,
em face da aposentadoria do Relator, nos
termos previstos no art. 38,1V, letra b, do
RI, elaborar a ementa definitiva do cresto a
ser publicado.
EXTRATO DA ATA
MS 20941 (Qantão de Ordem) —DF.
Rel.: lvfm. Néri da Silveira Imptes.: José
Ignácio Ferreira e outros (Advs.: Raymun-
95
do Faoro e outro). Autoridade coatora: Presidente da Câmara dos Deputados. Litiscensoras passivos: José Samey (Adv.: Sebastião Baptista Affonso), José Saulo Pereira Ramos e outros (Adv.: José Goma
Santos Cruz).
Decisão: Por votação unânime, o Tribunal, resolvendo questão de ordem, suscitada pelo Ministro Néri da Silveira, que presidira o julgamento do MS 20.941-1, designou o Ministro Sepúlveda Pertence para
redigir o acórdão, em face da aposentadoria
do então Relator, Ministro Aldir Passarinho. Impedido o Ministro Celso de Mello.
Ausente, ocasionalmente, o Ministro Marco Aurélio.
Presidência do Sr. Ministro Sydney Sanches. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Moreira Alves, Néri da Silveira, Octavio
Gallotti, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Calos Venoso, Marco Aurélio, limar Gaivão e Francisco Rezek. Procurador-Geral da República, Dr.
Aristides Junqueira Alvarenga.
Brasília, 27 de agosto de 1992 — Luiz
Tomimatsu, Secretário.
RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA N° 21.080 — DF
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Francisco Rezek
Recorrente: Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo do
Estado de São Paulo — Sindipetro-SP — Recorridos: União Federal e Sindicato do
Comércio Varejista de Derivados de Petróleo de Campinas e Região
Mandado de Segurança. Recurso ordinário. Decisão do Superior Dibunal de Justiça mantenedora de ato do Ministro do Trabalho.
Organização sindicai.
Recurso ordinário em mandado de segurança contra ato de
Ministro do Trabalho mantido pelo Superior Tribunal de Justiça. Organização sindical. Legitimidade de constituição de sindicato em base
territorial intermunidpal. Previsão legal de sua ocorrência. Ausência de
ilegalidade.
Recurso ordinário desprovido.
96
R.TJ. —150
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquignificas, à unanimidade de votos, em
negar provimento ao recurso em mandado
de segurança.
Brasília, 12 de agosto de 1993 — Octavio Gallotti, Presidente — Francisco Rezek, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Francisco Rezek: Esta
a análise que faz da espécie o Subprocurador-Geral da República Arthur de Castilho
Neto:
«O Sindicato do Comércio Varejista
de Derivados de Petróleo do Estado de
São Paulo — Sindipetm/SP — apresenta Recurso Ordinário contra decisão proferida pela Egrégia la Seção do Superior
Tribunal de Justiça que, por unanimidade, indeferiu Mandado de Segurança impetrado pelo Recorrente contra ato do
Sr. Ministro do Trabalho.
Sustenta, em síntese, que:
'a) a decisão recorrida deixou de
analisar adequadamente o ato ministerial impugnado, levando em consideração o enganoso argumento de
que o sindicato municipal prefere o
estadual, sendo que o litisconsorte
não representa a maioria da categoria
econômica local, que pretende continuar a ser representada pelo Recorrente;
para a formação de um novo
sindicato não é suficiente que uma
pequena parcela da categoria se manifeste nesse sentido, é preciso que a
maioria absoluta da classe o faça, de
forma inequívoca;
a autoridade coaxara, além disso, desconsiderou o parecer da Comissão de Enquadramento Sindical a
que estava vinculado e, para fazê-lo,
teria de justificar sua conduta;
não foi respeitado o direito adquirido do Recorrente ter sua base
territorial intacta, sendo que a categaia econômica representadapor este
tem peculiaridades que recomendam
um sindicato único, seus problemas
são comuns e demandam soluções
comuns; as negociações e o relacionamento com as entidades de trabalhadores necessitam de ter uma orientação comum;
a unicidade sindical significa
que, em uma mesma base territorial,
não pode haver duas ou mais organizações sindicais de mesmo grau, sob
pena de afrontar-se o art. 8°, II, da
CE'
Manifestação da SubprocuradoriaGeral da República às fls. 709/711.
Contra-razões do litisconsorte passivo às fls. 713/720.
Parecer
Trata-se de concessão de investidura
sindical outorgada na vigência da Constituição anterior, já que o ato ministerial
é de 30 de setembro de 1988, publicado
no DOU de 4-10-88 (fls. 19(/191 — 1°
volume).
Vigorava, então, o art. 166 da Emenda Constitucional. n° 1/69, que assim
dispunha:
'Art. 166 —É livre a associação
profissional ou sindical; a sua constituição, a representação legal nas
convenções coletivas de trabalho e o
exercício de funções delegadas de
poder público serão regulados em
lei.'
Deixou a CF que a matéria fosse
disciplinada pelo legislador ordinário,
incidindo, pois, sobre a matéria, o disposto nos artigos 515 e seguintes da
Consolidação das Leis do Trabalho (De-
R.TJ —150
creto-Lei n° 5.452, de 1° de maio de
1943).
No artigo 515 da CLT, são estabelecidas as condições que as associações
deverão preencher para serem reconhecidas como Sindicatos, verbis:
'Art. 515 —As associações profissionais deverão satisfazer os seguintes requisitos para serem reconhecidas como sindicatos:
reunião de um terço, no mínimo, de empresas legalmente constituirias, sob a forma individual ou de
sociedade, se se tratar de associação
de empregadores; ou de um terço dos
que integram a mesma categoria ou
exerçam a mesma profissão liberal,
se se tratar de associação de empregados ou de trabalhadores ou agentes
autônomos ou de profissão liberal;
duração de três anos para o
mandato da diretoria;
c) exercício do cargo de presidente por brasileiro nato, e dos demais
cargos de administração e representação por brasileiros.
Parágrafo único. O Ministro do
Trabalho poderá excepcionahnente,
reconhecer como sindicato a associação cujo número de associados seja
inferior ao terço a que se refere a
alínea a.
No artigo 516 está prevista uma limitação, consagradora do princípio da unicidade sindical, que impede o reconhecimento de mais de um sindicato em
orna mesma base territorial:
'Art. 516 — Não será reconhecido
mais de um sindicato representativo
da mesma categoria econômica ou
profissional, ou profissão liberal, em
uma dada base territorial.'
Já o art. 517 admite a existência de
sindicatos distritais (hoje, a área não
pode ser inferior à de um Município, cf.
97
art. 8", II, in fine, CF de 1988), podendo
o Ministro do Trabalho autorizar o reconhecimento de sindicatos nacionais:
'Art. 517 — Os sindicatos poderão ser distritais, municipais, intermunicipais, estaduais e interestaduais.
Excepcionalmente, e atendendo às peculiaridades de determinadas categorias ou profissões, o Ministro do Trabalho poderá autorizar o reconhecimento de sindicatos nacionais.
§ 1° — O Ministro do Trabalho
outorgará e delimitará a base territorial do sindicato;
§ 2° — Dentro da base territorial
que lhe for determinada é facultado
ao sindicato instituir delegacias ou
seções para melhor proteção dos associados e da categoria econômica
ou profissional ou profissão liberal
representada'
A investidura sindical será conferida sempre à associação mais representativa, ajuízo do Ministro do Trabalho,
conforme preceitua o art. 519, que fornece àquela autoridade os critérios pelos
quais ela se nortear•
'Art. 519 — A investidura sindical será conferida sempre à associação profissional mais representativa,
ajuízo do Ministro do Trabalho, constituindo elementos para essa apreciação, entre outros:
o número de associados;
os serviços sociais fundados e
mantidos;
c) o valor do patrimônio.'
Reconhecida como sindicato a associação profissional, o Ministro do Trabalho mencionará a base territorial em
que a entidade atuará:
'Art. 520 — Reconhecida como
sindicato a associação profissional,
ser-lhe-á expedida carta de reconhecimento, assinada pelo Ministro do
— 150
98
Trabalho, na qual será especificada a
representação econômica ou profissional conferida e mencionada a base
territorial outorgada.
Parágrafo único — O reconhecimento investe a associação nas prerrogativas do art. 513 e a obriga aos
deveres ao art. 514, cujo inadirnplemento a sujeitará às sanções desta
lei.'
Examine-se, agora, o recurso apresentado.
Não pode prosperar a alegação de
falta de motivação e de injuridicidade do
despacho ministerial concessivo.
Conforme se poderá inferir da leitura
do documento de fl. 190, a autoridade
coatora reconsiderou o despacho anterior em virtude dos fatos novos apresentados pelo litisconsorte requerente, que
teriam comprovado o preenchimento
dos requisitos indispensáveis à outorga.
Depois, conforme bem ponderou o voto
condutor do acórdão recorrido, o despacho anterior tinha sido proferido em recurso do impetrante, sem a audiência
da parte interessada. Desrespeitada fora
cláusula do due process of law.
Com efeito, colho do mencionado
voto:
'Irresignadas, retattaain administrativamente as entidades acima mencionadas (fls. 157 e 162), além da
Confederação Nacional do Comércio.
Apreciando os aludidos recursos,
houve por bem a Comissão de Enquadramento Sindical recomendar o
seu provimento, para o fim de ser
considerada sem efeito a resolução
anterior (fl. 179), recomendação essa
que foi acolhida pelo Ministro do
Trabalho (fi. 180).
Alegando cerceamento de defesa,
j á que não foi ouvida no procedimento recursal, impetrou, então, a Asso-
ciação prejudicada, reconsideração do
aludido ato, oportunidade em que,
refinando as razões dos recorrentes,
sustentou possuir a necessária representatividade para a pretensão manifestada a qual, a seu ver, não contraria o principio da unidade sindical.
A manifestação foi igualmente submetida à apreciação da Comissão de
Enquadramento Sindical, tendo-se manifestado esta pelo indeferimento, ao
singelo argumento de que <a matéria
já se encontra exaurida, no âmbito
deste colegiado, uma vez que, por
despacho do Exmo. Sr. Ministro, foi
acolhida proposta deste órgão, tornando assim sem efeito a Resolução
referida>.
Todavia, como seria de esperarse, diante das circunstâncias, o Ministro do Trabalho reconsiderou o
seu ato.
Com efeito, a apreciação e julgamento do recurso foram feitos sem
a audiência da parte adversa, com o
que se violou, o comezinho princípio
do due process of law, consagrado
no 153, § 15, da CF/67 e art. 5", LV,
da CF/88.
Trata-se de garantia que, já no
regime da Carta de 67, se estendia, de
modo induvidoso, aos processos administrativos, conforme observado
no ilustrado parecer da douta Subprocuradoria-Geral da República (fl.
681). Assim sendo, obviamente, outra não poderia ser a decisão da autoridade impetrada, senão tornar
sem efeito o precipitado julgamento
dos recursos.
Registre-se que a Comissão, no
caso em tela, não emitiu nenhum pronunciamento de ordem técnica a que
estivesse vinculada.'
Não podem prosperar o argumento
do direito adquirido a uma base territo-
R.T.J — 150
dai intata nem tampouco o da violação do princípio da unicidade sindical.
Primeiro, porque, conforme já se viu,
a então vigente EC n° 1/69, no art. 166,
consagrava o direito da livre associação. Segundo, porque diferentes são as
bases territoriais do impetrante e do litisconsorte: aquele é estadual e este é
intermunidpal (fls. 51 e 191).
Tampouco constituem os representados categoria diferenciada, de modo a
impedir o desmembramento aqui atacado. Mas, ainda que assim não fosse, tal
circunstância não impediria a constituição de um novo sindicato (arts. 570/571
CUT).
Com relação aos requisitos exigidos,
ao que parece, foram todos eles preenchidos (v. despacho concessivo de fl.
190). Não seria, ainda, o Mandado de
Segurança a via própria para analisar
prova documental (art. 1° da Lei n°
1.533/51).
Creio eu que o ato ministerial aqui
impugnado não cometeu nenhuma ilegalidade ao conferir à associação, então
postulante, a investidura sindical dentro
dos limites territoriais que assinalou.
Que são, inclusive, os da jurisdição do
TRT de Campinas, onde se faz representar o sindicato criado.
Para rematar, é de se assinalar que a
CF de 1988 é mais incisiva quanto ao
princípio da livre associação. Impede
até Inativamente a interferência do
Estado na organização sindical (art. 8°,
I, CF). A propósito dessa norma, o Supremo Tribunal Federal já adotou o entendimento de que apenas o princípio da
uniddade sindical, quanto à base territorial, e a circunstância da existência de
uma categoria diferendada estariam a
justificar a vedação de criação de nova
categoria sindical (MS 20.829-5/DF,
Rel. Min. alio Borja, Dl de 23-6-89 —
Pleno e RMS n° 21.305-1/DF, Rel. Min.
Marco Aurélio, DJ de 29-11-91, Pleno).
99
Por todas essas razões, sou pelo não
provimento do recurso.» (fls. 725/731)
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Francisco Rezek (Relator): Estimo exato o parecer do Ministério
Público Federal, que adoto como razão de
decidir. Acima de tudo ocorre-me inexistir
qualquer ilegalidade no ato do Ministro do
Trabalho, chancelado pelo Superior Tribunal de Justiça: a idéia de uma associação
local não colide com a existência de uma
base territorial maior — no caso estadual
—, tanto que prevista na legislação própria.
Sem a ilegalidade que ensejaria a correção
postulada, resta-me seguir o alvitre da Procuradoria-Geral da República e negar provimento ao recurso.
É como voto.
VOTO
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Sr. Presidente, doutrinariamente, entendo que não
é salutar o princípio da.unicidade sindical.
Entretanto, está consagrado pela Carta de
1988.
O artigo 8°, ao dispor sobre a matéria,
preceitua no inciso I:
nI — a lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação do
sindicato, ressalvado o registro no órgão
competente, vedadas ao Poder Público a
interferência e a intervenção na organização sindical;»
O inciso II, de uma forma mais precisa,
versa sobre o princípio da unicidade sindical:
v11— é vedada a criação de mais de
uma organização sindical, em qualquer
grau, representativa de categoria profissional ou econômica, na mesma base
territorial, que será definida pelos trabalhadores ou empregadores interessados,
não podendo ser inferior à área de um
Município;»
100
R.T.J. — 150
Manteve-se, portanto, o sistema da unicidade sindical.
Do relato feito pelo nobre Ministro Francisco Rezek, transcrevendo e anunciando à
Corte como razões de decidir o que se
contém no parecer do Ministério Público,
o que verificamos? Constatamos que havia,
como ainda há, um sindicato com abrangênciamaior, a alcançar vários Municípios.
Mesmo assim, estando a base territorial
ocupada, surgiu uma associação de classe
que foi transformada, com o endosso do
Ministério do Trabalho, em entidade sindical, em sindicato.
Não temos, no caso, uma superposição?
A meu ver, sim. Sob o meu ponto de vista,
não se faz presente a criação, em si, de um
sindicato, ocupando base territorial ainda
não abrangida pela representação de uma
outra entidade. Creio que não veio aos autos — estamos aqui para julgar em sede
ordinária e não extraordinária — sequer a
deliberação dos integrantes da categoria. O
que tivemos foi a criação de um novo sindicato.
Sr. Presidente, se as premissas por mim
lançadas, 'astreadas no que ouvi do nobre
Relator, são reais, formahnente reais, porque reveladas nestes autos —muito embora, repito, não seja favorável doutrinariamente ao princípio daunicidade sindical —
peço vênia a S. Ex.• para entender que o ato
do Ministro de Estado do Trabalho implicou a transgressão ao princípio insculpido
no inciso II do artigo 8° da Carta. Provejo,
no caso, o recurso para conceder a ordem,
creio, pleiteada no sentido da cassação desse ato de registro.
Não vou discutir aqui se persiste, ou
não, a necessidade do credenciamento. Não
vou versar sobre a matéria, frente ao surgimento, em si, do sindicato como pessoa
jurídica de direito privado, posto que a
Corte caminhou, nos precedentes mencionados pelo Ministro Francisco Rezek, no
sentido de concluir que, enquanto não vier
à balia a definição de um outro órgão,
competente para esse, vamos dizer assim,
segundo registro — porque o primeiro registro é no Cartório das Pessoas Jurídicas
— temos o Ministério do Trabalho como
credenciado a preservar, justamente, a unicidade de que cuida o dispositivo constitucional a que me referi anteriormente.
O Sr. Ministro Francisco Rezek (Relator): Sr. Presidente, um esclarecimento.
Temos em mesa, submetida à crítica do
sindicato recorrente, uma decisão do Superior Tribunal de Justiça, relatada ali pelo
Ministro limar Gaivão. Cuida-se de saber
se a decisão do Superior Tribunal de Justiça
aplicou o bom direito ou errou e, neste caso,
há de ser reformada.
A decisão foi tomada em mandado de
segurança, onde o ato impugnado é do Ministro de Estado do Trabalho, nos idos de
setembro de 1988 — portanto, sob a regência daConstituição anterior. A propósito do
princípio da unicidade sindical, que levou
o eminente Ministro Marco Aurélio a dizer
que entende ter havido superposição, penso
ter recolhido bem os argumentos de S. Ex.•
e devo descartar a idéia de superposição.
Ficou claro que, ao atender àquilo que lhe
foi solicitado pelas empresas do ramo, na
região de Campinas, o Ministro do Trabalho autorizou a investidura sindical no
nível regional. Mencionou então exata e
exaustivamente os municípios envolvidos,
e terminou dizendo: «Para não ocorrer dualidade de representação, deverão os referidos Municípios ser excluídos da base territorial do sindicato congênere de base estadual, apostilando-se nesse sentido a respectiva carta sindical». O que temos aqui, portanto, não é superposição. O que temos é
um sindicato para a categoria na região de
Campinas, e outro sindicato regional para
o restante do Estado.
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Aí resta saber se houve o pronunciamento dos
integrantes, dos interessados.
O Sr. Ministro Francisco Rezek (Relato* A premissa do Superior Tribunal de
R.T.J —150
Justiça, ao denegar a segurança, foi exatamente essa Não foi bem findada a tese de
que isso era unia aventura minoritária Isso
era algo desejado pela categoria na região.
Por acaso, essa área é exatamente a jurisdição do TRT de Campinas.
Estou dizendo, pois, que não está em
causa uma superposição. Há dois sindicatos de nível estadual. O que se chamava
estadual continua a guardar esse nome. Ele
é tão intermunicipal quanto o outro: abrange os demais Municípios, que não os de
Campinas e dezenas mais.
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Sr. Presidente, inclusive no início do voto pedi ao
nobre Relator que confirmasse as premissas lançadas. Uma delas foi justamente a
ausência de prova — referi-me à circunstância de estarmos em sede ordinária — de
deliberação dos interessados quanto ao desmembramento da área geográfica, porquanto a própria Carta agasalha a possibilidade de termos sindicato por Município.
O ilustre Relatar, até mesmo vindo em
meu socorro, agora esclarece que restou
comprovado nos autos que os interessados,
ou seja, aqueles que integram a categoria
econômica e que têm sede 'e agências na
área referida, pronunciaram-se a respeito.
Portanto, reuniram-se e, aí, partiram, a meu
ver, de forma válida, para o desmembramento que se mostra harmônico com o
inciso 11 do artigo 8° da Constituição Federal, sem violentar, por conseguinte, o princípio da unicidade sindical.
Diante desse esclarecimento, reajusto o
voto proferido para acompanhar S. Ex.',
negando acolhida ao pedido formulado no
recurso ordinário.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Venoso: Sr. Presidente, a Constituição vigente consagra o
princípio da unicidade sindical, no sentido
de que, numa «mesma base territorial», não
«será admitida mais de uma organização
sindical, em qualquer grau, representativa
101
da categoria profissional». De outro lado,
deixa expresso que caberá aos «trabalhadores ou empregadores interessados» a fixação dessa «base territorial», simplesmente
estabelecendo o mínimo, que, na parte fmal
do inciso II, do art. 8°, enuncia-se assim:
«não podendo ser inferior à área de um
Município».
No momento em que o sindicato fez o
desmembramento, quer-me parecer, implicitamente, talvez até expressamente, estabeleceu área diferente.
De modo que me parece, portanto, perfeita a decisão e o voto do eminente Relator
pode ser sufragado.
Com estas breves considerações, acompanho o voto do Sr. Ministro Relator, negando provimento ao recurso.
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence Sr.
Presidente, confortou-me a reconsideração
do voto do eminente Ministro Marco Aurélio, que, por sua justamente reconhecida
autoridade na área, me deixara perplexo,
ante a primeira convicção que flanara.
De fato, a unicidade sindical, mal ou
bem reafirmada pela Constituição, não me
parece obstáculo ao desmembramento. O
que se põe é um problema de representatividade que, salvo engano, não é colocada
corno razão de pedir do sindicato estadual
anterior e, de qualquer modo, está comprovada nos autos, conforme o esclarecimento
do voto do eminente Relator.
Se dúvida pudesse haver na vigência da
Constituição anterior, o final do inciso II do
art. 8° deixa claro que a definição da área,
«base territorial, que será definida pelos
trabalhadores ou empregadores interessados», é matéria remetida à decisão autônoma da categoria profissional ou economia respectiva.
O que não pode haver é a superposição
completa. Se a área é menor, o que há é um
desmembramento, que não ofende a miai-
102
R.T.J. —150
dade, porque subtrai do sindicato antigo a
categoria sediada na nova base, menor.
Decisão: Por votação unânime, o Tribunal negou provimento ao recurso em mandado de segurança Votou o Presidente.
Impedido o Ministro limar Gaivão.
Portanto, estou inteiramente de acordo
com o eminente Relator e com o voto,
afinal, proferido pelo Ministro Marco Aurélio e nego provimento ao recurso.
Presidência do Sr. Ministro Octavio CalIML Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Néri da Silveira, Sydney Sanches, Paulo
Brossard, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Velloso, Marco Aurélio, limar
Gaivão e Francisco Rezek. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Moreira Alves.
Procurador-Geral da República, Dr. Aristides Junqueira Alvarenga.
EXTRATO DA ATA
RMS 21.080 — DF —Rel.: Min. Francisco Rezek. Recte.: Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo do
Estado de São Paulo — SINDIPETRO/SP
(Adv.: Miguel Parente Dias). Recdos.: União
Federal e Sindicato do Comércio Varejista
de Derivados de Petróleo de Campinas e
Região (Advs.: Benedito José Barreto Fonseca e outro).
Brasília, 12 de agosto de 1993 — Luiz
Tomlin:atar:, Secretário.
MANDADO DE SEGURANÇA IM° 21.402 — AL
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence
Impetrante: Sinval Gomes dos Santos —Impetrado: Presidente daRepública
Demissão. Processo administrativo: indeferimento de prova
testemunhal oportunamente requerida: exigência de motivação (14 n°
8.112/90, art. 156, § 1°): nulidade da demissão e do processo, a partir do
indeferimento imotivado da prova.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos,
em deferir o mandado de segurança.
Brasília, 5 de março de 1993 — Octavio
Gallotti, Presidente — Sepúlveda Perten-
ce, Relator.
RELATÓRIO O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: O
parecer da Procuradoria-Geral da República, da lavra da ilustre Subprocuradora-Ge- ral Odilia Ferreira da Luz Oliveira resume
com precisão o caso e opina dos termos
seguintes (fls. 83/85):
Sinval Gomes dos Santos insurgese contra ato do Presidente da República, que o demitiu do cargo de Agente de
Vigilância, do Departamento de Polícia
Federal, com fundamento nos arts. 117,
incs. 11 e IX, e 132, inc. XIII, da Lei n°
8.112, de 11 de dezembro de 1990, por
ter-se prevalecido do cargo para lograr
proveito pessoal, em detrimento da dignidade da função.
Alega o impetrante a nulidade do
procedimento disciplinar que culminou
com a demissão, por cerceamento de
R.TJ — 150
defesa; uma vez que foi indeferida a
audiência das duas testemunhas que armiara oportunamente.
Nas informações, elaboradas pela
Consultoria-Geral da República a partir
de outras fornecidas pelo Ministério da
Justiça, historia-se que o procedimento
disciplinar foi instaurado porque, durante o plantão de 15 para 16 de dezembro
de 1990, o impetrante subtraiu duas cédulas de Cr§ 1.000,00 (mil cruzeiros),
com características de falsificação, e as
repassou a terceiros, a quem deu ciência
da falsidade.
Também se nega a existência de vícios que pudessem invalidar o procedimento, mas nada se diz especificamente
sobre o indeferimento da prova testemunhal. Argumenta-se, por fim, com a previsão legal de revisão administrativa do
procedimento disciplinar, caminho não
buscado pelo impetrante.
II
A Lei n° 8.112/90, no art. 156, § 1°,
autoriza o presidente da comissão de
procedimento disciplinar a indeferir a
produção de prova impertinente, meramente protelatória ou de nenhum interesse para o esclarecimento dos fatos.
103
negar a audiência de testemunhas por
ele arroladas.
A produção de prova é um direito do
indiciado em procedimento disciplinar
(art. 156, caput, da Lei n° 8.112190),
sendo desnecessário fundamentar o pedido. Mas o indeferimento da prova não
prescinde da indicação, mesmo sucinta,
do motivo.
Parece-me, assim, que houve ofensa
ao direito do impetrante à ampla defesa,
com a conseqüente nulidade do procedimento disciplinar.
Diante do exposto, opino pela concessão da segurança, anulando-se o procedimento disciplinar a partir do indeferimento itnotivado da produção de prova testemunhal requerida pelo impetrante, para que o presidente da comissão
profira nova decisão, ainda que de mesmo teor, mas devidamente motivada.
É o relatório.
VOTO
Se a lei arrola os motivos do indeferimento, é inegável que eles devem ser
declarados pelo agente público, exatamente para possibilitar o controle da
legalidade do ato, seja pela própria Administração Pública, seja pelo Poder Judiciária Ou seja: se somente tais motivos legitimam o indeferimento de produção de prova, é imprescindível que o
autor do ato exponha, ainda que sucintamente, qual deles o levou a tomar tal
decisão.
0 Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Tenho por irreurcável o parecer, que acolho
para, nos ternos nele propostos, deferir a
segurança
No processo administrativo para a demissão de funcionário —no qual, especificamente, a Constituição assegurou ampla
defesa —, o princípio é o direito do acusado
à produção das provas que entender convenientes: o indeferimento é o excepcional,
que há de ser motivado, tanto mais quanto
a lei enumerou, taxativamente, as razões
que podem legitimar o indeferimento, à
vista das circunstâncias do caso concreto.
Defiro a ordem: é o meu voto.
EXTRATO DA ATA
No caso, não há notícia de fundamentação do ato; pelo contrário, como se lê
à fl. 29, não se deu ciência ao interessado
dos motivos que levaram a comissão a
MS 21.402 — AL — Rel.: Min. Sepúlveda Pertence. Impte.: Sinval Gomes dos
Santos (Adv.: José Alexandrino de Melo).
Impdo.: Presidente da República.
R.TJ. —150
104
Decisão: Por votação unânime, o Tribunal deferiu o mandado de segurança, nos
termos do voto do Relator.
Presidência do Sr. kfmistm Octavio Gallotti, Presidente em exercício. Presentes à
Sessão os Srs. Ministros Moreira Alves,
Néri da Silveira, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence, Marco Aurélio, Binar Gaivão
e Francisco Rezek. Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Sydney Sanches,
Presidente, Celso de Mello e Carlos Venoso. Vice-Procurador-Geral da República,
Dr. Moacir Antonio Machado da Silva
Brasília, 5 de março de 1993 — Luiz
Tomimatsu, Secretário.
RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA N° 21.514 — DF
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio
Recorrentes: Confederação Nacional da Agricultura e outros — Recorrida:
União Federal
Mandado de segurança coletiva Legitimação. Substittdçie processuaL O inciso LXX do artigo 5° da Constituição Federal encerra o
instituto da substituição processual, distanciando-se da hipótese do
inciso XXI, no que surge no âmbito da representação. As entidades e
pessoas jurídicas nele mencionadas atuam, em nome próprio, na defesa
de interesses que se irradiam, encontrando-se no patrimônio de pessoas
diversas. Descabe a exigência de demonstração do credenciamenio.
Mandado de segurança coletiva Entidade de classe. Especificidade. Na disciplina constitucional do mandado de segurança coletivo,
inconfundível com a relativa à ação direta de inconstitudonalidade, não
se tem, quanto à legitimação ativa, a exigência de tratar-se de entidade
de classe que congregue categoria única. Constatada a abrangênda, a
ponto de alcançar os titulares do direito substancial em questão, mister
é concluir pela configuração de hipótese ensejadora da substituição
processual que distingue a espécie de mandado de segurança que é o
coletivo.
Mandado de segurança Complexidade dos fatos. Questões
fálicas de alta indagação. Há de se distinguir a complexidade dos fatos e
do tema de direito daquelas situações que não prescindem da abertura
de fase de instrução. Se o caso está compreendido no campo da referida
dificuldade, nem por isso o mandado de segurança exsurge como via
imprópria, impondo-se o julgamento do mérito. Somente em defrontando-se o órgão julgador com quadro a exigir elucidação de fatos cabe dizer
da impertinência da medida, sinalizando no sentido do ingresso em juízo
mediante ação ordinária.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na con-
formidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por maioria de votos, em conhecer do recurso e lhe dar provimento
para, afastada a ilegitimidade «ad causam»
das impetrantes, bem assim a iliquidez de
R.TJ — 150
fatos, determinar que o Superior Tribunal
de Justiça prossiga no julgamento do mandado de segurança, como entender de direito. Vencido, em parte, o Sr. Ministro Carlos
Venoso que, não obstante reconhecendo a
legitimidade «ad cascam» das impetrantes,
negava provimento ao recurso por entender
ilíquidos os fatos.
Brasília, 27 de abril de 1993 — Neri da
Silveira, Presidente — Marco Aurélio,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Marco Aurélio: O egrégio Superior Tribunal de Justiça concluiu
pela ilegitimidade das Impetrantes, ora Recorrentes e, assim, assentou a carência da
demanda proposta. Segundo o voto condutor do julgamento, da lavra do Ministro
Garcia Vieira, não teria havido a prova de
que membros filiados ou associados das
Impetrantes sejam produtores de trigo não
subsidiados e que estejam sendo prejudicados pela importação deste produto dos Estados Unidos da América. Não teriam os
Impetrantes juntado aos autos qualquer autorização dos produtores para ajuizar este
mandado de segurança coletivo, decorrendo, daí, a ilegitimidade. Aludiu a Corte ao
disposto do inciso XXI do artigo 5° da
Constituição Federal, apontando que a hipótese é conducente à extinção do processo
por ausência de legitimidade das Impetrantes. O Relator, diante da eventual suplantação da referida preliminar, adentrou o exame do mérito e, em relação a este, consignou a inexistência de prova nos autos dos
fatos alegados pelas Impetrantes, rotulando-os como complexos. Aludindo à necessidade de, no mandado de segurança, a
prova ser pré-constituída, rechaçou a existência de direito líquido e certo que pudesse
ser protegido na via eleita. Segundo a certidão de fl. 351, o deslinde da matéria ocorreu pelo voto de desempate, restringindo-se
a decisão à análise única e exclusiva da
legitimação (fls. 347/350).
105
No recurso ordinário de folhas 357 a
362, as Recorrentes procuram demonstrar
que estão autorizadas pelo teor do inciso
LXX do artigo 5° da Constituição Federal
a atuarem como substitutas processuais.
Discorrem sobre a impropriedade, ao caso,
do preceito contido no inciso XXI do rol
das garantias constitucionais, porque ligado a figura distinta — a da representação.
A seguir, asseveram que, conforme deixou
assinalado o Ministro Façanha Martins, a
questão versada nos autos, frente à notoriedade, nem precisaria de urna demonstração
mais clara e que, de qualquer forma, os
elementos coligidos são suficientes à demonstração da procedência do direito.
A União Federal ofereceu as contra-razões de folhas 364 a 367, salientando que
as Impetrantes não observaram a exigência
constitucional relativa à autorização expressa dos associados para defenderem os
direitos destes últimos e que, em, outro
plano, não lograram comprovar que os congregados atuam na agropecuária, mais precisamente na produção de trigo e que estariam sofrendo concorrência desleal, predatória, pela importação do produto devidamente subsidiado.
Remetidos os autos ao Ministério Público Federal, exarou a ilustre Subprocuradora-Geral da República Dta Anadyr de
Mendonça Rodrigues longo parecer, de folhas 372 a 397, assim resumido:
«1. Mandado de Segurança Coletivo
(art. 5°, LXX, b, da CF): a exigência
constitucional de que só venha a proteger 'direito liquido e certo' (art. 5°,
LXIX) impede que a '...realidade vigente e que salta aos olhos de qualquer
cidadão...' constitua elemento substitutivo da efetiva comprovação, nos autos
judiciais respectivos, do direito que dá
fundamento à impetração de Mandado
de Segurança (RT 594/248).
2. Interpretação sistemática: a mais
fiel e a única que permite harmonizar
diferentes garantias constitucionais, re-
106
—150
velando-lhes o espírito e a essência, sem
amputá-las em seu sentido.
55% para o imposto de importação, a
título de tributação compensatória'.
Atuação 'em defesa dos interesses de seus membros ou associados',
na impetração de Mandado de Segurança Coletivo (parte final do art. 50, LXX,
b, da CF): não diz respeito — como,
obviamente, ocorre com a cláusula 'e
em funcionamento há pelo menos um
ano' — apenas à associação legalmente constituída, última das entidades
referidas naquela disposição constitucional: patine a todas as entidades de
que trata a mesma alínea b do inciso
LXX.
6. Entidade de classe (art. 103, IX,
da CF); aplicabilidade, quanto ao art.
5°, LXX, b, da CF, do decidido pelo
STF no julgamento da ADIn 108-6DF-Q.0: 'O Supremo Tribunal Federal
tem salientado, em sucessivos pronunciamentos a propósito do tema, que não
se qualificam como entidades de classe
aquelas que, congregando pessoas jurídicas, apresentam-se como verdadeiras
associações de associações. Em tais hipóteses, tem-se-lhes negado a qualidade
reclamada pelo texto constitucional,
pois pessoas jurídicas, ainda que coletivamente representativas de categorias
profissionais ou econômicas, não formam classe alguma. Precedentes. A
jurisprudência desta Corte tem salientado, ainda, que pessoas jurídicas de direito privado, que reúnam, como membros
integrantes, associações de direito civil
e organismos de caráter sindical, desqualificam-se — como instituições de
classe, cuja noção conceituai reclama a
participação nelas, dos próprios indivíduos integrantes de determinada categoria, e não apenas das entidades privadas
constituídas para representá-los. Precedentes.»
Defesa dos interesses dos membros ou associados da organização sindical, da entidade de classe e da associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano (art. 5°,
LXX, b, da CF): não se confunde com a
representação judicial ou extrajudicial dos filiados de tais entidades (art.
5°, XXI, da CF), que são dotadas de
natureza intrinsecamente associativa,
razão por que, se a entidade associativa
não tiver expressamente autorizada,
por seus filiados, a impetração do Mandado de Segurança coletivo, não os estará representando judicialmente, ainda que esteja agindo 'em defesa dos Interesses de seus membros ou associado?.
5. Petitum que visa obter decisão de
natureza essencialmente concreta, com
efeitos mandamentais que atendem aos
interesses individualizados de cada triticultor que estaria prejudicado com a
importação do produto agrícola: desqualifica a impetração do Mandado de
Segurança Coletivo por entidade que
congrega outras entidades associativas,
eis que é o triticultor — e, não, qualquer dos membros, associados ou filiados da entidade impetrante — o beneficiário direto da pretendida salíquota de
Com base em tais premissas e nessas
conclusões, pronunciou-se o Órgão pelo
conhecimento do recurso ordinário e negativa de acolhimento ao pedido nele formulado.
Recebi estes autos para exame em 24 de
junho de 1992, liberando-os com relatório
e voto para julgamento no dia 20 de julho
de 1992, isto após determinar a retificação
da autuação para constar como Recorrida a
União Federal, em substituição aos Ministros da Economia, Fazenda e Planejamento
e da Agricultura
É o relatório.
R.TJ — 150
VOTO
O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Na interposição deste recurso ordinário foram atendidos os pressupostos de recorribilidade que lhe são próprios. Muito
embora a impugnação na via ordinária esteja limitada, pela alínea a, inciso II do
artigo 102 da Constituição Federal, às
hipóteses de denegação da segurança, a
pressupor sempre o julgamento de mérito, o Pleno desta Corte concluiu que «a
locução constitucional — «quando denegatória a decisão» — tem sentido amplo,
pois não só compreende as decisões dos
tribunais que, apreciando o mérito, indeferem o pedido de mandado de segurança, como também abrange aquelas que,
sem julgamento do mérito, operam a extinção do processo» — Mandado de Segurança n° 21.112-1-PR (AgRg) — Relator Ministro Celso de Mello, acórdão
publicado no Diário da Justiça de 29 de
junho de 1990, página 6220. Tal enfoque
atende à mens legis do preceito constitucional, que é, justamente, potencializar a
eficácia do mandado de segurança. Quanto à tempestividade, observaram as Impetrantes os quinze dias que lhe são próprios. Publicada a decisão do Superior
Tribunal de Justiça no Diário da Justiça
de 9 de março de 1992 (fl. 356), deu-se a
protocolação do ordinário no dia 23 seguinte. Já a regularidade da representação
processual exsurge dos documentos de
fls. 38 e 64. Quanto ao preparo, o recurso
foi interposto em data em que a tabela de
custas indicava como valor devido doze
centavos. O caráter irrisório da quantia e
a circunstância de não se ter sequer moeda em circulação para o devido recolhimento são conducentes à inexigibilidade
do preparo, valendo notar, ainda, que, no
âmbito do Superior Tribunal de Justiça,
grassa o entendimento de que a Lei n°
8.038/90 afastou a exigibilidade do preparo. Por isso, não houve a intimação das
Recorrentes para fazê-lo. Conheço do recurso interposto.
107
No mérito.
Delimito a matéria passível de ser examinada por força da interposição do recurso ordinário em fase de julgamento. Fm
primeiro lugar, tenho como impertinente a
norma inserta no parágrafo 1° do artigo 515
do Código de Processo Civil. Se de um lado
não potencializo o fato de no preceito aludirse a recurso de apelação, entendo-o aplicável ao ordinário estrito senso, de outro considero que a devolução plena, inclusive quanto
a questões não apreciadas por inteiro quando
da prolação do provimento impugnado, está
vinculada ao mérito. Se o julgamento ficou
restrito a preliminar da demanda, descabe,
uma vez suplantado o óbice que motivou a
decisão impugnada, adentrar o mérito da con.
trovérsia, porquanto este não chegou a ser
apreciado em relação a qualquer das partes
em que possa estar dividido.
Em segundo lugar, ressalto que, embora alguns integrantes do órgão de origem
hajam tratado, além da matéria ligada à
legitimidade, da complexidade probatória dos fatos, esta não chegou a ser objeto
de decisão pelo Colegiado.
Após o voto do Relator, Ministro Vieira Garcia, julgando as Impetrantes carecedoras da impetração em face não só
da ilegitimidade ad causam, como também da complexidade probatória dos elomentos fálicos envolvidos, seguiram-se,
na mesma assentada, três votos, a saber:
os dos Ministros Peçanha Martins e Gomes de Barros, refutando a carência nos
dois pontos, e o do Ministro Américo
Luz, rechaçando no primeiro — ilegitimidade e declarando-a com base no segundo — a necessidade de desenvolvimento de fase probatória. Deu-se a formulação de pedido de vista pelo Ministro
José de Jesus que, ao votar, apenas discorreu sobre a ilegitimidade, declarando
que acompanhava, na preliminar, o Relator. A Ata de fl. 351 contém a notícia de
que houve o empate na votação. Ao desempatar, o Ministro Presidente do Órgão
108
R.T.J. — 150
julgador somente o fez considerada a ilegitimidade das Recorrentes, silenciando sobreaquestãoalusivaàprova, talvezmesmo
diante do fato desta última estar ligada ao
mérito e, portanto, da prejudicialidade. Destarte, somente houve decisão do Órgão julgador quanto à condição da ação, que é a
legitimidade da parte autora, e somente este
tema foi devolvido com a interposição do
recurso ordinário, muito embora as Recorrentes também refiram-se ao outro.
Feita esta observação, passo ao exame
da ilegitimidade declarada.
A impetração não ocorreu objetivando a
defesa de direito público subjetivo das Impetrantes. A inicial visou à proteção dos
interesses dos membros e associados, considerados não os interesses particularizados de cada um destes, mas direitos que,
embora individuais, têm ligação com a própria atividade que desenvolvem e que se
mostrou como razão de ser dos agrupamentos realizados — a agricultura e os desdobramentos no mundo econômico. Em nome
próprio, as Impetrantes ingressaram no Superior Tribunal de Justiça, objetivando alcançar sentença mandamental que pusesse
fim a alegado desequilíbrio do mercado,
em razão da importação de um certo produto da agricultura — o trigo — por preços
subsidiados pelo país de origem — os Estados Unidos da América do Norte, viabilizando, assim, concorrência em situação
desfavorável, ou seja, desleal e predatória.
A regra do artigo 6° do Código de Processo Civil realmente está a revelar que a
legitimação é norteada pela titularidade do
direito substancial que se questiona. Contudo, no próprio preceito tem-se aberta a
possibilidade de outrem, que não o titular
do direito subjetivo, ingressar, em nome
próprio, em juízo:
«Ninguém poderá pleitear, em nome
próprio, direito alheio, salvo quando autorizado por lei».
Com a Constituição Federal de 1988,
buscaram-se as almejadas economia e cele-
ridade processuais, procurando-se evitar a
multiplicação de mandados de seguranças
impetrados, isoladamente, pelos titulares
de direito subjetivo que se mostrasse comum a uma certa coletividade, e a diversificação de decisões. Ao lado do tradicional
mandado de segurança — inciso LXIX —
previu-se o coletivo, definindo-se, no texto
constitucional, os legitimados a impetrá-lo
— inciso LXX, também do rol das garantias constitucionais. A conjugação deste
dispositivo com o que se contém no inciso
XXI do mesmo artigo não se mostra merecedora de agasalho. Os institutos neles contemplados são diversos. O inciso XXI encerra a representação em juízo, pressupondo a autorização dos filiados da entidade
associativa. No preceito alude-se, expressamente, como necessária, a competente
autorização. Havendo esta, pouco importam as características do direito em questão. Vale dizer: inexigível é que entre este
e a entidade associativa haja um elo. Mesmo que se trate de controvérsia totalmente
estranha aos fins sociais, cabe, uma vez
configurada a representação mediante ato
de vontade do filiado, a atuação da entidade
e esta ocorrerá não no campo da substituição processual, mas da simples representação Isto decorre, como já anunciado, do
próprio teor do preceito:
«XXI — as entidades associativas,
quando expressamente autorizadas, têm
legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente».
Instituto diverso, a justificar o tratamento constitucional em preceito próprio,
é o da substituição processual. Em elogiável avanço, os Constituintes de 1988 fizeram inserir no artigo 5° nova garantia constitucional — a do mandado de segurança
coletivo— e, então, quanto a este, tiveram
presentes as características de certos direitos, no que extravasam o âmbito simplesmente individual para irradiarem-se a ponto de serem encontrados no patrimônio de
várias pessoas que, em virtude de um fim
R.T.J — 150
comum, formam uma certa categoria. Tendo em vista esta peculiar situação é que se
previu, na alínea b do inciso LXX do artigo
5°, a prerrogativa das organizações sindicais, das entidades de classe e das associações legalmente constituídas e em funcionamento há pelo menos um ano, não para
representar, mediante autorização expressa, corno previsto no inciso XXI, os filiados, mas para impetrar o mandado de segurança coletivo. Não se tratasse de algo diverso da demanda plúrima ajuizada por
força de representação, mister seria concluir pela inocuidade do preceito.
Sempre tenho presente a premissa de
que o Direito é ciência e, como tal, possui
institutos, expressões e vocábulos com sentido próprio, havendo de se presumir que
o legislador, especialmente o constituinte,
haja atuado com técnica, atentando para o
fato de que o esmero no emprego da linguagem é essencial à revelação do sentido correto da disposição normativa. Destarte, impossível é confundir hipótese reveladora de
representação, a exigir autorização do titular do direito e de abrangência ilimitada,
considerada a matéria a ser tratada na demanda — como é a disciplinada no inciso
XXI em comento — com a relativa à substituição processual, quando o substituto,
frente à aproximação dos respectivos interesses com os do substituído, adentra o
Judiciário em nome próprio na defesa de
interesses deste último..
Não obstante, apontou-se, também, que
as Impetrantes não congregam apenas triticultores e, por isso, deixam de estar legitimadas para a impetração. Srs. Ministros,
não vejo corno ter agasalhada no preceito
constitucional a especificidade que se lhe
quer emprestar. Ao cogitar dos legitimados
para a impetração do mandado de segurança coletivo, o inciso LXX do artigo 5° o faz,
após a alusão aos partidos políticos, em
relação a «organização sindical, entidade
de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos
109
um ano, em defesa dos interesses de seus
membros». Na norma não se tem a limitação às pessoas jurídicas criadas por categoria especifica única, valendo notar que os
triticultores estão compreendidos no grande gênero que é o daqueles que se dedicam a uma mesma atividade para a qual
ainda não se atentou, como é preciso fazer, ou seja, a agricultura.
O que cumpre perquirir em cada caso é
a existência, ou não, da quase comunhão de
interesses entre a entidade impetrante e aqueles que por ela serão substituídos, os quais,
para o fortalecimento das respectivas posições, por meio dela procuraram-se unir,
viabilizando, assim, a defesa concentrada
dos interesses comuns. E isto está configurado na hipótese vertente. Tanto a Confederação Nacional da Agricultura, quanto
a Sociedade Rural Brasileira e a Organização das Cooperativas Brasileiras outra finalidade não têm, senão a defesa daqueles
que se colocam no plano primeiro da produção e comercialização ligados à Agricultura. Confira-se com os documentos juntados à inicial: fls. 30 a 37, 39 a 63 e 65 a 93,
respectivamente os Estatutos da Organização das Cooperativas Brasileiras, da Sociedade Rural Brasileira e da Confederação
Nacional da Agricultura. A figura do litisconsórcio não é estranha ao mandado de
segurança, sendo que, no caso concreto, a
legitimação atribuída a entidades que podem coexistir em relação a uma mesma
categoria afasta possíveis dúvidas a respeito. A unicidade contemplada na Constituição está ligada ao campo sindical e a este
são estranhas as entidades de classe (género) e as simples associações. A referência
constitucional às três espécies de pessoa
jurídica afasta possíveis dúvidas a respeito.
Por último, há o argumento lançado aos
autos pelo Ministério Público Federal, segundo o qual esta Corte tem concluído pela
ilegitimidade para a propositura da ação
direta de inconstitucionalidade, quando se
trata de requerente que aglutine não uma
110
R.T.J. — 150
classe em si, considerados os integrantes —
cidadãos — individualmente, mas pessoas
físicas e jurídicas diversas. A par de a jurisprudência estar assentada em regra constitucional que implicou, no que tange à Carta
pretérita, o elastecimento do rol dos legitimados para a ação direta de inconstitucionalidade, sendo conseqüência, assim, também de uma certa Política Judiciária, constata-se que são distintos os preceitos que
prevêem a legitimação para o mandado de
segurança coletivo e o que cuida daquela
concernente à ação direta de inconstitucionalidade. Enquanto relativamente a esta última contemplou-se, com a legitimação, as
confederações sindicais e as entidades de
classe de âmbito nacional, no dispositivo
pertinente ao mandado de segurança coletivo houve a extensão, no âmbito sindical,
a todas as entidades que nele estejam compreendidas — Sindicatos, Federações e Confederações —para, a seguir, aludir-se às de
classe e alfim, às associações como um
todo, sem cogitar-se sequer da representatividade nacional. De qualquer forma, a
simples circunstância de a alínea «b» do
inciso LXX do artigo 5° da Constituição
Federal albergar, a um só tempo, as entidades de classe e as associações, sem particularizar estas últimas, afasta a repercussão
ao caso da jurisprudência referida, isto sem
levar-se em conta o relevante fato de o
mandado de segurança coletivo consubstanciar garantia constitucional, não podendo, por isso mesmo, merecer, quanto ao
preceito que o disciplina, interpretação que
dificulte o respectivo exercício.
Conheço deste recurso e, no mérito, acolho o pedido nele formulado, a fim de,
reformando o acórdão de fls. 331 a 335,
concluir pela legitimidade das Recorrentes
para a impetração, determinando, com isto,
que os autos retornem à Corte de origem, a
fim de que prossigano julgamento do mandamos como entender de direito.
É o meu voto.
EXTRATO DA ATA
RMS 21.514 —DF —Rel.: Min. Marco
Aurélio. Rectes.: Confederação Nacional
da Agricultura e outros (Adv.: Jose Antonio Miguel Neto). Renda: União Federal.
Decisão: Após os votos dos Srs. Ministros Relator e Francisco Rezek conhecendo
do recurso e lhe dando provimento, o julgamento foi adiado em virtude do pedido
de vista do Sr. Ministro Carlos Velioso.
Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Paulo Brossard, Carlos Venoso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. SubprocuradorGeral da República, a Dra. Odflia Ferreira
da Luz Oliveira
Brasília, 8 de setembro de 1992 — José
Wilson Aragão, Secretário.
VOTO (VISTA)
«Ementa: Constitucional. Processual
civil. Mandado de segurança coletivo.
Substituição processual. Interesses coletivos e difusos e direitos subjetivos.
Fatos controvertidos. CF, art. 5°, LXX.
I — Mandado de segurança coletivo impetrado por entidades de classe
com o objetivo de impedir a importação
de trigo que, segundo se alega, são «altamente subsidiados no país de origem»,
o que vem em detrimento de interesse
dos produtores brasileiros filiados às
impetrantes.
II—A legitimação das organizações sindicais, entidades de classe ou
associações, para a segurança coletiva,
é extraordinária, ocorrendo, em tal caso,
substituição processual. CF, art. 5°, LXX.
Não se exige, tratando-se de segurança
coletiva, a autorização expressa aludida
no inciso XXI do art. 5° da Constituição.
III — O mandado de segurança
coletivo não visa a proteger interesses
que não configurem direitos subjetivos.
MS n° 21.291-8 (AgRg)-DF, Relator
Min. Celso de Mello, Plenário, 12-4-91.
R.T.J —150
Posição contrária do Min. Carlos Venoso, no sentido de que a segurança coletiva visa a proteger interesses coletivos,
interesses difusos e direitos subjetivos.
Ressalva de ponto de vista pessoal.
IV — Inocorre" cia, no caso, de direito líquido e certo, no sentido de que
os fatos são controvertidos.
V — Recurso improvido».
O Sr. Ministro Carlos Vdloso: Tratase de mandado de segurança coletivo impetrado pela Confederação Nacional da Agricultura, Sociedade Rural Brasileira e Organização das Cooperativas Brasileiras, na
defesa de interesses de seus associados,
contra ato dos Ministros da Economia, Fazenda e Planejamento, da Agricultura e Reforma Agrária e do Coordenador da Coordenação Técnica de Tarifas Aduaneiras
do Departamento de Comércio Exterior —
DECEX, que autorizaram a importação de
trigo proveniente dos Estados Unidos da
América do Noite, sem a correspondente
taxação necessária à compatibilização com
o preço do trigo nacional, em virtude da
defasagem de custos decorrentes dos subsídios diretos e indiretos concedidos pelos
Estados Unidos aos seus produtores. Argumentam que o ato impugnado foi praticado
com ofensa ao art. 174 da Constituição, à
Lei n° 8.174/91, ao Decreto n° 174/91 e
com violação aos Acordos relativos aos
Códigos de Subsídios e Medidas Compensatórias e Antidumping do GATT, aprovados pelo Congresso Nacional, pelos Decretos-Legislativos na 20 e 22, de 1986.
Os impetrados confirmaram a autorização dada a particulares para importação de
até 700.000 toneladas de trigo. Questionam, entretanto, a liquidez e certeza do
direito dos impetrantes, já que a solução da
questão depende do exame da política de
incentivos do governo americano, para
identificar e quantificar os subsídios, verificar os custos da produção nacional e
eventuais riscos derivados de eventual con-
111
corrência desleal por parte dos produtores
estrangeiros.
O Superior Tribunal de Justiça decidiu
pela carência da ação, sobre dois fundamentos, conforme está na ementa do acórdão, à fl. 355:
«Processual civil — Mandado de
segurança coletivo — Legitimidade
ativa — Matéria de prova — Impor-
tação de trigo — Tributação compensatória.
Para a comprovação do nexo entre o
direito ou interesse dos referidos produtora de trigo e o direito ou interesse dos
impetrantes é indispensável que os próprios interessados, os filiados, membros
ou associados, sejam ouvidos ou tenham, previamente, autorizado as organizaç& sindicais, entidades de classe
ou associações, às quais sejam filiados,
a agirem em seu nome para determinado
fim, poupe as entidades associativas, só
`quando expressamente autorizadas,
têm legitimidade para representar seus
filiados judicial ou extrajudicialmente'
(CF, art. 5°, XXI).
Se os fatos são complexos enfio estão
suficientemente comprovados, inexiste
direito liquido e certo a ser protegido
pela via eleita.
Carência da ação».
LI
Julgando o recurso ordinário, o eminente Ministro Marco Aurélio, Relator, depois
de afirmar que somente houve decisão do
Tribunal a quo quanto à condição da ação,
ou quanto à «legitimidade da parte autora,
e somente este terna foi devolvido com a
interposição do recurso ordinário, muito
embora as Recorrentes também refiram-se
ao outro», afirmou que a impetração não
visou à defesa de direito subjetivo, mas à
proteção dos interesses dos membros e associados, «direitos que, embora individuais, têm ligação com a própria atividade
que desenvolvem e que se mostrou como
112
R.TJ. — 150
razão de ser dos agrupamentos realizados
— a agricultura e os desdobramentos no
mundo econômico». Afirma, a seguir, que,
no caso, ocorre substituição processual —
CF, art. 5°, LXX, b — e não representação,
como previsto no inciso XXI do art. 5° da
Constituição, motivo por que não é exigida
a autorização dos associados para a impetração do writ. Concluiu S. Ex.' por dar
provimento ao recurso, pelo que decidiu
«pela legitimidade das Recorrentes para a
impetração, determinando, com isto, que os
autos retomem à Corte de origem, a fim de
que prossiga no julgamento do mandamus
como entender de direito».
Pedi vista dos autos e os trago, a fim de
retomarmos o julgamento do recurso.
Passo a votar.
No que toca ao primeiro fundamento
do acórdão recorrido — a exigência de
autorização dos filiados, membros ou associados para a impetração coletiva —
concordo com o eminente Relator, que
dispensa tal autorização. Já sustentei,
com base no art. 5°, XXI, da Constituição,
que as organizações sindicais, as entidades de classe ou associações deveriam
estar previamente autorizadas a representar os seus membros ou associados
para o aforamento da segurança coletiva.
Assim procedi logo que veio a lume a
Constituição de 1988. Continuei, entretanto, a meditar sobre a legitimação coletiva, ordinária e extraordinária, que a
Constituição de 1988 confere, amplamente, a entidades sindicais, entidades de
classe e associações (C.F., art. 5°, XXI;
art. 5°, LXX; art. 8°, III; art. 114, § 2°; art.
129, III, a recepcionar a Lei n° 7.347/85
(ação civil pública); art. 103, IX).
Na verdade, cumpre distinguir a hipótese do art. 5°, XXI —caso de representação,
em que se exige a autorização expressa dos
filiados, certo que «entidades associativas»
não compreendem organizações sindicais,
mas associações — do mandado de segu-
rança coletivo do inciso LXX do art. 5° da
Constituição. Neste, tem-se substituição processual, o que parece ocorrer, também, na
hipótese do artigo 8°, m, da Lei Mator. Ada
Pellegrini Grama, forte em «moderna tendência doutrinária que vê, na legitimação
de entidades que ajam na defesa de interesses institucionais, uma verdadeira legitimação ordinária», consoante se pode ver de
estudos e trabalhos de Vincenzo Vigoriti,
José Carlos Barbosa Moreira, Kazuo Watanabe e da própria Ada Pellegrini Grinover, leciona: «De modo que, caso a caso,
dever-se-á verificar se a entidade age na
defesa de seus interesses institucionais —
proteção ao ambiente, aos consumidores,
aos contribuintes, por exemplo — e neste
caso a legitimação seria ordinária; ou se
atua no interesse de alguns de seus filiados,
membros ou associados, que não seja comum a todos, nem esteja compreendido em
seus objetivos institucionais: neste caso,
sim, haveria uma verdadeira substituição
processual». («Mandado de segurança coletivo: legitimação, objeto e coisajulgada»,
em «Recurso no Superior Tribunal de Justiça», Coordenação do Ministro Sálvio de
Figueiredo Teixeira, Saraiva, 1991, pág.
286). Ada Grinover, todavia, não obstante
distinguir casos de substituição ordinária e
substituição extraordinária no mandado de
segurança coletivo, é peremptória no afirmar que não tem cabimento, tratando-se de
mandado de segurança coletivo, exigir a
autorização expressa a que alude o inciso
XXI do art. 5° da Constituição (ob. e loc.
cits).
Apenas, pois, sob o ângulo da legitimação, os autos deveriam baixar ao Tribunal
a quo, para que o julgamento tivesse continuidade.
Dois outros fundamentos, entretanto,
impedem o provimento do recurso.
IV
É que o acórdão embasa-se, também, em
outro fundamento: os fatos são complexos
e não estão suficientemente comprovados,
R.TJ — 150
pelo que inexiste direito liquido e certo a
ser protegido pela via eleita.
No ponto, aliás, peço vênia ao Sr. Ministro Relator para divergir do seu douto
entendimento no sentido de que o acórdão
apóia-se apenas num fundamento, o da legitimidade ad causam. Não. O acórdão
assenta-se sobre dois fundamentos: o da
legitimidade da parte e o da complexidade
dos fatos, que estariam a demandar o fazimento de prova
Com efeito.
O Ministro Garcia Vieira, Relator, referiu-se, expressamente, aos dois fundamentos, o que, aliás, consta da ementa do acórdão. Os Srs. Ministros Peçanha e Gomes de
Barros divergiram nos dois fundamentos.
O Sr. Ministro Américo Luz, no tocante à
legitimidade, acompanhou os votos dos Srs.
Ministros Peçanha e Barros; todavia, no
tocante à complexidade dos fatos, S. Ex.`
acompanhor5 expressamente, o Sr. Ministro Relator. E verdade que, nos votos escritos que estão às fls. 345 e 347/350, os Srs.
Ministros José de Jesus e Pedro Acioli não
se referem ao segundo fundamento. Todavia, na ata do julgamento, à fl. 351, está
escrito que ambos votaram com o Sr. Ministro Relator, o mesmo ocorrendo com os
Srs. Ministros Hélio Mosimann e Demócrito Reinaldo.
Votaram como Relator, pois, cinco Ministros, sendo que um deles, o Ministro A.
Luz, apenas quanto ao segundo fundamento.
Registre-se, aliás, que o recurso ataca
ambos os fundamentos (fls. 358/361, o primeiro; fl. 362, o segundo). Ambas as matérias, portanto, devem ser examinadas pelo
Tribunal ad quem.
É o que faremos.
No particular, disse o Sr. Ministro Garcia Vieira, Relator:
«Ainda que assim não fosse, estamos
diante de fatos complexos, não devidamente comprovados nestes autos e as
113
impetrantes fazem inúmeras afirmações,
sem contudo comprová-las. É evidente
que nada comprova simples recortes de
jornais e papéis impressos, sem qualquer assinatura ou prova de sua procedência. São Suficientes as provas existentes nestes autos, do subsídio dado
pelo Governo Americano aos produtores de trigo na época da importação e
que esta, com subsídio caracterize concorrência desleal ou predatória. As próprias impetrantes, no item 31 de sua
longa inicial se encarregamde confessar
a falta de provas, sobre os subsídios que
estariam sendo dado pelos Estados Unidos da América, ao dizer que protocolaram no Ministério da Economia, Fazenda e Planejamento, umpedido de 'investigação de subsídios, que até a presente
data não foi respondido' (fl. 12). Nem
sequer se provou existir em nosso mercado interno, trigo suficiente para atender à demanda e o prejuízo dos produtores brasileiros. Se não existe sequer prova dos preços de internação no mercado
brasileiro, como se pode chegar à conclusão de haver concorrência desleal ou
predatória? O importador pode estar, perfeitamente, importando trigo subsidiado
e vendendo-o no mercado interno do
Brasil, pelo mesmo valor de mercado
aqui hnperante e, nesta hipótese, não
estaria havendo concorrência desleal ou
prejuízos para o produtor brasileiro. Na
verdade nem sequer se provou os atuais
valores de custo e de mercado do trigo
brasileiro e americano, ao ser internado
no território brasileiro.
Se os fatos são complexos e não
estão suficientemente comprovados e
no mandado de segurança a prova é
pré-constituída, não estamos diante de
direito liquido e certo que possa ser protegido pela via eleita. Com razão a douta
Subprocuradmia-Geral da República ao
acentuar em seu Parecer (fls. 307/310)
que:
114
R.T.J. — 150
«Por fim, parecem efetivamente
ter razão as Autoridades Impetradas
ao invocar a necessidade de produção de prova fálica como impedimento ao desate da questão através'
do Mandado de Segurança, eis que,
indisputavelmente, o eventual direito
líquido e certo das Impetrantes depende da comprovação da existência
de subsídio no país produtor, do valor desse subsídio e de sua influência
ruinosa na economia dos produtores
nacionais». (fls. 334/335).
Os fatos não são, no caso, incontroversos. Como bem registrou o Ministro Garcia
Vieira, Relator do acórdão recorrido, isto
foi confessado pelas impetrantes no item
31 da inicial
O recurso, nesta parte, é de ser improvido.
Há mais.
V
No caso, o mandado de segurança tem
por objeto a defesa de interesse e não de
direito subjetivo. Sustentei e sustento atese
no sentido de que o mandado de segurança
coletivo visa a proteger direitos subjetivos
e interesses legítimos. No voto que proferi,
no Plenário desta Casa, quando do julgamento do MS 21.291-8(AgRg)-DF (Questão de Ordem), relatado pelo eminente Ministro Celso de Mello, deixei expresso o
meu entendimento a respeito do tema: que
o mandado de segurança coletivo protege
tanto os interesses coletivos e difusos,
quanto os direitos subjetivos. Fiquei vencido, entretanto. O Plenário, na linha do voto
do eminente Ministro Celso de Mello, Relator, decidiu que «o mandado de segurança coletivo—que constitui, ao lado do writ
individual, mera espécie da ação mandamental instituída pela Constituição de 1934
— destina-se, em sua precípua função jurídico-processual, a viabilizar a tutela jurisdicional de direito líquido e certo não amparável pelos remédios constitucionais do
habeas corpus e do babas data. Simples
interesses, que não configurem direitos,
não legitimam a válida utilização do mandado de segurança coletivo». (MS n°
21.291-8(AgItg)-DF (Questão de Ordem).
No Plenário, sempre que a questão for
colocada — a proteção de interesses coletivos e difusos pelo mandado de segurança
coletivo—sustentarei o meu ponto de vista
pessoal no sentido de que interesses coletivos e difusos e direitos subjetivos podem
ser objeto da segurança coletiva. Na Turma, entretanto, órgão fracionário, não posso colocar-me contrário ao decidido pelo
Plenário.
VI
Do exposto, não obstante acompanhar o
Sr. Ministro Relator quanto ao primeiro
fundamento, porque, adotando a tese da
substituição processual, também não exijo
a prévia autorização a que alude o inc. XXI
do art. 5° da Constituição, quanto aos dois
outros fundamentos, nego provimento ao
recurso.
EXTRATO DA ATA
RMS 21.514 —DF —Rel.: Min. Marco Aurélio. Remes.: Confederação Nacional da Agricultura e outros. (Adv.: Jose
Antonio Miguel Neto). Recda.: União Federal.
Decisão: Após os votos dos Sn. Ministros Relator e Francisco Rezek conhecendo
do recurso e lhe dando provimento, e do
voto do Sr. Ministro Carlos Velloso negando-lhe provimento, o julgamento foi adiado
em virtude do pedido de vista do Sr. Ministro Paulo Brossard.
Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Paulo Brossard, Carlos Velloso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. SubprocuradoraGeral da República, a Dra. Odília Ferreira
da Luz Oliveira.
Brasília, 30 de março de 1993 — José
Wilson Aragão, Secretário.
R.T.J — 150
VOTO (VISTA)
O Sr. Ministro Paulo Brossard: Sr.
Presidente, estamos julgando recurso ordinário em mandado de segurança coletivo,
interposto contra decisão do Superior Tribunal de Justiça. O Ministro Relator Marco Aurélio, acompanhado pelo Ministro
Francisco Rezek, entendendo que a matéria recorrida diz respeito, apenas, à legitimidade dos impetrantes, conhece do recurso e lhe dá provimento para declarar a
legitimidade dos recorrentes para a impetração e determinar que o Tribunal recorrido prossiga no julgamento como entender
de direito.
O Ministro Carlos Venoso também reconhece a legitimidade dos impetrantes,
mas por outras duas razões nega provimento do recurso. S. Ex.' entende que o acórdão
recorrido tem outro fundamento além do da
ilegitimidade de parte, que é o da complexidade dos fatos que demandam a produção
de provas, pelo que inexiste direito líquido
e certo a ser amparado por mandado de
segurança. E assim entendendo, nega provimento ao recurso porque há controvérsia
quanto aos fatos, e também porque cuida-se
de simples interesse, e não de direito, ressalvando seu voto vencido no julgamento
do MS n°21.291-8 (AgRg) —DF (Questão
de Ordem), relatado no Plenário pelo Ministro Celso de Mello, ainda não publicado.
Quanto ao primeiro fundamento, acompanho todos os que me precederam para
reconhecer, no caso, a legitimidade ad causam dos impetrantes, eis que, o art. 5°,
LXX, b, da Constituição, prevê hipótese de
substituição processual, viabilizando que
outrem postule em nome próprio direito
alheio, segundo a dicção art. 6° do Código
de Processo Civil.
Para ingressar na controvérsia aqui
surgida, do acórdão recorrido ter um ou
dois fundamentos, verifico que nem todos
os votos foram declarados, e os que foram,
não fornecem elementos seguros para uma
115
conclusão. Por esta razão, socorro-me da
ata do julgamento, que é o documento oficial que registra a prestação jurisdicional
que desata a lide. Diz ela, fl. 351:
«Prosseguindo no julgamento, a Seção, por maioria julgou extinto o processo, vencidos os Srs. Ministros Américo
Luz, Peçanha Martins e Gomes de Barros.
Os Srs. Ministros Hélio Mosimann,
Demócrito Reinaldo, e José de Jesus e
Pedro Acioli (voto desempate), votaram
com o Sr. Ministro Relator.»
Com ou sem a necessidade de desempate, o fato é que prevaleceu o voto do Ministro Relator Garcia Vieira, de forma que
somente este voto pode elucidar a questão.
Dele anoto o seguinte excerto, fl. 334:
«O caso é de extinção do processo
por ausência de legitimidade das impetrantes (CPC, art. 2057, VI).
Ainda que assim não fosse, estamos
diante de fatos complexos, não devidamente comprovados nestes autos e as
impetrantes fazem inúmeras afirmações,
sem contudo comprová-las.
Se os fatos são complexos e não estão
suficientemente comprovados e no mandado de segurança a prova é pré-constituída, não estamos diante de direito líquido e certo que possa ser protegido
pela via eleita...
Por isso,
Julgo as impetrantes carecedoras da
ação.»
Da leitura do voto vencedor, não há
como deixar de reconhecer o duplo fundamento do acórdão recorrido, onde está expresso que foi declarada a ilegitimidade de
parte das impetrantes e a existência de fatos
complexos não comprovados de plano. A
ementa, transcrita no voto do Min. Carlos
Venoso, também é clara ao fazer referência
116
R.T.J. — 150
aos dois fundamentos da denegação da segurança
O recurso ordinário interposto pelas impetrantes atacou os dois fundamentos, ao
assinalar, quanto ao segundo, que: «A argumentação sustentada pelo Superior Tribunal, e no sentido de que a matéria é
complexa e exigiria dilação probatória, s.m.j.,
não pode prosperar», fl. 362.
Por estas razões passo ao exame do segundo fundamento.
4. Os fatos não me parecem tão complexos, mas mesmo que fossem, não podem
impedir que aparte use o direito de recorrer
ao mandado de segurança, constitucionalmente previsto. Assim já decidiu esta Turma no julgamento do RE 100.411-8-RJ,
Rei Min. Francisco Rezek, DJ de 4-9-84,
em acórdão assim ementado:
«Mandado de segurança. Complexidade dos fatos. Litisconsórcio necessário. A complexidade dos fabris não exclui o caminho do mandado de segurança, desde que todos se encontrem comprovados de plano.»
Posto que é cabível impetrar segurança,
mesmo quando os fatos são complexos,
remanesce o exame da sua comprovação
prévia. Diz o relatório do acórdão recorrido
que a segurança foi impetrada porque autorizada a importação de trigo em grãos dos
Estados Unidos, altamente subsidiado, sem
aplicação da tributação compensatória para
eliminar os efeitos do subsídio, violando o
art. 174 da Constituição Federal, a Lei n°
8.174/91, o Decreto n° 174/91 e os Acordos
relativos aos Códigos de Subsídios e Medidas Antidumping do Acordo Geral sobre
Tarifas Aduaneiras e Comércio — GATT,
aprovados pelo Congresso Nacional pelos
Decretos-Legislativos na 20 e 22/86.
A prova exigida, no caso, diz respeito à
existência de subsídio concedido ao trigo
norte-americano e à iminência da importação.
Sobre serem fatos públicos e notórios e
em todas as regiões tritícolas do Brasil e do
mundo, e talvez nem tanto em regiões com
vocações paníferas outras, onde apenas se
consome o pão, acresce que pelas informações prestadas ficou confirmado estar sendo ultimada a autorização para particulares
importarem 700.000 toneladas de trigo dos
Estados Unidos e, em nenhum momento,
foi negada a existência de subsídio ao trigo
norte-americano, ficando em aberto, no
caso, a sua quantificação, para se cotejar os
preços pelos quais o trigo nacional e o
importado chegariam ao moinho.
Sobre o que deve e o que não deve ser
matéria de prova, vale recordar o art. 334
do Código de Processo Civil:
«Art. 334. Não dependem de provas
os fatos:
I —notórios;
II —afumados por uma parte e
confessados pela parte contrária;
— admitidos, no processo,
como incontroversos;
IV —em cujo favor milita presunção legal de existência ou de veracidade.»
Esta questão foi bem sentida no Superior Tribunal de Justiça, como se vê nos
votos dos Ministros Peçonha Martins e
Gomes de Barros, que passo a ler. Disse o
primeiro, em trecho do debate como Relator:
«O Exmg Sr. Ministro Peçonha
Martins: Sr. Presidente, ficarei aguardando uma resposta à segunda indagação, porque, quanto à segunda parte do
voto de V. Ex.', entendo que se trata de
fato notório.
O subsídio prestado pelo governo
americano a seus agricultores é fato denunciado e conhecido neste país, pelo
menos durante toda a minha vida. Entendo que a sua prova não precisaria
delimitar exatamente de quanto seria
- 150
para merecer a impetração do mandado
de segurança, que julgo preventivo.
Minha indagação se prende quanto à
legitimidade. Se foi autorizado a membros da associação de agricultores
contratar advogado, entendo legítima
e representada a parte e, no caso, conheço do mandado de segurança para discuti-lo no mérito.
Sr. Presidente, continuo com a palavra. Entendo que essa prova, data venta
do Eminente Ministro Garcia Vieira, é
notória, é declarada pelo Ministro da
Agricultura de agora e pelos Ministros
que se sucederam. Desde que me entendi por gente e comecei a participar da
vida pública deste Pais, temos conhecimento do efeito danoso que resultou
para a economia, para o desenvolvimento da agricultura nacional os famosos
acordos do trigo. Aliás, ainda há pouco
se viu, por exemplo, nos jornais, não só
daqui, mas também nos internacionais,
os agricultores franceses protestando por
novos ou pela manutenção dos subsídios. Essa é a realidade, que dificulta a
livre concorrência pelos produtores nacionais nos mercados internos e externos.
Em termos de fato, é como disse,
concordando embora com o Ministro
em que não há prova de quanto seria
exatamente o subsídio atual, mas ele
existe, sem dúvida. O fato é notório para
todos nós. Por isso, divirjo de V. a,
não dando pela carência da ação.
O Exma Sr. Ministro Garcia Vidra:
V. Ex.' me permite? Não será provado,
mas suponhamos que o trigo esteja
sendo importado, subsidiado.Não existe
prova nenhuma nesses autos do preço
pelo qual esse trigo está sendo vendido
no mercado interno. O importador pode
perfeitamente estar vendendo este trigo
pelo valor de mercado e neste caso aonde é que haveria a concorrência desleal,
o dumping! Estamos diante de um man-
117
dado de segurança, portanto nós não
podemos fazer prova, pois a prova é
pré-constituída.
O Exma Sr. tiro Peçonha Martins: No particular se há dumping, deverá ser apurado pelo Ministro da Agricultura e é evidente que não pode ser o
Tribunal quem deva estabelecer a tributação compensatória. O que devemos é
reconhecer o direito a ela, assecuratória
da livre concorrência (CF, artigo 170,
II). Quanto de compensação que se haverá de dar para igualizar os custos e
fazer com que a concorrência interna
não se faça em desfavor do esforço do
nosso agricultor? Isso é tarefa do Poder
Executivo e não nossa»
O Ministro Gomes de Barros acrescentou:
«Quanto à questão da certeza, impressionou-me o que ouvi da sustentação oral
e do próprio relatório. Eles pedem o rnandado de segurança em caráter preventivo;
não se dirigem às importações que já foram feitas e beneficiadas por subsídios.
Pedem justamente, o que se faz e se pratica
no estrangeiro, principalmente nos Estados Unidos da América, em relação a nós:
que se estabeleçaumatributação ~peaisae5ria sempre que houver no trigo importado incidência deste tributo. E, essa
ordem, parece-me, perfeitamente, que
pode ser dada, por que é uma ordem para
o futuro, que determina que sempre que
houver o fato, cumpra-se o preceito da lei.
Parece-me salutar o exercício do mandado
de segurança coletivo, como fator de economia processual.
Peço vênia para acompanhar o Eminente Ministro Peçanha Martins.»
Tratando-se de fatos notórios e incontroversos, suficientes para embasar o pedido de segurança formulado, dou provimento ao recurso também quanto ao segundo
fundamento do acórdão atacado.
118
Quanto ao julgamento do MS 21.2918 (AgRg —DF (Questão de Ordem), invocado pelo Min. Carlos Velloso, ao que me
lembro, decidimos sobre a impossibilidade
de substituição processual na defesa de direitos exclusivos do Poder Judiciário do
Estado do Rio de Janeiro, pela Associação
de Magistrados do mesmo Estado, e no
presente caso reconhecemos que é possível
e legítima. Recordo-me de eruditas considerações do Relator e de outros Ministros,
e estou certo que não julgamos o alcance da
expressão «interesses» contida na alínea b
do inc. LXX do art. 5° da Constituição,
assim redigido:
«LXX — o mandado de segurança
coletivo pode ser impetrado por
a) b) organização sindical, entidade de
classe ou associação legalmente constituída em funcionamento há pelo menos
um ano, em defesa dos interesses de
seus membros e associados.»
Ainda que o tema tenha sido abordado,
estou certo que a matéria não foi objeto de
julgamento pelo Plenário naquele mandado
de segurança.
Sr. Presidente, com estas considerações, conheço deste recurso ordinário em
mandado de segurança e lhe dou provimento para, reconhecendo a legitimidade ad
causam dos impetrantes e a possibilidade
de mandado de segurança onde fatos notórios e incontroversos não precisam ser comprovados, determinar que o Superior Tribunal de Justiça prossiga no julgamento, como
entender de direito.
VOTO (EXPLICAÇÃO)
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Como
Relator, Sr. Presidente, não cheguei a adentrar o exame do recurso ordinário quanto
a esse segundo fundamento. Se o Ministro
Paulo Brossard permitir e V. Ex.' autorizar,
farei a leitura dessa parte do voto, por que
S. Ex.• está subscrevendo a posição, a óptica do Ministro Carlos Velloso, assentan-
—150
do que o acórdão impugnado contém dois
fundamentos. Apontei que haveria apenas
um, que se teria chegado à carência do
mandado de segurança tendo em vista a
ilegitimidade. Creio que o Ministro Francisco Rezek acompanhou-me nesse entendimento. Aí, estaríamos diante de um empate relativamente a esse tema. Agora, se
suplantada essa matéria, ficando em corrente minoritária, externo, já de início, o
desejo de pronunciar, em primeiro lugar,
como Relator, o voto no tocante à inexistência de provas.
Sr. Presidente, a rigor estamos diante de
um acórdão que sugere dois enfoques. O
primeiro foi revelado por mim quanto à
existência apenas de um fundamento — a
ilegitimidade ad causam ativa. O segundo
é no sentido de que o acórdão está alicerçado em dois fundamentos: a ilegitimidade e
o envolvimento de matéria probatória de
alta indagação, que não pode ser dirimida
na via estreita do mandado de segurança
Assim, precisamos definir a conclusão
da Tunna no que concerne à base do acórdão proferido.
VOTO (ADITAMENTO)
O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Sr. Presidente, o eminente Ministro
Paulo Brossard ressalta uru aspecto que
realmente procede: é que se, de imediato,
afastarmos o obstáculo, assentado pela Corte
de origem, o Superior Tribunal de Justiça,
e adentrarmos o mérito, ou seja, fizermos o
exame, em si, do que se contém na prova
que foi anexada aos autos, estaremos suprimindo um crivo, e um crivo que diz respeito
à competência originária para apreciação
do mandado de segurança.
Confesso a V. Ex.* que nas notas que
tenho, quanto a essa segunda matéria, não
há uma conclusão a respeito do desiderato.
Creio que quando as elaborei, o fez visando
a reforçar a conclusão concernente à matéria primeira, que deságua na baixa dos autos ao Superior Tribunal de Justiça. Não
R.T.J —150
acredito que haja necessidade de procederse à leitura dessas notas, mas afino com o
eminente Ministro Paulo Brossard, concluindo, portanto, pelo conhecimento e
provimento do recurso nos dois pontos,
para determinar a baixa ao Superior Tribunal de Justiça, a fim de que prossiga na
apreciação do mandado de segurança como
entender de direito. O egrégio Superior Tribunal de Justiça concluiu pela ilegitimidade e apontou, como obstáculo ao sucesso
na via eleita, o envolvimento de matéria
probatória. Caminho no sentido de afastar,
como o Ministro Rezek e também o Ministro Paulo Brossard, a ilegitimidade, e também o óbice relativo ao envolvimento de
matéria fática de alta indagação, e, por conseqüência, determino o retorno dos autos à
Corte de origem, para que prossiga no exame do mandado de segurança corno de
direito.
VOTO
O Sr. Ministro Néri da Silveira (Presidente): Peço vênia ao Sr. Ministro Carlos
Velloso, para acompanhar os votos dos Srs.
Ministros Relator, Francisco Rezek e Paulo
Brossard, pelos fundamentos desenvolvidos no voto do Sr. Ministro PauloBrossard.
119
EXTRATO DA ATA
RMS 21.514 —DF—Rel.: Min. Marco
Aurélio. Rectes.: Confederação Nacional
da Agricultura e outros (Adv.: José Antonio Miguel Neto). Recda.: União Federal.
Decisão: Por maioria de votos, a Turma
conheceu do recurso e lhe deu provimento
para, afastaria a ilegitimidade «ad causam»
das impetrantes, bem assim a iliquidez de
fatos, determinar que o Superior Tribunal
de Justiça prossiga no julgamento do mandado de segurança, como entender de direito. Vencido, em parte, o Sr. Ministro Carlos
Velloso que, não obstante reconhecendo a
legitimidade «ad causam» das impetrantes,
negava provimento ao recurso por entender
ilíquidos os fatos.
Presidência do Sr. Armistro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Paulo Brossard, Carlos Velloso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Cláudio Lemos
Fonteles.
Brasília, 27 de abril de 1993 — José
Wilson Aragão, Secretário.
MANDADO DE SEGURANÇA N° 21.521 — CE
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Carlos Venoso.
Impetrante: Salde Brito Bastos Arruda — Impetrado: Tribunal de Contas da
União.
Constitucional. Administrativo. Pensão por morte: totalidade
dos vencimentos ou proventos do sentar falecida Pensão concedida
anteriormente à Lei n° 8.112, de 1990. CF, art. 40, 5°. Lei n° 8.112, de
1990, art 42, art. 215, art. 248.
I — Pensão por morte, concedida anteriormente à Lei n°
8.112190: passam a ser mantidas pelo órgão ou entidade de origem do
servidor. Lei n° 8.112/90, art. 248. Deverá ela corresponder ao valor da
120
R.TJ. —150
respectiva remuneração ou provento, observado o teto inscrito no art.
37, XI, da Constituição. CF, art. 40, 5°; Lei n° 8.112/90, artigos 215 e
42.
II — Mandado de segurança deferido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por decisão unânime, deferir
o mandado de segurança. Declarou impedimento o Ministro Sepúlveda Pertence.
Brasília, 2 de junho de 1993 — Octavio
Gallotti, Presidente — Carlos Venoso,
Relator.
RELATÓRIO
os cinqüenta por cento de sua pensão que
foram subtraídos no mês de maio p.p.».
Indeferida a medida liminar requerida
(fls. 23/23-v), vieram aos autos as informações prestadas pelo Presidente do Tribunal
de Contas da União (fls. 27/34), em que
transcreve a Decisão n°006/92 —Plenário,
daquele Tribunal, em que se decidiu no
Processo tf TC 016.051191-2-Administrativo, «que os pagamentos pensionais a cargo deste Tribunal devem seguir os mesmos
critérios adotados no âmbito do Poder Executivo: somente se aplica o art. 215 da Lei
n° 8.112/90 quando o óbito ocorrer em data
O Sr. Ministro Carlos Venoso: Trata- posterior à sua vigência». Esclarecem as
se demandado de segurança impetrado por informações que, no caso dos autos, como
servidor em questão faleceu no dia
Salete Brito Bastos Arruda contra ato do
Tribunal de Contas da União, que teria 26-6-88, «força é convir que a pensão dedeterminado a redução, em 50% da pensão vida à sua genitora tem respaldo na Lei n°
que vinha recebendo nos últimos doze me- 3.373, de 1958, que fixa em cinqüenta por
ses, pelo falecimento de seu filho, ex-ser- cento o valor do beneficio (artigo 4°), diploma este que rege a concessão de pensão
vidor do referido Tribunal.
à família do funcionário até o advento da
Diz a impetrante que recebeu comunica- Lei n° 8.112/90. Somente na hipótese de a
ção do Tribunal de Contas da União (fi. 20) causa moras ensejar concessão de pensão
de que aquela Corte havia decidido que as de acidente em serviço ou especial, conforpensões de ex-servidores do Tribunal, fale- me prevê a Lei n° 6.782/80, o que não
cidos antes de 12-12-90, data da vigência aconteceu, poderia a pensão ser compleda Lei n° 8.112/90, que instituiu o Regime mentada, e resultaria a integralização». No
Jurídico dos Servidores Públicos Civis da que concerne à regra do parágrafo 5° do art.
União, das Autarquias e das Fundações 40 da Constituição Federal, observam as
Públicas Federais, sofreriam uma redução informações que «a sua aplicação se faz
de 50%, a partir do mês de maio de 1992, imperiosa quando a remuneração do exo que entende ferir direito adquirido seu, à servidor (instituidor do beneficio) em corvista do que dispõe o art. 40, § 5°, da respondência com os servidores em ativiConstituição.
dade, for passível de revisão, inclusive
Requer, por isso, «a concessão de limi- quando em decorrência de transformação
nar, determinando que o Tribunal de Con- ou reclassificação do cargo ou função, detas da União, na pessoa de seu Excelentís- vendo ser observado, nesse último aspecto,
simo Presidente, pague, como já o vinha o preceituado no parágrafo 4° do mesmo
fazendo, os cem por cento a que tem direi- artigo, conforme entendimento sustentado
to a partir deste mês de junho, bem como no r. Parecer n° SR-90, de 13-6-89, da
R.T.J — 150
doutaConsultoria-Geral da República (DO
de 14-6-89, Seção I, págs. 9403 a 9406),
aprovado pelo Excelentíssimo Sr. Presidente da República».
O parecer do Inspetor-Geral do TCU,
anexado às informações, recebeu a seguinte ementa:
«Mandado de Segurança:
Pensão Civil.
Benefício instituído na vigência
da Lei n° 3.373, de 1958.
O artigo 215 da Lei n° 8.112, de
1990, é aplicável tão-somente às pensões instituídas a partir de 12-12-90.
Subsistem os critérios fixados na Lei n°
3.373/58 para os benefícios deferidos
anteriormente à vigência da nova lei
estatutária.
Inteligência do comando constitucional, ínsito no § 5° do artigo 40 da
Carta Magna e no artigo 20 do ADCT».
Oficiando às fls. 37/38, a ProcuradoriaGeral da República, pelo parecer da ilustre
Subprocuradora-Geral Odília Ferreira da
Luz Oliveira, opina «pela concessão da segurança, mas apenas para garantir o pagamento integral do beneficio, a partir do
ajuizamento do mandado de segurança. Período anterior deverá ser pleiteado na via
ordinária, se não for pago espontaneamente
pela Administração Pública».
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Venoso (Relatar): As pensões antigas, vale dizer, as pensões concedidas antaionnente àLei n° 8.112,
de 1990, eram regidas pela Lei n° 3.373, de
1958, que dispunha que a responsabilidade
pela sua concessão e pagamento era do
INSS e o seu valor corresponderia a 50%
(cinqüenta por cento) do salário-base do
servidor falecido.
A Lei n° 1.711/52, art. 242, e a Lei n°
6.782/80, estabeleciam, ainda, que quando
121
o falecimento do servidor se verificasse em
conseqüência de acidente no desempenho
de suas funções, de doença profissional ou
de doenças especificadas em lei, a família
do mesmo teria direito à pensão especial,
que deveria corresponder a 100% (cem por
cento) do valor do vencimento ou remuneração do servidor falecido. Neste caso, o
INSS pagava os 50% (cinqüenta por cento)
da pensão devida e o Ministério da Fazenda
a complementava.
A Constituição de 1988 e a Lei n° 8.112,
de 1990, alteraram os critérios para fixação
do valor da pensão, estabelecendo que todas elas, independentemente da causa da
morte do servidor, deverão corresponder à
totalidade do vencimento ou provento do
servidor falecido.
E mais: a citada Lei n° 8.112, de 1990,
estabeleceu, expressamente, no seu artigo
248, que as «pensões estatutárias, concedidas até a vigência desta lei, passam a ser
mantidas pelo órgão ou entidade de origem
do servidor».
Quando do julgamento, nesta Corte, do
MI 211-DF, versei o tema Destaco do voto
que então proferi:
0 5° do art. 40 estabelece, na sua
primeira parte, que a «pensão por morte
corresponderá à totalidade dos vencimentos ou proventos do servidor falecido». Depois, acrescenta, na sua segunda
parte: 'até o limite estabelecido em lei,
observado o disposto no parágrafo anterior'. Ora, estabelecendo, primeiramente,
que a pensão corresponderá à totalidade
dos vencimentos ou proventos do servidor falecido, segue-se a impossibilidade
de uma lei dispor a respeito de um
limite que esteja abaixo da totalidade
referida. A frase — 'até o limite estabelecido em lei' — deve ser entendida da
seguinte forma: observado o limite posto em lei a respeito da remuneração dos
servidores públicos, vale dizer, a lei re-
122
R.TJ. —150
ferida no inciso XI do art. 37 da Constituição, que dispõe:
«XI — a lei fixará o limite máximo e a relação de valores entre a
maior e a menor remuneração dos
servidores públicos, observados, como
limites máximos e no âmbito dos respectivos poderes, os valores percebidos como remuneração, em espécie,
a qualquer título, por membros do
Congresso Nacional, Ministros de Estado e Ministros do Supremo Tribunal Federal e seus correspondentes
nos Estados, no Distrito Federal e
nos Territórios, e, nos Municípios, os
valores percebidos como remuneração, em espécie, pelo Prefeito;»
É esta a lei referida no § 5° do art. 40,
da Constituição.
E esta lei já existe. É a Lei n° 8.112,
de 11-12-90, que, no seu art. 215, estabelece:
«Art. 215. Por morte do servidor,
os dependentes fazem jus a uma pensão mensal do valor correspondente
ao da respectiva remuneração ou provento, a partir da data do óbito, observado o limite estabelecido no art.
42.»
Exatamente como dizíamos, dispõe o
art. 42 da Lei 8.112/90:
«Art. 42. Nenhum servidor poderá perceber, mensalmente, a título de
remuneração, importância superior à
soma dos valores percebidos como
remuneração, em espécie, a qualquer
título, no âmbito dos respectivos Poderes, pelo Ministros de Estado, por
membros do Congresso Nacional e
Ministros do Supremo Tribunal Federal.»
Posta assim a questão, indaga-se: as
pensões concedidas anteriormente à Lei
n° 8.112, de 1990, deverão corresponder,
também, ao da respectiva remuneração ou
provento?
A resposta é positiva.
A uma, porque o § dó arit. 40, da
Constituição, refere-se, sem distinguir, ao
benefício da pensão por morte, a dizer que
corresponderá ele à totalidade dos vencimentos ou proventos do servidor falecido.
Quer dizer, o benefício da pensão por morte
vigente quando da promulgação da constituição, viu-se abrangido pela disposição
inscrita no 5° do seu art. 40. A Constituição não se refere às pensa" a serem concedidas a partir da sua promulgação, mas
ao «beneficio da pensão por morte corresponder/ à totalidade dos vencimentos ou proventos do servidor falecido...» A Lei n°
8.112, de 1990, por sua vez, estabelece que,
«por morte do servidor, os dependentes
fazem jus a uma pensão mensal de valor
correspondente ao da respectiva remuneração ou provento, a partir da data do óbito,
observado o limite estabelecido no art. 42».
A lei, tal qual a Constituição, não distingue
entre pensões concedidas e pensões a serem
concedidas.
A duas, porque a Constituição, espancando dúvidas, dispôs, no art. 20 do ADCT;
«Art. 20. Dentro de cento e oitenta
dias, proceder-se-á à revisão dos direitos dos servidores públicos inativos e
pensionistas e à atualização dos proventos e pensões a eles devidos, a fim de
ajustá-los ao disposto na Constituição».
A parte final do art. 20 — «a fim de
ajustá-los ao disposto na Constituição» —
indica que a Constituição concedeu o beneficio, estabelecendo, apenas, um prazo —
cento e oitenta dias —para o processamento da revisão do benefício e a sua atualizagb•
Opinando pelo deferimento da segurança, a Procuradoria-Geral da República, no
parecer de fls. 37/38, lavrado pela ilustre
Subprocuradora-Geral Caia da Luz Oliveira, escreveu:
R.T.J — 150
Por sua vez, o art. 20 do Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias
mandou atualizar os proventos dos servidores públicos inativos e as pensões,
a fim de ajustá-los ao disposto na Constituição. Isso significa que o regime criado pela Carta para as pensões estende-se
lapidas instituídas antes de sua vigência, pois somente a elas poderia dirigirse o preceito transitório, ao determinarlhes a atualização.
A regrado art. 215 daLein°8.112/90
sem dúvida foi expedida para regular as
pensões de acordo com o novo ordena.
mento constitucional e, por isso, aplicase, desde a sua vigência, também aos
benefícios anteriormente instituídos. Não
cabe, porém, fazer revisão retroativa, de
modo a propiciar o pagamento de diferenças anteriores a 1° de janeiro de 1991
(art. 252); isso porque a eficácia do art.
40, § 5°, da Constituição, dependia da
expedição da lei que menciona.
Não deve impressionar a expressão a
partir da data do óbito, constante da
norma em causa, pois indica apenas o
termo inicial da pensão, que deixou de
ser o momento da concessão, para retroagir à data de seu fato gerador». (fi. 38)
Esclareça-se que o Supremo Tribunal
Federal, administrativamente, com base em
parecer de sua Comissão de Regimento,
123
integrada dos Srs. Ministros Moreira Alves, nanar Gaivão e eu, dá aplicação ao
entendimento acima exposto (Proc. Administrativo n° 14.920-9/91).
Do exposto, defiro o mandado de segurança. Nãolhahonorários advocatícios (Súmula n° 512).
EXTRATO DA ATA
MS 21.521— CE — Rel.: Min. Carlos
Venosa Impte.: Salete Brito Bastas Amada. (Adv. Jose Maria Viana de Souza).
Impdo.: Tribunal de Contas da União.
Decirtto Por votação unanime, o Tribunal deferiu o mandado de segurança. Votou
o Presidenta Declarou impedimento o Ministro Sepúlveda Pertence. Procurador-Geral da República, Dr. Moacir Antonio Machado da Silva, na ausência ocasional do
Dr. Aristides Junqueira Alvarenga.
Presidência do Sr. Ministro °atavio Gallotti. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Néri da Silveira, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Venoso, Marco Auraio,1/mar Gaivão e Francisco Rezek. Ausentes, justificadamente, os
Srs. Ministros Moreira Alves e Sydney Sanches. Procurador-Geral da República, Dr.
Aristides Junqueira Alvarenga.
Brasília, 2 de junho de 1993 — Luiz
Tomimatsu, Secretário.
HABEAS CORPUS N° 67.759* — RJ
(Tribunal Pleno)
(Md na RTJ 148/181)
Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello
Pacientes: Carla Esteves de Azevedo Guedes e outra — Impetrante: Nélio
Roberto Seidl Machado — Castor: Superior Tribunal de Justiça
Haia corpus. Ministério Público. Sua declinação constitucional. Princípios institucionais. A questão do promotor natural em face
da Constituição de 1988 Alegado excesso no exercício do poder de densas* Republicado, por ter saído com incorreção na RTJ 146/794.
124
R.T.J. —150
dar. Inocorrinda. Constrangimento injusto não caracterizado. Pedido
indeferido.
O postulado do Promotor Natural, que se revela imanente
ao sistema constitucional brasileiro, repele, a partir da vedação de
designações casuísticas efetuadas pela Chefia da Instituição, a figura do
acusador de exceção. Esse princípio consagra uma garantia de ordem
jurídica, destinada tanto a proteger o membro do Ministério Público, na
medida em que lhe assegura o exercício pleno e independente do seu
oficio, quanto a tutelar a própria coletividade, a quem se reconhece o
direito de ver atuando, em quaisquer causas, apenas o Promotor cuja
intervenção se justifique a partir de critérios abstratos e pré-determinados, estabelecidos em Id.
