SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL REVISTA TRIMESTRAL DE JURISPRUDÊNCIA Volume 150 * (Páginas 1 a 340) Outubro de 1994 340.6 B823 Brasil. Supremo Tribunal Federal. Revista Trimestral de Jurisprudência. Brasília. S.T.F., 1957 340p. 1. Jurisprudência — Periódico. 2. Direito — Jurisprudência. I. Título. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL Ministro Luiz OCTAVIO Pires e Albuquerque GALLOTTI (20-11-84), Presidente Ministro PAULO BROSSARD de Souza Pinto (5-4-89), Vice-Presidente Ministro José Carlos MOREIRA ALVES (20-6-75) Ministro José NÉRI DA SILVEIRA (P-9-81) Ministro SYDNEY SANCHES (31-8-84) Ministro José Paulo SEPÚLVEDA PERTENCE (17-5-89) Ministro José CELSO DE MELLO Filho (17-8-89) Ministro CARLOS Mário da Silva VELLOSO (13-6-90) Ministro MARCO AURÉLIO Mendes de Farias Mello (13-6-90) Ministro ILMAR Nascimento GALVÃO (26-6-91) Ministro José FRANCISCO REZEK (21-5-92) COMISSÃO DE REGIMENTO Ministro MOREIRA ALVES Ministro CARLOS VELLOSO Ministro FRANCISCO REZEK Ministro ILMAR GALVÃO, Suplente COMISSÃO DE JURISPRUDÊNCIA Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE Ministro CELSO DE MELLO Ministro MARCO AURÉLIO COMISSÃO DE DOCUMENTAÇÃO Ministro NÉRI DA SILVEIRA Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE Ministro ILMAR GALVÃO COMISSÃO DE COORDENAÇÃO Ministro SYDNEY SANCHES Ministro PAULO BROSSARD Ministro CARLOS VFJ T OSO PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA Doutor ARISTIDES JUNQUEIRA Alvarenga COMPOSIÇÃO DAS TURMAS Primeira Turma Ministro José Carlos MOREIRA ALVES, Presidente Ministro SYDNEY SANCHES Ministro José Paulo SEPULVEDA PERTENCE Ministro José CELSO DE MELLO Filho Ministro ILMAR Nascimento GALVÃO Segunda Turma Ministro José NÉRI DA SILVEIRA, Presidente Ministro PAULO BROSSARD de Souza Pinto Ministro CARLOS Mário da Silva VFI d OSO Ministro MARCO AURÉLIO Mendes de Farias Mello Ministro José FRANCISCO REZEK SUMÁRIO . Pág. ACÓRDÃOS ÍNDICE ALFABÉTICO ÍNDICE NUMÉRICO 1 I XXI ACÓRDÃOS AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N° 175 — PR (Tribunal Pleno) (Med. Caut. na RTJ 132/1026) Relator: O Sr. Ministro Octavio Gallotti Requerente: Governador do Estado do Paraná — Requerida: Assembléia Legislativa do Estado do Paraná. Funcionalismo. Licença especial e direito a creche. Inconstitudonalidade dos itens XVIII e XXI do art. 34 da Constituição do Paraná, por tratarem de matéria sujdta à iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo (art. 61, 1°, c e d, da Carta Federal). Correção monetária de vencimentos em atraso r do art. 27 da Carta paranaense), não incompatível com a Constituição Federal. Banco Regional do Desenvolvimento do Extremo Sul. Natureza autárquica não caracterizada, não podendo também o Estado dispor, isoladamente, sobre regime dos servidores da empresa (art. 46 do ADCT do Paraná), sem o concurso das duas outras unidades da Federação, dela participantes (art. 25 da Constituição Federal). Inconslitudonalidade do art. 55 do ADCT do Paraná, por dilatar a exceção de dispensa de concurso para o cargo de Defensor público, prevista no art. 22 das disposições transitórias federais, infringindo os artigos 37, II, e 134, parágrafo único, da Constituição da República. Compatibilidade, com o art. 132 da Carta Federal e o art. 69 do respectivo ADCT, da manutenção, pelo art. 56 da Constituição paranaense, de carreiras especiais, voltadas ao assessoramento jurídico, sob a coordenação da Procuradoria-Geral do Estado. Ação direta julgada, em parte, procedente. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes au- tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- lama' Federal, em Sessão Plenária, na con- fomlidade da Ata de julgamento e das notas taquigráficas , à unanimidade de votos, julgar improcedente a ação, para declarar a constitucionalidade do § 7° do art. 27 da Constituição do Estado do Paraná. Tare- 4 R.TJ. — 150 bém por igual votação, julgar procedente a ação, para declarar a inconstitucionalidade dos arts. 46 e 55 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. E, por maioria de votos, julgar procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade do inciso XVIII e suas letras a e b, e do inciso XXI, ambos do art. 34 da mesma Carta e julgar improcedente a ação, para declarar a constitucionalidade do art. 56 e seus §§ 1°, 2° e 3° do ADCT da Constituição do Estado do Paraná, vencido, em parte, o Ministro Marco Aurélio, que declarava a inconstitucionalidade, apenas, do § 3°. Brasília, 3 de junho de 1993 — Octavio Gallotti, Presidente e Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Octavio Gallotti: Perante os artigos 25, 61, 169, parágrafo único e 40, III, b, da Carta Federal, o Governador do Paraná argúi a inconstitucionalidade do inciso XVIII, e suas alíneas a e b, da Constituição daquele Estado, de 5 de outubro de 1989, assim redigidos: «Art. 34. São direitos dos servidores públicos, entre outros: XVIII — licença especial de até seis meses, por decênio de efetivo exercício, com vencimentos integrais, admitida a conversão em cinqüenta por cento em espécie: no caso de cargo efetivo concederse-á, a cada qüinqüênio de exercício, ao servidor que arequerer, licença especial de três meses, com todos os direitos e vantagens inerentes ao cargo; se o servidor não quiser gozar do beneficio, ficará, para todos os efeitos legais, com o seu acervo de serviço público acrescido do dobro da licença que deixar de gozar.» (fls. 3/4) Do mesmo art. 34, é impugnado o item XXI, abaixo reproduzido, em confronto com as normas acima indicadas, e mais com os artigos 195, § e 39, § 2°, da Constituição da República, este pela ausência de remissão ao art. 7°, XXV: «Art. 34. São direitos dos servidores públicos, entre outros: XXI — creche para os filhos até seis anos de idade;» (fl. 8) Ainda no campo dos direitos dos servidores, é apontada a inconstitucionalidade, perante os artigos 25 e 61, § 1°, c, da Lei Maior, do § 7° do art. 27 da Carta paranaense: 7° os vencimentos dos servidores estaduais devem ser pagos até o último dia do mês vencido, corrigindo-se seus valores, se tal prazo for ultrapassado.» (fl. 10) Os demais dispositivos, abrangidos na inicial, estão situados no Ato das Disposições Transitórias da Constituição do Paraná, a começar pelo art. 46: «Art. 46. Aos servidores do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul — BRDE, lotados no Estado do Paraná, aplica-se o disposto no art. 36 desta Constituição». (fl. 12) O art. 36, a que é feita a remissão, estabelece que «são estáveis, após dois anos de efetivo exercício, os servidores nomeados em virtude de concurso público». Sendo os servidores do BRDE regidos pela CLT, o Autor considera violado o art. 22, I, da Constituição Federal, além do art. 19 e seu § 1°, do ADCT de 1988, que dispôs diversamente sobre a estabilidade dos servidores da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Mencionando os artigos 134, e seu parágrafo único (parte permanente), e 22 (disposições transitórias), da Constituição da República, o Requerente ataca o art. 55 da Carta paranaense (ADCT): «Art. 55. Fica assegurado aos advogados e assistentes jurídicos estáveis do 4 R.TJ — 150 Quadro Único do Poder Executivo, em exercício, na data da instalação da Assembléia Legislativa Constituinte estadual, na função de assistência judiciária no órgão referido no art. 22 do regulamento aprovado pelo Decreto n 2 1.185, de 19 de agosto de 1987, e nas funções jurídicas do Departamento Penitenciário do Estado, o enquadramento no cargo inicial da carreira de defensor público referidanos arts. 127 e 128 desta Constituição.» (fl. 16) Com base nos artigos 37, II, 19, § IR (ADCT), e 132 da Constituição Federal, impugna-se o art. 56 da estadual (ADCT) e seus §§ 12 e 22. No g. 32 do mesmo artigo 56, configurar-se-ia equiparação vedada pela Lei Maior (art. 37, XIII). Eis os dispositivos contra os quais afinal se insurge o Governador do Paraná: «Art. 56.0 assessoramento jurídico nos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e a representação judicial das autarquias e fundações públicas serão prestados pelos atuais ocupantes de cargos e empregos públicos de advogados, assessores e assistentes jurídicos estáveis que, nos respectivos poderes, integrarão carreiras especiais. 12 O assessoramento jurídico, nos órgãos do Poder Executivo, será coordenado pela Procuradoria-Geral do Estado, visando atuação uniforme. As carreiras de que trata este artigo serão criadas e organizadas em classes por iniciativa dos chefes dos respectivos poderes, no prazo de noventa dias da promulgação desta Constituição. ft 32 Aos integrantes dessas carreiras aplica-se, no que couber, o disposto no art. 125, §§ 22 e 32, desta Constituição.» Em sessão de 9 de fevereiro de 1990, foi deferido o requerimento de medida cantelar, quanto aos incisos XVIII (licença espe- §r 5 cial) e XXI (creche) do art. 34 da parte permanente da Constituição do Estado do Paraná e, ainda, quanto aos artigos 46 (BRDE) e 55 (defensores públicos) do respectivo Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Foi indeferida a liminar no tocante ao * 7° do art. 27 (correção de vencimentos em atraso) do corpo da Carta estadual e também com respeito ao art. 56, e seus parágrafos, do ADCT. Vieram as informações da Assembléia Legislativa, em douta exposição subscrita pelo eminente advogado, Professor Geraldo Ataliba (fls. 225/61). Em defesa do ato impugnado, oficiou, às fls. 299/302, o ilustre Dr. Miguel Frauduo Pereira, pela Advocacia-Geral da União. Manifestou-se, finalmente, pela procedência da ação, o ilustre SubprocuradorGeral Paulo de Tarso Braz Lucas. Eis a parte opinativa do parecer, aprovado, na conclusão, pelo eminente Procurador-Geral da República: «7. Quanto aos dispositivos da parte permanente da Constituição do Estado e que foram acima transcritos, pode-se desde já proclamar a sua inconstitucions1~, por vulneração ao princípio estabelecido no art. 61, § 1°, II, c, da Carta da República, que assegura ao Chefe do Poder Executivo a iniciativa de leis que disponham sobre servidores, regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria de civis, bem como reforma e transferência de militares para inatividade. 8. A simples leitura dos referidos dispositivos não deixa margem paradúvida quanto à natureza das matérias que lhes servem de objeto, as quais dizon respeito diretamente ao regime jurídico dos servidores do Estado. Como afirmar o contrário, se as normas impugnadas versam exatamente sobre licença especial dos servidores, sobre o direito a creche 6 R.T.J. — 150 para os seus filhos de até seis anos de idade e sobre a data em que devem ser pagos os seus vencimentos, com a previsão de correção monetária na hipótese de atraso no pagamento? Efetivamente, é impossível fazê-lo em termos plausíveis. Tampouco é possível afirmar, como fez o ilustre jurista subscritor das informações (fl. 228), que o art. 61 da Constituição da República não estabelece princípio limitativo da ação constituinte estadual. Ora, em primeiro lugar convém destacar que, apesar do advento da nova ordem constitucional, nenhuma mudança substancial se verificou no que se refere ao dever dos Estados de se submeterem ao princípio que foi transposto para o art. 61, 1°, H, alíneas a, c e e, da atual Carta Magna, atinente a iniciativa privativa do Poder Executivo para leis que disponham sobre de-terminadas matérias. Nem se venha argumentar que o art. 25 da atual Cada Magna, diferentemente do art. 13 da anterior, não se refere expressamente ao processo legislativo e, portanto, não o erigiu como princípio federal extensível, de cumprimento obrigatório pelos Estados-Membros. Nada disso parece essencial, principalmente se se levar em conta que o citado art. 13 também dispunha sobre a observância de outros princípios estabelecidos na Constituição além daqueles expressamente mencionados nos seus incisos I a IX. 11. Era essa, por exemplo, a orientação do eminente constitucionalista Celso Bastos (Curso de Direito Constitucional, 9° ed., São Paulo, 1986, pág. 117), o qual após tecer considerações sobre os princípios constitucionais sensíveis e os extensíveis, prelecionava, referindo-se aos 'princípios constitucionais estabelecidos', In verbis: «Além desses princípios, autonomia estadual está limitada por certas regras esparsas na Constituição, mas que contribuem para dar os contornos da área de atuação dos Estados federados. São os princípios constitucionais estabelecidos, dos quais não daremos aqui uma relação completa, mas apenas alguns exemplos: as vedações estabelecidas aos Estados pelos arts. 9°, 19 e 20, IR; o princípio da igualdade dos Estados membros que, a despeito de suas inegáveis diferenças, a múltiplos títulos, faz com que todos disponham da mesma soma de direitos; a obrigatoriedade de os Estados-membros se curvarem aos direitos e garantias individuais, firmadores de uma ordem democrática, a necessidade de se afinarem com o disposto no capítulo da constituição atinente à ordem econômica e social.» 12. E abordando a questão da utilidade da aludida classificação de princípios, atribuída a José Afonso da Silva e Raul Machado Horta, concluía o citado autor: «Sem embargo do meritório esforço dos autores da classificação exposta, quer nos parecer que o maior valor do trabalho realizado reside no seu aspecto didático, e não no científico. Isto porque, embora as diversas categorias de princípios estudadas possam apresentar algumas diferenças (p. ex., no que diz respeito às sanções), todas elas apresentam, a nosso ver, traços mais fortes que as unificam em um todo indiferenciado. Esse conjunto de normas e princípios é que faz nascer os limites à autonomia estadual, fixada no art. 13. O perfil jurídico-constitucional dos Estados vai nascer exatamente da conjugação do princípio da autonomia R.T..1 —150 com os limites a ela impostos pela Constituição Federal.» E essa conjugação deve-se fazer a partir da consideração de que, num sistema federativo como o nosso, é tradicional a simetria entre a organização dos Estados-membros e a organização da União Federal, esta só deixando de servir de modelo para aqueles naquilo que for evidentemente secundário ou que resultar de expressa disposição em contrário do próprio texto constitucional. Ou seja, os Estados-membros têm a sua autonomia reconhecida, mas devem seguir o modelo federal em sua essência, que se manifesta, entre outros, através do princípio estampado no art. 61, § r, II, a, c e e, da Carta Magna. E não tem relevo, por outro lado, o fato de estarem as normas impugnadas inseridas na Constituição do Estado do Paraná, e não se tratarem de normas ordinárias. O que importa é que houve usurpação de iniciativa do Chefe do Poder Executivo Estadual, a qual não é menos grave por emanar de um Poder Constituinte que, sendo decorrente e meramente autônomo, não pode, evidentemente, sobrepor-se, por via transversa, ao estabelecido pelo Poder Constituinte originário e soberano. 15. Mas no que diz respeito a esses mesmos dispositivos da parte permanente da Constituição do Estado, o requerente deduziu certos fundamentos que merecem ser examinados. 16.0 primeiro deles tem a ver com o disposto no parágrafo único e incisos do art. 169 da Constituição Federal, in verbis: art. 169 Parágrafo único. A concessão de qualquer vantagem ou aumento de remuneração,a criação de cargos ou alteração de estrutura de carreiras, bem como a admissão de pessoal, a 7 qualquer título, pelos órgãos e entidades da administração direta ou indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, só poderão ser feitas: I — se houver prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa de pessoal e aos acréscimos dela decorrentes; II — se houver autorização especifica na lei de diretrizes orçamentárias, ressalvadas as empresas públicas e as sociedades de economia mista. O requerente sugere que tal dispositivo da Carta da República teria sido vulnerado com a edição das normas acima mencionadas. Não parece, contudo, que a presente ação direta deva ser julgada procedente (no que se refere a tais normas) com base em semelhante fimdamento. Em primeiro lugar, porque, para afirmar-se a violação do Parágrafo Único, I e 1I do art. 169 da CF, seria preciso, antes de mais nada, que estivesse demonstrada, de plano, a inexistência da prévia dotação orçamentária e da autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias a que se referem os dois incisos mencionados. E nada disso foi feito, não se podendo decidir a respeito com suporte em mera presunção, principalmente em sede de ação direta de inconstitucionalidade. Em segundo lugar, porque não parece racional submeter o Poder Constituinte Estadual, mesmo com todas as limitações que lhe são inerentes, ao tipo de restrição previsto no art. 169, que mais parece ser dirigido ao legislador ordinário. Ora, abstraindo a questão atinente ao ckscurnprimento do princípio estabelecido no art. 61 da CF, que fulmina as normas em comento, como admitir que o Poder Constituinte Estadual pudesse ficar subordinado à deliberação prévia do legislador ordinário em maté- 8 R.TJ. —150 ria orçamentária? Enfim, no particular, tendo em vista o aludido fundamento, a ação não merece prosperar. Deve igualmente ser repelido o fundamento correspondente à alegação de violação do art. 40, III, a e b, da Constituição Federal pela alínea b do inciso XVIII do art. 34 da Constituição do Estado. A contagem em dobro do tempo de licença especial não gozada até pode, eventualmente, permitir a aposentadoria de servidor que conte menos tempo de serviço do que aquele exigido nas várias alínea« do inciso III do citado artigo da Carta Magna, mas de forma alguma afronta o que nelas estiver estabelecido. É que não há redução do tempo necessário para aposentadoria no plano abstrato, de modo a que, nesse mesmo plano em que se deve fazer o confronto das normas, se possa vislumbrar, desde logo, a vulneração da norma constitucional. Em outras palavras, a norma Estadual impugnada não reduz diretamente o tempo de serviço exigido para a aposentadoria dos servidores, mas apenas institui uma vantagem que, eventualmente e in concreto, pode, de modo indireto, resultar na redução do tempo efetivo exigido, sem que, com isto, se possa considerar vulnerado o disposto do art. 40, III, e alíneas da Constituição Federal. A norma impugnada em concreto — convém neer& — é inconstitucional somente do ponto de vista formal, por ter sido contrariado o princípio previsto no art. 61 da Constituição Federal. Quanto aos dois fundamentos adicionais que o requerente invoca para sustentar a sua alegação de inconstitucionalidade do art. 34, inciso XXI, da Constituição do Estado do Paraná, cumpre desde logo rechaçar, por impertinente, aquele que diz respeito à vulneração do art. 195, § 5°, da Constituição da República. O direito a 'creche para os filhos até seis anos de idade', garantido aos servidores na citada norma constitucional do Estado, não consubstancia beneficio ou serviço de seguridade social, mas sim vantagem outorgada ao servidor no plano da relação estatutária que vigora entre o Estado e os seus servidores, a qual como toda vantagem deve ser suportada pelo Estado, independentemente de fonte de custeio específico. 21. Já o outro fundamento parece ser dotado de maior consistência, merecendo uma análise mais acurada, em que pese a impossibilidade de subsistência da norma estadual supramencionada emace do princípio do art. 61 da CF. Eis como o requerente o formulou, no particular: «Os fimdamentos para demonstrar a inconstitucionalidade do inciso XXI da art. 34 da Constituição do Paraná são semelhantes aos examinados acima. Também há outra manifestação de conflito com a Constituição da República, e este se apresenta quando a constituinte estadual dá aos funcionários do Estalo direito que não receberam os funcionários da União na Constituição Federal. Os estados-membros estão por igual vinculados ao molde federal na disciplina constitucional dos direitos de seus funcionários. É conseqüência do sistema da organização federativa imposta pela Constituição da República. E esse sistema, quanto ao funcionalismo, consistiu em enunciar-lhes os direitos selecionando-os no elenco dos chamados direitos sociais, conferidos à generalidade dos trabalhadores. É o método do § 2° do art. 39, quando a Constituição Federal remete ao art. 7° de seu texto, isolando ali os direitos aplicáveis aos funcionários. No entanto a Constituição do Brasil não faz remissão ao inciso R.TJ — 150 XXV de seu art. 7°; não dá aos funcionários da União e territórios assistência gratuita aos filhos e dependentes em creches e pré-escolas. O inciso XXI do art. 34 da Constituição do Paraná é reprodução parcial do inciso XXV do art. 7° da Constituição da República. Porém essa transposição, mediante adaptação, lhe é vedada, mesmo para instituir direito a creche com limitação de faixa etária aos beneficiários.» A questão é de fato relevante, pois envolve a definição do nível de autonomia dos Estados no estabelecimento do regime jurídico de seus servidores. É certo que tais pessoas jurídicas, seja no plano constitucional, seja no plano de sua legislação ordinária, estão estritamente limitadas pelo disposto no art. 37 da Constituição Federal. O que merece umardlexão mais profunda, porém, é saber até que ponto elas estão limitadas pelas normas do art. 39, cujo § por remissão a vários incisos do art. 7° da mesma Carta Magna, estende aos servidores públicos em geral inúmeros direitos que ali são reconhecidos aos trabalhadores urbanos e rurais. A indagação que, em suma, se impõe, à espera de uma resposta desse Pretório Excelso, é a seguinte: não fosse o óbice resultante do art. 61, § 1°, da Constituição Federal, poderia o Constituinte estadual erigir em favor dos seus servidores mais direitos do que aqueles previstos no modelo Federal delineado no art. 39, § 2° da Carta Magna? Ao proferir o seu voto na Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 1221/600-SC (D7 12ó92), o Relator, Famr2 Sr. Min. Paulo Brossard, antes de concluir pela inconstitucionalidade do § 4° do art. 30 da Constituição do Estado de Santa Catarina (atinente à aposentadoria voluntária especial estendida aos 'Espe- 9 ciclistas em Assuntos Educacionais'), posicionou-se nos seguintes termos: «Os princípios gerais estabelecidos para a administração pública (art. 37, CF) e os específicos aos servidores públicos civis (art. 39 a 41, CF) são de observância e aplicabilidade obrigatória aos Estados, os quais, por isso, sobre eles não podem dispor de forma diferentemente.» Não obstante a ilustre fonte de onde provém, não parece que solução tão drástica seja a melhor. A disposição do art. 37 da CF tem nítido caráter limitativo da atuação legislativa dos Estados, mas o mesmo não se pode dizer do material normativo que emerge do art. 39, § 2°, da mesma Carta Magna. Aqui o Constituinte Federal estabeleceu expressamente a competência legislativa da União, Estados, Distrito Federal e Municípios para instituir o regime jurídico único e planos de carreira para os servidores das respectivas administração direta, autarquias e fundações públicas. Impôs — é verdade — o regime único, mas ao mesmo tempo reconheceu a competência legislativa dos Estados, Distrito Federal e Municípios para dispor sobre esse regime único, estabelecendo os direitos e obrigações dos servidores, desde que observados os princípios do art. 37, e garantidos, no mínimo, entre outros, os direitos reconhecidos no § 2° do art. 39 da Constituição Federal. Reconhecer que aos Estados é vedado instituir em favor dos seus servidores direitos outros além daqueles previstos na Constituição Federal é algo que, decididamente, parece fraturar irremediavelmente a espinha dorsal do sistema federativo, mesmo de um sistema como o nosso onde sempre houve uma tendência de tutela dos Estados pela União Federal. E isto é injustificável, seja por não resultar claramente do dis- 10 R.TJ.— 150 posto no art. 39 da Constituição Federal, seja por tolher a autonomia dos Estados em um plano onde o reconhecimento de direitos adicionais não vulnera os princípios estabelecidos na Constituição Federal, e nem desfigura, em pontos essenciais, o modelo que esta lhe impôs. Por outro lado, se se tiver de admitir que os Estados, ao nível de sua legislação ordinária e uma vez observado o princípio do art. 61, § P, da CF, não podem criar novos direitos para os seus servidores, essa mesma vedação terá que ser estendida para a União Federal, o que não parece racional, por impedir, a priori, aos servidores públicos do País a conquista de novos direitos, condenando-os à estagnação em sua luta por melhores condições de vida. Essas mesmas considerações são válidas para repelir idêntico fundamento invocado pelo requerente em relação ao disposto no § 70 do art. 27 da Constituição Federal, cujo único vício é de natureza formal, como já foi dito anteriormente. Impõe-se, finalmente, o exame das normas impugnadas constantes do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias do Paraná. No particular, ressalta, de logo, a inconstitucionalidade do art. 46, que mandou aplicar aos servidores do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul — BRDE, lotados no Estado do Paraná, o disposto no art. 36 da Constituição do Estado, que dispõe sobre a aquisição de estabilidade, após dois anos de efetivo exercício, pelos servidores nomeados em virtude do concurso público. Todos os fundamentos aduzidos pelo requerente são válidos e a norma impugnada efetivamente contraria não só o art. 22, I, da Constituição Federal (e eventualmente o art. 19 do ADCT/CF), como também, acima de tudo, evidencia uma irracionalidade que deve ser escoimada da Constituição do Estado do Paraná. Ora, como admitir que somente os empregados do BRDE em exercício no referido Estado possam adquirir a estabilidade, enquanto que os atuantes nos demais Estados que o criaram fiquem a ver navios? De duas uma Ou o Constituinte do Estado do Paraná pode, sozinho, estabelecer regras válidas para todos os empregados do BRDE, ou não pode estabelecer regra alguma, principalmente se pretender que seja válida somente para alguns deles, o que, no caso, constituiria afronta ao disposto no art. 19,111, da Constituição Federal. De resto, a própria controvérsia em tomo da natureza jurídica do BRDE já deveria por si só ter inibido a iniciativa do Constituinte Estadual. Tratandose de autarquia interestadual, se é que é possível a existência de tal figura em nosso ordenamento jurídico, nenhum ato normativo que lhe diga respeito e lhe crie obrigações pode ter validade e eficácia se não emanar de todos os Estados que a criaram. Dever-se-ia, no caso, observar a mesma forma jurídica adotada no processo de sua criação, sob pena até de violar-se a autonomia dos demais Estados (art. 18 da CF). E por tratar-se de autarquia — repetindo-se: se é que é possível atribuir tal natureza ao BRDE — o Constituinte estadual, de resto estaria violando o princípio previsto no art. 61, § P, da CF. 32. A verdade, porém, é que, cuidando-se de empresa pública, cujos empregados são regidos pela CLT, o Constituinte Estadual violou, in caso, o art. 22, I, da CF. E o que é pior pretendeu veladamente trazer para os seus quadros, sem o devido concurso público, empregados de uma empresa pública, em flagrante mineração do princípio estabelecido no art. 37,11, da mesma Carta Magna. R.TJ —150 33. 0 art. 55 do ADCT do Paraná é também inconstitucional, por violar o disposto no art. 22 do ADCT da República, que se limitou a assegurar «aos defensores públicos investidos na função até a data da instalação da Assembléia Nacional Constituinte o direito de opção pela carreira, com observância das garantias e vedações previstas no art. 134, Parágrafo Único, desta Constituição.» A norma impugnada, como bem o disse o requerente, foi além do permitido, pois: «(a) assegurou o ingresso na carreira de defensor público àqueles que estivessem em exercício na data de sua instalação, quando, pelo disciplinamento integrado dos artigos 134 do texto permanente e 22 das disposições transitórias da Constituição da República, essa investidura é permitida aos que em exercício estivessem na data de instalação da Assem- bléia Nacional Constituinte; (b) permitiu aos 'advogados e assistentes jurídicos nas funções jurídicas do Departamento Penitenciário do Estado' o ingresso, sem delongas, na carreira de Defensor Público. Neste último aspecto a inconstitucionalidade não comporta discussão, uma vez que se foge completamente ao padrão de excepcionalidade que foi admitido nas disposições transitórias da Constituição da República, já que incontomável a condição do concurso público.» 34.0 capei art. 56 do ADCT do Paraná é igualmente inconstitucional sob vários aspectos. Em primeiro lugar, porque, efetivamente, afronta o disposto no art. 132 da Constituição Federal, que, de modo, expresso reservou aos Procuradores dos Estados e do Distrito Federal a representação judicial e a consultoria jurídica das respectivas unidades federadas, o que s6 foi excepcionado na hi- 11 pótese prevista no art. 69 do ADCT da República, que permitiu «aos Estados manter consultorias jurídicas separadas de suas Procuradorias-Gerais ou Advocacias-Gerais, desde que, na data da promulgação da Constituição, tenham órgãos distintos para as respectivas funções». Daí se extrai, de imediato, a inconstitucionalidade da expressão «executivo» inserida no caput da referida norma, com a extensão de igual vício ao respectivo § 1°. Por outro lado, a norma em comento se mostra contrária ao disposto no art. 37,11 da Constituição Federal, pois, ao mesmo tempo em que impôs ao legislador ordinário a criação das carreiras especiais de assessoramento jurídico, no âmbito dos Três Poderes (§ 2°), determinou o aproveitamento dos ocupantes de cargos e empregos públicos de advogados, assessores e assistentes jurídicos nos cargos das carreiras a serem criados. Esse Pretório Excelso, recentemente, ao julgar a ADIn n° 231-RJ (Rel. Exmo. Sr. Na. Moreira Alves, DF 13-11-92, pág. 20.848) proclamou que inciso II do art. 37 da Constituição Federal também não permite o 'aproveitamento', uma vez que, nesse caso, há igualmente o ingresso em outra carreira sem o concurso exigido pelo mencionado dispositivo. 37. É preciso destacar, por último, que pouco importa, tu casa, que os servidores públicos aproveitados sejam estáveis ou não e tenham ou não sido aprovados em outros concursos públicos; pois o que deflui naturalmente da interpretação do Pretério Excelso no caso acima citado é que, para o ingresso em classe inicial de uma carreira com fiel observância da norma do art. 37,11, da CF, é essencial a aprovação em concurso público especifico. 12 R.TJ. — 150 Se o caput do citado art. 56 do ADCF do Paraná não tem, por essas razões, condição de ser considerado constitucional, já que não é possível escoimá-lo das expressões que o contaminam, hão de restar prejudicadas as argüições referentes aos §§ 2° e 3° do mesmo artigo. Pelo exposto, opinamos por que se julgue procedente a ação direta, declarando-se a inconstitucionalidade dos incisos XVIII, alíneas a e b, e XXI do art. 34 e do § 7° do art. 27 da Constituição do Estado do Paraná apenas por vulneração do princípio inserto no art. 61, § 1°, c,da Carta da República. Devem igualmente ser declarados inconstitucionais os arts. 46, 55 e 56, caput e § 1°, do ADCT do Paraná, por afrontarem, respectivamente, as disposições dos ares. 22, Ida CF, 22 do ADCT da República e 37, II do já citado corpo permanente da Carta Magna.» (fis. 307/19) É o relatório, cujas cópias deverão ser distribuídas aos Srs. Ministros, em obediência ao que prescreve o art. 172 do Regimento Interno do Supremo Tribunal. VOTO O Sr. Ministro Octavio Gallotti (Relator): O conteúdo dos incisos XVIII (licença especial) e XXI (direito a creche), do art. 34 impugnado, incide naquilo que normalmente se insere na iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo, segundo o art. 61, § 1°, II, letras a e c, da Constituição Federal: são disposições sobre servidores públicos e seu regime jurídico, com acréscimo, ainda que indireto, de remuneração e efetivo aumento da despesa pública. Há que indagar, todavia, se essa restrição, a que, sem dúvida está sujeito o processo legislativo ordinário dos Estados (como decorrência do princípio da separação dos Poderes), deve reputar-se igualmente aplicável ao legislador constituinte estadual, ao qual é infenso o poder de iniciativa do Poder Executivo. Nos debates preliminares em que tem essa delicada questão aqui aflorado, sinto decidida inclinação para uma resposta negativa do Plenário, isto é, para o reconhecimento da liberdade da Assembléia, sempre que se encontre deliberando sobre matéria de natureza efetivamente constitucional, isto é, relativa à própria estrutura do Estado. Quando todavia venha a imiscuir-se, a Assembléia, em minudências ou particularidades, próprias em substância do legislador ordinário, a assunção desses pormenores, pelo legislador constituinte estadual, afigura-se usurpadora da competência de iniciativa, inerente ao Poder Executivo. Nessa última hipótese, vejo claramente incidirem os pormenores que desceu a Constituição do Paraná a especificar, e que, no plano federal, são tratados em lei ordinária (art. 87 da Lei n° 8.112190, quanto à licença-prêmio), ou mesmo em decreto (Decreto n° 93.408/86, no tocante à instituição ou ao uso de serviços de creche). Considero, portanto, inconstitucionais os itens XVIII e XXI da Constituição do Estado do Paraná. Diversa é a questão relativa ao § 7° do art. 27 da mesma Carta, que, ao estabelecer data para o pagamento dos vencimentos dos servidores estaduais e a correção monetária dos mesmos em caso de atraso, não representa aumento de remuneração, mas simples preservação do poder aquisitivo do valor devido, visando a dar eficácia ao princípio de irredutibilidade. Assim foi, em suma, encarada, pelo Tribunal, previsão semelhante, insculpida na Constituição de Mato Grosso, declarada constitucional por decisão unânime, quando do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 176, em sessão de 21 de agosto de 1992, Relator o eminente Ministro Marco Aurélio. Em coerência R.T..T — 150 com essa conclusão, o mesmo se impõe, agora, em relação ao § 7° do art. 27 da Carta paranaense. Passo, então, ao exame do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, a começar pelo seu art. 46, que estende, aos empregados do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul — BRDE, norma da parte permanente da Constituição estadual, concernente à estabilidade dos servidores públicos. Sucede que a natureza autárquica do Banco (onde residiria o pressuposto de legitimidade de norma impugnada) já foi afastada, pelo Supremo Tribunal, em julgamento especificamente destinado ao deslinde da natureza jurídica do próprio BRDE, havendo ficado expresso na ementa de acórdão de Primeira Turma, no Recurso Extraordinário n° 120.932: — Autarquia interestadual de desenvolvimento: sua inviabilidade constitucional. 3.0 dado diferencial da autarquia é a personalidade de direito público (Celso Antônio), de que a podem dotar não só a União, mas também as demais entidades políticas do Estado Federal, como técnicas de realização de sua função administrativa, em setor especifico subtraído à administração direta. 4. Por isso mesmo, a validade da criação de uma autarquia pressupõe que a sua destinação institucional se compreenda toda na função administrativa da entidade matriz. 5.0 objetivo de fomento do desenvolvimento de região composta pelos territórios de três Estados Federados ultrapassa o raio da esfera administrativa que qualquer um deles, isoladamente considerado; só uma norma da Constituição Federal poderia emprestar à manifestação conjunta, mediante convênio, de três vontades estatais incompetentes 13 um poder que, individualmente, a todos eles falece. 6. As sucessivas Constituições da República — além de não abrirem explici- tamente às unidades federadas a criação de entidades públicas de administração interestadual —, têm reservado à União, expressa e privativamente, as atividades de planejamento e promoção do desenvolvimento regional: análise da temática regional no constitucionalismo federal brasileiro.» (RE 120.932, Relator, Ministro Sepúlveda Pertence, 1)1 de 30-4-92). Nem se compreenderia como pudesse o Estado do Paraná isoladamente dispor sobre empresa de que participa em concurso com duas outras unidades da Federação. Tendo pretendido fazê-lo, obrou em excesso dos limites da autonomia que lhe foi conferida pelo art. 25 da Constituição Federal, com que é, portanto, incompatível o art. 46 do ADCT do Paraná. É patente a inconstitucionalidade da norma consubstanciada no art. 55 das disposições estaduais transitórias, em apreciação, por dilatar a exceção de dispensa de concurso público, consentida no ADCT federal (art. 22) aos ocupantes de função de defensoria pública, até a data de instalação da Assembléia Nacional Constituinte, de modo a que passasse a abranger quantos tenham vindo a satisfazer o requisito, até o dia (ulterior) da inauguração da constituinte paranaense. Por preterição de exigência do concurso, estabelecida na norma geral do art. 37, II e na especial do parágrafo único do art. 134, ambos da Carta Federal, há de ser, portanto, declarado inconstitucional o art. 46 do ADCT do Paraná, sendo certo que subsiste o amparo direto do art. 22 do Ato das Disposições Transitórias federais, em relação aos servidores estaduais, capazes de preencher os requisitos ali estabelecidos. 14 R.T.J. — 150 A propósito do art. 56, e seus parágrafos, das mesmas disposições transitórias paranaenses, teceu, o eminente Ministro Sepúlveda Pertence, quando do julgamento do pedido cautelar desta ação, as seguintes observações, cuja utilidade continua presente, a nortear a decisão definitiva: (Sr. Presidente, pediria a atenção para alguns dados deste caso. Trata-se de assistentes, advogados ou assessores jurídicos dos Três Poderes. Recebemos memoriais em que demonstram, por exemplo, que os assessores jurídicos do Judiciário são funcionários, não só estáveis, mas concursados. Na verdade, em relação aos do Judiciário e do Executivo, exercem funções paralelas àquelas que exercem os Procuradores do Estado, pelo menos, no âmbito de consultoria. Note-se que, no parâmetro federal, a Advocacia-Geral da União presta consultoria apenas ao Poder Executivo e, em várias Cartas estaduais, temos visto que, em função disso, se vem tomando direito uniforme nos Estados a criação de procuradorias das Assembléias. No caso, criam-se ainda Procuradorias Judiciárias, a título de prestação de assessoria jurídica ao Tribunal. Por isso, não há nenhum escândalo em que tenham o mesmo tratamento dos Procuradores do Estado, digo —leia-se, dos Consultores do Poder Executivo. No plano federal, declaramente, durante a elaboração da Constituinte, fiz criticas a esse universo que se criou, misturando o serviço do contencioso da União com a consultoria do Poder Executivo, que, a meu ver, envolve a assessoria jurídica da administração federal: o certo é que se criou um monstro no plano nacional, que vai ser reptoduzido nos Estados. Agora, pelo menos em termos de cautelar, não vejo como manter uma situação privilegiada apenas para aque- les que detenham títulos de Procuradores de Estado. Na verdade, todo esse pessoal passará a exercer a função que a Constituição Federal definiu como 'Advocacia de Estado'.» (fls. 207/8) Vé-se, desde logo, que, no pertinente ao assessoramento jurídico do Poder Legislativo e do Poder Judiciário, não há margem alguma para a alegação, ínsita na petição inicial, de invasão da competência natural de Procuradoria-Geral do Estado. É certo que não possuindo — as Assembléias e os Tribunais — personalidade jurídica própria, sua representação, em juízo, é normalmente exercida pelos Procuradores do Estado. Mas têm, excepcionalmente, aqueles órgãos, quando esteja em causa a autonomia do Poder, reconhecida capacidade processual, suscetível de ser desempenhada por meio de Procuradorias especiais (se tanto for julgado conveniente, por seus dirigentes), às quais também podem ser cometidos encargos de assessoramento jurídico das atividades técnicas e administrativas dos Poderes em questão (Assembléia e Tribunais). Poder-se-á, até, discutir a utilidade dessa prática, jamais porém — penso eu — vir-se a considerá-la adequada às funções da Procuradoria do Estado, integrada no Poder Executivo. Tenho, assim, que, só quanto ao último (o Executivo), poderá assumir algum relevo a controvérsia sobre ser indissociável, da Procuradoria do Estado, a tarefa de assessoramento, entregue, pela Constituição do Paraná, a urna carreira especial, sob a coordenação da Procuradoria-Geral do Estado. Ainda aí, não encontro, porém, obstáculo sério à opção seguida pelo constituinte estadual. Devo resignar-me ao centralismo da Constituição de 1988 que, em alguns pontos — um deles, certamente, o art. 132, ora R.T.1 — 150 cogitado — conseguiu superar nesse desígnio, os regimes anteriores. Nem assim, entendo, porém, que, do citado dispositivo (o art. 132), se possa extrair malha tão estreita, a subjugar as Constituições estaduais, aponto de impedir a existência (a piar da dos Procuradores) de carreiras especiais, voltadas ao assessoramento jurídico, mas sob a coordenação da Procuradoria-Geral, de modo a assegurar a uniformidade de jurisprudência administrativa, onde julgo residir o escopo de norma da Carta Federal. Não em alguma reivindicação de caráter corporativo. Note-se que o art. 69 do ADCF de 1988 até ensejou, aos Estados, manter consultorias jurídicas separadas de suas Procuradorias-Gerais; sendo, pois um minus, em relação a esse permissivo, a preservação de assessorias em carreiras especiais, coordenadas pela Procuradoria-G=1 do Estado. Recordo, mais, que, no modelo federal fornecido pela recente Lei Complementar n° 73, de 10 de fevereiro de 1993, adotou-se a divisão tripartida de carreiras, uma delas exclusivamente destinada à consultoria ou assessoramento jurídico, outras duas à representação judicial da União. Não vejo, igualmente, no art. 56, ainda em exame, afronta à exigência do concurso público, eis que os servidores, nele contemplados, são mantidos em cargos da mesma natureza e, atribuições dos já exercidos. Não há, pois, investidura em outro cargo, suscetível de contrariar a prescrição constitucional. Ataca-se, por fim, a equiparação de vencimentos, resultante do § 3° do art. 56, entre os integrantes das carreiras ditas especiais e os Procuradores do Estado. Reservas poder-se-iam, em tese, opor a essa declaração de isonomia, quando se tratasse de vincular carmine de formação jurídica, mas dotadas de natureza e atribuições diferenciadas (como as da Magistratura, do Ministério Público e a dos Pro- 15 curadores do Estado ou da União), questão não resolvida, ainda, de modo definitivo, pelo Supremo Tribunal, perante a Constituição de 1988. Quando, se trate, entretanto, de cargos com atribuições análogas ou interligadas (a ponto de a própria inicial sustentar devessem estas obrigatoriamente aglutinadas em uma só carreira), não vejo como se objetar à igualdade de remuneração, entre os seus ocupantes situados nas classes equivalentes. Em resumo, e de acordo com todo o exposto, julgo procedente, empane, a ação, para declarar inconstitucionais os itens XVIII e suas letras a e b, e XXI, ambos do art. 34 da Constituição do Paraná, bem como os artigos 46 e 55 do respectivo Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. São declarados constitucionais o § 7° do sat. 27 da parte permanente da Constituição e o art. 56, e seus §§ 1°, 2° e 3°, do Ato das Disposições Transitórias, ainda do Estado do Paraná. VOTO (S/ INCISOS XVIII E XXI) O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Sr. Presidente, chamado à colação por V. Ex' sobre esse tema recorrente nesses quatro anos de discussão da Constituição de 88, vejo-me obrigado a algumas breves considerações. 2. Em decisão recente, efetivamente, achei razoável que se estabelecesse como critério de legitimidade do trato, pelas constituições estaduais, de matéria que, no processo legislativo ordinário, se submeta à iniciativa privativa no Poder Executivo, indagar se, concretamente, o tema versado pela disposição constitucional estadual pode considerar-se de estatura constitucional ou não. 3.0 princípio, para mim, é que as regras de iniciativa privativa obviamente se dirigem ao processo legislativo ordinário, e não se poderá opor à Assembléia Consti- 16 tuinte Estadual —por definição, no âmbito do Estado, poder constituinte e não poder constituído, malgrado poder constituinte, submetido, na estrutura total da federação, à prevalência dos princípios constitucionais da federação. A esse princípio, segundo penso, só é de abrir exceção quando, por seu conteúdo, a norma questionada seja de tal modo estranha à matéria própria dela que a sua inserção na Constituição do Estado se deva qualificar como fraude às normas de reserva de iniciativa do processo legislativo ordinário, da Constituição Federal, que compõem o sistema positivo da separação de poderes. Mas, Sr. Presidente, ao admitir esse critério, não parti de nenhuma tentativa de conceituação a priori do que seja matéria constitucional e do que não seja matéria constitucional, que seria render-se a uma distinção que hoje tem evidente sabor de anacronismo: a que parte de um padrão de matéria constitucional do Estado liberal clássico, para concluir que tudo aquilo que não diga com a estrutura dos poderes ou com a garantia dos direitos individuais — para recordar o célebre art. 16 da Declaração dos Direitos do Homem, da Revolução Francesa — não seria constitucional ou seria apenas formalmente constitucional. Creio que, pelo menos depois do primeiro após-guerra, Sr. Presidente, unia distinção dessas soa arbitrária e anacrônica. Não parto, assim, de um padrão apriorístico do que seja matéria constitucional, que, ao contrário, há de ser extraído do próprio ordenamento positivo: por isso, não posso negar que toda a temática, a que a Constituição Federal deu dimensões constitucionais, tenha dimensões constitucionais também na estruturação básica do ordenamento do Estado-membro. Acentuou, no entanto, o eminente Relator que o tema específico em causa — licença-prêmio de funcionários públicos —não é tratado na Constituição Federal em — 150 relação aos servidores da União; é matéria de legislação ordinária federal. Mas, data venia, não pode ser este o critério, até porque, então, só legitimaríamos a norma constitucional estadual rigorosamente inútil, pois as disposições relativas ao funcionalismo público, inseridas na Constituição Federal, por disposição expressa da mesma Constituição Federal, também se aplicam aos servidores dos Estados e dos Municípios. Fico em que, não só na Constituição de 88, como nos sucessivos textos constitucionais brasileiros, se tem considerado que as linhas básicas do estatuto do funcionalismo público, incluída a garantia daquele mínimo de vantagens e de benefícios que, a juízo político do constituinte, devam receber consagração constitucional, constituem matéria constitucional. E, por isso, entendo que não é exagerado, não é desarrazoado que a disciplina da licença-prêmio, a juízo político do constituinte paranaense, tenha sido considerado adequada, por integrar as linhas básicas do estatuto do funcionalismo estadual, de ganhar o status de garantia da Constituição local. Com esses fundamentos, já me antevendo vencido, mas, chamado pelo voto de V. Ex' a explicitar melhor a minha posição, peço vênia para, no ponto, divergir e declarar improcedente a ação. VOTO (S/INCISOS XVIII E XXI) O Sr. Ministro Paulo Brossard: Sr. Presidente, os temas constitucionais sofreram tamanho alargamento, ao longo do tempo, que hoje é difícil saber o que é e o que não é constitucional. Segundo o critério formal, toda disposição que estiver na Constituição o será; entram aí normas de Direito Civil, de Direito Comercial, de Direito Penal, de Direito Processual, Civil e Penal, de Direito Tributário, de Direito Internacional, de Direito do Trabalho, e assim por diante. —150 O problema se apresenta sob forma diferente quando se trata de um poder constituinte subordinado, ou condicionado, ou limitado, como é o poder dos Estados que, sendo autônomos, não chegam a ser soberanos e, por isso mesmo, não têm poder irrestrito quanto a sua auto-organização. Lamento que as Constituições dos Estados se repitam monotonamente. Se urna lei orgânica dos Estados fosse editada creio que pouca diferença fada, tal a similitude, para não dizer a identidade, que estas Constituições apresentam, de algum tempo a esta data. O mesmo vale dizer em relação aos municípios. Agora, os municípios têm poder de auto-organização, quando até a Constituição de 1988 sé o Rio Grande do Sul, de 1891 a 1988, permaneceu fiel a esta dimensão da autonomia municipal. Os demais Estados editavam a lei orgânica dos mtmicípios. Entretanto, se conferimos as leis orgânicas municipais do Rio Grande do Sul vamos verificar que elas são praticamente iguais. De modo que, em verdade, a importante atribuição que a Constituição reservou aos municípios não teve sentido útil. O mesmo vale dizer, mutalis mutandia, em relação aos Estados. De outro lado, a partir de 46, depois de longo período autoritário e centralizador, o Superno Tribunal se mostrou rigoroso na exegese da Constituição, fulminando qualquer novidade introduzida pelo constituinte estadual. 17 vida administrativa, à vida financeira, acompanho o voto de V. Er' na sua conclusão. VOTO (S/INCISOS XVIII E XXI) O Sr. Ministro Néri da Silveira: Sr. Presidente. O art. 7° da Constituição, no seu inciso XXV, estabelece: «Ari 7° São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: XXV — assistência gratuita aos filhos e dependentes desde o nascimento até seis anos de idade em creches e pré-escolas.» O art. 39, inserido no capítulo dos servidores públicos civis, no § 2° enumaa aqueles direitos dos trabalhadores que são, desde logo, assegurados aos servidores: aplica-se aos servidores públicos o disposto no art. 7° e incisos indicados. Efetivamente, o inciso XXV não está entre os enumerados; portanto, não mandou a Constituição Federal, desde logo, que se assegurasse assistência gratuita aos filhos e dependentes dos servidores públicos, desde o nascimento até os seis anos de idade, em creches e pré-escolas. Não ordenou que se aplicasse, obrigatoriamente, esse benefício. No caso, não se trata disso, trata-se da inserção na lei constitucional de normas de políticasocial, incensuráveis. Em tese, mas inexeqüíveis. Na capital, nas cidades de porte médio, o serviço pode ser mantido. No Estado inteiro é impossível. E como fica o Estado que deixa de cumprir cláusula explícita e imperativa de sua Constituição? Penso, entretanto, que nada impediria que os Estados, ao definirem o regime de assistência a seus servidores, na Carta local, no uso de sua autonomia, dispusessem a respeito de matéria que, não obstante a Constituição Federal não haja mandado aplicar obrigatoriamente aos servidores públicos, prevê-a, todavia, relativamente aos trabalhadores em geral. Assim, não por entender que sejam assuntos intratáveis na lei constitucional, mas porque vejo no preceito virtual ofensa à autonomia do Estado, autonomia que não deve se circunscrever apenas à lei constitucional, mas, também à vida legislativa, à Dá-se, porém, no caso concreto, que o dispositivo, assim como está redigido, se refere a creche até seis anos. Dir-se-á que, embora sob a denominação de creche, aí também se vai realizar uma assistência préescolar. 18 Posso, nesse sentido, aludir a um exemplo da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Lá a assistência em apreço realizase em instituição com o nome de «creche» e as crianças, que podem ingressar, desde três meses de idade, nela estão autorizadas a permanecer até seis anos, o que tem sido muito saudado particularmente por professores jovens da Universidade do Rio Grande do Sul, diante da possibilidade de manter seus filhos, com proveito, desde os primeiros meses até o termo referido. Dessa maneira, a Constituição estabelece esse parâmetro dos seis anos, para creches e pré-escolas. Não, vejo, pois, nenhuma inconstitucionalidade nessa disposição da Constituição do Estado do Paraná. É certo que a Constituição Federal, que é o paradigma para os Estados, não manda estender, desde logo, a seus servidores esse benefício, mas também não proíbe que o poder público, tanto o federal quanto o estadual, o estabeleça. Ora, se não há tal proibição, pergunto: seria inconstitucional se o Estado mandasse aplicar norma da Constituição Federal, de significativa importância aos trabalhadores em geral, a seus servidores? Penso que, no plano da sua autonomia, pode o Estado estipular uma garantia a seus servidores, que a Constituição Federal confere aos trabalhadores em geral. Com a devida vênia, não cabe estabelecer limitação dessa ordem à autonomia dos Estados, sob pena de tomar sem conteúdo a autonomia para organizar seus serviços. A Constituição de 1988 quis uma federação diferente, quanto ao regime anterior, em termos de maior autonomia aos Estados-membros. Desse modo, como o direito em exame está previsto para os trabalhadores em geral e há um rol de direitos que são obrigatoriamente aplicáveis aos servidores públicos, não vejo inconstitucionalidade se o Estado, no exercício da sua autonomia, resolver preceituar como obrigatória a assistência aos filhos dos servidores estaduais, nos limites de idade aludidos. — 150 Compreendo que não cabe declarar a inconstitucionalidade de norma de Constituição estadual que assegure aos servidores locais aquilo que é garantido aos trabalhadores em geral. Estado do Paraná, todos sabemos, possui um extraordinário progresso e tem procurado enfrentar os problemas sociais da sua população com grandes realizações nesse sentido. Não poderia, então, o constituinte estadual prever que os servidores do Estado do Paraná tenham esse beneficio que é assegurado aos trabalhadores em geral? Peço vênia para não declarar a inconstitucionalidade do dispositivo. Quanto à licença especial, como prevista, estou de acordo com a invalidade da norma, porque não está prevista na Constituição para os trabalhadores em geral e é uma vantagem tradicionalmente estatutária, definida em legislação infraconstitucional. Não houve, ainda, Constituição prevendo a licença-prêmio. Somente ao Poder Executivo caberia iniciativa de lei nesse sentido, de acordo com as conveniências e possibilidades do erário estadual. Do exposto, declaro a inconstituciona'idade do inciso XVIII, quanto à licençaespecial. Reconheço, entretanto, como válida, diante da Constituição Federal, a estipulação do inciso XXI em exame, relativa à assistência de filhos menores e dependentes de servidores estaduais, nos termos, aí, regulados. VOTO (S/INCISOS XVIII E XXI) Sr. Ministro Moreira Alves: Sr. Presidente, temos aqui, a meu ver, dois problemas diversos. O que o Sr. Ministro Néri da Silveira ora coloca não me parece estar em causa neste caso. Não nego que o Estado possa, por lei ordinária, dar as vantagens que entender deva dá-Ias. Na hipótese, não se trata de pré-escola, mas de creche, não se R.TJ — 150 aplicando princípios que dizem respeito àquela. Por outro lado, a iniciativa exclusiva para a apresentação de projetos de lei que a Constituição Federal outorga a um dos Poderes tem de ser respeitada pelos Estadosmembros, porquanto ela se insere no âmbito das funções reservadas de cada Poder, âmbito esse que compete à Constituição Federal delimitar, não podendo ser violado sequer pelo Poder Constituinte decorrente, que está sujeito à observância do princípio da separação dos Poderes que é uma das denominadas cláusulas pétreas. Se se admitir que o Poder Constituinte decorrente, que é o Poda Constituinte dos Estados-membros, possa disciplinar matérias que são, por força da Constituição Federal, objeto de projetos de lei da iniciativa exclusiva de um dos Poderes do Estado, estar-se-á impedindo que esse Poder se exerça plenamente no âmbito de suas atribuições, impossibilitado que se encontrará ele de, por lei ordinária com projeto de sua iniciativa exclusiva, modificar a disciplina com relação à qual a Constituição Federal entendeu de lhe dar o poder de iniciativa para estabelecê-la ou alterá-la por elo como o mais apto para avaliar as necessidades que se apresentarem e a disponibilidade dos recursos para enfrentá-las. Com isso, o Poder Constituinte decorrente estará cerceando indevidamente a iniciativa do Poder Constituído outorgada pela Carta Magna Federal. E assim como o Poder Constituinte decorrente está sujeito à observância do princípio da separação dos Poderes, cujos parâmetros é a Constituição Federal que estabelece, não pode ele, também, feri-los indiretamente, cerceando um deles de exercitar plenamente as funções que ela lhe outorga. Por isso, Sr. Presidente, s6 admito que o Poder Constituinte decorrente discipline matéria cuja disciplina legislativa seja da iniciativa exclusiva de um dos Poderes Constituídos quando ela esteja intimamente ligada à estrutura do Estado-membro e deva inserir-se, portanto, por sua natureza, 19 no texto constitucional estadual. Não é, evidentemente, o que ocorre no caso, porquanto livença-prêmio e berçário nada têm que ver com a estrutura do Estado-membro. Com essas considerações, Sr. Presidente, acompanho o voto de V. Ex'. VOTO (VOTO S/ ART. 46) O Sr. Ministro Carlos Velloso: Sr. Presidente, também acompanho o voto de V. Ex', dado que se trata de uma entidade que explora a atividade econômica; a ela se aplica, portanto, a Consolidação das Leis do Trabalho (CF, art. 173, § 1°). Não poderia o Estado-membro legislar a respeito sem infringência ao § 1° do art. 173 da Constituição. Julgo procedente a ação quanto ao art. 46 da Constituição do Paraná. EXTRATO DA ATA ADIn 175 — PR — Rel.: Min. Octavio Gallotti. Recite.: Governador do Estado do Paraná (Advs.: Wagner Brussolo Pacheco e outros) (Adv.: Julio Cesar Ribas Boeng). Reqda.: Assembléia Legislativa do Estado do Paraná (Advs.: Iracema Santos Rodrigues e outros). Decisão: Por votação unânime, o Tribunal julgou improcedente a ação, para declarar a constitucionalidade do § 7° do art. 27 da Constituição do Estado do Paraná. Também por igual votação, julgou procedente a ação, para declarar a inconstitucionalidade dos arts. 46 e 55 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. E, por maioria de votos, julgou procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade do inciso XVIII e suas letras «a» e «b», e do inciso XXI, ambos do art. 34 da mesma Carta, vencidos os Ministros Néri da Silveira e Sepúlveda Pertence. Ainda, após o voto do Relator (Min. Octavio Gallotti), julgando improcedente a ação para declarara inconstitucionalidade dos §§ 1°, 2° e 3° do art. 56 das Disposições Transitórias, o julga- 20 R.TJ. —150 mento foi adiado em virtude de pedido de vista dos autos, formulado pelo Ministro Néri da Silveira. Ausentes, ocasionalmente, o Ministro Paulo Brossard na votação dos arts. 55, 56 e seus §§ 1°, 2° e 3° do ADCT, e o Mini stro Marco Aurélio, quanto a este último dispositivo. Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotti, Presidente em exercício. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence, Celso dg Mello, Carlos Venoso, Marco Aurélio, fintar Gaivão e Francisco Rezek. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Sydney Sanches, Presidente. Procurador-Geral da República, Dr. Aristides Junqueira Alvarenga. Brasília, 17 de março de 1993 — Luiz Tomimatsu, Secretário. VOTO (VISTA) Poderes, no prazo de noventa dias da promulgação desta Constituição. § 3° Aos integrantes dessas carreiras aplica-se, no que couber, o disposto no art. 125, §§ 2° e 3°, desta Constituição.» Verifica-se, desde logo, que os dispositivos têm como destinatários advogados, assessores e assistentes jurídicos estáveis, que exercem funções jurídicas, nos três podere,s• O eminente Relator, Ministro Octavio GallottL teve como constitucionais os dispositivos em apreço, em longa fundamentação, onde invocou, também, a posição no mesmo sentido adotada pelo ilustre Ministro Sepúlveda Pertence, quando do julgamento da medida cautelar. No particular, está o voto do ilustre Relator assim deduzido: «A propósito do art. 56, e seus pará(Art. 56 e parágrafos do ADCT da Consgrados, das mesmas disposições transitituição do Estado do Paraná) tórias paranaenses, teceu, o eminente Ministro Sepúlveda Pertence, quando O Sr. Ministro Néri da Silveira: Pedi do julgamento do pedido cautelar desta vista dos autos, para melhor exame da maação, as seguintes observações, cuja utitéria relativa à argüição de inconstitucionalidade continua presente, a nortear a de'idade do art. 56 e parágrafos, do ADCT, da cisão definitiva: Constituição do Estado do Paraná de 1989, que possuem este teor «Sr. Presidente, pediria a atenção para alguns dados deste caso. «Art. 56 O assessoramento jurídico Trata-se de assistentes, advogados poderes Executivo Legislativo e Judos ou assessores jurídicos dos Três diciário e a representação judicial das Poderes. Recebemos memoriais em autarquias e fundações públicas serão que demonstram, por exemplo, que prestados pelos atuais ocupantes de caros assessores jurídicos do Judiciário gos e empregos públicos de advogados, são funcionários, não só estáveis, mas assessores e assistentes jurídicos estáconcursados. Na verdade, em relação veis que, nos respectivos Poderes, inteaos do Judiciário e do Executivo, exergrarão carreiras especiais. cem funções paralelas àquelas que § 1° O assessoramento jurídico, nos exercem os Procuradores do Estado, órgãos do Poder Executivo, será coordepelo menos, no âmbito de consultonado pela Procuradoria-Geral do Estaria. do, objetivando atuação uniforme. Note-se que, no parâmetro federal, a Advocacia-Geral da União pre-sta §2° As carreiras de que trata este artigo consultoria apenas ao Poder Executiserão criadas e organizadas em classe por vo e, em várias Cartas estaduais, telei de iniciativa dos chefes dos respectivos R.T.J —150 mos visto que, em função disso, se vem tornando direito uniforme nos Estalos a criação de procuradorias das Assembléias. No caso, criamse ainda Procuradorias Judiciárias a título de prestação de assessoria jurídica ao Tribunal. Por isso, não há nenhum escândalo em que tenham o mesmo tratamento dos Procuradores do Estado, digo — leia-se, dos Consultores do Poder Executivo. No plano federal, declaradamente, durante a elaboração da Constituinte, fiz críticas a esse universo que se criou, misturando o serviço do contencioso da União com a consultoria do Poder Executivo, que, a meu ver, envolve a assessoria jurídica da administração federal: o certo é que se criou um monstro no plano nacional, que vai ser reproduzido nos Estados. Agora, pelo menos em termos de cautelar, não vejo cano manta uma situação privilegiada apenas para aqueles que detenham títulos de Procuradores de Estado. Na verdade, todo esse pessoal passará a exercer a função que a Constituição Federal definiu cano 'Advocacia de Estado' (fls. 207/8). Vê-se, desde logo, que, no pertinente ao assessoramento jurídico do Poder Legislativo e do Poder Judiciário, não há margem alguma para a alegação, Sita na petição inicial, de invasão da competência natural da Procuradoria-Geral do Estado. É certo que não possuindo — as Assembléias e os Tribunais — personalidade jurídica própria, sua representação, em juízo, é normalmente exercida pelos Procuradores do Estado. Mas têm, excepcionalmente, aquela órgãos, quando esteja em causa a autonomia do Poder, reconhecida capacidade processual, suscetível de ser desempenhada por meio de Procura- 21 dorias especiais (se tanto for julgado conveniente, por seus dirigentes), às quais também podem ser cometidos encargos de assessoramento jurídico das atividades técnicas e administrativas dos Poderes em questão (Assembléias e Tribunais). Poda-se-á, até, discutir a utilidade dessa prática, jamais porém — penso eu—vir-se a considerá-la adequada às funções da Procuradoria do Estado, integrada no Poder Executivo. Tenho, assim, que, só quanto ao último (o Executivo), poderá assumir algum relevo a controvérsia sobre ser indissociável, da Procuradoria do Estado, a tarefa de assessoramento, entregue, pela Constituição do Paraná, a uma carreira especial, sob a coordenação da Procuradoria-Geral do Estado. Ainda aí, não encontro, porém, obstáculo sério à opção seguida pelo constituinte estadual. Devo resignar-me ao centralismo da Constituição de 1988 que, em alguns pontos — um deles, certamente, o art. 132, ora cogitado — conseguiu superar, nesse desígnio, os regimes anteriores. Nem assim, entendo, porém, que, do citado dispositivo (o art. 132), se possa extrair malha tão estreita, a subjugar as Constituições estaduais, a ponto de impedir a existência (a par da dos Procuradores) de carreiras especiais, voltadas ao assessoramento jurídico, mas sob a coordenação da Procuradoria-Geral, de modo a assegurar a uniformidade de jurisprudência administrativa, onde julgo residir o escopo de norma da Carta Federal. Não em alguma reivindicação de caráter corporativo. 22 R.T.L —150 Note-se que o art. 69 do ADCT de 1988 até ensejou, aos Estados, manter consultorias jurídicas separadas de suas Procuradorias-Gerais; sendo, pois, um minus, em relação a esse permissivo, a preservação de assessorias em carreiras especiais, coordenadas pela Procuradoria-Geral do Estado. Recordo, mais, que, no modelo federal fornecido pela recente Lei Complementar n° 73, de 10 de fevereiro de 1993, adotou-se a divisão tripartida de carreiras, uma delas exclusivamente destinada à consultoria ou assessoramento jurídico, outras duas à representação judicial da União. Não vejo, igualmente, no art. 56, ainda em exame, afronta à exigência do concurso público, eis que os servidores, nele contemplados, são mantidos em cargos da mesma natureza e atribuiçôes dos já exercidos. Não há, pois, investidura em outro cargo, suscetível de contrariar a prescrição constitucional. Ataca-se, por fim, a equiparação de vencimentos, resultante do § 3° do art. 56, entre os integrantes das carreiras ditas especiais e os Procuradores do Estado. Reservas poder-se-iam, em tese, opor, a essa declaração de isonomia, quando se tratasse de vincular carreiras de formação jurídica, mas dotadas de natureza e atribuições diferenciadas (como as da Magistratura, do Ministério Público e a dos Procuradores do Estado ou da União), questão não resolvida, ainda, de modo definitivo, pelo Supremo Tribunal, perante a Constituição de 1988. Quando, se trate, entretanto, de cargos com atribuições análogas ou interligadas (a ponto de a própria inicial sustentar devessem estar obriga- toriamente aglutinadas em uma só carreira), não vejo como se objetar à igualdade de remuneração, entre os seus ocupantes situados nas classes equivalentes.» A Lei paranaense n° 9.422/90 dispôs sobre carreira de Advogado, no âmbito do Poder Executivo. Conforme certidão expedida pela Secretaria da Administração do Paraná, incumbe aos ocupantes desses cargos jurídicos as seguintes atribuições:«a ) assessoramento jurídico dos órgãos do Poder Executivo, compreendendo nesse assessoramento: 1) a análise e a emissão de pareceres em qualquer reivindicação de servidores ativos e/ou inativos do Paraná; 2) a elaboração de minutas de anteprojeto de leis e de decretos; 3) a elaboração de informações em mandados de segurança; 4) a análise e a elaboração de minutas de contratos, convênios e termos de ajuste; 5) participação efetiva na análise dos procedimentos licitatórios do Estado e também a elaboração dos respectivos editais; 6) a representação judicial e extra das autarquias estaduais; 7) outras atividades correlatas». Quanto aos assistentes jurídicos, a especificação da categoria funcional, com base na Resolução n° 8.714, de 21-1-1986, da Secretaria da Administração, indica este conteúdo ocupacional: «Estudar a matéria jurídica e de outra natureza, consultando códigos, leis, jurisprudência e outros documentos, para adequar os fatos à legislação aplicável. — Complementar e operar as informações levantadas para obter o prosseguimento do processo, acompanhando-o em todas as fases. — Examinar e emitir pareceres sobre os processos e expedientes administrativos, consultando códigos, leis, e regulamentações vigentes, para determinar as disposições legais pertinentes. — Elaborar minutas de contratos, decretos, anteprojetos de leis e outros documentos de natureza jurídica. —Representar a parte de que é mandatário, comparecendo às audiências e tomando sua defesa, para plei- R.TJ — 150 tear decisões favoráveis. — Prestar assessoramento jurídico, informando, orientando e recomendando procedimentos em atos e assuntos administrativos. —Executa:outras tarefas correlatas». No que concerne ao assessoramento jurídico, no ambito do Poder Judiciário, a Lei paranaense n° 8.672/1987, criou, no Quadro de Pessoal da Secretaria do Tribunal de Justiça, o «Grupo Ocupacional Especial — Assessoramento e Atividades Jurídicas Superiores», com cargos de provimento efetivo, mediante concurso público de provas e títulos, divididos em três classes (I, II e III), privativos de Bacharéis em Direito. O último concurso ocorreu em 1988, sendo todos os seus integrantes estáveis. As atribuições de Assessor Jurídico do Poder Judiciário, conforme o art. 75 do Regulamento da Secretaria do Tribunal de Justiça do Estado, são as seguintes: «Art. 75. Ao Assessor Jurídico de provimento efetivo incumbe: I — prestar assessoramento jurídico aos dirigentes do Tribunal, Desembargadores, Secretários e Diretores de Departamento; II—pronunciar-se em processos ou expedientes concernentes à administração do Tribunal de Justiça, quando determinado; III — integrar qualquer comissão a critério da cúpula diretiva do Tribunal; —secretariar as sessões dos órgãos julgadores do Tribunal, assim como as de Comissões; V — integrar bancas examinadoras de concursos públicos e processos seletivos de caráter interno para preenchimento de cargos do Quadro de Pessoal da Secretaria do Tribunal de Justiça; 23 VI — elaborar minutas de contratos a serem firmados pelo Tribunal de Justiça; VII —redigir minutas de atos a serem baixados pelos dirigentes do Tribunal de Justiça; VIII — representar o Tribunal de Justiça como preposto, em reclamações trabalhistas, quando designados; IX—acompanhar junto aos órgãos competentes as ocorrências que envolvam veículos do Tribunal de Justiça, preparando os recursos cabíveis; X — exercer outras atribuições que lhe forem conferidas.» De observar é, destarte, que as atribuições dos Assessores Jurídicos do Poder Judiciário, no Paraná, correspondem, também, ao núcleo básico das carreiras jurídicas, quanto aos serviços de consultoria, assessontmento jurídico e inclusive representação, nas hipóteses acima enumeradas. Exame das atribuições dos cargos jurídicos providos por esses servidores estáveis está a indicar, desde logo, que a solução pretendida pelo art. 56 e seus parágrafos do ADCT da Carta paranaense não configura inconstitucionalidade, em determinando se criem, por lei, carreiras especiais no serviço jurídico. Em primeiro lugar, essas carreiras jurídicas não vulneram o art. 132 da Constituição Federal, pois, de explícito, no plano do Poder Executivo, prevêem a existência da Procuradoria-Geral do Estado, conferindolhe a coordenação do assessoramento jurídico, «objetivando atuação uniforme». Consoante bem anotou o eminente Relator, a Constituição Federal, no art. 69 do ADCT, estipulou ser permitido aos Estados manter consultorias jurídicas separadas de suas Procuradorias-Gerais ou Advocacias-Gerais, desde que, na data da promulgação da Constituição, tenham órgãos distintos para as respectivas funções, tal como se verifica, quanto a essas atividades de assessoramen- 24 R.T.J. — 150 to jurídico, no Paraná, anteriormente a 5 de outubro de 1988, para atender, também, aos serviços jurídicos das autarquias e fundações Do mesmo modo, no plano federal, vêm de se compreender na Advocacia-Geral da União, carreiras jurídicas com denominações diversas: Advogado da União, Assistente Jurídico, Procurador da Fazenda Nacional. Destinam-se às diversas atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo e, ainda, à repre.sentação da União, judicial ou extrajudicialmente, a teor do art. 131 da Lei Maior de 1988. Cuida-se, ademais, de situações jurídicas peculiares aos serviços de consultoria, assessoramento jurídico e representação, judicial ou extrajudicial, de autarquias e fundações, do âmbito estadual, sobre as quais cumpre entender, há de estar reservado, ao Estado-membro dispor, na sua autoorganização, ao ensejo em que se implanta uma nova ordem constitucional. De outra parte, pelo conteúdo ocupacional dessas carreiras jurídicas, no plano de cada Poder do Estado, verifica-se existirem situações de cargos assemelhados a justificar a aplicação, como estipula o art. 56, 3°, do ADCT em exame, dos princípios da isonomia e das vedações próprias das carreiras jurídicas a que se refere o art. 135, da Constituição Federal, nos limites já assentados por esta Corte, tal como o prevê, ademais, o art. 125, § 2°, III, da Carta Política paranaense, com a proibição, Por igual, do exercício da advocacia fora das funções institucionais (Constituição do Paraná, art. 125, 3°, I). Do exposto, acompanho, no particular, o voto do ilustre Ministro Octavio Gallotti, dando pela improcedência da ação, quanto ao art. 56 e seus parágrafos, do ADCT da Lei Magna do Estado do Paraná, ora impugnados. VOTO (Sobre o art 56 e parágrafos do Ato das Dispus0es Constitucionais Transitórias) O Sr. Ministro Marco Aurélio: Sr. Presidente, vários são os dispositivos da Carta do Paraná impugnados nesta ação direta de inconstitucionalidade, a saber: artigo 34, inciso XVIII e alíneas a e b, e inciso XXI; artigos 46 e 55 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias; 7° do artigo 27 do corpo permanente da Carta e artigo 56 e §§ 1°, 2° e 3° do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. V. Ex.°, no voto proferido, concluiu pela inconstitucionalidade dos dispositivos do artigo 34, bem como dos artigos 46 e 55 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, e declarou constitucionais o § 7° do artigo 27 do corpo permanente e o artigo 56 e parágrafos do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Creio que o Ministro Néri da Silveira o acompanhou. O Sr. Ministro Octavio Gaifona (Presidente e Relator): Já foi completada a votação quanto a todos eles, exceto o artigo 56 e seus três parágrafos, que estão agora em julgamento. Da Ata, consta que V. Ex.a estaria ausente apenas quando do exame desses três dispositivos. Sobre os demais, V. Ext votou. O Sr. Ministro Marco Aurélio: E o 7° do artigo 27? Em relação a esse artigo já houve a proclamação, também? O Sr. Ministro Octavio Gallotti (Presidente e Relator): Quanto a este, foi julgada a ação improcedente, para declarar-se a sua constitucionalidade. E foi unânime a votação. O Sr. Ministro Marco Aurélio: Sr. Presidente, o artigo ern julgamento, então, tem a seguinte redação: Art. 56. O assessoramento jurídico nos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e a representação judicial das autarquias e fundações públicas serão prestadas pelos atuais ocupantes de cargos e empregos públicos de advogados, assessores e assistentes jurídicos está- R.TJ— 150 vais que, nos respectivos Poderes integrado carreiras especiais. § 1° O assessoramento jurídico, nos Órgãos do Poder Executivo, será coordenado pela Procuradoria-Geral do Estado, objetivando atuação uniforme. § 2° As carreiras de que trata este artigo serão criadas e organizadas em classes por lei de iniciativa dos chefes dos respectivos Poderes, no prazo de noventa dias da promulgação desta Constituição. § 3° Aos integrantes dessas carreiras aplica-se, no que couber, o disposto no artigo 125, §§ 2° e 3°, desta Constituição. Sr. Presidente, tive dúvidas quanto ao dispositivo, em face da regra inserta no artigo 19 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Carta de 1988. Tive dúvidas em relação ao aproveitamento, em carreiras, de servidores que pudessem ser tidos como não estáveis; de servidores que, à época da promulgação da Cada de 1988, não contavam com cinco anos de serviços prestados. Acontece — e o Ministro Néri da Silveira ressaltou esse aspecto —que no caput do artigo 56 alude-se «aos estáveis» ao dispor-se sobre «atuais ocupantes de cargos e empregos públicos de advogado, assessores e assistentes jurídicos estáveis». Então, fica afastada a possibifidadqe de se cogitar de inconstitucionalidade, frente ao citado dispositivo. O outro preceito que me pareceu um pouco ambíguo é o preceito do § 3° do artigo 56, no que remete ao artigo 125, §§ 2° e 3°, &Carta, com a cláusula aio que couber». Temos nos autos a Carta do Estado do Paraná, e os §§ 2° e 3° cuidam da disciplina dos vencimentos, da inamovibilidade e também da impossibilidade de os beneficiários da norma, no caso que estamos examinando, perceberem quantitativo inferior àquele atribuído às carreiras a que se refere o artigo 135 da Constituição Federal, que 25 trata, creio, das carreiras que se integram no capítulo no qual está inserido. «Artigo 135. Às carreiras disciplinadas, neste Título aplicam-se o princípio do artigo 37, XII, e o artigo 39, § 1°.» No título, Sr. Presidente, temos várias carreiras, inclusive a carreira da magistratura. O Sr. Ministro Néri da Silveira: Sr. Ministro, no meu voto, já fiz menção, exatamente, a esse ponto: o Tribunal já fixou uma exegese, entendendo que, no caso, a vinculação é aos Procuradores do Estado. O Sr. Ministro Marco Aurélio: Sr. Presidente, diante do esclarecimento em boa hora prestado pelo Ministro Néri da Silveira, não tenho dúvidas em acompanhar V. Ex.` concluindo, portanto, pela constitucionalidade do dispositivo. Realmente, quando editada a Carta do Estado do Paraná, havia uma situação concreta ligada a estáveis que prestavam o assessoramento jurídico, que normalmente é desenvolvido pelos Procuradores do Estado. Por isso, entendo que não há conflito entre os diversos preceitos do artigo 56 e a Carta de 1988. Retifico o meu voto somente em relação ao § 3°. Aos integrantes dessas carreiras aplica-se, no que couber, a norma do artigo 125, §§ 2° e 3°, desta Constituição Federal. O § 2° é explícito no que revela uma isonomia, consideradas a magistratura e °Ministério Público. Ainda que assentemos, aqui, que a isonomia consagrada nesse § 3° tem como paragonados os Procuradores, a regra é inconstitucional, porque, indiretamente pelo efeito vinculativo, eles, assessores, passaram a perceba o mesmo que um magistrado, um membro do Ministério Público. Peço tia ao Ministro Néri da Silveira, no que sustentou a constitucionalidade do dispostivo, para fulminá-lo. EXTRATO DA ATA ADIn 175 — PR —Rel.: Min. Octavio Gallotti. Reqte.: Governador do Estado do Paraná (Advs.: Wagner Bmssolo Pacheco, 26 R.T.J. —150 Júlio Casar Ribas Boeng e outros). Reqda.: Assembléia Legislativa do Estado do Paraná (Advs.: Iracema Santos Rodrigues e outros). Decisão: Prosseguindo-se no julgamento, o Tribunal, por maioria de votos, julgou improcedente a ação, para declarar a constitucionalidade do art. 56 e seus $$ 1°, 2° e 3° do ADCT da Constituição do Estado do Paraná, vencido, em parte, o Ministro Marco Aurélio, que declarava a inconstitucionalidade, apenas, do § 3°. Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotti. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Néri da Silveira, Paulo Brossard, Saravada Pertence, Celso de Mello, Carlos Velloso, Marco Aurélio, limar Gaivão e Francisco Rezek. Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Moreira Alves e Sydney Sanches. Vice-Procurador-Geral da República, Dr. Moacir Antonio Machado da Silva. Brasília, 3 de junho de 1993 — Luiz Tomimatsu, Secretário. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N° 266 — RJ (Tribunal Pleno) (Medida Cautelar na RTJ 139/413) Relator: O Sr. Ministro Octavio Gallotti Requerente: Governador do Estado do Rio de Janeiro —Requeridos: Governador e Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro Embora, em princípio, admissível a «transposição» do servidor para cargo idêntico da mesma natureza em novo sistema de classificação, o mesmo não sucede com a chamada «transformação» que, visto implicar em alteração do título e das atribuições do cargo, configura novo provimento, a depender da exigência de concurso público, inscrita no art. 37, II, da Constituição. Ação direta julgada, em parte, procedente, para declarar a inconstitucionalidade da expressão «e transformação», contida no caput do art. 1° da Lei fluminense n° 1.643-90. ACÓRDÃO RELATÓRIO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, julgar procedente, em parte, a ação, para declarar a inconstitucionalidade da expressão «e transformação», contida no «caput» do art. 1° da Lei n° 1.643, de 4 de abril de 1990, do Estado do Rio de Janeiro. O Sr. Ministro Octavio Gallotti: Esta ação direta tem, como objeto, o art. 1°, e seu parágrafo único, da Lei n° 1.643, de 4 de abril de 1990, do Estado do Rio de Janeiro, redigidos como segue: Brasília, 18 de junho de 1993 — Octavio Presidente e Relator. «Art. 1° — Os certificados de aprovação do Programa de Aperfeiçoamento e Atualização do Servidor Público, realizado na Fundação Escola de Serviço Público do Rio de Janeiro, antes da vigência da presente lei, terão validade para enquadramento mediante transpo- R.TJ —150 sição e transformação de cargos ou empregos em cargos de Categorias Nacionais de 1° e 2° graus —Parte Permanente dos Quadros de Pessoal das Secretarias de Estado, Órgãos equivalentes a autarquias. Parágrafo único. O disposto no caput deste artigo aplicar-se-á apenas para comprovação de conhecimento equivalente ao exigido para o desenvolvimento de atribuições das categorias funcionais correspondentes, não assegurando direito e prosseguimento de estudo no ensino regular.» Ao relatar o requerimento de medida cautelar, que veio a ser deferido pelo Plenário, em sessão de 25-4-90, assim tive oportunidade de resumir a questão: «É quádruplo o fundamento da im-o. Reside, primeiramente, no art. 22, XXIV, da Constituição Federal, dado que o legislador estadual estaria conferindo escolaridade em hipóteses estranhas às previstas na legislação federal, porquanto a Fundação Escola de Serviço Público não é entidade do sistema regular de ensino, nem está habilitada a expedir diplomas daquela natureza. O segundo fundamento está na invasão da reserva de iniciativa assegurada, ao Governador, pelo art. 61, § 1°, R, c, combinado com o art. 2°, também da Carta da República, no que toca ao regime jurídico dos servidores públicos. Em terceiro lugar, invoca-se o art. 37, II, da Constituição Federal, porque a transformação autorizada no dispositivo atacado, podendo dar-se, segundo a legislação estadual, em cargo de atribuições diversas (v.g., de datilógrafo para médico), implica preterição da exigência de concurso público. Contrariado, estaria, ainda, o princípio da isonomia (art. 5°), visto que a generalidade do ftmcionalismo do Esta- 27 do, para obter melhorias, precisa cursar as oito séries do primeiro grau e as três do segundo, ao passo que, aos privilegiados pelo favor da lei impugnada, é possível as mesmas melhorias, após haver realizado menos cursos de aperfeiçoamento e atualização com carga horária muito inferior (no máximo vinte dias).» (fl. 34) As informações do Presidente da Assembléia Legislativa, às fls. 46/51, sustentam que a sanção, por ele aposta ao projeto respectivo, quando no exercício eventual da chefia do Poder Executivo, supre a falta de iniciativa do Governador, como admitido pela Súmula n° 5, do Supremo Tribunal Federal. Esclarecem que as normas impugnadas não conferem a graduação de cursos regulares do primeiro e segundo graus. Limitam-se a particularizar critérios seletivos de treinamento, aliás previstos na Lei Complementar Federal n° 20/74 (Lei da Fusão), posterior à Lei n° 5.692/71 (Lei de Diretrizes e Bases de Ensino), não havendo, pois, cogitar de invasão da competência legislativa da União (art. 22, XXIV, da Constituição). Consideram, finalmente, que a alegação de ofensa ao art. 32, II, da Constituição faz tabula rasa da previsão de elaboração de planos de carreiras (CF, art. 39, capei) e do estabelecimento de critérios preparatórios a tal objetivo (CF-ADCT, art. 24), institutos de classificação de cargos, genericamente denominados enquadramentos (transposição, transformação, transferência, progressão funcional, ascensão funcional» (fl. 51). Também o ilustre Dr. Miguel Franzino Pereira, oficiando, às fls. 54/8, como Advogado-Geral da União, manifesta-se pela constitucionalidade dos dispositivos atacados, por ser a validade dos.cursos em questão restrita ao efeito de enquadramento fimcional, sem que se trate do provimento de cargos correspondentes a profissões rega- 28 R.T.J. —150 lamentadas (advogado, médico, engenheiro, etc.). Observa que não se fez prova da tramitação defeituosa da lei em questão, e «tendo sido ela sancionada pelo Chefe do Poder Executivo, presume-se que não tenha ocorrido o defeito apontado» (fl. 56). Nem se enquadra, o texto impugnado, nas hipóteses de iniciativa excluída, previstas no art. 61, § 1°, 11, c, da Constituição Federal. No tocante à exigência de concurso público, afirma que o dispositivo atacado «não institui ou regula qualquer forma de provimento derivado. O texto, em sua essência, cuida tão-somente de um dos requisitos para a transposição ou transformação, que são objeto de outras leis (anexos II e III). Se violação possa existir ao art. 37, H, terá ela ocorrido em outros diplomas legais, não neste em discussão.» (fl. 57). No tocante à violação de garantia constitucional da isonomia, obtempera que, a «valer tal argumento, cairiam por terra, qual num jogo de dominó, todos os programas de valorização do servidor público, estaduais e federais» (fl. 57). No parecer de fls. 71/80, após sintetizar as peças até ali constantes dos autos, opina, como abaixo reproduzido, pela improcedência da ação, o eminente Professor Afonso Heariques Fretes Correia: «7. Importa notar, antes de mais nada, que, o que se impugna nesta ação, é, com efeito, a própria Lei n° 1.643/90, em sua inteireza, uma vez que a mesma se resume no artigo 1° e respectivo parágrafo único, indicados na inicial, cuidando o artigo 2° somente de sua entrada em vigor. 