A matriz constitucional desse princípio assenta-se nas cláusulas da independência funcional e da inamovibilidade dos membros da
Instituição. O postulado do Promotor Natural limita, por isso mesmo, o
poder do Procurador-Geral que, embora expressão visível da unidade
institucional, não deve exercer a Chefia do Ministério Público de modo
hegemônico e incontrastável.
Posição dos Ministros Celso de Mello (Relator), Sepúlveda
Pertence, Marco Aurélio e Carlos Velloso. Divergência, apenas, quanto à
aplicabilidade imediata do princípio do Promotor Natural: necessidade
da interpostao legislatoris para efeito de atuação do princípio (Ministro
Celso de Mello); incidência do postulado, independentemente de intermediação legislativa (Ministros Sepúlveda Pertence, Marco Aurélio e
Carlos Velloso).
Reconhecimento da possibilidade de instituição do princípio do Promotor Natural mediante lei (Ministro Sydney Sanches).
Posição de expressa rejeição à existência desse princípio
consignada nos votos dos Afinistros Paulo Brossard,Octavio Gallotti,Néri
da Silveira e Moreira Alves.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata de julgamento e das notas
taquigráficas, por maioria de votos, em indeferir o pedido de «habeas corpos».
Brasília, 6 de agosto de 1992 — Sydney
Sanches, Presidente — Celso de Mello,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Celso de Mello: O Ministério Público Federal, em parecer da lavra do ilustre Subprocurador-Geral da Re-
pública, em substituição, Dr. Mordem Costa Pinto, assim resumiu e apreciou a espécie destes autos (fls. 198/205), verbis:
«Trata-se de habeas corpos impetrado pelo advogado Nélio Roberto Seidl
Machado, em favor de Carla Esteves de
Azevedo Guedes e outra, alegando o
seguinte:
a) as pacientes foram presas em
flagrante, na cidade do Rio de Janeiro, acusadas de envolvimento no crime de tráfico de substância tóxica,
como resultado da gigantesca operação policial chamada 'Operação
Bandeja';
R.T.J —150
o procedimento policial foi distribuído ao Juiz de Direito da 5` Vara
Criminal da cidade do Rio de Janeiro,
onde o Promotor Público titular, Dr.
Avelino Gomes Moreira Neto, opinou pela concessão de liberdade provisória às pacientes, mediante o
pagamento de fiança, entendendo
ainda que na hipótese se não configurava tráfico ilícito de substância tóxica;
no dia seguinte ao pronunciamento do Dr. Avelino Gomes Moreira Neto, Promotor titular da 5' Vara
Criminal, o Procurador-Geral da Justiça do Estado do Rio de Janeiro editou portaria designando o Promotor
Luiz Carlos Rodrigues da Costa para
acompanhar o Inquérito n° 032/89,
em que as pacientes figuravam como
indiciadas, bem como em todos os
demais inquéritos resultantes da chamada 'Operação Bandeja' (fl. 74);
o Promotor designado ofereceu
dentmcia contra as pacientes, perante
o Juiz Criminal da 5' Vara do Rio de
Janeiro, imputando a elas o crime de
tráfico de substância tóxica (fis.
51/57);
impetrou habeas coreus perante o Tribunal de Justiça do Rio de
Janeiro, visando anular a ação penal
(fls. 22/42), sendo denegada a ordem
(fls. 9W103);
f) inconformado interpôs recurso
ordinário para o Superior Tribunal de
Justiça, que por maioria negou provimento ao mesmo (fls. 106/112
132/160);
g) em face da decisão do Superior
Tribunal de Justiça, que negou provimento ao recurso ordinário, impetrase habeas corpus originário perante
o Supremo Tribunal Federal, visando
a anulação do procedimento penal,
ao fundamento de que restou violado, com a nomeação de promotor
125
especial, o princípio constitucional
do Promotor Natural.
O presente writ é de ser conhecido,
pois eventual coação ilegal teria partido
do Superior Tribunal de Justiça, que negou provimento ao recurso ordinário
interposto pelas pacientes, passando assim a coator, corno ficou decidido no
HC 67.263-9-SP, Pleno, onde o eminente Ministro Moreira Alves enfatizou
que é sempre lícito ao interessado chegar ao Supremo Tribunal Federal '... por
meio do habeas expus originário (art.
102, I, i, da Constituição), se, interposto
recurso ordinário ao Superior Tribunal
de Justiça, este lhe negar provimento,
tornando-se, assim, o coator'.
No mérito, somos pela concessão
da ordem.
É que o princípioda independência
funcional do Ministério Público, agora
constitucionalmente assegurado (art.
127, P, da Carta Magna), implica na
consideração de que foi instituída a figura do Promotor Natural.
Efetivamente, se o chefe do Ministério Público, ou órgão de sua estrutura,
colegiado ou singular, não pode impor
ao Promotor sua linha de orientação,
dizendo a ele como deve agir em tal ou
qual hipótese, porque estaria violando a
sua autonomia funcional, não pode também afastá-lo do oficio para onde foi
legalmente designado, ou restringir a
sua atuação em face de determinado
caso, porque istó significa forma eficaz
de contornar, na prática, o princípio do
Promotor Natural, não devendo ser esquecido que tal ocorre, sempre, quando
há divergência ou possibilidade dela,
entre o posicionamento do Promotor de
Justiça, frente a uma situação concreta,
e o do Procurador-Geral.
6. Na hipótese em debate fica clara
esta divergência, pois a portaria designando Promotor Especial foi editada,
sem qualquer motivação ou justificati-
126
R.T.J. — 150
va, no dia seguinte ao pronunciamento
doPromotor titular daflaraCraninal,
opinando pela concessão de liberdade provisória e adiantando que entendia inexistente o crime do art. 12 da
Lei n° 6.368/76, resultando no oferecimento de denúncia por crime de tráfico de substância tóxica (fls. 51/53 e
74).
O fato de existir um chefe não
significa que exista qualquer tipo de subordinação funcional, sendo o Promotor
ou qualquer membro inteiramente livre
para exercer a sua atividade, oficiando
autônoma e fundamentadamente, com
obediência exclusiva à lei e a sua consciência.
Daí se extraio princípio do Promotor Natural que não é apenas regalia
funcional individual do órgão ou membro da instituição, que deve atuar livremente nos processos afetos ao limite de
suas atribuições, conforme determinação legal, mas principalmente uma garantia de todo cidadão ou entidade
jurídica no sentido de que está afastada
a possibilidade da existência do Promotor de Exceção, havendo sempre, conforme determinação legal preexistente,
um órgão específico do Ministério Público atuando de forma independente e
com legitimidade processual, sendo ao
mesmo tempo uma garantia individual e
social.
9.0 Professor Paulo Cegar Pinheiro
Carneiro, ilustre Promotor de Justiça do
Estado do Rio de Janeiro, em atualià simo trabalho intitulado «O Ministério
Público no Processo Civil e Penal —
Promotor Natural — Atribuição e Conceito», Forense, 2' edição, traz importante contribuição doutrinária sobre o
tema, que vale a pena ser transcrita, verbis:
'Esta garantia social e individual
permite ao Ministério Público cumprir, livre de pressões e influências, a
sua missão constitucional de defesa
da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. Qual a
garantia que se poderia dar a alguém,
à própria sociedade, de que a lei seria
cumprida na hipótese de ficar ao arbítrio de determinada autoridade a
escolha do membro do Ministro Público para examinar da conveniência
ou não de promover ação penal em
face de alta autoridade pública, para
promover ou não ação cível contra
poderosa fábrica que polui o ar de
determinada região pobre; para promover ação visando a apurar abuso e
omissões de autoridade; para coibir
abuso de autoridade ou poder econômico; para intervir, em geral, nos
proce,ssos nos quais está em jogo direito social ou individual indisponível? Certamente nenhuma.
O princípio do promotor natural
pressupõe que cada órgão da instituição tenha, de um lado, as suas
atribuições fixadas em lei e, de outro, que o agente que ocupa legalmente o cargo correspondente ao seu
órgão de atuação, seja aquele que irá
oficiar no processo correspondente,
salvo as exceções previstas em lei,
vedado, em qualquer hipótese, o
exercício das funções por pessoas
estranhas aos quadros do parquet'
(fi. 53).
Parece-nos, mais, que o princípio
do Promotor natural encontra apoio ainda nos princípios constitucionais da
proibição do Juízo ou Tribunal de exceção e do devido processo legal (art. 5°,
incisos XXXVIII e LIV, da Carta Magna), bem como na garantia da inamovibilidade.
Efetivamente, não se concebe a
garantia da inexistência de Juízo ou Tribunal de exceção com a possibilidade
concreta da existência da acusação ad
R.T.J —150
hoc, especialmente designada, onde é
possível antever desempenho inconseqüente ou dirigido, às vezes com sacrifício da função institucional do Ministério Público, que é a defesa intransigente
da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais
indisponíveis.
Por outro lado, a garantia do devido processo legal não se realizará plenamente sem a certeza de que não haverá acusador de exceção, pois qualquer
procedimento só Será considerado legítimo assegurada a atuação livre e independente de órgão ou autoridade com
atribuição funcional previamente fixada
em lei.
Neste ponto, é válido trazer à
colação o Magistério de Hugo Nigro
Mazzilli, ilustre membro do Ministério
Público do Estado de São Paulo, em sua
obra o 'Ministério Público na Constituição de 1988', Saraiva, 1989, página 79,
verbis:
'Não há dúvida de que, normalmente, quando a Constituição menciona 'processar e julgar', está
querendo referir-se à tarefa jurisdicional (cf. arts. 52, I e II, 102,1, 105,
I, 108, I e 109).
Entretanto, partindo-se da exclusividade da promoção da ação penal,
agora conferida ao Ministério Público (art. 129, 1), bem como considerando-se a inamovibilidade comum
de que gozam juízes e promotores
(arte. 95, II, e 128, § 5°, I, b), bem
como o procedimento da independência funcional que não é uma garantia só para o órgão, e sim para a
sociedade, final destinatária de sua
atuação, vemos que o princípio do
promotor natural hoje faz parte do
devido processo legal (CF, art. 5°,
LIII e LIV). Assim, sob esse prisma,
enorme do art. 5°, LIII, pode também
ser considerada, a um só tempo, o
127
princípio do juiz e do promotor com
competência ou atribuição legal para
oficiarem no caso.
É o mesmo princípio do promotor
natural, mas agora sob uma ótica diversa Realmente, este é o primeiro
direito do acusado: não apenas o de
ser julgado por uru órgão independente do Estado, mas até mesmo antes disso, o de receba a. acusação
independente, de um órgão do Estado escolhido previamente segundo
critérios e atribuições legais, abolidos não só o procedimento de ofício
e a acusação privada, como enfim e
principalmente eliminada a figura do
próprio acusador público de encomenda, escolhido pelo ProcuradorGeral de Justiça.'
É preciso ressaltar que tal princípio só admite as exceções previstas em
lei, tais como licença, remoção, férias,
etc., não sendo possível o afastamento
sem motivação legal, nem a evocação
inconseqüente, como na hipótese dos
autos.
Aqui é preciso novamente trazer
a doutrina do Professor Paulo Cezar Pinheiro Carneiro, obra citada, verbis:
'Todo e qualquer ato do Procurador-Geral que contrarie tal principio,
ainda que editado com aparência de
legalidade como designações, evocação, delegação e formação de grupos
especiais, é absolutamente nulo; incapaz de produzir qualquer tipo de
efeito e sujeito a medidas legais que
visem ao restabelecimento da observância do princípio do promotor natural, como examinaremos adiante.'
(fl. 53)
16. A possibilidadqe da ação privada
nos crimes de ação pública, no caso de
inércia do acusador, não descaracteriza
o princípio do Promotor Natural, seja
porque se trata de exceção prevista em
lei, seja porque o Promotor do caso não
128
R.TJ. — 150
é afastado de suas funções, podendo inclusive aditar a queixa, repudiá-la e oferecer denúncia substitutiva, e intervir
em todos os termos do processo, na forma do que dispõe o art. 29 do Código de
Processo Penal.
17.O mesmo é de ser dito em relação
ao art. 28 do Código de Processo Penal,
vez que se trata de outra exceção prevista em lei, onde o Procurador-Geral ou o
Promotor por ele designado passa a ser
o acusador legal, sendo certo ainda que
não há, na hipótese, o afastamento do
Promotor Titular e que tal decorre justamente da necessidade de conciliar o princípio da independência funcional com o
resguardo dos interesses da sociedade.
Em conclusão pode-se dizer que
a Constituição Federal de 1988 adotou
o princípio do Promotor Natural, ao estabelecer a independência funcional do
Ministério Público como um dos atributos da instituição, o que significa dizer
que a substituição do Promotor legalmente designado para ter ofício em determinada Vara só pode ocorrer em
decorrência de apressa autorização legal (férias, licença, remoção, etc.), arredada a possibilidade do afastamento Ga
offido ou injustificado, como ocorreu
no caso em exame.
Pelo exposto, somos pelo conhecimento e concessão da ordem, anulando-se o procedimento penal, por violação do princípio do Promotor Natural,
facultada a possibilidade de apresentação de nova denúncia através de Promotor com atribuição legal para tanto.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Celso de Mello (Relato): Com a nova Constituição brasileira,
promulgada em 1988, fortaleceu-se, por
soberana deliberação da Assembléia Nacional Constituinte, a instituição do Minis-
cério Público, por ela própria qualificada
como permanente e essencial à função
jurisdicional do Estado (art. 127).
Ao elaborar para o Excelentíssimo Senhor Consultor-Geral da República, Dr.
Saulo Ramos, a Exposição de Motivos que
fundamentou o encaminhamento ao Congresso Nacional, pelo Excelentíssimo Sr.
Presidente da República, do Projeto de lei
que institui a Lei Orgânica Nacional do
Ministério Público e dispõe sobre normas
gerais para a sua organização nos Estadosmembros, expendi algumas pcadaações —
das quais guardo ame convicção —,
motivadas pela magnitude do tema e estimuladas pela inquestionável relevância que
assumem, aqui e agora, as implicações decorrentes da inconstitucionalização do novo
Ministério Público.
Pude, então, afirmar que foram plenas
de significação as conquistas institucionais
obtidas pelo Ministério Público ao longo
do processo constituinte de que resultou a
promulgação da nova Constituição do Brasil. Com a reconstrução da ordem constitucional, emergiu o Ministério Público sob o
signo da legitimidade democrática. Ampliaram-se-lhe as atribuições; dilatou-selhe a competência; reformulou-se-lhe a fisionomia institucional; conferiram-se-lhe
os meios necessários à consecução de sua
destinação constitucional, atendendo-se,
finalmente, a antiga reivindicação da própria sociedade.
Posto que o Ministério Público não constitui órgão ancilar do Governo, instituiu o
legislador constituinte um sistema de garantias destinado a proteger o membro da
Instituição — o Promotor de Justiça —,
cuja atuação independente configura a confiança de respeito aos direitos, individuais
e coletivos, e a certeza de submissão dos
Poderes à lei.
É indisputável que o Ministério Público
ostenta, em face do ordenamento constitucional vigente, destacada posição na estrutura do Poder. A independência institucio-
R.TJ 150
nal, que constitui uma de suas mais expressivas prerrogativas, garante-lhe o livre desempenho, em toda a sua plenitude, das
atribuições que lhe foram conferidas.
O eminente Hely Lopes Meirdles (v.
«Estudos e Pareceres de Direito Público»,
vol. VII/332, 335 e 336, 1983, RI), discorrendo sobre aspectos institucionais referentes ao Ministério Público, acentua a importância de ser ele concebido como órgão
funcionalmente independente, verbis:
«Fixada a posição do Ministério Público na estrutura constitucional da nossa Federação, sobressai, desde logo, a
sua independência funcional, pois que
não está hierarquizado a qualquer outro
órgão ou Poder, e seus membros são
agentes políticos desvinculados do Estatuto dos Funcionários Públicos.
129
ra, emerge para a experiência concreta de
uma vida democrática
A ruptura do Ministério Público com os
conceitos tradicionais do passado — segundo os quais seria o fiscal da lei, de
qualquer lei, por mais injusta ou arbitrária
que fosse — impõe-se, hoje, como decorrência de novas exigências ético-políticas a
que essa Instituição deve, por um imperativo democrático, submeter-se e, também,
em face da reformulação a que foi submetida no plano constitucional.
A nova Constituição do Brasil proclama, em seu artigo 127, caput, que
«O Ministério Público é instituição
permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.»
Ora, no que concerne ao desempenho
Esse novo perfil institucional traduz, de
da função ministerial, pelo órgão (AC) modo
expressivo, um dos aspectos mais
e seus agentes (Promotores, Procurado- importantes
destinação constitucional
res), há independência de atuação e não do MinistériodaPúblico,
agora investido, por
apenas 'autonomia funcional'. Os mem- efeito de soberana deliberação
da Assembros do Ministério Público quando de- bléia Nacional Constituinte, da inderrogásempenham as suas atribuições instituatribuição de velar pela intangibilidade
cionais não estão sujeitos a qualquer vel
e
integridade
da ordem democrática.
subordinação hierárquica ou supervisão
orgânica do Estado a que pertencem.
Assim, o Ministério Público não deverá
mais só considerar, no desempenho de suas
relevantes funções, o aspecto formal ou
No mais, os membros do Ministério exterior do direito positivo. Mais imporPúblico atuam com absoluta liberdade tante, agora, toma-se o próprio conteúdo
funcional, só submissos à sua consciên- da lei, cujos elementos intrínsecos não pocia e aos seus deveres profissionais, pau- dem divorciar-se dos fatos sociais e do
tados pela Constituição e pelas leis re- quadro histórico em que a norma jurídica
gedoras da Instituição. Nessa liberdade se formou.
de atuação no seu ofício, é que se expresO Estado democrático, gerador de uma
sa a independência funcional (...).»
ordem jurídica fundada no consentimento
Cumpre, por isso mesmo, neste expres- dos governados — que se exterioriza pela
sivo momento histórico em que o Ministé- livre e permanente penetração da sua vonrio Público se situa entre o seu passado e o tade no processo decisório nacional —
seu futuro, refletir sobre a natureza da mis- deve ser entendido como aquele cujas bases
são institucional que a ele incumbe desem- repousam na soberania popular, na divisão
penhar no seio de uma sociedade que, ago- funcional do Poder, no respeito e na garan-
130
R.TJ.— 150
tia das liberdades públicas, e no pluralismo
de expressão e de organização política.
A legalidade assim posta, veiculadora
das justas aspirações e dos objetivos maiores perseguidos pelo corpo social, qualifica-se como democrática, passível, em conseqüência, da tutela institucional do Ministério Público.
Este, pois, deixa de ser um servo incondicional de qualquer legalidade, para converter-se num órgão que indague das origens da norma e lhe perquira o conteúdo,
valendo-se, para tanto, de critérios axiolt5gicos que lhe permitam aferir dos elementos que qualificam a regra jurídica como
essencialmente democrática Não mais o
mero e insuficiente controle formal da legalidade. Pretende-se, agora, investir o Ministério Público de um poder de verificação
e de tutela sobre a legitimidade ética e
política da própria norma de direito.
A obra do legislador, no que pertine ao
seu conteúdo está necessariamente condicionada pelas relações sociais, pelas normas de cultura, pelas concepções que vigoram na formação social em que atua e — o
que se revela essencial — deve estar legitimada pelo consenso dos governados.
Sem a observância desses condicionamentos, o direito posto pelo Estado refletirá, por suas intrínsecas distorções, um ato
de criação arbitrária, distanciado do bem
comum, cuja consecução traduz o próprio
fundamento teleológico da organização estatal.
A nova disciplina constitucional do Ministério Público redefiniu o sentido e o
caráter de sua ação institucional, para que
nele se passe, agora, a vislumbrar o instrumento de preservação de um ordenamento
democrático.
A essencialidade dessa posição políticojurídica do Ministério Público assume tamanho relevo que ele, deixando de ser o
fiscal de qualquer lei, converte-seno guar-
dião da ordem jurídica cujos fundamentos
repousam na vontade soberana do Povo.
O Ministério Público deixa, pois, de fisMissas a lei pela lei, num inútil exercício de
mero legalismo. Requer-se dele, agora, que
avalie, criticamente, o conteúdo da norma
jurídica, aferindo-lhe as virtudes intrínsecas, para, assim, neutralizar o absolutismo
formal de regras legais, muitas vezes divorciadas dos valores, idéias e concepções vigentes na comunidade, em dado momento
histórico-cultural.
Não mais se pode, assim, exigir do Ministério Público um comportamento institucional que traduza, em face da ordem
jurídica estabelecida, uma postura de neutralidade axiológica.
O tratamento dispensado ao Ministério
Público pela nova Constituição conferelhe, no plano da organização estatal, uma
posição de inegável eminência, na medida
em que se lhe conferiram funções institucionais de magnitude irrecusável, dentre as
quais avulta a de «zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de
relevância pública aos direitos assegurados
nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia» (v. CF/88,
artigo 129, inciso II).
O Ministério Público, em face dessa regra, tomou-se, por destinação constitucional, o defensor do povo.
Numa relação dilemática, em que confl item os interesses do governo e os do
povo, não há, para o Ministério Público,
alternativa politicamente válida e moralmente digna, senão a da intransigente defesa dos valores pertencentes à Nação, mesmo que sob o injusto assédio dos curadores
— de quaisquer curadores — do regime.
A tutela de um direito abstrato, que permita a destruição das liberdades públicas e
autorize o arbítrio, pela hipertrofia da coerção estatal, subjugando e aniquilando o
indivíduo, não pode constituir missão institucional do Ministério Público.
R.T.J — 150
O novo perfil do Ministério Público
representa, portanto, resposta significativa
aos anseios e postulações dos que, perseguidos pelo arbítrio e oprimidos pela onipotência do Estado, a ele recorrem, na
justa expectativa de verem restaurados os
seus direitos.
A responsabilidade social do Ministério
Público toma-se, por isso mesmo, imensa;
todos os membros da Instituição são, agora,
depositários da fé e da confiança do Povo
que, com eles, celebrou o compromisso,
grave e inderrogável, da liberdade e do
respeito aos seus direitos e às suas garantias.
Combatendo o arbítrio, insurgindo-se
contra os que violam, com prepotência, as
franquias individuais, transformando o protesto de vítimas indefesas em ação realizado= da Justiça, repudiando as leis injustas,
porque desvinculadas dos anseios e do consentimento dos governados, em assim agindo, o Ministério Público terá dado o testemunho que a Nação dele espera.
O princípio do Promotor Natural, tendo presente a nova disciplina constitucional do Ministério Público, ganha especial
significação no que se refere 210 objetivo
último decorrente de sua formulação doutrinária trata-se de garantia de ordem jurídica destinada tanto a proteger o membro
da Instituição, na medida em que lhe assegura o exercício pleno e independente de
seu oficio, quanto a tutelara própria coletividade, a quem se reconhece o direito de
ver atuando, em quaisquer causas, apenas
o Promotor cuja intervenção se justifique a
partir de critérios abstratos e pré-determinados, estabelecidos em lei.
Intuiu a existência desse postulado, em
nosso sistema de direito positivo, o eminente Ministro Antonio Neder, cujas observações sobre o tema registrou em voto
proferido nesta Corte (RTJ 63/315):
«O Sr. Ministro Antonio Neder. Entendo que não pode, porque, entre nós,
domina o princípio da legalidade da ação
131
penal, ou, mais precisamente, o da legalidade comum, ou ordinária, da ação
penal, tanto que o art. 153, § 15, da
Constituição, texto da Emenda
1, expressa que não haverá tribunais de exceção; ora, se é proibido o tribunal de
exceção, vedado é o juiz de exceção; se
é defeso instituir juízo de exceção, impedido é conceber-se o acusador de
exceção, pois não se compreende que
nossa Constituição proíba o juiz de exceção e admita o acusador de exceção,
isto é, conceda e, ao mesmo tempo, subtraia uma garantia» (Grifei.)
O eminente Professor Paulo Cezar Pinheiro Carneiro, membro ilustre do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, ao versar o tema ora proposto pelo impetrante («O Ministério Público no processo civil e penal — Promotor Natural —
Atribuição e Conflito», págs. 52/54, 3' ed.,
1990, Forense), analisou, no plano doutrinário e conceituai, a noção de Promotor
Natural, acentuando, verbis:
e
«A teoria do promotor natural ou legal, como anteriormente afirmado, decorre do princípio da independência, que
é imanente à própria instituição. Ela resulta, de um lado, da garantia de toda e
qualquer pessoa física, jurídica ou formal que figure em determinado processo que reclame a intervenção do Ministério Público, em ter um órgão específico do parquet atuando livremente com
atribuição predeterminada em lei, e, portanto, o direito subjetivo do cidadão ao
Promotor (aqui no sentido lato), legalmente legitimado para o processo. Por
outro lado, ela se constitui também como
garantia constitucional do princípio da
independência funcional, compreendendo o direito do Promotor de oficiar nos
processos afetos ao âmbito de suas atribuições.
Este princípio, na realidade, é verdadeira garantia constitucional, menos dos
membros do parquet e mais da própria
132
R.TJ. — 150
sociedade, do próprio cidadão em que o
MI2 atua, que nenhuma autoridade ou
poder poderá escolher Promotor ou Procurador específico para determinada
causa, bem como que o pronunciamento
deste membro do MI' dar-se-á livremente, sem qualquer tipo de interferência de
terceiros.
Esta garantia social e individual permite ao Ministério Público cumprir, livre de pressões e influências, a sua missão constitucional de defesa da ordem
jurídica, do regime democrático e dos
interesses sociais e individuais indisponíveis. Qual a garantia que se poderia
dar a alguém, à própria sociedade, de
que a lei seria cumprida, na hipótese de
ficar no arbítrio de determinada autoridade a escolha do membro do Ministério
Público para examinar da conveniência
ou não de promover ação penal em face
da alta autoridade pública; para promover ou não ação cível contra poderosa
fábrica que polui o ar de determinada
região pobre; para promover ação visando apurar abuso e omissões de autoridades; para coibir abuso de autoridade ou
poder econômico; para intervir, em geral, nos processos nos quais está emjogo
direito social ou individual indisponível? Certamente nenhuma.
O princípio do promotor natural pressupõe que cada órgão da instituição tenha, de um lado, as suas atribuições
fixadas em lei e, de outro, que o agente,
que ocupa legalmente o cargo correspondente ao seu órgão de atuação, seja
aquele que irá oficiar no processo correspondente, salvo as exceções previstas em lei, vedado, em qualquer hipótese, o exercício das funções por pessoas
estranhas aos quadros do parquet.
Todo e qualquer ato do ProcuradorGeral que contrarie tal princípio, ainda
que editado com aparência de legalidade
como designações, avocação, delegação
e formação de grupos especiais, é abso-
lutamente nulo, incapaz de produzir qualquer tipo de efeito e sujeito a medidas
legais que visem ao restabelecimento da
observância do princípio do promotor
natural, como examinaremos adiante.
Por outro lado, não há como se admitir a possibilidade da designação de pessoas estranhas aos quadros do Ministério Público (promotor ad hoc) para o
exercício de suas funções próprias, pois
a garantia primeira da teoria do promotor natural pressupõe prévia investidura
do agente no cargo e, portanto, no seu
órgão de atuação, na forma prevista na
Constituição.»
A exigência de atuação independente
do membro do Ministério Público, pautada
nos justos valores que devem informar a
elaboração do conteúdo normativo da lei,
reside na gênese da formulação do princípio do Promotor Natural, a que repugnam
interferências ilegítimas da Chefia da Instituição, que rompem, mediante designa' tinas e arbitrárias, a regular
ções casais
ordem de distribuição dos processos e encargos funcionais.
É preciso velar pela dignidade institucional do Ministério Público e impedir que
Procuradores-Gerais, despojados da consciência que lhes impõe o momento histórico que vive a Instituição, venham, por razões mores ou pela desprezível vontade
de agir servilmente, a degradá-la, convertendo-a, desse modo, em inaceitável instrumento de pretensões contestáveis.
Dessa expressiva garantia jurídica, em
que se traduz o princípio do Promotor Natural, teve percepção, em sua época, com
seu agudo senso de justiça e de independência, o eminente Roberto Lyra («Como
Julgar, como Defender, Como Acusar», pág.
121, 1975, Konfino), cuja advertência, extraída da descaracterização do Ministério
Público no plano da organização estatal,
cumpre não ser esquecida em momento
algum:
R.T.1 —150
«Pela primeira vez, na história do
Ministério Público, procuradores-gerais
seriam substituídos e, sobretudo, escolhidos à mercê de réus. O escândalo
dessa dissolução moral seria, além de
tudo, contraproducente, pois a Magistratura ficaria suscetibilizada no mais
santo de suas cóleras. Exercendo a Procuradoria-Geral, na última fase de minha carreira, impedi que o Ministério da
Guerra escolhesse o promotor público
(sempre o mesmo) em processos relativos à liberdade de imprensa.»
Esse notável membro do Ministério Público paulista que é biques de Camargo
Penteado, ao desenvolver a noção conceituai de Promotor Natural e insistir no alcance desse princípio («O Princípio do Promotor Natural», in Juritis', vol. 129/114-124)
—IL. os membros do parquet terão cargos
específicos, proibidas as simples e discricionárias designações, afastando-se Promotor de Justiça ad
—, assim se
refere, na perspectiva do tema, ao órgão
da Acusação Pública:
«... Estruturar-se-á em lei consentânea com o princípio outorgado. Está claro que o mesmo texto que assegura
ampla defesa contém o princípio da acusação constitucionalmente adequada;
isto é, por órgão próprio, criado pela
Constituição, estável, independente, designado para o cargo e não para o encargo determinado, para as funções e não
para o ato especifico.
Quando a Constituição Federal assegura ampla defesa e cria o Ministério
Público há que se extrair do sistema
integral a conclusão de que o Parquet
deve ser o primeiro interessado na realização concreta e antecipada daquele
princípio e, portanto, direta e substancialmente voltado para acusação advinda da naturalidade de seu organismo e
da normalidade decorrente da distribuição legal dos serviços.
133
Governo algum pode interferir no
Ministério Público para obter acusação
contra inimigo político, sob pena de violação dos princípios da igualdade e da
ampla defesa. Não basta o controle jurisdicional posterior, eis que a todo indivíduo deve ser assegurado o direito de
jamais ver seu nome inserido numa denúncia sem supedâneo suficiente. E o
contrário deve igualmente ser analisado.
Governo algum pode interferir no Parquet para obter denúncia que jamais
chegará a bom termo ou arquivamento
que deixará de levar à condenação justamente aquele que feriu a ordem jurídica.»
O princípio do Promotor Natural, já contemplado em suas linhas essenciais pela
legislação paulista concernente ao Ministério Público (Lei Complementar Estadual n°
304, de 1982, artigo 123), pode ser assim
enunciado: nenhum membro do Ministério
Público poderá ser afastado do desempenho de suas atribuições nos procedimentos
em que oficie, ou deva oficiar, exceto por
relevante motivo de interesse público, por
impedimento ou suspeição ou por razões
decorrentes de férias, licenças ou afastamento.
O reconhecimento desse princípio, que
se revela imanente à disciplina constitucional do Ministério Público, objetiva conferir
efetividade a dois postulados fundamentais: um, o da independência funcional, e
outro, o da inamovibilidade dos membros
da Instituição.
Tais postulados vinculam e limitam, por
seu conteúdo mesmo, o poder do Procurador-Geral, que, embora expressão visível
da unidade institucional, não deve exercer
a Chefia do Ministério Público de modo
hegemônico e incontrastável.
O princípio da independência funcional
reveste-se de caráter tutelar. É de ordem
institucional (CF, art. 127, 4 1°) e, nesse
plano, acentua a posição autônoma do Ministério Público em face dos Poderes da
134
R.TJ. — 150
República, com os quais não mantém vínA inamovibilidade, pois, enquanto gaculo qualquer de subordinação hierárqui- rantia subjetiva de independência, concerco-administrativa.
ne não só ao cargo, mas, especialmente, às
respectivas
funções, que não poderão dele
O magistério de José Frederico Marques («A Reforma do Poder Judiciário», ser destacadas pelo Procurador-Geral e, por
vol. 1/175, 1979, Saraiva) sobre esse tema ato deste, deferidas a outro Promotor/Procurador. Atribuir legitimidade a esse proé esclarecedor:
cedimento do Chefe do Ministério Público
«O Ministério Público é funcional- equivaleria a justificar o descumprimento
mente independente, porquanto, apesar indireto da garantia da inamovibilidade
de órgão da administração pública, não e, como necessário efeito conseqüencial,
é ele instrumento à mercê do governo e dar causa, injustificável, ao virtual esvado Poder Executiva (...). Independente ziamento das funções inerentes ao cargo
é, também, o Ministério Público, da ma- ocupado por membro do Ministério Públigistratura judiciária, que, sobre ele, ne- co.
nhum poder disciplinar exerce. Entre o
Não podem ser considerados, assim, ilijuiz e o promotor de justiça, existem
mitados
os poderes de avocação e de derelações de ordem processual tão-somente. Não cabe ao magistrado judicial signação do Procurador-Geral, inobstante
dar ordens ao Ministério Público, no esta Corte, por sua Colenda 2 • Turma, rel.
plano disciplinar e da jurisdição censt5- Ministro Moreira Alves, haja acentuado,
em função do princípio da unidade instituria
cional, que
Essa independência funcional do Mi«O Ministério Público é uno e pode,
nistério Público foi expressamente recoportanto, seu Chefe avocar qualquer
nhecida pelo Supremo Tribunal Federal,
processo ou designar promotor para que
quando, ao julgar procedente representanele ofereça denúncia.»
ção de inconstitucionalidade que se lhe
(RT 553/428).
submetera, proclamou a ausência absoluta de subordinação administrativa do MiNessa perspectiva, tais poderes, embora
nistério Público ao Poder Judiciário (RTJ derivados dos princípios da unidade e
95/980, rel. Ministro Moreira Alves).
da indivisibilidade da Instituição, sofrem,
O princípio da inamovibilidade, por sua hoje, o condicionamento de outro princívez, revela-se fonte matricial da tese que pio também constitucional — o da indeacolhe o princípio do Promotor Natural. pendência funcional — e encontram limite
Atua como garantia de ordem subjetiva, na garantia da inamovibilidade que, alçada
tendo por destinatário precípuo o próprio ao plano da Constituição, assiste, agora, de
membro da Instituição, que não poderá, modo amplo, aos membros do Ministério
ressalvada a hipótese de interesse público, Público.
ser compulsoriamente removido ou afastaO exercício desses poderes pelo Procudo do seu cargo. É amplo o alcance desse rador-Geral
se justificará, pois, nos limiprincípio, pois não só garante o Promotor tes estritos dasólei
e com respeito absoluto às
ou Procurador no cargo de que é titular, mas atribuições funcionais
membro do Miassegura-lhe, também, a integridade das nistério Público, as quaisdoconstituem
objeto
funções inerentes ao ofício que titulariza e de precisa discriminação legal.
desempenha, que não poderão ser atribuíAssim sendo, cumpre analisar, tendo predas, seletivamente, a outros membros da
Instituição, em razão de situações concre- sente esse contexto, a situação exposta pelo
tas e especiais.
ilustre impetrante.
R.TJ — 150
As ora, pacientes foram presas em flagrante e, inobstante beneficiadas pela concessão de liberdade provisória mediante
fiança, vieram a ser denunciadas pelo Ministério Público como incursas no artigo 12
da Lei 6.368/76.
Na peça acusatória (fls. 51/53), consubstanciou-se esta imputação, verbis:
Consta dos referidos autos que, no
dia 4-3-89, por volta das 7:30 horas, na
rua Joaquim Murtinho, n° 136, apt° 201,
em Santa Tereza, nesta Cidade, as duas
denunciadas foram presas em flagrante
delito, porque a primeira tinha, guardados para tráfico, 1,71g (um grama e
setenta e um centigramas) de clotidrato
de cocaína e 1,00g (um grama) da erva
denominada cannabis saibra, vulgarmente conhecida por 'maconha', sem
autorização legal ou regulamentar. E, a
segunda denunciada, porque consentiu
que a primeira denunciada se utilizasse
do imóvel, do qual é possuidora, para o
fim de uso indevido e tráfico ilícito de
entorpecentes e porque contribuiu para
incentivar e difundir o uso e tráfico de
entorpecentes.
Na verdade, diligências policiais foram levadas a efeito para desbaratar uma
quadrilha de traficantes, que fazia a distribuição de tóxico utilizando-se do BIP
n° 3.420.
Neste comércio ilícito, o viciado ligava para o BIP e deixava o número do
telefone em que estava. Recebido o recado, o traficante entrava em contato
com o viciado, que lhe fazia a encomenda do entorpecente e indicava o local em
que o mesmo deveria ser entregue.
Ato contínuo, era um dos integrantes
da quadrilha designado para fazer a entrega do entorpecente.
As diligências levadas a efeito indicaram que as denunciadas faziam parte
135
da quadrilha de traficantes, associadas a
outras pessoas.
Então, foi requerida a expedição de
mandado de busca e apreensão ao Juízo
de Direito da 5' Vara Criminal, que fez
expedir os respectivos mandados.
Em cumprimento a um dos mandados, policiais civis se dirigiram à residência das denunciadas, sendo certo que
a segunda denunciada era quem detinha
a posse do imóvel, permitindo que a
primeira denunciada'nele residisse.
Ao chegarem na residência das denunciadas e exibirem o respectivo mandado, os policiais civis tiveram a casa
franqueada, tendo iniciado a busca,
quando encontraram, nasala, um quadro
retratando, na pintura, a folha de maconha e de propriedade da segunda denuncia Caris.
Ato contínuo, os policiais se dirigiram ao quarto da primeira denunciada
Elaine, onde encontraram substância
entorpecente semelhante a cloridrato de
cocaína e a 'maconha', além de terem
encontrado duas balanças de precisão e
farto material destinado ao comércio de
entorpecente.
Em razão destes fatos, os policiais
levaram o material e as denunciadas à
Delegacia de Entorpecentes, onde, após
o exame prévio constatar tratar-se de
entorpecentes o material apreendido, foi
dada voz de prisão em flagrante às denunciadas tendo a primeira confessado
a posse para uso próprio, enquanto a
segunda confessava ser de seu conhecimento o envolvimento da outra com tóxico.
Assim, a primeira denunciada infringiu a norma do art. 12, da Lei n°
6.368/76, enquanto a segunda denunciada infringiu a norma do art. 12, § 2°,
II e III, do mesmo diploma repressivo,
devendo, em razão disto, ser condena-
136
R.T.J. —150
das àpenadereclusãocumulativarnente
com pena de multa.
O impetrante questiona a designação
de um Promotor especial para atuar no
procedimento penal persecutório que resultou do ato de prisão em flagrante das
ora pacientes, o qual, em divergência com
a manifestação anterior do seu colega,
titular da 5' Promotoria — que não vislumbrara na conduta incriminada nada
além do que a simples posse prevista no
art. 16 da Lei Antitóxicos (fl. 69) —, veio
a denunciá-las como incursas em infração mais grave, tipificada no art. 12 do
referido diploma legislativo.
Essa designação, reputada ofensiva ao
princípio do Promotor Natural, ocorreu,
precisamente, um dia após extemada nos
autos aquela opinião favorável.
Com efeito, o Procurador-Geral de Justiça, em portaria assinada no dia 10-3-89
(fl. 74), designou um outro Promotor, genericamente, para todos os casos resultantes da denominada «Operação Bandeja»
— e não só para aquele concernente às ora
pacientes.
Inobstante reconheça imanente ao novo
regramento constitucional pertinente ao Ministério Público o princípio do Promotor
Natural, não vislumbro, na situação concreta emergente destes autos, hipótese que
enseje a sua atuação, pois o sentido desse
postulado exige, para que se lhe dê aplicabilidade, a edição de ato legislativo.
A imprescindibilidade dessa integração normativa — essencial ao reconhecimento dos contornos desse princípio e à
definição das conseqüências decorrentes
de sua eventual inobservância — de um
lado, e a necessidade de conferir positividade jurídica ao postulado do Promotor
Natural, de outro, levaram o Exmo. Sr.
Presidente da República a encaminhar,
também para esse efeito, projeto de lei
ao Congresso Nacional, em cujo âmbito
fixaram-se regras inerentes a esse postulado, com o claro objetivo de precisar-lhe o
conteúdo, o alcance e a extensão.
Nessa proposição legislativa—que institui a Lei Orgânica Nacional do Ministério
Público e estabelece normas gerais para a
sua organização nos Estados-membros —,
prevista no art. 61, § 1°, II, d, da Constituição, delineou-se, por via de suas
qüêaelas no pano jurídico, o perfil do princípio do Promotor Natural, como se dessume dos artigos 10, IX, e e g 23 e 33, V, do
projeto mencionado.
Sendo assim, e enquanto não sobrevier
a disciplina legislativa pertinente, não há
como aplicar — ou mesmo invocar — o
princípio do Promotor Natural, que, inobstante a sua formulação no plano doutrinário, ainda constitui tema de lege ferenda.
Esse aspecto, inclusive, foi bem ressaltado no douto voto proferido pelo eminente Ministro Assis Toledo, do Superior Tribunal de Justiça, quando, ao abordar o tema
do Promotor Natural — que reputou digno
de amplo debate acadêmico —, concluiu
pela necessidade de sua institucionalização
mediante regular processo legislativo, o que,
a seu juízo, submete a matéria, na perspectiva em que analisada, a uma disciplina
normativa a ser ainda estabelecida pelo
Congresso Nacional (fls. 154/155), verbis:
«Pelo princípio da recepção (...) vige,
naquilo em que não contrariar a Carta
Constitucional, a legislação anterior. E,
com efeito, existe a Lei Orgânica do
Ministério Público — a Lei Complementar n° 40, de 14 de dezembro de
1981. E o que diz essa Lei Complementar? Diz o seguinte, no art. 7°, V: 'ao
Procurador-Geral da Justiça incumbe,
além de outras atribuições, designar, na
forma da lei, membros do Ministério
Público do Estado para o desempenho
de funções administrativas ou processuais afetas à Instituição'. Portanto, até
que seja substituída essa Lei Complementar, o Procurador-Geral da Justiça
R.TJ — 150
pode, mesmo no curso do processo, designar outro membro do Ministério Público para prosseguir na ação penal,
dando-lhe a orientação que for cabível
no caso concreto.
Portanto, cabe ao Chefe do Ministério Público, no sistema processual vigente, substituir o Promotor que não
exercita o poder-dever de oferecer denúncia, se dele discordar, na hipótese
em exame.
O que se poderia aqui discutir é se é
bom que assim seja: se não, seria a hora
de se estabelecer, em nova Lei Orgânica
do Ministério Público, alguns princípios
restritivos a essa faculdade que, presentemente, possui o Procurador-Geral.
Essa, entretanto, é uma questão de
lege terenda.
Devo registrar, ainda, que a alegada divergência entre os órgãos do Ministério
Público referidos, no que concerne à exata
classificação jurídica do comportamento
imputado às ora pacientes — tráfico de
entorpecentes, segundo a denúncia oferecida pelo Promotor especial, ou, «no
máximo», consoante acentuou o Promotor
titular, mera posse, para consumo próprio,
de substâncias tóxicas — é que se mostra
subjacente ao inconformismo manifestado
na presente impetração.
Não desconheço decisão desta Corte
(RTJ 9W1111), de que foi relatar o eminente Ministro Pirulito Paz, no sentido do
possível controle jurisdicional, mediante
habena corpos, de eventual excesso ou
abuso no exercício do poder de denunciar:
«Se a classificação do crime, contida
na denúncia, mostra-se patentemente errônea e exasperante, serve o habena
corpos para remediar a ilegalidade.»
O precedente em questão não aproveita
ao caso concreto, contudo.
137
As pacientes, já favorecidas pela concessão de liberdade provisória mediante
fiança, estilo sujeitas, no momento, a processo penal cuja fase sequer ultrapassou os
limites da instrução, necessariamente contraditória, da causa, podendo, quando do
ato sentenciai, se este eventualmente for de
natureza condenatória, ser beneficiadas por
desclassificação jurídica in mefilus, mais
favorável.
Além dessa possibilidade, sempre presente nos termos do que dispõe o art. 383
do CPP, é preciso ressaltar que a maior
severidade do Ministério Público na capitulação jurídica do fato não se mostra incompatível com as circunstâncias que motivaram a operação policial e resultaram na
prisão em flagrante das ora pacientes.
Note-se — porque é relevante — que a
peça acusatória, ao descrever o suposto envolvimento das pacientes no processo de
tráfico e comercialização de substâncias
entorpecentes, reporta-se à apreensão, em
poder de uma das pacientes, de
duas
balanças de precisão e farto material destinado ao comércio de entorpecentes» (fl.
53), o que é efetivamente corroborado pelo
auto de apreensão lavrado pela autoridade
policiai, o qual também registra a existência de grampeador, tesoura, rolo de fita
durex e pequenos sacos plásticos, num total
de trezentos e setenta e cinco (fl. 96).
Assim sendo, e tendo presentes os elementos que destes autos constam, indefiro
o pedido.
É o mau voto.
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence:
Desde a primeira chamada deste caso, na
Turma, ficou-me a impressão, data venta,
de que a conclusão do magnífico voto do
Ministro Celso de Mello, relator, ficaria
aquém das suas premissas.
2. Literalmente, S. Ex.' entendeu «imanente à disciplina constitucional do Ministério Público» o chamado «princípio do
138
R.T.J. — 150
Promotor Natural» como «garantia da ordem jurídica cujos destinatários são, de um
lado, o próprio membro da Instituição — a
quem assegura, no desempenho de seu oficio, o exercício pleno da independência
funcional — e, de outro, a própria coletividade, a quem se reconhece o direito de
ver atuando, nos procedimentos judiciais
ou administrativos vários, o Promotor ou
Procurador investido, em tese e em função
de critérios legais pré-determinados, das
atribuições inerentes ao seu cargo».
Em razão do princípio, enuncia o
Relator, «nenhum membro do Ministério
Público poderá ser afastado do desempenho de suas atribuições nos procedimentos
em que oficia, ou deva oficiar, exceto por
relevante motivo de interesse público, por
impedimento ou suspeição ou por razões
decorrentes de férias, hcenças ou afastamentos».
D4 a citação, sem reparos, da assertiva fundamental da tese do Prof. Paulo
César Pinheiro Carneiro de que, «todo e
qualquer ato do Procurador-Geral que contrarie tal princípio, ainda que editado com
aparência de legalidade como designação,
evocação, delegação e formação de grupos
especiais, é absolutamente nulo, incapaz de
produzir qualquer efeito...».
«A exigência de atuação independente do membro do Ministério Público»
— acentua em outro passo o isofmistro Celso
de Mello — «reside na gênese da formação
do princípio do Promotor Natural, a que
repugnam interferências ilegítimas da
Chefia da Instituição, que rompem, mediante designações easuísticas e arbitrárias, a regular ordem de distribuição dos
processos e encargos funcionais».
Não obstante, ao final, embora repise
a premissa de ser «imanente ao novo regramento pertinente ao Ministério Público o
princípio do Promotor Natural», concluiu
S. Ex.' que «o sentido desse postulado exige, para que se lhe dê aplicabilidade, a
decisão de ato legislativo». Acolhe, por
isso, o entendimento do voto do eminente
Ministro Assis Toledo, no Superior Tribunal de Justiça, segundo o qual, até que
venha a ser substituída por outra, a Lei
Complementar n° 40/81, art., 7°, V, assegura ao Procurador-Geral de Justiça o poder
de, «mesmo no curso do processo, designar
outro membro do Ministério Público para
prosseguir na ação penal, dando-lhe a orientação que for cabível no caso concreto».
De minha parte, talvez não possa
acompanhar os corolários mais radicais do
postulado do «promotor natural».
Creio ser indispensável precatar-se
o intérprete de certo mimetismo, que
compromete freqüentemente as reflexões
sobre a organização do Ministério Público e se traduz na tendência de transplante
cego de regras e princípios da magistratura judicial.
O «promotor natural», sustenta-se, é
decorrência inilidudível de dois tópicos da
normativa constitucional da instituição: de
um lado, o princípio da independência fimdanai (CF, art. 127, § 1°), de outro, a garantia de inamovibilidade dos seus membros (CF, art. 128, § 5°, I, b); além disso,
teria ele implicações com o princípio do
juiz natural e com a garantia do devido
processo legal.
É preciso contudo, não perder de
vista que, no tocante ao Ministério Público
e segundo o próprio texto constitucional,
todos esses princípios hão de conviver com
dois outros, o da unidade e o da indivisibilidade, os quais — malgrado respeitáveis
colocações em contrário (v.g., Paulo César
Pinheiro Carneiro, op. dt., pág. 46) —
emprestam à organização interna da instituição colorido específico e prismas inconfundíveis com a da magistratura judicial
11. Os princípios da unidade e da indivisibilidade, enquanto predicados históricos do Ministério Público, têm significação
própria e trazem consigo a idéia de uma
organização hierarquizada e, com ela, a de
certos poderes de direção de unia institui-
R.TJ — 150
ção una, entre os quais os ide devolução —
definido corno «o poder do superior hierárquico de chamar a si o exercício concreto
da função do subordinado» (J. Figueiredo
Dias, Direito ProcessualPaud, 1974, I/381)
— e o de substituição — isto o de «designar outro subordinado para o exercício
concreto da função do agente normalmente
competente» (id. ibidem).
Não obstante já não haja o inequívoco consenso de outrora sobre as dimensões
de tais poderes de direção interna do Ministério Público, a sua implicação nos princípios de unidade e indivisibilidade ainda é
uma afirmação constante (v.g. J. Frederico
Marques, Elementos de Direito Processual Penal, 1961,11/47; Manzini, Tratado
Direito Processual Penal, trad., 1949,
II/376; J. Figueiredo Dias, op. dt., 1/368
ss.; Siracusa, Pubbilco Ministero no No-
víssimo Digesto Italiano, XIV/540,
543
ss.): elaparte da convicção, aindadanhumte, sintetizada por Ângelo de Mania, ao
proceder ao balanço do Convegno de Mantova, de 1973 (La Rifonna del Pubblico
Ministero, Milano, 1974, pág. 27), de que
existe un esigenza organizzativa imprescindibile pergü uflideld pubblico
teto, direta all'azione e non alfa pura
decisione, i quali, per adempiere utilmente ai fiei loro assegnati dana Costituzione e dalla legge devono potere svolgere azioni esterne coerenti e unitarie;
abe pressuppone e impone una certa unitá interna di organizzazione.
Se a Constituição explicitamente adotou a unidade e a indivisibilidade, ao lado
da independência funcional, como princípios institucionais do Ministério Público,
não se me afigura de bom aviso, para enfatizar o da última, que se venha a despir as
primeiras de todo o seu significado essencial na teoria e na história da instituição.
15. Certo, como redargúi o eminente
Relator, tais poderes de avocação e designação, «embora derivados da unidade e da
indivisibilidade da Instituição, sofrem,
139
hoje, o condicionamento de outro princípio, também constitucional — o da inde,
pendência funcional — e encontram limite
na garantia da inamovibilidade que, alçada
ao plano da Constituição, assiste, agora, de
modo amplo, aos membros do Ministério
Público».
A questão da convivência da unidade e da indivisibilidade, de um lado, can a
independência funcional, de outro, não é
nova, nem parece oferecer dificuldades de
maior vulto, no estágio contemporâneo das
reflexões doutrinárias e das soluções legislativas sobre a organização do Ministério
Público.
Independência funcional, na temática do Ministério Público, não é expressão
de sentido inequívoco.
De fato. Numerosos autores a referem, não à liberdade de atuação dos seus
membros, em face da sua organização interna, mas à independência da instituição,
no tocante às suas atividades-fim, em relação aos vínculos de subordinação aos poderes políticos, particularmente do Governo, como também em relação aos órgãos
jurisdicionais.
Nesse sentido, à luz da Constituição
italiana, é a observação de De Mattia (op.
loc. dts., p4.26), para quem la garanzia
costituzionale riguarda l'indipendenza
degli uffici dagli altri potai, non l'organhaazione funzionaie interna. %mesma
linha, entre outros, Frederico Marques ao
notar que «assegurada a independência institucional do Ministério Público, nem por
isso perderá a sua fisionomia atual de instituição hierarquizada, mas que se dirigirá
Por si própria».
20. Não obstante, é certo que também já
se tem relacionado a independência funcional ao membro do Ministério Público, individualmente considerado, com o sentido
de não estar ele sujeito, na sua atividade
funcional, particularmente na sua atuação
processual, a ordens concretas do Procurador-Geral ou de outro órgão de direção.
140
R.TJ. — 150
Com esse sentido, de liberdade de
consciência ou de convicção jurídica do
membro do Ministério Público, porém, o
que predominantemente se tem entendido,
aqui e alhures, no propósito de conipatibilizá-la com a unidade hierarquizada da instituição, é que a independência funcional
não ilide os poderes diretivos de evocação
e de substituição.
Assim, sustenta Figueiredo Dias
(op. cit., 1/381) que «o conflito não é necessário e que, bem diferentemente, uma
composição de interesses é aqui, em larga
medida, possível». Para o notável jurista
luso, «a solução que vê na convicção jurídica do subordinado um limite ao poder de
direção do superior hierárquico (...) não
tem que importar um risco considerável
para a consecução das superiores finalidades político-criminais que à magistratura
do Ministério Público cumpre realizar, pois
sempre será possível fazer vingar a orientação do superior hierárquico, através do
uso do poder de devolução e de substituição
que lhe cabe».
Aplaude Figueiredo Dias, a propósito, a conclusão do IV Congresso Interamericano do Ministério Público, realizado em
Brasília, em 1972, segundo a qual, devendo
a organização do Ministério Público fundar-se nos princípios de unidade e indivisibilidade, é de ressalvar, no entanto, «a faculdade de cada um dos seus agentes proceder segundo seu critério, em razão de que
se deve prever um adequado procedimento
de substituição» (Arquivos do Ministério
da Justiça, v. 123/237).
O que mais me impressiona, por
isso, na construção da tese do «promotor
natural», é a invocação da garantia da inamovibilidade dos membros do Ministério
Público, «salvo por motivo de interesse
público, mediante decisão do órgão colegado competente do Ministério Público,
por voto de dois terços de seus membros,
assegurada ampla defesa» (CF, art. 128, §
1°, b).
Em pólo diametralmente oposto,
dispunha o antigo Estatuto Judiciário português que «o Ministério Público constitui
uma magistratura amovível». É significativo notar que Figueiredo Dias (op. cit., 1/30)
tem precisamente «o direito de substituição» dos membros do Ministério Público
como consectário do «caráter amovível
desta magistratura».
Assegurando, ao contrário, a Constituição brasileira, a inamovibilidade, segue-se, no ponto, a minha concordância,
em princípio, com o exato raciocínio do
Ministro Celso de Mello, no sentido de que
«a inamovibilidade
enquanto garantia
subjetiva da independência, concerne não
só ao cargo, mas, especialmente, às respectivas funções, que não poderão dele ser
destacadas pelo Procurador-Geral e, por
ato deste, deferidas a outro Promotor/Procurador». O que, segundo S. Ex.•, «equivaleria a justificaro descumprimento indireto
da garantia de inamovibilidade e, como
necessário deito conseqüencial, dar causa,
injustificável, ao virtual esvaziamento das
funções inerentes ao cargo ocupado por
membro do Ministério Público».
27. Certo, o art. 29, ADCT permitiu que
o membro do Ministério Público pudesse
«optar pelo regime anterior, no que respeita
às garantias e vantagens (...), observandose, quanto às vedações, a situação jurídica
na data desta» (Constituição). Em outras
palavras: admitiu-se a =teia às garantias
mais amplas, entre elas, a de inamovibilidade, em troca da permanência do regime
anterior de vedações mais limitadas. Daí
não se segue, contudo, que as garantias dos
agentes do Ministério Público se devam
desqualificar ao nível de meras vantagens
funcionais: cuida-se de um preceito transitório, que cria exceção temporária ao sistema permanente, para atender a interesses
conjunturais de ordem corporativa, sem negar, com isso, a natureza e a finalidade das
garantias, erigidas em favor do que se re-
—150
puta mais adequado ao melhor desempenho das funções institucionais do órgão.
Por outro lado, é certo que a inamovibilidade dos membros do Ministério Público, embora consagrada em termos substancialmente equiparáveis, não se identifica à dos juízes, precisamente porque — ao
contrário do que sucede em relação à magistratura —, no Ministério Público a garantia há de conciliar-se com os princípios
da unidade e da indivisibilidade, impostos
no mesmo contexto da Lei Fundamental.
A meu ver, não se cuidará, assim, de
repelir os institutos deles decorrentes, da
avocação e da substituição, mas, sim, de
cercar o exercício desses poderes de cautelas contra o uso arbitrário ou casufstko de
suas virtualidades.
Nem me parece que o sistema constitucional constitua óbice à continuidade e
ao aprofundamento da experiência de grupos especiais de promotores, dedicados a
matérias específicas: na medida em que
constituídos na forma da lei, o plexo de
atribuições de tais equipes, ipso facto, estará subtraído da esfera protegida das atribuições legais culinárias do agente que tenha a sua demarcação na competência do
juízo perante o qual sirva Estou, data venta, em que a opinião contrária é fruto do
mesmo mimetismo a que aludi e parte da
falsa idéia de que a rotina ronceira de que
o oficio de cada órgão do Ministério Público deve ter atribuições coextensivas ao de
um órgão judiciário. Nada, entretanto, o
impõe e as conveniências da administração
dos fins institucionais do Ministério Público freqüentemente o desaconselham.
A questão já me preocupara quando,
na Procuradoria-Geral da República, dediquei-me, com eminentes companheiros de
trabalho, particularmente o il. SubprocurdorGeral da República, aqui presente, à
formulação do projeto de Lei Orgânica do
Ministério Público da União. Na mensagem, com que o encaminhei ao Congresso
Nacional, acentuei:
141
«Ponto fundamental do projeto é o
relativo às garantias dos membros do
Ministério Público da União. A matéria
revelou aspectos de grande complexidade, em especial, quando se cuidou de
compatibilizar a inamovibilidade dos
seus membros com os princípios da unidade e da indivisibilidade, aquele e estas
consagradas na Constituição, o que tornou inadequado, no particular, a utilização dos parâmetros das garantias da
magistratura. O projeto pretende ter adotalo solução que harmoniza a garantia e
os princípios institucionais mencionados, estabelecendo a sede natural de
cada um dos níveis das carreiras do Nfinistério Público da União, distribuindo-os, horizontalmente, em ofícios,
mediante critérios objetivos fixados em
lei, e disciplinando rigidamente as hipóteses de remoção ou substituição».
32. Orientação similar foi seguida no
projeto do Executivo para a lei complementar de normas gerais para a organização do Ministério Público dos Estados,
cuja elaboração se fez sob a direção do
hoje em. Ministro Celso de Mello.
33.0 problema está, a meu ver, repito,
não em vedar a avocação e a designação
especial — que são instrumentos da unidade e da indivisibilidade da instituição, que
a Constituição preservou —, mas, sim, em
dar-lhes disciplina legal cerceadora do arbítrio. Nela, como acentuou o Relator, o
exercício desses poderes, pelo ProcuradorGeral, «só se justificará, pois, nos limites
estritos da lei e com respeito absoluto às
atribuições funcionais do membro do Ministério Público, as quais constituem objeto
de precisa discriminação legal».
34. É inegável, assim, em linha de princípio, que a concretização positiva da nova
organização do Ministério Público, compatível, a um tempo, com os princípios institucionais e as garantias de seus membros,
dependerá efetivamente de complementação legislativa. É o que resulta, aliás, das
142
R.TJ.— 150
várias remissões do texto constitucional
pertinente à legislação sub-constitucional,
complementar ou ordinária, que lhe desenvolva princípios e garantias (CF, arts. 127,
§ 2°, in fine; 128, §§ 3°, 4° e 5°; 128, § 5°,
11, c e e; 129, VI, VII e1X e 61, § 1°,11, d).
De minha parte, não o nego.
Nesse sentido, as normas que nos
ocupam, isto é, a regra que define os princípios institucionais do Ministério Público
— a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional (art. 127, § 1°) — assim como a da necessidade implícita de
cotnpatibilizá-la com as que definem as
garantias dos seus membros, entre elas, a
inamovibilidade, a serem observadas nas
leis complementares de organização (art.
128, § 5°,1), se enquadraria— observada a
conhecida classificação da obra maior de
José Afonso da Silva (Aplicabilidade das
Normas Conslitudonais, 1968, pág. 114)
—, na categoria das «normas constitucionais de princípio institutivo» ou «de princípio orgânico ou organizativo».
São normas, explica o autor (Ib.,
pág. 115), que «contém esquemas gerais,
um como que início da estruturação de
instituições, órgãos ou entidades», donde
serem «de eficácia limitada, porque é o
legislador ordinário que lhes vai conferir
executoriedade plena, mediante leis complementares ou ordinárias integrativas».
Mais recentemente, Maria Helena
Diniz (Norma Constitucional e seus efeitos, 1989), que segue, em linha gerais, o
esquema de José Afonso, entre as normas
de princípio institutivo — porquanto ~querem que o legislador estabeleça, mediante leis complementares ou ordinárias,
esquemas gerais de estruturação e atribuição de órgãos, para que tenham aplicabilidade plena ou imediata» (ob. cik, pág. 103)
— entre elas inclui a do art. 127, § 2°, onde
a Constituição, após definir o Ministério
Público, no caput, e lhe enumerar os princípios institucionais, no § 1°, remete à lei
dispor sobre sua organização e funcionamento.
Não contestando, assim, que a eficácia plena e a concretização positiva de tais
normas demandem imprescindível complementação legislativa, o que, não obstante, ponho em discussão é a sobrevivência,
incólume, até a edição das normas infraconstitucionais requeridas, da disciplina legal pré-constitucional, ainda no ponto em
que se mostra incomportável no esquadro
da nova ordem constitucional.
Penso, de modo particular, na legitimidade da recepção, ainda que a título provisório, do poder monocrático do Procurador-Geral para, imotivadamente e sem
previsão específica, substituir por agente
do Ministério Público de sua livre escolha
e para daeterminado procedimento em curso, o Promotor que nele deveria atuar segeado os critérios de distribuição decorrentes de sua designação para oficiar junto a
determinado juízo criminal.
Aqui, data varia, é que me parece
que a conclusão do em. Relator briga com
os postulados mais caros da reflexão contemporânea sobre a força normativa da
Constituição e reduz regras e princípios
basilares do esquema constitucional do Ministério Público a espécimes da ressurecta
categoria das normas constitucionais simplesmente diretórias ou not self executing
dos clássicos americanos.
Note-se, entretanto, que nem essa
velha classificação legitima a paralisia de
normas proibitivas, como as que o Ministro
Relator mesmo extraiu, com precisão dos
textos constitucionais abordados: já advertia Black (apud Francisco Campos, Direito Constitucional, 1956,1/398), que a distinção entre mandatárias e diretórias não se
aplica aos preceitos proibitivos (the tenra
Miandatory' and `directory' are naturally not applicable to prohibitive statutes or those which simply for bid or denounce the doing of certain acta.)
R.TJ — 150
De qualquer sorte —sabe-o, melhor
que eu, o em. Ministro Celso de Mello —,
atualmente, parte a metodologia do Direito
Constitucional do axioma, sintetizado por
José Afonso (ob. cit., pág. 75), de que «não
há norma constitucional alimma destituída
de eficácia. Todas elas irradiam efeitos jurídicos, importando sempre numa inovação
de ordem jurídica preexistente à entrada em
vigor da constituição a que aderem, e na
instauração da nova ordem instaurada. O
que se pode admitir é que a eficácia de
certas normas constitucionais não se manifesta na plenitude dos efeitos jurídicos pretendidos pelo constituinte, enquanto não se
emitir unia nomeação jurídica ordinária ou
complementar, prevista ou requerida».
No tocante especificamente às normas de princípio institutivo ou de organização -- como as de quae —, o jurista
pátria depois de mostrar que «a norma
constitucional dependente de regulamentação também entra em vigor na data prevista
na Constituição» e, «desde que entrem em
vigor, são aplicáveis até onde possam»
(ob. dt., pág. 122) —, conclui, na linha de
doutrina na contemporânea mais autorizada, que não obstante sua eficácia limitada,
«se traçam esquemas novos, revogam normas jurídicas preexistentes, instituidoras
de situações contrárias ao princípio nelas
consubstanciados» (ob. dt., pág. 124).
Para Maria Helena Diniz (ob. dt.,
pág. 101), tais normas de principio institutivo, porque dependentes de complementação legislativa, mão produzirão efeitos positivos, mas terão eficácia paralisante de
efeitos de normas precedentes incompariveia e impeditivas de qualquer conduta
contrária ao que estabelecerem».
Ainda entre nós, e. referindo-se à
mesma categoria de normas, Rosal Russomano adverte que elas, «face a elementos
autônomos que apresentem são aplicáveis
até onde o possam ser» e, por isso, infletem
sobre «a legislação anterior». (Das Normas Programáticas em Tendências Atuais
143
do Direito Público, Econ. Afonso Arinos,
Forense, 1976, 267, 275).
Sem sair do mundo lusófono, é imprescindível lembrar Jorge Miranda (Manual de Direito Constitucional, 2' al.,11)
e J.J. Gomes Canotilho (Constituição Dirigente e %Inalação do Legislador, 1982,
e Direito Constitucional, 4' ed., 1986).
De Jorge Miranda (ob. cit., 11/217
ss.), depois da peremptória afirmação de
que nenhuma norma constitucional, preceptora ou programática, «é mera proclamação política ou cláusula não vinculativa», a enumeração, em primeiro plano,
como efeito da «força jurídica das normas
programáticas», ode que «elas determinam
a cessação da vigência, por inconstitucionalidade superveniente, das normas legais
anteriores que dispunham em sentido contrário».
Canotilho, de seu turno —que dedicou à «compreensão das normas programáticas» sua monografia notável —, no curso
(Direito Constitucional, cit., pág. 135),
aceita igualmente que «as normas constitucionais programáticas tenham efeito 'derrogatório' ou 'invalidante' (por inconstitucionalidade superveniente) dos preceitos
legais anteriores não conformes com as
mesmas».
No caso concreto, coube ao em. Relator evidenciar, a meu ver de modo conclusivo, a incompatibilidade entre os princípios e garantias constitucionais do Ministério Público e o exercício indiscriminado
pelo Procurador-Geral dos poderes de avocação e substituição, que «só se justificará
(...) nos limites atritos da lei e com respeito
às atribuições funcionais do membro do
Ministério Público».
51. Daí me parecer que — não obstante
a positivação de todas as visualidades dos
princípios referidos e de sua conciliação
dependa da obra complementar de concretização legislativa —, enquanto ela não sobrevenha, da vigência mesma da Constituição irradia-se o efeito paralisante — derro-
144
R.T.J. — 150
gatório ou invalidante, corno se queira —
de normas (ou, pelo menos, da interpretação anterior de normas) preexistentes, contrárias à nova sistemática.
Aliás, ninguém duvidará de que é de
eficácia negativa plena e imediata o inciso
que outorgou aos membros do Ministério
Público a inamovibilidade.
Se esta — como entende o Ministro
Celso de Mello, can a minha adesão —, é
incompatível com a substituição por ato
individual sem parâmetros legais predeterminados, do Promotor com atribuições legais para o caso —, na ausência das nonas
infraconstitucionais, que o disciplinem, o
que se há de paralisar não é a garantia, mas,
sim, o poder de designação que, repito o
Relator, dado o condicionamento imposto
pelo novo sistema constitucional, «só se
justificará (...) nos limites estritos da lei».
Certo, a norma constitucional cuja
recepção, se pretende, validaria o ato questionado do Procurador-Geral de Justiça —
o art. T' V, LC 40/81 — é o que atribui o
poder de «designar, na forma da lei, membro do Ministério Público para o desempenho de funções administrativas ou processuais, afetas à instituição».
A cláusula, «na forma da lei», a que
ficou condicionada a atribuição, logo se vê,
dispensaria a rigor cogitar-se de revogação
ou inconstitucionalidade superveniente: a
inexistência de condicionamentos legais,
compatíveis com o novo regramento constitucional do Ministério Público, levaria
apenas à paralisia temporária do poder.
Aliás, de logo se me afigura que não
é mais praticável, sob a Constituição vigente, que os poderes de devolução e substituição se possam confiar ao exercício unipessoal do Procurador-Geral, com alheamento
do colegiado superior do Ministério Público.
Parece curial, com efeito, que, sendo
a garantia da inamovibilidade a condicionante básica dos referidos poderes hierár-
quicos, de seu exercício não se pode subtrair a participação do órgão colegiado ao
qual se cometeu o papel decisivo no juízo
do interesse público na remoção do membro do Ministério Público, que se admitiu
como ressalva da mesma garantia.
58.0 raciocínio tem a ver com um precedente do Tribunal, que me é muito caro,
porque página relevante de momento decisivo da minha vida. Refiro-me ao MS
19.615, de 18-9-69, rel. o em. Ministro
Eloy da Rocha, cuja ementa lhe resume
bem o raciocínio — RTJ 54/216:
«Promoção, por antigüidade, de
membro do Ministério Público da Justiça do Distrito Federal; recusa de indicação do mais antigo. Não é admissivel a
transferência, ao Chefe do Ministério
Público, de atribuição excepcional, conferida ao Conselho, pela Lei n° 3.434, de
20-7-58, só exercitável em condições
especialmente previstas na lei, isto 4
quando a vontade do órgão colegiado se
manifestasse pela maioria qualificada
de 2/3 dos votos. Vulneração do princípio da carreira do Ministério Público e
negação do direito à classificação segundo a antigüidade».
Mutatis rautandis, no sistema vigente, não podem remanescer na esfera da
decisão solitária do Procurador-Geral poderes excepcionais que afetam a garantia da
inamovibilidade, se a segurança desta foi
entregue, na Lei Fundamental, ao contrário
do que sucedia na ordem constitucional
anterior — (CF 69, art. 95, 1°, in fine), à
decisão da maioria qualificada de um colegiado da instituição: foi essa a fórmula
constitucional de proscrição, no campo delicado dessa garantia básica, da margem de
subjetivismo e de arbítrio que é inerente a
toda decisão individual discricionária.
Não se trata, é certo, de uma dedução
lógica de preceitos inequívocos, mas, na
ausência de disciplina complementar, de
uma tentativa de concretização conciliadora do que Canotilho chamaria «momentos
R.T.J —150
de tensão ou antagonismo entre os vários
princípios» votados, na Constituição, à estruturação do Ministério Público.
É significativo, aliás, que a submissão do exercício da avocação ou da
designação especial à anuência prévia ou
ao referendo dos colegiados superiores
da instituição tenha sido a solução proposta por ambos os projetos referidos, de
Lei Orgânica, do Ministério Público da
União (art. 49, VI e VIII) e da lei nacional
de bases do Ministério Público dos Estados (art. 10, IX, g).
De qualquer sorte, Sr. Presidente,
seja essa ou não a solução que validamente
se possa construir para a espera da complementação legislativa que o tema reclama,
basta, no caso concreto, a impossibilidade
de conciliar os princípios da nova estruturação do Ministério Público, gizados com
mestria pelo em. Relator, com a sobrevivência de substituições arbitrárias, de aparência casuística e com indícios veementes
de desvio de poder, como a que se questiona na impetração.
Com escusas pela inesperada extensão
do voto, peço vênia ao Ministro Relator
para deferir o habeas corpus para anular
o processo, incluída a denúncia:é o meu
voto.
EXTRATO DA ATA
HC 67.759 — RI — Rel.: Mia Celso de
Mello. Pactes.: Cada Esteves de Azevedo
Guedes e outra. Impte.: Nélio Seidl Machado. Coator: Superior Tribunal de Justiça.
Decisão: Após o voto do Sr. Ministro
Relator, que indeferia o pedido, e o voto do
Sr. Ministro Sepúlveda Pertence, que deferia o «habeas corpus» para anular o processo, o julgamento foi adiado em virtude do
pedido de vista do Sr. Ministro Marco Aurélio. O Tribunal, por unanimidade, deferiu
o pedido do Impetrante no sentido de ser
suspensa a realização de audiência de instrução e julgamento, já designada para o dia
1° de agosto, até a conclusão do julgamen-
145
to. Falaram: pelas Partes: o Dr. Nélio Seidl
Machado e pelo Ministério Público Federal
o Dr. Affonso Hemiques Prates Correia.
Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Moreira Alves, Aldir Passarinho, Sydney
Sanches, Octavio Gallota Célito Borja, Paulo
Brossard, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Vefioso e Marco Aurélio. Procurador-Geral da República, o Dr. Affonso
Henriques Prates Correia, substituto.
Brasília, 28 de junho de 1990 — BC:rectas Bonifádo Ferreira, Secretário.
COMUNICAÇÃO
O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): Submete-me, hoje, o ilustre impetrante, petição em que esclarece fatos cujo conhecimento pede seja transmitido à Corte,
por seu possível relevo na resolução desta
causa, verbis:
«O advogado Nélio Roberto Seidl
Machado, impetrante do habeas corpus em epígrafe. Pacientes, Carla Este-
ves de Azevedo Guedes e Elaine Estrela, vem a V. Ex.'requerer a apresentação dos documentos em anexo, os
quais evidenciam, permissa venia,
que o Promotor Especial, designado
pelo Procurador-Geral em 10 de março de 1989, jamais recebeu atribuição
específica para promover Ação Penal
contra as pacientes, eis que os poderes
que foram mencionados no ato GPGP
If 80/89 dizem respeito tão-somente às
tarefas de 'acompanhar o inquérito
policial n° 32/89, instaurado na Delegada de Entorpecentes e todos os
demais inquéritos ou flagrantes instaurados para apurar infrações penais resultantes da denominada
Operação Bandeja, para repressão
ao tráfico de entorpecentes'.
Como se vê, nenhuma atribuição foi
deferida em prol do Promotor Especial,
no sentido de alijar, para a eventual propositura da Ação Penal, o Promotor Ti-
146
R.TJ. — 150
colar da 5' Vara Criminal do Rio de
Janeiro, tratado na impetração como
promotor natural
De derradeiro, anexa-se, também, a
última cota da lavra do Promotor Especial nos autos do Inquérito n° 032/89,
identificado em juízo pelo n° 6630, bem
assim outra manifestação do Ministério
Público, da lavra da Promotora Gizelda
Leitão Teixeira, inferindo-se das mesmas que, tal como salientado da Tribuna, quando da sustentação oral, a investigação acerca da rumorosa 'operação
bandeja' continua em aberto, positivando-se, desse modo, de forma insofismável, o constrangimento que é objeto do
writ.
Rogando a V. EX.. que dê conhecimento desses fatos ao Plenário desse
Col. Supremo Tribunal Federal, justifica o impetrante a postulação pela circunstância de que, sob a fé de seu grau,
deu conhecimento à Corte do que aqui
agora resta comprovado.»
Essa petição vem instruída, dentre outros documentos, por uma portaria do Procurador-Geral de Justiça, cujo teor é o seguinte:
«O Procurador-Geral de Justiça do
Estado do Rio de Janeiro, no uso de
suas atribuições legais, resolve designar
o Dr. Luiz Carlos Rodrigues da Costa,
Promotor de Justiça de 1' Categoria,
para, sem prejuízo de suas atribuições
como representante do Ministério Público, acompanhar o inquérito policial
n° 32/89, instaurado na Delegacia de
Entorpecentes e todos os demais inquéritos ou flagrantes instaurados para apurar infrações penais resultantes da denominada 'Operação Bandeja', para
repressão ao tráfico de entorpecentes.»
Há, ainda, instruindo o pedido do impetrante, uma manifestação do Promotor especial em que este representante do Ministério Público determina à autoridade poli-
cial, encarregada das investigações, uma
série de diligências. O retardamento na execução das providências investigatórias levou a Promotora referida na petição do
impetrante a criticar, em termos veementes,
a desídia do organismo policial:
«MM Dr. Juiz,
Nada foi feito na última baixa Um
absurdo que inquérito de tal relevância
receba do responsável tratamento tão
desidioso, consubstanciado na certidão
de fl. 658.
Pela baixa para efetivo cumprimento
da promoção de fls. 614 ut 617.»
Esse expediente foi recebido, em abril
de 1990, pela autoridade policial, que determinou o integral cumprimento das diligências requisitadas pelo representante do
Ministério Público.
O Sr. Ministro Moreira Alva: Eles
alegam, em última análise, que o Procurador está ilegalmente desempenhando o
mister de Promotor?
O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator: Sim.
O Sr. Ministro Moreira Alves: Então
essa circunstância muda completamente o
panorama do caso, pois surge a questão de
saber se o Promotor está funcionando ilegalmente.
O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): Esta é uma questão cujo efetivo esclarecimento depende da análise do próprio
processo penal condenatório.
O Sr. Ministro Moreira Alves: Há prova disso: Se não há, será o caso de pedir...
O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): Existe uma portaria do ProcuradorGeral de Justiça; contudo, os elementos
existentes nestes autos não me permitem uma resposta categórica. Posso apenas
acentuar que a leitura da portaria do Procurador-Geral parece indicar que o Promotor
especial teria agido ultra vires, excedendo
os limites de uma mera designação admi-
R.T.J —150
nistrativa que limitou a sua atuação à fase
da investigação policiai
O Sr. Ministro Marco Aurelio: Agora
há =pormenor: quando da designação do
Promotor especial, o inquérito já estava
distribuído à 5' Vara Criminal, onde havia
o titular.
O Sr. Ministro Moreira Alves: O grande problema é que se trata de babem corpus, e não temos os autos da ação penal. A
meu ver, deve-se converter o julgamento
em diligência.
O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): Não me oponho a que se converta em
diligência este julgamento, para o efeito
indicado, a fim de que esta ação de babou
corpos venha a ser julgada — tal como
preconizado em meu voto e no do em. Mm.
Sepúlveda Pertence — à luz do princípio
do Promotor Natural e não em face de um
eventual excesso, cometido pelo Promotor
designado, no que concerne às atribuições
que lhe foram conferidas em portaria pelo
Procurador-Geral de Justiça.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence:
Tanto mais que o Procurador-Geral, opinando, interpreta o seu próprio ato como
tendo efetivamente designado o Promotor
para oficiar nos casos específicos, inclusive, para oferecer a denúncia questionada.
O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): De qualquer maneira, Sr. Presidente,
concordo com a proposta de conversão do
julgamento em diligência, formulada pelo
a Ministro Moreira Alva.
PROPOSTA DE DILIGÊNCIA
O Sr. Ministro Moreira Alves: Sr. Presidente, não me sinto em condições de julgar. Assim, proponho que se converta o
julgamento em diligência para que se requisitem os autos principais.
VOTO (S/DILIGÊNCIA)
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Sr. Presidente, creio que até certo ponto já revelei
o meu convencimento a respeito, ao apon-
147
tar que a atuação do Promotor especial se
fez após a distribuição do inquérito. Para
não parecer incoerente, posteriormente, assumindo essa posição e, portanto, deixando
transparecer a irrelevância da vinda dos
autos, faço este registro e concordo com a
diligência.
Sr. Ministro Moreira Alves, V. Ex.' me
permite? De qualquer forma, temos a discussão em torno da figura do Promotor
natural. Porque? Porque, coma designação
ocorrida, afastou-se aquele que normalmente atuaria no inquérito, tanto que o
inquérito subiu à Vara e o Promotor titular
da 5' Vara Criminal chegou a lançar nos
autos cota quanto à liberdade provisória das
Pacientes.
O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): A colocação feita pelo eminente
Ministro Marco Aurélio, na verdade, tendo presente a concepção formulada pela
doutrina em tomo do postalado do promotor natural, é justificável. É um conceito novo que emerge do texto constitucional promulgado em 1988. No Estado
de São Paulo, esse princípio já se acha
positivado na Lei Orgânica do MP paulista
desde 1982.
Mas, o princípio do promotor natural,
pela sua amplitude, estende-se à fase préprocessual; abrange, também, os procedimentos administrativos, de caráter investigatório, como o são os inquéritos policiais.
O Sr. Ministro Moreira Alva: Não é
isto que se está atacando.
O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): Inobstante estas observações, e atendendo à tradição da Corte, concordo com a
proposta de V. Ex.', de conversão do julgamento em diligência, para efeito de esclarecimento pessoal.
O Sr. Ministro Néri da Silveira (Presidente): Ministro Moreira Alves, vamos
limitar a questão por ora à proposta de
conversão do julgamento em diligência.
148
R.T.J. —150
CONFIRMAÇÃO DE VOTO
O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): Sr. Presidente, trata-se da questão pertinente ao denominado Promotor Natural,
em que já houve dois votos, o do eminente
Ministro Sepúlveda Pertence e o meu próprio, ambos reconhecendo implícito, embora com conclusões diversas, o princípio
do Promotor Natural no novo ordenamento
constitucional brasileiro.
Quando do prosseguimento do julgamento, o ilustre impetrante peticionou, esO Sr. Ministro Carlos Venoso: Sr. Pre- clarecendo que nenhuma atribuição fora
sidente, o fundamento principal da impe- deferida, formalmente, ao Promotor Espetração é que consagraria a Constituição Fe- cial, com o objetivo de viabilizar o ajuizaderal a figura do promotor natural, por isso mento de ação penal contra as ora pacienque, num certo processo criminal, o Procu- tes, razão pela qual teria ele, o Promotor
rador-Geral teria designado um outro pro- Especial, agido ultra vires, além dos limimotor, que não o titular da Vara, para fun- tes materiais estabelecidos na portaria de
cionar. Se a designação foi correta, podere- sua designação subscrita pelo Procuradormos enfrentar a questão do promotor natu- Geral de Justiça.
ral. Senão há designação, a ilegalidade será
Por essa razão, converteu-se o julgaoutra.
mento em diligência, a fim de que fossem
Imprescindível a diligência, a meu juí- requisitados os autos principais, ora apenzo.
sados ao presente habeas corpus. Neles,
constata-se a seguinte situação: a denúncia
EXTRATO DA ATA
foi oferecida em 29-3-89, e recebida em
HC 67.759 — RJ — Rel.: Min. Celso de 3-4-89, sem que, para tanto, dispusesse de
Mello. Poetes • Carla Esteves de Azevedo poderes o Promotor Especial, designado,
Guedes e outra. Inipte.: Nélio SeidlMacha- tão-somente, para acompanhar as investigações policiais. No entanto, o Procuradordo. Coator: Superior Tribunal de Justiça
Geral de Justiça baixou uma segunda porDecisão: Por unanimidade o Tribunal taria, em 5-4-89, ampliando as atribuições
converteu o julgamento em diligência, de- do Promotor Especial, com a finalidade de
terminando a requisição dos autos princi- conferir-lhe, também, poderes de atuar não
só em todos os inquéritos policiais, como,
pais. Votou o Presidente.
por igual, nas ações penais deles eventualPresidência do Sr. Ministro Néri da Sil- mente resultantes e concernentes àdenomiveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros nada «Operação Bandeja». Nesse segundo
Moreira Alves, Aldir Passarinho, Sydney ato, o Chefe do Ministério Público ratificou
Sanches, Octavio Ganotti, Célio Boda, Paulo o oferecimento da denúncia pelo Promotor
Brossard, Sepúlveda Pertence, Celso de Mel- Especial.
lo, Carlos Venoso e Marco Aurélio. ProcuEntendo que essa ratificação é perfeitarador-Geral da República, o Dr. Aristides
mente
possível, pelo que a portaria do SeJunqueira Alvarenga.
nhor Procurador-Geral de Justiça, de
Brasília, 8 de agosto de 1990 — Hérce- 5-4-89, legitimou qualquer possívele eventual defeito de ordem formal, no oferecilua Bonifácio Ferreira, Secretário.
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Concluindo, Presidente, reconhecendo que muito
embora estejamos apreciando habeas corpus impetrado contra decisão proferida pelo
Superior Tribunal de Justiça em recurso
interposto em habena corpos, com a ressalva que já fiz, voto a favor da diligência,
uma vez que alguns Colegas, pelo menos
dois, já se manifestaram no sentido da necessidade de os autos virem à Mesa.
VOTO (S/DILIGÊNCIA)
R.TJ —150
mento da peça acusatória pelo Promotor
Especial.
Assim, reitero o meu voto, o qual, não
obstante haver reconhecido presente em
nosso sistema constitucional o princípio do
Promotor Natural, orientou-se no sentido
de indeferir este habeas corpos pelas razões já longamente expostas.
VOTO (VISTA)
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Os presentes autos revelam que, em inquérito policial, distribuído à Quinta Vara Criminal
do Rio de Janeiro, oficiou. Titular nos seguintes termos:
«O M.P. manifesta-se pela concessão
de liberdade provisória mediante fiança
e, assim procede porque, efetivamente,
o auto de prisão em flagrante é carente
de qualquer elemento que indique o
exercício de tráfico ilegal de entorpecente por parte das indiciadas.
A hipótese no mesmo descrita é, no
máximo, aquela prevista no artigo 16 da
Lei n° 6.368/76, tratando-se, portanto,
de delito aflançável» (fl. 69).
Lançada a referida cota em 9 de março
de 1989, no dia imediato o ilustre Procurador-Geral de Justiça houve por bem designar o Promotor Dr. Luiz Carlos Rodrigues
da Costa para, «sem prejuízo de suas atribuições, como representante do Ministério
Público, acompanhar o inquérito policial n°
3289, instaurado na Delegacia de Entorpecentes e todos os demais inquéritos ou flagrantes instaurados para apurar infrações
penais resultantes da denominada 'Operação Bandeja', para repressão ao tráfico de
entorpecentes» (fl. 74).
Daí, a denúncia de fis. 51 a53, mediante
a qual o Promotor designado, em ótica diametralmente oposta a do Titular da Quinta
Vara Criminal, enquadrou a hipótese na
previsão do art. 12 da Lei n° 6.368176.
2.O Impetrante sustenta a nulidade processual, porquanto o afastamento do Titia-
149
lar da Quinta Vara Criminal e a designação
de outro membro do Ministério Público
para, no mesmo Juízo, atuar em um único
processo, estaria a configurar transgressão
ao princípio do «Promotor Natural», alçado
pela Carta de 1988 ao patamar constitucional.
3.0 nobre Ministro relator assim sintetizou a questão:
«Inobstante reconheça imanente ao
novo regramento constitucional pertinente ao Ministério Público o princípio
do Promotor Natural, não vislumbro, na
situação concreta emergente desses autos, hipótese que enseje a sua atuação,
pois o sentido desse postulado exige,
para que se lhe dê aplicabilidade, a edição de ato legislativo».
4. Na assentada em que teve início o
julgamento, externou o Ministro Sepúlveda Pertence o desejo não só de adiantar o
voto, face a estudo realizado após pedido
de vista na Turma, como também o de
fazê-lo antes daqueles que lhe antecedoriam na votação, ocorrendo concordância
implícita, originária, de minha parte, da
deliberação já tomada de fazer estudo da
matéria
Adotou S. Ex.' as premissas do voto do
Relator, concluindo, no entanto, pela concessão da segurança, já que:
«De qualquer sorte, Sr. Presidente,
seja essa ou não a solução que validamente se possa construir para a espera
da complementação legislativa que o
tema reclama, basta, no caso concreto, a
impossibilidade de conciliar os princípios da nova estruturação do Ministério
Público, gizados com mestria pelo eminente Relator, com a sobrevivência
de substituições arbitrárias, de aparência casuística e com indícios veementes
de desvio de poder, como a que se questiona na impetração.»
O voto mostrou-se conclusivo no sentido do deferimento do pedido formulado no
150
R.TJ. — 150
presente habeas corpo, para anular o processo, incluída a denúncia.
5. É inegável assistir ao Procurador-Geral de Justiça a atribuição de designar membro do Ministério Público para o desempenho de funções administrativas ou processuais afetas à instituição — artigo 7° da Lei
Complementar n° 40/81. Decorre tal atribuição da necessidade de racionalizar-se os
serviços, procedendo-se de forma global e,
portanto, tendo presente critério objetivo. E
isto ocorreu na hipótese dos autos. Determinado membro do Ministério Público foi
lotado, como Titular, na Quinta Vara Criminal do Estado do Rio de Janeiro, desempenhando a atividade pertinente ao cargo
de Promotor Público de forma indiscriminada, ou seja, em relação a todos os processos nela em tramitação. Daí haver lançado
cota nos autos do Inquérito Policial n°
032/89, reveladora não só da posição favorável do Estado quanto à liberdade provisória das Pacientes, como também da fragilidade do auto de prisão em fisga
visto que os fatos nele descritos estariam,
no máximo, — e esta foi a expressão utilizada, a configurar hipótese enquadrável no
artigo 16 da Lei n° 6.368/76.
Até então, viram as Pacientes observadas normas constitucionais básicas que asseguram, considerado o sentido amplo, e
assim deve ser percebido, o exercício do
lídimo direito de defesa. As condições do
caso, as particulares das acusadas, não ditaram providências discrepantes do quadro
normalmente verificado, logrando elas,
face ao pronunciamento ocorrido, a liberdade provisória
Eis que, no dia imediato ao do lançamento da cota nos autos pelo Titular do
Ministério Público junto à Vara para a qual
foi distribuído o inquérito, o ProcuradorGeral de Justiça resolveu, de ofício, designar Promotor específico para acompanhar
o inquérito policial referido, aludindo de
forma expressa a este último, bem como, de
forma genérica, a outros instaurados para
apuração de infrações penais resultantes da
denominada «Operação Bandeja». Com
isto, a visão do Estado quanto ao citado
inquérito modificou-se substancialmente,
vindo à balha denúncia a envolver o tráfico
de drogas e, portanto, o enquadramento das
Pacientes no artigo 12 da citada Lei Especial — fls. 51 a53.
A Constituição Federal contém preceitos que encerram a obrigatoriedade de respeitar-se o devido processo legal:
«Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo e aos acusados
em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e
recursos a ela inerentes» (inciso LV do
artigo 5°).
«Ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade compe-
tente» (inciso LIII do artigo 5°).
Inegavelmente, a existência deste último dispositivo legal revela alcance que
excede a simples previsão do juiz natural.
A uma, porque, ao contemplar garantia
constitucional, o faz com extravasamento
do campo alusivo ao ofício judie ante. Junge a prolação da sentença ao princípio do
juiz natural, é certo, mas também revela a
obrigatoriedade de observar-se o balizamento processual que outro não é senão o
previsto na legislação em vigor. A duas,
porquanto, estivesse o preceito limitado à
inserção do princípio do juiz natural como
garantia constitucional, forçoso seria dizer
da redundância, isto mediante revelação de
mandamentos com idêntico sentido, embora em incisos diversos. É que o de número
XXXVII, do mesmo artigo, prevê, este sim,
que não haverá juízo ou tribunal de exceção. Logo, impossível é deixar de reconhecer no inciso LIII sentido que extrapola o
campo pertinente à competência do juízo.
A alusão à impossibilidade de alguém vir a
ser processado senão pela autoridade competente diz respeito às normas processuais
e estas, iniludivehnente, abarcam os pressupostos de desenvolvimento válido do pro-
R.TJ 150
cesso e dentre estes exsurge a legitimidade
ad processum e que, no caso, quanto ao
Estado, é revelada pela atribuição conferida ao Promotor Público.
Ora, o elemento definidor da citada legithnidade fez-se na designação de determinado Promotor para, indistintamente,
atuar nos processos em tramitação na Quinta Vara Criminal. Observada a premissa
segundo a qual o processo deve seguir a
tramitação prevista na legislação em vigor,
conclui-se que as Pacientes não tiveram
respeitado o que lhes assegura a própria
Constituição, quer considerado o sentido
lato da expressão «juiz natural», quer em
relação ao conhecimento prévio do próprio
legitimado para o processo na figura tão
importante que é a do acusador.
Embora conhecedoras, de início, tias regras estabelecidos, viram estas últimas serem, de uma única penada e sem a provocação de que cogita o artigo 28 do Código
de Processo Penal — do Juiz da Vara—
modificadas e, o que é pior, após lograrem
enfoque amplamente favorável quanto à
tipicidade do fato. Em síntese, assentou-sélhes que o Juízo sentido lato — mostrouse desde logo completo quanto aos particise
pantes da relação processual, mas passível
de profunda modificação de acordo com os
desdobramentos do caso, como se autuação do Ministério Público não estivesse
direcionada, também, à busca, com isenção, da chamada verdade real. Passaram a
sei processadas mediante atuação de Promotor Especial --- e entenda-se nessa expressão o sentido da escolha —, olvidandose, com isto, a excomunhão, em termos
constitucionais, do juízo de exceção, a vinculação a formalidades de caráter abstrato
inciso LEI — e, ainda mais, a igualdade
que é o lastro de urna série de direitos —
homens e mulheres são iguais em direitos
e obrigações nos termos desta Constituição
inciso I do mencionado artigo 5°.
Sem mais nem menos ignorando-se até
mesmo a distribuição do inquérito já ocor-
151
rida, designou-se uni acusador para o caso
concreto, ao que tudo indica face ao descontentamento individual do Sr. Procurador-Geral com a atuação daquele que se
mostrou e continuou a se mostrar apto em
relação à totalidade dos demais processos
em Mimitação na Vara em que lotado como
Titular.
Se de um lado compete ao ProcuradorGeral a designação, de outro há que se
assentar a vinculação à lei. Sem fato contemplado por esta, o afastamento compulsório da4úele legitimado ad processam
para, em nome do Estado, promover a acusação e a substituição, em único processo,
por outrem e, mais ainda, após promoção
favorável aos acusados, vulnera, a um só
tempo, os preceitos pertinentes à proibição
dó juízo ou'tribunal de exceção de processar-se ao arrepio das normas previamente
conhecidas e, também, o que assegura a
ampla defesa, pois afastou-se o equilíbrio
verificado pela atuação, ao que se presume
eqüidistante, do Promotor originário. Discriminou-se, de forma atentatória, ao direito das Acusadas de terem o mesmo tratamento deferido àqueles envolvidos nos
demais processos em tramitação na referida Vara — inciso XLI do artigo 5° da
Constituição.
Dessarte, já aqui somo meu voto ao do
ilustre Ministro Sepúlveda Pertence e, no
particular, também peço vênia ao nobre
relator —não menos ilustre e douto Ministro Celso de Mello, para incorporar as premissas lançadas no voto que proferiu e que
revelam, como irrefutável, a conclusão em
torno da estatura constitucional do princípio Promotor Natural. Faço-o não só pelas
razões já consignadas e que agitam os
preceitos constitucionais dos incisos I,
XXXVII, LM e LV do artigo 5°, como
também por considerar que os princípios de
estatura constitucional geram, independentemente de lei regulamentadora, direitos e
garantias — principalmente estas — não
referidos expressamente no citado artigo,
152
R.T.J. —150
aliás como previsto no parágrafo segundo
a ele vinculado:
«Os direitos e garantias expressos
nesta Constituição não excluem outros
decorrentes do regime e dos princípios
por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte».
Constando do corpo da atual Carta,
quanto à atuação do Ministério Público,
muito mais para salvaguarda da própria
sociedade, como ressaltado pela melhor
doutrina — Sérgio Demoro Hamilton e
Paulo César Pinheiro Carneiro —, os predicados da independência funcional — §
1° do artigo 127 e da inamovibilidade —
alínea b do inciso 1 do artigo 128, há que
se ter o deslocamento da acusação, como
ocorrido, ou seja, à livre discrição do Procurador-Geral de Justiça do Estado do
Rio de Janeiro, como violador do direito
comezinho das Pacientes de verem observadas as regras previamente estabelecidas e, portanto, de não serem surpreendidas com a designação de um Promotor Especial. Vale ter presentes as palavras do Ministro Antonio Neder, lançadas
mediante voto proferido no habeas corpos
n° 48.728, em 26 de maio de 1971, julgado
pelo Pleno, cujo Acórdão foi publicado na
Revista Trimestral de Jurisprudência, págs.
299/339:
«Que o princípio da legalidade da
ação penal diz respeito aos atos do processo, à competência do juiz e também
à legitimidade do acusador. Em nosso
sistema judiciário não há acusador sem
que a lei o nomeie; em outras palavras,
o acusador há de ser sempre e necessariamente o acusador legal, isto é, aquele
que for previsto em lei ... entre nós,
domina o princípio da legalidade da ação
penal, ou, mais precisamente, o da legalidade comum ou ordinária da ação penal, tanto que o artigo 153, § 15, da
Constituição, texto da Emenda n° 1, expressa que não haverá tribunais de exce-
ção, vedado é o juiz de exceção; ora, se
é proibido o tribunal de exceção, vedado
é o juiz de exceção; se é vedado instituir
juízo de exceção, impedido é conceberse o acusador de exceção, pois não se
compreende que nossa Constituição
proíba o juiz de exceção e admita o
acusador de exceção, isto é, conceda e
ao mesmo tempo subtraia uma garantia».
E acabou por arrematar:
«O Promotor de Justiça da Comarca
de Guarulhos se encontra no exercício
de seu cargo de acusador oficial e a Ele,
só a ele, se pode cometer a acusação na
ação penal de que este processo ter a
acusação na ação penal de que este processo dá notícia isto por causa do princípio de que o acusador é sempre o
legitimado e não o escolhido por esta
ou aquela autoridade, categorizada que
seja, tanto mais justa esta conclusão
quanto é certo que a nomeação de outro
acusador importa em retirar, de tal promotor de justiça, a sua atribuição de
acusar, isto com ofensa manifesta à sua
estabilidade garantida, como se sabe
pela Constituição (art. 96)».
Hoje, robustece-se o enfoque conferido
à matéria pelo Ministro Antonio Neder,
pois a inamovibilidade constitucional está
contida de forma explícita em dispositivo
legal para mim de eficácia imediata, quer
porquanto encerra um princípio indispensável à atuação independente do Órgão,
quer porque nele já se contém disciplina
exaustiva. A regra está prevista sem o silêncio quanto à exceção — esta corte à
conta do interesse público e não prescinde
da deliberação de colegiado (no caso, o
Promotor Titular foi afastado por ato do
Procurador-Geral de Justiça), assegurada,
de qualquer forma, a ampla defesa
Contudo, ainda que assim não fosse,
mesmo que se possa dizer da necessidade
de regulamentação, impossível é olvidar o
princípio revelado no dispositivo constitu-
R.T.J — 150
cional, a gerar direitos, como previsto no
2° do artigo 5°, sendo certo que possível
dependência de balizamento legal do alcance da inamovibilidade aos citados direitos
não prejudica, constituindo-se, nisto sim,
em quadro inibidor de inciativas como a
revelada nestes autos. Em resumo, a ausência de regulamentação não exclui a inamovibilidade em si, afastando, sem a menor
dúvida, a instabilidade própria aos atos praticados à livre discrição, sob pena de alijarse aquela — a inamovibilidade — solapando-se, assim, a independência inerente à
atuação dos órgãos do Ministério Público.
Dentre as interpretações imagináveis deve
prevalecer a que empreste ao dispositivo
legal alguma eficácia, e não a que o torne
inócuo, potencializando-se, com isto, o
princípio fundamental nele inserido e que
está voltado à segurança jurídica.
Muito embora não conste alusão na Portaria, e colocando em plano secundário, por
absurdo, a origem individual e não colegiada do ato, impossível é vislumbrar o interesse público no simples fato de o Titular
da acusação haver concluído pela fragilidade do auto de prisão em flagrante e assentido quanto a requerimento em torno da
liberdade provisória e configuração, no
máximo, de consumo e não tráfico de entorporcentes, pois o que se espera do Ministério Público quer como parte, quer
como fiscal da lei é atuação voltada à verdade real.
As garantias do Ministério Público,
tais como as pertinentes aos magistrados,
extravasam, como já foi dito, o campo
dos interesses respectivos para alcançar o
dos que integram a vida gregária e, até
aqui, ninguém colocou em dúvida as relativas aos segundos, especialmente as
que cogitam da inamovibilidade, da vitaliciedade e da irredutibilidade de vencimentos.
A rigor, frente à Carta, a substituição do
Promotor Titular, ou seja, daquele que a
priori é destinatário de atribuição que o
153
torna legitimado à atuar em nome do Estado, somente pode ocorrer nas hipóteses de
suspeição, impedimento, ausência em virtude de faltas, férias ou licença e na pertinência do artigo 28 do Código de Processo
Penal. Estes são, em síntese, os casos que
encontram agasalho na ordem jurídica em
vigor. Extravagante é a substituição verificada à livre discrição do Procurador-Geral,
mormente a ponto de desautorizar o membro do Ministério Público que vem atuando
e de alcançar, solapando-a, a segurança dos
jurisdicionados. Conflita com a noção que
se tem do devido processo legal a variação
da figurado acusador em meio à tramitação
do processo e, portanto, sem que tenha
tornado conhecimento com anterioridade.
A independência do Ministério Público não
se coaduna com quadro que revele a existência de um superórgão retratado na pessoa do Procurador-Geral que, enfim, nada
mais é do que um membro da importante
instituição e que logrou, no campo político,
a confiança maior e, por isso mesmo, de
cunho subjetivo, indispensável ao exercício da função. Os esforços deste destacado
membro devem estar dirigidos ao fortalecimento da Instituição, a angariara confiança
dos cidadãos e, com isto, é de todo incompatível a interferência de oficio e sem justificativa ligada ao interesse público que
implique o afastamento daquele a quem se
atribuiu, anteriormente e de forma genérica, a incumbência de atuar em nome do
Estado.
Com este paralelo entre a inamovibilidade do Ministério Público — princípiogarantia dos que o integram, com os interesses e direitos das Pacientes, acompanho
nobre Relator quanto às premissas do
brilhante voto proferido e, na conclusão e
também nos doutos fundamentos, o voto do
Ministro Sepúlveda Pertence. Acolho o pedido formulado na inicial para deferir a
ordem, declarando nulo, assim, o processo
que resultou do Inquérito n° 32/89, a partir
do afastamento do Promotor Titular da
154
R.T.J. — 150
Quinta Vara Criminal e indicação do Especial para atuar no caso em análise.
EXTRATO DA ATA
HC 67.759 — RJ — Rel.: Min. Celso de
Mello. Poetes.: Carla Esteves de Azevedo
Guedes e outra. lmpte.: Nélio Seidl Machado. Coatoc Superior Tribunal de Justiça
Decisão: Após os votos dos Srs. Ministros Relator, que indeferia o pedido, e Marco Aurélio, que o deferia, para anular o
processo, nos termos enunciados em seu
voto, o julgamento foi adiado em virtude
do pedido de vista do Sr. Ministro Carlos
Venoso.
Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministro
Aldir Passarinho, Sydney Sanches, °eiavio Gallotti, alio Borja, Paulo Brossard,
Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Venoso e Marco Aurélio. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Moreira Alves. Procurador-Geral da República, o Dr.
Affonso Henriques Prates Correia, substituto.
Brasília, 19 de setembro de 1990 —
Hércelus Bonifácio Ferreira, Secretário.
VOTO (VISTA)
O Sr. Ministro Carlos Velioso: Num
inquérito policial distribuído à 5' Vara Criminal do Rio de Janeiro, o Promotor Avelino Gomes Moreira Neto oficiou manifestando-se pela concessão de liberdade provisória, mediante fiança, sustentando que
«o auto de prisão em flagrante é carente de
qualquer elemento que indique o exercício
de tráfico ilegal de entorpecente por parte
das indiciadas», e que «a hipótese no mesmo descrita é, no máximo, aquela prevista
no art. 16 da Lei n° 6.368/76, tratando-se,
portanto, de delito afiançável.» (fl. 72v.).
Esta manifestação deu-seno dia 9-3-89. No
dia seguinte, o Procurador-Geral de Justiça
designou outro Promotor para, «sem prejuízo de suas atribuições, como represen-
tante do Ministério Público, acompanhar o
Inquérito Policial. n° 32/89, instaurado na
Delegacia de Entorpecentes e todos os demais inquéritos ou flagrantes instaurados
para apurar infrações penais resultantes da
denominada Operação Bandeja, para repressão ao tráfico de entorpecentes.» (fl.
96). No dia 29-3-89, o Promotor Luiz Carlos Rodrigues da Costa, que fora designado
pelo Procurador-Geral, ofereceu denúncia
contra as ora pacientes, Elaine Estrela e
Cada Esteves de Azevedo Guedes (fls. 2/4
e 95), dando-as como incursas nas sanções
do art. 12 da Lei n° 6.368/76, a primeira,
enquanto a segunda nas sanções do art 12,
2°, II e III do mesmo diploma legal.
Houve pedido de habeas corpus perante o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro,
que denegou a ordem. Ao recurso ordinário
interposto, negou-lhe provimento o Superior Tribunal de Justiça. Daí o presente
habeas corpus originário perante esta Corte Suprema, visando à anulação do procedimento penal, sobre o fundamento de que
a designação de promotor especial, pelo
Procurador-Geral de Justiça, violou o princípio constitucional do Promotor natural
(CF, art. 127, 1° e art. 128, 5°, I, b).
O eminente Ministro Celso de Mello,
Relator, após enfatizar que a Constituição
de 1988 conferiu ao Ministério Público posição de eminência, como defensor do
povo, consagrando a figura do promotor
natural, «a que repugnam interferências ilegítimas da Chefia da Instituição, que rompem, mediante designações casuísticas e
arbitrárias, a regular ordem de distribuição
dos processos e encargos funcionais», cuja
fonte é o princípio de inamovibilidade, que
concerne ao cargo e às funções, acrescentou:
(...)
«Inobstante reconheça imanente ao
novo regramento constitucional pertinente ao Ministério Público o princípio
do promotor natural, não vislumbro, na
situação concreta emergente destes au-
R.T.J — 150
tos, hipótese que enseja a sua atuação,
pois o sentido desse postulado exige,
para que lhe dê aplicabilidade, a edição
de ato legislativo.»
Mais:
(...)
«Sendo assim, e enquanto não sobrevier a disciplina legislativa pertinente,
não há como aplicar —ou mesmo invocar — o princípio do Promotor Natural,
que, inobstante a sua formulação no Plano doutrinário, ainda constitui tema de
lege terenda.»
(...)
Concluiu S. Ex' por indeferir o habeas
coreus.
Já o Sr. Ministro Pertence, depois de
acentuar que o «promotor natural» decorre do princípio da independência funcional do Ministério Público (CF, art. 127, §
1°) e da garantia de inamovibilidade dos
seus membros (CF, art. 128, § 5°, I), com
implicações com o princípio do juiz natural e da garantia do devido processo
legal, acrescentou que esses princípios
hão de conviver com dois outros, o da
unidade e o da indivisibilidade, que contêm a idéia de uma organização hierarquizada, que compreende o poder de avocação e de substituição, vale dizer, «o poder
do superior hierárquico de chamar a si o
exercício concreto da função de subordinado» (J. Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, 1974, 1/381) -- e o de
substituição — isto é, o de «designar outro subordinado para o exercício concreto
da função do agente normalmente competente» (id. ibidem).» Destarte, acrescenta S. Ex.• «a inamovibilidade dos membros do Ministério Público, ... não se identifica à dos juízes, precisamente porque
— ao contrário do que sucede em relação
à magistratura —, no Ministério Público
a garantia há de conciliar-se com os
princípios da unidade e da indivisibilidade, impostos no mesmo contexto da
155
Lei Fundamental . » Todas essas questões
carecem de complementação legislativa,
diz S. Ex.• Todavia, acrescenta, as normas constitucionais que definem «os princípios institucionais do Ministério Público
— a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional (art. 127, § 1°) —
assim como a da necessidade implícita de
compatibilizá-las com as que definem as
garantias dos seus membros, entre elas, a
inamovibilidade a serem observadas nas
leis complementares de organização (art.
128, 5', 1), «são normas constitucionais
de princípio institutivo ou de princípio
orgânico ou organizativo, na classificação
de José Afonso da Silva (Aplicabilidade
das Normas Constitucionais, 1968, pág.
114), com uma certa dose de aplicabilidade
ou de eficácia, com o poder, por exemplo,
de cortar a eficácia de normas anteriores
com elas incompatíveis. Assim, por exemplo, não têm aplicação normas ou leis que
autorizam o Pmcbrador-Geral a praticar os
poderes de devolução e substituição sem o
concurso do colegiado superior do Ministério Público. Conclui S. Ex.':
(...)
«59. Mutatis mutandis, no sistema
vigente, não podem remanescer na esfera da decisão solitária do ProcuradorGeral poderes excepcionais que afetam
a garantia de inamovibilidadqe, se a segurança desta foi entregue, na Lei Fundamental, ao contrário do que sucedia na
ordem constitucional anterior — (CF
69, art. 95, § P, in fine), à decisão da
maioria qualificada de um colegiado da
instituição: foi essa a fórmula constitucional de proscrição, no campo delicado
dessa garantia básica , da margem de
subjetivismo e de arbítrio que é inerente
a toda decisão individual discricionária.
60. Não se trata, é certo, de uma
dedução lógica de preceitos inequívocos, mas, na ausência de disciplina complementar, de uma tentativa de concretização conciliadora do que Canotilho
156
R.T.J. —150
Chamaria «momentos de tensão ou antagonismo entre os vários princípios»
votados, na Constituição, à estruturação
do Ministério Público.
É significativo, aliás, que a submissão do exercício da avocação ou da
designação especial à anuência prévia
ou ao referendo dos colegiados superiores da instituição tenha sido a solução
proposta por ambos os projetos referidos, de Lei Orgânica, do Ministério Público da União (art. 49, VI e VIII) e da
lei nacional de bases do Ministério Público dos Estados (art. 10, IX, g).
De qualquer sorte, Sr. Presidente,
seja essa ou não a solução que validamente se possa construir para a espera
da complementação legislativa que o
tema reclama, basta, no caso concreto, a
impossibilidade de conciliar os princípios da nova estruturação do Ministério
Público, gizados com mestria pelo em.
Relator, com a sobrevivência de substituições arbitrárias, de aparência casuLsfica e com indícios veementes de desvio
de poder, como a que se questiona na
impetração.
Com escusas pela inesperada extensão do voto, peço vênia ao Ministro
Relator para deferir o habeas coreus
para anular o processo, incluída a denúncia: é o meu voto».
Votando, em seguida, o Sr. Ministro
Marco Aurélio, após considerações a respeito da garantia do devido processo legal,
do juiz natural (CF, art. 5°, LII1 e LV) e do
princípio da igualdade, trouxe ao debate o
voto do Sr. Ministro Antônio Neder, no HC
48.728, e deu adesão ao voto do Sr. Ministro Pertence, para o fim de deferir o writ.
Pedi vista dos autos e os trago, a fim de
retomarmos o julgamento do habeas corpus.
Estabelece a Constituição que são princípios institucionais do Ministério Público:
a unidade, a indivisibilidade e a indepen-
dência funcional (CF, art. 127, § 1°). E no
art. 128, § 5°, I, estatuiu:
«Art. 128 (...)
§ 5° Leis complementares da União
e dos Estados, cuja iniciativa é facultada aos respectivos Procuradores-Gerais, estabelecerão a organização, as
atribuições e o estatuto de cada Ministério Público, observadas, relativamente a seus membros:
I — as seguintes garantias:
(...)
inamovibilidade, salvo por motivo
de interesse público, mediante decisão
do órgão colegiado competente do Ministério Público, por voto de dois terços
de seus-membros, assegurada ampla defesa;
c) (.4»
Concordo com o Ministro Pertence,
quando S. Ex.' sustenta que o promotor
natural, que decorre dos princípios da independência funcional do Ministério Público (CF, art. 127, § 1°) e da inamovibilidade dos seus membros (CF, art. 128, § 5°,
b) deve hannonizar-se com os princípios
da unidade e da indivisibilidade (CF, art.
127, § 1°), compreendendo estes a idéia de
que o Ministério Público é «uma organização hierarquizada» e, como tal, a instituição, que é una, há de ter urna direção, uma
chefia — a própria Constituição, ao cuidar
do Ministério Público da União, deixa expresso que este tem por chefe o ProcuradorGeral da República, donde, pelo princípio
da simetria federal, os Ministérios Públicos
estaduais terão, também, um chefe, que
será o Procurador-Geral de Justiça — a
qual são conferidos certos poderes, «entre
os quais os de devolução —definido como
«o poder do superior hierárquico de chamar
a si o exercício concreto da função do subordinado» (J. Figueiredo Dias, DireitoProemulai Penal, 1974,1/381) —e ode substituição — isto é, o de «designar outro
normalmente competente» (id. Ibidem).»
R.T.J —150
Isto deflui, mesmo, da organização hierarquizada, com uma chefia, certo, entretanto,
que tala essa organização deverá ser objeto
de complementação legislativa, conforme
está expresso, aliás, na Constituição (art.
128, 5°).
Posta assim a questão, importa perquirir
se, enquanto não editada a lei complementar mencionadano § 5° do art 128 da Constituição, estaria de pé ou, noutras palavras,
teria sido recepcionada, pela nova ordem
constitucional, a disposição constante da
Lei Complementar n° 40, de 1981, que, no
seu art. 7°, V, confere ao Procurador-Geral
de Justiça poderes para, «mesmo no curso
do processo, designar outro membro do
Ministério Público para prosseguir na ação
penal, dando-lhe orientação que for cabível
no caso concreto.»
Esta é a questão.
Para enfrentá-la é necessário, primeiro
que tudo, verificar se a norma constante do
§ 5°, I, b, do art. 128, tem aplicabilidade ou
pelo menos alguma incidência.
José Afonso da Silva, em obra que se
tornou clássica, formulou, com base em
modernos constitucionalistas italianos,
como, por exemplo, Vezio Crisafulli, La
Coslituzione ele sue Disposizioni di Principio, Milão, Dott. A. Giuffrè-Editore,
1952, a divisão tricotômica das nonas
constitucionais, a dizer que, quanto à sua
eficácia e aplicabilidade, elas podem ser
assim divididas: a) normas constitucionais
de eficácia plena e aplicabilidade imediata:
não dependem de normatividade ulterior,
para sua aplicação, vale dizer, têm incidência imediata; b) normas constitucionais de
eficácia contida e aplicabilidade imediata,
mas possivelmente não integral: têm normatividade suficiente; todavia, prevêem
normatividade ulterior, que pode reduzir a
sua eficácia e aplicabilidade; c) normas
constitucionais de eficácia limitada ou reduzida, que podem ser de duas espécies:
cl) declaratórias de princípios institutivos
ou organizativos, c2) declaratórias de prin-
157
cípios programáticos. Essas normas não
receberam normatividade suficiente para a
sua aplicação, ou, noutras palavras, ao legislador ordinário cabe regulamentá-las;
são dependentes, portanto, de normatividade ulterior (José Afonso da Silva, Aplicabilidade das Normas Constitudonais, Ed.
RT, ? ed., 1982, pág. 67/75).
No caso, bem percebeu o eminente Ministro Pertence, as normas inscritas no § 5°
do art. 128 são normas de eficácia reduzida
ou limitada. Em princípio, pois, não têm
normatividade suficiente para sua aplicação. No caso, elas podem se classificar
como normas constitucionais de princípio
institutivo. São de eficácia limitada, em
princípio, mão são, todavia, destituídas de
aplicabilidade, como querem aqueles que
as chamam de normas de eficácia ou aplicabilidade diferida, como a pretender que
nada significam, enquanto o legislador não
emitir regras jurídicas que as complementem.» (José Afonso da Silva, ob. cit., págs.
111/112). Como contêm elas esquemas gerais de organização, estabelecem «como
que início de estruturação de instituições,
órgãos ou entidades, pelo que também poderiam chamar-se normas de princípio orgânico ou organizativo», acrescenta José
Afonso da Silva (ob. cit., pág. 112). Por
isso mesmo, porque estabelecem um início
de organização, têm aplicabilidade onde tal
aplicabilidade se tome possível.
Vamos ao caso sob exame.
Aqui, estou em que, conferindo a norma
constitucional inamovibilidadqe ao membro do Ministério Público, «salvo por motivo de interesse público, mediante decisão
do órgão colegiado competente do Ministério Público, por voto de dois terços de
seus membros, assegurada ampla defesa»
(CF, art. 128, § 5°, I, «b»), não recepcionou
ela norma infraconstitucional que assegure
ao Procurador-Geral poderes para, «mesmo no curso do processo, designar outro
membro do Ministério Público para prosseguir na ação penal, dando-lhe a orienta-
158
R.T.J. — 150
ção que for cabível no caso concreto.» (Lei
Complementar n° 40/81, art. 7°, V).
Uma coisa ficou certa, a partir da promulgação da norma constitucional de que
cuidamos, o § 5°, I, b, do art. 128: somente
mediante decisão do órgão colegiado do
Ministério Público, por voto de dois terços
de seus membros, assegurada ampla defesa, e por motivo de interesse público, poderá o membro do Ministério Público ser
afastado de suas funções ou das funções
para as quais estava designado. Esse afastamento será disciplinado na lei complementar de que fala o â 5° do art. 128, tendo
presentes os princípios da unidade e indivisibilidade do Ministério Público, é certo;
mas não é menos certo que, a partir da
promulgação da citada norma constitucional, vale repetir, já não tem vigência norma
infraconstitucional que autoriza o Procurador-Geral a afastar, em detrimento do princípio da inamovibilidade, o membro do
Ministério Público das funções para as
quais estava designado.
Este raciocínio mais se reforça diante
das considerações postas no voto do Sr.
Ministro Marco Aurélio. Na verdade, o
princípio da inamovibilidade do membro
do Ministério Público —com as restrições
atrás mencionadas, tendo em vista os princípios constitucionais da unidade e indivisibilidade do Ministério Público — completa °princípio do due process of law que
a Constituição consagra e que compreende
o do juiz natural (CF, art. 5°, XXXV, LEI,
LV).
Do exposto, peço licença ao Sr. Ministro
Celso de Mello para acompanhar o voto do
Sr. Ministro Sepúlveda Pertence. Em conseqüência, defiro o writ.
EXTRATO DA ATA
HC 67.759 —RJ —Rel.: Min. Celso de
Mello. Pactes.: Carla Esteves de Azevedo
Guedes e outra. Irnpte.: Nélio Seidl Machado. Coator: Superior Tribunal de Justiça.
Decisão: Após os votos do Srs. Ministros Relator, que indeferia o pedido, e Marco Aurélio, Sepúlveda Pertence e Carlos
Velloso que o deferiam, para anular o processo, o julgamento foi adiado em razão do
pedido de vista do Sr. Ministro Paulo Brossard.
Presidência do Sr. Ministro Aldir Passarinho, na ausência justificada do Sr. Ministro Néri da Silveira, Presidente. Presentes
os Srs. Ministros Moreira Alves, Sydney
Sanches, Octavio Gallotti, Célio Boda, Paulo
Brossard, Sepúlveda Pertence, Celso de
Mello, Carlos Velloso e Marco Aurélio.
Procurador-Geral da República, o Dr. Affonso Henriques Prates Correia, substituto.
Brasília, 11 de outubro de 1990 — Hércelus Bonifácio Ferreira, Secretário.
VOTO
O Sr. Ministro Paulo Brossard: Questiona-se no presente babas corpus a designação de um promotor especial, pelo
Procurador-Geral de Justiça do Estado do
Rio de Janeiro, para atuar em todos os
procedimentos persecutórios penais resultante de determinada operação policial, denominada «Operação Bandeja», efetivada na cidade do Rio de Janeiro.
Sustenta o impetrante que essa designação ofende o princípio do «promotor natural» que, na hipótese, seria o titular da
Promotoria da 5' Vara Criminal do Rio de
Janeiro.
2. 0 relator, Ministro Celso de Mello,
entende que o princípio depende de lei para
que se lhe dê aplicabilidade; a Lei Orgânica
Nacional do Ministério Público é que lhe
vai delinear o perfil, precisar-lhe o conteúdo, o alcance e a extensão. Enquanto não
sobrevier a disciplina legislativa pertinente, não há como aplicar— ou mesmo invocar — o princípio do promotor natural.
Por outro lado, o Ministro Sepúlveda
Pertence, entendendo que o promotor natural decorre do princípio da independência
funcional do Ministério Público (CF, art.
R.TJ— 150
127, § 1°) e, da garantia da inamovibilidade
dos seus membros (CF, art. 128, § 5°, I, b),
relaciona-o com os princípios do juiz natural e do devido processo legal e com os
princípios constitucionais que informam a
instituição, o da unidade e o da indivisibilidade. Não contesta, porém que a eficácia
plena e a concretização positiva de tais
normas dependam de complementação legislativa, — o que contesta é a recepção
do podennonocrático do Procurador-Geral
para, imotivadamente e sem previsão específica, substituir o Promotor, que deveria
atuar em determinado procedimento em
curso, em decorrência de sua designação
para oficiar junto a determinado juízo criminal, por outro de sua livre escolha. O que
se põe em discussão é a sobrevivência da
disciplina legal anterior, ante a nova ordem
constitucional, até a edição das normas legislativas requeridas. Acompanharam-no
os Ministros Marco Aurélio e Carlos Vdloso.
3. Preliminarmente, peço vênia para divergir dos que vêem na inamovibilidade
dos membros do Ministério Público a base
do princípio do «promotor natural». Vejo
na inamovibilidade uma garantia fundonal, cuja finalidade é proteger, no caso
específico, o pleno exercício das elevadas
funções dos membros do Ministério Público, contra desmandos de autoridades que
lhes sejam superiores. É a garantia funcional do Promotor Público de permanecer no
lugar para o qual foi designado, impedindo
sua remoção ex offido, salvo motivo de
interesse público.
Tanto é que a Constituição Federal dispõe no artigo 128, parágrafo 5°, que a Lei
Orgânica do Ministério Público deve observar, relativamente a seus membros:
I — as seguintes garantias:
b) inamovibilidade, salvo por motivo
de interesse público, mediante decisão
do órgão colegiado competente do Ministério Público, por voto de dois terços
159
de seus membros, assegurada a ampla
defesa
A inamovibilidade é garantia outorgada
aos membros do Ministério Público, que
objetiva evitar a sua remoção ou transferência discricionária ou arbitrária; é uma garantia, hoje constitucional, que visa ao
agente público e não aos administrados ou
jurisdicionados, não obstante fraga reflexos indiretos a estes.
Tanto isto é verdade que, mesmo na
hipótese de imovibilidade por motivo de
interesse público, permitida pela norma
constitucional, deve-se assegurar ao Promotor Público e somente ele a ampla defesa
dessa sua garantia funcional.
Ademais, assentar o princípio do «promotor natural» na garantia da inamovibilidade resultaria em sustentar também em
relação à Defensoria Pública o princípio do
«Defensor Público natural», já que o parágrafo único do artigo 134 da Constituição
assegura, também, a esses funcionários a
garantia da inamovibilidade.
4. No que diz respeito ao, também invocado, princípio da independência funcional
do Ministério Público, é de se observar que
ele é assegurado, no parágrafo 1°, do artigo
127, da Constituição Federal, à instituição
do Ministério Público, tanto é que a norma
constitucional ao assim conceituá-lo, como
princípio institucional, objetiva precípua e
fundamentalmente estabelecer sua autonomia em relação aos Poderes do Estado anão
exclui a hierarquia e a disciplina.
É claro que da independência funcional da instituição decorre a de seus membros; é uma garantia funcional que deflui
da institucional.
De mais a mais, entendo que os princípios da unidade e da indivisibilidade da
instituição não favorecem a tese da impetração.
Aliás, a designação de um promotor para
acompanhar todos os processos decorrentes de certa operação policial, como no caso
160
R.T.J. —150
vertente, parece-me que se justifica por si
mesma, a conveniência de dar unidade e
coerência à ação do Ministério Público em
relação a situações idênticas, evitando contradição ou desconformidade em procedimentos resultantes de uma só origem. Não
me parece tenha havido abuso na medida
adotada pelo Procurador-Geral do Estado.
A justificação da medida decorre de sua
própria enunciação; evidentemente cuidava dar unidade e coerência à ação persecutória. Quando ocorre urna «operação bandeja», suponho eu tenha atingido algumas
ou muitas pessoas; os processos resultantes
poderiam estar distribuídos por diversas
varas, para diversos promotores e ter desenvolvimento processual diferenciado e,
quem sabe, até contraditório. Parece-me
que, por um princípio normal de administração, o Procurador-Geral quis imprimir
ao caso unidade de ação e de tratamento. O
Procurador-Geral tem este poder? Entendo
que sim; ele tem de ter; não precisa a lei
dizer; decorre da própria organização do
serviço público. O Ministério Público não
faz exceção a esta regra. A menos que
houvesse nonna legal expressa em contrário, tenho para mim que é um poder Sito
a toda organização do serviço público. O
Procurador-Geral tem de ter. Agora, o Procurador-Geral pode claudicar? Pode. Mas
não posso raciocinar partindo do pressuposto de que o Procurador vá agir facciosa
e abusivamente. Tenho de raciocinar que
um alto servidor, que se presume possuidor
dos títulos devidos, não vai proceder senão
no sentido do regular funcionamento da
instituição que dirige. De modo que, a mim
parece uma medida que eu diria trivial de
organização, de disciplina, de condução do
serviço público. Não vejo ilegalidade nem
ofensa aos direitos dos impetrantes do habeas corpus. Se a lei amanhã dispuser de
outro modo, muito bem, a lei terá assim
disposto, mas assentar como regra que decorra da inamovibilidade o princípio do
promotor natural à semelhança do juiz natural, quer-me parecer que constitui um
excesso que não encontra fundamento na
disciplina constitucional da instituição.
Sr. Ministro Sepúlveda Pertence:
Não queria polemizar. Mas preciso deixar
claro que a denominação «promotor natural" se a usei, foi por mera simplificação.
No meu voto, ao que me lembro, disse
claramente que não cedia a essa perigosa
tendência de tratar os problemas do Ministério Público com a similitude absoluta
com a Magistratura, quando há dois princípios, também constitucionais — a unidade
e a indivisibilidade do Ministério Público
— a impor nítida diferenciação entre as
duas instituições. O que me pareceu, no
entanto, data venta, é que a unidade e a
indivisibilidade, na Constituição brasileira,
hão de compatibilizar-se com a independência funcional e, em termos, com a ina,movibilidade, sob pena de esvaziá-las.
Donde, a existência de critérios legais necessários a permitir o afastamento do promotor de determinado caso e a designação
de outro.
Sr. Ministro Paulo Brossard: Eu
apenas diria, Sr. Presidente, e sem propósito de prolongar o meu voto, que os princípios da unidade e da indivisibilidade do
Ministério Público não são novidade. A
eles se refere a velha lei do Ministério
Público, e mais do que isto, Sn Presidente,
antes que estivesse na lei, estava na jurisprudência. Eu me recordo de um acórdão
do Tribunal de Justiça do Estado do Rio
Grande do Sul, prolatado pouco depois da
Constituição de 1946, em que o Tribunal
do Rio Grande do Sul, por unanimidade,
concedeu babem corpus, num determinado caso, fundado no princípio da unidade e
indivisibilidade do Ministério Público, que
não estava expresso em nenhuma lei.
0Sr. hffinistro SepúlvedaPertenec Unidade e indivisibilidade à outrance levariam, como está na Lei Orgãnica do Ministério Público português, também à rígida
hierarquia da instituição. O difícil, entre
- 150
nós, é conciliar unidade e indivisibilidade
com independência funcional.
O Sr. Ministro Paulo Brossard: Mas a
independência funcional também tem o seu
alcance e o seu conteúdo. Se nós não conciliarmos esse princípio com o da hierarquia, vamos estabelecer, uma espécie de
«monarquia», uma série de ilhas que não
chegam sequer a formar um arquipélago,
num serviço que deve ter unidade e indivisibilidade e que tem inclusive um chefe que
se chamaProcuradar-Geral, previsto na Constituição, e que, aliás, não é de hoje.
Mas, é claro, Sr. Presidente, houve tempos em que o Ministério Público era realmente um agente de confiança absoluta,
pura e simples, do Poder Executivo Creio
que isso foi em todo o Brasil, no Rio Grande do Sul também foi assim. Mas há muito
tempo que ele vem se libertando dessa submissão e adquirindo um alto status legal e
constitucional. Creio, no entanto, que não
se pode levar ao ponto de estabelecer o
Ministério Público como se fosse uma espécie de domínio pessoal, próprio ou privativo de cada agente, e que o Chefe do Ministério Público não possa tomar providências relativas ao serviço, que a mim parecem de óbvia justificação, como neste caso
concreto.
Tenho para mim que «promotor natural»
é o integrante do Parquet com as garantias
funcionais (pessoais e institucionais) constitucionalmente previstas, a quem as leis
de integração normativa tenham deferido
competências privativas ou especiais. Não
vejo ofensa a esse princípio, na instituição
de órgãos especiais com funções específicas no Ministério Público, como também
não vejo na designação de Promotores especiais, desde que estas objetivem o interesse público e estejam previamente previstas nas suas leis organizacionais. O que
não é possível dentro da nova sistemática
constitucional é a designação do Promotor
ad hoc para exercer funções institucionais
do Ministério Público e nem as designa-
161
ções que venham a prejudicar ou inibir a
independência funcional de seus membros.
Em face da Constituição, na designação,
de um Promotor especial para cuidar de
processos originários de uma só providência policial, não vejo que resulte em constrangimento ilegal às pessoas por desventura envolvidas na apuração policial do caso
e an seu desdobramento judicial.
Peço vênia aos eminentes Ministros que
esposaram entendimento contrário para indeferir o habeas corpos, por entender,
como entendo, ser inaceitável a tese sustentada na impetração.
Indefiro o habeas corpo.
VOTO
O Sr. Ministro Octavio Gallotti: Também eu, Sr. Presidente, peço licença aos
Ministros que deles divergiram, para acolher os votos dos eminentes Ministros Relator e Paulo Brossard, pelos próprios fundamentos que S. Exm, brilhante e exaustivamente, aduziram perante este Tribunal.
Indefiro o pedido.
VOTO
O Sr. Ministro Moreira Alves: Sr. Presidente, também indefiro o pedido, por entender que inexiste a figura do denominado
promotor natural.
VOTO
O Sr. Ministro Sydney Sanches (Presidente): Havendo questão constitucional a
dirimir, devo votar.
A meu ver, a Constituição Federal de
1988 não contém explícito, nem implícito,
o princípio do «Promotor natural», não resultando ele, necessariamente, dos princípios da independência funcional e da inamovibilidade dos membros do Ministério
Público.
Valho-me, quanto a esses pontos, dos
fundamentos deduzidos no voto do eminente Ministro Paulo Brossard, com a devida vênia dos que dissentem.
R.T.J. —150
162
Nada impede, porém, que a Lei Orgânica do Ministério Público venha a adotar o
princípio (do «Promotor natural»), o que,
aliás, me parece salutar para a instituição e
para os jurisdicionados.
De qualquer maneira, devo acompanhar
a conclusão do voto do eminente Relator,
pois não vislumbrando (o meu voto), o princípio do «Promotor natural», nem explícito
nem implícito, na Constituição, e não havendo sido ainda editada lei que o reconheça,
devo, como S. Ex.*, concluir pelo indeferimento do pedido de babeas corpo.
EXTRATO DA ATA
HC 67.759 —RJ —Rel.: Min. Celso de
Mello — Pctes • Carla Esteves de Azevedo
Guedes e outra. Impte.: Nélio Roberto
Seidl Machado. Coator: Superior Tribunal
de Justiça — STJ.
Decisão: Por maioria de votos, o Tribunal indeferiu o pedido de «habeas corpos"
vencidos os Ministros Marco Aurélio, Carlos Velloso e Sepúlveda Pertence, que o
deferiam, ficando revogada a medida liminar. Votou o Presidente. Não votaram os
Ministros Francisco Rezek e Ilmar Gaivão,
pois, à época do início do julgamento não
integravam a Corte.
Presidência do Sr. Ministro Sydney Sanches. Presentes à Sessão os Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira, Octavio Gallotti, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence,
Celso de Mello, Carlos Velloso, Marco Aurélio, limar Gaivão e Francisco Rezek. Procurador-Geral da República, Dr. Aristides
Junqueira Alvarenga.
Brasília, 6 de agosto de 1992 — Luiz
Tomimatsu, Secretário.
HABEAS CORPUS N° 69.424 — RJ
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves
Paciente: Ailton Braz de Oliveira — Impetrante: Antônio Roberto Barbosa
— Coator: Tribunal de Alçada Criminal do Estado do Rio de Janeiro
alabeas corpus».
—Ocorrência de evidente erro material, insuscetível de acarretar prejuízo por dubiedade, é mera irregularidade que não invalida a
citação por edital.
— A inexistência, nos autos da ação penal, de certidão de que
o edital de citação foi afixado no foro implica nulidade relativa que tem
de ser alegada na primeira ocasião em que o réu, por seu advogado, se
manifeste nos autos (HC 50.893, RTJ 68/34 e seguintes), o que não
ocorreu no caso.
«Habeas corpo» indeferido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na confomúdade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos,
em indeferir o pedido de «habeas corpos».
Brasília, 20 de abril de 1993 — Moreira
Alves, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): São estas as informações prestadas
pelo Exmo. Sr. Presidente, em exercício, do
R.T.J — 150
Tribunal de Alçada Criminal do Estado do
Rio de Janeiro:
«Em atenção aos termos do Ofício n°
475/R, datado de 19 de maio passado, e
reportando-me, preliminarmente, ao
Expediente n° 088/SJ/92, desta Presidência, relativos ao writ em epígrafe,
impetrado em favor de Ailton Braz de
Oliveira, informa a Vossa Excelência o
seguinte:
O histórico fático-processual está
razoavelmente descrito na impetração,
embora alguns dados, como se vê a seguir, não estejam condizentes com a realidade.
Expedida deprecata para o Estado
de São Paulo, objetivando a citação pessoal do paciente, não logrou o meirinho
paulista encontrá-lo, nem veio ao feito,
antes da sentença ou do acórdão, prova
da prisão do paciente em São Paulo.
Contra o edital de citação expedido em razão de tal fato, e da inobservância às formalidades que presidem a
citação frota, é que reclama o impetrante, acoimando de nulo o édito e de inválido, também, em conseqüência, o diamamado editalício.
Consta dos autos, ao revés do retratado na exordial, a anexa cópia do
referido edital, datado de 26 de agosto
de 1975, convocando o paciente a ser
interrogado em 20 de outubro seguinte
(1973), às 11 horas, contendo o endereço do Juízo e demais dados pertinentes.
Do seu verso (cópia anexa), ao
contrário do contido na inicial, figuram
as certidões de conformidade com o original, de afixação no local de costume,
de expedição dos ofícios de praxe e de
envio do mesmo à publicação.
A seguir, está lavrada nos autos
certidão (cópia anexa) de que o Diário
Oficial publicou o referido edital em
19-12-75, não se achando, no entanto,
nos autos, exemplar do periódico, nem
163
explicitando a certidão a página respectiva da publicação.
0 atraso na publicação do edital,
efetivamente, ocasionou que esta se desse após a data fixada naquele para o
interrogatório, afigurando-se-me, entretanto, meras irregularidades, a ausência,
nos autos, de exemplar do Diário Oficial, bem como a inespecificação de sua
página na certidão do escrivão; estranha, de outra parte, ao sistema processual vigente, a certidão de `desafetação,
do edital, pleiteada, também, pelo impetrante.
Estas as informações que me cumpria transmitir a Vossa • nlênria, acompanhadas de outras peças dos autos, além
das supramencionadas, permanecendo o
signatário ao inteiro dispor do conspícuo Relator ou da Coletada Turma para
complementá-las dou adotar providências outras, acaso reputadas convenientes.» (fls. 51/53)
Às fls. 69/71, assim se manifesta a Procuradoria-Geral da República, em parecer
do Dr. Haroldo Ferraz da Nóbrega:
«O Dr. Antônio Roberto Barbosa
impetra uma ordem de habeas eorpus
em favor de Ailton Braz de Oliveira,
que cumpre diversas condenações em
São Paulo (entre as condenações, a condenação objeto do presente processo).
A condenação, cujo processo impugna, foi a dois anos e seis meses de reclusão, por estelionato.
Sustenta que é nulo o processo enfocado no HC (Proc. n° 29.870, RJ, Apelação Criminal n° 10.727, RJ, fls. 5W77)
por vício de citação por edital.
As nulidades teriam decorrido do seguinte:
não há nos autos cópia da citação
por edital;
não há certidão de afixação do
edital no local de costume;
164
R.T.J. — 150
c) não há certidão de desafixação do
edital.
Curiosamente, a própria defesa se
encarregou de trazer para os autos uma
cópia do Diário Oficial onde publicado
o edital de citação do paciente (fl. 28).
Sustenta, porém, a defesa que tal edital
não valeria pois publicado no Diário
Oficial de 19 de dezembro de 1975 convocara o réu para comparecer a Juízo a
15 de março de 1975 (fls. 9 e 28).
Não assiste razão aos impetrantes.
As informações esclarecem e comprovam que houve a certidão de afixação do edital no local de costume (fl.
55). Mostram ainda a cópia do edital (fl.
54), no qual há obediência às formalidades legais e estranham a exigência —
inteiramente procedente a perplexidade
— ante o sistema processual vigente de
certidão de desafixação.
As informações ressaltam que há certidão de publicação do edital no Diário
Oficial.
'Não se achando, no entanto, nos
autos, exemplar do periódico, nem
explicitando a certidão a página da
publicação' (autos, fl. 52).
Ocorre porém, que a defesa, como já
salientado, trouxe para os autos cópia do
Diário Oficial onde publicado o edital
(fl. 28).
Como se vê, as alegações de nulidade
formuladas na impetração foram repelidas nas informações às quais se reporta
este órgão para opinar pelo indeferimento do writ. Nesta oportunidade, destaca
o signatário para exame a alegação de
nulidade que decorreria da inserção de
data equivocada para comparecimento
do réu. Ora, se o edital era publicado a
19 de dezembro de 1975, com prazo de
15 dias, chamando o réu para interrogatório (ato futuro), a data 15 de março de
1975 haveria de ser entendida como 15
de março de 1976. Cuida-se de pequena
inexatidão material que não nulifica o
ato processual em referência. Nestas
condições, o parecer é no sentido do
indeferimento do writ.
Requisitei os autos da ação penal, que se
acham apensados.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): 1. No caso como se vê do exame dos
autos, houve citação por edital publicado
na imprensa. Embora não juntado o edital
aos autos da ação penal, há nestes certidão
de sua publicação no Diário Oficial de 1912-75 (fl. 130), e o próprio impetrante juntou, com a inicial deste habeas corpos,
xerox da folha do Diário onde se deu essa
publicação. É certo que, nela, ao invés de
15 de março de 1976, a data para o interrogatório saiu como sendo 15 de março de
1975, erro, no entanto, que dada a sua evidência (logo abaixo, vem a data de expedição dos editais (15 de dezembro de 1975; e
o Diário Oficial da publicação é de 19 de
dezembro de 1975), se constitui em mera
irregularidade, insusceptível de acarretar
prejuízo por dubiedade.
Ademais, a circunstância de não haver
certidão nos autos da ação penal de que esse
edital foi afixado no foro — nos autos há
apenas a certidão de que aforam expedidas
diligências» para o interrogatório no dia 15
de março de 1976, aludindo-se ao edital (fl.
129-verso) — implicaria nulidade relativa,
que, como decidiu o Plenário desta Corte
no HC 50.893 (RTJ 68/34 e segs.), teria de
ser alegada na primeira ocasião em que o
réu, por seu advogado, falasse no processo.
Ora, no caso, o réu, quando localizado, foi
interrogado (fls. 222 e 222-verso), tendo
declarado ser advogado na OAB, Seção do
Estado de São Paulo, e indicado para seu
patrono o Dr. João Cesar de Luca, que,
aliás, antes mesmo da intimação para a
ciência da sentença condenatória, interveio
no processo, com procuração passada pelo
ora paciente (fl. 192 dos autos da ação
R.TJ — 150
penal), peticionando, sucessivamente, às fls.
190, 196, 204, 208 e 211, sem alegar qualquer nulidade.
2. Em face do exposto, indefiro o presente habeas corpus, e determino a restituição dos autos da ação penal à origem.
EXTRATO DA ATA
HC 69.424 — RJ Rel.: Mm. Moreira
Alves. Pacte. • Afitar Braz de Oliveira. Impte.: Antonio Roberto Barbosa. Coator: Tribunal de Alçada Criminal do Estado do Rio
de Janeiro.
165
Decisão: A Turma indeferiu o pedido
de «habeas capas», nos termos do voto do
Relator. Unânime.
Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Octavio Gallotti, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e Durar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Miguel Franzino Pereira.
Brasília, 20 de abril de 1993 —Ricardo
Dias Duarte, Secretário.
HABEAS CORPUS N° 69.433 — SC
(Segunda Turma)
Relata: O Sr. Ministro Carlos Velloso
Paciente: Lauri Baldio Casarotto — Impetrante: Lati Antônio Hanauer —
Coator: Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina
Processual penaL Recurso. Tempestiridarle.
I — Tempestiva a apelação, deverá ela ser julgada, como
entender de direito, o Tribunal a que.
II — Habeas carpas deferido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por decisão unânime, deferir
o «habeas corpus», para que, afastada a
intempestividade da apelação, prossiga o
Tribunal no julgamento do mérito, como
entender de direito.
Brasília, 1° de dezembro de 1992 —
Néri da Silveira, Presidente — Carlos
Velloso, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Tratase de habeas torpe impetrado em favor
de Lauri Bortollo Casarotto, com o objetivo de desconstituir acórdão prolatado
pela Egrégia Segunda Câmara Criminal do
Tribunal de Justiça do Estado de Santa
Catarina, que não conheceu, por intempestivo, de recurso de apelação interposto contra decisão de primeiro grau, que condenara
o ora paciente pela prática do crime previsto no art. 129, capta, do Código Penal.
Diz o impetrante que o paciente foi condenado a três meses de detenção como incurso nas penas do art. 129, caput, do
Código Penal, pena que foi substituída pela
de multa. Inconformado, recorreu da decisão para o Tribunal de Justiça, cuja
Segunda Câmara Criminal não conheceu
do apelo, por entender ter sido o recurso
interposto a destempo. Sustenta o impetrante que o prazo recursal começou a
fluir no dia 1°-3-91, sexta-feira, e terminou no dia 5 do mesmo mês, data em que
166
R.T.J. — 150
protocolou o recurso, que recebeu o n°
14.791. A dúvida surgiu por ter o Dr. Juiz
despachado a petição no dia seguinte,
6-3-91.
As informações prestadas à fl. 15 se
limitam a dar a tramitação do processo que
resultou na condenação do ora paciente.
O presente writ foi impetrado perante o
Tribunal de Justiça de Santa Catarina, que
o encaminhou ao Superior Tribunal de Justiça e este, por sua vez, remeteu os autos a
esta Corte.
Por solicitação do Ministério Público
Federal, os autos da Apelação Criminal n°
27.220, da Comarca de Seara-SC, foram
requisitados ao Tribunal de Justiça de Santa
Catarina e juntados a estes autos.
Oficiando pela segunda vez, o Ministério Público Federal, pelo parecer do ilustre
Subprocurador-Geral Havido Ferraz da
Nóbrega, opina no sentido de ser considerada tempestiva a apelação questionada,
devolvendo-se os autos ao Tribunal de Justiça de Santa Catarina, para que a julgue
como entender de direito. Argumenta o
parecer que, examinando atentamente o documento de fl. 40 dos autos apensos, chegou à conclusão de que a apelação é tempestiva, esclarecendo que «o equívoco do
parecer de fls. 54/5 advém do fato de que o
seu nobre subscritor não examinou o verso
de fl. 40 (e não 49 como indicou), onde se
vê, com alguma dificuldade, é certo, as
anotações chanceladas mecanicamente:
'Poder Judiciário — Comarca de Seara —
14791 — Mar 91-5-15, 28'.»
O parecer foi assim ementado:
«Ementa: Demonstrado na impetração que a apelação era tempestiva, deve
ser tornada sem efeito a decisão que não
a conhecera por uma suposta intempestividade.»
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Velhas° (Relator): Destaco do parecer do ilustre Subprocurador-Geral Haroldo Nóbrega, às fls.
57/58:
4..)
Examinando atentamente o documento de fl. 40, dos autos do HC
69.433-1/130, concluo que a apelação é
tempestiva.
O Tribunal de Santa Catarina baseado no parecer de fls. 54/5 deu pela intempestividade do apelo. O equívoco do
parecer de fls. 54/5 advém do fato de que
o seu nobre subscritor não examinou o
verso de Il. 40 (e não 49 como indicou),
onde se vê, com alguma dificuldade, é
certo, as anotações chanceladas mecanicamente:
'Poder Judiciário — Comarca de
Seara — 14791 — Mar 91-5-15, 28.'
Ora tais anotações estão bem explicadas na certidão de fl. 5 (autos do HC).
Parece-me evidente que o parecer e o
acórdão (fls. 54/5 e 58/9 dos autos da
apelação) só examinaram o anverso de
fl. 40 e não também o seu verso.
No anverso, há realmente o despacho
do Magistrado, recebendo a apelação,
por própria e tempestiva, chancelada
mecanicamente a data do despacho, isto
é, 6 de março de 1991.
Mas não se pode esquecer a chancela
mecânica existente no verso de fl. 40.
O parecer destarte é no sentido de que
considerada por esse Excelso Pretório
tempestiva a apelação, o Colendo Tribunal de Justiça de Santa Catarinajulgue-a
como entender de direito.» (Fls.
57/58.)
Está correto o parecer.
Na verdade, à fl. 40v., dos autos da
Apelação Criminal n° 27.220 (99.45479.7),
que estão em apenso, verifica-se que o re-
R.TJ — 150
curso foi protocolizado no dia 5-3-91, às
15h28m, assim no prazo legal, pelo que
deve ser conhecido.
Defiro o writ para que, considerada
tempestiva a apelação, julgue-a, como
entender de direito, o Egrégio Tribunal de
Justiça do Estado de Santa Catarina.
Devolvam-se os autos da Apelação Criminal n° 27.220, que estão em apenso, ao
Eg. Tribunal de Justiça de Santa Catarina.
EXTRATO DA ATA
HC 69.433 — SC — Rel.: Min. Carlos
Valioso. Pacta.: Lauri Bartollo Casarotto.
Lorota.: Lari Antonio Hanauer. Coator. Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina
167
Decisão: Por unanimidade, a Tucura deferiu o «babem corpus» para, afastada a
intempestividade da apelação, prossiga o
Tribunal no julgamento do mérito, conto
entender de direito.
Presidência do Sr. Ministro Néai da Silveira. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Carlos Valioso, Marco Aurélio e
Francisco Rezek. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Paulo Brossard. Subprocuradora-Geral da República, a Dra. Odília
Ferreira da Luz Oliveira
Brasília, 1° de dezembro de 1992 —
José Wilson Aragão, Secretário.
HABEAS CORPUS N° 69520 — PA
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Néri da Silveira
Impetrantes: Guaracy da Silva Freitas e outros — Coator: Tribunal Regional
Federal da P Região — Paciente: Lauro Cardoso da Silva
Habeas Carpas. Absolvição com base no art. 386, VI, do CPP.
Hipótese em que a sentença absolvera com a só invocação do art. 386 do
CPP, sem referir qualquer de seus incisos. Recurso do MPF contra a
sentença. Nada impedia viesse a Corte, ora indigitada coatora, ao julgar
o recurso do MPF, explicitar que a absolvição do paciente era por
deficiência de provas, fazendo apressa menção ao art. 386, VI, do CPP.
Não há reconhecer configurada reformado In pejas. Diante da análise da
prova, volumosa e complexa, podia a Corte, no Julgamento da apelação
do MPF, decidir como o fez. Habeas corpos indeferido.
ACÓRDÃO
RELATÓRIO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade, indeferir o
«habeas corpus».
O Sr. Ministro Néri da Silveira (Relator): Cuida-se de ordem de babas corpos,
impetrada pelos advogados Guaracy da Silva Freitas e outros, em favor de Lauro
Cardoso da Silva, absolvido pela P Turma
Criminal do extinto Tribunal Federal de
Recursos, com suporte no artigo 386, inciso VI, do CPP, da prática do delito tipificado no artigo 318 do CPB.
Brasília, 9 de fevereiro de 1993 — Néri
da Silveira, Presidente e Relator.
168
R.T.J. — 150
Alega-se que o paciente, após ter respondido à ação penal perante a Justiça Federal do Estado do Pará, pelo fato de haver
facilitado a prática de contrabando ou descaminho, fora absolvido com fulcro no art.
386, inciso I, do CPP, ou seja, porque ficou
provada nos autos a inexistência do fato, e
que o Tribunal Federal de Recursos, por
sua r Turma, ao negar provimento à Apelação Criminal interposta pelo Ministério
Público Federal, não poderia ter modificado a capitulação da sentença absolutória,
passando o enquadramento da inexistência
do fato (art. 386, I, CPP) para o inciso VI
do mesmo artigo, alterando, assim, o motivo da absolvição, para insuficiência daprova colhida na instrução criminal. Asseveram os impetrantes que, tendo «negado
provimento ao recurso, não poderia o Tribunal alterar o fundamento da respeitável
Sentença, o que configura indubitavelmente a reformado in pejas, caracterizando
constrangimento ilegal a ser reparado por
este remédio heróico constitucional».
Interposto inicialmente perante o Superior Tribunal de Justiça, o ilustre Ministro
Costa Lima declarou-se incompetente para
processar e julgar o presente habeas corpus, à vista do que ordenou a remessa
decteç ao STF (ti. 41).
Solicitadas informações, vieram aos autos com o oficio de fls. 49/50, do ilustre
Presidente do Tribunal Regional Federal da
1• Região, nestes termos:
«Trata-se de pedido de habeas corpus por meio do qual se pretende, verbis: I ... que seja o writ conhecido e
deferida a ordem para anular o Acórdão
ora atacado, proferido na Apelação Criminal n° 2485-PA, na parte que acrescentou que as absolvições têm por suporte o art. 386, n° VI, isto é; a insuficiência da prova colhida na instrução
criminal, mantendo-se a decisão de 1°
Grau'. Esta absolvera o paciente com
base no art. 386, I, do CPP, vale dizer,
por entender provada a inexistência do
fato objeto da imputação.
Percebe-se, de plano, que o paciente
— por ter sido absolvido — não sofre
nem está ameaçado de sofrer violência
ou coação em sua liberdade de locomoção, pgroliaridade que toma inidônea e
inadequada, data venia, a utilização da
ação constitucional do habeas corpus,
máxime para o Fim cofimado na inicial.
A pretendida desclassificação do fundamento jurídico da absolvição do paciente implicaria, sem dúvida, irrecusável análise dos fatos da causa e importaria em aprofundada investigação do conjunto probatório reunido no processo,
operação que esbarra em obstáculo incontomável decorrente da natureza sumarissima da ação penal de habeas corpus.
Com estas breves considerações, espera o signatário não conheça do pedido
o Colendo Supremo Tribunal Federal.»
Opinou a Procuradoria-Geral da República, pelo indeferimento do writ.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Néri da Silveira (Relator): A sentença, quanto ao paciente, e outros co-réus, ao dispor sobre a absolvição,
após registrar que o crime do art. 318 do CP
consiste em facilitar, com infração de dever
funcional, a prática de contrabando ou descaminho, anota (fls. 35/36):
«Por tudo isso, o jeito é acreditar
mesmo na palavra do denunciado José
Carvalho de Miranda, quando afirma
haver encaminhado ao então Procurador
Regional da República setenta e dois
(72) ofícios com as necessárias informações à defesa dos direitos e interesses do
Fisco.
Por outro lado, no caso das alegadas
conivências do referido acusado com o
R.T.J — 150
contrabando ocorrido no terreno de propriedade de Carlos Massud, de negativa
em adotar providências tendentes a garantir o Fiscal Aduaneiro apreensor daquele contrabando e de omissão diante
da representação que lhe foi dirigida por
dois (2) outros Fiscais Aduaneiros tidos
como prejudicados em certa apreensão
no igarapé Candeua, afigura-se-nos inválidas tais alegações diante da falta de
prova nos autos de qualquer «conivência», «negativa» e «omissão», por parte
do dito acusado José Carvalho de Miranda
Quanto aos fatos atribuídos aos indiciados Alírio Seabra Tobias, José Maria
Paiva, Lauro Cardoso da Silva e Zito
Brigido, também se nos afigura impossível diante da prova colhida
Realmente, os três (3) primeiros acusados foram ao igarapé Candeua e estiveram a bordo de um barco sem
denominação ali fundeado, onde havia,
como carga, certa quantidade de madeira, conforme se apurou no curso da instrução criminal, e não os falados quatro
(4) automóveis de diversas marcas, inclusive um marca Chevrolet.
Portanto, inexistiu o alegado contrabando de automóveis e, como é óbvio,
«facilidades» por parte dos aludidos
acusados. Também, pelo cotejo da prova dos autos, chega-se à conclusão de
que o denunciado José Maria Paiva não
removeu obstáculos para facilitar o contrabando encontrado e apreendido no
terreno de propriedade do referido Carlos Massud. Ao contrário, ele concorreu
para a apreensão do mesmo, socorrendo
o Fiscal apreensor, quando este, como
alega, encontrava-se em situação difícil.»
Ao julgar, entretanto, improcedente a
denúncia e absolver os acusados, entre eles,
o paciente, o magistrado de primeiro grau
não fez referência a qualquer inciso do art.
169
386 do CPP, qual se vê do texto da sentença
(fls. 2W37), que é de 23-10-1973.
O MPF recorreu dessa decisão.
O voto condutor do acórdão, de
7-10-1974, da lavra do ilustre Ministro
Moacir Catunda, da P Turma do extinto
Tribunal Federal de Recursos, acolhendo
o parecer da Subprocuradoria-Geral da
República, que transcreveu, assim concluiu (fls. 23/24):
«Fico de acordo com as razões, de
fato e de direito, aduzidas no parecer
supra-transcrito. Os elementos informativos existentes no bojo das volumosas
investigações administrativas, cujos
autos se vêm em apenso, bastando à
formação de juízo de suspeição, autorizativo do oferecimento de denúncia, não
justificam, por si só, a condenação, mesmo porque para esta o direito exige prova contenciosa e a produzida durante a
instrução e mostra-se reticente, débil,
inapta a formar convencimento de que
os apelados nomeados na denúncia de fl.
418, tenham realmente praticado contrabando ou descaminho, com infração
de dever funcionaL Haja vista o depoimento de fl. 434, em que se faz referência à versão de uma pessoa já falecida,
sobre a estranha conduta dos acusados
de participação no episódio do barco
fundeado no igarapé ~deus», que
teria transportado automóveis de fabricação estrangeira, do exterior para Belém
No tocante aos acusados de facilitação de contrabando ou descaminho, relacionados na denúncia de fls. 2/4, do
apenso, que trata de volume contendo
mercadorias estrangeiras, transportadas
do exterior para Belém num avião da
Varig, debilíssimos também são os elementos de convicção, de vez que nenhuma testemunha os incriminou em juízo.
Os elementos reunidos nas investigações administrativas não resultaram jurisdicionalizados de sorte que dos cri-
170
R.T.J. — 150
mes narrados nas denúncias existem vagas suspeitas e não provas aptas a justificar condenação. A solução jurídica do
caso, destarte, será o desprovimento do
recurso, por falta de prova suficiente à
condenação e neste sentido é o meu
voto.»
É de anotar que o parecer da Subprocuradoria-Geral da República, transcrito no
voto, concluíra, nestes termos (fl. 23):
«Assim sendo, opinamos por que se
negue provimento ao recurso, acrescentando-se, porém, que as absolvições têm
por suporte o artigo 386, n° VI, isto é, a
insuficiência da prova colhida na instrução criminal».
O ilustre Ministro Jorge Lafayette Guimarães, terceiro a votar, acompanhou o
Relator, in verbis (fl. 26):
«Sr. Presidente, meu voto é acompanhando o de Vossa Excelência Realmente, o que ocorre, segundo a convicção a que cheguei, é falta de provas, não
sendo possível afirmar que os acusados
não praticaram o crime.
Como Vossa Excelência bem acentuou, o tempo decorrido dificulta essa
prova. Entretanto, daí a chegar-se à afirmativa da inexistência do crime há uma
distância considerável.
Não me pareceu que a sentença —
como declarou o nobre Ministro Revisor — tenha proclamado a inexistência
do crime. Se assim foi, todavia, o Tribunal não está vinculado ao decidido. Há,
inclusive, apelação do Ministério Público, possibilitando o não provimento do
recurso, porém, com fundamento diverso, enquadrada a absolvição em outro
inciso do art. 386, do CPP.»
Discordando, em parte, do Relator,
quanto à explicitaçáo relativa ao fundamento das absolvições, como Revisor, assim votou (fl. 25):
«Sr. Presidente. Também nego provimento ao recurso, para confirmar a
sentença, mas sem o acréscimo pedido
pela douta Subprocuradoria-Geral da
República em o final do seu parecer e
admitido por V. Ex.'. Negando provimento ao recurso para cotar a sentença, parece-me que V. Ex.', data
venial, não podia atendê-lo para declarar que as absolvições têm como suporte
o art. 386, n° VI, do Código de Processo
Penal. É que °motivo de cada urna delas
está declarado pela decisão.
De fato. Após definir o crime de facilitação de contrabando, a sentença
afirma que os indiciados Ivan de Jesus
Loureiro, Francisco Acioly Meireles e
Antonio de Lima Vale não o cometeram
(fL 510). E, de fl. 511 consta que, 'realmente, os contrabandos havidos não resultaram de facilidades, pois as mesmas
não decorreram de atividades do acusado José Carvalho de Miranda, como inspetor da Alfândega de Belém, e dos
denunciados Afilio Seabra Tobias, José
Maria Paiva, Lauro Cardoso da Silva e
Zito Brígido, como Fiscais Aduaneiros
Por fim, está também escrito bem
perto do final da sentença:
«Portanto, inexistiu o alegado contrabando de automóveis e, como é
óbvio, «facilidades» por parte dos
aludidos acusados». (fl. 512)
Isto posto, declarado pela sentença o
motivo de cada uma das absolvições —
inexistência do fato criminoso — somente a sua reforma autorizaria a sua
modificação.»
Verifica-se, dessa maneira, que, julgando recurso do Ministério Público, nada impedia pudesse a Corte a quo decidir como
o fez. Não há falar em reforma& In pejus
vedada. O acórdão podia acolher o apelo do
MPF, que pleiteava a modificação integral
da sentença, consoante observam os impetrantes na inicial. A Turma julgadora manteve a absolvição, mas o fez por fundamento diverso, o que lhe era lícito. Nem, para
R.T.J —150
isso, haveria de prover o recurso. Podia
manter a absolvição, por falta de provas
suficientes à condenação, somente adotando o inciso VI do art. 386 do CPP. Reafirme-se que a sentença não foi expressa, quanto ao inciso do art. 386, do CPP, eis que, no
ponto, silente (fl. 37).
É de referir, no particular, que o próprio
autor da sentença, hoje Presidente do coleado TRF-1' Região e Armistro já nomeado para o egrégio Superior Tribunal de
Justiça, ilustre Juiz José Anselmo de Figueiredo Santiago, nas informações, afasta
a pretensão dos impetrantes, ao afirmar (fl.
50):
«Trata-se de pedido de habeas corpus por meio do qual se pretende, verbis: '... que seja o writ conhecido e
deferida a ordem para anular o Acórdão
ora atacado, proferido na Apelação Criminal n° 2.485 — PA, na parte que
acrescentou que as absolvições tem por
suporte o art. 386, n° VI, isto é, a insuficiência da prova colhida na instrução
criminal, mantendo-se a decisão de 1°
Grau'. Esta absolvera o paciente com
base no art. 386, I, do CPP, vale dizer,
por entender provada a inexistência do
fato objeto da imputação.
Percebe-se, de plano, que o paciente
— por ter sido absolvido — não sofre
nem está ameaçado de sofrer violência
ou coação em sua liberdade de locomoção, peculiaridade que torna inidônea e
inadequada, data venial, a utilização da
ação constitucional do habeatt corpus,
máxime para o fim colimado na inicial.
A pretendida desclassificação do
fundamento jurídico da absolvição do
paciente implicaria, sem dúvida, irrecusável análise dos fatos da causa e importaria em aprofundada investigação do
conjunto probatório reunido no processo, operação que esbarra em obstáculo
incontomável decorrente da natureza
sumaríssima da ação penal de habeas
corpus.
171
Com estas breves considerações, espera o signatário não conheça do pedido
o Colendo Supremo Tribunal Federal.»
Também a Procuradoria-Geral da República, em seu parecer, às fls. 52/53, anota
que o paciente foi absolvido em primeira
instância, «não tendo porém o Magistrado,
em atenção ao disposto no artigo 386 do
Código de Processo Penal, declarado em
qual dos incisos do mesmo artigo enquadrava a absolvição do réu». E conclui (fl.
54):
<Xixi tese, é cabível a postulação do
réu de alteração do fundamento da absolvição (cfe. TJSP, RT 526/325, apud.
Código de Processo Penal Anotado, Saraiva, 1982, Damásio E de Jesus, página 206). Certamente, porém, o habeas
corpus não é a via adequada para alteração dos fundamentos da absolvição,
quando a postulação, como no caso, demandar exame de matéria bastante complexa de provas.»
Do exposto, não há como atender à pretensão dos impetrantes, em que pese o esforço revelado na inicial .e ora da tribuna
Não há, in casu, reconhecer a configuração
de reformado in pejas, proibida. Autorizada estava a Corte julgadora a proceder
como o fez, diante da análise da prova, que
se entremostra complexa e volumosa, insuscetível de reapreciação no âmbito do
babas corpus. Certo, porém, é que ilegalidade não há, no acórdão, a ensejar a decretação de nulidade postulada na inicial,
no ponto em debate.
Indefiro, assim, o habeas corpus.
VOTO
OSr. Ministro Francisco Rezek: Sempre estimei — e penso que não vai aí posição original dentro desta Casa — que o
tema da reformado in pejos é perfeitamente comportável no âmbito do babem
corpus. É uma das questões estritamente
legais que examinamos — não raramente,
diga-se de passagem —em habeas corpus.
172
R.TJ. — 150
Mas no caso, o que ficou demonstrado com
o douto voto de Vossa Excelência é que
isso não aconteceu.
A prática do Supremo indica, como alta
probabilidade estatística, que nossas críticas à reformatio in pejus, redundando na
concessão de habena corpus, têm por premissa um quadro de desaviso, um lapso
com que a instância de origem incide na
reformado in pejus proibida. Não poderia
ter-se dado esse fenômeno no caso do acórdão ora em exame, visto que, ficou claro,
foi um acórdão extremamente estudado,
resultante de debate que envolveu figuras
das mais eminentes do antigo Tribunal Federal de Recursos. Sem dúvida, alterou-se
para pior a situação do réu — que continuou absolvido, mas absolvido por fundamento menos reconfortante que aquele
adotado em primeira instância. O que sucedeu foi algo a que o Tribunal estava autorizado pela presença em mesa do recurso da
acusação. Insisto nesse particular, porque o
tema j á nos deu algum trabalho meses atrás.
Aqui o recurso da acusação visou realmente a agravar a situação do réu, a vê-lo condenado pela autoria de crimes cuja própria
ocorrência fora negada no juízo monocrático. O Tribunal deu como certa a ocorrência do delito, mas estimou insuficiente a
prova da autoria. Deu satisfação, ainda que
mínima, ao Ministério Público.
Caso diverso foi aquele em que o Promotor recorreu mas para ver abrandada a
situação do réu, e o tribunal de origem
curiosamente achou que, apesar do sentido
benfazejo do recurso, estava autorizado,
por que o recorrente era o Ministério Público, à reformatio in pejus. O caso em tela
não tem essa rara característica que, no
precedente, levou à concessão da ordem.
Enaltecendo, com Vossa Excelência, o
bom trabalho da defesa, também denego a
ordem.
VOTO
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Sr. Presidente, creio que toda a celeuma resultou
de um fato: da circunstância de não se ter
agasalhado o recurso do Ministério Público. Talvez, se tivesse vindo à balha o acolhimento, não estivéssemos, a esta altura,
enfrentando um habena corpus.
O Sr. Ministro Néri da Silveira (Presidente e Relator): A defesa teve oportunidade de esclarecer a situação, porque havia
condições de interpor embargos infringentes, para que prevalecesse o ponto de vista
do Ministro Peçanha Mastins. Se entendesse, pois, que realmente aquela conclusão do
acórdão era gravosa para a situação dos
réus, com base no voto vencido, em parte,
caberiam embargos infringentes.
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Na sentença, estaria caracterizada a espécie do
inciso I do artigo 386, que não foi, entretanto, expressamente mencionado. Não obstante, S. Ex.' entendeu que estaria configurada a hipótese, porquanto na sentença absolutória alude-se à prova da inexistência
do fato: facilitar o contrabando.
O Ministério Público interpôs o recurso
em que foi claríssimo ao sustentar justamente o contrário e, com base nesse fato,
fez um pedido bem mais elástico, mais
abrangente, de transmudação da absolvição
em condenação.
Creio que a Turma do Tribunal Federal
de Recursos, ao enfrentar esse recurso, ao
enfrentar o apelo do Ministério Público e
manter a absolvição, modificando apenas a
capitulação da hipótese, não extravasou o
pedido formulado.
Por isso, acompanho V. Ex.', denegando
a ordem.
EXTRATO DA ATA
HC 69.520— PA — Rel.: Min. Néri da
Silveira. Pacte.: Lauro Cardoso da Silva.
Imptes.: Guaracy da Silva Freitas e outros.
Coator.: Tribunal Regional Federal da 1'
Região.
R.TJ —150
Decisão: Por unanimidade, a Mama indeferiu o «habeas corpos». Falou pelo paciente o Dr. Guaracy da Silva Freitas.
Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Paulo Bmssard, Calos Valioso, Marco Au-
173
rélio e Francisco Rezek. SubprocuradoraGeral da República, a Dra. Odília Ferreira
da Luz Oliveira.
Brasília, 9 de fevereiro de 1993. José
Wilson Aragão, Secretário.
FUMAS CORPUS N° 69.628 — SP
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio
Paciente e Impetrante: José Carlos da Silva— Coator: Tribunal de Justiça do
Estado de São Paulo
Habeas empas. Duplicidade. Mostrando-se o habeas co pus
repetição de anterior, quando o órgão julgador sinalizou com a pertinência da revisão criminal, descabe admiti-lo.
Assinatura. Falsidade. Artigo 389 do Código de Processo MIL
Imprópria é a evocação da regra do inciso II do artigo 389 do Código de
Processo Civil se a assinatura contestada consta de documento lavrado
pelo próprio Juizo. A observância da regra segundo a qual cumpre à
parte que produziu o documento demonstrar a boa procedência da
assinatura esbarra na presunção de veraddade de atas e certidões
lavradas.
Carta precatória — Intimação do defensor. Se de um lado é
certo afirmar-se que o defensor do acusado deve ser intimado para
acompanhar o cumprimento da carta precatória, de outro não menos
correto é dizer-se da preciusão da matéria quando não articulada na
oportunidade de que cogita o artigo 500 do Código de Processo Penal, ou
seja, em alegações finais, isto a teor do disposto no artigo 571, inciso II,
do referido Código, no que apenas excepciona o processo sumário e o
outrora existente processo para aplicação de medida de segurança por
fato não criminoso.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na confomildade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos,
em conhecer, em parte, do «babeas corpos»
e, nessa parte, o indeferir.
Brasília, 17 de agosto de 1993 — Néri
da Silvara, Presidente —Marro Aurélio,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Em
Sessão realizada c= 3 de setembro de 1991,
esta Turma apreciou babeas carpias também impetrado pelo ora Paciente. Na opor-
174
R.TJ. — 150
tunidade, consignou que a medida não se
mostrava hábil a alcançar-se o exame de
documento para saber-se da autenticidadae, ou não, de assinatura daquele constante, o mesmo ocorrendo quanto a nuanças
relativas a reconhecimento levado a efeito.
Daí haver denegado a ordem (fls. 59 a 63).
Com esta impetração, procura o Paciente demonstrar que a conclusão da Turma
decorreu da circunstância de haver requerido a juntada de documentos após a assentada em que julgado o habeas corpos anterior. São tecidas considerações sobre o
ônus da prova quando contestada a autenticidade de assinatura Busca-se inspiração
no artigo 389 do Código de Processo Civil
para dizer-se, no campo da aplicação analógica, que, impugnada a boa procedência
da assinatura, cabe à parte que produziu o
documento comprovar a valia respectiva.
Insiste-se em que o ora Paciente não é o
autor da assinatura lançada na ata relativa
ao cumprimento de precatória. Discorre-se,
também, sobre a angência de intimação do
advogado constituído para acompanhar o
cumprimento da precatória
Solicitadas informações à Corte de origem, encaminhou-se o ihrstre Segundo VicePresidente do Tribunal de Justiçado Estado
de São Paulo, Dr. Dagoberto Sanes Cunha
Camargo, fazendo-o conforme peça de fls.
68 a 74. Revela a luta do ora Paciente para
alcançar desiderato favorável. Impetrou ele
perante a Corte de origem os Habeas Corpus na 72.888-3 e 74.278-3 objetivando
fulminar a prisão preventiva O segundo
não foi conhecido por ser repetição do anterior.
Remetidos os autos à Procuradoria-Geral da República, pronunciou-se esta pelo
indeferimento da ordem, a duzindo que «a
possível ausência de requisição do réu para
inquirição de uma única testemunha, quando, como é certo, esteve presente ao depoimento de três vítimas e três outras testemunhas, não anula o processo, no caso, pois a
eventual irregularidade não teve peso deci-
sivo na decisão da causa e nem foi capaz de
alterar a verdade substancial da mesma
nuca».
Recebi estes autos para exame em 4 de
agosto de 1993, liberando-os para julgamento em 7 seguinte (fl. 155).
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Ressalvo mais uma vez a convicção
pessoal quanto à competência para apreciar
este habeas corpos, que é definida pelas
partes envolvidas e, portanto, pela existência, ou não, da prerrogativa de foro. Desta
não goza o Paciente, razão pela qual há de
se considerar aqueles apontados como autoridades coatoras. São os desembargadores do Tribunal de Justiça e estes estão, a
teor do artigo 105, inciso I, alínea a, da
Constituição Federal, nos crimes de responsabilidade e nos comuns, sob a jurisdição direta do Superior Tribunal de Justiça,
o que atrai a pertinência da norma inserta
na alínea c do citado inciso. A observância
da alíneal do inciso I do artigo 102 da Carta
pressupõe a submissão à jurisdição direta
do Supremo Tribunal Federal, o que não
ocorre na espécie. Todavia, até aqui esta
não é a conclusão da ilustrada maioria, o
que tem atraído para esta Corte inúmeros
habeas corpos que deveriam ser julgados
pelo Superior Tribunal de Justiça. Atuando
em Órgão fracionado, coloco em plano secundário o entendimento individual e homenageio a jurisprudência assentada, deixando para discutir a matéria em sede própria Aliás, isto já vem acontecendo, com o
julgamento da Medida Reclamatória
341-DF. Após o voto do Relator, externei
dissensão, seguindo-se pedido de vista do
Ministro Francisco Rezeic. Assim, tenho o
Supremo Tribunal Federal como competente para examinar este habeas corpos.
Ao julgar o habena corpos anterior, esta
Turma deixou sinalizada, como propícia ao
debate pretendido pelo ora Paciente, a revi-
R.TJ —150
são criminal. Confira-se com o que se contém às fls. 59 a 63. No que se pretende
rediscutir a autenticidade, ou não, da assinatura lançaria na ata concernente ao cumprimento de carta precatória, este habeas
corpos é repetição do anterior. No entanto,
alega-se a pertinência do disposto no artigo
389 do Código de Processo Civil, segundo
o qual incumbe o ônus da prova, quando se
tratar de contestação de assinatura, à parte
que produziu o documento. No particular,
tenho que a matéria é nova e por isso não
vejo esta impetração como repetição da
anterior. Contudo, nem por isso procede a
irresignação ora demonstrada. O documento que se ataca é de natureza pública, sendo
produzido em juízo — a ata referente ao
cumprimento da diligência. Tal dado revela, a mais não poder, que não se pode cogitar da aplicação analógica da regra instrumental comum. Impossível é transferir ao
próprio Juízo a prova da autenticidade da
assinatura do Paciente. Presume-se a boa
procedência de tudo que se contém na ata
lavrada e subscrita pelos presentes e pelo
Juiz que presidiu os trabalhos, incumbindo
à parte interessada comprovar o defeito
alegado.
Relativamente à ausência de intimação do advogado que vinha assistindo ao
então Acusado, se é certo que as peças
trazidas aos autos e também o processo
principal requisitado por proposta da Procuradoria-Geral da República comprovam que realmente não houve a intimação, tem-se que preciosa está a matéria.
Em alegações finais não foi veiculada como
deveria, isto a teor do artigo 571, inciso II,
do Código de Processo Penal. Frise-se, por
175
oportuno, que não se está diante de hipótese
a envolver as exceções contempladas no
citado inciso, ou seja, o processo sumário
alusivo à contravenção, e o agora inexistente processo de aplicação de medida de segurança por fato não criminoso.
Por tais fundamentos, concluo não conhecendo da impetração quanto à causa de
pedir ligada à falsidade da assinatura do
Paciente na ata de fl. 52, posto que repete a
anterior. No que tange aos ônus da prova
atinente à assinatura e à inexistência de
intimação do advogado que vinha prestando assistência para acompanhar o cumprimento da carta precatória, denego a ordem
pelos fatos supra-referidos, salientando que
na assentada o Juízo designou defensor ad
hoc.
É o meu voto.
EXTRATO DA ATA
HC 69.628 — SP — Rel.: Min. Marco
Aurélio. Pacta.: José Carlos da Silva. Impte.: O mesmo. Coator: Tribunal de Justiça
do Estado de São Paulo.
Decisão: Por unanimidade, a Turma conheceu, em parte, do «habeas corpos» e,
nessa parte, o indeferiu. Ausentes, ocasionalmente, os Ministros Paulo Brossard e
Carlos Venoso.
Presidente do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Paulo Brossarcl, Carlos Venoso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Haroldo Ferraz
da Nóbrega.
Brasília, 17 de agosto de 1993 — José
Wilson Aragão, Secretário.
HABEAS CORPUS Ir 69.821— SP
(Primeira Tunas)
Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves
Paciente e Impetrante: Clocivaldo Zacarias Pereira — Coator: Tribunal de
Alçada Criminal do Estado de São Paulo
176
R.TJ. —150
Habeas carpa.
Citação por edital e decretação de revelia feitas regularmente.
Não tendo o paciente feito qualquer comunicação, à autoridade policial que o detivera, da audiência para a qual fora intimado,
não pode ele, agora, alegar o só fato da prisão para pretender que o
não-cumprimento se deu por motivo justificado.
Improcedência da alegação de que a condenação se estribou decisivamente no depoimento de uma das testemunhas de acusação.
«tiabeas corpos» indeferido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos,
em indeferir o pedido de «habeas corpus»
e determinar à Secretaria do Tribunal a
retificação da autuação.
Brasília, 18 de maio de 1993 — Moreira Alves, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Moreira Alves: Assim
expõe e aprecia o presente habeas corpus
o parecer da Procuradoria-Geral da República, de autoria do Dr. Edson Oliveira de
Almeida:
«1.0 impetrante, em causa própria,
argúi a nulidade da Ação Penal n°
603/87 (23* Vara Criminal da Comarca
de São Paulo), dizendo que, embora preso no 47° Distrito Policial, foi condenado à revelia, sem presenciar a inquirição
das testemunhas da acusação.
2. Lê-se nas informações que, por
fatos ocorridos no dia 30 de outubro de
1987, foram o paciente e outro co-réu
denunciados perante o Juízo da Vigésima Terceira Vara Criminal da Comarca
de São Paulo, como incursos no artigo
157, parágrafo 2°, I e II, c.c. o artigo 29,
caput, ambos do Código Penal (fl. 21).
Recebida a denúncia e decretada a
prisão preventiva do paciente (fls. 22/3),
foi o mesmo requisitado e interrogado
(fl. 25).
Ouvida a vítima (fl. 27), foi revogada
a prisão preventiva (fl. 28) e expedido
alvará de soltura em favor do acusado,
que foi liberado em 10-12-87 (lis. 30 e
30v°). Foi designado dia 25-3-88 para a
próxima audiência, dentes as partes (fl.
28).
Entrementes, a advogada constituída
dos réus renunciou ao mandato (petição
protocolada em 6-1-88, fl. 31).
Após infrutífera tentativa de intimação pessoal do paciente para constituir
novo advogado (em 27-1-88), foi determinada a intimação por edital (publicação no Diário Oficial de 29-2-88, fl.
39), também não atendida
A revelia do réu, decretada em
29-4-88 (fl. 43), deveu-se ao não comparecimento à audiência do dia 25 de
março de 1988 (fl. 41), para inquirição
das testemunhas da acusação. O paciente havia sido intimado para essa audiência quando do depoimento do ofendido,
realizado em 9-12-87 (fls. 26/28).
Após decretada a revelia, em audiência realizada em 23-6-88, foi ouvido o Sd PM José Edemur Sanches Madureira (fls. 45/6), cujo depoimento pesou desfavoravelmente aos interesses da
R.TJ —150
defesa, como se colhe da sentença (fl.
53) e do acórdão da apelação (fl. 67).
Encerrada a instrução (fl. 46) e
apresentadas as alegações finais (fls. 47
a 50), sobreveio sentença condenatória,
que apenou o paciente em 5 anos e 8
meses de reclusão e multa, por infração
ao artigo 157, parágrafo 2°, I e II, do
Código Penal (fls. 51/54).
Expedido e cumprido o mandado
de prisão (fl. 57), o condenado, intimado
pessoalmente, apelou (fls. 58/61), tendo
a E. Segunda Câmara do Tribunal de
Justiça, por unanimidade, negado provimento ao recurso (fls. 64/69), transitado
em julgado a condenação em 22-5-89
(fl. 70).
7. Ocorre que, conforme está comprovado pelo atestado de fl. 87, o paciente, que havia sido posto em liberdade em 10-12-87, foi preso novamente
em 9-1-88, por outro crime de roubo,
fato desconhecido do Juiz da causa.
8 Com isso, ao tempo da decretação
da revelia (29-4-88),o paciente se encontrava preso e impossibilitado de comparecer espontaneamente à audiência
Portanto, inobstante o desconhecimento
do magistrado, não havia lugar para a
aplicação do artigo 366 do Código de
Processo Penal, visto que não configurado o tipo legal 'deixar de comparecer
sem motivo justificado'.
Por outro lado, restou inobservada a
regra do artigo 360 do Código de Processo Penal: 'Se o réu estiver preso, será
requisitada a sua apresentação em juízo,
no dia e hora designados'.
Oportuno observar que, já ao tempo em que se buscou localizá-lo para
notificação da renúncia da advogada
constituída (diligência datada de 27-188, fl. 33v.), o paciente se encontrava
preso.
A evolução da jurisprudência do
Supremo Tribunal Federal acerca do ar-
177
figo 360 do Código de Processo Penal
está resumida no voto que o eminente
Ministro Rafael Mayer proferiu no
RHC 63.348-RJ:
«O Sr. Ministro Rafael Mayer
(Relator): Resultante do artigo 360
do Código de Processo Penal, é indeclinável seja o réu preso requisitado
para o comparecimento aos atos da
instrução criminal, importando a sua
falta em nulidade. A controvérsia diz
somente com a natureza dessa nulidade, se relativa ou absoluta.
A mais antiga e tranqüila jurisprudência desta Corte sempre entendeu
que a falta de requisição de réu preso
à audiência de instrução constituía
causa de nulidade absoluta e insanável, posto que afetado o direito de
autodefesa que se assegura ao réu, e
que tem singular oporamidade de exercitar-se na tomada de depoimento de
testemunhas, pelos esclarecimentos
que pode reclamar por via de seu
defensor ou ainda pelo que a sua
presença suscita de maior exigência
de verdade no relato dos fatos. Entretanto, essa orientação jurisprudencial
sofreu inflexão a partir da decisão
pelo Plenário da Corte, por maioria
de votos, do HC n° 54.217, relatado
peb aninente Máásuo Cordeiro Guerra, e do HC n° 56.682, por unanimidade, relatado pelo eminente Ministro Antônio Neder, onde se fez doutrina de que aquela nulidade não assumia caráter de absoluto, sendo portanto, suscetível de sanamento e reclamando demonstração de prejuízo para que venha a ser decretada. A
ementa do primeiro acórdão bem reflete a doutrina que passou então a
prevalecer:
«Habena atapus. Ausência dos
réus à instrução criminal. Presença dos advogados constituídos e
que nada objetaram, no ato, à rea-
178
R.TJ. — 150
lização do sumário, nem alegaram
posteriomiente, nos prazos dos arfigos 499 e 500 do CPP, e cerceamento de defesa. Nulidade inocorrente.
O exame do direito processual
penal brasileiro revela que, indispensável é a defesa técnica do réu.
A chamada autodefesa não é colocada pela lei, no tocante a sua
indispensabilidade„ no mesmo plano da defesa técnica.
Indeferimento do pedido.»
Esse entendimento tem desde então prevalecido como se vê, ainda
recentemente, no julgamento do HC
n° 60.791, da Primeira Turma, relatado pelo eminente Ministro Néri da
Silveira, e HC n° 61.330, da Segunda Turma, relatado pelo eminente Ministro Moreira Alves, e ainda
no RE 100.285, por mim relatado
(RTJ 107/445).
Nas circunstâncias do caso, tão
graves as irregularidades processuais
e o prejuízo advindo automaticamente à defesa, que não é invocável o
sanarnento, como devidamente destacado no douto voto vencido.» (RTJ
115 (2): 721-2, fev. 1986)
Finalizando, o Min. Rafael Mayer,
para enfatizar a singularidade do caso,
lembra que no leading case da jurisprudência atual se considerou despicienda a
presença do réu em razão do comparecimento e anuência do defensor por ele
constituído».
11. Ocorre que, na hipótese concreta,
o prejuízo é manifesto: o réu estava detido na mesma Comarca do Juízo, o defensor era dativo, e a prova da acusação,
colhida sem a requisição do réu preso,
influiu decisivamente para a condenação (o depoimento da testemunha foi
conclusivo para validar o reconhecimento
feito pelo ofendido e afinar a respon-
sabilidade do paciente). Por isso, embora nada tenha sido alegado na apelação
interposta pela defensora dativa, que nenhum contato teve com o paciente, não
se pode ter como sanada a nulidade.
Tais as circunstâncias, tem aplicação
o precedente plenário, tomado no HC
54.483-RJ, relatado pelo emérito Ministro Antônio Neder e assim ementado:
«Achando-se o réu na prisão, deve
o juiz requisitar sua presença nos
atos da instrução criminal.
Nulidade.
Petição de habeas coreus deferida.» (RTJ 80(1):37, abr. 1977)
É interessante citar, para melhor explicitação, os votos do saudoso Ministro
Cunha Peixoto e do eminente Ministro
Moreira Alves, in verbis:
«O Sr. Ministro Cunha Peixoto:
— Sr. Presidente, pedi vista deste
processo porque sustento ponto de
vista de que a nulidade é relativa.
Mas o eminente Ministro Antônio
Neder ressaltou dois pontos que achei
de suma importância: o réu, embora
estivesse preso na mesma Comarca
do Juízo, não foi requisitado; o advogado é dativo.
Por esses motivos especiais, estou
inteiramente de acordo com o eminente Ministro Antônio Neder e também concedo o habeas corpos.
O Sr. Ministro Moreira Alves: Sr.
Presidente, também defendo atese de
que, no caso, se trata de nulidade
relativa.
Tendo em vista, porém, as duas
circunstâncias que o eminente Ministro CunhaPeixoto acaba de ressaltar, também concedo a ordem.»
12. Pelo exposto, opino pelo deferimento da ordem para anular a Ação
Penal n° 603/87 (23' Vara Criminal da
R.TJ — 150
Comarca de São Paulo), a partir da decretação da revelia, sem a expedição de
alvará de soltura. O paciente é elemento
perigoso, havendo notícia da pendência
de outros processos. Portanto, até que se
esclareça melhor essa situação, por ora
nebulosa, não é recomendável, ad contactam, a expedição de alvará de soltura,
que poderia, inclusive, frustrar eventual
prisão preventiva» (fls. 103/109)
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): 1. Do exame dos autos, verifico que o
ora paciente foi interrogado em Juízo, ocasião em que, além de declarar ter advogado
— a Dra. Ivone Garcia Bueno —, informou
residir na rua Padre Nelson Antônio, 93 —
Jardim Fujiará — Santo Amaro. Tendo sua
advogada mandado de intimação pessoal
para a constituição de novo patrono, mandado esse que, com relação ao ora paciente,
não pode ser cumprido por não haver o
oficial de justiça encontrado o n° 93 da
referida rua. Em face disso, fez-se a intimação por edital para a constituição de novo
defensor. Posteriormente, no dia 25 de março de 1988, o ora paciente não compareceu
à audiência para a oitiva das testemunhas
de acusação, embora tivesse sido intimado
pessoalmente para o comparecimento nessa data quando esteve presente à audiência
de oitiva da vítima (que depôs) e das testemunhas de acusação (que não compareceram).
Portanto, como se vê, a citação por edital se fez regularmente por não existir (e o
ora paciente não afirma o contrário) o endereço indicado no interrogatório, e a sua
revelia, que decorreu de sua ausência apesar de ter sido ele intimado pessoalmente
para a audiência, também se fez regularmente, não havendo sequer alegado o ora
paciente que, embora detido numa Delegacia de Polícia, haja comunicado — como
deveria ter procedido —à autoridade competente que estava intimado a comparecer
179
em Juízo, só não o tendo feito por impossibilitado de fazê-lo por ação ou omissão
dessa mesma autoridade. Aliás, mesmo
posteriormente, quando foi intimado pessoalmente da sentença condenatória — e
intimação pessoal que se deu em decorrênciada comunicação ao Juízo de que ele fora
recolhido à Casa de Detenção para cumprimento de pena que lhe fora imposta em
outro processo —, e apelou, nada alegou o
ora paciente quanto ao seu não-comparecimento à audiência em virtude da qual sua
revelia foi decretada. Assim sendo, e não
tendo o ora paciente feito qualquer comunicação, à autoridade policial que o detivera, da audiência para a qual fora intimado,
não pode ele, agora, alegar o só fato da
prisão para pretender que o não-comparecimento se deu por motivo justificado. E
não se invoque o precedente alegado pela
Procuradoria-Geral da República (11C n°
54.483), em que o réu estava preso, disso
tinha conhecimento o Juiz, e apesar dessa
circunstância não foi ele requisitado para a
audiência, da qual não tinha ciência (RTJ
80/37-38).
No caso, portanto, não há sequer nulidade relativa, até porque a justificativa do
não-comparecimento à audiência para a
qual fora intimado e que dera margem à
decretação da revelia incumbia ao ora paciente que não a alegou na ação penal apesar de intimado pessoalmente da sentença
condenatória, certo como é que o acórdão
que manteve a condenação transitou em
julgado em 22 de maio de 1989, e o atestado
policial relativo à detenção quando da realização da audiência é datado de 25 de
março de 1992.
Note-se, por fim, que não é exato dizerse que a condenação se estribou decisivamente no depoimento de uma das testemunhas de acusação, pois, tanto a sentença
condenatória quanto o acórdão que a confirmou, enfatizaram a circunstância assim
referida no aludido aresto:
180
R.TJ. — 150
«Embora a vítima tenha hesitado em
reiterar a recognição dos réus em juízo,
o que é compreensível posto que temerosa de eventual represália já que eles se
encontravam presentes na audiência,
acabou por revelar dado importante para
a dilucidação da autoria, até então desconhecida nos autos. E que além do
carro os ladrões subtraíram, também,
um relógio de pulso que foi encontrado
pelos policiais na cela onde eles foram
recolhidos após a prisão em flagrante
delito (fl. 50).» (fls. 67/68).
2. Em face do exposto, indefiro o presente habeas corpus.
ADITAMENTO AO VOTO
O Sr. Ministro Moreira Alves (Presidente e Relator): Determino à Secretaria
que corrija a autuação, tendo em vista a
circunstância de que a autoridade coatora
não é °Juiz de Direito da 23a Vara Criminal
da Comarca de São Paulo, mas, sim, o
Tribunal de Alçada Criminal do mesmo
Estado.
EXTRATO DA ATA
HC 69.821— SP —Rel.: Min. Moreira
Alves. Pacta. e Impte.: Clocivaldo Zacarias
Pereira. Coator: Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo.
Decisão: A Turma indeferiu o pedido de
«habeas corpus», nos termos do voto do
Relator e determinou à Secretaria do Tribunal que retifique a autuação. Unânime.
Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Sydney Sanches, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e limar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza.
Brasília, 18 de maio de 1993 — Ricardo Dias Duarte, Secretário.
«ABRAS CORPUS N° 69.866 — SC*
(Primeira Turma)
(Diligência na RTJ 149/485)
Relator. O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence
Paciente: Manoel Urbano Camargo dos Santos — Impetrantes: José M. Soar
e outro — Coator: Superior Tribunal de Justiça
Júri: coerência necessária entre a versão do fato da denúncia
com a da pronúncia, que a tenha acolhido à qual, de sua vez, devem
conformar-se o libelo e o questionário.
«Se o libelo não pode contrariar a pronúncia nem o questionário divergir do libelo, óbvio é que a pronúncia constitui o padrão
regulador, cuja autoridade se estende, plena e inalterável, até o julgamento» (Ruy Barbosa): portanto, há nulidade absoluta, se a denúncia
não aditada e a pronúncia, que a acolheu, imputaram aos dois co-réus
participação indeterminada na prática do homicídio, que afirmam
resultante de um único disparo de arma de fogo, ao passo que o libelo,
ao qual se conformou o questionário, atribui a um deles a cooperação
no fato por haver desferido «disparos de anua de fogo contra a vítima».
* Relatório: Vide RTJ 149/485.
R.TJ —150
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos,
em deferir o pedido de diabeas coipus»,
para anular o processo a partir do libelo,
inclusive.
Brasília, 6 de abril de 1993 — Octavio
Gallotli, Presidente— Sepúlveda Pertence, Relator.
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence
(Relator):
Na sessão de 15-12-92, assim relatei o
caso (lê o relatório).
Meu voto acolhia a primeirá das nulidades arguidas, relativa às três recusas a
mais, não permitidas ao defensor único de
ambos os co-réus; nessa parte, contudo,
fiquei vencido.