8. Dito diploma legal está sendo atacado sob a alegação de ser formal e materialmente inconstitucional, estando presente o vício formal desde o início de sua elaboração, quando, o legislador estadual, além de invadir competência reservada ao legislador federal, dispondo sobre normas gerais de ensino (art. 22, XXIV, da CF), prescindiu da iniciativa do chefe do Poder Executivo, exclusiva, ex-vi do art. 61, § 1°, 11, c, da Constituição Federal, por se tratar de norma atinente a regime jurídico de servidor público, ferindo-se, via de conseqüência o art. 2° da Carta, que garante a independência e harmonia entre os Poderes. Já o vício material estaria consubstanciado na possibilidade decorrente da mesma lei, de ingresso em cargo público sem concurso, contrariando o mandamento do inc. II, do artigo 37, da Constituição Federal. É fácil perceber, pela clareza de seu teor, que a lei em causa não dispõe sobre normas gerais de ensino, assim como não confere graduação em qualquer nível a qualquer servidor. Tampouco versa matéria relativa à educação propriamente dita, referindo-se, isso sim, a requisito para aproveitamento de servidor na Administração Pública estadual, inclusive com respaldo na Lei Complementar Federal n° 20/74. E é sob este último enfoque que poderia, eventualmente, apresentar o alegado vício de inconstitucionalidade. Isto porque, sendo norma pertinente aregime jurídico de servidor estadual, deveria ter partido, com efeito, da iniciativa do chefe do Poder Executivo estadual, nos termos do art. 61, § 1°, II, c, da Carta Federal e em atenção ao princípio da independência e harmonia entre os Poderes (art. 2°). Não obstante, predita lei foi sancionada pelo Governador do Estado em exercício, nada importando, no caso, se o mesmo estava ocupando interinamente o cargo, por ausência do titular, visto agir com os poderes a este conferidos. 11. Cabe aqui lembrar, que o problema de ser a sanção suficiente ou não para suprir a falta de iniciativa do Chefe do Executivo, não tem sido pacífico, existindo opiniões antagônicas, defendendo R.TJ — 150 ora a revogação total da Súmula n° 5, do Colendo Supremo Tribunal Federal, segundo a qual «a sanção do projeto supre a falta de iniciativa do Poder Executivo», ora sua revogação, apenas parcial, para os casos de emendas que aumentem a despesa prevista, ora, ainda, sua revificação com a promulgação da nova Carta Política. Em que pesem todos os argumentos a favor ou contra a vigência dessa Súmula, tem-se que a mesma só foi afastada quanto às emendas a projetos de lei de iniciativa exclusiva do Chefe do Executivo, que viessem aumentar a despesa prevista, orientação esta emanada das expressas disposições do § 1° do art. 60 da Constituição Federal de 1967, repetidas no § 1° do art. 57, da Emenda Constitucional n° 1, de 1969, nesse sentido tendo a Suprema Corte decidido, em várias oportunidades, destacando-se o julgamento da Rp. n° 890/CB, com acórdão publicado na RTJ n° 69/625, que constituiu precedente de outras hipóteses, entre as quais a Rp 1.091-GO — RTJ 103/96 e, recentemente, o RE n° 119.103-1-MA (DJ, de 23-2-90). Remarque-se, que, ainda hoje, perdura a restrição quanto a aumento de despesa em projetos de iniciativa exclusiva do chefe do Poder Executivo e naqueles sobre organização dos serviços administrativos da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, dos Tribunais Federais e do Ministério Público, como se depreende do art. 63, do Estatuto Federal em vigor, sendo nessas situações incabível a invocação da Súmula n° 5, que só subsistiria nos casos em que a sanção não viesse convalidar aumento da despesa prevista. 14. Não há, todavia, nem no regime constitucional anterior, nem no atual, qualquer proibição expressa dessa ordem, no que respeita a simples projetos de lei, que não acarretam aumento da 29 despesa prevista, podendo concluir que a intervenção do Poder Executivo, manifestando positivamente sua vontade, ainda no curso da elaboração de uma lei, para anuir completamente a seu teor, através da sanção, vem imprimir eficácia a esse ato legislativo em formação, suprindo a falta de iniciativa, cuja competência fora definida pelo Texto Fundamental, neste sentido prevalecendo o espírito da Súmula n° 5. Na presente hipótese ainda que na ausência de elementos mais esclarecedores sobre a tramitação do diploma legal em pauta (Lei n° 1.643/90), mas diante da evidente sanção do Executivo, estampada na cópia do Texto integral à fl. 12, parece razoável concluir que a falta de iniciativa foi sanada, tendo em conta que o Texto comentado só pretendeu conferir maior eficácia a mero certificado de aprovação em curso de aperfeiçoamento e amalisstção de servidor público estadual, como forma de propiciar melhor aproveitamento deste pela Administração não estabelecendo aumento ou redução da despesa prevista Não pode, portanto, a Lei n° 1.643/90, por esse prisma, ser considerada inconstitucional. Relativamente ao vício de inconstitucionalidade material, que estaria maculando o dispositivo, hão é preciso ir longe para constatar que o mesmo inexiste, não tendo sido afetados, nem o artigo 37, II, nem o artigo 5°, da Constituição Federal. Desde logo, cumpre destacar, que o preceito impugnado não tem o condão de operar transposição ou transformação de cargo público, como tampouco promover enquadramento dos servidores que aproveita. Limita-se a possibilitar, como dito, mediante valorização de um requisito, um mais adequado aproveitamento de servidores no âmbito da 30 —150 Administração estadual. Não concede, por si só, o direito de ingresso em qualquer cargo, seja originário ou transformado, bem como não dispensa o destinatário de prestar concurso, quando este se faz necessário. Tão-somente prestigia um certificado de aperfeiçoamento que não gera outra expectativa, a não ser a de pleitear uma possível melhoria no serviço público, sem, no entanto, dispensar outros requisitos previstos na legislação respectiva. Ressalta, ao menor exame, que o dispositivo em questão não garante graduação ou escolaridade a alguém, como não convalida diploma algum, muito menos de nível superior, o que deflui clara e explicitamente de seu teor, estabelecendo, inclusive, no § 1°, que não se assegura direito a prosseguimento de estudo no ensino regular. Não se encontra no texto contestado qualquer nuance que leve a concluir que pelo menos se pretendeu contornar a exigência de concurso público, com ofensa à Lei Magna, pois, assim como ele não dispõe sobre a transformação ou transposição propriamente ditas, também não dá direito a ingresso direto nos cargos daí oriundos, não promovendo servidor a cargo algum; somente lhe proporciona um elemento que poderá levá-lo a uma situação melhor, mais condizente com sua nova formação, cujo ingresso poderá ou não depender de concurso público, do qual a Lei n° 1.643/90 não cuida, e é somente esta que se encontra em discussão, sendo estranhas ao âmbito da presente ação quaisquer indagações quanto à constitucionalidade ou não de leis que regulem efetivas formas de movimentação de servidores estaduais, com ou sem concurso, aí compreendidas as que disponham sobre transposição e transformação de cargos públicos. Finalmente, não há como admitir que as disposições da Lei n° 1.643/90 ofendam o princípio da igualdade, já não consagrou explícita ou implicitamente forma de desigualdade entre iguais. Ao contrário, facultou tratamento igual a iguais, porquanto se destinam a todos aqueles que, dentro de certas condições definidas em lei, se dispuseram a seguir o curso de aperfeiçoamento de que se cogita, deixando de contemplar, como é de justiça, aqueles que não o fizeram, apesar de para tanto poderem se habilitar. Ao que conta, não foi essa Lei n° 1.643/90 que estabeleceu os requisitos para ingresso em tal curso, alcançando, unicamente, os servidores que, habilitados, chegaram a se diplomar. Daí ser totalmente inoportuna a aleg'ção de ofensa ao princípio inscrito no artigo 5° da Lei Fundamental. Face ao que foi exposto, é o parecer no sentido de que se julgue improcedente a ação.» (fls. 75/80) Deste Relatório, distribuam-se cópias aos Srs. Ministros em cumprimento ao disposto no art. 172 do Regimento Interno. VOTO O Sr. Ministro Octavio Gallotti (Relator): A lei impugnada versa, efetivamente, matéria relativa ao regime jurídico de servidor público e originou-se de projeto de iniciativa parlamentar, mas foi sancionada pelo Governador, então em exercício. A mconstitucionalidade formal, argüida perante o art. 61, §§ 1°, 2°, c, deve ser afastada, em obséquio ao enunciado da Súmula n° 5, do Supremo Tribunal: «5. A sanção do projeto supre a falta de iniciativa do Poder Executivo» Esse verbete, aprovado na vigência da Constituição de 1946, subsistiu na prática da de 1967, com a ressalva de não ser aplicável ao caso de projeto ou emenda causadores de aumento de despesa, dada a proibição terminante introduzida pelo pa- R.TJ —150 rágrafo único do art. 57 daquela segunda Carta (a de 1967), que encontra correspondência no art. 63 da atual. Vejam-se, a propósito dessa questão, os acórdãos na Representação n° 1.099, e outros compendiados no voto que tive a ocasião de proferir como Relator do Recurso Extraordinário n° 119.103 e se acha publicado no volume 131 da «Revista Trimestral de Jurisprudência». (Págs. 424/7). Não estando em causa essa hipótese especial (aumento de despesa) é, portanto, de aplicar-se a orientação consagrada pela Súmula do Supremo Tribunal. Não procede, por igual, a assertiva da invasão da competência legislativa da União sobre diretrizes e bases da educação nacional. Não se trata aqui de regular os cursos, diplomas ou graduações disciplinados na legislação federal de ensino (especialmente a Lei n° 5.692-71): só da edição de norma de direito administrativo, relativa à seleção e treinamento de servidores, cujas funções não se compreendam entre as atividades profissionais regulamentadas pela União. No tocante ao princípio da isonomia (art. 5° da Constituição), merece mais detido exame a alegação de sua contrariedade na feição específica que lhe confere outro dispositivo da mesma Carta, o art. 37, em seus dois primeiros incisos, a garantir o acesso aos cargos públicos e cuidar do provimento deles, mediante concurso. A circunstância de não outorgar enquadramento automático, nem por si só instituir transposição ou transformação, não basta, data venta, para imunizar a regra impugnada do controle constitucional, sob o prisma da exigência do concurso, como propõe o parecer da douta ProcuradoriaGeral da República. Precisamente por não serem, os certificados em questão, instrumentos do ensino em geral, e sim títulos ou requisitos de investidura em cargo público, não logro divisar como possa, a legitimidade desse 31 provimento derivado vira ser dissociada do pressuposto de constitucionalidade da norma que o tem como única finalidade. Dentro dessa linha de apreciação, penso caber, desde logo, a distinção entre as duas espécies de provimento compreendidas no art. 1° da Lei estadual n° 1.643/90, impugnada por meio desta ação. A chamada «transposição» simplesmente reside na «passagem de um cargo atual para cargo idêntico da mesma natureza, do novo sistema classificatório» (art. 14, IV, a, do Decreto-Lei n° 408/79, do Rio de Janeiro) ou no «deslocamento de um cargo existente para classe de atribuições correlatas do novo sistema» (art. 9°, 1°, b, do Decreto federal n° 70.320/72). Já a «transformação» chega a consistir na «alteração de titulação e atribuições do cargo com seu ocupante» (art. 14,1V, b, do Decreto-Lei estadual citado), ou na «alteração das atribuições de um cargo existente» 1°, a, do Decreto federal n° (art. g', 70.320/72). Como se vê, ao passo que a transposição não atinge a natureza ou as atribuições essenciais do cargo, são ambas alteradas (além da denominação), pela chamada transformação, por meio da qual se opera uma modificação substancial, capaz de intrinsicamente caracterizar um novo provimento do cargo. A circunstância de cuidar-se de um segundo provimento, também conhecido como provimento derivado, perde significado quando se atenta para que o texto do art. 37, II, da Constituição de 1988, não mais restringe a exigência do concurso à primeira investidura, como sucedia na Carta revogada, em seu art. 97, 1°. Essa importante evolução foi bem ressaltada pelo eminente Ministro Moreira Alves, como Relator das Ações Diretas n°s 231 e 245. A transformação de cargos foi concebida como instrumento transitório da aplica- 32 R.T.J. — 150 ção de determinado plano de classificação (o da Lei Federal n° 5.645, de 1970). Ao perenizar essa prática circunstancial, a Administração Pública não só desvirtua a concepção original da medida, como a partir da promulgação da Carta de 1988, passa a incidir na eiva de inconstitucionalidade. Julgo procedente, em parte, a ação, para declarar inconstitucional a expressão «e transformação» no art. 1° da Lei n° 1.643, de 4 de abril de 1990, do Estado do Rio de Janeiro. EXTRATO DA ATA ADIn 266 — RJ —Rel.: Min. Octavio Gallotti. Reqte.: Governador do Estado do Rio de Janeiro (Advs.: José Eduardo Santos Neves e outros). Recdos.: Governador e Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro. Decisão: Após o voto do Relator, julgando procedente em parte a ação, para declarar a inconstitucionalidade das expressões «e transformação», contidas no «captai» do art. 1° da Lei n° 1.643, de 4 de abril de 1990, do Estado do Rio de Janeiro, o julgamento foi adiado em virtude do pedido de vista do Ministro Moreira Alves. Presidência do Sr. Ministro Sydney Sandia. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira, Octavio Gallotti, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Valioso, Marco Aurélio e limar Gaivão. Procurador-Geral da República, Dr. Aristides Junqueira Alvarenga. Brasília, 1° de abril de 1992 — Luiz Tomimatsu, Secretário. VOTO (VISTA) O Sr. 11finistro Moreira Alves: 1. Pedi vista apenas para examinar ajurisprudência desta Corte quanto àprimeira parte do voto do eminente relator que afasta, no caso, a inconstitucionalidade formal da lei em causa com base na Súmula n° 5, sob o fundamento de que tal Súmula só não é aplicável a partir da Constituição de 1967 pela proibição introduzida pelo parágrafo único do artigo 57 desta, que, à semelhança do disposto no artigo 63 da Carta Magna atual, se limita às hipóteses de projeto ou emenda de que decorra aumento de despesa. Estando o voto do eminente relator em conformidade com a jurisprudência da Corte, como verifiquei do exame a que procedi com relação a ela, também não acolho, no caso, a argüição de inconstitucionalidade formal da lei sob exame. Tenho-a, no entanto — como S. Ex.' e pelos fundamentos expostos em seu voto —, por inconstitucional no tocante à expressão «e transformação», no artigo 1°. Também julgo, pois, procedente, em parte, a ação, para declarar inconstitucional a expressão «e transformação» no artigo 1° da Lei n° 1.643, de 4 de abril de 1990, do Estado do Rio de Janeiro. EXTRATO DA ATA ADIn 266 — RJ — Rel.: Min. Octavio Gallotti. Regro.: Governador do Estado do Rio de Janeiro (Advs.: José Eduardo Santos Neves e outros). Reqdos.: Governador e Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro. Decisão: Por votação nnanime, o Tribunal julgou procedente, em parte, a ação, para declarar a inconstitucionalidade da expressão «e transformação», comida no «caput» do art. 1° da Lei n° 1.643, de 4 de abril de 1990, do Estado do Rio de Janeiro. Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotti. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Moreira Alva, Néri da Silveira, Sydney Sanches, Paulo Brossard, Maro Aurélio, Binar Gaivão e Francisco Rezek. Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e Carlos Valioso. Vice-Procurador-Geral da República, Dr. Moacir Antonio Machado da Sn/ va. Brasília, 18 de junho de 1993 — Luiz Tomimatsu, Secretário. R.TJ — 150 33 MANDADO DE INJUNÇÃO N° 413 (AgRg) — DF (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves Agravante: DPR — Indústria de Moda 1.2da. — Agravado: Presidente da República Agravo regimental. Segundo a orientação desta Corte, o original da petição transmitida por fac-símile, deve dar entrada no Protocolo do Tribunal dentro do prazo do recurso. — Não-ocorrência disso, no aum. Agravo regimental não conhecido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na con- fremida& da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, não conhecer do agravo regimental. Brasília, 11 de março de 1993 — Octa- vio Gallotd,Presidene— Moreira Alves, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Moreira Alves (Relatar): Neguei seguimento ao presente mandado de injunção pelo seguinte despacho: 1. «Trata-se de mandado de injunção que se impetra contra a omissão do Exmo. Sr. Presidente da República de fixar o índice de correção monetária a ser aplicado em procedimentos falimentares. Alega a impetrante que 'no caso a competência para a fixação do índice adequado de correção monetária a ser aplicado nos procedimentos falimentores é do Sr. Presidente daRepública, nos precisos termos do artigo 84, IV, da Constituição Federal de 1988' (fl. 8). 2 Sucede, porém, que de acordo com o disposto no artigo 5°, DOM da Com- tituição Federal, o mandado de injunção só é cabível quando falta norma regulamentadora que toma inviável o exercicio dos direitos e liberdades constituciomis e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e cidadania. Isso implica dizer que s6 cabe mandado de injunção quando falta a regulamentação de texto constitucional que outorgue direito, liberdade ou prerrogativa inerente à nacionalidade, à soberania, e à cidadania, falta essa que inviabiliza o exercício de qualquer um deles. No caso, não se invoca — porque não há—qualquer dispositivo constitucional que outorgue direito, liberdade ou prerrogativa cujo exercício dependa, para ser viabilizado, de regulamentação (que só poderia fazer-se por lei) ou, pelo menos, da iniciativa exclusiva do Exoro. Sr. Presidente da República. Em face do exposto, e com base no artigo 38 da Lei o° 8.038, nego seguimento ao presente mandado de intimção, ficando, assim, prejudicada a apreciação do pedido de liminar.» (ti. 15) Contra essa decisão, publicada em 1° de fevereiro do corrente ano, foi interposto agravo regimental por meio de fax, protocolado em 8 do mesmo mês, tendo o origi- 34 R.T.J. — 150 nal dado entrada nesta Corte no dia seguinte. Nesse agravo, alega-se: § 1° do artigo 5° da Constituição Federal determina que as normas defmidons dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata. O § 2° do mesmo artigo preceitua que os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados. O artigo 5° da Constituição Federal não pode sofrer interpretação restritiva, porque eliminaria, justamente, direitos e deveres individuais e coletivos, fundamentais. O artigo 3° da Lei de Introdução ao Código Civil dispõe que na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais que ela se dirige, e às exigências do bem comum. O Colendo Supremo Tribunal Federal ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 483-0, declarando a inconstitucionalidade da Lei n° 8.177, de 1°-3-91, demonstrou a inaplicabilidade dos índices de correção monetária. Por força do princípio da divisão dos Poderes o Excelso Pretório não poderia ir além, mas agora, mediante a provocação constante do Mandado de Injunção n° 413-7, pode e deve completar o julgamento histórico, determinando a elaboração de norma regulamentadora sobre a correção monetária nos procedimentos falimentares. A falta da norma regulamentadora torna inviável o livre comércio, e conduzirá à falência de empresários brasileiros, os quais estão sendo compelidos, diariamente, pelo Poder Judiciário, ao pagamento da Taxa Referencial — TR/TRD, extorsiva, inconstitucional, e que não possui a característica de neutralidade. A utilização de uma taxa neutra de correção monetária é prerrogativa do cidadão brasileiro e do comerciante. Sua inexistência coloca em perigo direitos, liberdades e prerrogativas essenciais, garantidos na Constituição Federal.» (fls. 24/25) Havendo mantido o despacho agravado, trago o agravo a julgamento deste Plenário. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): 1. Publicado o despacho agravado em 1° de fevereiro do corrente ano, terminou, em 8 do mesmo mês, o prazo para a interposição dele. Nesse dia 8 deu entrada nesta Corte a petição de agravo, em fac-símile, inclusive sem qualquer autenticação. Só no dia seguinte, quando já se escoara o prazo de interposição do recurso, é que ingressou em nosso Protocolo a petição original. 2. Em face do exposto, e consoante a orientação já fumada por esta Corte no sentido de que, nesses casos, a observância do prazo se afere da data de ingresso, no Protocolo da Corte, do original da petição, não conheço do presente agravo. EXTRATO DA ATA MI 413 (AgRg) — DF — Rel.: Min. Moreira Alves. Agte.: DFR Indústria de Moda Ltda. (Advs.: Álvaro Alvares da Silva Campos e outros). Agdo.: Presidente da República. Decisão: Por votação unânime, o Tribunal não conheceu do agravo regimental. Votou o Presidente. Ausente, ocasionalmente, o Ministro Francisco Rezek. Procurador-Geral da República, Dr. Moacir Antonio Machado da Silva, na ausência ocasional do Dr. Aristides Junqueira Alvarenga. Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotti, Presidente em exercício. Presentes à R.T.J —150 35 Sessão os Srs. Ministros Moreira Alves, curador-Geral da República, Dr. Aristides Néri da Silveira, Paulo Brossard, Sepúlve- Junqueira Alvarenga. da Pertence, Celso de Mello, Carlos Valioso, Marco Aurélio, limar Gaivão e Francisco Rezek. Ausente, justificadamente, o Sr. Brasília, 11 de março de 1993 — Luiz Ministro Sydney Sanches, Presidente. Pro- Tomimatsu, Secretário. RECLAMAÇÃO N° 433 — DF (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro Ilmar Gaivão. Reclamante: Marco Antônio da Morta Tenório — Reclamado: Presidente do Senado Federal. Reclamação. Alegação de descumprintento da decisão do Supremo Tribunal Federal, em mandado de segurança, que declarou a ruindade do ato de exoneração do reclamante por ter sido editado por autoridade incompetente. Alcance que lhe pretende impor o reclamante. Se o acórdão no mandado de segurança, cuja autoridade está em causa, restringiu-se a declarar a nulidade da dispensa, posto que o agente que a praticou não tinha competência, nada impedia a renovação do ato pela autoridade julgada competente, sem que, com isso, ocorresse desrespeito à decisão da Corte. A pretensão do reclamante à ampliação do julgado, para que lhe seja reconbedda a condição de servidor, em face da natureza do vínculo que o une ao órgão, constitui matéria estranha ao julgamento do mandado de segurança. Reclamação julgada improcedente. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, por seu Tribunal Pleno, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em julgar improcedente a reclamaflto. Brasília, 5 de agosto de 1993 — Odavio Gallotti, Presidente — limar Gaivão, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro limar Gaivão (Relator): Marco Antônio da Mota Tenório ajuizou reclamação contra o Presidente do Se- nado Federal, apontando, como decisão do Supremo Tribunal Federal cuja autoridade estaria sendo desafiada, o v. acórdão proferido no Mandado de Segurança n° 21.117 — DF, de que fui relator, que declarou a nulidade do ato de sua exoneração por ter sido editado por autoridade incompetente para o exercício do poder de demitir servidores. Alega o reclamante que a conseqüência do julgado desta Corte seria a anulação do ato de sua dispensa e a sua permanência no cargo de assessor, de provimento efetivo, resultante da transformação operada pela Lei n° 8.112/90, que implantou o Regime Jurídico Único, mas que, entretanto, isso não ocorreu, tendo-se limitado a autoridade 36 R.T.J. — 150 reclamada a determinar que o Diretor do Centro Gráfico do Senado Federal — CEGRAF promovesse o ato de sua exoneração, não lhe pagando, todavia, a remuneração advinda da anulação do ato de demissão pelo Supremo Tribunal Federal. Foram prestadas informações pela autoridade reclamada, que, em sua essência, aduz (fls. 24/27): «A matéria objeto da presente controvérsia, em razão de manifestação com fundamentos semelhantes, na esfera de competência administrativa, já foi, anteriormente, objeto de apreciação por parte dos órgãos de assessoria jurídica do Senado Federal e do seu Centro Gráfico, tendo o Diretor Executivo do CEGRAF, à época, exaurido a questão, através da Exposição de Motivos n° 021/92-DE, encaminhada à esta Presidência no Processo if 009496/92-0, informando: «Trata o presente feito de representação manifestada pelo ex-servidor Marco Antônio da Mota Temido, Assessor DAS-3, insurgindose contra o Ato n° 244/92 de sua dispensa, desta Diretoria Executiva, baixado de acordo com a competência expressa regulamentar, prevista no artigo 25, III, do Ato ne 10n9, da Comissão Diretora do Senado Federal e consoante o entendimento fumado pelo Supremo Tribunal Federal, ao julgar, em 28-5-92, o Mandado de Segurança if 21.117-2/160, impetrado pelo referido interessado. A mencionada dispensa, procedida validamente por esta Diretoria Executiva, ateve-se à conveniência do respectivo ato, por se tratar de cargo de confiança, de livre exoneração, de demissibilidscha ad nutrira, cuja natureza e o vínculo de ex-servidor, não teve modificação em razão da decisão do Pretório Excelso, ao apenas anular o ato anterior impug- nado judicialmente, originário da digna Presidência do Senado Federal, vez que a competência expressa para a prática do ato é da Diretoria Executiva, na forma do Regulamento Administrativo do Órgão. Assim, no âmbito do seu poder discricionário, dentro dos limites de sua competência, definida, inclusive, pelo próprio Supremo Tribunal Federal, esta Diretoria Executiva não tinha como manter no cargo, de livre exoneração, de Assessor DAS-3, o ex-servidor, pois ausentes os pressupostos para a sua manutenção neste cargo de confiança, havendo ipso fato a conveniência de sua dispensa. A decisão do Pretório Excelso, como se vê dos termos do próprio Oficio n° 618/P que a Presidência daquela Corte Suprema encaminhou ao Senado Federal, não assegurou ao interessado a condição de servidor em caráter efetivo para a pretendida Inserção' no Quadro Permanente de Pessoal do CEGRAF. Via de conseqüência, com a anulação tão-só do ato primitivo de demissão elaborado pela Presidência do Senado Federal, sem qualquer indicação de outras conseqüências jurídicas, toma evidente que o interessado apenas retomou ao cargo de Assessor DAS-3, inapelavelmente de livre exoneração. Considere-se que este posicionamento já restou demonstrado no Parecer da Assessoria Jurídica e na Exposição de Motivos encaminhada, à época, à elevada consideração da Presidência do Senado Federal, às fls. 5/15, do Processo 007766/92-0, em anexo, que determinou ao Diretor-Geral da Casa que desse ciência ao interessado do novo ato de sua dispensa. R.TJ —150 Por outro lado, cabe ressaltar que até hoje não foi publicado o acórdão relativo ao julgamento do mencionado Mandado de Segurança, sujeitando a decisão a interposição de recursos, como, por exemplo, embargos de declaração. Trata-se de um julgamento cuja decisão ocorreu por maioria, de apenas um voto, o que caracteriza a complexidade da matéria contida na impetração, a impor toda a cautela de Administração para o rigoroso cumprimento da determinação judicial. A Lei n° 5.021, de 9 de junho de 1966, dispõe sobre o pagamento de vencimentos em sentença concessiva de mandado de segurança, a servidor público civil. Assim sendo, após o trânsito era julgado da referida decisão, o que até agora não ocorreu, ainda será feita a liquidação judicial de sentença, por 'cálculo', relativa ao crédito dos estipêndios atrasados, nos termos do art. 1°, § deste supracitado dispositivo legal. Feitas estas considerações, não procedem os termos da representação articulada pelo requerente já que esta Diretoria Executiva procedeu em restrita obediência às normas legais em vigor, aplicáveis à espécie, atuando nos limites de sua competência regulamentar, praticando ato formal e substancialmente legítimo, pelo critério de conveniência administrativa, prerrogativa esta definida e proclamada pelo Supremo Tribunal Federal ao julgar a ação mandamental do requerente.» O mencionado acórdão, portanto, está, ainda, pendente de publicação, como o próprio Reclamante esclarece no seu pedido, ressaltando que a decisão judicial não transitou em julgado, facultando-se, em decorrência, a interpo- 37 sição de recurso por parte da AdvocaciaGeral da União, implantada atualmente. Não há, assim, nenhum fundamento fático ou legal a autorizar pretensão reclamatória. O Ofício n" 618/1', dessa Excelsa Corte, de 2-6-1992, ao comunicar a anulação do Ato desta Presidência n° 16/90, assegurou, também, ao Diretor Executivo do CEGRAF, o exercício pleno dos atos administrativos, de sua petência, sem qualquer restrição não sendopertinente hipótese de ' de demissão desmotivada, vez que relativa a ato de dispensa de cargo em comissão, de livre exoneração, assim definido por lei. Neste sentido, ao ser estabelecida a situação funcional do Reclamante, por ato desta Presidência, a Diretaiado CEGRAF, diante da faculdade legal, de estrita observância à conveniência administrativa, mediante procedimento distinto, exonerou o ex-servidor do cargo que ocupava, por se tratar, como visto, de cargo de confiança, de livre exoneração, dando ciência de todos os atos praticados ao ora Reclamante.» parecer da Procuradoria-Geral da República opinou pela improcedência da reclamação. É o relatório. VOTO Sr. Ministro limar Gaivão (Relator): Sobre o mérito, opinou o Ministério Público Federal, nos seguintes termos (fis. 50/51): «O acórdão em causa ainda não foi publicado; mas obtive cópia do oficio enviado ao presidente do Senado pela Presidência do Tribunal, em que se deixa claro o motivo da concessão majoritária da segurança: apenas a incompetência do impetrado, posto que cabia ao Diretor-Executivo do CEGRAF a dispensa dos servidores do órgão. Diversamente do que pretendia o impetrante, 38 R.TJ. — 150 hoje reclamante, não há notícia de que o Tribunal tenha aceitado a tese, por ele defendida, de que não se tratava de emprego em comissão; da mesma forma, não consta que tenha sido acolhido o argumento da necessidade de motivarse o ato de dispensa. Em nenhum momento, atribuiu-se ao impetrante um inexistente direito de permanecer no cargo de provimento em comissão resultante da transformação do antigo emprego da mesma natureza. Como o único vicio que levou à anulação do ato foi a incompetência do agente, nada impedia sua renovação pela autoridade julgada competente — o Diretor-Executivo do CEGRAF. Observo a desnecessidade da anulação da dispensa pelo Presidente do Senado, porque já feita pelo Judiciário, bem como da reintegração formal do ora reclamante, porque simples efeito da decisão judicial. De todo modo, consta dos autos que o julgado foi cumprido (fl. 29), com a extensão referida no ofício cuja cópia estou anexando a este parecer. O pagamento das vantagens pecuniárias devidas em razão do julgamento do mandado de segurança (Súmula n° 271, do Supremo Tribunal Federal) será feito de acordo com o disposto na Lei n° 5.021, de 9 de junho de 1966, e pressupõe o trânsito em julgado do acórdão. Eventuais parcelas anteriores ao ajuizamento da segurança deverão ser reclamadas em ação própria, se não forem pagas administrativamente. Na verdade, a exoneração contra a qual o impetrante se insurge é ato novo, a ser impugnado em nova ação. Dado que o reclamante teve ciência de tal ato há quase um ano, noto que não é mais viável o ataque por via de mandado de segurança, para cujo julgamento, aliás, o Supremo Tribunal Federal seria incompetente. O que o reclamante pretende, na verdade, é ampliar o julgamento anterior, para abranger questões por ele suscitadas, mas não acolhidas pelo Tribunal. De desrespeito a tal julgado, não se pode cogitar e, por isso, a reclamação é improcedente.» O acórdão do MS 21.117, cuja autoridade está em causa, restringiu-se a declarar a nulidade da dispensa, posto que a competência, para produção do ato, não cabia ao Presidente da Comissão Diretora do Senado, mas sim ao Diretor-Executivo, nos termos do próprio regulamento do Centro Gráfico do Senado Federal — CEGRAF. Só se prestou o mandado de segurança para essa mera declaração de nulidade. Donde, no seu julgamento, não ter sido apreciada a natureza do vínculo que unia o impetrante ao Centro Gráfico do Senado. Aduzi a propósito no voto que, então, proferi: «Tal conclusão afasta, por absolutamente irrelevante ao desfecho da controvérsia, a questão, também argüida nas informações e no parecer da douta Procuradoria-Geral da República, da natureza do contrato que vinculava o impetrante ao CEGRAF. Efetivamente, evidenciada a incompetência do impetrado para produção do ato impugnado, é de reconhecer-se a nulidade deste, não importando saber se o vínculo que une o impetrante ao CEGRAF é, ou não, de natureza temporária, baseia-se, ou não, em confiança, reveste-se, ou não, da garantia da estabilidade». Só cabe examinar, no juízo da reclamação, se a autoridade da decisão do Supremo Tribunal Federal foi, ou não, desrespeitada. E a conclusão a que se chega, nesse caso, é negativa, já que a concessão da segurança não teve o alcance que lhe pretende impor o reclamante. Nesse ponto, entendo inteiramente procedentes as R.T.J — 150 razões do parecer da Procuradoria-Geral da República. Assim sendo, julgo improcedente a reei—o. EXTRATO DA ATA Red. 433 — DF — Rel.: Min. limar Gaivão. Recite.: Marco Antonio da Mota Tenório (Adv.: Sebastião Baptista Affonso). Reciclo.: Presidente do Senado Federal. Decisão: Por votação unânime, o Tribunal julgou improcedente a reclamação. 39 Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotti. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira, Sydney Sanches, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Venoso, Marco Aurélio e Ilmar Gaivão. Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Paulo Brossard e Francisco Rezek. Vice-Procurador-Geral da República, Dr. Moacir Antonio Machado da Silva. Brasília, 5 de agosto de 1993. Luiz Tomimatsu, Secretário. SUSPENSÃO DE SEGURANÇA N° 529 (AgRg) — RS (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro Octavio Gallotti. Agravante: Círculo de Pais e Mestres da Escola Estadual de Segundo Grau Padre Reus — Agravados: Estado do Rio Grande do Sul e Relator do MS n° 592121768 do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Diversificação de calendário escolar. Índole constitucional da matéria questionada. Inconveniência, já assentada pelo Plenário (ADIn 748) de introduzir-se alteração de períodos letivos durante o curso dos mesmos. Agravo Regimental a que se nega provimento, para manter a suspensão da segurança. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tri- banal Federal, em Sessão Plenária, na con- formidade da ata do julgamento e das notas taquignificas, por unanimidade de votos, negar provimento ao agravo regimental. Brasília, 24 de junho de 1993 — Octavio Ganota Presidente e Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Octavio Gallottl: A medida liminar (cuja suspensão se requer) houve por bem autorizar a unificação, em determinado estabelecimento de ensino, de calendários escolares que haviam sido diversificados pelo Decreto n° 34.185, de 21-1-92, do Governador do Rio Grande do Sul. Deferida a suspensão pelo despacho do eminente Presidente Sydney Sanches (às fls. 135/9), ingressou o presente Agravo Regimental (fls. 166/9) onde os impetrantes, em suma, argumentam no sentido de que não se discute, no mandado de segurança, a constitucionalidade ou a legaliti tab. do citado Decreto estadual, mas somente a sua aplicabilidade, ao caso concreto, dada a comprovada inexistência de excedentes, a justificar a implantação dos novos calendários. Após resumir a controvérsia, opina a douta Procuradoria-Geral da República, ante as seguintes razões expendidas pela 40 R.TJ. — 150 ilustre Dra. Anadyr de Mendonça Rodrigues, Subprocuradora-Geral da República: «4. Tudo posto, afigura-se desde logo patente que as razões do Agravo Regimental extrapolam do limitado âmbito do pedido de Suspensão de Segurança, pois — conforme remissão já feita no Parecer de fls. 128/133 —, no entender dessa Excelsa corte, «Em suspensão de segurança, não se discute o mérito do mandado de segurança, mas, tão-só, se verifica a ocorrência, ou não, de qualquer das hipóteses previstas no art. 297 do RISTE, isto é, se da liminar ou da decisão, em mandado de segurança, resulta ameaça de grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia pública. Compreende-se no conceito de ordem, ut art. 297 do RISTE, também a ordem administrativa.» (SS 303-8-AgRg-DF, Rel. Min. Néri da Silveira, in ni de 26-4-91, Pág. 5094); Estão, no entanto, limitadas unicamente ao mérito do mandado de segurança, as razões do Agravo Regimental, quando abordam a alegada desnecessidade de aplicação do Decreto local n° 34.185, de 1992, e do sistema que instituiu, no que tange ao Colégio Padre Reus, de Porto Alegre. Poderia até acontecer, eventualmente, que a lesão à ordem administrativa realmente findasse por não se consumar, caso ficasse o Colégio Padre Reus, de Porto Alegre, excluído do sistema rotativo implantado por força do Decreto local n° 34.185, de 1992. 7. Veja-se, contudo, que a consumação da lesão não constitui requisito de presença essencial à concessão da Suspensão de Segurança. De fato, nos termos do art. 4° da Lei n° 4.348, de 1964, é suficiente, apenas, que exista a ameaça de grave lesão aos valores que quis proteger, para ficar legitimado o deferimento do pedido de Suspensão de Segurança, porquanto é cabível, nos casos em que o cumprimento imediato do julgado ou da liminar pode ferir ou ameaçar os interesses superiores legalmente protegidos.» (In RTJ 118/861) Bem por isso, em nada aproveitam ao Agravante as argüições feitas, visto como se mostram restritas à questão da inconveniência e da inoportunidade de aplicação do Decreto local n° 34.185, de 1992, e do sistema que instituiu, no que respeita ao Colégio Padre Reus, de Porto Alegre. Ademais, restou incólume ao ataque do Agravo Regimental o seguinte fundamento, de que se serviu a R. decisão presidencial agravada: «O Supremo Tribunal Federal já decidiu que a sustação da aplicação do artigo 3° do Decreto n° 34.185, de 30 de janeiro de 1992 — que implantou tal Calendário Escolar Rotativo —, envolve prejuízo a interesse público, ao deferir medida cautelar, na ADIn 748-3-RS.» (fls. 138/139) Por fim, não é demais consignar que perdeu seu ensejo — ante o transcurso do tempo — a alegação do Agravante atinente aos prejuízos dos alunos que ficariam impedidos de concorrer ao exame vestibular para ingresso em Universidades: «Prejuízos estes que importam na perda de um ano inteiro letivo dos alunos que estejam nos sistemas b e c, os quais não poderão exercer o direito ao Concurso Vestibular vindouro, estabelecendo, assim, uma solar discriminação destes em rela- R.TJ —150 ção aos alunos do calendário ca», que terão tal oportunidade logo;» (fls. 166/169) 12.0 parecer é, por conseguinte, de que o Agravo Regimental não comporta provimento.» (fls. 20W11) É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Octavlo Gallotil (Relatar): Embora os agravantes procurem reduzir a controvérsia ao ponto referente à rasoficiênciade procura de vagas parajustificar a diversificação do calendário, é cato que a causa comporta as implicações de ordem constitucional suscitadas pelos próprios impetrantes na ação cautelar inominada, cuja &ninar acabou garantida no mandado de segurança (art. 206, I e art. 227, fl. 79) e pelacontestação do Estado, à fl. 90 (art. 82, e VII). De outro lado, no acórdão do Supremo Tribunal que suspendeu a eficácia do Deacto legislativo estadual, de modo a restabelecer a do Decreto executivo unificador do calendário (ADIn 748), ficou registrada a inconveniência de introduzir-se alteração de períodos letivos durante o curso dos mesmos (cfr. votos dos eminentes Afirastroa Néri da Silveira, à fl. 64 e Sydney Sanehes, à fl. 66). 41 Essa mesma razão milita agora em favor de manter-se suspensa a segurança. Nego provimento ao Agravo Regiamtal. EXTRATO DA ATA SS 529 (AgRg) — RS — Afim Octavio Canora. Agte.: Círculo de Pais e Mestres da Escola Estadual de Segundo Grau Padre Reus (Adv.: Luis Gustavo Andrade Madeira). Agdo.: Estado do Rio Grande do Sul. (Advas.: Eliana Soledade Graeff Martins e outros). Agdo.: Relata do MS n° 592121768 do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Decisão: Por votação unânime, o Tribunal negou provimento ao agravo regimental. Presidência do Sr. Ministro Octavio (fatiara. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira, Sydney Sanches, Paulo Brossard, Sep6lveda Pertence, Carlos Velioso, Marco Aurélio, limar Gaivão e Francisco Rezek. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Celso de Mello. Vice-Procurador-Geral da República, Dr. Moacir Antonio Machado da Silva. Brasília, 24 de junho de 1993 — Luiz Tomimatsu, Secretário. QUÉRITO N° 592 (AgRg) — MG (Tribunal Pleno) Relata.: O Sr. Ministro Moreira Alves Autor Ministério Público Federal — Indiciado: Wagner do Nascimento Ação penal que se processa contra quem se torna parlamentar federal no curso desse processo. — Esta Corte, ao julgar questão de ordem no Inquérito 571, reviu sua orientação anterior, e passou a entender que são válidos os atos — inclusive • denúncia —praticados antes do deslocamento da compe- 42 R.T.J. —150 tênda do Juízo, em ação penal cujo réu se torna parlamentar no curso de seu processo. Agravo a que se nega provimento. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em negar provimento ao agravo regimental. Brasília, 24 de março de 1993 — Sydney Sanches, Presidente — Moreira Alves, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): A Procuradoria-Geral da República requereu fosse solicitada prévia licença à Câmara dos Deputados para o prosseguimento de ação penal contra o Deputado Federal Wagner do Nascimento, com a seguinte manifestação: ...» (fls. 4522/4527). À fl. 4532, exarei este despacho: «Solicite-se a licença a que alude o parecer da Procuradoria-Geral da República no item 18, à fl. 4527.» Às fls. 4547/4551, opõe-se agravo regimental contra o referido despacho, alegando-se: «... Havendo mantido o despacho agravado, trago o agravo a julgamento do Plenário. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): 1. Esta Corte, ao julgar questão de ordem no Inquérito n° 571, foi chamada, de início, pelo relator, o eminente Ministro Sepúlveda Pertence, a rever sua jurispru- dência — que é a invocada pelo ora agravante quanto à nulidade da denúncia e dos atos praticados em ação penal que se procossa contra quem se torna parlamentar federal no curso desse processo. Em seu voto, o eminente relator sustentou o que assim está sintetizado na ementa do acórdão que, afinal, foi prolatado nessa questão de ordem: «STF: competência penal originária por prerrogativa de função: advento da investidura no curso do processo: inexistência de nulidade superveniente da denúncia e dos atos nele anteriormente praticados: revisão da jurisprudência do Tribunal. A perpetuatio jurisdidonis, embora aplicável ao processo penal, não é absoluta: assim, v.g., é indiscutível que a diplomação do acusado, eleito Deputado Federal, no curso do processo, em que já adviera sentença condenatória pendente de apelação, acarretou a hnediata cessação da competência da Justiça local e seu deslocamento para o Supremo Tribunal. Daí não se segue, contudo, a derrogação do princípio tempus regit actum, do qual resulta, no caso, que a validade dos atos antecedentes à alteração da competência inicial, por força da intercorrente diplomação do réu, há de ser aferida, segundo o estado de coisas anterior ao fato determinante do seu deslocamento. 3. Não resistem à crítica os fundamentos da jurisprudência em contrário, que se vinha firmando no STF: a) o art. 567 do Código Processual Penal, faz nulos os atos decisórios do juiz incompetente, mas não explica a R.TJ —150 43 suposta eficácia ex tone da incompetência superveniente à decisão; virtude do referido fato superveniente. Disse, então, S. Ex.': b) a pretensa ilegitimidade superveniente do autor da denúncia afronta, além do postulado tempus regit actuai', o principio da indisponibilidade da ação penal. «O delito imputado é anterior à investidura do acusado no mandato; desse modo, com a extinção desse, cessou o foro por prerrogativa de função, de que gozava, e, em conseqüência, a competência do Tribunal, seja, na conformidade da jurisprudência, para refazer o processo ex mace, seja, como propus, para o seu prosseguimento: nesse sentido, é firme e, no ponto, incensurável, a orientação da Casa (v.g., mais recentemente, Inq. 516, 1°-8-91, Celso de Mello; Inq. 186, 25-3-87, Sanches; RTJ 121/423; APn 275,13-3-83, Buzaid, RTJ 107/15). Enquanto prerrogativa da função do congressista, o início da competência originária do Supremo Tribunal Federal há de coincidir com o diploma, mas nada impõe que se empreste força retroativa a esse fato novo que o determina. Desse modo, no caso, competiria ao STF apenas o julgamento da apelação pendente contra a sentença condenaa5ria, se, para tanto, a Câmara dos Deputados concedesse a necessária licença. A intercomIncia da perda do mandato de congressista do acusado, porém, fez cessar integralmente a competência do Tribunal, dado que o fato objeto do processo é anterior à diplomação. Devolveu-se, em conseqüência, ao Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia a competência para julgar a apelação pendente, uma vez que a diplomação do réu não afetou a validade dos atos anteriormente praticados, desde a denúncia à sentença condenatória.» Sucedeu, porém, que, antes do término do julgamento dessa questão, o parlamentar então em causa perdeu seu mandato, razão por que cessou a competência desta Corte, sem, no entanto, ficar prejudicada a questão de ordem levantada, até porque, se mantida a jurisprudência anterior, teria de ser declarado nulo o processo desenrolado na instância de origem, o que impediria a decisão final desta Corte, no caso: a de devolver ao Tribunal de Justiça local a competência, que passara a ser do Supremo Tribunal Federal enquanto o réu fora deputado, para julgar a apelação pendente. Isso, aliás, foi salientado pelo Ministro Sepúlveda Pertence, na retomada do julgamento em 2.0 que resta, pois, é apenas declinar da competência para o juízo competente. Não obstante, estou em que a determinação de qual seja o juízo competente, no estado do processo, traz de volta à tona a questão inicialmente suscitada. De fato. Mantida a linha da jurisprudência do Tribunal, a investidura intercorrente do acusado teria implicado a nulidade ipso Jure de todo o processo, a partir da denúncia, inclusive. Efeito esse, parece induvidoso, que a subseqüente perda de mandato não desfaz, uma vez que não devida à nulidade da investidura, mas a fato posterior a ela. Se, ao contrário, se entende, como sustentei, que são válidas a denúncia, a instrução e a sentença de primeiro grau, devendo o processo retomar o seu curso com o julgamento da apelação, cessada para tanto a competência do Supremo Tribunal, ressurgirá a do Tribunal de Justiça de Rondônia. Por isso, e dada a presença de Ministros que não assistiram ao início do julgamento, sinto-me, com a escusa dos demais, na contingência de reler o voto que então proferi (lê). 44 R.TJ. —150 7. Desse modo, altero a conclusão do voto para atender à superveniente perda do mandato do acusado e declinar da competência de julgar a apelação para o Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia: é o meu voto.» (fls. 242/243) Portanto, esta Corte, nesse julgamento, por unanimidade de votos, alterou sua jurisprudência anterior — que agora volta a ser invocada —, o que determinou o requerimento da Procuradoria-Geral da República, neste caso, e o despacho ora agravado. 2. Em face do exposto, e com base nesse precedente onde a questão foi amplamente examinada e de cujo julgamento participei com voto de adesão, nego provimento ao presente agiameA TO DA ATA Inq 592 (AgRg) —MG. Rel.: Min. Moreira Alves. Agte.: Wagner do Nascimento (Adv.: Paulo Alfonso Silveira). (Advs.: Carlos Mário da Silva Velloso Filho e Outros). Agdo.: Ministério Público Federal. Decisão: Por votação unânime, o Tribunal negou provimento ao agravo regimental. Votou o Presidente. Impedido o Ministro Carlos Velloso. Presidência do Sr. Ministro Sydney Sanches Presentes à Sessão os Srs. Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira, Octavio Gallotti, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Venoso, Marco Aurélio, limar Gaivão e Francisco Reza Vice-Procurador-Geral da República, Dr. Moacir Antonio Machado da Silva. Brasília, 24 de março de 1993. Luiz Tomhnatsu, Secretário. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N° 618 — RS (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro Sydney Sanches. Requerente: Confederação Nacional das Profissões Liberais — Requerido Governador do Estado do Rio Grande do Sul — Requerida: Assembléia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul. Ação Direta de Inconstitucionalidade. Lei n° 8.792, de 30-12-1988, do Estado do Rio Grande do Sul. Tributário. Adicional de imposto de renda (art. 155, II, da Constituição Federal). Artigos 146 e 24, parágrafo 3°, da parte permanente da C.F. e art. 34, parágrafos 3°, 4° e 5° do ADCT. O adicional de imposto de renda, de que trata o inciso II do art. 155, não pode ser instituído pelos Estados e Distrito Federal, sem que, antes, a lei complementar nacional, prevista no «rapai» do art. 146, disponha sobre as matérias referidas em seus incisos e alíneas, não estando sua edição dispensada pelo parágrafo 3° do art. 24 da parte permanente da Constituição Federal, nem pelos parágrafos 3°, 4° e 5° do art. 34 do Ana. Ação julgada, procedente, declarada a inconstitucionalidade da Lei n° 8.792, de 30-12-1988, do Estado do Rio Grande do Sul. - 150 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em julgar procedente a ação, declarando-se a inconstitucionalidade da Lei n° 8.792, de 30-12-1988, do Estado do Rio Grande do Sul. Brasília, 6 de outubro de 1993 — Octavio Galiotti, Presidente — Sydney Sanches, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Sydney Sanches (Relatar): O Ministério Público federal, em parecer do ilustre Vice-Procurador-Geral da República, Dr. Moadr Antonio Machado da Silva, aprovado pelo Exmo. Sr. Procurador-Geral, Dr. Aristides Junqudra Alvarenga, resumiu a hipótese e, em seguida, opinou, in verbis: «A Confederação Nacional das Profusões Liberais, com fundamento no art. 102, I, a, e 103, IX, da Constituição Federal, propõe a presente ação direta, objetivando a declaração de inconstitucionalidade da Lei n° 8.792, de 30 de dezembro de 1988, do Estado do Rio Grande do Sul, que instituiu o 'Adicional do Imposto sobre Renda e Proventos de qualquer Natureza', previsto no art. 155, II da Constituição Federal. A ação, inicialmente proposta, tinha por obj eto a declaração de inconstitucionalidade de vinte e uma leis de diferentes Estados da Federação, tendo sido, porém, desmembrada em número correspondente ao das leis impugnadas, para individualização dos processos respectivos, conforme decisão do Supremo Tribunal Federal em Questão de Ordem suscitada pelo Procurador-Geral da República, julgada em 19-9-91 (fi. 190). Segundo a requerente, o diploma em causa é inconstitucional, por infringên- 45 cia aos arts. 146,111, a, 151, I, 5°, R e 150, I, da Constituição Federal, tendo em vista que (fls. 15/16): «a) o adicional de que trata o art. 155, II, da CF é imposto novo, ine)(latindo sobre ele legislação anterior que pudesse ter sido recebida pela nova ordem jurídica constitucional, de forma a atender ao art. 146, Dl, da CF, que exige lei complementar para definição de fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes dos impostos; o § r do art. 34, ao autorizar expressamente a regulamentação provisória do ICMS por convênio, à falta de lei complementar, não autoriza que se interprete o caput do artigo e o seu 3° como regras permissivas do exercício da competência legislativa plena, independentemente de acatamento ao art. 146; a Constituição não contém qualquer disposição que excepcione o adicional em tela do princípio do art. 146, III, sequer prevendo a possibilidade de os Estados legislarem provisoriamente sobre esse adicional, na falta de lei complementar; o art. 24, 3°, da CF tampouco autoriza a instituição de imposto sem lei complementar, porque se aplica tão-somente às hipóteses de competência concorrente, o que não se verifica na espécie, além de cuidar de lei ordinária federal, e não de lei complementar nacional; ainda que se admitisse que os Estados pudessem instituir o adicional sem lei complementar, os diplomas impugnados não definem os elementos básicos do imposto, configurando a exigência da exação ofensa ao princípio da legalidade.» Em sessão Plenária realizada em 12-4-89, o Supremo Tribunal Federal 46 R.T.J. — 150 indeferiu o pedido de medida liminar, em decisão assim ementada (fl. 71): «Argüição de inconstitucionalidade de leis estaduais que instituíram o adicional do imposto sobre a renda, previsto no art 155, II, da Constituição Federal. Medida cautelar indeferida, porquanto, não obstante o relevo do fundamento apresentado, não se configura o pressuposto relativo à demonstração da ineficácia de decisão a ser, porventura, proferida no sentido de procedência da ação.» Nas informações, o Exm° Sr. Governador do Estado (fls. 87/97) e a Assembléia Legislativa (fls. 75/80) refutam o vício de inconstitucionalidade formal do diploma impugnado, sustentando, no mérito, sua absoluta compatibilidade com a Constituição Federal. Em cumprimento ao art. 103, § 3°, da Constituição Federal, a Advocacia-Geral da União manifesta-se em defesa da constitucionalidade da lei impugnada reportando-se aos argumentos expendidos pela Procuradoria-Geral da República, no RE n° 140.887-1, acrescentando ainda que: «a) a competência da União para editar lei complementar em mata tributária não exclui a competência supletiva dos Estados (art. 24, §§ 2° a 4° da CF), encontrando-se as normas gerais do CTN e de outras leis em plena vigência, naquilo que não colidam com a Carta Federal e as leis novas pertinentes (art. 34, § 5° do ADCI); b) o novo imposto independe da lei complementar referida no art. 146, III, a, da Constituição Federal, porquanto os respectivos fato gerador, base de cálculo, sujeito passivo e alíquota máxima já estão previstos no art. 155,11, da Carta, não podendo lei complementar alterar sua demição; ainda que não houvesse tal definição, na falta de lei geral nacional, poderiam os Estados expedir as normas necessárias, até que viesse a ser editada a lei nacional competente, nos termos do art. 24, §§ 3° e 4°, da Constituição Federal, leis e»eas que só entrariam em vigor a partir de 1°-3-89 (art. 34 §§ 3° e 4° do ADC'T); não se cogita, no caso, de infringência do princípio da irretroatividade da lei tributária, sendo o fato gerador do novo imposto o pagamento do IR devido à União, e não a percepção dos lucros, ganhos e rendimentos de capital, que constitui fato gerador do tributo federal». Com vista dos autos, passa a Procuradoria-Geral da República a pronunciar-se sobre a controvérsia. Argüi-se a inconstitucionalidade da Lei n° 8.792/88, do Estado do Rio Grande do Sul, sob a alegação de que estaria formalmente viciada, porque não constitui instrumento apto a criar imposto novo, face ao estatuído no art. 146, 111, a, da Constituição Federal, que exige lei complementar federal para definir não só os tributos e suas espécies, como os fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes dos impostos constitucionalmente previstos. A controvérsia em tomo da exigência de lei complementar federal relativa a normas gerais sobre o adicional do imposto de renda, de que trata o art. 155, II, da Constituição Federal, foi dirimida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 140.887-RJ e do RE 136.215-RJ, em 18-2-93, declarando-se a inconstitucionalidade formal da Lei n° 1.394, de 1988, do Estado do Rio de Janeiro. R.T.J — 150 No voto que proferiu como Relator no RE 140.887-RJ, salientou, a respeito, o eminente Ministro Moreira Alves: «..., é manifesto que o adicional previsto pela Constituição Federal, no inc. II do art. 155, é tributo da competência exclusiva dos Estados e do Distrito Federal, mas não só não é autônomo — (...) —, como também sua disciplina pelas leis locais pode dar margem a conflitos de competência entre Estados e a União Federal, de outro, pelos seus inevitáveis reflexos nacionais.» Em outras passagens, acrescenta: «Quer se considere que o fato gerador desse adicional é o pagamento à União a título de imposto de renda incidente sobre lucros, ganhos e rendimentos de capital (...), quer se considere que o seu fato gerador é o imposto de renda (...), o que é indubitavelmente certo é que a legislação complementar de princípios gerais terá que impor à União disciplina do imposto de renda que permita, para efeito de exigência, arrecadação e cobrzmça pelos Estados e pelo Distrito Federal, se identifique o que o contribuinte do imposto de renda é devedor ou foi pagador por incidência sobre lucros, ganhos e rendimentos de capital, de um lado, e, de outro, sobre rendas que não estas, como decorrente de trabalho, tendo em vista o sistema de antecipações e de reajustes, bem como as faixas de isenção ou de aliquotas diversificadas e as deduções que se aplicam às rendas englobadamente.» (...) «Por outro lado, (...), há uma série de aspectos que estão a exigir normas gerais de cunho nacional, por não se circunscreverem ao âmbito territorial do Estado ou do Distrito Federal. 47 ..., por exemplo, nos casos de retenção do imposto de renda na fonte, quando a fonte retentora está situada em Estado diverso daquele em que tem domicílio o contribuinte identificado, hipótese em que ou se criará a obrigação de aquela fazer a retenção do adicional no Estado do domicílio do contribuinte (...) ou se terá de criar a obrigação de aquela (a fonte retentora) comunicar a este (o contribuinte) a retenção que está fazendo, permitindo-se a este que efetue o pagamento do adicional no Estado em que é domiciliado em data diversa da em que a retenção foi efetuada (o que também terá de resultar de norma nacional).» Quanto ao argumento de que a falta de lei complementar pode ser suprida pelos Estados, nos termos do art. 24, § 3° da Constituição Federal, ponderou o eminente Ministro Oetavio CARMO no voto que proferiu no RE 136.215-4/1U: «Admito que se preste esse permissivo, entre a disciplina de outras matérias, a possibilitar a instituição de tributos, dispensada, a título de formalidade, para esse fim, a prévia edição de lei complementar. Jamais, entretanto, quando a existência desta se torne materialmente imprescindível, para a dirimência de conflitos de competência entre os Estados. É esta última — e tipicamente — a hipótese em discussão, onde a diversidade de critérios legislativos estaduais sobre o domicílio de pessoas físicas e jurídicas (contribuintes e fontes de retenção), especialmente quando possuem mais de um estabelecimento, é campo fértil de inaceitável bitributação. Figure-se, ainda,e só para exemplificar, a transferência de domiclio, pelo contribuinte, no primeiro dia do ano, de são Paulo (onde o fato gera- 48 R.T.J. —150 dor — Lei n° 6.352/88 —é o mesmo do imposto de renda), para o Rio de Janeiro (onde o fato gerador é o pagamento do imposto de renda, Lei n° 1.394/88). A sancionar-se essa liberdade do legislador local, seria o imposto devido aos dois Estados. O disposto no â 3° do art. 24 da Constituição não pode, portanto, significar a abolição da lei complementar necessária à dirimência de conflitos de competência entre Unidades da Federação. O âmbito do dispositivo está limitado, logicamente, às situações de alcance simplesmente isolado ou local, como também indica a expressão literal da norma, em sua parte final, quando se declara destinada a atender os Estados 'em suas peculiaridades', sem se mostrar, assim, pertinente ao trato da matéria tributária que haverá, fatalmente, de compreender o inter-relacionamento de mais de um Estado». (...) «Note-se que, para tornar viável a cobrança do ICMS, o § 8°, do citado art. 34 do ADCT, autorizou o suprimento da falta de lei complementar pela celebração de convênio, o que, não tendo sido previsto em relação ao adicional estadual do imposto de renda, serve para corroborar a impossibilidade de exigência deste último, sem a lei complementar determinada pelo art. 146 da Constituição Federal.» O acórdão proferido no citado RE 136.215-RJ traz a seguinte ementa «Adicional estadual do imposto sobre a renda (art. 155, II, da CF). Impossibilidade de sua cobrança, sem prévia lei complementar (art. 146 da CF.). Sendo ela materialmente indispensável à dirimência de conflitos de competência entre os Estados da Federação, não bastam, para dispensar sua edição, os pemiissivos inscritos no art. 24, â 3°, da constituição e no art. 34, e seus parágrafos, do ADCT. Recurso extraordinário provido para declarar a inconstitucionalidade da Lei n° 1.394, de 2-12-88, do Estado do Rio de Janeiro, concedendo-se a segurança.» Os fundamentos expostos demonstram a obrigatoriedade da edição de lei complementar nacional, que, definindo aqueles elementos essenciais ao adicional em causa, propiciará aos Estados os meios para a efetiva criação desse tributo, nos limites de sua jurisdição. Ressalte-se, porém, que a exação, se estabelecida, só poderá prevalecer até 1996, uma vez que dito tributo foi extinto pela Emenda Constitucional n° 3, de 1993, que, em seu art. 3° dispõe: «A eliminação do adicional ao imposto de renda, de competência dos Estados, decorrente desta Emenda Constitucional, somente produzirá efeitos a partir de 1° de janeiro de 1996.» A ausência de lei complementar compromete, portanto,a validade da Lei n° 8.792, de 1988, do Estado do Rio Grande do Sul. Em inclusão, o parecer é no sentido de que se julgue procedente a ação, declarando-se a inconstitucionalidade da Lei n° 8.792 de 30 de dezembro de 1988, do Estado do Rio Grande do Sul.» É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Sydney Sambes (Relato): 1. O acórdão precedente, a que se referiu o parecer da Procuradoria-Geral da República e de que foi relator o eminente Minis- R.T.J —150 tro Octavio Oanani (RE n° 136.215/IU, julgado unânime do Plenário do STF, em data de 18-2-1993) foi publicado no DJ de 16-4-1993, Ementário n° 1.699-5 e ficou assim ementado: «Adicional estadual do imposto sobre a renda (art. 155, E, da CF). Impossibilidade de sua cobrança, sem prévia lei complementar (art. 146 da CF). Sendo ela materialmente indispensável à dirimência de conflitos de competia entre os Estados da Fede bastam, para dispensar sua raçóo edição os pemrissivos inscritos no art. 24, § 3°, da Constituição e no art. 34, e seara parágrafos, do ADCT. Recurso extraordinário provido para declarar a inconstitucionalidade da Lei n° 1394, de 2-12-88, do Estado do Rio de Janeiro, concedendo-se a segurança*. 2. Na mesma data (18-2-1993), o E Plenário, julgando o RE 140.887, também por votação tmânime, declarou a inccestituciondidade da mesma Lei 1.394, de 212-88, do Estado do Rio de Janeiro, tendo sido o v. acórdão, (de que foi relator o eminente Ministro Moreira Alves), publicado no DJ de 14-5-93, Ementário n° 1.703-23, com a seguinte ementa: «Adicional do imposto de renda, em favor dos Estados-membros. Incoruttitucionalidade da Lei 1.394, de 2-12-88, do Estado do Rio de Janeiro. Os Estados e o Distrito Federal só podem instituir tributos, independentemente da Lei Complementar nacional tributária a que alude o artigo 146 da Constituição Federal, com relação a tributos autônomos, de sua competência, e tributos esses que não possam ter ieflexos em outros Estados, no Distrito Federal e na própria União. — Sentido e alcance dos §§ 3°, 4° e 5° do artigo 34 do ADCT, bem como do 49 § 3° do artigo 24 da parte permanente da Constituição Federal. O adicional previsto pela Carta Magna, no inciso II do art. 155, é tributo da competência exclusiva dos Estados e do Distrito Federal, mas não só não é 'autônomo' — como adicional que é, está inequivocamente vinculado ao imposto de renda como instituído e disciplinado pela União —, senão também sua disciplina pelas leis locais pode dar margem a conflitos de competência entre Estados e Distrito Federal, de um lado, e entre estes e a União Federal, de outro, pelos seus inevitáveis reflexos nadoRecurso extraordinário conhecido e provido, declarando-se a inconstitucionalidade da Lei n° 1.394, de 2-12-88, do Estado do Rio de Janeiro.» 3. Adotando os fundamentos deduzidos nesses precedentes e mais os do parecer do Ministério Público federal, transcrito no relatório, declaro a inconstitucionalidade da Lei 8.792, de 30-12-1988, do Estado do Rio Grande do Sul. EXTRATO DA ATA e ADIn 618 — RS — Rel.: Min. Sydney Sanches. Reqte.: Confederação Nacional das Profissões Liberais. (Advs.: Luiz Carlos Bettiol e outro). Reqdos.: Governador do Estado do Rio Grande do Sul e Assembléia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul. Decisão: Por votação unânime, o Tribunal julgou procedente a ação, para declarar a inconstitucionalidade da Lei n° 8.7932, de 30-12-88, do Estado do Rio Grande do Sul. Votou o Presidente. Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotti. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira, Sydney Sanches, Sepúlveda Pertence, Carlos Velloso, Marco Aurélio, Binar Galvão e Francisco Rezek. Antes, justificadamente, os Srs. Ministros Paulo Brossard e Celso de R.T.J. —150 50 Mello. Procurador-Geral da República, Dr. Aristides Junqueira Alvarenga. Brasília, 6 de outubro de 1993 — Luiz Tomimatsu, Secretário. AÇÃO DIRETA DE INICONSTITUCIONAL1DADE N° 683 — SC (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio. Requerente: Procurador-Geral da República—Requerido Tribunal Regional do Trabalho da 12' Região. Ação Direta de Inconstitucionalidade. Objeto. Resolução de órgão do Poder Judiciário. Normatividade. Reajuste de vencimentos do mis de abril de 1990. Índice inflacionário do período de 15 de fevereiro a 15 de março de 1990. Ganha contornos normativos decisão de tribunal que, presente alteração na política de revisão geral de vencimentos perpetrada em data anterior ao mês alusivo ao das remunerações, determina a observância de índice resultante de legislação revogada, fazendo-o de forma linear, ou seja, em relação a todo corpo de servidores. É o caso do ato de tribunal no que implicou abandono da legislação em vigor na data da aquisição do direito aos vencimentos— Medida Provisória n° 154/90, transformada na Lei n° 8.030/90, e dispôs sobre a aplicação de índice que, à época, carecia de sustentação legal. Descabe confundir período a ser pesquisado para efeito de fixação do índice inflacionário com a aquisição do direito em si à percepção dos vencimentos devidamente corrigidas. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos, em julgar procedente a ação, para declarar a inconstitucionalidade da Decisão Administrativa n° TRT/SC/PA-MAD-0006/91 (Acórdão-TP-n° 3.374/91), do Tribunal Regional do Trabalho da Décima Segunda Região. Brasília, 24 de junho de 1993 —Octavio Gallotti, Presidente — Marco Aurélio, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Marco Aurélio: Valhome, em parte, do que tive oportunidade de consignar quando procedi ao relato do pedido de concessão de liminar: «O Procurador-Geral da República ajuíza esta ação direta de inconstitucionalidade contra ato normativo do Tribunal Regional do Trabalho da Décima Segunda Região, que implicou a concessão de diferenças salariais relativas ao Índice de Preços ao Consumidor de março de 1990, no percentual de 84,32%. Alude, na inicial, à contrariedade aos arts. 5°, inciso XVI, 37, incisos X e XV, 95, inciso III, e 96, inciso II, alínea d, da Constituição Federal e pleiteia a concessão de cautelar que importe na suspensão da eficácia do referido ato.» Em Sessão de 11 de março de 1992, esta Corte concedeua liminar pleiteada, dizendo do concurso dos pressupostos que lhe são próprios (fls. 33 a 37). O Presidente do Tribunal Regional do Trabalho da Décima Segunda Região, Juiz Airton Minoggio do Nascimento, prestou R.T.J — 150 as informações de fls. 43 a 49, evocando, em síntese, a circunstância de a Medida Provisória n° 154, de 16 de março de 1990, já haver apanhado situação constituída, bem como aduzindo que o ato praticado quanto ao servidor Antonio Ramos revela-se com contornos concretos, não cabendo, assim, contra ele, a ação direta de inconstitucionalidade, que fica reduzida à decisão proferida no que implicou a normatização do reajuste de 84,32%. Com as informações vieram as peças de fis. 50 a 72. A Advocacia-Geral da União argüiu o descabimento da ação direta de incoanitucionalidade, agasalhando a tese do Requerido, no sentido de que o ato que se pretende ver fulminado tem efeitos concretos. É levantada questão sobre o alcance do disposto no ã 3° do art. 103 da Constituição Federal, considerados os seguintes pontos: a legitimidade para a propositura da ação direta de inconstitucionalidade alcança o Presidente da República Logo, difícil é conceba que, em tais hipóteses, deva o Advogado-Geral da União, necessariamente, sustentar a valia da norma; ao Advogado-Geral da União cumpre observar o postulado imanente da fidelidade constitucional e isto fica seriamente comprometido a partir do momento em que se assente o dever de, em qualquer hipótese, defender o ato; c) os precedentes desta Corte — dos quais são exemplos os acórdãos proferidos nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade na 96 e 72, relatadas, respectivamente, pelos ministros Moreira Alves e Sepúlveda Pertence, publicados nas Revistas Trimestrais de Jurisprudência nos 131/470 e 131/958 — devem merecer temperamentos, isto quanto ao fato de o Advogado-Geral da União atuar, em tal espécie de ação, como curador especial, não se lhe podendo impor «uma conduta empedernida e insensível, que acabaria por desqualificar a seriedade de sua própria posição institucional»; 51 d) há de se reconhecer a possibilidade de o Advogado-Geral da União, na hipótese de inconstitucionalidade manifesta, assumir posição contra o ato, mormente quando existentes julgamentos sobre o tema emanados da Suprema Corte. O pronunciamento é conclusivo no que tange à inadmissibilidade da ação e vem subscrito pelo Procurador da República Dr. Gilmar Ferreira Mendes e pelo Subprocurador-Geral da República, Dr. Artur Castilho Neto. Observada a óptica da maioria, em relação à qual guardo reserva, no sentido da necessidade de remessa dos autos da ação direta de inconstitucionalidade ao Procurador-Geral da República, ainda que este a tenha proposto, veio à balha a peça de fls. 82 a 89, propugnando-se pela declaração de inoonstitucionalidade da resolução administrativa atacada. Em síntese, ressaltase o leading case decorrente da apreciação do Mandado de Segurança n° 21.216-1DF-, no qual esta Corte afastou a possibilidade de considerar existente, em tal hipótese, o direito adquirido dos servidores quanto à aplicação do percentual de 84,32% aos salários como decorrente da inflação calculada até 15 de março de 1990. Recebi os presentes autos para exame em 22 de abril de 1993, liberando-os em 26 seguinte, determinando a remessa de cópias desse relatório aos demais integrantes da Corte. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Da natureza do ato atacado. A decisão da Corte de origem (fia. 6 a 11) resultou realmente de requerimento formulado por determinado servidor. A partir de interpretação dada às Leis n°57.730/89, 7.788'89 e 8.030/90, concluiu-se pela existência de direito adquirido ao reajuste de vencimentos com base na variação do índice de Preços ao Consumidor no período de 15 de 52 RTJ. —150 fevereiro a 15 de março de 1990, considerados os vencimentos do mês de abril. Em passo seguinte, emprestou-se à decisão, explicitamente, caráter normativo. Este último fato colou à deliberação, como um todo, contornos ensejadores da ação direta de inconstitucionalidade. Este enquadramento mais se robustece quando se constata que o Tribunal a quo teve presente que diploma legal de 15 de março de 1990 alterou a política de revisão dos vencimentos e, mesmo assim, assentou a observância do percentual de 84.32%, muito embora já não houvesse norma que a respaldasse. Neste sentido decidiu o Pleno desta Corte na apreciação do pedido de liminar na Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 666, oportunidade em que fiquei vencido de forma isolada, razão pela qual coloco em plano secundário o convencimento pessoal. Rejeito a preliminar apontada pela Advocacia-Geral da União. Quanto às questões levantadas pelo órgão sobre a regra do § 3° do artigo 103 da Constituição Federal, a elucidação não cabe, em si, no âmbito do julgamento desta ação direta de inconstitucionalidade, no que tem objeto específico. O desempenho funcional da Advocacia-Geral da União é estranho a este último, valendo notar que compete ao próprio órgão em tal campo emprestar ao § 3° do artigo 103 o alcance que entenda mais adequado, isto em face à expressão «que defenderá o ato ou texto impugnado». Evidentemente, não se pode, em interpretação meramente gramatical, verbal, caminhar para conclusão geradora de perplexidade. De qualquer forma, o tema não é passível de decisão, em si, nesta ação direta de inconstitucionalidade, razão pela qual o registro da liberdade técnica do Órgão exsurge como simples opinião. Relativamente à matéria de fundo, verifica-se que o ato impugnado ao qual se emprestou efeitos normativos revela o extravasamento do campo reservado à atuação do Tribunal autor, que acabou não por reconhecer a existência de direito adquirido dos servidores, mas por criar reajuste a lebre da ordem jurídica em vigor. A partir de confusão entre período a ser pesquisado na fixação de índice inflacionário com o alusivo à aquisição do direito ao reajuste, acabou por legislar. À época da edição da Medida Provisória n° 154/90, transformada na Lei n° 8.038/90, não tinham os servidores do Tribunal Regional do Trabalho da Décima-Segunda Região, nos respectivos patrimônios, o direito aos vencimentos do mês de abril. A Medida Provisória entrou em vigor em 16 de março de 1990 e somente em 1° de abril teve início °período concernente aos vencimentos que, indevidamente, foram alcançados pelo ato impugnado. Neste sentido decidiu esta Corte ao enfrentar, no Mandado de Segurança n° 21.216/90, pleito dos respectivos servidores, oportunidade na qual o ilustre Relator, Ministro Octavio Gallotti, salientou que a referida medida teria contornos retroativos, caso houvesse apanhado a remuneração correspondente adias, à época da edição, já trabalhados. Julgo procedente o que ora pleiteado e declaro, assim, a inconstitucionaliclade do ato de fls. 6 a 11 que, emanado do Tribunal Regional do Trabalho da Décima-Segunda Região, ganhou o n° TRT/SC/PA-MAD-006/91. É o meu voto. VOTO O Sr. Ministro Carlos Velloso: Sr. Presidente, quando do julgamento do MS n° 21.216, do Distrito Federal, sustentei a tese no sentido de que quando veio a lume a Medida Provisória n° 154, de 15-3-90, publicada no Diário Oficial de 16-3-90, que acabou se convertendo na Lei n° 8.030, de 12-4-90, o acontecimento que a lei elegeu para dar nascimento ao direito ao reajuste já ocorrera por inteiro, vale dizer, já ocorrera a variação do IPC de 15-2-90 a 15-3-90. Sustentei, então, a existência de direito R.T.1 —150 adquirido dos servidores ao reajuste correspondente à inflação ocorrida 53 15-2-90 a 15-3-90, conforme divulgado pelo IBGE, cumprindo ao empregador o pagamento, no mês seguinte, ou no mês Sr. Presidente, para ganharmos tempo, de abril. Porque, vale repetir, a Medida não vou ler os termos do mencionado voto, Provisória 154, que entrou em vigor no já que a Casa o conhece. Vou, entretanto, dia 16-3-90, encontrou condição aperinclui-lo no voto que ora estou proferindo, feiçoada, fato gerador do direito já ocordado que não estou convencido do seu derido, por inteiro. sacerto, mesmo porque restei vencido na companhia honrosa dos Ministros Paulo A partir de 16-3-90, alei nova alterou Brossard e Sepúlveda Pertence. Assim o a regra, deixou de considerar o fato atrás voto que proferi: mencionado como capaz de dar nascimento a direito subjetivo. A lei nova, «Sr. Presidente, ao que ouvi e apreenentretanto, vale para o futuro, não pode di, a Lei n° 7.830, de 28-9-89, estabeleretroagir (Constieiçan, art. 5°, XXXVI). ceu, no art. 1°, que os vencimentos dos A partir de abril de 1990, desde que servidores seriam reajustados, trimesos servidores trabalhassem, vale dizer, tralmente, em percentual igual à variadesde que realizassem a condição pano ção acumulada do IPC, verificada nos recebimento do reajuste, reajuste a que três meses anteriores, drvinridas as anfizeram jus no dia 15-3-90, deveriam tecipações do art. 2°, dando-se o primeirecebê-lo, porque é necessário distinro reajuste trimestral cm outubro de 1989. guir a condição ou o fato que deu nasciO artigo 2° estatuiu, a seu turno, que mento ao direito ao reajuste da condição sempre que a variação do IPC verificada para recebimento deste: a condição esno mês anterior fosse superior a cinco colhida pela lei para dar nascimento ao por cento, os estipêndios dos servidores direito, ou o fato gerador deste, é a vaseriam reajustados, a titulo de antecipariação do IPC calculada na forma do art. ção, pelo percentual correspondente a 10 daLei n° 7.730, de 31-1-89, verificaeste excedente (Lei rf 7.830/89, arts. 1° da no dia 15-3-90; a condição para o e 2°). A Lei n° 7.974, de 22-12-89 tamrecebimento do reajuste, direito ao reabém dispôs a respeito do tema. A Lei n° juste adquirido no dia 15-3-90, é ter o 7.730, de 31-1-89, art. 10, determinou servidor trabalhado no mês de abril de que «O IPC, a partir de março de 1989, 1990, trabalhado ou ter continuado vinserá calculado com base na média dos culado ao emprego. preços apurados entre o início da 2' (segunda) quinzena do mês anterior e o Do exposto, apesar de compreender término da P (primeira) quinzena do a extensão desta decisão, desde que ocormês de referência». rido o fato gerador do direito subjetivo, não posso deixar de deferir o mandado Posta assim a questão, Sr. Presidende segurança, com a vênia do eminente te, verifica-se que quando veio a lume Ministro Relator. a MP n° 154, de 15-3-90, publicada no Defiro o svrit». DO de 16-3-90, que acabou se convertendo na Lei n° 8.030, de 12-4-90, a Com a vênia do Sr. Ministro Relator, condição escolhida pela lei para dar nas- julgo improcedente a ação direta de incemcimento ao direito subjetivo dos servi- titucionalidade. dores, ou o acontecimento que a lei EXTRATO DA ATA elegeu para dar nascimento ao direito ao reajuste, já ocorrera, por inteiro, vale ADIn 683 — SC —Rel.: Min. Marco dizer, já ocorrera a variação do 1PC, de Aurélio. Reqte.: Procurador-Geral da Re- 54 R.TJ.— 150 pública. Reqdo.: Tribunal Regional do Trabalho da 12' Região. Decisão: Por maioria de votos, o Tribunal julgou procedente a ação, para declarar a inconstitucionalidade da Decisão Administrativa n° TRT/SC/PA-MAD-0006/91 (Acórdão-TP-n° 3.374/91), do Tribunal Regional do Trabalho da 12' Região, vencidos os Ministros Carlos Velloso e Sepúlveda Pertence, que a julgavam improcedente e constitucional o ato impugnado. Votou o Presidente. Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotti. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira, Sydney Sanches, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence, Carlos Velloso, Marco Aurélio, limar Gaivão e Francisco Rezek. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Celso de Mello. Vice-Procurador-Geral da República, Dr. Moacir Antonio Machado da Silva. Brasília, 24 de junho de 1993. Luiz Tomimatsu, Secretário. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N° 807 — RS (Questão de Ordem) (Tribunal Pleno) Relator. O Sr. Ministro Celso de Mello. Requerente: Procurador-Geral da República — Requeridos: Governador do Estado do Rio Grande do Sul e Assembléia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul. Ação Direta de Inconstitacionalidade. Legitimidade ativa. Impossibilidade de o Governador do Estado, que já figura como órgão requerido, passar à condição de litisconsorte ativo. Medida cautelar não requerida pelo autor. Pedido ulteriormente formulado pelo sujeito passivo da relação processuaL Impossibilidade. Não-conhecimento. — O órgão estatal que já figure no pólo passivo da relação processual não pode ostentar, simultaneamente, a condição de litisconsorte ativo no processo de controle abstrato instaurado por iniciativa de terceiro. A circunstância de o Governador do Estado poder questionar, autonomamente, a validade jurídica de uma espécie normativa local em sede de ação direta, fazendo instaurar, por iniciativa própria, o concernente controle concentrado de constancionalidade, não lhe confere a prerrogativa de, uma vez iniciada a fiscalização abstrata por qualquer dos outros ativamente legitimados — e constando ele como órgão requerido na ação direta —, buscar a sua inclusão no pólo ativo. —O órgão do Poder Público que formalmente atue como sujeito passivo no processo de controle normativo abstrato não dispõe de legitimidade para requerer a suspensão cautelar do ato impugnado, ainda que tenha expressamente reconhecido a procedência do pedido. R.TJ —150 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, resolvendo questão de ordem, em indeferir a admissão do Governador do Estado do Rio Grande do Sul como litisconsorte ativo, e não conhecer do pedido de medida canelar. Brasília, 27 de maio de 1993 —Octavio Gallotii, Presidente — Celso de Mello, Relator. RELATÓRIO 55 requerida pelo Autor — da eficácia das normas impugnadas. Para apreciação desse pedido, submeto o processo, em questão de ordem, ao Plenário da Corte. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): A nova Carta Política, ao ampliar o rol das pessoas ativamente legitimadas para o exercício da ação direta de inconstitucionalidade, tornou viável, a partir da institucionalização dessa legitimidade concorrente, a formação de litisconsórcio ativo no processo objetivo de controle normativo absO Sr Ministro Celso de Mello: O Pro- trato, desde que, para efeito de sua instaucurador-Geral da República ajuizou a pre- ração, os litisconsortes disponham, autosente ação direta de inconstitucionalidade, nomamente, de qualidade para agir. impugnando os arts. 6°, caput e seu paráNada impede, portanto, que, em tese, grafo único, e 7° do ADCT da Constituição Governador de Estado e o Procurador-Gedo Estado do Rio Grande do Sul, bem assim ral da República figurem no pólo ativo da a Lei n° 9.123/90, que regulamentou os relação processual que se estabelece com o dispositivos da Carta estadual. ajuizamento, perante o Supremo Tribunal Figuram, como sujeitos passivos da re- Federal, da ação direta. lação processual em causa, o governador e Quando, no entanto, o ato normativo a Assembléia Legislativa do Estado, por- impugnado em sede de fiscalização abstraquanto deles emanaram os atos normativos ta tiver emanado também do Chefe do Poora questionados. der Executivo —a lei, sendo ato estatal Requisitadas as informações de praxe, subjetivamente complexo, emerge da conprestou-as a Assembléia Legislativa esta- jugação das vontades autônomas do Legisdual, sustentando a legitimidade constitu- lativo e do Executivo — e este figurar, em conseqüência, no pólo passivo da relação cional das normas impugnadas. processual, tomar-se-á juridicamente imO Governada do Estado, contudo, não possível o seu ingresso em condição subjeobstante a sua condição formal de sujeito tiva diversa daquela que já ostenta no propassivo da presente relação processual, eis cesso. Vale dizer, o órgão estatal responsáque sancionou o projeto que se converteu vel pela edição do ato questionado não na Lei n° 9.123/90, pleiteia o seu ingresso pode, em processo de controle abstrato já nesta causa, na qualidade de litisconsorte instaurado por terceiro, figurar como seu ativo o Procurador-Geral da República. litisconsorte ativo. O Chefe do Poder Executivo estadual, A circunstância de o Governador do Esque expressamente reconheceu o pedido tado poder questionar, autonomamente, a formulado pelo Procurador-Geral daRepú- validade jurídica de uma espécie normativa blica —, e, em conseqüência, manifestou- local em sede de ação direta, fazendo insse pela procedência integral da ação —, taurar, por iniciativa própria, o concernente postula, ainda, a suspensão cautelas—não controle concentrado de constitucionalida- 56 R.TJ. — 150 de, não lhe confere a prerrogativa de, uma vez iniciada a fiscalização abstrata por qualquer dos outros ativamente legitimados, buscar a sua inclusão no pólo ativo. O reconhecimento pelo Governador do Estado do pedido formulado pelo Procurador-Geral da República — ato processual que, embora possível, nenhuma eficácia jurídica possui em sede de controle abstrato, onde se controverte sobre situações normativos indisponíveis — não legitima a novação subjetiva da relação processual, tal como pretendida pelo órgão público de que também emanou o ato impugnado. A circunstância de o Procurador-Geral da República haver impugnado a validade jurídica de normas inscritas no ADCI' local — estatuto promulgado pela Assembléia Legislativa do Estado — não autoriza a pretendida inversão da posição formal do Governador, eis que este, por haver sido co-participe do processo de formação da Lei n° 9.123/90 (ato igualmente questionado nesta sede), já ostenta a necessária condição de sujeito passivo da relação processual. Não pode o Chefe do Executivo, desse modo, pretender figurar, simultaneamente, numa mesma relação processual, nas antagônicas posições de sujeito ativo e de sujeito passivo, quando se tratar de ação direta de inconstitucionalidade ajuizada por terceiro. Assim, indefiro o postulado ingresso do Governador do Estado — que figura como órgão requerido na presente ação direta — na condição de litisconsorte ativo do Procurador-Geral da República. Resta, ainda, uma indagação: pode o sujeito passivo da relação processual instaurada com o ajuizamento de ação direta de inconstitucionalidade requerer a suspensão cautelar da eficácia das normas impugnadas, quando não o fez o próprio Autor? Entendo que não. Tenho para mim que não se revela lícito ao órgão de que emanou o ato questionado, na hipótese em que figure ele como requerido em sede de ação direta, deduzir a pretensão de ordem coutelar, ainda que expressamente reconheça a procedência do pedido formulado por terceiro. Somente aquele que fez instaurar o processo de controle normativo abstrato, e nele figure, validamente, como autor, dispõe de legitimidade ativa para requerer a concessão de medida cautelar em ação direta de inconstitucionalidade. Disso decorre que o órgão estatal requerido, que se situa no pólo passivo da relação processual, não possui qualidade para, em sede de fiscalização abstrata de constitucionalidade, formular pedido de suspensão cautelar da eficácia do ato impugnado. Isto posto, e resolvendo este segundo ponto da questão de ordem ora suscitada, não conheço do pedido de medida cautelar deduzido pelo Governador do Estado do Rio Grande do Sul, em face de sua absoluta ilegitimidade ativa para, neste processo em que figura como órgão requerido, deshivir semelhante pretensão. É o meu voto. EXTRATO DA ATA ADIn 807 (Questão de Ordem) — RS — Rel.: Min. Celso de Mello. Reqte.: Procurador-Geral da República. Reqdos.: Governador do Estado do Rio Grande do Sul e Assembléia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul. Decisão: Apresentado o feito em mesa, o julgamento foi adiado em virtude do adiantado da hora. Plenário, 5-5-93. Decisão: Por votação unânime, o Tribunal, resolvendo questão de ordem proposta pelo Relator, indeferiu a admissão do Govemador do Estado do Rio Grande do Sul como litisconsorte ativo, e não conheceu do pedido de medida cautelar por ele formula- R.TJ —150 do. Votou o Presidente. Ausente, ocasionahnmte, o Ministro Carlos Velloso. Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotd. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Moreira Alves, Nézi da Silveira, Paulo Brossa* Sepdveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Veiloso, Marco Aurélio, limar Gal- 57 vão e Francisco Rezei Ausente, justificademente, o Sr. Ministro Sydney Sandra. Vice-Procurador-Geral da República, Dr. Moacir Antonio Machado da Silva. Brasília, 27 de maio de 1993 — Luiz Tondmatsn, Seaetído. AÇÃO DIRETA DE 1NCONSTTTUCIONALIDADE br 895 — RS (Medida Cautelar) (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro limar Gaivão Requerente: Governador do Estado do Rio Grande do Sul — Requerido: Assembléia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul Constitucional. Dispensa de servidor público para exercício de mandato em entidade representatim. Matéria de iniciativa legislativa reservada (aM 61, 51; H C, da CF). Aplicação da regra dos estados-membros. Precedentes. Apurada a relevinda jurídica do pedido fundado em alegação de inconstitudonalidade formal, e o justificado recdo de grave lesão ao cumprimento do calendário escolar se mantida a legislação impugnada, é de se deferir a medida cautelar requerida. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, por seu Tribunal Pleno, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em referendar o despacho do Mmistro limar Gaivão, que deferira medida cautelar para suspender, até a decisão final da ação, a eficácia da Lei n° 9.536, de 10-3-92, do Estado do Rio Grande do Sul. Votou o Presidente. Brasília, 8 de setembro de 1993 — Octudo Gallotd, Presidente — limar Gelvão, Relator. RELATÓRIO pedido de medida liminar, tendente à suspensão da Lei n° 9536092, do Estado do Rio Grande do Sul, com o seguinte teor: art. 1° — Fica acrescentado à Lei n° 9.073, de 15 de março de 1990, o seguinte artigo, que será o quinto, renumerando-se os demais: Art. 5° —Fica garantida a dispensa de, no mínimo, um representante por ciramsaição regional, nos casos em que as entidades adotarem esta forma de estrutura e congregaran mais de quinhentos associados das respectivas regiões. O Sr. MInktiro limar Gaivão (Rela- Art. 2" —Estalei entra em vigor na data de sua publicação. tar): Às vésperas do último recesso, vieram-me conclusos os autos da presente ação direta, em que se encontrava formulado Art. 3° — Revogam-se as disposições em contrário.» 58 R.TJ. — 150 No dia 1° do corrente, proferi despacho, ad referendum do egrégio Plenário, nos seguintes termos: «O Governador do Rio Grande do Sul propõe ação direta de inconstitucionalidade da Lei Estadual n° 9.536, de 10 de março de 1992, pela qual, em acréscimo ao disposto na Lei n° 9.073, de 15 de março de 1990, foi estendida aos servidores públicos, integrantes de entidades de classe ou sindical, com organização regional, a garantia de dispensa de suas atividades para o exercício nelas de mandato eletivo. Afirma que a referida lei, além de contrária ao interesse público, é inconstitucional, por usurpação de competência, uma vez que originada de projeto de lei proposto por membro da Assembléia Legislativa, quando a matéria relativa ao afastamento de servidores públicos é afeta à iniciativa legislativa própria do Chefe do Poder Executivo, de conformidade com o art. 61, § 1°, II, c, da Constituição Federal. Pleiteia a concessão de medida cautelar, assinalando que a execução da legislação impugnada implica conturbar a Administração Estadual, particularmente na área do magistério, dado o número de afastamentos em causa, com grave prejuízo ao desenvolvimento das atividades letivas nos diversos estabelecimentos de ensino espalhados pelo território gaúcho. Vislumbro configurada, na hipótese, a relevância e plausibilidade jurídica no pedido do Autor, tendo em vista o documento de fl. 16 e, ainda, que a matéria concernente à dispensa ou licença de servidores públicos é afeta ao quadro das normas que devem disciplinar o regime jurídico da categoria e, pois, inserida na competência privativa do Chefe do Poder Executivo, para efeito de iniciativa legislativa, a teor do que dispõe o art. 61, § 1°, II, c, da Constituição Federal, cuja aplicação aos Estadosmembros decorre de ser tal regra um desdobramento necessário do princípio da separação dos Poderes (ADIMC n° 757, de que fui relator). Concorre, outrossim, o requisito do perimiam in mora, considerando a circunstância de que, somente no caso dos profissionais da área de educação, a execução daquelas normas resulta no afastamento de elevado número de professores das atividades de ensino, com evidente prejuízo ao cumprimento do calendário escolar. Com efeito, composta a diretoria de cada um dos quarenta e dois núcleos regionais do sindicato dos professores do Rio Grande do Sul de oito membros (documentos de fls. 20/21, e 25-v), a aplicação das regras de dispensa de servidores para o exercício de mandato eletivo redunda em subtrair da atividade de ensino, na rede pública, cerca de trezentos e trinta e seis professores, evidenciando o justo receio manifestado pelo Autor quanto à ocorrência de dano irreparável. Por todo o aposto, concedo, ad referendum do egrégio Plenário, a medida cautelar requerida para efeito de suspender, até o julgamento final da ação direta, a execução da Lei n° 9.536/92, do Estado do Rio Grande do Sul. Providenciem-se as devidas comunicações, solicitando-se informações à autoridade requerida» Para a apreciação desta decisão, submeto-a, na forma regimental, ao egrégio Plenário. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro limar Gaivão (Relator): Ao deferir a medida cautelar, consignei que o fundamento da ação direta era juridicamente relevante e plausível em face R.T.J —150 do que dispõe o art. 61, § 1°, II, c, da Constituição Federal, e, por outro lado, que havia o perleulum in mora em face do considerável contingente de professores que estariam sendo beneficiados com a dispensa ou licença de suas atividades profissionais, em prejuízo do normal desenvolvimento do calendário letivo nos estabelecimentos de ensino da rede pública do Estado do Rio Grande do Sul. Acrescento, nesta oportunidade, com vistas a apenas reforçar o argumento em torno da situação de perieulunt In mora, que a legislação impugnada permite elevar o número de dispensa de professores para além daquele indicado no despacho, através de atos de iniciativa exclusiva da própria entidade sindical. Com efeito, basta atentar para a circunstância de que a Lei n° 9.073/90, em cujo contexto foi inserida a legislação ora impugnada, permite que, em caso de representação sindical, o número de dispensas atinja o limite de até onze, o que não foi alcançado no caso particular das representaçõesregionais do sindicato dos professores, podendo vir a sê-lo, todavia, mediante simples alteração do respectivo estatuto, de modo que, elevado dos atuais oito para onze o número de diretores de cada núcleo regional, restariam beneficiados pela dispensa remunerada das atividades de ensino, em tese, nada menos do que quatrocentos e sessenta e dois professores. E mais, é possível ainda que o próprio sindicato, como prevê o at. 23, 1°, do seu estatuto, venha a criar, observando a congregação mínima legal de quinhentos associados por área, novos núcleos regionais para atender «às necessidades de mobilização e organização da categoria», o que implicaria elevar ainda mais o atual número de afastamentos remunerados de ptufessores. 59 É óbvio que estes últimos números se revelam como projeções ou possibilidades, sendo certo que, de concreto, há apenas a garantia de afastamento dos referidos trezentos e trinta e seis professora da rede pública de ensino. De qualquer modo é o quanto me pareceu suficiente para ver caracterizado o perimiam in mora, que conduziu-me ao deferimento da medida liminar. Por isso, Sr. Presidente, meu voto é no sentido de que seja mantido o despacho que suspendeu, cautelarmente, a eficácia da Lei n° 9336/92 até o julgamento final da presente ação direta. EXTRATO DA ATA ADln 895 (Medida Cautelar) —RS — Rel.: Min. limar Gaivão. Repte.: Governador do Estado do Rio Grande do Sul (Advs.: Gabriel Pauli Fadei e outra). Reqda.: Assembléia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul (Advs.: Regis Amoldo Ferretti e outros). Decisão: Por votação unânime, o Tribunal referendou o despacho do Ministro mar Gaivão, que deferira medida canelar para suspender, até a decisão final da ação, a eficácia da Lei n° 9.536, de 10-3-92, do Estado do Rio Grande do Sul. Votou o Presidente. Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotti. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira, Sydney Saches, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Venoso, Marco Aurélio e limar Gaivão. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Francisco Rezek. Procurador-Geral da República, Dr. Aristides Junqueira Alvarenga Brasília, 8 de setembro de 1993 —Luiz Tominatsu, Secretário. 60 — 150 AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N° 900 — DF (Questão de Ordem) (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro Sydney Sanches Requerente: Associação Brasileira dos Inquilinos — Requeridos: Presidente da República e Congresso Nacional Ação direta de inconstitucionalidade. Legitimidade ativa. Associação Brasileira de Inquilinos (art. 103, IX, da Constituição Federal). Uma associação de inquilinos — reunindo pessoas ligadas, apenas, pelo interesse contingente de estarem na mesma posição jurídica de partes, em relações distintas de contratos de locação, mas sem integrar a mesma categoria econômica ou profissional —não é entidade de classe, legitimada à propositura de ação direta de inconstitucionalidade, prevista no art. 103, IX, da Constituição Federal. Ação não conhecida, por ilegitimidade ativa «ad causam». ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, resolvendo questão de ordem proposta pelo Relator, em não conhecer da ação por falta de legitimidade ativa da requerente. Brasília, 23 de setembro de 1993 — Octavio Gallotti, Presidente — Sydney Sanches, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Sydney Sanches (Relato* 1. Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade dos artigos 77 e 78, parágrafo único, da Lei n° 8.245, de 18-10-1991, proposta pela Associação Brasileira de Inquilinos, com base no art. 103, inc. IX, da Constituição Federal, sob alegação de que tais dispositivos ofendem o inc. XXXVI do art. 5° da Constituição Federal, segundo o qual «a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada». 2. À fl. 6, como relator, determinei à Autora que juntasse procuração outorgada ao advogado signatário da inicial e comprovasse o teor de seu estatuto, bem como o respectivo registro no cartório competente, o que foi feito às fls. 10/24. Determinei, ainda, à fl. 25, que a Autora apresentasse a relação de seus associados, com indicação, inclusive, de residência e domicilio, não tendo sido cumprido o despacho. Trago, então, os autos à consideração do Eg. Tribunal para o exame de questão de ordem, relacionada com a legitimação para a propositura da ação (art. 21, inc. BI, do RISTF). É o relatório. VOTO (QUESTÃO DE ORDEM) O Sr. Ministro Sydney Sanches (Relator): 1. A autora é uma «sociedade civil, sem fms lucrativos», com sede na cidade do Rio de Janeiro (art. 2° do estatuto, fl. 14). O art. 1° aponta como sua área de atuação «todo o território brasileiro» (fl. 14). Pode filiar-se a ela quem «comprovar, mediante contrato, a condição de inquilino» (art. 9°, inc. II, fl. 15). R.TJ —150 Como constou do relatório, havendo o Relatar determinado que a autora apresentasse a relação de seus associados, com indicação, inclusive, de residência e domicílio, não cumpriu ela o despacho. Ora, inquilino ou locatário é uma das partes da relação jurídica contratual de locação. O inquilino ou locatário, enquanto tal, não integra uma classe, no sentido de categoria profissional ou econômica E este é o significado que se deve atribuir ao vocábulo classe, empregado no inc. IX do art. 103 da Constituição Federal. Matada mutandis, é de ser lembrado precedente na ADIn n° 034, de que foi Relator o eminente Ministro Octavio Gallotti (RTJ 128/481, julgada em 5-4-1989): «Requerente: Associação dos Empregados da CAEEB — ASEC — Requerido: Presidente da República Ação direta de inconstitucionalidade. Não se caracteriza, como «entidade de classe», a conferir legitimidade para a propositura de ação direta de inconstitucionalidade, nos termos do art. 103, IX, da Constituição, a simples associação de empregados de determinada empresa, por não congregar uma categoria de pessoas intrinsecamente distinta das danais, mas somente agrupadas peio interesse contingente de estarem a serviço de determinado empregador. Processo extinto, por ilegitimidade de pane, sem julgamento de mérito.» Observo que os inquilinos também não congregam uma categoria de pessoas, intrinsecamente distinta das demais categorias e somente se agrupam pelo interesse contingente de estarem na mesma posição jurídica de partes, em relações distintas de contratos de locação. 61 De sorte que uma associação de inquilinos não é, propriamente, uma entidade de classe, para os efeitos do art. 103, IX, da Constituição Federal. Aliás, na Aia n° 501, Relator o eminente Ministro Moreira Alves, uma entidade que congrega aposentados e pensionistas, de diversas categorias profissionais, não foi considerada como «entidade de classe» (RTJ 136/1061, julgada em 15-51991). Já na ADIn n° 42, Relator o eminente Ministro Paulo Brossard, exigiu o Tribunal, para efeito de caracterização de uma entidade de classe, a «unidade, em caráter permanente, de interesse daqueles que empreendem atividade profissional idêntica» (DJ, 2-4-1993, n° 63, pág. 5611). Por outro lado, a CUT e a CGT também não fixam consideradas entidades de classe, para os efeitos do art. 103, IX, da Constituição Federal, por reuniram trabalhadores das mais diversas categorias e não de uma só (ADIn n° 271, Relator Ministro Moreira Alves; ADIn n° 335, Relator Ministro Néri da Silveira; ADIn n° 334, Relatar Ministro Moreira Alves; ADIn n° 928, Relator Ministro Sydney Sanches). Por todas essas razões, a Associação Brasileira dos Inquilinos, também não pode ser considerada uma entidade de classe, para os efeitos do art. 103, IX, da Constituição Federal, faltando-lhe legitimidade para a propositura da ação, já por essa razão. Mesmo, porém, que os inquilinos pudessem ser considerados como integrantes de uma «classe», para os efeitos do inc. IX do art. 103 da Constituição Federal, nem por isso teria a autora legitimidade para a propositura da ação. É que não basta haver apontado, no estatuto, como área de sua atuação, todo o território brasileiro. 62 R.T.J. —150 Toma-se indispensável a prova de que se trata de uma entidade de âmbito efetivamente nacional. Nesse sentido, podem ser invocados, mutatis mutandis, os seguintes precedentes: r RTJ 136/479: ação Direta de Inconstitucionalidade n° 386-SP (Medida Liminar) (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro Sydney Sanches Requerente: Associação Brasileira das Indústrias de Sucos Cítricos — ABRASSUCOS — Requerida Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo. Ação Direta de Inconstitucionalidade. Legitimidade ativa. Entidade de classe de âmbito nacional (art. 103, IX, da Constituição Federal). Não é entidade de classe de âmbito nacional, para os efeitos do inciso IX do art. 103 da Constituição, a que reúne empresas sediadas no mesmo Estado, nem a que congrega outras de apenas quatro Estados da Federação. Ação não conhecida, por ilegitimidade ativa ad causam». (Nesse precedente ficou ressaltado pelo Relator e condutor do acórdão: <Tara que a entidade de classe tenha âmbito nacional, não basta que o declare em seus estatutos. É preciso que esse âmbito se configure de modo inequívoco» (RTJ 136/485, item 3). E no voto do Ministro Moreira Alves foi salientado que o âmbito nacional pode ser reconhecido, se houver filiados em pelo menos nove Estados da Federação, àsemelhança do que acontece, por força de lei, com os Partidos Políticos, para que sejam considerados de caráter nacional —RTJ 136, pág. 492 —, critério, aliás, que passou a ser seguido pela Corte, em outros julgados). 2° RTJ 129/957 ação Direta de Inconstitucionalidade n° 39/RJ (Questão de Ordem) (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves Requerente: Sindicato dos Bancos do Estado do Rio de Janeiro — Requeridos: Governador e Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro. Ação direta de inconstitucionalidade. Questão de ordem sobre legitimação para propô-la. Sindicato de Bancos, que tendo base territorial em alguns Estados-membros, só congrega, como associados, os Bancos em funcionamento nesses Estados que satisfaçam as exigências da legislação sindical, não tem âmbito nacional, e, portanto, não se enquadra na hipótese prevista no artigo 103, IX, in fine, da Constituição. Julgou-se extinto o processo sem julgamento do mérito, por falta de legitimação ativa.» (julgada em 27-4-1989). Ora, a Autora tem sede na cidade do Rio de Janeiro e, embora instada pelo Relator, não apresentou a relação de seus filiados, com indicação do respectivo endereço, de modo a possibilitar a constatação de que tenha filiados fora do Estado do Rio de Janeiro e, menos ainda, em nove Estados da Federação, como tem exigido a referida jurisprudência do Tribunal, com aplicação analógica da Lei Orgânica dos Partidos Políticos, que só considera nacionais os que estejam organizados em pelo menos nove unidades federativas. Por todas essas razões, não sendo a autora, propriamente, uma entidade de classe, nem comprovando que opere em âmbito nacional, falta-lhe legitimidade R.T.J — 150 para a propositura da ação direta de inconstitucionalidade. Isto posto, resolvendo a questão de ordem, não conheço da ação, por ilegitimidade ativa ad causam. 63 te, já não posso partir para tal presunção, e, por esse segundo fundamento, concluo pela carência da ação proposta em face da ilegitimidade. VOTO (PRELIMINAR) VOTO (QUESTÃO DE ORDEM) O Sr. tfro Marco Aurélo: Sr. Presidente, quanto à caracterização dessa associação como uma entidade de classe, o quadro é mais favorável do que aquele revelado nas ações diretas de inconstitucionalidade que envolveram a CUT, a CGT e também a UNE, porque, a meu ver, o que qualifica urna associação de classe é a existência de interesses comuns aos integrantes. Pouco importa que, na espécie, não tenhamos, aí, uma categoria, em si, profissional. O que cabe perquirir é se a associação, na verdade, atua em prol de um segmento da sociedade. Não tenho a menor dúvida de que a Associação Brasileira dos Inquilinos assim o faz. Agora, surge o problema alusivo à abrangência. Afitara o nobre Relator que instou a Associação a comprovar a abrangência ' tano inciso IX do artigo 103 da Carta previu de 1988, e que a Requerente quedou silente, não trazendo aos autos essa comprovação. Indaga-se: basta, na espécie, a designação, a nomenclatura da entidade «Associação Brasileira dos Inquilinos»? Caminharia, de início, nesse sentido, frente até mesmo ao princípio da razoabilidade, presumindo o que normalmente ocorre, o quotidiano, o ordinário e não o excepcional. Não posso presumir que uma associação, que se diga brasileira, não tenha abrangência maior a ponto de alcançar várias unidades da Federação. Todavia, diante da postura adotada pelo Relator e do silêncio da própria Reguem- O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Sr. Presidente, já não tenho esperanças nesta geração: mas, quem sabe os nossos sucessores, um dia, darão ao conceito de entidade de classe do art. 103, IX — até hoje quase só reconhecida à UDR —, um sentido menos «celetista». Acompanho o eminente Relator, na extensão do voto do eminente Ministro Marco Aurélio, e não conheço da ação. EXTRATO DA ATA ADIn 900 (Questão de Ordem) — DF — ReL: Mn. Sydney Sanches. Reqte.: Associação Brasileira dos Inquilinos (Adv.: Mário J. Damasceno). Reqdos.: Presidente da República e Congresso Nacional. Decisão: Por votação unânime, o Tribunal, resolvendo questão de ordem proposta pelo Relator, não conheceu da ação por falta de legitimidade ativa da requerente. Votou o Presidente. Presidência do Sr. Ministro Octavio lotti. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Néri da Silveira, Sydney Sanches, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Marco Aurélio, Ilmar Gaivão e Francisco Rezek. Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Moreira Alves e Carlos Venoso. Procurador-Geral da República, Dr. Aristides Junqueira Alvarenga. Brasflia, 23 de setembro de 1993 — Luiz Tomimatsu, Secretário. R.TJ. —150 64 AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N' 928 — DF (Medida Cautelar) (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro Sydney Sanches Requerente: Confederação Geral dos Trabalhadores —CGT —Requeridos.: Presidente da República e Congresso Nacional Ação direta de inconstitudonalidade. Legitimidade ativa. Confederação Sindical. — Confederação Geral dos Trabalhadores — CGT. Art. 103, IX, da Constituição Federal. A CGT, embora se autodenomine Confederação Geral dos Trabalhadores, não é, propriamente, uma Confederação Sindical, pois não congrega federações de sindicatos que representem a maioria absoluta de um grupo de atividades ou profissões idênticas, similares ou conexas. Também não é propriamente, uma entidade de classe, pois não congrega apenas os integrantes de uma determinada atividade ou categoria profissional ou econômica. É, sim, uma Central Geral dos Trabalhadores, ou seja de todas as categorias de trabalhadores. Não sendo, assim, uma Confederação Sindical, nem uma entidade de classe de âmbito nacional, não tem legitimidade para a propositura de ação direta de inconslitudonalidade (art. 103, IX, da Constituição Federal). Precedentes. Ação não conhecida, por ilegitimidade ativa «ad-causam». ACÓRDÃO RELATÓRIO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquignlficas, por maioria de votos, o Tribunal não conheceu da ação, por ilegitimidade ativa da requerente, ficando, em conseqüência prejudicado o requerimento de medida cautelar, vencidos os Ministros Marco Aurélio e Sepülveda Pertence, que dela conheciam. Brasília, 1° de setembro de 1993 — Ottani° Gallotli, Presidente — Sydney Sanches, Relator. O Sr. Ministro Sydney Sanches (Relator): 1. Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade do art. 2°, caput, e seu parágrafo 2', da Emenda Constitucional 3, de 17-3-1993, e da Lei Complementar n° 77, de 13-7-93, proposta pela Confederação Geral dos Trabalhadores — CGT, com base nos artigos 103, IX, e 102, 1, a e p, da Constituição Federal. e 2. Na inicial, alega e pleiteia a autora o seguinte (fls. 2/20): «Ação Direta de Inconstitudonalidade com Pedido de Liminar R.T.J - 150 No que concerne ao art. 2°, capei, e respectivo parágrafo 2°, da Emenda à Constituição n° 3/93, promulgada em 17 de março de 1993, e à Lei Complementar e 77, sancionada em 13-7-93, por ofensa aos preceitos constitucionais insculpidos nos arts. caput, 145, parágrafo 1° 150, inciso IV, e, em especial com viola ção dos princípios da anualidade (art. 165, parágrafo 2°), e da anterioridade (art. 150,111, letra b), em combinação com o art. 60, parágrafo 4°, IV, que veda a deliberação congressual acerca de proposições legislativas que contrariem as limitações constitucionalmente impostas ao poder constituinte derivado. A tramitado da emenda n' 393 1. Em 9-12-92, foi aprovado pela Comissão Especial constituída para os fina do art. 202, parágrafo 2°, do Regimento Interno da Câmara dos Deputados o parecer do Relator designado para apreciar proposta de emenda à Constituição (n° 48/91), favorecendo substitutivo que, apar de prever nova incidência tributária sobre movimentação financeira, o fez com total descaso pelos direitos e garantias individuais constitucionalmente assegurados pelos arts. 5°, caput, e inciso LV, 145, parágrafo 1°. 150, inciso IV, da Constituição Federal. A matéria, em que pese a manifesta violação à norma limitadora do poder constituinte derivado, foi levada ao Plenário da Câmara dos Deputados, onde contou com a aprovação por maioria qualificada, em dois turnos, nas sessões realizadas em 21-1-93 e 2-2-93, a desfruta:ira:acido pronunciamento de parcomo o Deputado José Maria Eymael denunciando a grave ofensa aos postulados do Estado de Direito. Posteriormente, no âmbito do Senado Federal, foi a proposta de emenda igualmente aprovada em dois tomos, nas sessões de 18-2-93 e 10-3-93 apesar das 65 advertências feitas por parlamentares de distintos partidos políticos como o Senador Bisol que qualificou a emenda de verdadeiro ato institucional, e pelo SenadorJosaphat Marinho que ressaltou a ameaça às liberdades democráticas contida na deliberação então aprovada (cf. doc. fls.). 2. A redação do substitutivo cuja tramitado legislativa iniciara-se na Câmara dos Deputados, em 9-12-92, que acabou por ser aprovado em ambas as Casas do Congresso Nacional e promulgado pelas Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal em 17-3-93, a par de violar implicitamente preceitos constitucionais diversos que abrigam direitos e garantias do cidadão em geral e do contribuinte em particular (arts. 5°, capei, e inciso LV, 145, parág. 1°, 150, inciso IV), contempla disposição que pretende abolir de forma expressa garantia constitucionalmente assegurada aos contribuintes, verbis: Art. 2° - A União poderá instituir, nos termos da lei complementar, com vigência até 31 de dezembro de 1994, imposto sobre movimentação ou transmissão de valores e de créditos e de direitos de natureza financeira Parágrafo 2° - Ao imposto de que trata este artigo não se aplica o art. 150, 111, b, e IV, nem o disposto no parágrafo 5° do art. 153 da Constituição. Tais disposições configuram ofensa expressa ao dispositivo inserto no art. CO, parágrafo 4°, IV, da Lei Maior, razão pela qual são fulminadas de inconstitucionalidade. A Lei Complementar n° 77/93, sancionada em 13-7-93, ao instituir o tributo de que trata o art. 2°, caput, da malsinada Emenda n° 3/93, encontra-se igual- 66 R.TJ. 150 mente inquinada de vício insanável, mormente ao pretender iniciar a cobrança no presente exercício (art. 28). Do Direito Do Regime Constitucional das Garantias Individuais Dispõe a Constituição do Brasil, no seu artigo 1°, constituir-se a República Federativa do Brasil em Estado Democrático de Direito. É objetivo fundamental daRepública construir uma sociedade livre, justa e solidária (art. 3°, I, da Constituição). O surgimento das Constituições está vinculado às garantias fundamentais dos cidadãos contra o arbítrio e a surpresa na exigência de tributos. A Carta Magna, o BID of wrights, a Pelition of wrights são momentos marcantes da elaboração institucional dessas garantias. Para que possam prevalecer os princípios fundamentais do Estado de Direito afirmou a Constituição brasileira a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade e instituiu garantias a esses direitos. Multiplicam-se as garantias, desde as 77 figuras do art. 5°, no Título II, da Constituição. O parágrafo 2° do artigo 5° ilumina a significação dos direitos e garantias constitucionais, verbis: «Parágrafo 2° — Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.» Dentre as garantias constitucionais, assinalam-se aquelas que, na linha herdada da evolução das Constituições britânicas, desde João sem Terra, garan- tem os contribuintes contra o excesso e surpresas na imposição de tributos. Foi com esse objetivo que, ressalvando expressamente quaisquer outras garantias asseguradas ao contribuinte, dispôs seu inciso III, letra b, o art. 150, da Constituição do Brasil: Art. 150 — Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: 11I — cobrar tributos: b) no mesmo exercício fmanceiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou.» Essa norma consagra, em nosso país, o princípio a que os constitucionalistas e tributadstas, em todo o mundo, denominam «princípio da anterioridade»: para que possa ser cobrado tributo, em um exercício, deve alei que o instituiu ou aumentou ter sido publicada em ano anterior. Essa garantia, contra a tributação apressada e não fundada em planejamento maduro, é fundamental à segurança econômica dos cidadãos: torna-se inviável a atividade econômica e racional, se está submetida a surpresa de alteraçô«s tributárias de efeito imediato. A par desta, a Constituição Federal de 1988 cuidou igualmente, na melhor tradição de nosso Direito, do princípio da anualidade, que veda a cobrança de tributos que não se encontrem previstos na lei orçamentária. Com efeito, o art. 165, parágrafo 2°, da Constituição Federal, exige que a lei de diretrizes orçamentárias disponha sobre as alterações na legislação tributária, tendo o Plenário do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia se pronunciado claramente quanto à ilegalidade da cobrança de tributos R.TJ —150 não previstos na lei orçamentária, (cf. Acórdão às fls.). O princípio em questão assegura ao contribuinte que este não será surpreendido por normas impositivas cujo conhecimento prévio poderia tê-lo feito agir diferentemente. É o princípio da previsibilidade da ação estatal a que se refere o festejado Mestre Geraldo AtaOba, traduzindo o postulado da «certeza pronta e definitiva sobre a quantia da dívida tributária» (O Princípio da Irretroatividade das Leis em Matéria Tributária, in Resenha ABDF n° 7, pág. 58). Ademais deste, a Constituição Federal cuidou de proteger o cidadão em geral e o contribuinte de impostos, em particular, em diversas outras disposições que buscam delimitar o poder de tributar, por parte do Estado, através de um conjunto de regras que se convencionou chamar de Estatuto do Contribuinte. Assim é que, no art. 5', captai, reconheceu a Constituição Federal o princípio da igualdade de todos perante a lei. Tal princípio se traduz em tratar igualmente os iguais, e desigualmente os desiguais, como já manifestado de forma lúcida e contundente por nossos Tribunais. A tributação do trabalhador brasileiro, cujos legítimos interesses são representados por esta Confederação Geral dos Trabalhadores — CGT, constitui, com efeito, grave ofensa ao princípio da isonomia, mormente ao considerar que o poder constituinte originário previu, no conjunto de incidências elencadas no capítulo constitucional acerca do Sistema Tributário Nacional, impostos que sequer foram instituídos pelo legislador ordinário, que preferiu usurpar, através do poder constituinte, exercendo-o ao arrepio da vedação constitucional para criar novo tributo. 67 Assim é que o imposto sobre grandes Ramas previsto constitucionalmente no art. 153, VII, cuja instituição chegou a ser proposta perante o Congresso Nacional pelo atual Ministro da Fazenda, o então Senador Fernando Henrique Cardoso, remanesce letra morta até o presente, optando o Congresso Nacional por gravar tributariamente, ainda esta vez, o sofrido trabalhador brasileiro. É para pôr cobro a esta grave iniqüidade que a CGT move a presente ação. Também, os arts. 145, parágrafo 1°, e 150, inciso IV, da Lei Maior, ao estabelecerem o princípio da progressividade dos tributos, tendo em vista a capacidade econômica dos contribuintes, e o princípio do não confisco, criam, igualmente, exercício da atividade econômica, protegendo o indivíduo contra os abusos do poder constituído. De resto, o sistema constitucional brasileiro, em matéria tributária constitui um sistema fechado, com previsão expressa de cada um dos impostos de competência da União, dos Estados e Municípios, ressalvada à União, a competência residual, cujo exercício pressupõe a instituição de imposto obrigatoriamente de caráter não cumulativo (art. 154,1, da CF). Ora, se foi por desejo expresso do poder constituinte originário que se vedou a instituição de novos impostos de caráter não cumulativo, não há como pretender quebrar tal sistemática por meio de emenda aprovada pelo poder derivado, sem ofender a disposição contida no art. 60, parágrafo 4°, IV, da Carta Magna. Da intangibilidade das Garantias Individuais no Sistema Constitucional Vigente 5.0 legislador constituinte de 1988 insculpiu dentre as proibições de natureza material às modificações ulterio- 68 R.TJ. — 150 do texto constitucional as normas atinentes aos direitos e garantias individuais (art. 60, parágrafo 4°, IV). «Artigo 60 — A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: Ao fazê-lo, tomou nulas as deliberações congressuais relacionadas com emendas à Constituição na parte em que abolissem tais direitos. Parágrafo 4° —Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: tas Importa, a este ponto, traçar a distinção entre o exercício do poder constituinte originário e aquele poder derivado que exerce o Congresso Nacional. Distinguindo entre as duas figuras, com o brilho sempre presente em seus votos, o eminente Ministro Celso de Meio delineou nitidamente contornos de exigência da constitucionalidade: «O Congresso Nacional, no exercício de sua atividade constituinte derivada e no desempenho de sua função reformadora, está juridicamente subordinado à decisão do poder constituinte originário que, a par de restrições de ordem circunstancial, inibitória do poder reformador (CF, art. 60, parágrafo 11, identificou, em nosso sistema constitucional, um núcleo temático intangível e imune à ação revisora da instituição parlamentar. As limitações materiais explícitas, definidas no parágrafo 4° do art. 60 da Constituição da República, incidem diretamente sobre o poder de reforma conferido ao Poder Legislativo da União, inibindo-lhe o exercício nos pontos ali discriminados. A irreformabilidade desse núcleo temático, acaso desrespeitada, pode legitimar o controle normativo abstrato, e mesmo a fiscalização jurisdicional concreta, de constituemnalidade» (ADIn 466-2). 6. De fato, dispõe o artigo 60 da Constituição, em seu parágrafo 4°, IV: IV — os direitos e garantias individuais.» Emenda tendente a abolir direitos e garantias individuais não pode ser objeto de deliberação. Não cuida, esse dispositivo constitucional, da evidente necessidade de que obedeçam à Lei Maior todas as deliberações. São mais enérgicas as disposições daquele inciso IV: nunca poderia o Congresso Nacional, nunca poderia qualquer de suas Casas, deliberar sequer sobre a emenda que tendesse a abolir direito ou garantia individual. Nem se poderia distinguir entre o conjunto dos direitos, o conjunto das garantias, e uma detenninada garantia ou um determinado direito em particular. O sistema de disposições constitucionais que tutela as garantias e direitos dos cidadãos e, em matéria tributária, especialmente os dos contribuintes, seria ferido se se tomasse objeto de deliberação medida que visasse a abolir determinada garantia. Nesse sentido, tem concluído esta E. Corte Suprema, como decorre do citado voto da lavra do Ministro Celso de Mello, que deslinda o tema coto sua habitual clareza: «Emendas à Constituição — que não são normas constitucionais originárias — podem, assim, incidir, elas próprias, no vício da inconstitucionalidade, configurado pela inobservância de limitações jurídicas R.TJ — 150 superiormente estabelecidas no texto constitucional por deliberação do órgão exercente das funções constituintes primárias ou originárias, como tem reconhecido a doutrina, expressa no magistério de Otto Bacho?, «Normas Constitucionais Inconstitucionais?», págs.52/54,1977 , Atlântica Editora, Coimbra; Jorge Miranda, «Manual de Direito Constitucional», tomo II/287-294, item n° 72, 2' ed., 1988, Coimbra Editora; Maria Helena Dinis, «Norma Constitucional e seus efeitos», pág. 97, 1989, Saraiva; J. J. Gomes Canonlho, «Direito Constitucional», págs. 756-758, 4' ed., 1987, Almedina; José Afonso da Silva, «Curso de Direito Constitucional Positivo», págs. 5W60, 5' ed., 1989, RT, entre outros» (ADIn 466-2, às fls.). 7. Nem se poderia negar validade a essa garantia constitucional, pela circunstância de que alguns tributos foram dela excluídos. É cariai que as exceções a este direito e garantia individual do contribuinte só poderiam ser estatuídas pelo poder constituinte originário, como efetivamente o foram no artigo 150, parágrafo 1°, da Carta em vigor. Não pode o poder constituinte derivado instituir novas exceções não originariamente previstas —estas são numeras dausus. O princípio prevalece, salvo as exceções que o poder originário instituiu. Assim em relação aos demais direitos e garantias individuais, que não os de natureza tributária. Com efeito, a exceção ao princípio da intangibilidade do direito adquirido (art. 5°, XXXVI, da Constituição Federal), só se sustenta quando abrigada no texto constitucional originário (art. 17 do ADCT), não podendo, em nenhuma hipótese, ser excepcionada por meio de 69 emenda à Constituição, como de resto, reconheceu a Câmara dos Deputados ao acolher o pronunciamento do Impetrante suprimindo o ert. 9'' da proposta de emenda em questão que visava excluir indevidamente direito adquirido (fls. usque). Nesse sentido, a lição, entre tantos outros, de Michel Temer: «Evidentemente, se uma emenda constitucional trouxer modificação, por exemplo, do sistema tributário, vulnerando princípios, ou em desobediência à forma determinada para sua produção, não se admite sua introdução na Constituição. Se vier a introduzir-se é passível de declaração de inconstitucionalidade.» (Grifamos) («Elementos de Direito Constituciamb., Malheiros Editores, 9° ed., 1992, pág. 135). Ao visar à supressão de garantia constitucional assegurada ao cidadão no art. 150,M, b, da Constituição Federal, para fins da incidência que a emenda à Constituição instituiu no caput do art. 2°, defronta-se o legislador dotado de poderes constituintes derivados com óbice intransponível, contido no art. 60, parágrafo 4°, inciso IV da Constituição Federal. Admitir que a União, no exercício de sua competência residual, ainda que por emenda constitucional, pudesse excepcionar a aplicação desta garantia individual do contribuinte, implica em conceder ao ente tributante poder que o constituinte expressamente lhe subtraiu ao vedar a deliberação de proposta de emenda à constituição tendende a abolir os direitos e garantias individuais constitucionalmente assegurados. Além de afrontar a Constituição instituindo um imposto cuja cobrança não se sujeitaria à anterioridade, com violação expressa da norma contida no art. 60, parágrafo 4°, inciso IV, da Coes- 70 R.T.J. —150 tituição Federal, a promulgação da Emenda n° 3/93, acompanhada da Lei Complementar n° 77/93 acarreta implícita violação às disposições contidas no art. 5°, caput e inciso 145, parágrafo 1°, e 150, inciso IV, da Lei Maior. Do pedido liminar. Face à demonstrada incompatibilidade da Emenda Constitucional n° 3, de 1993, no seu art. 2°, caput, e respectivo parág. 2°, por evidente desrespeito à disposição contida no art. 60, parágrafo 4°, IV, da Constituição, e tendo em vista a iminência da cobrança do tributo prevista na Lei Complementar n° 77/93 para iniciar-se a partir desta data, 26-8-93, requer a Autora a concessão de medida liminar, mediante a suspendo da eficácia da Emenda Constitucional n° 3, de 1993, em seu art. ?, bem como a decorrente suspensão da eficácia das disposições contidas na Lei Complementar n° 77/93, de modo a evitar, assim, que se empreenda a supressão de garantia individual assegurada pela nastituição Federal, como exposto anteriormente, com a possibilidade de grave e irreparável lesão. Neste sentido, a 2° Seção do Tribunal Regional Federal da ?Região concedeu liminar, nos termos do voto da Juíza Relatora Diva Malerbi, do qual cabem ressaltar os trechos abaixo, pela excepcional, ainda que habitual, lucidez de seus fundamentos, verbis: «A razoabilidade da tese se sustenta no fato de a doutrina e a jurisprudência pátrias reconhecerem, sob a denominação de estatuto do contribuinte, todos os desdobramentos que mereceram, no capitulo do sistema tributário, os direitos e garantias individuais, notadamente aqueles decorrentes dos princípios da igualdade e da legalidade, por serem estes os disciplinadores das relações jurídicas entre Estados e particulares, re- tratando não só a certeza do direito como a segurança de que a ação estatal de tributar seguirá o devido processo legal, este constitucionalmente pré-definido. «O princípio da anterioridade encontra raízes imediatas na certeza e segurança das relações entre Estado e contribuinte, traduzindo-se na garantia individual do conhecimento prévio das leis que irão instituir ou agravar as prestações tributárias no exercício financeiro seguinte, e, ainda, na garantia individual de que, durante esse mesmo lapso de tempo, nem mesmo as leis em vigor poderão cobrar eficácia sobre as atividades econômicas dos particulares. «Por isso mesmo, costuma-se afirmar, o núcleo essencial da garantia individual da irretroatividade, em matéria tributária, é qualificado, redobrado, pois a Constituição determina — e o princípio da anterioridade predica — que a lei tributária eficaz sempre será aquela que estiver em vigor até o último dia do ano anterior àquele em que se iniciarem os fatos geradores das obrigações tributárias. «A tese da inconstitucionalidade da lei de emenda se sustenta porque, embora se entenda que, em geral, os limites materiais do poder reformador se refiram sempre a princípios, independentemente das manifestações concretas que recebam expressão no texto constitucional, parece indisputável, hoje, que o mesmo não se passa com os direitos e garantias individuais. É entendimento dominante que o núcleo essencial dos direitos e garantias individuais é aquele definido pelo constituinte e que mesmo o sistema geral do regime do seu exercício e as suas formas de proteção devem ser considerados como R.TJ —150 incluídos na garantia material que a Constituição consagra na cláusula pétrea. Nesse sentido, aliás, a disposição do parágrafo 2° do artigo 5°, de que os direitos e garantias expressos na Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados ou, ainda, a da cabeça do artigo 150 que, ao tratar das limitações ao poder de tributar, ali afirma que as garantias deduzidas não excluem outras garantias igualmente asseguradas aos contribuintes. «Sob a égide da Constituição de 1988 predomina o entendimento de que exceções ao princípio da anterioridade são apenas e tão-somente aquelas previstas pelo constituinte de 1988, por constituir garantia individual em proteção de certeza do direito e segurança nas relações jurídicas. «As regras estatuidoras de limites ao poder de emendar se afiguram, assim, no direito vigente, como 'superconstitucionais' , por atestarem a superioridade do poder constituinte originário e, por isso, sua violação, mesmo em se tratando de legislador de emenda, deve ser tida como incidindo sobre a própria garantia da Constituição de 1988» (doc. fls.). Caso julgada excessiva a amplitude da liminar ora requerida, reitera, desde logo, a Autora o pedido a este respeito, requerendo que seja, neste caso, deferida liminar, tão-somente, para suspender a eficácia da Emenda n° 3/93 e da Lei Complementar n° 77/93 no trecho em que excluem a aplicação do art. 150, IR, b, da Constituição Federal, para fins de incidência do IPMF (art. 2°, parágrafo 2°, da Emenda e art. 28 da Lei Complementar), como tem ocorrido em diversas impetrações levadas a efeito contra a incidência inquinada de inconstitucionandaia (cf. docs. fls.). 71 Requer, outrossim, a citação dos Presidentes das Mesas do Senado Federal e da Câmara dos Deputados, do Procurador-Geral da República e do AdvogadoGeral da União para a defesa dos dispositivos impugnados. Requer fmalmente seja declarada definitivamente a inconstitucionalidade do art. 2°, caput, e respectivo parágrafo 2°, da Emenda Constitucional n° 3/93, bem como da Lei Complementar n° 77/93, por contrários às disposições dos arts. 5°, caput, 145, parágrafo 1°, 150, III, b, e IV, 165, parágrafo 2°, todos da Constituição Federal. Termos em que, Pede deferimento. Brasília, 26 de agosto de 1993. Ass.: André Martins de Andrade OAB/DF n° 1.103 — A». A inicial veio instruída com os documentos de fls. 21/83. Havendo requerimento de medida cautelar, trago os autos à consideração do Eg. Plenário (art. 170, parágrafo 1°, do RISTF). É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Sydney Sanches (Relatar): 1.0 Eg. Plenário, em data de 24-91992, por maioria de votos, vencidos os Ministros Sepúlveda Pertence e Marco Aurélio, não tomou conhecimento da ADIn n° 271, proposta pela Central única dos Trabalhadores — CUT, e de que foi Relator o Ministro Moreira Alves, ficando a essência do julgado assim expressa na ementa: «Ação direta de inconstitucionalidade. Central única dos Trabalhadores (CUT). Falta de legitimação ativa. — Sendo a autora constituída por pessoas jurídicas de natureza vária, e que representam categorias profissionais diversas, não se enquadra ela, na expressão «entidade de classe de âmbito nacional», a que alude o artigo 103 da Constituição, contrapondo-se às confedera- 72 R.TJ. — 150 ções sindicais, porquanto não é uma entidade que congregue os integrantes de uma determinada atividade ou categoria profissional ou econômica, e que, portanto, represente, em âmbito nacional, uma classe. — Por outro lado, não é a autora — e nem ela própria se enquadra nesta qualificação — uma confederação sindical, tipo de associação sindical de grau superior devidamente previsto em lei (CLT artigos 533 e 535), o qual ocupa o cimo da hierarquia de nossa estrutura sindical e ao qual inequivocamente alude a primeira parte do inciso IX do artigo 103 da Constituição. Ação direta de inconstitucionalidade que não se conhece por falta de legitimação da autora.» Na mesma data (24-9-1992), o Eg. Plenário, também por maioria de votos, vencido o Ministro Marco Aurélio, não tomou conhecimento da ADIn n° 335, proposta igualmente pela CUT, por considerála, ainda uma vez, parte ilegítima para a ação. Foi Relator o eminente Ministro Néri da Silveira. Eis a ementa desse julgado: «Ação Direta de Inconstitucionalidade. Central Única dos Trabalhadores — CUT. Na ADIn n° 271, o Plenário do STF, decidiu que a entidade em referência não possui legitimidade ativa à demanda de inconstitucknalidade, ut, art. 103, inciso IX, da Constituição. À vista do precedente, não se conhece da ação, prejudicado o pedido de cautelar» (DJU de 2-4-1993, pág. 5612, Ementário n° 1.698-02). E na sessão de hoje, em julgamento que precedeu, imediatamente, a este, o Eg. Plenário, por maioria, não conheceu da ADIn n° 334, por ilegitimidade ativa da Confederação Nacional dos Trabalhadores —CGT, que é também a autora da presente ADIn n° 928, de que sou agora o Relator. 4.O voto do eminente Ministro Moreira Alves, Relator e condutor do acórdão na ADIn n° 334, proposta pela CGT, assim se deduziu: «Voto O Sr. Ministro Moreira Alves (Rektor): 1. Há, na espécie, que se examinar, preliminarmente, a questão da legitimação da autora. Corno se vê do disposto no parágrafo único do artigo 23 dos seus estatutos, podem a ela filiar-se as seguintes pessoas jurídicas: 'a) Sindicatos; Federações; Confederações; d) Associações Profissionais, associações pré-sindicais, associações de categorias impedidas de sindicalização, e associações de funcionários e servidores públicos de âmbito municipal, estadual e nacional, desde que não implique em dupla representação'. À autora, no tocante à sua legitimação ativa, aplicam-se as considerações que fiz no voto que proferi, na Ação Direta de Inconstitacionalidade n° 271, sobre a mesma questão referente à Central Única dos Trabalhadores, e que são estas: '0 Sr. Ministro Moreira Alves (Relato* 1. No caso, há que se examinar, preliminarmente, a questão da legitimação da autora, que se qualifica como entidade de classe de âmbito nacional. Ora, do exame de seus estatutos verificando-se que, pelo artigo 1°, é ela uma entidade civil que pode congregar um número ilimitado de pessoas jurídi- R.TJ —150 cas, que, em face do artigo 34, são as seguintes: sindicatos; associações profissionais por ramo de trabalho, associações pré-sindicais, associações de categorias sem sindicatos, não podendo existir dupla representação; federações; e confederações.' Como se vê, trata-se, em verdade de pessoa jurídica que é constituída por ages sindicais ou não (assim, associações profissionais, associações pré-sindicais e associações de categorias sem sindicatos) representativos de quaisquer categorias profissionais de trabalhadores, uma vez que visa a representar os trabalhadores em geral, consoante o disposto no artigo 10 de seus Estatutos, o qual reza: 'Todos os setores da classe trabalhadora devem estar tepeesentados na CUT levando-se em consideração o seu peso no conjunto produtivo, sua importância estratégica e sua capacidade de luta já demonstrada. Toda a representáção deve smescolhidadentrodeumprocessolivre e democrático'. Sendo constituída por pessoas jurídicas de natureza vária, e que representam categorias profissionais diversas, não se enquadra ela na expressão 'entidade de classe de âmbito nacional', a que alude o artigo 103 da Constituição, contrapondo-a às confederações sindicais, porquanto não é urna entidade que congregue os integrantes de uma determinada atividade ou categoria profissional ou econômica, e que, portanto, represente, em âmbito nacional uma classe, em contaposição às confederações sindicais — a que também se refere a Constituição Federal — que, além de atuarem na esfera nacional, como associações sindicais que se encontram no topo da hierar- 73 quia sindical, congregam, pelas federações que as constituem, a representação de atividades ou categorias profissionais ou econômicas diversas, diferentemente, aliás do que ocorre com os sindicatos e as federações sindicais (aqueles representando cada um u'a mesma categoria, e estas congregando sindicatos que representem a maioria absoluta de um grupo de atividade ou profissões idênticas, similares ou conexas). Por outro lado, não é a Central única dos Trabalhadores — e nem ela própria se enquadra nesta qualificação — uma confederação sindical, tipo de associação sindical de grau superior devidamente previsto em lei (C12 artigos 533 e 535), o qual ocupa o cimo da hierarquia de nossa estmtura sindical e ao qual inequivocamente alude a primeira parte do inciso IX do artigo 103 da Constituição. Centrais, como a Central Única dos Trabalhadores, são organismos de coordenação de entidades sindicais ou não de atividades ou de categorias profissionais diversas, que não integram a hierarquia das associações sindicais, e que têm sido admitidas em nosso sistema jurídico por considerações sintetizadas na Portaria 125, de 3-4-1963, do /vfinistério do Trabalho, e que continuam válidas em face da atual Constituição: a liberdade de associação constitucionalmente garantida e 'que a CLT não proíbe nem poderia proibir, em face de mandamento constitucional, a assistência de organismos de coordenação entre as entidades sindicais, para o trato de problemas que não se limitam pela competência de cada uma delas em particular (artigo 511), porque envolvem interesses de todos em geral' (apud Buena Magno, Organização Sindical Brasileira, 47, pág. 168, Editora Revista dos Tribunais, São Paulo, 1982). e 74 RTJ. — 150 Não vingou, em nosso sistema jurídico, a orientação adotada pelo anteprojeto de Código do Trabalho do Prof. Evaristo de Moraes Filho que transformava as Centrais sindicais em entidades de cúpula da estrutura hierárquica sindical, corno confederações gerais, consoante o preceituado no artigo 712 do referido anteprojeto: 'As confederações poderão unificar-se em confederação geral dos empregadores, confederação geral dos profissionais liberais ou confederação geral dos trabalhadores autônomos'. Por isso mesmo, além de não serem elas uma espécie de confederação, podem as centrais sindicais multiplicarem-se com base no princípio da liberdade de associação, o que, aliás, hoje ocorre, com aexistência de algumas centrais de trabalhadores. A atual Constituição, não só consagrou, no artigo 8°, II, o princípio da unidade sindical, vedando a criação de mais de uma organização sindical, em qualquer grau, representativa de categoria profissional ou econômica na mesma base territorial, mas também manteve a hierarquia dos entes sindicais já estabelecida na CLT (sindicatos, federações e confederações), como deflui claramente dos artigos 111, parágrafo 2°, e 105, III, nos quais se outorga o poder de indicar os nomes dos representantes classistas para integrarem as listas tríplices para a escolha de membros do Tribunal Superior do Trabalho às confederações nacionais de trabalhadores ou empregadores, conforme o caso, e, para o mesmo fim, com relação aos Tribunais Regionais do Trabalho, às federações e aos sindicatos com base territorial na região. Não integram, portanto, as centrais sindicais a pirâmide em que se estrutura a organização sindical, e em cujo ápice se encontram as confederações nacionais, a que alude a Constituição no artigo 103, IX, primeira parte. E — note-se —, ao contrário do que ocorre com relação à legitimação para ilupchan o mandado de segurança coletivo, em que o artigo 5°, LXX, b, da Constituição a confere à organizações sindicais (o que abarca sindicatos, federações ou confederações, conforme a vinculação dos membros atingidos pela ilegalidade) bem como às entidades de classe (o que mostra que estas são entidadesnão- sindicais), no que diz respeito à legitimação para propor a ação direta de inconstitucionalidade não mais se alude, genericamente, a organização sindical, mas apenas a uma espécie dela — hierarquicamente superior, que é a confederação —, a que não pertence a autora. Em face do exposto, e por não se enquadrar a autora em qualquer dos incisos do artigo 103 da Constituição Federal, não tem ela legitimação para propor ação direta de inconstitucionalidade, razão por que não conheço da presente ação.' Com base na argumentação acima transcrita, não conheço da presente ação direta de inconstitucionalidade por falta de legiffinatio ad causam da autora». Participei do julgamento das ADIns n°s 271, 335 e 334, formando a maioria pelo não conhecimento, por ilegitimidade ativa da CUT e da CGT. Valho-me dos fundamentos apresentados pelos integrantes da maioria, nesses precedentes, para concluir, aqui, no mesmo sentido. 7. Apenas acrescento que a CGT, embora se autodenomine uma Confederação Geral dos Trabalhadores, não é, propriamente, uma confederação sindical, pois não congrega apenas federações de sindicatos que representem a maioria absoluta de um grupo de atividades ou profissões idênticas, similares ou conexas. —150 Também não é a CGT, propriamente, uma entidade de classe, pois não congrega apenas os integrantes de uma determinada atividade ou categoria profissional ou econômica. Na verdade, é a CGT urna Central Geral de Trabalhadores, ou seja, de todas as categorias de trabalhadores. Não é, então, uma Confederação Sindical de uma só e mesma classe de trabalhadores. Com efeito, dispõe o art. 8° de seus estatutos (fl. 30). «Art. 8° — Podem filiar-se à CGT todas as organizações de trabalhadores que estejam de acordo com os princípios, objetivos e condições estabelecidas neste Estatuto. Parágrafo único. A CGT aceitará [inações individuais de trabalhadores, de grupos de trabalhadores e de entidades não sindicais de trabalhadoMS, 10. Por todas essas razões e pelo mais que ficou dito nos votos que compuseram a maioria, no julgamento das ADIns n°s 271, 335 e 334, não conheço, também, da presente ADIn n° 928, por ilegitimidade ativa da autora e, em conseqüência, julgo prejudicado o requerimento de medida cautelar. VOTO (MEDIDA CAUTELAR) O Sr. hanistro Marco Aurélio: Sr. Presidente, apenas duas palavras sobre a matéria, afunde que não pese qualquer dúvida quanto ao motivo pelo qual concluí, nos processos anteriores, envolvendo a Central Única dos Trabalhadores e a própria Central Geral dos Trabalhadores, pela legitimação para a propositura da ação direta de inconstitucionalidade. Sr. Presidente, creio que ninguém desconhece que o sistema sindical brasileiro é o confederativo; que a organização sindical faz-se mediante entidades que estão em três 75 e não em quatro patamares: os sindicatos, as federações e as confederações. Quando abri a divergência para concluir pela legitimação da Central Geral dos Trabalhadores e, no processo seguinte, pela legitimação da Central Única dos Trabalhadores, eu o fiz enquadrando essas entidades não na primeira parte do último inciso do artigo 103, da Constituição Federal, mas na segunda parte. Reconheci o que penso ser a realidade. Reconheci estar diante de entidades, ou melhor, de associações de classe de âmbito nacional e aí citei um rol de diplomas legais que prevêem aparticipação dessas Centrais Sindicais, como associações de classe, em determinados Conselhos. Mencionei a Lei n° 7.998, de 21 de janeiro de 1990, que, no artigo 18, cuida da participação no Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador. Fiz alusão à Lei ri' 8213, de 24 de julho de 1991, em que as Centrais são citadas como integrantes do Conselho Nacional de Previdência Social eme referi, ainda, à Lei n° 8.212, de 1991, que dispõe sobre a participação das Centrais no Conselho Nacional de Seguridade Social e no Conselho Gestor do Cadastro Nacional do Trabalhador. . Sr. Presidente, mesmo que estivesse — penso que terei que admitir isso, em face dos pronunciamentos do Plenário — diante de uma situação ambígua, quanto à configuração da associação prevista constitucionalmente, teria que caminhar para apostura que viabilizasse o exercício do direito da ação. Continuo convencido que as restrições à legitimação para a propositura da ação direta de inconstitucionalidade estão contidas na própria Carta e não alcançam as Centrais que tenho como representantes dos trabalhadores. Vejo, no âmbito dos trabalhadores, na presença dos trabalhadores, a existência de uma verdadeira classe. Mantenho o ponto de vista, como esclarecimento atinente ao fato de também não enquadrar as Centrais como entidades sindicais. 76 VOTO O Sr. Ministro Carlos Venoso: Sr. Presidente, na ADInn° 334 votei pela legitimidade da Central Geral dos Trabalhadores para propor ação direta de inconstitucionalidade. Quedei-me, entretanto, vencido. Ressalvando o ponto de vista pessoal, adiro ao voto do Sr. Ministro Relator. VOTO O Sr. Ministro Celso de Mello: A presente causa suscita questão de alto relevo, referente à pertinência subjetiva das Centrais Sindicais para o exercício do poder de agir nas ações diretas de inconstitucionalidade. Dentre os ativamente legitimados ad causam para o controle concentrado de constitucionalidade de leis e atos normativos federais e estaduais, encontram-se as Confederações Sindicais, consoante preceitua o art. 103, IX, da Constituição Federal. A organização sindical constitui uma das dimensões em que se projeta, em nosso sistema jurídico, a liberdade sindical. O delineamento da estrutura organizacional das entidades sindicais deriva, essencialmente, da própria Constituição, que impõe as formas diversas de sua composição. Manteve-se, desse modo, sem maiores alterações, no que pertine à organização sindical, um modelo jurídico heterônomo, que se traduz na submissão das entidades sindicais a tipos estruturahnente hierarquizados, cuja definição resulta de prévia decisão estatal. Inobstante a nova Constituição do Brasil haja elastecido os domínios da liberdade sindical — e isso traduz uma realidade histórica e jurídico-social de alcance inquestionável —, não se pode desconhecer, dentro da perspectiva em que se analisa o fenômeno da organização sindical, que foi preservada, nesse plano, a sua estrutura básica, em cujo âmbito se hierarquizam entidade» de graus diversos. — 150 Há, pois, uma tipiddade constitucional a ser necessariamente observada no domínio temático da organização sindical, que nela permite identificar 3 (três) tipos insuprimíveis de entidades sindicais: o sindicato, a federação e a confederaçâo. Amaury Mascaro Nasdmento («Direito Sindical», pág. 136, 1989, Saraiva), em autorizado magistério, acentua que «A Constituição Federal de 1988 preserva o sistema confederativo da organização sindical brasileira, mantendo a sua estrutura básica, que vem desde 1930, com apermissão legal da criação de entidades sindicais cujas formas são fixadas também pelo legislador, e que são três, sindicatos, federações e confederações, hierarquicamente dispostas...». Note-se, portanto, que as centrais sindicais, no contexto normativo referido, parecem constituir entidades institucionalmente estranhas ao sistema confederativo, inobstante existam Autores ilustres, como Evaristo de Moraes Filho («Sindicato — organização e funcionamento», in LTR, vol. 44(9) — 1065, 1980), Segadas Manna («Instituições de Direito do Trabalho», vol. 2/1024, 8' ed., Freitas Bastos) e o próprio Amaury Mascaro Nascimento (op cit., págs. 141/142), que reconhecem a possibilidade de sua integração jurídica no plano da organização sindical. Arnaldo Susseldred, ao analisar o tema das Centrais Sindicais, expendeu magistério irrepreensível, verbis: «A Constituição de 1988 conservou a estrutura da organização sindical adotada no Brasil desde 1939 (Lei n° 1.402) e mantida pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT — 1943). Daí ter elevado a nível constitucional: a) o princípio da unicidade de representação sindical, com o que ficou 'vedada a criação de mais de uma organização sindical, em qualquer grau, representativa de categoria econômica ou profissional, na mesma base territorial' (art. 8°, n° II); RTJ-150 77 b) o 'sistema confederativo de representação sindical' (art. 8°, n° IV). qualquer grau' da sua estrutura hierárquica. Destarte, a nova Carta Magna recepcionou, por evidente compatibilidade, as normas da CLT concernentes à unicidade sindical compulsória e à estruturação do sistema confederativo sindical. Aliás, o colendo Supremo Tribunal Federal já decidiu que E as chamadas centrais sindicais (CUT, CGT e US1)? 'o citado inciso II do art. 8° da Constituição estabelece o princípio da unicidade sindical em qualquer grau, ou seja, no plano dos sindicatos, das federações e das confederações. Representa, assim, uma limitação à liberdade de organização de confederações' (Ac. do Pleno, de 3-5-89, no MS n° 20.829-5, rel. Ministro Célio Borja, ementa in DJ de 23-6-89). Esse sistema configura a seguinte estruturação hierárquica sindical: cada categoria formada por atividades econômicas (empresas) ou profissionais (trabalhadores) específicas é representada, em determinada base territorial, por um sindicato. Excepcionalmente, o sindicato pode aglutinar atividades similares ou conexas; cada grupo de atividades idênticas, similares ou conexas, numa área geográfica, em regra estadual, pode formar a respectiva federação sindical; c) cada ramo da economia nacional (indústria, comércio, agricultura, etc.), no plano dos empresários e no dos trabalhadores, pode constituir a correspondente confederação sindical. Este é o sistema confederativo sindical referido na Constituição, que tem como pressuposto fundamental a unicidade obrigatória de representação 'em É inquestionável, em face do exposto, que elas não Integram esse sistema, não possuindo, portanto, natureza sindical. Basta ter-se em conta que existem três e o princípio do monismo sindical é compulsório 'em qualquer grau' da organização sindical (art. 8°, n° 11, da Constituição). Aludindo a esse inciso, escreveu Eduardo Saad: «Semelhante dispositivo constitucional não deixa espaço para que as centrais sindicais se organizem legitimamente. Numa palavra, é inadmissível que haja pluralismo na cúpula sindical (CUT, CGT, etc.) e unitarismo nos planos inferiores» («Constituição e Direito do Trabalho», SP, LTr, r ed., 1989, pág. 180). (Grifei) O modelo jurídico de integração das entidades sindicais brasileiras decompõese, como visto, numa tríade sindical, organizada, hierarquicamente, pelos sindicatos, federações e confederações, que representam, observados os limites da liberdade sindical, os elementos típicos de sua coes-o. Dispenso-me, no momento, de analisar a questão pertinente à possibilidade jurídica de existência, ou não, em nosso sistema de direito positivo, das centrais sindicais, cujo escopo maior — acentua a doutrina — reside na necessidade de mobilização, de ação conjunta, na defesa de interesses que não são apenas de uma categoria», eis que, «Para que esse objetivo possa ser alcançado, não bastam as confederações; é preciso um órgão acima delas, coordenando-as» (Amaury Mascaro Nascimento, op. cit., págs. 141/142). 78 R.TJ.— 150 Basta-me, no entanto, a relevante circunstância de que as hipóteses de legitimidade ativa ad causam, no exercício da ação direta de inconstitucionalidade, são de direito estrito e, portanto, inextensíveis a outras situações. Não há confundir confederações com centrais sindicais. As Confederações distinguem-se claramente das Centrais Sindicais, pois aquelas associações degrau superior, posicionadas no ápice dapidirnide sindical, representam, enquanto uniões compostas que são, uma só categoria econômica ou profissional, enquanto que estas — as centrais sindicais — apresentam-se superpostas às próprias categorias. É certo que já se verifica, quer no plano do direito comparado, quer no plano do direito positivo nacional, uma clara tendência no sentido da institucionalização da central sindical, que constitui verdadeira Confederação geral de todas as categorias. Ocorre, porém, que, em face do vacuum legis existente, e da própria omissão do legislador constituinte que, embora podendo fazê-lo, deixou de integrar, na estrutura organizacional do sindicalismo brasileiro, as centrais sindicais, não há como equipará-las, para efeito de titularidade ativa da ação direta de inconstitucionalidade, às, confederações sindicais, nem como torná-las categorias redutíveis à noção de associações sindicais de grau superior, nem, tampouco, qualificá-las — como entes híbridos que são — como entidades de classe de âmbito nacional. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem restringido, no que concerne às entidades de classe de âmbito nacional — e para os fins do art, 103, IX, da Constituição Federal —o sentido conceituai dessas pessoas jurídicas de direito privado, descaracterizando-as como tais quando concomitantemente integradas, tal como no caso ocorre, por associações de natureza sindical e por entes de caráter não-sindical (ADIn 57, Rel. Min. limar Gaivão; ADIn 67, Rel. Min. Moreira Alves; ADIn 433, Rel. Mia Moreira Alves; ADIn 444, Rel. Min. Moreira Alves; ADIn 530, Rel. Min. Moreira Alves; ADIn 705, ReL Min Celso de Mello). Sendo assim, peço vênia para declarar a ilegitimidade ativa ad causam da autora e, em conseqüência, não conhecer da presente ação. É o meu voto. VOTO O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Sr. Presidente, para efeito de documentação integrarei ao meu voto o que proferi na Ação Direta de Inconstitucionalidade 271, e ao qual me reportei na Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 334. 2. Como eminente Ministro Marco Aurélio desejo realçar dois pontos fundamentais do voto que então proferi —e creio que os Colegas prestar-me-ão o beneficio do reconhecimento de que eu também sei que as centrais sindicais não integram o sistema sindical confederativo da CLT. Tentei longamente demonstrar, no entanto, que isso não lhes ilide a legitimidade como associações civis de classe. E ponderei: a unicidade e o sistema confederativo são restrições constitucionais às organizações sindicais stricto sensu, nada tendo a ver com a irrestrita liberdade de associação para fins lícitos, entre os quais os de defesa de interesses econômicos ou profissionais de uma categoria específica ou de urna pluralidade delas. A plena liberdade da constituição e das atividades de tais associações, é óbvio, não as converte em entidades sindicais. O sindicato é também uma associação. Peculiar, no entanto, como se sabe, pelas prerrogativas que o ordenamento lhe reconhece e que ultrapassam as raias —150 da esfera de ação aberta às associações civis em geral. A principal dessas prerrogativas sindicais especificas — que tem sua manifestação mais eloqüente no mecanismo das convenções coletivas —, é o poder de representação de que são dotados ou, nos tenros da constituição (art. 8°, III), de 'defesa dos direitos e interesses co- letivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais e administrativas'. 'Em primeiro legar' —assinalaRus- somano (A Natureza Jurídica do Sindicato, em Relações Coletims de »abelha cit.. págs. 219, 225) —, 'o poder de representação dos interesses individuais de sais associados; mas, indo além, representa, igualmente, os interesses coletivos da categoria profissional' (...) claro'— prossegue — 'que, pelo fato de representar e defender, inclusive perante o Estado, os interesses coletivos da categoria, o sindicato não se transforma em pessoa de direito público (...). É conveniente, não obstante, pôr em relevo que essa re- presentação de interesses coletivos é necessária, portanto, de natureza jurídica distinta da mera representação dos interesses particulares dos assodados'. O saudoso Hahnemann Guimarães (MS 767, RF 118/408), em acórdão recentemente lembrado por Xavier de Albuquerque (LTr 5.311/1.278), chega a ver, no papel dos sindicatos na convenção coletiva, 'o exercício do poder normativo, que constitui, sem dúvida, espécie do poder público de regulamentação', que recebe por delegação do Estado. É patente que dessas prerrogativas e poderes jurídicos peculiares não dispõem — nem podem dispor, na ordem positiva brasileira —, as centrais sindicais: é quanto basta para que, de um lado, não 79 sejam 'entidades sindicais', em sentido próprio, mas, de outro, que sejam associações civis, de constituição e funcionamento garantidos pela Constituição. Aludindo à representatividade das entidades componentes do sistema confederativo imposto na Constituição, anota, assim, Octávio Bueno Magano (A organização sindical na nova Constituição, Ltr 53-1/38, 43) que se trata de 'representação legal, de que não gozam as centrais sindicais. Não é que estas não possam existir', esclarece, porém. 'Ao contrário, a existência deles é perfeitamente compatível com a nova Constituição. Contudo, não gozam de representação legal'. Com esse sentido, parece, é que o juiz e professor Roberto A. O. Santos (A Autonomia Sindical na Constituição Brasileira de 1988, em Relações Coletivas de Trabalho, cit., págs. 279, 281) anotou, com razão, ter a Constituição facultado 'a criação de organismos coordenadores de interesses pluriterritoriais e pluriprofissionais' , chave em que cabe inserir as centrais sindicais. A liberdade de criação, pelas entidades sindicais, dessas associações civis votadas à coordenação e mobilização de suas atividades corresponde, na cúpula do sistema, à liberdade de associação profissional ou empresarial, que, desde a CLT, sempre conviveu, na base, com a unicidade sindical (Haddock Lobo e Prado Leite, Comen- tários à Constituição Federal, Eds. Trabalhistas, P/264). 'A existência de um sindicato' — explica Roberto A. O. Santos (ob. loc. cita., pág. 290) —, 'não esgota o total de possibilidades de representação privada de direitos e interesses de grupos sociais, mesmo que profissionais ou econômicos (...) Em outras palavras' — conclui, após lembrar a 80 RTJ. —150 legitimação representativa, inclusive processual, de que a Constituição dotou as entidades associativas (art. 5°, XXI) —,'podem coexistir ao lado do sindicato várias associações profissionais, com direito a representar seus próprios associados, só não lhe sendo lícito estender tal faculdade ao conjunto da categoria profissional'. Do mesmo modo, entendo eu que, assim como ao trabalhador se faculta, paralelamente à sindicalização, a constituição de associações profissionais, às entidades sindicais não se pode negar liberdade de associar-se a coordenação da defesa de interesses comuns, independentemente de sua integração paralela no sistema confederativo, a cujos integrantes se reservam com exclusividade os poderes jurídicos de representação sindical. As centrais, por isso, não exercem atividade sindical, embora exerçam, sobre ela, inequívoca influência de fato. Não me aventuro ao cometimento sociológico de identificar as causas dessa influência, de que resulta o fato, igualmente notório, do grau crescente de preferência das autoridades públicas, como das entidades sindicais, pelo diálogo com as centrais sindicais, em detrimento das entidades de cúpula, as confederações, dos diversos subsistemas confederativos da classe trabalhadora. Parece evidente, no entanto, que não se trata de uma questão de simpatia ou de tolerância, mas de eficácia, à qual não será estranha a circunstância de que, até agora, o problema básico da relação de trabalho, a questão salarial, se resolve primordialmente entre nós mediante normas estatais impositivas do Poder central — em relação às quais é homogêneo o interesse de todos os trabalhadores dependentes — e não pelos mecanismos de negociações coletivas descentralizadas entre as diferentes ca- tegorias de atividade econômica, que serve de princípio reitor da estrutura sindical formal. Superar, em função dos interesses globais da classe-matriz dos trabalhadores, a subdivisão em categorias é a razão de ser das centrais sindicais. O que, aztreteira), não gera problemas jurídicos de monta, se se tem em conta que elas são associações, que como tal se legitimam. Com efeito, ao contrário do que se impôs à organização dos sindicatos, às associações de qualquer grau nada autoriza circunscrever compulsoriamente a uma base social limitada a determinada categoria econômica ou profissional: aos associados, pessoas físicas ou pessoas jurídicas, incluídas as entidades sindicais, é que incumbe demarcar livremente o âmbito do agrupamento social a congregar. O que resta saber é se as centrais sindicais — sendo associações civis licitamente constituídas por entidades sindicais e associações profissionais — serão, elas próprias 'entidades de das: se de âmbito nacional', para legitimarse à ação direta, coneorrentemente às confederações sindicais. Entendeu que não o eminente relator: em síntese, porque, 'sendo constituída por pessoas jurídicas de natureza vária (-.) não é uma entidade que congregue os integrantes de uma determinada atividade ou categoria profissional ou econômica'. Lamento dissentir, com todas as vênias. Que o sistema sindical brasileiro se desdobre compulsoriamente pelos diversos subsistemas confederativos, setorizado, cada um deles, à base de um determinado compartimento social, demarcado por categoria ou grupo de categorias profissionais ou econômicas R.TJ — 150 similares ou conexas, é um fato. Isso, porém, data venta, não apaga a evidência de que, sobre tais subdivisões, sobrepaire a salame dfristo determinada pelo sistema de produção capitalista, isto é, a repartição fundamental dos agentes econômicos entre os trabalhadores, de um lado — ou seja, todos os que vivem, mediante relação de emprego ou não, da colocação profissional de sua força de trabalho a serviço de outrem —, e, do lado oposto, os que, remunerando-o, se beneficiam do trabalho alheio, posto à disposição dos seus fins, econômicos ou não. Não me convenço, data venta, de que, na sociedade capitalista, aos trabalhadores em geral se possa negar a qualificação de classe, a maior delas. A própria CLT, aliás, ao distinguir as categorias econômicas das categorias profissionais, deixou clara a homogeneidade básica que, independentemente dos diferentes setores de atividade a que se dediquem, reúne e identifica, de um lado, os empregadores, de outro, os trabalhadores. Portanto, o caráter de classe que se atribui, sem contestação, às diferentes categorias econômicas ou profissionais específicas, parte, embora não se esgote, da pertinência de cada uma delas a uma categoria maior, oriunda da divisão básica de toda a sociedade, em função do papel de cada um no processo produtivo, e que é, à evidência, a mais elementar das diferenciações de classe: o atributo classista das partes, as categorias, lhe advém fundamentalmente do todo de que participam. Não importa a existência de outras centrais sindicais, igualmente de âmbito nacional: a unicidade, que se impõe às entidades sindicais, por força de restrição constitucional explícita, não se pode estenda às chamadas centrais sindicais, que são associações civis, de formação 81 dominada pelo princípio, também constitucional, de liberdade plena. Reputo irrelevante, de sua vez, que as entidades sindicais filiadas à CUT o sejam paralelamente — diretamente as federações, indiretamente os sindicatos —, a confederações nacionais: ao argumento, que, em substância, já viera à tona na ADIn n° 42-0, relativa à ABRASCA, opus, naquele precedente, as razões — aplicáveis, mutilas mutandis, à espécie — da minha convicção, que segue inabalada: que, para ser fiel às inspirações pluralistas e participacionistas do art. 103, IX, da Constituição, ao conceito de 'entidade de classe de âmbito nacional' é preciso emprestar toda a abrangência que ele comporte sem violência, de modo a estender a legitimação ao maior plexo possível de associações representativas de estrutura plural da sociedade. Nesse quadro, não creio se possa fazer abstração da realidade e da representatividade das centrais sindicais.» 3. Disso continuo convencido, Sr. Presidente. E, com as escusas da douta maioria entendo que essa orientação, que agora se fuma, sobre as centrais sindicais, é uma das mais preocupantes na constrição progressiva do raio de legitimação de entidades da sociedade civil ativa para ação direta de inconstitucionalidade. Peço vênia, portanto, ao eminente Relator e aos que o acompanham e o acompanharão, para rejeitar a preliminar e conhecer da ação direta. EXTRATO DA ATA ADIn 928 (Medida Cautelar) — DF — Rel.: Min. Sydney Sanches. Repte.: Confedanação Geral dos Trabalhadores —CGT (Adv.: Andre Martins de Andrade). Reqdos.: Presidente da República e Congresso Nacional. Decisão: Por maioria de votos, o Tribunal não conheceu da ação, por ilegitimida- 82 R.T.J. — 150 de ativa da requerente, ficando, em conseqüência, prejudicado o requerimento de medida cautelar, vencidos os Ministros Marco Aurélio e Sepúlveda Pertence, que dela conheciam. Votou o Presidente. Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotti. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira, Sydney Sanches, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Velloso, Marco Aurélio, limar Gaivão e Francisco Rezek. Ausente, justificadamente, o Ministro Paulo Brossard. Procurador-Geral da República, Dr. Aristides Junqueira Alvarenga. Brasília, 1° de setembro de 1993 —Luiz Tomimatsu, Secretário. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N° 944 — DF (Medida Cautelar) (Tribunal Pleno) Relato': O Sr. Ministro Sydney Sanhas Requerente: Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria — Requeridos: Presidente da República e Congresso Nacional Ação direta de inconstitucionalidade. IPMF (Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira) (Lei Complementar n° (177, de 13-7-1993). Legitimidade ativa. Medida cautelar. A Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria tem legitimidade para propor ação direta de inconstitucionalidade (art. 103, IX, da Constituição Federal). Julga-se prejudicada medida cautelar de suspensão da Lei impugnada, se esta já se encontra suspensa, até 31-12-1993, por decisão do Tribunal, em outra ação direta de inconstitucionalidade. 3. Ressalva do exame do requerimento de cautelar, quanto ao exercido de 1994, se, até 31-12-1993, não tiver sido, a ação, julgada pelo mérito. ACÓRDÃO RELATÓRIO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em julgar prejudicado o requerimento de medida cautelar, até 31-12-93, com a mesma ressalva feita na ADIn 939-7, julgada em 15-9-93. O Sr. Ministro Sydney Sanches (Relator): 1. Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade da Lei Complementar n° 77, de 13-7-1993, que instituiu o «Imposto Provisório sobre a Movimentação ou Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira — IPMF.» 2. Foi proposta pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria, com base no inc. IX do art. 103 da Constituição Federal, alegando-se, na inicial, que a lei impugnada viola o princípio constitucional da anterioridade (art. 150, IR, b) assim Brasília, 22 de setembro de 1993 — Octavio Gallotti, Presidente — Sydney Sanches, Relator. R.TJ —150 como aquele que coíbe a bitributação (fls. 215). 3. Havendo requerimento de medida cautelar, trago os autos à consideração do eg. Plenário (art. 170, § 1°, do RISTF). É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Sydney Sanches (Relator): 1. A Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria é entidade sindical de grau superior, conforme consta do art. 1° de seu estatuto (fl. 10), «coordenadora dos interesses profissionais dos trabalhadores na indústria em todo o território nacional, na conformidade do regime instituído pela Consolidação das Leis do Trabalho», e como tal reconhecida pelo Decreto federal n° 21.978, de 25-10-1946 (fl. 7). Conheço, pois, da ação por ela proposta, em face do que dispõe o art. 103, inc. IX, da Constituição Federal. Mas julgo prejudicado, si et in quantum, ou seja, até 31-12-1993, o requerimento de medida cautelar. É que, nos autos da ADIn n° 939, proposta pela CNTC (Confederação Nacional dos Trabalhadores no Comércio), a lei impugnada (LC n° 77/1993) já foi suspensa pelo Eg. Plenário (juntamente com o art. 2° e seus parágrafos da Emenda Constitucional n° 3/93), até o dia 31-12-1993, em proveito de todos os contribuintes. 4. É cato que, naquele feito, a suspensão foi até 31-12-1993, porque a maioria levou em conta apenas o princípio da anterioridade, previsto no art. 150, III, b, da Constituição Federal, que, a um primeiro exame, teve por indevidamente excepcionado pelo parágrafo 2° do art. 2° da Emenda Constitucional n° 3/1993, em face do que dispõe o art. 60, § 4°, inc. IV, da Constituição. Lá não foram levadas em consideração, pela maioria, as demais alegações da inicial, no sentido de outras violações à 83 Constituição Federal, inclusive a relativa ao princípio que coíbe a bitributação, aqui reiterado. Mas, em se tratando de ADIn, em cujo processo, de natureza objetiva, a causa de pedir, segundo a jurisprudência, não vincula o Tribunal, que pode adotar todo e qualquer outro fundamento, para julgá-la procedente, ou improcedente, se for o caso, e também, para deferir ou indeferir a medida cautelar, é de se entender que, a que foi aqui requerida, está prejudicada, ao menos até 31.12.1993, já que a Corte se reservou para examinar as demais alegações, quanto ao exercício de 1994, se até o recesso judiciário, a iniciar-se a 19-12-1993, não tiver julgado o mérito da ação Em suma, conheço da ação, mas com a referida ressalva, julgo prejudicada a medida cautelar, até 31-12-1993. 5. A seguir, serão colhidas informações das Presidências da República, da Câmara dos Deputados e do Senado Federal e manifestações do Advogado-Geral da União e do Procurador-Geral da República. EXTRATO DA ATA ADIn 944 (Medida Cautelar) — DF — Rel.: Min. Sydney Sanches. Reqte.: Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria (Advs.: Pedro Luiz Leão Valioso Ebert e outros). Reqdos.: Presidente da República e Congresso Nacional. Decisão: Por votação unânime, o Tribunal julgou prejudicado o requerimento de medida cautelar, até 31-12-93, com a mesma ressalva feita na ADIn 939-7, julgada em 15-9-93. Votou o Presidente. Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotti. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira, Sydney Sanches, Paulo Brossard, Sepálveda Pertence, Celso de Mello, Marco Aurélio, Binar Gaivão e Francisco Rezek. Ausente, justificadamade, o Sr. Ministro Carlos Vel- R.TJ. —150 84 loco. Vice-Procurador-Geral da República, Dr. Moacir Antonio Machado da Silva. Brasília, 22 de setembro de 1993 — Luiz Tomimatsu, Secretário. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N° 947 —DF (Medida Cautelar) (Tribunal Pleno) Relatar. O Sr. Ministro Sydney Sanches Requerente: Confederação Nacional dos Diretores Lojistas — Requeridos: Presidente da República e Congresso Nacional Ação direta de inconstitudonalidade. Legitimidade ativa (art. 102, IX, da Constituição Federal). Confederação Nacional dos Diretores Lojistas. IPMF. A Confederação Nacional dos Diretores Lojistas não é entidade sindical, mas, sim, entidade dv11, mais precisamente uma associação de associações», que, segundo os critérios jurisprudenciais do Supremo Tribunal Federal, na interpretação do inciso IX do art. 103 da Constituição Federal, não é propriamente, uma «entidade de classe» e, por isso, não está legitimada à propositura de ação direta de inconstitudonalidade. Ação não conhecida, por Ilegitimidade ativa ad causam», prejudicado o requerimento de medida cautelar. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em não conhecer da ação, por ilegitimidade ativa da requerente. Brasília, 14 de outubro de 1993 — Octavio Gallotti, Presidente — Sydney Sanches, Relator. RELATÓRIO (MEDIDA CAUTELAR) O Sr. Ministro Sydney Sanches (Relatar): 1. Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade da Emenda Constitucional n° 3/93, que autorizou a instituição do Imposto Provisório de Movimentação Financeira — IPMF, bem como da Lei Comple- mentar n° 77, de 13-7-1993, que efetivamente o instituiu. Foi proposta pela Confederação Nacional dos Diretores Lojistas, com base nos arts. 103, I, a, e 103, IX, da Constituição Federal. Na inicial, alegou a autora que os diplomas impugnados violaram princípios que estabelecem garantias individuais intocáveis (art. 60, parágrafo 4°, inc. IV, art. 150,111, b, IV, art. 5°, incisos LIV, XXII e XXXV, art. 170,11), assim como o princípio que coíbe a bitributação, além de afrontar garantia decorrente de tratado internacional sobre o cheque (art. 5°, parágrafo 2°, da Constituição Federal, Decreto n° 57.595, de 7-1-1966, e Lei Uniforme sobre Cheques, no que concerne ao número permitido de endossos). R.TJ — 150 Foram apensados a estes os autos de Petição 771, pela qual a autora requer medida rima-lar de suspensão dos diplomas impugnados. Trago, pois, os autos à consideração do E Plenário, para o exame do requerimento de medida cautelar (art. 170, parágrafo 1°). É o relatório. VOTO (MEDIDA CAUTELAR) O Sr. Ministro Sydney Sanches (Relatar): 1. À fl. 76v. destes autos principais, despachei, como Relator, In verbis: «Em face do que dispõem o art. 19 e respectivo parágrafo único de seus estatutos (fl. 29), esclareça a Autora se `Diretores Lojistas' são pessoas físicas ou jurídicas, relacionando-as. Deve, outrossim, comprovar que as Federações referidas às fls. 46/49 estão filiadas a ela, 'Confederação'.» 2. Às fls. 78/79, disse a autora o seguinte: «1. Quanto a primeira parte do despacho de V. Ex.', esclarece a Autora que 'Diretores Lojistas', na forma como está no caput do art. 19, não são pessoas físicas e tampouco jurídicas. II. Com efeito, os 'Clubes de Diretores Lojistas', estes sim são pessoas jurídicas de direito privado, entidades civis, sem fins lucrativos, e os sócios, em número máximo de 200 (duzentos), em cada clube, com direito a voto; afora sócios em outras categorias, sem direito a voto, são, via de regra, empresas lojistas, ou seja pessoas jurídicas. Quanto à relação dos 'Clubes de Diretores Lojistas', existentes em todo o Brasil, somam mais de 450 (quatrocentos e cinqüenta), e sua completa relação está acostada à peça exordial. 85 No que patine a segunda parte do despacho de V. Ex.', esclarece a Autora, que as Federações de Diretores Lojistas, para serem filiadas à Confederação Nacional dos Diretores Lojistas, devem cumprir fielmente o que dispõe o artigo r e suas alíneas do estatuto da ora Autora, cabendo a ela Confederação, a decisão da filiação, uma vez atendidos os requisitos estatutários. IV. Destarte, a pura e simples declaração da Autora, é prova o bastante para comprovação da filiação. Por esta razão, acosta-se a presente, declaração firmada neste sentido, que serve de comprovação de filiação para as federações relacionadas às fls. 46/49. Assim sendo e cumprido integralmente o despacho de V. Ex.', requer o prosseguimento do feito em seus ulteriores termos. E. Deferimento Distrito Federal, 27 de setembro de 1993 — Jacques Malka Y. Negri, OAB/RJ — 60.011» 3. Com a petição de fls. 78/79 os documentos de fl. 80, deste teor «Declaração Declaramos para fazer prova junto ao Supremo Tribunal Federal, que as Federações de Diretores Lojistas, abaixo relacionadas, estão filiadas à nossa Confederação, tendo sido cumprido pelas respectivas Federações, integralmente, as disposições estatutárias, principalmente as do artigo sétimo e suas respectivas alíneas. Relação das Federações de Diretores Lojistas filiadas à Confederação Nacional dos Diretores Lojistas: Federação dos Diretores Lojistas de Magoas; Federação dos Diretores Lojistas da Bahia; Federação dos Diretores Lojistas do Ceará; Federação dos Diretores Lojistas do Espírito Santo;Federa- 86 R.TJ. — 150 ção dos Diretores Lojistas de Goiás; Federação dos Diretores Lojistas de Mato Grosso; Federação dos Diretores Lojistas de Minas Gerais; Federação dos Diretores Lojistas do Pará; Federação dos Diretores Lojistas da Paraíba; Federação dos Diretores Lojistas do Paraná; Federação dos Diretores Lojistas de Pernambuco; Federação dos Diretores Lojistas do Piauí; Federação dos Diretores Lojistas do Rio de Janeiro; Federação dos Diretores Lojistas do Rio Grande do Norte; Federação dos Diretores Lojistas do Rio Grande do Sul. Federação dos Diretores Lojistas de Santa Catarina; Federação dos Diretores Lojistas de São Paulo; Federação dos Diretores Lojistas de Sergipe. Clubes dos Diretores Lojistas Equiparados: Clube de Diretores Lojistas de Manaus; Clube de Diretores Lojistas de Macapá; Clube de Diretores Lojistas de Brasília; Clube de Diretores Lojistas de São Luís; Clube de Diretores Lojistas de Campo Grande; Clube de Diretores Lojistas de Porto Velho. Rio de Janeiro, 24 de setembro de 1993. Confederação Nacional dos Diretores Lojistas. José Moura de Aguiar, GerenteAdministrativo» A autora, embora se denomine «Confederação», não é entidade sindical, mas «entidade civil», como consta do art. 1° de seu estatuto (fi. 27) Congrega Federações constituídas de Clubes de Diretores Lojistas e seus associados (art. 2°, letra a, fi. 27). Estes, os «Clubes de Diretores Lojistas», são constituídos de empresas que se dedicam ao comércio lojista (art. 19, fl. 29). Na verdade, os Clubes, as Federações e a Confederação têm personalidades jurídicas distintas, com direção própria, como se vê do estatuto (fls. 27/38), os primeiros filiando-se às segundas e estas à terceira. Então, a Confederação é uma entidade civil, de caráter associativo, que reúne em seus quadros outras entidades civis (as Federações), que, por sua vez, congregam outras mais (os Clubes). Ou, inversamente, os clubes se reúnem em Federações, que integram a Confederação. Esta, por conseguinte, não tendo caráter sindical, é uma entidade civil a que se filiam outras entidades civis. É, uma associação integrada por outras associações. Ora, o Plenário desta Corte, no julgamento da ADIn n° 591, de que foi Relator o eminente Ministro Moreira Alves, negou legitimidade ativa à União dos Auditores Fiscais do Tesouro Nacional — UNAFISCO Nacional, dentre outras razões porque é «uma associação de associações e, portanto, representa estas e não os membros de uma classe». (RTJ 138/81). A Confederação Democrática dos Trabalhadores no Serviço Público Federal, que não é entidade sindical, tambémnão foi considerada, peloPlenáriodestaCorte, como «entidade de classe de âmbito nacional, porque não tem como associados os membros da classe que são os servidores públicos federais, mas sim pessoas jurídicas» (ADIn 433 Relator Ministro Moreira Alves —RTJ 138/421). Na ADIn n° 137, ficou entendido que entidade de classe de âmbito nacional, para os efeitos do art. 103, IX, da CF, deve ser integrada por pessoas físicas e da mesma atividade econômica ou categoria profissional e não por pessoas jurídicas que as representem (RTJ 137/82). 10. Ao ensejo do julgamento da ADIn n° 108, Relator o eminente Ministro Celso de Mello, ficou assentado na ementa (RTJ 141/3): «O Supremo Tribunal Federal tem salientado, em sucessivos pronunciamentos a propósito do tema, que não se quali- R.T.J —150 ficam como entidades de classe aquelas que, congregando pessoas jurídicas, apresentam-se como verdadeiras associações de associações. Em tais hipóteses, tem-se-lhes negado a qualidade reclamada pelo texto constitucional, pois pessoas jurídicas, ainda que coletivamente representativas de categorias profissionais ou econômicas, não formam classe alguma. Precedentes.» Nesse julgado há referência a outro, de que foi Relator o eminente Ministro Paulo Brossard, ou seja, a ADIn 511, ajuizada pela FENAFISCO — Federação Nacional do Fisco Estadual, à qual «não se reconheceu — precisamente por ser assodação de associações — a qualidade de entidade de classe para o efeito de propositura da ação direta de inconstitucionalidade» (RTJ 141/5). Por todas essas razões e pelas que foram deduzidas em tais precedentes, não conheço da presente ação, por ilegitimidade ativa ad causam, julgando prejudicado o requerimento da medida cautelar. VOTO (MEDIDA LIMINAR) PRELIMINAR O Sr. Ministro Marco Aurélio: Sr. Presidente, fiquei convencido, na espécie, com as ponderações feitas pelo Ministro Francisco Rezek. Temos uma Confederação específica, como entidade sindical, que é a 87 Confederação Nacional do Comércio, e que congrega os lojistas porque estes estão no comércio. Tanto quanto possível, devemos adotar uma interpretação que homenageie o sistema sindical brasileiro. Acompanho o eminente Relator, não conhecendo da ação. EXTRATO DA ATA ADIn 947 (Medida Cautelar) — DF — Rel.: Min. Sydney Sanches. Reqte.: Confederação Nacional dos Diretores Lojistas. (Advs.: Paulo Elisio de Souza e outros) Reqdos.: Presidente da República e Congresso Nacional. Decisão: Em votação unânime, o Tribunal não conheceu da ação, por ilegitimidade ativa da requerente. Votou o Presidente. Ausente, ocasionalmente, o Ministro Sepúlveda Pertence. Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotti. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira, Sydney Sanches, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Velloso, Marco Aurélio, limar Gaivão e Francisco Rezek. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Paulo Brossarcl. Vice-Procurador-Geral da República, Dr. Moacir Antonio Machado da Silva. Brasília, 14 de outubro de 1993 —Luiz Tomimatsu, Secretário. MANDADO DE SEGURANÇA br 20341 — DF (Questão de Ordem) (Tribunal Pleno) (MS na RTJ 148/88 e MS (AgRg) na RTJ 141/803) Relator. O Sr. Ministro Néri da Silveira Impetrantes: José Ignácio Ferreira e outros — Aut. Coatora Presidente da Câmara dos Deputa tos — Lit. Passivos: José Samey e outros Mandado de Segurança. Acórdão. Ementa. A ementa deve constituir uma síntese da decisão. Prevalecerão as notas taquigráficas autenticadas, se o seu teor não coincidir com a ementa do acórdão. 88 R.TJ. —150 Hipótese em que a ementa foi redigida pelo Relator, com base no voto por ele proferido, porque ainda não haviam sido iiberadas as notas taquigráficas referentes aos dentais votos que compuseram a maioria. Posterior afastamento definitivo do Relator, em virtude de aposentadoria, por implemento de idade. Devendo o Ministro que presidiu o julgamento subscrever o acórdão (RLSTF, art. 94), se verificar que o conteúdo da ementa não corresponde aos votos da maioria, expressos nas notas taquigráficas devidamente autenticadas, mas, apenas, ao do Relator, pode submeter ao Tribunal, em Questão de Ordem, o fato, para que se corrija a ementa do acórdão, ainda não publicado oficialmente, embora já assinado pelo Relator, lavrando-se, então, novo arcaico. Significado da ementa e de sua publiddade. Questão de Ordem resolvida pelo Tribunal. Estando afastado definitivamente da Corte o Relator, por motivo de aposentadoria, designa-se, como Relator para o acórdão, o Ministro que tiver proferido o primeiro voto vencedor, após o Relator, de acordo com o art. 38, inciso IV, letra b, do Regimento Interno do STF. ACÓRDÃO Trata-se de mandado de segurança impetrado por parlamentares federais contra o Vistos, relatados e discutidos estes au- ato do Sr. Presidente da amara dos Deputos, acordam os Ministros do Supremo Tri- tados, ao determinar o arquivamento da bunal Federal, em Sessão Plenária, na con- denúncia que os impetrantes apresentara formidade da ata de julgamento e das figurando como denunciados o então Prenotas taquigráficas, à unanimidade, resol- sidente da República, 1k. José Sarney, e, ver questão de ordem, suscitada pelo Mi- «por conexão, conforme esclarecem, connistro Néri da Silveira, que presidiu o jul- tra Ministros de Estado e o Sr. Consultorgamento do MS n° 20.941-1 e designar o Geral da República, pela prática de crime Ministro Sepúlveda Pertence para redigir o de responsabilidade» (fi. 627). acórdão, em face da aposentadoria do então Relator, Ministro Aldir Passarinho. Impedido o Sr. Ministro Celso de Mello. A decisão da Corte está assim registrada, ás fi. 817: «Preliminarmente, o Tribunal Brasília, 27 de agosto de 1992 — Syd- rejeitou a argüição de falta de jurisdição ney Sanches, Presidente—Na da Silvei- para conhecer do Mandado de Segurança, ra, Relator. vencidos os Srs. Ministros Sepúlveda Pertence, Paulo Brossard e alio Borja. O RELATÓRIO Tribunal, a seguir, rejeitou a preliminar de O Sr. Ministro Néri da Silveira (Rela- ilegitimidade ativa dos impetrantes, vencitor): Sr. Presidente. Ontem, à tarde, foram dos os Srs. Ministros Sepúlveda Pertence e recebidos, em meu Gabinete, para a assina- alio Borja. No mérito, o Tribunal indefetira do acórdão referente ao julgamento riu o Mandado de Segurança, vencidos os concluído em 9 de fevereiro de 1990, que Srs. Ministros Octavio Gallotti, Sydney presidi, os autos do Mandado de Segurança Sanches, Moreira Alves e Presidente.» Parn° 20.941-1-DF, relator o ilustre Ministro ticiparam do julgamento, por ma presidiAldir Passarinho; impetrantes: José Igná- do, os Srs. Ministros Moreira Alves, Aldir cio Ferreira e outros; autoridade coatora: Passarinho (relator), Sydney Sanches, 0oPresidente da Câmara dos Deputados, e tavio Gallotti, Carlos Madeira, CélioBcaja, litisconsortes passivos: o então Presidente Paulo Brossard e Sepúlveda Pertence. Auda República, Dr. José Sarney e outros. sente, justificadamente, o Sr. Ministro - 150 Francisco Reza, havendo afirmado impedimento o Sr. Ministro Celso de Mello. Antes de afastar-se do Tribunal, em virtude de aposentadoria, por implemento de idade, a 21 de abril de 1991, o Sr. Ministro Aldir Passarinho, relatar e integrante da corrente majoritária, com o zelo que tanto distinguiu sua atuação de magistrado, não só liberou para a Secretaria o relatório e votos proferidos no julgamento do feito, devidamenterubricados, como, também, S. Ex' elaborou a ementa do acórdão respectivo, assinando-o, desde logo, o que também foi entregue à Secretaria. Dá-se, porém, que, ao fazê-lo, ainda não haviam sido devolvidos, com a autenticação prevista no Regimento Interno, todos os votos dos participantes do julgamento. Observo que as notas taquigráficas relativas ao julgamento, em sua totalidade, somente agora vêm de ser reunidas e ocupam, no 4° voL, de fls. 648 a 819, o que torna possível, nos termos do Regimento Interno, a publicação do acórdão. Em virtude desse fato, a ementa do acórdão, à época mencionada, redigida pelo ilustre Ministro Aldir Passarinho, como relator, seguiu a linha e conteúdo do voto proferido por S. Ex.'. Com efeito, a ementa do acórdão, que, ontem, veio à minha assinatura, já firmado pelo relator, possui este teor (fl. 818): «Ementa: Mandado de Segurança. Processo de impeachment contra °Presidente da República e Ministros de Estada Arquivamento pelo Presidente da Câmara dos Deputados. Pedido de processamento. Lei n° 1.079, de 1950. Alteração no processo, com o advento da nova Constituição Federal, a de 1988. A Lei n° 1.079/50 estabelecia, na conformidade do disposto na Carta de 1946, então vigente, que nos processos de responsabilidade contra o Presidente da República e os Ministros de Estado, o recebimento da denúncia e a decreta- 89 ção da acusação cabia à Câmara dos Deputados, após regular processo que ali corria, tudo na conformidade do disposto nos seus arts. 14 a 23, competindo ao Senado Federal o julgamento, segundo o disposto nos arts. 24 a 37 da nova lei, funcionando, como está apresso no art. 80 desta, aquela primeira Casa do Congresso, como tribunal de pronúncia, e a segunda como tribunal de julgamento. A nova Constituição Federal alterai profundamente a competência da Câmara dos Deputados, e do Senado Federal para o processo e julgamento, nos crimes de responsabilidade, do Presidente da República e Ministros de Estado, passando a este último a atribuição para as duas fases, e não somente para o julgamento (art. 52,1, da CF). A Câmara dos Deputados, entretanto, não ficou alheia à questão, passando a caber-lhe a autorização para a instauração, no Senado Federal, do processo, conforme o seu art. 51, 1. Indispensável, contudo que, não mais podendo prevalecer, em relação à Câmara dos Deputados, as normas contidas nos arts. 14 a 23 da Lei n° 1.07W50, que cuidam do processamento, ali, dos aludidos crimes de responsabilidade, ante a nova Carta Política, que estabeleça tal Casa o procedimento a ser ali adotado para que haja a autorização para ser instaurado o processo para a apuração dos crimes daquela natureza, atribuídos ao Presidente da República e aos Ministros de Estado, pois não se torna cabível,ante os princípios constitucionais assecuratórios da ampla defesa, que seja concedido tal autorização sem que se possam defender aquelas altas autoridades. É que a instauração do processo, no Senado Federal, que não poderá negá-la, importa em imediato afastamento do Presidente da República de suas funções, segundo dispõe o art. 86, § 1°, I, da nova Constituição Federal. 90 R.TJ. — 150 Inexistindo, na Câmara dos Deputados, normas específicas para o procedimento a ser ali adotado, para que possa ser concedida a autorização para a instauração do processo, para a apuração do crime de responsabilidade, pois as previstas na Lei n° 1.079/50 já não lhe são aplicáveis, e nem cabendo ao Supremo Tribunal Federal fixálas, é de indeferir-se o mandado de segurança impetrado para que seja autorizado, por aquela Casa do Congresso, a instauração do processo, pelo Senado Federal. Os órgãos competentes da Câmara é que deverão decidir como proceder a respeito, à falta de lei que disciplina a matéria, no que lhe diz respeito.» A parte mais significativa da ementa afirma, destarte, que, não mais podem prevalecer, em relação à Câmara dos Deputados, as normas contidas nos arts. 14 a 23 da Lei n° 1.079/50, «que cuidam do processamento, ali, dos aludidos crimes de responsabilidade, ante a nova Carta Política», sendo indispensável que estabeleça tal Casa «o procedimento a ser ali adotado» a fim de que haja a autorização destinada a instaurar o processo para a apuração do crime de responsabilidade do Presidente da República e Ministros de Estado, com vistas a assegurar-lhes ampla defesa. Afirmando inexistir, na Câmara dos Deputados, tais normas específicas, conclui-se na ementa por indeferir o mandado de segurança Ora, essas disposições da ementa correspondem, efetivamente, ao que se vê do voto do ilustre Ministro Aldir Passarinho, em especial, às fls. 681/683: «Assim, ainda a admitir-se que somente haveria necessidade de a lei dispor sobre as normas processuais para o andamento da questão, no Senado, já que a Carta Magna estabelece que ali é que será instaurado o processo de impeachment, então, mesmo assim, terse-á como indeclinável que na Câmara dos Deputados haja um prévio procedimento instrutório para asseguração da apuração dos fatos e a garantia de pelo menos uma defesa preliminar, sendo, após, levado o assunto à deliberação daquela Casa do Congresso para autorizar, ou não, a instauração do processo no Senado Federal, dada as implicações de octana gravidade e significação decorrentes dessa instauração. Já assinalava o Prof. Paulo Brossard, hoje ilustre Ministro desta Casa, na obraj á referida, Olmpeachment, que `o fato de ser umprocesso político não significa que ele deva ou possa marchar à margem da lei' (pág. 146). De qualquer sorte, e isso é que, na oportunidade, é imperioso salientar — e dentro dos lindes que ao Supremo Tribunal Federal compete pronunciar-se — não mais cabendo a aplicação da Lei n° 1.079/50 quanto ao processamento da denúncia, na Câmara dos Deputados, e nada havendo, no seu Regimento Interno, quanto ao procedimento a ser ali adotado, tenho como absolutamente incabível, por isso mesmo, e mais pelas razões antes expostas, que possa ser ordenado por esta Corte que, de plano, seja a denúncia diretamente levada ao Plenário daquela Casa do Congresso, ou tenha determinado andamento administrativo. O pedido formulado, como inicialmente se viu, cifra-se à exigência de que haja o cumprimento da Lei n° 1.079/50 e dos arts. 51, I, e 86, da Constituição Federal, à consideração de que o arquivamento da denúncia, pelo Presidente da Câmara, em exercício, fora ilegal. A Lei 1.079/50, como se viu, não se torna suscetível de aplicação à fase inicial da tramitação da denúncia, na Câmara dos Deputados, e o cumprimento dos arts. 51, I e 86 da Constituição Federal dependem da normatização do procedimento cabível, ainda que seja por deliberação interna a ser ali — e só ali — adotada, pois não cabe ao judiciã- —150 rio dizer como deve desenvolver-se o procedimento no âmbito daquela ilustre Casa do Congresso, o que envolve, inclusive a questão relativa ao de,sarquivamento da denúncia. Creio, entretanto, que à falta de norma disciplinadora de como proceder o desarquivamento da denúncia poderia ser objeto de recurso para o Plenário da Câmara que poderia, então, estabelecer as diretrizes administrativo-processuais a ser obedecidas. Pelo exposto, indefiro a segurança.» Devendo constituir a ementa do acórdão síntese do que foi decidido, ou pela unanimidade, ou pela maioria da Corte, como ocorreu na espécie, não cabe expressar, tão-só, o conteúdo do voto do relator, se a fundamentação deste não é coincidente com a dos demais, ou com a daqueles que, com ele, compuseram a maioria, no julgamento. Seguramente, pelas circunstâncias antes referidas, em que o ilustre relator houve por bem, com louvável zelo, deixar elaborada aementa, ao afastar-se da Cate, a 21-4-1991, verifico não corresponder, entretanto, seu enunciado ao que se contém nos votos da maioria que, com S. Ex.•, indeferiu o mandado de segurança. Assim, o ilustre Ministro Sepúlveda Pertence, que também denegou, no mérito, o writ, e às fls. 771/776, expressamente, discordou do Relator, no ponto indicado, como se lê, de forma particular, às fls. 775/776: «Esse é o ponto nuclear do voto de S. Ex.', que, por isso, preferiu à falta da segurança da existência desse devido processo legal, entender que, enquanto não regulamentado, era impossível atender à pretensão dos impetrantes e conceder a segurança. Mas, data vertia, se essa é a preocupação de S. Ex.' e se, hoje, a própria Câmara já adotou a Lei n° 1.079, não vejo como descartá-la. A preocupação do Relator é com a garantia da defesa 91 prévia. Ora, o que poderiam dizer os que admitem uma profunda minimização do papel da Câmara no processo de impeachment, segundo a Constituição vigente, é que era preciso menos defesa do que assegurava a Lei n° 1.079. Então, o que se pode queixar é que a Lei n° 1.079, daria defesa demais, não, de menos. Por isso, não é por esse fundamento que se pode afastar a Lei n° 1.079, que a Câmara adotou: ainda os que admitam, como o Relator chega a aventar, que, sendo, o processo, hoje, integralmente desenvolvido no Congresso, a matéria teria passado a ser regimental, hão de convir em que o Regimento adotou a Lei n° 1.079, fazendo-a, quando fosse o caso, conteúdo de disciplina regimental do impeachment. De tal modo, seja por força do Regimento, seja por força da lei, não faltam, no arsenal da Câmara, instrumentos normativos para assegurar a defesa. O que pode existir é excesso de oportunidade de defesa, para os que entendem que a função da Câmara se resumiu a um simples juízo discricionário de autorização. De qualquer modo, o de que se cuida é da fase liminar, vestibular, do procedimento, e nisso não vejo em que a alteração do sistema constitucional possa afetar a Lei n° 1.079. Para mim, a Lei n° 1.079 é compatível com a Constituição. E me gratifica essa convicção, que não impõe à alta responsabilidade do STF afirmar que, enquanto não sobrevier lei nova, não haveria hnpeachment. De modo, Sr. Presidente, que, nesse ponto, não posso acompanhar a fundamentação do voto do Relator.» E, em debate, à fl. 785, com o ilustre Relator, afirmou o Ministro Sepúlveda Pertence: 92 R.T.J. —150 «E isto está assegurado pela recepção da Lei n° 1.079, com as adaptações necessárias». Já, em seu douto voto, sobre o mérito, o eminente Ministro Paulo Brossard, após brilhante exposição acerca do impeachment, recordando inchnive posição adotada em obra de merecida reputação doutrinária, de sua autoria, indeferiu o mandado de segurança, sem considerar, especificamente, a questão aludida, fundamentando sua decisão, em outros termos, cuja síntese se vê às fls. 791/792r «Mas, chamado a votar o mérito do mandado de segurança, como o Relator, como o Ministro Sepúlveda Pertence, concluo pelo indeferimento da segurança, ou melhor, dele não tomo conhecimento. Deferi-lo, importaria em desarquivar o processo, e reformar a decisão do Presidente da Câmara, da qual não houve recurso para o Plenário. Não examino o acerto ou desacerto dessa decisão do Presidente da Câmara que, como o Ministro Sepúlveda Pertence salientou, tem atribuições que não são meramente burocráticas. Ele exerce singular magistratura. Entendo que o Tribunal não poderia desarquivar o processo. No caso vertente, digo mais, não vejo direito líquido e certo a ser protegido.» O ilustre Ministro alio Borja, à sua vez, que também teve seu pronunciamento somado àmaioria, quanto ao julgamento do mérito, indeferindo o writ, ressaltou que «o ato de autorização é ato discricionário» (fl. 794), acrescentando (fl. 794): «Os votos dos Deputados na apreciação do pedido de autorização não são vinculados a nenhuma lei. Contra eles nada se pode; pode-se informar ao Plenário da Câmara as circunstâncias em que os fatos noticiados se produziram, que elementos abonam a autenticidade dessa untais, mas cada um votará como entender, e não haverá apelo dessa decisão; portanto, trata-se, data venta das opiniões em contrário, de uma decisão política. A informação que se colhe para deliberação não vincula. Se todas as informações convergirem no sentido da inocência do Presidente da República, da não autoria dos fatos que lhe são imputados, a Câmara., por sua maioria de 2/3, maioria qualificada, pode dizer que, não obstante a denúncia deve ser apreciada pelo Senado. E passa-a ao Senado. Instaura-se o processo.» O que quero dizer é a Constituição não mandou que a lei disciplinasse o processo na Câmara dos Deputados. Mandou, sim, que a lei regulasse o processo de julgamento, e, este, se passa no Senado. Há outra circunstância, Sr. Presidente, eu apenas superficialmente, no voto que trouxe escrito, a ela aludi. Tendo sido eu responsável por uma das Câmaras sei que o Presidente de qualquer delas é também garante das instituições. Ele não é um batedor de carimbos, ele não é um verificador da mera regularidade formal dos processos, ele tem sobre seus ombros o dever de velar por que não se abata nenhuma desgraça sobre a República A atividade política é sui generis; as aproximações que fazemos do processo de impeachment com o processo penal, com ação penal, ajudam, por certo a compreendê-lo e darlhe ordem e disciplina, mas não nos podem levar a identificá-los de forma absoluta. Voltando ao ponto do debate, afirmo que me recuso a afirmar a competência do Presidente da Câmara para negar autorização para o processo por crime de responsabilidade do Presidente e seus Ministros. A Constituição é clara, está no art. 51, I, que a competência para autorizar o processo é do Plenário da - 150 Câmara dos Deputados, falando por 2/3 de seus membros. Não tenho a menor dúvida. Competente para autorizar o Senado a processar é o Plenário da Câmara dos Deputados e só ele. Entretanto, falece aos impetrantes o direito de pleitear a nulidade do ato do Presidente da Câmara, isso porque a sua intervenção no processo terminou com o oferecimento das infonnações a respeito da atividade dita criminosa do Presidente da República. Passa, sim, a regularidade do processo a ser o cuidado, o oficio, o mister, a preocupação dos Membros da Câmara dos Deputados. A autorização para o processo de impeachment é, assim, matéria na qual só os seus membros intervêm. Se se facultasse aos nobres Senadores que impetram este writ, participar de urna deliberação que pertence exclusivamente à Câmara dos Deputados, estaríamos, a meu ver, violando o mais fundamental dos princípios de organização do Congresso Nacional que é o do bicameralismo. Por isso, a Câmara não pode dar aos seus ilustres informantes o status de parte na sua deliberação. O mesmo ocorrerá no Senado, tanto assim que a acusação cabe, ali, a uma comissão designada dentre os seus membros. Nem da acusação, nem do julgamento podem participar os Deputados. Sr. Presidente, entendo, portanto, que não há direito líquido e certo dos impetrantes. Pedindo vênia aos eminentes Colegas que pensam contrariamente, no mérito, indefiro a impetração.» Certo está que, no início de seu voto sobre o mérito, afirmara (fl. 793): «Sr. Presidente, no voto escrito que ali, esta tarde, ao Colendo Plenário, disse que, em outra causa pendente de julgamento, afirmei a nalureza discricioal- 93 ria e política da autorização prevista no art. 51, I, da Constituição, entendendo que, por isso, já não mais se lhe aplicam as regras processuais e procedimentais da Lei n° 1.079, de 1950. Os jovens publicistas que hoje pontificam neste País esqueceram-se de alguns princípios fundamentais da orgrmiração política nacional, entre eles o bicameralismo, que pede que as Câmaras tenham, urna em relação a outra, autonomia e independência» Vou prosseguir na leitura, Sr. Presidente: «Penso, portanto, que tendo exercido os nobres impetrantes a faculdade escrita no art. 14 da Lei a° 1.079, de 1950, de noticiar fatos que têm como criminosos, o processamento ulterior da noticia ou denúncia submete-se, exclusivamente, ao Regimento Interno da Câmara dos Deputados.» De qualquer sorte, não parece existir coincidência de fundamentação, no ponto indicado na ementa e nos termos em que se expressa o voto do Sr. Ministro alio Boria O Sr. Ministro Carlos Madeira, a seguir, entendeu que os impetrantes careciam de direito líquido e certo, quanto ao desarquivamento do processo, «porque foi um ato discricionário do Presidente da Câmara, dentro do exercício de seus poderes» (fl. 797). É exato, entretanto, que, em continuação, asseverou (fl. 797): «Deixo de estender considerações em torno do processamento, porque, na realidade, considero derrogada parte da Lei n°1.079, que está em desacordo com a Constituição. E tão em desacordo está que a Constituição o comprova: manda que se faça nova lei estabelecendo o processo de responsabilidade do Presidente da República. O parágrafo único do art. 85 — o Ministro Gálio Beija já alertou — manda que o Congresso Na- 94 R.T.J. —150 cional elabore nova lei, porque essa lei está derrogada, pelo menos na parte do processo na Câmara.» Os votos, em prosseguimento dos Srs. Ministros Octavio Gallotti (fls. 798/799), Sydney Sanches (fls. 800801), Moreira Alves (fls. 803/804) e o que, por último, proferi (fls. 808/816), embora sejam os quatro votos vencidos, que deferiam o mandado de segurança, para cassar o ato do Presidente da Câmara dos Deputados, ao determinar o arquivamento, em todos eles, há Posição diversa da que expressa a ementa do acórdão, quanto ao procedimento na Câmara dos Deputados. Em virtude dessas observações, quanto ao julgamento e às respectivas notas taquigráficas autenticadas, tendo em conta que o eminente Ministro Aldir Passarinho, com pesar para todos nós, não mais integra a Corte, — entendi de trazer a matéria, em Questão de Ordem, ao Tribunal. Penso que o dever de aposição da assinatura no acórdão, por parte de quem presidiu a sessão de julgamento (RI, art. 94), autoriza levar, previamente, ao relator e, em suafalta, àCorte, ponderação dessa ordem para que se reexamine o enunciado da ementa, a fim de que esta sempre seja formulada e publicada, guardando exata correspondência com o que ficou decidido e nos limites do julgamento. Acresce referir, no caso concreto, que a imprensa, nos últimos dias, tem feito alusão a este julgado do Tribunal, embora não publicado. Importa, pois, que o acórdão, pelo uso e divulgação que decerto terá, possua também ementa precisa, destinada, inclusive, à publicação oficial, prevista no Regimento Interno, no Diário da Justiça, resumindo-se, nela, com exatidão, o que foi efetivamente decidido. É a Questão de Ordem que entendo de meu dever submetê-la ao Plenário, ao ensejo em que me são presentes os autos, para assinatura do acórdão. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Néri da Silveira (Relator): Dispõe o Regimento Interno deste Tribunal, em seu art. 93, que as conclusões do Plenário e das Turmas, em suas decisões, constarão de acórdão, no qual o Relator se reportará às notas taquigráficas do julgamento, que dele farão parte integrante. Subscrevem o acórdão o Ministro que presidiu o julgamento e o Relator que o lavrou (RI, art. 94), fazendo-se a publicação do aresto, por suas conclusões e ementa, para todos os efeitos, no Diário da Justiça (RI, art. 95). Estabelece, ainda, o art. 96, do RI, que, em cada julgamento, «as notas taquigráficas registrarão o relatório, a discussão, os votos fundamentados, bem como as perguntas feitas aos advogados e suas respostas, e serão juntas aos autos com o acórdão, depois de revistas e rubricadas», estipulando o § 2° do art. 96 do RI, verbis: 2°. Prevalecerão as notas taquigráficas autenticadas, se o seu teor não coincidir com o acórdão». 4 Todos sabemos que a ementa do acórdão não é, em princípio, parte componente do julgado. Este se expressa pelo conteúdo dos votos dos membros da Corte, que do julgamento participaram. De ordinário, sequer erro, defeito ou imprecisão da ementa ensejam embargos de declaração, precisamente, porque a ementa não integra o aresto. No RE n° 88.060, DJ de 1-6-1979, esta Corte decidiu: «Para simples correção de ementa, não cabem embargos de declaração; prevalecem as notas taquigráficas». Dá-se, porém, que os Tribunais que adotam, em seus acórdãos, ementas, estas hão de constituir uma súmula ou síntese fiel do que foi decidido. Seus enunciados são publicados no Diário da Justiça, passam a integrar repositórios de jurisprudência e, por vezes, constituem instrumento utilíssimo de sua divulgação e pesquisa. No caso concreto, cuida-se de acórdão volumoso, com cerca de 170 páginas, sobre R.T.J —150 matéria constitucional da maior importância Penso que é de nosso dever evitar que a publicação oficial dessa decisão se faça, de faina equivoca ou em termos a não traduzir a exata compreensão do julgado. Na impossibilidade de, ao eminente Ministro Aldir Passarinho, por não mais integrar o Tribunal, caber reapreciar, como estou disso certo o faria, o teor da ementa do acórdão, já agora podendo compulsar todos os votos que se proferiram nesse longo julgamento, — penso que, admitida pelo Plenário, a presente Questão de Ordem, os autos devem ser conclusos ao ilustre Ministro Sepúlveda Pertence, que, pela ordem, foi o primeiro voto, logo após o relator, dentre os que formaram a maioria, a fim de S. Ex.', designado relator para o acórdão, em face da aposentadoria do Relator, nos termos previstos no art. 38,1V, letra b, do RI, elaborar a ementa definitiva do cresto a ser publicado. EXTRATO DA ATA MS 20941 (Qantão de Ordem) —DF. Rel.: lvfm. Néri da Silveira Imptes.: José Ignácio Ferreira e outros (Advs.: Raymun- 95 do Faoro e outro). Autoridade coatora: Presidente da Câmara dos Deputados. Litiscensoras passivos: José Samey (Adv.: Sebastião Baptista Affonso), José Saulo Pereira Ramos e outros (Adv.: José Goma Santos Cruz). Decisão: Por votação unânime, o Tribunal, resolvendo questão de ordem, suscitada pelo Ministro Néri da Silveira, que presidira o julgamento do MS 20.941-1, designou o Ministro Sepúlveda Pertence para redigir o acórdão, em face da aposentadoria do então Relator, Ministro Aldir Passarinho. Impedido o Ministro Celso de Mello. Ausente, ocasionalmente, o Ministro Marco Aurélio. Presidência do Sr. Ministro Sydney Sanches. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira, Octavio Gallotti, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Calos Venoso, Marco Aurélio, limar Gaivão e Francisco Rezek. Procurador-Geral da República, Dr. Aristides Junqueira Alvarenga. Brasília, 27 de agosto de 1992 — Luiz Tomimatsu, Secretário. RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA N° 21.080 — DF (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro Francisco Rezek Recorrente: Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo do Estado de São Paulo — Sindipetro-SP — Recorridos: União Federal e Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo de Campinas e Região Mandado de Segurança. Recurso ordinário. Decisão do Superior Dibunal de Justiça mantenedora de ato do Ministro do Trabalho. Organização sindicai. Recurso ordinário em mandado de segurança contra ato de Ministro do Trabalho mantido pelo Superior Tribunal de Justiça. Organização sindical. Legitimidade de constituição de sindicato em base territorial intermunidpal. Previsão legal de sua ocorrência. Ausência de ilegalidade. Recurso ordinário desprovido. 96 R.TJ. —150 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquignificas, à unanimidade de votos, em negar provimento ao recurso em mandado de segurança. Brasília, 12 de agosto de 1993 — Octavio Gallotti, Presidente — Francisco Rezek, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Francisco Rezek: Esta a análise que faz da espécie o Subprocurador-Geral da República Arthur de Castilho Neto: «O Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo do Estado de São Paulo — Sindipetm/SP — apresenta Recurso Ordinário contra decisão proferida pela Egrégia la Seção do Superior Tribunal de Justiça que, por unanimidade, indeferiu Mandado de Segurança impetrado pelo Recorrente contra ato do Sr. Ministro do Trabalho. Sustenta, em síntese, que: 'a) a decisão recorrida deixou de analisar adequadamente o ato ministerial impugnado, levando em consideração o enganoso argumento de que o sindicato municipal prefere o estadual, sendo que o litisconsorte não representa a maioria da categoria econômica local, que pretende continuar a ser representada pelo Recorrente; para a formação de um novo sindicato não é suficiente que uma pequena parcela da categoria se manifeste nesse sentido, é preciso que a maioria absoluta da classe o faça, de forma inequívoca; a autoridade coaxara, além disso, desconsiderou o parecer da Comissão de Enquadramento Sindical a que estava vinculado e, para fazê-lo, teria de justificar sua conduta; não foi respeitado o direito adquirido do Recorrente ter sua base territorial intacta, sendo que a categaia econômica representadapor este tem peculiaridades que recomendam um sindicato único, seus problemas são comuns e demandam soluções comuns; as negociações e o relacionamento com as entidades de trabalhadores necessitam de ter uma orientação comum; a unicidade sindical significa que, em uma mesma base territorial, não pode haver duas ou mais organizações sindicais de mesmo grau, sob pena de afrontar-se o art. 8°, II, da CE' Manifestação da SubprocuradoriaGeral da República às fls. 709/711. Contra-razões do litisconsorte passivo às fls. 713/720. Parecer Trata-se de concessão de investidura sindical outorgada na vigência da Constituição anterior, já que o ato ministerial é de 30 de setembro de 1988, publicado no DOU de 4-10-88 (fls. 19(/191 — 1° volume). Vigorava, então, o art. 166 da Emenda Constitucional. n° 1/69, que assim dispunha: 'Art. 166 —É livre a associação profissional ou sindical; a sua constituição, a representação legal nas convenções coletivas de trabalho e o exercício de funções delegadas de poder público serão regulados em lei.' Deixou a CF que a matéria fosse disciplinada pelo legislador ordinário, incidindo, pois, sobre a matéria, o disposto nos artigos 515 e seguintes da Consolidação das Leis do Trabalho (De- R.TJ —150 creto-Lei n° 5.452, de 1° de maio de 1943). No artigo 515 da CLT, são estabelecidas as condições que as associações deverão preencher para serem reconhecidas como Sindicatos, verbis: 'Art. 515 —As associações profissionais deverão satisfazer os seguintes requisitos para serem reconhecidas como sindicatos: reunião de um terço, no mínimo, de empresas legalmente constituirias, sob a forma individual ou de sociedade, se se tratar de associação de empregadores; ou de um terço dos que integram a mesma categoria ou exerçam a mesma profissão liberal, se se tratar de associação de empregados ou de trabalhadores ou agentes autônomos ou de profissão liberal; duração de três anos para o mandato da diretoria; c) exercício do cargo de presidente por brasileiro nato, e dos demais cargos de administração e representação por brasileiros. Parágrafo único. O Ministro do Trabalho poderá excepcionahnente, reconhecer como sindicato a associação cujo número de associados seja inferior ao terço a que se refere a alínea a. No artigo 516 está prevista uma limitação, consagradora do princípio da unicidade sindical, que impede o reconhecimento de mais de um sindicato em orna mesma base territorial: 'Art. 516 — Não será reconhecido mais de um sindicato representativo da mesma categoria econômica ou profissional, ou profissão liberal, em uma dada base territorial.' Já o art. 517 admite a existência de sindicatos distritais (hoje, a área não pode ser inferior à de um Município, cf. 97 art. 8", II, in fine, CF de 1988), podendo o Ministro do Trabalho autorizar o reconhecimento de sindicatos nacionais: 'Art. 517 — Os sindicatos poderão ser distritais, municipais, intermunicipais, estaduais e interestaduais. Excepcionalmente, e atendendo às peculiaridades de determinadas categorias ou profissões, o Ministro do Trabalho poderá autorizar o reconhecimento de sindicatos nacionais. § 1° — O Ministro do Trabalho outorgará e delimitará a base territorial do sindicato; § 2° — Dentro da base territorial que lhe for determinada é facultado ao sindicato instituir delegacias ou seções para melhor proteção dos associados e da categoria econômica ou profissional ou profissão liberal representada' A investidura sindical será conferida sempre à associação mais representativa, ajuízo do Ministro do Trabalho, conforme preceitua o art. 519, que fornece àquela autoridade os critérios pelos quais ela se nortear• 'Art. 519 — A investidura sindical será conferida sempre à associação profissional mais representativa, ajuízo do Ministro do Trabalho, constituindo elementos para essa apreciação, entre outros: o número de associados; os serviços sociais fundados e mantidos; c) o valor do patrimônio.' Reconhecida como sindicato a associação profissional, o Ministro do Trabalho mencionará a base territorial em que a entidade atuará: 'Art. 520 — Reconhecida como sindicato a associação profissional, ser-lhe-á expedida carta de reconhecimento, assinada pelo Ministro do — 150 98 Trabalho, na qual será especificada a representação econômica ou profissional conferida e mencionada a base territorial outorgada. Parágrafo único — O reconhecimento investe a associação nas prerrogativas do art. 513 e a obriga aos deveres ao art. 514, cujo inadirnplemento a sujeitará às sanções desta lei.' Examine-se, agora, o recurso apresentado. Não pode prosperar a alegação de falta de motivação e de injuridicidade do despacho ministerial concessivo. Conforme se poderá inferir da leitura do documento de fl. 190, a autoridade coatora reconsiderou o despacho anterior em virtude dos fatos novos apresentados pelo litisconsorte requerente, que teriam comprovado o preenchimento dos requisitos indispensáveis à outorga. Depois, conforme bem ponderou o voto condutor do acórdão recorrido, o despacho anterior tinha sido proferido em recurso do impetrante, sem a audiência da parte interessada. Desrespeitada fora cláusula do due process of law. Com efeito, colho do mencionado voto: 'Irresignadas, retattaain administrativamente as entidades acima mencionadas (fls. 157 e 162), além da Confederação Nacional do Comércio. Apreciando os aludidos recursos, houve por bem a Comissão de Enquadramento Sindical recomendar o seu provimento, para o fim de ser considerada sem efeito a resolução anterior (fl. 179), recomendação essa que foi acolhida pelo Ministro do Trabalho (fi. 180). Alegando cerceamento de defesa, j á que não foi ouvida no procedimento recursal, impetrou, então, a Asso- ciação prejudicada, reconsideração do aludido ato, oportunidade em que, refinando as razões dos recorrentes, sustentou possuir a necessária representatividade para a pretensão manifestada a qual, a seu ver, não contraria o principio da unidade sindical. A manifestação foi igualmente submetida à apreciação da Comissão de Enquadramento Sindical, tendo-se manifestado esta pelo indeferimento, ao singelo argumento de que <a matéria já se encontra exaurida, no âmbito deste colegiado, uma vez que, por despacho do Exmo. Sr. Ministro, foi acolhida proposta deste órgão, tornando assim sem efeito a Resolução referida>. Todavia, como seria de esperarse, diante das circunstâncias, o Ministro do Trabalho reconsiderou o seu ato. Com efeito, a apreciação e julgamento do recurso foram feitos sem a audiência da parte adversa, com o que se violou, o comezinho princípio do due process of law, consagrado no 153, § 15, da CF/67 e art. 5", LV, da CF/88. Trata-se de garantia que, já no regime da Carta de 67, se estendia, de modo induvidoso, aos processos administrativos, conforme observado no ilustrado parecer da douta Subprocuradoria-Geral da República (fl. 681). Assim sendo, obviamente, outra não poderia ser a decisão da autoridade impetrada, senão tornar sem efeito o precipitado julgamento dos recursos. Registre-se que a Comissão, no caso em tela, não emitiu nenhum pronunciamento de ordem técnica a que estivesse vinculada.' Não podem prosperar o argumento do direito adquirido a uma base territo- R.T.J — 150 dai intata nem tampouco o da violação do princípio da unicidade sindical. Primeiro, porque, conforme já se viu, a então vigente EC n° 1/69, no art. 166, consagrava o direito da livre associação. Segundo, porque diferentes são as bases territoriais do impetrante e do litisconsorte: aquele é estadual e este é intermunidpal (fls. 51 e 191). Tampouco constituem os representados categoria diferenciada, de modo a impedir o desmembramento aqui atacado. Mas, ainda que assim não fosse, tal circunstância não impediria a constituição de um novo sindicato (arts. 570/571 CUT). Com relação aos requisitos exigidos, ao que parece, foram todos eles preenchidos (v. despacho concessivo de fl. 190). Não seria, ainda, o Mandado de Segurança a via própria para analisar prova documental (art. 1° da Lei n° 1.533/51). Creio eu que o ato ministerial aqui impugnado não cometeu nenhuma ilegalidade ao conferir à associação, então postulante, a investidura sindical dentro dos limites territoriais que assinalou. Que são, inclusive, os da jurisdição do TRT de Campinas, onde se faz representar o sindicato criado. Para rematar, é de se assinalar que a CF de 1988 é mais incisiva quanto ao princípio da livre associação. Impede até Inativamente a interferência do Estado na organização sindical (art. 8°, I, CF). A propósito dessa norma, o Supremo Tribunal Federal já adotou o entendimento de que apenas o princípio da uniddade sindical, quanto à base territorial, e a circunstância da existência de uma categoria diferendada estariam a justificar a vedação de criação de nova categoria sindical (MS 20.829-5/DF, Rel. Min. alio Borja, Dl de 23-6-89 — Pleno e RMS n° 21.305-1/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 29-11-91, Pleno). 99 Por todas essas razões, sou pelo não provimento do recurso.» (fls. 725/731) É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Francisco Rezek (Relator): Estimo exato o parecer do Ministério Público Federal, que adoto como razão de decidir. Acima de tudo ocorre-me inexistir qualquer ilegalidade no ato do Ministro do Trabalho, chancelado pelo Superior Tribunal de Justiça: a idéia de uma associação local não colide com a existência de uma base territorial maior — no caso estadual —, tanto que prevista na legislação própria. Sem a ilegalidade que ensejaria a correção postulada, resta-me seguir o alvitre da Procuradoria-Geral da República e negar provimento ao recurso. É como voto. VOTO O Sr. Ministro Marco Aurélio: Sr. Presidente, doutrinariamente, entendo que não é salutar o princípio da.unicidade sindical. Entretanto, está consagrado pela Carta de 1988. O artigo 8°, ao dispor sobre a matéria, preceitua no inciso I: nI — a lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação do sindicato, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ao Poder Público a interferência e a intervenção na organização sindical;» O inciso II, de uma forma mais precisa, versa sobre o princípio da unicidade sindical: v11— é vedada a criação de mais de uma organização sindical, em qualquer grau, representativa de categoria profissional ou econômica, na mesma base territorial, que será definida pelos trabalhadores ou empregadores interessados, não podendo ser inferior à área de um Município;» 100 R.T.J. — 150 Manteve-se, portanto, o sistema da unicidade sindical. Do relato feito pelo nobre Ministro Francisco Rezek, transcrevendo e anunciando à Corte como razões de decidir o que se contém no parecer do Ministério Público, o que verificamos? Constatamos que havia, como ainda há, um sindicato com abrangênciamaior, a alcançar vários Municípios. Mesmo assim, estando a base territorial ocupada, surgiu uma associação de classe que foi transformada, com o endosso do Ministério do Trabalho, em entidade sindical, em sindicato. Não temos, no caso, uma superposição? A meu ver, sim. Sob o meu ponto de vista, não se faz presente a criação, em si, de um sindicato, ocupando base territorial ainda não abrangida pela representação de uma outra entidade. Creio que não veio aos autos — estamos aqui para julgar em sede ordinária e não extraordinária — sequer a deliberação dos integrantes da categoria. O que tivemos foi a criação de um novo sindicato. Sr. Presidente, se as premissas por mim lançadas, 'astreadas no que ouvi do nobre Relator, são reais, formahnente reais, porque reveladas nestes autos —muito embora, repito, não seja favorável doutrinariamente ao princípio daunicidade sindical — peço vênia a S. Ex.• para entender que o ato do Ministro de Estado do Trabalho implicou a transgressão ao princípio insculpido no inciso II do artigo 8° da Carta. Provejo, no caso, o recurso para conceder a ordem, creio, pleiteada no sentido da cassação desse ato de registro. Não vou discutir aqui se persiste, ou não, a necessidade do credenciamento. Não vou versar sobre a matéria, frente ao surgimento, em si, do sindicato como pessoa jurídica de direito privado, posto que a Corte caminhou, nos precedentes mencionados pelo Ministro Francisco Rezek, no sentido de concluir que, enquanto não vier à balia a definição de um outro órgão, competente para esse, vamos dizer assim, segundo registro — porque o primeiro registro é no Cartório das Pessoas Jurídicas — temos o Ministério do Trabalho como credenciado a preservar, justamente, a unicidade de que cuida o dispositivo constitucional a que me referi anteriormente. O Sr. Ministro Francisco Rezek (Relator): Sr. Presidente, um esclarecimento. Temos em mesa, submetida à crítica do sindicato recorrente, uma decisão do Superior Tribunal de Justiça, relatada ali pelo Ministro limar Gaivão. Cuida-se de saber se a decisão do Superior Tribunal de Justiça aplicou o bom direito ou errou e, neste caso, há de ser reformada. A decisão foi tomada em mandado de segurança, onde o ato impugnado é do Ministro de Estado do Trabalho, nos idos de setembro de 1988 — portanto, sob a regência daConstituição anterior. A propósito do princípio da unicidade sindical, que levou o eminente Ministro Marco Aurélio a dizer que entende ter havido superposição, penso ter recolhido bem os argumentos de S. Ex.• e devo descartar a idéia de superposição. Ficou claro que, ao atender àquilo que lhe foi solicitado pelas empresas do ramo, na região de Campinas, o Ministro do Trabalho autorizou a investidura sindical no nível regional. Mencionou então exata e exaustivamente os municípios envolvidos, e terminou dizendo: «Para não ocorrer dualidade de representação, deverão os referidos Municípios ser excluídos da base territorial do sindicato congênere de base estadual, apostilando-se nesse sentido a respectiva carta sindical». O que temos aqui, portanto, não é superposição. O que temos é um sindicato para a categoria na região de Campinas, e outro sindicato regional para o restante do Estado. O Sr. Ministro Marco Aurélio: Aí resta saber se houve o pronunciamento dos integrantes, dos interessados. O Sr. Ministro Francisco Rezek (Relato* A premissa do Superior Tribunal de R.T.J —150 Justiça, ao denegar a segurança, foi exatamente essa Não foi bem findada a tese de que isso era unia aventura minoritária Isso era algo desejado pela categoria na região. Por acaso, essa área é exatamente a jurisdição do TRT de Campinas. Estou dizendo, pois, que não está em causa uma superposição. Há dois sindicatos de nível estadual. O que se chamava estadual continua a guardar esse nome. Ele é tão intermunicipal quanto o outro: abrange os demais Municípios, que não os de Campinas e dezenas mais. O Sr. Ministro Marco Aurélio: Sr. Presidente, inclusive no início do voto pedi ao nobre Relator que confirmasse as premissas lançadas. Uma delas foi justamente a ausência de prova — referi-me à circunstância de estarmos em sede ordinária — de deliberação dos interessados quanto ao desmembramento da área geográfica, porquanto a própria Carta agasalha a possibilidade de termos sindicato por Município. O ilustre Relatar, até mesmo vindo em meu socorro, agora esclarece que restou comprovado nos autos que os interessados, ou seja, aqueles que integram a categoria econômica e que têm sede 'e agências na área referida, pronunciaram-se a respeito. Portanto, reuniram-se e, aí, partiram, a meu ver, de forma válida, para o desmembramento que se mostra harmônico com o inciso 11 do artigo 8° da Constituição Federal, sem violentar, por conseguinte, o princípio da unicidade sindical. Diante desse esclarecimento, reajusto o voto proferido para acompanhar S. Ex.', negando acolhida ao pedido formulado no recurso ordinário. VOTO O Sr. Ministro Carlos Venoso: Sr. Presidente, a Constituição vigente consagra o princípio da unicidade sindical, no sentido de que, numa «mesma base territorial», não «será admitida mais de uma organização sindical, em qualquer grau, representativa 101 da categoria profissional». De outro lado, deixa expresso que caberá aos «trabalhadores ou empregadores interessados» a fixação dessa «base territorial», simplesmente estabelecendo o mínimo, que, na parte fmal do inciso II, do art. 8°, enuncia-se assim: «não podendo ser inferior à área de um Município». No momento em que o sindicato fez o desmembramento, quer-me parecer, implicitamente, talvez até expressamente, estabeleceu área diferente. De modo que me parece, portanto, perfeita a decisão e o voto do eminente Relator pode ser sufragado. Com estas breves considerações, acompanho o voto do Sr. Ministro Relator, negando provimento ao recurso. VOTO O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence Sr. Presidente, confortou-me a reconsideração do voto do eminente Ministro Marco Aurélio, que, por sua justamente reconhecida autoridade na área, me deixara perplexo, ante a primeira convicção que flanara. De fato, a unicidade sindical, mal ou bem reafirmada pela Constituição, não me parece obstáculo ao desmembramento. O que se põe é um problema de representatividade que, salvo engano, não é colocada corno razão de pedir do sindicato estadual anterior e, de qualquer modo, está comprovada nos autos, conforme o esclarecimento do voto do eminente Relator. Se dúvida pudesse haver na vigência da Constituição anterior, o final do inciso II do art. 8° deixa claro que a definição da área, «base territorial, que será definida pelos trabalhadores ou empregadores interessados», é matéria remetida à decisão autônoma da categoria profissional ou economia respectiva. O que não pode haver é a superposição completa. Se a área é menor, o que há é um desmembramento, que não ofende a miai- 102 R.T.J. —150 dade, porque subtrai do sindicato antigo a categoria sediada na nova base, menor. Decisão: Por votação unânime, o Tribunal negou provimento ao recurso em mandado de segurança Votou o Presidente. Impedido o Ministro limar Gaivão. Portanto, estou inteiramente de acordo com o eminente Relator e com o voto, afinal, proferido pelo Ministro Marco Aurélio e nego provimento ao recurso. Presidência do Sr. Ministro Octavio CalIML Presentes à Sessão os Srs. Ministros Néri da Silveira, Sydney Sanches, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Velloso, Marco Aurélio, limar Gaivão e Francisco Rezek. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Moreira Alves. Procurador-Geral da República, Dr. Aristides Junqueira Alvarenga. EXTRATO DA ATA RMS 21.080 — DF —Rel.: Min. Francisco Rezek. Recte.: Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo do Estado de São Paulo — SINDIPETRO/SP (Adv.: Miguel Parente Dias). Recdos.: União Federal e Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo de Campinas e Região (Advs.: Benedito José Barreto Fonseca e outro). Brasília, 12 de agosto de 1993 — Luiz Tomlin:atar:, Secretário. MANDADO DE SEGURANÇA IM° 21.402 — AL (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence Impetrante: Sinval Gomes dos Santos —Impetrado: Presidente daRepública Demissão. Processo administrativo: indeferimento de prova testemunhal oportunamente requerida: exigência de motivação (14 n° 8.112/90, art. 156, § 1°): nulidade da demissão e do processo, a partir do indeferimento imotivado da prova. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em deferir o mandado de segurança. Brasília, 5 de março de 1993 — Octavio Gallotti, Presidente — Sepúlveda Perten- ce, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: O parecer da Procuradoria-Geral da República, da lavra da ilustre Subprocuradora-Ge- ral Odilia Ferreira da Luz Oliveira resume com precisão o caso e opina dos termos seguintes (fls. 83/85): Sinval Gomes dos Santos insurgese contra ato do Presidente da República, que o demitiu do cargo de Agente de Vigilância, do Departamento de Polícia Federal, com fundamento nos arts. 117, incs. 11 e IX, e 132, inc. XIII, da Lei n° 8.112, de 11 de dezembro de 1990, por ter-se prevalecido do cargo para lograr proveito pessoal, em detrimento da dignidade da função. Alega o impetrante a nulidade do procedimento disciplinar que culminou com a demissão, por cerceamento de R.TJ — 150 defesa; uma vez que foi indeferida a audiência das duas testemunhas que armiara oportunamente. Nas informações, elaboradas pela Consultoria-Geral da República a partir de outras fornecidas pelo Ministério da Justiça, historia-se que o procedimento disciplinar foi instaurado porque, durante o plantão de 15 para 16 de dezembro de 1990, o impetrante subtraiu duas cédulas de Cr§ 1.000,00 (mil cruzeiros), com características de falsificação, e as repassou a terceiros, a quem deu ciência da falsidade. Também se nega a existência de vícios que pudessem invalidar o procedimento, mas nada se diz especificamente sobre o indeferimento da prova testemunhal. Argumenta-se, por fim, com a previsão legal de revisão administrativa do procedimento disciplinar, caminho não buscado pelo impetrante. II A Lei n° 8.112/90, no art. 156, § 1°, autoriza o presidente da comissão de procedimento disciplinar a indeferir a produção de prova impertinente, meramente protelatória ou de nenhum interesse para o esclarecimento dos fatos. 103 negar a audiência de testemunhas por ele arroladas. A produção de prova é um direito do indiciado em procedimento disciplinar (art. 156, caput, da Lei n° 8.112190), sendo desnecessário fundamentar o pedido. Mas o indeferimento da prova não prescinde da indicação, mesmo sucinta, do motivo. Parece-me, assim, que houve ofensa ao direito do impetrante à ampla defesa, com a conseqüente nulidade do procedimento disciplinar. Diante do exposto, opino pela concessão da segurança, anulando-se o procedimento disciplinar a partir do indeferimento itnotivado da produção de prova testemunhal requerida pelo impetrante, para que o presidente da comissão profira nova decisão, ainda que de mesmo teor, mas devidamente motivada. É o relatório. VOTO Se a lei arrola os motivos do indeferimento, é inegável que eles devem ser declarados pelo agente público, exatamente para possibilitar o controle da legalidade do ato, seja pela própria Administração Pública, seja pelo Poder Judiciária Ou seja: se somente tais motivos legitimam o indeferimento de produção de prova, é imprescindível que o autor do ato exponha, ainda que sucintamente, qual deles o levou a tomar tal decisão. 0 Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Tenho por irreurcável o parecer, que acolho para, nos ternos nele propostos, deferir a segurança No processo administrativo para a demissão de funcionário —no qual, especificamente, a Constituição assegurou ampla defesa —, o princípio é o direito do acusado à produção das provas que entender convenientes: o indeferimento é o excepcional, que há de ser motivado, tanto mais quanto a lei enumerou, taxativamente, as razões que podem legitimar o indeferimento, à vista das circunstâncias do caso concreto. Defiro a ordem: é o meu voto. EXTRATO DA ATA No caso, não há notícia de fundamentação do ato; pelo contrário, como se lê à fl. 29, não se deu ciência ao interessado dos motivos que levaram a comissão a MS 21.402 — AL — Rel.: Min. Sepúlveda Pertence. Impte.: Sinval Gomes dos Santos (Adv.: José Alexandrino de Melo). Impdo.: Presidente da República. R.TJ. —150 104 Decisão: Por votação unânime, o Tribunal deferiu o mandado de segurança, nos termos do voto do Relator. Presidência do Sr. kfmistm Octavio Gallotti, Presidente em exercício. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence, Marco Aurélio, Binar Gaivão e Francisco Rezek. Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Sydney Sanches, Presidente, Celso de Mello e Carlos Venoso. Vice-Procurador-Geral da República, Dr. Moacir Antonio Machado da Silva Brasília, 5 de março de 1993 — Luiz Tomimatsu, Secretário. RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA N° 21.514 — DF (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio Recorrentes: Confederação Nacional da Agricultura e outros — Recorrida: União Federal Mandado de segurança coletiva Legitimação. Substittdçie processuaL O inciso LXX do artigo 5° da Constituição Federal encerra o instituto da substituição processual, distanciando-se da hipótese do inciso XXI, no que surge no âmbito da representação. As entidades e pessoas jurídicas nele mencionadas atuam, em nome próprio, na defesa de interesses que se irradiam, encontrando-se no patrimônio de pessoas diversas. Descabe a exigência de demonstração do credenciamenio. Mandado de segurança coletiva Entidade de classe. Especificidade. Na disciplina constitucional do mandado de segurança coletivo, inconfundível com a relativa à ação direta de inconstitudonalidade, não se tem, quanto à legitimação ativa, a exigência de tratar-se de entidade de classe que congregue categoria única. Constatada a abrangênda, a ponto de alcançar os titulares do direito substancial em questão, mister é concluir pela configuração de hipótese ensejadora da substituição processual que distingue a espécie de mandado de segurança que é o coletivo. Mandado de segurança Complexidade dos fatos. Questões fálicas de alta indagação. Há de se distinguir a complexidade dos fatos e do tema de direito daquelas situações que não prescindem da abertura de fase de instrução. Se o caso está compreendido no campo da referida dificuldade, nem por isso o mandado de segurança exsurge como via imprópria, impondo-se o julgamento do mérito. Somente em defrontando-se o órgão julgador com quadro a exigir elucidação de fatos cabe dizer da impertinência da medida, sinalizando no sentido do ingresso em juízo mediante ação ordinária. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na con- formidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos, em conhecer do recurso e lhe dar provimento para, afastada a ilegitimidade «ad causam» das impetrantes, bem assim a iliquidez de R.TJ — 150 fatos, determinar que o Superior Tribunal de Justiça prossiga no julgamento do mandado de segurança, como entender de direito. Vencido, em parte, o Sr. Ministro Carlos Venoso que, não obstante reconhecendo a legitimidade «ad cascam» das impetrantes, negava provimento ao recurso por entender ilíquidos os fatos. Brasília, 27 de abril de 1993 — Neri da Silveira, Presidente — Marco Aurélio, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Marco Aurélio: O egrégio Superior Tribunal de Justiça concluiu pela ilegitimidade das Impetrantes, ora Recorrentes e, assim, assentou a carência da demanda proposta. Segundo o voto condutor do julgamento, da lavra do Ministro Garcia Vieira, não teria havido a prova de que membros filiados ou associados das Impetrantes sejam produtores de trigo não subsidiados e que estejam sendo prejudicados pela importação deste produto dos Estados Unidos da América. Não teriam os Impetrantes juntado aos autos qualquer autorização dos produtores para ajuizar este mandado de segurança coletivo, decorrendo, daí, a ilegitimidade. Aludiu a Corte ao disposto do inciso XXI do artigo 5° da Constituição Federal, apontando que a hipótese é conducente à extinção do processo por ausência de legitimidade das Impetrantes. O Relator, diante da eventual suplantação da referida preliminar, adentrou o exame do mérito e, em relação a este, consignou a inexistência de prova nos autos dos fatos alegados pelas Impetrantes, rotulando-os como complexos. Aludindo à necessidade de, no mandado de segurança, a prova ser pré-constituída, rechaçou a existência de direito líquido e certo que pudesse ser protegido na via eleita. Segundo a certidão de fl. 351, o deslinde da matéria ocorreu pelo voto de desempate, restringindo-se a decisão à análise única e exclusiva da legitimação (fls. 347/350). 105 No recurso ordinário de folhas 357 a 362, as Recorrentes procuram demonstrar que estão autorizadas pelo teor do inciso LXX do artigo 5° da Constituição Federal a atuarem como substitutas processuais. Discorrem sobre a impropriedade, ao caso, do preceito contido no inciso XXI do rol das garantias constitucionais, porque ligado a figura distinta — a da representação. A seguir, asseveram que, conforme deixou assinalado o Ministro Façanha Martins, a questão versada nos autos, frente à notoriedade, nem precisaria de urna demonstração mais clara e que, de qualquer forma, os elementos coligidos são suficientes à demonstração da procedência do direito. A União Federal ofereceu as contra-razões de folhas 364 a 367, salientando que as Impetrantes não observaram a exigência constitucional relativa à autorização expressa dos associados para defenderem os direitos destes últimos e que, em, outro plano, não lograram comprovar que os congregados atuam na agropecuária, mais precisamente na produção de trigo e que estariam sofrendo concorrência desleal, predatória, pela importação do produto devidamente subsidiado. Remetidos os autos ao Ministério Público Federal, exarou a ilustre Subprocuradora-Geral da República Dta Anadyr de Mendonça Rodrigues longo parecer, de folhas 372 a 397, assim resumido: «1. Mandado de Segurança Coletivo (art. 5°, LXX, b, da CF): a exigência constitucional de que só venha a proteger 'direito liquido e certo' (art. 5°, LXIX) impede que a '...realidade vigente e que salta aos olhos de qualquer cidadão...' constitua elemento substitutivo da efetiva comprovação, nos autos judiciais respectivos, do direito que dá fundamento à impetração de Mandado de Segurança (RT 594/248). 2. Interpretação sistemática: a mais fiel e a única que permite harmonizar diferentes garantias constitucionais, re- 106 —150 velando-lhes o espírito e a essência, sem amputá-las em seu sentido. 55% para o imposto de importação, a título de tributação compensatória'. Atuação 'em defesa dos interesses de seus membros ou associados', na impetração de Mandado de Segurança Coletivo (parte final do art. 50, LXX, b, da CF): não diz respeito — como, obviamente, ocorre com a cláusula 'e em funcionamento há pelo menos um ano' — apenas à associação legalmente constituída, última das entidades referidas naquela disposição constitucional: patine a todas as entidades de que trata a mesma alínea b do inciso LXX. 6. Entidade de classe (art. 103, IX, da CF); aplicabilidade, quanto ao art. 5°, LXX, b, da CF, do decidido pelo STF no julgamento da ADIn 108-6DF-Q.0: 'O Supremo Tribunal Federal tem salientado, em sucessivos pronunciamentos a propósito do tema, que não se qualificam como entidades de classe aquelas que, congregando pessoas jurídicas, apresentam-se como verdadeiras associações de associações. Em tais hipóteses, tem-se-lhes negado a qualidade reclamada pelo texto constitucional, pois pessoas jurídicas, ainda que coletivamente representativas de categorias profissionais ou econômicas, não formam classe alguma. Precedentes. A jurisprudência desta Corte tem salientado, ainda, que pessoas jurídicas de direito privado, que reúnam, como membros integrantes, associações de direito civil e organismos de caráter sindical, desqualificam-se — como instituições de classe, cuja noção conceituai reclama a participação nelas, dos próprios indivíduos integrantes de determinada categoria, e não apenas das entidades privadas constituídas para representá-los. Precedentes.» Defesa dos interesses dos membros ou associados da organização sindical, da entidade de classe e da associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano (art. 5°, LXX, b, da CF): não se confunde com a representação judicial ou extrajudicial dos filiados de tais entidades (art. 5°, XXI, da CF), que são dotadas de natureza intrinsecamente associativa, razão por que, se a entidade associativa não tiver expressamente autorizada, por seus filiados, a impetração do Mandado de Segurança coletivo, não os estará representando judicialmente, ainda que esteja agindo 'em defesa dos Interesses de seus membros ou associado?. 5. Petitum que visa obter decisão de natureza essencialmente concreta, com efeitos mandamentais que atendem aos interesses individualizados de cada triticultor que estaria prejudicado com a importação do produto agrícola: desqualifica a impetração do Mandado de Segurança Coletivo por entidade que congrega outras entidades associativas, eis que é o triticultor — e, não, qualquer dos membros, associados ou filiados da entidade impetrante — o beneficiário direto da pretendida salíquota de Com base em tais premissas e nessas conclusões, pronunciou-se o Órgão pelo conhecimento do recurso ordinário e negativa de acolhimento ao pedido nele formulado. Recebi estes autos para exame em 24 de junho de 1992, liberando-os com relatório e voto para julgamento no dia 20 de julho de 1992, isto após determinar a retificação da autuação para constar como Recorrida a União Federal, em substituição aos Ministros da Economia, Fazenda e Planejamento e da Agricultura É o relatório. R.TJ — 150 VOTO O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Na interposição deste recurso ordinário foram atendidos os pressupostos de recorribilidade que lhe são próprios. Muito embora a impugnação na via ordinária esteja limitada, pela alínea a, inciso II do artigo 102 da Constituição Federal, às hipóteses de denegação da segurança, a pressupor sempre o julgamento de mérito, o Pleno desta Corte concluiu que «a locução constitucional — «quando denegatória a decisão» — tem sentido amplo, pois não só compreende as decisões dos tribunais que, apreciando o mérito, indeferem o pedido de mandado de segurança, como também abrange aquelas que, sem julgamento do mérito, operam a extinção do processo» — Mandado de Segurança n° 21.112-1-PR (AgRg) — Relator Ministro Celso de Mello, acórdão publicado no Diário da Justiça de 29 de junho de 1990, página 6220. Tal enfoque atende à mens legis do preceito constitucional, que é, justamente, potencializar a eficácia do mandado de segurança. Quanto à tempestividade, observaram as Impetrantes os quinze dias que lhe são próprios. Publicada a decisão do Superior Tribunal de Justiça no Diário da Justiça de 9 de março de 1992 (fl. 356), deu-se a protocolação do ordinário no dia 23 seguinte. Já a regularidade da representação processual exsurge dos documentos de fls. 38 e 64. Quanto ao preparo, o recurso foi interposto em data em que a tabela de custas indicava como valor devido doze centavos. O caráter irrisório da quantia e a circunstância de não se ter sequer moeda em circulação para o devido recolhimento são conducentes à inexigibilidade do preparo, valendo notar, ainda, que, no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, grassa o entendimento de que a Lei n° 8.038/90 afastou a exigibilidade do preparo. Por isso, não houve a intimação das Recorrentes para fazê-lo. Conheço do recurso interposto. 107 No mérito. Delimito a matéria passível de ser examinada por força da interposição do recurso ordinário em fase de julgamento. Fm primeiro lugar, tenho como impertinente a norma inserta no parágrafo 1° do artigo 515 do Código de Processo Civil. Se de um lado não potencializo o fato de no preceito aludirse a recurso de apelação, entendo-o aplicável ao ordinário estrito senso, de outro considero que a devolução plena, inclusive quanto a questões não apreciadas por inteiro quando da prolação do provimento impugnado, está vinculada ao mérito. Se o julgamento ficou restrito a preliminar da demanda, descabe, uma vez suplantado o óbice que motivou a decisão impugnada, adentrar o mérito da con. trovérsia, porquanto este não chegou a ser apreciado em relação a qualquer das partes em que possa estar dividido. Em segundo lugar, ressalto que, embora alguns integrantes do órgão de origem hajam tratado, além da matéria ligada à legitimidade, da complexidade probatória dos fatos, esta não chegou a ser objeto de decisão pelo Colegiado. Após o voto do Relator, Ministro Vieira Garcia, julgando as Impetrantes carecedoras da impetração em face não só da ilegitimidade ad causam, como também da complexidade probatória dos elomentos fálicos envolvidos, seguiram-se, na mesma assentada, três votos, a saber: os dos Ministros Peçanha Martins e Gomes de Barros, refutando a carência nos dois pontos, e o do Ministro Américo Luz, rechaçando no primeiro — ilegitimidade e declarando-a com base no segundo — a necessidade de desenvolvimento de fase probatória. Deu-se a formulação de pedido de vista pelo Ministro José de Jesus que, ao votar, apenas discorreu sobre a ilegitimidade, declarando que acompanhava, na preliminar, o Relator. A Ata de fl. 351 contém a notícia de que houve o empate na votação. Ao desempatar, o Ministro Presidente do Órgão 108 R.T.J. — 150 julgador somente o fez considerada a ilegitimidade das Recorrentes, silenciando sobreaquestãoalusivaàprova, talvezmesmo diante do fato desta última estar ligada ao mérito e, portanto, da prejudicialidade. Destarte, somente houve decisão do Órgão julgador quanto à condição da ação, que é a legitimidade da parte autora, e somente este tema foi devolvido com a interposição do recurso ordinário, muito embora as Recorrentes também refiram-se ao outro. Feita esta observação, passo ao exame da ilegitimidade declarada. A impetração não ocorreu objetivando a defesa de direito público subjetivo das Impetrantes. A inicial visou à proteção dos interesses dos membros e associados, considerados não os interesses particularizados de cada um destes, mas direitos que, embora individuais, têm ligação com a própria atividade que desenvolvem e que se mostrou como razão de ser dos agrupamentos realizados — a agricultura e os desdobramentos no mundo econômico. Em nome próprio, as Impetrantes ingressaram no Superior Tribunal de Justiça, objetivando alcançar sentença mandamental que pusesse fim a alegado desequilíbrio do mercado, em razão da importação de um certo produto da agricultura — o trigo — por preços subsidiados pelo país de origem — os Estados Unidos da América do Norte, viabilizando, assim, concorrência em situação desfavorável, ou seja, desleal e predatória. A regra do artigo 6° do Código de Processo Civil realmente está a revelar que a legitimação é norteada pela titularidade do direito substancial que se questiona. Contudo, no próprio preceito tem-se aberta a possibilidade de outrem, que não o titular do direito subjetivo, ingressar, em nome próprio, em juízo: «Ninguém poderá pleitear, em nome próprio, direito alheio, salvo quando autorizado por lei». Com a Constituição Federal de 1988, buscaram-se as almejadas economia e cele- ridade processuais, procurando-se evitar a multiplicação de mandados de seguranças impetrados, isoladamente, pelos titulares de direito subjetivo que se mostrasse comum a uma certa coletividade, e a diversificação de decisões. Ao lado do tradicional mandado de segurança — inciso LXIX — previu-se o coletivo, definindo-se, no texto constitucional, os legitimados a impetrá-lo — inciso LXX, também do rol das garantias constitucionais. A conjugação deste dispositivo com o que se contém no inciso XXI do mesmo artigo não se mostra merecedora de agasalho. Os institutos neles contemplados são diversos. O inciso XXI encerra a representação em juízo, pressupondo a autorização dos filiados da entidade associativa. No preceito alude-se, expressamente, como necessária, a competente autorização. Havendo esta, pouco importam as características do direito em questão. Vale dizer: inexigível é que entre este e a entidade associativa haja um elo. Mesmo que se trate de controvérsia totalmente estranha aos fins sociais, cabe, uma vez configurada a representação mediante ato de vontade do filiado, a atuação da entidade e esta ocorrerá não no campo da substituição processual, mas da simples representação Isto decorre, como já anunciado, do próprio teor do preceito: «XXI — as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente». Instituto diverso, a justificar o tratamento constitucional em preceito próprio, é o da substituição processual. Em elogiável avanço, os Constituintes de 1988 fizeram inserir no artigo 5° nova garantia constitucional — a do mandado de segurança coletivo— e, então, quanto a este, tiveram presentes as características de certos direitos, no que extravasam o âmbito simplesmente individual para irradiarem-se a ponto de serem encontrados no patrimônio de várias pessoas que, em virtude de um fim R.T.J — 150 comum, formam uma certa categoria. Tendo em vista esta peculiar situação é que se previu, na alínea b do inciso LXX do artigo 5°, a prerrogativa das organizações sindicais, das entidades de classe e das associações legalmente constituídas e em funcionamento há pelo menos um ano, não para representar, mediante autorização expressa, corno previsto no inciso XXI, os filiados, mas para impetrar o mandado de segurança coletivo. Não se tratasse de algo diverso da demanda plúrima ajuizada por força de representação, mister seria concluir pela inocuidade do preceito. Sempre tenho presente a premissa de que o Direito é ciência e, como tal, possui institutos, expressões e vocábulos com sentido próprio, havendo de se presumir que o legislador, especialmente o constituinte, haja atuado com técnica, atentando para o fato de que o esmero no emprego da linguagem é essencial à revelação do sentido correto da disposição normativa. Destarte, impossível é confundir hipótese reveladora de representação, a exigir autorização do titular do direito e de abrangência ilimitada, considerada a matéria a ser tratada na demanda — como é a disciplinada no inciso XXI em comento — com a relativa à substituição processual, quando o substituto, frente à aproximação dos respectivos interesses com os do substituído, adentra o Judiciário em nome próprio na defesa de interesses deste último.. Não obstante, apontou-se, também, que as Impetrantes não congregam apenas triticultores e, por isso, deixam de estar legitimadas para a impetração. Srs. Ministros, não vejo corno ter agasalhada no preceito constitucional a especificidade que se lhe quer emprestar. Ao cogitar dos legitimados para a impetração do mandado de segurança coletivo, o inciso LXX do artigo 5° o faz, após a alusão aos partidos políticos, em relação a «organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos 109 um ano, em defesa dos interesses de seus membros». Na norma não se tem a limitação às pessoas jurídicas criadas por categoria especifica única, valendo notar que os triticultores estão compreendidos no grande gênero que é o daqueles que se dedicam a uma mesma atividade para a qual ainda não se atentou, como é preciso fazer, ou seja, a agricultura. O que cumpre perquirir em cada caso é a existência, ou não, da quase comunhão de interesses entre a entidade impetrante e aqueles que por ela serão substituídos, os quais, para o fortalecimento das respectivas posições, por meio dela procuraram-se unir, viabilizando, assim, a defesa concentrada dos interesses comuns. E isto está configurado na hipótese vertente. Tanto a Confederação Nacional da Agricultura, quanto a Sociedade Rural Brasileira e a Organização das Cooperativas Brasileiras outra finalidade não têm, senão a defesa daqueles que se colocam no plano primeiro da produção e comercialização ligados à Agricultura. Confira-se com os documentos juntados à inicial: fls. 30 a 37, 39 a 63 e 65 a 93, respectivamente os Estatutos da Organização das Cooperativas Brasileiras, da Sociedade Rural Brasileira e da Confederação Nacional da Agricultura. A figura do litisconsórcio não é estranha ao mandado de segurança, sendo que, no caso concreto, a legitimação atribuída a entidades que podem coexistir em relação a uma mesma categoria afasta possíveis dúvidas a respeito. A unicidade contemplada na Constituição está ligada ao campo sindical e a este são estranhas as entidades de classe (género) e as simples associações. A referência constitucional às três espécies de pessoa jurídica afasta possíveis dúvidas a respeito. Por último, há o argumento lançado aos autos pelo Ministério Público Federal, segundo o qual esta Corte tem concluído pela ilegitimidade para a propositura da ação direta de inconstitucionalidade, quando se trata de requerente que aglutine não uma 110 R.T.J. — 150 classe em si, considerados os integrantes — cidadãos — individualmente, mas pessoas físicas e jurídicas diversas. A par de a jurisprudência estar assentada em regra constitucional que implicou, no que tange à Carta pretérita, o elastecimento do rol dos legitimados para a ação direta de inconstitucionalidade, sendo conseqüência, assim, também de uma certa Política Judiciária, constata-se que são distintos os preceitos que prevêem a legitimação para o mandado de segurança coletivo e o que cuida daquela concernente à ação direta de inconstitucionalidade. Enquanto relativamente a esta última contemplou-se, com a legitimação, as confederações sindicais e as entidades de classe de âmbito nacional, no dispositivo pertinente ao mandado de segurança coletivo houve a extensão, no âmbito sindical, a todas as entidades que nele estejam compreendidas — Sindicatos, Federações e Confederações —para, a seguir, aludir-se às de classe e alfim, às associações como um todo, sem cogitar-se sequer da representatividade nacional. De qualquer forma, a simples circunstância de a alínea «b» do inciso LXX do artigo 5° da Constituição Federal albergar, a um só tempo, as entidades de classe e as associações, sem particularizar estas últimas, afasta a repercussão ao caso da jurisprudência referida, isto sem levar-se em conta o relevante fato de o mandado de segurança coletivo consubstanciar garantia constitucional, não podendo, por isso mesmo, merecer, quanto ao preceito que o disciplina, interpretação que dificulte o respectivo exercício. Conheço deste recurso e, no mérito, acolho o pedido nele formulado, a fim de, reformando o acórdão de fls. 331 a 335, concluir pela legitimidade das Recorrentes para a impetração, determinando, com isto, que os autos retornem à Corte de origem, a fim de que prossigano julgamento do mandamos como entender de direito. É o meu voto. EXTRATO DA ATA RMS 21.514 —DF —Rel.: Min. Marco Aurélio. Rectes.: Confederação Nacional da Agricultura e outros (Adv.: Jose Antonio Miguel Neto). Renda: União Federal. Decisão: Após os votos dos Srs. Ministros Relator e Francisco Rezek conhecendo do recurso e lhe dando provimento, o julgamento foi adiado em virtude do pedido de vista do Sr. Ministro Carlos Velioso. Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Paulo Brossard, Carlos Venoso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. SubprocuradorGeral da República, a Dra. Odflia Ferreira da Luz Oliveira Brasília, 8 de setembro de 1992 — José Wilson Aragão, Secretário. VOTO (VISTA) «Ementa: Constitucional. Processual civil. Mandado de segurança coletivo. Substituição processual. Interesses coletivos e difusos e direitos subjetivos. Fatos controvertidos. CF, art. 5°, LXX. I — Mandado de segurança coletivo impetrado por entidades de classe com o objetivo de impedir a importação de trigo que, segundo se alega, são «altamente subsidiados no país de origem», o que vem em detrimento de interesse dos produtores brasileiros filiados às impetrantes. II—A legitimação das organizações sindicais, entidades de classe ou associações, para a segurança coletiva, é extraordinária, ocorrendo, em tal caso, substituição processual. CF, art. 5°, LXX. Não se exige, tratando-se de segurança coletiva, a autorização expressa aludida no inciso XXI do art. 5° da Constituição. III — O mandado de segurança coletivo não visa a proteger interesses que não configurem direitos subjetivos. MS n° 21.291-8 (AgRg)-DF, Relator Min. Celso de Mello, Plenário, 12-4-91. R.T.J —150 Posição contrária do Min. Carlos Venoso, no sentido de que a segurança coletiva visa a proteger interesses coletivos, interesses difusos e direitos subjetivos. Ressalva de ponto de vista pessoal. IV — Inocorre" cia, no caso, de direito líquido e certo, no sentido de que os fatos são controvertidos. V — Recurso improvido». O Sr. Ministro Carlos Vdloso: Tratase de mandado de segurança coletivo impetrado pela Confederação Nacional da Agricultura, Sociedade Rural Brasileira e Organização das Cooperativas Brasileiras, na defesa de interesses de seus associados, contra ato dos Ministros da Economia, Fazenda e Planejamento, da Agricultura e Reforma Agrária e do Coordenador da Coordenação Técnica de Tarifas Aduaneiras do Departamento de Comércio Exterior — DECEX, que autorizaram a importação de trigo proveniente dos Estados Unidos da América do Noite, sem a correspondente taxação necessária à compatibilização com o preço do trigo nacional, em virtude da defasagem de custos decorrentes dos subsídios diretos e indiretos concedidos pelos Estados Unidos aos seus produtores. Argumentam que o ato impugnado foi praticado com ofensa ao art. 174 da Constituição, à Lei n° 8.174/91, ao Decreto n° 174/91 e com violação aos Acordos relativos aos Códigos de Subsídios e Medidas Compensatórias e Antidumping do GATT, aprovados pelo Congresso Nacional, pelos Decretos-Legislativos na 20 e 22, de 1986. Os impetrados confirmaram a autorização dada a particulares para importação de até 700.000 toneladas de trigo. Questionam, entretanto, a liquidez e certeza do direito dos impetrantes, já que a solução da questão depende do exame da política de incentivos do governo americano, para identificar e quantificar os subsídios, verificar os custos da produção nacional e eventuais riscos derivados de eventual con- 111 corrência desleal por parte dos produtores estrangeiros. O Superior Tribunal de Justiça decidiu pela carência da ação, sobre dois fundamentos, conforme está na ementa do acórdão, à fl. 355: «Processual civil — Mandado de segurança coletivo — Legitimidade ativa — Matéria de prova — Impor- tação de trigo — Tributação compensatória. Para a comprovação do nexo entre o direito ou interesse dos referidos produtora de trigo e o direito ou interesse dos impetrantes é indispensável que os próprios interessados, os filiados, membros ou associados, sejam ouvidos ou tenham, previamente, autorizado as organizaç& sindicais, entidades de classe ou associações, às quais sejam filiados, a agirem em seu nome para determinado fim, poupe as entidades associativas, só `quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente' (CF, art. 5°, XXI). Se os fatos são complexos enfio estão suficientemente comprovados, inexiste direito liquido e certo a ser protegido pela via eleita. Carência da ação». LI Julgando o recurso ordinário, o eminente Ministro Marco Aurélio, Relator, depois de afirmar que somente houve decisão do Tribunal a quo quanto à condição da ação, ou quanto à «legitimidade da parte autora, e somente este terna foi devolvido com a interposição do recurso ordinário, muito embora as Recorrentes também refiram-se ao outro», afirmou que a impetração não visou à defesa de direito subjetivo, mas à proteção dos interesses dos membros e associados, «direitos que, embora individuais, têm ligação com a própria atividade que desenvolvem e que se mostrou como 112 R.TJ. — 150 razão de ser dos agrupamentos realizados — a agricultura e os desdobramentos no mundo econômico». Afirma, a seguir, que, no caso, ocorre substituição processual — CF, art. 5°, LXX, b — e não representação, como previsto no inciso XXI do art. 5° da Constituição, motivo por que não é exigida a autorização dos associados para a impetração do writ. Concluiu S. Ex.' por dar provimento ao recurso, pelo que decidiu «pela legitimidade das Recorrentes para a impetração, determinando, com isto, que os autos retomem à Corte de origem, a fim de que prossiga no julgamento do mandamus como entender de direito». Pedi vista dos autos e os trago, a fim de retomarmos o julgamento do recurso. Passo a votar. No que toca ao primeiro fundamento do acórdão recorrido — a exigência de autorização dos filiados, membros ou associados para a impetração coletiva — concordo com o eminente Relator, que dispensa tal autorização. Já sustentei, com base no art. 5°, XXI, da Constituição, que as organizações sindicais, as entidades de classe ou associações deveriam estar previamente autorizadas a representar os seus membros ou associados para o aforamento da segurança coletiva. Assim procedi logo que veio a lume a Constituição de 1988. Continuei, entretanto, a meditar sobre a legitimação coletiva, ordinária e extraordinária, que a Constituição de 1988 confere, amplamente, a entidades sindicais, entidades de classe e associações (C.F., art. 5°, XXI; art. 5°, LXX; art. 8°, III; art. 114, § 2°; art. 129, III, a recepcionar a Lei n° 7.347/85 (ação civil pública); art. 103, IX). Na verdade, cumpre distinguir a hipótese do art. 5°, XXI —caso de representação, em que se exige a autorização expressa dos filiados, certo que «entidades associativas» não compreendem organizações sindicais, mas associações — do mandado de segu- rança coletivo do inciso LXX do art. 5° da Constituição. Neste, tem-se substituição processual, o que parece ocorrer, também, na hipótese do artigo 8°, m, da Lei Mator. Ada Pellegrini Grama, forte em «moderna tendência doutrinária que vê, na legitimação de entidades que ajam na defesa de interesses institucionais, uma verdadeira legitimação ordinária», consoante se pode ver de estudos e trabalhos de Vincenzo Vigoriti, José Carlos Barbosa Moreira, Kazuo Watanabe e da própria Ada Pellegrini Grinover, leciona: «De modo que, caso a caso, dever-se-á verificar se a entidade age na defesa de seus interesses institucionais — proteção ao ambiente, aos consumidores, aos contribuintes, por exemplo — e neste caso a legitimação seria ordinária; ou se atua no interesse de alguns de seus filiados, membros ou associados, que não seja comum a todos, nem esteja compreendido em seus objetivos institucionais: neste caso, sim, haveria uma verdadeira substituição processual». («Mandado de segurança coletivo: legitimação, objeto e coisajulgada», em «Recurso no Superior Tribunal de Justiça», Coordenação do Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Saraiva, 1991, pág. 286). Ada Grinover, todavia, não obstante distinguir casos de substituição ordinária e substituição extraordinária no mandado de segurança coletivo, é peremptória no afirmar que não tem cabimento, tratando-se de mandado de segurança coletivo, exigir a autorização expressa a que alude o inciso XXI do art. 5° da Constituição (ob. e loc. cits). Apenas, pois, sob o ângulo da legitimação, os autos deveriam baixar ao Tribunal a quo, para que o julgamento tivesse continuidade. Dois outros fundamentos, entretanto, impedem o provimento do recurso. IV É que o acórdão embasa-se, também, em outro fundamento: os fatos são complexos e não estão suficientemente comprovados, R.TJ — 150 pelo que inexiste direito liquido e certo a ser protegido pela via eleita. No ponto, aliás, peço vênia ao Sr. Ministro Relator para divergir do seu douto entendimento no sentido de que o acórdão apóia-se apenas num fundamento, o da legitimidade ad causam. Não. O acórdão assenta-se sobre dois fundamentos: o da legitimidade da parte e o da complexidade dos fatos, que estariam a demandar o fazimento de prova Com efeito. O Ministro Garcia Vieira, Relator, referiu-se, expressamente, aos dois fundamentos, o que, aliás, consta da ementa do acórdão. Os Srs. Ministros Peçanha e Gomes de Barros divergiram nos dois fundamentos. O Sr. Ministro Américo Luz, no tocante à legitimidade, acompanhou os votos dos Srs. Ministros Peçanha e Barros; todavia, no tocante à complexidade dos fatos, S. Ex.` acompanhor5 expressamente, o Sr. Ministro Relator. E verdade que, nos votos escritos que estão às fls. 345 e 347/350, os Srs. Ministros José de Jesus e Pedro Acioli não se referem ao segundo fundamento. Todavia, na ata do julgamento, à fl. 351, está escrito que ambos votaram com o Sr. Ministro Relator, o mesmo ocorrendo com os Srs. Ministros Hélio Mosimann e Demócrito Reinaldo. Votaram como Relator, pois, cinco Ministros, sendo que um deles, o Ministro A. Luz, apenas quanto ao segundo fundamento. Registre-se, aliás, que o recurso ataca ambos os fundamentos (fls. 358/361, o primeiro; fl. 362, o segundo). Ambas as matérias, portanto, devem ser examinadas pelo Tribunal ad quem. É o que faremos. No particular, disse o Sr. Ministro Garcia Vieira, Relator: «Ainda que assim não fosse, estamos diante de fatos complexos, não devidamente comprovados nestes autos e as 113 impetrantes fazem inúmeras afirmações, sem contudo comprová-las. É evidente que nada comprova simples recortes de jornais e papéis impressos, sem qualquer assinatura ou prova de sua procedência. São Suficientes as provas existentes nestes autos, do subsídio dado pelo Governo Americano aos produtores de trigo na época da importação e que esta, com subsídio caracterize concorrência desleal ou predatória. As próprias impetrantes, no item 31 de sua longa inicial se encarregamde confessar a falta de provas, sobre os subsídios que estariam sendo dado pelos Estados Unidos da América, ao dizer que protocolaram no Ministério da Economia, Fazenda e Planejamento, umpedido de 'investigação de subsídios, que até a presente data não foi respondido' (fl. 12). Nem sequer se provou existir em nosso mercado interno, trigo suficiente para atender à demanda e o prejuízo dos produtores brasileiros. Se não existe sequer prova dos preços de internação no mercado brasileiro, como se pode chegar à conclusão de haver concorrência desleal ou predatória? O importador pode estar, perfeitamente, importando trigo subsidiado e vendendo-o no mercado interno do Brasil, pelo mesmo valor de mercado aqui hnperante e, nesta hipótese, não estaria havendo concorrência desleal ou prejuízos para o produtor brasileiro. Na verdade nem sequer se provou os atuais valores de custo e de mercado do trigo brasileiro e americano, ao ser internado no território brasileiro. Se os fatos são complexos e não estão suficientemente comprovados e no mandado de segurança a prova é pré-constituída, não estamos diante de direito liquido e certo que possa ser protegido pela via eleita. Com razão a douta Subprocuradmia-Geral da República ao acentuar em seu Parecer (fls. 307/310) que: 114 R.T.J. — 150 «Por fim, parecem efetivamente ter razão as Autoridades Impetradas ao invocar a necessidade de produção de prova fálica como impedimento ao desate da questão através' do Mandado de Segurança, eis que, indisputavelmente, o eventual direito líquido e certo das Impetrantes depende da comprovação da existência de subsídio no país produtor, do valor desse subsídio e de sua influência ruinosa na economia dos produtores nacionais». (fls. 334/335). Os fatos não são, no caso, incontroversos. Como bem registrou o Ministro Garcia Vieira, Relator do acórdão recorrido, isto foi confessado pelas impetrantes no item 31 da inicial O recurso, nesta parte, é de ser improvido. Há mais. V No caso, o mandado de segurança tem por objeto a defesa de interesse e não de direito subjetivo. Sustentei e sustento atese no sentido de que o mandado de segurança coletivo visa a proteger direitos subjetivos e interesses legítimos. No voto que proferi, no Plenário desta Casa, quando do julgamento do MS 21.291-8(AgRg)-DF (Questão de Ordem), relatado pelo eminente Ministro Celso de Mello, deixei expresso o meu entendimento a respeito do tema: que o mandado de segurança coletivo protege tanto os interesses coletivos e difusos, quanto os direitos subjetivos. Fiquei vencido, entretanto. O Plenário, na linha do voto do eminente Ministro Celso de Mello, Relator, decidiu que «o mandado de segurança coletivo—que constitui, ao lado do writ individual, mera espécie da ação mandamental instituída pela Constituição de 1934 — destina-se, em sua precípua função jurídico-processual, a viabilizar a tutela jurisdicional de direito líquido e certo não amparável pelos remédios constitucionais do habeas corpus e do babas data. Simples interesses, que não configurem direitos, não legitimam a válida utilização do mandado de segurança coletivo». (MS n° 21.291-8(AgItg)-DF (Questão de Ordem). No Plenário, sempre que a questão for colocada — a proteção de interesses coletivos e difusos pelo mandado de segurança coletivo—sustentarei o meu ponto de vista pessoal no sentido de que interesses coletivos e difusos e direitos subjetivos podem ser objeto da segurança coletiva. Na Turma, entretanto, órgão fracionário, não posso colocar-me contrário ao decidido pelo Plenário. VI Do exposto, não obstante acompanhar o Sr. Ministro Relator quanto ao primeiro fundamento, porque, adotando a tese da substituição processual, também não exijo a prévia autorização a que alude o inc. XXI do art. 5° da Constituição, quanto aos dois outros fundamentos, nego provimento ao recurso. EXTRATO DA ATA RMS 21.514 —DF —Rel.: Min. Marco Aurélio. Remes.: Confederação Nacional da Agricultura e outros. (Adv.: Jose Antonio Miguel Neto). Recda.: União Federal. Decisão: Após os votos dos Sn. Ministros Relator e Francisco Rezek conhecendo do recurso e lhe dando provimento, e do voto do Sr. Ministro Carlos Velloso negando-lhe provimento, o julgamento foi adiado em virtude do pedido de vista do Sr. Ministro Paulo Brossard. Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Paulo Brossard, Carlos Velloso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. SubprocuradoraGeral da República, a Dra. Odília Ferreira da Luz Oliveira. Brasília, 30 de março de 1993 — José Wilson Aragão, Secretário. R.T.J — 150 VOTO (VISTA) O Sr. Ministro Paulo Brossard: Sr. Presidente, estamos julgando recurso ordinário em mandado de segurança coletivo, interposto contra decisão do Superior Tribunal de Justiça. O Ministro Relator Marco Aurélio, acompanhado pelo Ministro Francisco Rezek, entendendo que a matéria recorrida diz respeito, apenas, à legitimidade dos impetrantes, conhece do recurso e lhe dá provimento para declarar a legitimidade dos recorrentes para a impetração e determinar que o Tribunal recorrido prossiga no julgamento como entender de direito. O Ministro Carlos Venoso também reconhece a legitimidade dos impetrantes, mas por outras duas razões nega provimento do recurso. S. Ex.' entende que o acórdão recorrido tem outro fundamento além do da ilegitimidade de parte, que é o da complexidade dos fatos que demandam a produção de provas, pelo que inexiste direito líquido e certo a ser amparado por mandado de segurança. E assim entendendo, nega provimento ao recurso porque há controvérsia quanto aos fatos, e também porque cuida-se de simples interesse, e não de direito, ressalvando seu voto vencido no julgamento do MS n°21.291-8 (AgRg) —DF (Questão de Ordem), relatado no Plenário pelo Ministro Celso de Mello, ainda não publicado. Quanto ao primeiro fundamento, acompanho todos os que me precederam para reconhecer, no caso, a legitimidade ad causam dos impetrantes, eis que, o art. 5°, LXX, b, da Constituição, prevê hipótese de substituição processual, viabilizando que outrem postule em nome próprio direito alheio, segundo a dicção art. 6° do Código de Processo Civil. Para ingressar na controvérsia aqui surgida, do acórdão recorrido ter um ou dois fundamentos, verifico que nem todos os votos foram declarados, e os que foram, não fornecem elementos seguros para uma 115 conclusão. Por esta razão, socorro-me da ata do julgamento, que é o documento oficial que registra a prestação jurisdicional que desata a lide. Diz ela, fl. 351: «Prosseguindo no julgamento, a Seção, por maioria julgou extinto o processo, vencidos os Srs. Ministros Américo Luz, Peçanha Martins e Gomes de Barros. Os Srs. Ministros Hélio Mosimann, Demócrito Reinaldo, e José de Jesus e Pedro Acioli (voto desempate), votaram com o Sr. Ministro Relator.» Com ou sem a necessidade de desempate, o fato é que prevaleceu o voto do Ministro Relator Garcia Vieira, de forma que somente este voto pode elucidar a questão. Dele anoto o seguinte excerto, fl. 334: «O caso é de extinção do processo por ausência de legitimidade das impetrantes (CPC, art. 2057, VI). Ainda que assim não fosse, estamos diante de fatos complexos, não devidamente comprovados nestes autos e as impetrantes fazem inúmeras afirmações, sem contudo comprová-las. Se os fatos são complexos e não estão suficientemente comprovados e no mandado de segurança a prova é pré-constituída, não estamos diante de direito líquido e certo que possa ser protegido pela via eleita... Por isso, Julgo as impetrantes carecedoras da ação.» Da leitura do voto vencedor, não há como deixar de reconhecer o duplo fundamento do acórdão recorrido, onde está expresso que foi declarada a ilegitimidade de parte das impetrantes e a existência de fatos complexos não comprovados de plano. A ementa, transcrita no voto do Min. Carlos Venoso, também é clara ao fazer referência 116 R.T.J. — 150 aos dois fundamentos da denegação da segurança O recurso ordinário interposto pelas impetrantes atacou os dois fundamentos, ao assinalar, quanto ao segundo, que: «A argumentação sustentada pelo Superior Tribunal, e no sentido de que a matéria é complexa e exigiria dilação probatória, s.m.j., não pode prosperar», fl. 362. Por estas razões passo ao exame do segundo fundamento. 4. Os fatos não me parecem tão complexos, mas mesmo que fossem, não podem impedir que aparte use o direito de recorrer ao mandado de segurança, constitucionalmente previsto. Assim já decidiu esta Turma no julgamento do RE 100.411-8-RJ, Rei Min. Francisco Rezek, DJ de 4-9-84, em acórdão assim ementado: «Mandado de segurança. Complexidade dos fatos. Litisconsórcio necessário. A complexidade dos fabris não exclui o caminho do mandado de segurança, desde que todos se encontrem comprovados de plano.» Posto que é cabível impetrar segurança, mesmo quando os fatos são complexos, remanesce o exame da sua comprovação prévia. Diz o relatório do acórdão recorrido que a segurança foi impetrada porque autorizada a importação de trigo em grãos dos Estados Unidos, altamente subsidiado, sem aplicação da tributação compensatória para eliminar os efeitos do subsídio, violando o art. 174 da Constituição Federal, a Lei n° 8.174/91, o Decreto n° 174/91 e os Acordos relativos aos Códigos de Subsídios e Medidas Antidumping do Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio — GATT, aprovados pelo Congresso Nacional pelos Decretos-Legislativos na 20 e 22/86. A prova exigida, no caso, diz respeito à existência de subsídio concedido ao trigo norte-americano e à iminência da importação. Sobre serem fatos públicos e notórios e em todas as regiões tritícolas do Brasil e do mundo, e talvez nem tanto em regiões com vocações paníferas outras, onde apenas se consome o pão, acresce que pelas informações prestadas ficou confirmado estar sendo ultimada a autorização para particulares importarem 700.000 toneladas de trigo dos Estados Unidos e, em nenhum momento, foi negada a existência de subsídio ao trigo norte-americano, ficando em aberto, no caso, a sua quantificação, para se cotejar os preços pelos quais o trigo nacional e o importado chegariam ao moinho. Sobre o que deve e o que não deve ser matéria de prova, vale recordar o art. 334 do Código de Processo Civil: «Art. 334. Não dependem de provas os fatos: I —notórios; II —afumados por uma parte e confessados pela parte contrária; — admitidos, no processo, como incontroversos; IV —em cujo favor milita presunção legal de existência ou de veracidade.» Esta questão foi bem sentida no Superior Tribunal de Justiça, como se vê nos votos dos Ministros Peçonha Martins e Gomes de Barros, que passo a ler. Disse o primeiro, em trecho do debate como Relator: «O Exmg Sr. Ministro Peçonha Martins: Sr. Presidente, ficarei aguardando uma resposta à segunda indagação, porque, quanto à segunda parte do voto de V. Ex.', entendo que se trata de fato notório. O subsídio prestado pelo governo americano a seus agricultores é fato denunciado e conhecido neste país, pelo menos durante toda a minha vida. Entendo que a sua prova não precisaria delimitar exatamente de quanto seria - 150 para merecer a impetração do mandado de segurança, que julgo preventivo. Minha indagação se prende quanto à legitimidade. Se foi autorizado a membros da associação de agricultores contratar advogado, entendo legítima e representada a parte e, no caso, conheço do mandado de segurança para discuti-lo no mérito. Sr. Presidente, continuo com a palavra. Entendo que essa prova, data venta do Eminente Ministro Garcia Vieira, é notória, é declarada pelo Ministro da Agricultura de agora e pelos Ministros que se sucederam. Desde que me entendi por gente e comecei a participar da vida pública deste Pais, temos conhecimento do efeito danoso que resultou para a economia, para o desenvolvimento da agricultura nacional os famosos acordos do trigo. Aliás, ainda há pouco se viu, por exemplo, nos jornais, não só daqui, mas também nos internacionais, os agricultores franceses protestando por novos ou pela manutenção dos subsídios. Essa é a realidade, que dificulta a livre concorrência pelos produtores nacionais nos mercados internos e externos. Em termos de fato, é como disse, concordando embora com o Ministro em que não há prova de quanto seria exatamente o subsídio atual, mas ele existe, sem dúvida. O fato é notório para todos nós. Por isso, divirjo de V. a, não dando pela carência da ação. O Exma Sr. Ministro Garcia Vidra: V. Ex.' me permite? Não será provado, mas suponhamos que o trigo esteja sendo importado, subsidiado.Não existe prova nenhuma nesses autos do preço pelo qual esse trigo está sendo vendido no mercado interno. O importador pode perfeitamente estar vendendo este trigo pelo valor de mercado e neste caso aonde é que haveria a concorrência desleal, o dumping! Estamos diante de um man- 117 dado de segurança, portanto nós não podemos fazer prova, pois a prova é pré-constituída. O Exma Sr. tiro Peçonha Martins: No particular se há dumping, deverá ser apurado pelo Ministro da Agricultura e é evidente que não pode ser o Tribunal quem deva estabelecer a tributação compensatória. O que devemos é reconhecer o direito a ela, assecuratória da livre concorrência (CF, artigo 170, II). Quanto de compensação que se haverá de dar para igualizar os custos e fazer com que a concorrência interna não se faça em desfavor do esforço do nosso agricultor? Isso é tarefa do Poder Executivo e não nossa» O Ministro Gomes de Barros acrescentou: «Quanto à questão da certeza, impressionou-me o que ouvi da sustentação oral e do próprio relatório. Eles pedem o rnandado de segurança em caráter preventivo; não se dirigem às importações que já foram feitas e beneficiadas por subsídios. Pedem justamente, o que se faz e se pratica no estrangeiro, principalmente nos Estados Unidos da América, em relação a nós: que se estabeleçaumatributação ~peaisae5ria sempre que houver no trigo importado incidência deste tributo. E, essa ordem, parece-me, perfeitamente, que pode ser dada, por que é uma ordem para o futuro, que determina que sempre que houver o fato, cumpra-se o preceito da lei. Parece-me salutar o exercício do mandado de segurança coletivo, como fator de economia processual. Peço vênia para acompanhar o Eminente Ministro Peçanha Martins.» Tratando-se de fatos notórios e incontroversos, suficientes para embasar o pedido de segurança formulado, dou provimento ao recurso também quanto ao segundo fundamento do acórdão atacado. 118 Quanto ao julgamento do MS 21.2918 (AgRg —DF (Questão de Ordem), invocado pelo Min. Carlos Velloso, ao que me lembro, decidimos sobre a impossibilidade de substituição processual na defesa de direitos exclusivos do Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro, pela Associação de Magistrados do mesmo Estado, e no presente caso reconhecemos que é possível e legítima. Recordo-me de eruditas considerações do Relator e de outros Ministros, e estou certo que não julgamos o alcance da expressão «interesses» contida na alínea b do inc. LXX do art. 5° da Constituição, assim redigido: «LXX — o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por a) b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros e associados.» Ainda que o tema tenha sido abordado, estou certo que a matéria não foi objeto de julgamento pelo Plenário naquele mandado de segurança. Sr. Presidente, com estas considerações, conheço deste recurso ordinário em mandado de segurança e lhe dou provimento para, reconhecendo a legitimidade ad causam dos impetrantes e a possibilidade de mandado de segurança onde fatos notórios e incontroversos não precisam ser comprovados, determinar que o Superior Tribunal de Justiça prossiga no julgamento, como entender de direito. VOTO (EXPLICAÇÃO) O Sr. Ministro Marco Aurélio: Como Relator, Sr. Presidente, não cheguei a adentrar o exame do recurso ordinário quanto a esse segundo fundamento. Se o Ministro Paulo Brossard permitir e V. Ex.' autorizar, farei a leitura dessa parte do voto, por que S. Ex.• está subscrevendo a posição, a óptica do Ministro Carlos Velloso, assentan- —150 do que o acórdão impugnado contém dois fundamentos. Apontei que haveria apenas um, que se teria chegado à carência do mandado de segurança tendo em vista a ilegitimidade. Creio que o Ministro Francisco Rezek acompanhou-me nesse entendimento. Aí, estaríamos diante de um empate relativamente a esse tema. Agora, se suplantada essa matéria, ficando em corrente minoritária, externo, já de início, o desejo de pronunciar, em primeiro lugar, como Relator, o voto no tocante à inexistência de provas. Sr. Presidente, a rigor estamos diante de um acórdão que sugere dois enfoques. O primeiro foi revelado por mim quanto à existência apenas de um fundamento — a ilegitimidade ad causam ativa. O segundo é no sentido de que o acórdão está alicerçado em dois fundamentos: a ilegitimidade e o envolvimento de matéria probatória de alta indagação, que não pode ser dirimida na via estreita do mandado de segurança Assim, precisamos definir a conclusão da Tunna no que concerne à base do acórdão proferido. VOTO (ADITAMENTO) O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Sr. Presidente, o eminente Ministro Paulo Brossard ressalta uru aspecto que realmente procede: é que se, de imediato, afastarmos o obstáculo, assentado pela Corte de origem, o Superior Tribunal de Justiça, e adentrarmos o mérito, ou seja, fizermos o exame, em si, do que se contém na prova que foi anexada aos autos, estaremos suprimindo um crivo, e um crivo que diz respeito à competência originária para apreciação do mandado de segurança. Confesso a V. Ex.* que nas notas que tenho, quanto a essa segunda matéria, não há uma conclusão a respeito do desiderato. Creio que quando as elaborei, o fez visando a reforçar a conclusão concernente à matéria primeira, que deságua na baixa dos autos ao Superior Tribunal de Justiça. Não R.T.J —150 acredito que haja necessidade de procederse à leitura dessas notas, mas afino com o eminente Ministro Paulo Brossard, concluindo, portanto, pelo conhecimento e provimento do recurso nos dois pontos, para determinar a baixa ao Superior Tribunal de Justiça, a fim de que prossiga na apreciação do mandado de segurança como entender de direito. O egrégio Superior Tribunal de Justiça concluiu pela ilegitimidade e apontou, como obstáculo ao sucesso na via eleita, o envolvimento de matéria probatória. Caminho no sentido de afastar, como o Ministro Rezek e também o Ministro Paulo Brossard, a ilegitimidade, e também o óbice relativo ao envolvimento de matéria fática de alta indagação, e, por conseqüência, determino o retorno dos autos à Corte de origem, para que prossiga no exame do mandado de segurança corno de direito. VOTO O Sr. Ministro Néri da Silveira (Presidente): Peço vênia ao Sr. Ministro Carlos Velloso, para acompanhar os votos dos Srs. Ministros Relator, Francisco Rezek e Paulo Brossard, pelos fundamentos desenvolvidos no voto do Sr. Ministro PauloBrossard. 119 EXTRATO DA ATA RMS 21.514 —DF—Rel.: Min. Marco Aurélio. Rectes.: Confederação Nacional da Agricultura e outros (Adv.: José Antonio Miguel Neto). Recda.: União Federal. Decisão: Por maioria de votos, a Turma conheceu do recurso e lhe deu provimento para, afastaria a ilegitimidade «ad causam» das impetrantes, bem assim a iliquidez de fatos, determinar que o Superior Tribunal de Justiça prossiga no julgamento do mandado de segurança, como entender de direito. Vencido, em parte, o Sr. Ministro Carlos Velloso que, não obstante reconhecendo a legitimidade «ad causam» das impetrantes, negava provimento ao recurso por entender ilíquidos os fatos. Presidência do Sr. Armistro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Paulo Brossard, Carlos Velloso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Cláudio Lemos Fonteles. Brasília, 27 de abril de 1993 — José Wilson Aragão, Secretário. MANDADO DE SEGURANÇA N° 21.521 — CE (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro Carlos Venoso. Impetrante: Salde Brito Bastos Arruda — Impetrado: Tribunal de Contas da União. Constitucional. Administrativo. Pensão por morte: totalidade dos vencimentos ou proventos do sentar falecida Pensão concedida anteriormente à Lei n° 8.112, de 1990. CF, art. 40, 5°. Lei n° 8.112, de 1990, art 42, art. 215, art. 248. I — Pensão por morte, concedida anteriormente à Lei n° 8.112190: passam a ser mantidas pelo órgão ou entidade de origem do servidor. Lei n° 8.112/90, art. 248. Deverá ela corresponder ao valor da 120 R.TJ. —150 respectiva remuneração ou provento, observado o teto inscrito no art. 37, XI, da Constituição. CF, art. 40, 5°; Lei n° 8.112/90, artigos 215 e 42. II — Mandado de segurança deferido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por decisão unânime, deferir o mandado de segurança. Declarou impedimento o Ministro Sepúlveda Pertence. Brasília, 2 de junho de 1993 — Octavio Gallotti, Presidente — Carlos Venoso, Relator. RELATÓRIO os cinqüenta por cento de sua pensão que foram subtraídos no mês de maio p.p.». Indeferida a medida liminar requerida (fls. 23/23-v), vieram aos autos as informações prestadas pelo Presidente do Tribunal de Contas da União (fls. 27/34), em que transcreve a Decisão n°006/92 —Plenário, daquele Tribunal, em que se decidiu no Processo tf TC 016.051191-2-Administrativo, «que os pagamentos pensionais a cargo deste Tribunal devem seguir os mesmos critérios adotados no âmbito do Poder Executivo: somente se aplica o art. 215 da Lei n° 8.112/90 quando o óbito ocorrer em data O Sr. Ministro Carlos Venoso: Trata- posterior à sua vigência». Esclarecem as se demandado de segurança impetrado por informações que, no caso dos autos, como servidor em questão faleceu no dia Salete Brito Bastos Arruda contra ato do Tribunal de Contas da União, que teria 26-6-88, «força é convir que a pensão dedeterminado a redução, em 50% da pensão vida à sua genitora tem respaldo na Lei n° que vinha recebendo nos últimos doze me- 3.373, de 1958, que fixa em cinqüenta por ses, pelo falecimento de seu filho, ex-ser- cento o valor do beneficio (artigo 4°), diploma este que rege a concessão de pensão vidor do referido Tribunal. à família do funcionário até o advento da Diz a impetrante que recebeu comunica- Lei n° 8.112/90. Somente na hipótese de a ção do Tribunal de Contas da União (fi. 20) causa moras ensejar concessão de pensão de que aquela Corte havia decidido que as de acidente em serviço ou especial, conforpensões de ex-servidores do Tribunal, fale- me prevê a Lei n° 6.782/80, o que não cidos antes de 12-12-90, data da vigência aconteceu, poderia a pensão ser compleda Lei n° 8.112/90, que instituiu o Regime mentada, e resultaria a integralização». No Jurídico dos Servidores Públicos Civis da que concerne à regra do parágrafo 5° do art. União, das Autarquias e das Fundações 40 da Constituição Federal, observam as Públicas Federais, sofreriam uma redução informações que «a sua aplicação se faz de 50%, a partir do mês de maio de 1992, imperiosa quando a remuneração do exo que entende ferir direito adquirido seu, à servidor (instituidor do beneficio) em corvista do que dispõe o art. 40, § 5°, da respondência com os servidores em ativiConstituição. dade, for passível de revisão, inclusive Requer, por isso, «a concessão de limi- quando em decorrência de transformação nar, determinando que o Tribunal de Con- ou reclassificação do cargo ou função, detas da União, na pessoa de seu Excelentís- vendo ser observado, nesse último aspecto, simo Presidente, pague, como já o vinha o preceituado no parágrafo 4° do mesmo fazendo, os cem por cento a que tem direi- artigo, conforme entendimento sustentado to a partir deste mês de junho, bem como no r. Parecer n° SR-90, de 13-6-89, da R.T.J — 150 doutaConsultoria-Geral da República (DO de 14-6-89, Seção I, págs. 9403 a 9406), aprovado pelo Excelentíssimo Sr. Presidente da República». O parecer do Inspetor-Geral do TCU, anexado às informações, recebeu a seguinte ementa: «Mandado de Segurança: Pensão Civil. Benefício instituído na vigência da Lei n° 3.373, de 1958. O artigo 215 da Lei n° 8.112, de 1990, é aplicável tão-somente às pensões instituídas a partir de 12-12-90. Subsistem os critérios fixados na Lei n° 3.373/58 para os benefícios deferidos anteriormente à vigência da nova lei estatutária. Inteligência do comando constitucional, ínsito no § 5° do artigo 40 da Carta Magna e no artigo 20 do ADCT». Oficiando às fls. 37/38, a ProcuradoriaGeral da República, pelo parecer da ilustre Subprocuradora-Geral Odília Ferreira da Luz Oliveira, opina «pela concessão da segurança, mas apenas para garantir o pagamento integral do beneficio, a partir do ajuizamento do mandado de segurança. Período anterior deverá ser pleiteado na via ordinária, se não for pago espontaneamente pela Administração Pública». É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Carlos Venoso (Relatar): As pensões antigas, vale dizer, as pensões concedidas antaionnente àLei n° 8.112, de 1990, eram regidas pela Lei n° 3.373, de 1958, que dispunha que a responsabilidade pela sua concessão e pagamento era do INSS e o seu valor corresponderia a 50% (cinqüenta por cento) do salário-base do servidor falecido. A Lei n° 1.711/52, art. 242, e a Lei n° 6.782/80, estabeleciam, ainda, que quando 121 o falecimento do servidor se verificasse em conseqüência de acidente no desempenho de suas funções, de doença profissional ou de doenças especificadas em lei, a família do mesmo teria direito à pensão especial, que deveria corresponder a 100% (cem por cento) do valor do vencimento ou remuneração do servidor falecido. Neste caso, o INSS pagava os 50% (cinqüenta por cento) da pensão devida e o Ministério da Fazenda a complementava. A Constituição de 1988 e a Lei n° 8.112, de 1990, alteraram os critérios para fixação do valor da pensão, estabelecendo que todas elas, independentemente da causa da morte do servidor, deverão corresponder à totalidade do vencimento ou provento do servidor falecido. E mais: a citada Lei n° 8.112, de 1990, estabeleceu, expressamente, no seu artigo 248, que as «pensões estatutárias, concedidas até a vigência desta lei, passam a ser mantidas pelo órgão ou entidade de origem do servidor». Quando do julgamento, nesta Corte, do MI 211-DF, versei o tema Destaco do voto que então proferi: 0 5° do art. 40 estabelece, na sua primeira parte, que a «pensão por morte corresponderá à totalidade dos vencimentos ou proventos do servidor falecido». Depois, acrescenta, na sua segunda parte: 'até o limite estabelecido em lei, observado o disposto no parágrafo anterior'. Ora, estabelecendo, primeiramente, que a pensão corresponderá à totalidade dos vencimentos ou proventos do servidor falecido, segue-se a impossibilidade de uma lei dispor a respeito de um limite que esteja abaixo da totalidade referida. A frase — 'até o limite estabelecido em lei' — deve ser entendida da seguinte forma: observado o limite posto em lei a respeito da remuneração dos servidores públicos, vale dizer, a lei re- 122 R.TJ. —150 ferida no inciso XI do art. 37 da Constituição, que dispõe: «XI — a lei fixará o limite máximo e a relação de valores entre a maior e a menor remuneração dos servidores públicos, observados, como limites máximos e no âmbito dos respectivos poderes, os valores percebidos como remuneração, em espécie, a qualquer título, por membros do Congresso Nacional, Ministros de Estado e Ministros do Supremo Tribunal Federal e seus correspondentes nos Estados, no Distrito Federal e nos Territórios, e, nos Municípios, os valores percebidos como remuneração, em espécie, pelo Prefeito;» É esta a lei referida no § 5° do art. 40, da Constituição. E esta lei já existe. É a Lei n° 8.112, de 11-12-90, que, no seu art. 215, estabelece: «Art. 215. Por morte do servidor, os dependentes fazem jus a uma pensão mensal do valor correspondente ao da respectiva remuneração ou provento, a partir da data do óbito, observado o limite estabelecido no art. 42.» Exatamente como dizíamos, dispõe o art. 42 da Lei 8.112/90: «Art. 42. Nenhum servidor poderá perceber, mensalmente, a título de remuneração, importância superior à soma dos valores percebidos como remuneração, em espécie, a qualquer título, no âmbito dos respectivos Poderes, pelo Ministros de Estado, por membros do Congresso Nacional e Ministros do Supremo Tribunal Federal.» Posta assim a questão, indaga-se: as pensões concedidas anteriormente à Lei n° 8.112, de 1990, deverão corresponder, também, ao da respectiva remuneração ou provento? A resposta é positiva. A uma, porque o § dó arit. 40, da Constituição, refere-se, sem distinguir, ao benefício da pensão por morte, a dizer que corresponderá ele à totalidade dos vencimentos ou proventos do servidor falecido. Quer dizer, o benefício da pensão por morte vigente quando da promulgação da constituição, viu-se abrangido pela disposição inscrita no 5° do seu art. 40. A Constituição não se refere às pensa" a serem concedidas a partir da sua promulgação, mas ao «beneficio da pensão por morte corresponder/ à totalidade dos vencimentos ou proventos do servidor falecido...» A Lei n° 8.112, de 1990, por sua vez, estabelece que, «por morte do servidor, os dependentes fazem jus a uma pensão mensal de valor correspondente ao da respectiva remuneração ou provento, a partir da data do óbito, observado o limite estabelecido no art. 42». A lei, tal qual a Constituição, não distingue entre pensões concedidas e pensões a serem concedidas. A duas, porque a Constituição, espancando dúvidas, dispôs, no art. 20 do ADCT; «Art. 20. Dentro de cento e oitenta dias, proceder-se-á à revisão dos direitos dos servidores públicos inativos e pensionistas e à atualização dos proventos e pensões a eles devidos, a fim de ajustá-los ao disposto na Constituição». A parte final do art. 20 — «a fim de ajustá-los ao disposto na Constituição» — indica que a Constituição concedeu o beneficio, estabelecendo, apenas, um prazo — cento e oitenta dias —para o processamento da revisão do benefício e a sua atualizagb• Opinando pelo deferimento da segurança, a Procuradoria-Geral da República, no parecer de fls. 37/38, lavrado pela ilustre Subprocuradora-Geral Caia da Luz Oliveira, escreveu: R.T.J — 150 Por sua vez, o art. 20 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias mandou atualizar os proventos dos servidores públicos inativos e as pensões, a fim de ajustá-los ao disposto na Constituição. Isso significa que o regime criado pela Carta para as pensões estende-se lapidas instituídas antes de sua vigência, pois somente a elas poderia dirigirse o preceito transitório, ao determinarlhes a atualização. A regrado art. 215 daLein°8.112/90 sem dúvida foi expedida para regular as pensões de acordo com o novo ordena. mento constitucional e, por isso, aplicase, desde a sua vigência, também aos benefícios anteriormente instituídos. Não cabe, porém, fazer revisão retroativa, de modo a propiciar o pagamento de diferenças anteriores a 1° de janeiro de 1991 (art. 252); isso porque a eficácia do art. 40, § 5°, da Constituição, dependia da expedição da lei que menciona. Não deve impressionar a expressão a partir da data do óbito, constante da norma em causa, pois indica apenas o termo inicial da pensão, que deixou de ser o momento da concessão, para retroagir à data de seu fato gerador». (fi. 38) Esclareça-se que o Supremo Tribunal Federal, administrativamente, com base em parecer de sua Comissão de Regimento, 123 integrada dos Srs. Ministros Moreira Alves, nanar Gaivão e eu, dá aplicação ao entendimento acima exposto (Proc. Administrativo n° 14.920-9/91). Do exposto, defiro o mandado de segurança. Nãolhahonorários advocatícios (Súmula n° 512). EXTRATO DA ATA MS 21.521— CE — Rel.: Min. Carlos Venosa Impte.: Salete Brito Bastas Amada. (Adv. Jose Maria Viana de Souza). Impdo.: Tribunal de Contas da União. Decirtto Por votação unanime, o Tribunal deferiu o mandado de segurança. Votou o Presidenta Declarou impedimento o Ministro Sepúlveda Pertence. Procurador-Geral da República, Dr. Moacir Antonio Machado da Silva, na ausência ocasional do Dr. Aristides Junqueira Alvarenga. Presidência do Sr. Ministro °atavio Gallotti. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Néri da Silveira, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Venoso, Marco Auraio,1/mar Gaivão e Francisco Rezek. Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Moreira Alves e Sydney Sanches. Procurador-Geral da República, Dr. Aristides Junqueira Alvarenga. Brasília, 2 de junho de 1993 — Luiz Tomimatsu, Secretário. HABEAS CORPUS N° 67.759* — RJ (Tribunal Pleno) (Md na RTJ 148/181) Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello Pacientes: Carla Esteves de Azevedo Guedes e outra — Impetrante: Nélio Roberto Seidl Machado — Castor: Superior Tribunal de Justiça Haia corpus. Ministério Público. Sua declinação constitucional. Princípios institucionais. A questão do promotor natural em face da Constituição de 1988 Alegado excesso no exercício do poder de densas* Republicado, por ter saído com incorreção na RTJ 146/794. 124 R.T.J. —150 dar. Inocorrinda. Constrangimento injusto não caracterizado. Pedido indeferido. O postulado do Promotor Natural, que se revela imanente ao sistema constitucional brasileiro, repele, a partir da vedação de designações casuísticas efetuadas pela Chefia da Instituição, a figura do acusador de exceção. Esse princípio consagra uma garantia de ordem jurídica, destinada tanto a proteger o membro do Ministério Público, na medida em que lhe assegura o exercício pleno e independente do seu oficio, quanto a tutelar a própria coletividade, a quem se reconhece o direito de ver atuando, em quaisquer causas, apenas o Promotor cuja intervenção se justifique a partir de critérios abstratos e pré-determinados, estabelecidos em Id. A matriz constitucional desse princípio assenta-se nas cláusulas da independência funcional e da inamovibilidade dos membros da Instituição. O postulado do Promotor Natural limita, por isso mesmo, o poder do Procurador-Geral que, embora expressão visível da unidade institucional, não deve exercer a Chefia do Ministério Público de modo hegemônico e incontrastável. Posição dos Ministros Celso de Mello (Relator), Sepúlveda Pertence, Marco Aurélio e Carlos Velloso. Divergência, apenas, quanto à aplicabilidade imediata do princípio do Promotor Natural: necessidade da interpostao legislatoris para efeito de atuação do princípio (Ministro Celso de Mello); incidência do postulado, independentemente de intermediação legislativa (Ministros Sepúlveda Pertence, Marco Aurélio e Carlos Velloso). Reconhecimento da possibilidade de instituição do princípio do Promotor Natural mediante lei (Ministro Sydney Sanches). Posição de expressa rejeição à existência desse princípio consignada nos votos dos Afinistros Paulo Brossard,Octavio Gallotti,Néri da Silveira e Moreira Alves. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos, em indeferir o pedido de «habeas corpos». Brasília, 6 de agosto de 1992 — Sydney Sanches, Presidente — Celso de Mello, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Celso de Mello: O Ministério Público Federal, em parecer da lavra do ilustre Subprocurador-Geral da Re- pública, em substituição, Dr. Mordem Costa Pinto, assim resumiu e apreciou a espécie destes autos (fls. 198/205), verbis: «Trata-se de habeas corpos impetrado pelo advogado Nélio Roberto Seidl Machado, em favor de Carla Esteves de Azevedo Guedes e outra, alegando o seguinte: a) as pacientes foram presas em flagrante, na cidade do Rio de Janeiro, acusadas de envolvimento no crime de tráfico de substância tóxica, como resultado da gigantesca operação policial chamada 'Operação Bandeja'; R.T.J —150 o procedimento policial foi distribuído ao Juiz de Direito da 5` Vara Criminal da cidade do Rio de Janeiro, onde o Promotor Público titular, Dr. Avelino Gomes Moreira Neto, opinou pela concessão de liberdade provisória às pacientes, mediante o pagamento de fiança, entendendo ainda que na hipótese se não configurava tráfico ilícito de substância tóxica; no dia seguinte ao pronunciamento do Dr. Avelino Gomes Moreira Neto, Promotor titular da 5' Vara Criminal, o Procurador-Geral da Justiça do Estado do Rio de Janeiro editou portaria designando o Promotor Luiz Carlos Rodrigues da Costa para acompanhar o Inquérito n° 032/89, em que as pacientes figuravam como indiciadas, bem como em todos os demais inquéritos resultantes da chamada 'Operação Bandeja' (fl. 74); o Promotor designado ofereceu dentmcia contra as pacientes, perante o Juiz Criminal da 5' Vara do Rio de Janeiro, imputando a elas o crime de tráfico de substância tóxica (fis. 51/57); impetrou habeas coreus perante o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, visando anular a ação penal (fls. 22/42), sendo denegada a ordem (fls. 9W103); f) inconformado interpôs recurso ordinário para o Superior Tribunal de Justiça, que por maioria negou provimento ao mesmo (fls. 106/112 132/160); g) em face da decisão do Superior Tribunal de Justiça, que negou provimento ao recurso ordinário, impetrase habeas corpus originário perante o Supremo Tribunal Federal, visando a anulação do procedimento penal, ao fundamento de que restou violado, com a nomeação de promotor 125 especial, o princípio constitucional do Promotor Natural. O presente writ é de ser conhecido, pois eventual coação ilegal teria partido do Superior Tribunal de Justiça, que negou provimento ao recurso ordinário interposto pelas pacientes, passando assim a coator, corno ficou decidido no HC 67.263-9-SP, Pleno, onde o eminente Ministro Moreira Alves enfatizou que é sempre lícito ao interessado chegar ao Supremo Tribunal Federal '... por meio do habeas expus originário (art. 102, I, i, da Constituição), se, interposto recurso ordinário ao Superior Tribunal de Justiça, este lhe negar provimento, tornando-se, assim, o coator'. No mérito, somos pela concessão da ordem. É que o princípioda independência funcional do Ministério Público, agora constitucionalmente assegurado (art. 127, P, da Carta Magna), implica na consideração de que foi instituída a figura do Promotor Natural. Efetivamente, se o chefe do Ministério Público, ou órgão de sua estrutura, colegiado ou singular, não pode impor ao Promotor sua linha de orientação, dizendo a ele como deve agir em tal ou qual hipótese, porque estaria violando a sua autonomia funcional, não pode também afastá-lo do oficio para onde foi legalmente designado, ou restringir a sua atuação em face de determinado caso, porque istó significa forma eficaz de contornar, na prática, o princípio do Promotor Natural, não devendo ser esquecido que tal ocorre, sempre, quando há divergência ou possibilidade dela, entre o posicionamento do Promotor de Justiça, frente a uma situação concreta, e o do Procurador-Geral. 6. Na hipótese em debate fica clara esta divergência, pois a portaria designando Promotor Especial foi editada, sem qualquer motivação ou justificati- 126 R.T.J. — 150 va, no dia seguinte ao pronunciamento doPromotor titular daflaraCraninal, opinando pela concessão de liberdade provisória e adiantando que entendia inexistente o crime do art. 12 da Lei n° 6.368/76, resultando no oferecimento de denúncia por crime de tráfico de substância tóxica (fls. 51/53 e 74). O fato de existir um chefe não significa que exista qualquer tipo de subordinação funcional, sendo o Promotor ou qualquer membro inteiramente livre para exercer a sua atividade, oficiando autônoma e fundamentadamente, com obediência exclusiva à lei e a sua consciência. Daí se extraio princípio do Promotor Natural que não é apenas regalia funcional individual do órgão ou membro da instituição, que deve atuar livremente nos processos afetos ao limite de suas atribuições, conforme determinação legal, mas principalmente uma garantia de todo cidadão ou entidade jurídica no sentido de que está afastada a possibilidade da existência do Promotor de Exceção, havendo sempre, conforme determinação legal preexistente, um órgão específico do Ministério Público atuando de forma independente e com legitimidade processual, sendo ao mesmo tempo uma garantia individual e social. 9.0 Professor Paulo Cegar Pinheiro Carneiro, ilustre Promotor de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, em atualià simo trabalho intitulado «O Ministério Público no Processo Civil e Penal — Promotor Natural — Atribuição e Conceito», Forense, 2' edição, traz importante contribuição doutrinária sobre o tema, que vale a pena ser transcrita, verbis: 'Esta garantia social e individual permite ao Ministério Público cumprir, livre de pressões e influências, a sua missão constitucional de defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. Qual a garantia que se poderia dar a alguém, à própria sociedade, de que a lei seria cumprida na hipótese de ficar ao arbítrio de determinada autoridade a escolha do membro do Ministro Público para examinar da conveniência ou não de promover ação penal em face de alta autoridade pública, para promover ou não ação cível contra poderosa fábrica que polui o ar de determinada região pobre; para promover ação visando a apurar abuso e omissões de autoridade; para coibir abuso de autoridade ou poder econômico; para intervir, em geral, nos proce,ssos nos quais está em jogo direito social ou individual indisponível? Certamente nenhuma. O princípio do promotor natural pressupõe que cada órgão da instituição tenha, de um lado, as suas atribuições fixadas em lei e, de outro, que o agente que ocupa legalmente o cargo correspondente ao seu órgão de atuação, seja aquele que irá oficiar no processo correspondente, salvo as exceções previstas em lei, vedado, em qualquer hipótese, o exercício das funções por pessoas estranhas aos quadros do parquet' (fi. 53). Parece-nos, mais, que o princípio do Promotor natural encontra apoio ainda nos princípios constitucionais da proibição do Juízo ou Tribunal de exceção e do devido processo legal (art. 5°, incisos XXXVIII e LIV, da Carta Magna), bem como na garantia da inamovibilidade. Efetivamente, não se concebe a garantia da inexistência de Juízo ou Tribunal de exceção com a possibilidade concreta da existência da acusação ad R.T.J —150 hoc, especialmente designada, onde é possível antever desempenho inconseqüente ou dirigido, às vezes com sacrifício da função institucional do Ministério Público, que é a defesa intransigente da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. Por outro lado, a garantia do devido processo legal não se realizará plenamente sem a certeza de que não haverá acusador de exceção, pois qualquer procedimento só Será considerado legítimo assegurada a atuação livre e independente de órgão ou autoridade com atribuição funcional previamente fixada em lei. Neste ponto, é válido trazer à colação o Magistério de Hugo Nigro Mazzilli, ilustre membro do Ministério Público do Estado de São Paulo, em sua obra o 'Ministério Público na Constituição de 1988', Saraiva, 1989, página 79, verbis: 'Não há dúvida de que, normalmente, quando a Constituição menciona 'processar e julgar', está querendo referir-se à tarefa jurisdicional (cf. arts. 52, I e II, 102,1, 105, I, 108, I e 109). Entretanto, partindo-se da exclusividade da promoção da ação penal, agora conferida ao Ministério Público (art. 129, 1), bem como considerando-se a inamovibilidade comum de que gozam juízes e promotores (arte. 95, II, e 128, § 5°, I, b), bem como o procedimento da independência funcional que não é uma garantia só para o órgão, e sim para a sociedade, final destinatária de sua atuação, vemos que o princípio do promotor natural hoje faz parte do devido processo legal (CF, art. 5°, LIII e LIV). Assim, sob esse prisma, enorme do art. 5°, LIII, pode também ser considerada, a um só tempo, o 127 princípio do juiz e do promotor com competência ou atribuição legal para oficiarem no caso. É o mesmo princípio do promotor natural, mas agora sob uma ótica diversa Realmente, este é o primeiro direito do acusado: não apenas o de ser julgado por uru órgão independente do Estado, mas até mesmo antes disso, o de receba a. acusação independente, de um órgão do Estado escolhido previamente segundo critérios e atribuições legais, abolidos não só o procedimento de ofício e a acusação privada, como enfim e principalmente eliminada a figura do próprio acusador público de encomenda, escolhido pelo ProcuradorGeral de Justiça.' É preciso ressaltar que tal princípio só admite as exceções previstas em lei, tais como licença, remoção, férias, etc., não sendo possível o afastamento sem motivação legal, nem a evocação inconseqüente, como na hipótese dos autos. Aqui é preciso novamente trazer a doutrina do Professor Paulo Cezar Pinheiro Carneiro, obra citada, verbis: 'Todo e qualquer ato do Procurador-Geral que contrarie tal principio, ainda que editado com aparência de legalidade como designações, evocação, delegação e formação de grupos especiais, é absolutamente nulo; incapaz de produzir qualquer tipo de efeito e sujeito a medidas legais que visem ao restabelecimento da observância do princípio do promotor natural, como examinaremos adiante.' (fl. 53) 16. A possibilidadqe da ação privada nos crimes de ação pública, no caso de inércia do acusador, não descaracteriza o princípio do Promotor Natural, seja porque se trata de exceção prevista em lei, seja porque o Promotor do caso não 128 R.TJ. — 150 é afastado de suas funções, podendo inclusive aditar a queixa, repudiá-la e oferecer denúncia substitutiva, e intervir em todos os termos do processo, na forma do que dispõe o art. 29 do Código de Processo Penal. 17.O mesmo é de ser dito em relação ao art. 28 do Código de Processo Penal, vez que se trata de outra exceção prevista em lei, onde o Procurador-Geral ou o Promotor por ele designado passa a ser o acusador legal, sendo certo ainda que não há, na hipótese, o afastamento do Promotor Titular e que tal decorre justamente da necessidade de conciliar o princípio da independência funcional com o resguardo dos interesses da sociedade. Em conclusão pode-se dizer que a Constituição Federal de 1988 adotou o princípio do Promotor Natural, ao estabelecer a independência funcional do Ministério Público como um dos atributos da instituição, o que significa dizer que a substituição do Promotor legalmente designado para ter ofício em determinada Vara só pode ocorrer em decorrência de apressa autorização legal (férias, licença, remoção, etc.), arredada a possibilidade do afastamento Ga offido ou injustificado, como ocorreu no caso em exame. Pelo exposto, somos pelo conhecimento e concessão da ordem, anulando-se o procedimento penal, por violação do princípio do Promotor Natural, facultada a possibilidade de apresentação de nova denúncia através de Promotor com atribuição legal para tanto. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Celso de Mello (Relato): Com a nova Constituição brasileira, promulgada em 1988, fortaleceu-se, por soberana deliberação da Assembléia Nacional Constituinte, a instituição do Minis- cério Público, por ela própria qualificada como permanente e essencial à função jurisdicional do Estado (art. 127). Ao elaborar para o Excelentíssimo Senhor Consultor-Geral da República, Dr. Saulo Ramos, a Exposição de Motivos que fundamentou o encaminhamento ao Congresso Nacional, pelo Excelentíssimo Sr. Presidente da República, do Projeto de lei que institui a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público e dispõe sobre normas gerais para a sua organização nos Estadosmembros, expendi algumas pcadaações — das quais guardo ame convicção —, motivadas pela magnitude do tema e estimuladas pela inquestionável relevância que assumem, aqui e agora, as implicações decorrentes da inconstitucionalização do novo Ministério Público. Pude, então, afirmar que foram plenas de significação as conquistas institucionais obtidas pelo Ministério Público ao longo do processo constituinte de que resultou a promulgação da nova Constituição do Brasil. Com a reconstrução da ordem constitucional, emergiu o Ministério Público sob o signo da legitimidade democrática. Ampliaram-se-lhe as atribuições; dilatou-selhe a competência; reformulou-se-lhe a fisionomia institucional; conferiram-se-lhe os meios necessários à consecução de sua destinação constitucional, atendendo-se, finalmente, a antiga reivindicação da própria sociedade. Posto que o Ministério Público não constitui órgão ancilar do Governo, instituiu o legislador constituinte um sistema de garantias destinado a proteger o membro da Instituição — o Promotor de Justiça —, cuja atuação independente configura a confiança de respeito aos direitos, individuais e coletivos, e a certeza de submissão dos Poderes à lei. É indisputável que o Ministério Público ostenta, em face do ordenamento constitucional vigente, destacada posição na estrutura do Poder. A independência institucio- R.TJ 150 nal, que constitui uma de suas mais expressivas prerrogativas, garante-lhe o livre desempenho, em toda a sua plenitude, das atribuições que lhe foram conferidas. O eminente Hely Lopes Meirdles (v. «Estudos e Pareceres de Direito Público», vol. VII/332, 335 e 336, 1983, RI), discorrendo sobre aspectos institucionais referentes ao Ministério Público, acentua a importância de ser ele concebido como órgão funcionalmente independente, verbis: «Fixada a posição do Ministério Público na estrutura constitucional da nossa Federação, sobressai, desde logo, a sua independência funcional, pois que não está hierarquizado a qualquer outro órgão ou Poder, e seus membros são agentes políticos desvinculados do Estatuto dos Funcionários Públicos. 129 ra, emerge para a experiência concreta de uma vida democrática A ruptura do Ministério Público com os conceitos tradicionais do passado — segundo os quais seria o fiscal da lei, de qualquer lei, por mais injusta ou arbitrária que fosse — impõe-se, hoje, como decorrência de novas exigências ético-políticas a que essa Instituição deve, por um imperativo democrático, submeter-se e, também, em face da reformulação a que foi submetida no plano constitucional. A nova Constituição do Brasil proclama, em seu artigo 127, caput, que «O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.» Ora, no que concerne ao desempenho Esse novo perfil institucional traduz, de da função ministerial, pelo órgão (AC) modo expressivo, um dos aspectos mais e seus agentes (Promotores, Procurado- importantes destinação constitucional res), há independência de atuação e não do MinistériodaPúblico, agora investido, por apenas 'autonomia funcional'. Os mem- efeito de soberana deliberação da Assembros do Ministério Público quando de- bléia Nacional Constituinte, da inderrogásempenham as suas atribuições instituatribuição de velar pela intangibilidade cionais não estão sujeitos a qualquer vel e integridade da ordem democrática. subordinação hierárquica ou supervisão orgânica do Estado a que pertencem. Assim, o Ministério Público não deverá mais só considerar, no desempenho de suas relevantes funções, o aspecto formal ou No mais, os membros do Ministério exterior do direito positivo. Mais imporPúblico atuam com absoluta liberdade tante, agora, toma-se o próprio conteúdo funcional, só submissos à sua consciên- da lei, cujos elementos intrínsecos não pocia e aos seus deveres profissionais, pau- dem divorciar-se dos fatos sociais e do tados pela Constituição e pelas leis re- quadro histórico em que a norma jurídica gedoras da Instituição. Nessa liberdade se formou. de atuação no seu ofício, é que se expresO Estado democrático, gerador de uma sa a independência funcional (...).» ordem jurídica fundada no consentimento Cumpre, por isso mesmo, neste expres- dos governados — que se exterioriza pela sivo momento histórico em que o Ministé- livre e permanente penetração da sua vonrio Público se situa entre o seu passado e o tade no processo decisório nacional — seu futuro, refletir sobre a natureza da mis- deve ser entendido como aquele cujas bases são institucional que a ele incumbe desem- repousam na soberania popular, na divisão penhar no seio de uma sociedade que, ago- funcional do Poder, no respeito e na garan- 130 R.TJ.— 150 tia das liberdades públicas, e no pluralismo de expressão e de organização política. A legalidade assim posta, veiculadora das justas aspirações e dos objetivos maiores perseguidos pelo corpo social, qualifica-se como democrática, passível, em conseqüência, da tutela institucional do Ministério Público. Este, pois, deixa de ser um servo incondicional de qualquer legalidade, para converter-se num órgão que indague das origens da norma e lhe perquira o conteúdo, valendo-se, para tanto, de critérios axiolt5gicos que lhe permitam aferir dos elementos que qualificam a regra jurídica como essencialmente democrática Não mais o mero e insuficiente controle formal da legalidade. Pretende-se, agora, investir o Ministério Público de um poder de verificação e de tutela sobre a legitimidade ética e política da própria norma de direito. A obra do legislador, no que pertine ao seu conteúdo está necessariamente condicionada pelas relações sociais, pelas normas de cultura, pelas concepções que vigoram na formação social em que atua e — o que se revela essencial — deve estar legitimada pelo consenso dos governados. Sem a observância desses condicionamentos, o direito posto pelo Estado refletirá, por suas intrínsecas distorções, um ato de criação arbitrária, distanciado do bem comum, cuja consecução traduz o próprio fundamento teleológico da organização estatal. A nova disciplina constitucional do Ministério Público redefiniu o sentido e o caráter de sua ação institucional, para que nele se passe, agora, a vislumbrar o instrumento de preservação de um ordenamento democrático. A essencialidade dessa posição políticojurídica do Ministério Público assume tamanho relevo que ele, deixando de ser o fiscal de qualquer lei, converte-seno guar- dião da ordem jurídica cujos fundamentos repousam na vontade soberana do Povo. O Ministério Público deixa, pois, de fisMissas a lei pela lei, num inútil exercício de mero legalismo. Requer-se dele, agora, que avalie, criticamente, o conteúdo da norma jurídica, aferindo-lhe as virtudes intrínsecas, para, assim, neutralizar o absolutismo formal de regras legais, muitas vezes divorciadas dos valores, idéias e concepções vigentes na comunidade, em dado momento histórico-cultural. Não mais se pode, assim, exigir do Ministério Público um comportamento institucional que traduza, em face da ordem jurídica estabelecida, uma postura de neutralidade axiológica. O tratamento dispensado ao Ministério Público pela nova Constituição conferelhe, no plano da organização estatal, uma posição de inegável eminência, na medida em que se lhe conferiram funções institucionais de magnitude irrecusável, dentre as quais avulta a de «zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia» (v. CF/88, artigo 129, inciso II). O Ministério Público, em face dessa regra, tomou-se, por destinação constitucional, o defensor do povo. Numa relação dilemática, em que confl item os interesses do governo e os do povo, não há, para o Ministério Público, alternativa politicamente válida e moralmente digna, senão a da intransigente defesa dos valores pertencentes à Nação, mesmo que sob o injusto assédio dos curadores — de quaisquer curadores — do regime. A tutela de um direito abstrato, que permita a destruição das liberdades públicas e autorize o arbítrio, pela hipertrofia da coerção estatal, subjugando e aniquilando o indivíduo, não pode constituir missão institucional do Ministério Público. R.T.J — 150 O novo perfil do Ministério Público representa, portanto, resposta significativa aos anseios e postulações dos que, perseguidos pelo arbítrio e oprimidos pela onipotência do Estado, a ele recorrem, na justa expectativa de verem restaurados os seus direitos. A responsabilidade social do Ministério Público toma-se, por isso mesmo, imensa; todos os membros da Instituição são, agora, depositários da fé e da confiança do Povo que, com eles, celebrou o compromisso, grave e inderrogável, da liberdade e do respeito aos seus direitos e às suas garantias. Combatendo o arbítrio, insurgindo-se contra os que violam, com prepotência, as franquias individuais, transformando o protesto de vítimas indefesas em ação realizado= da Justiça, repudiando as leis injustas, porque desvinculadas dos anseios e do consentimento dos governados, em assim agindo, o Ministério Público terá dado o testemunho que a Nação dele espera. O princípio do Promotor Natural, tendo presente a nova disciplina constitucional do Ministério Público, ganha especial significação no que se refere 210 objetivo último decorrente de sua formulação doutrinária trata-se de garantia de ordem jurídica destinada tanto a proteger o membro da Instituição, na medida em que lhe assegura o exercício pleno e independente de seu oficio, quanto a tutelara própria coletividade, a quem se reconhece o direito de ver atuando, em quaisquer causas, apenas o Promotor cuja intervenção se justifique a partir de critérios abstratos e pré-determinados, estabelecidos em lei. Intuiu a existência desse postulado, em nosso sistema de direito positivo, o eminente Ministro Antonio Neder, cujas observações sobre o tema registrou em voto proferido nesta Corte (RTJ 63/315): «O Sr. Ministro Antonio Neder. Entendo que não pode, porque, entre nós, domina o princípio da legalidade da ação 131 penal, ou, mais precisamente, o da legalidade comum, ou ordinária, da ação penal, tanto que o art. 153, § 15, da Constituição, texto da Emenda 1, expressa que não haverá tribunais de exceção; ora, se é proibido o tribunal de exceção, vedado é o juiz de exceção; se é defeso instituir juízo de exceção, impedido é conceber-se o acusador de exceção, pois não se compreende que nossa Constituição proíba o juiz de exceção e admita o acusador de exceção, isto é, conceda e, ao mesmo tempo, subtraia uma garantia» (Grifei.) O eminente Professor Paulo Cezar Pinheiro Carneiro, membro ilustre do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, ao versar o tema ora proposto pelo impetrante («O Ministério Público no processo civil e penal — Promotor Natural — Atribuição e Conflito», págs. 52/54, 3' ed., 1990, Forense), analisou, no plano doutrinário e conceituai, a noção de Promotor Natural, acentuando, verbis: e «A teoria do promotor natural ou legal, como anteriormente afirmado, decorre do princípio da independência, que é imanente à própria instituição. Ela resulta, de um lado, da garantia de toda e qualquer pessoa física, jurídica ou formal que figure em determinado processo que reclame a intervenção do Ministério Público, em ter um órgão específico do parquet atuando livremente com atribuição predeterminada em lei, e, portanto, o direito subjetivo do cidadão ao Promotor (aqui no sentido lato), legalmente legitimado para o processo. Por outro lado, ela se constitui também como garantia constitucional do princípio da independência funcional, compreendendo o direito do Promotor de oficiar nos processos afetos ao âmbito de suas atribuições. Este princípio, na realidade, é verdadeira garantia constitucional, menos dos membros do parquet e mais da própria 132 R.TJ. — 150 sociedade, do próprio cidadão em que o MI2 atua, que nenhuma autoridade ou poder poderá escolher Promotor ou Procurador específico para determinada causa, bem como que o pronunciamento deste membro do MI' dar-se-á livremente, sem qualquer tipo de interferência de terceiros. Esta garantia social e individual permite ao Ministério Público cumprir, livre de pressões e influências, a sua missão constitucional de defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. Qual a garantia que se poderia dar a alguém, à própria sociedade, de que a lei seria cumprida, na hipótese de ficar no arbítrio de determinada autoridade a escolha do membro do Ministério Público para examinar da conveniência ou não de promover ação penal em face da alta autoridade pública; para promover ou não ação cível contra poderosa fábrica que polui o ar de determinada região pobre; para promover ação visando apurar abuso e omissões de autoridades; para coibir abuso de autoridade ou poder econômico; para intervir, em geral, nos processos nos quais está emjogo direito social ou individual indisponível? Certamente nenhuma. O princípio do promotor natural pressupõe que cada órgão da instituição tenha, de um lado, as suas atribuições fixadas em lei e, de outro, que o agente, que ocupa legalmente o cargo correspondente ao seu órgão de atuação, seja aquele que irá oficiar no processo correspondente, salvo as exceções previstas em lei, vedado, em qualquer hipótese, o exercício das funções por pessoas estranhas aos quadros do parquet. Todo e qualquer ato do ProcuradorGeral que contrarie tal princípio, ainda que editado com aparência de legalidade como designações, avocação, delegação e formação de grupos especiais, é abso- lutamente nulo, incapaz de produzir qualquer tipo de efeito e sujeito a medidas legais que visem ao restabelecimento da observância do princípio do promotor natural, como examinaremos adiante. Por outro lado, não há como se admitir a possibilidade da designação de pessoas estranhas aos quadros do Ministério Público (promotor ad hoc) para o exercício de suas funções próprias, pois a garantia primeira da teoria do promotor natural pressupõe prévia investidura do agente no cargo e, portanto, no seu órgão de atuação, na forma prevista na Constituição.» A exigência de atuação independente do membro do Ministério Público, pautada nos justos valores que devem informar a elaboração do conteúdo normativo da lei, reside na gênese da formulação do princípio do Promotor Natural, a que repugnam interferências ilegítimas da Chefia da Instituição, que rompem, mediante designa' tinas e arbitrárias, a regular ções casais ordem de distribuição dos processos e encargos funcionais. É preciso velar pela dignidade institucional do Ministério Público e impedir que Procuradores-Gerais, despojados da consciência que lhes impõe o momento histórico que vive a Instituição, venham, por razões mores ou pela desprezível vontade de agir servilmente, a degradá-la, convertendo-a, desse modo, em inaceitável instrumento de pretensões contestáveis. Dessa expressiva garantia jurídica, em que se traduz o princípio do Promotor Natural, teve percepção, em sua época, com seu agudo senso de justiça e de independência, o eminente Roberto Lyra («Como Julgar, como Defender, Como Acusar», pág. 121, 1975, Konfino), cuja advertência, extraída da descaracterização do Ministério Público no plano da organização estatal, cumpre não ser esquecida em momento algum: R.T.1 —150 «Pela primeira vez, na história do Ministério Público, procuradores-gerais seriam substituídos e, sobretudo, escolhidos à mercê de réus. O escândalo dessa dissolução moral seria, além de tudo, contraproducente, pois a Magistratura ficaria suscetibilizada no mais santo de suas cóleras. Exercendo a Procuradoria-Geral, na última fase de minha carreira, impedi que o Ministério da Guerra escolhesse o promotor público (sempre o mesmo) em processos relativos à liberdade de imprensa.» Esse notável membro do Ministério Público paulista que é biques de Camargo Penteado, ao desenvolver a noção conceituai de Promotor Natural e insistir no alcance desse princípio («O Princípio do Promotor Natural», in Juritis', vol. 129/114-124) —IL. os membros do parquet terão cargos específicos, proibidas as simples e discricionárias designações, afastando-se Promotor de Justiça ad —, assim se refere, na perspectiva do tema, ao órgão da Acusação Pública: «... Estruturar-se-á em lei consentânea com o princípio outorgado. Está claro que o mesmo texto que assegura ampla defesa contém o princípio da acusação constitucionalmente adequada; isto é, por órgão próprio, criado pela Constituição, estável, independente, designado para o cargo e não para o encargo determinado, para as funções e não para o ato especifico. Quando a Constituição Federal assegura ampla defesa e cria o Ministério Público há que se extrair do sistema integral a conclusão de que o Parquet deve ser o primeiro interessado na realização concreta e antecipada daquele princípio e, portanto, direta e substancialmente voltado para acusação advinda da naturalidade de seu organismo e da normalidade decorrente da distribuição legal dos serviços. 133 Governo algum pode interferir no Ministério Público para obter acusação contra inimigo político, sob pena de violação dos princípios da igualdade e da ampla defesa. Não basta o controle jurisdicional posterior, eis que a todo indivíduo deve ser assegurado o direito de jamais ver seu nome inserido numa denúncia sem supedâneo suficiente. E o contrário deve igualmente ser analisado. Governo algum pode interferir no Parquet para obter denúncia que jamais chegará a bom termo ou arquivamento que deixará de levar à condenação justamente aquele que feriu a ordem jurídica.» O princípio do Promotor Natural, já contemplado em suas linhas essenciais pela legislação paulista concernente ao Ministério Público (Lei Complementar Estadual n° 304, de 1982, artigo 123), pode ser assim enunciado: nenhum membro do Ministério Público poderá ser afastado do desempenho de suas atribuições nos procedimentos em que oficie, ou deva oficiar, exceto por relevante motivo de interesse público, por impedimento ou suspeição ou por razões decorrentes de férias, licenças ou afastamento. O reconhecimento desse princípio, que se revela imanente à disciplina constitucional do Ministério Público, objetiva conferir efetividade a dois postulados fundamentais: um, o da independência funcional, e outro, o da inamovibilidade dos membros da Instituição. Tais postulados vinculam e limitam, por seu conteúdo mesmo, o poder do Procurador-Geral, que, embora expressão visível da unidade institucional, não deve exercer a Chefia do Ministério Público de modo hegemônico e incontrastável. O princípio da independência funcional reveste-se de caráter tutelar. É de ordem institucional (CF, art. 127, 4 1°) e, nesse plano, acentua a posição autônoma do Ministério Público em face dos Poderes da 134 R.TJ. — 150 República, com os quais não mantém vínA inamovibilidade, pois, enquanto gaculo qualquer de subordinação hierárqui- rantia subjetiva de independência, concerco-administrativa. ne não só ao cargo, mas, especialmente, às respectivas funções, que não poderão dele O magistério de José Frederico Marques («A Reforma do Poder Judiciário», ser destacadas pelo Procurador-Geral e, por vol. 1/175, 1979, Saraiva) sobre esse tema ato deste, deferidas a outro Promotor/Procurador. Atribuir legitimidade a esse proé esclarecedor: cedimento do Chefe do Ministério Público «O Ministério Público é funcional- equivaleria a justificar o descumprimento mente independente, porquanto, apesar indireto da garantia da inamovibilidade de órgão da administração pública, não e, como necessário efeito conseqüencial, é ele instrumento à mercê do governo e dar causa, injustificável, ao virtual esvado Poder Executiva (...). Independente ziamento das funções inerentes ao cargo é, também, o Ministério Público, da ma- ocupado por membro do Ministério Públigistratura judiciária, que, sobre ele, ne- co. nhum poder disciplinar exerce. Entre o Não podem ser considerados, assim, ilijuiz e o promotor de justiça, existem mitados os poderes de avocação e de derelações de ordem processual tão-somente. Não cabe ao magistrado judicial signação do Procurador-Geral, inobstante dar ordens ao Ministério Público, no esta Corte, por sua Colenda 2 • Turma, rel. plano disciplinar e da jurisdição censt5- Ministro Moreira Alves, haja acentuado, em função do princípio da unidade instituria cional, que Essa independência funcional do Mi«O Ministério Público é uno e pode, nistério Público foi expressamente recoportanto, seu Chefe avocar qualquer nhecida pelo Supremo Tribunal Federal, processo ou designar promotor para que quando, ao julgar procedente representanele ofereça denúncia.» ção de inconstitucionalidade que se lhe (RT 553/428). submetera, proclamou a ausência absoluta de subordinação administrativa do MiNessa perspectiva, tais poderes, embora nistério Público ao Poder Judiciário (RTJ derivados dos princípios da unidade e 95/980, rel. Ministro Moreira Alves). da indivisibilidade da Instituição, sofrem, O princípio da inamovibilidade, por sua hoje, o condicionamento de outro princívez, revela-se fonte matricial da tese que pio também constitucional — o da indeacolhe o princípio do Promotor Natural. pendência funcional — e encontram limite Atua como garantia de ordem subjetiva, na garantia da inamovibilidade que, alçada tendo por destinatário precípuo o próprio ao plano da Constituição, assiste, agora, de membro da Instituição, que não poderá, modo amplo, aos membros do Ministério ressalvada a hipótese de interesse público, Público. ser compulsoriamente removido ou afastaO exercício desses poderes pelo Procudo do seu cargo. É amplo o alcance desse rador-Geral se justificará, pois, nos limiprincípio, pois não só garante o Promotor tes estritos dasólei e com respeito absoluto às ou Procurador no cargo de que é titular, mas atribuições funcionais membro do Miassegura-lhe, também, a integridade das nistério Público, as quaisdoconstituem objeto funções inerentes ao ofício que titulariza e de precisa discriminação legal. desempenha, que não poderão ser atribuíAssim sendo, cumpre analisar, tendo predas, seletivamente, a outros membros da Instituição, em razão de situações concre- sente esse contexto, a situação exposta pelo tas e especiais. ilustre impetrante. R.TJ — 150 As ora, pacientes foram presas em flagrante e, inobstante beneficiadas pela concessão de liberdade provisória mediante fiança, vieram a ser denunciadas pelo Ministério Público como incursas no artigo 12 da Lei 6.368/76. Na peça acusatória (fls. 51/53), consubstanciou-se esta imputação, verbis: Consta dos referidos autos que, no dia 4-3-89, por volta das 7:30 horas, na rua Joaquim Murtinho, n° 136, apt° 201, em Santa Tereza, nesta Cidade, as duas denunciadas foram presas em flagrante delito, porque a primeira tinha, guardados para tráfico, 1,71g (um grama e setenta e um centigramas) de clotidrato de cocaína e 1,00g (um grama) da erva denominada cannabis saibra, vulgarmente conhecida por 'maconha', sem autorização legal ou regulamentar. E, a segunda denunciada, porque consentiu que a primeira denunciada se utilizasse do imóvel, do qual é possuidora, para o fim de uso indevido e tráfico ilícito de entorpecentes e porque contribuiu para incentivar e difundir o uso e tráfico de entorpecentes. Na verdade, diligências policiais foram levadas a efeito para desbaratar uma quadrilha de traficantes, que fazia a distribuição de tóxico utilizando-se do BIP n° 3.420. Neste comércio ilícito, o viciado ligava para o BIP e deixava o número do telefone em que estava. Recebido o recado, o traficante entrava em contato com o viciado, que lhe fazia a encomenda do entorpecente e indicava o local em que o mesmo deveria ser entregue. Ato contínuo, era um dos integrantes da quadrilha designado para fazer a entrega do entorpecente. As diligências levadas a efeito indicaram que as denunciadas faziam parte 135 da quadrilha de traficantes, associadas a outras pessoas. Então, foi requerida a expedição de mandado de busca e apreensão ao Juízo de Direito da 5' Vara Criminal, que fez expedir os respectivos mandados. Em cumprimento a um dos mandados, policiais civis se dirigiram à residência das denunciadas, sendo certo que a segunda denunciada era quem detinha a posse do imóvel, permitindo que a primeira denunciada'nele residisse. Ao chegarem na residência das denunciadas e exibirem o respectivo mandado, os policiais civis tiveram a casa franqueada, tendo iniciado a busca, quando encontraram, nasala, um quadro retratando, na pintura, a folha de maconha e de propriedade da segunda denuncia Caris. Ato contínuo, os policiais se dirigiram ao quarto da primeira denunciada Elaine, onde encontraram substância entorpecente semelhante a cloridrato de cocaína e a 'maconha', além de terem encontrado duas balanças de precisão e farto material destinado ao comércio de entorpecente. Em razão destes fatos, os policiais levaram o material e as denunciadas à Delegacia de Entorpecentes, onde, após o exame prévio constatar tratar-se de entorpecentes o material apreendido, foi dada voz de prisão em flagrante às denunciadas tendo a primeira confessado a posse para uso próprio, enquanto a segunda confessava ser de seu conhecimento o envolvimento da outra com tóxico. Assim, a primeira denunciada infringiu a norma do art. 12, da Lei n° 6.368/76, enquanto a segunda denunciada infringiu a norma do art. 12, § 2°, II e III, do mesmo diploma repressivo, devendo, em razão disto, ser condena- 136 R.T.J. —150 das àpenadereclusãocumulativarnente com pena de multa. O impetrante questiona a designação de um Promotor especial para atuar no procedimento penal persecutório que resultou do ato de prisão em flagrante das ora pacientes, o qual, em divergência com a manifestação anterior do seu colega, titular da 5' Promotoria — que não vislumbrara na conduta incriminada nada além do que a simples posse prevista no art. 16 da Lei Antitóxicos (fl. 69) —, veio a denunciá-las como incursas em infração mais grave, tipificada no art. 12 do referido diploma legislativo. Essa designação, reputada ofensiva ao princípio do Promotor Natural, ocorreu, precisamente, um dia após extemada nos autos aquela opinião favorável. Com efeito, o Procurador-Geral de Justiça, em portaria assinada no dia 10-3-89 (fl. 74), designou um outro Promotor, genericamente, para todos os casos resultantes da denominada «Operação Bandeja» — e não só para aquele concernente às ora pacientes. Inobstante reconheça imanente ao novo regramento constitucional pertinente ao Ministério Público o princípio do Promotor Natural, não vislumbro, na situação concreta emergente destes autos, hipótese que enseje a sua atuação, pois o sentido desse postulado exige, para que se lhe dê aplicabilidade, a edição de ato legislativo. A imprescindibilidade dessa integração normativa — essencial ao reconhecimento dos contornos desse princípio e à definição das conseqüências decorrentes de sua eventual inobservância — de um lado, e a necessidade de conferir positividade jurídica ao postulado do Promotor Natural, de outro, levaram o Exmo. Sr. Presidente da República a encaminhar, também para esse efeito, projeto de lei ao Congresso Nacional, em cujo âmbito fixaram-se regras inerentes a esse postulado, com o claro objetivo de precisar-lhe o conteúdo, o alcance e a extensão. Nessa proposição legislativa—que institui a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público e estabelece normas gerais para a sua organização nos Estados-membros —, prevista no art. 61, § 1°, II, d, da Constituição, delineou-se, por via de suas qüêaelas no pano jurídico, o perfil do princípio do Promotor Natural, como se dessume dos artigos 10, IX, e e g 23 e 33, V, do projeto mencionado. Sendo assim, e enquanto não sobrevier a disciplina legislativa pertinente, não há como aplicar — ou mesmo invocar — o princípio do Promotor Natural, que, inobstante a sua formulação no plano doutrinário, ainda constitui tema de lege ferenda. Esse aspecto, inclusive, foi bem ressaltado no douto voto proferido pelo eminente Ministro Assis Toledo, do Superior Tribunal de Justiça, quando, ao abordar o tema do Promotor Natural — que reputou digno de amplo debate acadêmico —, concluiu pela necessidade de sua institucionalização mediante regular processo legislativo, o que, a seu juízo, submete a matéria, na perspectiva em que analisada, a uma disciplina normativa a ser ainda estabelecida pelo Congresso Nacional (fls. 154/155), verbis: «Pelo princípio da recepção (...) vige, naquilo em que não contrariar a Carta Constitucional, a legislação anterior. E, com efeito, existe a Lei Orgânica do Ministério Público — a Lei Complementar n° 40, de 14 de dezembro de 1981. E o que diz essa Lei Complementar? Diz o seguinte, no art. 7°, V: 'ao Procurador-Geral da Justiça incumbe, além de outras atribuições, designar, na forma da lei, membros do Ministério Público do Estado para o desempenho de funções administrativas ou processuais afetas à Instituição'. Portanto, até que seja substituída essa Lei Complementar, o Procurador-Geral da Justiça R.TJ — 150 pode, mesmo no curso do processo, designar outro membro do Ministério Público para prosseguir na ação penal, dando-lhe a orientação que for cabível no caso concreto. Portanto, cabe ao Chefe do Ministério Público, no sistema processual vigente, substituir o Promotor que não exercita o poder-dever de oferecer denúncia, se dele discordar, na hipótese em exame. O que se poderia aqui discutir é se é bom que assim seja: se não, seria a hora de se estabelecer, em nova Lei Orgânica do Ministério Público, alguns princípios restritivos a essa faculdade que, presentemente, possui o Procurador-Geral. Essa, entretanto, é uma questão de lege terenda. Devo registrar, ainda, que a alegada divergência entre os órgãos do Ministério Público referidos, no que concerne à exata classificação jurídica do comportamento imputado às ora pacientes — tráfico de entorpecentes, segundo a denúncia oferecida pelo Promotor especial, ou, «no máximo», consoante acentuou o Promotor titular, mera posse, para consumo próprio, de substâncias tóxicas — é que se mostra subjacente ao inconformismo manifestado na presente impetração. Não desconheço decisão desta Corte (RTJ 9W1111), de que foi relatar o eminente Ministro Pirulito Paz, no sentido do possível controle jurisdicional, mediante habena corpos, de eventual excesso ou abuso no exercício do poder de denunciar: «Se a classificação do crime, contida na denúncia, mostra-se patentemente errônea e exasperante, serve o habena corpos para remediar a ilegalidade.» O precedente em questão não aproveita ao caso concreto, contudo. 