Acolheu, porém, a Turma minha proposta de requisição dos autos do processo
condenatório, para exame dos demais fundamentos do pedido, assim formulada no
meu voto:
«As nulidades remanescentes dizem
com o questionário.
A primeira é atinente aos quesitos
sobre a materialidade e a autoria (ou
co-autoria) do homicídio.
Confesso que a leitura da denúncia,
de um lado, e do libelo e do questionário, me deixam em perplexidade, que os
autos não permitem dissipar talvez por
lhes faltar o teor de pronúncia.
Com efeito no processo do Júri, a
pronúncia, na extensão em que a declare
procedente, deve guardar coerência com
a denúncia. De sua vez, o libelo há de
ser conforme à pronúncia; e o questio-
181
nário, no que disser com a versão acusatória, há de adequar-se ao libelo.
No caso, a denúncia assim descreve
o fato (fl. 23):
«No dia 16 de setembro de 1986,
por volta de 12 horas, os denunciados abordaram a vítima Paulo Sniltnia à saída de seu escritório no
centro desta Capital e, pretextando
pagar uma dívida, atraíram-na para
o interior do automóvel que tripulavam. Em seguida tomaram a direção do Parque da Harmonia
(proximidades da Câmara de Vereadores) onde, fazendo uso de
uma arma calibre 6.35, abateramna com um tiro na região occipital.
A vítima teve morte instantânea.
Os denunciados suspeitavam de
relações amorosas entre a vítima e
Cleusa Santos, esposa e mãe respectivamente do primeiro e do segundo
denunciado. Este o motivo do crime.
Usaram o pagamento de antiga dívida como artificio para dissimular
suas verdadeiras intenções, eis que,
atraída a vítima para o interior do
automóvel esta ficava a mercê dos
agressores e sem poder safar-se.
As indagações policiais não lograram individuar a atuação de cada
participe no evento, mas é certo que
agiram em concerto.»
Para que, na pronúncia, se enriquecesse a imputação e se individualizasse
a conduta atribuída a cada um dos coréus, a denúncia deveria ter sido aditada,
Mas, nem se tem notícia de aditamento,
nem dos termos da pronúncia
O que se conhece são os libelos, literalmente idênticos para os dois réus e
assim articulados com relação ao. paciente (fl. 25):
(<(..)
1. que no dia 16-9-86, após o
meio-dia, no Parque da Harmonia,
182
R.T.J. — 150
em Porto Alegre/RS, mediante disparos de arma de fogo, alguém produziu em Paulo Smânia as lesões
corporais descritas no auto de necrópsia de fls. 78/82;
que ditas lesões causaram a
morte da vítima;
que o réu Manoel Urbano Camargo dos Santos, ao desferir disparos de arma de fogo contra a vítima,
Paulo Smânia, concorreu para a prática do crime;
que o réu Manoel Urbano
Camargo dos Santos concorreu de
qualquer modo para a prática do
crime;
que o crime foi cometido mediante dissimulação, pois o réu usou
o pretexto de pagar uma dívida para
esconder suas verdadeiras intenções,
atraindo a vítima para o interior de
um veículo automotor, aonde ela
teve dificultada a sua defesa.»
De sua vez, o questionário submetido
ao Júri, no que interessa, segue substancialmente o libelo (fl. 55).
A dissonância entre a denúncia, de
um lado, e o libelo e questionário de
outro, é evidente; mas sua exata relevância pende do conhecimento da existência ou não de explicação processual adequada.
Voto pela conversão em diligência
para requisição dos autos originais e seu
exame propiciará melhor análise também das te," restantes da impetração.
Recebidos os autos principais requisitados, devolvo o caso à Mesa.
II
A consulta aos autos do processo
principal forneceu-me os dois dados de fato
de que necessitava: primeiro, a certeza de
que não houve aditamento da denúncia e,
de outro lado, a confirmação de que a pronúncia, em conseqüência, estritamente se
manteve, como era devido, nos lindes da
imputação de fato veiculada na inicial acusatória
Recorde-se que, na denúncia, o núcleo da imputação típica de homicídio em
co-autoria contra o paciente e seu filho foi
que, depois de atrair e conduzir a vítima ao
local do fato, «fazendo uso de uma arma
calibre 6.35, abateram-na com um tiro na
região occipital»; a atribuição indiferenciada do ato criminoso a ambos os acusados
—não obstante a vítima houvesse recebido
um único tiro —ficou explicado ao final da
denúncia:
«As indagações policiais não lograram individuar a atuação de cada participe no evento, mas é certo que agiram
em concerto».
Note-se que, na denúncia sequer houve alusão à existência, ou não, no episódio
o que'é ponto controverso no processo
de um segundo disparo de arma de fogo,
que não atingiu a vítima.
Por isso, ao propor a requisição dos
autos, acentuei que, como é óbvio — à vista
de princípios elementares do processo acusatório —, «para que, na pronúncia, se enriquecesse a imputação e se individualizasse a conduta atribuída a cada um dos coréus, a denúncia deveria ter sido aditada.
Mas — ponderei — nem se tem notícia de
aditamento nem dos termos da pronúncia».
Agora, tem-se que efetivamente não
houve aditamento.
E, de seu turno, a pronúncia é de todo
congruente à imputação delimitada na denúncia.
Com efeito. Na pronúncia, depois de
transcrever literalmente a versão da denúncia e relatar o processo, na fundamentação
limitou-se o Juiz, no que interessa, asseverar (vol. 4/581, 582):
«Os réus devem ser pronunciados,
pois está provado o fato e existem indícios suficientes de que são autores.
R.T.J —150
O réu Elton Caldas confessou a autoria, tanto que sua tese defensória é a
legítima defesa, como está registrado à
fl. 571.
No tocante ao réu Manoel Urbano,
os elementos que constam dos autos
conduzem à pronúncia, irretorquivelmente.
E, à negativa do paciente, de qualquer participação ou simples presença no
fato, redargúi a pronúncia (ap., vol. 4/582):
«Há vários indícios de que Manoel
Urbano participou do fato, direta ou indiretamente: Algumas testemunhas viram o carro alugado por Manoel
Urbano, no Parque da Harmonia, proximidades da Câmara de Vereadores; há
quem diga que no carro estavam duas
pessoas, ou uma e uma coisa de cor
alaranjada, no lado direito, o que bem
poderia ser uma pessoa agachada; há
quem diga, também, que o motorista do
cano poderia ser Manoel Urbano; se
existiam razões para matar a vítima,
era ele quem tinha, pois falam de um
romance entre sua esposa e Smânia;
foi o próprio Manoel Urbano quem
locou o automóvel, e só por quatro
horas, quando estavam viajando em
automóvel próprio.
183
incidentemente, à cogitada ocorrência de
um disparo, um único, além do que feriu a
vítima, nem muito menos atribuiu a prática
de disparos — assim no plural — a cada um
dos acusado&
Ao contrário no que diz com o paciente, a pronúncia explicitamente se adstringiu aos termos da imputação indeterminada, que lhe dirigira a denúncia: à sua
negativa de qualquer participação no fato,
cingiu-se a pronúncia a responder que «há
vários indícios de que Manoel Urbano
participou do fato, direta ou indiretamente...»
Sucede que, a essa confessada indeterminação da denúncia e da pronúncia, quanto à participação do paciente no
fato criminoso, contrapuseram-se, de outro lado, radicalmente, o libelo e o questionário submetido ao Júri: o que se lhes
atribui, no libelo (ap., vol. 5/601) e também, nos mesmos termos, se indagou do
Júri (ap., vol. 6/827v.) — no quesito que
decidiu de sua condenação —, foi o fato
determinado de que «fazendo dispares
de amua de fogo, concorreu para a prática daquelas lesões», ou seja, das lesões
«que causaram a morte da vitima», o
evento, no entanto, vale insistir, que, segundo a denúncia e a pronúncia, teria
resultado de um único disparo, de autoria
Não há dúvida que tais indícios são não individuada.
suficientes para a pronúncia do acusaTem-se, pois, em ponto decisivo,
do e a impronúncia, como quero hábil diversidade frontal entre a pronúncia (fiel à
defensor, constituir-se-ia em indevida denúncia), de um lado, e, de outro, o libelo
intromissão do juiz, em matéria da e o questionário nele decalcado.
competência exclusiva do Tribunal do
Nesse quadro, não vejo como refutar
Júri».
a alegação de nulidade.
Manteve-se, pois, o Juiz da pronún19. Nos procedimentos bifásicos, do tipo
cia, rigorosamente, nos termos e nos limi- do que, no direito brasileiro, ainda remates do objeto do processo, ou seja, da im- ' nesce nos processos de competência do
putação de fato contida na denúncia. E a Júri, constitui um truísmo a sujeição do
falta de aditamento espontâneo ou provoquestionário ao libelo e deste à pronúncia,
cado da inicial, não poderia ter agido diver- de tal modo que, como ensinou o velho
samente.
Faustin Hélie, citado por Rui Barbosa (Obras
14. A pronúncia nada acrescentou à ver- Completas, MEC, 1965, v. XV, 1988, t.
são da denúncia. Nem se referiu, sequer 1/214), em verdade, no juízo da causa, «a
184
R.TJ. —150
pronúncia é a base única e exclusiva de
toda a acusação».
20. «Se ao libelo, de feito» — aduziu
Rui (Coisa Julgada em Matéria Criminal, na ob. cit., XV, 1/195, 217) — «não
se permite deslizar da pronúncia, forçosamente se segue ser esta a base inevitável dos quesitos, de que é molde
obrigatório o libelo...». Com efeito, insistiu o mestre (ob. loc. dt., pág. 218),
«se o libelo não pode contrariar a pronúncia nem o questionário divergir do
libelo, óbvio é que a pronúncia constitui o padrão regulador, cuja autoridade se estende, plena e inalterável, até o
julgamento». (...), «pois repugnaria ao
senso comum e à humanidade mais elementar que, formada a culpa numa imputação, corresse o julgamento sobre
outra». Por isso, concluía, de novo com
palavras de Hélie, «inquinam-se de nulidade os quesitos, quando versam sobre fatos diferentes dos mencionados
na pronúncia».
2L A citação de Rui vale apenas pela
recordação dessa sua rara incursão na área
penal: a verdade, já então cediça, da inteira
submissão do libelo e do questionário à
pronúncia continua a ser ponto incontroverso, na doutrina do Júri (v.g., Magarinos
Torres, Processo Penal do Jury, § 57, pág.
234; J. Frederico Marques, O Júri no Direito Brasileiro, 1955, pág . 244; Marrey,
Franco e Stoco, Júri, 1993, pág . 179).
22. Aliás, essa nenhuma força própria
do libelo (Meio de Abreu e Lima, «Do
Libelo Crime Acusatório», 1953, pág. 19,
apud J. F. Marques, ob. cit., pág 248) —
é que levou, na Itália, à abolição do similar
atto di accusa, no procedimento da Corte
d'assise, já preconizada desde 1905, porque considerado, no testemunho de Manzini (verb. Atti di Accusa, Novis. Dig.,
1.2/1481) — «un inudile riassunto della sentença di rinvio». Certamente pelo
mesmo motivo, o libelo foi suprimido no
anteprojeto Frederico Marques de C. Proc.
Penal (cf. arts. 581 ss).
Inequívoca, no caso, a dr«mnformidade substancial entre a imputado facti
acolhida na pronúncia e a veiculada originariamente no libelo, que se refletiu no
quesito decisivo à condenação do paciente,
a nulidade se me afigura radical e absoluta,
pois importou em alterar o próprio objeto
da acusação admitida na decisão preclusa.
Desse modo, concedo o habeas corpus para anular o processo a partir do libelo, inclusive: é o meu voto.
EXTRATO DA ATA
HC 69.866 — SC — Rel.: Min. Sepúlveda Pertence. Poete.: Manoel Urbano Camargo dos Santos. Imptes.: José M. Soar e
outro. Coator. Superior Tribunal de Justiça.
Decisão: Por maioria de votos, a Turma
indeferiu o pedido de «habeas compus»,
quanto à primeira alegação de nulidade do
sorteio de Crocrlho de Sentença, vencidos
os Ministros Relator e Celso de Mello.
Prosseguindo, a Turma converteu o julgamento em diligência, para aquisição dos
autos originais, nos termos do voto do Relator. Unânime. Falou pelo paciente o Dr.
José Manuel Soar. Turma, 15-12-92.
Decisão: A Turma deferiu o pedido de
«habeas corpo» para anular o processo a
partir do libelo, inclusive, nos termos do
voto do Relator. Unânime.
Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotti, na ausênciajustificada do Sr. Ministro
Moreira Alves (Presidente). Presentes à Sessão, os Srs. Ministros Sepúlveda Pertence
e Celso de Mello. Ausente, justificadamen• te, o Sr. Ministro Ilmar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Miguel Franzino Pereira.
Brasilia, 6 de abril de 1993 — Ricardo
Dias Duarte, Secretário.
r
R.T.J —150
185
HABEAS CORPUS N° 69.879 — SP
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Paulo Brossard
Paciente e Impetrante: José Júnior Maximiano — Coator: Superior Tribunal
de Justiça
ellabeas carpas" Nulidades. Cerceamento de defesa.
Reconhecimento fotográfico na fase inquisitória
com observância do art. 226 CPP. Renovação dos atos probatórios na
instrução judicial, sob o crivo do contraditório. Prova que não constitui
único elemento na formação da convicção do juízo da condenação.
Nulidade inexistente.
' eia judiciária. Dispensa das testemunhas de defesa e
Assistes,
da acusação na audiência de instrução. Ausência de defesa não caracterizada. Efetivo prejuízo não demonstrado (art. 563, CPC). Oportunidade
de alegação, já superada (arta. 564, IV, 571, II, 572 CPP).
Ordem conhecida, mas indeferida.
hora.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros componentes da
Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, por unanimidade de votos e na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquignlficas, indeferir o «habeas corpus».
A Secretaria deverá adotar as providências
determinadas na parte foral do voto do Ministro Relator.
Brasília, 8 de junho de 1993 — Paulo
Brossard, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Paulo Brossard: Cuida-se de «habeas corpus» impetrado pelo
próprio paciente no qual se alega nulidade
do processo condenatório, em razão de cerceamento de defesa.
O paciente, preso e recolhido à Penitenciária Regional de Maré, São Paulo, condenado a 10 anos de reclusão e multa, por
infração ao artigo 157, § 2°, I, D, c.c. 71, do
Código Penal, sentença essa reformada
pelo Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo, que reduziu a pena para 6
(seis) anos e 8 (oito) meses de reclusão,
alega, em síntese:
nulidade do reconhecimento fotográfico, segundo a jurisprudência desta Corte;
nulidade do processo, porque não
fora assistido por advogado, pois o que lhe
fora nomeado, dispensou sua presença da
audiência, bem como o depoimento das
testemunhas de defesa, limitando-se a cumprir apenas as formalidades do processo, ao
assinar o respectivo termo de assentada da
audiência.
2.0 paciente, anteriormente, impetrara
ordem de «habeas corpos» com alegações
idênticas. Todavia, em razão da denegação
do writ interposto perante o Tribunal de
Alçada Criminal do Estado de São Paulo,
quando ainda tramitava recurso de apelação, determinei a remessa dos autos ao
Superior Tribunal de Justiça, por ser o competente para o seu julgamento, o qual indeferiu a ordem requerida. Eis a ementa do
acórdão:
«Ementa: Penal. «habeas comais».
Nulidade do Processo.
186
R.TJ. — 150
— Todas as fases processuais foram
orientadas pelas regras ditadas pelo Código Adjetivo Penal.
todo, em face da renovação dos atos durante a instrução criminal, sob o crivo do contraditório.
O contraditório, amplo e irrestrito,
saneia qualquer irregularidade havida
na fase inquisitória.
Ademais, a respeito do reconhecimento fotográfico, esta Corte assim já se manifestou:
As ações cometidas por defensor, não trazendo prejuízo ao réu, ou
as omissões, não servem de suporte
para pretensa anulação de julgamento.»
«Prova. Matéria criminal. Reconhecimento fotográfico. Vítimas que através desse meio identificaram o acusado.
Existência de outros elementos nos autos corroborando-o. Condenação subsistente. Habeas corpus denegado.
3. Solicitadas as informações a autoridade apontada como coatora, estas vieram aos autos do Ofício n° 548/GP-STJ,
com os documentos de fls. 15/20.
4.0 Ministério Público Federal, às fls.
22/24, manifesta-se pelo indeferimento do
Pedi.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Paulo Brossard (Relator): Alega o paciente nulidade processual,
por cerceamento de defesa. Sustenta que
fora condenado em razão de conhecimento
fotográfico e não fora assistido por advogado, vez que o defensor «ad hoc» além de
dispensar sua presença na audiência de instrução, em que foram ouvidas a vítima e as
testemunhas arroladas pela defesa, não diligenciou em seu favor, limitando-se a assinar o termo da audiência.
Não procede a alegação de nulidade
do reconhecimento fotográfico, porquanto esse foi realizado na fase inquisitória orientado pelas regras ditadas pelo
art. 226 do Código de Processo Penal,
como se colhe do julgamento proferido
pelo Superior Tribunal de Justiça, quando da primeira impetração (fls 15/20).
Colhe-se ainda das informações, que esta
prova não foi o único fundamento a ensejar a convicção do juízo da condenação,
sendo certo que, eventual irregularidade
na fase inquisitória não contamina necessariamente o procedimento como um
O reconhecimento fotográfico é meio
válido de prova que deve, como todos os
demais, sofrer o exame crítico do magistrado.
Reconhecimento confirmado por provas diretas e circunstâncias pode legitimar o convencimento do juiz para condenar o indiciado». (HC n° 57 355-0-SP
—RT 542/433).
2. No que concerne à defesa, como
se colhe das informações, é exato que o
impetrante e paciente não esteve presente à audiência em que foram ouvidas
as vítimas e as testemunhas arroladas na
denúncia, oportunidade em que foram dispensadas as da defesa. Todavia, além do
paciente não haver comprovado ocorrência
de efetivo prejuízo (art. 563, do CPP), o seu
defensor dativo compareceu a audiência
incriminada, assinando o respectivo termo
sem nada dissentir, não o fazendo nem mesmo em alegações finais, restando, pois, sanada eventual irregularidade por falta de
oportuna alegação, diante do que dispõem
os arts. 564, IV, 571, II, 572, todos do
Código de Processo Penal.
A ausência do acusado à audiência e a
dispensa das testemunhas de defesa não são
capazes de infirmar a decisão condenatória;
se o defensor entendeu-as desnecessárias,
bem ou mal, sábio ou erradamente, podia
fazê-lo, sem que isso importasse em nulidade de decisão.
R.T.J — 150
Nos termos do parecer do Ministério
Público, conheço do pedido, mas o indefiro.
Por tratar-se de paciente preso e sem
advogado constituído nos autos, determino
à Secretaria que se lhe envie cópia desta
decisão.
EXTRATO DA ATA
HC 69.879 — SP — Rel.: Min. Paulo
Brossard. Pacte.: José Júnior Maximiano.
Impte.: O mesmo. Coator: Superior Tribunal de Justiça.
Decisão: Por unanimidade, a Tunna
indeferiu o «habeas corpus». A Secretaria
187
deverá adotar as providências determinadas na parte final do voto do Ministro Relator.Ausente, ocasionalmente, °Ministro
Presidente. Presidiu° j ulgamento o Ministro PauloBrossard.
Presidência do Sr. Ministro Néri da
Silveira. Presentes à Sessão os Senhores
Ministros Paulo Brossard, Carlos Velloso, Marco Aurélio e Francisco Rezek.
Subprocurador-Geral da República, o Dr.
Mardem Costa Pinto.
Brasília, 8 de junho de 1993 — José
Wilson Aragão, Secretário.
HABEAS CORPUS N° 69.940 — RJ
(Primeira Turma)
Relator O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence
Paciente: Carlos Lopes Machado — Impetrante: José Mauro Couto de Assis
— Coator: Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro
I — Homicídio: qualificativa de cometimento do crime
mediante paga ou promessa de recompensa que, embora relativa ao
mandatário, se comunica ao mandante.
H — Júri: quesitos: pretensa nulidade que, se existente,
nenhum prejuízo causou à defesa, pois relativo o quesito impugnado à
segunda qualificadora do homicídio, cuja pena foi fixada no mínimo
kgaL
HI — Júri: quesito não obrigatório: menor importância da
participação de co-réu, não alegada pela defesa.
RELATÓRIO
ACÓRDÃO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: O
ilustre
advogado José Mauro Couto de AsVistos, relatados e discutidos estes ausis
requer
habeas corpus em favor de Cartos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na con- los Lopes Machado, condenado pelo Júri
formidade da ata do julgamento e das notas por tentativa de homicídio qualificado, detaquigráficas, por unanimidade de votos, cisão que, embora nula, foi mantida, em
em indeferir o pedido de «babeas corpus». apelação, pelo Tribunal de Justiça do atado do Rio de Janeiro.
2. Dizem as nulidades argüidas com o
Brasília, 9 de março de 1993 — Moreira Alves, Presidente — Sepúlveda Per- libelo — infiel à pronúncia — e o questionário.
tence, Relator.
188
R.TJ. — 150
Em síntese, alega-se:
1°) ao passo que, na pronúncia, coerente
com a versão da denúncia, a qualificativa
do motivo torpe, com relação ao paciente,
situou-se em ter a suaparticipação no crime
derivado de vingança contra a vítima, por
questões comerciais, no libelo e no questionário, a mesma qualificadora teria consistido na promessa de recompensa aos autores materiais da agressão;
2°) que é complexo o terceiro quesito —
O acusado, de qualquer maneira, colaborou para a prática do atue prometendo ele a recompensa em dinheiro para os
que atiraram.
3°) a denúncia e a pronúncia situaram a
segunda qualificativa em ter sido o crime
«cometido em condições que dificultou a
defesa da vítima» (sic), ao passo que o
quesito correspondente indagou se o crime
fora cometido «em condições que tomaram
impossível a defesa da vítima»;
4°) finalmente, omitiu-se quesito obrigatório sobre ter sido de menor importância
a participação do paciente na prática do
delito.
Documenta a petição a jurisprudência do STF no sentido de ser absoluta a
nulidade decorrente de vícios do questionário submetido ao Júri, quando, por sua
gravidade, capazes de conduzir o Conselho
de Sentença a perplexidade sobre as indafiações.
Deferi a liminar, verbis (fi. 51):
«Defiro a liminar requerida para sustar a execução do mandado de prisão ou
relexá-la, se já cumprido: os fundamentos do pedido são relevantes e a prisão
indevida é fonte de danos irreparáveis.
Solicitem-se informações.»
O parecer do ilustre SubprocuradorGeral Cláudio Ponteies é pela denegação da
ordem.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence
(Relator): Impressionou-me a primeira argüição de nulidade, formulada com maestria, de cuja improcedência, no entanto,
acabei por convencer-me.
2. Acentua, a propósito, o parecer do
Ministério Público Federal (fl. 84):
«Importa pois bem conhecer os termos da denúncia, que assim estão, na
descrição e definição jurídica da conduta do paciente, verbis:
«Os denunciados Carlos e José
contrataram os dois primeiros denunciados, que para eles trabalhavam como 'seguranças', fazendo a
eles promessa de pagamento, motivados por um outro motivo torpe,
a eliminação da vítima que com eles
participava do quadro acionário de
uma empresa de turismo e que pretendia afastar-se da empresa, por
não concordar com procedimentos
ilegais que os denunciados estavam adotando.
Assim procedendo, incidiram os
denunciados Nelson e Valdir nas
sano.% do artigo 121, § 2°, itens I e
IV, em combinação com o item II do
artigo 14, enquanto que os denunciados Carlos e José incidiram nas mesmas sanções, em combinação com o
artigo 25, todos do Código Penal,
sendo de se aplicar aos dois últimos
as circunstâncias agravantes específicas».
A pronúncia, com efeito tem por provada a denúncia, nos termos em que esta
se pôs, porque:
«Os acusados Carlos e José, filho
e pai, tinham sérias divergências com
a vítima na firma da qual os três eram
sócios. As discussões entre o réu
Carlos e a vítima eram freqüentes
e públicas, conforme consta de diversos depoimentos colhidos.
R.T.J — 150
Presentes, portanto, os indícios de
autoria que autorizam a remessa dos
autos a julgamento pelo Júri.
Indiciadas, também, as qualificativas articuladas na denúncia, segundo a versão ali contida». (Pronúncia
à fl. 66, grifamos.)
Portanto, estabelecido ficou no ilididum accusationais que na conduta de
Carlos fortes indícios havia de que perpetrara homicídio duplamente qualificado: por contratar a morte de desafeto
e por fazê-lo em outra torpe motivação:
silenciar o sócio que se indispunha contra os procedimentos ilegais que na empresa realizava.»
3. Certo, não há dizer que age por motivo torpe aquele que contrata outrem, mediante promessa de recompensa, para a
execução do homicídio. Não obstante, independentemente da motivação que o tenha
induzido à contratação do sicário, responde
o mandante por crime qualificado por ter
sido cometido «mediante paga ou promessa de recompensa». Trata-se de circunstância pessoal do executor, que, no
entanto, porque elementar do tipo qualificado do homicídio, se comunica ao mandante. Preciso, nesse sentido, o voto-vista
do eminente Ministro Aldir Passarinho,
no HC 66.571, 20-6-89, Boda, Lex STF,
156/229,236:
«Na verdade, o quesito quanto a ter
sido o crime cometido por motivo torpe,
deveria ter-se referido ao executor e não
ao mandante, pois, como disse, a mim
parece que em relação a este último não
poderia haver compatibilização nas respostas afirmativas quanto ao motivo
torpe e, concomitantemente, quanto ao
motivo fútil.
Ocorre, entretanto, que, no caso, a
toda evidência, pelo que resulta induvidoso dos autos, ao responderem os
jurados afirmativamente ao quesito
concernente ao motivo torpe, por ter
189
sido o crime executado mediante pagamento, não quis referir-se ao paciente,
mas sim ao executor e, assim sendo,
tem-se que tal circunstância qualificadora se comunica ao mandante — no
caso, o ora paciente, inobstante tratar-se
de circunstância de caráter pessoal, posto que a incomunicabilidade das circunstâncias pessoais deixa de existir
quando estas se inserem na própria ação
do crime, segundo resultava da parte
foral do art. 26 da anterior Parte Geral
do Código Penal, que assim dispunha:
'Não se comunicam as circunstâncias de
caráter pessoal, salvo quando elementares do crime'. Tal regra veio a ser mantida na nova Parte Geral do Código Penal, pelo art. 30, com a mesma redação.
Nelson Hungria, comentando o art.
26 do Código Penal da anterior Parte
Geral e que, como se disse, corresponde
ao atual artigo 30, rq36s exemplificar o
'motivo torpe' como circunstância pessoal, observa que 'a incomunicabilidade
das circunstâncias pessoais cessa quando estas entram na própria noção, a do
crime', advertindo: 'No homicídio qualificado, por exemplo, as qualificativas
de caráter pessoal ex capite executoras
se estende aos partícipes' (Comentários, vol. I, Tomo II, pág. 437, 4° ed.).»
Por isso, afirmada, na pronúncia, a
qualificativa da promessa de recompensa,
correta a inclusão do quesito a ela correspondente na série relativa ao paciente, tanto
mais que a sua redação deixa claro que a
promessa de recompensa fora o móvel dos
executores e não do mandante (cf. 4° quesito, fl. 70: O atue foi cometido por
motivo torpe, promessa de recompensa
feita aos agressores?)
É verdade que a denimcia e a pronúncia afirmaram também a torpeza da motivação do paciente, que deveria ter sido
incluída no questionário, seja para a hipótese de que a outra qualificativa fosse negada pelo Júri, seja para o caso de que, já
190
RTJ. —150
afirmada a primeira, o eventual reconhecimento da segunda qualificadora pesasse
contra o réu, na fixação da pena. Mas, como
se vê, no ponto, e o acórdão impugnado o
frisou, a omissão do questionário, ao invés
de prejudicar, beneficiou o paciente, tanto
mais quanto a pena-base foi concretizada
no mínimo legal.
As demais argüições da impetração
são, data veada, de menor consistência.
Não há complexidade no terceiro quesito quando especifica em que teria consistido a colaboração do paciente à prática do
delito.
Como «impossibilidade» de defesa é
hipótese mais restrita do que «dificuldade»
de defesa, também nesse ponto a alegada
discrepância entre o questionário e a pronúncia favoreceu a defesa. Por outro lado,
a afirmação pelo júri dessa qualificadora
foi irrelevante, dado que a pena se fixou no
mínimo legal.
Fmalmente, não é obrigatória a indagação ao Júri sobre ter sido de menos importância a participação do réu. É circunstância que depende de alegação da defesa
em plenário, a qual, de resto, na hipótese,
dificilmente se conciliaria com o reconhecimento pelo Júri de ter sido do paciente a
iniciativa do crime, mediante a contratação
dos executores.
Por tudo isso, indefiro o habeas corpus,
cessando a eficácia da liminar: é o meu
voto.
EXTRATO DA ATA
HC 69.940 — RJ — Rel.: Min. Sepúlveda Pertence. Pacte.: Carlos Lopes Machado. Impte.: José Mauro Couto de Assis.
Coator: Tribunal de Justiça do Estado do
Rio de Janeiro.
Decisão: A Turma indeferiu o pedido de
«habeas corpus», nos termos do voto do
Relator. Unânime. Falou pelo paciente o
Dr. José Mauro Couto de Assis.
Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Octavio Gallotti, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e limar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza.
Brasília, 9 de março de 1993 —Ricardo
Dias Duarte, Secretário.
HABEAS CORPUS N° 69973 — MS
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Francisco Rezek
Paciente: José Carlos Alves Foss — Impetrante: Aureliano Ferreira da Silva
— Coator: Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso do Sul
Habeas carpiu. Anulação da sentença. Manutenção da custádia preventiva. Tikicos.
Réu preso no curso do processo, que vê anulada sentença
condenatória. Subsistência dos atos processuais àquela pretéritos. Validade da manutenção da custódia preventiva, pela convicção, no julgamento colegiada, de persistirem seus motivos. Procedimento que não
caracteriza ilegalidade nem abuso de poder.
Habeas corpus indeferido.
R.TJ — 150
191
ACÓRDÃO
considerando a natureza do delito —
tráfico de cocaína.
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Tur5. A um segundo argumento, há o
ma do Supremo Tribunal Federal, na confato de que tendo sido decretada, exformidade da ata do julgamento e das notas
clusivamente, a nulidade da sentença
taquigráficas, à unanimidade de votos, em
e, em assim sendo, válidos são toindeferir o «habeas carpim».
dos os atos anteriormente praticados
Brasília, 8 de junho de 1993 — Paulo
, a lide pende somente de uma nova
Brossard, Presidente — Francisco Rezek,
finalização, razão pela qual grande é a
Relator.
possibilidade de que, à época do julgamento do presente writ, tenha o MM.
RELATÓRIO
Sentenciante proferido o novo vereO Sr. Ministro Francisco Rezek: Esta
dicto, fazendo quedar todo o fundaa análise que faz da espécie o Subprocuramento do pedido.
dor-Geral da República Cláudio Fonte6. Nesse aspecto, portanto, consideles:
rando que os autos têm o seu lter total«O paciente José Carlos Alves Foes,
mente finalizado, opina o MPU pelo
através de seu advogado, impetrou o HC
indeferimento do writ
que se vê às fls. 2/67 alegando que a sua
7. Acaso V. Ex.', todavia, entenda
condição de réu primário, com bons anpor conceder o writ —ciramstrincia em
tecedentes, residência fixa e profissão
que haveria de ser observada a regra do
definida, afastam a custódia preventiva
artigo 580 do CPP com relação aos réus
decretada pelo juízo de 1° grau, e manMoacir Barbosa Leite e Odilberto de
tida no de onde se declarou nula por
Oliveira —, somos de opinar porque
cerceamento de defesa a decisão condetanto o paciente, quanto os demais réus
natória exarada em 31-10-91. (Vide fls.
aqui citados, compareçam mensalmente
99/114 e 115/131.)
perante
ajuízo processante, afunde que
Diligências solicitadas por este MP
demonstrem
a permanência em domicírestaram concluídas para informar que
lio certo e o desempenho de ocupação
os exames toxicológicos, determinado
habitual lícita.» (fis. 154/156)
pelo Colegiada Revisor, teriam sido realizados no dia 16-4-93, às 14 h, no IML
É o relatório.
de Campo Grande/MS.
VOTO
Vejamos, pois.
O Sr. Ministro Francisco Rezek (Re4. Cumpre observar, primeiramenlatar):
Esta Casa, mesmo quando defrontate, que este Excelso Tribunal já tem,
por assentado que a nulidade do pro- da com hipóteses de anulação ab inflo de
cesso — observe-se que, no caso, so- um processo penal, nunca hesitou em conmente a sentença fora anulada — não firmar a manutenção da preventiva, houimplica revogar a prisão preventiva se vesse o juiz despendido alguma argumenpermanecem os motivos para a custó- tação hábil em prol da mesma.
dia (RT 658/347 — STF). À espécie,
O Supremo é coerente, portanto, no trato
destacando aquilo que interessa à lide, desta matéria: frente à emulação, verifica-se
há de se observar que o MN'. Julgador se algo se produziu de parte da autoridade
de 1° grau, ao prestar as informações judiciária que faça nova. — para utilizar
solicitadas demonstrou certa preocu- uma expressão do direito civil — a custódia
pação quanto a liberação do paciente, preventiva: ausente este dispêndio de ativi-
r,
R.TJ. — 150
192
dade judiciária, justificativa da prisão, resulta ilegal a mesma.
Na hipótese, a anulação pautada no cerceamento de defesa não excedeu de desautorizar a sentença, restando intangidos os
demais atos instrutórios. Não se viu dizer,
quando da anulação, unia palavra em favor
da liberdade do paciente: ao revés, o fecho
da decisão aqui impugnada é no sentido de
anular o feito a partir da sentença, «sem
prejuízo da sentença de suas prisões» (fl.
21). Entreviu a instância de apelação, dessarte, motivo suficiente para a continuidade
da custódia, declarando-o expressamente
— e o parecer do Ministério Público Federal lembra com propriedade que nós mesmos não vemos, em semelhante proceder,
nota da ilegalidad e que mereça reparo em
habeas corpu.s.
EXTRATO DA ATA
HC 69.973 — MS — Rel.: Min. Francisco Rezek. Pacte.: José Carlos Alves
Poss. Impte.: Aureliano Peneira da Silva.
Coator: Tribunal de Justiça do Estado do
Mato Grosso do Sul.
Decisão: Por unanimidade, a Turma indeferiu o «habeas carpis». Ausente, ocasionalmente, o Ministro Presidente. Presidiu o julgamento o Ministro Paulo Brossard.
Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Paulo Brossard, Carlos Venoso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. SubprocurbdorGeral da República, o Dr. Ululem Costa
Pinto.
Brasília, 8 de junho de 1993 — José
Wilson Aragão, Secretária
Indefiro a ordem.
HABEAS CORPUS 69.976 — RS
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Francisco Rezek
Paciente: Saint Clair Frey Piegas — Impetrante: Luiz Goulart Filho —
Coator: Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul
Habeas corpus. Mandado de recolhimento e guia de internação. Insanidade mentaL
Paciente que teve reconhecida sua insanidade mental no
processo-crime da origem e postula não o cumprimento do mandado de
recolhimento expedido pelo magistrado que o condenou, mas a expedição
de gula de internação pelo juiz das execuções. Mandado que figura como
antecedente lógico da guia, visto que foragido o paciente.
Habeas corpus denegado.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, à unanimidade de votos, em
indeferir o «habeas corpus».
Brasília, 28 de junho de 1993 — Néri
da Silveira, Presidente — Francisco Rezek, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Francisco Rezelc O
Subprocurador-Geral da República /farol-
R.TJ —150
do Nóbrega lança a seguinte quota nos autos:
«Cuida-se de habeas corpos impetrado por Dr. Luiz Goulart Filho, em
favor de Saint Clair Frey Piegas.
Este médico foi julgado por tentativa
de homicídio e, reconhecida a sua insanidade mental, foi-lhe aplicada a medida de segurança de intnnaçãoi, por, no
mínimo, 2 anos, no Instituto Psiquiátrico Forense.
Quando foi proposta a impetração já
tinha transitado em julgado a decisão
referida e, por isso mesmo, a Juíza Titular da Vara, onde correu o feito,
'determinou a expedição de
mandado de recolhimento' (autos,
fl. 4).
Idêntica providência fora tomada anteriormente pelo Presidente das Câmaras Criminais Reunidas do TJRGS, Desembargador Luiz Melíbio Uiraçaba Machado, logo após o julgamento dos embargos infringentes, confinnatérios da
aplicação da medida de segurança ao
réu.
O impetrante sustenta porém que as
autoridades referidas eram incompetentes para determinar o recolhimento do
paciente, providência que s6 caberia ao
Juiz das Execuções Criminais, através
da expedição de guia de internação (fl.
4).
As informações estão prestadas, no
seguinte teor:
'Em resposta ao Ofício n° 1542/R,
de 14 do corrente, tenho a honra de
me dirigir a Vossa Excelência para
prestar as informações que seguem
acerca do pedido de «Habeas corpus» n" 69.976-6, impetrado perante
essa egrégia Corte por Luiz Goulart
Filho em favor de Saint Clair Frey
Piegas. A presente impetração repete
a de 1569-0/RS, encaminhada pelo
mesmo requerente em prol do mes-
e
193
mo paciente, ao Colendo Superior
Tribunal deJustiça e lá distribuída ao
eminente Ministro José Cândido. Ambas as petições têm idênticos texto e
data, evidenciando-se ser uma delas
cópia reprográfwa da outra.
Fin 9 de novembro do corrente ano
prestei informações relativas àquela
primeira postulação, através do Ofício n° 252/92-Scr/DP, do qual tomo
a liberdade de anexar cópia.
Em complementação ao que consta no referido oficio, informo que o
mandado de captura do paciente ainda não logrou ser cumprido, conforme comunicação hoje recebida da Vara
das Execuções Criminais do Foro da
Capital. Quanto à guia para seu recolhimento ao Instituto Psiquiátrico Forense, será expedida pelo Juízo da
Vara antes mencionada por ocasião
da concretização da prisão, na forma
dos artigos 762 do Código de Processo Penal e 172 da Lei de Execuções
Penais.
Colho a oportunidade para renovar a Vossa Excelência protestos de
elevada estima e distinta consideração.' (Fls. 70/71)
Como se vê, o presente habeas corpus se resume a um mero e inútil jogo
de palavras.
O fundamental aqui é que a ordem de
internação ou a guia de internação até
hoje não foi cumprida, posto que o réu,
apesar de reconhecido inteiramente incapaz de entender o caráter criminoso
do fato e/ou de determinar-se de acordo
com este entendimento, tem sabido procurar em eficiência os caminhos da fuga..
A pretensão de habena corpos, especialmente por já ter transitado em julgado o acórdão nos embargos — trânsito
verificado antes mesmo da impetração
— é absolutamente inconsistente.
R.T.J. — 150
194
O parecer, destarte, em conclusão,
é pelo indeferimento do writ.» (Fls.
94/96).
É o relatório.
VOTO
Inexiste, como apontou o Ministério Público Federal, ilegalidade que reclame correção. Tais as circunstâncias, denego a ordem.
O Sr. ~dm Francisco Rezek (Relator): O paciente, vendo reconhecida sua
insanidade mental no processo-crime de
origem, estima ilegal a expedição de mandado de recolhimento pela juíza instrutora
do feito. Quer, sim, que em seu nome saia
uma guia de recolhimento do juiz das execuções. Sucede que não há incompatibilidade, tenninoldgica ou de roteiro processual, entre uma e outra. O paciente está
foragido. Uma vez detido, o juiz das execuções fará expedir a guia de internação,
como mandam o Código de Processo e a
Lei ncl 7.210. O mandado de recolhimento
é, assim, antecedente lógico da guia — a
menos que o paciente resolva se apresentar
espontaneamente, tornando ociosa a determinação constritiva.
11069.976—RS —Rel.: Min. Francisco Rezek. Pacte.: Saint Clair Frey Piegas.
Impte.: Luiz Goulart Filho. Coator: Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do
Sul.
EXTRATO DA ATA
Decisão: Por unanimidade, a Turma indeferiu o «habeas capim».
Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Paulo Brossard, Carlos Venoso, Marco Aurélio e Francisco Rezai. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Mardem Costa
Pinto.
Brasília, 28 de junho de 1993 — José
Wilson Aragão, Secretário.
HABEAS CORPUS N° 70.001— DF
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence
Paciente: Marta Jorge de Frias — Impetrante: Jansen Fialho de Almeida —
Coator: Superior Tribunal de Justiça
Habeas carpas: questão de fato controvertida: inidonddade.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos,
em indeferir o pedido de «habeas carpiu».
Brasília, 9 de março de 1993 — Moreira Alves, Presidente — Sepúlveda Pertence, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence A
paciente, Marta Jorge de Frias, foi denunciada por roubo, com três co-réus, nos seguintes termos, (fl. 44).
«O Promotor de Justiça que esta subscreve, no uso de suas atribuições legais,
vem oferecer denúncia contra José de
Moura Araújo, vulgo 'Sapo', Márcio
Rodrigues de Souza, vulgo 'Moleque',
Jorge Alves de Souza, vulgo 'Jorge
R.T.J —150
Pezão' e Marta Jorge de Frias, qualificados respectivamente às fls. 4, 18, 17
e 35 do incluso inquérito policial, pelo
fato delituoso que passa a narrar:
No dia 13• de novembro de 1984,
cerca das 10h30 min, os dois primeiros
denunciados adentraram na residência
situada na Rua José Maria de Abreu n°
275, Realengo, e lá, mediante grave
ameaça exercida com arma de fogo portada pelo segundo denunciado, imobilizaram a empregada Ana Maria Ferreira
e as moradoras lha Jorge de Frias e a
quarta denunciada, respectivamente
mãe e filha e subtraíram para eles e os
demais denunciados os objetos descritos no campo 7 do Registro de Ocorrência de fl. 3v e mais a quantia de Cr$
200.000,00 (duzentos mil cruzeiros).
A quarta denunciada forneceu a referida ama e facilitou a entrada dos dois
primeiros denunciados em sua residência, indicando aos mesmos onde estavam os objetais de valor.
O terceiro denunciado ficou do lado
de fora dando «cobertura» aos seus companas e foi mentor intelectual da ação
ilícita aqui descrita
Os denunciados agiram em concurso
de ações e desígnios e combinaram o
roubo na noite do dia anterior.»
Por alegação de falta de justa causa para
o processo, seus advogados, sucessivamente, requereram habeas coreus, sem êxito,
ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e
ao Superior Tribunal de Justiça.
O acórdão do STJ, da lavra do ilustre
Ministro Costa Lima, ficou sintetizado
nesta ementa (fl. 30):
« Habeas arpas substitutivo do re-
curso ordinário. Trancamento da ação
penal por falta de justa causa. Exame
da prova.
1. Possível o conhecimento do habeas corpos como substitutivo do recurso ordinário não interposto, porém
195
limitando-se o conhecimento ao que foi
objeto do pedido originário.
É possível o trancamento da ação
penal por falta de justa causa, se a atipicidade dos fatos exsurge claramente e a
inocência ressai de forma incontestável.
Tal não ocorre nos autos, fazendo-se
indispensável um detido exame da prova, comparando-se as versões da acusação e da defesa para concluir que a paciente é ou não inocente.
A denúncia descreve a ocorrência
de crimes em tese e a participação da
paciente para a prática da infração penal.
4. Ordem denegada».
Donde a presente impetração ao STF,
que insiste na fundamentação das anteriores. Aduz o requerente, (fls. 4 ss.).
«Sucintamente Matando, os fatos
ocorreram da seguinte forma:
Em 13 de novembro de 1984, por
volta das 10 horas, dois delinqüentes
adentraram a residência da paciente, que
encontrava-se com sua genitora e a empregada Ana Maria, e, mediante emprego de uma amara e uma faca, obrigaram
as mesmas a entregarem objetos de valor que se encontravam no armário do
quarto, na despensa da casa, e no interior
de uma maleta, da seguinte forma:
— primeiramente adentraram no
quarto da genitora da paciente e, vasculhando o armário, encontraram um re-
vólver calibre 32, de propriedade do
pai da paciente, bem como uma maleta que estava trancada. Isto acontecido, apossaram-se da arma, e tentaram
abrir violentamente a maleta, quando a
vítima lhes deu a chave, possivelmente
temendo maiores violências, onde, após
aberta, foi encontrada e subtraída certa
quantia em dinheiro;
— seqüencialmente, os delinqüentes
obrigaram a vítima (genitora) a dizer
onde guardava as jóias da família e,
mediante ameaça, os levou à despensa
196
R.TJ. — 150
da residência, onde escondia as jóias e
entregou-as;
satisfeitos com a subtração, os
assaltantes trancaram, no banheiro, Marta, sua mãe e Ana Maria, obrigando-as
a ficarem deitadas e só saírem após um
certo tempo;
decorridos alguns poucos minutos, um dos marginais voltou ao banheiro, obrigando Marta a abrir o portão,
para que pudessem sair, pois estava
trancado. Ocorrido isto, os mesmos
adentraram em um automóvel que era
dirigido por outra pessoa, e fugiram;
—após o assalto, Marta, sua genitora
e Ana Maria, dirigiram-se imediatamente à 33" Delegacia Policial, informando
a noticia criminas ao Delegado de Plantão, que, prontamente, apresentou às
mesmas um álbum de fotos de delinqüentes procurados dou com passagens
por aquela DP;
—com efeito, a paciente reconhe-
ceu um dos assaltantes pelo álbum a
ela apresentado (doc. VI), identificando o Sr. José de Moura Araújo e,
diante disto, o Dr. Delegado, no mesmo
instante, determinou a agentes que fizessem diligências no sentido de capturar o delinqüente identificado, o que ocorreu. Prontamente, a paciente o reconheceu frontalmente (doc. VII), sendo
que, na mesma data, paciente e sua genitora prestaram depoimento sobre o fato
ocorrido (docs. VIII e IX), tendo ainda,
o delinqüente ameaçado Marta por tê-lo
reconhecido, afirmando que 'iria pagar
por isso, que a mataria'.
O delinqüente, em seu depoimento,
disse que Marta havia entregue uma
arma para fazerem o assalto e, ainda
teria deixado o portão aberto (da residência), para facilitar a entrada dos mesmos. Conclusa valia, o depoimento foi
no mínimo contraditório e mentiroso,
(doc. X), como se vislumbra
«que ao saírem trancaram os
ocupantes da casa no interior do
banheiro; que Moleque retornou
ao interior da residência, de onde
voltou com Marta, a qual abriu o
portão, para que os elementos saíssem»;
«disse que entre os objetos
subtraíram um revólver do interior
da residência». (Frisamos)
Ora, se Marta já tivesse aberto o portão para adentrarem, por que após o
assalto a buscaram para abri-lo?
Como Marta poderia entregar o revólver, se a única arma existente em
sua residência fora roubada pelos assaltantes, durante o assalto?
Claras e cristalinas se demonstram as
mentiras narradas por José de Moura
Araújo que, talvez por vingança por Marta o ter reconhecido ou, pensando em
diminuir sua culpa, prestou depoimento
eivado de contradições e mentiras, que
não condizem com a veracidade dos fatos e depoimentos da vítima e paciente,
senão vejamos:
Léa Jorge de Frias (vítima)
«... o qual portava uma arma (revólver); ... iniciaram a subtração dos
seguintes objetos: urna adaga, ... um
revólver taurus calibre 32mm...»
(Grifos nossos.)
Ora, o depoimento da paciente somente confirma o depoimento da vítima, alicerçado na verdade, até porque, o
Douto Promotor de Justiça ao oferecer
denúncia, fundou-se no depoimento de
José de Moura Araújo, pessoa que,
apesar de falecido, praticou vários delitos.
Permissa vertia, aos outros denunciados foi decretada a revelia, tendo em
vista que não compareceram em Juizo
para o interrogatório, bem como, no
inquérito policial.
R.T.J — 150
Notoriamente se apercebe o intuito
do delinqüente (diga-se, José de Moura
Araújo), em acusar Marta, para desviar
a finalidade do inquérito policial.
Cumpre ressaltar, que a denúncia foi
oferecida fundamentada em inquérito
policial em que a vítima e a paciente, em
seus depoimentos não deixam dúvidas
ou contradições quanto ao fato ocorrido,
valendo-se a Promotoria de depoimento
falso de um bandido.
Ademais, a paciente era e é proprietária da residência, local do assalto,
desde 1980, portanto, anteriormente à
empreitada delituosa.» (doc. XI)
Opinou pelo Ministério Público o ilustre
Subprocurador-Geral Cláudio Fonteles no
sentido da denegação da ordem, por «inadequação da via eleita», dado que a questão
exige detalhado exame probatório»; realça
o parecer que «a própria paciente à fl. 47
afirmou conhecer um dos elementos que
participou do delito ocorrido em sua residência».
É o relatório.
VOTO
O Sr. Affiristro Sepúlveda Pertence (Relatar): A impetração — quiçá de prova
difícil dada a morte do único co-réu inquirido, ao que se afirma — não é, porém, o
que Orosimbo Nonato chamou de «criação
mental da acusação».
197
2.0 que há, na verdade, é a contraposição radical entre a versão acusatória —
fundada em minuciosas declarações de um
dos co-réus —, e a negativa peremptória da
paciente.
De resto, a declaração do co-réu contra a paciente em nada beneficia o delator,
o que, se é certo que não basta para convertê-la em prova definitiva da participação
questionada, não permite que, de logo, em
habeas cogites, se recuse qualquer valia à
—o.
Denego a ordem: é o meu voto.
EXTRATO DA ATA
HC 70.001 —DF — Rel.: Min. Sepúlveda Patence. Pacte.: Marta Jorge de Frias.
Impe.: Jansen Ralho de Almeida. Coator:
Superior Tribunal de Justiça.
Decisão: A Turma indeferiu o pedido de
«babeas corpus», nos termos do voto do Relator. Unânime.
Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Octavio Gallotti, Sepúlveda Patente, Celso
de Mello e flmarGalvão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Antonio Fanando Barros e Silva de Souza.
Brasília, 9 de março de 1993 — Ricardo
Dias Duarte, Secretário.
RAMAS CORPUS N° 70.001 (EDc1) — DF
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence
Embargante: Marta Jorge de Frias — Embargada Turma do Supremo
Tribunal Federal
Furto é subtração de coisa móvel: embargos de declaração
recebidos para explidtar o óbvio de que, por isso, à sua caracterização é
irrelevante que o agente tenha ou não o domínio do Imóvel de onde
subtraídos os bens móveis alheios.
198
R.TJ. — 150
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos,
acordam os Ministros da Primeira Turma do
Supremo Tribunal Federal, na conformidade
da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, emreceber os
embargos de declaração, sem tração do
resultado.
Brasília, 6 de abril de 1993 — Octavio
Gallotti, Presidente — Sepúlveda Pertaice,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Eis
o teor dos embargos de declaração (fl 88)•
«0 V. Acórdão teve o voto condutor
da lavra do Em. Ministro Relator, litte-
ris:
«A impetração — quiçá de prova
difícil dada a morte do único co-réu
inquirido, ao que se afirma — não é,
porém, o que Orosimbo Nonato chamou de 'criação mental da acusação'.
2.O que há, na verdade, é a contraposição radical entre a versão acusatória — fundada em minuciosas
declarações de um dos co-réus —, e
a negativa peremptória da paciente.
3. De resto, a declaração do co-réu
contra a paciente em nada beneficia
o delator, o que, se é certo que não
basta para convertê-la em prova definitiva da participação questionada,
não permite que, de logo, em habena
corpus, se recuse qualquer valia à
—o.
4. Denego a ordem; é o meu voto.»
Data venia, o acórdão foi omisso
quanto ao pedido alternativo feito pelo
impetrante, senão vejamos:
«Do pedido
(...)
(...)
c) a nulidade do processo, bem
como a inépcia da denúncia, no que
se refere a impetrante, tendo em
vista que o fato de ser proprietária
do bem, à época do fato, discorreu
a denúncia um crime impossível,
atípico.» (Grifei)
Observe-se, que no Relatório, foi destacada esta alegação do impetrante:
«... Ademais, a paciente era e é
proprietária da residência, local do
assalto, desde 1980, portanto anteriormente à empreitada delituosa.»
(dor. X1)
Porém, no julgamento, tal ponto não
foi apreciado. Ressalte-se as Razões do
Pedido do impetrante:
«... Haja vista que a paciente era à
época do fato, proprietária (residência), local do assalto, ocorrendo assim, crime impossível, atípico (art.
?XXXIX da CF), sendo esta, nulidade absoluta devendo ser decretada
de ofício, podendo ser invocada em
qualquer fase e grau de jurisdição,
tendo em vista o benefício à paciente, e norma de garantia Constitucional.»
Como se vislumbra, o V. Acórdão
não apreciou integralmente o pedido do
impetrante, foi omisso em matéria que
deveria ter se pronunciado.
Sendo assim, requer que os presentes Embargos de Declaração sejam
acolhidos e providos, para que seja
prestada a Tutela Jurisdicional (art. 5°
XXXV da CF), bem como, se providos, tenham efeito modificativo do
julgado (art. 338, parte final, do
RISTF).»
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence
(Relator): Recebo os embargos, uma vez
que efetivamente, no acórdão embargado, reputei desnecessário ocupar-me explicitamente da alegada impossibilidade
R.T.J —150
do crime, tal, data venia, a fragilidade do
argumento.
Certo, fez-se prova coma impetração de
que, por escritura de 15-10-80, os pais da
paciente doaram-lhe, em condomínio com
dois irmãos seus e com reserva de usufruto,
dois imóveis, um dos quais o lote sobre o
qual se teria edificado a casa em que se deu
o fato delituoso.
Sucede que a paciente responde por coautoria de furto, cujo objeto material é «coisa móvel alheia», pouco importando que o
agente tenha o domínio do imóvel onde
haja ocorrido a subtração incriminada.
Com essa ululante obviedade, complemento a fundamentação do acórdão embargado, mantida a conclusão: é o meu voto.
199
EXTRATO DA ATA
11C 70.001 (DM) — DF — Rel.: Min.
Sepúlveda Pertence. Embte.: Marta Jorge
de Frias (Adv.: Jansen Fialho de Almeida).
Embda.: 1° Turma do Supremo Tribunal
Federal.
Decisão: A Turma recebeu os embargos
de declaração, sem alteração do resultado,
nos termos do voto do Relator. Unânime.
Presidência do Sr. Ministro Octavio Callotti, na ausênciajustificadado Sr. Ministro
Moreira Alves (Presidente). Presentes à Sessão os Srs. Ministros Sepúlveda Pertence e
Celso de Mello. Ausente, justificadamente,
o Senhor Ministro limar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Miguel
Franzino Pereira.
Brasília, 6 de abril de 1993 — Ricardo
Dias Duarte, Secretário.
HABEAS CORPUS N° 70.023 — RJ
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio
Paciente: Carlos Alberto Alves dos Santos — Impetrante: Maryse Horta de
Araújo — Coator: Tribunal de Alçada Criminal do Estado do Rio de Janeiro
Prestaçãoftaisdiciorsal. Predicado. Os provimentos judiciais
devem, tanto quanto possível, conter o exame da matéria controvertida
de modo a conduzir ao convencimento. A ordem Jurídico-constitucional
impõe a entrega da prestação jurisdicional de forma completa. O vício
da omissão fica exacerbado quando ocorre no âmbito da liberdade do
cidadão. Exsurge como nulo acórdão que não abrange a apreciação
completa do recurso interposto pela defesa, deixando-se de cuidar, por
exemplo, da atenuante consubstanciada na confissão espontânea.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos,
em deferir o «habeas corpus», para anular
o acórdão e determinar que outro seja pro-
latado, considerados os termos do recurso
interposto pelo Paciente.
Brasília, 3 de agosto de 1993 —Néri da
Silveira, Presidente — Marco Aurélio,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Marco Aurélio: A Defensora Pública Maryse Horta de Araújo
200
R.T.J. —150
impetra este habeas corpus apontando que
a Corte de origem não apreciou a matéria
veiculada no recurso interposto, relativa à
atenuante referente a confissão espontânea
(fls. 2 a 4). Coma inicial, visam aos autos
os documentos de fls. 5 a 17.
Solicitadas informações à Corte de origem, prestou-as o respectivo Presidente,
conforme peça de fls. 26 e 27, acompanhadas dos documentos de fls. 28 a 45. Em
síntese, reconhece-se que não houve exame
da questão ligada à atenuante. Contudo,
teria sido encampada a sentença, não se
seguindo embargos declaratórios.
A Procuradoria-Geral da República pronuncia-se pela denegação da ordem, asseverando analisado o tema quando do julgamento da apelação. Consignou também que
«a atenuante da confissão espontânea é
uma retribuição ao acusado, que colabora
para a verdade processual, esclarecendo espontaneamente a autoria da infração. Não
pode haver colaboração para apuração da
autoria, da parte de quem é preso em flagrante delito. Parecer pelo indeferimento
do mit».
Recebi os presentes autos para exame
em 29 de junho de 1993, liberado-os no
dia 7 imediato (fl. 50).
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Inicialmente, ressalvo entendimento
individual sobre a competência para apreciar este habeas corpus. É que, a teor do
disposto no inciso TB, artigo 96 da Constituição Federal, os componentes dos Tribunais de Alçada, como Juízes Estaduais, estão submetidos à jurisdição direta dos respectivos Tribunais de Justiça. Assim, a estes
cabe o julgamento de habena corpus quando envolvido como Paciente cidadão comum e como Autoridade Coatora membro
de Tribunal de Alçada. Todavia, até aqui
este não é o enfoque prevalente na Corte,
razão pela qual coloco em plano secundário
a convicção pessoal, deixando para discutir
a matéria em sede própria, ou seja, no Plenário, o que já vem ocorrendo mediante
apreciação da Medida Reclamatória n°
341-1-DF, em que funciona como Relator
o Ministro Moreira Alves. Após o voto de
S. Ex.', divergi, seguindo-se pedido de vista
do Ministro Francisco Rezek. Conheço do
pedido formulado nestes habeas corpus.
Ao contrário do que asseverado pela
Procuradoria-Geral da República, em parecer da lavra do Subprocurador-Geral Dr.
Haroldo Ferraz da Nóbrega, a matéria a
envolver a atenuante da confissão espontânea, embora veiculada no recurso interposto pela Defensoria Pública (fls. 11 a
13), não foi objeto de apreciação pelo órgão revisor. Sequer constou do relatório
pelo qual deu-se aos demais participantes
do Colegiado o conhecimento da matéria
a ser examinada, o que se dirá quanto ao
voto condutor do julgamento. Confira-se
com que se contém às fls. 40 a 44. Na
verdade, o parecer exarado incidiu em
equívoco no que transcreveu como parte
do acórdão proferido trecho da manifestação da Procuradoria-Geral de Justiça junto
à Câmara julgadora (fls. 34 a 39).
Nem se diga, como fez o ilustre Presidente da Corte de origem, que não teriam
sido opostos embargos declaratórios. A
circuntância não afasta do mundo jurídico
o constrangimento ilegal a que está submetido o Paciente. Impossível é potencializar
no campo penal a forma, prejudicando-se
o fundo, a ponto de entender-se preclusa
uma determinada matéria para efeito de
habeas corpus, por não terem sido protocolados os declaratórios. Também não
procede a assertiva segundo a qual, negado acolhida ao recurso, o órgão julgador
confirmou a sentença, fazendo-o, assim,
implicitamente no que concerne à atenuante. Todo provimento judicial é ato de inteligência e tanto quanto possível deve levar
os envolvidos à convicção sobre o respectivo acerto. Reclama-se, para tanto, a ob-
R.T.J —150
servância dos elementos que consubstanciam a estrutura que lhe é própria — o
relatório, a fundamentação e o dedsum. A
ordem jurídica não agasalha decisões que
se mostrem omissas, obscuras, contraditórias e ensejadoras de dúvida. No caso, a
ausência de interposição dos declaratórios
não prejudica a procedência desta medida.
Concedo a ordem, para anulando o acórdão de fls. 40 a 44, determinar que outro
seja proferido, apreciando-se as matérias
veiculadas no recurso da Defensoria Pública, cuja fotocópia encontra-se às fls. 11 e
13. É como voto na espécie dos autos.
EXTRATO DA ATA
HC 70.023 -RJ —Rel.: Min. Marco
Aurélio. Pacte.: Carlos Alberto Alves dos
201
Santos. Impte.: Maryse Horta de Araújo.
Coator: Tribunal de Alçada Criminal do
Estado do Frio de Janeiro.
Decisão: Por unanimidade, a Turma
deferiu o «habeas corpus», para anular o
acórdão e determinar que outro seja prolatado, considerados os termos do recurso
interposto pelo paciente.
Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Carlos Venoso e Marco Aurélio. Ausentes,
justificadamente, os Srs. Ministros Paulo
Brossard e Francisco Rezek. Subprocurador-Geral da República, o Dr. Haroldo
Ferraz da Nóbrega.
Brasília, 3 de agosto de 1993 — José
Wilson Aragão, Secretário.
RAMAS CORPUS N° 70.036 — SP
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves
Paciente: Josecir Cuoco — Impetrantes: Maria da Conceição Ayres Cemicchiar° e outro — Coator: Superior Tribunal de Justiça
«Habita carpes».
— Sentença que, mantida a condenação, se anula no tocante
à fixação das penas, a fim de que sejam elas fixadas com a explkitação
da operação mental e aritmética do Juízo, para, partindo da pena-base,
chegar à pena definitiva.
illabeas capas» deferido em parte.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira
Turma do Supremo Tribunal Federal, na
conformidade da ata do julgamento e das
notas taquigráficas, por unanimidade de
votos, em deferir, em parte, o pedido de
«habeas corpus», para, mantendo a sentença no tocante à condenação, anulá-la,
somente quanto à função das penas do
ora paciente, estendendo essa concessão,
«ex officio», a Domingos Campanella Júnior, nos termos do voto do relator.
Brasília, 30 de março de 1993 — Moreira Alves, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): Assim expõe e aprecia o presente babe= corpus o parecer da Procuradoria-Geral da República, de autoria do Dr. Hatoldo
Ferraz da Nábrega:
«Cuida-se de habeas anus requerido em favor de Josedr Cuoco pelos
Drs. Maria da Conceição Ayres Cer-
202
R.T.J. — 150
Inicchiru-o e Joaquim Jair Xitnenes de
Aguiar.
Os mesmos não se conformam com
a decisão do Colendo Superior Tribunal
de Justiça, cuja ementa é do seguinte
teor
`Penal. Sentença condenatória.
Dosimetria. Fundamentação. Reineidascia. Habeas copas. Subslituição
de recurso.
Não se examina dosimetria de
pena em habeas corpus.
Cabe à defesa, em habeas corpus demonstrar de forma incontroversa eventual erro monocrático, o
que não ocorreu neste caso quanto à
reincidência do Réu.
3. Habeas corpus conhecido
como Substitutivo de Recurso; ordem
denegada'.
A impetração postula, como expressamente referido, não absolvição do réu,
mas 'a nulidade da sentença, pois faltoulhe exata qualificação das penas aplicadas
e a devidaftmdamaitação individualizada
conforme determina a lei' (autos, fl. 4).
A própria impetração reconhece que
o Magistrado aplicou a pena mínima
para todas as infrações (fl. 4).
Acrescento que o Magistrado aumentou as referidas penas mínimas de
1/6, pela agravante da reincidência.
Entendo que o HC não se credencia
ao deferimento.
Embora a sentença seja passível da
crítica de haver pecado na análise a
aplicação do art. 59 do CP ao fixar a
pena-base — apesar de brilhante na análise da prova e nas considerações sobre
o delito de tortura — não há a nulidade
no caso.
As penas foram fixadas no mínimo
legal, sendo que o acréscimo, perfeitamente dedutível e declarado, foi de 1/6
pela agravante da reincidência.
A jurisprudência, inclusive do Supremo Tribunal Federal, é no sentido de
que a fixação da pena-base é 'dispensável quando a pena for aplicada no mínimo legal (STF, RHC 64.682, DJ de 133-87, pág. 3881; RHC 59.750, 21-5-82,
pág. 4870) (apud Código Penal Comentado, 3' edição, Celso Delmanto (atualizado por Roberto Delmanto), 1991, Renova Editora, pág. 92).
À mesma página, vê-se, ainda, esta
decisão: 'Pena-base dedutível: A falta
de fixação da pena-base, mesmo quando
há aplicação de causas especiais de aumento, não anula, se é facilmente dedodvel e foi fixada no mínimo legal (STF,
RTJ 103/601; HC 58.933, In de 23-1081, pág. 10628).
Com base nesses precedentes e ante
o que mais consta dos autos, opino no
sentido do indeferimento do writ.» (fls.
117/119)
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): 1. 0 Superior Tribunal de Justiça indeferiu habeas corpus substitutivo de recurso ordinário de habeas corpus, por entender que o writ não é o meio adequado
para o reexame de dosimetria de pena.
Sucede, no entanto, que, no caso, não se
trata, propriamente, de apreciação quanto
aos limites da dosagem da pena, mas de a
sentença de primeiro grau haver fixado a
pena definitiva sem que se saiba como chegou a ela. Com efeito, é este o teor da
sentença quanto à fixação da pena do ora
paciente:
«Frente ao exposto, julgo procedente, em parte, a denúncia, para condenar:
Josecir Cuoco e Domingos Campanella Júnior, como incursos, por duas
vezes, nas penas do artigo 350, do Código Penal; artigo 6°, parágrafo 3°, letras
R.T.J —150
a, b e c, da Lei n° 4.898/65; por infração
ao artigo V, letras a, e i, da mesma
Lei e artigo 322, do Código Penal; bem
como por urna vez, nas penas do artigo
129, parágrafo 1°, inciso I, do Código
Penal, e por urna vez nas penas do artigo
129, caput, do mesmo Código, tudo combinado com os artigos 29 e 69, ambos
também do Código Penal, a dois anos,
quatro meses e vinte dias de reclusão e
três anos e dez meses de detenção.» (fl.
28)
E, mais adiante, lê-se:
«As penas foram fixadas a partir
dos mínimos, com observância do arfigo 69, caput, do Código Penal, concurso material, aplicando-se cumulativamente, conforme entendimento jurisprudencial predominante: JUTACRIM, 45/196, 25/331, 44/411,
47/207, 46/347, 50/248, 52/343; RTJ
101/595 e RT, 404/298.
Após, houve acréscimo de um-sexto
por causa da reincidência.» (fl. 29)
Já o Ministério Público do Estado de
São Paulo, quando emitiu parecer no habena corpos que deu margem à decisão do
STJ ora atacado, salientou:
«Todavia, indisputável data venta o
equívoco em que laborou o ínclito magistrado sentenciante no tocante à dosimetria das penas privativas de liberdade
aplicadas ao paciente.
Assim, partindo-se do mínimo legal
relativamente às penas de detenção,
tem-se um total, já acrescido no sexto
concernente à nota de reincidência, de 1
ano, 9 meses e 12 dias (um ano, nove
meses e doze dias).
E, relativamente ao único delito apenado com reclusão id est lesão corporal
de natureza grave a pena data venta
203
correta seria de 1 ano e 2 meses de
reclusão e não 2 anos, 4 meses e 20 dias
de reclusão; desse modo, impossível reproduzir-se a operação levada a cabo
pelo culto magistrado sentenciante, para
partindo da pena-base, chegar-se ao
quantuna final das reprimendas impostas.» (fl. 64)
Assim sendo, defiro, empane, o presente pedido, para, mantendo a sentença no
tocante à condenação, anulá-la, somente,
quanto à fixação das penas do ora paciente,
a fim de que sejam elas fixadas com a
explicitação da operação mental e aritmética do Juízo, para, partindo da pena-base,
chegar à pena definitiva.
Entendo essa concessão, ex officio, a
Domingos Campandla Júnior, por estar
na mesma situação objetiva do ora paciente.
EXTRATO DA ATA
HC 70.036 — SP — Rd.: Min. Moreira
Alves. Pacte: Josecir Cuoco. 'raptes: Maria
da Conceição Ayres Cernicchiaro e outro.
Coalhar: Superior Tribunal de Justiça.
Decisão: A Turma deferiu, em parte, o
pedido de «habeas corpus», para, mantendo a sentença no tocante à condenação,
anulá-la, somente quanto à fixação das penas do ora paciente, estendendo essa concessão, «ex officio», a Domingos CampanellaJunior, nos termos do voto do Relator.
Unânime.
Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Octavio Gallotti, Celso de Mello e limar
Gaivão. Ausente, justificadamente, o Sr.
Ministro Sepfilveda Pertence. Subprocurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza.
Brasília, 30 de março de 1993, Ricardo
Dias Duarte, Secretário.
—150
204
HABEAS CORPUS N° 70.081— SP
(Segunda Turma)
Relatar: O Sr. Ministro Francisco Rezek
Paciente e Impetrante: Rui Nogueira Bernardo — Coator: Tribunal de Alçada
Criminal do Estado de São Paulo
Habeas corpus.Alegação de cerceamento de defesa Ausência
da defensora ad hoc em ato instrutória Indeferimento de diligência.
Indeferimento do pedida
I — Alegação de cerceamento de defesa em virtude da
ausência —indemonstrada —da defensora ad hoc em inquiriçãojudidal
de testemunha. Inexistência de prejuízo à defesa. Alegações finais apresentadas por defensor constituído que, não obstante a combatividade,
não abordam a alegada ausência.
II — Diligência — constante em obtenção de declaração de
certa empresa — indeferida, visto que procrastinatória: já existia, nos
autos, o aventado documento.
Habeas corpos indeferido.
ACÓRDÃO
lado à fl. 110, o eminente Juiz a quo
causou-lhe
prejuízos pois tal procediVistos, relatados e discutidos estes aumento
poderia
confirmar o seu depoitos, acordam os Ministros da Segunda Turmento
prestado
em juízo.
ma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata de julgamento e das notas
Sem razão o impetrante.
taquigráficas, à unanimidade de votos, em
Assim está em trecho do v. Acórindeferir o «habeas corpos».
dão do 1° Grupo de Câmaras do TribuBrasília, 8 de junho de 1993 —Paulo
nal de Alçada Criminal de São Paulo,
Brossard, Presidente —Francisco Rezek,
verbis:
Relator.
«II — Quanto à primeira preliRELATÓRIO
minar levantada pelo peticionário e
referente a alegado cerceamento de
O Sr. Ministro Francisco Rezek: O
defesa, por falta de defensor à auSubprocurador-Geral da República Cláudiência de instrução do feito revidio Ponteies lança a seguinte quota nos
dendo, entendeu a douta maioria,
autos, em análise da espécie:
adotando o voto e o pensamento do
«1. Rui Nogueira Bernardo impeeminente Juiz Haroldo Luz, vencitra apresente ordem de habeas corpus,
dos neste ponto o signatário e o
em benefício próprio, objetivando a
ilustre
Juiz Pedro Gagliardi, de
desconstituição do v. Acórdão de fls.
afastá-la,
pois a simples omissão
168/174, alegando para tanto, a ocorda
assinatura
da defensoria ad
rência de cerceamento de defesa eis que
Procuradora
da Assistência
hoc,
defensora ad hoc não participou das auJudiciária
do
Estado,
aos termos
diências para oitiva das testemunhas.
onde foram colhidas as assinatu2. Afirma, ainda, o paciente que ao
ras da vítima e testemunhas,
constitui-se em mera irregulariindeferir o pedido de diligência formu-
R.TJ— 150
dade, insuscetível, no caso, de ser
reconhecida como nulidade. E
isso porque, a nomeação da defensora ad hoc e seu nome constaram da assentada da audiência, o
que indica que estava presente,
não tendo o fato da alegada nulidade sido ventilado, seja nas
alegações finais da defesa do
peticionário, seja em qualquer outro
momento. Demais disso, entendeuse, ainda, que, na via revisional,
como se fazia necessário, o peticionário não produziu qualquer prova a
respeito da efetiva ocorrência dessa
nulidade.' (vide fls. 169/170 — grifamos)
Como se vê, o ora paciente foi
assistido durante todo o curso do processo, tendo a sua defesaparticipado das
audiências e oferecido, até mesmo, alegações finais. (vide fls. 118/122)
Com relação ao segundo argumento, este é em todo improcedente.
A diligência solicitada à fl. 110
objetivava tão-somente a procrastinação do feito eis que a declaração da
empresa já havia sido anexada aos autos. (vide fl. 111).
Não há, portanto, qualquer amstranghnento ilegal que propicie a concessão da ordem.
9. Somos, assim, pelo indeferimento do pedido.» (fls. 182/184).
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Francisco Rezek (Relatar): O argumento tratado em caráter derradeiro pelo Ministério Público Federal
afasto-o desde logo, pelo motivo lançado
na parte final do parecer. O tema do cerceamento de defesa reclama resposta mais firme, que o próprio Ministério Público cuidou, repudiando-o, de dar. Aqui há uma
petição de habeas corpus caracterizada
205
por nenhuma instrução documental. A alegação de cerceamento de defesa não fez
referência temporal alguma que possibilitasse, no cotejo das ulteriores informações
prestadas pelo tribunal impetrado, detectar
o mencionado vício. Há, porém, um dado
cronológico que me pareceu relevante: as
alegações finais da acusação foram datadas
de 18 de julho de 1988 — evidência de que
se encerrara, antes disto, a oitiva das testemunhas. Pois ban: no agosto seguinte julgava eu um recurso de habena corpus em
favor deste mesmo paciente, e ali não se vê
irresignação contra este tópico.
No feito criminal, as alegações finais da
defesa —não obstante articuladas por combativo e engenhoso advogado, pelo que se
vê às fls. 115/119 destes autos —tampouco
deduzem uma única sílaba em prol da tese
do cerceamento.
Dá-se a condenação: o réu apela — e
nada a respeito. Na revisão fala-se da suposta ausência da defensora ad hoc em
certa audiência, conducente à nulidade do
feito. Por ter o tribunal afastado este alvitre
de nulidade é que o tema nos chega à mesa.
Recordo o que nos dizemos com freqüência
nesta sala: a nulidade, em hipóteses como
esta, só se verifica com a comprovação do
prejuízo. E só a ausência de defesa, não sua
hipotética deficiência, tem o dom de fulminar a ação penal.
Nada disto ocorre-me, folheando os autos, e dando-me conta da forma como instruído o feito original. Repito que as alega
ções finais da defesa primam pela combatividade — o que menos se vê ali é falta de
apego ao propósito absolutório. Não vejo
como situar nesta ausência da defensora—
de resto indemonstrada — cerceamento ou
prejuízo à defesa, pelo que, após este vício
alegado, produziu a defesa constituída do
paciente.
Por isto não vejo razão em averiguar a
idoneidade da alegação não comprovada do
paciente que é o carro-chefe da impetração:
a ausência não trouxe dano algum a ele, não
206
R.T.J. —150
devendo o Supremo, assim, nela se basear
para proclamar uma nulidade.
Meu voto indefere o pedido.
EXTRATO DA ATA
HC 70.081 — SP —Rel.: Min. Francisco Rezek. Pacta e Impte.: Rui Nogueira
Bernardo. Coator: Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo.
Decisão: Por unanimidade, a Turma indeferiu o «habeas corpus». Ausente, oca-
sionalmente, o Ministro Presidente. Presidiu o julgamento o Ministro Paulo Brossard.
Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Paulo Brossard, Carlos Valioso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. SubprocuradorGeral da República, o Dn Mardem Costa
Pinto.
Brasília, 8 de junho de 1993 — José
Wilson Aragão, Secretário.
HABEAS CORPUS N° 70.097 — MS
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Moreira Alva
Paciente: Suely Pletz Neder — Coator: Tribunal de Justiça do Estado de Mato
Grosso do Sul
41obeas corpus». Incidente de inconstitucionalidade levantado, no julgamento de apelação, em Turma do Tribunal de Justiça, e
por ela julgado.
Inobservância do disposto no artigo 97 da Constituição Fe-
deral. Precedente do STF.
«tiabeas corpos» deferido, para anular o acórdão ora impugnado, a fim de que a Segunda Turma Criminal do Tribunal de Justiça
do Estado do Mato Grosso do Sul, voltando a julgar a apelação, levante,
querendo, o incidente de inconstitucionalidade da mencionada Lei n°
7.891/139 perante o Plenário daquela Corte.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da atado julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos,
deferir o pedido de «habeas corpus», nos
termos do voto do Relator.
Brasília, 16 de março de 1993 — Moreira Alves, Presidente e Relator
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): Assim expõe e aprecia o presente habeas carpas o parecer da Procuradoria-Ge-
ral da República, de autoria do Dr. Edson
Oliveira de Almeida:
«A Colenda Segunda Turma Criminal do Tribunal de Justiça do Estado
do Mato Grosso do Sul não conheceu,
por internpestividade, de apelação criminal firmada pela Assistência Judiciária, uma vez que não reconhecido, ao
argumento de inconstitucionalidade, o
beneficio do prazo em dobro previsto no
artigo 5°, § 5°, da Lei n° 1.060/50 (redação da Lei n° 7.871/89).
A impetrante alega que a Turma
Criminal não tem competência para declarar a inconstitucionalidade de lei,
R.T.J —150
conforme estatuído no artigo 97 da
Constituição Federal.
3. A Constituição Federal (artigo 97)
reserva o julgamento da constitucionalidade das leis para o Tribunal Pleno (ou
órgão especial, onde houver, art. 93,
XI), uma vez que exigido, para a declaração da inconstitucionalidade, o voto
da maioria absoluta dos membros do
Tribunal ou do respectivo órgão especial.
4.0 incidente deve ser suscitado no
órgão fracionário e, uma vez acolhido,
cabe sobrestar o julgamento até a decisão plenária (CPC, artigos 480 a 482).
5 . A questão é semelhante àquela
decidida pelo Supremo Tribunal Federal no FICif 69.730-5-MS, relatado pelo
Ministro Mordra Alves, In verbis:
Habeas corpo. Incidente de inconstitucionalidade levantado, no julgamento de embargos infringentes,
na Seção Criminal do Tribunal de
Justiça, e por ela julgado.
— Inobservância do disposto no
artigo 97 da Constituição Federal.
— Habeas corpus deferido, para
anular o acórdão ora impugnado, a
fim de que a Seção Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Mato
Grosso do Sul, voltando a julgar os
embargos infringentes a ela mterpostos, levante, querendo, o incidente de
inconstitucionalidade da mencionada Lei n° 7.891/89 perante o Plenário
daquela Corte.»
(DJ de 18-12-92, pág. 24378)
6. Pelo exposto, nos termos do precedente citado, opino pelo deferimento do
writ para que seja anulado o acórdão da
apelação, com o fim de ser renovado o
julgamento, observado o artigo 97 da
Constituição Federal em caso de acolhi-
mento da preliminar de inconstitucionalidade.» (fls. 43/45)
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator):
Esta Segunda Turma, ao julgar, recentemente, o RE 69.730, que tratava de hipótese análoga à presente, anulou o acórdão
de Seção Criminal que, sem submeter o
incidente de inconstitucionalidade de lei ao
Plenário do Tribunal local, afastou a aplicação da lei em causa por julgá-la inconstitucional. Essa anulação se fundou na inobservância do disposto no artigo 97 da Cons.
tituição Federal.
Em face do exposto, e com base
nesse precedente, defiro o presente habena corpus, para anular o acórdão ora
impugnado, a fim de que a Segunda Turma Criminal do Tribunal de Justiça do
Estado de Mato Grosso do Sul, voltando
a julgar a apelação, levante, querendo, o
incidente de inconstitucionalidade da
mencionada Lei n° 7.891/89 perante o
Plenário daquela Corte.
EXTRATO DA ATA
HC 70.097— MS —Rel.: Min. Moreira
Alves. Pacte.: Milton Marques Sampaio.
Impte.: Suely Pletz Neder. Coator: Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do
Sul.
Decisão: A Turma deferiu o pedido de
«habeas corpus», nos termos do voto do
Relator. Unânime.
Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Octavio Gallotti, Septilveda Pertence, Celso de Mello e finar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza.
Brasília, 16 de março de 1993 —Ricardo Dias Duarte, Secretário.
208
R.T.J. —150
HABEAS CORPUS N° 70.172 — SP
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves
Paciente: Luiz Carlos de Sant' Anna — Impetrante: Alecseo Kravec e outro
— Coator: Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo
allabeas carpas». Nulidades processuais inexistentes.
—Esta Corte, ao julgar a Representação de Incoastitudonalidade n° 1.280 (RTJ 116/889), declarou a constitudonalidade —por não
confinarem com os artigos 8°, XVII, abo e 153, 15, da Emenda
Constitucional n° 1/69 — das normas do Provimento CXCV84 do Conselho Superior da Magistratura do Estado de São Paulo, com base nas
quais foi feito o interrogatório do ora paciente por meicide precatória.
A Constituição atual nada inovou a respeito, motivo por que não há que
se pretender não tenham sido recebidas essas normas.
— A utilização da estenotipia na audiência de interrogatório
não configura nulidade, máxime se nenhum prejuízo trouxe ao paciente,
que negou seu envolvimento nos fatos.
—Não há que se declarar a nulidade da oiliva de testemunhas
sem a presença do paciente, porquanto, embora dispensada ela por
defensor dativo, não foi ela alegada, no momento oportuno, por advogado já então constituído, certo como é que, em se tratando de nulidade
relativa, há a necessidade de sua oportuna alegação bem como a demonstração objetiva de prejuízo.
—Se o advogado constituído, apesar de devidamente intimado, não compareceu à audiência de oitiva da vítima e de testemunhas, foi
regu
lar a nomeação de defensor ad hoc (art. 265, parágrafo único, do
CPP).
Habeas carpas indeferido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos,
em indeferir o pedido de «habeas corpus».
Brasília, 23 de março de 1993 — Moreira Alves, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Moreira Alves: São estas as informações prestadas pelo Exmo. Sr.
Presidente do Tribunal de Alçada Criminal
do Estado de São Paulo (fls. 156/157):
«Tenho a honrar de acusar o recebimento do Ofício n° 321/SST, através do
qual são solicitadas informações para a
instrução do Habeas Corpos n° 1.6062/SP (Rg. n° 92.0030187-8), em que é
paciente Luiz Carlos Sant'Ana, que usa
outros nomes (fl. 174, doc. n° 1), e impetrantes os bacharéis Alecseo Kravec
e Lígia de Oliveira Melo.
Alegam estes últimos, em síntese,
estar o paciente sofrendo constrangimento ilegal, eis que condenado em processo manifestamente nulo (Ação Penal n°
953/88, da Terceira Vara Criminal da
Comarca de São José dos Campos). Ar-
R.TJ — 150
gilem, para tanto, cerceamento de defesa, em virtude das seguintes eivas: a) ter
sido o paciente interrogado em juízo
diverso do processante, apesar de se encontrar preso na mesma unidade da Federação; b) utilização de estenotipia na
audiência de interrogatório; e, c) ausência do paciente à audiência de instrução
realizada no juízo do processo.
Cabe-me, a propósito, e em atenção
ao ofício de Vossa Excelência, transmitir os esclarecimentos que seguem.
Por fatos ocorridos em 29 de fevereiro de 1988, foi o paciente denunciado, perante o Juízo da Terceira Vara
Criminal da Comarca de São José dos
Campos, como incurso no artigo 157,
parágrafo 2°, I, do Código Penal (fl. 2,
doc n° 2).
Recebida a denúncia (fl. 40v., doe.
n° 3), citado e interrogado o réu no juízo
deprecado (fls. 45/v. e 47/51, doe. n°
4), o defensor constituído pelo paciente,
Bel. João Carlos Rosa, apresentou a defesa prévia (fl. 52, doe. n° 5), sendo,
então, remetida a carta precatória ao
juízo de origem (fl. 53, doc. n° 6).
Após a expedição dos oficios requisitórios do réu e a intimação do seu
defensor constituído (fls. 73, 75/77 e
83/84v., doc. n° 7), foi realizada, no juízo
processante, a audiência de oitiva da
vítima e das testemunhas de acusação,
sendo nomeado defensor ad hoc ao acusado, que se encontrava ausente (fls.
85/91, doe. n° 8).
Ouvidas as testemunhas de defesa
através de carta precatória (fls. 98/99v.,
101/102 e 104/108, doc. n° 9) e apresentadas as alegações finais (fls. 137/138 e
146/148, doc. n°10), sobreveio sentença
condenatória, que apenou o paciente a 5
anos e 4 meses de reclusão e 10 diasmulta, por infringência ao artigo 157,
parágrafo 2°, I, do Código Penal (fls.
150/151, doc. n° 11).
209
Inconformada, apelou a defesa (fls.
163/166 e 171/172, doe. n° 12), tendo a
Eg. Segunda Câmara do Tribunal, à unanimidade, negado provimento ao recurso (fls. 178/181 e 187/191, doc. n° 13).
O ven. acórdão restou hozcouldo (fl.
192, doc. 14).
As fls. 227/231, assim se manifesta a
Procuradoria-Geral daRepública, em parecer do Dr. %adem Costa Pinto:
«Cuida-se de habeas corpus impetrado pelo advogado Alecseo Kravec e
outro, em beneficio de Luiz Carlos de
Sant'Anna, alegando e requerendo o seguinte:
o paciente foi condenado pelo Juiz
da 3° Vara Criminal da comarca de São
José dos Campos-SP, em cinco anos e
quatro meses de reclusão e dez diasmulta, como incurso nas penas do artigo
157, parágrafo 2°, inciso I, do Código
Penal (fls. 197/198), decisão integralmente confirmada pelo egrégio Tribunal de Alçada Criminal do Estado de
São Paulo, que negou provimento ao
recurso da defesa (fls. 209/213);
esperam a concessão da ordem
para anular o processo, a partir do interrogatório ou da audiência de instrução,
seja porque o interrogatório foi irregularmente realizado pelo processo de
estenotipia e através de precatória, estando o paciente preso no mesmo Estado
da Federação (São Caetano do Sul), seja
porque o paciente não foi requisitado
para a audiência de inquirição da vítima
e das testemunhas, tendo o defensor ad
hoc dispensado, também irregularmente, a presença do mesmo na referida
audiência, sendo certo que o advogado
constituído pelo paciente não esteve
presente à audiência em destaque, tendo
havido assim evidente cerceamento de
defesa.
2. O presente babe= corpus deve
ser conhecido mas, no mérito, denegada
a ordem.
210
R.T.J. — 150
É o que o interrogatório do paciente, através de precatória, foi realizado
com base no Provimento OCCl/84 do
egrégio Conselho Superior da Magistratura do Estado de São Paulo (fl. 51), o
que não configura nulidade vez que o
Supremo Tribunal Federal já decidiu,
em face da Carta Política de 1969, mas
que se aplica a atual Carta Magna, que
tal provimento é constitucional, bastando conferir a ementa abaixo transcrita,
verbis:
«Representação de inconstitucionalidade. Provimento do Conselho
Superior da Magistratura do Estado
de São Paulo. OCCU84. Constitucionalidade.
Não conflitam com os preceitos
constitucionais (art. 8°, XVII, b e art.
153, parágrafo 15), as normas do
Provimento n° CXCl/84, do Conselho Superior da Magistratura do Estado de São Paulo, que dispõem
sobre o interrogatório nos processos
criminais, na comarca em que o réu
preso ou solto estiver, mediante precatória.» RTJ 116/889.
Vale destarar parte do pronunciamento do Ministério Público Federal, da
lavra do hoje eminente Ministro Assis
Toledo, quando demonstra a possibilidade legal do interrogatório por precatória, verbis:
«Daí a necessidade, ante a lacuna
da lei processual brasileira, de se construir o seguinte raciocínio, perfeitamente cabível na área processual: permitindo o Código a precatória para a
inquirição de testemunhas (art. 222)
— o que é 'o mais', visto que nessa
prova pode basear-se e freqüentemente baseia-se a condenação — não se
deve inferir, na ausência de dispositivo expresso, que o mesmo Código
não permitiria 'o menos', ou seja, o
interrogatório por precatória, ato no
qual o acusado pode silenciar-se ou
não dizer a verdade. Note-se que a
própria confissão não constitui prova
definitiva (art. 197), além de ser retratável (art. 200).
Assim, nada obsta que, por aplicação analógica, expressamente admissivel em processo (art. 2° do CPP,
RTJ 73/909), se estenda a regulamentação legal do artigo 222, prevista para a inquirição de testemunhas,
a uma situação semelhante (a inquirição do acusado), sempre que um
ponto puder identificar ambas as hipóteses: pessoas residentes em Comarca distante, que não aquela em
que se situa a sede no Juízo; dificuldades materiais, ou de outra natureza, acarretando a necessidade de assim se proceder.
Não se estará, com esse recurso à
analogia, afrontando o artigo 188 e
incisos do Código, corno se alegou,
porque outro Juiz — o deprecado
com as mesmas garantias, irá cumpri-lo, interrogando o acusado sobre
os itens da denúncia e os elementos
a que ela se reporta. Se no caso concreto, ocorrer algum prejuízo por ausência de indagação, como se afirma,
sobre determinada prova, sobre a arma
do crime ou sobre algum fato ou pormenor (itera 2, fl. 4), caberá a defesa
argüir oportunamente a nulidade e
demonstrar o prejuízo, a fim de que
Juiz do processo, entendendo razoável a alegação, sane a falha reinquirindo o réu, nos expressos termos
do parágrafo único do artigo 502 do
CPP.» RTJ 116/895/896.
Já a utilização da estenotipia na
audiência de interrogatório não configura nulidade, sendo certo que do referido
ato não resultou qualquer prejuízo à defesa, já que o paciente negou estar envolvido nos fatos.
Quanto à audiência de oitiva da
vítima e testemunhas, que teria sido rea-
R.TJ —150
211
liada sem a presença do paciente, tendo
Aplicação do artigo 265, paráo defensor ad hoc dispensado a presengrafo único do Código Penal.
ça do mesmo, trata-se de hipótese de
Habena corpus indeferido
nulidade relativa, cuja declaração
(RHC 60.427-DF, Rel. Mia Alfredo
não prescinde de oportuna alegação e
Buzaid, DJ de 18-3-93, pág. 2975.»
demonstração de prejuízo, sendo certo
9. Pelo exposto, somos pelo conhecique nada foi alegado na fase das alegamento
e denegação da ordem.
ções finais, apresentadas por advogado
contratado (fls. 106/107), além de
É O parecer.»
não ter sido demonstrada, objetivamenÉ o relatório.
te, a ocorrência de efetivo prejuízo.
VOTO
A jurisprudência do Supremo TriO Sr. Ministro Moreira Alves (Relabunal Federal é no sentido de que a
declaração de nulidade, nesses casos, tor): 1. Correto o parecer da Procuradoriadepende do preenchimento simultâneo Geral da República.
dos requisitos da oportuna alegação e da
Com efeito, esta Corte, ao julgar a Reprova de prejuízo, como se vê da ementa presentação de Inconstitucionalidade
a seguir transcrita:
1.280 (RTJ 116/889), declarou a constitu«Ementa: Ausência de réu preso cionalidade —por não conflitarem com os
à audiência de testemunhas e da víti- artigos 8°, XVII, b, e 1$3, parágrafo 15, da
Emenda Constitucional a° 1/69 — das norma.
mas do Provimento CXCl/84 do Conselho
Nulidade relativa, cuja pronúncia Superior da Magistratura do Estado de São
dependeria de oportuna argüição e de Paulo, com base nas quais foi feito o interdemonstração de prejuízo, o que, no rogatório do ora paciente por meio de precatória. A Constituição atual nada inovou
caso, não comeu.
a respeito, motivo por que não há de se
Pedido indeferido.» —HC 69.309- pretender não tenham sido recebidas essas
1/SP — Rel. Mim Octavio Gallotti Mina
— DJ de 7-8-92 — pág. 11780.
Por outro lado, a arilinçâo da estenotiQuanto à nomeação de defensor pia na audiência de interrogatório não conad hoc, para a audiência de oitiva da figura nulidade, máxime se nenhum prejuívítima e testemunhas (fls. 78/79), foi zo trouxe ao paciente, que negou seu envolela regular, não sendo portanto motivo vimento nos fatos.
para declaração de nulidade já que o
Também não há que se declarar a nuliadvogado constituído não compare- dade da oitiva de testemunhas sem a preceu, apesar de regularmente intimado sença do paciente, porquanto, embora dis(fls. 76/78), pois o artigo 265, parágra- pensada ela por defensor dativo, não foi ela
fo único, do Código de Processo Penal alegada, no momento oportuno, por advoassim autoriza, o que também está de gado já então constituído, certo como é que,
acordo com decisão do Supremo Tribu- em se tratando de nulidade relativa, há a
nal Federal como se vê da ementa abai- necessidade de sua oportuna alegação bem
xo:
como a demonstração objetiva de prejuízo.
«Ementa: 1. Habeas corpos. IneFmalmente, se o advogado constituído,
xistência de cerceamento de defesa apesar de devidamente intimado, não compela ausência de defensor constituído pareceu à oitiva da vítima e de testemuhas,
na inquirição testemunhal.
foi regular a nomeação de defensor ad hoc
R.T.J. —150
212
(ar t. 265, parágrafo único, do Código de
Processo Penal).
2. Em face do exposto, indefiro o presente habeas coreus.
EXTRATO DA ATA
HC 70.172— SP — Rel.: Min. Moreira
Alves. Pacte.: Luiz Carlos de Sant'Anna.
Imptes.: Alecseo ICravec e outro. Coator:
Tribunal de Alçada Criminal do Estado de
São Paulo.
Decisão: A Turma indeferiu o pedido de
shabeas anus», nos termos do voto do
Relator. Unânime.
Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Octavio Gallotti, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e Bmar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza.
Brasília, 23 de março de 1993 — Ricar-
do Dias Duarte, Secretário.
HAl3EAS CORPOS N° 70.174 — SP
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Carlos Velloso
Paciente e Impetrante: JosuéFemandes Lisboa—Coator: Tribunal de Alçada
Criminal do Estado de São Paulo
Processual Penal. PenaL Continuidade deliam. Elemento
tentporaL CM. Penal, art. 71.
I — Não ocorre a continuidade delitiva se o intervalo entre
um crime e outro é superior a trinta dias.
II — Precedentes do STF: HC 69.896-SP, HC 62.451, HC
69.305.
III — HC indeferido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na COn
-fonidaetjulgmnodast
taquigráficas, por decisão unânime, indeferir o «habeas corpus».
Brasília, 8 de junho de 1993 — Paulo
Brossard, Presidente — Carlos Venoso,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Carlos Venoso: Tratase de habeas corpos impetrado por Josué
Fernandes Lisboa, em seu próprio favor,
com a alegação de estar sendo vítima de
constrangimento ilegal, por terem sido ex-
cluídas três de suas penas das séries de
penas unificadas pelo Juízo da Vara de
Execuções Criminais da Comarca de São
Paulo, alusivas às Ações Penais rt's
1.651/78, 1.427/78 e 1.558/78, oriundas,
respectivamente, das 30', 11° e 21° Varas
Criminais da Comarca de São Paulo. Tais
decisões foram mantidas pelo Egrégio Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São
Paulo.
Depois de longas considerações, requer
a concessão da ordem «... unificando-se as
seis (6) penas resultantes de delitos perpetrados entre os dias 11-2 a 17-8 de 1978,
DUM único grupo...»
O eminente Presidente do Tribunal de
Alçada Criminal do Estado de São Paulo
R.TJ —150
pastou informações às fls. 120/121, esclarecendo:
«Por petição de 5 de agosto de 1983,
o sentenciado pleiteou, perante o Juizo
da Vara das Execuções Criminais da
Comarca de São Paulo, a unificação das
penas impostas nas Ações Penais na
1311/78, 294/79, 1354178, 1.651/78,
1.427/78, 872/76, 1.558/78 e 6179, das
Trigésima, Sétima, Segunda, Trigésima,
Décima Primeira, Sexta, Vigésima Primeira e Décima Segunda Varas Criminais da Comarca de São Paulo, respectivamente (fls. 2/58v. e 61/68v., doe. n°
2).
Após a manifestação do representante do Ministério Público (fls. 69v.,
doc. n° 3), o MM. Juiz de Primeira Instância deferiu o pedido para unificar as
penas em dois grupos, com exdusão das
sanções impostas nos Processos na
1.651/78, 1.427/78 e 1.558/78 (fls.
71/72, doc. n° 4)
Inconformada, recorreu a defesa (fls.
76/77, 7W86 e 88/89, doe. n° 5). Mantida a decisão atacada (fl. 90, doe. n° 6), a
E. Terceira Câmara desta Corte, por votação unânime, negou provimento ao
recurso (fls. 98/101, doc. n° 7), restando
irrecorrido o ven. acórdão (fl. 102, doe.
n° 8).
Outrossim, informo a Vossa Excelência que, nos assentamentos desta Secretaria, constam, em favor do paciente,
os seguintes pedidos revisionais:
n° 136.406/6, do qual desistiu o
peticionário, em 22 de novembro de
1984 (fls. 2/4 e 14/15, doe n° 9);
—n° 156.6828, indeferido, pelo Eg.
Primeiro Grupo de Câmaras, sem discrepância de votos (fls. 2/5 e 25/28, doc.
n° 10); e,
n° 224.192/4, que a Eg. Turma
Julgadora, à unanimidade, não conheceu (fls. 2/11 e 24/26, doc. n° 11)».
213
O Ministério Público Federal, pelo parecer do ilustre Subprocurador-Geral Cláudio Lemos Fonteles, opina pelo indeferimento do writ. Mutua, após transcrever
trechos da decisão do Juízo da Vara das
Execuções Criminais da Comarca de São
Paulo e do acórdão da Terceira Câmara do
TACRIM/SP, que «as decisões de 1° e 2°
graus não merecem reforma, pois, devidamente fiadamentadas, encontram-se em consonância com recente jurisprudência da Supram Corte...» (HC 69.869, DJ de 2-4-93,
pág. 5620).
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Vdloso (Relator): A Procuradoria-Geral da República,
no parecer de fls. 2361240, lavrado pelo
ilustre Subprocurador-Geral Cláudio Lemos Fonteles, assim equacionou a controvérsia:
1(4
O ora paciente pleiteou perante o
Juízo das Execuções Criminais a unificação das penas que lhe foram impostas em
oito (8) processos.
Assim está em trecho da decisão que
deferiu parcialmente o pedido, verbis:
«Excluo, ao inicio da reclamada
unificação, as sanções impostas nos
Processos na 1.651/78, 1.427/78,
1.558/78, vez que os delitos ali tratados distam entre si e dos demais,
na linha temporal, lapso superior
a 30 dias, obstada aí a continuidade.
Defiro, no mais, em dois grupos,
que não podem compor série única,
ainda em respeito ao critério temporal.
Os delitos que os compõem estão distante também por prazo superior a
30 dias.
No primeiro grupo, incluo as penas dos Processos ngi 1.511/78,
294/79 e 1.554/78.
214
R.TJ. — 150
No segundo, as paras dos Processos 872/76 e 6/79.
A pena-base para o cálculo, no 1°
grupo, é de 6 anos, 2 meses e 20 dias
de reclusão, a mais grave (Proc.
1.554/78), acresço-lhe 1/5, pela
quantidade de delitos. Para cumprimento, ficam 7 anos, 5 meses e 18
dias de reclusão.
No segundo, a pena-base é de 5
anos e 5 meses de reclusão, impostas
em ambos os feitos. Acresço-lhe 1/6,
por ser dois os delitos. Para cumprimento, ficam 6 anos, 2 meses e 20
dias de reclusão, inalteradas as sanções pecuniárias.» (Vide fls. 189/190
— grifamos.)
Inconformado, recorreu o paciente, tendo sido, entretanto, mantida a decisão do eminente Juiz da Vara de Execuções Criminais.
Leia-se em trecho do acórdão
proferido pela E. Terceira Câmara do
TACrim/SP:
«A decisão está correta e ne-
nhum reparo merece.
É impossível, por primeiro, a unificação de todas as condenações em
uma única série, como pretende o
recorrente, já que cometeu crimes nos
anos de 1976 e 1978, separados por
longo intervalo de tempo, o que
justifica o agrupamento em séries
distintas.
Para os crimes praticados no ano
de 1978, foi corretamente reconhecida a continuidade delitiva abrangendo os delitos de fevereiro e março, que constituam o primeiro grupo.
Neste, como é óbvio, não podem
ser integrados os crimes cometidos
em junho, julho e agosto por ser
evidente a ausência do nexo temporaL
Resta, apenas, o exame dos delitos que não foram excluídos na unificação.
Reconheceu o douto Prolator da
respeitável sentença recorrida que entre eles imitiste o liame temporal,
porque cometidos em intervalo de
tempo maior que trinta dias, respectivamente em 9 de junho de 1978
e 17 de agosto de 1978.
(...)
Diferente, em cada delito, a maneira de execução, impossível se torna o reconhecimento da continuidade
delitiva entre eles, separados por intervalo de tempo superior a trinta
dias.
Não configurada a continuidade
delitiva, senão em parte, como reconhecida na decisão recorrida, de maior
beneficio não é merecedor o recorrente, ficando, em conseqüência, desprovido o recurso que interpôs.» (V.
fls. 205/207 — grifamos.)
7. Repetindo a argumentação que emborcara o recurso de apelação, o ora paciente formulou perante o TACrim/SP
vários pedidos revisionais.
& A primeira revisão criminal (v. fls.
218/220) restou indeferida e a segunda
não foi conhecida (v. fls. 232/233) pelo
Colegiado a quo por se tratar de mera
reiteração.
9. As decisões de P e 2° graus não
merecem reforma pois, devidamente
fundamentadas, encontram-se em consonância com recente jurisprudência da
Suprema Corte, verbis:
«Continuidade delitiva — Elemento temporal. Quanto ao fator
'tempo' previsto no artigo 71 do Código Penal, a jurisprudência sedimentada do Supremo Tribunal Federal é
no sentido de observar-se o limite de
trinta dias que, uma vez extrapolado,
afasta a possibilidade de se ter o se-
R.T.J — 150
gundo crime como continuação do
primeiro. ...». (Habeas corpos n°
69.896-4, DJ de 2-4-93, p. 5620)
10. Somos, portanto, pelo indeferimento do pedido.» (fls. 237/240)
Está correto o parecer.
É que os delitos que originaram as condenações cuja unificação é pedida, foram praticados em épocas diversas, assim separados
por longo intervalo de tempo. A jurisprudência do Supremo Tribmal Federal é, na verdade, «no sentido de observar-se o limite de
trinta dias que, uma vez extrapolado, afasta a
possibilidade de se too segundo crime como
continuação do primeiro». (HC n° 69.896SP, Relatar o Sr. fvfmistroMarco Aurélio, em
DJ de 2-4-93; HC 62.451, Relator o Sr. Ministro Aldir Passarinho, em DJ de 26-4-85;
HC 69.305, Relator o Sr. Ministro Seprilveda Pertence, em DJ de 5-6-92).
215
Do exposto, indefiro o Iara.
EXTRATO DA ATA
HC 70.174 — SP — Rel.: Mn. Carlos
Venoso. Pacta.: Josue Fernandes Lisboa.
Impte.: O mesmo. Coator: Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo.
Decisão: Por unanimidade, a Turma indeferiu o «cobras compus». Ausente, ocasionalmente, o Ministro Presidente. Presidiu o
julgamento o Ministro Paulo Brossard.
Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Paulo Brossani, Carlos Valioso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Mardem Costa
Pinto.
Brasília, 8 de junho de 1993 — José
Wilson Aragão, Secretário.
HABEAS CORPUS N" 70.197 — SP
(Segunda 'Turma)
Relator. O Sr. Ministro Carlos Valioso
Paciente e Impetrante: Pedro Yamauchi — Coator: Tribunal de Justiça do
Estado de São Paulo
Processual penaL Penal. Citação por editaL Mudança de endereço residenciaL
I — Informado o meirinho, no local referido como sendo o
da residência do réu, de que este mudara-se para local ignorado, não está
o servidor da Justiça obrigado a efetivar consultas a repartições públicas
ou particulares a respeito do paradeiro do citando, certo que tem este a
obrigação de estar atento aos atos processuais e, no caso de mudança de
residência, de comunicar à Justiça o seu novo endereço.
II — Citação por edital realizada regularmente, dado que
o réu não foi encontrado no endereço constante dos autos.
111 — HC indeferido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na confonnidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por decisão unânime, indeferir o «habeas corpos».
Brasília, 8 de jimbo de 1993 — Paulo
Brossard, Presidente — Carlos Valioso,
Relator.
216
R.T.J. — 150
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Tratase de habeas empas impetrado por Pedro
Yamauchl, em causa própria, em que alega
ter sido condenado pelo crime previsto nos
artigos 213 e 214 do Código Penal, c.c. os
artigos 69e 71 do mesmo Código, a 12 anos
10 meses de reclusão, e pleiteia a anulação do processo-crime a partir da citação,
por entenda ter havido vício na citação
editalícia.
Afirma que o Oficial de Justiça, de maneira apressada, com base unicamente nas
informações de sua esposa, com quem está
em litígio, certificou que o paciente estava
em lugar incerto e não sabido, fazendo com
que fosse decretada sua revelia, com sério
prejuízo para sua defesa. Entende que o
meirinho deveria ter consultado outros órgãos, além da Vara processante, como Cartório Eleitoral, Instituto de Identificação e
outros.
O eminente Presidente em exercício do
Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de
São Paulo prestou informações às fls. 46/47,
esclarecendo que o paciente, além de ter
sido condenado à pena de 12 anos e 10
meses de reclusão, por incurso nas penas
dos arts. 213 e 214 do Código Penal, c.c. os
arts. 69 e 71 do mesmo Código teve decretada sua «... incapacidade para o exercício
do pátrio poder em relação às suas filhas
Cristina Célia Yamaucbi e Alessandra Yamauchi, em virtude de tal direito-dever ser
incompatível com os atos por ele praticados...», com fundamento no art. 92, II, do
Código Penal. O paciente impetrou habeas
corpos, alegando nulidade da citação editalícia. A Segunda Câmara Criminal denegou a ordem, sobre o fundamento de que o
paciente foi procurado no endereço constante de sua qualificação no inquérito policial, sem nenhum sucesso, e de que «a
pretensão dos impetrantes no sentido de
que efetuasse o meirinho diligências na
tentativa de obter notícias do paradeiro do
citando, sobre não corresponder a qualquer
exigência legal, não é sequer sensata, uma
vez que não tinha o Oficial de Justiça razão
para supor estivesse a intencionalmente enganá-lo a esposa do acusado». Contra esse
acórdão interpôs recurso ordinário, cujo
processamento foi indeferido, por ser intempestivo. Também o pedido de revisão
criminal que ajuizou, insistindo na irregularidade da citação, foi indeferido.
Em 4-12-92, ingressou com novo pedido revrs'ional, alegando insuficiência de prova para incriminá-lo. A Procuradoria de
Justiça opinou pelo deferimento parcial do
pedido, «para que se proceda à mitigação
da reprimenda», por entender que, sen4o o
réu primário, «não se justificava que a base
da mesma fosse situada tão acima do mínimo legal». Relativamente à dosagem da
pena, transcrevem as informações parte da
respeitável sentença:
«O réu merece forte reprimenda penal, pois agiu com intenso grau de dolo,
utilizando-se da condição de pai para a
prática dos hediondos crimes praticados
contra suas próprias filhas, ainda menores, que ficarão, com certeza, para sempre marcadas pelo estigma de terem sido
objeto da luxúria do próprio pai.
Não merece o beneplácito da Justiça
Penal modo que, em razão do crime de
estupro, fixo-lhe a pena base em 6 (seis)
anos de reclusão, a qual aumento em 1/6
(um sexto), em razão da continuidade
(artigo 71, capar), de sorte que torno
definitiva, por tal crime, a pena de 7
(sete) anos de reclusão.
Em razão do crime de atentado violento ao pudor, fixo-lhe a pena de 5
(cinco) anos de reclusão, a qual, aumento em 1/6 (um sexto), em conseqüência
do nexo de continuidade, de maneira
que, tomo definitiva, por tal crime, a
pena de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses
de reclusão...»
Registram as informações que a declaração de nulidade do ato citatório pretendida pelo paciente deveria ser postulada na
R.T.J —150
forma do art. 571 do CPP, sendo certo que
«o réu, ora paciente, teve nomeado Defensor dativo que praticou todos os atos inerentes à ampla defesa de seus direitos no
curso da instrução criminal, não apontando
em momento algum irregularidade ou nulidade de qualquer dos atos praticados». Sobre a validade da citação editalícia, invocam as informações a Súmula 366-STF e
concluem que o que realmente pretende o
paciente é «o =exame dos julgados com
supedâneo nas provas existentes nos autos», o que não é admitido pela jurisprudência da Suprema Corte em sede de habeas
corpus.
Oficiando às fls. 106/116, o Ministério
Público Federal, pelo parecer do ilustre
Subprocurador-Geral Edson Oliveira Almeida, opina pelo indeferimento da ordem,
por entender que para a citação editalícia,
«não são exigíveis consultas de outro tipo,
como ao TRE e sindicatos de classe, visando obter o endereço de réu não encontrado
em sua residência, cujo paradeiro seja desconhecido». Transcreve o parecer trecho
do acórdão proferido pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo no
habeas corpus impetrado em favor do ora
paciente e escólios doutrinários no sentido
de que «não há qualquer exigência na lei
que obrigue o meirinho a outras diligências, conto a coasulta a repartições públicas
ou particulares (Tribunal Regional Eleitoral, Ministério do Trabalho, etc.)» (Processo Penal, Mio Fabrini Mirabete, ?ed. São
Paulo, Atlas, 1992, p. 416).
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Valioso (Relator): O acórdão da 2° Câmara Criminal do
Tribunal de Justiça de São Paulo, às fls.
72f75, refutou, com bons argumentos, a
alegação de irregularidade na citação editalícia:
217
A determinação de citação editalícia
foi escorreita, sem dúvida.
Qualificado no curso do inquérito policial, o único local referido como sendo
o da nesidência do paciente foi a Rua Dr.
Mello Alves n° 39, em Cerqueira César
(fls. 14 e 15), onde, sem nenhum sucesso, foi procurado pelo Sr. Oficial de
Justiça (fl. 18).
A pretensão dos impetrantes no sentido de que efetuasse omeirinho diligências na tentativa de obter notícias do
paradeiro do citando, sobre não corresponder a qualquer exigência legal, não
tinha o Oficial de Justiça razão para
supor estivesse a intencionalmente enganá-lo a esposa do acusado.
Para a tentativa de citação pessoal,
antes da editalícia, o que se exige, tãosó, é o exaurimento de providências razoáveis, possíveis e que se revistam de
alguma perspectiva de sucesso, como tal
entendida a procura do citando em todos
os endereços referidos nos autos, sejam
de sua residência, sejam do local de
trabalho, bem por isso, para que se mostre adequada a citação editalicia, não
reclama a lei exerça o Oficial de Justiça
autêntica atividade investigatória, de
pesquisa e de descobrimento, na esperança de deslindar o mistério do desaparecimento do citando.
Fosse essa a missão do Oficial de
Justiça, fosse esse o encargo que lhe
cabe antes de se fazer possível e justa a
citação por edital, estaria a ação penal
destinada a infindável procrastinação e
indesejável retardamento, pois sempre
haveriam de surgir outras e novas providências (às vezes astutamente arquitetadas com objetivos claramente
escusos) a adiar a legitimidade da citação ficta daquele que está em local evidentemrate ignorado.
Por essas razões que, suficientemente procurado o paciente no único local
mencionado como sendo da sua residên-
218
R.T.J. — 150
cia, e ali informado o meirinho de que
ele se mudara para local desconhecido,
fez-se adequada a citação por meio de
éditos.
Mesmo porque, acrescente-se, não
fizeram os impetrantes, até aqui, prova
alguma da inverdade da informação fornecida ao Oficial de Justiça, indicando,
por exemplo, que tinha ele residência
naquele endereço ou em outro possível
de conhecimento.
E já que não se mostram adequadas
ao âmbito estrito do habeas corpos indagações a respeito do intencional propósito da esposa do citando de dizê-lo
em local ignorado, pretendendo, com a
mentira, dificultar-lhe o exercício do direito de defesa, por esse primeiro aspecto não procede a impetração, certamente».
O certo é que o meirinho procurou pelo
réu, ora paciente, a fim de citá-lo no único
local referido corno sendo o da sua residência, não obtendo sucesso, dado que, ali,
foi informado de que o réu, ora paciente,
mudara-se para local ignorado. Diante disso,
nada mais restava a fazer, mesmo porque o
réu, ora paciente, não se encontrava preso.
Com propriedade, escreve o ilustre Subprocurador-Geral Edson de Oliveira Almeida, no parecer de fls. 106(116:
<4.4
5. Finalmente, diz o impetrante que,
embora expedidos os ofícios de praxe,
para tentar localizar o citando em algum
presídio ou delegacia policial, 'não foram consultados outros órgãos oficiais,
como Cartório Eleitoral, Instituto de
Identificação.'
Essas diligências adicionais não são
exigidas, merecendo ser lembrada lição
de Ada Pellegrini Grinover et ala:
«... segundo opinião corrente na
jurisprudência, não são exigíveis con-
sultas de outro tipo, como ao TRE e
sindicatos de classe, visando a obter
o endereço de réu não encontrado em
sua residência, cujo paradeiro seja
desconhecido». (As Nulidades no
Processo Penal. São Paulo, Malheiros Editores, 1992, p. 88)
No mesmo sentido °posicionamento
de Júlio Fabrini Mirabete:
«Não há qualquer exigência na lei
que obrigue o meirinho a outras diligências, como a consulta a repartições públicas ou particulares (Tribunal Regional Eleitoral, Ministério
do Trabalho, etc.)...» (Processo Penal, 2• ed., São Paulo, Atlas, 1992, p.
416).
Perfeito o entendimento. Esclareça-se
que corre ao réu, que está sendo processado
criminalmente, a obrigação de estar atento
aos atos processuais e, no caso de mudança
de residência, comunicar à Justiça o seu
novo endereço.
Do exposto, indefiro o writ.
EXTRATO DA ATA
HC 70.197 — SP —Rel.: Carlos Venoso. Pacte.: Pedro Yamaucbi. linpte.: O mesmo. Coator: Tribunal de Justiça do Estado
de São Paulo.
Decisão: Por unanimidade, a Tunna indeferiu o «habeas carpis». Ausente, ocasionalmente, o Ministro Presidente. Presidiu o julgamento o Ministro Paulo Erossard.
Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Paulo Brossard, Carlos Venoso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Mardem Costa
Pinto.
Brasília, 8 de junho de 1993 — José
Wilson Aragão, Secretário.
R.T.J —150
219
!JARRAS CORPUS N° 70.239 — SP
(Primeira Turma)
Relator p/o acórdão: O Sr. Ministro limar Gaivão
Paciente: José Amaury Pereira — Coator: Tribunal de Alçada Criminal do
Estado de São Paulo
Habeas corpus. Alegado nulidade da citação editacia, por
encontrar-se o paciente, na oportunidade, em regime de cumprimento de
prisão albergue domiciliar. Peado tambim fiaidado entnegativa de autoria.
Alegações insuscetíveis de serem consideradas. No primeiro
caso, não apenas ante a inexistência, nos autos, de prova de que o
paciente se achava preso ao tempo em que se tentou a sua citação
pessoal, mas também por não se encontrar a prisão albergue abrangida
pela regra da Súmula n° 351; e, no segundo pelo evidente descabimento,
no habeas corpos, de reexame de prova com vistas à alteração, quanto
ao mérito, da sentença condenatória. Pedido indeferido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, na
conformidade da ata do julgamento e das
notas taquigráficas, em indeferir o pedido
de «habeas corpus», vencido o Sr. Ministro
Sepúlveda Pertence, Relator, que o deferia.
Brasília, 29 de junho de 1993 — Moreira Alves, Presidente— Rmar Gaivão, Relator p/o acórdão.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: 1.
José Amaury Pereira, impetra, habeas corpus alegando nulidade da citação editalícia
e, portanto, da subseqüente condenação à
revelia, por ter sido considerado em local
incerto e não sabido, ao mesmo tempo em
que cumpria prisão-albergue domiciliar
por outro delito, na comarca.
2.0 paciente foi absolvido em primeira
instância e condenado — provido apelo do
Ministério Público — pelo Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo a 6 anos e 13
dias de reclusão por roubo qualificado.
3. As informações —quanto ao decreto
de revelia — são as seguintes (fls. 54/55):
«Recebida a denúncia (fl. 29, doc. n°
4), tentou-se a citação pessoal do paciente, sem sucesso (fl. 69/v, doc. n° 5).
Determinado o chamamento por edital e
expedidos os ofícios de praxe (fls.
71/72, 76 e 80/v, doc. n° 6), veio aos
autos a informação de que o acusado se
encontrava em regime de prisão-albergue domiciliar desde 6 de maio de 1983
(fl. 78/v, doc. n° 7). Diligenciou-se novarnente no sentido de citar pessoalmente o réu, ocasião em que se comunicou
ter sido o paciente beneficiado com a
prisão-albergue domiciliar desde 11 de
maio de 1983 (fls. 82/92v, 95/96, 98/v,
100/104v e 1071v, doc. n° 8). A seguir,
o Juízo a quo decretou a revelia do réu,
nomeando-lhe defensor dativo (fls.
108/109, doc. n° 9).»
4. Acrescenta o ilustre Juiz Lustosa Goulart, Presidente do TACrim-SP:
«Após novas e frustadas tentativas
de localização do paciente (fls. 176/v,
184/v, e 188/189, doc. n° 12), manifestaram-se as partes (fls. 1901191, doc. n°
13), sobrevindo, então, sentençaabsolutória, com fundamento no art. 386, VI,
do Código de Processo Penal (fls.
194/197, doc. n° 14).
220
R.T.J. —150
Inconformado, recorreu o representante do Ministério Público (fls. 200,
202/206 e 210/212, doe. n° 15), tendo a
E Sexta Câmara desta Corte, por votação unânime, dado provimento à apelação para condenar o recorrido à pena de
6 anos de reclusão e 13 dias-multa, por
roubo agravado e determinar a expedição de mandado de prisão (fls. 224/229,
doc. n° 16). 0 v. acórdão restou irrecorrido (fl. 230, doc. n° 17) e o mandado de
prisão foi cumprido em 19 de abril de
1989 (fls. 236/237v, doe. n° 18).
Por derradeiro, esclareço que o paciente formulou, neste Tribunal, o Pedido Revisional n° 196.200/1, que o E
Segundo Grupo de Câmaras, sem discrepância de votos, indeferiu (fls. 2/6 e
18/22, doc. n° 19). (...)»
5. 0 ilustre Subprocurador-Geral Mardem Pinto opina pelo indeferimento da ordem, aduzindo (fl. 156):
«(...) não há qualquer irregularidade
na citação editalícia e no decreto de revelia.
Com efeito, o impetrante e paciente
foi procurado no endereço que indicou
no interrogatório policial, ou seja, na
Rua 6, n° 35, Jaraguá (fl. 68), endereço
constante também dos documentos de
fls. 61, 62 e 72, e também no endereço
do seu trabalho, não sendo encontrado,
frustrando-se as tentativas de citação
pessoal, como pode ser conferido às fls.
75, 92 e 92/verso.
Nada importa o fato de o paciente
ter sido beneficiado, em outro processo,
com a prisão-albergue domiciliar, seja
porque o mesmo não comprovou que
esteja em gozo do citado beneficio na
época em que foi tentada a citação pessoal, o que ocorreu em março a julho de
1985 (fls. 75 e 92), sendo certo que os
documentos de fls. 82, 94/verso, 97,
100/verso e 104 apenas indicam que o
impetrante e paciente foi beneficiado
com o citado regime a partir de maio de
1983, nada indicando sobre o término
do mesmo, seja porque os documentos
acima referidos deixam claro que, por
uma falha Inexplicável do sistema,
ninguém se preocupou em anotar o
endereço do impetrante e paciente,
seja fmahnente porque a hipótese (prisão-albergue domiciliar sem endereço do condenado) evidentemente não
se enquadra no enunciado da Súmula
n° 351 do STF.
Já a alegação de que não seria o autor
do crime, bem como a de que a condenação estaria fundada exclusivamente
em provas do inquérito e em reconhecimento fotográfico, não podem ser apreciadas em habeas corpos, que por seu
objetivo e rito processual, em regra, não
comporta reexame da prova visando à
alteração, quanto ao mérito, da sentença
condenatória.
Pelo exposto, somos pelo conhecimento e denegação da ordem.» (grifado)
o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: A
citação por edital, por sua notória inutilidade, na quase totalidade das vezes, é modalidade de chamamento do réu ao processo
que só se legitima, quando exauridos os
meios de que disponha o juízo para a localização do denunciado e sua citação pessoal.
Ora, no caso, o paciente comprovou
que, depois de vindo aos autos a informação de achar-se cumprindo pena, sob regime de prisão-albergue domiciliar — que
importava na obrigação de comparecimento periódico ao Juízo das Execuções Criminais —, efetivamente ali compareceu diversas vezes, duas delas — 13-11-85 e
14-2-86 (fl. 44) — antes que, em 24-4-86,
lhe fosse decretada a revelia.
Patente , assim, que se descurou o Juiz
do processo de diligência que teria propiciado a citação pessoal, estou cru que não
R.TJ —150
se pode negar a nulidade da citação por
edital, que contaminou irremediavelmente
o processo.
4. Defiro a ordem para declarar-lhe a
nulidade, desde o decreto de revelia, com a
soltura do paciente, se por al não estiver
preso: é o meu voto.
VOTO
O Sr. Ministro limar Gaivão: Sr. Presidente, vou pedir vênia ao Ministro Relator para denegar a ordem, perfilhando, para
tanto, os fundamentos do parecer da douta
Procuradoria.
VOTO
O Sr. Ministro Moreira Alves (Presidente): Também acompanho o eminente
Ministro Ilmar Gaivão, tendo em vista a
circunstância de que, procurado no domicílio indicado, onde, aliás, devia estar cumprindo a prisão-albergue domiciliar, não foi
encontrado o paciente. Tentou-se, inclusive, a sua localização no local tido como o
221
de trabalho e, com isso, exauriram-se as
possibilidades para encontrá-lo.
Assim, também indefiro o babeas corPua.
EXTRATO DA ATA
HC 70.239 — SP — Rel.: Min. Sepúlveda Pertence. Pacte.: José Amaury Pereira. Impte.: José Amaury Pereira. Coator:
Tribunal de Alçada Criminal do Estado de
São Paulo.
Decisão: A Turma indeferiu o pedido de
«habeas carpas». Vencido o Sr. Ministro
SeptIlveda Pertence, Relator, que o deferia.
Relator para o acórdão o Sr. Ministro Ilmar
Gaivão.
Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Sydney Sanches, Sepúlveda Pertence,
Celso de Mello e finar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Miguel Franzino Pereira.
Brasília, 29 de junho de 1993 — Ricardo Dias Duarte, Secretário.
RAMAS CORPUS 70.240 — SP
(Primeira 'Turma)
Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello
Pacientes: Nivaldo Rodrigues e outros — Impetrantes: Imo Ishi e outros —
Coator: Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
Habeas corpos. Apelação criminal interposta exclusivamente
pelos réus. Agravamento do regime de cumprimento da pena. Ofensa ao
art. 617, in ene, do CPP. Reformado in pejas. Pedido deferido.
O Tribunal, ao julgar recurso interposto exclusivamente
pelos réus, não pode agravar o regime inicial de cumprimento da pena,
alterando-o, ausente qualquer iniciativa recarga' do Ministério Público,
de senil-aberto para fechado.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes au- tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- bunal Federal, em Primeira Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigiáficas, por unanimidade de votos,
em deferir o pedido de «habeas comusa,
222
R.T.J. —150
para manter o regime penal semi-aberto
estabelecido na sentença de primeiro
grau.
Brasília, 8 de junho de 1993 —Moreira
Alves, Presidente — Celso de Mello, Relator.
RELATÓRIO
cumprimento das sanções penais impostas,
o regime semi-aberto (fls. 16/17).
Consta destes autos, no entanto, que o
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo,
ao julgar recurso de apelação criminal exclusivamente interposto pelos pacientes,
veio a agravar-lhes a situação jurídico-penal, na medida em que, ausente qualquer
O Sr. Ministro Celso de Mello: Trata- iniciativa recursal do Ministério Públise de habeas corpus, com pedido de limi- co, impôs-lhes o regime penal fechado para
nar, impetrado em favor de Nivaldo Rodri- efeito de cumprimento das penas (fl. 23).
gues, Paulo Roberto Firmo e Paulo Cezar
Houve, à toda evidência, no caso predos Reis, contra acórdão do Tribunal de sente, clara ofensa ao preceito inscrito no
Justiça do Estado de São Paulo que, julgan- art. 617 do Código de Processo Penal que
do apelação criminal exclusivamente inter- veda, nos recursos exclusivos da defesa,
posta pelos réus, ora pacientes, agravou- o agravamento do status poenalis do réu.
lhes o regime inicial de cumprimento da
O princípio da reformatio in pejas, ao
pena, alterando-o de semi-aberto pata feimportar em restrição aos poderes dos Trichado (fls. 19/23).
bunais, constitui garantia subjetiva dos senConcedi, às fls. 64/65, a medida liminar tenciados, que dele extraem, como líquido
requerida pelos impetrantes para manter os e certo, o direito de não verem agravada,
pacientes, até final julgamento deste ha- ante a ausência de recurso do Ministério
beas corpus, no regime penal semi-aberto, Público, a sua própria situação jurídica, tal
determinado pela sentença condenatória como definida pela decisão penal condenaproferida pelo Juízo de Direito da l' Vara tória emanada do órgão judiciário de priCriminal da comarca de São Bernardo do meiro grau.
Campo (fls. 9/17).
O Supremo Tribunal Federal, ao aprePrestadas as informações pelo órgão ciar tema idêntico ao suscitado na presente
apontado como coator (fls. 74/79), ma- impetração, decidiu que, verbis:
nifestou-se o Ministério Público Federal no
diabas corpus. Homicídio simples.
sentido da concessão do writ, por entender
Apelação
interposta exclusivamente
configurada, na espécie, uma nítida hipótepela
defesa.
Agravamento do regime
se de reformatio in pejus, eis que o TriprisionaL Reformado in pejas. Pedido
bunal de Justiça, ao julgar recurso interposdeferida
to exclusivamente pelos ora pacientes, cul— O juízo ad quem não pode, ao
minou por impor-lhes regime penal mais
apreciar recurso interposto exclusivagravoso que aquele fixado na sentença
condenatória de primeira instância (fls.
mente pela Defesa, agravar o regime
126/134).
prisional imposto ao réu condenado. Essa
atuação processual do Tribunal, que torÉ o relatório.
na mais gravoso o regime de execução
VOTO
da pena, sem que haja recurso do Ministério Público, incide na censura da lei
O Sr. Ministro Celso de Mello (Relaque veda a reformatio in pejus.
tor): A sentença proferida pelo magistrado
de primeira instância, após ressaltar «a pri— A norma inscrita no art. 617 do
mariedade e ausência de maus antecedenCódigo de Processo Penal, que obsta o
tes dos acusados», fixou, como regime de
agravamento da pena quando somente
R.TJ —150
o réu houver apelado da sentença, tem
por objetivo impedir que os Tribunais
onerem a situação jurídico-penal dos
acusados quando destes — exclusivamente destes — for a impugnação recursa! deduzida.» (HC 69.477-2-RS,
Rel. Min. Celso de Mello, Primeira Turma, julgamento em 30-6-92, votação
unânime)
A Colenda Segunda Turma desta Suprema Corte, por sua vez, ao julgar o HC
69.504-SP, Rel. Min. Paulo Brossard, e
tendo presente situação jurídica rigorosamente idêntica à destes autos, houve por
bem deferir o writ constitucional em acórdão assim ementado (DJ de 23-10-92), verbis:
«Habeas corpos. Reformado ia
O Tribunal, ao julgar apelação interposta exclusivamente pelo réu, agravou
o regime inicial de cumprimento da
pena de semi-aberto para fechado, sem
qualquer fundamentação. Configuração
da reformado in pejas.
Habess corpus deferido.»
Idêntica orientação jurisprudencial foi
também consagrada em decisão deste
Tribunal no julgamento do HC 67.747SP, Rel. Min. Francisco Rezek, Dl de
3-8-90, verbis:
«Habena corpas.ReformatioMpojus.
Apelação exclusiva da defesa. Agra-
223
vamento do regime de cumprimento
da pena.
Tribunal que, julgando apelação da
defesa, agrava o regime inicial do cumprimento da pena.
Flabeas corpus deferido.»
Sendo assim, e tendo presente, ainda, o
parecer inteiramente favorável da douta Procuradoria-Geral da República (fls. 126/134),
defiro o pedido para, continuando a liminar
anteriormente concedida, manter, em favor
dos ora pacientes, o regime penal semiaberto estabelecido na sentença condenatória de primeiro grau.
É o meu voto.
EXTRATO DA ATA
HC
11C70.240—SP---Rel.: Min. Celso de
Mello. Pactes.: Nivaldo Rodrigues e outros. Imptes.: Isao Ishi e outros. Coator:
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
Decisão: A Turma deferiu o pedido de
«habeas corpos», para manter o regime penal semi-aberto estabelecido na sentença de
primeiro grau, nos termos do voto do Relator. Unânime.
Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Sydney Sanches, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e limar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza.
Brasília, 8 de junho de 1993 — Ricardo
Dias Duarte, Secretário.
HABEAS CORPUS N° 70.249 — MS
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello
Paciente: Anadilson da Costa Leite — Impetrante: Maria Anete Barros —
Coator: Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul
Habena corpus. Defensor público. Lei rt• L060/50 (art. 5°, §
5,, com a redação dada pela Lei 7.871/89. Declaração de inconstita-
e
224
R.T.J. — 150
cionalidade pela Seção Criminaldo Tribtsnalde Justiça. Inadmissibilidade. Princípio da reserva de plenário (CF, art. 97). bisa:idade da decisão
intpugnada.Pedidodeferido.
— Nenhum órgão fraccionário de qualquer Tribunal dispõe de competência, no sistema jurídico brasileiro, para declarar a
inconstitucionalidade de leis on atos emanados do Poder Público. Essa
magna prerrogativa jurisdidonal foi atribuída, em grau de absoluta
exclusividade, ao Plenário dos Tribunais ou, onde houver, ao respectivo Órgão Especial. Essa extraordinária competência dos Tribunais
é regida pelo princípio da reserva de Plenário, inscrito no artigo 97
da Constituição da República.
— Suscitada a questão prejudicial de constitudonalidade
perante órgão fraccionário de Tribunal (Câmaras, Grupos, Turmas
ou Seções), a este competirá, em acolhendo a alegação, submeter a
controvérsia jurídica ao Tribunal Pleno.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Primeira Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos,
em deferir o pedido de «habeas comum.
Brasília, 4 de maio de 1993 — Moreira
Alves, Presidente — Celso de Mello, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Celso de Mello: O Ministério Público Federal, em parecer do
ilustre Subprocurador-Gemi da República,
Dr. Edson Oliveira de Almeida, assim
resumiu e apreciou os fundamentos da presente impetração, concluindo — após registrar a existência de precedente do Supremo Tribunal Federal no exame da matéria
— pela concessão da ordem de habeas
corpus (fls. 43/45), verbis:
«Inconstitucionalidade de lei federal declarada pela Seção Criminal
do Tribunal de Justiça: nulidade por
ofensa ao artigo 97 da Constituição
Federal.
A colenda Seção Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso
do Sul não conheceu, por intempesli-
vidade, de embargos infringentes criminais opostos por meio da Assistência
Judiciária, uma vez que não reconhecido, ao argumento de inconstitucionalidade, o benefício do prazo em dobro
previsto no artigo 5°, § 5°, da Lei n°
1.060/50 (redação da Lei n° 7.871/89).
A impetrante alega que a Seção Criminal não tem competência para declarar a inconstitucionalidade de lei, conforme estatuído no artigo 97 da Constituição Federal.
A Constituição Federal (artigo 97)
reserva o julgamento da constitucionalidade das leis para o Tribunal Pleno (ou
órgão especial, onde houver, art. 93,
XI), uma vez que exigido, para a declaração da inconstitucionalidade, o voto
da maioria absoluta dos membros do
Tribunal ou do respectivo órgão especiaL
O incidente deve ser suscitado no
órgão fracionário e, uma vez acolhido,
cabe sobrestar o julgamento até a decisão plenária (Código de Processo Civil,
artigos 480 a 482).
Pelo exposto, (...), opino pelo deferimento do writ para que seja anulado o
acórdão dos embargos infringentes opos-
R.TJ —150
tos em favor do paciente, com o fim de
ser renovado o julgamento, observado o
artigo 97 da Constituição Federal, em
caso de acolhimento da preliminar de
inconstitucionalidade.»
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): A questão suscitada no presente babem corroa não é nova, uma vez que esta
Turma, apreciando-a em wrlts anteriores,
proclamou que somente o Plenário dos Tribunais — ou, onde houver, o correspondente órgão Especial — dispõe de competência para declarar a inconstitucionalidade
dos atos estatais.
A Primeira Turma do Supremo Tribunal
Federal, ao julgar o HC 69.921-9 (DJ de
26-3-93), Rel. Min. Celso de Mdlo, resolveu idêntica controvérsia jurídica, ora renovada nesta sede processual, em acórdão
assim ementado:
«Habitas corpos. Defensor público
— Praia recursal espedal. Prejudidai de Inconstitucionalidade. Ld n°
1.060/50 (art. 5°, 5°), com a redação
dada pela Lei n° 7.871/89. Princípio
da reserva de Plenário (CF, art. 97).
Incompetência da Seção Criminal do
Tribunal de Justiça para a declaração
de inconstitudonalidade. Necessidade de o incidente de inconstitucionalidade ser submetido ao plenário do
tribunal. Pedido deferido.
— A declaração de inconstitucionalidade de leis ou atos emanados do Poder Público submete-se ao princípio da
reserva de Plenário consagrado no art.
97 da Constituição Federal. A vigente
Carta Política, seguindo uma tradição
iniciada pela Constituição de 1934, reservou ao Plenário dos Tribunais a competência funcional por objeto do juízo
para proferir decisões declaratórias de
inconstitucionalidade.
225
Órgãos fraccionários dos Tribunais
(Câmaras, Grupos de Câmaras, Turmas
ou Seções), muito embora possam confumar a legitimidade constitucional dos
atos estatais (RTJ 98/877), não dispõem
do poder de declaração da inconstiticionaliclade das leis e demais espécies jurídicas editadas pelo Poder Público.
Essa especial competência dos Tribunais pertence, com exclusividade, ao
respectivo Plenário ou, onde houver, ao
correspondente órgão especial.
—A norma inscrita no art. 97 da Carta
Federal, porque exclusivamente dirigida
aos órgãos colegiados do Poder Judiciário, não se aplica aos magistrados singulares quando no exercício da jurisdição
constitucional (RT 554/253).»
Esse entendimento reflete a orientação
jurisprudencial firmada pelo Supremo Tribunal Federal a propósito do tema em questão, como se verifica dos seguintes precedentes:
4Habeas corpos. Incidente de inconstitucionalidade levantado, no julgamento de embargos infringentes, na Seção Criminal do Tribunal de Justiça, e
por ela julgado.
Inobservância do disposto no artigo 97 da Constituição Federal.
Habeas corpus deferido, para anular o acórdão ora impugnado, a fim de
que a Seção Criminal do Tribunal de
Justiça do Estado de Mato Grosso, voltando a julgar os embargos infringentes
a ela interpostos, levante, querendo, o
incidente de inconstitucionalidade da
mencionada Lei n° 7.871/89 perante o
Plenário daquela Corte.»
(HC 69.730-5-MS, Rel. 11%. Moreira
Alves, DJ de 18-12-92)
«Incompetência de órgão fracionário
de Tribunal para declarar a inconstitucionalidade do prazo em dobro previsto
no art. 5°,. § 5°, da Lei n° 1.06W50 (ralação dada pela Lei n° 7.871-89).
226
R.TJ. — 150
Babe= corpus deferido, para que, cial de constitucionalidade da Lei n° 7.871,
anulado o acórdão ora impugnado, a de 1989.
Seção Criminal do Tribunal de Justiça
Deixo de ordenar a soltura do ora pado Estado de Mato Grosso do Sul, vol- ciente, eis que, não obstante invalidado o
tando a julgar os embargos infringentes acórdão que declarou a intempestividade
a ela interpostos, levante, querendo, o do recurso de embargos infringentes e de
incidente de inconstitucionalidade da nulidade, ainda subsiste a condenação pemencionada Lei n° 7.871/89 perante o nal a ele imposta pela prática do delito de
Plenário daquela corte.»
latrocínio, qualificado como crime hedion(HC 69.913-8-MS, ReL Min. Octavio do pela Lei n° 8.072/90.
Gallotti, DJ de 2-4-93).
Registro que o ora paciente foi condena«Controle incidente de constitucio- do à pena de 23 anos de reclusão, a ser
nalidade: quorum qualificado para a de- cumprida em regime fechado, por infração
claração de inconstitucionalidade de lei, ao art. 157, § 3°, última parte, do Código
à exigência do qual é irrelevante que se Penal, eis que teria cometido — já vigente
tenha ou não formulado argüição explí- a lei que define os crimes hediondos (Lei
cita, bastando que a aplicação da norma n° 8.072 de 25-7-90) — o delito de latrocída lei incidente haja sido afastada, no nio.
caso concreto, sob fundamento de conA sentença penal condenatória, proferitrariedade à Constituição.»
da
pelo magistrado de primeira instância,
(HC 69.939-1-MS, Rel. Afira Sepúlvefoi
confirmada em sede =cursai, por votada Pertence, DJ de 19-3-93)
ção majoritária, quando do julgamento da
Nenhum órgão fraccionário de qualquer apelação criminal interposta pelo ora paTribunal dispõe de competência, no siste- ciente.
ma jurídico brasileiro, para declarar a inNada legitima, em conseqüência, a preconstitucionalidade de leis ou atos emana- tendida expedição de alvará de soltura em
dos do Poder Público. Essa magna prerrofavor do ora paciente.
gativa jurisdicional foi atribuída, em grau
É o meu voto.
de absoluta exclusividade, ao Plenário dos
Tribunais ou, onde houver, ao respectivo
EXTRATO DA ATA
Órgão Especial. Essa extraordinária comHC 70.249 — MS — Rel.: Min. Celso
petência dos Tribunais é regida pelo princípio da reserva de Plenário, inscrito no de Mello. Pacte.: Anadilson da Costa Leite.
Impte.: Maria Mete Barros. Coator. Tribuartigo 97 da Constituição da República.
nal de Justiça do Estado de Mato Grosso do
Suscitada a questão prejudicial de cons- Sul.
titucionalidade perante órgão fraccionário
Decisão: A Turma deferiu o pedido de
de Tribunal (Câmaras, Grupos, Turmas ou
«habeas
corpus», nos termos do voto do
Seções), a este competirá, em acolhendo a
Relator.
Unânime.
alegação, submeter a controvérsia jurídica
ao Tribunal Pleno.
Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves.
Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Assim sendo, defiro o pedido, a fim de
que a Seção Criminal do Tribunal de Justi- Octavio Gallotti, Sepúlveda Pertence, Celça do Estado de Mato Grosso do Sul, vol- so de Mello e limar Gaivão. Subprocuratando a julgar o recurso de embargos infrin- dor-Geral da República, Dr. Arthur de Casgentes e de nulidade interposto pela Defen- tilho Neto.
Brasília, 4 de maio de 1993 — Ricardo
soria Pública, suscite, querendo, perante o
Plenário daquela Corte, a questão prejudi- Dias Duarte, Secretário.
R.T.J —150
227
BARRAS CORPUS N° 70275 — SP
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro limar Gaivão
Paciente: Gilmar de Jesus — Coator: Tribunal de Alçada Criminal do Estado
de São Paulo
Habeas corpos. Prescrição retroativa configurada. Prazo dindruddo pela menoridade do paciente à época dos fatos esem que houvesse
interrupção pelo fator superveniente da reincidência.
Comprovado o transcurso de mais de dois anos entre a data
do recebimento da denúncia e a da publicação da sentença, concede-se a
ordem para se declarar extinta a punibilidade do paciente pelo crime de
furto, pelo qual foi apenado com um ano de reclusão, tendo em vista a
sua menoridade à época do cometimento do delito e a circunstância de
não ter sido interrompido o prazo prescridonal então em curso (art. 109,
V, c/c art. 115, ambos do CP).
Soltura do paciente se por al não se encontrar preso.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, na
conformidade da ata do julgamento e das
notas taquigráficas, por unanimidade de
votos, em deferir o pedido de «habeas corpus», nos termos do voto do Relator.
Brasília, 22 de junho de 1993 —Moreira Alves, Presidente — limar Gaivão, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Limar Gaivão (Relator): A Procuradora do Estado, Janora Rocha Rossetti, no exercido da assistência
judiciária gratuita, impetra habeas corpos
em favor de Gilmar de Jesus, ora recolhido
ao Centro de Readaptação Penitenciária
de Taubaté-SP, alegando estar o paciente
sofrendo constrangimento ilegal, em virtude de o Tribunal de Alçada Criminal não
lhe ter reconhecido a prescrição da pretensão punitiva estatal.
Alega que, denunciado pelo crime de
furto (art. 155 do CP), foi o paciente
condenado a um ano de reclusão, tendose em apelação majorado a pena reclusiva
para um ano e dois meses, circunstância
esta que afirma não ter afetado, ainda naquela época, a consumação da prescrição,
que, no caso, é de dois anos, por contar ele,
quando do fato, menos de vinte e um anos,
e jáhaver tallapso transcorrido entre adata
do recebimento da denúncia (27-6-73) e a
da publicação da sentença (1°-7-75). Em
conseqüência, requeraconcessãodaordem
para que seja expedido alvará de soltura.
Prestando informações, o ilustre Presidente do Tribunal apontado como coator,
Juiz Lodosa Goulart, relata as principais
ocorrências do processo em primeira e segunda instâncias, encaminhando as respectivas peças (fls. 20/46).
A douta Procuradoria-Geral da República, por seu ilustre Subprocurador-Geral
Mantem Costa Pinto, opina, às fls. 48/49,
pela concessão da ordem.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro limar Gaivão (Relator): O douto parecer, acolhendo os fundamentos da impetração, assim se manifesta,
verbis (fl. 49):
228
R.TJ. — 150
«O presente habeas corpus deve ser
conhecido e concedida a ordem.
É que o paciente, que na data do fato
era menor de vinte e um anos (fls. 12 e
37), e que não é reincidente (fl. 37), foi
condenado em um ano e dois meses de
prisão, ocorrendo a prescrição no prazo
de dois anos, conforme arts. 109, inciso
V, 110 e 115, todos do Código Penal,
prazo que fluiu entre o recebimento da
denúncia, ocorrido em 28-6-73 (fl. 20),
e a sentença, datada de 1°-7-75 (fl. 37),
ocorrendo a chamada prescrição retroativa.
Pelo exposto, somos pelo conhecimento e concessão da ordem.
É o parecer.»
Evidenciado, pelo que consta dos autos,
inexistir entre aquelas datas qualquer causa
impeditiva da prescrição, ou interruptiva
relacionada a reincidência, é inegável que
é de se acolher a conclusão da douta Praça-
radoria-Geral da República quanto a estar
extinta a punibilidade do paciente, razão
pela qual defiro o habeas carpas, determinando seja o mesmo solto, se por al não
estiver preso.
EXTRATO DA ATA
HC 70.275 — SP — Rel.: Mia limar
Gaivão. Pacte.: Gilmar de Jesus. Impte.:
Janota Rocha Rossetti. Coator: Tribunal de
Alçada Criminal do Estado de São Paulo.
Decisão: A Turma deferiu o pedido de
«habeas corpus», nos ternos do voto do
Relator. Unânime.
Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Sydney Sanches, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e limar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Miguel Frauzino Pereira.
Brasília, 22 de junho de 1993 — Ricar-
do Dias Duarte, Secretário.
HABEAS CORPUS N° 70331— PR
(Segunda Turma)
Relator O Sr. Ministro Carlos Velioso
Paciente: Mário Sérgio Capelari —Impetrante: O mesmo —Coator. Tribunal
de Alçada do Estado do Paraná
Penal. Processual penal. Habeas empas. Questão não examinada pelo Tribunal a quo. Exame de prova.
I — Inexistência de ato do Tribunal a quo, de modo a
Firmar a competência do Supremo Tribunal Federal (CF, art. 102, I, 0.
II — O tema alusivo à deserção da apelação criminal envolve matéria de prova, que não pode ser examinada em sede de babeas
corpos.
III — Indeferimento do writ quanto ao exame da deserção
da apelação criminal.
IV — Devolução dos autos ao Tribunal a quo para julgamento das alegadas nulidades.
R.TJ —150
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráflats, por decisão Uflállált, conhecer, em parte, do «habeas corpos», quanto
à deserção e, nessa parte, o indeferir. No
mais, determinou a remessa dos autos ao
Tribunal de Alçada do Estado do Paraná
para que conheça do pedido quanto à alegação de nulidade da sentença, julgando-o
como entenda de direito.
Brasília, 1° de junho de 1993 — Néri da
Silveira, Presidente — Carlos Velloso,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Carlos Velloso (Relator): Mário Sérgio Capelari, condenado a
13 anos de reclusão e 100 dias-multa pelo
crime previsto no art. 157, ã 2°, I e 11, do
Código Penal, c.c. os arts. 29 e 70 do mesmo Código, apelou da sentença para o Tribunal de Alçada do Estado do Paraná, mas
o recurso foi julgado deserto, em face da
fuga do réu. Interpostos embargos declaratalos, foram eles rejeitados.
Foi interposto, então, com fundamento
no art. 105, III, a e c, da Constituição,
recurso especial para o Egrégio Superior
Tribunal de Justiça, recurso a que foi negado seguimento pelo Tribunal de Alçada do
Estado do Paraná, que, no entanto, recebeu
o inconformisrno do recorrente como babais carpas, a ser dirigido ao Supremo
Tribunal Federal, nos termos do art. 648,
VI, do CPP e com base no art. 102, I, 1, da
Constituição.
O Ministério Público Federal, pelo parecer do ilustre Subprocurador-Geral Cláudio Lemos Ponteies, opina pelo «não-conhecimento do IIC quanto ao exame dos
termos insertos no Recurso Especial transformado, com a sua conseqüente remessa
ao TJ paranaense, e pelo conhecimento,
com posterior indeferimento, do tema que
229
fala da deserção da apelação criminal uma
vez tratar-se de matéria probatória».
Sustenta o parecer que é equivocada a
declinatoria foi, salvo no tocante ao exa-
me da deserção decretada em grau de recurso, pois, pelo que se vê dos autos, «os ternas
trazidos a essa Corte Alta não lograram o
exame prévio do TA paranaense para delimitar a competência deste STF no examinar o writ. Inexistindo o ato do Tribunal
que venha a ensejar o seu exame da forma
do art. 102, I, 1, da CF, não é de se atribuir
a esta Corte a competência para o seu respectivo exame». Entende, por isso, que seria o caso de se transformar o recurso especial interposto em babas oorpus a ser
apreciado pelo próprio Tribunal de Alçada
no tocante «às nulidades processuais argüidas e mencionadas por ocasião da decisão
de fls. 303/4».
No que concerne à deserção, tema tratado no acórdão de fls. 303/304, por envolver
exame de prova, não pode ser apreciado no
âmbito do babas carpim
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Valioso (Relatar): O parecer da Procuradoria-Geral da
República (fls. 371/373), da lavra do ilustre
Subprocurador-Geral da República Cláudio Lemos Ponteies, assim equacionou a
controvérsia:
«Fazendo-se um breve histórico dos
acontecimentos, ternos que Mário Sérgio Capdari, denunciado e condenado
a 13 anos de reclusão pelo crime do
artigo 157, § 2°, I e II do CP, c.c. os arts.
29 e 70 do mesmo Estatuto Repressivo,
apelou da referida sentença, cujo recurso, face à fuga do réu, restou declarado
deserto pela Corte de Alçada ad quem.
2. Ao embargo de declaração interposto, entendeu o Tribunal por rejeitar
também este recurso, argumentando,
com razão, tratar-se de matéria que não
230
R.T.J. — 150
objetivara suprir obscuridade, ambigüidade, omissão ou contradição.
Ato seqüencial, Capelarl apresenta
Recurso Especial com base nas alíneas
a e c do inciso IQ, do artigo 105 da CF,
para o que o TA do Paraná, negando
seguimento ao recurso, assim especificore
o... este recurso não merece ultrapassar este juízo prévio de admissibilidade. É que pela alínea a da norma autorizadora não houve indicação
de dispositivos infraconstitucionais
supostamente violados pelo acórdão
recorrido e, no que tange à letra c, não
se demonstrou divergência jurisprudencial, conforme as exigências contidas no art. 255 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça.
Todavia, as questões suscitadas
na petição recurso' merecem ser levadas ao conhecimento do Pretório
Excelso, ao menos através de habeas
corpos. Inclusive, é o douto parecer
ministerial de fl. 359 que realça a
relevância das alegações do réu e recomenda o envio dos autos à instância ad quem como pedido de habeas
corpus.
Face ao exposto, nego seguimento ao recurso especial e recebo o inconformismo do recorrente como de
habeas corpus, nos termos do art.
648, inc. VI, do Código de Processo
Penal, o qual deve ser dirigido ao
Colendo Supremo Tribunal Federal,
de acordo com o art. 102, inciso I,
letra i, da Carta da República» (fls.
365/366)
Daí a tramitação da lide neste último patamar, a fim de que, como visto,
examine-se os temas insertos no pedido
do réu, ora paciente.
Datíssima vênia do entendimento
exarada pela Corte de Alçada Estadual,
estamos em que a dedinatoria fori está
equivocada, exceto, é claro, para o exame da deserção decretada em grau de
recurso (vide fls. 303/304).
É que, conforme se depreende do
exame dos autos, os temas trazidos a
essa Corte Alta não lograram o exame
prévio do TA Paranaense para delimitar
a competência deste STF no examinar o
writ. Inexistindo o ato do Tribunal que
venha a ensejar o seu exame na forma
do art. 102, I, i, da CF, não é de se
atribuir a esta Corte a competência para
o seu respectivo exame.
Seria, pois, ao ver do MPF, o caso
de se transformar a interposição do Recurso Especial em HC para o seu próprio exame pela Corte Estadual de
Alçada, na parte alusiva às nulidades
processuais argüidas e mencionadas por
ocasião da decisão de fls. 303/4.
8. Quanto ao tema da deserção, apesar de já ter sido tratada no acórdão de
fls. 303/4, envolve esta matéria de cunho probatório e que, por isso, refoge ao
âmbito do HC (vide fls. 325/331).»
Correto o parecer.
É que as questões que estão sendo submetidas ao exame do STF deveriam ter sido
apreciadas, antes, pelo Tribunal de Alçada
do Estado do Paraná, para fixar a competência desta Corte.
Dessa maneira, como bem salientou o
parecer do Ministério Público Federal, devem estes autos retornar àquele Tribunal,
para que, como habeas corpus, as questões
atinentes às alegadas nulidades sejam examinadas.
Já no tocante à deserção, matéria apreciada pelo Tribunal de Alçada paranaense,
não pode esta Corte apreciá-la, tendo em
vista os termos em que foi posta, por envolver reexame de prova, inviável em sede de
habeas corpus.
Isto posto, indefiro o writ no pertinente
à deserção e determino a remessa dos autos
R.T.J — 150
ao Tribunal de Alçada do Paraná, para exame da alegação de nulidade feita pelo paciente.
EXTRATO DA ATA
HC 70.331 — PR — Rel.: Min. Carlos
Venoso. Pacta.: Mano Sérgio Capelati (Advs.:
Moacyr Correa Filho e outros). Coator:
Tribunal de Alçada do Estado do Paraná.
Decisão: Por unanimidade, a Turma conheceu, em parte, do «habeas corpos», quanto à deserção e, nessa parte, o indeferiu. No
mais, determinou a remessa dos autos ao
231
Tribunal de Alçada do Estado do Paraná
para que conheça do pedido quanto à alegação de nulidade da sentença, julgando-o
como entender de direito.
Presidência do Sr. Ministro Néri da Silvam. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Paulo Brossard, Carlos Venoso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Mantem Costa
Pinto.
Brasília, 1° de junho de 1993 — José
Wilson Aragão, Secretário.
HABEAS CORPUS N° 70.378 —
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Francisco Rezek
Paciente: Franco Tiberio — Impetrante: José Ferreira Gomez — Coator:
Relator da PPE 151-7
Babam corpos. Formalização do pedido extradicional Superação do prazo da Lei n'
Ausência de ilegalidade.
Apresentação, após o prazo de noventa dias preconizado pelo
Estatuto do Estrangeiro, do pedido formal de extradição. Circunstância
que sana o vido resultante da superação do prazo. Precedentes do STF
(HHCC na 57.446 e 68.684).
Habeas carpas indeferido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na confonnidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, à unanimidade de votos, em
indeferir o pedido de «habeas camas».
Brasília, 23 de junho de 1993 — Paulo
Brossard, Presidente— Francisco Rezek,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Francisco Rezek (Relatar): Adoto como relatório a manifestação do Subprocurador-Geral da República
Cláudio Fonteles acerca da espécie:
«Cuida-se de ordem de habeas corpus impetrarei por José Ferreira Gomez
em favor do italiano Franco Tiberio objetivando a revogação do mandado de
prisão preventiva sob a alegação de dmcumprimento do prazo de 90 dias previsto no § 2° do artigo 82 da Lei n°
6.815/80.
Sem razão o impetrante.
Assim está em trecho das inflamações prestadas pelo Exmo. Sr. Ministro
Celso de Mello, verbis:
«Em atenção ao pedido de informações consubstanciado no Ofício
n° 683/R, de 25-5-93, para instruir o
Habeas Carpes n° 70.378-0, do qual
232
R.TJ. — 150
V. Ex.* é o Relator, tenho a honra de
esclarecer que, a requerimento do Sr.
Ministro da Justiça, foi decretada,
em 28 de janeiro do corrente ano,
para fins extradidonais, por ato do
Exmo. Sr. Ministro-Presidente do
Supremo Tribunal Federal, a prisão preventiva de Franco Tiberio
(doc. 1).
A custódia cautelar do ora padente efetivou-se em 2-2-93, data
em que foi capturado por agentes do
Departamento de Policia Federal, na
cidade do Rio de janeiro» (doc. 2).
(V. fl. 10 — grifamos.)
Como se vê, foi decretada a prisão
preventiva do paciente para fins de extradição apedido do Exmo. Sr. Ministro
da Justiça.
A Lei n° 6.815/80, em seu artigo
82, §§ 1° e 2°, determina que, efetivada
a prisão, o Estado requerente deverá
formalizar o pedido de extradição em 90
dias e a prisão será mantida além desse prazo.
É certo que o Governo Italiano
deveria ter formulado o pedido extradicional em 2-5-93.
Ocorre que o referido pedido só foi
encaminhado à Suprema Corte em 12-593.
Assim, mesmo formalizada a extradição tardiamente, não se configura
excesso de prazo, conforme pacifica
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal charla à fl. 11.
Opina, pois, o MPF pelo indeferimento do pedido.» (fls. 30/32)
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Francisco Rezek (Relator): Há, de fato, sólida e uniforme jurisprudência do Supremo no sentido de não
configurar-se aí uma razão para a concessão da ordem de habeas corpos com o seu
intuito liberatório. Quando o Estado estrangeiro formula ao Brasil um pedido de prisão cautelar para fins de extradição, apresentando documentação mínima, a lei não
quer que o extraditando fique detido indefinidamente em nome desse gesto provisório, e diz que o Estado requerente tem prazo
de noventa dias — contados da prisão —
para formalizar o pedido extradicional. A
custódia não será mantida além desse prazo, se o Estado nele não se manifesta.
Verifico — e não me surpreende este
fato — que a República Italiana endereçou
às Relações Exteriores do Brasil o pedido
formal em 29 de abril. Portanto, perfeitamente dentro do prazo. Se esta Casa veio a
receber o pedido formal no dia 12 de maio
seguinte, é por que entre a Chancelaria, o
Ministério daJustiça e este ponto da Esplanada, alguns dias se consomem no trânsito
de documentos... De modo que a República
Italiana honrou o prazo; e como quer que
seja, esse atraso por conta do trânsito do
pedido formal entre as Mações Exteriores,
a Justiça e o Supremo, embora freqüente,
nunca é algo abusivo; chega a uma semana
ou pouco mais que isso.
Não há dúvida de que um pedido de
habeas corpos que desse entrada no Supremo passados os noventa dias, que se contam da prisão efetiva do extraditando, se
confirmado que naquela data o Estado requerente ainda não apresentou pedido formal, há de conceder-se o habeas corpos. O
que não adianta muito, visto que, se no
momento de examinar-se o pedido de habeas corpos o pedido formal chegou, ainda
que com atraso, às mãos do governo brasileiro, a_prisão simplesmente tem continuidade. E que em nenhuma hipótese a lei
justifica a assertiva de que a exaustão do
prazo de noventa dias, sem que o Estado
requerente o observe, seja um fundamento
para liquidar-se o tema da extradição, pondo-se em liberdade definitiva o extraditando.
R.TJ — 150
233
Assim, nos termos do parecer da Pro- vio Gallotti, Presidente. Presidiu o julgacuradoria-Geral e invocando a jurispru- mento o Ministro Paulo Brossard.
dência da Casa, indefiro o pedido. Não
Presidência do Sr. Ministro Octavio Galacho que tenha havido ilegalidade nem lotti. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
abuso de poder no gesto do Ministro Cel- Moreira Alves, Néri da Silveira, Sydney
so de Mello quando manteve a prisão de Sanches, Paulo Brossard, Sepúlveda Perextraditando.
tence, Carlos Venoso, Marco Aurélio, IIEXTRATO DA ATA
mar Gaivão e Francisco Rezek. Ausente,
o Sr. Ministro Celso de
HC 70.378 — RJ —Rel.: Min. Francis- justificadamente,
Mello.
co Rezek. Paute.: Franco Tiberio. Impte.:
Procurador-Geral daRepública, Dr. AnJosé Ferreira Goma Coator: Relator da
tonio Fernando Barros e Silva de Souza,
PPE 151-7
Decisão: Por votação unânime, o Tribu- Substituto.
nal indeferiu o pedido de «habeas corpos».
Brasília, 23 de junho de 1993 — Luiz
Ausente, ocasionalmente, o Ministro Octa- Tomimatsu, Secretário.
HABEAS CORPUS N° 70.467 — MS
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio
Paciente e Impetrante: Luiz Mário da Silva— Coator: Tribunal de Justiça do
Estado de Mato Grosso do Sul
Regime de cumprimento da pena. Progressão. Artigo 2 1; §
dela! "072/90. Na dicção da ilustrada maioria do Supremo Tribunal
Federal, o regime de cumprimento da pena não se coloca no âmbito da
individualização desta, o que atrai a impossibilidade de assentar-se a
procedência da pecha de inconstitucional era relação à regra do 1° do
artigo 2° da Lei n° 8.072/90. A atuação em Órgão fracionado é conducente
a homenagear-se o entendimento da maioria, ressalvando-se a convicção
pessoal. A unidade do Direito não subsiste quando grassa o dissono
intestino, ou seja, quando órgãos do mesmo Tribunal decidem de forma
conflitante.
ACÓRDÃO
RELATÓRIO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos,
em indeferir o «habeas corpos».
O Sr. Ministro Marco Aurélio — Com
este babam corpos, visa o Impetrante e Paciente a alcançar a progressão no regime de
cumprimento da pena. Em síntese, tem com
inconstitucional a Lei n° 8.072/90, por contrariar o princípio da individualização da
pena (fls. 2 a 4). Solicitadas informações à
Corte de origem, prestou-as o Vice-Presidente — Desembargador Osvaldo Rodrigues de Melo —na forma do que se contém
Bradá, 10 de agosto de 1993 — Néri
da Silveira, Presidente— Marco Aurélio,
Relator.
234
R.T.J. — 150
à fl. 15. Resume a tramitação da ação penal
em que condenado o Paciente.
A Procuradoria-Geral da República,
evocando o que decidido por esta Corte
nos Habena Corpus # 69.657-SP, redigido pelo Ministro Francisco Rezek, cujo
acórdão foi publicado no Diário da Justiça
da União, de 18 de junho de 1992, e 69.603SP, relatado pelo Ministro Paulo Brossard,
com acórdão veiculado no Diário da Justiça da União de 23 de abril de 1993, ambas
as decisões do Plenário, pronuncia-se pelo
indeferimento da ordem.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Inicialmente, ressalvo entendimento
pessoal sobre a competência para apreciação deste habeas coreus. É que na definição respectiva são consideradas as pessoas
dos envolvidos quer como pacientes, quer
como autoridades apontadas como Gostoras. No caso, o Paciente não goza de prerrogativa de foro, sendo que os Desembargadores do Tribunal de Justiça de Mato
Grosso do Sul estão submetidos à jurisdição direta do Superior Tribunal de Justiça,
que atrai a incidência do disposto na
alínea c do inciso Ido artigo 105 da Carta.
Todavia, até aqui, esta não é a conclusão
dominante, razão pela qual coloco em plano secundário a convicção individual para
homenagear a jurisprudência da Corte, deixando para discutir a matéria em sede própria, ou seja, no Plenário, o que já vem
ocorrendo em face do julgamento da Medida Reclarnatória n° 341-DF. Após o voto do
Ministro-Relator — Moreira Alves — externei dissensão, seguindo-se pedido de
vista formulado pelo Ministro Francisco
Rezek.
Quanto à matéria de fundo, fiquei vencido nas vezes em que o Pleno a examinou,
contando com a companhia honrosa do Ministro Sepúlveda Pertence. Transcrevo as
razões pelas quais assim procedi, salientan-
do que no Plenário prevaleceu a tese de que
o regime de cumprimento da pena não está
no âmbito da individualização assegurada
constitucionalmente. Daí a ausência de inconstitucionalidade do § 1° do artigo 2° da
Lei n° 8.072/90.
Denego a ordem, procedendo à transcrição das razões pelas quais tenho convencimento contrário a tal enfoque, que ressalvo,
nesta oportunidade:
«Preceitua o parágrafo em exame que
nos crimes hediondos definidos no artigo 1° da citada Lei, ou seja, nos de latrocínio, extorsão qualificada pela morte,
extorsão mediante seqüestro e na forma
qualificada, estupro, atentado violento
ao pudor, epidemia com resultado morte, envenenamento de água potável ou
de substância alimentícia ou medicinal,
qualificado pela morte, genocídio, tortura, tráfico ilícito de entorpecente e drogas
afins e, ainda, terrorismo, a pena será
cumprida integralmente em regime fechado.
No particular, contrariando-se consagrada sistemática alusiva à execução
da pena, assentou-se a impertinência das
regras gerais do Código Penal e da Lei
de Execuções Penais, distinguindo-se
entre cidadãos não a partir das condições sóciopsicológicas que lhes são
próprias, mas de episódio criminoso no
qual, por isto ou por aquilo, acabaram
por se envolver. Em atividade legislativa cuja formalização não exigiu mais do
que uma linha, teve-se o condenado a
um dos citados crimes como Sr. de periculosidade ímpar, a merecer, ele, o
afastamento da humanização da pena
que o regime de progresso viabiliza, e a
sociedade, o retorno abrupto daquele
que segregara, á então com as cicatrizes
inerentes ao abandono de suas características pessoais e à vida continuada em
ambiente criado para atender a situação
das mais anormais e que, por isso mes-
R.TJ — 150
mo, não oferece quadro harmônico com
a almejada =socialização.
Sr. Presidente, tenho o regime de cumprimento da pena como algo, que, no
campo da execução, racionaliza-a, evitando a famigerada idéia do Mal pelo
mal causado' e que sabidamente é contrária aos objetivos do próprio contrato
social. A progressividade do regime está
umbilicalmente ligada à própria pena,
no que acenando ao condenado comdias
melhores, incentiva-o à correção de rumo
e, portanto, a empreender um comportamento penitenciário voltado à ordem, ao
mérito e a uma futura inserção no meio
social. O que se pode esperar de alguém
que, antecipadamente, sabe da irrelevância dos próprios atos e reações durante o período no qual ficará longe do
meio social e familiar e da vida normal
que tem direito um ser humano; que
ingressa em uma penitenciária com a
tarja da despersonalização?
Sob este enfoque, digo que a principal razão de ser da progressividade no
cumprimento da pena não é em si a
minimização desta, ou o beneficio indevido, porque contrário ao que inicialmente sentenciado, daquele que acabou
perdendo o bem maior que é a liberdade.
Está, isto sim, no interesse da preservação
do ambiente social, da sociedade, que,
dia-menos-dia receberá de volta aquele
que inobservou a norma penal e, com
isto, deu margem à movimentação do
aparelho punitivo do Estado. A ela não
interessa o retorno de um cidadão, que
enclausurou, embrutecido, muito embora o tenha mandado para detrás das grades com o fito, dentre outros, de recuperá-lo, objetivando uma vida comum em
seu próprio meio, o que o tempo vem
demoastrando, a mais não poder, ser
uma quase utopia. Por sinal, a Lei n"
8.072/90 ganha, no particular, contornos contraditórios. A um só tempo dispõe sobre o cumprimento da pena no
235
regime fechado, afastando a progressividade, e viabiliza o livramento condicional, ou seja, o retorno do condenado
à vida gregária antes mesmo do integral
cumprimento da pena e sem que tenha
progredido no regime. É que, pelo artigo
5° da Lei 8.072/90, foi introduzido no
artigo 83 do Código Penal preceito assegurando aos condenados por crimes
hediondos, pela prática de tortura ou
terrorismo e pelo tráfico ilícito de entorpecentes, a possibilidade de alcançarem
a liberdade condicional, desde que não
sejam reincidentes em crimes de tal natureza — inciso V. Pois bem, a Lei em
comento impede a evolução no cumprimento da pena e prevê, em flagrante
descompasso, beneficio maior, que é o
livramento condicional. Descabe a passagem do regime fechado para o semiaberto, continuando o incurso nas sanções legais a cumprir a pena no mesmo
regime. No entanto, assiste-lhe o direito
de ver examinada a possibilidade de voltar à sociedade, tão logo transcorrido
quantitativo superior a dois terços da
pena.
Conforme salientado na melhor doutrina, a Lei re 8.072190 contém preceitos
que fazem pressupor não a observância
de uma coerente política criminal, mas
que foi editada sob o clima da emoção,
como se no aumento da pena e no rigor
do regime estivessem os únicos meios
de afastar-se o elevado índice de criminalidade.
Por ela, os enquadráveis nos tipos
aludidos são merecedores de tratamento
diferenciado daquele disciplinado no Código Penal e na Lei de Execuções Penais, ficando sujeitos não às regras relativas aos cidadãos em geral, mas a especiais, despeitando a que, fulminando o
regime de progressão da pena, amesquinha a garantia constitucional da individualização.
236
R.T.J. — 150
Diz-se que a pena é individnslizatia
porque o Estado-Juiz, ao fixá-la, está
compelido, por norma cogente, a observar as circunstâncias judiciais, ou seja,
os fatos objetivos e subjetivos que se
fizeram presentes à época do procedimento criminalmente condenável. Ela o
é não em relação ao crime considerado
abstratamente, ou seja,ao tipo definido
em lei, mas, por força das circunstâncias
reinantes à época da prática. Daí cogitar
o artigo 59 do Código Penal que o juiz,
atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade
do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem
como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e
suficiente para reprovação e prevenção
do crime, não só as penas aplicáveis
dentre as cominadas (inciso I), como
também o quantitativo (inciso II), o regime inicial de cumprimento da pena
privativa de liberdade — e, portanto,
provisório, já que passível de modificação até mesmo para adotar-se regime
mais rigoroso (inciso III) — e a substituição da pena privativa da liberdade
aplicada, por outra espécie de pena, se
cabível.
Dizer-se que o regime de progressão
no cumprimento da pena não está compreendido no grande todo que é a individualização preconizada e garantida
constitucionalmente é olvidar o instituto, relegando a plano secundário a justificativa socialmente aceitável que o
recomendou ao legislador de 1984. É
fechar os olhos ao preceito que o junge
a condições pessoais do próprio réu,
dentre as quais (=surgem o grau de culpabilidade, os antecedentes, a conduta
social, a personalidade, alfun, os próprios fatores subjetivos que desaguaram
na prática delituosa. Em duas passagens,
o Código Penal vincula a fixação do
regime às circunstâncias judiciais previstas no artigo 59, fazendo-o no § 30 do
artigo 33 e no inciso III do próprio artigo
59. Todavia, ao que tudo indica, receouse, quando da edição da Lei n° 8.072/90,
que poderia faltar aos integrantes do
aparelho judiciário, aos juizes, aos tribunais, o zelo indispensável à definição do
regime e sua progressividade e, aí, alijou-se do crivo mais abalizado que pode
haver tal procedimento.
Assentar-se, a esta altura, que a definição do regime e modificações posteriores não estão compreendidas na individualização da pena é passo demasiadamente largo, implicando restringir garantia constitucional em detrimento de
todo um sistema e, o que é pior, a transgressão a princípios tão caros em um
Estado Democrático como são os da
igualdade de todos perante a lei, o da
dignidade dapessoa humana e o da atuação do Estado sempre voltada ao bem
comum. A permanência do condenado
em regime fechado durante todo o cumprimento da pena não interessa a quem
quer que seja, muito menos à sociedade
que um dia, mediante o livramento condicional ou, o mais provável, o esgotamento dos anos de clausura, terá necessariamente que recebe-lo de volta, não
para que este torne a delinqüir, mas para
atuar como um partícipe do contrato
social, observados os valores mais elevados que o respaldam.
Por último, há de se considerar que a
própria Constituição Federal contempla
as restrições a serem impostas àqueles
que se mostrem incursos em dispositivos da Lei n° 8.072/90 e dentre elas não
é dado encontrar a relativa à progressividade do regime de cumprimento da
pena. O inciso XLIII do rol das garantias
constitucionais — artigo 5' — afasta,
tão-somente, a fiança, a graça e a anistia
para, em inciso posterior (XLVI), assegurar de forma abrangente, sem excepcionar esta ou aquela prática delituosa,
a individualização da pena. Como, en-
R.T.J —150
tão, entender que o legislador ordinário
o possa fazer? Seria a mesma coisa que
estender aos chamados crimes hediondos e assim enquadrados pela citada Lei,
a imprescritibilidade que o legislador
constitucional somente colou às ações
relativas a atos de grupos armados, civis
ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático (inciso
XLIV). Indaga-se: 6 possível ao legislador comum fazê-lo? A resposta somente
pode ser negativa, a menos que se coloque em plano secundário a circunstância
de que a previsão constitucional está
comida no elenco das garantias constitucionais, conduzindo, por isso mesmo,
à ilação no sentido de que, a contrario
sensu, as demais ações ficam sujeitas à
regra geral da prescrição. O mesmo raciocínio tem pertinência no que concerne à extensão, pela Lei em comento, do
dispositivo atinente à demência ao indulto, quando a Carta, em norma de
exceção, apenas rechaçou a anistia e a
graça — inciso XLIII do artigo 5°.
Destarte, tenho como inconstitucional o preceito do â 1° do artigo 2° da Lei
n° 8.072/90, no que dispõe que a pena
imposta pela prática de qualquer dos
237
crimes nela mencionados será cumprida, integralmente, no regime fechado.
Com isto, concedo parcialmente a
cedem, não para ensejar ao Paciente qualquer dos regimes mais favoráveis, mas
para reconhecer-lhe, porque cidadão e
acima de tudo pessoa humana, os benefícios do instituto geral que é o da progressão do regime de cumprimento da
pena, providenciando o Estado os exames cabíveis.
É o meu voto.
EXTRATO DA ATA
HC 70A67 — MS — Rel.: Ivfin. Marco
Aurélio. Parle. e Impte.: Luiz Mário da
Silva Contar: Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul.
Decisão: Por unanimidade, a Turma indeferiu o «habeas corpos».
Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Carlos Venoso, Marco Aurélio e Francisco
Rezek. Ausente, justificadammte, o Sr. /vfinisto Paulo Brossard. Subprocurador-Geral da República, o Dr. Haroldo Ferraz da
Nóbrega.
Brasília, 10 de agosto de 1993 — José
Wilson Aragão, Secretário.
HARPAS CORPUS N° 70.476 —DF
(Primeira Turma)
Relate O Sr. Ministro Sydney Sanches
Paciente: Milton Carlos Soares de Oliveira — Impetrante: Adelcy Maria
Rocha Simões Conta — Coator: Superior Tribunal ffilitar
Habitas corpos. Processo Penal. Nulidade. Cerceamento de
defesa
Tendo sido, pelo acórdão impugnado, considerada desnecessária e impertinentes prova pretendida pelo padente e não havendo este,
na impetração do habeas capas, logrado demonstrar sua necessidade e
perlinênda, não é de se acolher a alegação de nulidade, por cerceamento
de defesa. Sobretudo quando a condenação se apoiou em numerosos
238
R.TJ. — 150
elementos de convicção, que não se haveriam de infirmar com a prova
visada.
Indemonstrado prejuízo para a defesa e não se caracterizando hipótese de constrangimento ilegal, é de se denegar a ordem impetrada.
Habeas carpas indeferido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, na
conformidade da ata do julgamento e das
notas taquigráficas, por unanimidade de
votos,em indeferir o pedido de «habeas
corpos», nos termos do voto do Relator.
Brasília, 28 de setembro de 1993 — Moreira Alves, Presidente — Sydney Sanches, Relatar.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Sydney Sanches (Relatar): O ilustre Subprocurador-Geral da República, Dr. Mudem Costa Pinto, no parecer de fls. 199/204, resumiu a hipótese e,
em seguida, opinou, nos termos seguintes:
«Ementa: Habeas carpas. Alegação de nulidade. Sem prova de efetivo prejuízo inviável é a pretensão
de anular o procedimento penal.
Trata-se de habeas carpas impetrado pela advogada Adelcy Maria Rocha
Simões, Corrêa, Defensora Pública da
Justiça Militar Federal, em beneficio de
Milton Carlos Soares de Oliveira, alegando que o mesmo foi condenado pelo
Conselho Especial de Justiça para a Marinha, em três meses e quinze dias de
prisão, como incurso nas penas do art.
157 do Código Penal Militar, decisão
integralmente confirmada pelo egrégio
Superior Tribunal Militar, buscando-se
a nulidade do processo, a partir do indeferimento da diligência requerida na petição vista em cópia à fl. 8 da presente
impetração, ao fundamento de que o
indeferimento da diligência requerida
feriu o princípio constitucional do direito de ampla defesa.
0 presente habeas carpas deve
ser conhecido mas, no mérito, denegado
a ordem.
Com efeito, a defesa, na petição
vista em cópia às fls. 8, requereu a expedição de ofício à UNISME, para que
esta enviasse ao Juízo «histórico médico, diagnóstico apresentado, e tudo o
que constar na referida unidade de terapia com respeito ao CF Mareio de Carvalho Continha (vítima), no período
compreendido entre o início de 1984,
até 1986; tratamentos sob o acompanhamento dos Drs. Carneiro e Nascimento,
conforme noticiam os autos».
A diligência, como se vê do despacho lançado na própria petição, foi deferido em parte.
Não se conforma a impetrante com
o deferimento parcial de seu pedido,
sustentando assim que houve cerceamento de defesa, tendente a levar à anulação do procedimento.
A pretensão da impetrante não
pode ser atendida, seja porque a diligênda requerida e negada em parte não tem
relação direta como fato ilícito apurado,
consistente no crime de violência contra
superior (art. 157 do CPM), seja porque
não se demonstrou, de forma objetiva,
como competia à impetrante, a ocorrência de efetivo prejuízo para a defesa,
incidindo na hipótese a regra geral
segundo a qual não se proclama nulidade sem prova de prejuízo concreto.
Ademais, as informações prestadas pelo Juiz Auditor ao egrégio Supe-
R.TJ — 150
rior Tribunal Militar, quando do julgamano da correição parcial Sentada pela
defesa do paciente após o indeferimento
da diligência em evidência, deixam claro que tudo que interessava ao processo,
referente à vítima e co-réu Márcio de
Carvalho Coutinho, no que respeita ao
histórico médico do mesmo, na referida
Unidade Integrada de Saúde Mental, já
integravam os autos, o que vem reforçar
a tese da ausência de prejuízo, sendo útil
transcrever parte das referidas informações, como consta dos autos da citada
correição parcial, verbis:
«Tão logo o APF deu entrada neste juizo demos vista ao MPM e ciência à Defensoria de Oficio, conforme
se depreende de fl. 40 (xerox anexa).
No mesmo dia da conclusão proferimos duas decisões (cópias anexas), inclusive colocando em liberdade o ora requerente, apesar da gravidade da conduta que lhe era atribuída.
A exordial acusatória foi recebida
por despacho datada de 13-2-92 (cópia anexa) e no prazo legal (fl. 267).
Os acusados foram interrogados
no mesmo dia 11-3-92 (fls. 306/7,
308/9, 31W11, 312 e 313/v.), ocasião
em que determinamos a vinda aos
autos da ficha médica dos acusados,
conforme ata de fl. 314 (xerox anexa), por terem os acusados deixado
evidenciado que vinham passando por
problemas emocionais.
Os acusados arrolaram, no prazo
legal, suas testemunhas (em 23-31992), sendo que a defesa do requerente, CB Milton, a destempo, fora
do prazo previsto no artigo 417, § 2°,
do CPPM, arrolou mais de uma testemunha, conforme petição de fl. 300
(xerox anexa), que deferimos.
A Unidade Integrada de Saúde
Mental (UISM), atendendo requisi-
239
ção deste Juiz, enviou, através de Ofí-
cio n° 196, os documentos confidenciais dos acusados, incluindo-se uma
Informação Médica e um Parecer que,
juntamente com as Fichas de Atendimento, serviram de suporte ao laudo
médico de fl. 345, que se reporta a
todos os atendin2entos do Oficial acusado, desde 1986 (documentos anexos).
Dando-se vista as partes para diligências (em 8-4-92), nos termos e
prazos estabelecidos no artigo 427 do
CPPM, a Defesa do CB Milton em
requerimento de fl. 361, dando uma
visão distorcida do interrogatório do
outro acusado, afirma que o mesmo
esteve em tratamento na UISM 'no
período compreendido entre o infido de 1984 até 1986', quando na
citada peça refere-se a tratamento de
três meses e devido a problema pessoal e familiar.
Na própria petição indeferimos,
fundamentadamente, a diligência.
A Defesa do CB Milton pede reconsideração, através da petição de
fl. 363, que mereceu o despacho de
fl. 364, que preferiu omitir em suas
peças xerocadas que, entretanto,
anexamos à presente.
À fl. 365 determinamos que viessem aos autos o que mais existisse na
UISM, apesar de, a priori sabermos
que nada mais existia, porquanto na
requisição que fizéramos à fl. 320, no
início da instrução, englobava todo o
histórico médico dos mesmos.
À fl. 366, encontram-se informe
do referido nosocômio, ou seja estava cumprida a diligência da Defesa.
A Defesa do CB Milton, em petição que poderá ser apreciada pelo E.
SIM insiste na absurda diligência
que mereceu o nosso indeferimento.
240
R.TJ. — 150
À fl. 368, a Defesa do CB Dalton
requer reconsideração do despacho
anterior e pede nova diligência, agora
fora do prazo legal, cujo despacho
encontra-se na própria petição, e devidamente fundamentado.
Srs. Ministros,
Em momento algum praticamos
qualquer ato que mereça ser corrigido,
por erro ou omissão inescusáveis,
que seja abusivo ou tumultuário.
Ao contrário, temos evitado diligências inúteis e zmtiéticas.
A prova no processo penal é dirigida ao Juiz, para que o mesmo forme
seu convencimento, e cumpre às partes apresentarem os objetivos de suas
diligências.
A Defesa do 0 Milton, além de
se equivocar na leitura do texto do
interrogatório do outro acusado, também se enganou na fundamentação
de sua insistente diligência, ao dizer
no item 11 da Correição:
«Por outro lado, os próprios
assentamentos militares do co-réu
CF Márcio, às fls.243 e244, registram LESM obtida no 2° sem/84,
no período compreendido entre 2610-84 a 25-4-85, corroborando aos
já mencionados documentos de fls.
338 e 302, em amparo, portanto, à
pretensão da defesa, o que torna
mais gravoso, data varia o r. despacho impugnado, considerandose que, o direito processual constitucional, consubstanciado no contraditório e na ampla defesa, tem
sido consagrado tanto doutrinária
como jurisprudencialmente.»
A licença constante do documento de fls. 243/244, citada pela defesa,
refere-se à licença especial denominada de licença-prêmio e referente
ao 1° decênio, nada tendo a ver com
licença para tratamento médico.
Finalmente, e em especial, entendemos que os documentos trazidos
aos autos, principalmente o laudo
médico de fl. 345, que a defesa omitiu entre as peças que entendeu indispensáveis a levar ao conhecimento
de VV. Exas., que juntamos àpresente, reportando-se à toda a vida pristina do co-réu CF Márcio, já fornece
elementos suficientes ao exame da
matéria
Os fatos passados na vida privada do co-réu CF Manto em 1984
não merecem qualquer registro nos
seus assentamentos e, caso viessem
aos autos, em nada alterariam o conteúdo do Laudo de fl. 345, e só teria
o condão de avançar em intimidades
familiares que só poderiam vir à colação por determinação do Juiz ou
por iniciativa do próprio paciente,
caso contrário, atropelar-se-ia a ética
médica
Aliás, a Defesa do mencionado
acusado, em petição trazida aos autos, apresenta seu repúdio pela Defesa do CB Milton (xerox anexa).» (fls.
145/147).
Está assim demonstrada, ademais,
através das informações acima transcritas, a impertinência da diligência requerida pela defesa do paciente.
Pelo exposto, somos pelo conhecimento e denegação da ordem.
É O pantera.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Sydney Sanches (Rela-
tor): 1.0 babam corpos é impetrado contra o v. acórdão do E Superior Tribunal
Militar, que, mantendo indeferimento de
diligência requerida pela impetrante, em
favor do paciente (fl. 8), indeferiu a correição parcial reproduzida às fls. 13/19.
2. É este o teor desse acórdão (fls. 2129):
R.TJ —150
«Superior Tribunal Militar — Correição Parcial n° 1.404-O/RJ
Correição parcial. Art. 498 do
CPPM. Incensurável a decisão recorrida
que indeferiu reiteradas diligências divorciarias da matéria tratada na ação penal. Indeferimento da Correição. Decisão unânime.
Relator: Ministro Alte Esq. José do
Cabo Teixeira de Carvalho. 12,4arente: Milton Carlos Soares de Oliveira,
CB. Mar.
Recorrida: Os despachos do Exmo.
Sr. Juiz-Auditor da P Auditoria de Marinha da 1° CJM, de 28-4 e 30-4-92,
proferidos nos autos do Processo n°
1/92-9, com pedido de liminar no sentido de suspenda o citado processo até o
julgamento da presente correição.
Advogada: Dra. Adelcy Maria Rocha Simões Corrêa
Vistos, relatados, etc.
A defesa do CB Mar. Milton Carlos
Soares de Oliveira, com fundamento
no art. 498 do CPPM, requer Correição
de Decisões do Exmo. Dr: Juiz-Auditor
da la Auditoria de Marinha da 1*
proferidas nos autos do Processo n°
1/92-9, aduzindo em síntese, o seguinte:
Através de denúncia foi instaurado o
Processo n° 1/92-9 contra o CF Márcio
de Carvalho Coutinho e o CB-EP Milton Carlos Soares de Oliveira, aos
quais foram imputadas as condutas antijurídicas ínsitas nos arts. 209 para o
primeiro e nos arts. 157 e 209, todos do
CPM, para o segundo denunciado. Os
fatos narrados na denúncia ocorreram
an 29-11-91 e 2-12-91.
Com o prosseguimento normal do
frito, após a oitiva das testemunhas do
MPM e da defesa «e vindo aos autos por
determinação do Colendo Conselho Especial de Justiça, documentos encaminhados pela UISM relacionados aos
dois co-réus», sendo o relatório de aten-
241
dimento médico do CF Márcio relativo
a atendimentos médicos realizados em
1986, «abriu-se vistas às partes para os
fins do artigo 427 do CPPM».
Com base no relatório de atendimento médico do CF Márcio e em seu interrogatório onde informou que leve
problemas em 1984, de ordem pessoal
familiar, o que levou o interrogando a
um tratamento de três meses na UISM',
a ilustre Advogada-de-Ofício requereu
diligências 'no sentido de ser encaminhado ao juízo, conforme referência feita no interrogatório (fl. 302, in line) e
através do documento de fl. 338, histórico médico, diagnóstico apresentado, e
tudo o que constar na referida Unidade
de Terapia com respeito ao CF Márcio
de Carvalho Coutinho, no período
compreendido entre o início de 1984 até
1986...' Requereu, igualmente, a Defesa, expedição de ofício à Casa do Marinheiro, no sentido de ser enviado ao
juízo cópia do detalhe de serviço do dia
29-11-91.
A primeira diligência foi indeferida
pelo douto Juiz-Auditor nos seguintes
termos:
«Defiro em parte eis que a diligência se refere a tratamento que iniciou-se em 1984 e continuou até 1986,
quando o interrogando refere-se a tratamento de três meses e devido a
problemas pessoal e familiar que nada
têm a ver como fato, objeto do presente. Os documentos de fls. 336/345,
reportam-se a tratamento do acusado
desde 1986 e são por demais minudentes.» (fl. 19).
Inconformada com o referido Despacho, a Defesa solicitou reconsideração,
'no que foi atendida pelo r. Juízo, que
determinou ofício para seu cumprimento, quando, então, veio aos autos o documento da UISM de fl. 366 informando que lá não existiam registros do período solicitado'.
242
R.T.J. — 150
Argumentando que referida informação entra em contradição com os documento s de fl. 338 (relatório de
atendimento médico do CF Márcio e fl.
302 (interrogatório do referido Oficial),
a ilustre defensora apresentou o requerimento de fl. 21 onde assevera: '... por
não haver sido atendido ainda o seu
pedido, com os esclarecimentos que entende imprescindíveis ao desempenho
de seu munus é o presente para requerer
a V. Ex.' se digne em determinar a expedição de oficio ao CAIO Carlos Barbosa Carneiro (DSM), no sentido de
ser infonnado se o CF Márcio de Carvalho Coutinho esteve sob tratamento
com o mesmo, no período requerido,
qual o diagnóstico apresentado àquela
época, e quais outros esclarecimentos
sobre a evolução do tratamento que possa prestar'. (fl. 21)
Tal requerimento foi indeferido pelo
Exmo. Dr. Juiz-Auditor nos seguintes
termos:
'Indefiro o requerido eis que se
não há registros da UISM o atendimento foi de natureza particular. Registramos a insistência no equívoco
da requerente eis que o CF Márcio
não ficou em tratamento de 1984 a
1986 e sim por três meses devido a
problemas de ordem pessoal e familiar que nada tem a ver com o deslinde da causa.' (fl. 21)
Novamente inconformada com o indeferimento de sua postulação, volta a
Defesa a solicitar reconsideração (fl. 22)
tendo o douto Magistrado mantido integralmente os Despachos impugnados.
Repudiando tal decisão, argumenta a
Advogada-de-Oficio que «cerceou-se à
defesa o direito ao esclarecimento de
matéria umbilicahnente ligada ao desate
da quaestio, em que pese, lhe haver sido
indeferida diligência, porque considerada intempestiva, quando, data vertia,
não encerrada a prova da mesma».
E prossegue argumentando:
«Por outro lado, os próprios assentamentos militares do co-réu CF
Márcio, às fls. 243 e 244, registram
LESM obtida no 2° sem/84, no período compreendido entre 26-10-84 a
25-4-85, corroborando aos já mencionados documentos de fls. 338 e
302, em amparo, portanto, à pretensão da defesa, o que torna mais gravoso, data veria, o r. despacho impugnado, considerando-se que, o direito processual constitucional, consubstanciado no contraditório e na
ampla defesa, tem sido consagrado
tanto doutrinária como jurisprudencialmente.»
Em seguida, ilustra sua petição com
farta jurisprudência relacionada ao caso
em apreço.
Finalizado, 'requer-se' a essa egrégia corte castrense, seja corrigido o
erro com o deferimento do solicitado
pela defesa (fl. 361, inciso I, de conformidade com fl. 368) pois só assim, feita
a correição solicitada, poderemos caminhar para a mais completa segurança
da distribuição da justiça.
Requer-se outrossim, por esse tribunal não o determinando o juízo a quo, a
liminar suspensão do processo, até a
solução da presente correição, já que,
em se tratando de matéria de prova , tal
medida tem sido acolhida pela iterativa
jurisprudência de nossos tribunais (fls.
3/9).
A ilustre defensora anexou os documentos acostados às fls. 10 usque 23.
Informações prestadas pelo Exmo.
Sr. Juiz Auditor, Dr. Carlos Alberto
Marques Soares às fls. 24/28, com documentos anexos às fls. 29/45.
Com vistas à Procuradoria-Geral da
Justiça Militar, pelo parecer de fls. 50/58,
o insigne Procurador, Dr. Marco Antonio Pinto Biliar opinou pelo 'indeferi-
R.T.J — 150
mento da Correição, diante da ausência
de qualquer de seus pressupostos'.
É o relatório.
Fruto de obstinação da ilustre defensora do CB Milton Carlos Soares de
Oliveira, aporta a esta Corte de Justiça
a presente Correição Parcial visando trazer aos autos do Processo n° 1/92-9 fatos
relacionados à vida privada do co-réu CF
Márcio de Carvalho Cadinho, ocorridos entre 1984 e 1986, cujas informações, inclusive, não consta de registros
e 'nada tem a ver com a prova relacionada com os fatos apurados na Ação
Penal Militar em curso na P Auditoria
de Marinha'. (Parecer, fl. 9)
A informação precisa do FJC1310. Dr.