137 As pacientes, já favorecidas pela concessão de liberdade provisória mediante fiança, estilo sujeitas, no momento, a processo penal cuja fase sequer ultrapassou os limites da instrução, necessariamente contraditória, da causa, podendo, quando do ato sentenciai, se este eventualmente for de natureza condenatória, ser beneficiadas por desclassificação jurídica in mefilus, mais favorável. Além dessa possibilidade, sempre presente nos termos do que dispõe o art. 383 do CPP, é preciso ressaltar que a maior severidade do Ministério Público na capitulação jurídica do fato não se mostra incompatível com as circunstâncias que motivaram a operação policial e resultaram na prisão em flagrante das ora pacientes. Note-se — porque é relevante — que a peça acusatória, ao descrever o suposto envolvimento das pacientes no processo de tráfico e comercialização de substâncias entorpecentes, reporta-se à apreensão, em poder de uma das pacientes, de duas balanças de precisão e farto material destinado ao comércio de entorpecentes» (fl. 53), o que é efetivamente corroborado pelo auto de apreensão lavrado pela autoridade policiai, o qual também registra a existência de grampeador, tesoura, rolo de fita durex e pequenos sacos plásticos, num total de trezentos e setenta e cinco (fl. 96). Assim sendo, e tendo presentes os elementos que destes autos constam, indefiro o pedido. É o mau voto. VOTO O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Desde a primeira chamada deste caso, na Turma, ficou-me a impressão, data venta, de que a conclusão do magnífico voto do Ministro Celso de Mello, relator, ficaria aquém das suas premissas. 2. Literalmente, S. Ex.' entendeu «imanente à disciplina constitucional do Ministério Público» o chamado «princípio do 138 R.T.J. — 150 Promotor Natural» como «garantia da ordem jurídica cujos destinatários são, de um lado, o próprio membro da Instituição — a quem assegura, no desempenho de seu oficio, o exercício pleno da independência funcional — e, de outro, a própria coletividade, a quem se reconhece o direito de ver atuando, nos procedimentos judiciais ou administrativos vários, o Promotor ou Procurador investido, em tese e em função de critérios legais pré-determinados, das atribuições inerentes ao seu cargo». Em razão do princípio, enuncia o Relator, «nenhum membro do Ministério Público poderá ser afastado do desempenho de suas atribuições nos procedimentos em que oficia, ou deva oficiar, exceto por relevante motivo de interesse público, por impedimento ou suspeição ou por razões decorrentes de férias, hcenças ou afastamentos». D4 a citação, sem reparos, da assertiva fundamental da tese do Prof. Paulo César Pinheiro Carneiro de que, «todo e qualquer ato do Procurador-Geral que contrarie tal princípio, ainda que editado com aparência de legalidade como designação, evocação, delegação e formação de grupos especiais, é absolutamente nulo, incapaz de produzir qualquer efeito...». «A exigência de atuação independente do membro do Ministério Público» — acentua em outro passo o isofmistro Celso de Mello — «reside na gênese da formação do princípio do Promotor Natural, a que repugnam interferências ilegítimas da Chefia da Instituição, que rompem, mediante designações easuísticas e arbitrárias, a regular ordem de distribuição dos processos e encargos funcionais». Não obstante, ao final, embora repise a premissa de ser «imanente ao novo regramento pertinente ao Ministério Público o princípio do Promotor Natural», concluiu S. Ex.' que «o sentido desse postulado exige, para que se lhe dê aplicabilidade, a decisão de ato legislativo». Acolhe, por isso, o entendimento do voto do eminente Ministro Assis Toledo, no Superior Tribunal de Justiça, segundo o qual, até que venha a ser substituída por outra, a Lei Complementar n° 40/81, art., 7°, V, assegura ao Procurador-Geral de Justiça o poder de, «mesmo no curso do processo, designar outro membro do Ministério Público para prosseguir na ação penal, dando-lhe a orientação que for cabível no caso concreto». De minha parte, talvez não possa acompanhar os corolários mais radicais do postulado do «promotor natural». Creio ser indispensável precatar-se o intérprete de certo mimetismo, que compromete freqüentemente as reflexões sobre a organização do Ministério Público e se traduz na tendência de transplante cego de regras e princípios da magistratura judicial. O «promotor natural», sustenta-se, é decorrência inilidudível de dois tópicos da normativa constitucional da instituição: de um lado, o princípio da independência fimdanai (CF, art. 127, § 1°), de outro, a garantia de inamovibilidade dos seus membros (CF, art. 128, § 5°, I, b); além disso, teria ele implicações com o princípio do juiz natural e com a garantia do devido processo legal. É preciso contudo, não perder de vista que, no tocante ao Ministério Público e segundo o próprio texto constitucional, todos esses princípios hão de conviver com dois outros, o da unidade e o da indivisibilidade, os quais — malgrado respeitáveis colocações em contrário (v.g., Paulo César Pinheiro Carneiro, op. dt., pág. 46) — emprestam à organização interna da instituição colorido específico e prismas inconfundíveis com a da magistratura judicial 11. Os princípios da unidade e da indivisibilidade, enquanto predicados históricos do Ministério Público, têm significação própria e trazem consigo a idéia de uma organização hierarquizada e, com ela, a de certos poderes de direção de unia institui- R.TJ — 150 ção una, entre os quais os ide devolução — definido corno «o poder do superior hierárquico de chamar a si o exercício concreto da função do subordinado» (J. Figueiredo Dias, Direito ProcessualPaud, 1974, I/381) — e o de substituição — isto o de «designar outro subordinado para o exercício concreto da função do agente normalmente competente» (id. ibidem). Não obstante já não haja o inequívoco consenso de outrora sobre as dimensões de tais poderes de direção interna do Ministério Público, a sua implicação nos princípios de unidade e indivisibilidade ainda é uma afirmação constante (v.g. J. Frederico Marques, Elementos de Direito Processual Penal, 1961,11/47; Manzini, Tratado Direito Processual Penal, trad., 1949, II/376; J. Figueiredo Dias, op. dt., 1/368 ss.; Siracusa, Pubbilco Ministero no No- víssimo Digesto Italiano, XIV/540, 543 ss.): elaparte da convicção, aindadanhumte, sintetizada por Ângelo de Mania, ao proceder ao balanço do Convegno de Mantova, de 1973 (La Rifonna del Pubblico Ministero, Milano, 1974, pág. 27), de que existe un esigenza organizzativa imprescindibile pergü uflideld pubblico teto, direta all'azione e non alfa pura decisione, i quali, per adempiere utilmente ai fiei loro assegnati dana Costituzione e dalla legge devono potere svolgere azioni esterne coerenti e unitarie; abe pressuppone e impone una certa unitá interna di organizzazione. Se a Constituição explicitamente adotou a unidade e a indivisibilidade, ao lado da independência funcional, como princípios institucionais do Ministério Público, não se me afigura de bom aviso, para enfatizar o da última, que se venha a despir as primeiras de todo o seu significado essencial na teoria e na história da instituição. 15. Certo, como redargúi o eminente Relator, tais poderes de avocação e designação, «embora derivados da unidade e da indivisibilidade da Instituição, sofrem, 139 hoje, o condicionamento de outro princípio, também constitucional — o da inde, pendência funcional — e encontram limite na garantia da inamovibilidade que, alçada ao plano da Constituição, assiste, agora, de modo amplo, aos membros do Ministério Público». A questão da convivência da unidade e da indivisibilidade, de um lado, can a independência funcional, de outro, não é nova, nem parece oferecer dificuldades de maior vulto, no estágio contemporâneo das reflexões doutrinárias e das soluções legislativas sobre a organização do Ministério Público. Independência funcional, na temática do Ministério Público, não é expressão de sentido inequívoco. De fato. Numerosos autores a referem, não à liberdade de atuação dos seus membros, em face da sua organização interna, mas à independência da instituição, no tocante às suas atividades-fim, em relação aos vínculos de subordinação aos poderes políticos, particularmente do Governo, como também em relação aos órgãos jurisdicionais. Nesse sentido, à luz da Constituição italiana, é a observação de De Mattia (op. loc. dts., p4.26), para quem la garanzia costituzionale riguarda l'indipendenza degli uffici dagli altri potai, non l'organhaazione funzionaie interna. %mesma linha, entre outros, Frederico Marques ao notar que «assegurada a independência institucional do Ministério Público, nem por isso perderá a sua fisionomia atual de instituição hierarquizada, mas que se dirigirá Por si própria». 20. Não obstante, é certo que também já se tem relacionado a independência funcional ao membro do Ministério Público, individualmente considerado, com o sentido de não estar ele sujeito, na sua atividade funcional, particularmente na sua atuação processual, a ordens concretas do Procurador-Geral ou de outro órgão de direção. 140 R.TJ. — 150 Com esse sentido, de liberdade de consciência ou de convicção jurídica do membro do Ministério Público, porém, o que predominantemente se tem entendido, aqui e alhures, no propósito de conipatibilizá-la com a unidade hierarquizada da instituição, é que a independência funcional não ilide os poderes diretivos de evocação e de substituição. Assim, sustenta Figueiredo Dias (op. cit., 1/381) que «o conflito não é necessário e que, bem diferentemente, uma composição de interesses é aqui, em larga medida, possível». Para o notável jurista luso, «a solução que vê na convicção jurídica do subordinado um limite ao poder de direção do superior hierárquico (...) não tem que importar um risco considerável para a consecução das superiores finalidades político-criminais que à magistratura do Ministério Público cumpre realizar, pois sempre será possível fazer vingar a orientação do superior hierárquico, através do uso do poder de devolução e de substituição que lhe cabe». Aplaude Figueiredo Dias, a propósito, a conclusão do IV Congresso Interamericano do Ministério Público, realizado em Brasília, em 1972, segundo a qual, devendo a organização do Ministério Público fundar-se nos princípios de unidade e indivisibilidade, é de ressalvar, no entanto, «a faculdade de cada um dos seus agentes proceder segundo seu critério, em razão de que se deve prever um adequado procedimento de substituição» (Arquivos do Ministério da Justiça, v. 123/237). O que mais me impressiona, por isso, na construção da tese do «promotor natural», é a invocação da garantia da inamovibilidade dos membros do Ministério Público, «salvo por motivo de interesse público, mediante decisão do órgão colegado competente do Ministério Público, por voto de dois terços de seus membros, assegurada ampla defesa» (CF, art. 128, § 1°, b). Em pólo diametralmente oposto, dispunha o antigo Estatuto Judiciário português que «o Ministério Público constitui uma magistratura amovível». É significativo notar que Figueiredo Dias (op. cit., 1/30) tem precisamente «o direito de substituição» dos membros do Ministério Público como consectário do «caráter amovível desta magistratura». Assegurando, ao contrário, a Constituição brasileira, a inamovibilidade, segue-se, no ponto, a minha concordância, em princípio, com o exato raciocínio do Ministro Celso de Mello, no sentido de que «a inamovibilidade enquanto garantia subjetiva da independência, concerne não só ao cargo, mas, especialmente, às respectivas funções, que não poderão dele ser destacadas pelo Procurador-Geral e, por ato deste, deferidas a outro Promotor/Procurador». O que, segundo S. Ex.•, «equivaleria a justificaro descumprimento indireto da garantia de inamovibilidade e, como necessário deito conseqüencial, dar causa, injustificável, ao virtual esvaziamento das funções inerentes ao cargo ocupado por membro do Ministério Público». 27. Certo, o art. 29, ADCT permitiu que o membro do Ministério Público pudesse «optar pelo regime anterior, no que respeita às garantias e vantagens (...), observandose, quanto às vedações, a situação jurídica na data desta» (Constituição). Em outras palavras: admitiu-se a =teia às garantias mais amplas, entre elas, a de inamovibilidade, em troca da permanência do regime anterior de vedações mais limitadas. Daí não se segue, contudo, que as garantias dos agentes do Ministério Público se devam desqualificar ao nível de meras vantagens funcionais: cuida-se de um preceito transitório, que cria exceção temporária ao sistema permanente, para atender a interesses conjunturais de ordem corporativa, sem negar, com isso, a natureza e a finalidade das garantias, erigidas em favor do que se re- —150 puta mais adequado ao melhor desempenho das funções institucionais do órgão. Por outro lado, é certo que a inamovibilidade dos membros do Ministério Público, embora consagrada em termos substancialmente equiparáveis, não se identifica à dos juízes, precisamente porque — ao contrário do que sucede em relação à magistratura —, no Ministério Público a garantia há de conciliar-se com os princípios da unidade e da indivisibilidade, impostos no mesmo contexto da Lei Fundamental. A meu ver, não se cuidará, assim, de repelir os institutos deles decorrentes, da avocação e da substituição, mas, sim, de cercar o exercício desses poderes de cautelas contra o uso arbitrário ou casufstko de suas virtualidades. Nem me parece que o sistema constitucional constitua óbice à continuidade e ao aprofundamento da experiência de grupos especiais de promotores, dedicados a matérias específicas: na medida em que constituídos na forma da lei, o plexo de atribuições de tais equipes, ipso facto, estará subtraído da esfera protegida das atribuições legais culinárias do agente que tenha a sua demarcação na competência do juízo perante o qual sirva Estou, data venta, em que a opinião contrária é fruto do mesmo mimetismo a que aludi e parte da falsa idéia de que a rotina ronceira de que o oficio de cada órgão do Ministério Público deve ter atribuições coextensivas ao de um órgão judiciário. Nada, entretanto, o impõe e as conveniências da administração dos fins institucionais do Ministério Público freqüentemente o desaconselham. A questão já me preocupara quando, na Procuradoria-Geral da República, dediquei-me, com eminentes companheiros de trabalho, particularmente o il. SubprocurdorGeral da República, aqui presente, à formulação do projeto de Lei Orgânica do Ministério Público da União. Na mensagem, com que o encaminhei ao Congresso Nacional, acentuei: 141 «Ponto fundamental do projeto é o relativo às garantias dos membros do Ministério Público da União. A matéria revelou aspectos de grande complexidade, em especial, quando se cuidou de compatibilizar a inamovibilidade dos seus membros com os princípios da unidade e da indivisibilidade, aquele e estas consagradas na Constituição, o que tornou inadequado, no particular, a utilização dos parâmetros das garantias da magistratura. O projeto pretende ter adotalo solução que harmoniza a garantia e os princípios institucionais mencionados, estabelecendo a sede natural de cada um dos níveis das carreiras do Nfinistério Público da União, distribuindo-os, horizontalmente, em ofícios, mediante critérios objetivos fixados em lei, e disciplinando rigidamente as hipóteses de remoção ou substituição». 32. Orientação similar foi seguida no projeto do Executivo para a lei complementar de normas gerais para a organização do Ministério Público dos Estados, cuja elaboração se fez sob a direção do hoje em. Ministro Celso de Mello. 33.0 problema está, a meu ver, repito, não em vedar a avocação e a designação especial — que são instrumentos da unidade e da indivisibilidade da instituição, que a Constituição preservou —, mas, sim, em dar-lhes disciplina legal cerceadora do arbítrio. Nela, como acentuou o Relator, o exercício desses poderes, pelo ProcuradorGeral, «só se justificará, pois, nos limites estritos da lei e com respeito absoluto às atribuições funcionais do membro do Ministério Público, as quais constituem objeto de precisa discriminação legal». 34. É inegável, assim, em linha de princípio, que a concretização positiva da nova organização do Ministério Público, compatível, a um tempo, com os princípios institucionais e as garantias de seus membros, dependerá efetivamente de complementação legislativa. É o que resulta, aliás, das 142 R.TJ.— 150 várias remissões do texto constitucional pertinente à legislação sub-constitucional, complementar ou ordinária, que lhe desenvolva princípios e garantias (CF, arts. 127, § 2°, in fine; 128, §§ 3°, 4° e 5°; 128, § 5°, 11, c e e; 129, VI, VII e1X e 61, § 1°,11, d). De minha parte, não o nego. Nesse sentido, as normas que nos ocupam, isto é, a regra que define os princípios institucionais do Ministério Público — a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional (art. 127, § 1°) — assim como a da necessidade implícita de cotnpatibilizá-la com as que definem as garantias dos seus membros, entre elas, a inamovibilidade, a serem observadas nas leis complementares de organização (art. 128, § 5°,1), se enquadraria— observada a conhecida classificação da obra maior de José Afonso da Silva (Aplicabilidade das Normas Conslitudonais, 1968, pág. 114) —, na categoria das «normas constitucionais de princípio institutivo» ou «de princípio orgânico ou organizativo». São normas, explica o autor (Ib., pág. 115), que «contém esquemas gerais, um como que início da estruturação de instituições, órgãos ou entidades», donde serem «de eficácia limitada, porque é o legislador ordinário que lhes vai conferir executoriedade plena, mediante leis complementares ou ordinárias integrativas». Mais recentemente, Maria Helena Diniz (Norma Constitucional e seus efeitos, 1989), que segue, em linha gerais, o esquema de José Afonso, entre as normas de princípio institutivo — porquanto ~querem que o legislador estabeleça, mediante leis complementares ou ordinárias, esquemas gerais de estruturação e atribuição de órgãos, para que tenham aplicabilidade plena ou imediata» (ob. cik, pág. 103) — entre elas inclui a do art. 127, § 2°, onde a Constituição, após definir o Ministério Público, no caput, e lhe enumerar os princípios institucionais, no § 1°, remete à lei dispor sobre sua organização e funcionamento. Não contestando, assim, que a eficácia plena e a concretização positiva de tais normas demandem imprescindível complementação legislativa, o que, não obstante, ponho em discussão é a sobrevivência, incólume, até a edição das normas infraconstitucionais requeridas, da disciplina legal pré-constitucional, ainda no ponto em que se mostra incomportável no esquadro da nova ordem constitucional. Penso, de modo particular, na legitimidade da recepção, ainda que a título provisório, do poder monocrático do Procurador-Geral para, imotivadamente e sem previsão específica, substituir por agente do Ministério Público de sua livre escolha e para daeterminado procedimento em curso, o Promotor que nele deveria atuar segeado os critérios de distribuição decorrentes de sua designação para oficiar junto a determinado juízo criminal. Aqui, data varia, é que me parece que a conclusão do em. Relator briga com os postulados mais caros da reflexão contemporânea sobre a força normativa da Constituição e reduz regras e princípios basilares do esquema constitucional do Ministério Público a espécimes da ressurecta categoria das normas constitucionais simplesmente diretórias ou not self executing dos clássicos americanos. Note-se, entretanto, que nem essa velha classificação legitima a paralisia de normas proibitivas, como as que o Ministro Relator mesmo extraiu, com precisão dos textos constitucionais abordados: já advertia Black (apud Francisco Campos, Direito Constitucional, 1956,1/398), que a distinção entre mandatárias e diretórias não se aplica aos preceitos proibitivos (the tenra Miandatory' and `directory' are naturally not applicable to prohibitive statutes or those which simply for bid or denounce the doing of certain acta.) R.TJ — 150 De qualquer sorte —sabe-o, melhor que eu, o em. Ministro Celso de Mello —, atualmente, parte a metodologia do Direito Constitucional do axioma, sintetizado por José Afonso (ob. cit., pág. 75), de que «não há norma constitucional alimma destituída de eficácia. Todas elas irradiam efeitos jurídicos, importando sempre numa inovação de ordem jurídica preexistente à entrada em vigor da constituição a que aderem, e na instauração da nova ordem instaurada. O que se pode admitir é que a eficácia de certas normas constitucionais não se manifesta na plenitude dos efeitos jurídicos pretendidos pelo constituinte, enquanto não se emitir unia nomeação jurídica ordinária ou complementar, prevista ou requerida». No tocante especificamente às normas de princípio institutivo ou de organização -- como as de quae —, o jurista pátria depois de mostrar que «a norma constitucional dependente de regulamentação também entra em vigor na data prevista na Constituição» e, «desde que entrem em vigor, são aplicáveis até onde possam» (ob. dt., pág. 122) —, conclui, na linha de doutrina na contemporânea mais autorizada, que não obstante sua eficácia limitada, «se traçam esquemas novos, revogam normas jurídicas preexistentes, instituidoras de situações contrárias ao princípio nelas consubstanciados» (ob. dt., pág. 124). Para Maria Helena Diniz (ob. dt., pág. 101), tais normas de principio institutivo, porque dependentes de complementação legislativa, mão produzirão efeitos positivos, mas terão eficácia paralisante de efeitos de normas precedentes incompariveia e impeditivas de qualquer conduta contrária ao que estabelecerem». Ainda entre nós, e. referindo-se à mesma categoria de normas, Rosal Russomano adverte que elas, «face a elementos autônomos que apresentem são aplicáveis até onde o possam ser» e, por isso, infletem sobre «a legislação anterior». (Das Normas Programáticas em Tendências Atuais 143 do Direito Público, Econ. Afonso Arinos, Forense, 1976, 267, 275). Sem sair do mundo lusófono, é imprescindível lembrar Jorge Miranda (Manual de Direito Constitucional, 2' al.,11) e J.J. Gomes Canotilho (Constituição Dirigente e %Inalação do Legislador, 1982, e Direito Constitucional, 4' ed., 1986). De Jorge Miranda (ob. cit., 11/217 ss.), depois da peremptória afirmação de que nenhuma norma constitucional, preceptora ou programática, «é mera proclamação política ou cláusula não vinculativa», a enumeração, em primeiro plano, como efeito da «força jurídica das normas programáticas», ode que «elas determinam a cessação da vigência, por inconstitucionalidade superveniente, das normas legais anteriores que dispunham em sentido contrário». Canotilho, de seu turno —que dedicou à «compreensão das normas programáticas» sua monografia notável —, no curso (Direito Constitucional, cit., pág. 135), aceita igualmente que «as normas constitucionais programáticas tenham efeito 'derrogatório' ou 'invalidante' (por inconstitucionalidade superveniente) dos preceitos legais anteriores não conformes com as mesmas». No caso concreto, coube ao em. Relator evidenciar, a meu ver de modo conclusivo, a incompatibilidade entre os princípios e garantias constitucionais do Ministério Público e o exercício indiscriminado pelo Procurador-Geral dos poderes de avocação e substituição, que «só se justificará (...) nos limites atritos da lei e com respeito às atribuições funcionais do membro do Ministério Público». 51. Daí me parecer que — não obstante a positivação de todas as visualidades dos princípios referidos e de sua conciliação dependa da obra complementar de concretização legislativa —, enquanto ela não sobrevenha, da vigência mesma da Constituição irradia-se o efeito paralisante — derro- 144 R.T.J. — 150 gatório ou invalidante, corno se queira — de normas (ou, pelo menos, da interpretação anterior de normas) preexistentes, contrárias à nova sistemática. Aliás, ninguém duvidará de que é de eficácia negativa plena e imediata o inciso que outorgou aos membros do Ministério Público a inamovibilidade. Se esta — como entende o Ministro Celso de Mello, can a minha adesão —, é incompatível com a substituição por ato individual sem parâmetros legais predeterminados, do Promotor com atribuições legais para o caso —, na ausência das nonas infraconstitucionais, que o disciplinem, o que se há de paralisar não é a garantia, mas, sim, o poder de designação que, repito o Relator, dado o condicionamento imposto pelo novo sistema constitucional, «só se justificará (...) nos limites estritos da lei». Certo, a norma constitucional cuja recepção, se pretende, validaria o ato questionado do Procurador-Geral de Justiça — o art. T' V, LC 40/81 — é o que atribui o poder de «designar, na forma da lei, membro do Ministério Público para o desempenho de funções administrativas ou processuais, afetas à instituição». A cláusula, «na forma da lei», a que ficou condicionada a atribuição, logo se vê, dispensaria a rigor cogitar-se de revogação ou inconstitucionalidade superveniente: a inexistência de condicionamentos legais, compatíveis com o novo regramento constitucional do Ministério Público, levaria apenas à paralisia temporária do poder. Aliás, de logo se me afigura que não é mais praticável, sob a Constituição vigente, que os poderes de devolução e substituição se possam confiar ao exercício unipessoal do Procurador-Geral, com alheamento do colegiado superior do Ministério Público. Parece curial, com efeito, que, sendo a garantia da inamovibilidade a condicionante básica dos referidos poderes hierár- quicos, de seu exercício não se pode subtrair a participação do órgão colegiado ao qual se cometeu o papel decisivo no juízo do interesse público na remoção do membro do Ministério Público, que se admitiu como ressalva da mesma garantia. 58.0 raciocínio tem a ver com um precedente do Tribunal, que me é muito caro, porque página relevante de momento decisivo da minha vida. Refiro-me ao MS 19.615, de 18-9-69, rel. o em. Ministro Eloy da Rocha, cuja ementa lhe resume bem o raciocínio — RTJ 54/216: «Promoção, por antigüidade, de membro do Ministério Público da Justiça do Distrito Federal; recusa de indicação do mais antigo. Não é admissivel a transferência, ao Chefe do Ministério Público, de atribuição excepcional, conferida ao Conselho, pela Lei n° 3.434, de 20-7-58, só exercitável em condições especialmente previstas na lei, isto 4 quando a vontade do órgão colegiado se manifestasse pela maioria qualificada de 2/3 dos votos. Vulneração do princípio da carreira do Ministério Público e negação do direito à classificação segundo a antigüidade». Mutatis rautandis, no sistema vigente, não podem remanescer na esfera da decisão solitária do Procurador-Geral poderes excepcionais que afetam a garantia da inamovibilidade, se a segurança desta foi entregue, na Lei Fundamental, ao contrário do que sucedia na ordem constitucional anterior — (CF 69, art. 95, 1°, in fine), à decisão da maioria qualificada de um colegiado da instituição: foi essa a fórmula constitucional de proscrição, no campo delicado dessa garantia básica, da margem de subjetivismo e de arbítrio que é inerente a toda decisão individual discricionária. Não se trata, é certo, de uma dedução lógica de preceitos inequívocos, mas, na ausência de disciplina complementar, de uma tentativa de concretização conciliadora do que Canotilho chamaria «momentos R.T.J —150 de tensão ou antagonismo entre os vários princípios» votados, na Constituição, à estruturação do Ministério Público. É significativo, aliás, que a submissão do exercício da avocação ou da designação especial à anuência prévia ou ao referendo dos colegiados superiores da instituição tenha sido a solução proposta por ambos os projetos referidos, de Lei Orgânica, do Ministério Público da União (art. 49, VI e VIII) e da lei nacional de bases do Ministério Público dos Estados (art. 10, IX, g). De qualquer sorte, Sr. Presidente, seja essa ou não a solução que validamente se possa construir para a espera da complementação legislativa que o tema reclama, basta, no caso concreto, a impossibilidade de conciliar os princípios da nova estruturação do Ministério Público, gizados com mestria pelo em. Relator, com a sobrevivência de substituições arbitrárias, de aparência casuística e com indícios veementes de desvio de poder, como a que se questiona na impetração. Com escusas pela inesperada extensão do voto, peço vênia ao Ministro Relator para deferir o habeas corpus para anular o processo, incluída a denúncia:é o meu voto. EXTRATO DA ATA HC 67.759 — RI — Rel.: Mia Celso de Mello. Pactes.: Cada Esteves de Azevedo Guedes e outra. Impte.: Nélio Seidl Machado. Coator: Superior Tribunal de Justiça. Decisão: Após o voto do Sr. Ministro Relator, que indeferia o pedido, e o voto do Sr. Ministro Sepúlveda Pertence, que deferia o «habeas corpus» para anular o processo, o julgamento foi adiado em virtude do pedido de vista do Sr. Ministro Marco Aurélio. O Tribunal, por unanimidade, deferiu o pedido do Impetrante no sentido de ser suspensa a realização de audiência de instrução e julgamento, já designada para o dia 1° de agosto, até a conclusão do julgamen- 145 to. Falaram: pelas Partes: o Dr. Nélio Seidl Machado e pelo Ministério Público Federal o Dr. Affonso Hemiques Prates Correia. Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Moreira Alves, Aldir Passarinho, Sydney Sanches, Octavio Gallota Célito Borja, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Vefioso e Marco Aurélio. Procurador-Geral da República, o Dr. Affonso Henriques Prates Correia, substituto. Brasília, 28 de junho de 1990 — BC:rectas Bonifádo Ferreira, Secretário. COMUNICAÇÃO O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): Submete-me, hoje, o ilustre impetrante, petição em que esclarece fatos cujo conhecimento pede seja transmitido à Corte, por seu possível relevo na resolução desta causa, verbis: «O advogado Nélio Roberto Seidl Machado, impetrante do habeas corpus em epígrafe. Pacientes, Carla Este- ves de Azevedo Guedes e Elaine Estrela, vem a V. Ex.'requerer a apresentação dos documentos em anexo, os quais evidenciam, permissa venia, que o Promotor Especial, designado pelo Procurador-Geral em 10 de março de 1989, jamais recebeu atribuição específica para promover Ação Penal contra as pacientes, eis que os poderes que foram mencionados no ato GPGP If 80/89 dizem respeito tão-somente às tarefas de 'acompanhar o inquérito policial n° 32/89, instaurado na Delegada de Entorpecentes e todos os demais inquéritos ou flagrantes instaurados para apurar infrações penais resultantes da denominada Operação Bandeja, para repressão ao tráfico de entorpecentes'. Como se vê, nenhuma atribuição foi deferida em prol do Promotor Especial, no sentido de alijar, para a eventual propositura da Ação Penal, o Promotor Ti- 146 R.TJ. — 150 colar da 5' Vara Criminal do Rio de Janeiro, tratado na impetração como promotor natural De derradeiro, anexa-se, também, a última cota da lavra do Promotor Especial nos autos do Inquérito n° 032/89, identificado em juízo pelo n° 6630, bem assim outra manifestação do Ministério Público, da lavra da Promotora Gizelda Leitão Teixeira, inferindo-se das mesmas que, tal como salientado da Tribuna, quando da sustentação oral, a investigação acerca da rumorosa 'operação bandeja' continua em aberto, positivando-se, desse modo, de forma insofismável, o constrangimento que é objeto do writ. Rogando a V. EX.. que dê conhecimento desses fatos ao Plenário desse Col. Supremo Tribunal Federal, justifica o impetrante a postulação pela circunstância de que, sob a fé de seu grau, deu conhecimento à Corte do que aqui agora resta comprovado.» Essa petição vem instruída, dentre outros documentos, por uma portaria do Procurador-Geral de Justiça, cujo teor é o seguinte: «O Procurador-Geral de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, no uso de suas atribuições legais, resolve designar o Dr. Luiz Carlos Rodrigues da Costa, Promotor de Justiça de 1' Categoria, para, sem prejuízo de suas atribuições como representante do Ministério Público, acompanhar o inquérito policial n° 32/89, instaurado na Delegacia de Entorpecentes e todos os demais inquéritos ou flagrantes instaurados para apurar infrações penais resultantes da denominada 'Operação Bandeja', para repressão ao tráfico de entorpecentes.» Há, ainda, instruindo o pedido do impetrante, uma manifestação do Promotor especial em que este representante do Ministério Público determina à autoridade poli- cial, encarregada das investigações, uma série de diligências. O retardamento na execução das providências investigatórias levou a Promotora referida na petição do impetrante a criticar, em termos veementes, a desídia do organismo policial: «MM Dr. Juiz, Nada foi feito na última baixa Um absurdo que inquérito de tal relevância receba do responsável tratamento tão desidioso, consubstanciado na certidão de fl. 658. Pela baixa para efetivo cumprimento da promoção de fls. 614 ut 617.» Esse expediente foi recebido, em abril de 1990, pela autoridade policial, que determinou o integral cumprimento das diligências requisitadas pelo representante do Ministério Público. O Sr. Ministro Moreira Alva: Eles alegam, em última análise, que o Procurador está ilegalmente desempenhando o mister de Promotor? O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator: Sim. O Sr. Ministro Moreira Alves: Então essa circunstância muda completamente o panorama do caso, pois surge a questão de saber se o Promotor está funcionando ilegalmente. O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): Esta é uma questão cujo efetivo esclarecimento depende da análise do próprio processo penal condenatório. O Sr. Ministro Moreira Alves: Há prova disso: Se não há, será o caso de pedir... O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): Existe uma portaria do ProcuradorGeral de Justiça; contudo, os elementos existentes nestes autos não me permitem uma resposta categórica. Posso apenas acentuar que a leitura da portaria do Procurador-Geral parece indicar que o Promotor especial teria agido ultra vires, excedendo os limites de uma mera designação admi- R.T.J —150 nistrativa que limitou a sua atuação à fase da investigação policiai O Sr. Ministro Marco Aurelio: Agora há =pormenor: quando da designação do Promotor especial, o inquérito já estava distribuído à 5' Vara Criminal, onde havia o titular. O Sr. Ministro Moreira Alves: O grande problema é que se trata de babem corpus, e não temos os autos da ação penal. A meu ver, deve-se converter o julgamento em diligência. O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): Não me oponho a que se converta em diligência este julgamento, para o efeito indicado, a fim de que esta ação de babou corpos venha a ser julgada — tal como preconizado em meu voto e no do em. Mm. Sepúlveda Pertence — à luz do princípio do Promotor Natural e não em face de um eventual excesso, cometido pelo Promotor designado, no que concerne às atribuições que lhe foram conferidas em portaria pelo Procurador-Geral de Justiça. O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Tanto mais que o Procurador-Geral, opinando, interpreta o seu próprio ato como tendo efetivamente designado o Promotor para oficiar nos casos específicos, inclusive, para oferecer a denúncia questionada. O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): De qualquer maneira, Sr. Presidente, concordo com a proposta de conversão do julgamento em diligência, formulada pelo a Ministro Moreira Alva. PROPOSTA DE DILIGÊNCIA O Sr. Ministro Moreira Alves: Sr. Presidente, não me sinto em condições de julgar. Assim, proponho que se converta o julgamento em diligência para que se requisitem os autos principais. VOTO (S/DILIGÊNCIA) O Sr. Ministro Marco Aurélio: Sr. Presidente, creio que até certo ponto já revelei o meu convencimento a respeito, ao apon- 147 tar que a atuação do Promotor especial se fez após a distribuição do inquérito. Para não parecer incoerente, posteriormente, assumindo essa posição e, portanto, deixando transparecer a irrelevância da vinda dos autos, faço este registro e concordo com a diligência. Sr. Ministro Moreira Alves, V. Ex.' me permite? De qualquer forma, temos a discussão em torno da figura do Promotor natural. Porque? Porque, coma designação ocorrida, afastou-se aquele que normalmente atuaria no inquérito, tanto que o inquérito subiu à Vara e o Promotor titular da 5' Vara Criminal chegou a lançar nos autos cota quanto à liberdade provisória das Pacientes. O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): A colocação feita pelo eminente Ministro Marco Aurélio, na verdade, tendo presente a concepção formulada pela doutrina em tomo do postalado do promotor natural, é justificável. É um conceito novo que emerge do texto constitucional promulgado em 1988. No Estado de São Paulo, esse princípio já se acha positivado na Lei Orgânica do MP paulista desde 1982. Mas, o princípio do promotor natural, pela sua amplitude, estende-se à fase préprocessual; abrange, também, os procedimentos administrativos, de caráter investigatório, como o são os inquéritos policiais. O Sr. Ministro Moreira Alva: Não é isto que se está atacando. O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): Inobstante estas observações, e atendendo à tradição da Corte, concordo com a proposta de V. Ex.', de conversão do julgamento em diligência, para efeito de esclarecimento pessoal. O Sr. Ministro Néri da Silveira (Presidente): Ministro Moreira Alves, vamos limitar a questão por ora à proposta de conversão do julgamento em diligência. 148 R.T.J. —150 CONFIRMAÇÃO DE VOTO O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): Sr. Presidente, trata-se da questão pertinente ao denominado Promotor Natural, em que já houve dois votos, o do eminente Ministro Sepúlveda Pertence e o meu próprio, ambos reconhecendo implícito, embora com conclusões diversas, o princípio do Promotor Natural no novo ordenamento constitucional brasileiro. Quando do prosseguimento do julgamento, o ilustre impetrante peticionou, esO Sr. Ministro Carlos Venoso: Sr. Pre- clarecendo que nenhuma atribuição fora sidente, o fundamento principal da impe- deferida, formalmente, ao Promotor Espetração é que consagraria a Constituição Fe- cial, com o objetivo de viabilizar o ajuizaderal a figura do promotor natural, por isso mento de ação penal contra as ora pacienque, num certo processo criminal, o Procu- tes, razão pela qual teria ele, o Promotor rador-Geral teria designado um outro pro- Especial, agido ultra vires, além dos limimotor, que não o titular da Vara, para fun- tes materiais estabelecidos na portaria de cionar. Se a designação foi correta, podere- sua designação subscrita pelo Procuradormos enfrentar a questão do promotor natu- Geral de Justiça. ral. Senão há designação, a ilegalidade será Por essa razão, converteu-se o julgaoutra. mento em diligência, a fim de que fossem Imprescindível a diligência, a meu juí- requisitados os autos principais, ora apenzo. sados ao presente habeas corpus. Neles, constata-se a seguinte situação: a denúncia EXTRATO DA ATA foi oferecida em 29-3-89, e recebida em HC 67.759 — RJ — Rel.: Min. Celso de 3-4-89, sem que, para tanto, dispusesse de Mello. Poetes • Carla Esteves de Azevedo poderes o Promotor Especial, designado, Guedes e outra. Inipte.: Nélio SeidlMacha- tão-somente, para acompanhar as investigações policiais. No entanto, o Procuradordo. Coator: Superior Tribunal de Justiça Geral de Justiça baixou uma segunda porDecisão: Por unanimidade o Tribunal taria, em 5-4-89, ampliando as atribuições converteu o julgamento em diligência, de- do Promotor Especial, com a finalidade de terminando a requisição dos autos princi- conferir-lhe, também, poderes de atuar não só em todos os inquéritos policiais, como, pais. Votou o Presidente. por igual, nas ações penais deles eventualPresidência do Sr. Ministro Néri da Sil- mente resultantes e concernentes àdenomiveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros nada «Operação Bandeja». Nesse segundo Moreira Alves, Aldir Passarinho, Sydney ato, o Chefe do Ministério Público ratificou Sanches, Octavio Ganotti, Célio Boda, Paulo o oferecimento da denúncia pelo Promotor Brossard, Sepúlveda Pertence, Celso de Mel- Especial. lo, Carlos Venoso e Marco Aurélio. ProcuEntendo que essa ratificação é perfeitarador-Geral da República, o Dr. Aristides mente possível, pelo que a portaria do SeJunqueira Alvarenga. nhor Procurador-Geral de Justiça, de Brasília, 8 de agosto de 1990 — Hérce- 5-4-89, legitimou qualquer possívele eventual defeito de ordem formal, no oferecilua Bonifácio Ferreira, Secretário. O Sr. Ministro Marco Aurélio: Concluindo, Presidente, reconhecendo que muito embora estejamos apreciando habeas corpus impetrado contra decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça em recurso interposto em habena corpos, com a ressalva que já fiz, voto a favor da diligência, uma vez que alguns Colegas, pelo menos dois, já se manifestaram no sentido da necessidade de os autos virem à Mesa. VOTO (S/DILIGÊNCIA) R.TJ —150 mento da peça acusatória pelo Promotor Especial. Assim, reitero o meu voto, o qual, não obstante haver reconhecido presente em nosso sistema constitucional o princípio do Promotor Natural, orientou-se no sentido de indeferir este habeas corpos pelas razões já longamente expostas. VOTO (VISTA) O Sr. Ministro Marco Aurélio: Os presentes autos revelam que, em inquérito policial, distribuído à Quinta Vara Criminal do Rio de Janeiro, oficiou. Titular nos seguintes termos: «O M.P. manifesta-se pela concessão de liberdade provisória mediante fiança e, assim procede porque, efetivamente, o auto de prisão em flagrante é carente de qualquer elemento que indique o exercício de tráfico ilegal de entorpecente por parte das indiciadas. A hipótese no mesmo descrita é, no máximo, aquela prevista no artigo 16 da Lei n° 6.368/76, tratando-se, portanto, de delito aflançável» (fl. 69). Lançada a referida cota em 9 de março de 1989, no dia imediato o ilustre Procurador-Geral de Justiça houve por bem designar o Promotor Dr. Luiz Carlos Rodrigues da Costa para, «sem prejuízo de suas atribuições, como representante do Ministério Público, acompanhar o inquérito policial n° 3289, instaurado na Delegacia de Entorpecentes e todos os demais inquéritos ou flagrantes instaurados para apurar infrações penais resultantes da denominada 'Operação Bandeja', para repressão ao tráfico de entorpecentes» (fl. 74). Daí, a denúncia de fis. 51 a53, mediante a qual o Promotor designado, em ótica diametralmente oposta a do Titular da Quinta Vara Criminal, enquadrou a hipótese na previsão do art. 12 da Lei n° 6.368176. 2.O Impetrante sustenta a nulidade processual, porquanto o afastamento do Titia- 149 lar da Quinta Vara Criminal e a designação de outro membro do Ministério Público para, no mesmo Juízo, atuar em um único processo, estaria a configurar transgressão ao princípio do «Promotor Natural», alçado pela Carta de 1988 ao patamar constitucional. 3.0 nobre Ministro relator assim sintetizou a questão: «Inobstante reconheça imanente ao novo regramento constitucional pertinente ao Ministério Público o princípio do Promotor Natural, não vislumbro, na situação concreta emergente desses autos, hipótese que enseje a sua atuação, pois o sentido desse postulado exige, para que se lhe dê aplicabilidade, a edição de ato legislativo». 4. Na assentada em que teve início o julgamento, externou o Ministro Sepúlveda Pertence o desejo não só de adiantar o voto, face a estudo realizado após pedido de vista na Turma, como também o de fazê-lo antes daqueles que lhe antecedoriam na votação, ocorrendo concordância implícita, originária, de minha parte, da deliberação já tomada de fazer estudo da matéria Adotou S. Ex.' as premissas do voto do Relator, concluindo, no entanto, pela concessão da segurança, já que: «De qualquer sorte, Sr. Presidente, seja essa ou não a solução que validamente se possa construir para a espera da complementação legislativa que o tema reclama, basta, no caso concreto, a impossibilidade de conciliar os princípios da nova estruturação do Ministério Público, gizados com mestria pelo eminente Relator, com a sobrevivência de substituições arbitrárias, de aparência casuística e com indícios veementes de desvio de poder, como a que se questiona na impetração.» O voto mostrou-se conclusivo no sentido do deferimento do pedido formulado no 150 R.TJ. — 150 presente habeas corpo, para anular o processo, incluída a denúncia. 5. É inegável assistir ao Procurador-Geral de Justiça a atribuição de designar membro do Ministério Público para o desempenho de funções administrativas ou processuais afetas à instituição — artigo 7° da Lei Complementar n° 40/81. Decorre tal atribuição da necessidade de racionalizar-se os serviços, procedendo-se de forma global e, portanto, tendo presente critério objetivo. E isto ocorreu na hipótese dos autos. Determinado membro do Ministério Público foi lotado, como Titular, na Quinta Vara Criminal do Estado do Rio de Janeiro, desempenhando a atividade pertinente ao cargo de Promotor Público de forma indiscriminada, ou seja, em relação a todos os processos nela em tramitação. Daí haver lançado cota nos autos do Inquérito Policial n° 032/89, reveladora não só da posição favorável do Estado quanto à liberdade provisória das Pacientes, como também da fragilidade do auto de prisão em fisga visto que os fatos nele descritos estariam, no máximo, — e esta foi a expressão utilizada, a configurar hipótese enquadrável no artigo 16 da Lei n° 6.368/76. Até então, viram as Pacientes observadas normas constitucionais básicas que asseguram, considerado o sentido amplo, e assim deve ser percebido, o exercício do lídimo direito de defesa. As condições do caso, as particulares das acusadas, não ditaram providências discrepantes do quadro normalmente verificado, logrando elas, face ao pronunciamento ocorrido, a liberdade provisória Eis que, no dia imediato ao do lançamento da cota nos autos pelo Titular do Ministério Público junto à Vara para a qual foi distribuído o inquérito, o ProcuradorGeral de Justiça resolveu, de ofício, designar Promotor específico para acompanhar o inquérito policial referido, aludindo de forma expressa a este último, bem como, de forma genérica, a outros instaurados para apuração de infrações penais resultantes da denominada «Operação Bandeja». Com isto, a visão do Estado quanto ao citado inquérito modificou-se substancialmente, vindo à balha denúncia a envolver o tráfico de drogas e, portanto, o enquadramento das Pacientes no artigo 12 da citada Lei Especial — fls. 51 a53. A Constituição Federal contém preceitos que encerram a obrigatoriedade de respeitar-se o devido processo legal: «Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes» (inciso LV do artigo 5°). «Ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade compe- tente» (inciso LIII do artigo 5°). Inegavelmente, a existência deste último dispositivo legal revela alcance que excede a simples previsão do juiz natural. A uma, porque, ao contemplar garantia constitucional, o faz com extravasamento do campo alusivo ao ofício judie ante. Junge a prolação da sentença ao princípio do juiz natural, é certo, mas também revela a obrigatoriedade de observar-se o balizamento processual que outro não é senão o previsto na legislação em vigor. A duas, porquanto, estivesse o preceito limitado à inserção do princípio do juiz natural como garantia constitucional, forçoso seria dizer da redundância, isto mediante revelação de mandamentos com idêntico sentido, embora em incisos diversos. É que o de número XXXVII, do mesmo artigo, prevê, este sim, que não haverá juízo ou tribunal de exceção. Logo, impossível é deixar de reconhecer no inciso LIII sentido que extrapola o campo pertinente à competência do juízo. A alusão à impossibilidade de alguém vir a ser processado senão pela autoridade competente diz respeito às normas processuais e estas, iniludivehnente, abarcam os pressupostos de desenvolvimento válido do pro- R.TJ 150 cesso e dentre estes exsurge a legitimidade ad processum e que, no caso, quanto ao Estado, é revelada pela atribuição conferida ao Promotor Público. Ora, o elemento definidor da citada legithnidade fez-se na designação de determinado Promotor para, indistintamente, atuar nos processos em tramitação na Quinta Vara Criminal. Observada a premissa segundo a qual o processo deve seguir a tramitação prevista na legislação em vigor, conclui-se que as Pacientes não tiveram respeitado o que lhes assegura a própria Constituição, quer considerado o sentido lato da expressão «juiz natural», quer em relação ao conhecimento prévio do próprio legitimado para o processo na figura tão importante que é a do acusador. Embora conhecedoras, de início, tias regras estabelecidos, viram estas últimas serem, de uma única penada e sem a provocação de que cogita o artigo 28 do Código de Processo Penal — do Juiz da Vara— modificadas e, o que é pior, após lograrem enfoque amplamente favorável quanto à tipicidade do fato. Em síntese, assentou-sélhes que o Juízo sentido lato — mostrouse desde logo completo quanto aos particise pantes da relação processual, mas passível de profunda modificação de acordo com os desdobramentos do caso, como se autuação do Ministério Público não estivesse direcionada, também, à busca, com isenção, da chamada verdade real. Passaram a sei processadas mediante atuação de Promotor Especial --- e entenda-se nessa expressão o sentido da escolha —, olvidandose, com isto, a excomunhão, em termos constitucionais, do juízo de exceção, a vinculação a formalidades de caráter abstrato inciso LEI — e, ainda mais, a igualdade que é o lastro de urna série de direitos — homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações nos termos desta Constituição inciso I do mencionado artigo 5°. Sem mais nem menos ignorando-se até mesmo a distribuição do inquérito já ocor- 151 rida, designou-se uni acusador para o caso concreto, ao que tudo indica face ao descontentamento individual do Sr. Procurador-Geral com a atuação daquele que se mostrou e continuou a se mostrar apto em relação à totalidade dos demais processos em Mimitação na Vara em que lotado como Titular. Se de um lado compete ao ProcuradorGeral a designação, de outro há que se assentar a vinculação à lei. Sem fato contemplado por esta, o afastamento compulsório da4úele legitimado ad processam para, em nome do Estado, promover a acusação e a substituição, em único processo, por outrem e, mais ainda, após promoção favorável aos acusados, vulnera, a um só tempo, os preceitos pertinentes à proibição dó juízo ou'tribunal de exceção de processar-se ao arrepio das normas previamente conhecidas e, também, o que assegura a ampla defesa, pois afastou-se o equilíbrio verificado pela atuação, ao que se presume eqüidistante, do Promotor originário. Discriminou-se, de forma atentatória, ao direito das Acusadas de terem o mesmo tratamento deferido àqueles envolvidos nos demais processos em tramitação na referida Vara — inciso XLI do artigo 5° da Constituição. Dessarte, já aqui somo meu voto ao do ilustre Ministro Sepúlveda Pertence e, no particular, também peço vênia ao nobre relator —não menos ilustre e douto Ministro Celso de Mello, para incorporar as premissas lançadas no voto que proferiu e que revelam, como irrefutável, a conclusão em torno da estatura constitucional do princípio Promotor Natural. Faço-o não só pelas razões já consignadas e que agitam os preceitos constitucionais dos incisos I, XXXVII, LM e LV do artigo 5°, como também por considerar que os princípios de estatura constitucional geram, independentemente de lei regulamentadora, direitos e garantias — principalmente estas — não referidos expressamente no citado artigo, 152 R.T.J. —150 aliás como previsto no parágrafo segundo a ele vinculado: «Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte». Constando do corpo da atual Carta, quanto à atuação do Ministério Público, muito mais para salvaguarda da própria sociedade, como ressaltado pela melhor doutrina — Sérgio Demoro Hamilton e Paulo César Pinheiro Carneiro —, os predicados da independência funcional — § 1° do artigo 127 e da inamovibilidade — alínea b do inciso 1 do artigo 128, há que se ter o deslocamento da acusação, como ocorrido, ou seja, à livre discrição do Procurador-Geral de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, como violador do direito comezinho das Pacientes de verem observadas as regras previamente estabelecidas e, portanto, de não serem surpreendidas com a designação de um Promotor Especial. Vale ter presentes as palavras do Ministro Antonio Neder, lançadas mediante voto proferido no habeas corpos n° 48.728, em 26 de maio de 1971, julgado pelo Pleno, cujo Acórdão foi publicado na Revista Trimestral de Jurisprudência, págs. 299/339: «Que o princípio da legalidade da ação penal diz respeito aos atos do processo, à competência do juiz e também à legitimidade do acusador. Em nosso sistema judiciário não há acusador sem que a lei o nomeie; em outras palavras, o acusador há de ser sempre e necessariamente o acusador legal, isto é, aquele que for previsto em lei ... entre nós, domina o princípio da legalidade da ação penal, ou, mais precisamente, o da legalidade comum ou ordinária da ação penal, tanto que o artigo 153, § 15, da Constituição, texto da Emenda n° 1, expressa que não haverá tribunais de exce- ção, vedado é o juiz de exceção; ora, se é proibido o tribunal de exceção, vedado é o juiz de exceção; se é vedado instituir juízo de exceção, impedido é conceberse o acusador de exceção, pois não se compreende que nossa Constituição proíba o juiz de exceção e admita o acusador de exceção, isto é, conceda e ao mesmo tempo subtraia uma garantia». E acabou por arrematar: «O Promotor de Justiça da Comarca de Guarulhos se encontra no exercício de seu cargo de acusador oficial e a Ele, só a ele, se pode cometer a acusação na ação penal de que este processo ter a acusação na ação penal de que este processo dá notícia isto por causa do princípio de que o acusador é sempre o legitimado e não o escolhido por esta ou aquela autoridade, categorizada que seja, tanto mais justa esta conclusão quanto é certo que a nomeação de outro acusador importa em retirar, de tal promotor de justiça, a sua atribuição de acusar, isto com ofensa manifesta à sua estabilidade garantida, como se sabe pela Constituição (art. 96)». Hoje, robustece-se o enfoque conferido à matéria pelo Ministro Antonio Neder, pois a inamovibilidade constitucional está contida de forma explícita em dispositivo legal para mim de eficácia imediata, quer porquanto encerra um princípio indispensável à atuação independente do Órgão, quer porque nele já se contém disciplina exaustiva. A regra está prevista sem o silêncio quanto à exceção — esta corte à conta do interesse público e não prescinde da deliberação de colegiado (no caso, o Promotor Titular foi afastado por ato do Procurador-Geral de Justiça), assegurada, de qualquer forma, a ampla defesa Contudo, ainda que assim não fosse, mesmo que se possa dizer da necessidade de regulamentação, impossível é olvidar o princípio revelado no dispositivo constitu- R.T.J — 150 cional, a gerar direitos, como previsto no 2° do artigo 5°, sendo certo que possível dependência de balizamento legal do alcance da inamovibilidade aos citados direitos não prejudica, constituindo-se, nisto sim, em quadro inibidor de inciativas como a revelada nestes autos. Em resumo, a ausência de regulamentação não exclui a inamovibilidade em si, afastando, sem a menor dúvida, a instabilidade própria aos atos praticados à livre discrição, sob pena de alijarse aquela — a inamovibilidade — solapando-se, assim, a independência inerente à atuação dos órgãos do Ministério Público. Dentre as interpretações imagináveis deve prevalecer a que empreste ao dispositivo legal alguma eficácia, e não a que o torne inócuo, potencializando-se, com isto, o princípio fundamental nele inserido e que está voltado à segurança jurídica. Muito embora não conste alusão na Portaria, e colocando em plano secundário, por absurdo, a origem individual e não colegiada do ato, impossível é vislumbrar o interesse público no simples fato de o Titular da acusação haver concluído pela fragilidade do auto de prisão em flagrante e assentido quanto a requerimento em torno da liberdade provisória e configuração, no máximo, de consumo e não tráfico de entorporcentes, pois o que se espera do Ministério Público quer como parte, quer como fiscal da lei é atuação voltada à verdade real. As garantias do Ministério Público, tais como as pertinentes aos magistrados, extravasam, como já foi dito, o campo dos interesses respectivos para alcançar o dos que integram a vida gregária e, até aqui, ninguém colocou em dúvida as relativas aos segundos, especialmente as que cogitam da inamovibilidade, da vitaliciedade e da irredutibilidade de vencimentos. A rigor, frente à Carta, a substituição do Promotor Titular, ou seja, daquele que a priori é destinatário de atribuição que o 153 torna legitimado à atuar em nome do Estado, somente pode ocorrer nas hipóteses de suspeição, impedimento, ausência em virtude de faltas, férias ou licença e na pertinência do artigo 28 do Código de Processo Penal. Estes são, em síntese, os casos que encontram agasalho na ordem jurídica em vigor. Extravagante é a substituição verificada à livre discrição do Procurador-Geral, mormente a ponto de desautorizar o membro do Ministério Público que vem atuando e de alcançar, solapando-a, a segurança dos jurisdicionados. Conflita com a noção que se tem do devido processo legal a variação da figurado acusador em meio à tramitação do processo e, portanto, sem que tenha tornado conhecimento com anterioridade. A independência do Ministério Público não se coaduna com quadro que revele a existência de um superórgão retratado na pessoa do Procurador-Geral que, enfim, nada mais é do que um membro da importante instituição e que logrou, no campo político, a confiança maior e, por isso mesmo, de cunho subjetivo, indispensável ao exercício da função. Os esforços deste destacado membro devem estar dirigidos ao fortalecimento da Instituição, a angariara confiança dos cidadãos e, com isto, é de todo incompatível a interferência de oficio e sem justificativa ligada ao interesse público que implique o afastamento daquele a quem se atribuiu, anteriormente e de forma genérica, a incumbência de atuar em nome do Estado. Com este paralelo entre a inamovibilidade do Ministério Público — princípiogarantia dos que o integram, com os interesses e direitos das Pacientes, acompanho nobre Relator quanto às premissas do brilhante voto proferido e, na conclusão e também nos doutos fundamentos, o voto do Ministro Sepúlveda Pertence. Acolho o pedido formulado na inicial para deferir a ordem, declarando nulo, assim, o processo que resultou do Inquérito n° 32/89, a partir do afastamento do Promotor Titular da 154 R.T.J. — 150 Quinta Vara Criminal e indicação do Especial para atuar no caso em análise. EXTRATO DA ATA HC 67.759 — RJ — Rel.: Min. Celso de Mello. Poetes.: Carla Esteves de Azevedo Guedes e outra. lmpte.: Nélio Seidl Machado. Coatoc Superior Tribunal de Justiça Decisão: Após os votos dos Srs. Ministros Relator, que indeferia o pedido, e Marco Aurélio, que o deferia, para anular o processo, nos termos enunciados em seu voto, o julgamento foi adiado em virtude do pedido de vista do Sr. Ministro Carlos Venoso. Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministro Aldir Passarinho, Sydney Sanches, °eiavio Gallotti, alio Borja, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Venoso e Marco Aurélio. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Moreira Alves. Procurador-Geral da República, o Dr. Affonso Henriques Prates Correia, substituto. Brasília, 19 de setembro de 1990 — Hércelus Bonifácio Ferreira, Secretário. VOTO (VISTA) O Sr. Ministro Carlos Velioso: Num inquérito policial distribuído à 5' Vara Criminal do Rio de Janeiro, o Promotor Avelino Gomes Moreira Neto oficiou manifestando-se pela concessão de liberdade provisória, mediante fiança, sustentando que «o auto de prisão em flagrante é carente de qualquer elemento que indique o exercício de tráfico ilegal de entorpecente por parte das indiciadas», e que «a hipótese no mesmo descrita é, no máximo, aquela prevista no art. 16 da Lei n° 6.368/76, tratando-se, portanto, de delito afiançável.» (fl. 72v.). Esta manifestação deu-seno dia 9-3-89. No dia seguinte, o Procurador-Geral de Justiça designou outro Promotor para, «sem prejuízo de suas atribuições, como represen- tante do Ministério Público, acompanhar o Inquérito Policial. n° 32/89, instaurado na Delegacia de Entorpecentes e todos os demais inquéritos ou flagrantes instaurados para apurar infrações penais resultantes da denominada Operação Bandeja, para repressão ao tráfico de entorpecentes.» (fl. 96). No dia 29-3-89, o Promotor Luiz Carlos Rodrigues da Costa, que fora designado pelo Procurador-Geral, ofereceu denúncia contra as ora pacientes, Elaine Estrela e Cada Esteves de Azevedo Guedes (fls. 2/4 e 95), dando-as como incursas nas sanções do art. 12 da Lei n° 6.368/76, a primeira, enquanto a segunda nas sanções do art 12, 2°, II e III do mesmo diploma legal. Houve pedido de habeas corpus perante o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que denegou a ordem. Ao recurso ordinário interposto, negou-lhe provimento o Superior Tribunal de Justiça. Daí o presente habeas corpus originário perante esta Corte Suprema, visando à anulação do procedimento penal, sobre o fundamento de que a designação de promotor especial, pelo Procurador-Geral de Justiça, violou o princípio constitucional do Promotor natural (CF, art. 127, 1° e art. 128, 5°, I, b). O eminente Ministro Celso de Mello, Relator, após enfatizar que a Constituição de 1988 conferiu ao Ministério Público posição de eminência, como defensor do povo, consagrando a figura do promotor natural, «a que repugnam interferências ilegítimas da Chefia da Instituição, que rompem, mediante designações casuísticas e arbitrárias, a regular ordem de distribuição dos processos e encargos funcionais», cuja fonte é o princípio de inamovibilidade, que concerne ao cargo e às funções, acrescentou: (...) «Inobstante reconheça imanente ao novo regramento constitucional pertinente ao Ministério Público o princípio do promotor natural, não vislumbro, na situação concreta emergente destes au- R.T.J — 150 tos, hipótese que enseja a sua atuação, pois o sentido desse postulado exige, para que lhe dê aplicabilidade, a edição de ato legislativo.» Mais: (...) «Sendo assim, e enquanto não sobrevier a disciplina legislativa pertinente, não há como aplicar —ou mesmo invocar — o princípio do Promotor Natural, que, inobstante a sua formulação no Plano doutrinário, ainda constitui tema de lege terenda.» (...) Concluiu S. Ex' por indeferir o habeas coreus. Já o Sr. Ministro Pertence, depois de acentuar que o «promotor natural» decorre do princípio da independência funcional do Ministério Público (CF, art. 127, § 1°) e da garantia de inamovibilidade dos seus membros (CF, art. 128, § 5°, I), com implicações com o princípio do juiz natural e da garantia do devido processo legal, acrescentou que esses princípios hão de conviver com dois outros, o da unidade e o da indivisibilidade, que contêm a idéia de uma organização hierarquizada, que compreende o poder de avocação e de substituição, vale dizer, «o poder do superior hierárquico de chamar a si o exercício concreto da função de subordinado» (J. Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, 1974, 1/381) -- e o de substituição — isto é, o de «designar outro subordinado para o exercício concreto da função do agente normalmente competente» (id. ibidem).» Destarte, acrescenta S. Ex.• «a inamovibilidade dos membros do Ministério Público, ... não se identifica à dos juízes, precisamente porque — ao contrário do que sucede em relação à magistratura —, no Ministério Público a garantia há de conciliar-se com os princípios da unidade e da indivisibilidade, impostos no mesmo contexto da 155 Lei Fundamental . » Todas essas questões carecem de complementação legislativa, diz S. Ex.• Todavia, acrescenta, as normas constitucionais que definem «os princípios institucionais do Ministério Público — a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional (art. 127, § 1°) — assim como a da necessidade implícita de compatibilizá-las com as que definem as garantias dos seus membros, entre elas, a inamovibilidade a serem observadas nas leis complementares de organização (art. 128, 5', 1), «são normas constitucionais de princípio institutivo ou de princípio orgânico ou organizativo, na classificação de José Afonso da Silva (Aplicabilidade das Normas Constitucionais, 1968, pág. 114), com uma certa dose de aplicabilidade ou de eficácia, com o poder, por exemplo, de cortar a eficácia de normas anteriores com elas incompatíveis. Assim, por exemplo, não têm aplicação normas ou leis que autorizam o Pmcbrador-Geral a praticar os poderes de devolução e substituição sem o concurso do colegiado superior do Ministério Público. Conclui S. Ex.': (...) «59. Mutatis mutandis, no sistema vigente, não podem remanescer na esfera da decisão solitária do ProcuradorGeral poderes excepcionais que afetam a garantia de inamovibilidadqe, se a segurança desta foi entregue, na Lei Fundamental, ao contrário do que sucedia na ordem constitucional anterior — (CF 69, art. 95, § P, in fine), à decisão da maioria qualificada de um colegiado da instituição: foi essa a fórmula constitucional de proscrição, no campo delicado dessa garantia básica , da margem de subjetivismo e de arbítrio que é inerente a toda decisão individual discricionária. 60. Não se trata, é certo, de uma dedução lógica de preceitos inequívocos, mas, na ausência de disciplina complementar, de uma tentativa de concretização conciliadora do que Canotilho 156 R.T.J. —150 Chamaria «momentos de tensão ou antagonismo entre os vários princípios» votados, na Constituição, à estruturação do Ministério Público. É significativo, aliás, que a submissão do exercício da avocação ou da designação especial à anuência prévia ou ao referendo dos colegiados superiores da instituição tenha sido a solução proposta por ambos os projetos referidos, de Lei Orgânica, do Ministério Público da União (art. 49, VI e VIII) e da lei nacional de bases do Ministério Público dos Estados (art. 10, IX, g). De qualquer sorte, Sr. Presidente, seja essa ou não a solução que validamente se possa construir para a espera da complementação legislativa que o tema reclama, basta, no caso concreto, a impossibilidade de conciliar os princípios da nova estruturação do Ministério Público, gizados com mestria pelo em. Relator, com a sobrevivência de substituições arbitrárias, de aparência casuLsfica e com indícios veementes de desvio de poder, como a que se questiona na impetração. Com escusas pela inesperada extensão do voto, peço vênia ao Ministro Relator para deferir o habeas coreus para anular o processo, incluída a denúncia: é o meu voto». Votando, em seguida, o Sr. Ministro Marco Aurélio, após considerações a respeito da garantia do devido processo legal, do juiz natural (CF, art. 5°, LII1 e LV) e do princípio da igualdade, trouxe ao debate o voto do Sr. Ministro Antônio Neder, no HC 48.728, e deu adesão ao voto do Sr. Ministro Pertence, para o fim de deferir o writ. Pedi vista dos autos e os trago, a fim de retomarmos o julgamento do habeas corpus. Estabelece a Constituição que são princípios institucionais do Ministério Público: a unidade, a indivisibilidade e a indepen- dência funcional (CF, art. 127, § 1°). E no art. 128, § 5°, I, estatuiu: «Art. 128 (...) § 5° Leis complementares da União e dos Estados, cuja iniciativa é facultada aos respectivos Procuradores-Gerais, estabelecerão a organização, as atribuições e o estatuto de cada Ministério Público, observadas, relativamente a seus membros: I — as seguintes garantias: (...) inamovibilidade, salvo por motivo de interesse público, mediante decisão do órgão colegiado competente do Ministério Público, por voto de dois terços de seus-membros, assegurada ampla defesa; c) (.4» Concordo com o Ministro Pertence, quando S. Ex.' sustenta que o promotor natural, que decorre dos princípios da independência funcional do Ministério Público (CF, art. 127, § 1°) e da inamovibilidade dos seus membros (CF, art. 128, § 5°, b) deve hannonizar-se com os princípios da unidade e da indivisibilidade (CF, art. 127, § 1°), compreendendo estes a idéia de que o Ministério Público é «uma organização hierarquizada» e, como tal, a instituição, que é una, há de ter urna direção, uma chefia — a própria Constituição, ao cuidar do Ministério Público da União, deixa expresso que este tem por chefe o ProcuradorGeral da República, donde, pelo princípio da simetria federal, os Ministérios Públicos estaduais terão, também, um chefe, que será o Procurador-Geral de Justiça — a qual são conferidos certos poderes, «entre os quais os de devolução —definido como «o poder do superior hierárquico de chamar a si o exercício concreto da função do subordinado» (J. Figueiredo Dias, DireitoProemulai Penal, 1974,1/381) —e ode substituição — isto é, o de «designar outro normalmente competente» (id. Ibidem).» R.T.J —150 Isto deflui, mesmo, da organização hierarquizada, com uma chefia, certo, entretanto, que tala essa organização deverá ser objeto de complementação legislativa, conforme está expresso, aliás, na Constituição (art. 128, 5°). Posta assim a questão, importa perquirir se, enquanto não editada a lei complementar mencionadano § 5° do art 128 da Constituição, estaria de pé ou, noutras palavras, teria sido recepcionada, pela nova ordem constitucional, a disposição constante da Lei Complementar n° 40, de 1981, que, no seu art. 7°, V, confere ao Procurador-Geral de Justiça poderes para, «mesmo no curso do processo, designar outro membro do Ministério Público para prosseguir na ação penal, dando-lhe orientação que for cabível no caso concreto.» Esta é a questão. Para enfrentá-la é necessário, primeiro que tudo, verificar se a norma constante do § 5°, I, b, do art. 128, tem aplicabilidade ou pelo menos alguma incidência. José Afonso da Silva, em obra que se tornou clássica, formulou, com base em modernos constitucionalistas italianos, como, por exemplo, Vezio Crisafulli, La Coslituzione ele sue Disposizioni di Principio, Milão, Dott. A. Giuffrè-Editore, 1952, a divisão tricotômica das nonas constitucionais, a dizer que, quanto à sua eficácia e aplicabilidade, elas podem ser assim divididas: a) normas constitucionais de eficácia plena e aplicabilidade imediata: não dependem de normatividade ulterior, para sua aplicação, vale dizer, têm incidência imediata; b) normas constitucionais de eficácia contida e aplicabilidade imediata, mas possivelmente não integral: têm normatividade suficiente; todavia, prevêem normatividade ulterior, que pode reduzir a sua eficácia e aplicabilidade; c) normas constitucionais de eficácia limitada ou reduzida, que podem ser de duas espécies: cl) declaratórias de princípios institutivos ou organizativos, c2) declaratórias de prin- 157 cípios programáticos. Essas normas não receberam normatividade suficiente para a sua aplicação, ou, noutras palavras, ao legislador ordinário cabe regulamentá-las; são dependentes, portanto, de normatividade ulterior (José Afonso da Silva, Aplicabilidade das Normas Constitudonais, Ed. RT, ? ed., 1982, pág. 67/75). No caso, bem percebeu o eminente Ministro Pertence, as normas inscritas no § 5° do art. 128 são normas de eficácia reduzida ou limitada. Em princípio, pois, não têm normatividade suficiente para sua aplicação. No caso, elas podem se classificar como normas constitucionais de princípio institutivo. São de eficácia limitada, em princípio, mão são, todavia, destituídas de aplicabilidade, como querem aqueles que as chamam de normas de eficácia ou aplicabilidade diferida, como a pretender que nada significam, enquanto o legislador não emitir regras jurídicas que as complementem.» (José Afonso da Silva, ob. cit., págs. 111/112). Como contêm elas esquemas gerais de organização, estabelecem «como que início de estruturação de instituições, órgãos ou entidades, pelo que também poderiam chamar-se normas de princípio orgânico ou organizativo», acrescenta José Afonso da Silva (ob. cit., pág. 112). Por isso mesmo, porque estabelecem um início de organização, têm aplicabilidade onde tal aplicabilidade se tome possível. Vamos ao caso sob exame. Aqui, estou em que, conferindo a norma constitucional inamovibilidadqe ao membro do Ministério Público, «salvo por motivo de interesse público, mediante decisão do órgão colegiado competente do Ministério Público, por voto de dois terços de seus membros, assegurada ampla defesa» (CF, art. 128, § 5°, I, «b»), não recepcionou ela norma infraconstitucional que assegure ao Procurador-Geral poderes para, «mesmo no curso do processo, designar outro membro do Ministério Público para prosseguir na ação penal, dando-lhe a orienta- 158 R.T.J. — 150 ção que for cabível no caso concreto.» (Lei Complementar n° 40/81, art. 7°, V). Uma coisa ficou certa, a partir da promulgação da norma constitucional de que cuidamos, o § 5°, I, b, do art. 128: somente mediante decisão do órgão colegiado do Ministério Público, por voto de dois terços de seus membros, assegurada ampla defesa, e por motivo de interesse público, poderá o membro do Ministério Público ser afastado de suas funções ou das funções para as quais estava designado. Esse afastamento será disciplinado na lei complementar de que fala o â 5° do art. 128, tendo presentes os princípios da unidade e indivisibilidade do Ministério Público, é certo; mas não é menos certo que, a partir da promulgação da citada norma constitucional, vale repetir, já não tem vigência norma infraconstitucional que autoriza o Procurador-Geral a afastar, em detrimento do princípio da inamovibilidade, o membro do Ministério Público das funções para as quais estava designado. Este raciocínio mais se reforça diante das considerações postas no voto do Sr. Ministro Marco Aurélio. Na verdade, o princípio da inamovibilidade do membro do Ministério Público —com as restrições atrás mencionadas, tendo em vista os princípios constitucionais da unidade e indivisibilidade do Ministério Público — completa °princípio do due process of law que a Constituição consagra e que compreende o do juiz natural (CF, art. 5°, XXXV, LEI, LV). Do exposto, peço licença ao Sr. Ministro Celso de Mello para acompanhar o voto do Sr. Ministro Sepúlveda Pertence. Em conseqüência, defiro o writ. EXTRATO DA ATA HC 67.759 —RJ —Rel.: Min. Celso de Mello. Pactes.: Carla Esteves de Azevedo Guedes e outra. Irnpte.: Nélio Seidl Machado. Coator: Superior Tribunal de Justiça. Decisão: Após os votos do Srs. Ministros Relator, que indeferia o pedido, e Marco Aurélio, Sepúlveda Pertence e Carlos Velloso que o deferiam, para anular o processo, o julgamento foi adiado em razão do pedido de vista do Sr. Ministro Paulo Brossard. Presidência do Sr. Ministro Aldir Passarinho, na ausência justificada do Sr. Ministro Néri da Silveira, Presidente. Presentes os Srs. Ministros Moreira Alves, Sydney Sanches, Octavio Gallotti, Célio Boda, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Velloso e Marco Aurélio. Procurador-Geral da República, o Dr. Affonso Henriques Prates Correia, substituto. Brasília, 11 de outubro de 1990 — Hércelus Bonifácio Ferreira, Secretário. VOTO O Sr. Ministro Paulo Brossard: Questiona-se no presente babas corpus a designação de um promotor especial, pelo Procurador-Geral de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, para atuar em todos os procedimentos persecutórios penais resultante de determinada operação policial, denominada «Operação Bandeja», efetivada na cidade do Rio de Janeiro. Sustenta o impetrante que essa designação ofende o princípio do «promotor natural» que, na hipótese, seria o titular da Promotoria da 5' Vara Criminal do Rio de Janeiro. 2. 0 relator, Ministro Celso de Mello, entende que o princípio depende de lei para que se lhe dê aplicabilidade; a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público é que lhe vai delinear o perfil, precisar-lhe o conteúdo, o alcance e a extensão. Enquanto não sobrevier a disciplina legislativa pertinente, não há como aplicar— ou mesmo invocar — o princípio do promotor natural. Por outro lado, o Ministro Sepúlveda Pertence, entendendo que o promotor natural decorre do princípio da independência funcional do Ministério Público (CF, art. R.TJ— 150 127, § 1°) e, da garantia da inamovibilidade dos seus membros (CF, art. 128, § 5°, I, b), relaciona-o com os princípios do juiz natural e do devido processo legal e com os princípios constitucionais que informam a instituição, o da unidade e o da indivisibilidade. Não contesta, porém que a eficácia plena e a concretização positiva de tais normas dependam de complementação legislativa, — o que contesta é a recepção do podennonocrático do Procurador-Geral para, imotivadamente e sem previsão específica, substituir o Promotor, que deveria atuar em determinado procedimento em curso, em decorrência de sua designação para oficiar junto a determinado juízo criminal, por outro de sua livre escolha. O que se põe em discussão é a sobrevivência da disciplina legal anterior, ante a nova ordem constitucional, até a edição das normas legislativas requeridas. Acompanharam-no os Ministros Marco Aurélio e Carlos Vdloso. 3. Preliminarmente, peço vênia para divergir dos que vêem na inamovibilidade dos membros do Ministério Público a base do princípio do «promotor natural». Vejo na inamovibilidade uma garantia fundonal, cuja finalidade é proteger, no caso específico, o pleno exercício das elevadas funções dos membros do Ministério Público, contra desmandos de autoridades que lhes sejam superiores. É a garantia funcional do Promotor Público de permanecer no lugar para o qual foi designado, impedindo sua remoção ex offido, salvo motivo de interesse público. Tanto é que a Constituição Federal dispõe no artigo 128, parágrafo 5°, que a Lei Orgânica do Ministério Público deve observar, relativamente a seus membros: I — as seguintes garantias: b) inamovibilidade, salvo por motivo de interesse público, mediante decisão do órgão colegiado competente do Ministério Público, por voto de dois terços 159 de seus membros, assegurada a ampla defesa A inamovibilidade é garantia outorgada aos membros do Ministério Público, que objetiva evitar a sua remoção ou transferência discricionária ou arbitrária; é uma garantia, hoje constitucional, que visa ao agente público e não aos administrados ou jurisdicionados, não obstante fraga reflexos indiretos a estes. Tanto isto é verdade que, mesmo na hipótese de imovibilidade por motivo de interesse público, permitida pela norma constitucional, deve-se assegurar ao Promotor Público e somente ele a ampla defesa dessa sua garantia funcional. Ademais, assentar o princípio do «promotor natural» na garantia da inamovibilidade resultaria em sustentar também em relação à Defensoria Pública o princípio do «Defensor Público natural», já que o parágrafo único do artigo 134 da Constituição assegura, também, a esses funcionários a garantia da inamovibilidade. 4. No que diz respeito ao, também invocado, princípio da independência funcional do Ministério Público, é de se observar que ele é assegurado, no parágrafo 1°, do artigo 127, da Constituição Federal, à instituição do Ministério Público, tanto é que a norma constitucional ao assim conceituá-lo, como princípio institucional, objetiva precípua e fundamentalmente estabelecer sua autonomia em relação aos Poderes do Estado anão exclui a hierarquia e a disciplina. É claro que da independência funcional da instituição decorre a de seus membros; é uma garantia funcional que deflui da institucional. De mais a mais, entendo que os princípios da unidade e da indivisibilidade da instituição não favorecem a tese da impetração. Aliás, a designação de um promotor para acompanhar todos os processos decorrentes de certa operação policial, como no caso 160 R.T.J. —150 vertente, parece-me que se justifica por si mesma, a conveniência de dar unidade e coerência à ação do Ministério Público em relação a situações idênticas, evitando contradição ou desconformidade em procedimentos resultantes de uma só origem. Não me parece tenha havido abuso na medida adotada pelo Procurador-Geral do Estado. A justificação da medida decorre de sua própria enunciação; evidentemente cuidava dar unidade e coerência à ação persecutória. Quando ocorre urna «operação bandeja», suponho eu tenha atingido algumas ou muitas pessoas; os processos resultantes poderiam estar distribuídos por diversas varas, para diversos promotores e ter desenvolvimento processual diferenciado e, quem sabe, até contraditório. Parece-me que, por um princípio normal de administração, o Procurador-Geral quis imprimir ao caso unidade de ação e de tratamento. O Procurador-Geral tem este poder? Entendo que sim; ele tem de ter; não precisa a lei dizer; decorre da própria organização do serviço público. O Ministério Público não faz exceção a esta regra. A menos que houvesse nonna legal expressa em contrário, tenho para mim que é um poder Sito a toda organização do serviço público. O Procurador-Geral tem de ter. Agora, o Procurador-Geral pode claudicar? Pode. Mas não posso raciocinar partindo do pressuposto de que o Procurador vá agir facciosa e abusivamente. Tenho de raciocinar que um alto servidor, que se presume possuidor dos títulos devidos, não vai proceder senão no sentido do regular funcionamento da instituição que dirige. De modo que, a mim parece uma medida que eu diria trivial de organização, de disciplina, de condução do serviço público. Não vejo ilegalidade nem ofensa aos direitos dos impetrantes do habeas corpus. Se a lei amanhã dispuser de outro modo, muito bem, a lei terá assim disposto, mas assentar como regra que decorra da inamovibilidade o princípio do promotor natural à semelhança do juiz natural, quer-me parecer que constitui um excesso que não encontra fundamento na disciplina constitucional da instituição. Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Não queria polemizar. Mas preciso deixar claro que a denominação «promotor natural" se a usei, foi por mera simplificação. No meu voto, ao que me lembro, disse claramente que não cedia a essa perigosa tendência de tratar os problemas do Ministério Público com a similitude absoluta com a Magistratura, quando há dois princípios, também constitucionais — a unidade e a indivisibilidade do Ministério Público — a impor nítida diferenciação entre as duas instituições. O que me pareceu, no entanto, data venta, é que a unidade e a indivisibilidade, na Constituição brasileira, hão de compatibilizar-se com a independência funcional e, em termos, com a ina,movibilidade, sob pena de esvaziá-las. Donde, a existência de critérios legais necessários a permitir o afastamento do promotor de determinado caso e a designação de outro. Sr. Ministro Paulo Brossard: Eu apenas diria, Sr. Presidente, e sem propósito de prolongar o meu voto, que os princípios da unidade e da indivisibilidade do Ministério Público não são novidade. A eles se refere a velha lei do Ministério Público, e mais do que isto, Sn Presidente, antes que estivesse na lei, estava na jurisprudência. Eu me recordo de um acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, prolatado pouco depois da Constituição de 1946, em que o Tribunal do Rio Grande do Sul, por unanimidade, concedeu babem corpus, num determinado caso, fundado no princípio da unidade e indivisibilidade do Ministério Público, que não estava expresso em nenhuma lei. 0Sr. hffinistro SepúlvedaPertenec Unidade e indivisibilidade à outrance levariam, como está na Lei Orgãnica do Ministério Público português, também à rígida hierarquia da instituição. O difícil, entre - 150 nós, é conciliar unidade e indivisibilidade com independência funcional. O Sr. Ministro Paulo Brossard: Mas a independência funcional também tem o seu alcance e o seu conteúdo. Se nós não conciliarmos esse princípio com o da hierarquia, vamos estabelecer, uma espécie de «monarquia», uma série de ilhas que não chegam sequer a formar um arquipélago, num serviço que deve ter unidade e indivisibilidade e que tem inclusive um chefe que se chamaProcuradar-Geral, previsto na Constituição, e que, aliás, não é de hoje. Mas, é claro, Sr. Presidente, houve tempos em que o Ministério Público era realmente um agente de confiança absoluta, pura e simples, do Poder Executivo Creio que isso foi em todo o Brasil, no Rio Grande do Sul também foi assim. Mas há muito tempo que ele vem se libertando dessa submissão e adquirindo um alto status legal e constitucional. Creio, no entanto, que não se pode levar ao ponto de estabelecer o Ministério Público como se fosse uma espécie de domínio pessoal, próprio ou privativo de cada agente, e que o Chefe do Ministério Público não possa tomar providências relativas ao serviço, que a mim parecem de óbvia justificação, como neste caso concreto. Tenho para mim que «promotor natural» é o integrante do Parquet com as garantias funcionais (pessoais e institucionais) constitucionalmente previstas, a quem as leis de integração normativa tenham deferido competências privativas ou especiais. Não vejo ofensa a esse princípio, na instituição de órgãos especiais com funções específicas no Ministério Público, como também não vejo na designação de Promotores especiais, desde que estas objetivem o interesse público e estejam previamente previstas nas suas leis organizacionais. O que não é possível dentro da nova sistemática constitucional é a designação do Promotor ad hoc para exercer funções institucionais do Ministério Público e nem as designa- 161 ções que venham a prejudicar ou inibir a independência funcional de seus membros. Em face da Constituição, na designação, de um Promotor especial para cuidar de processos originários de uma só providência policial, não vejo que resulte em constrangimento ilegal às pessoas por desventura envolvidas na apuração policial do caso e an seu desdobramento judicial. Peço vênia aos eminentes Ministros que esposaram entendimento contrário para indeferir o habeas corpos, por entender, como entendo, ser inaceitável a tese sustentada na impetração. Indefiro o habeas corpo. VOTO O Sr. Ministro Octavio Gallotti: Também eu, Sr. Presidente, peço licença aos Ministros que deles divergiram, para acolher os votos dos eminentes Ministros Relator e Paulo Brossard, pelos próprios fundamentos que S. Exm, brilhante e exaustivamente, aduziram perante este Tribunal. Indefiro o pedido. VOTO O Sr. Ministro Moreira Alves: Sr. Presidente, também indefiro o pedido, por entender que inexiste a figura do denominado promotor natural. VOTO O Sr. Ministro Sydney Sanches (Presidente): Havendo questão constitucional a dirimir, devo votar. A meu ver, a Constituição Federal de 1988 não contém explícito, nem implícito, o princípio do «Promotor natural», não resultando ele, necessariamente, dos princípios da independência funcional e da inamovibilidade dos membros do Ministério Público. Valho-me, quanto a esses pontos, dos fundamentos deduzidos no voto do eminente Ministro Paulo Brossard, com a devida vênia dos que dissentem. R.T.J. —150 162 Nada impede, porém, que a Lei Orgânica do Ministério Público venha a adotar o princípio (do «Promotor natural»), o que, aliás, me parece salutar para a instituição e para os jurisdicionados. De qualquer maneira, devo acompanhar a conclusão do voto do eminente Relator, pois não vislumbrando (o meu voto), o princípio do «Promotor natural», nem explícito nem implícito, na Constituição, e não havendo sido ainda editada lei que o reconheça, devo, como S. Ex.*, concluir pelo indeferimento do pedido de babeas corpo. EXTRATO DA ATA HC 67.759 —RJ —Rel.: Min. Celso de Mello — Pctes • Carla Esteves de Azevedo Guedes e outra. Impte.: Nélio Roberto Seidl Machado. Coator: Superior Tribunal de Justiça — STJ. Decisão: Por maioria de votos, o Tribunal indeferiu o pedido de «habeas corpos" vencidos os Ministros Marco Aurélio, Carlos Velloso e Sepúlveda Pertence, que o deferiam, ficando revogada a medida liminar. Votou o Presidente. Não votaram os Ministros Francisco Rezek e Ilmar Gaivão, pois, à época do início do julgamento não integravam a Corte. Presidência do Sr. Ministro Sydney Sanches. Presentes à Sessão os Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira, Octavio Gallotti, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Velloso, Marco Aurélio, limar Gaivão e Francisco Rezek. Procurador-Geral da República, Dr. Aristides Junqueira Alvarenga. Brasília, 6 de agosto de 1992 — Luiz Tomimatsu, Secretário. HABEAS CORPUS N° 69.424 — RJ (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves Paciente: Ailton Braz de Oliveira — Impetrante: Antônio Roberto Barbosa — Coator: Tribunal de Alçada Criminal do Estado do Rio de Janeiro alabeas corpus». —Ocorrência de evidente erro material, insuscetível de acarretar prejuízo por dubiedade, é mera irregularidade que não invalida a citação por edital. — A inexistência, nos autos da ação penal, de certidão de que o edital de citação foi afixado no foro implica nulidade relativa que tem de ser alegada na primeira ocasião em que o réu, por seu advogado, se manifeste nos autos (HC 50.893, RTJ 68/34 e seguintes), o que não ocorreu no caso. «Habeas corpo» indeferido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na confomúdade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em indeferir o pedido de «habeas corpos». Brasília, 20 de abril de 1993 — Moreira Alves, Presidente e Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): São estas as informações prestadas pelo Exmo. Sr. Presidente, em exercício, do R.T.J — 150 Tribunal de Alçada Criminal do Estado do Rio de Janeiro: «Em atenção aos termos do Ofício n° 475/R, datado de 19 de maio passado, e reportando-me, preliminarmente, ao Expediente n° 088/SJ/92, desta Presidência, relativos ao writ em epígrafe, impetrado em favor de Ailton Braz de Oliveira, informa a Vossa Excelência o seguinte: O histórico fático-processual está razoavelmente descrito na impetração, embora alguns dados, como se vê a seguir, não estejam condizentes com a realidade. Expedida deprecata para o Estado de São Paulo, objetivando a citação pessoal do paciente, não logrou o meirinho paulista encontrá-lo, nem veio ao feito, antes da sentença ou do acórdão, prova da prisão do paciente em São Paulo. Contra o edital de citação expedido em razão de tal fato, e da inobservância às formalidades que presidem a citação frota, é que reclama o impetrante, acoimando de nulo o édito e de inválido, também, em conseqüência, o diamamado editalício. Consta dos autos, ao revés do retratado na exordial, a anexa cópia do referido edital, datado de 26 de agosto de 1975, convocando o paciente a ser interrogado em 20 de outubro seguinte (1973), às 11 horas, contendo o endereço do Juízo e demais dados pertinentes. Do seu verso (cópia anexa), ao contrário do contido na inicial, figuram as certidões de conformidade com o original, de afixação no local de costume, de expedição dos ofícios de praxe e de envio do mesmo à publicação. A seguir, está lavrada nos autos certidão (cópia anexa) de que o Diário Oficial publicou o referido edital em 19-12-75, não se achando, no entanto, nos autos, exemplar do periódico, nem 163 explicitando a certidão a página respectiva da publicação. 0 atraso na publicação do edital, efetivamente, ocasionou que esta se desse após a data fixada naquele para o interrogatório, afigurando-se-me, entretanto, meras irregularidades, a ausência, nos autos, de exemplar do Diário Oficial, bem como a inespecificação de sua página na certidão do escrivão; estranha, de outra parte, ao sistema processual vigente, a certidão de `desafetação, do edital, pleiteada, também, pelo impetrante. Estas as informações que me cumpria transmitir a Vossa • nlênria, acompanhadas de outras peças dos autos, além das supramencionadas, permanecendo o signatário ao inteiro dispor do conspícuo Relator ou da Coletada Turma para complementá-las dou adotar providências outras, acaso reputadas convenientes.» (fls. 51/53) Às fls. 69/71, assim se manifesta a Procuradoria-Geral da República, em parecer do Dr. Haroldo Ferraz da Nóbrega: «O Dr. Antônio Roberto Barbosa impetra uma ordem de habeas eorpus em favor de Ailton Braz de Oliveira, que cumpre diversas condenações em São Paulo (entre as condenações, a condenação objeto do presente processo). A condenação, cujo processo impugna, foi a dois anos e seis meses de reclusão, por estelionato. Sustenta que é nulo o processo enfocado no HC (Proc. n° 29.870, RJ, Apelação Criminal n° 10.727, RJ, fls. 5W77) por vício de citação por edital. As nulidades teriam decorrido do seguinte: não há nos autos cópia da citação por edital; não há certidão de afixação do edital no local de costume; 164 R.T.J. — 150 c) não há certidão de desafixação do edital. Curiosamente, a própria defesa se encarregou de trazer para os autos uma cópia do Diário Oficial onde publicado o edital de citação do paciente (fl. 28). Sustenta, porém, a defesa que tal edital não valeria pois publicado no Diário Oficial de 19 de dezembro de 1975 convocara o réu para comparecer a Juízo a 15 de março de 1975 (fls. 9 e 28). Não assiste razão aos impetrantes. As informações esclarecem e comprovam que houve a certidão de afixação do edital no local de costume (fl. 55). Mostram ainda a cópia do edital (fl. 54), no qual há obediência às formalidades legais e estranham a exigência — inteiramente procedente a perplexidade — ante o sistema processual vigente de certidão de desafixação. As informações ressaltam que há certidão de publicação do edital no Diário Oficial. 'Não se achando, no entanto, nos autos, exemplar do periódico, nem explicitando a certidão a página da publicação' (autos, fl. 52). Ocorre porém, que a defesa, como já salientado, trouxe para os autos cópia do Diário Oficial onde publicado o edital (fl. 28). Como se vê, as alegações de nulidade formuladas na impetração foram repelidas nas informações às quais se reporta este órgão para opinar pelo indeferimento do writ. Nesta oportunidade, destaca o signatário para exame a alegação de nulidade que decorreria da inserção de data equivocada para comparecimento do réu. Ora, se o edital era publicado a 19 de dezembro de 1975, com prazo de 15 dias, chamando o réu para interrogatório (ato futuro), a data 15 de março de 1975 haveria de ser entendida como 15 de março de 1976. Cuida-se de pequena inexatidão material que não nulifica o ato processual em referência. Nestas condições, o parecer é no sentido do indeferimento do writ. Requisitei os autos da ação penal, que se acham apensados. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): 1. No caso como se vê do exame dos autos, houve citação por edital publicado na imprensa. Embora não juntado o edital aos autos da ação penal, há nestes certidão de sua publicação no Diário Oficial de 1912-75 (fl. 130), e o próprio impetrante juntou, com a inicial deste habeas corpos, xerox da folha do Diário onde se deu essa publicação. É certo que, nela, ao invés de 15 de março de 1976, a data para o interrogatório saiu como sendo 15 de março de 1975, erro, no entanto, que dada a sua evidência (logo abaixo, vem a data de expedição dos editais (15 de dezembro de 1975; e o Diário Oficial da publicação é de 19 de dezembro de 1975), se constitui em mera irregularidade, insusceptível de acarretar prejuízo por dubiedade. Ademais, a circunstância de não haver certidão nos autos da ação penal de que esse edital foi afixado no foro — nos autos há apenas a certidão de que aforam expedidas diligências» para o interrogatório no dia 15 de março de 1976, aludindo-se ao edital (fl. 129-verso) — implicaria nulidade relativa, que, como decidiu o Plenário desta Corte no HC 50.893 (RTJ 68/34 e segs.), teria de ser alegada na primeira ocasião em que o réu, por seu advogado, falasse no processo. Ora, no caso, o réu, quando localizado, foi interrogado (fls. 222 e 222-verso), tendo declarado ser advogado na OAB, Seção do Estado de São Paulo, e indicado para seu patrono o Dr. João Cesar de Luca, que, aliás, antes mesmo da intimação para a ciência da sentença condenatória, interveio no processo, com procuração passada pelo ora paciente (fl. 192 dos autos da ação R.TJ — 150 penal), peticionando, sucessivamente, às fls. 190, 196, 204, 208 e 211, sem alegar qualquer nulidade. 2. Em face do exposto, indefiro o presente habeas corpus, e determino a restituição dos autos da ação penal à origem. EXTRATO DA ATA HC 69.424 — RJ Rel.: Mm. Moreira Alves. Pacte. • Afitar Braz de Oliveira. Impte.: Antonio Roberto Barbosa. Coator: Tribunal de Alçada Criminal do Estado do Rio de Janeiro. 165 Decisão: A Turma indeferiu o pedido de «habeas capas», nos termos do voto do Relator. Unânime. Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Octavio Gallotti, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e Durar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Miguel Franzino Pereira. Brasília, 20 de abril de 1993 —Ricardo Dias Duarte, Secretário. HABEAS CORPUS N° 69.433 — SC (Segunda Turma) Relata: O Sr. Ministro Carlos Velloso Paciente: Lauri Baldio Casarotto — Impetrante: Lati Antônio Hanauer — Coator: Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina Processual penaL Recurso. Tempestiridarle. I — Tempestiva a apelação, deverá ela ser julgada, como entender de direito, o Tribunal a que. II — Habeas carpas deferido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por decisão unânime, deferir o «habeas corpus», para que, afastada a intempestividade da apelação, prossiga o Tribunal no julgamento do mérito, como entender de direito. Brasília, 1° de dezembro de 1992 — Néri da Silveira, Presidente — Carlos Velloso, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Carlos Velloso: Tratase de habeas torpe impetrado em favor de Lauri Bortollo Casarotto, com o objetivo de desconstituir acórdão prolatado pela Egrégia Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, que não conheceu, por intempestivo, de recurso de apelação interposto contra decisão de primeiro grau, que condenara o ora paciente pela prática do crime previsto no art. 129, capta, do Código Penal. Diz o impetrante que o paciente foi condenado a três meses de detenção como incurso nas penas do art. 129, caput, do Código Penal, pena que foi substituída pela de multa. Inconformado, recorreu da decisão para o Tribunal de Justiça, cuja Segunda Câmara Criminal não conheceu do apelo, por entender ter sido o recurso interposto a destempo. Sustenta o impetrante que o prazo recursal começou a fluir no dia 1°-3-91, sexta-feira, e terminou no dia 5 do mesmo mês, data em que 166 R.T.J. — 150 protocolou o recurso, que recebeu o n° 14.791. A dúvida surgiu por ter o Dr. Juiz despachado a petição no dia seguinte, 6-3-91. As informações prestadas à fl. 15 se limitam a dar a tramitação do processo que resultou na condenação do ora paciente. O presente writ foi impetrado perante o Tribunal de Justiça de Santa Catarina, que o encaminhou ao Superior Tribunal de Justiça e este, por sua vez, remeteu os autos a esta Corte. Por solicitação do Ministério Público Federal, os autos da Apelação Criminal n° 27.220, da Comarca de Seara-SC, foram requisitados ao Tribunal de Justiça de Santa Catarina e juntados a estes autos. Oficiando pela segunda vez, o Ministério Público Federal, pelo parecer do ilustre Subprocurador-Geral Havido Ferraz da Nóbrega, opina no sentido de ser considerada tempestiva a apelação questionada, devolvendo-se os autos ao Tribunal de Justiça de Santa Catarina, para que a julgue como entender de direito. Argumenta o parecer que, examinando atentamente o documento de fl. 40 dos autos apensos, chegou à conclusão de que a apelação é tempestiva, esclarecendo que «o equívoco do parecer de fls. 54/5 advém do fato de que o seu nobre subscritor não examinou o verso de fl. 40 (e não 49 como indicou), onde se vê, com alguma dificuldade, é certo, as anotações chanceladas mecanicamente: 'Poder Judiciário — Comarca de Seara — 14791 — Mar 91-5-15, 28'.» O parecer foi assim ementado: «Ementa: Demonstrado na impetração que a apelação era tempestiva, deve ser tornada sem efeito a decisão que não a conhecera por uma suposta intempestividade.» É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Carlos Velhas° (Relator): Destaco do parecer do ilustre Subprocurador-Geral Haroldo Nóbrega, às fls. 57/58: 4..) Examinando atentamente o documento de fl. 40, dos autos do HC 69.433-1/130, concluo que a apelação é tempestiva. O Tribunal de Santa Catarina baseado no parecer de fls. 54/5 deu pela intempestividade do apelo. O equívoco do parecer de fls. 54/5 advém do fato de que o seu nobre subscritor não examinou o verso de Il. 40 (e não 49 como indicou), onde se vê, com alguma dificuldade, é certo, as anotações chanceladas mecanicamente: 'Poder Judiciário — Comarca de Seara — 14791 — Mar 91-5-15, 28.' Ora tais anotações estão bem explicadas na certidão de fl. 5 (autos do HC). Parece-me evidente que o parecer e o acórdão (fls. 54/5 e 58/9 dos autos da apelação) só examinaram o anverso de fl. 40 e não também o seu verso. No anverso, há realmente o despacho do Magistrado, recebendo a apelação, por própria e tempestiva, chancelada mecanicamente a data do despacho, isto é, 6 de março de 1991. Mas não se pode esquecer a chancela mecânica existente no verso de fl. 40. O parecer destarte é no sentido de que considerada por esse Excelso Pretório tempestiva a apelação, o Colendo Tribunal de Justiça de Santa Catarinajulgue-a como entender de direito.» (Fls. 57/58.) Está correto o parecer. Na verdade, à fl. 40v., dos autos da Apelação Criminal n° 27.220 (99.45479.7), que estão em apenso, verifica-se que o re- R.TJ — 150 curso foi protocolizado no dia 5-3-91, às 15h28m, assim no prazo legal, pelo que deve ser conhecido. Defiro o writ para que, considerada tempestiva a apelação, julgue-a, como entender de direito, o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina. Devolvam-se os autos da Apelação Criminal n° 27.220, que estão em apenso, ao Eg. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. EXTRATO DA ATA HC 69.433 — SC — Rel.: Min. Carlos Valioso. Pacta.: Lauri Bartollo Casarotto. Lorota.: Lari Antonio Hanauer. Coator. Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina 167 Decisão: Por unanimidade, a Tucura deferiu o «babem corpus» para, afastada a intempestividade da apelação, prossiga o Tribunal no julgamento do mérito, conto entender de direito. Presidência do Sr. Ministro Néai da Silveira. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Carlos Valioso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Paulo Brossard. Subprocuradora-Geral da República, a Dra. Odília Ferreira da Luz Oliveira Brasília, 1° de dezembro de 1992 — José Wilson Aragão, Secretário. HABEAS CORPUS N° 69520 — PA (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Néri da Silveira Impetrantes: Guaracy da Silva Freitas e outros — Coator: Tribunal Regional Federal da P Região — Paciente: Lauro Cardoso da Silva Habeas Carpas. Absolvição com base no art. 386, VI, do CPP. Hipótese em que a sentença absolvera com a só invocação do art. 386 do CPP, sem referir qualquer de seus incisos. Recurso do MPF contra a sentença. Nada impedia viesse a Corte, ora indigitada coatora, ao julgar o recurso do MPF, explicitar que a absolvição do paciente era por deficiência de provas, fazendo apressa menção ao art. 386, VI, do CPP. Não há reconhecer configurada reformado In pejas. Diante da análise da prova, volumosa e complexa, podia a Corte, no Julgamento da apelação do MPF, decidir como o fez. Habeas corpos indeferido. ACÓRDÃO RELATÓRIO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade, indeferir o «habeas corpus». O Sr. Ministro Néri da Silveira (Relator): Cuida-se de ordem de babas corpos, impetrada pelos advogados Guaracy da Silva Freitas e outros, em favor de Lauro Cardoso da Silva, absolvido pela P Turma Criminal do extinto Tribunal Federal de Recursos, com suporte no artigo 386, inciso VI, do CPP, da prática do delito tipificado no artigo 318 do CPB. Brasília, 9 de fevereiro de 1993 — Néri da Silveira, Presidente e Relator. 168 R.T.J. — 150 Alega-se que o paciente, após ter respondido à ação penal perante a Justiça Federal do Estado do Pará, pelo fato de haver facilitado a prática de contrabando ou descaminho, fora absolvido com fulcro no art. 386, inciso I, do CPP, ou seja, porque ficou provada nos autos a inexistência do fato, e que o Tribunal Federal de Recursos, por sua r Turma, ao negar provimento à Apelação Criminal interposta pelo Ministério Público Federal, não poderia ter modificado a capitulação da sentença absolutória, passando o enquadramento da inexistência do fato (art. 386, I, CPP) para o inciso VI do mesmo artigo, alterando, assim, o motivo da absolvição, para insuficiência daprova colhida na instrução criminal. Asseveram os impetrantes que, tendo «negado provimento ao recurso, não poderia o Tribunal alterar o fundamento da respeitável Sentença, o que configura indubitavelmente a reformado in pejas, caracterizando constrangimento ilegal a ser reparado por este remédio heróico constitucional». Interposto inicialmente perante o Superior Tribunal de Justiça, o ilustre Ministro Costa Lima declarou-se incompetente para processar e julgar o presente habeas corpus, à vista do que ordenou a remessa decteç ao STF (ti. 41). Solicitadas informações, vieram aos autos com o oficio de fls. 49/50, do ilustre Presidente do Tribunal Regional Federal da 1• Região, nestes termos: «Trata-se de pedido de habeas corpus por meio do qual se pretende, verbis: I ... que seja o writ conhecido e deferida a ordem para anular o Acórdão ora atacado, proferido na Apelação Criminal n° 2485-PA, na parte que acrescentou que as absolvições têm por suporte o art. 386, n° VI, isto é; a insuficiência da prova colhida na instrução criminal, mantendo-se a decisão de 1° Grau'. Esta absolvera o paciente com base no art. 386, I, do CPP, vale dizer, por entender provada a inexistência do fato objeto da imputação. Percebe-se, de plano, que o paciente — por ter sido absolvido — não sofre nem está ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, pgroliaridade que toma inidônea e inadequada, data venia, a utilização da ação constitucional do habeas corpus, máxime para o Fim cofimado na inicial. A pretendida desclassificação do fundamento jurídico da absolvição do paciente implicaria, sem dúvida, irrecusável análise dos fatos da causa e importaria em aprofundada investigação do conjunto probatório reunido no processo, operação que esbarra em obstáculo incontomável decorrente da natureza sumarissima da ação penal de habeas corpus. Com estas breves considerações, espera o signatário não conheça do pedido o Colendo Supremo Tribunal Federal.» Opinou a Procuradoria-Geral da República, pelo indeferimento do writ. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Néri da Silveira (Relator): A sentença, quanto ao paciente, e outros co-réus, ao dispor sobre a absolvição, após registrar que o crime do art. 318 do CP consiste em facilitar, com infração de dever funcional, a prática de contrabando ou descaminho, anota (fls. 35/36): «Por tudo isso, o jeito é acreditar mesmo na palavra do denunciado José Carvalho de Miranda, quando afirma haver encaminhado ao então Procurador Regional da República setenta e dois (72) ofícios com as necessárias informações à defesa dos direitos e interesses do Fisco. Por outro lado, no caso das alegadas conivências do referido acusado com o R.T.J — 150 contrabando ocorrido no terreno de propriedade de Carlos Massud, de negativa em adotar providências tendentes a garantir o Fiscal Aduaneiro apreensor daquele contrabando e de omissão diante da representação que lhe foi dirigida por dois (2) outros Fiscais Aduaneiros tidos como prejudicados em certa apreensão no igarapé Candeua, afigura-se-nos inválidas tais alegações diante da falta de prova nos autos de qualquer «conivência», «negativa» e «omissão», por parte do dito acusado José Carvalho de Miranda Quanto aos fatos atribuídos aos indiciados Alírio Seabra Tobias, José Maria Paiva, Lauro Cardoso da Silva e Zito Brigido, também se nos afigura impossível diante da prova colhida Realmente, os três (3) primeiros acusados foram ao igarapé Candeua e estiveram a bordo de um barco sem denominação ali fundeado, onde havia, como carga, certa quantidade de madeira, conforme se apurou no curso da instrução criminal, e não os falados quatro (4) automóveis de diversas marcas, inclusive um marca Chevrolet. Portanto, inexistiu o alegado contrabando de automóveis e, como é óbvio, «facilidades» por parte dos aludidos acusados. Também, pelo cotejo da prova dos autos, chega-se à conclusão de que o denunciado José Maria Paiva não removeu obstáculos para facilitar o contrabando encontrado e apreendido no terreno de propriedade do referido Carlos Massud. Ao contrário, ele concorreu para a apreensão do mesmo, socorrendo o Fiscal apreensor, quando este, como alega, encontrava-se em situação difícil.» Ao julgar, entretanto, improcedente a denúncia e absolver os acusados, entre eles, o paciente, o magistrado de primeiro grau não fez referência a qualquer inciso do art. 169 386 do CPP, qual se vê do texto da sentença (fls. 2W37), que é de 23-10-1973. O MPF recorreu dessa decisão. O voto condutor do acórdão, de 7-10-1974, da lavra do ilustre Ministro Moacir Catunda, da P Turma do extinto Tribunal Federal de Recursos, acolhendo o parecer da Subprocuradoria-Geral da República, que transcreveu, assim concluiu (fls. 23/24): «Fico de acordo com as razões, de fato e de direito, aduzidas no parecer supra-transcrito. Os elementos informativos existentes no bojo das volumosas investigações administrativas, cujos autos se vêm em apenso, bastando à formação de juízo de suspeição, autorizativo do oferecimento de denúncia, não justificam, por si só, a condenação, mesmo porque para esta o direito exige prova contenciosa e a produzida durante a instrução e mostra-se reticente, débil, inapta a formar convencimento de que os apelados nomeados na denúncia de fl. 418, tenham realmente praticado contrabando ou descaminho, com infração de dever funcionaL Haja vista o depoimento de fl. 434, em que se faz referência à versão de uma pessoa já falecida, sobre a estranha conduta dos acusados de participação no episódio do barco fundeado no igarapé ~deus», que teria transportado automóveis de fabricação estrangeira, do exterior para Belém No tocante aos acusados de facilitação de contrabando ou descaminho, relacionados na denúncia de fls. 2/4, do apenso, que trata de volume contendo mercadorias estrangeiras, transportadas do exterior para Belém num avião da Varig, debilíssimos também são os elementos de convicção, de vez que nenhuma testemunha os incriminou em juízo. Os elementos reunidos nas investigações administrativas não resultaram jurisdicionalizados de sorte que dos cri- 170 R.T.J. — 150 mes narrados nas denúncias existem vagas suspeitas e não provas aptas a justificar condenação. A solução jurídica do caso, destarte, será o desprovimento do recurso, por falta de prova suficiente à condenação e neste sentido é o meu voto.» É de anotar que o parecer da Subprocuradoria-Geral da República, transcrito no voto, concluíra, nestes termos (fl. 23): «Assim sendo, opinamos por que se negue provimento ao recurso, acrescentando-se, porém, que as absolvições têm por suporte o artigo 386, n° VI, isto é, a insuficiência da prova colhida na instrução criminal». O ilustre Ministro Jorge Lafayette Guimarães, terceiro a votar, acompanhou o Relator, in verbis (fl. 26): «Sr. Presidente, meu voto é acompanhando o de Vossa Excelência Realmente, o que ocorre, segundo a convicção a que cheguei, é falta de provas, não sendo possível afirmar que os acusados não praticaram o crime. Como Vossa Excelência bem acentuou, o tempo decorrido dificulta essa prova. Entretanto, daí a chegar-se à afirmativa da inexistência do crime há uma distância considerável. Não me pareceu que a sentença — como declarou o nobre Ministro Revisor — tenha proclamado a inexistência do crime. Se assim foi, todavia, o Tribunal não está vinculado ao decidido. Há, inclusive, apelação do Ministério Público, possibilitando o não provimento do recurso, porém, com fundamento diverso, enquadrada a absolvição em outro inciso do art. 386, do CPP.» Discordando, em parte, do Relator, quanto à explicitaçáo relativa ao fundamento das absolvições, como Revisor, assim votou (fl. 25): «Sr. Presidente. Também nego provimento ao recurso, para confirmar a sentença, mas sem o acréscimo pedido pela douta Subprocuradoria-Geral da República em o final do seu parecer e admitido por V. Ex.'. Negando provimento ao recurso para cotar a sentença, parece-me que V. Ex.', data venial, não podia atendê-lo para declarar que as absolvições têm como suporte o art. 386, n° VI, do Código de Processo Penal. É que °motivo de cada urna delas está declarado pela decisão. De fato. Após definir o crime de facilitação de contrabando, a sentença afirma que os indiciados Ivan de Jesus Loureiro, Francisco Acioly Meireles e Antonio de Lima Vale não o cometeram (fL 510). E, de fl. 511 consta que, 'realmente, os contrabandos havidos não resultaram de facilidades, pois as mesmas não decorreram de atividades do acusado José Carvalho de Miranda, como inspetor da Alfândega de Belém, e dos denunciados Afilio Seabra Tobias, José Maria Paiva, Lauro Cardoso da Silva e Zito Brígido, como Fiscais Aduaneiros Por fim, está também escrito bem perto do final da sentença: «Portanto, inexistiu o alegado contrabando de automóveis e, como é óbvio, «facilidades» por parte dos aludidos acusados». (fl. 512) Isto posto, declarado pela sentença o motivo de cada uma das absolvições — inexistência do fato criminoso — somente a sua reforma autorizaria a sua modificação.» Verifica-se, dessa maneira, que, julgando recurso do Ministério Público, nada impedia pudesse a Corte a quo decidir como o fez. Não há falar em reforma& In pejus vedada. O acórdão podia acolher o apelo do MPF, que pleiteava a modificação integral da sentença, consoante observam os impetrantes na inicial. A Turma julgadora manteve a absolvição, mas o fez por fundamento diverso, o que lhe era lícito. Nem, para R.T.J —150 isso, haveria de prover o recurso. Podia manter a absolvição, por falta de provas suficientes à condenação, somente adotando o inciso VI do art. 386 do CPP. Reafirme-se que a sentença não foi expressa, quanto ao inciso do art. 386, do CPP, eis que, no ponto, silente (fl. 37). É de referir, no particular, que o próprio autor da sentença, hoje Presidente do coleado TRF-1' Região e Armistro já nomeado para o egrégio Superior Tribunal de Justiça, ilustre Juiz José Anselmo de Figueiredo Santiago, nas informações, afasta a pretensão dos impetrantes, ao afirmar (fl. 50): «Trata-se de pedido de habeas corpus por meio do qual se pretende, verbis: '... que seja o writ conhecido e deferida a ordem para anular o Acórdão ora atacado, proferido na Apelação Criminal n° 2.485 — PA, na parte que acrescentou que as absolvições tem por suporte o art. 386, n° VI, isto é, a insuficiência da prova colhida na instrução criminal, mantendo-se a decisão de 1° Grau'. Esta absolvera o paciente com base no art. 386, I, do CPP, vale dizer, por entender provada a inexistência do fato objeto da imputação. Percebe-se, de plano, que o paciente — por ter sido absolvido — não sofre nem está ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, peculiaridade que torna inidônea e inadequada, data venial, a utilização da ação constitucional do habeatt corpus, máxime para o fim colimado na inicial. A pretendida desclassificação do fundamento jurídico da absolvição do paciente implicaria, sem dúvida, irrecusável análise dos fatos da causa e importaria em aprofundada investigação do conjunto probatório reunido no processo, operação que esbarra em obstáculo incontomável decorrente da natureza sumaríssima da ação penal de habeas corpus. 171 Com estas breves considerações, espera o signatário não conheça do pedido o Colendo Supremo Tribunal Federal.» Também a Procuradoria-Geral da República, em seu parecer, às fls. 52/53, anota que o paciente foi absolvido em primeira instância, «não tendo porém o Magistrado, em atenção ao disposto no artigo 386 do Código de Processo Penal, declarado em qual dos incisos do mesmo artigo enquadrava a absolvição do réu». E conclui (fl. 54): <Xixi tese, é cabível a postulação do réu de alteração do fundamento da absolvição (cfe. TJSP, RT 526/325, apud. Código de Processo Penal Anotado, Saraiva, 1982, Damásio E de Jesus, página 206). Certamente, porém, o habeas corpus não é a via adequada para alteração dos fundamentos da absolvição, quando a postulação, como no caso, demandar exame de matéria bastante complexa de provas.» Do exposto, não há como atender à pretensão dos impetrantes, em que pese o esforço revelado na inicial .e ora da tribuna Não há, in casu, reconhecer a configuração de reformado in pejas, proibida. Autorizada estava a Corte julgadora a proceder como o fez, diante da análise da prova, que se entremostra complexa e volumosa, insuscetível de reapreciação no âmbito do babas corpus. Certo, porém, é que ilegalidade não há, no acórdão, a ensejar a decretação de nulidade postulada na inicial, no ponto em debate. Indefiro, assim, o habeas corpus. VOTO OSr. Ministro Francisco Rezek: Sempre estimei — e penso que não vai aí posição original dentro desta Casa — que o tema da reformado in pejos é perfeitamente comportável no âmbito do babem corpus. É uma das questões estritamente legais que examinamos — não raramente, diga-se de passagem —em habeas corpus. 172 R.TJ. — 150 Mas no caso, o que ficou demonstrado com o douto voto de Vossa Excelência é que isso não aconteceu. A prática do Supremo indica, como alta probabilidade estatística, que nossas críticas à reformatio in pejus, redundando na concessão de habena corpus, têm por premissa um quadro de desaviso, um lapso com que a instância de origem incide na reformado in pejus proibida. Não poderia ter-se dado esse fenômeno no caso do acórdão ora em exame, visto que, ficou claro, foi um acórdão extremamente estudado, resultante de debate que envolveu figuras das mais eminentes do antigo Tribunal Federal de Recursos. Sem dúvida, alterou-se para pior a situação do réu — que continuou absolvido, mas absolvido por fundamento menos reconfortante que aquele adotado em primeira instância. O que sucedeu foi algo a que o Tribunal estava autorizado pela presença em mesa do recurso da acusação. Insisto nesse particular, porque o tema j á nos deu algum trabalho meses atrás. Aqui o recurso da acusação visou realmente a agravar a situação do réu, a vê-lo condenado pela autoria de crimes cuja própria ocorrência fora negada no juízo monocrático. O Tribunal deu como certa a ocorrência do delito, mas estimou insuficiente a prova da autoria. Deu satisfação, ainda que mínima, ao Ministério Público. Caso diverso foi aquele em que o Promotor recorreu mas para ver abrandada a situação do réu, e o tribunal de origem curiosamente achou que, apesar do sentido benfazejo do recurso, estava autorizado, por que o recorrente era o Ministério Público, à reformatio in pejus. O caso em tela não tem essa rara característica que, no precedente, levou à concessão da ordem. Enaltecendo, com Vossa Excelência, o bom trabalho da defesa, também denego a ordem. VOTO O Sr. Ministro Marco Aurélio: Sr. Presidente, creio que toda a celeuma resultou de um fato: da circunstância de não se ter agasalhado o recurso do Ministério Público. Talvez, se tivesse vindo à balha o acolhimento, não estivéssemos, a esta altura, enfrentando um habena corpus. O Sr. Ministro Néri da Silveira (Presidente e Relator): A defesa teve oportunidade de esclarecer a situação, porque havia condições de interpor embargos infringentes, para que prevalecesse o ponto de vista do Ministro Peçanha Mastins. Se entendesse, pois, que realmente aquela conclusão do acórdão era gravosa para a situação dos réus, com base no voto vencido, em parte, caberiam embargos infringentes. O Sr. Ministro Marco Aurélio: Na sentença, estaria caracterizada a espécie do inciso I do artigo 386, que não foi, entretanto, expressamente mencionado. Não obstante, S. Ex.' entendeu que estaria configurada a hipótese, porquanto na sentença absolutória alude-se à prova da inexistência do fato: facilitar o contrabando. O Ministério Público interpôs o recurso em que foi claríssimo ao sustentar justamente o contrário e, com base nesse fato, fez um pedido bem mais elástico, mais abrangente, de transmudação da absolvição em condenação. Creio que a Turma do Tribunal Federal de Recursos, ao enfrentar esse recurso, ao enfrentar o apelo do Ministério Público e manter a absolvição, modificando apenas a capitulação da hipótese, não extravasou o pedido formulado. Por isso, acompanho V. Ex.', denegando a ordem. EXTRATO DA ATA HC 69.520— PA — Rel.: Min. Néri da Silveira. Pacte.: Lauro Cardoso da Silva. Imptes.: Guaracy da Silva Freitas e outros. Coator.: Tribunal Regional Federal da 1' Região. R.TJ —150 Decisão: Por unanimidade, a Mama indeferiu o «habeas corpos». Falou pelo paciente o Dr. Guaracy da Silva Freitas. Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Paulo Bmssard, Calos Valioso, Marco Au- 173 rélio e Francisco Rezek. SubprocuradoraGeral da República, a Dra. Odília Ferreira da Luz Oliveira. Brasília, 9 de fevereiro de 1993. José Wilson Aragão, Secretário. FUMAS CORPUS N° 69.628 — SP (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio Paciente e Impetrante: José Carlos da Silva— Coator: Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Habeas empas. Duplicidade. Mostrando-se o habeas co pus repetição de anterior, quando o órgão julgador sinalizou com a pertinência da revisão criminal, descabe admiti-lo. Assinatura. Falsidade. Artigo 389 do Código de Processo MIL Imprópria é a evocação da regra do inciso II do artigo 389 do Código de Processo Civil se a assinatura contestada consta de documento lavrado pelo próprio Juizo. A observância da regra segundo a qual cumpre à parte que produziu o documento demonstrar a boa procedência da assinatura esbarra na presunção de veraddade de atas e certidões lavradas. Carta precatória — Intimação do defensor. Se de um lado é certo afirmar-se que o defensor do acusado deve ser intimado para acompanhar o cumprimento da carta precatória, de outro não menos correto é dizer-se da preciusão da matéria quando não articulada na oportunidade de que cogita o artigo 500 do Código de Processo Penal, ou seja, em alegações finais, isto a teor do disposto no artigo 571, inciso II, do referido Código, no que apenas excepciona o processo sumário e o outrora existente processo para aplicação de medida de segurança por fato não criminoso. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na confomildade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em conhecer, em parte, do «babeas corpos» e, nessa parte, o indeferir. Brasília, 17 de agosto de 1993 — Néri da Silvara, Presidente —Marro Aurélio, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Marco Aurélio: Em Sessão realizada c= 3 de setembro de 1991, esta Turma apreciou babeas carpias também impetrado pelo ora Paciente. Na opor- 174 R.TJ. — 150 tunidade, consignou que a medida não se mostrava hábil a alcançar-se o exame de documento para saber-se da autenticidadae, ou não, de assinatura daquele constante, o mesmo ocorrendo quanto a nuanças relativas a reconhecimento levado a efeito. Daí haver denegado a ordem (fls. 59 a 63). Com esta impetração, procura o Paciente demonstrar que a conclusão da Turma decorreu da circunstância de haver requerido a juntada de documentos após a assentada em que julgado o habeas corpos anterior. São tecidas considerações sobre o ônus da prova quando contestada a autenticidade de assinatura Busca-se inspiração no artigo 389 do Código de Processo Civil para dizer-se, no campo da aplicação analógica, que, impugnada a boa procedência da assinatura, cabe à parte que produziu o documento comprovar a valia respectiva. Insiste-se em que o ora Paciente não é o autor da assinatura lançada na ata relativa ao cumprimento de precatória. Discorre-se, também, sobre a angência de intimação do advogado constituído para acompanhar o cumprimento da precatória Solicitadas informações à Corte de origem, encaminhou-se o ihrstre Segundo VicePresidente do Tribunal de Justiçado Estado de São Paulo, Dr. Dagoberto Sanes Cunha Camargo, fazendo-o conforme peça de fls. 68 a 74. Revela a luta do ora Paciente para alcançar desiderato favorável. Impetrou ele perante a Corte de origem os Habeas Corpus na 72.888-3 e 74.278-3 objetivando fulminar a prisão preventiva O segundo não foi conhecido por ser repetição do anterior. Remetidos os autos à Procuradoria-Geral da República, pronunciou-se esta pelo indeferimento da ordem, a duzindo que «a possível ausência de requisição do réu para inquirição de uma única testemunha, quando, como é certo, esteve presente ao depoimento de três vítimas e três outras testemunhas, não anula o processo, no caso, pois a eventual irregularidade não teve peso deci- sivo na decisão da causa e nem foi capaz de alterar a verdade substancial da mesma nuca». Recebi estes autos para exame em 4 de agosto de 1993, liberando-os para julgamento em 7 seguinte (fl. 155). É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Ressalvo mais uma vez a convicção pessoal quanto à competência para apreciar este habeas corpos, que é definida pelas partes envolvidas e, portanto, pela existência, ou não, da prerrogativa de foro. Desta não goza o Paciente, razão pela qual há de se considerar aqueles apontados como autoridades coatoras. São os desembargadores do Tribunal de Justiça e estes estão, a teor do artigo 105, inciso I, alínea a, da Constituição Federal, nos crimes de responsabilidade e nos comuns, sob a jurisdição direta do Superior Tribunal de Justiça, o que atrai a pertinência da norma inserta na alínea c do citado inciso. A observância da alíneal do inciso I do artigo 102 da Carta pressupõe a submissão à jurisdição direta do Supremo Tribunal Federal, o que não ocorre na espécie. Todavia, até aqui esta não é a conclusão da ilustrada maioria, o que tem atraído para esta Corte inúmeros habeas corpos que deveriam ser julgados pelo Superior Tribunal de Justiça. Atuando em Órgão fracionado, coloco em plano secundário o entendimento individual e homenageio a jurisprudência assentada, deixando para discutir a matéria em sede própria Aliás, isto já vem acontecendo, com o julgamento da Medida Reclamatória 341-DF. Após o voto do Relator, externei dissensão, seguindo-se pedido de vista do Ministro Francisco Rezeic. Assim, tenho o Supremo Tribunal Federal como competente para examinar este habeas corpos. Ao julgar o habena corpos anterior, esta Turma deixou sinalizada, como propícia ao debate pretendido pelo ora Paciente, a revi- R.TJ —150 são criminal. Confira-se com o que se contém às fls. 59 a 63. No que se pretende rediscutir a autenticidade, ou não, da assinatura lançaria na ata concernente ao cumprimento de carta precatória, este habeas corpos é repetição do anterior. No entanto, alega-se a pertinência do disposto no artigo 389 do Código de Processo Civil, segundo o qual incumbe o ônus da prova, quando se tratar de contestação de assinatura, à parte que produziu o documento. No particular, tenho que a matéria é nova e por isso não vejo esta impetração como repetição da anterior. Contudo, nem por isso procede a irresignação ora demonstrada. O documento que se ataca é de natureza pública, sendo produzido em juízo — a ata referente ao cumprimento da diligência. Tal dado revela, a mais não poder, que não se pode cogitar da aplicação analógica da regra instrumental comum. Impossível é transferir ao próprio Juízo a prova da autenticidade da assinatura do Paciente. Presume-se a boa procedência de tudo que se contém na ata lavrada e subscrita pelos presentes e pelo Juiz que presidiu os trabalhos, incumbindo à parte interessada comprovar o defeito alegado. Relativamente à ausência de intimação do advogado que vinha assistindo ao então Acusado, se é certo que as peças trazidas aos autos e também o processo principal requisitado por proposta da Procuradoria-Geral da República comprovam que realmente não houve a intimação, tem-se que preciosa está a matéria. Em alegações finais não foi veiculada como deveria, isto a teor do artigo 571, inciso II, do Código de Processo Penal. Frise-se, por 175 oportuno, que não se está diante de hipótese a envolver as exceções contempladas no citado inciso, ou seja, o processo sumário alusivo à contravenção, e o agora inexistente processo de aplicação de medida de segurança por fato não criminoso. Por tais fundamentos, concluo não conhecendo da impetração quanto à causa de pedir ligada à falsidade da assinatura do Paciente na ata de fl. 52, posto que repete a anterior. No que tange aos ônus da prova atinente à assinatura e à inexistência de intimação do advogado que vinha prestando assistência para acompanhar o cumprimento da carta precatória, denego a ordem pelos fatos supra-referidos, salientando que na assentada o Juízo designou defensor ad hoc. É o meu voto. EXTRATO DA ATA HC 69.628 — SP — Rel.: Min. Marco Aurélio. Pacta.: José Carlos da Silva. Impte.: O mesmo. Coator: Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Decisão: Por unanimidade, a Turma conheceu, em parte, do «habeas corpos» e, nessa parte, o indeferiu. Ausentes, ocasionalmente, os Ministros Paulo Brossard e Carlos Venoso. Presidente do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Paulo Brossarcl, Carlos Venoso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Haroldo Ferraz da Nóbrega. Brasília, 17 de agosto de 1993 — José Wilson Aragão, Secretário. HABEAS CORPUS Ir 69.821— SP (Primeira Tunas) Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves Paciente e Impetrante: Clocivaldo Zacarias Pereira — Coator: Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo 176 R.TJ. —150 Habeas carpa. Citação por edital e decretação de revelia feitas regularmente. Não tendo o paciente feito qualquer comunicação, à autoridade policial que o detivera, da audiência para a qual fora intimado, não pode ele, agora, alegar o só fato da prisão para pretender que o não-cumprimento se deu por motivo justificado. Improcedência da alegação de que a condenação se estribou decisivamente no depoimento de uma das testemunhas de acusação. «tiabeas corpos» indeferido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em indeferir o pedido de «habeas corpus» e determinar à Secretaria do Tribunal a retificação da autuação. Brasília, 18 de maio de 1993 — Moreira Alves, Presidente e Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Moreira Alves: Assim expõe e aprecia o presente habeas corpus o parecer da Procuradoria-Geral da República, de autoria do Dr. Edson Oliveira de Almeida: «1.0 impetrante, em causa própria, argúi a nulidade da Ação Penal n° 603/87 (23* Vara Criminal da Comarca de São Paulo), dizendo que, embora preso no 47° Distrito Policial, foi condenado à revelia, sem presenciar a inquirição das testemunhas da acusação. 2. Lê-se nas informações que, por fatos ocorridos no dia 30 de outubro de 1987, foram o paciente e outro co-réu denunciados perante o Juízo da Vigésima Terceira Vara Criminal da Comarca de São Paulo, como incursos no artigo 157, parágrafo 2°, I e II, c.c. o artigo 29, caput, ambos do Código Penal (fl. 21). Recebida a denúncia e decretada a prisão preventiva do paciente (fls. 22/3), foi o mesmo requisitado e interrogado (fl. 25). Ouvida a vítima (fl. 27), foi revogada a prisão preventiva (fl. 28) e expedido alvará de soltura em favor do acusado, que foi liberado em 10-12-87 (lis. 30 e 30v°). Foi designado dia 25-3-88 para a próxima audiência, dentes as partes (fl. 28). Entrementes, a advogada constituída dos réus renunciou ao mandato (petição protocolada em 6-1-88, fl. 31). Após infrutífera tentativa de intimação pessoal do paciente para constituir novo advogado (em 27-1-88), foi determinada a intimação por edital (publicação no Diário Oficial de 29-2-88, fl. 39), também não atendida A revelia do réu, decretada em 29-4-88 (fl. 43), deveu-se ao não comparecimento à audiência do dia 25 de março de 1988 (fl. 41), para inquirição das testemunhas da acusação. O paciente havia sido intimado para essa audiência quando do depoimento do ofendido, realizado em 9-12-87 (fls. 26/28). Após decretada a revelia, em audiência realizada em 23-6-88, foi ouvido o Sd PM José Edemur Sanches Madureira (fls. 45/6), cujo depoimento pesou desfavoravelmente aos interesses da R.TJ —150 defesa, como se colhe da sentença (fl. 53) e do acórdão da apelação (fl. 67). Encerrada a instrução (fl. 46) e apresentadas as alegações finais (fls. 47 a 50), sobreveio sentença condenatória, que apenou o paciente em 5 anos e 8 meses de reclusão e multa, por infração ao artigo 157, parágrafo 2°, I e II, do Código Penal (fls. 51/54). Expedido e cumprido o mandado de prisão (fl. 57), o condenado, intimado pessoalmente, apelou (fls. 58/61), tendo a E. Segunda Câmara do Tribunal de Justiça, por unanimidade, negado provimento ao recurso (fls. 64/69), transitado em julgado a condenação em 22-5-89 (fl. 70). 7. Ocorre que, conforme está comprovado pelo atestado de fl. 87, o paciente, que havia sido posto em liberdade em 10-12-87, foi preso novamente em 9-1-88, por outro crime de roubo, fato desconhecido do Juiz da causa. 8 Com isso, ao tempo da decretação da revelia (29-4-88),o paciente se encontrava preso e impossibilitado de comparecer espontaneamente à audiência Portanto, inobstante o desconhecimento do magistrado, não havia lugar para a aplicação do artigo 366 do Código de Processo Penal, visto que não configurado o tipo legal 'deixar de comparecer sem motivo justificado'. Por outro lado, restou inobservada a regra do artigo 360 do Código de Processo Penal: 'Se o réu estiver preso, será requisitada a sua apresentação em juízo, no dia e hora designados'. Oportuno observar que, já ao tempo em que se buscou localizá-lo para notificação da renúncia da advogada constituída (diligência datada de 27-188, fl. 33v.), o paciente se encontrava preso. A evolução da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal acerca do ar- 177 figo 360 do Código de Processo Penal está resumida no voto que o eminente Ministro Rafael Mayer proferiu no RHC 63.348-RJ: «O Sr. Ministro Rafael Mayer (Relator): Resultante do artigo 360 do Código de Processo Penal, é indeclinável seja o réu preso requisitado para o comparecimento aos atos da instrução criminal, importando a sua falta em nulidade. A controvérsia diz somente com a natureza dessa nulidade, se relativa ou absoluta. A mais antiga e tranqüila jurisprudência desta Corte sempre entendeu que a falta de requisição de réu preso à audiência de instrução constituía causa de nulidade absoluta e insanável, posto que afetado o direito de autodefesa que se assegura ao réu, e que tem singular oporamidade de exercitar-se na tomada de depoimento de testemunhas, pelos esclarecimentos que pode reclamar por via de seu defensor ou ainda pelo que a sua presença suscita de maior exigência de verdade no relato dos fatos. Entretanto, essa orientação jurisprudencial sofreu inflexão a partir da decisão pelo Plenário da Corte, por maioria de votos, do HC n° 54.217, relatado peb aninente Máásuo Cordeiro Guerra, e do HC n° 56.682, por unanimidade, relatado pelo eminente Ministro Antônio Neder, onde se fez doutrina de que aquela nulidade não assumia caráter de absoluto, sendo portanto, suscetível de sanamento e reclamando demonstração de prejuízo para que venha a ser decretada. A ementa do primeiro acórdão bem reflete a doutrina que passou então a prevalecer: «Habena atapus. Ausência dos réus à instrução criminal. Presença dos advogados constituídos e que nada objetaram, no ato, à rea- 178 R.TJ. — 150 lização do sumário, nem alegaram posteriomiente, nos prazos dos arfigos 499 e 500 do CPP, e cerceamento de defesa. Nulidade inocorrente. O exame do direito processual penal brasileiro revela que, indispensável é a defesa técnica do réu. A chamada autodefesa não é colocada pela lei, no tocante a sua indispensabilidade„ no mesmo plano da defesa técnica. Indeferimento do pedido.» Esse entendimento tem desde então prevalecido como se vê, ainda recentemente, no julgamento do HC n° 60.791, da Primeira Turma, relatado pelo eminente Ministro Néri da Silveira, e HC n° 61.330, da Segunda Turma, relatado pelo eminente Ministro Moreira Alves, e ainda no RE 100.285, por mim relatado (RTJ 107/445). Nas circunstâncias do caso, tão graves as irregularidades processuais e o prejuízo advindo automaticamente à defesa, que não é invocável o sanarnento, como devidamente destacado no douto voto vencido.» (RTJ 115 (2): 721-2, fev. 1986) Finalizando, o Min. Rafael Mayer, para enfatizar a singularidade do caso, lembra que no leading case da jurisprudência atual se considerou despicienda a presença do réu em razão do comparecimento e anuência do defensor por ele constituído». 11. Ocorre que, na hipótese concreta, o prejuízo é manifesto: o réu estava detido na mesma Comarca do Juízo, o defensor era dativo, e a prova da acusação, colhida sem a requisição do réu preso, influiu decisivamente para a condenação (o depoimento da testemunha foi conclusivo para validar o reconhecimento feito pelo ofendido e afinar a respon- sabilidade do paciente). Por isso, embora nada tenha sido alegado na apelação interposta pela defensora dativa, que nenhum contato teve com o paciente, não se pode ter como sanada a nulidade. Tais as circunstâncias, tem aplicação o precedente plenário, tomado no HC 54.483-RJ, relatado pelo emérito Ministro Antônio Neder e assim ementado: «Achando-se o réu na prisão, deve o juiz requisitar sua presença nos atos da instrução criminal. Nulidade. Petição de habeas coreus deferida.» (RTJ 80(1):37, abr. 1977) É interessante citar, para melhor explicitação, os votos do saudoso Ministro Cunha Peixoto e do eminente Ministro Moreira Alves, in verbis: «O Sr. Ministro Cunha Peixoto: — Sr. Presidente, pedi vista deste processo porque sustento ponto de vista de que a nulidade é relativa. Mas o eminente Ministro Antônio Neder ressaltou dois pontos que achei de suma importância: o réu, embora estivesse preso na mesma Comarca do Juízo, não foi requisitado; o advogado é dativo. Por esses motivos especiais, estou inteiramente de acordo com o eminente Ministro Antônio Neder e também concedo o habeas corpos. O Sr. Ministro Moreira Alves: Sr. Presidente, também defendo atese de que, no caso, se trata de nulidade relativa. Tendo em vista, porém, as duas circunstâncias que o eminente Ministro CunhaPeixoto acaba de ressaltar, também concedo a ordem.» 12. Pelo exposto, opino pelo deferimento da ordem para anular a Ação Penal n° 603/87 (23' Vara Criminal da R.TJ — 150 Comarca de São Paulo), a partir da decretação da revelia, sem a expedição de alvará de soltura. O paciente é elemento perigoso, havendo notícia da pendência de outros processos. Portanto, até que se esclareça melhor essa situação, por ora nebulosa, não é recomendável, ad contactam, a expedição de alvará de soltura, que poderia, inclusive, frustrar eventual prisão preventiva» (fls. 103/109) É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): 1. Do exame dos autos, verifico que o ora paciente foi interrogado em Juízo, ocasião em que, além de declarar ter advogado — a Dra. Ivone Garcia Bueno —, informou residir na rua Padre Nelson Antônio, 93 — Jardim Fujiará — Santo Amaro. Tendo sua advogada mandado de intimação pessoal para a constituição de novo patrono, mandado esse que, com relação ao ora paciente, não pode ser cumprido por não haver o oficial de justiça encontrado o n° 93 da referida rua. Em face disso, fez-se a intimação por edital para a constituição de novo defensor. Posteriormente, no dia 25 de março de 1988, o ora paciente não compareceu à audiência para a oitiva das testemunhas de acusação, embora tivesse sido intimado pessoalmente para o comparecimento nessa data quando esteve presente à audiência de oitiva da vítima (que depôs) e das testemunhas de acusação (que não compareceram). Portanto, como se vê, a citação por edital se fez regularmente por não existir (e o ora paciente não afirma o contrário) o endereço indicado no interrogatório, e a sua revelia, que decorreu de sua ausência apesar de ter sido ele intimado pessoalmente para a audiência, também se fez regularmente, não havendo sequer alegado o ora paciente que, embora detido numa Delegacia de Polícia, haja comunicado — como deveria ter procedido —à autoridade competente que estava intimado a comparecer 179 em Juízo, só não o tendo feito por impossibilitado de fazê-lo por ação ou omissão dessa mesma autoridade. Aliás, mesmo posteriormente, quando foi intimado pessoalmente da sentença condenatória — e intimação pessoal que se deu em decorrênciada comunicação ao Juízo de que ele fora recolhido à Casa de Detenção para cumprimento de pena que lhe fora imposta em outro processo —, e apelou, nada alegou o ora paciente quanto ao seu não-comparecimento à audiência em virtude da qual sua revelia foi decretada. Assim sendo, e não tendo o ora paciente feito qualquer comunicação, à autoridade policial que o detivera, da audiência para a qual fora intimado, não pode ele, agora, alegar o só fato da prisão para pretender que o não-comparecimento se deu por motivo justificado. E não se invoque o precedente alegado pela Procuradoria-Geral da República (11C n° 54.483), em que o réu estava preso, disso tinha conhecimento o Juiz, e apesar dessa circunstância não foi ele requisitado para a audiência, da qual não tinha ciência (RTJ 80/37-38). No caso, portanto, não há sequer nulidade relativa, até porque a justificativa do não-comparecimento à audiência para a qual fora intimado e que dera margem à decretação da revelia incumbia ao ora paciente que não a alegou na ação penal apesar de intimado pessoalmente da sentença condenatória, certo como é que o acórdão que manteve a condenação transitou em julgado em 22 de maio de 1989, e o atestado policial relativo à detenção quando da realização da audiência é datado de 25 de março de 1992. Note-se, por fim, que não é exato dizerse que a condenação se estribou decisivamente no depoimento de uma das testemunhas de acusação, pois, tanto a sentença condenatória quanto o acórdão que a confirmou, enfatizaram a circunstância assim referida no aludido aresto: 180 R.TJ. — 150 «Embora a vítima tenha hesitado em reiterar a recognição dos réus em juízo, o que é compreensível posto que temerosa de eventual represália já que eles se encontravam presentes na audiência, acabou por revelar dado importante para a dilucidação da autoria, até então desconhecida nos autos. E que além do carro os ladrões subtraíram, também, um relógio de pulso que foi encontrado pelos policiais na cela onde eles foram recolhidos após a prisão em flagrante delito (fl. 50).» (fls. 67/68). 2. Em face do exposto, indefiro o presente habeas corpus. ADITAMENTO AO VOTO O Sr. Ministro Moreira Alves (Presidente e Relator): Determino à Secretaria que corrija a autuação, tendo em vista a circunstância de que a autoridade coatora não é °Juiz de Direito da 23a Vara Criminal da Comarca de São Paulo, mas, sim, o Tribunal de Alçada Criminal do mesmo Estado. EXTRATO DA ATA HC 69.821— SP —Rel.: Min. Moreira Alves. Pacta. e Impte.: Clocivaldo Zacarias Pereira. Coator: Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo. Decisão: A Turma indeferiu o pedido de «habeas corpus», nos termos do voto do Relator e determinou à Secretaria do Tribunal que retifique a autuação. Unânime. Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Sydney Sanches, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e limar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza. Brasília, 18 de maio de 1993 — Ricardo Dias Duarte, Secretário. «ABRAS CORPUS N° 69.866 — SC* (Primeira Turma) (Diligência na RTJ 149/485) Relator. O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence Paciente: Manoel Urbano Camargo dos Santos — Impetrantes: José M. Soar e outro — Coator: Superior Tribunal de Justiça Júri: coerência necessária entre a versão do fato da denúncia com a da pronúncia, que a tenha acolhido à qual, de sua vez, devem conformar-se o libelo e o questionário. «Se o libelo não pode contrariar a pronúncia nem o questionário divergir do libelo, óbvio é que a pronúncia constitui o padrão regulador, cuja autoridade se estende, plena e inalterável, até o julgamento» (Ruy Barbosa): portanto, há nulidade absoluta, se a denúncia não aditada e a pronúncia, que a acolheu, imputaram aos dois co-réus participação indeterminada na prática do homicídio, que afirmam resultante de um único disparo de arma de fogo, ao passo que o libelo, ao qual se conformou o questionário, atribui a um deles a cooperação no fato por haver desferido «disparos de anua de fogo contra a vítima». * Relatório: Vide RTJ 149/485. R.TJ —150 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em deferir o pedido de diabeas coipus», para anular o processo a partir do libelo, inclusive. Brasília, 6 de abril de 1993 — Octavio Gallotli, Presidente— Sepúlveda Pertence, Relator. VOTO O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Na sessão de 15-12-92, assim relatei o caso (lê o relatório). Meu voto acolhia a primeirá das nulidades arguidas, relativa às três recusas a mais, não permitidas ao defensor único de ambos os co-réus; nessa parte, contudo, fiquei vencido. Acolheu, porém, a Turma minha proposta de requisição dos autos do processo condenatório, para exame dos demais fundamentos do pedido, assim formulada no meu voto: «As nulidades remanescentes dizem com o questionário. A primeira é atinente aos quesitos sobre a materialidade e a autoria (ou co-autoria) do homicídio. Confesso que a leitura da denúncia, de um lado, e do libelo e do questionário, me deixam em perplexidade, que os autos não permitem dissipar talvez por lhes faltar o teor de pronúncia. Com efeito no processo do Júri, a pronúncia, na extensão em que a declare procedente, deve guardar coerência com a denúncia. De sua vez, o libelo há de ser conforme à pronúncia; e o questio- 181 nário, no que disser com a versão acusatória, há de adequar-se ao libelo. No caso, a denúncia assim descreve o fato (fl. 23): «No dia 16 de setembro de 1986, por volta de 12 horas, os denunciados abordaram a vítima Paulo Sniltnia à saída de seu escritório no centro desta Capital e, pretextando pagar uma dívida, atraíram-na para o interior do automóvel que tripulavam. Em seguida tomaram a direção do Parque da Harmonia (proximidades da Câmara de Vereadores) onde, fazendo uso de uma arma calibre 6.35, abateramna com um tiro na região occipital. A vítima teve morte instantânea. Os denunciados suspeitavam de relações amorosas entre a vítima e Cleusa Santos, esposa e mãe respectivamente do primeiro e do segundo denunciado. Este o motivo do crime. Usaram o pagamento de antiga dívida como artificio para dissimular suas verdadeiras intenções, eis que, atraída a vítima para o interior do automóvel esta ficava a mercê dos agressores e sem poder safar-se. As indagações policiais não lograram individuar a atuação de cada participe no evento, mas é certo que agiram em concerto.» Para que, na pronúncia, se enriquecesse a imputação e se individualizasse a conduta atribuída a cada um dos coréus, a denúncia deveria ter sido aditada, Mas, nem se tem notícia de aditamento, nem dos termos da pronúncia O que se conhece são os libelos, literalmente idênticos para os dois réus e assim articulados com relação ao. paciente (fl. 25): (<(..) 1. que no dia 16-9-86, após o meio-dia, no Parque da Harmonia, 182 R.T.J. — 150 em Porto Alegre/RS, mediante disparos de arma de fogo, alguém produziu em Paulo Smânia as lesões corporais descritas no auto de necrópsia de fls. 78/82; que ditas lesões causaram a morte da vítima; que o réu Manoel Urbano Camargo dos Santos, ao desferir disparos de arma de fogo contra a vítima, Paulo Smânia, concorreu para a prática do crime; que o réu Manoel Urbano Camargo dos Santos concorreu de qualquer modo para a prática do crime; que o crime foi cometido mediante dissimulação, pois o réu usou o pretexto de pagar uma dívida para esconder suas verdadeiras intenções, atraindo a vítima para o interior de um veículo automotor, aonde ela teve dificultada a sua defesa.» De sua vez, o questionário submetido ao Júri, no que interessa, segue substancialmente o libelo (fl. 55). A dissonância entre a denúncia, de um lado, e o libelo e questionário de outro, é evidente; mas sua exata relevância pende do conhecimento da existência ou não de explicação processual adequada. Voto pela conversão em diligência para requisição dos autos originais e seu exame propiciará melhor análise também das te," restantes da impetração. Recebidos os autos principais requisitados, devolvo o caso à Mesa. II A consulta aos autos do processo principal forneceu-me os dois dados de fato de que necessitava: primeiro, a certeza de que não houve aditamento da denúncia e, de outro lado, a confirmação de que a pronúncia, em conseqüência, estritamente se manteve, como era devido, nos lindes da imputação de fato veiculada na inicial acusatória Recorde-se que, na denúncia, o núcleo da imputação típica de homicídio em co-autoria contra o paciente e seu filho foi que, depois de atrair e conduzir a vítima ao local do fato, «fazendo uso de uma arma calibre 6.35, abateram-na com um tiro na região occipital»; a atribuição indiferenciada do ato criminoso a ambos os acusados —não obstante a vítima houvesse recebido um único tiro —ficou explicado ao final da denúncia: «As indagações policiais não lograram individuar a atuação de cada participe no evento, mas é certo que agiram em concerto». Note-se que, na denúncia sequer houve alusão à existência, ou não, no episódio o que'é ponto controverso no processo de um segundo disparo de arma de fogo, que não atingiu a vítima. Por isso, ao propor a requisição dos autos, acentuei que, como é óbvio — à vista de princípios elementares do processo acusatório —, «para que, na pronúncia, se enriquecesse a imputação e se individualizasse a conduta atribuída a cada um dos coréus, a denúncia deveria ter sido aditada. Mas — ponderei — nem se tem notícia de aditamento nem dos termos da pronúncia». Agora, tem-se que efetivamente não houve aditamento. E, de seu turno, a pronúncia é de todo congruente à imputação delimitada na denúncia. Com efeito. Na pronúncia, depois de transcrever literalmente a versão da denúncia e relatar o processo, na fundamentação limitou-se o Juiz, no que interessa, asseverar (vol. 4/581, 582): «Os réus devem ser pronunciados, pois está provado o fato e existem indícios suficientes de que são autores. R.T.J —150 O réu Elton Caldas confessou a autoria, tanto que sua tese defensória é a legítima defesa, como está registrado à fl. 571. No tocante ao réu Manoel Urbano, os elementos que constam dos autos conduzem à pronúncia, irretorquivelmente. E, à negativa do paciente, de qualquer participação ou simples presença no fato, redargúi a pronúncia (ap., vol. 4/582): «Há vários indícios de que Manoel Urbano participou do fato, direta ou indiretamente: Algumas testemunhas viram o carro alugado por Manoel Urbano, no Parque da Harmonia, proximidades da Câmara de Vereadores; há quem diga que no carro estavam duas pessoas, ou uma e uma coisa de cor alaranjada, no lado direito, o que bem poderia ser uma pessoa agachada; há quem diga, também, que o motorista do cano poderia ser Manoel Urbano; se existiam razões para matar a vítima, era ele quem tinha, pois falam de um romance entre sua esposa e Smânia; foi o próprio Manoel Urbano quem locou o automóvel, e só por quatro horas, quando estavam viajando em automóvel próprio. 183 incidentemente, à cogitada ocorrência de um disparo, um único, além do que feriu a vítima, nem muito menos atribuiu a prática de disparos — assim no plural — a cada um dos acusado& Ao contrário no que diz com o paciente, a pronúncia explicitamente se adstringiu aos termos da imputação indeterminada, que lhe dirigira a denúncia: à sua negativa de qualquer participação no fato, cingiu-se a pronúncia a responder que «há vários indícios de que Manoel Urbano participou do fato, direta ou indiretamente...» Sucede que, a essa confessada indeterminação da denúncia e da pronúncia, quanto à participação do paciente no fato criminoso, contrapuseram-se, de outro lado, radicalmente, o libelo e o questionário submetido ao Júri: o que se lhes atribui, no libelo (ap., vol. 5/601) e também, nos mesmos termos, se indagou do Júri (ap., vol. 6/827v.) — no quesito que decidiu de sua condenação —, foi o fato determinado de que «fazendo dispares de amua de fogo, concorreu para a prática daquelas lesões», ou seja, das lesões «que causaram a morte da vitima», o evento, no entanto, vale insistir, que, segundo a denúncia e a pronúncia, teria resultado de um único disparo, de autoria Não há dúvida que tais indícios são não individuada. suficientes para a pronúncia do acusaTem-se, pois, em ponto decisivo, do e a impronúncia, como quero hábil diversidade frontal entre a pronúncia (fiel à defensor, constituir-se-ia em indevida denúncia), de um lado, e, de outro, o libelo intromissão do juiz, em matéria da e o questionário nele decalcado. competência exclusiva do Tribunal do Nesse quadro, não vejo como refutar Júri». a alegação de nulidade. Manteve-se, pois, o Juiz da pronún19. Nos procedimentos bifásicos, do tipo cia, rigorosamente, nos termos e nos limi- do que, no direito brasileiro, ainda remates do objeto do processo, ou seja, da im- ' nesce nos processos de competência do putação de fato contida na denúncia. E a Júri, constitui um truísmo a sujeição do falta de aditamento espontâneo ou provoquestionário ao libelo e deste à pronúncia, cado da inicial, não poderia ter agido diver- de tal modo que, como ensinou o velho samente. Faustin Hélie, citado por Rui Barbosa (Obras 14. A pronúncia nada acrescentou à ver- Completas, MEC, 1965, v. XV, 1988, t. são da denúncia. Nem se referiu, sequer 1/214), em verdade, no juízo da causa, «a 184 R.TJ. —150 pronúncia é a base única e exclusiva de toda a acusação». 20. «Se ao libelo, de feito» — aduziu Rui (Coisa Julgada em Matéria Criminal, na ob. cit., XV, 1/195, 217) — «não se permite deslizar da pronúncia, forçosamente se segue ser esta a base inevitável dos quesitos, de que é molde obrigatório o libelo...». Com efeito, insistiu o mestre (ob. loc. dt., pág. 218), «se o libelo não pode contrariar a pronúncia nem o questionário divergir do libelo, óbvio é que a pronúncia constitui o padrão regulador, cuja autoridade se estende, plena e inalterável, até o julgamento». (...), «pois repugnaria ao senso comum e à humanidade mais elementar que, formada a culpa numa imputação, corresse o julgamento sobre outra». Por isso, concluía, de novo com palavras de Hélie, «inquinam-se de nulidade os quesitos, quando versam sobre fatos diferentes dos mencionados na pronúncia». 2L A citação de Rui vale apenas pela recordação dessa sua rara incursão na área penal: a verdade, já então cediça, da inteira submissão do libelo e do questionário à pronúncia continua a ser ponto incontroverso, na doutrina do Júri (v.g., Magarinos Torres, Processo Penal do Jury, § 57, pág. 234; J. Frederico Marques, O Júri no Direito Brasileiro, 1955, pág . 244; Marrey, Franco e Stoco, Júri, 1993, pág . 179). 22. Aliás, essa nenhuma força própria do libelo (Meio de Abreu e Lima, «Do Libelo Crime Acusatório», 1953, pág. 19, apud J. F. Marques, ob. cit., pág 248) — é que levou, na Itália, à abolição do similar atto di accusa, no procedimento da Corte d'assise, já preconizada desde 1905, porque considerado, no testemunho de Manzini (verb. Atti di Accusa, Novis. Dig., 1.2/1481) — «un inudile riassunto della sentença di rinvio». Certamente pelo mesmo motivo, o libelo foi suprimido no anteprojeto Frederico Marques de C. Proc. Penal (cf. arts. 581 ss). Inequívoca, no caso, a dr«mnformidade substancial entre a imputado facti acolhida na pronúncia e a veiculada originariamente no libelo, que se refletiu no quesito decisivo à condenação do paciente, a nulidade se me afigura radical e absoluta, pois importou em alterar o próprio objeto da acusação admitida na decisão preclusa. Desse modo, concedo o habeas corpus para anular o processo a partir do libelo, inclusive: é o meu voto. EXTRATO DA ATA HC 69.866 — SC — Rel.: Min. Sepúlveda Pertence. Poete.: Manoel Urbano Camargo dos Santos. Imptes.: José M. Soar e outro. Coator. Superior Tribunal de Justiça. Decisão: Por maioria de votos, a Turma indeferiu o pedido de «habeas compus», quanto à primeira alegação de nulidade do sorteio de Crocrlho de Sentença, vencidos os Ministros Relator e Celso de Mello. Prosseguindo, a Turma converteu o julgamento em diligência, para aquisição dos autos originais, nos termos do voto do Relator. Unânime. Falou pelo paciente o Dr. José Manuel Soar. Turma, 15-12-92. Decisão: A Turma deferiu o pedido de «habeas corpo» para anular o processo a partir do libelo, inclusive, nos termos do voto do Relator. Unânime. Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotti, na ausênciajustificada do Sr. Ministro Moreira Alves (Presidente). Presentes à Sessão, os Srs. Ministros Sepúlveda Pertence e Celso de Mello. Ausente, justificadamen• te, o Sr. Ministro Ilmar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Miguel Franzino Pereira. Brasilia, 6 de abril de 1993 — Ricardo Dias Duarte, Secretário. r R.T.J —150 185 HABEAS CORPUS N° 69.879 — SP (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Paulo Brossard Paciente e Impetrante: José Júnior Maximiano — Coator: Superior Tribunal de Justiça ellabeas carpas" Nulidades. Cerceamento de defesa. Reconhecimento fotográfico na fase inquisitória com observância do art. 226 CPP. Renovação dos atos probatórios na instrução judicial, sob o crivo do contraditório. Prova que não constitui único elemento na formação da convicção do juízo da condenação. Nulidade inexistente. ' eia judiciária. Dispensa das testemunhas de defesa e Assistes, da acusação na audiência de instrução. Ausência de defesa não caracterizada. Efetivo prejuízo não demonstrado (art. 563, CPC). Oportunidade de alegação, já superada (arta. 564, IV, 571, II, 572 CPP). Ordem conhecida, mas indeferida. hora. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros componentes da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, por unanimidade de votos e na conformidade da ata do julgamento e das notas taquignlficas, indeferir o «habeas corpus». A Secretaria deverá adotar as providências determinadas na parte foral do voto do Ministro Relator. Brasília, 8 de junho de 1993 — Paulo Brossard, Presidente e Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Paulo Brossard: Cuida-se de «habeas corpus» impetrado pelo próprio paciente no qual se alega nulidade do processo condenatório, em razão de cerceamento de defesa. O paciente, preso e recolhido à Penitenciária Regional de Maré, São Paulo, condenado a 10 anos de reclusão e multa, por infração ao artigo 157, § 2°, I, D, c.c. 71, do Código Penal, sentença essa reformada pelo Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo, que reduziu a pena para 6 (seis) anos e 8 (oito) meses de reclusão, alega, em síntese: nulidade do reconhecimento fotográfico, segundo a jurisprudência desta Corte; nulidade do processo, porque não fora assistido por advogado, pois o que lhe fora nomeado, dispensou sua presença da audiência, bem como o depoimento das testemunhas de defesa, limitando-se a cumprir apenas as formalidades do processo, ao assinar o respectivo termo de assentada da audiência. 2.0 paciente, anteriormente, impetrara ordem de «habeas corpos» com alegações idênticas. Todavia, em razão da denegação do writ interposto perante o Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo, quando ainda tramitava recurso de apelação, determinei a remessa dos autos ao Superior Tribunal de Justiça, por ser o competente para o seu julgamento, o qual indeferiu a ordem requerida. Eis a ementa do acórdão: «Ementa: Penal. «habeas comais». Nulidade do Processo. 186 R.TJ. — 150 — Todas as fases processuais foram orientadas pelas regras ditadas pelo Código Adjetivo Penal. todo, em face da renovação dos atos durante a instrução criminal, sob o crivo do contraditório. O contraditório, amplo e irrestrito, saneia qualquer irregularidade havida na fase inquisitória. Ademais, a respeito do reconhecimento fotográfico, esta Corte assim já se manifestou: As ações cometidas por defensor, não trazendo prejuízo ao réu, ou as omissões, não servem de suporte para pretensa anulação de julgamento.» «Prova. Matéria criminal. Reconhecimento fotográfico. Vítimas que através desse meio identificaram o acusado. Existência de outros elementos nos autos corroborando-o. Condenação subsistente. Habeas corpus denegado. 3. Solicitadas as informações a autoridade apontada como coatora, estas vieram aos autos do Ofício n° 548/GP-STJ, com os documentos de fls. 15/20. 4.0 Ministério Público Federal, às fls. 22/24, manifesta-se pelo indeferimento do Pedi. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Paulo Brossard (Relator): Alega o paciente nulidade processual, por cerceamento de defesa. Sustenta que fora condenado em razão de conhecimento fotográfico e não fora assistido por advogado, vez que o defensor «ad hoc» além de dispensar sua presença na audiência de instrução, em que foram ouvidas a vítima e as testemunhas arroladas pela defesa, não diligenciou em seu favor, limitando-se a assinar o termo da audiência. Não procede a alegação de nulidade do reconhecimento fotográfico, porquanto esse foi realizado na fase inquisitória orientado pelas regras ditadas pelo art. 226 do Código de Processo Penal, como se colhe do julgamento proferido pelo Superior Tribunal de Justiça, quando da primeira impetração (fls 15/20). Colhe-se ainda das informações, que esta prova não foi o único fundamento a ensejar a convicção do juízo da condenação, sendo certo que, eventual irregularidade na fase inquisitória não contamina necessariamente o procedimento como um O reconhecimento fotográfico é meio válido de prova que deve, como todos os demais, sofrer o exame crítico do magistrado. Reconhecimento confirmado por provas diretas e circunstâncias pode legitimar o convencimento do juiz para condenar o indiciado». (HC n° 57 355-0-SP —RT 542/433). 2. No que concerne à defesa, como se colhe das informações, é exato que o impetrante e paciente não esteve presente à audiência em que foram ouvidas as vítimas e as testemunhas arroladas na denúncia, oportunidade em que foram dispensadas as da defesa. Todavia, além do paciente não haver comprovado ocorrência de efetivo prejuízo (art. 563, do CPP), o seu defensor dativo compareceu a audiência incriminada, assinando o respectivo termo sem nada dissentir, não o fazendo nem mesmo em alegações finais, restando, pois, sanada eventual irregularidade por falta de oportuna alegação, diante do que dispõem os arts. 564, IV, 571, II, 572, todos do Código de Processo Penal. A ausência do acusado à audiência e a dispensa das testemunhas de defesa não são capazes de infirmar a decisão condenatória; se o defensor entendeu-as desnecessárias, bem ou mal, sábio ou erradamente, podia fazê-lo, sem que isso importasse em nulidade de decisão. R.T.J — 150 Nos termos do parecer do Ministério Público, conheço do pedido, mas o indefiro. Por tratar-se de paciente preso e sem advogado constituído nos autos, determino à Secretaria que se lhe envie cópia desta decisão. EXTRATO DA ATA HC 69.879 — SP — Rel.: Min. Paulo Brossard. Pacte.: José Júnior Maximiano. Impte.: O mesmo. Coator: Superior Tribunal de Justiça. Decisão: Por unanimidade, a Tunna indeferiu o «habeas corpus». A Secretaria 187 deverá adotar as providências determinadas na parte final do voto do Ministro Relator.Ausente, ocasionalmente, °Ministro Presidente. Presidiu° j ulgamento o Ministro PauloBrossard. Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Paulo Brossard, Carlos Velloso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. Subprocurador-Geral da República, o Dr. Mardem Costa Pinto. Brasília, 8 de junho de 1993 — José Wilson Aragão, Secretário. HABEAS CORPUS N° 69.940 — RJ (Primeira Turma) Relator O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence Paciente: Carlos Lopes Machado — Impetrante: José Mauro Couto de Assis — Coator: Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro I — Homicídio: qualificativa de cometimento do crime mediante paga ou promessa de recompensa que, embora relativa ao mandatário, se comunica ao mandante. H — Júri: quesitos: pretensa nulidade que, se existente, nenhum prejuízo causou à defesa, pois relativo o quesito impugnado à segunda qualificadora do homicídio, cuja pena foi fixada no mínimo kgaL HI — Júri: quesito não obrigatório: menor importância da participação de co-réu, não alegada pela defesa. RELATÓRIO ACÓRDÃO O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: O ilustre advogado José Mauro Couto de AsVistos, relatados e discutidos estes ausis requer habeas corpus em favor de Cartos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na con- los Lopes Machado, condenado pelo Júri formidade da ata do julgamento e das notas por tentativa de homicídio qualificado, detaquigráficas, por unanimidade de votos, cisão que, embora nula, foi mantida, em em indeferir o pedido de «babeas corpus». apelação, pelo Tribunal de Justiça do atado do Rio de Janeiro. 2. Dizem as nulidades argüidas com o Brasília, 9 de março de 1993 — Moreira Alves, Presidente — Sepúlveda Per- libelo — infiel à pronúncia — e o questionário. tence, Relator. 188 R.TJ. — 150 Em síntese, alega-se: 1°) ao passo que, na pronúncia, coerente com a versão da denúncia, a qualificativa do motivo torpe, com relação ao paciente, situou-se em ter a suaparticipação no crime derivado de vingança contra a vítima, por questões comerciais, no libelo e no questionário, a mesma qualificadora teria consistido na promessa de recompensa aos autores materiais da agressão; 2°) que é complexo o terceiro quesito — O acusado, de qualquer maneira, colaborou para a prática do atue prometendo ele a recompensa em dinheiro para os que atiraram. 3°) a denúncia e a pronúncia situaram a segunda qualificativa em ter sido o crime «cometido em condições que dificultou a defesa da vítima» (sic), ao passo que o quesito correspondente indagou se o crime fora cometido «em condições que tomaram impossível a defesa da vítima»; 4°) finalmente, omitiu-se quesito obrigatório sobre ter sido de menor importância a participação do paciente na prática do delito. Documenta a petição a jurisprudência do STF no sentido de ser absoluta a nulidade decorrente de vícios do questionário submetido ao Júri, quando, por sua gravidade, capazes de conduzir o Conselho de Sentença a perplexidade sobre as indafiações. Deferi a liminar, verbis (fi. 51): «Defiro a liminar requerida para sustar a execução do mandado de prisão ou relexá-la, se já cumprido: os fundamentos do pedido são relevantes e a prisão indevida é fonte de danos irreparáveis. Solicitem-se informações.» O parecer do ilustre SubprocuradorGeral Cláudio Ponteies é pela denegação da ordem. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Impressionou-me a primeira argüição de nulidade, formulada com maestria, de cuja improcedência, no entanto, acabei por convencer-me. 2. Acentua, a propósito, o parecer do Ministério Público Federal (fl. 84): «Importa pois bem conhecer os termos da denúncia, que assim estão, na descrição e definição jurídica da conduta do paciente, verbis: «Os denunciados Carlos e José contrataram os dois primeiros denunciados, que para eles trabalhavam como 'seguranças', fazendo a eles promessa de pagamento, motivados por um outro motivo torpe, a eliminação da vítima que com eles participava do quadro acionário de uma empresa de turismo e que pretendia afastar-se da empresa, por não concordar com procedimentos ilegais que os denunciados estavam adotando. Assim procedendo, incidiram os denunciados Nelson e Valdir nas sano.% do artigo 121, § 2°, itens I e IV, em combinação com o item II do artigo 14, enquanto que os denunciados Carlos e José incidiram nas mesmas sanções, em combinação com o artigo 25, todos do Código Penal, sendo de se aplicar aos dois últimos as circunstâncias agravantes específicas». A pronúncia, com efeito tem por provada a denúncia, nos termos em que esta se pôs, porque: «Os acusados Carlos e José, filho e pai, tinham sérias divergências com a vítima na firma da qual os três eram sócios. As discussões entre o réu Carlos e a vítima eram freqüentes e públicas, conforme consta de diversos depoimentos colhidos. R.T.J — 150 Presentes, portanto, os indícios de autoria que autorizam a remessa dos autos a julgamento pelo Júri. Indiciadas, também, as qualificativas articuladas na denúncia, segundo a versão ali contida». (Pronúncia à fl. 66, grifamos.) Portanto, estabelecido ficou no ilididum accusationais que na conduta de Carlos fortes indícios havia de que perpetrara homicídio duplamente qualificado: por contratar a morte de desafeto e por fazê-lo em outra torpe motivação: silenciar o sócio que se indispunha contra os procedimentos ilegais que na empresa realizava.» 