Juiz Auditor (fls. 24/28) esclarece os
fatos como a seguir verbis:
«Tão logo o APF deu entrada neste juízo, demos vista ao MPM e ciência à Defensoria de Ofício, conforme
se depreende da fl. 40 (xerox anexa).
No mesmo dia da conclusão proferimos duas decisões (cópias anexas), inclusive colocando em liberdade o ora requerente, apesar da gravidade da conduta que lhe era atribuída.
A excedia' acusatóriafoi recebida
por despacho datado de 13-2-92 (cópia anexa) e no prazo legal (fl. 267).
Os acusados foram interrogados
no mesmo dia 11-3-92 (fls. 301/2v e
303/4v) sendo que as testemunhas
arroladas pelo MPM depuseram no
dia 18-3-92 (fls. 306/7, 308/9,
310/11, 312 e 313/v), ocasião em que
determinamos a vinda aos autos da
ficha médica dos acusados, conforme ata de fl. 314 (xerox anexa), por
terem os acusados deixado evidenciado que vinham passando por problemas emocionais.
Os acusados arrolaram, no prazo
legal, suas testemunhas (23-3-92), sai-
243
do que a Defesa do requerente, CB
Mito; a destempo, fora do prazo
previsto no artigo 417, § 2° do CPPM,
anulou mais uma testemunha, conforme petição de fL 330 (xerox anexa),
que deferimos.
A Unidade Integrada de Saúde
Mental (UISM), atendendo requisição deste Juiz, enviou, através do
Ofício n° 1%, os documentos confidenciais dos acusados, incluindo-se
unia Informação Médica e um Parecer que, juntamente com as Fichas de
Atendimento, servirem de suporte ao
laudo médico de fl. 345, que se reporta a todos os atendimentos do Oficial acusado, desde 1986 (documentos anexos).
Dando-se vista as partes para diligências (em 8-4-92), nos termos e
prazos estabelecidos no artigo 427 do
CPPM, a Defesa do CB Milton em
requerimento de fl. 361, dando uma
visão distorcida do interrogatório do
outro acusado, afirma que o mesmo
esteve em tratamento na UISM `no
período compreendido entre o inido
de 1984 até 1986', quando na citada
peça refere-se a tratamento de três
meses e devido a problema pessoal e
familiar.
Na própria petição indeferimos,
fundamentadamente, a diligência.
A Defesa do CB Milton pede reconsideração, através da Petição de
fl. 363, que mereceu o despacho de
fl. 364, que preferiu omitir em suas
peças xerocadas que, entretanto,
anexamos à presente.
À fl. 365 determinamos que viessem aos autos o que mais existisse na
UISM, apesar de, a priori sabermos
que nada mais existia, porquanto na
requisição que fizéramos à fl. 320, no
início da instrução, englobava todo o
histórico médico dos mesmos.
R.T.J. —150
À fl. 366, encontra-se informe do
referido nosocômio, ou seja estava
cumprida a diligência da Defesa.
A Defesa do CB Milton, em petição que poderá ser apreciada pelo E.
STM, insiste na absurda diligência
que mereceu o nosso indeferimento.
À fl. 368, a Defesa do CB Milton
requer reconsideração do despacho
anterior e pede nova diligência, agora
fora do prazo legal, cujo despacho
encontra-se na própria petição, e devidamente fundamentado.
Srs. Ministros,
Em momento algum praticamos
qualquer ato que mereça ser corrigido, por erro ou omissão inescusáveis, que seja abusivo ou tumultuário.
Ao contrário, temos evitado diligências inúteis e aidéticas.
A prova no processo penal é dirigida ao Juiz para que o mesmo forme
seu convencimento e cumpre às partes apresentarem os objetivos de suas
diligências.
A Defesa do CB Milton, além de
se equivocar na leitura do texto do
interrogatório do outro acusado, também se enganou, na fundamentação
de sua insistente diligência, ao dizer
no item 11 da Correição:
«Por outro lado, os próprios assentamentos militares do co-réu
CF Márcio, às fls. 243 e 244,
registraram LESM obtida no 2°
semJ84, no período compreendido entre 26-10-84 a 25-4-85, corroborando aos já mencionados documentos de fls. 338 e 302, em
amparo, portanto, à pretensão da
defesa, o que torna mais gravoso,
data venta, o r. despacho impugnado, considerando-se que, o direito processual constituciaal, consubstanciado no contraditório e na
ampla defesa, tem sido consagrado tanto doutrinária como jurisprudencialmente.»
A licença constante do documento de
fls. 243/244, citada pela defesa, referese à licença especial denominada de licença-prêmio e referente ao 1° decênio,
nada tendo a ver com licença para tratamento médico.
Finalmente, e em especial, entendemos que os documentos trazidos aos
autos, principalmente o laudo médico
de fl. 345, que a defesa omitiu entre as
peças que entendeu indispensáveis a levar ao conhecimento de VV. Exas., que
juntamos à presente, reportando-se à toda
a vida prístina do co-réu CF Márcio, já
fornece elementos suficientes ao exame
da matéria.
Os fatos passados na vida privada do
co-réu CF Márcio em 1984 não mereceram qualquer registro nos seus assentamentos e, caso viessem aos autos, em
nada alterariam o conteúdo do laudo de
fl. 345, e s6 teria o condão de avançar
em intimidades familiares que só poderiam vir à colação por determinação do
Juiz ou por iniciativa do próprio paciente, caso contrário, atropelar-se-ia a ética
médica.
Aliás, a Defesa do mencionado acusado, em petição trazida aos autos, apresenta seu repúdio ao requerido pela Defesa do CB Milton (xerox anexa).
O douto parecerista, Dr. Marco Antonio Pinto Binar assim comenta as decisões hostil] Tsclag:
«Data venta, o juízo não cometeu
qualquer erro ou omissão inescusáveis ou ato abusivo ou tumultuário
que deva ser corrigido. Não há qualquer cerceamento de defesa a ser obviado. Sob nossa ótica, trata-se de
prova despropositada, sem qualquer
referência ou nexo com a matéria
debatida na ação penal.»
R.T.J —150
A corroborar tudo o que acima foi
discutido, colacionamos jurisprudência
desta Egrégia Corte Castrense consubstanciada na Correção Parcial if 1348-5,
decisão unânime de 8-9-88. Recurso Criminal n° 5.817-1, decisão unânime de
8-6-88 e o Recurso Criminal n's 5.973-9,
decisão de 7-3-91, Relator o Eminente
Ministro Jorge Frederico Machado
de Sant'Anna, cuja ementa transcrevemos verbis:
«Recurso Criminal. I — Conhecidas, ex vi do art. 516 do CPPM as
decisões suscetíveis de impugnação,
através dos recursos em sentido estrito, resulta inconteste, que a hipótese,
ali, não encontra encarte, por justo
lhe faltar os pressupostos objetivos
de admissibilidade. 11 — O ~ame
da quaestlo, que alardeia o cerceamento de defesa, como notório, somente encontra cabimento, na via
recamai da Correição Parcial, segundo a inteligência do art. 498, alínea a
do CPPM. IlI — Escorreito e incensurável o decimam recorrido, que houve por indeferir a repetição de diligências, posto que, além de desnecessárias, se mostram inexeqüíveis,
no lugar e no tempo. IV — A unanimidade, conhecido o pedido como
Correição Parcial, ex vi do art. 498,
alínea a do CPPM, para indeferila, mantendo-se o r. despacho hostilizado.»
Com relação ao pedido de liminar,
para melhor apreciação dos autos, antes
do julgamento do Processo em rInstância, este Relator deferiu o pedido da
Defesa através do Despacho acostado à
fl. 60.
Isto posto,
Acordam os Ministros do Superior
Tribunal Militar, por unanimidade, em
indeferir a Correição Parcial para manter os Despachos impugnados.
Brasília, DF, em 28 de maio de 1992.
245
Ass.: Dr. Antonio Carlos de No1Vfmistro Vice-Presidente, no exercício da Presidência
Ass.: AlteEs q. José do Cabo Teixeira de Carvalho — Ministro Relator.
"Fui presente'
Ass.: Milton Menezes da Costa Filho, Procurador-Geral da Justiça Militar>
Como se vê, tanto o Juiz Auditor
quanto o E Superior Tribunal Militar demonstraram a desnecessidade e a impertinência da prova pretendida pela defesa do
réu, ora paciente.
E na impetração de fls. 2/6 não conseguiu a impetrante demonstrar a necessidade e a pertinência de tal prova. Menos
ainda que sua falta causou prejuízo à defesa.
De resto, a sentença de primeiro grau,
e os acórdãos que julgaram a apelação e os
embargos infringentes interpostos em favor do ora paciente, examinaram, aprofundadamente, os elementos de prova reunidos
nos autos e concluíram por sua condenação, quanto ao delito de violência contra
superior (art. 157 do Código Penal Militar)
(fls. 113/132, 151/172 e 17W196).
Destaco do acórdão, proferido nos
embargos infringentes, os tópicos destinados à fundamentação e à conclusão (fls.
18W196):
«O ora embargante foi denunciado
por dois fatos delituosos.
O primeiro, ocorrido em 29 de novembro de 1991 e o segundo, em 2 de
dezembro do mesmo ano.
O embargante, juntamente, com o coréu foi absolvido quanto aos fatos ocorridos na segunda data, tendo a sentença
a quo transitado em julgado nessa parte,
em razão do conformismo do Ministério
Público Militar.
O ora embargante foi condenado, pelo
Conselho Especial de Justiça, em razão
gania
246
R.TJ. — 150
dos fatos ocorridos em 29 de novembro
de 1991, à pena de 3 (Cês) meses e 15
(quinze) dias de prisão, como incurso no
art. 157 do Código Penal Militar, de o
parágrafo 3°, do mesmo artigo.
Este Tribunal, por maioria de votos,
negou provimento ao apelo então interposto, o que possibilitou a oposição dos
presentes Embargos.
Os Ministros Antonio Carlos de Nogueira, Revisor, Chentban Rosa Filho e
AMO Fagundes, deram provimento ao
apelo da defesa, para absolver o ora
embargante, com base no artigo 439,
letra B, do Código de Processo Penal
Militar.
A divergência no julgamento anterior está em que a douta minoria entendeu que a ação praticada pelo ora embargente é atípica.
Tal divergência obriga que se reexamine a prova dos autos.
Foram ouvidas, em juizo, doze testemunhas, sendo arroladas cinco na denúncia, quatro pela defesa do Oficial e
três pela defesa do ora embargante.
Dessas testemunhas, apenas, uma —
o SO Manoel Senécio Mão, fls. 310 e
verso,assistiu aos fatos ocorridos, a 29
de novembro de 1991, e pelos quais foi
o CD Mar. Milton Carlos condenado,
enquanto que a testemunha de defesa,
Wilder Barroso, 2° SGT — ER que
embora não tenha assistido aos fatos
ocorridos a 29 de novembro de 1991,
sobre os mesmos conversou com o embargante e assim afirmou, à fl. 325:
«que, com relação ao fato ocorrido no dia 29, o CB Milton disse ao
depoente que agira daquela forma,
porque estava 'de cabeça quente', tendo demonstrado arrependimento pelo
fato;»
A testemunha SO Brlão, testemunha
presencial, às fl. 310 e verso, relatou:
«que no dia 29, o depoente se
dirigiu à sala do Vice-Diretor, levando uns documentos que precisariam
ser assinados; que após a assinatura
dos mesmos, o Vice-Diretor chamou
o depoente para que o acompanhasse
na inspeção que iria ser feita na incumbência; que pôde verificar, acompanhando o Sr. Vice-Diretor que as
quadras externas estavam sujas, e havia grama alta no local, fato que foi
chamado atenção pelo vice-diretor,
que imediatamente mandou que chamasse à sua presença o CB Milton
que era o responsável pela manutenção do local; que o depoente se dirigiu ao CB Milton, e como o mesmo
tratava da manutenção da piscina, com
roupa própria, determinou que o mesmo trocasse de roupa e comparecesse
à presença do Vice-Diretor; que o
Vice-Diretor não estava aparentemente nervoso; que ao ser interpelado
pelo Cmte. Márcio, que fez de forma
normal, o CB Milton disse ao Oficial
que conhecia sua incumbência, e que
sabia que estava pegando, e que estava dando serviço, um por um; que o
depoente não pode afirmar com precisão se o Comandante, teria dito:
«Venha cá, porra!», ou «Vem cá, seu
porra!»; que o CB Milton disse que
não precisava ir ver a grama porque
de onde ele se encontrava dava para
ver a grama; que o Comandante falava
normalmente com o CB Milton, não
era em tom agressivo, e que ele disse:
«Venha cá, que vou lhe apresentar a
grama», e o CB Milton, que não precisava porque já conhecia a grama;
que neste momento o Cmte. jáestava
voltado para o local, em movimento,
já de costas para o CB Milton; que
CD Milton, indo em direção ao Comandante, quando o CB Milton empurrou o Comandante e o agrediu
com um soco, o qual parece ao depoente, que teria atingido o ombro do
R.T.J —150
Oficial, e voltou-se e se atracou com
o CB Milton; que, melhor dizendo,
entrou em choque como CB Milton;
que o depoente não precisou naquele
dia, ou percebeu qualquer lesão, tanto num quanto noutro acusado; que
melhor esclarecendo, o CB Milton
empurrou o Oficial pelas costas, o
qual perdeu o equilíbrio e, impulsionado que foi à frente, ato continuo em
que recebeu a agressão, soco, do CB
Milton; que o Oficial, tão logo se
equilibrou, virou-se de frente para o
CB Milton e revidou entrando em
soco e pontapés os dois, sendo imediatamente separados pelo depoente.»
O ora embargante, ao ser interrogado, às fls. 303 e seguintes, declarou:
«que o interrogando considera
como verdadeira a imputação que lhe
é feita na denúncia, com relação ao
fato ocorrido no dia 29-11-91 (...);
que no dia 29, como já registrado
anteriormente, o interrogando estava
em efetivo serviço na piscina da Casa
do Marinheiro, e era o único «EP», a
bordo quando, por volta das dez horas, foi chamado pelo SO Brião, para
que comparecesse à presença do CF
Márcio; que o mesmo estava muito
exaltado e gesticulava muito, e na
presença do SO, perguntou ao interrogando porque ele não tinha cuidado da grama, da quadra de vôlei,
tendo o interrogando esclarecido ao
Oficial que a faina era grande e que,
no momento, precisava, como prioridade, liberar a piscina, que a grama
da citada quadra não atrapalhava a
prática do esporte, pois ficava entre
as pedras; que o Oficial ainda perguntou ao interrogando se tinha visto
a grama; que o interrogando respondeu ao Oficial, que estava vendo a
grama; que a resposta não foi em tom
de deboche, e então o Oficial, disse
247
o seguinte: «Vamos lá ver, porra!»,
mandando que o interrogando se deslocasse até o local da grama; que o
interrogando nesse momento agrediu
o Oficial com um soco, e que o mesmo estava de frente para o interrogando; que revidou e entrou em luta
corporal com o ora acusado, tendo
sido os dois separados pelo SO Brião,
que o soco atingiu o Oficial no rosto.»
Inconteste, pela prova produzida que
o ora embargante, no dia 29 de novembro de 1991, após ser chamado a atenção
sobre a grama existente, perto da quadra
de vôlei, e, ainda, não retirada, findou
por agredir seu superior, o CF Márdo
Coutinho.
Afirma-se, no voto vencido, sustenta-se, nas razões dos Embargos e no
parecer da Douta Procuradoria-Geral da
Justiça Militar, que o CF Márcio Comlinho, se despiu de sua condição de superior ao dirigir-se ao embargante, para
reclamar do corte da grama, levando
este último a agir como agiu.
O voto vencido, as razões dos embargos e o parecer da Procuradoria-Geral
da Justiça Militar entenderam que o ora
embargante agiu acobertado, pelo contido no inciso II, do artigo 47 do Código
Penal Militar, que dispõe:
«Artigo 47: Deixam de ser elementos constitutivos do crime:
1 — (omissis)
II —A qualidade de superior
ou a de inferior, a de Oficial de dia,
de serviço ou de quarto, ou a de sentinela, vigia ou plantão quando a ação
é praticada em repulsa a agressão.»
Data veria, não é isso que se
colhe da prova coligida.
A expressão proferida pelo co-réu,
CF Márcio Coutinho, através da qual se
procura ajustar a atitude do embargante
ao preceituado no inciso II do artigo 47
248
R.T.J. — 150
do Código Penal Militar está a merecer
apreciação.
Tudo gira em torno das expressões:
«Vem cá, seu porra!» ou «Venha cá, porral»
Não resta a menor dúvida de que a
primeira delas é ofensiva à honra da
pessoa a quem é dirigida, em que pese a
palavra última da expressão, de tão chula, com a 'modernidade' de nossa sociedade, infelizmente, já é ouvida corriqueiramente, proferida por adultos, de
ambos os sexos, em ambiente não condizente com tal linguajar, por adolescentes e crianças e até mesmo nos programas de televisão, que invadem os
lares brasileiros, nos mais diversos rincões.
A expressão de tão chula, parece comezinha, encontran-se hoje no Novo
Dicionário Aurélio, l a edição, 12' impressão, 1975.
Entretanto, vejamos o que consta da
prova
O CF Márdo Condito nega tenha se
dirigido ao embargante, empregando aexpressão: 'Venha cá, seu para!', para, em
outra parte de seu intarogatório afirmar
que ao dirigir-se ao C113 Milton Carlos ter
dito: «pena, venha ver o mato.»
Por sua vez, o embargante afirma que
o Oficial ao dirigir-se àsua pessoa disse:
«Vamos lá ver, porra»; o que vem a
confirmar a negativa do co-réu CF Márdo Coudt.
Por sua vez, a testemunha presencial,
o SOBrião, à fi. 310, ao depor emito,
afirmou não poder precisar a expressão
proferida pelo Oficial co-réu, nestes autos.
Não se pode dizer, em razão da prova
constante dos autos, que o ora embargente tenha desferido um soco no rosco
de seu superior em repulsa a agressão
verbal da parte deste.
Não se pode afirmar que a qualidade
de superior, do co-réu, CF Márdo Couanho, elemento constitutivo do crime
de violência contra superior Laja desaparecido, quando da agressão praticada
pelo, ora embargante, CB Mar Milton
Carlos, no dia 29 de novembro de 1991,
contra Oficial Superior.
Não há que modificar-se o acórdão
embargado.
Assim, acordam os ministros do Superior Tribunal Militar, por maioria de
votos, em rejeitar os Embargos interpostos por Milton Carlos Soares de Oliveira, Cabo daMarinha, paramente: o Acórdão embargado.
Superior Tribunal Militar, 22 de abril
de 1993.
Ass.: Ten. Brig. do Ar. Cherubim
Rosa Filho, Ministro-Presidente.
Ass.: Dr. Antonio Carlos de Seiras
Telles, frfinistro,Relator.
Ass.: Alte. Esq. José do Cabo Teixeira de Carvalho, Ministro-Revisor
'Fui presente'
Ass.: Dr. Milton Menezes da Costa
Filho, Procurador-Geral da Justiça Militar».
Ora, não se pode inferir, em face da
fundamentação do acórdão transcrito (que,
aliás, não está sendo aqui impugnado), que
a prova pretendida pela defesa do réu, ora
paciente, considerada desnecessária e até
impertinente, pudesse, por si só, elidir os
elementos que foram considerados nos três
julgamentos de mérito (sentença, acórdãos
da apelação e dos embargos infringentes).
Assim, indemonstrado real prejuízo
para a defesa, é de se indeferir o habena
coreus, como demonstrou, aliás, o parecer
do Ministério Público federal.
9. Isto posto, indefiro o pedido.
R.T.J —150
EXTRATO DA ATA
HC 70.476 — DF -- Rel.: Min. Sydney
Sanches. Pacto.: Milton Carlos Soares de
Oliveira. Impte.: Adelcy Maria Rocha Simões Conta. Coator: Superior Tribunal
Militar.
Decisão: A Turma indeferiu o pedido de
«habeas corpus», nos termos do voto do
Relator. Unânime.
249
Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Sydney Sanches, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e limar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Artur Castilho
Pereira Neto.
Brasília, 28 de setembro de 1993 —
Ricardo Dias Duarte, Secretário.
HABEAS CORPUS N° 70.521 — SP
(Segunda Turma)
Relator. O Sr. Ministro Marco Aurélio
Paciente e Impetrante: Carlos Alberto de Almeida — Coator: Tribunal de
Justiça do Estado de São Paulo
Intimação. Defensoria pública. Pessoalidade. Por força da
norma inserta no 4 5' do artigo 5° da Lei n° 1.060, de 5 de fevereiro de
1950, com a redação dada pela Lei n° 7.871/89, a intimação do defensor
público ou de quem exerça cargo equivalente há de se fazer de forma
pessoal. O presto é aplicado quando constatada a atuação da Procuradoria de Assistência Judiciária da Procuradoria-Geral do Estado de São
Paulo. O desatendimento à citada formalidade, porque essencial à valia
dos atos, resulta na nulidade, impondo-se concessão de ordem para que
se observe o dispositivo.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos,
em deferir o «habeas corpos», nos termos
do voto do Ministro Relator.
Brasília, 14 de setembro de 1993 — Néri
da Silveka, Presidente — Marco Aura),
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Marco Aurélio: O Impetrante e Paciente, mediante peça subscrita pelo Procurador do Estado de São Paulo,
Dr. Waldir Francisco Honorto Júnior, pleiteia a concessão da ordan, afim de que seja
reaberto o prazo para interposição do tear
so cabível contra o acórdão do Tribunal de
Justiça do Estado de São Paulo que implicou o desacollihnento de pedido formulado
em apelação. Em síntese, aponta que, em
razão da Suficiência financeira que atravessa, gozou da assistência judiciária do
Estado e que, assim, a intimação para a
ciência do que decidido pelo egrégio Tribunal teria que ocorrer com observância ao
disposto no artigo 5° da Lei n° 1.060, de 5
de fevereiro de 1950. Este habeas corpos
foi impetrado inicialmente perante o Superior Tribunal de Justiça, que declinou da
competência, conforme decisão de fl. 28.
Distribuído inicialmente ao Ministro Sepúlveda Pertence, declarou este impedimento (fl. 32). À fl. 34, deferi liminar para
suspender a eficácia de audiência admonitória.
R.T.J.-150
250
Aos autos vieram as informações de fls.
45 a 48, nas quais o Vice-Presidente do
Tribunal de Justiçado Estado de São Paulo,
Desembargador Dagoberto Saltes Cunha
Camargo, revela a tramitação da ação penal
também que o acórdão prolatado pela
Corte teve publicidade mediante inserção
em exemplar do Diário Oficial. Reconhece-se a inexistência da intimação pessoal,
contrapondo-se ao pleito as normas insculpidas no Regimento Interno daquele Tribunal.
Remetidos os autos à Procuradoria-Geral da República, oficiou o proficiente Subprocurador-Geral, Dr. Édson Oliveira de
Almeida, assim sintetizando tal parecer:
dntimação. Defensor público. Determina o artigo 5° do § 5° da Lei n° 1.060/50
(redação dada pela Lei 7.871/89) que o
defensor público seja intimado pessoalmente de todos os atos do processo em
ambas as instâncias, contando-se-lhe em
dobro todos os prazos. Caso em que,
após julgamento de apelação pelo Tribunal de Justiça, o processo baixou à
origem sem que do acórdão fosse intimado pessoalmente o defensor público.
Parecer pelo deferimento da ordem
para realização da correta intimação do
defensor público e conseqüente reabertura do prazo de recurso.» (fls. 67 a 72)
Recebi os presentes autos para estudo
em 30 de agosto de 1993, liberando-os para
julgamento em 4 do mês seguinte (fl. 73).
É o relatório.
VOTO
deral. Os integrantes dos Tribunais de Justiça dos Estados estão submetidos à jurisdição direta, nos crimes comuns e de responsabilidade, do Superior Tribunal de Justiça, o que atrai a pertinência da alínea c do
citado inciso, no sentido de que compete ao
Superior Tribunal de Justiça processar e
julgar originariamente os «habeas corpus»
quando o coator ou o paciente for qualquer
das pessoas mencionadas na alínea a, ou
quando o coator for Ministro de Estado,
ressalvada a competência da Justiça Eleitontl. A De tração, em si, não é dirigida
contra o • gão, mas conta aquele que o
apresenta. Todavia, até aqui, este não tem
sido o entendimento da maioria, razão pela
qual coloco em plano secundário a convicção pessoal, deixando para discutir o tema
em sede própria, a do Plenário, o que j á vem
ocorrendo mediante apreciação da medida
reclamatória n° 341-1-DF. Após o voto do
Relator, Ministro Moreira Alves, dissenti,
pedindo vista o Ministro Francisco Rezek.
Conheço da impetração.
Quanto à matéria de fundo, bem a enquadrou o ilustre Subprocurador-Geral da
República que oficiou neste processo, Dr.
Édson Oliveira de Almeida. O § 5° do artigo 5° da Lei n° 1.060/50 é categórico ao
dispor que:
O Sr. Wmistro Marco Aurélio (Relator): Continuo convencido de que a definição da competência para o julgamento de
habeas corpus ocorre consideradas as pessoas nele envolvidas. É incontroverso que
o Paciente não goza de prerrogativa de foro.
Logo, cabe perquirir a situação daqueles
que integram o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Revela-a a alínea a do
inciso I do artigo 105 da Constituição Fe-
A redação do parágrafo decorreu da edição da Lei n° 7.871/89. É incontroverso
que, no Estado de São Paulo, a Defensoria
Pública tem atuação mediante Órgão da
Procuradoria-Geral do Estado. Assim, incumbia a intimação pessoal. Concedo a
ordem para afastar a declaração de trânsito
em julgado do acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, proferido no
Processo n° 353/90 e determinar que se
e
«Nos Estados onde a assistência judiciária seja organizada e por eles mantida, o defensor público, ou que exerça
cargo equivalente, será intimado pessoalmente de todos os atos do processo,
em ambas as instâncias, contando-selhes em dobro todos os prazos».
R.T.J —150
proceda à intimação pessoal do Procurador
que atua na defesa do ora Impetrante e
Paciente.
É o meu voto.
EXTRATO DA ATA
HC 70.521 — SP — Rel.: Min. Marco
Aurélio. Pacta.: Carlos Alberto de Almeida. Impe.: O Mesmo. Coator: Tribunal de
Justiça do Estado de São Paulo.
251
Decisão: Por unanimidade, a Turma deferiu o »habeas corpos», nos termos do
voto do Ministro Relator.
Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Paulo Brossard, Carlos Venoso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Haroldo Ferraz
da Nóbrega.
Brasília, 14 de setembro de 1993 —
José Wilson Aragão, Secretário.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 114306 —SP
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Carlos Venoso
Recorrente: Ccanponel — Componentes Elétricos Ltda. —Recorrido: Estado
de São Paulo
Consfiluelonal. Tributário. ICM Direito de crédito pela entrada de matéria-prima intpootada com isenção do imposto.
1 — Não tendo o acórdão decidido a questão constitucional
posta no recurso extraordinário, dele não se conhece.
II — RE não conhecido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por decisão unânime, não conhecer do recurso extraordinário.
Brasília, le de dezembro de 1992 —Néri
da Silveira, Presidente — Carlos Venoso,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Carlos Valioso: Tratase de ação declaratória ajuizada por Com-
pond Componentes Elétricos Ltda. contra a Fazenda do Estado de São Paulo,
com o objetivo de ver reconhecido o seu
direito de creditamento do ICM, incidente
nas importações de matérias-primas adquiridas com isenção.
A sentença de fls. 1029/1037 julgou o
pedido procedente.
A Décima Câmara Civil do Tribunal de
Justiça do Estado de São Paulo, por unanimidade, deu provimento à remessa oficial
e ao recurso da ré, julgando a autora caracedora da ação. Ententeu o aresto que «em
hipóteses como a dos autos, não se cuida de
simples ação declaratória, mas de ação
constitutiva— condenatória, decorrente do
pedido que encara, com efeito equivalente
ao ação de repetição de indébito». Assim,
»o êxito da demanda estava condicionado
à prova do fato de que o contribuinte de
direito, ou seja, a autora, suportara o encargo ou não passara para o contribuinte de
252
R.TJ. — 150
fato o ônus do tributo de cujo valor pretendeu creditar-se».
Inconformada, a autora interpõe recurso
extraordinário, fundado no art. 119, III, a e
d da Constituição anterior, argüindo a relevância da questão federal.
Sustenta a recorrente que o aresto violou
o art. 23, H, da Carta Magna, bem como
divergiu da jurisprudência desta Corte.
Inadmitido o recurso na origem, subiram os autos por força do provimento do
agravo de instrumento.
A ilustre Subprocuradora-Geral da República Odflia Ferreira da Luz Oliveira, em
parecer de fls. 1180/1181, opina pelo não
conhecimento do recurso extraordinário.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Valioso (Relator): Destaco do parecer da Procuradoria.
Geral da República, lavrado pela ilustre
Subprocuradora-Geral Odflia da Luz Oliveira:
II
Falta pressuposto de admissibilidade
do recurso: o prequestionamento da matéria constitucional. O acórdão ficou no
plano (subconstitucional) das condições
da ação, negando a legitimidade da recorrente para pleitear a restituição do
tributo. Como não chegou ao mérito da
causa, absteve-se de examinar o princípio da não-cumulatividade do ICM.
III
Assim sendo, opino pelo não-conhecimento do recurso extraordinário.» (fls.
1180/1181).
Está correto o parecer. O acórdão recorrido decidiu a causa no plano das normas
infraconstitucionais. Noutras palavras, a
questão constitucional posta no recurso extraordinário não foi decidida pelo acórdão
recorrido.
Não conheço do recurso.
EXTRATO DA ATA
/(.-)
Segundo o acórdão, a prova produzida demonstra que houve transferência
do encargo aos adquirentes da mercadoria e, assim, tem-se verdadeira repetição
de indébito, para a qual a recorrente não
está legitimada.
RE 114.306 — SP — Rel.: Min. Carlos
Venoso. Reate.: Componel — Componentes Elétricos Ltda., sucessora de Compela
—Componentes Elétricos Lida (Adv.: João
Carlos Nicolella). Recdo.: Estado de São
Paulo (Adva.: Yara de Campos Escudero).
No recurso extraordinário, invocase ofensa ao princípio constitucional da
não-cumulatividade (art. 23, inc. II, da
Constituição de 1967, na redação da
Emenda n° 1, de 1969), bem como matéria infraconstitucional.
Indeferido o recurso, houve agravo
para o Supremo Tribunal Federal, provido, mas ficando preclusa a matéria
infraconstitucional, dado que a argüição
de relevância não foi reiterada.
Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Carlos Valioso, Marco Aurélio e Francisco
Rezeis. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Paulo Brossard. Subprocuradora-Geral da República, a Dra. Odflia Ferreira da
Luz Oliveira.
Decisão: Por unanimidade, a Turma não
conheceu do recurso extraordinário.
Brasília, PI de dezembro de 1992 —
José Wilson Aragão, Secretário.
R.TJ — 150
253
RECURSO EXTRAORDINÁRIO ir 116.761 — AL
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves
Recorrente: Instituto de Administração Financeira da Previdência e Assistência Social — IAPAS — Recorrida: Companhia Integrada de Desenvolvimento Agropecuário de Alagoas — CIDAL
Contribuições para o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço. Prescrição.
— Esta Corte, ao julgar, por seu Plenário, o RE 100.249,
firmou o entendimento, em face da Emenda Constitucional n" 1/69, de
que as contribuições para o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço
não se caracterizam como créditos tributários ou contribuições equiparáveis a tributos, razão por que não se lhes aplica a prescrição qüinqüenal prevista no Código Tributário Nacional.
Recurso extraordinário conhecido e provido.
ACÓRDÃO
qüenal prescricional, previsto no artigo 174 do CTN.
Vistos, relatados e discutidos estes au11 — Apelação desprovida.'
tos, acordam os Ministros da Primeira Tur(fi. 71)
ma do Supremo Tribunal Federal, na confomradade da ata do julgamento e das notas
Este é o entendimento que a maioria
taquigráficas, por unanimidade de votos,
dos componentes desta egrégia Corte
conhecer do recurso e lhe dar provimento,
vem adotando e que também adoto.
nos termos do voto do Relator.
Nesse ruamo sortido, teriapara aponBrasília, 16 de março de 1993 — Motar uma enormidade de precedentes, os
reira Alves, Presidente e Relator.
quais, já é do conhecimento dos ilustres
pares.
RELATÓRIO
No entanto, dispenso-me de enumeO Sr. Ministro Moreira Alves (Relarar ditos precedentes por entender destar): É este o teor do acórdão recorrido,
piciendo.
prolatado em embargos infringentes pelo
Rejeito os embargos.
extinto Tribunal Federal de Recursos:
É como voto.» (fi. 82)
«Por primeiro há de se transcrever o
Opostos embargos de declaração, foram
acórdão lavrado pelo eminente Ministro
eles rejeitados por cresto, onde se lê:
Pádua Ribeiro:
«No confuso fundamento dos embar'Execução fiscal. Contribuições
gos,
o embargaste pontilha inúmeros
previdenciárias. FGTS.
dispositivos legais, em uma tentativa de
Prescrição qüinqüenal. Caracterilançar dúvidas sobre a constitucionaliração•
dade da aplicação do prazo qüinqüenal
com respeito à decadência e prescrição
I — As contribuições previpara com os créditos previdenciários.
denciá'rias, inclusive as relativas ao
FGTS, consubstanciam tributos,
É de somenos importância o apontaachando-se sujeitas ao prazo qüinmento de tão diversos artigos do CTN e
254
R.T.J. — 150
da Carta Magna, pois que, em nenhum
momento sequer, existe conflito entre
eles. Poderia eu alongar-me na interpretação de tais dispositivos, com a fmalidade de esclarecer ao embargante as dúvidas que foram levantadas quando de
seus embargos. Todavia, como em julgados passados, sempre vem o IAPAS
apresentando recursos a esse respeito, o
que me parece ser do seu desconhecimento que a matéria ora tratada já se
encontra jufisprudenciahnente firmada,
como se pode constatar através da Súmula n° 108, deste Tribunal, que a este
serve como ementa.
Na realidade, os embargos é que não
indicam com clareza o ponto obscuro,
duvidoso ou omisso que desejam atacar.
Quer o Instituto, assim, reavivar a discussão da tormentosa questão do prazo
prescricional das contribuições previdenciárias, ressalte-se, inoportunamente.
Bastaria, assim, deter-me nessa preliminar, sem apreciar o mérito do caso
vertente. Aprecio-o, no entanto, em respeito ao direito da parte de ver seu pedido tutelado juridicamente.
Faço transcrever parte do parecer da
douta Subprocuradoria-Geral da República, que demonstra claramente a improcedência dos embargos:
'A natureza jurídica das contribuições parafiscais ou especiais suscitou algumas divergências na interpretação oferecida pelos Tribunais,
principalmente no período que antecedeu a EC n° 8/77. Após a edição
dessa Emenda Constitucional, e desde o julgamento do RE n° 86.595
(RTJ 87/271), o Colendo Supremo
Tribunal Federal acolheu a tese de
que a partir dessa EC, as contribuições deixaram de ter natureza jurídica tributária.
Esse entendimento do Excelso
Pretório acha-se também consolida-
do em recente julgamento do RE n°
100.790.7 — Relator Ministro Francisco Rezek (DS de 13-3-87, pág.
3882).
Ora, tratando-se as contribuições
apuradas e exigidas no período de
1/67 a
isto é, anteriores à Emenda
Constitucional n° 8/77, encontramse elas vinculadas à natureza tributária, que à época as afetava' — fls.
112/113.
Vê-se, pois, que sem razão de ser os
embargos oferecidos pelo IAPAS.
Aliás, os mesmos fundamentos destes embargos foram utilizados pelo embargante nos EDcI na AC n° 101.445PA, julgado em 20 de novembro de 1985,
tendo a eg. Quinta Turma rejeitado os
embargos.
Por todo o exposto, conheço os embargos mas os rejeito.
É como voto.» (fls. 117/119)
Interposto recurso extraordinário, foi
ele admitido pelo seguinte despacho:
«O IAPAS, buscando amparo na letra a do permissivo constitucional, recorre extraordinariamente de acórdão da
Segunda Seção deste Tribunal que, em
grau de embargos, entendeu consumarse em cinco anos o prazo de prescrição
para cobrança dos créditos relativos ao
FGTS, a teor do art. 174, do CTN, ante
sua natureza tributária.
O recorrente acusa de equívoca a qualificação dessas contribuições como tributo, em face dos diversos dispositivos
constitucionais arrolados.
Argúi, ainda, relevância da questão
federal.
Sobre a controvérsia, tem sido predominante a orientação jurisprudencial
desta Corte (Súmula n° 107), de que,
mesmo para as contribuições do FGTS,
aplica-se o prazo qüinqüenal da prescrição, mormente aos períodos de compe-
sn
R.T..1 —150
tênia anteriores ao advento da Emenda
Constitucional n° 8/77.
Já agora, entretanto, a Corte Suprema
definiu a natureza do FGTS, segundo
inúmeras decisões proferidas na esteira
do RE 100.249, das quais destaco as
seguintes:
'Fundo de Garantia do Tempo de
Serviço. Natureza de contribuição social, prevista no número X do artigo
43, da Carta da República, para custeio do encargo previsto no n° XIII do
seu artigo 165.
Definida a natureza do FGTS, pelo
Plenário da Suprema Corte, no julgamento do RE 100.249, em sessão de
2-12-87, pacificado fica o entendimento que não se aplica às contribuições a prescrição qüinqüenal prevista no Código Tributário Nacional,
mesmo para os créditos relativos ao
período anterior à Emenda Constitucional n° 8, de 1977.
Recurso conhecido e provido.'
(RE 114.386-0-RJ—Rel. Mm. Carlos Madeira — I» de 12-2-88 —
pág. 1993).
'Fundo de Garantia do Tempo de
Serviço (FGTS). Natureza jurídica
Prescrição. Decadência.
Ao julgar, recentemente, o RE
100.249, o Plenário desta Corte, por
maioria de votos entendeu que as
contribuições para o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS)
não são contribuições previdenciárias, mas, sim, contribuições sociais,
que, mesmo antes da Emenda Constitucional n° 8/77, não tinham natureza tributa, razão por que não se
lhes aplica o disposto nos artigos 173
e 174 do CTN.
Recurso extraordinário conhecido e provido.' (RE 114.252-9-SP —
Rel. Mia Moreira Alves — Dl de
11-3-88 — pág. 4747)
255
'Contribuições devidas ao Fundo
de Garantia do Tempo de Serviço.
Não configuram espécies de tributo,
sendo alheias, à sua disciplina, as
normas estabelecidas, pelo Código
Tributário Nacional, a respeito da prescrição e da decadência. Precedente
do Tribunal Pleno (RE 100.249).
Recurso provido, para afastar a
prescrição (art. 174 do CTN).'
(RREE 112.888-7-SP e 112.697-3MG — Rel. Min. Octavio Gallotti
— DJ de 11-3-88 — pág. 4746).
'Fundo de Garantia do Tempo de
Serviço (FGTS). Contribuição estritamente social, sem caráter tributário. Inaplicabilidade à espécie do art.
173 do CTN, que fixa em cinco anos
o prazo para constituição do crédito
tributário. RE conhecido e provido
para se afastar a declaração de decadência
Precedente do Plenário.' (RE
110.012-5-AL — Rel. Mm. Sydney
Sambes — DJ de 11-3-88 — pág.
4745).
'FGTS — Recusada a natureza
tributária da contribuição, não ocorre
a prescrição qüinqüenal do art. 174
do Código Tributário Nacional (julgamento do RE 100.249 — Pleno).
Recurso extraordinário conhecido e
provido: (RREE 114.372-O-RN e
109.613-6-SP — Tel. Min. Oscar
Corrêa — DJ de 26-2-88 e 12-2-88
—págs. 3195 e 1991).
Daí que, tratando-se de definir a natureza jurídica do FGTS, frente à matéria constitucional argüida, o presente recurso extraordinário, ao contrário de inúmeros outros, merece encaminhamento
ao Supremo Tribunal Federal.
Ante o exposto, admito o recurso.
Quanto à argüição de relevância da
questão federal, observe-se o disposto
no art. 328, 1°, do RISTF, com a
256
R.T.J. —150
redação dada pela Emenda Regimental
n" 2, de 4-12-85.» (fls. 140/141)
Propiciado o desdobramento do recurso
extraordinário em extraordinário e especial, o ora recorrente dele não se valeu.
Às fls. 164/166, assim se manifesta a
Procuradoria-Geral da República, em parecer da Dra. Anadyr de Mendonça Rodrigues:
«O Recurso Extraordinário foi interposto em 14 de janeiro de 1988, com
fundamento exclusivamente na alínea a
do permissivo constitucional, fazendo
alegação de ofensa aos artigos 21, § 2°,
I, 62, § 2°, 163, parágrafo único, e 165,
XIII, da Emenda n° 1, de 1969, e a
disposições de lei ordinária, a par de
fazer argüição de relevância da questão
federal (não apreciada, segundo fl. 151).
O Exmo. Sr. Ministro Relator, na esteira do decidido por essa Excelsa Corte
no julgamento do RE 117.329-7-MG,
houve por bem facultar ao Recorrente o
desdobramento do apelo (fl. 154), mas
o interessado não se valeu de tal faculdade (fl. 158), assim ficado preclusas as
questões infraconstitucionais.
Os temas constitucionais estão assaz
prequestionados, porque o V. Acórdão
recorrido assim decidiu:
toniribuições previdendfulas.
Prescrição.
I
Dado o caráter tributário
das contribuições previdenciárias, forçosamente estão submetidas à prescrição qüinqüenal estabelecida no
CIN. Precedentes.
II— Embargos rejeitados.'
(fl. 87)
Essa Suprema Corte, todavia, chegou
a entendimento contrário àquele abraçado pelo E. Tribunal a quo:
'Fundo de Garantia do Tempo
de Serviço. Sua natureza jurídica.
Constituição, art. 165, XIII. Lei n°
5.107, de 13-9-1966. As contribuições para o FGTS não se caracterizam como crédito tributário ou
contribuições a tributo equiparáveis.
Sua sede está no art. 165, XIII, da
Constituição. Assegura-se ao trabalhador estabilidade, ou fundo de garantia equivalente. Dessa garantia, de
índole social, promana, assim, a exigibilidade pelo trabalhador do pagamento do FGTS, quando despedido,
na forma prevista em lei. Cuida-se de
um direito do trabalhador. Dá-lhe o
Estado garantia desse pagamento. A
contribuição pelo empregador, no
caso, deflui do fato de ser ele o sujeito passivo da obrigação, de natureza
trabalhista e social, que encontra, na
regra constitucional aludida, sua fonte. A atuação do Estado, ou de órgão
da Administração Pública, em prol
do recolhimento da contribuição do
FGTS, não implica tomá-lo findar do
direito à contribuição, mas, apenas,
decorre do cumprimento, pelo Poder
Público, de obrigação de fiscalizar e
tutelar a garantia assegurada ao empregado optante pelo FGTS. Não
exige o Estado, quando aciona o empregador, valores a serem recolhidos
ao Erário, como receita pública. Não
há, contribuição de natureza fiscal
ou parafiscal. Os depósitos do FGTS
pressupõem vínculo jurídico, com
disciplina no Direito do Trabalho.
Não se aplica às contribuições do
FGTS o disposto nos arte. 173 e 174,
do CIN. Recurso extraordinário conhecido, por ofensa ao afastar a prescrição qüinqüenal da ação.' (RE
100.249-2-SP, Rel. Mia Oscar Corrêa, in DJ de 1-7-88, pág. 16903).
4
O parecer é, por conseguinte, de que
o Recurso Extraordinário comporta conhecimento e provimento.»
É o relatório.
R.TJ —150
VOTO
O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): I. A questão constitucional foi prequestionada nas razões dos embargos infringentes (fls. 75f76) e, posteriormente,
nos embargos declaratórios (fls. 90/91).
Esta Corte, ao julgar, por seu Plenário, o RE 100.249, firmou o entendimento,
em face da Emenda Constitucional n° 1/69,
de que as contribuições para o Fundo de
Garantia por Tempo de Serviço não se caracterizam corno créditos tributários ou contribuições equiparáveis a tributos, razão por
que não se lhes aplica a prescrição qüinqüenal, prevista no Código Tributário Nacional.
O acórdão recorrido divergiu desse entendimento.
Em face do exposto, conheço do presente recurso, e lhe dou provimento.
257
EXTRATO DA ATA
RE 116.761 — AL — Rel.: M1111. Moreira Alves. Recte.: Instituto de Administração Financeira da Previdência e Assistência Social — LAPAS (Advs.: Paulo Cesar
Gontijo e outros). Recda.: Companhia Integrada de Desenvolvimento Agropecuário
de Alagoas — CIDAL (Adv.: Manoel Cícero do Rego).
Decisão: A Turma conheceu do recurso
e lhe deu provimento, nos temos do voto
Relator. Unânime. Impedido o Sr. Ministro
Limar Gaivão.
Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Octavio Gallotti, Sepúlveda Pertence, Celso de Meio e Ihnar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza.
Brasília, 16 de março de 1993 —Ricardo Dias Duarte, Secretário.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 118.344 (SEGUNDO) — RS
(Segunda Turma)
(Primdro RE na RTJ 137/892)
Relata: O Sr. Ministro Marco Aurélio
Recorrentes: Oswaldo Opitz e outros — Recorrido: Condomínio do Edifício
Dom Feliciano
Condomínio. Parte comum. Alteração. «Quorum». A aquisição da unidade privativa faz-se considerados os perímetros das partes
COMUM Previsto na convenção de condomínio que a alteração destas
últimas somente é possível uma vez alcançada a manifestação favorável
de todos os condôminos, descabe, em sutil estratégia, afastar o requisito
da unanimidade. A mudança do quorum há de se fazer mediante observância do mesmo quantitativo estabelecido na cláusula condondnial para
a valia da deliberação sobre o tema. Se a modificação das partes comuns
está jungida à unanimidade, a da convenção que assim dispõe também
fica vinculada à concordância de todos os condôminos, sob pena de cair
por terra a garantia Inidalmente consignada, colocando-se em plano
secundário o princípio da não-contradição. Vulnera o preceito constitudonal assegurador da intangibilldade do direito de propriedade decisão
judicial em que desse modo não se conclui.
258
R.T.J. — 150
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos,
em conhecer do recurso e lhe dar provimento, para restabelecer a sentença de fls. 273
a281.
Brasília, 24 de agosto de 1993 — Néri
da Silveira, Presidente — Marco Aurélio,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Valhome do relato que tive oportunidade de fazer
quando submeti a esta Turma o segundo
recurso extraordinário interposto e que o
foi considerado o acórdão do Superior Tribunal de Justiça de fls. 521 a 527, em que
se assentou o não-conhecimento do especial em virtude da óptica de que não teria
sido formalizada a argüição de relevância
Friso que no julgamento daquele recurso
prevaleceu a tese que abracei, consoante a
qual, diante da decisão prolatada pelo meu
antecessor, Ministro Carlos Madeira, não
cabia ao Superior Tribunal de Justiça adentrar a questão alusiva à argüição de relevância, porque a ele os autos foram remetidos
para apreciar não o extraordinário, mas o
especial. Confira-se com a ementa de fl.
596. Do relatório que se encontra às fls. 577
a 582, pinça a referência à síntese do julgado do Tribunal de Justiça do Rio Grande do
Sul, ressaltando que analisamos agora o
primeiro recurso extraordinário sob o ângulo constitucional:
«Condomm
'io. Área amura A maioria qualificada dos condôminos pode decidir acerva da alteração de destinação
de área comum, mormente quando a
construção pretendida determina acréscimo da mesma sem prejuízo real ao
uso, gozo e fruição de área descoberta.
A unanimidade dos condôminos só se
exige, nos casos expressos em lei, nas
hipóteses em que a deliberação da maio-
ria qualificada incide sobre a fração ideal
de terreno de cada condômino, ampliando-se em relação a alguns e diminuindose em relação a outros.
A arnpliaçãodo espaço-estacionamento, para locação ou cessão de uso aos
condôminos que não disponham de garagem sem alienação, não reduz a fração
ideal de terreno que originariamente cada
condômino dispõe, nem reduz sua participação nas coisas de uso comum, sempre
que se trata de área acrescida.» (fl. 391)
No extraordinário, abstraída a matéria
legal que restou analisada pelo Superior
Tribunal de Justiça em face da conversão
do citado recurso, nessa parte, em especial,
sustentam os Recorrentes que o decidido
resultou na transgressão ao direito de propriedade. Argumentam que, por ato inicialmente formalizado— a Convenção —previu-se que qualquer alteração de área comum deveria contar com a manifestação da
unanimidade dos condôminos, não podendo prevalecer alteração perpetrada por vontade da maioria, com o fim de afastar tal
requisito. As razões apresentadas foram
reiteradas conforme peça de fls. 463 a 471,
vindo aos autos as contra-razões de fls. 485
a 495, refutando-se a viabilidade do extraordinário, ante o fato de a controvérsia
envolver a Convenção do Condomínio e,
portanto, o alcance respectivo. O Recorrido
afirma ainda que somente subsiste a questão alusiva ao artigo 462 do Código de
Processo Civil, no que se teria levado em
conta, no julgamento dos embargos infringentes, a modificação daquele regimento.
Quanto a este recurso extraordinário, o
Ministério Público Federal emitiu o parecer de fls. 572 a 575, salientando que a
decisão da Corte de origem discrepa da
garantia constitucional insculpida no § 22
do artigo 153 da Carta pretérita, repetida na
atual. A deliberação da Assembléia de
Condôminos, adotada por maioria de votos, no sentido de mudar a destinação de
área comum do imóvel, de sorte a atribuir
R.T.J —150
o uso privativo a parte de alguns dos con&num
' os, em detrimento da minoria vencida, estaria a evidenciar a ofensa ao direito
de propriedade.
Esclareço que, em face do julgamento
do segundo recurso extraordinário interposto, os autos foram remetidos ao egrégio
Superior Tribunal de Justiça, que não conheceu do especial resultante da conversão,
vencidos os ffmistros Valdemar Zveiter e
Nilson Naves (fls. 603 a 626). Tal decisão
transitou em julgado —certidão de fl. 627.
Recebi os presentes autos para exame
em 4 de agosto de 1993, liberando-os para
inclusão em pauta no dia 15 seguinte (fl.
628).
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Os pressupostos gerais de recorribilidade estão atendidos. Os documentos de
fls. 15 e 16 revelam regulara representação
processual, constando à fl. 472 a guia comprobatória do preparo. Quanto ao prazo
recursal, a decisão que se pretende alvejada
com este extraordinário teve publicidade
formalizada com o exemplar do Diário da
Justiça de 27 de outubro de 1987 — terçafeira (fl. 413) — ocorrendo a manifestação
do inconformismo em 11 imediato —quarta-feira (fl. 415) — e, portanto, dentro dos
quinze dias. Resta destarte o exame do
enquadramento do citado recurso no permissivo constitucional alusivo à transgressão a preceito da Carta de 1969.
Quanto ao prequestionamento, ressaltou com acerto o ilustrado Ministério Público que o Tribunal de Justiça, ao prolatar
o acórdão de fls. 386 a 412, decidiu sobre
o direito de propriedade, tanto assim que, à
fl. 400, deixou consignado que cio caso
presente, as resoluçães assembleiares (sic)
não atingem o direito de propriedade e de
posse dos condôminos». Logo, em que
pese não haver menção, no atesto impugnado, ao artigo 153, 22, da Constituição
259
Federal, tenho como objeto de debate e
decisão prévios o tema nele versado. O
instituto do prequestionamento não pode
ser potencializado a ponto de exigir-se referência a números de dispositivos legais,
sob pena de sobrepor-se o fetichismo da
forma ao conteúdo. Diz-se prequestionado
certo tema quando o órgão julgador haja
emitido juízo a respeito e isto aconteceu,
porquanto a controvérsia dirimida está ligada, justamente, ao direito de propriedade
dos Recorrentes, considerada a transmudação de parte comum em área destinada ao
uso de alguns condôminos. Neste sentido,
decidiu o Tribunal Pleno, conforme depreende-se das ementas transcritas no parecer
«Diz-se prequestionada determinada
matéria quando esta consta decidida no
acórdão impugnado. Descabe exacerbar
o instituto a ponto de exigir que o Órgão
julgadcr faça referência aos algarismos
do diploma legal pertinente à hipótese.
O prequestionamento tem como razão
de ser a necessidade de proceder-se a
cotejo para, somente então, dizer-se do
enquadramento do recurso na hipótese
legal e isto é viabilizado pela simples
adoção de entendimento sobre o tema
jurígeno (RE 118.934-7-PR, Rel. Min.
Marco Aurélio, in DJ de 7-12-90, pág.
14641).
Impor, para configuração do prequestionamen0a, além da matéria veiculada no recurso, a referência ao número
do dispositivo pertinente, extravasa o
campo da razoabilidade, chegando às
raias do exagero e do mero capricho,
paixões que devem estar ausentes quando do exercício do ofício judicante. (RE
128.518-4-DF, Tribunal Pleno, Rel.
Min. Marco Aurélio, in DJ de 8-3-91,
pág. 206).»
Da violência ao artigo 153, § 22, da
Constituição Federal
Articulam os Recorrentes com a vulneração ao artigo 153, 22, da Constituição
260
R.TJ. —150
Federal anterior. Aduzem que a destinação
de parte comum do Condomínio à feitura
de garagens, para atender àqueles que não
a possuem no prédio, alcança o direito de
propriedade, não podendo resultar, assim,
de deliberação de parte dos condôminos.
Conforme consta do acórdão atacado, o
Condomínio é constituído de cinqüenta e
duas unidades autônomas. Destas, segundo
o disposto no artigo 3° da Convenção, apenas trinta e dois têm assegurado o direito a
espaço de estacionamento de automóvel na
garagem coletiva, bem como o conforto
decorrente de portão automático de acesso
e a segurança advinda da guarita, contando,
ainda, com manobristas. Há a individualização das vagas de garagem à razão de um
trinta e dois avos. A Convenção prevê também a existência de partes de uso comum,
inalienáveis e ligadas de forma acessória,
indissoluvelmente, às unidades privativas,
estabelecendo o artigo 2° a necessidade de
contar-se com o consenso unânime para
qualquer alteração. O artigo 4° da Convenção confirma a regra do artigo 2°, ao revelar-se que as coisas comuns e aquelas que
dizem respeito à harmonia do edifício não
podem ser modificadas sem a concordância
de todos os condôminos e, mesmo assim,
há de se ter presente a estabilidade e a
segurança do próprio edifício, viabilizando
o dispositivo legal o recurso da maioria ao
suprimento judicial. Por outro lado, o artigo 8° fixa como direito dos condôminos o
uso e a fruição das partes comuns, sem com
isso impedir o uso e o gozo por parte dos
demais.
Entrementes, mediante Assembléia Geral realizada em 5 de janeiro de 1981, à qual
compareceram vinte e cinco condôminos
dos cinqüenta e dois que fonnam a totalidade, decidiu-se, por maioria simples dos
presentes — dezesseis votos a nove —
aprovar-se a construção de vinte garagens
no pátio dos fundos do edifício, constituindo-se Comissão para acompanhar a construção e regulamentar a venda das gara-
gens. Em 21 de janeiro de 1981, deliberouse, mais, que cada unidade de estacionamento ficaria vinculada ao apartamento do
condômino como acessório ao principal,
sendo inalienável como unidade autônoma,
muito embora passível de venda em conjunto com o respectivo apartamento. Posteriormente, no dia 3 de setembro de 1981,
voltou-se a tratar do assunto pertinente à
alienação dos espaços-estacionamentos,
cogitando-se da construção de um play
ground sobre a garagem. Tais decisões
conduziram seis condôminos à busca do
Judiciário, a fim de obstaculizar a construção. Para tanto, tiveram presente que aquelas providências estariam a vulnerar os respectivos direitos de propriedade e não apenas os atinentes ao uso das parta comuns.
A Corte de origem concluiu, por maioria de
votos, vencido o proficiente Desembargador Adroaldo Furtado Fabrício, pela improcedência do inconformismo demonstrado,
levando em conta ocorrência de fatos novos, e acionando, assim, porque confirmado o acórdão anterior, a norma inserta no
artigo 462 do Código de Processo Civil.
Uma nova Assembléia teria sido realizada
era 21 de dezembro de 1981, ou seja, cerca
de um mês após o ajuizamento da presente
demanda. Nela transmudou-se a deliberação alusiva à venda das garagens em mera
utilização, apreciando-se projeto que estaria a revelar um acréscimo de área de
248.02m2 de terraço, a englobar um plus
de play ground de 56,92m`. As vagas, pela
nova resolução, ao invés de serem alienadas, passariam ao Condomínio, explorando
este a locação respectiva, gerando, conseqüentemente, receita. Por outro lado, no
ano que se seguiu, mais precisamente em
23 de março de 1982, realizou-se nova
Assembléia-Geral Extraordinária, à qual
compareceram quarenta e quatro condôminos, dedicindo-se pela reforma de alguns
artigos da Convenção, por quarenta votos a
favor e quatro contrários. Dentre estes, o
artigo 2° da Convenção, no que previa necessária a unanimidade para alteração das
R.TJ —150
partes comuns. Passou-se a ter o quorum
qualificado de dois terços.
Perante a Corte de origem surgiram, então, as duas correntes. A da maioria, concluindo pela legitimidade da alteração, cogitando de acréscimo da área destinada à
parte comum e da impossibilidade de potencializar-se o critério alusivo à concordância de todos. A segunda, assentada na
circunstância de a modificação haver alcançado o direito de propriedade dos ora
Recorrentes, pois perderam a parte que até
então era comum, sem que tenham contribuído, mediante manifestação de vontade,
para tanto.
A hipótese é interessante e, de início,
verifica-se que o artigo 462 do Código de
Processo Civil foi empolgado visando a
esvaziar a causa de pedir formulada na
presente demanda. Iniludivehnente, os Recorrentes alcançaram, a mercê da compra
das respectivas unidades autônomas, um
determinado quadro e este fez-se real pela
certeza de que estavam adquirindo as referidas unidades, consideradas, também, as
áreas comuns. Daí o autor do voto vencido
haver asserido à fl. 409, que:
«O que determina a esse rigor e até a
exigência da unanimidade para determinadas deliberações é o fato de que cada
condômino, ao adquirir a sua unidade
autônoma no condomínio, não a adquire
só, mas a adquire com determinados
acessórios e com determinados direitos
subjetivos que aderem à propriedade exclusiva daquela determinada unidade autônoma. Por outras palavras, seja aquele
que adquire quando da incorporação,
seja aquele que adquire posteriormente,
não adquire um apartamento, ou uma
loja, ou uma sala, ou um conjunto só,
adquire com esta unidade autônoma, com
essa economia individual, adquire também a parcela ideal do mais que existe,
ou deva existir, ou esteja previsto existir
no edifício.»
261
E realmente assim o é. A aquisição da
unidade privada, autônoma, faz-se com inicial extensão às áreas de uso comum e, no
caso dos autos, isto restou mais patenteado
quando houve a adesão dos condôminos a
uma escritura de Convenção em que foi
prevista, expressamente, a impossibilidade
de haver modificação de parte comum sem
a concordância de todos. Ajustaram-se os
condôminos em tal sentido, mas eis que o
inconformismo em torno da inexistência de
vagas na garagem suficientes à utilização
por todos, já que somente a trinta e duas
unidades foram atribuídas, conduziu à deliberação, por escassa maioria — dezesseis
votos a nove, não estando presente sequer
metade dos condôminos — ao esquecimento da norma convencional proibitiva. Dirse-á, como o fez a Corte de origem, que, em
data posterior, a maioria dos condôminos
houve por bem alterar o teor do artigo 2° da
Convenção quanto ao consenso unânime.
Isto realmente ocorreu quando já ajuizada
a presente demanda. Acontece que o procedimento objetivou driblar o desiderato previsível da controvérsia. A este dado somase outro, ligado à incongruência Difícil é
conceber que se possa modificar um dispositivo da Convenção, que preveja a unanimidade, mediante deliberação tomada por
maioria. Conclusão diversa implica tomar
letra morta a unanimidade exigida. O meio
pertinente à alteração não pode ser implementado sem observância do quorum a ser
modificado. Se no preceito convencional
cuida-se da unanimidade, por lógica racional a alteração respectiva há de ser promovida também com respeito ao aludido quorum. No caso, não se atentou para o princípio da não-contradição, deixando de haver a coerência. Enveredou-se por raciocínio contraditório. A um só tempo, teve-se
presente o fato de o artigo 2° cogitar da
unanimidade para a deliberação em torno
da alteração das partes comuns e modificou-se, por maioria, embora absoluta, o que
exigido, esvaziando-se, assim, com contrariedade a direito dos Recorrentes, a garrar-
262
RTJ.— 150
tia que decorria da Convenção. A mudança
somente seria válida se observado outro
princípio, que é o da identidade, ou seja,
uma vez houvesse contado com o consenso
unânime dos condôminos. Indubitavelmente, o que providenciado pela maioria
não é de molde a alcançar a propriedade dos
dissidentes, porque sob a proteção do que
ajustado anteriormente. Na verdade, os demais condôminos acabaram por reconhecer
o óbice intransponível ao intento de criar,
no lugar do espaço comum, novas garagens. Procuraram afastá-lo, engendrando a
alteração. No entanto, pecaram ao fazê-lo,
pois deixaram de lado a circunstância de se
tratar de dispositivo convencional ao qual
estava colada a necessidade de se ter o
consenso unânime. Nem se diga que a Convenção pode ser modificada pelo quorum
qualificado. Esta premissa sofre temperamento e este decorre, justamente, da existência de disposições convencionais às
quais se impôs o critério da unanimidade,
somente afastável, consoante visto, por suprimento judicial e este não veio à balha.
Sensibilizou-se a Corte de origem com
o que seria a ausência de perda da área
comum. Evidentemente, a construção verificada, se o foi, como é incontroverso, em
área comum e para a utilização de parte dos
condôminos, diminuiu esta última, não frutificando a idéia pertinente à feitura de um
terraço. Na espécie, não cabe confundir
parte comum com a fração ideal de cada
unidade. É certo que, não ocorrendo a alienação inicialmente prevista, as frações continuaram as mesmas. Todavia, a idêntica
conclusão não se chega quanto às partes
comuns, pois as garagens passaram a ocupar um dimensionamento, não cabendo cogitar da substituição pelo acréscimo alusivo ao terraço ajardinado que, no voto vencido quando do julgamento da apelação, foi
rotulado como tentativa de dourar a pílula,
disfarçando, na verdade, a modificação.
Uma área comum totalmente livre foi objeto de construção e, o que é pior, não com
idêntico destino, mas para beneficiar, no
campo da comodidade, alguns condôminos, muito embora lhes sendo imposto o
ónus de pagar um aluguel.
A segurança das relações jurídicas restou infringida pela deliberação da maioria
dos condôminos. Mudaram as regras adrede estabelecidas e o fizeram sem a observância da exigência estipulada — unanimidade, muito embora tergiversando via mudança do que inicialmente ajustado. Os Recorrentes vieram-se alcançados, ferindose-lhes o direito de propriedade, sendo de
se presumir que, no tocante a cada qual,
houve diminuição do patrimônio, pois antes contavam com a unidade autônoma e
área comum ampla, sendo que a construção
das novas vagas de garagem, para utilização por terceiros, acabou por diminuir esta
última. Meu convencimento sobre a matéria, longe de potencializar os efeitos nefastos da unanimidade, coincide com o do
autor do voto vencido — Desembargador
Adroaldo Furtado Fabrício, e agora, também com o da ilustre Subprocuradora-Geral da República, Dra. Anadyr de Mendonça Rodrigues. Conheço o recurso pela violência ao artigo 153, § 22, da Constituição
Federal anterior. No mérito, provejo-o
para, reformando o acórdão de fls. 391 a
412, restabelecer o entendimento sufragado pelo juízo e para a sentença de fls. 273
a 281.
É o meu voto.
EXTRATO DA ATA
RE 118.344 — RS — Rel.: Min. Marco
Aurélio. Rectes.: Oswaldo Opitz e outros.
(Advs.: Aristides Dutra Boeira, Henrique
Fonseca de Araujo e outros). Recdo.: Condomínio do Edifício Dom Feliciano. (Adv.:
Ajadil de Lemos).
Decisão: Por unanimidade, a Turma conheceu do recurso e lhe deu provimento,
para restabelecer a sentença de fls.
273/281. Falou pelos recorrentes o Dr.
Henrique Fonseca de Araújo.
R.TJ — 150
263
Presidência do Sr. Ministro N&i da Sil- Geral da República, o Dr. Artur Castilho
veira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Pereira Neto.
Paulo Brossard, Carlos Velloso e Marco
Brasília, 24 de agosto de 1993 — José
Aurélio. Ausente, justificadamente, o Sr.
Ministro Francisco Rezek. Subprocurador- Wilson Aragão, Secretário.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO Ir 120.924 — SP
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves
Recorrente: Valte de Oliveira — Recorrido: Estado de São Paulo
' da de culpa
Responsabilidade objetiva do Estado. Ocorrem
exclusiva da vítima.
Esta Corte tem admitido que a responsabilidade objetiva
da pessoa jurídica de direito público seja reduzida ou excluída conforme
haja culpa concorrente do particular ou tenha sido este o exclusivo
culpado (Ag. 113.722-3-AgRg e RE 113587).
No caso, tendo o acórdão recorrido, com base na análise
dos elementos probatórios cujo nane não é admissível em recurso
extraordinário, deddido que ocorreu culpa exclusiva da vítima, inexistente a responsabilidade civil da pessoa jurídica de direito público, pois
foi a vítima que deu causa ao infortúnio, o que afasta, sem dúvida, o nexo
de causalidade entre a ação e a omissão e o dano, no tocante ao ora
recorrido.
Recurso extraordinário não conhecido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superno Tribunal Federal, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos,
em não conhecer do recurso.
Brasília, 25 de maio de 1993 — Moreira Alves, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Moreira Alva: É este
o teor do acórdão recorrido (fls. 275/276):
«Vistos, relatados e discutidos estes
autos de Apelação Cível n° 106.646-1,
da Comarca de São Paulo, em que é
apelante Valte de Oliveira, sendo ape-
lada a Fazenda do Estado de São Paulo:
Trata-se de recurso de autor objetivando a reforma da r. sentença de fls.
245/9, que julgou improcedente a ação
indenizatória que propôs contra a Fazenda pelo atropelamento e morte de sua
esposa por viatura policial, que teria ultrapassado sinal vermelho da Rua Senador Vergueiro, em São Bernardo do
Campo.
A r. sentença concluiu pela improcedência, diante da prova testemunhal corroboradora da contestação, que alegou
culpa exclusiva da vítima, a qual não
respeitou o sinal, que lhe era contrário.
O recurso sustenta que em face da
responsabilidade objetiva há o dever de
indenizar e mais que o reexame da prova
leva à culpa do motorista da viatura.
Houve resposta.
É o relatório.
À evidência a responsabilidade objetiva não implica em indenizar qualquer
dano, posto que comprovada a total
isenção de culpa da Administração inexiste o pressuposto para responder.
A orientação doutrinária e jurisprudencial nesse sentido é uniforme.
A prova é clara e uníssona no sentido
da culpa exclusiva da vítima, com exceção da testemunha José Agripino Tavares (fls. 34/6), que, todavia, não
explicou a razão da mudança da versão
que dera no processo administrativo (fl.
60).
A par de tal prova ser de testemunha
única, tem-se que aparenta ser claramente de favor.
Todos os outros depoimentos quer na
fase administrativa, corno na judicial,
são claros, coerentes e coincidentes.
Só o de tal testemunha discrepa e
tem-se que é contraditório.
A improcedência é a conclusão lógica e decorrente dos fatos.
Isto posto,
Acordam, em Primeira Câmara Cfvel do Tribunal de Justiça, por votação
unânime, em negar provimento ao recurso.»
Interposto recurso extraordinário, foi ele
admitido por este despacho (fls. 288289):
«Trata-se de ação ordinária de indenização proposta contra a Fazenda do
Estado de São Paulo, objetivando indenização por morte causada por viatura
policial.
A ação foi julgada improcedente em
primeiro grau, sendo a decisão confirmada por acórdão unânime da Egrégia
Primeira Câmara Civil deste Tribunal.
Inconformado, recorre extraordinariamente o autor, com fundamento no
artigo 102, inciso BI, letra a, da Constituição Federal. Impugnação às fls.
284/286.
O recurso merece prosperar, porque
não se trata apenas de reexame de questão de fato, como pretende a Fazenda do
Estado.
Discute-se, isto sim, o alcance real do
dispositivo constitucional que estabelece a chamada responsabilidade objetiva
do Estado.
O tema foi prequestionado, tendo a
Câmara Julgadora afirmado a tese-de
que 'a responsabilidade objetiva não
implica em indenizar qualquer dano,
posto que comprovada a total isenção de
culpa da Administração..? (fl. 275)
Deve, assim, ser processada a inconformidade para que a questão seja decidida pela Colenda Suprana Corte.
Diante do exposto, defiro o processamento do recurso extraordinário interposto.»
Às fls. 307/311, assim se manifesta a
Procuradoria-Geral daRepública, em parecer da Dra. Anadyr de Mendonça Rodrigues:
«O Recurso extraordinário foi interposto em 10 de fevereiro de 1989, dizendo-se fundamentado exclusivamente na
alíneas do art. 101, HL da Carta de 1988
e fazendo alegação de ofensa aos artigos
107, parágrafo único, da Emenda n° 1,
de 1969, e 37, parágrafo 6°, da vigente
Carta Magna, e foi admitido na origem
(fls. 188/189).
1 Eis o v. acórdão recorrido:
«À evidência a responsabilidade
objetiva não implica em indenizar
qualquer dano, posto que comprovada a total isenção de culpa da Administração inexiste o pressuposto para
responder.
R.TJ — 150
A orientação doutrinária e jurisprudencial nesse sentido é unifonne.
A prova é clara e uníssona no sentido
da culpa exclusiva da vítima, com
exceção da testemunha José Agripiao Tavares (fls. 34/6), que, todavia,
não explicou a razão da mudança da
versão que dera no processo administrativo (fl. 60).
A par de tal prova ser de testemunha única, tem-se que aparenta ser
claramente de favor.
Todos os outros elementos, quer
na fase administrativa, como najudicial, são claros, coerentes e coincidentes.
Só o de tal testemunha discrepa e
tem-se que é contraditório.
A improcedência é a conclusão
lógica e decorrente dos fatos.» (fls.
275/276)
3. O recurso extraordinário, por sua
vez, assim se sustenta:
«A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de Direito Público é
objetiva, ou seja, independe da prova
de culpa ou dolo, quando seus servidores causarem danos a terceiros, no
exercício de sua função.
A respeito do art. 107, da Constituição Federal, o ilustre constitucionidista, Manoel GooçalvesFerreira
Filho, em sua obra, Comentários à
Constituição Brasileira, 5' Edição,
1984, teceu as seguintes considerações:
4(A. responsabilidade objetiva
do Estado:
Mantém-se na Constituição vigente, a solução adotada na Constituição de 1946 (artigo 194), ou
seja, a responsabilidade, dita objetiva do Estado por danos causados no exercício de função pública a particulares. Em face desse
265
princípio, quem sofreu o dano, para
haver do Estado a reparação desse
dano, apenas deve provar ter sido
ele causado no exercício da função pública A reparação prescinde de prova de culpa ou dolo por
parte do causador, depende exclusivamente de estar este no exercício de função pública.
Esta solução é de justiça social,
visa reparar de modo equitativo os
encargos sociais. O custo do serviço público, no qual se inclui o
dano causado a particulares, deve
ser repartido por todos. Se a vítima do dano arcasse com este ou
tivesse de comprovar a culpa ou
dolo para vê-lo ressarcido, estaria suportando mais do que sua
parte, como integrante da comunidade. Note-se que funcionário público, no texto em exegese, abrange todo aquele que exerce função pública, ou seja, a que
título for. Abrange, portanto, os
servidores do regime especial nos
termos do artigo 106, os eventualmente sujeitos ao regime trabalhista etc.»
Assim é que o parágrafo 6° do
artigo 37 da Constituição Federal vigente deixa claro o seguinte:
Permanece a responsabilidade da
pessoa jurídica de Direito Público,
principalmente aos danos causados
por seus funcionários a terceiros, no
exercício de suas funções, exigindose, apenas, a prova da culpa ou do
dolo, para assegurar o direito de regresso•
Isto significa que, realmente, a pessoa jurídica de Direito Público deve
provar a culpa ou dolo do servidor,
quando pretender obter regressiw
mente deste, o que pagou a título de
indenização.
R.T.J. — 150
266
A responsabilidade civil objetiva
do Estado é tranqüilamente aceita pela
maioria dos administrativistas, e para
excluí-la, somente a culpa exclusiva
da vítima, e, no presente caso, não
fora comprovada a culpa da mesma,
eis que agiu com a devida cautela.
Precedentes da Corte.» (Ag.
113.722-3-AgRg-SP, Rel. Min. Sydney Sanches, in DJ de 20-3-87, pág.
4600, destaques nossos)
Além do mais, faz-se mister ressaltar que o próprio Supremo Tribunal Federal, adotou o entendimento
agora mencionado e conforme se segue:
'A responsabilidade civil das
pessoas jurídicas de direito público, não depende da prova de culpa, exigindo apenas a realidade do
prejuízo injusto' (RTJ 47/378 —
RF 169/137.» (fls. 280/282)
Tudo posto, não merece conhecimento o recurso extraordinário.
mite pesquisa em torno da culpa do
particular, para o fim de abrandar
ou mesmo excluir a responsabilidade estatal, ocorre, em síntese, dian-
É que a culpa da vítima do dano —
exclusiva ou concorrente — constitui,
conforme o caso, fator excludente ou
mitigador da responsabilidade civil do
Estado.
6. Trata-se de entendimento que essa
Excelsa Corte há muito consagra, do
que são meros exemplos os seguintes
vv. arestos:
«Responsabilidade civil de pessoa jurídica de direito público (autarquia) (Departamento de Estradas de
Rodagem do Estado de São Paulo)
(art. 107 da CF), litisdenunciada pela
ré, em ação indenizatória por colisão
de veículos em rodovia estadual.
A responsabilidade objetiva da
pessoa jurídica de direito público (no
caso litisdenunciada) pode e deve
ser reduzida, se houver culpa concorrente da demandante (ré-litisdenunciante, na hipótese).
Acórdão que assim decide, com
base na prova dos autos (Súmula n°
279), não viola o artigo 107 da CF.
«A responsabilidade civil do Estado, responsabilidade objetiva, com
base no risco administrativo, que ad-
te dos seguintes requisitos: a) nexo
causal entre o dano e a ação administrativa.» (RE 113.587-5-SP, Rd. Min.
Carlos Velloso, in DJ de 3-4-92, pág.
4292, destaques nossos)
Ocorrendo culpa exclusiva do particular que sofreu o dano — como, in
hoc casu, decidiu o E. Tribunal a quo,
ao abrigo da Súmula n° 279 —, deixa
de existir o imprescindível nexo causal
justificador da atribuição da responsabilidade civil ao Estado.
O parecer é, por conseguinte, de
que o recurso extraordinário não comporta conhecimento.»
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): 1. Como bem demonstra o parecer da
Procuradoria-Geral da República, esta Corte tem admitido que a responsabilidade objetiva da pessoa jurídica de direito público
seja reduzida ou excluída conforme
haja culpa concorrente do particular ou
tenha sido este o exclusivo culpado (Ag.
113.722-3-AgRg e RE 113.587).
No caso, tendo o acórdão recorrido, com
base na análise dos elementos probatórios
cujo reexame não é admissível em recurso
extraordinário, decidido que ocorreu culpa
exclusiva da vítima, inexiste a responsabilidade civil da pessoa jurídica de direito
público, pois foi a vítima que deu causa ao
infortúnio, o que afasta, sem dúvida, o nexo
R.T.J — 150
de causalidade entre a ação e a omissão e o
dano, no tocante ao ora recorrido.
2. Em face do exposto, não conheço do
presente recurso extraordinário.
EXTRATO DA ATA
RE 120.924 — SP — Rel.: Min. Moreira Alves. Recta: Valte de Oliveira. (Advs.:
Rogerio da Silva Gonçalves e outros). Recdo.: Estado de São Paulo (Advs.: Mima
Cianci e outros).
267
Decisão: A Turma não conheceu do recurso extraordinário, nos termos do voto do
Relator.
Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e limar Gaivão. Ausente, justificadamente, o
Sr. Ministro Sydney Sanches. Subprocurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza.
Brasília, 25 de inalo de 1993 — Ricar-
do Dias Duarte, Secretário.
AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 131.249 (AgRg) — MS
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Afmistro Carlos Valioso
Agravante: Banco Bamerindus do Brasil S/A — Agravado: Antônio Balbino
de Almeida Júnior
tucionat
ConstitactonaL Recurso Extraordinário. Matéria infraconsti-
I — Inocorrd' wia de questão constitucional decidida, certo
que a argumentação do recorrente gira em torno de matéria infraconstitudonal — valor de provas e interpretação do art. 74, CLT.
II — RE inadmitido. Agravo improvido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por decisão unânime, negar
provimento ao agravo regimental.
Brasília, 1° de junho de 1993 — Néri da
Silveira, Presidente — Carlos Valioso, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Carlos Vdloso: Tratase de agravo regimental contra decisão que
negou seguimento ao agravo de instrumento interposto de decisão indeferitória do
processamento de recurso extraordinário
manifestado com fundamento no art. 143
da Constituição anterior, em que se aponta
como violado o art. 153, parágrafos 1° e ?
da mesma Carta.
Tem este teor a decisão agravada:
Entendeu a decisão agravada que o
extraordinário não tinha condições de
prosperar, porque, no caso «a discussão
gira em torno da interpretação de dispositivo da Norma Consolidada — art. 74
—, o que não enseja o recurso com base
no art. 143, da Norma Maior, que pressupõe a violação direta e frontal a preceito constitucional...»
268
R.T.J. — 150
Está correta a decisão agravada, por isso
que, como bem acentua o parecer da Procuradoria-Geral da República, «toda a argumentação do recorrente trata, na verdade, de matéria infraconstitucional — valor
de provas e interpretação do art. 74 da
Consolidação das Leis do Trabalho» (fi.
83).
Diz o agravante, depois de historiar o
andamento do processo nas instâncias inferiores, que pretende lhe seja dado 4(0 direito
constitucional de ver apreciada a questão
do exercício de cargo de confiança exercido pelo reclamante, o que faz com que o
mesmo não tenha direito a horas extras, e,
quanto ao depoimento de uma única testemunha, contraditada pelo reclamado, por
ter o mesmo ação própria contra o mesmo
banco, depoimento este determinante da
condenação ocorrida, o que é expresso no
art. 5°, H e XXXVda CF, no momento
processual adequado e necessário...», conforme jurisprudência da Suprema Corte
(RE 114.230-8-BA, Rel. Min. Oscar Corrêa, DJ de 27-11-87). Ressalta que a decisão ora agravada não enfrentou a questão
constitucional posta em julgamento e que
«o que ficou ausente é a análise de questões
fálicas anteriores e definidoras de circunstâncias próprias para o deslinde de questões
propostas, como o exemplo do cargo de
confiança que nada tem com a interpretação do art. 74 da CLT».
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Velloso (Relator): A Procuradoria-Geral da República,
oficiando às fls. 79/80, parecer lavrado pela
ilustre Subprocuradora-Geral Odilia Ferreira da Luz Oliveira, assim se manifestou:
O recurso extraordinário indeferido
volta-se contra acórdão que negou provimento a agravo dirigido, por sua vez,
contra despacho denegatório de seguimento a recurso de revista.
Tal acórdão afastou, sem justificar, a
violação dos arts. 153, *à 1°, 2° e 4°, da
Constituição em vigor à época (fl. 55).
O ora agravante, então, opôs embargos
de declaração, cujo acórdão justificou
apenas a negativa de ofensa ao § 4°,
continuando omisso quanto aos ৠ1° e
2° (fi. 59).
No extraordinário, o agravante aponta infrigência dos *à 1° e ? por parte do
acórdão do Tribunal Regional do Trabalho, quando é certo que deveria atacar a
decisão proferida no agravo de instrumento.
Isso jáé suficiente para não se conhecer do recurso extraordinário. Mas podese salientar, ainda, o fundamento do despacho agravado: toda a argumentação
do recorrente trata, na verdade, de matéria infraconstitucional — valor de provas e interpretação do art. 74 da Consolidação das Leis do Trabalho.
BI
Demonstrada a inviabilidade do recurso extraordinário, opino pelo desprovimento do agravo». (fls. 79/80)
Por isso mesmo, neguei trânsito ao agravo de instrumento, dado que, conforme é
fácil verificar, a argumentação do recorrente gira em tomo de matéria infraconstitucional —valor de provas e interpretação do
art. 74, CLT.
Confiam a decisão agravada, por seus
fundamentos.
Nego seguimento ao agravo.
EXTRATO DA ATA
Ag. 131.249 (AgJtg) —MS--Rel.: Min.
Carlos Venoso. Agte.: Banco Bamerindus
do Brasil S/A (Adv.: Cristiana Rodrigues
Gontijo). Agdo.: Antonio Balbino de Almeida Júnior (Adv.: Jose Torres das Noves).
Decisão: Por unanimidade, a Turma negou provimento ao agravo regimental. Au-
R.T.J —150
sentes, ocasionalmente, os Ministros Paulo
Brossard e Francisco Rezek.
Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Paulo Brossard, Carlos Venoso, Mamo Au-
269
rélio e Francisco Rezek. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Mardem Costa
Pinto.
Brasília, 1° de junho de 1993 — José
Wilson Aragão, Secretário.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 140370 — MT
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence
Recorrentes: Guido Laino e cônjuge — Recorridos: Fernando Gonçalves de
Souza e outros
Sentença: exigência constitucional de fUndamentação: intdigênda.
O que a Constituição exige, no art. 93, IX, é que a decisão
judicial seja fundamentada; não, que a fundamentação seja correta, na
solução das questões de fato ou de direito da lide: declinadas no julgado
as premissas, corretamente assentadas ou não, mas coerentes com o
dispositivo do acórdão, está satisfeita a exigênda constitudonal.
ACÓRDÃO
depomos e principalmente, a introdução de
gado nas pastagem, atingindo uma área de
Vistos, relatados e discutidos estes au- centenas
de hectares, difícil de precisar.
tos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na conOs réus contestaram a demanda, neganformidaie da ata do julgamento e das notas do a turbação da posse dos autores, uma vez
taquigráficas, por unanimidade de votos, que, desde 1980, estão ocupando as terras
em não conhecer do recurso extraordinário. mansa e pacificamente, fazendo melhorias
imóvel, bem como a posse de seus anteBrasília, 20 de abril de 1993 —Moreira no
cessores
de 1974 e a dos antecessores
Alves, Presidente — Sepúlveda Pertence, destes, dedata
mais de 30 anos; aduziram, mais,
Relatos.
que, de qualquer modo, os autores jamais
RELATÓRIO
exerceram posse na parte da fazenda, que
reclamam.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence:
O juiz de primeiro grau acolheu o pediCuida-se de ação de possessória, dita de
manutenção, proposta por Fernando Gon- do, com fundamento no artigo 499 do Cóçalves de Souza e outros contra Guido Lai- digo Civil e 926 do Código de Processo
no e cônjuge.
Civil. Entendendo a sentença configurasse, no caso, má-fé na posse dos réus, não
Alegaram os autores que são senhores e lhes
deferiu indenização.
possuidores de 3.038 hectares de terras «pastais e lavradias», cujas divisas descrevem,
O Tribunal de Justiça deu provimento,
denominadas «Fazenda Santa Paula», em em parte, à apelação dos réus, apenas para
Barra do Bugres, MT, e que, há mais de três reconhecer-lhes a boa-fé e, em conseqüênanos, os réus invadiram parte dessas terras cia, deferir a indenização das benfeitorias
com piquetes de gado, barracão, chiqueiro (fl. 276).
270
R.TJ. — 150
O voto condutor do acórdão, na parte em
que confirmou a sentença, é do seguinte
teor (fis. 268/273):
«Versa esta causa sobre uma ação de
manutenção de posse proposta por Fernando Gonçalves de Souza e Antônio
Gonçalves de Souza e suas respectivas
mulheres, ora apelados, contra os apelantes Guido Laino e sua mulher, através da qual os autores visam garantir sua
posse sobre uma área, da qual dizem ser
senhores e possuidores, constantes de
3.038 hectares de terras pastais e lavradias, destacada em porção certa, do antigo lote «Santa Elvira», Município de
Barra do Bugres, tendo seu marco inicial na barra do Ribeirão Onça Magra do Rio Paraguai, seguindo as divisas conforme foram descritas na inicial, onde também historia a origem da
propriedade, inclusive afi rmando que a
mesma se acha cadastrada no INCRA
sob o n° 903.035.036.021-1, bem assim
fora adquirida de José Luiz Nespoli, matrícula n° 12.844, Livro n° 2, registro
7.381, registro feito no RI daquela corna/Ca.
Alegam eles, autores, que os atos de
turbação se configuram em invadirem
uma parte das mesmas terras (há mais de
três anos), e que se situam abaixo dos
alagados da 'Baía Grande', até a foz do
Ribeirão Onça Magra, no Rio Paraguai,
com piquetes para gado, barracão, chiqueiro de porcos e, prmcipalmente, a
introdução de gado nas pastagens naturais, cuja turbação é difícil de se precisar, mas que atinge a centenas de hectares.
Os réus contestaram a demanda e
renovaram nas razões do apelo, asseverando que não turbaram a posse dos
apelados, pois que, desde 1980, mansa
e pacificamente, lá estão ocupando e
fazendo melhorias no imóvel, enquanto
que seus antecessores em-IÇA-Hun posse
sobre o mesmo desde 1974 e, por sua
vez, aqueles que lhes transferiram, exerciam-na há mais de trinta anos e nunca,
em tempo algum, os apelados exerceram posse no imóvel, nem tampouco
seus antecessores. Não tendo exercido
atos possessórios, carecem de ação, eis
que ausente um dos pressupostos: o da
posse anterior.
Dizem, ainda, que a ação não pode
prosperar, porque a posse não é duvidosa, pois a exercem, como também não
há como se oferecer guarida à mesma,
tal como fora proposta, porque impossível o exame do domínio.
Por último dizem: não se nega que os
apelados sejam titulares e seus antecessores, de alguma área, naquelas proximidades; o que se recusa é sua incidência onde a pretendem; se reconhecer tratar-se de posse de boa-fé, lhes seja assegurado o direito de indenização pelas
benfeitorias realizadas no imóvel.
A presente ação, também chamada
de força turbativa, é prevista nos artigos 499 do Código Civil e 926 do
Código de Processo Civil.
É certo que, no juízo possessório, não
se discute a propriedade: nem por isso
quer dizer que o legítimo proprietário
seja preterido em seu direito pelo simples possuidor.
Com efeito, segundo se vê dos artigos 505 do Código Civil e 923 do Código de Processo Civil, os mesmos versam
sobre a hipótese da alegação do domínio
na ação possessória, sendo ambos claros
em preverem esta situação.
Comentando a respeito, salienta Carvalho Santos, 'será absurdo negar-se a
posse a quem, evidentemente possui o
domínio, obrigando-o, por simples formalismo, a volta a juízo armado dos
mesmos documentos e das mesmas demais provas, por meio da ação reivindicatória, para pleitear aquilo mesmo que
lhe foi negado e que, nessa nova ação,
R.T.J —150
lhe será deferido' (Código Civil Int.,
vol. VII, pág. 160).
Também, a respeito, a jurisprudência
tem entendido da mesma forma, como
se vê voto do Desembargador Jesus de
Oliveira Sobrinho, quando Relata:
«É assim que o artigo 923 do Código de Processo Civil, ao versar a
hipótese da alegação de domínio na
ação possessória, expressa e exclusivamente se refere à manutenção e à
reintegração, conforme podemos verificar do seu texto In verbis: «Não
obsta, porém, à manutenção ou à reintegração na posse a alegação do domínio...» (v. Edson Prata, Rep. de
Jur., do CPC 3921 — Vol. 15, pág.
4914).
Portanto, no tocante à matéria alegada pelos apelantes, sustentando não poderem os apelados, com respeito à proteção de sua posse, alegarem a exceptio
proprietatis, a mesma não pode ser acolhida, pois, a pretensão exposta na inicial, objetiva a proteção da posse na
qualidade de senhor e possuidor.
Também, a irresignação dos apelantes
ao pertinente às alegações, quando afirmam não terem turbado ou molestado a
posse dos apelados, bem assim de que
estes não mantêm aposse sobre o trato de
taras, cujos limites vêm traçados na inicial, não merece provimento neste outro
aspecto, e tem cabimento a ação.
Ora, no caso em exame, a prova é
exuberante, no sentido de que os apelados,
não só mantinham a posse anterior na área
disputada, que é justamente o requisito
principal da ação possessória, e que, embora nela molestados por atos praticados
por eles apelantes, não veio a perdê-la.
A instrução da causa, inclusive com
a prova pericial, clareou a controvérsia
Pelo que se verifica do laudo pericial,
da lavra do Dr. Perito do Juízo, age-
271
ciando suas afirmativas, encontramos o
seguinte:
Ao responder ao 10° quesito formulado pelos apelados:
«10. Se a ocupação dos suplicados Unido Laino e sua mulher estão
dentro do perímetro da Fazenda SantaPaula, antes Fazenda Santa Elvira?
Resposta: A ocupação dos réus
Unido Laino e sua mulher está dentro
do perímetro da Fazenda Santa Paula, dos autores...» (fi. 99-TJ)
Nesta mesma resposta, o Dr. Perito
fez a seguinte observação:
«Veja planta da Fazenda Santa
Paula confeccionada com elementos
da Escritura recebida pelos autores, e
também planta e memorial descritivo
da medição primitiva do lote Santa
Elvira, onde há apressa referência à
confluência do Rio Onça Magra com
o Rio Paraguai, margem direita deste.» (fi. 99M)
Ainda a prova documentada por fotografias existentes nos autos, deixa bem
clara a certidão da posse dos apelados e
os vestígios dos atos de turbação por
parte dos apelantes.
In casu, entendemos mais, ser decisiva em favor dos apelados a prova testemunhal para estabelecer a posse anterior dos mesmos e a turbação pelos atos
praticados pelos apelantes. Vejamos:
Para a testemunha de nome José Ramos da Cruz, em seu depoimento, informa o seguinte
que o córrego Onça Magra
deságua no Rio Paraguai, mas no local a que se refere a inicial, o rio tem
dois braços, um deságua numa baía
conhecida por baião e o outro desce
para a baía Fabrício; que dessas
bafas, o riacho Onça Magra acaba
desaguando no Rio Paraguai; que até
1970, o Sr. tinido Laino não residia
272
R.TJ. — 150
no local; que a familia que residia no
vel objeto da ação, provou que os venlocal era conhecida cano família Ludedores deram-lhes a posse (título) de
cas.» (fl. 170-Ti)
fato, no imóvel objeto da venda e que
essa posse foi violentada, depois por
Lendo-se os depoimentos das demais
atos praticados pelos apelantes.
testemunhas inclusive as arroladas pelos apelantes, verifica-se que suas inforA prova, efetivamente, não demonsmações não são conflitantes, 'porém,
tra a alegada posse que pudesse ensejar
robustas à pretensão dos apelados, apea prescrição aquisitiva de propriedade,
sar de se apresentarem de difícil comde que alegaram os apelantes, cujaprova
preensão', como bem asseverou o MM.
estava a seu cargo.
Juiz prolator da decisão recorrida.
Assim, deve vingar a ação possessóÉ muito significativo, por outro lado,
ria proposta pelos apelados, como apreque os apelantes reconhecem dois fatos:
ciou e decidiu o MM. Juiz, ut sinta
a) «não se nega que os apelados sejam
em sua sentença, pois que o proprietário
titulares e seus antecessores, de alguma
e possuidor é o legítimo titular da resárea, naquelas proximidades»; b) não
pectiva ação.
negam estar ocupando e fazendo melhoAliás, a propósito, já foi decidido:
rias no imóvel, afirmando que não existe
incidência com a posse dos apelados.
«Possessória — Reintegração de
posse — Ação ajuizada por comDemais disso, as alegações dos apeprador de imóvel — Procedência —
lantes, vêm desacompanhadas de eleApelação não provida
mentos convincentes, enquanto que os
apelados, autores da ação, como lhes
Admite-se a reintegração de posse
incumbia, produziram provas dos fatos
para o comprador de imóvel a posse
constitutivos da relação jurídica litigiodeste, posto que o atual Código de
sa (mc. 1, art. 333 do CPC), provas essas
Processo Civil suprimiu a ação de
satisfatórias de sua posse jurídica e a
imissão de posse.» (cf. Apel. Cível n°
continuação desta, que vem caracteri246.377 —4° Cara C. do TJSP, Rel.
zando pela prática dos atos exeriorizanDes. Henrique Machado, julgamento
tes da propridade.
em 23-10-75, In Rep. de Jur. do CPC
—Edson Prata, vol. 16, pág. 4974, n°
Caracterizou-se, destarte, a turbação
3947).
que se haveria de obstar com o emprego
do interdito de manutenção de posse,
Os embargos de declaração, que alegasendo que sentença recorrida examinou ram erro material e obscuridade na motivacom propriedade a espécie em deslinde, ção, quanto à prova testemunhal, bem como
pois que o magistrado, fundamentada- contradição, dúvida e omissão quanto à
mente, louvou-se não só na prova teste- perícia, e pediram o esclarecimento das
munhal, que se afina com as conclusões dúvidas e suprimento das omissões, foram
periciais e ainda na inspeção judicial rejeitados (Lis. 293/296).
realizada, como razão de decidir.
Donde a interposição de recurso exO certo, em suma, é que, segundo a traordinário e recurso especial, ambos deprova apurada nos autos, ficaram de- feridos (fls. 355/356 e 352/354).
monstrados, amplamente, os requisitos
No Superior Tribunal de Justiça o recurnecessários à posse dos apelantes, incluso
especial
não foi conhecido.
sive a localização da área litigiosa, consoante o requerido na inicial, isto porO RE, a, alegou vulneração dos arte. 5°,
que, na qualidade de adquirentes do imó- XXXV e 93, IX, da Constituição Federal,
R.TJ —150
por ausência de motivação dos acórdãos,
conforme resumiu o recorrente, verbis (fl.
315):
«a) tendo o v. acórdão concluído que
os Réus não tinham razão em argüir o
usucapião, havendo reconhecido a posse de boa-fé, cumpria atendesse ao reclamo dos embargos declaratórios, motivando a inoconência da presaição, com
a enunciação de data e fatos concretos;
afirmando o v. acórdão que os
Autores estavam na posse e que esta
depois foi violentada pelos Réus, conto
este é um ponto nodal da ação possessória, impunha-se fosse declinado quando
e como sucedeu tal violência;
inscrevendo o v. Acórdão que a
prova pericial clareou a controvérsia e
como aquela prova registra que na área
em litígio 'não foram encontradas manifestações da presença dos Autores', essa
contradição precisava ser esclarecida.»
(11. 315)
Oficiando pelo Ministério Público Federal, a ilustre Subprocuradora-Gera1, Anadyr Rodrigues opinou pelo não conhecimento do recarrso.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relato* Restrito à matéria constitucional, cinge-se o recurso extraordinário à alegação
de ofensa do art. 93, IX, da Lei Fundamental, que determina sejam fundamentadas
todas as decisões do Poder Judiciário.
2. Dei-me ao trabalho de ler — e à
Turma, o de ouvir —todo o voto condutor
do acórdão recorrido. O seu teor demonstra
que, sejam quais forem os seus defeitos na
apreciação da prova ou na aplicação do
direito aos fatos que julgou provados, o
certo é que não se pode afirmar que careça
de motivação: o que a Constituição exige,
no preceito invocado, é que a decisão seja
fundamentada, não, que a fundamentação
273
seja correta: cl«rlistates no julgado as razões do decime, está satisfeita a exigência
constitucional.
Vícios de motivação existente podem
levar à cassação ou à rescisão do julgado.
Assim, por exemplo, a contrariedade substancial à lei ou à Constituição, que na motivação se revele; ou ainda o erro de fato,
como, em tese, o que os recorrentes imputam ao acórdão, no ponto em que admitiu
como real um fato que dizem inexistente,
qual a posse dos autores sobre a área questionada que, ao contrário, os réus já ocupariam, antes da aquisição pelos primeiros da
Fazenda em que se inclui a gleba.
São questões, no entanto, que ou reclamam via processual diversa ou, quando
acaso dessem margem ao recurso extraordinário, não guardam pertinência com a
exigência de motivação das decisões judiciais, único fundamento constitucional deduzido na interposição do presente.
Certo, há um defeito de fundamentação de sentença que se pode reputar equivalente ao de sua inexistência: é a de falta
de coerência lógico-jurídica entre amotivação e o dispositivo (CF, HC 69.419, 23-692, Pertence, Dl 28-8-92).
Não é o caso, porém. Acertadamente
ou não, o acórdão recorrido, à luz da prova
ou da interpretação, que emprestou, a normas de direito possessório, assentou premissas que induziram à procedência do pedido de reintegração.
7. Desse modo, não conheço do recurso:
é o meu voto.
EXTRATO DA ATA
RE 140.370 — MT — Rel.: Mn. Sepúlveda Pertence. Recta.: Guido Laino e cônjuge (Advs.: Rubens Amo Sella e outro).
Recdos.: Fernando Gonçalves de Souza e
outros (Adv.: Antônio Antero de Almeida).
274
R.TJ. — 150
Decisão: A Turma não conheceu do recurso extraordinário, nos termos do voto do
Relator. Unânime.
Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Octavio Gallotti, Sepúlveda Pertence, Cel-
so de Mello e limar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Miguel Franzino Pereira.
Brasília, 20 de abril de 1993 — Ricardo
Dias Duarte, Secretário.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 140.705 — CE
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence
Recorrente: União Federal — Recorridos: Rádio FM Casablanca Ltda. e
outros.
Contribuição soda! sobre o lucro (Lei n° 7.689/88): constitudonalidade de sua instituição, fundada no art. 195, I, CF; inconstituelomdidade, porém, de sua exigência sobre o lucro apurado em 31-12-88, à
vista do art. 195, § 6°, da Constituição (STF, RREE 146.733 e 138.284).
Renda das pessoas jurídicas, no caso o
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes au- lucro». (fls. 59/65)
O acórdão recorrido manteve a sentença
tos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na con- de primeiro grau, fundando-se em decisão
formidade da ata do julgamento e das notas plenária do Tribunal a quo, que acolhera a
taquigráficas, por unanimidade de votos, argüição de inconstitucionalidade da citada
em conhecer do recurso e dar-lhe provi- lei.
mento, em parte.
Opostos embargos de declaração, foBrasília, 6 de abril de 1993 — Octavio ram acolhidos, determinada a juntada aos
Gallotti, Presidente — Sepúlveda Perten- autos do acórdão plenário que decidiu o
incidente de inconstitucionalidade. (fl.
ce, Relator.
106)
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence- do.A União interpôs, então, RE, b, admitiCuida-se de ação proposta pelas empresas
o relatório.
recorridas, objetivando seja declarada a inexigibilidade da contribuição social instituíVOTO
da pela Lei n° 7.689/88, sobre os lucros
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence
apurados pelas autoras, ou pelo menos, em
relação ao exercício financeiro de 1989, (Relator): Dado que a decisão recorrida
declarou a inconstitucionalidade de lei feano-base de 1988.
A sentença de primeira instância julgou deral, conheço do recurso extraordinário
procedente a ação, declarando, incidental- (CF, 102, III, b).
Ao julgar o RE 146.733, de 29-6-92,
mente, a inconstitucionalidade da referida
lei federal instituidora da exação questio- Moreira Alves, e o RE 138.284, de 1°-7-92,
nada, «na parte que tomou o mesmo fato Venoso, o plenário do Supremo Tribunal,
gerador e base de cálculo do Imposto de embora reputasse válida a instituição da
R.TJ —150
contribuição social impugnada — objeto
dos arts. 1°, 2° e 3° da Lei n° 7.689/88 —
declarou a inconstitucionalidade do seu art.
8°, que já a tomava exigível sobre o lucro
do exercício de 1988, contrariando a regra
de anterioridade mitigada do art. 195, ü 6°,
da Lei Fundamental.
No caso, foi julgada procedente a ação,
reconhecendo a sentença, incidentemente,
que a Lei n° 7.689/88 é inconstitucional
«na parte em que tomou o mesmo fato
gerador e base de cálculo do Imposto de
Renda das pessoas jurídicas, no caso o
lucro». (f1 65)
O acórdão recorrido confirmou a sentença, fundando-se em precedente do plenário que acolhera argüição de inconstitucionalidade da Lei n° 7.689/88, «à míngua
de Lei Complementar que estabeleça o
âmbito dentro do qual pode o legislador
ordinário criar contribuições sodais com
fundamento no artigo 149 da Constituição».
275
EXTRATO DA ATA
RE 140.705 — CE —Rel,: Min. Sepfilveda Pertence. Recte.: União Federal
(Adva.: Procuradoria da Fazenda Nacional). Recdos.: Rádio FM Casablanca Ltda.
e outros (Advs.: Schubert de Farias Machado e outro).
Decisão: A Turma conheceu do recurso
e lhe deu provimento, em parte, nos termos
do voto do Relator. Unânime.
Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotti, na ausência justificada do Sr. Ministro
Moreira Alves (Presidente). Presentes à Sessão os Srs. Ministros Sepúlveda Pertence e
Celso de Mello. Ausente, justificarbunente„
o Sr. Ministro limar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Miguel Frauzino Pereira.
Brasília, 6 de abril de 1993 — Ricardo
Dias Duarte, Secretário.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 140.924 (EDd) —DF
(Primeira Turma)
Relator. O Sr. Ministro Moreira Alves
Embargante: Miguel Tavora Goulart Lopes — Embargada: União Federal
Embargos de declaração.
— Inexistência de omissão no acórdão embargado.
— O acórdão recorrido, salientando que o Plenário da Corte
havia julgado, recentemente, dois recursos extraordinários sobre casos
análogos ao presente, se fundou nesses precedentes que decidiram que o
artigo 8° do ADCT da Constituição não se aplica a promoções, por
merecimento, de militares, porquanto, se estivessem em serviço ativo a
das não teriam direito, uma vez que elas, por sua própria natureza,
geram apenas expectativa de direito.
Aliás, ainda que não fosse — como é — índia à natureza
mesma da promoção por meredmento a inexistência de direito a ela, o
só fato de a Constituição dizer que os anistiados teriam direito às
promoções a que teriam direito se continuassem na ativa implicaria a
elementar necessidade, para a aplicação, ou não, do texto constitucional,
276
R.TJ.— 150
da verificação da existência, ou não, desse direito em face da legislação
a ele pertinente. Isso, evidentemente, diz respeito à aplicação direta da
Constituição, e a concessão de direito inexistente implica, também,
obviamente, desrespeito direto ao texto constitucional, por inobservfmda da condição por ele estabelecido.
Embargos de declaração rejeitados.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, ha conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos,
rejeitar os embargos de declaração, nos termos do voto do Relator.
Brasília, 30 de março de 1993 — Moreira Alves, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): É este o teor do acórdão embargado:
e... lê
(fls. 237/238)
A esse atesto opõem-se embargos declaratórios em que se alega (fis. 242/255):
e... lê ...»
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): 1. Não há omissão alguma ase suprida
O acórdão recorrido, salientando que o
Plenário da Corte havia julgado, recentemente, dois recursos extraordinários sobre
casos análogos ao presente, se fundou nesses precedentes que decidiram que o artigo
8° do ADCT da Constituição não se aplica
a promoções, por merecimento, de militares, porquanto, se estivessem em serviço
ativo a elas não teriam direito, uma que
elas, por sua própria natureza, geram apenas expectativa de direito.
Aliás, ainda que não fosse —como é —
insita à natureza mesma da promoção por
merecimento a inexistência de direito a ela,
o só fato de a Constituição dizer que os
anistiados teriam direito às promoções a
que teriam direito se continuassem na ativa
implicaria a elementar necessidade, para a
aplicação, ou não, do texto constitucional,
da verificação da existência, ou não, desse
direito em face da legislação a ele pertinente. Isso evidentemente, diz respeito à aplicação direta da Constituição, e a concessão
de direito inexistente implica, também, obviamente, desrespeito direto ao texto constitucional, por inobservância da condição
por ele estabelecida
2. Em face do exposto rejeito os presentes embargos.
EXTRATO DA ATA
RE 140.924 (Ene» — DF — ReL: Min.
Moreira Alves. Embte.: Miguel Távora Goulart Lopes (Advs.: Hélio Gonçalves e outro). Embda: União Federal.
Decisão: A Turma rejeitou os embargos
de declaração, nos termos do voto do Relator. Unânime.
Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Octavio Gallotti, Celso de Mello e limar
Gaivão. Ausente, justificadamente, o Sr.
Ministro Sepúlveda Pertence. Subprocurador-Geral da República, lk Antonio Fer
-nadoBrseSilvuza.
Brasília, 30 de março de 1993 — Ricardo Dias Duarte, Secretário.
R.TJ — 150
277
RECURSO EXTRAORDINÁRIO N• 141.649 — SP
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro limar Gaivão
Recorrente: Instituto Nacional do Seguro Social — INSS — Recorrida:
Aparecida Fogaça de Oliveira
Previdência Social Artigo 58 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.
A revisão dos benefídos previdenciários expressos em quantidade de salários mínimos, na data de sua concessão, pelo critério
estatuído, para o futuro, pelo artigo 58 do Ato das Disposições Constituicionals Transitórias, não abrange prestações anteriores ao período
Inicial de sua vigência.
Recurso extraordinário conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os lvfmistros do Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, na
conformidade da ata de julgamento e das
notas taquigraficas, por unanimidade de
votos, em conhecer do recurso e lhe dar
provimento, nos termos do voto do Relator.
Brasília, 21 de setembro de 1993 —
Moreira Alves, Presidente — Binar Gaivão, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro limar Gaivão (Relator): O Segundo Tribunal de Alçada Civil
do Estado de São Paulo deu provimento ao
apelo do obreiro, reconhecendo-lhe o direito de perceber auxílio-doença acidentário
no período de 4 de novembro de 1984 a 17
de novembro de 1986 e, a partir daí, aposentadoria por invalidez, e determinou que
os benefícios, desde a data de sua concessão, tivessem seus valores reajustados levando-se em conta a incidência do art. 58
do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, de modo que viessem a corresponder à mesma quantidade de salários tnínimos por ocasião do pagamento.
No recurso extraordinário interposto
pelo Instituto Nacional do Seguro Social —
INSS, exclusivamente com fundamento na
alínea a do permissivo constitucional, alega-se ofensa ao art. 58 do Ato das Disposições Constitucionais Transitória Aduz-se
que as modificações no critério de reajuste
dos benefícios previdenciários decorrentes
da nova Constituição só passaram a ser
aplicáveis a partir do tnês de abril de 1989,
pois até o sexto mês seguinte à promulgação da Carta a atualização processara-se
pela aplicação dos índices previdenciários.
O recurso foi admitido na origem pelo
despacho de fls. 127/128.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro limar Gaivão (Relator): Trata-se, no caso, de auxílio-doença
acidentário e aposentadoria por invalidez
que o mesto recorrido determinou que fossem pagos a partir de 17 de novembro de
1984, e 18 de novembro de 1986, respectivamente.
Ao determinar a observância para todo
o crédito do critério estatuído, para o futuro, pelo artigo 58 do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias, sobre prestações anteriores ao período inicial de sua
vigência, como o próprio texto observa quando diz «as prestações mensais dos benefícios atualizados de acordo com este artigo
serão devidas e pagas a partir do sétimo
278
R.TI. — 150
mês a contar da promulgação da Constituição», o acórdão recorrido fez retrooperar a
referida disposição.
Procede, assim, o articulado pela autarquia recorrente.
Aliás, precedentes similares já foram
julgados por esta Turma — RE 137.794-1
— Relator o eminente Ministro Octavio
Gallotti e RE 140.492, de que fui relator,
seguindo-se, a partir daí, o julgamento de
outros casos. O entendimento que ficou
estabelecido está expresso na ementa do
acórdão dos recursos que relatei, verbis:
«Previdência Social. Artigo 58 do Ato
das Disposições Constitucionais Transitórias.
A revisão dos benefícios previdenciários expressos em quantidade de salários mínimos, na data de sua concessão, pelo critério estabelecido, para o
futuro, pelo artigo 58 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, não
abrange prestações anteriores ao período inicial de sua vigência-
Recurso extraordinário conhecido e
provido.»
Ante o exposto, conheço do recurso e
lhe dou provimento.
EXTRATO DA ATA
RE 141.649 — SP — ReL: Min. Binar
Gaivão. Recto.: Instituto Nacional do Seguro Social—INSS (Advs.: AneteRodello
e outros). Recria.: Aparecida Fogaça de
Oliveira (Advs.: Fernando Guimarães de
Souza e outro).
Decisão: A Turma conheceu do recurso
e lhe deu provimento, nos termos do voto
do Relatar. Unânime. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Min. Sepúlveda Pertence.
Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes h Sessão os Srs. Ministros
Sydney Sanches, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e limar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Artur Castilho
Pereira Neto.
Brasília, 21 de setembro de 1993 —
Ricardo Dias Duarte, Secretário.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 143.619 — PE
(Primeira Turma)
(AgRg na RTJ 148/286)
Relator: O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence
Recorrente: União Federai — Recorrida: Ferreira Pinto & Cia. Ltda.
Controle incidente de constitucionalidade: declaração de luconstitucionalidade por acórdão plenário, que, embora proferido em
causa diversa, se integra à decisão do órgão fracionário que, com base
nele, afastou a incidência da lei julgada inválida: cabimento de embargos
de declaração para obter de Turma julgadora a determinação de juntada
aos autos do teor de decisão plenária em que fundou o julgamento do
caso concreto.
ACÓRDÃO
em conhecer do recurso e dar-lhe provimento, em parte.
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na con- Brasília, 6 de abril de 1993 — Octavio
formidade da ata do julgamento e das notas Gallottt Presidente— Sepfalveda Pertentaquigráficas, por unanimidade de votos, ce, Relator.
R.TJ — 150
RELATÓRIO
0Sr. MlnistniSepúlvedaPertaice Cuida-se de ação ajuizada pela empresa recorrida, visando à declaração de inexistência
de débito fiscal correspondente à contribuição social instituída pela Lei n° 7.689/88,
relativamente ao ano-base de 1988.
A ação foi julgada improcedente em
primeira instância, mas o Tribunal Regional Federal da 5' Região, por sua l' Turma,
deu provimento à apelação da autora, declarando a inconstitucionalidade da exação
questionada.
A União opôs embargos de declaração,
pretendendo a explicitação de que o «acórdão embargado se funda na decisão do Plenário proferida na Argüição de inconstitucionalidade suscitada na AMS 976-AL» e
a «incorporação ao anato impugnado de
todos os fundamentos que ensejaram a referida declaração de inconstitucionalidade». A Turma, porém, rejeitou os embargos, nestes ternos (fl. 129):
«Embargos declaratórios. Decisão
da Turma.Argiiiçãodeinconstituciona!idade suscitada em outro processo.
Quando, em processo de competência das Câmaras ou Turmas, verifica-se
o incidente de inconstitucionalidade, a
decisão do Pleno passa a ser parte integrante do acórdão que vier a ser proferido pelo órgão fracionado. Todavia, em
processo diverso, em que não foi suscitado o incidente, mesmo que se discuta
questão de direito idêntica, as razões e
os fundamentos (consubstanciados nas
notas taquigráficas) daquela decisão plenária não se incorporamformalmente ao
acórdão do órgão fracionado, embora
sobre este julgamentoproduzamefeitos.
A função do julgador, nos embargos
declaratórios, não é responder à perquirição sobre decisão em argüição de inconstitucionalidade de lei suscitada em
outro processo submetido ao julgamento do Tribunal.
279
Embargos rejeitados. Decisão unânime.»
A União interpôs recurso especial e recurso extraordinário, ambos admitidos.
No Superior Tribunal de Justiça, contudo, o relator do recurso especial negou-lhe
seguimento (fl. 165), sem interposição de
recurso (fl. 166v.).
O RE, a e b, aponta contrariedade aos
artigos 97 e 5°, XXXV, da Constituição
Federal.
Sustenta a recorrente que, se tem «no
caso presente, uma decisão de Turma
declarando inconstitucionalidade de lei
em flagrante contrariedade ao artigo 97,
da CF, pelo que manifestamente nula».
Acrescenta que «instada a sanara omissão através de embargos declaratórios
(...), a. Egrégia Turma insistiu em não
reconhecê-la, denegando, assim, a prestação Jurisdicional em violação ao artigo
5°, inciso XXXV, da Carta Magna».
Pede ainda que, se não conhecido pelo
primeiro fundamento, seja o recurso recebido pela alínea b — já que a decisão declarou a inconstitucionalidade de lei federal —
e reconhecida a constitucionalidade da Lei
n° 7.689/88.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): É firme nesta Turma e no Tribunal
que, no controle incidente, o acórdão plenário que resolve e declara a inconstitucionalidade suscitada é parte integrante da decisão do caso concreto, juntamente com o
acórdão posterior, do órgão parcial, que
aplica à lide a solução da questão prejudicial.
2. Nessa linha, assentamos, no AgRg
RE 141.988, em 5-5-92, de que fui relator:
«1. Em processos cujo julgamento
caiba aórgãos parciais do Tribunal, suscitada a argüição de inconstitucionalida-
280
R.T.J. — 150
de da norma incidente, dá-se repartição
de competência por objeto do juízo, devolvendo-se ao Plenário a decisão da
questão prejudicial de constitucionalidade.
2. Desse modo, é no acórdão plenário
que se há de buscar a motivação da
decisão recorrida, com respeito à argüição de inconstitucionalidade, sendo indiferente o que a propósito do mérito
dela, contra ou a favor, se diga no acórdão da Turma.»
Trata-se de entendimento que deriva
do art. 97 da Constituição.
Não obstante, no caso concreto, para
negar-se, em embargos de declaração, a
incorporar ao seu acórdão o do Tribunal
Pleno, que decidira a prejudicial de inconstitucionalidade, partiu o acórdão recorrido
de uma distinção, assim deduzida no voto
condutor do ilustre Juiz Francisco Falcão
(fl. 125):
«Quando, em processo de competência das Câmaras ou Turmas, verifica-se
o incidente de inconstitucionalidade, a
decisão do Pleno passa a ser parte integrante do acórdão que vier a ser proferido pelo órgão fracionado. Todavia, em
processo diverso, em que não foi suscitado o incidente, mesmo que se discuta
questão de direito idêntica, as razões e
os fundamentos (consubstanciados nas
notas taquigráficas) daquela decisão plenária não se incorporam formalmente ao
acórdão do órgão fracionado, embora
sobre este julgamento produzam efeitos.
Por outro lado, a função do julgador,
nos embargos declaratórios, não é responder à perquirição sobre decisão em
argüição de inconstitucionalidade de lei
suscitada em outro processo submetido
ao julgamento do Tribunal.»
5. Estou, data veada, em que o distinguo da decisão recorrida é de ser repelido,
porque, levado às últimas conseqüências,
implicaria a nulidade do julgado.
Como assinalei no RE 121.791, no
âmbito do Supremo Tribunal, o art. 101
RISTF, que mantém sua força de lei, prescreveu que a adedaração deconsütucionaNade ou incomtitudondidade de Id ou
ato normativo, pronunciada por maioria
qualificada, aplica-se aos novos feitos submetidos às Turmas ou ao Plenário», ressalvada a proposta de revisão da jurisprudência (art. 103).
Ao disciplinar, para os outros tribunais, o incidente da argüição de inconstitucionalidade (arts. 480/482), o Código de
Processo Civil não conferiu expressamente
à declaração plenária essa eficácia vinculante dos órgãos parciais de cada tribunal,
fora do processo em que proferida.
Não obstante, é certo que se tem difundido a rotina de aplicação pelas Turmas
da precedente declaração de inconstitucionalidade, dispensando-se nova remessa da
questão ao Plenário.
É prática que se impôs por óbvias
razões de economia processual, à qual, em
linha de principio, não se opõe o art. 97 da
Constituição: sua legitimidade, no entanto,
pende de que o órgão parcial, ao decidir a
causa, se considera juridicamente vinculado à decisão plenária da questão de inconstitucionalidade, não obstante tenha sido provocada em processo diverso.
Se, ao contrário, a Turma pretende
reduzir o acórdão plenário a mero precedente jurisprudencial sem força vinculante,
a conseqüência é que não poderá decidir da
causa, sem novamente submeta ao Pleno a
prejudicial de inconstitucionalidade.
De tudo resulta que, para ser válida,
a decisão do órgão fracionário há de receber, como parte integrante sua, o acórdão
do Tribunal Pleno, declaratório da inconstitucionalidade de que se cogite.
12. E, nessa hipótese, provada por embargos de declaração, não pode a Turma
furtar-se a trazer aos autos o acórdão plenf»
R.T.1 —150
rio que é parte integrante da decisão da
Causa.
13. Desse modo, conheço do recurso e
lhe dou provimento para detenninar que a
Turma faça juntar o acórdão plenário reclamado nos embargos de declaração: é o meu
voto.
EXTRATO DA ATA
RE 143.619 — PE — ReL: Min. Sepúlveda Pertence. Recte.: União Federal
(Adva.: Procuradoria da Fazenda Nacional). Recda.: Peneira Pinto & Cia. Ltda.
(Advs.: Renato Santos Pinheiro e outros).
281
Decisão: A Turma conheceu do recurso
e lhe deu provimento, nos termos do voto
do Relator. Unânime.
Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotti, na ausência justificada do Sr. Ministro
Moreira Alves (Presidente). Presentes à Sessão os Srs. Ministros Sepúlveda Pertence e
Celso Mello. Ausente, justificadamente, o
Sr. Ministro limar Gaivão. SubprocuradorGeral da República, Dr. Miguel Franzino
Pereira.
Brasília, 6 de abril de 1993 — Ricardo
Dias Duarte, Secretário.
AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 143.689 (AgRg) — SP
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro limar Gaivão
Agravante: Companhia Brasileira de Aço — Agravado: Estado de São Paulo
ICM Mercadoria adquirida de outra unidade federativa sob o
regime de alíquota reduida. Pretendido reconhecimento do direito ao
crédito da diferença Alegaçdo de contrariedade ao princípio da ndo-ounuelatividade.
A aquisição de mercadoria adquirida de outra unidade federada sob o regime de "nota reduzida não enseja crédito fiscal pela
diferença.
Ausência de afronta ao princípio da não-cumtdatividade, que
objetiva tão-somente permitir que o imposto incidente sobre a mercadoria, ao final do ciclo produção-distribuição-consumo, não ultrapasse, em
sua soma, percentual superior à allquota máxima prevista em lei, resultado que não se inviabiliza pela denegação do pretendido crédito.
Agravo regimental a que se, nega provimento.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Trilbuinal Federal, por sua Primeira Turma, na
conformidade da ata de julgamento e das
notas taquigráficas, por unanimidade de
votos, em negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Relator.
Brasília, 21 de setembro de 1993 —
Moreira Alves, Presidente — filmar Gaivão, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro limar Gaivão (Relator): Trata-se de agravo regimental ajuizado contra o despacho que negou seguimento ao agravo de instrumento, verbis (fl.
200):
282
R.TJ. — 150
«Companhia Brasileira de Aço ajuizou ação ordinária contra o Estado de
São Paulo, pretendendo o reconhecimento do direito ao crédito do ICM correspondente à diferença de alíquotas nas
operações interestaduais.
A ação foi julgada improcedente,
tendo sido mantida, em apelação, a decisão.
Donde o recurso extraordinário, com
fundamento no art. 102, III, a e c da
Constituição Federal, alegando que o
acórdão recorrido violou o princípio
constitucional danão-cumulatividade, e
considerou válida lei estadual contestada em face da Resolução do Senado
Federal.
O despacho agravado indeferiu o recurso, salientando que a jurisprudência
do Pretório Excelso abona a tese do
acórdão recorrido (fls. 67/68).
Tratando-de de caso de alíquota reduzida, e não de isenção, comporta mero
abatimento, considerado o valor efetivamente cobrado, e não aquele resultante
da alíquota máxima.
Ainda recentemente, em sessão da
Eg. Primeira Turma, julguei caso de
idêntica natureza (RE 135.189-6), onde
me manifestei no sentido de que o princípio da não-curnulatividade do ICM, ao
que se depreende da letra do art. 23,
da CF/69, e ainda do art. 155, parágrafo
2°, I, da CF/88, se expressa pela necessidade de compensar-se, em cada operação relativa à circulação da mercadoria,
o montante do tributo que foi cobrado
nas operações anteriores, seja pelo próprio Estado, seja por outro, de molde a
permitir que o imposto incidente sobre
a mercadoria, ao foral do ciclo produção-distribuição-consumo, não ultrapasse, em sua soma, percentual superior
ao correspondente à alíquota máxima
prevista em lei para o tributo.
Assim, improcede a alegação de violação à norma constitucional invocada,
mostrando-se descabida a pretensão
crediticia deduzida pelo recorrente.
Frente ao art. 38 da Lei n° 8.038/90 e
ao parágrafo 1° do art. 21 do RISTF,
nego seguimento ao agravo.»
Alegou a agravante que a presente ação,
contrariamente ao que se verificou no precedente invocado na decisão impugnada,
versa fatos verificados antes do advento da
EC n° 23/83 (agosto/82 — dezembro/83),
havendo sido sustentado que, em face da
declaração de inconstitucionalidade da Resolução n° 7/80, do Senado Federal, deve
prevalecer, ou incidir, a única alíquota
constitucionalmente válida, isto é, a de
16%; e que, não obstante tenha a Constituição Federal feito menção, no art. 23, inc. II,
ao crédito do imposto «cobrado» nas operações anteriores, há de entender-se que o
sentido do termo «cobrado» não pode ser
outro a não ser o de ICM «incidente» nas
operações anteriores, posto que o direito ao
crédito decorre da realização do fato gerador relativo à operação anterior, e não da
circunstância de o montante devido ter, ou
não, sido efetivamente recolhido.
Aduziu ter sido esse o entendimento que
prevaleceu no STF, relativamente às aquisições isentas, de matéria-prima, o que não
impediu que o creditamento fosse efetuado,
uma vez que o imposto foi considerado
como «incidente» na operação anterior, por
força do princípio da não•cumulatividade.
Assim, se por deito da mencionada Resolução n° 07/80, do Senado, havia exoneração de uma parcela do ICM vendido para
outro Estado, não poderia o Estado de destino exigir o tributo sobre essa parte, sob
pena de enriquecimento ilícito.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro limar Gaivão (Relator): Mantenho o despacho agravado, pelos
seus próprios fundamentos.
R.T.J —150
O princípio da não-cumulatividade do
ICM já se exprimia pela necessidade de
abater-se «o montante cobrado nas anteriores (operações) pelo mesmo ou por outro
Estado», como meio apto a impedir que o
imposto incidente sobre a mercadoria, ao
final do ciclo produção-distribuição-consumo, venha a ultrapassar, em sua soma,
percentual superior ao correspondente à
alíquota máxima prevista em lei para o
tributo.
Se, por efeito da alíquota reduzida, beneficiou-se a agravante com pagamento
menor de imposto, não há como reconhecer-lhe direito a creditar-se, senão pelo
quanfinn desembolsado, não havendo que
se falar em exigência, pelo Estado de destino da mercadoria, da parcela que foi objeto de dispensa, se, na venda do produto
ao consumidor, não afetada pela isenção
parcial, embute-se o tributo integral, que a
agravante se limita a recolher ao Fisco.
Hipótese de idêntica natureza já foi
apreciada por ambas as Turmas do Supremo Tribunal Federal (RE 135.189 e Ag.
283
143.387, de que fui relator e Ags. 135.832
e 135.512, relator Ministro Marco Aurélio).
Manifesta, pelas razões expostas, a improcedência do agravo, meu voto é no sentido de negar-lhe provimento.
EXTRATO DA ATA
Ag 143.689 (AgRg) — SP —Rel.: Min.
limar Gabião. Agtes.: Cia. Brasileira de
Aço (Advs.: Celso Botelho de Moraes e
outros). Agdo.: Estado de São Paulo (Advs.:
Eliana Maria Barbieri Bertachini e outros).
Decisão: A Turma negou provimento ao
agravo, nos termos do voto do Relator.
Unânime.
Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Sydney Sanches, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e Ilmar GalVão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Artur Castilho
Pereira Neto.
Brasília, 21 de setembro de 1993 —
Ricardo Dias Duarte, Secretário.
AGRAVO DE INSTRUMENTO Ir 146.605 (AgRg) — PR
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro limar Gaivão
Agravante: Banco Bamerindus do Brasil S.A. — Agravado: Joel Leite
Pedroso
Trabalhista. Bancária Horas extraordinárias. Deferimento
com base nos fatos murados nas provas. Alegação de afronta ao art. 5°,
inc. XXXV, da Constituição.
A questão de saber-se se é justificável ou não pedido de
reavaliação das provas colhidas nos autos, que levaram ao deferimento
das horas extras, não se alça a nível constitucional, sendo inviável de
exame na via do recurso extraordinário, a despeito da alegada negativa
de prestação jurisdidonal e cerceamento de defesa.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, na
conformidade da ata do julgamento e das
notas taquigráficas, por unanimidade de
votos, em negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Relator.
284
R.TJ. — 150
Brasília, 18 de maio de 1993 — Moreira Alves, Presidente — limar Gaivão, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro limar Gaivão (Relator): O Banco Bamerindus do Brasil S.A.
apresenta agravo regimental, inconformado com o despacho que negou seguimento
ao agravo de instrumento de teor seguinte
(fls. 63/64):
«O Banco Bamerindus do Brasil S.A.,
inconformado com a decisão regional
que deferiu o pagamento, como extraordinárias, das sétimas e oitavas horas laboradas pelo obreiro bancário, recorreu,
via revista, para o Tribunal Superior do
Trabalho, apontando violação ao inc.
XXXV do art. 5° da Constituição Federal, porquanto, no seu entender, não
lhe foi prestada a jurisdição completa
quando da decisão proferida em embargos de declaração, culminando com
o cerceamento de defesa.
Inadmitida a revista, foi interposto
agravo de instrumento, que restou desprovido pela Terceira Turma daquela
Corte. Está consignado no acórdão (fl.
37):
«Todavia, o v. acórdão Regional
(fls. 10/16), juntamente com a r. decisão declarativa, ao contrário do que
alega o Recorrente, entregou-lhe ampla prestação jurisdicional, apreciando todas as questões que lhe foram
submetidas a julgamento, fundamentando-as como prescreve a lei.»
Daí o recurso extraordinário interposto pela instituição bancária, com
fundamento no art. 102, BI, a, da Carta
Federal, onde persiste o Banco na alegação de afronta ao art. 5°, inc. XXXV,
porque, no seu entender, não houve uma
análise dos fatos narrados nas provas, e
as razões que levaram à formação do
convencimento do julgador limitam-se
à simples afirmação de que a prova tes-
temunhal convence do fato alegado. Argúi, ainda, a inconstitucionalidade do
art. 40 da Lei n° 8.177/91, que trata da
exigência do depósito recursal.
O recurso não foi admitido, por implicar o revolvimento de matéria finco-probatória, vedado pelo princípio
inscrito na Súmula n° 279 desta Corte.
Na minuta de agravo insiste o agravante na inconstitucionalidade da exigência do depósito recursal, e contesta a
aplicação da Súmula, porque não pretende rever prova, mas sim saber os
motivos que levaram à formação da convicção do juízo, já que, segundo alega,
afirmações de natureza meramente dispositiva não atendem à necessidade de
ampla defesa.
Verifica-se que a decisão que deferiu
as horas extraordinárias ao agravado o
fez, à evidência, baseado «no conjunto
probatório que dos autos consta, examinado à exaustão». Assim esclareceu o
Tribunal Regional do Trabalho da e
Região nos embargos declaratórios
opostos com objetivo de sanar omissão
referente à apreciação da prova
Não há como o recorrente alegar que
a decisão recorrida não lhe entregou a
ampla prestação jurisdicional. Embora
possa parecer inexata, aos olhos do recorrente, a jurisdição foi prestada.
Assim, frente ao art. 38 da Lei n°
8.038/90 e ao â 1° do art. 21 do RISTF,
nego seguimento ao agravo.»
Insiste o agravante em que ocorrera negativa de prestação jurisdicional e cerceamento de defesa, tese que diz vir sustentando desde a interposição dos embargos de
declaração na instância regional, mas, no
entanto, a matéria foi rechaçada ao argumento de situar-se no âmbito estrito da
prova Acrescenta que a preliminar argüida
no recurso extraordinário e novamente colocada em destaque no agravo de instrumento, referente à inconstitucionalidade do
R.TJ — 150
art. 40 da Lei n° 8.177/91, que exige depó-
sito a cada novo recurso, foi apenas referida, mas não decidida pelo despacho ora
~o.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro limar Gaivão (Relator): A questão de saber-se se é justificável
ou não o pedido de readdise das provas
colhidas nos autos, que levaram ao deferimento das sétima e oitava horas como extras, não se alça a nível constitucional, sendo inviável de exame na via do recurso
extraordinário.
Embora o agravante insista que houve
negativa da prestação jurisdicional e cerceamento de defesa, não se poderia averiguar tal ocorrência sem nova avaliação das
provas e dos faros que as instâncias ordinárias consideraram demonstrados.
Com relação à inconstitucionalidade da
legislação que trata do depósito recursal na
Justiça do Trabalho, como poderia o despacho deliberar a respeito dessa questão se
não foi questionada no acórdão recorrido?
O recurso extraordinário é julgado nos
limites em que é interposto e em relação à
matéria que ficara decidida no julgado.
285
A par disso, há em trâmite nesta Corte a
Ação Direta de Inconstitucionalidade
836, que nata do referido tensa, cujo pedido
de concessão de medida liminar foi indeferido em sessão plenária realizada em 11-293.
Tala circunstância, nego provimento ao
agravo regimental, mantendo íntegros os
fundamentos do despacho agravado.
EXTRATO DA ATA
Ag 146.605 (AgRg) —PR — Rel.: Min.
Ilmar Gaivão. Agte.: Banco Bamerindus do
Brasil S/A (Advs.: Cristina Rodrigues Gontijo,Nicanor Favero Filho coutais). Agdo.:
Joel Leite Pedroso (Adv.: Vivaldo Silva da
Rocha).
Decido: A Turma negou provimento ao
agravo regimental, nos termos do voto do
Relatar. Unânime.
Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Sydney Sanches, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e limar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza.
Brasília, 18 de maio de 1993 — Ricardo Dias Duarte, Secretário.
AGRAVO DE INSTRUMENTO lsr 147.414 (AgRg) — RJ
(Segunda Turma)
Relatar. O Sr. Ministro Carlos Valioso
Agravante: Lecy dos Santos Bastos — Agravados: Espólio de Luiz Eurico
Ferreira e outros
Constitucional. Acórdão: fundamentação. CF, art. 93, a
I — Inocorrênda da falta alegada no sentido de que o
acórdão não conteria fundamentação, com ofensa ao art. 93, IX, da
Constituição Federal.
II — RE inadmitido. Negativa de trânsito ao agravo de
instrumento. Agravo regimental improvido.
286
R.T.J. — 150
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na C011formidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por decisão unânime, negar
provimento ao agravo regimental. Ausentes, ocasionalmente, os ATmistrcs Paulo Brossard e Marco Aurélio.
Brasília, 15 de junho de 1993 — Néri
da Silveira, Presidente — Carlos Venoso,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Carlos Venoso: A decisão de fl. 250, por mim proferida, negou
seguimento ao agravo de instrumento interposto de decisão denegatória do processamento de recurso extraordinário fundado
no art. 102,
a, da Constituição, em que
se alega ofensa ao art. 93, IX, da mesma
Carta.
Publicada a decisão, interpõe Lecy dos
Santos Bastos agravo regimental (fls.
252/254), sustentando que o acórdão recorrido ofendeu o art. 93, IX, da Constituição,
porque «não contém uma linha sequer de
fundamentação esclarecido o Motivo por
que acolheu integralmente a reconvenção
dos ora agravados e, em decorrência, mandou incluir no monte partilhável todos os
bens arrolados um a um no pedido recon~danai». Contesta que pretenda discutir
prova, afirmando que objetiva «exigir do
Estado uma tutela fundamentada, que
lhe esclareça o porquê de terem sido tais
bens, de sua exclusiva propriedade, induídos na sociedade de fato». No que
toca à alegada falta de prequestionamento,
salienta que a violação ao texto constitucional surgiu no acórdão, pelo que interpôs
embargos de declaração do acórdão recorrido, em que destacou, verbis:
«Portanto, o decisum da ação e o
dedsum relativo à reconvenção não
foram fundamentados, motivo por que
violou o Acórdão, de forma frontal, o
inciso IX do art. 93 da Constituição
Federal e, também, os arts. 131, 458, II
e 459, do Código de Processo Civil».
Pede, por isso, «seja reconsiderado o r.
despacho ou, se assim não se entender, seja
o presente recurso encaminhado à consideração da Colenda Turma..»
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Venoso (Relator): A agravante tem razão quando sustenta que interpôs embargos de declaração
para o fim de prequestionar o dispositivo
constitucional inscrito no art. 93, IX, da
Constituição. Verifico que a ora agravante,
mediante a petição e razões copiadas às fls.
163/168, sustentou, em embargos de declaração, que «o acórdão não apresentou qualquer fundamento para dar pela procedência
da reconvenção». (fls. 165/168).
Rememoremos a questão.
A ora agravante, Lecy dos Santos Bastos, ajuizou ação ordinária de declaração de
sociedade de fato, cumulada com declaratória de sua propriedade sobre os bens adquiridos na sua constância, com reivindicação dos referidos bens, contra o Espólio de
Luiz Eurico Ferreira e contra os herdeiros
necessários Luiz Eurico FerreiraFilho, Gustavo Adolfo Brito F,asjra, Maria Cristina
Peneira Moura Brasil do Amaral e seu
marido Oswaldo Moura Brasil do Amaral
Filho, e Luiz Eduardo Brito Ferreira (fls.
13/47).
A açãofoi contestada, tendo sido apresentada, também, reconvenção (fs. 84 e ss.).
A ação foi julgada procedente, e improcedente a reconvenção, por sentença do
MM. Juiz de Direito (fls. 144/151).
Os réus-reconvintes apelaram (fl. 152).
A ?Câmara Cível do Tribunal de Justiça
do Estado do Rio de Janeiro, pelo acórdão
que está, por cópia, às fls. 154/158, lavrado
pelo Desembargador Wehbi Dib, deu «parcial provimento ao recurso para diminuir-se
R.TJ — 150
a partilha». O acórdão preservou os lega
dos, vale dizer, o que o finado Luiz Enrico
Fentira legou, em testamento, para a apelada, ora agravante. Preservou, também,
«os bens vindos à autora durante o período,
os quais permanecerão consigo, porque assim desejou o companheiro». Entendeu o
acórdão, todavia, que «não faz jus a apelada
à meação». E deu as razões por que assim
decidia (fls. 1571158), concluindo, então,
por dar «parcial provimento aos apelos para
julgar-se procedente a reconvenção, no que
concerne à partilha, ficando diminuída da
metade para os parâmetros acima, mantido o
reconhecimento da sociedade de fato». (fl.
158)
A ora agravante, repito, intapôs embargos de declaração: sustentou que o acórdão
julgara extra pana (fis. 163/165)e que apresenta ausência de fundamentação (lis.
165/168).
Julgando esses embargos, o Tribunal esclareceu, no ponto em que se alega falta de
fimdamentação, que «o acórdão vem com
cinco páginas de fundamentação.A leitura de
fls. 92.35 a 9237 reflete inconformismo, mas
sem comprovar qualquer dos vícios entnnerados no art. 535 do diploma proa- c omo Por
tais motivos, nega-se provimento ao recurso
de Lecy dos Santos Bastos». (fls. 172/174,
especialmente fl. 173).
Posta assim a questão, é fácil verificar que
o agravo regimental deve ser improvido.
É que, ao contrário do alegado, o acórdão
está fundamentado. Pode não estar impecavehnente fundamentado, mas está suficientemente fundamentado. É consultá-lo, por cópiaàs fis. 154/158.A fundamentação que está
287
ali posta embasa a procedência da reconvenção. O que não é possível é verificar, na
instância extraordinária, se a fundamentação fálica está ou não correta. O Tribunal a
quo, em tal matéria, decide soberanamente,
pelo que não pode a ora agravante, agora,
pretenda o seu =exame.
Mantenho, pois, o que escrevi no fecho da
decisão agravada: «Observe-se, ademais,
que os acórdãos de fls. 154/158, 172/174 e
180/181 estão suficientemente fundamenta
dos. Sem dúvida, o que pretende o recorrente
é o reexame de provas, o que é vedado na via
extraordinária».
Do exposto, nego provimento ao agravo
regimental.
EXTRATO DA ATA
Ag 147.414 (AgRg) —RJ —Rel.: Min.
Carlos Venoso. Agte.: Lecy dos Santos
Bastos (Advs.: Mauro Fichtner Pereira e
outros). Agdos.: Espólio de Luiz Enrico
Parara e outros (Adv.: Paulo Fontenelle).
Agdos.: Maria Cristina Ferreira Moura Brasil do Amaral e cônjuge (Adv.: João Borsidi Neto).
Decisão: Por unanimidade, a Turma negou provimento ao agravo regimental. Ausentes, ocasionalmente, os Ministros Paulo
Brossard e Marco Aurélio.
Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Paulo Brossad, Carlos Venoso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Mantem Costa
Pinto.
Brasília, 15 de junho de 1993 — José
Wilson Aragio, Secretário.
AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 147.935 (Agltg) — RS
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Afmistro Carlos Venoso
Agravante: Instituto Nacional do Seguro social — INSS — Agravado:
Alfredo Rojabn
R.TJ. — 150
288
Constitucional. Preridencikrio. Benefício. CF, art. 201, § § 5*
e 6'.
I — Alegação no sentido de que o acórdão, tendo decidido
pela auto-aplicabilidade dos § § 5" e 6° do art. 201, da Constituição, teria
violado o art. 2° da mesma Carta, que consagra o principio da independência e harmonia dos Poderes. Improcedência do alegado, dado que
cabe aoJudiciário fazer valer a vontade concreta da Id e da Constituição.
Para isto, há de interpretar a uni ou a Constituição, sem que isto implique
ofensa ao princípio inscrito no art. 2° da CF.
II — RE inadmitido. Agravo improvido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na confonnidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por decisão unânime, negar
provimento ao agravo regimental.
Brasília, 9 de março de 1993 —Néri da
Silveira, Presidente — Carlos Velloso,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Tratase de agravo regimental contra decisão que
negou seguimento ao agravo de instrumento da decisão denegatória do processamento de recurso extraordinário interposto de
acórdão que decidiu pela auto-aplicabilidade dos §§ 5° e 6° do art. 201 da Constituição. O recurso extraordinário fundamentase no art. 102, III, a, da mesma Carta,
argumentando que o acórdão ofendeu o art.
2° da Lei Maior.
É deste teor a decisão agravada:
«Entende a decisão agravada que o
recorrente não conseguiu demonstrar o
modo pelo qual o princípio da independência e harmonia dos poderes, inscrito
no referido artigo 2°, fora violado.
Está correta a decisão. O Tribunal,
entendendo auto-aplicáveis os §§ 5° e 6°
do art. 201 da Constituição, simplesmente fez o que lhe cabia, dado que cabe
ao Judiciário fazer valer a vontade concreta da lei e da Constituição. Para isto,
há de interpretar a lei ou a Constituição.
E foi o que ocorreu.
Nego seguimento ao agravo.»-(fl.
36)
Sustenta o agravante que a questão
constitucional foi exaustivamente ventilada na decisão recorrida. Ademais, o Ministro Relator, ao negar seguimento ao recurso
interposto, afirmando que o Tribunal a quo
fez valer a vontade concreta da Constituição, entendendo auto-aplicáveis os §§ 5° e
6° do art. 201, da Constituição, teria extrapolado os limites estabelecidos no art.
38 da Lei 8.038/90, tuna vez que o recurso
não saia intempestivo, incabível ou improcedente, além de não ser matéria sumulada
nesta Corte. Alude, finalmente, ao parecer
emitido pelo Ministério Público Federal no
RE 151.080-3-SP,favorávelà pretensão do
recorrente, e a julgados do Egrégio Tribunal Regional Federal da 1' Região, no sentido de que o beneficio previdenciário previsto no art. 201, § 5°, da Constituição,
depende de norma regulamentadora.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Venoso (Relator): Sustentou a autarquia agravante, no
recurso extraordinário, que «O Poder Judiciário ao deferir a pretensão postulada na
inicial se investiu de prerrogativas que são
do Poder Legislativo, quebrando e ferindo
o principio estabelecido no artigo 2° da
R.TJ —150
Constituição Federal, da independência e
harmonia dos Poderes».
Esta foi a questão constitucional posta
no recurso extraordinário.
O eminente Presidente do Tribunal a
quo, ao indeferir o processamento do RE,
sustentou que o recorrente não conseguiu
demonstrar o modo pelo qual o princípio da
independência e harmonia dos poderes,
inscrito no artigo 2°, da Constituição, fora
violado.
Constei acertada essa decisão, por
isso que, entendendo o acórdão auto-aplicáveis os âl) 5° e 6° do art. 201 da Constituição, simplesmente fez o que lhe cabia,
dado que compete ao Judiciário fazer valer
a vontade concreta da lei e da Constituição.
Para isto, há de interpretar a lei ou a Constituição, sem que isto implique ofensa ao
princípio da independência e hamsonia dos
Poderes (CF, art. 2°), princípio que o ora
289
agravante afirmou, no RE, que fora violado.
Do exposto, nego provimento ao agravo
regimental.
EXTRATO DA ATA
Ag 147.935 (AgItg) — RS —Rel.: Min.
Carlos Valioso. Agte.: Instituto Nacional
do Seguro Social — INSS (Advs.: Jayme
Paz da Silva e outros). Agdo.: Alfredo Rojalut (Adv.: Nilvin Ehlert).
Decisão: Por unanimidade, a Turma negou provimento ao agravo regimental.
Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Paulo Brossard, Carlos Valioso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Haroldo Ferraz
da Nóbrega.
Brasília, 9 de março de 1993 — José
Wilson Aragão, Secretário.
AGRAVO DE INSTRUMENTO PP 148.658 (EDcI-AgRg) —
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Carlos Venoso
Embargante: Instituto Nacional do Seguro Social — INSS — Embargado:
Atilia Capovila
Processual cialL Embargos de declaração. RISTF, art. 337.
I — In000rrênda, em termos objetivos, dos pressupostos
dos embargos de declaração: dúvida, obscuridade, contradição ou omissão. RISTF, art. 337.
II — Embargos de declaração rejeitados.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por decisão unânime, rejeitar
os embargos de declaração.
Brasília, 11 de maio de 1993 — Néri da
Silveira, Presidente — Carlos Vdloso,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Carlos Velloso:O acórdão negou provimento ao agravo regimental interposto contra decisão que negou se-
290
R.TJ.— 150
guimento ao agravo de instrumento da decisão indeferitória do processamento de recurso extraordinário manifestado com fardamento no art. 102,111, a, daConstituição,
em que se alegava violação ao § 5° do art.
195, da mesma Carta.
Foi assim ementado o acórdão:
.S.,menta: ConstitudonaL Previdenetário. Revisão e reposição de beneficio. CF, art. 201, § 5°. Recurso extraordinário: questão constitucional
posta no RE que não foi decidida pelo
acórdão.
I —Eficácia plena e aplicabilidade imediata da norma inscrita no § 5°
do art. 201 da Constituição. Esta a questão decidida pelo acórdão.
II— A questão constitucional posta no RE — ofensa ao § 5° do art. 195 da
CF — não foi decidida pelo acórdão.
Não cabimento, por isto, do RE.
III—RE inadmitido. Agravo regimental improvido.» (fl. 45)
Publicado o acórdão, interpõe o Instituto Nacional do Seguro Social embargos
de declaração (fls. 47/50), alegando ter havido omissão e obscuridade na decisão ora
embargada, pois a questão posta no recurso
extraordinário versaria exatamente sobre a
auto-aplicabilidade do § 5° do art. 201 da
Lei Maior e, a referência ao § 5° do art. 195,
da mesma Carta teria sido feita, «simplesmente, pela íntima correlação entre uma e
outra norma, retro». Ademais, o exame da
auto-aplicabilidade do mencionado § 5° do
art. 201 da Constituição somente seria possível à luz dos arts. 58 e 59 do ADCT,
relacionando-se com o princípio constitucional da previsão da fonte de custeio do
benefício previdenciário (CF, art. 195, §
5°).
Finalmente, alude o recorrente à jurisprudência do Egrégio Tribunal Regional
Federal da r Região, compendiada em Súmula, bem como aos Mandados de 1njunção n°s 215-1-RS, Rel. Min. Celso de Mel-
lo e 322-O-DF, Rel. Min. Néri da Silveira,
cujas decisões seriam «diametralmente
opostas ao do venerando decisório ora recorrido».
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Velloso (Relator): A dúvida que autoriza os embargos de
declaração é a dúvida objetiva. O mesmo
deve ser dito em relação à omissão e à
obscuridade. É que a dúvida objetiva, tal
como a obscuridade e omissão, podem ser
sanadas. Já a dúvida subjetiva, esta se resolve com a leitura atenta do acórdão.
É o caso dos autos.
Aqui, no RE, a autarquia recorrente sustentou que o acórdão ofendera o art. 195, §
5°, da Constituição, argumentando que a
majoração de benefícios previdenciários
para um salário mínimo dependeria da criação da respectiva fonte de custeio, mediante lei ordinária. A questão constitucional
decidida pelo acórdão, entretanto, foi outra:
a eficácia plena e aplicabilidade imediata
da norma inscrita no § 5° do art. 201 da
Constituição. Quer dizer, o acórdão não
decidiu a questão constitucional posta no
recurso extraordinário. Exatamente isto o
que ficou proclamado no acórdão desta
Tunna, às fls. 34/38.
O acórdão embargado, pois, não incidiu
nas increpações que lhe faz a embargante,
que pretende, na verdade, um novo julgamento, dado que empresta efeitos modificativos aos embargos; numa outra perspectiva, os embargos poderiam ser considerados protelatórios. Numa outra oportunidade poderei voltar ao tema, tendo em vista o
disposto no § 2° do art. 339 do Regimento
Interno, ou parág. único do art. 538, CPC.
Rejeito os embargos.
EXTRATO DA ATA
Ag 148.658 (EDcl-AgRg) — SP — Rel.:
Min. Carlos Velloso. Embte.: Instituto Nacional do Seguro Social — INSS (Adv.:
R.TJ —150
Francisco Antonio Fogaça). Embda.: Atilia
Capovila (Adva: Maria Rosalina Nichos
Domiciano).
Decisão: Por unanimidade, a Turma rejeitou os embargos de declaração.
Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira Presentes à Sessão os Srs. Ministros
291
Paulo Brossard, Carlos Venoso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Mardem Costa
Pinto.
Brasília, 11 de maio de 1993 — José
Wilson Aragão, Secretário.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO Isr 148.663 — SP
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello.
Reclamante:União Federal — Reclamada:Têxtil São João Clitnaco Ltda.
Contribuição social sobre o lucro das pessoas jurídicas. Lei tt*
7.689/1181 Natureza jurídica A questão da Lei Complementar. Princípio da
irretroatividade das leis tributárias. Inconstitucionalidade da cobrança
com referência ao período-base de 1988. Precedentes do STF. Recurso
extraordinário provido em parta
A qualificação jurídica da exação instituída pela Lei n°
7.689188 nela permite identificar espécie tributária que, embora não se
reduzindo à dimensão conceituai do imposto, traduz típica contribuição
social, constitucionalmente vinculada ao financiamento da seguridade
social.
Tributo vinculado, com destinação constitudonal específica (CF, art. 195,1), essa contribuição social sujeita-se, dentre outras, às
limitações instituídas peio art. 150, I e IQ, a, da Carta Política, que
consagra, como instrumentos de proteção jurídica do contribuinte, os
postulados fundamentais da reserva legal e da irretroatividade das leis
tributárias.
A norma inscrita no art. 8° da Lei n° 7.689/88 — que
tornou exigível a contribuição social em questão «a partir do resultado
apurado no período-base a ser encenado em 31 de dezembro de 1988»
— vulnerou, de modo frontal, o princípio da irretroatividade das leis
tributárias, que veda a cobrança de tributos «em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído
ou aumentado» (CF, art. 150, III, a).
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Primeira Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos,
em conhecer do recurso e, em parte, lhe dar
provimento.
Brasília, 13 de outubro de 1992 — Moreira Alves, Presidente — Celso de Mello,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Celso. de Mello: Tratase de causa em que se discute a legitimidade constitucional da contribuição social sobre o lucro das pessoas jurídicas, instituída
292
RTJ. —150
pela Lei n° 7.689, de 15-12-88, para financiamento da seguridade social.
O Tribunal Regional Fedeu! da 3' Região, ao julgar a ação em grau de recurso,
reportou-se a precedente jurisprudencial do
Plenário da Corte para declarar a inconstitucionalidade do próprio ato legislativo de
que derivou a criação da contribuição referida
Daí o presente recurso extraordinário,
interposto pela União Federal com fundamento no art. 102, III, a e b, da Constituição, que venho submeter à apreciação desta
Primeira Turma.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): A questão da constitucionalidade da
contribuição social instituída pela Lei n°
7.689/88 já foi objeto de apreciação pelo
Plenário desta Corte, que, ao julgar o RE
138.284-PA, Rel. Min. Carlos Velloso, estatuiu, verbis:
«ConstitudonaL Tributário. Contribuições sodais. Contribees inddentes sobre o lucro das pessoas jurídicas.
Lei n" 7.689, de 15-12-88.
I — Contribuições parafiscais:
contribuições sociais, contribuições de
intervenção e contribuições corporativas. CF, art. 149. Contribuições sociais
de seguridade social. CF, arts. 149 e
195. As diversas espécies de contribuições sociais.
II — A contribuição da Lei n°
7.689, de 15-12-88, é uma contribuição
social instituída com base no art. 195, I,
da Constituição. As contribuições do
art. 195, I, II, III, da Constituição, não
exigem, para a sua instituição, lei complementar. Apenas a contribuição do parág. 4° do mesmo art. 195 é que exige,
para a sua instituição, lei complementar, dado que essa instituição deverá observar a técnica da competência residual
da União (CF, art. 195, parág. 4°; CP,
art. 154, D. Posto estarem sujeitas à lei
complementar do art. 146, III, da Constituição, porque não são impostos, não
há necessidade de que a lei complementar defina o seu fato gerador, base de
cálculo e contribuintes (CF, art. 146, III,
a).
—Adicional ao imposto de
renda: classificação desarrazoada.
IV — Irrelevância do fato de a
receita integrar o orçamento fiscal da
União. O que importa é que ela se destina ao financiamento da seguridade social (Lei n° 7.689/88, art. 1°).
V — Inconstitucionalidacle do art.
8°, da Lei 7.689/88, por ofender o princípio da innroatividade (CF, art. 150,
III, a) qualificado pela inexigibilidade
da contribuição dentro do prazo de noventa dias da publicação da lei (CF, art.
195,§ 6°). Vigência e eficácia da lei:
distinção.
VI — Recurso Extraordinário conhecido, mas improvido, declarada a inconstitucionalidade apenas do artigo 8°
da Lei n° 7.689, de 1988.»
A qualificação jurídica da exação instituída pela Lei n° 7.689/88 nela permite
distinguir uma espécie tributária que, embom não se reduzindo à dimensão conceituai do imposto, traduz típica contribuição
social, constitucionalmente vinculada ao
financiamento da seguridade social.
Tributo vinculado, com destinação
constitucional específica (CF, art. 195, I),
essa contribuição social sujeita-se às limitações instituídas pelo art. 150, I e III, a, da
Carta Polida que consagra, como instrumentos de proteção jurídica do contribuinte, os postulados fundamentais da reserva
legal e da irretroatividade das leis tributárias.
No caso, o princípio da reserva absoluta
de lei foi observado, eis que, para efeito de
criação da contribuição prevista no inciso I
R.T.J —150
do art. 195 da Constituição Federal, não se
revela exigível lei complementar, só reclamada para instituição de «outras fontes
destinadas a garantir a manutenção ou expansão da seguridade social...» (grifei —
CF, art. 195, § 4°).
Não se pode desconhecer, a propósito
do terna concernente à exigibilidade de lei
complementar para a disciplinação normativa de certas matérias, que
«É doutrina pacífica, em face do direito constitucional federal, que só se
exige lei complementar para aquelas matérias para as quais a Carta Magna Federal, expressamente, exige essa espécie
de lei...»
(RTJ 113-392, 398, Rel. Min. Moreira
Alves).
As leis complementares, assim qualificadas em função de expressa designação
formal pela Carta Federal, constituem espécies normativas típicas ou nominadas.
A sua designação jurídica emerge, desse
modo, do próprio documento constitucional. Rege-as, portanto, um princípio de índole constitucional — o da tipicidade positiva, que só considera leis complementares
aquelas que ostentem, no plano da Constituição, esse nomear jutas. A Carta Federal,
na realidade, prestigiou o conceito formal
ou jurídico-positivo de lei complementar,
para, com isso, distingui-la das demais leis
interativas de normas constitucionais
de eficácia limitada (v. Geraldo Ataliba,
«Lei Complementar na Constituição», pág.
30, 1971, RT.; José Souto Maior Borges,
«Lei Complementar Tributária», págs.
34/35,1975, RT/Educ; Cebo Bastos, «Lei
Complementar», págs. 16/17, 1985, Saraiva).
Ene, também, o magistério de José Afonso da Silva (v. «Aplicabilidade das Normas
Constitucionais», pág. 235, 1968, RT), verbis:
«Devemos, desde a vigência da Constituição de 1967, modificar essa terminologia, reservando *expressão leis com-
293
planentares da Constituição apenas para
designar aquelas assim previstas no Estatuto Básico da República....»
O novo ordenamento constitucional não
submeteu ao domínio normativo de lei complementar a instituição das contribuições
sociais previstas no art. 195, I, o que legitima, em conseqüência, a sua veiculação mediante simples lei ordinária. Não há, pois,
como tratar desse tema em sede de legislação complementar. Afinal, como ressalta
Geraldo Andiba (v. «Interpretação no Direito Tributário», pág. 131, 1975, Educ/Saraiva),
«(...) só cabe lei complementar, quando expressamente requerida por tecto
constitucional explícito. O Congresso
Nacional não faz lei complementar à sua
vontade, ao seu talante. No sistema brasileiro, só há lei complementar exigida
expressamente pelo texto constitucional.» (Grifei)
Por outro lado, a existência de expressa
autorização constitucional para a cobrança
das contribuições sociais (CF, art. 195, I)
afasta, por si só, a alegada ofensa ao art.
154, I, do ordenamento constitucional, que
proclama o princípio do non bis in idem.
Impõe-se observar, finalmente, que a
norma inscrita no art. 8° da Lei n° 7.689/88
—que tornou exigível a contribuição social
em questão «a partir do resultado apurado
no período-base a ser encenado em 31 de
dezembro de 1988» — vulnerou, de modo
frontal, o princípio da irretroatividade das
leis tributárias, que veda a cobrança de
tributos «em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que
os houver instituído ou aumentado» (CF,
art. 150, IQ, a).
Daí, a advertência desta Corte, quando
do julgamento do RE 146.733-SP, Rel.
Mia Moreira Alves, no sentido de que
«... a Lei n° 7.689/88, (....) ao determinar, em seu artigo 8°, que essa contribuição já seria devida a partir do lucro
294
R.T.J. — 150
apurado no período-base a ser encerrado
em 31 de dezembro de 1988, violou o
princípio da irretroatividade contido no
artigo 150,11!, a, da Constituição Federal, que proíbe que a lei que institui
tributo tenha como fato gerador desse
tributo fato ocorrido antes do início da
vigência dela»
Com estas considerações, e na linha da
jurisprudência desta Corte, firmada a partir
do julgamento do referido RE 146.733-SP,
Rel. Min. Moreira Alves, conheço do recurso e dowlhe provimento, em parte, para,
afastando a inconstitucionalidade dos arts.
1°, 2° e 3° da Lei n° 7.689/88, declarada pelo
Tribunal a quo, reconhecer a ilegitimidade
constitucional tão-somente do art. 8" desse
diploma legal, que estabelece, como fato
gerador da contribuição em causa, o lucro
apurado ainda no período-base findo em
31-12-88.
Nesse sentido é o meu voto.
EXTRATO DA ATA
RE 148.663 — SP — Rel.: Min. Celso
de Mello. Recte.: União Federal. (Adv.:
Procuradoria da Fazenda Nacional). Renda: Têxtil São João Climaco Ltda. (Adv.:
Norton Vilas Boas).
Decisão: A Turma conheceu do recurso
e lhe deu provimento, em parte, nos termos
do voto do Relator. Unânime.
Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Octavio Gallotti, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e limar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza.
Brasília, 13 de outubro de 1992 — Ricardo Dias Duarte, Secretário.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 149.478 (AgRg) — MG
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence
Agravante: Companhia Cimento Portland Itaú — Agravada: União Federal
RE, a: acórdão recorrido de órgão fracionário do Tribunal a
quo, fundado na afirmação incidente de constitucionalidade da lei discu-
tida, já antes declarada pelo Plenário, em outro processo: hipótese em
que, se o acórdão recorrido tem motivação própria, se dispensa a documentação do teor da decisão plenária no mesmo sentido: revisão da
jurisprudência anterior.
Cuidando-se de declaração incidente de oonstitucionalidade — e não de inconstitucionalidade — da lei, a competência, quando for
o caso, será do órgão parcial a quem couber, segundo as normas gerais
aplicáveis, julgar o caso concreto (CF, art. 97; CPC, art. 481).
Nessa hipótese, — ao contrário do que sucede no caso de
declaração de inconstitucionalidade — o acórdão plenário que, decidindo incidente suscitado em outro processo, já houver resolvido, no mesmo
sentido, a prejudicial de inconstitucionalidade, é mero precedente de
jurisprudência, que não integra, formalmente, porém, a decisão da
Câmara ou da Turma.
R.TJ — 150
295
Certo, se a última se limita a reportar-se ao precedente do
plenário, a juntada deste se fará necessária, quando da interposição do
recurso extraordinário, para documentar os fundamentos da decisão
recorrida e o prequestionamento dos temas ventilados no apelo constitudonal.
Não é o caso, porém, se — invocando ou não o precedente
plenário — a decisão da Câmara ou da Turma contém, em si mesma, a
motivação da declaração incidente de conslitudonalidade.
5. Revisão da jurisprudência em contrário.
ACÓRDÃO
Em hipótese similar (RE 156.309-5,
17-10-92,
Pertence), decidiu a r Turma
Vistos, relatados e discutidos estes audesta Corte:
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri«RE: acórdão recorrido de Turim
bunal Federal, em Sessão Plenária, na condo Tribunal a quo, fundado na obformidade da ata do julgamento e das notas
servância devida à decisão plenária
taquigrfficas, por unanimidade de votos,
anterior da questão de inconstitucioem dar provimento ao agravo regimental
nalidade
da norma incidente na caupara determinar o processamento do recursa: ausência nos autos, do acórdão
so extraordinário.
plenário, que inviabiliza o recurso.
Brasília, 24 de março de 1993 — SydSó a declaração de inconstitucioney Sanches, Presidente — Sepúlveda
nalidade da lei é privativa do plenário
Pertence, Relator.
dos Tribunais (CF, art. 97), não a
RELATÓRIO
rejeição da argüição de inconstitucionalidade; não obstante, se a TurO Sr. Ministro Sepúlveda Patenee: Nema, Câmara ou Seção a submete ao
guei seguimento ao recurso extraordinário
Pleno, a decisão deste, ainda que denestes termos (fl. 249):
clare constitucional a lei questiona«Cuida-se de RE de Companhia Cida, se integra, no ponto, ao acórdão
mento Portland Baú contra decisão de
que, no órgão parcial, a aplica ao caso
Turma do Tribunal a quo, que aplicou
concreto: dai, a necessidade, também
ao caso concreto decisão precedente do
nessa hipótese, de que o teor do acórseu Plenário, declaratória da constitudão plenário seja trazido aos autos
para que se possa examinar o recurso
cionalidade da Lei n° 7.689/88 (contribuição social sobre o lucro dos empreextraordinário.»
gadores).
A omissão inviabiliza, pois, o RE, ao
qual
nego seguimento.»
Dos autos não consta, entretanto, o
teor do acórdão do Tribunal Pleno que
Tempestivamente, opfle a recorrente agradecidiu e rejeitou o incidente de incons- vo regimental, com estes fundamentos (fls.
titucionalidade.
252/256).
De aplicar-se, pois, a jurisprudência
a postura data venta formalistica
de se exigir presente aos autos o acórdão
do Plenário (RE 121 A87, 23-8-90, Pertence) e de ambas as Turmas do STF,
de decisão plenária, quando a ela se
refere o acórdão recorrido, não pode ser
estas a partir do julgamento pela Primeira Turma, do AgRg RE 141.988, de
levado a extremos de inviabilizar por
completo a total manifestação dessa E
5-5-92.
—150
296
Corte, quando já consta do r. acórdão a
que todos os elementos e fundamentos
para bem ser aferida a natureza da discussão, e o embasamento a que se utilizaram aqueles outros juízes.»
(...)
«Quando da interposição do Recurso
Especial e RecursoFxtraordinfaio, não havia, ali relação a ate ótimo, o namdasalto regimental ou mesmo precdto de
jurisprudência de San formal que a
então Recorrente devais observar, quanto iro juntada do exigido acórdão.
E se não havia essa obrigatoriedade,
e da leitura do v. acórdão guerreado, já
é possível aferir as razões e argumentos
sobre os quais se embasa, como então,
após admitido e distribuído e processado nessa Corte, podeo apelo extremo ser
alvo de decisão que o inadmite sob a
pecha de desconformidade formal?
Data veria, e sem querer em momento algum ofender, a r. decisão jurisprudencial que !estreia o r. despacho
passa a ter força de precdto normativo de cunho regimental, e portanto de
se aplicar a todos os Recursos Extraordinários que venham a ser processados,
mas não de forma retroativa àqueles
já em trâmite no STF, como é o caso
presente. Mas an se admitindo esse
efeito retroativo, que ao menos se permita a oportrmidade de uma regularização formal.
Com efeito, a carga audológica da
decisão plenária do e é de todo relevante (pulado firma a exigincia das condições para uma efetiva e séria apreciação do inteiro teor da discussão a que se
seguiu para rejeitar ou acolher incidente
de inconstitucionalidacle de lei.
ns
É pertinente esse dado valorativo quando, por exemplo, o Recurso Fatraordinftrio esteja calcado em acórdão que simplesmente se limita a decidir invocando
precedente do plenário de sua própria
cone. Até repise está de pleno acordo.
O que o Agravante não concorda é
estender esse entendimento a todo e
qualquer Recurso Extraordinário, sem
se aferir se o acórdão especifico não traz
osdasare seriam necessários para
compres
a profundidade e teor do
pensamento que esteve a presidir seus
protetores.
Com efeito Excelência, a decisão recorrida do E. Tribunal Regional Federal da 1° Região, traz esses elementos e
subsídios, deforma que não saia necessária a análise do acórdão plenário, da
mesma Corte a que se refere, em vista
de já estarem presentes os dados que são
hábeis para julgar haver ofensa ou não
ao texto constitucional.
Mas não é sól Em que pesem os
argumentos precedentes, a matéria a ser
objeto de decisão no Recurso Extraordinário da Agravante já foi decidida an
plenária do próprio &grano Mirairei Fedarst.epataars tear, validade
e akatassalsta datanuliinkin,da
Lei n• 7.61
Se assim é, e havendo pacífico catardimano dessa matéria, é de se indagar:
que prejuízo causou &ausência do acórdão a que se refere o despacho agravado?
Prejuízo lavada no catardes de v.
Ex.*, cudo nade ate a Agravada promove a jantada de aludido acórdão,
obtido ~cópia autenticada perene o E.
TRF-1', da decisão plenária no REO n°
89.01.097818-MT (vide anexo).
Reza o artigo 5° da Lei de Introdução
ao Código Civil (a lei das leis), que na
aplicação da lei o juiz atenderá aos fins
sociais aquecia se dirige e às exigências
do bem comum. Ora, que maior finalidade há na lei processual que conduzir
as partes e o órgão julgadora uma sadafatória composição da lide nos termos
R.T..1 —150
de fazer valer o ordenamento jurídico? os fundamentos da decisão recorrida e o
É evidente que as normas processuais prequestionamento dos temas ventilados
caminham para a decisão da lide, na no apelo constitucional.
composição do conflito, e data veda
Não é o caso, porém, se — invocando
não em ressaltar facetas técnicas proces- ou não o precedente plenário — a decisão
suais. Não são, evidentemente, os mean- da Câmara ou da Turma contém, em si
dros técnicos que devem amolecer, mas mesma, a motivação da declaração incidensim a finalidade soda! de apazigua- te de constitucionalidade.
mento das relações sociais em face da
II
norma constitucional, corolário em se
atingir o bem comum que dela decorre,
Pronto esse modestíssimo voto, ontem,
dentro do Estado de Direito.
recebi memorial dos ilustres advogados
A prevalecer a r. decisão agravada, Min. Xavier de Albuquerque e Aluisio Xaestar-se-á desvirtuando tudo que o direi- via de Albuwaque, o qual constitui, como
to propriamente pretende e assegura era de esperar, contribuição valiosa ao enneste caso concreto, quando orientações riquecimento da discussão.
de ordem formal não podem sobrepor a
A partir de passagem do voto do emiprópria razão de ser da prestação juris- nente Ministro Moreira Alves, no RE
dicional.»
121.487, para quem, nos casos de que se
Juntou-se o inteiro teor do acórdão ple- cogita, a ausência nos autos dos fundamennário do Tribunal a quo, cuja ausência nos tos da decisão plenária equivale «à falta de
autos motivou a negativa de seguimento do prequestionamento das questões constitucionais», depois aventadas no recurso exRE (fls. 258/422).
traordinário (RTJ 133/459, 468), o memoÉ o relatório.
dal opõe reparos ao que aos autores se
afigurou «apuros de rigorismo formal», inVOTO
compatíveis com a missão precfpua de
O Sr. Ministro Sepálveda Pertence guarda da Constituição, que o texto de
(Relator): De minha parte, rendo-me à ar- 1988 conferiu ao Supremo Tribunal Fedegumentação da agravante.
ral, em «preceituação normativa (...) de
Cuidando-se de declaração incidente de explicitude inédita.»
constitucionalidade —e não de inconstituDe minha parte, contudo, jamais situei
cionalidade — da lei, a competência, quan- o fundamento básico da orientação firmada
do for o caso, será do órgão parcial a quem na desatenção à exigência do prequestionacouber, segundo as normas gerais aplicá- mento.
veis, julgar o caso concreto.
Certo, no voto referido do Ministro MoNessa hipótese, o acórdão plenário que, reira Alves, a inogação do vício de falta de
decidindo incidente suscitado em outro prequestionamento era pertinente —e nisprocesso, já houver resolvido, no mesmo so parece estar acorde o memorial (ti. 10, §
sentido, a prejudicial de inconstitucionali- 15) — porque efetivamente o acórdão redade, é mero precedente de jurisprudência, corrido se limitava, no caso concreto então
que não integra, formalmente, porém, a examinado, à invocação do precedente do
decisão da Câmara ou da Turma.
Plenário do Tribunal Federal de Recursos,
Certo, se a última se limita a reportar-se que acolhas a argüição de inconstitucionaao precedente do plenário, a juntada deste lidade da lei questionada.
se fará necessária, quando da interposição
Há casos numerosos, entretanto, nos
do recurso extraordinário, para documentar quais, ao contrário, embora invocando a
298
R.TJ. — 150
declaração plenária da inconstitucionalidade aventada, o acórdão ulterior do órgão
parcial arrola, com maior ou menor extensão, os fundamentos da ilegitimidade constitucional declarada e nessa hipótese realmente não é a ausência de prequestionamento que pode opor ao conhecimento do
recurso extraordinário.
Por isso, ao proferir, nesta Turma, o
voto-condutor do AgRg RE 141.988, de
5-5-92 — salvo engano, o primeiro de nova
série sobre o tema —, já não aludi ao problema do prequestionamento, como se verifica da síntese da motivação do julgado,
que consignei na ementa
«RE: acórdão recorrido de Turma do
Tribunal a quo, fundado na observância
devida à decisão plenária anterior da
questão de inconstitucionalidade da
norma incidente na causa: ausência, nos
autos, do acórdão plenário, que inviabiliza o recurso.
Emprocessos cujo julgamento caiba a órgãos parciais do Tribunal, suscitada a argüição de inconstitucionalidade
da norma incidente, dá-se repartição de
competência por objeto do juízo, devolvendo-se ao Plenário a decisão da questão prejudicial de constitucionalidade.
Desse modo, é no acórdão plenário
que se há de buscar a motivação da
decisão recorrida, com respeito à argüição de inconstitucionalidade, sendo indiferente o que a propósito do mérito
dela, contra ou a favor, se diga no acórdão da Turma.»
Nessa linha, data venda, sigo convencido do acerto da jurisprudência.
Na hipótese de aplicação pelo órgão parcial de decisão plenária declaratória de inconstitucionalidade de lei, o que se tem, na
decisão do caso concreto, é realmente um
julgamento subjetivamente complexo, cuja
documentação formal reclama a presença
de ambos os acórdãos que o compõem:
estou em que não se pode qualificar de
«tearicalidade subalterna», nem como «apuros de rigorismo formal» que, para a discussão entre as partes e o julgamento do
recurso extraordinário, se reclame a presença nos autos do acórdão plenário que,
precisamente no que diz com a questão
constitucional que constitui o seu tema,
substantiva a decisão recorrida, objeto do
apelo.
Certo, ao raciocínio contrapõe o memonal — invocando a autoridade do douto
Barbosa Moreira — que a decisão plenária
no incidente de inconstitucionaldiade, só é
«vinculativa para o órgão fracionário, no
caso concreto», não havendo regra legal
«que a torne obrigatória ad futuram».
Desse modo, a rigor, só no mesmo processo
em que se suscitou a prejudicial de inconstitucionalidade é que a decisão plenária se
incorporaria ao acórdão que o julgou.
Aventei o problema no voto que proferi
no RE 121.791 — afinal prejudicado por
desistência do recorrente — verbis:
«No âmbito do Supremo Tribunal, o
art. 101, RISTF, que mantém sua força
de lei, prescreveu que «a declaração de
constitucionalidade ou inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, pronunciada por maioria qualificada, aplica-se
aos novos feitos submetidos às Turmas
ou ao Plenário», ressalvada a proposta
de revisão da jurisprudência (art. 103).
Ao disciplinar, para os outros tribunais, o incidente da argüição de inconstitucionalidade (arts. 48W482), o C. Pr.
Civ. não conferiu expressamente à declaração plenária essa eficácia vinculante dos órgãos parciais de cada tribunal,
fora do processo em que proferida.
Não obstante, é certo que se tem difundido a rotina de aplicação pelas Turmas da precedente declaração de inconstitucionalidade, dispensando-se nova remessa da questão ao Plenário.»
A essa rotina é que o memorial dos
ilustres Xavier de Albuquerque dedica o
—150
299
epíteto de «deformação construtiva». E
A legitimidade constitucional dessa prática consagrada, no entanto, pende de que
acentuam (pág. 8, § 12):
«No rigor dos princípios, portanto, o órgão fracionário, ao decidir a causa, se
somente no mesmo processo, em que considere juridicamente vinculado à deciproferida, é que a decisão plenária inte- são plenária da questão de inconstitucionagra-se, formando com ela corpo único, lidade,não obstante tenha esta sido provona decisão do órgão parcial. Em proces- cada e resolvida em processo diverso.
sos distintos, apenas pode valer, e freSe, ao contrário, a Turma pretende reduqüentemente vale, conto precedente ju- zir o acórdão plenário a mero precedente
risprudencial a merecer acatamento.
junsprudencial sem força vinculante, a conEsse acatamento tem, por um lado, seqüência é que não poderá decidir da caucomo visto, bom fundamento teórico, e, sa, sem novamente submeter ao Pleno a
por outro, ainda melhor fundamento, a prejudicial de inconstitucionalidade.
um tempo moral e pragmático. FundaDe tudo resulta que, para ser válida, a
mento de boa moral judiciária, porque decisão do órgão fracionário há de receber,
obvia, ao menos no âmbito de cada Tri- como parte integrante sua, o acórdão do
bunal, o dissenso interpretativo de seus Tribunal Pleno, declaratório da inconstituórgãos parciais e, o que é pior, a dispa- cionalidade de que se cogite.
ridade das soluções dadas a lides análoTertius non datur: ou se entende que,
gas ou até mesmo iguais. E fundamento
de pragmática judiciária, porque, na an- embora prolatada em outro processo, a degústia proverbial do acúmulo de proces- cisão declaratória de inconstitucionalidade
sos a julgar, aumenta o rendimento do — pelo menos, enquanto não revista pelo
trabalho e agiliza o respectivo desempe- Pleno —é vinculativa da decisão da Turma
em cada caso concreto ulterior — hipótese
nho.
Por tudo isso e diante da massifica- em que o acórdão plenário há de integrar a
ção da prestação jurisdicional, que a documentação do julgamento da espécie;
vida econômica moderna reclama em ou se continua a insistir na tese, superada
avalanchas de casos análogos, a prática pela prática judiciária, que empresta à dedos Tribunais usa optar pelo acatamento cisão plenária, *Ronde proferida, força de
do precedente plenário para decidir to- simples precedente jutisprudencial — aldos os demais casos, daí por diante, no ternativa, contudo, que implica a nulidade
do julgamento, por incompetênciado órgão
sentido que ele haja tomado.
fracionário para a declaração de inconstituTrata-se, a bem dizer, de uma defor- cionalidade.
mação, posto inspirada em muito bons
Reconheço, no entanto, que o problema
propósitos, do processo de controle constitucional difuso. Chamemo-la, por isso, se altera radicalmente, se a decisão plenária
do incidente de inconstitucionalidade susdeformação construtiva.»
citado em processo diverso resultou na deDe minha parte, não vacilo em atribuir claração incidente de constitucionalidade
à prática e à convicção subjacente do órgão da lei questionada.
parcial, de estar vinculado à declaração pleAí efetivamente — como já antecipara
nfuia declaratória de inconstitucionalidade,
galas de verdadeiro costume judiciário, que no voto preparado antes do memorial —
se impôs por óbvias razões de economia não há como negar a autonomia judicante
processual, às quais, em linha de princípio, do órgão parcial, expressa no art. 481 CPC,
não creio se oponha o art. 97 da Constitui- que, aliás, resulta, a contrario saem, da
regra do art. 97 da Constituição.
çaa
300
R.TJ. — 150
Nesse ponto, tenho por irrepreensível o
raciocínio final do memorial comentado
(pág. 2, I} 17).
«Não há, com efeito, como não distinguir as situações. Uma é a de recurso
extraordinário contra acórdão de órgão
parcial que, com base em inconstitucionalidade declarada aliunde pelo Plenário do respectivo Tribunal, nega aplicação à lei no caso concreto. Somente
nesta, caberia, se fosse justificável em
si mesma, a aplicação da regra
Outra, a de recurso extraordinário
contra acórdão de órgão parcial que, ou
por entendimento próprio, ou com base
em constitucionalidade reconhecida
aliunde — quer declaradamente, quer
por simples falta de quorum, conto se
deu nos dois casos ora versados para a
conclusão oposta — pelo Plenário do
respectivo Tribunal, dá aplicação lei
no caso concreto. Éindiferente que a
decisão recorrida assente em entendimento próprio do órgão parcial, ou em
precedente plenário a que se remeta;
ocorrendo a segunda hipótese, como já
visto anteriormente, o precedente plenário terá valido apenas como argumento
jurisprudencial, graças àquela deformação construtiva de que se falou, mas não
se terá incorporado, em julgamento subjetivamente complexo, no acórdão do
órgão parcial. Nesta segunda situação,
ocorra uma ou outra das duas hipóteses,
não parece caber, mesmo se justificável
em si mesma, a dita aplicação.
Duas razões, principais militam em
prol da negativa Uma, é a já salientada
não-incorporação do precedente plenário no acórdão do órgão parcial, de que
resulta sua serventia puramente intelectual ou dialética. Outra, a presunção de
constitucionalidade das leis, que confere poder ao órgão parcial para, ele próprio, rejeitar qualquer argüição de
inconstitucionalidade.»
E, depois de citar Buzaid e Pontes de
Miranda e invocar velhos julgados do STF
(RE 18.681, in Cordeiro de Mello, O Processo no Supremo... 1/249 e RE 22.897,
ib., 1/260), prossegue o arrazoado (pág. 14,
19):
«Se o acórdão recorrido, de órgão
parcial, conclui em termos práticos pela
negativa de aplicação da lei com base
em inconstitucionalidade declarada
aliunde por precedente plenário, pode
ser logicamente admissível, aquiesçase, sem conceder, que se lhe reclame a
integração, para conhecimento cabal de
sua motivação, pelo teor do precedente
invocado.
Mas, se o acórdão recorrido, também
de órgão parcial, conclui em termos práticos pela aplicação da lei, mesmo que o
faça com base em constitucionalidade
reconhecida aliunde por precedente plenário, já não se mostra logicamente admissivel o reclamo de suaintegração por
idêntico modo. Não se mostra admissível, porque o acórdão atacado terá pronunciado conclusão para a qual, primeiro, convergia a presunção de constitucionalidade das leis, e segundo, bastava
a autoridade do órgão prolator, embora
com eventual arrimo em julgado diverso, a que, quando podia não fazê-lo,
tenha dado acatamento. Nesse caso, insista-se, ao julgado acatado ter-se-á tributado mera reverência intelectual.»
Concluo, desse modo, que, salvo quando necessário para documentar o prequestionamento, efetivamente não se justifica a
exigência, para o conhecimento do recurso
extraordinário, da juntada do acórdão plenruio anterior sobre a mesma questão, em
outro processo, se o acórdão recorrido,
oriundo de órgão fracionário do Tribunal a
quo, fundou-se na constitucionalidade da
lei incidente no caso concreto.
DI
Assim fumada a minha convicção —
com a retificação parcial que não hesito em
R.TJ —150
assumir, de posição contrária que vinha
assumindo, como retratado no despacho
agravado —, autorizava-me o Regimento a
sua reconsideração com o provimento do
agravo regimental.
Entendi, Porém, que — cuidando-se de
questão procedimental recorrente em inúmeros casos —a decisão de rever ou não a
orientação que se vem observando devia
ser remetida ao Plenário por um imperativo
de equanimidade, com o que concordaram
os eminentes pares da Primeira Turma.
Nesses termos, em conclusão, dou provimento ao agravo para que tenha seguimento o recurso extraordinário: é o meu
voto.
EXTRATO DA ATA
RE 149.478 (AgRg) — MG — Rel.:
MIL Sepúlveda Pertence. Agre.: Compa-
301
nhia Cimento Portland Baú (Adv.: Luiz
Fernando Ferraz de Rezende) (Advs.: Aluiaio Xavier de Albuquerque e outros). Agda.:
União Federal (Adva.: Procuradoria da Fazenda Nacional).
Decisão: Por votação unãnime, o Tribunal deu provimento ao agravo regimental
para determinar o processamento do recurso extraordinário. Votou o Presidente.
Presidência do Sr. ~suo Sydney Sanches. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Moreira Alves, Néri da Silveira, Octavio
Gallotti, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence, Celso de Meio, Carlos Velloso, Marco Aurélio, limar Gaivão e Francisco Rezek. Vice-Procurador-Geral da República,
Dr. Moacir Antonio Machado da Silva.
Brasília, 24 de março de 1993 — Luiz
Tomimatsu, Secretário.
AGRAVO DE INSTRUMENTO N• 149.549 (AgRg) — MG
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio
Agravante: Rubens Ribeiro dos Reis — Agravado: Unibanco — União de
Bancos Brasileiros SÃ.
Recurso extraordinário. Juízo primeiro de adadssibilMade. A
atuação do Juízo primeiro de admissibildade não fica restrita aos pressupostos gerais de recorribilidade. Há de examinar se o extraordinário
enquadra-se em una dos permissivos conslitudonals. Nisto não usurpa a
competência de órgão do Supremo Tribunal Federal. Sendo negativa a
decisão, tem a parte o acesso a esta Corte via agravo de instrumento.
Recurso. Prequestionantento. Configuração. O prequestlonamento não resulta da circunstância de a matéria haver sido empolgada
pela parte recorrente. A configuração do instituto pressupõe debate e
decisão prévios pelo Colegiada ou seja, emissão de juízo explícito sobre
o tema. O procedimento tem como escopo o cotejo indispensável a que
se diga do enquadramento do recurso extraordinário no permisdvo
constitucional, e se o Tribunal «a quo» não adotou entendimento explícito a respeito do fato judgeno veiculado nas razões recameis, inviabilizada fica a conclusão sobre a violência ao preceito evocado pelo
recorrente.
Recurso extraordinário. Moldura fálica. Na apreciação do
enquadramento do recurso extraordinário em um dos permisdvos coes-
302
R.TJ. — 150
*acionais, parte-se da moldura titica delineada pela Corte de origem.
Impossível é pretender substituí-Ia para, a partir de fundamentos diversos, alegar-se à conclusão sobre o desrespdto a dispositivo da Lei Básica
Federal.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos,
em negar provimento ao agravo regimentaL
Brasília, 24 do agosto de 1993 — Néri
da Silveira, Presidente —Marco Aurélio,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Insiste
o Agravante em asseverar que não cabia ao
Juízo primeiro de admissibilidade emitir
entendimento sobre a matéria de fundo veiculada no extraordinário. Aponta, mais, que,
em relação aos meios suficientes ao pagamento do débito, acabou-se por considerar
bens excepcionais pelo inciso III do 3° do
artigo 47 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Por último, ressalta
que se partiu para a cobrança de correção
monetária sem que esta houvesse sido pactuada ou imposta por preceito legal (fls. 99
e 100).
Recebi os presentes autos para exame
em 1° de junho de 1993, liberando-os para
julgamento em 7 imediato (fl. 106).
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Na interposição deste regimental foram atendidos os pressupostos de recorribilidade que lhe são próprios. O Agravante
tomou conhecimento do despacho agravado mediante publicação ocorrida no Diário
da Justiça de 14 de abril de 1993 — quarta-feira (fl. 98) —protocolando este recurso em 19 seguinte'— segunda-feira (fl. 99)
—e, portanto, dentro do qüinqüídio. Quanto à representação processual, os documentos de fls. M e 105 revelam-nos regulares.
A parte que se alegou como não abrangida pela decisão atacada diz respeito à
cobrança da correção monetária sem previsão contratual ou legal. Contudo, esse tema
não foi objeto de debate e decisão prévios
quando da prolação do acórdão de fls. 79 a
82. Nada se disse sobre o silêncio da cédula
rural pignoratícia e o respectivo contrato
relativamente à correção monetária Incumbia ao Agravante proliv-nlar os embargos
declaratórios afim de que o órgão julgador
emitisse juízo explícito a respeito. No particular, o extraordinário mostrou-se deficiente no tocante ao prequestionamento.
No mais, as razões apresentadas não infirmam os fundamentos do ato impugnado,
que, assim, transcrevo:
«A usurpação alegada pelo Agravante improcede. A uma, porquanto não se
pode confundir duas atividades distintas, ou seja, a desenvolvida pelo Juízo
primeiro de admissibilidade e a que decorre da atuação de órgão desta Corte.
Interposto o recurso, cumpre ao Tribunal de origem dizer do atendimento, ou
não, aos pressupostos gerais de recorribilidade e aos específicos, tudo como
estabelecido na Lei n° 8.038/90. A duas,
porque em tal Diploma não se atribui ao
Presidente do Tribunal, em si, o despacho atinente ao recurso então protocolado. A incumbência cabe realmente a
quem representa a Corte e nesse campo
possível é a disciplina interna no sentido
da atuação do Vice-Presidente, no que
desenvolve atividade de apoio à presidência, situando-se os respectivos atos,
por isso mesmo, no âmbito desta última.
Não há como interpretar os preceitos
pertinentes à espécie em detrimento da
R.TJ —150
racionalização dos serviços. Inexiste irregularidade a contaminar o ato no que
o recurso foi despachado não pelo Presidente do Tribunal de origem, mas pelo
Vice-Presidente.
No tocante aos dispositivos assinalados como infringidos nas razões do extraordinário, verifica-seque emmomento
algum colocou-se em plano secundário
o princípio da legalidade ou mesmo o
concernente à impossibilidade de alguém
ser privado dos próprios bens sem o
devido processo legal. O acórdão atacado mediante o extraordinário revela que
o Agravante não tem jus à anistia referente à correção monetária de vez que,
vencido o débito, somente providenciou
o ajuizamento da consignatária dois meses após, deixando de ofertar o valor da
multa fixada no neonato. Também acrescentou-se cano fundamento a existência de meios à satisfação do débito tal
como previsto originariamente. Muito
embora seja questionável a obrigatoriedade de inclusão do valor da multa, requisito não contemplado no inciso I do
§ 3° do artigo 47, afasta-se a transgressão argüida em face ao segundo fundamento da decisão recorrida, isto é, a
303
suficiência de meios para o pagamento
da divida. Destarte, tenho como correta
a decido que resultou na negativa de
trânsito ao extraordinário.»
Pelos motivos supra, nego acolhida ao
pedido formulado neste regimental.
É o mai voto.
EXTRATO DA ATA
Ag 149349 (AgRg) — MG — Rel.:
Mia Marco Aurélio. Agte.: Rubens Ribeiro dos Reis (Advs.: Mareio Gontijo, Raimundo Cândido Júnior e outros). Agdo.:
Unibanco — União de Bancos Brasileiros
S.A. (Advs.: Paulo Henrique de Carvalho
Chamou e outros).
Decisão: Por unanimidade, a Turma negou provimento ao agravo regimental.
Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Paulo Brossard, Carlos Velloso e Marco
Aurélio. Ausente, justificadamente, o Sr.
Ministro Francisco Rezar. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Artur Castilho
Pereira Neto.
Brasília, 24 de agosto de 1993 — José
Wilson Aragão, Secretário.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO br 151.508 — DF
(Segunda 'Turma)
Relator para o acórdão: O Sr. Ministro Marco Aurélio
Recorrente: Fundação Hospitalar do Distrito Federal — Recorridos: Abelardo de Oliveira Brito e outros
Judiciário. Acesso. óbice. Configuração. A cdstência de provimentos judiciais a envolver o mérito revela o exercício do direito de
ação. Descabe confundir decisão relativa a pressupostos de reconibilidade previstos em normas estritamente legais com obstáculo ao acesso
ao Judiciário.
Recurso extraordinário. Prequestionamento. Se a Corte de
origem não adotou entendimento explicito sobre a matéria vdculada no
recurso extraordinária, impossível é proceder-se ao cotejo indispensável
à conclusão sobre o enquadramento do recurso no permissivo constitucional.
304
R.TJ. — 150
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por maioria de votos, em não
conhecer do recurso extraordinário.
Brasília, 1° de junho de 1993 — Néri da
Silveira, Presidente — Marco Aurélio,
Relator para o acórdão.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Paulo Brossard: Trata-se de recurso extraordinário interposto
com base na alínea a, do inciso III do artigo
102, da Constituição Federal que impugna
decisão do Tribunal Superior do Trabalho,
proferida em agravo de instrumento que
visava a subida de recursos de revista que
impugnava decisão do Tribunal Regional
do Trabalho da 104 Região proferida em
reclamação trabalhista promovida pelos recorridos. Alega-se ofensa ao artigo 5°, inciso XXXV, da mesma Carta constitucional.
2.0 referido agravo de instrumento recebeu, inicialmente, à fl. 61, o seguinte
despacho negando-lhe seguimento:
«1. Do exame dos autos, verifica-se
que o presente Agravo de Instrumento
padece de irregularidade de representação, uma vez que o Agravante deixou de
transladar aos autos peça essencial para
a formação do instrumento, qual seja, a
procuração principal. O substabelecimento de fl. 35 não basta para verificar
a legitimidade de representação da
subscritora das razões =ars ais.
2. Desta forma nego prosseguimento
ao Agravo de Instrumento, com bas e tio
art. 896, § 5°, in fine, da CLT, bem como
no verbete Sumular n° 272 do TST.».
3. Dessa decisão, a ora recorrente, interpôs agravo regimental perante aquela mais
alta Corte do Trabalho, alegando violação
ao princípio constitucional da prestação jurisdicional, art. 5°, XXXV. Por novo des-
pacho do Ministro Relator, à fl. 74, foi
negado seguimento também ao agravo regimental, vestis:
«Em que pesem as considerações tecidas na peça recursal, o apelo não prospera. Isto porque a agravante não se
preocupou em sanar o vicioapontado no
despacho ora impugnado, pelo que o
agravo regimental, em apreço, padece
da mesma irregularidade de representa.
ção, que resulta na sua inexistência.»
Novo agravo regimental foi interposto dessa decisão pela recorrente, o qual não
foi provido pelo acórdão de fls. 92195, cuja
ementa é suficiente para revelar o seu conteúdo:
Agravo regimental. Objeto. Relator. Faculdade conferida pelo art.
896, 5', da CLT.
1.0 objeto do agravo regimental é a
desconstituição do óbice imposto ao
prosseguimento do recurso intentado.
Sem a impugnação direta às razões expendidas no ato impugnado, o agravo
regimental apresenta-se desfundamett-
tedo.
2.O art. 896, § 5°, da CLT faculta ao
relator, como membro integrante do oolegiado, indeferir o recurso submetido a
sua consideração, quando verificar a
ausência de qualquer dos pressupostos
extrínsecos, indispensáveis ao atendimento das exigências formais do ato
de recorrer. Tal procedimento não impede a obtenção da devida prestação
jurisdicional, prevista no art. 5°, inciso
XXXV, da CF/88.
3. Agravo regimental desprovido.
Dessa decisão que se interpôs o presente apelo extraordinário, cuja subida para
melhor exame determinei no agravo de instrumento anexo. Transcrevo, na parte que
interessa, as razões do recurso:
«Ao negar seguimento ao agravo de
instrumento, pelas razões que expôs, o
MM. Relatar impediu que o pedido cons-
R.T.J —150
tante do recurso viesse asa examinado
e, conseqüentemente, pudesse vir a ser
provido, permitindo-se, assim, a subida
da revista interposta pela agravante.
Esta decisão, ressalte-se, veio amparada no parágrafo 5° do artigo 896 da
CLT e no Verbete n° 272 da Súmula
desta Corte de Justiça.
Verifica-se, porém, que o Enunciado
n° 272 há de ser revisto, resta evidenciado que este verbete tentou reproduzir,
data venta, indevidamente, o de n° 288,
do E Supremo Tribunal Federal.
Indevidamente, porque a jurisprudência daquela Excelsa Corte foi definida no sentido de que o Verbete n° 288
aplica-se, tão-somente a ela, e não aos
dentais órgãos judicantes, em face das
peculiaridades dos agravos de instrumentos que lhes são dirigidos.
Não podem, portanto, os demais Tribunais julgar neste sentido e, tampouco,
sumular tais decisões.
Assim sendo, não cabe ao MM. Relator indeferir de plano o agravo de instrumento, com base em ausência de peça
de translado obrigatório, uma vez que
não há respaldo legal para tanto, o que
faz com que a decisão proferida nesse
sentido afronte o texto constitucional, e
o artigo 523 do CPC.» (fia. 97/98)
6. A Procuradoria-Geral da República
manifestou-se por meio de parecer da Subprocuradora-Geral Anadyr de Mendonça
Rodrigues que conclui, não obstante entenda estar prequestionado o tema constitucional, pelo não conhecimento do recurso:
«6. Tudo posto, observa-se, primeiro, que o apelo extremo silencia, completamente, sobre a aplicabilidade, ao
caso sob exame, do disposto no art. 896,
5°, in fine, da Consolidação das Leis
do Trabalho — comando legal em que
está arrimado o V. Acórdão recorrido
—, assim se fazendo invocável a &uno-
305
la 283 e ficando o Recurso Extraordinário insuscetível de conhecimento.
«É inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida
assenta em mais de um fundamento
suficiente e o recurso não abrange
todos eles.»
De outra parte, é de se consignar
que só reconhecendo-se, primeiro, que
errou o V. atesto guerreado, ao encontrar apoio para o decidido no disposto no
art. 896, ft 5°, in fine, da Consolidação
das Leis do Trabalho — assim desrespeitando-o, é que, em segundo passo,
poder-se-ia, eventualmente, chegar à conclusão sustentada pelo Recurso Extraordinário.
Em tal caso, porém, configurar-seia a ofensa reflexa à Carta Magna, o que
não enseja Recurso Extraordinário:
«A ofensa ao texto constitucional
de fama reflexa não viabiliza o recurso extraordinário.» (Ag 128.2827-AgRg-RS, Rel. Afia Djaci Falcão,
In Dl de 11-11-88, pág. 29315).
Ademais, afigura-se inegável que
a matéria em discussão — tuiparsabilidade da parte pela falta do traslado da
procuração, em autos de Agravo de Instrumento — tem nítida natureza processual, o que lhe retini o porte constitucional.
Por fim, inexistiu negativa de
prestação jurisdicional, porque:
«O STF entende haver-se dado a
prestação jurisdicional ainda quando inexata, notadamente — como
aliás quis o constituinte brasileiro
— no âmbito da Justiça do Trabalho, cuja autonomia sobre a matéria
só é elidida no caso de afronta
direta à Carta da República.» (RE
117.066-2-BA, ReL Min. alio Borja, in Dl de 8-9-89)
306
R.TJ. —150
11.0 parecer é, por conseguinte, de
que o Recurso Extraordinário não comporta conhecimento.»
o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Paulo Brossard (Relator): A questão constitucional está preguestionada e quanto a isto não há divergência.
Desde o primeiro despacho denegatório,
vem a recorrente alegando violação ao
princípio da prestação jurisdicional — inciso XXXV, art. 5°, CF — por obstar a
decisão o conhecimento do Recurso de Revista e a decisão recorrida diz expressamente, tanto no corpo do acórdão quanto na
sua ementa, que não impede ela ou o procedimento por ela invocada a obtenção da
devida prestação jurisdicional, prevista na
citada norma constitucional.
A decisão recorrida negou seguimento ao agravo de instrumento que visava a
subida de recurso de revista interposto contra decisão do TRT da 10° Região, ao argumento de deficiência na formação do instrumento; isto é, por constar do traslado
cópia apenas do substabelecimento e não
da «procuração principal». Fundamentou a
decisão tanto no «artigo 896, § 5°, in fine,
da CLT.», como no verbete da Súmula n°
272 do TST (fls. 61 e 74).
Como esclarece o parecer da Procuradoria-Geral da República a matéria está
prequestionada. Desde o primeiro despacho denegatório da subida do Recurso de
Revista, vem a recorrente alegando violação à garantia de prestação jurisdicional —
inciso XXXV, art. 5°, CF — e a decisão
recorrida diz expressamente, tanto no corpo do acórdão quanto na sua ementa, que
não impede ela ou o procedimento por ela
invocado a obtenção da devida prestação
jurisdicional, prevista na citada norma
constitucional.
4. Não obstante o parecer da Procuradoria-Geral da República tenha invocado a
Súmula 283 desta Egrégia Corte por enten-
der que a decisão recorrida assentou em
mais de um fundamento, na realidade, ele
é um único — falta da procuração prindpal no traslado do instrumento. A base
que se invocou para, com esse fundamento,
negar seguimento ao agravo de instrumento que são duas: a de ordem legal — art.
896, § 5°, In flne — e a sumular — verbete
272 do TST. Assim sendo, o extraordinário
ataca exclusivamente esse fundamento,
entendendo que, ao denegar seguimento ao
agravo por falta de cópia da procuração no
traslado, a decisão obstou a prestação jurisdicional assegurada no art. 5°, XXXV, da
Constituição Federal.
Desde já, necessário, se faz esclarecer que a recorrida quando da interposição do agravo de instrumento pediu expressamente o traslado da procuração (fl.
3), e depois, quando intimada para indicar as peças, tanto da procuração, como
do substabelecimento (fl. 11). Não obstante este fato, o instrumento foi formado
apenas com a reprodução do substabelecimento, sem a cópia do instrumento
principal de procuração.
A aplicação pelo Tribunal Superior
do Trabalho da sua Súmula 272, que reproduz a Súmula 288 desta Egrégia Corte, para obstar o seguimento do agravo de
instrumento que visa a subida de recursos
de revista, é muito questionada. Hoje tanto
em relação à denegação de recurso extraordinário como de recurso especial, a norma
que disciplina formação do instrumento do
agravo que se lhe opõe, é específica, a da
Lei n° 8.038/90, art. 28. Ao passo que os
demais agravos de instrumento, inclusive
aqueles interpostos contra decisão que
nega seguimento ao recurso de revista trabalhista, são regidos pelas normas gerais do
Código de Processo Civil que, além
determinar ao recorrente que indique as
peças do processo e quais são as que devem
ser obrigatoriamente trasladadas, dispõe no
artigo 560, parágrafo único, que em havendo preliminar suscitada no julgamento que
- 150
verse sobre nulidade sanável, «o tribunal,
havendo necessidade, converterá o julgamento em diligênda, ordenando a remessa dos autos ao juiz, a fim de ser
sanado o vido». Aliás, é por essa razão que
precedentes desta Egrégia Corte, entendem
que a regra da Súmula 288 não se aplica
aos tribunais ordinários (RE 95.744, RTJ
101/1317; RE104488,Di de 12-4-85, pág.
4941 e AGRAG 110.101, DJ de 20-6-88,
pág. 10936).
Na hipótese presente é de se considerar, ainda, que milita em favor da recorrente
uma presunção de existência do instrumento principal da procuração, pelo qual a recorrente outorgou os poderes objeto do
substabelecimento.
Mesmo a aplicação da Súmula 288
perante essa Egrégia Corte tem sofrido temperamentos. Com a entrada em vigor do
Código de Processo Civil de 1975, foi da
objeto de revisão pelo Plenário e não obstante, houvessem expressivos votos tanto
pela sua revogação, como pelo seu abrandamento, foi ratificada em seus termos
(AG 64.869 AgRg, Tribunal Pleno, RTJ
87/855). Deste modo, a falta no translado
de peça essencial à compreensão da controvérsia, nega-se provimento a agravo que
objetiva a subida de recurso extraordinário;
cabendo a parte o dever de vigilância na
formação do instrumento. Porém, recentemente, esta mesma Turma quando do julgamento do Agrag. 138.312-7, converteu-o
em diligência, assinando prazo de dez dias
para o agravante regularizar sua representação. Ainda a poucos dias o Ministro Marco Aurélio, por falta no traslado do instrumento de procuração, sugeriu a Turma remessa de processo ao Plenário para o reexame dessa Súmula, no que toca irresponsabilidade da parte na formação do instrumento. Vê-se, assim, que mesmo a aplicação dessa Súmula perante a Corte depende
da hipótese concreta que lhe é submetida.
9. Porém, na hipótese dos autos, mesmo
que se admitisse a aplicação da regra con-
307
tida na Súmula pelo Tribunal Superior do
Trabalho, creio que não se poderia obstar o
seguimento do agravo por falta de substabelecimento, porque a recorrente é unia
Fundação Pública que integra a administração indireta do Distrito Federal e, por isso,
é representada em juízo, ex vi lede, por
seus procuradores, nos termos do artigo 12,
inciso I, do Código de Processo Civil; hipótese em que se dispensa a apresentação
de procuração emJulzo. Sendo arecommte
uma fundação pública, mesmo que dotada
de personalidade jurídica de direito privado
com autonomia administrativa, integra
ela a administração pública indireta, artigo 4°, inciso II, alínea d, do Decreto-Lei n°
200/67. Ademais, o fato dela estar sendo
defendida em juízo por Procurador do
Distrito Federal, reforça a idéia da desnecessidade de apresentação de instrumento de mandato de procuração.
Emhipótese semelhante, envolvendo autarquias, esta Egrégia Corte assim decidiu
ao julgar o RE 65.729-GB, relatado pelo
Ministro Themístocles Cavalcanti:
Ementa: Os Procuradores das autarquias não dependem da apresentação de procuração para exercerem as
suas fmeçães cru Juízo.
C.onhedmento e provimento do Recurso Extraordinário (RTJ 50/395)
Mais recentemente, também o Plenário
confirmou essa orientação no julgamento
dos Embargos de Divergência 121.957DF, interpostos pelo Banco Central do Brasil, relatado pelo Ministro Sepúlveda Pertence. Transcrevo a ementa na parte que
interessa:
11 — Advogado: falta de prova, mediante juntada de procuração, de poderes de representação da parte; dispensa,
quando se cuida de profissional investido em cargo de advogado de autarquia.
A regra geral que decorre do art. 37,
assim como do art. 70 EOAB, é a exigência de juntada da procuração outor-
R.TJ. —150
308
goda pela parte ao advogado habilitado;
mas, a procuração é instrumento do mandato ad judicia, que só é de exigir quando este for o título de representação pela
parte do advogado que postula em seu
nome; não é o caso, pois, dos advogados
do Banco Central e o dos procuradores
autárquicos em geral, que, atuando em
juízo pela autarquia respectiva, não
cumprem mandato ad judicia — contrato que se prova pela procuração, mas
exercem atribuição do seu cargo, para o
que não dependem de outro título que a
investidura nele. (RTJ 137/410).
Ante o exposto, admito o pnrsente recurso extraordinário e lhe deu provimento para
determinar a subida do recurso de revista
para que o Tribunal a quo prossiga no seu
julgamento.
VOTO (PRELIMINAR)
O Sr. ~Iro Marco Aurélio: Sr. Presidente, a Recorrente empolgou um inciso
do rol das garantias constitucionais que não
pode ser tido como panacéia, como um
verdadeiro trampolim para, nas hipóteses
de transgressão às normas instrumentais
comuns, chegar-se ao Supremo Tribunal
Federal, para alçar-se à Suprema Corte matéria de contornos simplesmente processuais, que encontra regência na legislação
comum, na legislação dita ordinária.
A Recorrente apontou que se teria obsfocalizado o acesso ao Judiciário. Indagase: é possível afirmar-se esse óbice quando
dois órgãos investidos do ofício judicante
julgaram o mérito? Como dizer-se que o
acesso ao Judiciário foi obstaculizado quando o próprio Supremo Tribunal Federal é
convocado para emitir entendimento sobre
questão estritamente processual? Penso que
não, Sr. Presidente. E, já por isso, caminharia no sentido do não-conhecimento do recurso extraordinário.
Há mais. Na hipótese dos autos, tivemos
urna decisão negativa prolatada pelo Juízo
primeiro de admissibilidade do recurso de
revista. Entendeu a Presidente do Décimo
Regional à época, a Juíza Heloísa Pinto
Marques, que a revista não se enquadrava
em um dos pamissivos do artigo 896 da
Consolidação das Leis do Trabalho. Deu-se
a interposição de agravo, só que a formação
do instrumento fez-se com peça que não
tem vida própria, com um substabelecimento, não se trazendo aos autos o instrumento de mandato, que é a procuração. O
Relator, acionando norma estritamente legal, o § 5° do artigo 8% consolidado, negou
seguimento ao agravo. E aí o que ocorreu?
Alertada, a Fundação trouxe aos autos a
prova do credenciamento do advogado, ao
interpor o regimental? Não. Pelo menos
sob a óptica da Corte de origem, sob o
ponto de vista do Relator que atuou junto
ao Tribunal Superior do Trabalho, tomou a
claudicar, não anexando aos autos a procuração, deixando de sanear, assim, o defeito
apontado pelo Relator do processo, por sinal classista e empregador. Exsurgiu, então, novo pronunciamento, consignando-se
a inexistência do mandato. E novo regimental, como se houvesse oportunidade
para uma verdadeira segunda época, foi
protocolado, mas, simplesmente, contendo
alegações ligadas à primeira decisão, àquela relativa ao agravo de instrumento e não
à referente à última decisão do processo, a
decorrente do agravo regimental anterior.
Nesse segundo agravo regimental é que foi
juntada aos autos a procuração que está à
folha 86.
Sr. Presidente, não posso assentar, sob
pena de abrir uma via larguíssima ao acesso
a esta Corte, transmudando-a em instância
ordinária no julgamento de recurso que não
tem essa índole, que o quadro revela a
oposição de obstáculo ao acesso ao Judiciário.
Dir-se-á: trata-se de uma Fundação Hospitalar, de uma Fundação de direito público
que, portanto, é representada pelos respectivos Procuradores, estando dispensada da
apresentação de mandato. Se isso é certo,
R.TJ —150
não menos correto é que não podemos julgar, pela primeira vez, o tema, que deveria
ter sido articulado junto ao Tribunal Superior do Trabalho. Não podemos asseverar
que a Corte de origem claudicou quando
Sio houve adoção de entendimento sobre a
matéria. Não podemos presumir que, avisada quanto à qualificação da Recorrente,
mesmo assim a Corte insistiria na declaração de irregularidade da representação processual.
A Turma admitirá, neste caso, o preqüestionamento implícito se a Corte não o
faz, sequer, naquelas hipóteses em que envolvida a incompetência do órgão julgador? Creio que não podemos dar passo tão
largo e, também, que não podemos radio,
gr* a hipótese, dispensando formalidade
que temos proclamado em inúmeros provimentos judiciais, ou seja, a ligada à convicção de que o preqüestionamento deve estar
revelado no processo com um predicado —
o da explicitude• que deve significar, sob
qualquer ângulo, o debate e a decisão prévios sobre o tema judgeno veiculado no
extraordinário. Não sei, sequer, se nesse
extraordinário a Recorrente se vale da qualificação de fundação de direito público e
conclama a Turma a entender dispensável,
no caso, o instrumento de mandato. Ouso,
inclusive, consignar que a matéria é estranha ao extraordinário. Faço-o, Sr. Presidente, porque confio na atuação da Procuradoria-Geral da República, na forma cuidadosa com que a ilustre SubprocuradoraGeral da República, Anadyr de Mendonça
Rodrigues, aprecia os casos que são colocados sob o abalizado crivo que sempre
demonstra.
Peço vênia ao nobre Relator, para não
conhecer do extraordinário.
VOTO (PRELIMINAR)
OSr. Ministro Carlos Venoso: Sr. Presidente, ouvi com a maior atenção a sustentação oral feita pelo jovem e talentoso advogado.
309
Convenci-me de que a questão posta,
puramente processual, não ostenta as galas
de questão constitucional. Quer dizer, não
houve, no caso, ofensa direta à Constituição, e é essa ofensa que autoriza a interposição do recurso extraordinário.
Com essas breves considerações, peço
vênia ao eminente Ministro Relator, cujas
opiniões e votos tenho o costume de respeitar, para, divergindo, no caso, não conhecer
do recurso extraordinário, nos termos do
voto do Sr. Ministro Marco Aurélio.
VOTO
O Sr. Ministro Néri da Silveira (Presidente): Também peço vênia ao Sr. Mmistro-Relator, para acompanhar o voto do Sr.
Ministro Marco Aurélio, não conhecendo
do presente recurso.
Fundado o apelo na alegação de ofensa
ao inciso XXXV do art. 5° da Constituição,
bem de ver é que não restou demonstrada a
vulnerado desses:apositivo. Todo o debate é desenvolvimento em torno de matéria
de natureza processual. Saber se a juntada
de instrumento de mandato haveria de darse no caso concreto; se, mesmo não tendo
trazido aos autos, o respectivo mandato,
quando interpôs o recorrente o agravo de
instrumento, estaria este recurso em condições de ser conhecido ou não: essas indagações põem-se em plano estritamente processual e só se poderia efe tivamente chegar
a eventual demonstração de ofensa à regra
maior invocada, depois de ser dirimida dita
questão processual.
É da orientação da Corte que a ofensa à
Constituição deve ser imediata e direta para
ensejar conhecimento do apelo extraordinário.
Com essas breves considerações, não
conheço do recurso.
EXTRATO DA ATA
RE 151.508 — DF — Rel.: Min. Paulo
Brossard. Recte.: Fundação Hospitalar do
310
R.Ti. —150
Distrito Federal (Advs.: Angela Silveira Banhos e outros). Recdos.: Abelardo de Oliveira Brito e outros (Advs.: Marcos Luís
Borges de Resende e outros).
Decisão: Por maioria de votos, a Turma
não conheceu do recurso extraordinário.
Vencido o Sr. Ministro Relatar que dele
conhecia e lhe dava provimento. Ausente,
ocasionalmente, o Sr. Ministro Francisco
Rezek. Lavrará o acórdão o Ministro Mar-
co Aurélio. Falou pelos recorridos o Dr.
Marcos Luís Borges de Resende.
Presidência do Sr. Ministro Nfti da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Paulo Brossard, Carlos Venoso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Mardem Costa
Pinto.
Brasília, 1° de junho de 1993 — José
Wilson Aragão, Secretário.
AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 152.775 (AgRg) — SP
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio
Agravantes: Waldir Ambrósio Gil e outro —Agravado: Estado de São Paulo
Recurso Extraordinário. Moldura fálica. Legislação locaL A
teor do disposto no artigo 337 do Código de Processo Civil, a parte que
alegar direito municipal, estadual, estrangeiro ou consuetudinário provar-lhe-á o teor e a vigência, se assim o determinar o juiz. A atuação em
sede extraordinária faz-se a partir da moldura tática delineada, soberanamente, pela Corte de origem. Constando do acórdão atacado que a
legislação local não contempla um certo direito, descabe cogitar da
vulneração ao inciso XXXVI do artigo 5° da Constituição Federal, no
que revela a intangibilidade do ato jurídico perfeito e acabado, do direito
adquirido e da coisa julgada.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos,
em negar provimento ao agravo regimental.
Brasília, 10 de agosto de 1993 — Néri
da Silveira, Presidente—Marco Aurélio,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Ao negar acolhida ao pedido formulado no agravo
de instrumento, assim relatei a hipótese:
O Juízo primeiro de admissibilidade,
em despacho da lavra do Terceiro Vice-
Presidente — Desembargador Yussef
Cahali — apontou que não foi preguesdanado tema constitucional, citando, relativamente àquele instituto, o que
decidido no Agravo de Instrumento n°
135.005-9-PA, no qual funcionei como
Relator. Indicou como óbices ao trânsito
do extraordinário os Verbetes de na 282
e 356 da Súmula da jurisprudência predominante desta Corte. Por último, salientou que, no máximo, poder-se-ia
estar diante de hipótese a revelar afronta
à Carta intennediada pelo desrespeito a
norma estritamente legal, o que não viabiliza o extraordinário (folhas 45 a 47).
Coma minuta de folhas 3 a 5, procuram os Agravantes demonstrar o enquadramento do recurso no permissivo
R.T.J —150
constitucional. Afirmam que a Corte de
origem aludiu à necessidade de observar-se o princípio isontiinico e refutou o
conflito da postura adotada pelo Estado
com a Carta.
Aos autos veio a contraminuta de
folhas 49 a 53, no sentido de que a
controvérsia foi dirimida à luz da Lei
Complementar n° 567/88, do Estado de
São Paulo.
A seguir, fiz consignar que Órgão julgador apreciou a questão sob o ângulo da
legislação local e que, para dizer-se da
ofensa ao direito adquirido dos Agravantes
indispensável seria o exame do respectivo
texto. Frisei que em momento algum foi
obstaculizado o acesso ao Judiciário, tanto
assim que a demanda foi julgada, no mérito, por dois órgãos integrantes do Poder
Judiciário local (folhas 59 e 60).
Com o telegrama de folha 62, os Agravantes insistem etn asseverar que a decisão
impugnada mediante o extraordinário conflito com a garantia insculpida no inciso
XXXVI do artigo 5° da Carta. Discorrem
sobre a defesa apresentada no processo a
partir da inicialInfonnaram o envio do original, na mesma data, a esta Corte, o que
ocorreu conforme revelam as peças de folhas 64 a 67.
Recebi os presentes autos para análise
em 17 de junho de 1993, liberando-os, para
julgamento, no dia 21 imediato (folha 68).
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relatar): A matéria de fundo veiculada neste
regimental está a merecer o conhecimento
do Colegiado. As peças, folhas 17 e 20,
comprovam a regularidade da representação processual, sendo que, publicada deci-
311
são atacada no Diário de 4 de junho de 1993
— sexta-feira (folha 61) — deu-se a protocolação do agravo em 11 seguinte — sexta-feira (folha 64) — e, portanto, dentro do
qüinqüídio.
A atração em sede extraordinária faz-se
a partir da moldura fálica delineada, soberanamente, pela Corte de origem. Conforme fiz ver ao apreciar o pedido formulado
no agravo de instrumento, decidiu a Quarta
Câmara Civil de Férias do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo mediante interpretação de lei local — a Lei Complementar n° 567/88 — que, a teor do disposto no
artigo 337 do Código de Processo Civil,
depende de prova. Sem o afastamento das
premissas lançadas na decisão, impossível
é dizer da inobservância ao direito adquirido dos Agravantes. Por isso, nego acolhida
à reiteração do pedido de trânsito do extraordinário.
É o meu voto.
EXTRATO DA ATA
Ag 152.775 (Aglig) — SP —Rel.: Min.
Marco Aurélio. Agtes.: Waldir Ambrósio
Gil e outro (Adv.: Celso RolimRosa). Agdo.:
Estado de São Paulo (Advs.: Maria Luciana
de Oliveira Facchina e outro).
Decisão: Por unanimidade, a Turma negou provimento ao agravo regimental. Ausente, ocasionalmente, o Ministro Carlos
Velloso.
Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Carlos Velloso, Marco Aurélio e Francisco
Rezek. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Paulo Brossard. Subprocurador-Geral da República, o Dr. Haroldo Ferraz da
Nóbrega.
Brasília, 10 de agosto de 1993 — José
Wilson Aragão, Secretário.
312
R.TJ. — 150
AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 152.992 (AgRg) — SP
(Prisndra Turma)
Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello
Agravante: Instituto Nacional do Seguro Social —INSS —Agravada: Maria
Aparecida Monteiro
Constitucional. Prevideaddrio. Valor mínimo do beneficio.
Fonte de cadeia CF, art. 195, § E Aplicabilidade bnediata da norma
inscrita no art. 201, §§ 5' e 611, da Casta Política. Precedentes Aproe
regimental bnprovida
A jurisprudência de ambas as Turmas do Supremo Tribunal Federal firmou-se, de modo unânime e uniforme, no sentido da
auto-aplicabilidade das normas inscritas no art. 201, §§ 5` e 6', da
Constituição da República.
A garantia jurídico-previdenciária outorgada pelo art.
201, §§ 5" e e, da Carta Federal deriva de norma provida de elidida
plena e revestida de aplicabilidade direta, imediata e integral. Esse
precdto da Lei Fundamental qualifica-se como estrutura jurídica dotada de suficiente densidade normativa, a tornar prescindirei qualquer
mediação legislativa concretizadora do comando nele positivado.
Essa norma constitucional —por não reclamar a baresposido
legislatoris — opera, em plenitude, no plano Jurídico, todas as suas
conseqüências e virtualidades "acida.
A exigência inscrita no art. 195, § 5°, da Carta Política
traduz comando
destinatário que
exclusivo, tem,por,
o próprio legislador,
no que se refere à criação, majoração ou extensão de outros benefícios
ou serviços da seguridade social.
A aplicabilidade do conteúdo normativo do art. 201, 0 5'
6°, da Constituição, por revelar-se plena, imediata e integral, não
depende, por isso mesmo, da indicação de qualquer específica fonte de
custeio.
ACÓRDÃO
RELATÓRIO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Primeira Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos,
em negar provimento ao agravo regimental.
Brasília, 3 de agosto de 1993 — Moreira Alves, Presidente — Celso de Mello,
Relatar.
O Sr. Ministro Celso de Mello: O presente recurso de agravo — manifestado
pelo INSS sob a forma de «agravo regimental» (RISTF, art. 317) —, insurge-se contra
a decisão por mim proferida (fls. 28/29)
que negou trânsito, na esfera do Supremo
Tribunal Federal, a agravo de instrumento
deduzido em face de ato decisório da Presidência do Tribunal Regional Federal da
3° Região que não admitiu o processamento
R.T.J — 150
do apelo extremo interposto pelo ora recorrente.
Em suas razões recursais, expendidas
neste agravo, o recorrente deixou consignado que (As. 32/34), verbis:
«Não se conforma o Instituto Agravante com o eminente dedsum ora agravado por versar a matéria dos autos sobre auto-aplicabilidade ou não de norma
constitucional, cuja interpretação é, inafastavelmente, conjugada com a regra
do art. 195, 5° da própria Constituição
Federal e a do art. 59 do ADCT. E, em
conseqüência, trata-se de hipótese de
preceito constitucional cuja eficácia somente se operou com o advento da Lei
n° 8.213/91 — norma regulamentadora
do multicitado preceito constitucional.
Conseguinte, somente a partir da referida Lei n° 8.213/91, pode-se atribuir
plena eficácia à atinente norma constitucional.
Em suma, vigora o irrefutável entendimento de que multicitado preceito
constitucional (art. 201, § 5°) não é
auto-aplicável, visto que 'para o desfrute do direito garantido pelo texto magno,
o legislador constituinte fez depender da
vontade integrativa do legislador ordinário'. Enfim, trata-se de Interpretação conjugada da norma constitudonal dtada com a regra do art. 195,
5°, da Lei Maior, e a do art. 59, parágrafo único, do ADCT'. É 'caso em
que, com eficácia operada a partir do
advento da Lei n° 8.213/91, diploma
normativo-integrativo que lhe dá aplicabilidade plena, sobreveio a atividade regulamentadora do preceito constitucional'.
Com efeito, é de se atentar para a
lite/alidade do disposto no caput do art.
201, cuja redação é absolutamente idêntica ao caput do art. 195, ao remeter à
Id a matéria nele disciplinada ('nos ter-
313
mos da lei'). A imperatividade do comando contido no § 5° de ambos os
dispositivos fica, claramente, na dependência da lei prevista no respectivo caput, de sorte a inexistir qualquer razão
jurídica para se conferir auto-aplicabilidade a um deles, enquanto o outro seria
destinado ao legislador. Se este fosse o
caso de um dos artigos, deveria ser o art.
201, já que esta regra se reporta aos
'planos de previdência social', por sua
vez objeto do art. 59 do ADCT. Nem se
poderia distanciar o artigo 201 do parágrafo 5° do art. 195, por força também
do disposto no parágrafo 2° desse mesmo dispositivo constitucional (art. 201).
Aduz, finalmente, que (fls. 38/43):
Na verdade, data mata vaia, aludido preceito constitucional (99 5° e,
ainda, o 6° do artigo 201 da CF), possuindo conteúdo programático, não poderiam ter aplicação imediata Nem prescindir de fonte de custeio total. Isto,
mesmo se considerado dito preceito uma
garantia fundamental, comportando ainda a seguinte indagação: — de que valeria o Legislador assegurar tal garantia
sem o meio de concretizá-la?
Relevante é que o Legislativo, o Executivo e o próprio Judiciário vêm entendendo pela não auto-aplicabilidade dos
multicitados dispositivos constitucionais
(ff 5° e 6° do art. 201 da CF). Mais ainda
relevante é que, até mesmo nesse Pretório Excelso há precedente neste sentido,
com remissão a concernentes proposições legislativas que deram concreção
ao art. 201 da Magna Carta, como se
demonstra, retro.
E, volta-se a repetir, em não se tratando de disposições auto-aplicáveis, unicamente podem ser tidas como normas
regulamentares da mesma espécie as Leis
314
R.TJ. — 150
na 8.212/91 e 8.213/91. A nenhuma outra lei, data maxima venia, pode-se
atribuir mesma função regulamentadon. De se destacar que a Lei n° 7.787/89,
mencionada em inúmeras decisões pertinentes à mesma espécie em exame
como geradora de fonte de custeio para
aplicação do parágrafo 5° do art. 201 da
Constituição Federal, apenas cuidou expressamente de reajustamento de valor
de beneficio previdenciário, em função
do disposto no art. 58 do ADCT (arts.
14 e 15 da Lei n° 7.787/89), bem ainda
de alteração de alíquotas para determinadas categorias de contribuintes, sem
implicar fonte total de custeio (art. 195,
§ 5° da CF). Desde a inicial do feito que
se discute exatamente a aplicabilidade,
o momento de aplicação de pertinente
dispositivo constitucional. E o venerando acórdão extraordinariamente recorrido não elidiu nem poderia elidir a questão relativa, simplesmente por ter tomado como marco inicial ou momento desta aplicabilidade a Lei n° 7.787/89. Evidentemente, com este entendimento, apenas, foi decidido equivocadamente o mérito da causa
E o que é mais fundamental, sendo,
como também afirma a Jurisprudência,
conjugada a interpretação do multicitado dispositivo constitucional (art 201,
§ 5°) com regra do artigo 195, § 5°, da
Lei Maior, e a do artigo 59 do ADCT,
desta mesma interpretação, data maxima venda, além de não poder se afastar o Julgador, ter-se-ia também matéria que, pelo que se depreende do disposto no art. 5°, VII, do RISTF, refoge
do âmbito da competência da própria e
Egrégia Turma Julgadora. Outrossim, a
correlação entre os parágrafos 2°, 5° e 6°,
do ext. 201 da Lei Máxima, com o art.
195, parágrafo 5° desta mesma Lei, bem
ainda com os arts. 33, 40 e 145 da Lei n°
8.213/91 é incompatível com o decisum
ora agravado e, particularmente, não poderia coexistir esse mesmo venerando
despacho agravado com referidos dispositivos legais (arts. 33, 40 e 145 da Lei
n° 8.213/91), a não ser que fossem tidos
estes (multicitados dispositivos legais)
como inconstitucionais, o que é por demais relevante para, por si só, remeterse o feito ao Plenário dessa Calcada
Corte de Justiça, em conformidade com
o disposto no art. 11, I, do RISTE
Ante o exposto, invocando os suplementos altamente judiciosos do Emérito
Julgador, pede-se seja reconsiderado o
eminente decisum ora agravado e, assim, valendo-se Vossa Excelência da
faculdade assegurada pelos art. 21, IV,
22 do RISTF, que submeta mesma
matéria ao Plenário dessa Excelsa Corte
de Justiça, com o que, ainda com a maxima venta, pôr-se-ia termo definitivo à
demanda, que abriga milhares de casos
desta mesma natureza que ainda tramitam e estão subindo ao Excelso Pretório,
os quais poderiam ser abrangidos em
uma única decisão, dirimindo, precipuamente, divergência jurisprudencial entre os Egrégios Tribunais Regionais
Federais...»
Por não me haver convencido das razões
apresentadas, submeto o presente recurso à
apreciação desta E. Primeira Turma.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Celso de Mello (Relatar): Trata-se de recurso extraordinário, não
admitido pela Presidência do Tribunal
inferior, no qual o ora agravante busca a
reforma do acórdão impugnado no ponto
em que este, decidindo a questão da aplicabilidade da norma inscrita no art. 201, §§
5° e 6°, da Constituição Federal, interpretou
o alcance desse preceito em função da regra
consubstanciada no art. 195, § 5°, da mesma Carta Política, e no art. 59 do ADCT/88.
R.TJ —150
315
O Instituto Nacional do Seguro Social
De outro lado, a exigência inscrita no
— INSS, ao deduzir o recurso extraordiná- art. 195, § 5°, da Carta Política traduz corio, (a) alegou que a decisão do Tribunal a mando que tem, por destinatário exclusiquo infringiu o art. 195, § 5°, da CF; (b) vo, o próprio legislador, no que se refere à
sustentou que o preceito inscrito no art. criação, majoração ou extensão de outros
201, §§ 5° e 6°, da Carta Política depende, benefícios ou serviços da seguridade sopara efeito de sua incidência, de necessária cial.
complementação normativa a ser concretiDesse modo, a aplicabilidade do conteúzada pelo legislador e (c) salientou que o do normativo do art. 201, §§ 5° e 6°, da
acórdão impugnado ofendeu o art. 59 do Constituição, por revelar-se plena, imediaADCT/88.
ta e integral, não depende, por isso mesmo,
Denegado o apelo extremo, manifestou da indicação de qualquer específica fonte
recorrente este agravo de instrumento de custeio.
para o Supremo Tribunal Federal.
Devo registrar, não obstante estas conNeguei-lhe provimento, quer em função siderações, que a parte ora agravada conda auto-aplicabilidade da norma constitu- formou-se com o pronunciamento emanacional em questão, quer em face da forma do do Tribunal Regional Federal em quesincoerente e ilógica com que deduzida a tão, satisfazendo-se com o reconhecimento
pretensão recursal pela autarquia recorren- judicial, ainda que em menor extensão
te, quer, finalmente, pela uniforme orienta- temporal, do seu direito ao reajuste do
ção jurisprudencial fixada, sem maiores das'- beneficio previdenciário.
ceptações, no tema em exame, por ambas
A circunstância de o acórdão impugnaas Turmas do Supremo Tribunal Federal.
do haver estabelecido a vigência do beneCom efeito, a garantia jurídico-previ- fício previdenciádo em questão a partir da
denciária outorgada pelo art. 201, §§ 5° e Lei n° 7.787/89, e não a dentar de 5-10-88,
6°, da Carta Federal deriva de aorta provi- em nada favorece a pretensão recursal do
da de eficácia plena e revestida de aplica- INSS, especialmente em face do conteúdo
bilidade direta, imediata e integral. Esse da petição com que deduziu o apelo extrepreceito da Lei Fundamental qualifica-se mo.
como estrutura jurídica dotada de suficienA entidade autárquica recorrente, não
te densidade normativa, a tornar prescin- obstante tenha expressamente reconhecido
dível qualquer mediação legislativa con- que o acórdão impugnado fundamentou-se
cretizadora do comando nele positivado.
na Lei n° 7.787/89, sustenta, de modo inSendo assim, desveste-se de qualquer coerente e ilógico, que o Tribunal a quo
fomento jurídico a pretensão =cursai que deu aplicabilidade direta e imediata ao cobusca condicionar a aplicabilidade do art. mando emergente do art. 201, ¢§ 5° e 6°, da
201, §§ 5° e 6°, da Lei Fundamental, quer Constituição.
à edição de lei, quer à implantação proDaí, a creta decisão da Presidência do
gressiva dos planos de custeio e de benefi- Tribunal a quo que, aplicando à espécie a
cio, nos termos fixados pelo art. 59 do Súmula 284 do STF, deixou de admitir o
ADCT/88.
recurso extraordinário interposto pelo
Na realidade, a norma constitucional em INSS.
questão —por não reclamar a haterpositio
Impõe-se registrar, por necessário, que
legialatoris — opera, em plenitude, no pla- a matéria suscitada na presente sede prono jurídico, todas as suas conseqüências e cessual já foi apreciada por ambas as Turvirtualidades eficaciais.
mas do STF que, em precedentes tapeei-
316
R.T.J. —150
ficas, repeliram a pretensão recursol ora
deduzida pelo INSS:
«Previdendário. Beneficio. Piso salarial. Art. 201, §§ r e 6' da Condituição Federal.
As normas dos dispositivos acima
mencionados, que estabelecem piso igual
ao salário-mini:no para os benefícios
previdenciários e gratificação natalina
dos aposentados e pensionistas'equivalente aos proventos do mês de dezembro, são auto-aplicáveis, independendo
sua eficácia de edição de lei ordinária
regulatnentadora.
Agravo regimental improvida»
(Ag 147.972-9-SP (AgRg), Rel. Km.
limar Gaivão, Primeira Turma, DJ de
1°-7-93).
dlendido previdenclário — Piso
—Fonte de custeio. As regras contidas
nos §§ 5° e 6° do artigo 201 da Constituição Federal têm aplicabilidade imediata. O disposto no § 5° do artigo 195
não as condiciona, já que dirigido ao
legislador ordinário, no que vincula a
criação, majoração ou extensão de benefício ou serviço da seguridade social à
correspondente fonte de custeio total.»
(Ag 148.401-3-RS (AgRg), Rel. 1Vfin.
Marco Aurélio, Segunda Turma, DJ de
26-3-93)
«Recurso extraordinário. Previdência Sodal.
Benefício previdenciário. Constituição, art. 201, ৠ5° e 6°. Sua auto-aplicabilidade. Não se opõem à sua eficácia
plena e imediata aplicação o art. 195, §
5°, da Constituição, nem os arts. 58 e 59,
do Ato de suas Disposições Transitórias. Hipótese em que o acórdão recorrido estabeleceu a vigência do benefício a
que se refere o § 5° do art. 201, da Constituição, a partir da Lei n° 7.787/89, e
não a contar de 5-10-88, conformandose, entretanto, o autor com o julgado.
Recurso extraordinário do INSS não ad-
miúdo. Agravo regimental a que se nega
provimento.»
(RE 162.170-3/SP (AgRg), Rel. Mm.
Md da Silveira, Segunda Turma, DJ
de 11-6-93)
Como assinalado, o entendimento exposto vem merecendo, em sucessivos e
inúmeros julgados, a adesão uniforme dos
membros integrantes desta Suprema Corte,
o que torna de todo dispensável — ante a
posição comum e convergente de ambas as
Turmas — a submissão do pleito recursal
ao Plenário do Tnhunal, v.g.: Ag 147.470-0
(AgRg), Rel. Min. Sepálveda Pertence,
Primeira Turma, julg. em 29-6-93; RE
151.082-1 (AgRg), Rel. Min. Sepúlveda
Pertence, Primeira Turma, julg. em 29-693; Ag 149.953-3 (AgRg), Rel. Min. Britar
Gaivão, Primeira Turma, I» de 1°-7-93;
Ag 152.4074 (AgRg), Ra Mlii. Néri da
Silveira, Segunda Turma, julg. em 21-593.
Impõe-se referir, neste ponto, que o
INSS, ao sustentar a necessidade de apreciação da presente causa pelo Plenário do
STF, deduziu nesta sede recursol questão
inteiramente nova, versando a alegada inconstitucionalidade dos arts. 33, 40 e 145
da Lei te 8.213/91.
Esse aspecto da controvérsia, porque
sequer ventilado no acórdão recorrido, não
se torna passível de cognição na instância
recursal extraordinária, por evidente ausência de configuração do requisito do prequestionamento.
Não ventilada no acórdão recorrido a
quaestio — que somente agora veio a ser
suscitada pela parte recorrente—, deixa de
caracterizar-se, tecnicamente, o prequestionamento da matéria, necessário ao conhecimento do recurso extraordinário (RTJ
98/754 — 116/451).
A imprescindibilidade do prequestionamento como requisito viabi fixador do apelo
extremo impõe, consoante adverte Castro
Nunes («Teoria e Prática do Poder Judiciário», pág. 345, item n° 11, 1943, Forense),
R.T.I —150
a existência de «uma controvérsia anterior
à interposição do recurso», verbis:
É que, pelo recurso extraordinário, o Supremo Tribunal não julga questões novas, que já então seriam por ele
decididas em instância (mica.»
É pacífico o entendimento deste Supremo Tribunal — apoiado no magistério da
doutrina (Rodolfo de Camargo Mancuso,
«Recurso Extraordinário e Recurso Especial», págs. 123/124, 1990, RT) —, no sentido de que
«No exame do recurso extraordinário, no Supremo Tribunal Federal, não é
aplicável o princípio jura novit cursa,
pelo que os temas a serem apreciados
devem ser anteriormente examinados na
instância a quo. É o que resulta da jurisprudência consubstanciada nos Verbetes na 282 e 356 da Súmula.»
(RE 99.978-7 (EDc1), Rel. Min. Aldir
Passarinho, DJ de 22-8-86).
«Não se aplica ao julgamento do recurso extraordinário, pelo Supremo Tribunal Federal, o princípio jura novit
Mia.»
(Ag 141.873-7-SP (AgRg), Rel. Min.
Celso de Meio, DJ de 7-5-93).
Disso tudo resulta a impossibilidade de
apreciar, nesta sede recursal, um tema jurídico que, por ausência de prequestionamento, não pode ter acesso à via do apelo
extremo.
Finalmente, não procede a alegação do
ora agravante de que precedente desta Corte, em matéria análoga, teria merecido, em
sede de processo injuncional, decisão incompatível com o teor do ato decisório ora
impugnado.
Uma leitura atenta da decisão proferida
no MI 215-1-RS (DJ de 16-3-90) evidencia
317
que a referência à incompletude das normas inscritas no art. 201, §* 5° e 6°, da
Consfituição Federal foi feita ad argumentandum Untura, com o claro propósito de
demonstrar que, mesmo que se reconhecesse a necessidade de ulterior integração normativa dos preceitos em questão (não se
declarou, portanto, que era imprescindível
a interpositio legislatoris), a ação injuncional, de todo modo, não mereceria Utak° pelo fato de, a partir da formalização
de proposições legislativas várias concernentes à matéria, não mais ~imputável ao
Congresso Nacional, precisamente pelo caráter positivo dessa atuação parlamentar, a
inertia agendi vel deliberandi, cuja ocorrência pode, em tese, dar lugar ao mandado
de injunção.
Assim, e com estas considerações, nego
provimento ao presente agravo.
É o meu voto.
EXTRATO DA ATA
Ag 152.992 (AgRg) — SP — Rel.: Mn.
Celso de Mello. Agte.: Instituto Nacional do
Seguro Social — INSS (Adva.: Vilma
Westmann Anderlini). Agda.: Maria Aparecida Monteiro (Adv.: José Ferreira das Neves).
Decisão: A Turma negou provimento ao
agravo regimental, nos termos do voto do
Relator. Unânime.
Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Sydney Sanches, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e limar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Miguel Franzino Pereira.
Brasília, 3 de agosto de 1993 — Ricardo Dias Duarte, Secretário.
318
R.T.J. — 150
AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 153377 (AgRg) — RJ
(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio
Agravante: Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do
Estado do Rio de Janeiro — CREA — Agravado: Emerson B. Martins
Recurso. Representação processual. Autarquia Corporativista
(Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia) —Adrocoda-Geral da Unido. A legislação disdplinadora da Advocacia-Geral da
União não dispôs sobre o aproveitamento automático dos advogados das
autarquias corporativistas, mormente considerada a inexistência de
demonstração do vinculo empregaticio.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos,
em negar provimento ao agravo regimental.
Brasília, 24 de agosto de 1993 — Néri
da Silveira, Presidente — Marco Aurélio,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Deixei
de conhecer do pedido formulado no agravo de instrumento em face à irregularidade
da representação processual. Não foi trasladado o instrumento de mandato. Observei, assim, o Verbete de n° 288 que integra
a Súmula da jurisprudência predominante
desta Corte.
O Conselho Regional de Engenharia,
Arquitetura e Agronomia do Estado do Rio
de Janeiro — CREA/RJ, ressaltando a qualidade de autarquia federal, sustenta que, a
teor do disposto no artigo 17 da Lei Complementar n°73, de 10 de fevereiro de 1993,
tem a representação exercida pela Advocacia-Geral da União e que a subscritora do
agravo, atuando como advogada da Autarquia, passou a compor a Instituição. Procedeu à juntada do instrumento de folha 55,
acompanhado da peça relativa à transferência dos poderes, com reservas, de folha 56.
Recebi os presentes autos para exame
em 2 de agosto de 1993, liberando-os em 4
seguinte.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relato): Conheço deste agravo regimental, porquanto atendidos os pressupostos de recorribilidade que lhe são próprios. Os documentos de folhas 55 e 56 revelam regular a
representação processual, sendo que o recurso foi protocolado dentro do prazo legal.
No mais, ainda que se pudesse agasalhar
a tese sobre a integração automática dos
advogados das autarquias corporativistas,
com ou sem vínculo empregai:feio, à Advocacia-Geral da União, passo demasiadamente largo, verifica-se que o agravo interposto foi subscrito pela profissional da advocacia Dra. Regina Célia Pinheiro Amorim Fonseca, que se qualificou como advogada. O credenciamento veio aos autos
mediante peça reveladora de substabelecimento, isto quando da protocolação do regimental. O artigo 17 da Lei Complementar
n° 73, no que prevê que aos órgãos jurídicos
das autarquias e das fundações públicas
compete a sua representação judicial e extrajudicial, bem como a atividade de consultoria e assessoramento jurídico, espelha
R.TJ —150
justamente o contrário do que sustentado.
Revela a preservação de tais órgãos nas
estruturas respectivas. De qualquer forma,
a representação das autarquias pressupõe o
vínculo dos procuradores como tais, e este
não ficou comprovado nos autos. Por estas
razões, tenho como íntegra a referência ao
Verbete de n° 288 da Súmula. Nego acolhida ao pedido formulado no regimental.
É como voto.
EXTRATO DA ATA
Ag 153.377 (AgRg) —RJ —Rel.: Min.
Marco Aurélio. Agte.: Conselho Regional
de Engenharia, Arquitetura e Agronomia
319
do Estado do Rio de Janeiro — CREA
(Advs.: Regina Célia Pinheiro Amorim Fonseca e outros). Agdo.: Emerson B. Martins.
Decisão: Por unanimidade, a Turma negou provimento ao agravo regimental.
Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Paulo Brossard, Carlos Velloso e Marco
Aurélio. Ausente, justificadamente, o Sr.
Ministro Francisco Rezek. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Artur Castilho
Pereira Neto.
Brasília, 24 de agosto de 1993 — José
Wilson Aragão, Secretário.
AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 153.625 (AgRg) — RS
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro limar Gaivão
Agravante: Estado do Rio Grande do Sul—Agravada Sucessão de Albertina
Cangeri
Imposto de transmissão causa mortas. Alkuota. Fixação pelo
Senado Federal —CF169, art. 23, I. CFISS, art. 15% IV.
A nova Carta Constitucional manteve a antiga regra de
que cabe ao Senado Federal estabelecer as aliquotas máximas do
imposto de transmissão causa moras.
Diante da existência de resolução reguladora da matéria
compatível com o novo texto, não restou espaço para o legislador
estadual dispor acerca da alíquota do tributo, sob invocação do 3° do
art. 34 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.
Agravo regimental improvido.
ACÓRDÃO
RELATÓRIO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, na
conformidade da ata do julgamento e das
notas taquigráficas, por unanimidade de
votos, em negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Relator.
O Sr. Ministro limar Gaivão (Relator): O despacho contra o qual o Estado do
Rio Grande do Sul manifesta agravo regimental temo seguinte teor (fl. 63):
Brasília, 14 de setembro de 1993 —
Moreira Alves, Presidente — Binar Gaivão, Relator.
«O Estado do Rio Grande do Sul
recorre extraordinariamente contra o
acórdão do Tribunal de Justiça da mesma unidade federativa que, nos autos do
inventário dos bens deixados por morte
do agravado, determinou o recolhimen-
320
R.TJ. —150
to do imposto de transmissão causa
mores a uma alíquota máxima de 4%,
quando o correto seria de 8%, conforme
determina a legislação estadual. Alega
que foram afrontados os §§ 3° e 5° do
art. 34 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias e o art. 155, § 1°,
inc. IV, da Constituição Federal.
O recorrente sustenta que a Lei Estadual n° 8.821/89, que fixou a alíquota de
8%, superior à de 4% prevista na Resolução n° 99/81, do Senado Federal, foi
recepcionada pelo Sistema Tributário Nacional introduzido pela Constituição Federal vigente, enquanto que o ato senatorial é totalmente incompatível com a
nova distribuição de competência tributária.
A via recursal foi trancadana origem,
aludindo-se o despacho a precedentes,
do mesmo Tribunal, em casos similares,
que concluíram não só pela inconstitucionalidade da Lei n° 8.821/89, como
também que a Resolução do Senado fora
recepcionada pelo texto constitucional,
permanecendo, pois, inalterada a competência para fixação de tdíquota máxima do imposto de transmissão causa
morlis.
A Lei Magna impõe ao Senado Federal a determinação das alíquotas máximas do referido tributo. A legislação
estadual não pode ultrapassar os limites
estabelecidos pela Resolução.
A situação anterior não se modificou
ante o advento da Carta atual, de modo
que a afirmação da decisão recorrida no
sentido de que a Resolução n° 9W81 foi
recepcionada no concemente ao texto
das alíquotas não há de ser contestada
frente aos preceitos constitucionais invocados.
Assim, frente ao art. 38 da Lei n°
8.038/90 e ao § 1° do art. 21 do RISTF,
nego seguimento ao agravo.»
Sustenta o agravante que o despacho
não podia analisar o mérito da causa, cabendo-lhe apenas enfrentar os pressupostos
de admissibilidade do recurso extraordinário, e que estes se encontram preenchidos.
Afirma que os fundamentos da decisão no
sentido de que a Resolução do Senado Federal — que limitou as alíquotas de 4%
(quatro por cento) —foi recepcionada pelo
atual texto constitucional não podiam levar
à conclusão de que o recurso é manifestamente incabível ou improcedente, pois isso
concerne ao mérito da controvérsia. Reedita os argumentos expendidos no agravo de
instrumento, salientando que este Supremo
Tribunal Federal tem determinado a subida
de recurso para melhor exame, devendo
assim proceder em relação a estes autos.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro limar Gaivão (Relator): A Lei n° 8.038/90, em seu artigo 38,
contrariamente ao que entende o agravante,
autoriza o relator, no Supremo Tribunal
Federal, a negar seguimento ao recurso manifestamente incabível ou improcedente.
Recurso extraordinário dessa espécie,
entre outros, é o que vem fundado em alegação, manifestamente improcedente, de
ofensa à Constituição Federal.
Trata-se de hipótese de não-conhecimento do recurso, conforme vetusta orientação do Supremo Tribunal Federal, nada
impedindo, pois, que, diante de sua configuração, o próprio Relator, que a tanto,
antes da Lei n° 8.038/90, já se achava autorizado pelo art. 21, § 1°, do RISTF, negue,
de pronto, seguimento ao apelo, tanto mais
quando se sabe que de sua decisão cabe
recurso da espécie ora apreciada, para o
Colegiado.
Não há falar-se, pois, em usurpação da
competência da Corte pela decisão agravada.
No tocante ao mérito, melhor êxito não
colhe o recorrente.
R.TJ — 150
Com efeito, a Carta de 1988, no que
concerne ao imposto de transmissão de
bens imóveis e de direitos reais sobre imóveis, até então previsto de forma integral
como de competência dos Estados (art. 23,
1, da CF/69), o que fez foi desmembrá-lo,
deixando com os Estados tão-somente a
parte relativa à transmissão causa morde e
por doação (art. 155, 1, a) e atribuindo o
restante aos Municípios (art. 156, 11).
Não houve, portanto, criação de novo
imposto, mas simples desdobramento de
tributo já existente.
Relativamente ao que foi deixado à
competência dos Estados, manteve a nova
Carta, no art. 155, IV, a antiga regra (art.
23, § 2°, segunda parte, da CF/69) de que
cabe ao Senado Federal estabelecer as aliquotas máximas do tributo, já agora, é verdade, independentemente de proposta do
Presidente da República, aspecto irrelevante para o deslinde da controvérsia.
Sendo assim, se de novo imposto não se
trata e já que se estava diante de resolução
do Senado reguladora da matéria, é fora de
dúvida que, em face do princípio da recepção, pelo qual é de ter-se como sobreviventes ao advento da nova Carta, as nomes que
se mostram com ela compatíveis, como
previsto no art. 34, § 5°, do ADCT/88,
especificamente para a matéria tributária, é
fora de dúvida que não restou espaço para
falar-se em omissão da aludida Casa, suscetível de ser sanada pelo legislador estadual ou ensejadora de pretensa competência legislativa, ilimitada, dos Estados, acerca das mencionadas alíquotas, muito menos sob invocação do § 3° do ~acionado
preceito transitório, que não trata de delegação dessa espécie.
Hipótese símile já foi apreciada pela
Segunda Turma (AgRg n° 150.617-3, Relator o eminente Ministro Marco Aurélio,
DJ de 20-8-93), com acórdão assim ementado:
«Imposto causa mos*. Alíquota
— Atuação dos Estados. Tal como
321
previsto na Carta pretérita — § 2° do
artigo 23 — a atual reserva ao Senado
Federal a fixação das alíquotas referentes ao imposto causa morta — inciso
IV do artigo 155. Não há como falar em
transgressão ao artigo 34, §§ 3° e 4°, do
Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias quando o provimento judicial repousa nessas premissas. Impossível é perquirir da lacuna indispensável a
que se tenha como legítima a atuação da
unidade federativa prevista no § 3° do
artigo 34 referido, valendo notar que,
pela regra inserta no § 5° desse artigo, o
afastamento da legislação anterior, para
ensejar a atividade dos Estados, pressupõe incompatibilidade, ou seja, lacuna.»
Havendo o acórdão recorrido decidido
de acordo com essa orientação, não há que
se falar em afronta aos textos constitucionais invocados e, conseqüentemente, em
cabimento do recurso extraordinário.
Meu voto, pois, é no sentido de negar
provimento ao agravo regimental.
EXTRATO DA ATA
Ag 153.625 (AgRg) —RS —Rel.: Min.
limar Gaivão. Agte.: Estado do Rio Grande
do Sul (Advs.: Vera Lucia Zanette e outros). Agdo.: Sucessão de Albertina Cangeri (Advs.: Nelco Sangoi e outro).
Decisão: A Turma negou provimento ao
agravo, nos termos do voto do Relator.
Unânime.
Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Sydney Sanches, Celso de Mello e limar
Gaivão. Ausente, justificadamente, o Sr.
Ministro Sepftiveda Pertence. Subprocurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza.
Brasília, 14 de setembro de 1993 —
Ricardo Dias Duarte, Secretário.
322
RT.J. — 150
AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 153.870 (AgRg) — SP
(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Sydney Banhes
Agravante: Carlos Roberto Micelli — Agravado: Primeiro Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo
Recurso. «Fax». Embargos dedaratúrios opostos a decisão
de Relator de Agravo de Instrumento, no Supremo Tribunal Federal.
Conversão dos embargos em agravo regimental. Não conhecimento
deste, porém, por intempestivo.
O recurso pode ser interposto, no Supremo Tribunal Federal,
mediante «fax», mas a petição original deve ser apresentada à Secretaria
do Tribunal, no prazo legal, sob pena de ser considerado intempestivo.
Precedentes.
Agravo regimental não conhecido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, na
conformidade da ata do julgamento e das
notas taquigráficas, por unanimidade de
votos, em não conhecer do agravo, nos
termos do voto do Relator.
Brasília, 28 de setembro de 1993 —
Moreira Alves, Presidente — Sydney
Sanches, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Sydney Sanches (Relatar): 1. Às fls. 102/103, proferi, como Relator, a seguinte decisão:
«Decisão:
1. A respeitável decisão, impugnada mediante o presente agravo de instrumento, tem o teor seguinte (fl. 91):
«Processo n't 525.158-7/02 — São
Paulo (fls. 249-58):
Nos termos do art. 105, II, b, da
Constituição da República, denegada
a ordem em mandado de segurança
originário, cabível recurso ordinário.
Consoante posicionamento firmado pelo Colendo Supremo Tribunal
Federal, 'A locução constitucional — <quando denegaténa a decisão> — tem sentido amplo, pois não
sé compreende as decisões que, apreciando o meritum causae, indeferem o pedido de mandado de segurança, como também abrange aquelas que, sem julgamento do mérito,
operam a extinção do processo' (Supremo Tribunal Federal — Pleno —
Mandado de Segurança n° 21.112-1
— PR — AgRg, Relator Ministro
Celso de Mello, in DJ de 29-6-90,
pág. 6220).
In casa, indeferida a petição inicial do mandamus e julgado extinto
processo, foi negado provimento
ao agravo regimental interposto e rejeitados os embargos de declaração
apresentados.
Assim, induvidosamente não se
valeu o ora recorrente da via recursal
adequada, razão por que indefiro o
processamento do recurso extraordinário.
São Paulo, 24 de novembro de
1992
Ass.: Paulo Bonito Junior, Vice-Presidente, no impedimento do Presidente»
R.TJ —150
2. Na petição de interposição do agravo (fls. 315), insiste o agravante no processamento do recurso extraordinário,
invocando o direito de ação, os princípios constitucionais do contraditório e
da ampla defesa e alegando o descumprimento do inc. IX do art. 93 da Constituição Federal, porque não fundamentada a decisão agravada.
Decido:
Como demonstrou a respeitável
decisão impugnada, o recurso cabível,
na espécie, era o ordinário, para o Superior Tribunal de Justiça (art. 105, II, b,
da Constituição Federal), e não o extraordinário para o Supremo Tribunal
Federal (art. 102, III, da Constituição
Federal), (v. tb. arts. 26 e seguintes e art.
33 da Lei n° 8.038, de 28-5-90), não
podendo este preceder o exaurimento
das instâncias ordinárias.
Nesse sentido é a orientação do precedente do Plenário desta Corte, referido na decisão ora recorrida.
E nas razões de agravo não conseguiu o agravante demonstrar o desacerto
desta. Nem que lhe haja faltado fundamentação.
3. Isto posto, com base no art. 21,
parágrafo 1°, do RISTF, e no art. 38 da
Lei n° 8.038, de 28-5-90, nego seguimento ao agravo de instrumento. Publique-se.»
2. Inconformado, o agravante, apresentou «embargos declaratórios», mediante
«fax», alegando e pleiteando o seguinte:
«1°) em 12 de agosto de 1993, pela
imprensa oficial foi publicado o r. despacho judicial:
'Decido:
1. Como demonstrou a respeitável
decisão impugnada, o recurso cabível,
na espécie, era o ordinário, para o Superior Tribunal de Justiça (art. 105, II, b,
da Constituição Federal), e não o ex-
323
traordinário para o Supremo Tribunal
Federal (art. 102, III, da Constituição
Federal) (v. tb. arts. 26 e seguintes e art.
33 da Lei n° 8.038, de 28-5-90), não
podendo este preceder o exaurimento
das instâncias ordinárias....
Data magma veda, inicialmente:—
Os embargos de declaração podem caber contra qualquer decisão judicial,
seja qual for a sua espécie, o órgão de
que emane e o grau de jurisdição em que
se profira... (extraído da pág. 215, da
monografia 'O Novo Processo Civil
Brasileiro' da lavra do insigne Ministro
Barbosa Moreira), com todo respeito e
acatamento o nosso pedido para endereçar ao Pretório Excelso em virtude do
digno Presidente enfeixar a figura máxima da Magistratura Nacional, portanto,
existiu simplesmente o excesso de zelo
pela matéria inusitada e não foi tratada
de maneira correta como poderá o Prof.
Cândido R. Dinamarco na pág. 275 da
'A lastmmentalidade do Processo': 'O
juiz moderno compreende que só se lhe
exige imparcialidade no que diz respeito à oferta de iguais oportunidades às
partes e recusa a estabelecer distinções
em razão das próprias pessoas ou reveladoras de preferências personalíssimas.
Não se lhe tolera, porém, a indiferença.
...', explicitar-nos.
2°) Data maxima veda, com todo o
acatamento e respeito, o presente Embargos de Declaração tem a finalidade
precfpua de esclarecer unia obscuridade
ou seja não foi invocado o princípio da
fungibilidade e havendo a substitutibilidade do encaminhamento legal do presente Agravo de Instrumento, para ser
acolhido e julgado no Egrégio Superior
Tribunal de Justiça, Brasília, DF.
3°) Data veda, pela sensibilidade
jurídico-social do insigne Ministro Relator, sem dúvida irá visualizar o nosso
pedido sob a ótica inserida na 'HameneuÚca e Aplicação do Direito' nas págs.
324
R.TJ. — 150
168/9 do inesquecível jurista Carlos
Hutt juritis, pereat
Maximiliano:
mundus': 'Faça-se justiça, ainda que o
mundo pereça'. A interpretação sociológica atende cada vez mais às conseqüências prováveis de um modo de entender
e aplicar determinado texto; quanto possível busca uma conclusão benéfica e
compatível com o bem geral e as idéias
modernas de proteção aos fracos, de solidariedade humana. Faça-se justiça, porém de tal sorte que o mundo prossiga
a rumo dos seus altos destinos... 'Sum.
mum jos, summa injuria': 'supremo
direito, suprema justiça'; 'direito elevado ao máximo, injustiça em grau
máximo resultante'. O excesso de juridicidade é contraproducente; afasta-se
do objetivo superior das leis; desvia os
pretórios dos fins elevados para que
foram instituídos; 'faça-se justiça, porém do modo mais humano possível,
de sorte que o mundo progrida, e jamais pereça. ...'
Data maodma venial, esta é a única
medida jurídica, com devido respeito e
acatamento, que entendemos compatível para não colocar o art. 1°, eaput da
Lei Magna em xeque ou seja, o Estado
Democrático de Direito e sem postergar
os incisos II e III do mesmo comando
constitucional que consagra a cidadania
e a dignidade da pessoa humana e levando em consideração o art. 85 do Código
Civil: 'Nas declarações de vontade se
atenderá mais à sua intenção que ao
sentido literal da linguagem'. Para acolher nosso Embargos de Declaração e,
data venta, utilizando-se do princípio
da fungibilidade se digne remeter o presente Agravo de Instrumento para o Egrégio Superior Tribunal de Justiça para
ser apreciado.
Isto posto, aguardamos com toda a
serenidade e confiança creio no Pretório
Excelso e no digno e honrado Ministro
Relator, por esta Justiça feita por ho-
meus de sólida formação moral, que se
nutrem de um sentimento comum de
nacionalidade, de amor a seu povo e ao
Direito, que sabem encontrar, mesmo
além do texto frio da lei, os caminhos da
Paz Social para ser modificado o r. despacho judicial como orienta a jurisprudência pacífica (RTJ 86/359, RE
88.958; RTJ 43/323, RE 56.300; RTJ
53/332, RE 67.953; RTJ 8W548 e RTJ
94/1167, RE 87.092) para assegurar
uma diretriz segura e legal para o acolhimento do presente Embargos de Declaração e haver a sua modificação e
adequação ao técnico-jurídico e ao justo.
Nestes termos, p. deferimento.
'Ilyrk deison'
De Araraquara p/Brasflia, 17 de agosto de 1993 — Carlos Roberto MieeR1,
OAB/SP n° 39.102.»
Às fls. 108/109, veio para os autos o
original da petição de interposição dos
«embargos declaratórios.»
À fl. 110, despachei, encaminhando
os autos a esta l• Turma, para exame dos
«embargos declaratórios», como agravo regimental (art. 317 do RISTF) e determinando a retificação da autuação, quanto a isso.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Sydney Sanches (Relator): Embargos declaratórios não são oponíveis a decisão singular de Relator, no
Supremo Tribunal Federal, em face do disposto no art. 337 do seu Regimento Interno,
segundo o qual são eles cabíveis contra
acórdão.
E não pode o recurso ser conhecido como
agravo regimental, que seria o cabível na
espécie, porque, embora interposto mediante
«fax», no prazo legal, a petição original só
foi apresentada ao protocolo da Secretaria
do Tribunal fora desse prazo. É que a decisão recosida foi publicada no dia 12-8-93,
R.TJ —150
quinta-feira, dia útil, tendo-se escoado o
prazo de cinco dias, a 17-8. O original do
recurso s6 se protocolou no dia 18-8. Intempestivamene, portanto.
A jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal tem entendido que a petição original deve ser apresentada ao protocolo dentro do prazo legal (MI 372-6 (AgRg), Rel.
Mia. Celso de Mello, DJ de 21-2-92; MS
21.230 (AgRg), Rel. Min. Paulo Brossard, DJ de 24-10-91; MS 21A03-1, Rel.
Mia Moreira Alves, DJ de 21-10-91; Ag
143.783 (AgRg), Rel. Mui. Celso de Mello, DJ de 4-9-92; Ag. 140.697-6 (AgRg),
hfin. Sepúlveda Pertence, DJ de 24492; Ag. 136.727, Rel. /Tm. Celso de
Mello, Dl de 14-9-93, pág. 18669).
Não conheço, pois, do recurso.
325
EXTRATO DA ATA
Ag 153.870 (AgRg)
(AgRg)—SP—Rel.: Min.
Sydney Sanches. Agte.: Carlos Roberto
Micelli (Adv.: O mesmo). Agdo.: Primeiro Tribunal de Alçada Civil do Estado de
São Paulo.
Decisão: A Turma não conheceu do
agravo, nos termos do voto do Relator.
Unânime.
Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Sydney S
Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e limar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Artur Castilho
Pereira Neto.
Brasília, 28 de setembro de 1993 —
Ricardo Dias Duarte, Sevtário.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO W158.315 — PB
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro limar Gaivão
Recorrente Antónia Lúcia Navarro Braga — Recorridos: Partido Social
Trabalhista — Procuradoria Regional Eleitoral
Eleitoral Impugnação a registro de candidatura a Prefeito de
capital Inelegibilidade. Candidata casada civilmente com ex-prefsito, que
renunciou ao mandato executivo para postular outro cargo majoritário.
Prejudicialidade.
Tendo o recurso extraordinário ingressado no Supremo Tribunal Federal após a realização das eleições de 3 de outubro de 1992,
deve-se considerá-lo prejudicado, em razão de ter perdido objeto, visto
que se limita a pedido de registro de candidatura ao referido pleito.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, por seu Tribunal Pleno, na
~anuidade da ata do julgamento e das
noas taquilliftelcas , por unanimidade de
votos, em julgar prejudicado o recurso.
Brasília, 4 de agosto de 1993 — Octavio Gallotti, Presidente — limar Gaivão, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro limar Gaivão (Relatar): O Partido Social Trabalhista — PST
impugnou o registro da candidatura a Pre-
326
R.TJ. — 150
feito da cidade de João Pessoa da Deputada
Federal Antônio Lúcia Navarro Braga pelo
Partido Democrático Trabalhista — PDT.
Argumentou no sentido da inelegibilidade,
tendo em vista que a candidata é casada
civilmente com o ex-Prefeito eleito no ano
de 1988, para mandato de quatro anos, embom não o tenha concluído, por ter renunciado em abril de 1990 para se candidatar
ao Governo do Estado da Paraíba, não logrando êxito no pleito.
A impugnação foi julgada procedente
pelo MM. Juiz Eleitoral, vindo a ser indeferida pelo Tribunal Regional Eleitoral,
que proclamou a elegibilidade da candidata, considerando que seu marido havia renunciado na primeira metade do mandato,
inocorrendo a vedação do art. 14, § 7 3, da
Constituição Federal.
Em grau de recurso especial, interposto
pelo Procurador Regional Eleitoral e pelo
impugnante, o Tribunal Superior Eleitoral
reformou a decisão regional, em acórdão de
que foi relator o Ministro José Cândido.
Ficou expressa no acórdão a inelegibilidade da recorrida para o cargo de Prefeito, no
território da jurisdição do titular, seu cônjuge, mesmo tendo ocorrido afastamento
definitivo do cargo por tempo superior ao
referido no art. l4, § 7°, da Constituição.
No recurso extraordinário interposto
com fundamento no art. 102, BI, a, da
Constituição Federal alega-se que a exegese proclamada pelo acórdão recorrido não
pode prevalecer, pois consagraria interpretação ofensiva aos §§ 5°, 6° e z do art. 14
da Carta Federal.
recurso foi admitido pelo seguinte
despacho (fi. 305):
«Antônio Lúcia Navarro Braga, candidata a Prefeito do município de João
Pessoa, PB, pela legenda do Partido Democrático Trabalhista —PDT, nas eleições de 3 de outubro passado, manifesta
recurso extraordinário da decisão do
Tribunal Superior Eleitoral consubstanciado no Acórdão n° 12.552, de 17 de
r
setembro de 1992, que a declarou inelegível para o cargo à vista do disposto no
§ 7° do artigo 14, da Constituição Federal, uma vez ser a candidata cônjuge
do então Titular do cargo.
Nas razões do extraordinário, alegase afronta ao disposto nos §§ 5°, 6° e 7°
do mesmo artigo 14, em razão da interpretação sistemática e teleológica emprestada pelo Tribunal aos referidos
dispositivos constitucionais.
O Tribunal, ao declarar a inelegibilidade, considerou sua orientação já consagrada no sentido de que a norma ínsita
no § 7° do artigo 14 da Carta de 1988
comporta interpretação teleológica
compatível com o princípio republicano
da não continuidade dos ocupantes de
cargo de Chefia do Executivo, evitando,
destarte, a colocação da máquina administrativa a serviço de candidaturas, a
fim de propiciar sucessões.
Conquanto o recurso possa ser considerado prejudicado, face a realização
das eleições municipais, a relevância da
quaestio iuris é incontestável e merece
ser examinada pelo egrégio Supremo
Tribunal Federal, razão pela qual admito o seu processamento.»
A Procuradoria-Geral da República opinou pelo não-conhecimento do recurso nestes ternos (fi. 315):
«Observo, preliminarmente, que a
petição de recurso e as respectivas razões, incluirias as assinaturas dos
mandatários da recorrente, foram
juntadas aos autos por fotocópia, o que
impede o conhecimento do recurso.
Além disso, é certo que a pretensão
da recorrente está prejudicada, pela superveniência da eleição, de que não participou por força do acórdão recorrido
—como, aliás, já observou o Presidente
do Tribunal Superior Eleitoral, no despacho de admissão.
R.TJ — 150
De todo modo, parece-me acertada a
interpretação dada por tal acórdão aos
dispositivos constitucionais apontados
conto infringidos: a Carta quis evitar a
continuidade (para não dizer perpetua
ção) de indivíduos (art. 14, § 5°) ou
grupos familiares (art. 14, § 7°) em cargos de chefia do Poder Executivo.
A aplicação do prazo do § 6°, pretendida pela recorrente, é inaceitável, pois
tal dispositivo trata de matéria diversa
— a concorrência dos titulares desses
cargos a outros cargos eletivos — ao
passo que a vedação do § r, segundo o
Tribunal Superior Eleitoral, limita-se ao
mesmo cargo.»
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Betar Gaivão (Relator): Há a examinar a questão preliminar da
prejudicialidade do extraordinário, apontada no despacho presidencial de admissibilidade e no parecer da Procuradoria-Geral
da República, em face de o recurso ter sido
apreciado após a realização das eleições
municipais de 3 de outubro de 1992.
Segundo precedentes específicos desta
Corte (RE 118.068; RE 118.268; RE
118.272; RE 118.308), tendo aqui che-
327
gado o recurso extraordinário, em 23 de
outubro de 1992, após a realização das
eleições, deve-se considerá-lo prejudicado,
em razão de ter perdido objeto, visto que se
limita a pedido de registro de candidatura
ao referido pleito.
Nesse sentido o meu voto.
EXTRATO DA ATA
RE 158.315 — PB — Rel.: Min. limar
Gaivão. Recta.: Antonia Lúcia Navarro
Braga. (Advs.: Antonio Vital do Rego e
outros). Recdo.: Partido Social Trabalhista.
(Advs.: Luiz Rafael Mayer e outros). Renda: Procuradoria Regional Eleitoral.
Decisão: Por votação unanime, o Tribunal julgou prejudicado o recurso. Votou o
Presidente.
Presidência do Sr. Ministro Otavio Gallotti. Presentes à Sessão os Sn. Ministros
Moreira Alves, Néri da Silveira, Sydney
Sambes, Sepedveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Venoso, Marco Aurélio e limar
Gaivão. Ausentes, justificadamente, os Srs.
Ministros Paulo Brossazd e Francisco Rezek. Vice-Procurador-Geral da República,
Dr. Moacir Antonio Machado da Silva.
Brasília, 4 de agosto de 1993 — Luiz
Tomimatsu, Secretário.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO rir 160.322 (AgRg) — SP
(Primdra Turma)
Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello
Agravante: Instituto Nacional do Seguro Social — INSS — Agravado:
Dionisio do Disterro Marques
Rasam extraordinário. Recesso forense ido comprovado. Embargos de declaração extanportbteas. Ineficácia suspensiva do prazo recurso!. Intempesilvidade do apelo extrema Agravo regimental intprovido.
O prazo legal referente à interposição do recurso extraordinário não se suspende quando os embargos de declaração, opostos ao
acórdão do Tribunal inferior, são deduzidos extemporaneamente.
—150
328
O Supremo Tribunal Federal, não está vinculado aos pronundamentos da instância a quo, pertinentes ao juízo de admissibilidade
dos recursos. A drcunsanda de o Tribunal local deixar de reconhecer
a extemporaneidade dos embargos de declaração não subtrai à Suprema
Corte o poder de reexaminar esse pressuposto mamai, que constitui
elemento necessário à verificação da tempestividade do próprio apelo
extremo.
Isto posto, nego seguimento ao recurso extraordinário dada a sua evidente
intempestividade (Lei n° 8.038/90, art.
38).»
Inconformado, o INSS intapfie agravo
regimental, sustentando a tempestividade
dos embargos declaratórios e a conseqüente suspensão do prazo do recurso extraordinário, por se ter verificado, no período,
recesso forense.
De outro lado, argumenta que a suspensividade dos embargos de declaração decorre, de todo modo, da circunstância de o
Tribunal a quo tê-los julgado e acolhido.
O Sr. Ministro Celso de Mello: Neguei
É o relatório.
trânsito ao presente recurso extraordinário
VOTO
nos seguintes termos:
O Sr. Ministro Celso de Mello (Rela«Trata-se de recurso extraordinário,
admitido na origem, interposto contra tor): Nego provimento ao agravo.
acórdão do Segundo Tribunal de Alçada
Não obstante o agravante sustente ter
Civil de são Paulo, com base no art. 102, havido recesso forense no período comIQ, a, da Constituição Federal.
preendido entre 16-4-92 (quinta-feira sanO recurso é intempestivo. Publicado ta) e 21-4-92 (Tiradentes), nada há nos
o acórdão recorrido em 6-4-92, segun- autos que comprove a suspensão do curso
da-feira, foram opostos, extempora- dos prazos nesses dias.
Tampouco o agravante fez juntar certineamente, embargos de declaração
dão expedida pelo Tribunal a quo, comproem 22-4-92, quarta-feira.
vando a ocorrência do recesso.
A intempestividade dos embargos
Não podendo presumir a alegada susretira-lhes o efeito suspensivo do prazo
correspondente ao recurso principal — pensão de prazos no âmbito do Tribunal a
o recurso extraordinário, no caso. Com quo, tenho que, publicado o acórdão em
isso, o prazo de trinta dias fixado para a 6-4-92, segunda-feira, o prazo de dez dias
interposição do recurso extraordinário viu-se esgotar em 16-4-92, quinta-feira santa. Ainda que se considere essa data como
viu-se esgotar em 6-5-92, terça-feira.
feriado forense, os embargos hão de ser
O recurso extraordinário, contudo, tidos como intempestivos. O primeiro dia
só foi interposto em 27-5-92, quarta-fei- útil após a Semana Santa foi 20-4-92, sera, após a publicação do acórdão lavrado gunda-feira; o recurso, porém, foi protoconos embargos em 15-5-92, sexta-feira. lizado apenas em 22-4-92, quarta-feira.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Primeira Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos,
em negar provimento ao agravo regimental.
Brasília, 25 de maio de 1993 —Moreira Alves, Presidente — Celso de Mello,
Relator.
RELATÓRIO
RTJ —150
Por último, não procede o argumento do
INSS no sentido de que o julgamento dos
embargos pelo Tribunal de origem ilide a
sua eventual intempestividade.
O Supremo Tribunal Federal não está
vinculado, de modo algum, aos pronunciamentos da instância a quo, pertinentes ao
juízo de admissibilidade dos recursos. A
circunstância de o Tribunal local deixar de
constatar a extemporaneidade dos embargos de declaração não subtrai à Suprema
Corte o poder de reexaminar esse pressuposto recursal, que constitui elemento necessário à verificação da tempestividade do
próprio apelo extremo.
A intempestividade dos embargos de
declaração—que os argumentos de agravo
não lograram infirmar — retira-lhes, consoante registra a própria decisão agravada,
o efeito suspensivo do prazo referente ao
recurso extraordinário.
Impõe-se acentuar que essa ineficácia
suspensiva dos embargos de declaração extemporâneos tem sido reconhecida e proclamada pela jurisprudência do Supremo
Tribunal Federal, cujos pronunciamentos
advertem que os prazos recursais não se
suspendem «com os embargos declaratórios interpostos a destempo» (RTJ
121/1252, Rel. Mm. Carlos Madeira).
329
Publicado o acórdão recorrido em
6-4-92, o prazo para a interposição do apelo
extremo pelo INSS, que é de 30 dias, esgotou-se em 6-5-92, sendo que o recurso só
veio a ser protocolizado em 27-5-92.
Intempestivo o recurso extraordinário,
mantenho a decisão que lhe negou seguimento.
É o meu voto.
EXTRATO DA ATA
RE 160.322 (AgRg) — SP —Rel.: Min.
Celso de Mello. Agte.: Instituto Nacional
do Seguro Social — INSS (Adva.: Maria
Teresa Ferreira Cahali). Agdo.: Dionisio
do Disterro Marques (Advs.: Luiz Gonzaga
Curi Kachan e outros).
Decisão: A Turma negou provimento ao
agravo regimental, nos termos do voto do
Relator. Unânime.
Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e limar Gaivão. Ausente, justificadamente, o
Sr. Ministro Sydney Sanches. Subprocurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza.
Brasília, 25 de maio de 1993, Ricardo
Dias Duarte, Secretário.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO N' 161390 — AL
(Medida Cautelar)
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence
Requerente: Procurador-Geral de Justiça do Estado de Alagoas —Requerido:
Câmara Municipal de Maceió
Controle de constitucionalidade: lei municipal em face de
preceito da Constituição do Estado, ainda que se trate de reprodução
compulsória de norma da Constituição Federal: competência do Tribunal de Justiça, afirmada em precedente do STF (Red. 383, M. Alves), que
aconselha no caso o deferimento de medida cautelar em favor do RE que
sustenta a mesma tese.
330
R.T.J. — 150
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos,
em referendar decisão do Ministro Sepúlveda Pertence, que deferira o pedido de
medida liminar.
Brasília, 1° de abril de 1993 — Octavio
Gallotti, Presidente —Sepúlveda Pertence, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence:
Sr. Presidente, o Procurador-Geral de Justiça do Estado de Magoas propôs ao Tribunal de Justiça daquele Estado ação direta de
insconstitucionalidade de lei do município
de Maceió relativa a cálculo de proventos
do funcionalismo municipal.
Apontou como parâmetro da inconstitucionalidade argüida a Constituição do Estado.
No núcleo da fundamentação da ação
direta, aduziu, porém, o Procurador-Geral de Justiça (fl. 6):
«No art. 40, incisos I, II, III, a Carta
Federal instituiu o modelo de aposentadoria a ser adotado em nosso sistema
jurídico:
Art. 40.0 servidor será aposentado:
I — por invalidez permanente, sendo os proventos integrais quando decorrentes de acidentes em serviço, moléstia profissional ou moléstia grave, contagiável ou incurável,
especificadas em lei;
II — compulsoriamente, aos setenta anos de idade, com proventos
proporcionais ao tempo de serviço;
III — voluntariamente:
aos trinta e cinco anos de serviço, se homem, e aos trinta, se mulher,
com proventos integrais;
aos trinta anos de efetivo exercício em funções de magistério, se
professor, e vinte e cinco anos, se
professora, com proventos integrais;
aos trinta anos de serviço, se
homem, e aos vinte e cinco, se mulher, com proventos proporcionais a
esse tempo;
aos sessenta e cinco anos de
idade, se homem, e aos sessenta, se
mulher, com proventos proporcionais
ao tempo de serviço.
Com relação ao valor dos proventos,
o instituto de aposentadoria deve-se harmonizar com outros princípios constitucionais, dentre eles o da isonomia e o da
paridade vencimental, previstos respectivamente nos arts. 5°, caput, e 39, parágrafo primeiro.
A isonomia pressupõe iguais oportunidade de ingresso e ascensão funcional
no serviço público. Faz parte de sua
essência o tratamento igualitário do
ponto de vista jurídico aos especificamente iguais nos termos da lei. Essa
igualdade assenta-se sobre bases sólidas
e transparentes. Valoriza as qualidades
técnicas e dedicação demonstradas no
dia-a-dia.
Já a paridade vencimental, regulamentada por lei complementar, permite
que a todos os servidores seja dada a
isonomia de vencimentos nos cargos e
atribuições assemelhadas ou iguais no
âmbito dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.
Quando o servidor entra em gozo da
aposentadoria, deve perceber seus proventos dentro dos padrões acima esposados. Qualquer discriminação legal ou
tratamento diferenciado à situação fimcional, tolhendo iguais oportunidades
para os servidores, é inconstitucional.),
Ft.T.J —150
F., só então, argumenta (fl. 7):
«Como não poderia deixar de ser, a
Constituição do Estado de Alagoas, em
seu art. 57,1, 11, e III, adotou idêntica
sistemática de aposentadoria.
Além do mais, estabeleceu, em seu
art. 47, inciso VIL a isonomia vencimental nos mesmos moldes da Constituição Brasileira.
O Tribunal de Justiça deferiu liminar
(11.28); no entanto, no julgamento definitivo, o acórdão acolheu, por unanimidade, a
preliminar de incompetência do Tribunal
de Justiça.
Leio a sua fundamentação (11,48):
«A hipótese em exame, trata-se de
Ação Direta de Inconstitucionalidade
Genérica onde o autor — o ProcuradorGeral de Justiça do Estado de Alagoas,
pretende a ineficácia da Emenda n° 2/91
— à Lei Orgânica do Município de Maceió, promulgada em 23 de agosto de
1991, que acrescentou ao art. 86 da aludida Lei Orgânica, os parágrafos 6' e 7°,
constante do Diário Oficial de 24 de
agosto de 1991, alegando afrontar as
Constituições Federal e Estadual.
Em mesa para julgamento, argüiu-se
preliminar de incompetência deste Tribunal de Justiça para o processamento e
julgamento da presente ação, face suposta agressão e afronta da Constituição
Federal, pelo ato impugnado.
Os artigos apontados, na Constituição Estadual e na Federal, instituem como
devem ser adotados os princípios norteadores do direito relativo à aposentadoria do servidor público.
Portanto, não se há que falar em afronta ao texto constitucional estadual, só e
só, uma vez que existindo igual determinação na Constituição Federal, é esta
que está sendo afrontada pelo ato impugnado, pois esta sendo superior, deve
ser observada.
331
Finalmente, a competência do Coleado Tribunal de Justiça para conhecer
e julgar Ação Direta de Inconstitucionalidade, na forma do art. 133, inciso IX,
letra o, da Constituição Estadual, só se
dá quando o texto impugando lesa a
própria Constituição Estadual, o que não
ocorre ia casa, uma vez que se existe
afronta à Carta Magna do País, esta deve
ser observada, tomando competente para
julgamento o Coleado Supremo Tribunal Federal, por força do disposto no art.
102, inciso I, letra a, da Constituição
Federal.»
Donde o recurso extraordinário que, além
de repisar argumentos de mérito, ataca o
fundamento da preliminar acolhida pelo
Tribunal de Justiça, verbis (fl. 65):
«Depois, os Tribunais de Justiça são
competentes para declarar a inconstitucionalidade de leis municipais, podendo, havendo inconformisrno, ser a matéria novamente apreciada pelo STF, a
quem cabe a última palavra sobre o caso.
Não observamos, assim, quaisquer conflitos que possam trazer prejuízos à uniformização de julgamentos sobre matérias constitucionais idênticas.
Por fim, caso o entendimento constante do Acórdão contestado prevaleça,
o STF ficará congestionado de ações,
uma vez que o sistema constitucional
brasileiro, caracterizado pela prodigalidade de normas, fatalmente lhe transferirá a competência para declarações de
inconstitucionalidade de todas as leis
municipais do Brasil, pois, a rigor, ao
invés de contrariarem as Constituições
Estaduais, estaria a grosso modo colidindo com a Carta Maior. Isso seria um
absurdo, porque os Tribunais Estaduais,
na prática, se julgariam incompetentes
para o julgamento de qualquer ação de
inconstitucionalidade.»
E, ao final, pede liminar, neste recurso
extraordinário, aduzindo (11.66):
332
R.TJ. — 150
«A relevância dos fundamentos emerge da exposição antecedente, aqui evocada para evitar cansativa repetição. A
lide apresentada à jurisdição desse Eg.
Supremo Tribunal Federal sustenta direito plausível, mesmo em se tratando
de recurso extraordinário.
O receio da ineficácia do provimento
final sobressai da realidade exposta, pois
diversos pedidos de refomulação de cálculos de proventos com base na Lei
Orgânica já foram deferidos peia Procuradoria-Geral do Município, o que está
causando evidente dano ao erário.
Leve-se em consideração a extrordinária probabilidade de êxito na pretensão do Ministério Público e a quase impossível devolução ao Município dos
valores pagos indevidadmente.
Inexoravelmente estão unidos o fumas boni Mis e o periculum in mora.
Admitido o recurso, que me foi distribuído, deferi a liminar à fl. 78 verso, verbis:
«Ad referendum, entendendo presentes os seus pressupostos, defiro a
medida cautelar para restabelecer, até o
julgamento do presente recurso, a liminar deferida pelo Tribunal a quo» (fi.
28).
Para o referendum, trago os autos à
apreciação do Plenário.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence
(Relator): Como o Tribunal verificou do
relatório, a discussão que se estabeleceu
neste processo perante o Tribunal de Justiça de Alagoas repisa, com menos desenvolvimento, a longa polêmica em que nos envolvemos, particularmente no julgamento
da Reclamação n° 383, relativa ao momentoso caso do 1PTU do Município de São
Paulo.
Malgrado vencido, ou porque vencido,
eu, que sustentara tese similar à do acórdão
recorrido, neste caso, tenho de ceda à evidência de que o voto da maioria do Tribunal
empresta plausibilidade evidente ao recursos extraordinário e, conseqüentemente, grande probabilidade de que a decisão dele venha a resultar na devolução do caso ao
julgamento do Tribunal de Justiça de Alagoas.
Ora, se esse, o Tribunal de Magoas,
órgão provavelmente competente, julgou
reunidos os pressupostos da suspensão cantelar, a mim se me afigurou conveniente o
deferimento da liminar para evitar que os
riscos — que, segundo o Tribunal, eliminar
visou a evitar —, se consumem e se tornem
irremediáveis.
Por isso, voto pelo referendum.
EXTRATO DA ATA
RE 161.390 (Medida Cautelar) — AL
—Rel.: Min. Sepúlveda Pertence. Reqte.:
Procurador-Geral de Justiça do Estdo de
Alagoas. Reqda.: Câmara Municipal de Maceió (Mv.: Wellington Calheiros Mendonça)•
Decisão: Por votação unânime, o Tribunal referendou decisão do Ministro Sepfdveda Pertence, que deferira o pedido de
medida liminar. Votou o Presidente. Procurador-Geral da República, Dr. Moacir Antonio Machado da Silva, na ausência ocasional do Dr. Aristides Junqueira AlvarengaPresidência do Sr. Ministro Octavio
lotti. Presentes à Sessão os Srs. Ministros
Moreira Alves, Néri da Silveira, Paulo Brossant, Sepúlveda Pertence, Carlos Venoso,
Marco Aurélio e limar Gaivão. Ausentes,
justificaria:n=1e, os Srs. Ministros Sydney
Sanches, Presidente, Celso de Mello e Francisco Rezek. Procurador-Geral da República, Dr. Aristides Junqueira Alvarenga.
Brasília, 1° de abril de 1993 — Luiz
Tondmatsu, Secretário.
R.T..1 — 150
333
RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 162.139 (AgRg) — SI'
(Segunda 'Turma)
Relator O Sr. Ministro Paulo Brosaard
Agravante: Instituto Nacional do Seguro Social —INSS —Agravado: Santo
Augusto Sávio
Previdência social. Benefício previdendário. Vinculação
conslituakmaL Auto-aplicabilidade.
O preceito inserto no art. 201, §§ 5° e 6°, da Constituição
Federal é auto-aplicável, porque se qualifica como estrutura jurídica
dotada de suficiente densidade normativa.
O disposto no § 5° do art. 195 da Constituição Fedaul não
constitui óbice à sua incidência, vez que é dirigido ao legislador ordinário, tão-somente no que vincula a criação, majoração ou extensão de
beneficio ou serviço da seguridade social à correspondente fonte de
custeio.
Precedentes.
Agravo Regimental a que se nega provimento.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros componentes da
Segunda Turma do Supremo Tribunal Fedaal, por tmanimidade de votos e na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, negar provimento ao agravo
regimental.
Brasília, 22 de junho de 1993 — Néri
da Silveira, Presidente — Paulo Broaurd, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Paulo Brossard: Cuida-se de agravo regimental interposto contra decisão denegatória que proferi nos autos do extraordinário, verbis:
«Trata-se de recurso extraordinário
no qual a recorrente sustenta violação
aos acta. 201, e seus parágrafos, e 195, §
5°, da Constituição Federal, e ao art. 59
do ADCT, ao argumento de que a majoração de beneficio previdenciário dependeria da criação da respectiva fonte
de custeio, e, assim, a norma constitu-
cional inserta no art. 201, §§ 5° e 6°, não
tem aplicação imediata.
A questão já foi dirimida pela 2° Turma desta Corte no sentido de que as
regras atidas nos §§ 5° e 6° do artigo
201 da Constituição Federal têm aplicação imediata. O disposto no § 5° do
artigo 195 não as condiciona, já que
dirigido ao legislador ordinário, no que
vincula a criação, majoração ou extensão de beneficio ou serviço da seguridade social à correspondente fonte de custeio total.
Precedentes: Ag(AgRg) 148.401-3,
148.309-2, 148.407-2, 148.342-4,
148.455-2, Relatar Ministro Marco Aurélio, acórdão publicado no DJ de 26
de março de 1993; Ag(AgRg) (Mel)
148.641-5, 148.643-1, 148.658-0, Relata Ministro Carlos Velloso, julgado
em 11 de maio de 1993; Ag(AgRg)
152.411-2, 152.407-4, 152.471-6,
152.394-9, 162.212-2, 152.388-4, Relata Ministro Nérl da Silveira, julgado
em 14 de maio de 1993.
334
R.TJ. — 150
Ante o exposto, com base no art. 21,
§ 1°, do RISTF, nego seguimento ao
recurso.»
No agravo regimental interposto, sustenta a recorrente que o entendimento externado não pode prevalecer, posto que a
norma constitucional inserta no art. 195, §
5° somente pode ser interpretada se conjugada com a do art. 59 do ADCT. Portanto,
somente com o advento da Lei n° 8.213/91,
que as regulamentou, esses dispositivos vieram a ter eficácia plena. E isto porque, para
a fruição do direito garantido pelo preceito
constitucional, o legislador constituinte fez
depender da vontade integrativa do legislador ordinário.
Acresce, em apoio a sua tese, que a
imperatividade do comando contido no §
5°, tanto do artigo 195, quanto do art. 201,
da Constituição Federal, cria um liame de
dependência da lei regulamentadora, de
sorte a inexistir qualquer razão jurídica
para se conferir auto-aplicabilidade a um
deles.
Após transcrever jurisprudências dos
Tribunais Regionais Federais, traz à colação o despacho proferido nos autos do
Mandado de Injunção n° 215-1/RS, Relator Ministro Celso de Mello, que assevera
ser diametralmente oposto às decisões exaradas.
Requer, a final, seja reconsiderada a decisão proferida.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Paulo Brossard (Relator): A questão acerca da auto-aplicabilidade do art. 201, §§ 5° e 6°, da Constituição
Federal, já foi dirimida por esta 'ruma,
oportunidade em que se firmou o entendimento no sentido de sua eficácia plena,
visto que esse preceito constitucional qualifica-se como estrutura jurídica dotada de
suficiente densidade normativa, a tomar
prescindível qualquer mediação legislativa concretizadora do comando nele positi-
vado. Quando a Constituição, em seu § 5°
do art. 201, diz que «nenhum beneficio que
substitua o salário de contribuição ou o
rendimento de trabalho do segurado terá
valor mensal inferior ao salário mínimo»
estabeleceu um estalão abaixo do qual fica
vedado descer. Em caso algum. De modo
que o legislador, querendo ou não, está
agrilhoado a esse critério certo, definido,
inquestionável, conhecido, com força própria para imperar e obstar, sem o auxílio de
lei, que nesta parte é inteiramente desnecessária, porque se sabe que nenhum beneficio, nenhum, que substitua o salário de
contribuição ou o rendimento de trabalho,
nenhum, será inferior a salário mínimo.
Portanto, não se concebe a pretensão recursal que busca condicionar a aplicabilidade
do art. 201, §§ 5° e 6°, da Constituição, quer
à edição de lei, quer à implantação progressiva dos pl
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supremo tribunal federal revista trimestral jurisprudência