3. Certo, não há dizer que age por motivo torpe aquele que contrata outrem, mediante promessa de recompensa, para a execução do homicídio. Não obstante, independentemente da motivação que o tenha induzido à contratação do sicário, responde o mandante por crime qualificado por ter sido cometido «mediante paga ou promessa de recompensa». Trata-se de circunstância pessoal do executor, que, no entanto, porque elementar do tipo qualificado do homicídio, se comunica ao mandante. Preciso, nesse sentido, o voto-vista do eminente Ministro Aldir Passarinho, no HC 66.571, 20-6-89, Boda, Lex STF, 156/229,236: «Na verdade, o quesito quanto a ter sido o crime cometido por motivo torpe, deveria ter-se referido ao executor e não ao mandante, pois, como disse, a mim parece que em relação a este último não poderia haver compatibilização nas respostas afirmativas quanto ao motivo torpe e, concomitantemente, quanto ao motivo fútil. Ocorre, entretanto, que, no caso, a toda evidência, pelo que resulta induvidoso dos autos, ao responderem os jurados afirmativamente ao quesito concernente ao motivo torpe, por ter 189 sido o crime executado mediante pagamento, não quis referir-se ao paciente, mas sim ao executor e, assim sendo, tem-se que tal circunstância qualificadora se comunica ao mandante — no caso, o ora paciente, inobstante tratar-se de circunstância de caráter pessoal, posto que a incomunicabilidade das circunstâncias pessoais deixa de existir quando estas se inserem na própria ação do crime, segundo resultava da parte foral do art. 26 da anterior Parte Geral do Código Penal, que assim dispunha: 'Não se comunicam as circunstâncias de caráter pessoal, salvo quando elementares do crime'. Tal regra veio a ser mantida na nova Parte Geral do Código Penal, pelo art. 30, com a mesma redação. Nelson Hungria, comentando o art. 26 do Código Penal da anterior Parte Geral e que, como se disse, corresponde ao atual artigo 30, rq36s exemplificar o 'motivo torpe' como circunstância pessoal, observa que 'a incomunicabilidade das circunstâncias pessoais cessa quando estas entram na própria noção, a do crime', advertindo: 'No homicídio qualificado, por exemplo, as qualificativas de caráter pessoal ex capite executoras se estende aos partícipes' (Comentários, vol. I, Tomo II, pág. 437, 4° ed.).» Por isso, afirmada, na pronúncia, a qualificativa da promessa de recompensa, correta a inclusão do quesito a ela correspondente na série relativa ao paciente, tanto mais que a sua redação deixa claro que a promessa de recompensa fora o móvel dos executores e não do mandante (cf. 4° quesito, fl. 70: O atue foi cometido por motivo torpe, promessa de recompensa feita aos agressores?) É verdade que a denimcia e a pronúncia afirmaram também a torpeza da motivação do paciente, que deveria ter sido incluída no questionário, seja para a hipótese de que a outra qualificativa fosse negada pelo Júri, seja para o caso de que, já 190 RTJ. —150 afirmada a primeira, o eventual reconhecimento da segunda qualificadora pesasse contra o réu, na fixação da pena. Mas, como se vê, no ponto, e o acórdão impugnado o frisou, a omissão do questionário, ao invés de prejudicar, beneficiou o paciente, tanto mais quanto a pena-base foi concretizada no mínimo legal. As demais argüições da impetração são, data veada, de menor consistência. Não há complexidade no terceiro quesito quando especifica em que teria consistido a colaboração do paciente à prática do delito. Como «impossibilidade» de defesa é hipótese mais restrita do que «dificuldade» de defesa, também nesse ponto a alegada discrepância entre o questionário e a pronúncia favoreceu a defesa. Por outro lado, a afirmação pelo júri dessa qualificadora foi irrelevante, dado que a pena se fixou no mínimo legal. Fmalmente, não é obrigatória a indagação ao Júri sobre ter sido de menos importância a participação do réu. É circunstância que depende de alegação da defesa em plenário, a qual, de resto, na hipótese, dificilmente se conciliaria com o reconhecimento pelo Júri de ter sido do paciente a iniciativa do crime, mediante a contratação dos executores. Por tudo isso, indefiro o habeas corpus, cessando a eficácia da liminar: é o meu voto. EXTRATO DA ATA HC 69.940 — RJ — Rel.: Min. Sepúlveda Pertence. Pacte.: Carlos Lopes Machado. Impte.: José Mauro Couto de Assis. Coator: Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Decisão: A Turma indeferiu o pedido de «habeas corpus», nos termos do voto do Relator. Unânime. Falou pelo paciente o Dr. José Mauro Couto de Assis. Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Octavio Gallotti, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e limar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza. Brasília, 9 de março de 1993 —Ricardo Dias Duarte, Secretário. HABEAS CORPUS N° 69973 — MS (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Francisco Rezek Paciente: José Carlos Alves Foss — Impetrante: Aureliano Ferreira da Silva — Coator: Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso do Sul Habeas carpiu. Anulação da sentença. Manutenção da custádia preventiva. Tikicos. Réu preso no curso do processo, que vê anulada sentença condenatória. Subsistência dos atos processuais àquela pretéritos. Validade da manutenção da custódia preventiva, pela convicção, no julgamento colegiada, de persistirem seus motivos. Procedimento que não caracteriza ilegalidade nem abuso de poder. Habeas corpus indeferido. R.TJ — 150 191 ACÓRDÃO considerando a natureza do delito — tráfico de cocaína. Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Tur5. A um segundo argumento, há o ma do Supremo Tribunal Federal, na confato de que tendo sido decretada, exformidade da ata do julgamento e das notas clusivamente, a nulidade da sentença taquigráficas, à unanimidade de votos, em e, em assim sendo, válidos são toindeferir o «habeas carpim». dos os atos anteriormente praticados Brasília, 8 de junho de 1993 — Paulo , a lide pende somente de uma nova Brossard, Presidente — Francisco Rezek, finalização, razão pela qual grande é a Relator. possibilidade de que, à época do julgamento do presente writ, tenha o MM. RELATÓRIO Sentenciante proferido o novo vereO Sr. Ministro Francisco Rezek: Esta dicto, fazendo quedar todo o fundaa análise que faz da espécie o Subprocuramento do pedido. dor-Geral da República Cláudio Fonte6. Nesse aspecto, portanto, consideles: rando que os autos têm o seu lter total«O paciente José Carlos Alves Foes, mente finalizado, opina o MPU pelo através de seu advogado, impetrou o HC indeferimento do writ que se vê às fls. 2/67 alegando que a sua 7. Acaso V. Ex.', todavia, entenda condição de réu primário, com bons anpor conceder o writ —ciramstrincia em tecedentes, residência fixa e profissão que haveria de ser observada a regra do definida, afastam a custódia preventiva artigo 580 do CPP com relação aos réus decretada pelo juízo de 1° grau, e manMoacir Barbosa Leite e Odilberto de tida no de onde se declarou nula por Oliveira —, somos de opinar porque cerceamento de defesa a decisão condetanto o paciente, quanto os demais réus natória exarada em 31-10-91. (Vide fls. aqui citados, compareçam mensalmente 99/114 e 115/131.) perante ajuízo processante, afunde que Diligências solicitadas por este MP demonstrem a permanência em domicírestaram concluídas para informar que lio certo e o desempenho de ocupação os exames toxicológicos, determinado habitual lícita.» (fis. 154/156) pelo Colegiada Revisor, teriam sido realizados no dia 16-4-93, às 14 h, no IML É o relatório. de Campo Grande/MS. VOTO Vejamos, pois. O Sr. Ministro Francisco Rezek (Re4. Cumpre observar, primeiramenlatar): Esta Casa, mesmo quando defrontate, que este Excelso Tribunal já tem, por assentado que a nulidade do pro- da com hipóteses de anulação ab inflo de cesso — observe-se que, no caso, so- um processo penal, nunca hesitou em conmente a sentença fora anulada — não firmar a manutenção da preventiva, houimplica revogar a prisão preventiva se vesse o juiz despendido alguma argumenpermanecem os motivos para a custó- tação hábil em prol da mesma. dia (RT 658/347 — STF). À espécie, O Supremo é coerente, portanto, no trato destacando aquilo que interessa à lide, desta matéria: frente à emulação, verifica-se há de se observar que o MN'. Julgador se algo se produziu de parte da autoridade de 1° grau, ao prestar as informações judiciária que faça nova. — para utilizar solicitadas demonstrou certa preocu- uma expressão do direito civil — a custódia pação quanto a liberação do paciente, preventiva: ausente este dispêndio de ativi- r, R.TJ. — 150 192 dade judiciária, justificativa da prisão, resulta ilegal a mesma. Na hipótese, a anulação pautada no cerceamento de defesa não excedeu de desautorizar a sentença, restando intangidos os demais atos instrutórios. Não se viu dizer, quando da anulação, unia palavra em favor da liberdade do paciente: ao revés, o fecho da decisão aqui impugnada é no sentido de anular o feito a partir da sentença, «sem prejuízo da sentença de suas prisões» (fl. 21). Entreviu a instância de apelação, dessarte, motivo suficiente para a continuidade da custódia, declarando-o expressamente — e o parecer do Ministério Público Federal lembra com propriedade que nós mesmos não vemos, em semelhante proceder, nota da ilegalidad e que mereça reparo em habeas corpu.s. EXTRATO DA ATA HC 69.973 — MS — Rel.: Min. Francisco Rezek. Pacte.: José Carlos Alves Poss. Impte.: Aureliano Peneira da Silva. Coator: Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso do Sul. Decisão: Por unanimidade, a Turma indeferiu o «habeas carpis». Ausente, ocasionalmente, o Ministro Presidente. Presidiu o julgamento o Ministro Paulo Brossard. Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Paulo Brossard, Carlos Venoso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. SubprocurbdorGeral da República, o Dr. Ululem Costa Pinto. Brasília, 8 de junho de 1993 — José Wilson Aragão, Secretária Indefiro a ordem. HABEAS CORPUS 69.976 — RS (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Francisco Rezek Paciente: Saint Clair Frey Piegas — Impetrante: Luiz Goulart Filho — Coator: Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul Habeas corpus. Mandado de recolhimento e guia de internação. Insanidade mentaL Paciente que teve reconhecida sua insanidade mental no processo-crime da origem e postula não o cumprimento do mandado de recolhimento expedido pelo magistrado que o condenou, mas a expedição de gula de internação pelo juiz das execuções. Mandado que figura como antecedente lógico da guia, visto que foragido o paciente. Habeas corpus denegado. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, em indeferir o «habeas corpus». Brasília, 28 de junho de 1993 — Néri da Silveira, Presidente — Francisco Rezek, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Francisco Rezelc O Subprocurador-Geral da República /farol- R.TJ —150 do Nóbrega lança a seguinte quota nos autos: «Cuida-se de habeas corpos impetrado por Dr. Luiz Goulart Filho, em favor de Saint Clair Frey Piegas. Este médico foi julgado por tentativa de homicídio e, reconhecida a sua insanidade mental, foi-lhe aplicada a medida de segurança de intnnaçãoi, por, no mínimo, 2 anos, no Instituto Psiquiátrico Forense. Quando foi proposta a impetração já tinha transitado em julgado a decisão referida e, por isso mesmo, a Juíza Titular da Vara, onde correu o feito, 'determinou a expedição de mandado de recolhimento' (autos, fl. 4). Idêntica providência fora tomada anteriormente pelo Presidente das Câmaras Criminais Reunidas do TJRGS, Desembargador Luiz Melíbio Uiraçaba Machado, logo após o julgamento dos embargos infringentes, confinnatérios da aplicação da medida de segurança ao réu. O impetrante sustenta porém que as autoridades referidas eram incompetentes para determinar o recolhimento do paciente, providência que s6 caberia ao Juiz das Execuções Criminais, através da expedição de guia de internação (fl. 4). As informações estão prestadas, no seguinte teor: 'Em resposta ao Ofício n° 1542/R, de 14 do corrente, tenho a honra de me dirigir a Vossa Excelência para prestar as informações que seguem acerca do pedido de «Habeas corpus» n" 69.976-6, impetrado perante essa egrégia Corte por Luiz Goulart Filho em favor de Saint Clair Frey Piegas. A presente impetração repete a de 1569-0/RS, encaminhada pelo mesmo requerente em prol do mes- e 193 mo paciente, ao Colendo Superior Tribunal deJustiça e lá distribuída ao eminente Ministro José Cândido. Ambas as petições têm idênticos texto e data, evidenciando-se ser uma delas cópia reprográfwa da outra. Fin 9 de novembro do corrente ano prestei informações relativas àquela primeira postulação, através do Ofício n° 252/92-Scr/DP, do qual tomo a liberdade de anexar cópia. Em complementação ao que consta no referido oficio, informo que o mandado de captura do paciente ainda não logrou ser cumprido, conforme comunicação hoje recebida da Vara das Execuções Criminais do Foro da Capital. Quanto à guia para seu recolhimento ao Instituto Psiquiátrico Forense, será expedida pelo Juízo da Vara antes mencionada por ocasião da concretização da prisão, na forma dos artigos 762 do Código de Processo Penal e 172 da Lei de Execuções Penais. Colho a oportunidade para renovar a Vossa Excelência protestos de elevada estima e distinta consideração.' (Fls. 70/71) Como se vê, o presente habeas corpus se resume a um mero e inútil jogo de palavras. O fundamental aqui é que a ordem de internação ou a guia de internação até hoje não foi cumprida, posto que o réu, apesar de reconhecido inteiramente incapaz de entender o caráter criminoso do fato e/ou de determinar-se de acordo com este entendimento, tem sabido procurar em eficiência os caminhos da fuga.. A pretensão de habena corpos, especialmente por já ter transitado em julgado o acórdão nos embargos — trânsito verificado antes mesmo da impetração — é absolutamente inconsistente. R.T.J. — 150 194 O parecer, destarte, em conclusão, é pelo indeferimento do writ.» (Fls. 94/96). É o relatório. VOTO Inexiste, como apontou o Ministério Público Federal, ilegalidade que reclame correção. Tais as circunstâncias, denego a ordem. O Sr. ~dm Francisco Rezek (Relator): O paciente, vendo reconhecida sua insanidade mental no processo-crime de origem, estima ilegal a expedição de mandado de recolhimento pela juíza instrutora do feito. Quer, sim, que em seu nome saia uma guia de recolhimento do juiz das execuções. Sucede que não há incompatibilidade, tenninoldgica ou de roteiro processual, entre uma e outra. O paciente está foragido. Uma vez detido, o juiz das execuções fará expedir a guia de internação, como mandam o Código de Processo e a Lei ncl 7.210. O mandado de recolhimento é, assim, antecedente lógico da guia — a menos que o paciente resolva se apresentar espontaneamente, tornando ociosa a determinação constritiva. 11069.976—RS —Rel.: Min. Francisco Rezek. Pacte.: Saint Clair Frey Piegas. Impte.: Luiz Goulart Filho. Coator: Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. EXTRATO DA ATA Decisão: Por unanimidade, a Turma indeferiu o «habeas capim». Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Paulo Brossard, Carlos Venoso, Marco Aurélio e Francisco Rezai. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Mardem Costa Pinto. Brasília, 28 de junho de 1993 — José Wilson Aragão, Secretário. HABEAS CORPUS N° 70.001— DF (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence Paciente: Marta Jorge de Frias — Impetrante: Jansen Fialho de Almeida — Coator: Superior Tribunal de Justiça Habeas carpas: questão de fato controvertida: inidonddade. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em indeferir o pedido de «habeas carpiu». Brasília, 9 de março de 1993 — Moreira Alves, Presidente — Sepúlveda Pertence, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence A paciente, Marta Jorge de Frias, foi denunciada por roubo, com três co-réus, nos seguintes termos, (fl. 44). «O Promotor de Justiça que esta subscreve, no uso de suas atribuições legais, vem oferecer denúncia contra José de Moura Araújo, vulgo 'Sapo', Márcio Rodrigues de Souza, vulgo 'Moleque', Jorge Alves de Souza, vulgo 'Jorge R.T.J —150 Pezão' e Marta Jorge de Frias, qualificados respectivamente às fls. 4, 18, 17 e 35 do incluso inquérito policial, pelo fato delituoso que passa a narrar: No dia 13• de novembro de 1984, cerca das 10h30 min, os dois primeiros denunciados adentraram na residência situada na Rua José Maria de Abreu n° 275, Realengo, e lá, mediante grave ameaça exercida com arma de fogo portada pelo segundo denunciado, imobilizaram a empregada Ana Maria Ferreira e as moradoras lha Jorge de Frias e a quarta denunciada, respectivamente mãe e filha e subtraíram para eles e os demais denunciados os objetos descritos no campo 7 do Registro de Ocorrência de fl. 3v e mais a quantia de Cr$ 200.000,00 (duzentos mil cruzeiros). A quarta denunciada forneceu a referida ama e facilitou a entrada dos dois primeiros denunciados em sua residência, indicando aos mesmos onde estavam os objetais de valor. O terceiro denunciado ficou do lado de fora dando «cobertura» aos seus companas e foi mentor intelectual da ação ilícita aqui descrita Os denunciados agiram em concurso de ações e desígnios e combinaram o roubo na noite do dia anterior.» Por alegação de falta de justa causa para o processo, seus advogados, sucessivamente, requereram habeas coreus, sem êxito, ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e ao Superior Tribunal de Justiça. O acórdão do STJ, da lavra do ilustre Ministro Costa Lima, ficou sintetizado nesta ementa (fl. 30): « Habeas arpas substitutivo do re- curso ordinário. Trancamento da ação penal por falta de justa causa. Exame da prova. 1. Possível o conhecimento do habeas corpos como substitutivo do recurso ordinário não interposto, porém 195 limitando-se o conhecimento ao que foi objeto do pedido originário. É possível o trancamento da ação penal por falta de justa causa, se a atipicidade dos fatos exsurge claramente e a inocência ressai de forma incontestável. Tal não ocorre nos autos, fazendo-se indispensável um detido exame da prova, comparando-se as versões da acusação e da defesa para concluir que a paciente é ou não inocente. A denúncia descreve a ocorrência de crimes em tese e a participação da paciente para a prática da infração penal. 4. Ordem denegada». Donde a presente impetração ao STF, que insiste na fundamentação das anteriores. Aduz o requerente, (fls. 4 ss.). «Sucintamente Matando, os fatos ocorreram da seguinte forma: Em 13 de novembro de 1984, por volta das 10 horas, dois delinqüentes adentraram a residência da paciente, que encontrava-se com sua genitora e a empregada Ana Maria, e, mediante emprego de uma amara e uma faca, obrigaram as mesmas a entregarem objetos de valor que se encontravam no armário do quarto, na despensa da casa, e no interior de uma maleta, da seguinte forma: — primeiramente adentraram no quarto da genitora da paciente e, vasculhando o armário, encontraram um re- vólver calibre 32, de propriedade do pai da paciente, bem como uma maleta que estava trancada. Isto acontecido, apossaram-se da arma, e tentaram abrir violentamente a maleta, quando a vítima lhes deu a chave, possivelmente temendo maiores violências, onde, após aberta, foi encontrada e subtraída certa quantia em dinheiro; — seqüencialmente, os delinqüentes obrigaram a vítima (genitora) a dizer onde guardava as jóias da família e, mediante ameaça, os levou à despensa 196 R.TJ. — 150 da residência, onde escondia as jóias e entregou-as; satisfeitos com a subtração, os assaltantes trancaram, no banheiro, Marta, sua mãe e Ana Maria, obrigando-as a ficarem deitadas e só saírem após um certo tempo; decorridos alguns poucos minutos, um dos marginais voltou ao banheiro, obrigando Marta a abrir o portão, para que pudessem sair, pois estava trancado. Ocorrido isto, os mesmos adentraram em um automóvel que era dirigido por outra pessoa, e fugiram; —após o assalto, Marta, sua genitora e Ana Maria, dirigiram-se imediatamente à 33" Delegacia Policial, informando a noticia criminas ao Delegado de Plantão, que, prontamente, apresentou às mesmas um álbum de fotos de delinqüentes procurados dou com passagens por aquela DP; —com efeito, a paciente reconhe- ceu um dos assaltantes pelo álbum a ela apresentado (doc. VI), identificando o Sr. José de Moura Araújo e, diante disto, o Dr. Delegado, no mesmo instante, determinou a agentes que fizessem diligências no sentido de capturar o delinqüente identificado, o que ocorreu. Prontamente, a paciente o reconheceu frontalmente (doc. VII), sendo que, na mesma data, paciente e sua genitora prestaram depoimento sobre o fato ocorrido (docs. VIII e IX), tendo ainda, o delinqüente ameaçado Marta por tê-lo reconhecido, afirmando que 'iria pagar por isso, que a mataria'. O delinqüente, em seu depoimento, disse que Marta havia entregue uma arma para fazerem o assalto e, ainda teria deixado o portão aberto (da residência), para facilitar a entrada dos mesmos. Conclusa valia, o depoimento foi no mínimo contraditório e mentiroso, (doc. X), como se vislumbra «que ao saírem trancaram os ocupantes da casa no interior do banheiro; que Moleque retornou ao interior da residência, de onde voltou com Marta, a qual abriu o portão, para que os elementos saíssem»; «disse que entre os objetos subtraíram um revólver do interior da residência». (Frisamos) Ora, se Marta já tivesse aberto o portão para adentrarem, por que após o assalto a buscaram para abri-lo? Como Marta poderia entregar o revólver, se a única arma existente em sua residência fora roubada pelos assaltantes, durante o assalto? Claras e cristalinas se demonstram as mentiras narradas por José de Moura Araújo que, talvez por vingança por Marta o ter reconhecido ou, pensando em diminuir sua culpa, prestou depoimento eivado de contradições e mentiras, que não condizem com a veracidade dos fatos e depoimentos da vítima e paciente, senão vejamos: Léa Jorge de Frias (vítima) «... o qual portava uma arma (revólver); ... iniciaram a subtração dos seguintes objetos: urna adaga, ... um revólver taurus calibre 32mm...» (Grifos nossos.) Ora, o depoimento da paciente somente confirma o depoimento da vítima, alicerçado na verdade, até porque, o Douto Promotor de Justiça ao oferecer denúncia, fundou-se no depoimento de José de Moura Araújo, pessoa que, apesar de falecido, praticou vários delitos. Permissa vertia, aos outros denunciados foi decretada a revelia, tendo em vista que não compareceram em Juizo para o interrogatório, bem como, no inquérito policial. R.T.J — 150 Notoriamente se apercebe o intuito do delinqüente (diga-se, José de Moura Araújo), em acusar Marta, para desviar a finalidade do inquérito policial. Cumpre ressaltar, que a denúncia foi oferecida fundamentada em inquérito policial em que a vítima e a paciente, em seus depoimentos não deixam dúvidas ou contradições quanto ao fato ocorrido, valendo-se a Promotoria de depoimento falso de um bandido. Ademais, a paciente era e é proprietária da residência, local do assalto, desde 1980, portanto, anteriormente à empreitada delituosa.» (doc. XI) Opinou pelo Ministério Público o ilustre Subprocurador-Geral Cláudio Fonteles no sentido da denegação da ordem, por «inadequação da via eleita», dado que a questão exige detalhado exame probatório»; realça o parecer que «a própria paciente à fl. 47 afirmou conhecer um dos elementos que participou do delito ocorrido em sua residência». É o relatório. VOTO O Sr. Affiristro Sepúlveda Pertence (Relatar): A impetração — quiçá de prova difícil dada a morte do único co-réu inquirido, ao que se afirma — não é, porém, o que Orosimbo Nonato chamou de «criação mental da acusação». 197 2.0 que há, na verdade, é a contraposição radical entre a versão acusatória — fundada em minuciosas declarações de um dos co-réus —, e a negativa peremptória da paciente. De resto, a declaração do co-réu contra a paciente em nada beneficia o delator, o que, se é certo que não basta para convertê-la em prova definitiva da participação questionada, não permite que, de logo, em habeas cogites, se recuse qualquer valia à —o. Denego a ordem: é o meu voto. EXTRATO DA ATA HC 70.001 —DF — Rel.: Min. Sepúlveda Patence. Pacte.: Marta Jorge de Frias. Impe.: Jansen Ralho de Almeida. Coator: Superior Tribunal de Justiça. Decisão: A Turma indeferiu o pedido de «babeas corpus», nos termos do voto do Relator. Unânime. Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Octavio Gallotti, Sepúlveda Patente, Celso de Mello e flmarGalvão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Antonio Fanando Barros e Silva de Souza. Brasília, 9 de março de 1993 — Ricardo Dias Duarte, Secretário. RAMAS CORPUS N° 70.001 (EDc1) — DF (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence Embargante: Marta Jorge de Frias — Embargada Turma do Supremo Tribunal Federal Furto é subtração de coisa móvel: embargos de declaração recebidos para explidtar o óbvio de que, por isso, à sua caracterização é irrelevante que o agente tenha ou não o domínio do Imóvel de onde subtraídos os bens móveis alheios. 198 R.TJ. — 150 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, emreceber os embargos de declaração, sem tração do resultado. Brasília, 6 de abril de 1993 — Octavio Gallotti, Presidente — Sepúlveda Pertaice, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Eis o teor dos embargos de declaração (fl 88)• «0 V. Acórdão teve o voto condutor da lavra do Em. Ministro Relator, litte- ris: «A impetração — quiçá de prova difícil dada a morte do único co-réu inquirido, ao que se afirma — não é, porém, o que Orosimbo Nonato chamou de 'criação mental da acusação'. 2.O que há, na verdade, é a contraposição radical entre a versão acusatória — fundada em minuciosas declarações de um dos co-réus —, e a negativa peremptória da paciente. 3. De resto, a declaração do co-réu contra a paciente em nada beneficia o delator, o que, se é certo que não basta para convertê-la em prova definitiva da participação questionada, não permite que, de logo, em habena corpus, se recuse qualquer valia à —o. 4. Denego a ordem; é o meu voto.» Data venia, o acórdão foi omisso quanto ao pedido alternativo feito pelo impetrante, senão vejamos: «Do pedido (...) (...) c) a nulidade do processo, bem como a inépcia da denúncia, no que se refere a impetrante, tendo em vista que o fato de ser proprietária do bem, à época do fato, discorreu a denúncia um crime impossível, atípico.» (Grifei) Observe-se, que no Relatório, foi destacada esta alegação do impetrante: «... Ademais, a paciente era e é proprietária da residência, local do assalto, desde 1980, portanto anteriormente à empreitada delituosa.» (dor. X1) Porém, no julgamento, tal ponto não foi apreciado. Ressalte-se as Razões do Pedido do impetrante: «... Haja vista que a paciente era à época do fato, proprietária (residência), local do assalto, ocorrendo assim, crime impossível, atípico (art. ?XXXIX da CF), sendo esta, nulidade absoluta devendo ser decretada de ofício, podendo ser invocada em qualquer fase e grau de jurisdição, tendo em vista o benefício à paciente, e norma de garantia Constitucional.» Como se vislumbra, o V. Acórdão não apreciou integralmente o pedido do impetrante, foi omisso em matéria que deveria ter se pronunciado. Sendo assim, requer que os presentes Embargos de Declaração sejam acolhidos e providos, para que seja prestada a Tutela Jurisdicional (art. 5° XXXV da CF), bem como, se providos, tenham efeito modificativo do julgado (art. 338, parte final, do RISTF).» É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Recebo os embargos, uma vez que efetivamente, no acórdão embargado, reputei desnecessário ocupar-me explicitamente da alegada impossibilidade R.T.J —150 do crime, tal, data venia, a fragilidade do argumento. Certo, fez-se prova coma impetração de que, por escritura de 15-10-80, os pais da paciente doaram-lhe, em condomínio com dois irmãos seus e com reserva de usufruto, dois imóveis, um dos quais o lote sobre o qual se teria edificado a casa em que se deu o fato delituoso. Sucede que a paciente responde por coautoria de furto, cujo objeto material é «coisa móvel alheia», pouco importando que o agente tenha o domínio do imóvel onde haja ocorrido a subtração incriminada. Com essa ululante obviedade, complemento a fundamentação do acórdão embargado, mantida a conclusão: é o meu voto. 199 EXTRATO DA ATA 11C 70.001 (DM) — DF — Rel.: Min. Sepúlveda Pertence. Embte.: Marta Jorge de Frias (Adv.: Jansen Fialho de Almeida). Embda.: 1° Turma do Supremo Tribunal Federal. Decisão: A Turma recebeu os embargos de declaração, sem alteração do resultado, nos termos do voto do Relator. Unânime. Presidência do Sr. Ministro Octavio Callotti, na ausênciajustificadado Sr. Ministro Moreira Alves (Presidente). Presentes à Sessão os Srs. Ministros Sepúlveda Pertence e Celso de Mello. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro limar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Miguel Franzino Pereira. Brasília, 6 de abril de 1993 — Ricardo Dias Duarte, Secretário. HABEAS CORPUS N° 70.023 — RJ (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio Paciente: Carlos Alberto Alves dos Santos — Impetrante: Maryse Horta de Araújo — Coator: Tribunal de Alçada Criminal do Estado do Rio de Janeiro Prestaçãoftaisdiciorsal. Predicado. Os provimentos judiciais devem, tanto quanto possível, conter o exame da matéria controvertida de modo a conduzir ao convencimento. A ordem Jurídico-constitucional impõe a entrega da prestação jurisdicional de forma completa. O vício da omissão fica exacerbado quando ocorre no âmbito da liberdade do cidadão. Exsurge como nulo acórdão que não abrange a apreciação completa do recurso interposto pela defesa, deixando-se de cuidar, por exemplo, da atenuante consubstanciada na confissão espontânea. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em deferir o «habeas corpus», para anular o acórdão e determinar que outro seja pro- latado, considerados os termos do recurso interposto pelo Paciente. Brasília, 3 de agosto de 1993 —Néri da Silveira, Presidente — Marco Aurélio, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Marco Aurélio: A Defensora Pública Maryse Horta de Araújo 200 R.T.J. —150 impetra este habeas corpus apontando que a Corte de origem não apreciou a matéria veiculada no recurso interposto, relativa à atenuante referente a confissão espontânea (fls. 2 a 4). Coma inicial, visam aos autos os documentos de fls. 5 a 17. Solicitadas informações à Corte de origem, prestou-as o respectivo Presidente, conforme peça de fls. 26 e 27, acompanhadas dos documentos de fls. 28 a 45. Em síntese, reconhece-se que não houve exame da questão ligada à atenuante. Contudo, teria sido encampada a sentença, não se seguindo embargos declaratórios. A Procuradoria-Geral da República pronuncia-se pela denegação da ordem, asseverando analisado o tema quando do julgamento da apelação. Consignou também que «a atenuante da confissão espontânea é uma retribuição ao acusado, que colabora para a verdade processual, esclarecendo espontaneamente a autoria da infração. Não pode haver colaboração para apuração da autoria, da parte de quem é preso em flagrante delito. Parecer pelo indeferimento do mit». Recebi os presentes autos para exame em 29 de junho de 1993, liberado-os no dia 7 imediato (fl. 50). É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Inicialmente, ressalvo entendimento individual sobre a competência para apreciar este habeas corpus. É que, a teor do disposto no inciso TB, artigo 96 da Constituição Federal, os componentes dos Tribunais de Alçada, como Juízes Estaduais, estão submetidos à jurisdição direta dos respectivos Tribunais de Justiça. Assim, a estes cabe o julgamento de habena corpus quando envolvido como Paciente cidadão comum e como Autoridade Coatora membro de Tribunal de Alçada. Todavia, até aqui este não é o enfoque prevalente na Corte, razão pela qual coloco em plano secundário a convicção pessoal, deixando para discutir a matéria em sede própria, ou seja, no Plenário, o que já vem ocorrendo mediante apreciação da Medida Reclamatória n° 341-1-DF, em que funciona como Relator o Ministro Moreira Alves. Após o voto de S. Ex.', divergi, seguindo-se pedido de vista do Ministro Francisco Rezek. Conheço do pedido formulado nestes habeas corpus. Ao contrário do que asseverado pela Procuradoria-Geral da República, em parecer da lavra do Subprocurador-Geral Dr. Haroldo Ferraz da Nóbrega, a matéria a envolver a atenuante da confissão espontânea, embora veiculada no recurso interposto pela Defensoria Pública (fls. 11 a 13), não foi objeto de apreciação pelo órgão revisor. Sequer constou do relatório pelo qual deu-se aos demais participantes do Colegiado o conhecimento da matéria a ser examinada, o que se dirá quanto ao voto condutor do julgamento. Confira-se com que se contém às fls. 40 a 44. Na verdade, o parecer exarado incidiu em equívoco no que transcreveu como parte do acórdão proferido trecho da manifestação da Procuradoria-Geral de Justiça junto à Câmara julgadora (fls. 34 a 39). Nem se diga, como fez o ilustre Presidente da Corte de origem, que não teriam sido opostos embargos declaratórios. A circuntância não afasta do mundo jurídico o constrangimento ilegal a que está submetido o Paciente. Impossível é potencializar no campo penal a forma, prejudicando-se o fundo, a ponto de entender-se preclusa uma determinada matéria para efeito de habeas corpus, por não terem sido protocolados os declaratórios. Também não procede a assertiva segundo a qual, negado acolhida ao recurso, o órgão julgador confirmou a sentença, fazendo-o, assim, implicitamente no que concerne à atenuante. Todo provimento judicial é ato de inteligência e tanto quanto possível deve levar os envolvidos à convicção sobre o respectivo acerto. Reclama-se, para tanto, a ob- R.T.J —150 servância dos elementos que consubstanciam a estrutura que lhe é própria — o relatório, a fundamentação e o dedsum. A ordem jurídica não agasalha decisões que se mostrem omissas, obscuras, contraditórias e ensejadoras de dúvida. No caso, a ausência de interposição dos declaratórios não prejudica a procedência desta medida. Concedo a ordem, para anulando o acórdão de fls. 40 a 44, determinar que outro seja proferido, apreciando-se as matérias veiculadas no recurso da Defensoria Pública, cuja fotocópia encontra-se às fls. 11 e 13. É como voto na espécie dos autos. EXTRATO DA ATA HC 70.023 -RJ —Rel.: Min. Marco Aurélio. Pacte.: Carlos Alberto Alves dos 201 Santos. Impte.: Maryse Horta de Araújo. Coator: Tribunal de Alçada Criminal do Estado do Frio de Janeiro. Decisão: Por unanimidade, a Turma deferiu o «habeas corpus», para anular o acórdão e determinar que outro seja prolatado, considerados os termos do recurso interposto pelo paciente. Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Carlos Venoso e Marco Aurélio. Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Paulo Brossard e Francisco Rezek. Subprocurador-Geral da República, o Dr. Haroldo Ferraz da Nóbrega. Brasília, 3 de agosto de 1993 — José Wilson Aragão, Secretário. RAMAS CORPUS N° 70.036 — SP (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves Paciente: Josecir Cuoco — Impetrantes: Maria da Conceição Ayres Cemicchiar° e outro — Coator: Superior Tribunal de Justiça «Habita carpes». — Sentença que, mantida a condenação, se anula no tocante à fixação das penas, a fim de que sejam elas fixadas com a explkitação da operação mental e aritmética do Juízo, para, partindo da pena-base, chegar à pena definitiva. illabeas capas» deferido em parte. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em deferir, em parte, o pedido de «habeas corpus», para, mantendo a sentença no tocante à condenação, anulá-la, somente quanto à função das penas do ora paciente, estendendo essa concessão, «ex officio», a Domingos Campanella Júnior, nos termos do voto do relator. Brasília, 30 de março de 1993 — Moreira Alves, Presidente e Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): Assim expõe e aprecia o presente babe= corpus o parecer da Procuradoria-Geral da República, de autoria do Dr. Hatoldo Ferraz da Nábrega: «Cuida-se de habeas anus requerido em favor de Josedr Cuoco pelos Drs. Maria da Conceição Ayres Cer- 202 R.T.J. — 150 Inicchiru-o e Joaquim Jair Xitnenes de Aguiar. Os mesmos não se conformam com a decisão do Colendo Superior Tribunal de Justiça, cuja ementa é do seguinte teor `Penal. Sentença condenatória. Dosimetria. Fundamentação. Reineidascia. Habeas copas. Subslituição de recurso. Não se examina dosimetria de pena em habeas corpus. Cabe à defesa, em habeas corpus demonstrar de forma incontroversa eventual erro monocrático, o que não ocorreu neste caso quanto à reincidência do Réu. 3. Habeas corpus conhecido como Substitutivo de Recurso; ordem denegada'. A impetração postula, como expressamente referido, não absolvição do réu, mas 'a nulidade da sentença, pois faltoulhe exata qualificação das penas aplicadas e a devidaftmdamaitação individualizada conforme determina a lei' (autos, fl. 4). A própria impetração reconhece que o Magistrado aplicou a pena mínima para todas as infrações (fl. 4). Acrescento que o Magistrado aumentou as referidas penas mínimas de 1/6, pela agravante da reincidência. Entendo que o HC não se credencia ao deferimento. Embora a sentença seja passível da crítica de haver pecado na análise a aplicação do art. 59 do CP ao fixar a pena-base — apesar de brilhante na análise da prova e nas considerações sobre o delito de tortura — não há a nulidade no caso. As penas foram fixadas no mínimo legal, sendo que o acréscimo, perfeitamente dedutível e declarado, foi de 1/6 pela agravante da reincidência. A jurisprudência, inclusive do Supremo Tribunal Federal, é no sentido de que a fixação da pena-base é 'dispensável quando a pena for aplicada no mínimo legal (STF, RHC 64.682, DJ de 133-87, pág. 3881; RHC 59.750, 21-5-82, pág. 4870) (apud Código Penal Comentado, 3' edição, Celso Delmanto (atualizado por Roberto Delmanto), 1991, Renova Editora, pág. 92). À mesma página, vê-se, ainda, esta decisão: 'Pena-base dedutível: A falta de fixação da pena-base, mesmo quando há aplicação de causas especiais de aumento, não anula, se é facilmente dedodvel e foi fixada no mínimo legal (STF, RTJ 103/601; HC 58.933, In de 23-1081, pág. 10628). Com base nesses precedentes e ante o que mais consta dos autos, opino no sentido do indeferimento do writ.» (fls. 117/119) É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): 1. 0 Superior Tribunal de Justiça indeferiu habeas corpus substitutivo de recurso ordinário de habeas corpus, por entender que o writ não é o meio adequado para o reexame de dosimetria de pena. Sucede, no entanto, que, no caso, não se trata, propriamente, de apreciação quanto aos limites da dosagem da pena, mas de a sentença de primeiro grau haver fixado a pena definitiva sem que se saiba como chegou a ela. Com efeito, é este o teor da sentença quanto à fixação da pena do ora paciente: «Frente ao exposto, julgo procedente, em parte, a denúncia, para condenar: Josecir Cuoco e Domingos Campanella Júnior, como incursos, por duas vezes, nas penas do artigo 350, do Código Penal; artigo 6°, parágrafo 3°, letras R.T.J —150 a, b e c, da Lei n° 4.898/65; por infração ao artigo V, letras a, e i, da mesma Lei e artigo 322, do Código Penal; bem como por urna vez, nas penas do artigo 129, parágrafo 1°, inciso I, do Código Penal, e por urna vez nas penas do artigo 129, caput, do mesmo Código, tudo combinado com os artigos 29 e 69, ambos também do Código Penal, a dois anos, quatro meses e vinte dias de reclusão e três anos e dez meses de detenção.» (fl. 28) E, mais adiante, lê-se: «As penas foram fixadas a partir dos mínimos, com observância do arfigo 69, caput, do Código Penal, concurso material, aplicando-se cumulativamente, conforme entendimento jurisprudencial predominante: JUTACRIM, 45/196, 25/331, 44/411, 47/207, 46/347, 50/248, 52/343; RTJ 101/595 e RT, 404/298. Após, houve acréscimo de um-sexto por causa da reincidência.» (fl. 29) Já o Ministério Público do Estado de São Paulo, quando emitiu parecer no habena corpos que deu margem à decisão do STJ ora atacado, salientou: «Todavia, indisputável data venta o equívoco em que laborou o ínclito magistrado sentenciante no tocante à dosimetria das penas privativas de liberdade aplicadas ao paciente. Assim, partindo-se do mínimo legal relativamente às penas de detenção, tem-se um total, já acrescido no sexto concernente à nota de reincidência, de 1 ano, 9 meses e 12 dias (um ano, nove meses e doze dias). E, relativamente ao único delito apenado com reclusão id est lesão corporal de natureza grave a pena data venta 203 correta seria de 1 ano e 2 meses de reclusão e não 2 anos, 4 meses e 20 dias de reclusão; desse modo, impossível reproduzir-se a operação levada a cabo pelo culto magistrado sentenciante, para partindo da pena-base, chegar-se ao quantuna final das reprimendas impostas.» (fl. 64) Assim sendo, defiro, empane, o presente pedido, para, mantendo a sentença no tocante à condenação, anulá-la, somente, quanto à fixação das penas do ora paciente, a fim de que sejam elas fixadas com a explicitação da operação mental e aritmética do Juízo, para, partindo da pena-base, chegar à pena definitiva. Entendo essa concessão, ex officio, a Domingos Campandla Júnior, por estar na mesma situação objetiva do ora paciente. EXTRATO DA ATA HC 70.036 — SP — Rd.: Min. Moreira Alves. Pacte: Josecir Cuoco. 'raptes: Maria da Conceição Ayres Cernicchiaro e outro. Coalhar: Superior Tribunal de Justiça. Decisão: A Turma deferiu, em parte, o pedido de «habeas corpus», para, mantendo a sentença no tocante à condenação, anulá-la, somente quanto à fixação das penas do ora paciente, estendendo essa concessão, «ex officio», a Domingos CampanellaJunior, nos termos do voto do Relator. Unânime. Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Octavio Gallotti, Celso de Mello e limar Gaivão. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Sepfilveda Pertence. Subprocurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza. Brasília, 30 de março de 1993, Ricardo Dias Duarte, Secretário. —150 204 HABEAS CORPUS N° 70.081— SP (Segunda Turma) Relatar: O Sr. Ministro Francisco Rezek Paciente e Impetrante: Rui Nogueira Bernardo — Coator: Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo Habeas corpus.Alegação de cerceamento de defesa Ausência da defensora ad hoc em ato instrutória Indeferimento de diligência. Indeferimento do pedida I — Alegação de cerceamento de defesa em virtude da ausência —indemonstrada —da defensora ad hoc em inquiriçãojudidal de testemunha. Inexistência de prejuízo à defesa. Alegações finais apresentadas por defensor constituído que, não obstante a combatividade, não abordam a alegada ausência. II — Diligência — constante em obtenção de declaração de certa empresa — indeferida, visto que procrastinatória: já existia, nos autos, o aventado documento. Habeas corpos indeferido. ACÓRDÃO lado à fl. 110, o eminente Juiz a quo causou-lhe prejuízos pois tal procediVistos, relatados e discutidos estes aumento poderia confirmar o seu depoitos, acordam os Ministros da Segunda Turmento prestado em juízo. ma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata de julgamento e das notas Sem razão o impetrante. taquigráficas, à unanimidade de votos, em Assim está em trecho do v. Acórindeferir o «habeas corpos». dão do 1° Grupo de Câmaras do TribuBrasília, 8 de junho de 1993 —Paulo nal de Alçada Criminal de São Paulo, Brossard, Presidente —Francisco Rezek, verbis: Relator. «II — Quanto à primeira preliRELATÓRIO minar levantada pelo peticionário e referente a alegado cerceamento de O Sr. Ministro Francisco Rezek: O defesa, por falta de defensor à auSubprocurador-Geral da República Cláudiência de instrução do feito revidio Ponteies lança a seguinte quota nos dendo, entendeu a douta maioria, autos, em análise da espécie: adotando o voto e o pensamento do «1. Rui Nogueira Bernardo impeeminente Juiz Haroldo Luz, vencitra apresente ordem de habeas corpus, dos neste ponto o signatário e o em benefício próprio, objetivando a ilustre Juiz Pedro Gagliardi, de desconstituição do v. Acórdão de fls. afastá-la, pois a simples omissão 168/174, alegando para tanto, a ocorda assinatura da defensoria ad rência de cerceamento de defesa eis que Procuradora da Assistência hoc, defensora ad hoc não participou das auJudiciária do Estado, aos termos diências para oitiva das testemunhas. onde foram colhidas as assinatu2. Afirma, ainda, o paciente que ao ras da vítima e testemunhas, constitui-se em mera irregulariindeferir o pedido de diligência formu- R.TJ— 150 dade, insuscetível, no caso, de ser reconhecida como nulidade. E isso porque, a nomeação da defensora ad hoc e seu nome constaram da assentada da audiência, o que indica que estava presente, não tendo o fato da alegada nulidade sido ventilado, seja nas alegações finais da defesa do peticionário, seja em qualquer outro momento. Demais disso, entendeuse, ainda, que, na via revisional, como se fazia necessário, o peticionário não produziu qualquer prova a respeito da efetiva ocorrência dessa nulidade.' (vide fls. 169/170 — grifamos) Como se vê, o ora paciente foi assistido durante todo o curso do processo, tendo a sua defesaparticipado das audiências e oferecido, até mesmo, alegações finais. (vide fls. 118/122) Com relação ao segundo argumento, este é em todo improcedente. A diligência solicitada à fl. 110 objetivava tão-somente a procrastinação do feito eis que a declaração da empresa já havia sido anexada aos autos. (vide fl. 111). Não há, portanto, qualquer amstranghnento ilegal que propicie a concessão da ordem. 9. Somos, assim, pelo indeferimento do pedido.» (fls. 182/184). É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Francisco Rezek (Relatar): O argumento tratado em caráter derradeiro pelo Ministério Público Federal afasto-o desde logo, pelo motivo lançado na parte final do parecer. O tema do cerceamento de defesa reclama resposta mais firme, que o próprio Ministério Público cuidou, repudiando-o, de dar. Aqui há uma petição de habeas corpus caracterizada 205 por nenhuma instrução documental. A alegação de cerceamento de defesa não fez referência temporal alguma que possibilitasse, no cotejo das ulteriores informações prestadas pelo tribunal impetrado, detectar o mencionado vício. Há, porém, um dado cronológico que me pareceu relevante: as alegações finais da acusação foram datadas de 18 de julho de 1988 — evidência de que se encerrara, antes disto, a oitiva das testemunhas. Pois ban: no agosto seguinte julgava eu um recurso de habena corpus em favor deste mesmo paciente, e ali não se vê irresignação contra este tópico. No feito criminal, as alegações finais da defesa —não obstante articuladas por combativo e engenhoso advogado, pelo que se vê às fls. 115/119 destes autos —tampouco deduzem uma única sílaba em prol da tese do cerceamento. Dá-se a condenação: o réu apela — e nada a respeito. Na revisão fala-se da suposta ausência da defensora ad hoc em certa audiência, conducente à nulidade do feito. Por ter o tribunal afastado este alvitre de nulidade é que o tema nos chega à mesa. Recordo o que nos dizemos com freqüência nesta sala: a nulidade, em hipóteses como esta, só se verifica com a comprovação do prejuízo. E só a ausência de defesa, não sua hipotética deficiência, tem o dom de fulminar a ação penal. Nada disto ocorre-me, folheando os autos, e dando-me conta da forma como instruído o feito original. Repito que as alega ções finais da defesa primam pela combatividade — o que menos se vê ali é falta de apego ao propósito absolutório. Não vejo como situar nesta ausência da defensora— de resto indemonstrada — cerceamento ou prejuízo à defesa, pelo que, após este vício alegado, produziu a defesa constituída do paciente. Por isto não vejo razão em averiguar a idoneidade da alegação não comprovada do paciente que é o carro-chefe da impetração: a ausência não trouxe dano algum a ele, não 206 R.T.J. —150 devendo o Supremo, assim, nela se basear para proclamar uma nulidade. Meu voto indefere o pedido. EXTRATO DA ATA HC 70.081 — SP —Rel.: Min. Francisco Rezek. Pacta e Impte.: Rui Nogueira Bernardo. Coator: Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo. Decisão: Por unanimidade, a Turma indeferiu o «habeas corpus». Ausente, oca- sionalmente, o Ministro Presidente. Presidiu o julgamento o Ministro Paulo Brossard. Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Paulo Brossard, Carlos Valioso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. SubprocuradorGeral da República, o Dn Mardem Costa Pinto. Brasília, 8 de junho de 1993 — José Wilson Aragão, Secretário. HABEAS CORPUS N° 70.097 — MS (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Moreira Alva Paciente: Suely Pletz Neder — Coator: Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul 41obeas corpus». Incidente de inconstitucionalidade levantado, no julgamento de apelação, em Turma do Tribunal de Justiça, e por ela julgado. Inobservância do disposto no artigo 97 da Constituição Fe- deral. Precedente do STF. «tiabeas corpos» deferido, para anular o acórdão ora impugnado, a fim de que a Segunda Turma Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso do Sul, voltando a julgar a apelação, levante, querendo, o incidente de inconstitucionalidade da mencionada Lei n° 7.891/139 perante o Plenário daquela Corte. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da atado julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, deferir o pedido de «habeas corpus», nos termos do voto do Relator. Brasília, 16 de março de 1993 — Moreira Alves, Presidente e Relator RELATÓRIO O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): Assim expõe e aprecia o presente habeas carpas o parecer da Procuradoria-Ge- ral da República, de autoria do Dr. Edson Oliveira de Almeida: «A Colenda Segunda Turma Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso do Sul não conheceu, por internpestividade, de apelação criminal firmada pela Assistência Judiciária, uma vez que não reconhecido, ao argumento de inconstitucionalidade, o beneficio do prazo em dobro previsto no artigo 5°, § 5°, da Lei n° 1.060/50 (redação da Lei n° 7.871/89). A impetrante alega que a Turma Criminal não tem competência para declarar a inconstitucionalidade de lei, R.T.J —150 conforme estatuído no artigo 97 da Constituição Federal. 3. A Constituição Federal (artigo 97) reserva o julgamento da constitucionalidade das leis para o Tribunal Pleno (ou órgão especial, onde houver, art. 93, XI), uma vez que exigido, para a declaração da inconstitucionalidade, o voto da maioria absoluta dos membros do Tribunal ou do respectivo órgão especial. 4.0 incidente deve ser suscitado no órgão fracionário e, uma vez acolhido, cabe sobrestar o julgamento até a decisão plenária (CPC, artigos 480 a 482). 5 . A questão é semelhante àquela decidida pelo Supremo Tribunal Federal no FICif 69.730-5-MS, relatado pelo Ministro Mordra Alves, In verbis: Habeas corpo. Incidente de inconstitucionalidade levantado, no julgamento de embargos infringentes, na Seção Criminal do Tribunal de Justiça, e por ela julgado. — Inobservância do disposto no artigo 97 da Constituição Federal. — Habeas corpus deferido, para anular o acórdão ora impugnado, a fim de que a Seção Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso do Sul, voltando a julgar os embargos infringentes a ela mterpostos, levante, querendo, o incidente de inconstitucionalidade da mencionada Lei n° 7.891/89 perante o Plenário daquela Corte.» (DJ de 18-12-92, pág. 24378) 6. Pelo exposto, nos termos do precedente citado, opino pelo deferimento do writ para que seja anulado o acórdão da apelação, com o fim de ser renovado o julgamento, observado o artigo 97 da Constituição Federal em caso de acolhi- mento da preliminar de inconstitucionalidade.» (fls. 43/45) É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): Esta Segunda Turma, ao julgar, recentemente, o RE 69.730, que tratava de hipótese análoga à presente, anulou o acórdão de Seção Criminal que, sem submeter o incidente de inconstitucionalidade de lei ao Plenário do Tribunal local, afastou a aplicação da lei em causa por julgá-la inconstitucional. Essa anulação se fundou na inobservância do disposto no artigo 97 da Cons. tituição Federal. Em face do exposto, e com base nesse precedente, defiro o presente habena corpus, para anular o acórdão ora impugnado, a fim de que a Segunda Turma Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul, voltando a julgar a apelação, levante, querendo, o incidente de inconstitucionalidade da mencionada Lei n° 7.891/89 perante o Plenário daquela Corte. EXTRATO DA ATA HC 70.097— MS —Rel.: Min. Moreira Alves. Pacte.: Milton Marques Sampaio. Impte.: Suely Pletz Neder. Coator: Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul. Decisão: A Turma deferiu o pedido de «habeas corpus», nos termos do voto do Relator. Unânime. Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Octavio Gallotti, Septilveda Pertence, Celso de Mello e finar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza. Brasília, 16 de março de 1993 —Ricardo Dias Duarte, Secretário. 208 R.T.J. —150 HABEAS CORPUS N° 70.172 — SP (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves Paciente: Luiz Carlos de Sant' Anna — Impetrante: Alecseo Kravec e outro — Coator: Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo allabeas carpas». Nulidades processuais inexistentes. —Esta Corte, ao julgar a Representação de Incoastitudonalidade n° 1.280 (RTJ 116/889), declarou a constitudonalidade —por não confinarem com os artigos 8°, XVII, abo e 153, 15, da Emenda Constitucional n° 1/69 — das normas do Provimento CXCV84 do Conselho Superior da Magistratura do Estado de São Paulo, com base nas quais foi feito o interrogatório do ora paciente por meicide precatória. A Constituição atual nada inovou a respeito, motivo por que não há que se pretender não tenham sido recebidas essas normas. — A utilização da estenotipia na audiência de interrogatório não configura nulidade, máxime se nenhum prejuízo trouxe ao paciente, que negou seu envolvimento nos fatos. —Não há que se declarar a nulidade da oiliva de testemunhas sem a presença do paciente, porquanto, embora dispensada ela por defensor dativo, não foi ela alegada, no momento oportuno, por advogado já então constituído, certo como é que, em se tratando de nulidade relativa, há a necessidade de sua oportuna alegação bem como a demonstração objetiva de prejuízo. —Se o advogado constituído, apesar de devidamente intimado, não compareceu à audiência de oitiva da vítima e de testemunhas, foi regu lar a nomeação de defensor ad hoc (art. 265, parágrafo único, do CPP). Habeas carpas indeferido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em indeferir o pedido de «habeas corpus». Brasília, 23 de março de 1993 — Moreira Alves, Presidente e Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Moreira Alves: São estas as informações prestadas pelo Exmo. Sr. Presidente do Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo (fls. 156/157): «Tenho a honrar de acusar o recebimento do Ofício n° 321/SST, através do qual são solicitadas informações para a instrução do Habeas Corpos n° 1.6062/SP (Rg. n° 92.0030187-8), em que é paciente Luiz Carlos Sant'Ana, que usa outros nomes (fl. 174, doc. n° 1), e impetrantes os bacharéis Alecseo Kravec e Lígia de Oliveira Melo. Alegam estes últimos, em síntese, estar o paciente sofrendo constrangimento ilegal, eis que condenado em processo manifestamente nulo (Ação Penal n° 953/88, da Terceira Vara Criminal da Comarca de São José dos Campos). Ar- R.TJ — 150 gilem, para tanto, cerceamento de defesa, em virtude das seguintes eivas: a) ter sido o paciente interrogado em juízo diverso do processante, apesar de se encontrar preso na mesma unidade da Federação; b) utilização de estenotipia na audiência de interrogatório; e, c) ausência do paciente à audiência de instrução realizada no juízo do processo. Cabe-me, a propósito, e em atenção ao ofício de Vossa Excelência, transmitir os esclarecimentos que seguem. Por fatos ocorridos em 29 de fevereiro de 1988, foi o paciente denunciado, perante o Juízo da Terceira Vara Criminal da Comarca de São José dos Campos, como incurso no artigo 157, parágrafo 2°, I, do Código Penal (fl. 2, doc n° 2). Recebida a denúncia (fl. 40v., doe. n° 3), citado e interrogado o réu no juízo deprecado (fls. 45/v. e 47/51, doe. n° 4), o defensor constituído pelo paciente, Bel. João Carlos Rosa, apresentou a defesa prévia (fl. 52, doe. n° 5), sendo, então, remetida a carta precatória ao juízo de origem (fl. 53, doc. n° 6). Após a expedição dos oficios requisitórios do réu e a intimação do seu defensor constituído (fls. 73, 75/77 e 83/84v., doc. n° 7), foi realizada, no juízo processante, a audiência de oitiva da vítima e das testemunhas de acusação, sendo nomeado defensor ad hoc ao acusado, que se encontrava ausente (fls. 85/91, doe. n° 8). Ouvidas as testemunhas de defesa através de carta precatória (fls. 98/99v., 101/102 e 104/108, doc. n° 9) e apresentadas as alegações finais (fls. 137/138 e 146/148, doc. n°10), sobreveio sentença condenatória, que apenou o paciente a 5 anos e 4 meses de reclusão e 10 diasmulta, por infringência ao artigo 157, parágrafo 2°, I, do Código Penal (fls. 150/151, doc. n° 11). 209 Inconformada, apelou a defesa (fls. 163/166 e 171/172, doe. n° 12), tendo a Eg. Segunda Câmara do Tribunal, à unanimidade, negado provimento ao recurso (fls. 178/181 e 187/191, doc. n° 13). O ven. acórdão restou hozcouldo (fl. 192, doc. 14). As fls. 227/231, assim se manifesta a Procuradoria-Geral daRepública, em parecer do Dr. %adem Costa Pinto: «Cuida-se de habeas corpus impetrado pelo advogado Alecseo Kravec e outro, em beneficio de Luiz Carlos de Sant'Anna, alegando e requerendo o seguinte: o paciente foi condenado pelo Juiz da 3° Vara Criminal da comarca de São José dos Campos-SP, em cinco anos e quatro meses de reclusão e dez diasmulta, como incurso nas penas do artigo 157, parágrafo 2°, inciso I, do Código Penal (fls. 197/198), decisão integralmente confirmada pelo egrégio Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo, que negou provimento ao recurso da defesa (fls. 209/213); esperam a concessão da ordem para anular o processo, a partir do interrogatório ou da audiência de instrução, seja porque o interrogatório foi irregularmente realizado pelo processo de estenotipia e através de precatória, estando o paciente preso no mesmo Estado da Federação (São Caetano do Sul), seja porque o paciente não foi requisitado para a audiência de inquirição da vítima e das testemunhas, tendo o defensor ad hoc dispensado, também irregularmente, a presença do mesmo na referida audiência, sendo certo que o advogado constituído pelo paciente não esteve presente à audiência em destaque, tendo havido assim evidente cerceamento de defesa. 2. O presente babe= corpus deve ser conhecido mas, no mérito, denegada a ordem. 210 R.T.J. — 150 É o que o interrogatório do paciente, através de precatória, foi realizado com base no Provimento OCCl/84 do egrégio Conselho Superior da Magistratura do Estado de São Paulo (fl. 51), o que não configura nulidade vez que o Supremo Tribunal Federal já decidiu, em face da Carta Política de 1969, mas que se aplica a atual Carta Magna, que tal provimento é constitucional, bastando conferir a ementa abaixo transcrita, verbis: «Representação de inconstitucionalidade. Provimento do Conselho Superior da Magistratura do Estado de São Paulo. OCCU84. Constitucionalidade. Não conflitam com os preceitos constitucionais (art. 8°, XVII, b e art. 153, parágrafo 15), as normas do Provimento n° CXCl/84, do Conselho Superior da Magistratura do Estado de São Paulo, que dispõem sobre o interrogatório nos processos criminais, na comarca em que o réu preso ou solto estiver, mediante precatória.» RTJ 116/889. Vale destarar parte do pronunciamento do Ministério Público Federal, da lavra do hoje eminente Ministro Assis Toledo, quando demonstra a possibilidade legal do interrogatório por precatória, verbis: «Daí a necessidade, ante a lacuna da lei processual brasileira, de se construir o seguinte raciocínio, perfeitamente cabível na área processual: permitindo o Código a precatória para a inquirição de testemunhas (art. 222) — o que é 'o mais', visto que nessa prova pode basear-se e freqüentemente baseia-se a condenação — não se deve inferir, na ausência de dispositivo expresso, que o mesmo Código não permitiria 'o menos', ou seja, o interrogatório por precatória, ato no qual o acusado pode silenciar-se ou não dizer a verdade. Note-se que a própria confissão não constitui prova definitiva (art. 197), além de ser retratável (art. 200). Assim, nada obsta que, por aplicação analógica, expressamente admissivel em processo (art. 2° do CPP, RTJ 73/909), se estenda a regulamentação legal do artigo 222, prevista para a inquirição de testemunhas, a uma situação semelhante (a inquirição do acusado), sempre que um ponto puder identificar ambas as hipóteses: pessoas residentes em Comarca distante, que não aquela em que se situa a sede no Juízo; dificuldades materiais, ou de outra natureza, acarretando a necessidade de assim se proceder. Não se estará, com esse recurso à analogia, afrontando o artigo 188 e incisos do Código, corno se alegou, porque outro Juiz — o deprecado com as mesmas garantias, irá cumpri-lo, interrogando o acusado sobre os itens da denúncia e os elementos a que ela se reporta. Se no caso concreto, ocorrer algum prejuízo por ausência de indagação, como se afirma, sobre determinada prova, sobre a arma do crime ou sobre algum fato ou pormenor (itera 2, fl. 4), caberá a defesa argüir oportunamente a nulidade e demonstrar o prejuízo, a fim de que Juiz do processo, entendendo razoável a alegação, sane a falha reinquirindo o réu, nos expressos termos do parágrafo único do artigo 502 do CPP.» RTJ 116/895/896. Já a utilização da estenotipia na audiência de interrogatório não configura nulidade, sendo certo que do referido ato não resultou qualquer prejuízo à defesa, já que o paciente negou estar envolvido nos fatos. Quanto à audiência de oitiva da vítima e testemunhas, que teria sido rea- R.TJ —150 211 liada sem a presença do paciente, tendo Aplicação do artigo 265, paráo defensor ad hoc dispensado a presengrafo único do Código Penal. ça do mesmo, trata-se de hipótese de Habena corpus indeferido nulidade relativa, cuja declaração (RHC 60.427-DF, Rel. Mia Alfredo não prescinde de oportuna alegação e Buzaid, DJ de 18-3-93, pág. 2975.» demonstração de prejuízo, sendo certo 9. Pelo exposto, somos pelo conhecique nada foi alegado na fase das alegamento e denegação da ordem. ções finais, apresentadas por advogado contratado (fls. 106/107), além de É O parecer.» não ter sido demonstrada, objetivamenÉ o relatório. te, a ocorrência de efetivo prejuízo. VOTO A jurisprudência do Supremo TriO Sr. Ministro Moreira Alves (Relabunal Federal é no sentido de que a declaração de nulidade, nesses casos, tor): 1. Correto o parecer da Procuradoriadepende do preenchimento simultâneo Geral da República. dos requisitos da oportuna alegação e da Com efeito, esta Corte, ao julgar a Reprova de prejuízo, como se vê da ementa presentação de Inconstitucionalidade a seguir transcrita: 1.280 (RTJ 116/889), declarou a constitu«Ementa: Ausência de réu preso cionalidade —por não conflitarem com os à audiência de testemunhas e da víti- artigos 8°, XVII, b, e 1$3, parágrafo 15, da Emenda Constitucional a° 1/69 — das norma. mas do Provimento CXCl/84 do Conselho Nulidade relativa, cuja pronúncia Superior da Magistratura do Estado de São dependeria de oportuna argüição e de Paulo, com base nas quais foi feito o interdemonstração de prejuízo, o que, no rogatório do ora paciente por meio de precatória. A Constituição atual nada inovou caso, não comeu. a respeito, motivo por que não há de se Pedido indeferido.» —HC 69.309- pretender não tenham sido recebidas essas 1/SP — Rel. Mim Octavio Gallotti Mina — DJ de 7-8-92 — pág. 11780. Por outro lado, a arilinçâo da estenotiQuanto à nomeação de defensor pia na audiência de interrogatório não conad hoc, para a audiência de oitiva da figura nulidade, máxime se nenhum prejuívítima e testemunhas (fls. 78/79), foi zo trouxe ao paciente, que negou seu envolela regular, não sendo portanto motivo vimento nos fatos. para declaração de nulidade já que o Também não há que se declarar a nuliadvogado constituído não compare- dade da oitiva de testemunhas sem a preceu, apesar de regularmente intimado sença do paciente, porquanto, embora dis(fls. 76/78), pois o artigo 265, parágra- pensada ela por defensor dativo, não foi ela fo único, do Código de Processo Penal alegada, no momento oportuno, por advoassim autoriza, o que também está de gado já então constituído, certo como é que, acordo com decisão do Supremo Tribu- em se tratando de nulidade relativa, há a nal Federal como se vê da ementa abai- necessidade de sua oportuna alegação bem xo: como a demonstração objetiva de prejuízo. «Ementa: 1. Habeas corpos. IneFmalmente, se o advogado constituído, xistência de cerceamento de defesa apesar de devidamente intimado, não compela ausência de defensor constituído pareceu à oitiva da vítima e de testemuhas, na inquirição testemunhal. foi regular a nomeação de defensor ad hoc R.T.J. —150 212 (ar t. 265, parágrafo único, do Código de Processo Penal). 2. Em face do exposto, indefiro o presente habeas coreus. EXTRATO DA ATA HC 70.172— SP — Rel.: Min. Moreira Alves. Pacte.: Luiz Carlos de Sant'Anna. Imptes.: Alecseo ICravec e outro. Coator: Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo. Decisão: A Turma indeferiu o pedido de shabeas anus», nos termos do voto do Relator. Unânime. Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Octavio Gallotti, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e Bmar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza. Brasília, 23 de março de 1993 — Ricar- do Dias Duarte, Secretário. HAl3EAS CORPOS N° 70.174 — SP (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Carlos Velloso Paciente e Impetrante: JosuéFemandes Lisboa—Coator: Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo Processual Penal. PenaL Continuidade deliam. Elemento tentporaL CM. Penal, art. 71. I — Não ocorre a continuidade delitiva se o intervalo entre um crime e outro é superior a trinta dias. II — Precedentes do STF: HC 69.896-SP, HC 62.451, HC 69.305. III — HC indeferido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na COn -fonidaetjulgmnodast taquigráficas, por decisão unânime, indeferir o «habeas corpus». Brasília, 8 de junho de 1993 — Paulo Brossard, Presidente — Carlos Venoso, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Carlos Venoso: Tratase de habeas corpos impetrado por Josué Fernandes Lisboa, em seu próprio favor, com a alegação de estar sendo vítima de constrangimento ilegal, por terem sido ex- cluídas três de suas penas das séries de penas unificadas pelo Juízo da Vara de Execuções Criminais da Comarca de São Paulo, alusivas às Ações Penais rt's 1.651/78, 1.427/78 e 1.558/78, oriundas, respectivamente, das 30', 11° e 21° Varas Criminais da Comarca de São Paulo. Tais decisões foram mantidas pelo Egrégio Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo. Depois de longas considerações, requer a concessão da ordem «... unificando-se as seis (6) penas resultantes de delitos perpetrados entre os dias 11-2 a 17-8 de 1978, DUM único grupo...» O eminente Presidente do Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo R.TJ —150 pastou informações às fls. 120/121, esclarecendo: «Por petição de 5 de agosto de 1983, o sentenciado pleiteou, perante o Juizo da Vara das Execuções Criminais da Comarca de São Paulo, a unificação das penas impostas nas Ações Penais na 1311/78, 294/79, 1354178, 1.651/78, 1.427/78, 872/76, 1.558/78 e 6179, das Trigésima, Sétima, Segunda, Trigésima, Décima Primeira, Sexta, Vigésima Primeira e Décima Segunda Varas Criminais da Comarca de São Paulo, respectivamente (fls. 2/58v. e 61/68v., doe. n° 2). Após a manifestação do representante do Ministério Público (fls. 69v., doc. n° 3), o MM. Juiz de Primeira Instância deferiu o pedido para unificar as penas em dois grupos, com exdusão das sanções impostas nos Processos na 1.651/78, 1.427/78 e 1.558/78 (fls. 71/72, doc. n° 4) Inconformada, recorreu a defesa (fls. 76/77, 7W86 e 88/89, doe. n° 5). Mantida a decisão atacada (fl. 90, doe. n° 6), a E. Terceira Câmara desta Corte, por votação unânime, negou provimento ao recurso (fls. 98/101, doc. n° 7), restando irrecorrido o ven. acórdão (fl. 102, doe. n° 8). Outrossim, informo a Vossa Excelência que, nos assentamentos desta Secretaria, constam, em favor do paciente, os seguintes pedidos revisionais: n° 136.406/6, do qual desistiu o peticionário, em 22 de novembro de 1984 (fls. 2/4 e 14/15, doe n° 9); —n° 156.6828, indeferido, pelo Eg. Primeiro Grupo de Câmaras, sem discrepância de votos (fls. 2/5 e 25/28, doc. n° 10); e, n° 224.192/4, que a Eg. Turma Julgadora, à unanimidade, não conheceu (fls. 2/11 e 24/26, doc. n° 11)». 213 O Ministério Público Federal, pelo parecer do ilustre Subprocurador-Geral Cláudio Lemos Fonteles, opina pelo indeferimento do writ. Mutua, após transcrever trechos da decisão do Juízo da Vara das Execuções Criminais da Comarca de São Paulo e do acórdão da Terceira Câmara do TACRIM/SP, que «as decisões de 1° e 2° graus não merecem reforma, pois, devidamente fiadamentadas, encontram-se em consonância com recente jurisprudência da Supram Corte...» (HC 69.869, DJ de 2-4-93, pág. 5620). É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Carlos Vdloso (Relator): A Procuradoria-Geral da República, no parecer de fls. 2361240, lavrado pelo ilustre Subprocurador-Geral Cláudio Lemos Fonteles, assim equacionou a controvérsia: 1(4 O ora paciente pleiteou perante o Juízo das Execuções Criminais a unificação das penas que lhe foram impostas em oito (8) processos. Assim está em trecho da decisão que deferiu parcialmente o pedido, verbis: «Excluo, ao inicio da reclamada unificação, as sanções impostas nos Processos na 1.651/78, 1.427/78, 1.558/78, vez que os delitos ali tratados distam entre si e dos demais, na linha temporal, lapso superior a 30 dias, obstada aí a continuidade. Defiro, no mais, em dois grupos, que não podem compor série única, ainda em respeito ao critério temporal. Os delitos que os compõem estão distante também por prazo superior a 30 dias. No primeiro grupo, incluo as penas dos Processos ngi 1.511/78, 294/79 e 1.554/78. 214 R.TJ. — 150 No segundo, as paras dos Processos 872/76 e 6/79. A pena-base para o cálculo, no 1° grupo, é de 6 anos, 2 meses e 20 dias de reclusão, a mais grave (Proc. 1.554/78), acresço-lhe 1/5, pela quantidade de delitos. Para cumprimento, ficam 7 anos, 5 meses e 18 dias de reclusão. No segundo, a pena-base é de 5 anos e 5 meses de reclusão, impostas em ambos os feitos. Acresço-lhe 1/6, por ser dois os delitos. Para cumprimento, ficam 6 anos, 2 meses e 20 dias de reclusão, inalteradas as sanções pecuniárias.» (Vide fls. 189/190 — grifamos.) Inconformado, recorreu o paciente, tendo sido, entretanto, mantida a decisão do eminente Juiz da Vara de Execuções Criminais. Leia-se em trecho do acórdão proferido pela E. Terceira Câmara do TACrim/SP: «A decisão está correta e ne- nhum reparo merece. É impossível, por primeiro, a unificação de todas as condenações em uma única série, como pretende o recorrente, já que cometeu crimes nos anos de 1976 e 1978, separados por longo intervalo de tempo, o que justifica o agrupamento em séries distintas. Para os crimes praticados no ano de 1978, foi corretamente reconhecida a continuidade delitiva abrangendo os delitos de fevereiro e março, que constituam o primeiro grupo. Neste, como é óbvio, não podem ser integrados os crimes cometidos em junho, julho e agosto por ser evidente a ausência do nexo temporaL Resta, apenas, o exame dos delitos que não foram excluídos na unificação. Reconheceu o douto Prolator da respeitável sentença recorrida que entre eles imitiste o liame temporal, porque cometidos em intervalo de tempo maior que trinta dias, respectivamente em 9 de junho de 1978 e 17 de agosto de 1978. (...) Diferente, em cada delito, a maneira de execução, impossível se torna o reconhecimento da continuidade delitiva entre eles, separados por intervalo de tempo superior a trinta dias. Não configurada a continuidade delitiva, senão em parte, como reconhecida na decisão recorrida, de maior beneficio não é merecedor o recorrente, ficando, em conseqüência, desprovido o recurso que interpôs.» (V. fls. 205/207 — grifamos.) 7. Repetindo a argumentação que emborcara o recurso de apelação, o ora paciente formulou perante o TACrim/SP vários pedidos revisionais. & A primeira revisão criminal (v. fls. 218/220) restou indeferida e a segunda não foi conhecida (v. fls. 232/233) pelo Colegiado a quo por se tratar de mera reiteração. 9. As decisões de P e 2° graus não merecem reforma pois, devidamente fundamentadas, encontram-se em consonância com recente jurisprudência da Suprema Corte, verbis: «Continuidade delitiva — Elemento temporal. Quanto ao fator 'tempo' previsto no artigo 71 do Código Penal, a jurisprudência sedimentada do Supremo Tribunal Federal é no sentido de observar-se o limite de trinta dias que, uma vez extrapolado, afasta a possibilidade de se ter o se- R.T.J — 150 gundo crime como continuação do primeiro. ...». (Habeas corpos n° 69.896-4, DJ de 2-4-93, p. 5620) 10. Somos, portanto, pelo indeferimento do pedido.» (fls. 237/240) Está correto o parecer. É que os delitos que originaram as condenações cuja unificação é pedida, foram praticados em épocas diversas, assim separados por longo intervalo de tempo. A jurisprudência do Supremo Tribmal Federal é, na verdade, «no sentido de observar-se o limite de trinta dias que, uma vez extrapolado, afasta a possibilidade de se too segundo crime como continuação do primeiro». (HC n° 69.896SP, Relatar o Sr. fvfmistroMarco Aurélio, em DJ de 2-4-93; HC 62.451, Relator o Sr. Ministro Aldir Passarinho, em DJ de 26-4-85; HC 69.305, Relator o Sr. Ministro Seprilveda Pertence, em DJ de 5-6-92). 215 Do exposto, indefiro o Iara. EXTRATO DA ATA HC 70.174 — SP — Rel.: Mn. Carlos Venoso. Pacta.: Josue Fernandes Lisboa. Impte.: O mesmo. Coator: Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo. Decisão: Por unanimidade, a Turma indeferiu o «cobras compus». Ausente, ocasionalmente, o Ministro Presidente. Presidiu o julgamento o Ministro Paulo Brossard. Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Paulo Brossani, Carlos Valioso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Mardem Costa Pinto. Brasília, 8 de junho de 1993 — José Wilson Aragão, Secretário. HABEAS CORPUS N" 70.197 — SP (Segunda 'Turma) Relator. O Sr. Ministro Carlos Valioso Paciente e Impetrante: Pedro Yamauchi — Coator: Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Processual penaL Penal. Citação por editaL Mudança de endereço residenciaL I — Informado o meirinho, no local referido como sendo o da residência do réu, de que este mudara-se para local ignorado, não está o servidor da Justiça obrigado a efetivar consultas a repartições públicas ou particulares a respeito do paradeiro do citando, certo que tem este a obrigação de estar atento aos atos processuais e, no caso de mudança de residência, de comunicar à Justiça o seu novo endereço. II — Citação por edital realizada regularmente, dado que o réu não foi encontrado no endereço constante dos autos. 111 — HC indeferido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na confonnidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por decisão unânime, indeferir o «habeas corpos». Brasília, 8 de jimbo de 1993 — Paulo Brossard, Presidente — Carlos Valioso, Relator. 216 R.T.J. — 150 RELATÓRIO O Sr. Ministro Carlos Velloso: Tratase de habeas empas impetrado por Pedro Yamauchl, em causa própria, em que alega ter sido condenado pelo crime previsto nos artigos 213 e 214 do Código Penal, c.c. os artigos 69e 71 do mesmo Código, a 12 anos 10 meses de reclusão, e pleiteia a anulação do processo-crime a partir da citação, por entenda ter havido vício na citação editalícia. Afirma que o Oficial de Justiça, de maneira apressada, com base unicamente nas informações de sua esposa, com quem está em litígio, certificou que o paciente estava em lugar incerto e não sabido, fazendo com que fosse decretada sua revelia, com sério prejuízo para sua defesa. Entende que o meirinho deveria ter consultado outros órgãos, além da Vara processante, como Cartório Eleitoral, Instituto de Identificação e outros. O eminente Presidente em exercício do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo prestou informações às fls. 46/47, esclarecendo que o paciente, além de ter sido condenado à pena de 12 anos e 10 meses de reclusão, por incurso nas penas dos arts. 213 e 214 do Código Penal, c.c. os arts. 69 e 71 do mesmo Código teve decretada sua «... incapacidade para o exercício do pátrio poder em relação às suas filhas Cristina Célia Yamaucbi e Alessandra Yamauchi, em virtude de tal direito-dever ser incompatível com os atos por ele praticados...», com fundamento no art. 92, II, do Código Penal. O paciente impetrou habeas corpos, alegando nulidade da citação editalícia. A Segunda Câmara Criminal denegou a ordem, sobre o fundamento de que o paciente foi procurado no endereço constante de sua qualificação no inquérito policial, sem nenhum sucesso, e de que «a pretensão dos impetrantes no sentido de que efetuasse o meirinho diligências na tentativa de obter notícias do paradeiro do citando, sobre não corresponder a qualquer exigência legal, não é sequer sensata, uma vez que não tinha o Oficial de Justiça razão para supor estivesse a intencionalmente enganá-lo a esposa do acusado». Contra esse acórdão interpôs recurso ordinário, cujo processamento foi indeferido, por ser intempestivo. Também o pedido de revisão criminal que ajuizou, insistindo na irregularidade da citação, foi indeferido. Em 4-12-92, ingressou com novo pedido revrs'ional, alegando insuficiência de prova para incriminá-lo. A Procuradoria de Justiça opinou pelo deferimento parcial do pedido, «para que se proceda à mitigação da reprimenda», por entender que, sen4o o réu primário, «não se justificava que a base da mesma fosse situada tão acima do mínimo legal». Relativamente à dosagem da pena, transcrevem as informações parte da respeitável sentença: «O réu merece forte reprimenda penal, pois agiu com intenso grau de dolo, utilizando-se da condição de pai para a prática dos hediondos crimes praticados contra suas próprias filhas, ainda menores, que ficarão, com certeza, para sempre marcadas pelo estigma de terem sido objeto da luxúria do próprio pai. Não merece o beneplácito da Justiça Penal modo que, em razão do crime de estupro, fixo-lhe a pena base em 6 (seis) anos de reclusão, a qual aumento em 1/6 (um sexto), em razão da continuidade (artigo 71, capar), de sorte que torno definitiva, por tal crime, a pena de 7 (sete) anos de reclusão. Em razão do crime de atentado violento ao pudor, fixo-lhe a pena de 5 (cinco) anos de reclusão, a qual, aumento em 1/6 (um sexto), em conseqüência do nexo de continuidade, de maneira que, tomo definitiva, por tal crime, a pena de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão...» Registram as informações que a declaração de nulidade do ato citatório pretendida pelo paciente deveria ser postulada na R.T.J —150 forma do art. 571 do CPP, sendo certo que «o réu, ora paciente, teve nomeado Defensor dativo que praticou todos os atos inerentes à ampla defesa de seus direitos no curso da instrução criminal, não apontando em momento algum irregularidade ou nulidade de qualquer dos atos praticados». Sobre a validade da citação editalícia, invocam as informações a Súmula 366-STF e concluem que o que realmente pretende o paciente é «o =exame dos julgados com supedâneo nas provas existentes nos autos», o que não é admitido pela jurisprudência da Suprema Corte em sede de habeas corpus. Oficiando às fls. 106/116, o Ministério Público Federal, pelo parecer do ilustre Subprocurador-Geral Edson Oliveira Almeida, opina pelo indeferimento da ordem, por entender que para a citação editalícia, «não são exigíveis consultas de outro tipo, como ao TRE e sindicatos de classe, visando obter o endereço de réu não encontrado em sua residência, cujo paradeiro seja desconhecido». Transcreve o parecer trecho do acórdão proferido pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo no habeas corpus impetrado em favor do ora paciente e escólios doutrinários no sentido de que «não há qualquer exigência na lei que obrigue o meirinho a outras diligências, conto a coasulta a repartições públicas ou particulares (Tribunal Regional Eleitoral, Ministério do Trabalho, etc.)» (Processo Penal, Mio Fabrini Mirabete, ?ed. São Paulo, Atlas, 1992, p. 416). É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Carlos Valioso (Relator): O acórdão da 2° Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, às fls. 72f75, refutou, com bons argumentos, a alegação de irregularidade na citação editalícia: 217 A determinação de citação editalícia foi escorreita, sem dúvida. Qualificado no curso do inquérito policial, o único local referido como sendo o da nesidência do paciente foi a Rua Dr. Mello Alves n° 39, em Cerqueira César (fls. 14 e 15), onde, sem nenhum sucesso, foi procurado pelo Sr. Oficial de Justiça (fl. 18). A pretensão dos impetrantes no sentido de que efetuasse omeirinho diligências na tentativa de obter notícias do paradeiro do citando, sobre não corresponder a qualquer exigência legal, não tinha o Oficial de Justiça razão para supor estivesse a intencionalmente enganá-lo a esposa do acusado. Para a tentativa de citação pessoal, antes da editalícia, o que se exige, tãosó, é o exaurimento de providências razoáveis, possíveis e que se revistam de alguma perspectiva de sucesso, como tal entendida a procura do citando em todos os endereços referidos nos autos, sejam de sua residência, sejam do local de trabalho, bem por isso, para que se mostre adequada a citação editalicia, não reclama a lei exerça o Oficial de Justiça autêntica atividade investigatória, de pesquisa e de descobrimento, na esperança de deslindar o mistério do desaparecimento do citando. Fosse essa a missão do Oficial de Justiça, fosse esse o encargo que lhe cabe antes de se fazer possível e justa a citação por edital, estaria a ação penal destinada a infindável procrastinação e indesejável retardamento, pois sempre haveriam de surgir outras e novas providências (às vezes astutamente arquitetadas com objetivos claramente escusos) a adiar a legitimidade da citação ficta daquele que está em local evidentemrate ignorado. Por essas razões que, suficientemente procurado o paciente no único local mencionado como sendo da sua residên- 218 R.T.J. — 150 cia, e ali informado o meirinho de que ele se mudara para local desconhecido, fez-se adequada a citação por meio de éditos. Mesmo porque, acrescente-se, não fizeram os impetrantes, até aqui, prova alguma da inverdade da informação fornecida ao Oficial de Justiça, indicando, por exemplo, que tinha ele residência naquele endereço ou em outro possível de conhecimento. E já que não se mostram adequadas ao âmbito estrito do habeas corpos indagações a respeito do intencional propósito da esposa do citando de dizê-lo em local ignorado, pretendendo, com a mentira, dificultar-lhe o exercício do direito de defesa, por esse primeiro aspecto não procede a impetração, certamente». O certo é que o meirinho procurou pelo réu, ora paciente, a fim de citá-lo no único local referido corno sendo o da sua residência, não obtendo sucesso, dado que, ali, foi informado de que o réu, ora paciente, mudara-se para local ignorado. Diante disso, nada mais restava a fazer, mesmo porque o réu, ora paciente, não se encontrava preso. Com propriedade, escreve o ilustre Subprocurador-Geral Edson de Oliveira Almeida, no parecer de fls. 106(116: <4.4 5. Finalmente, diz o impetrante que, embora expedidos os ofícios de praxe, para tentar localizar o citando em algum presídio ou delegacia policial, 'não foram consultados outros órgãos oficiais, como Cartório Eleitoral, Instituto de Identificação.' Essas diligências adicionais não são exigidas, merecendo ser lembrada lição de Ada Pellegrini Grinover et ala: «... segundo opinião corrente na jurisprudência, não são exigíveis con- sultas de outro tipo, como ao TRE e sindicatos de classe, visando a obter o endereço de réu não encontrado em sua residência, cujo paradeiro seja desconhecido». (As Nulidades no Processo Penal. São Paulo, Malheiros Editores, 1992, p. 88) No mesmo sentido °posicionamento de Júlio Fabrini Mirabete: «Não há qualquer exigência na lei que obrigue o meirinho a outras diligências, como a consulta a repartições públicas ou particulares (Tribunal Regional Eleitoral, Ministério do Trabalho, etc.)...» (Processo Penal, 2• ed., São Paulo, Atlas, 1992, p. 416). Perfeito o entendimento. Esclareça-se que corre ao réu, que está sendo processado criminalmente, a obrigação de estar atento aos atos processuais e, no caso de mudança de residência, comunicar à Justiça o seu novo endereço. Do exposto, indefiro o writ. EXTRATO DA ATA HC 70.197 — SP —Rel.: Carlos Venoso. Pacte.: Pedro Yamaucbi. linpte.: O mesmo. Coator: Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Decisão: Por unanimidade, a Tunna indeferiu o «habeas carpis». Ausente, ocasionalmente, o Ministro Presidente. Presidiu o julgamento o Ministro Paulo Erossard. Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Paulo Brossard, Carlos Venoso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Mardem Costa Pinto. Brasília, 8 de junho de 1993 — José Wilson Aragão, Secretário. R.T.J —150 219 !JARRAS CORPUS N° 70.239 — SP (Primeira Turma) Relator p/o acórdão: O Sr. Ministro limar Gaivão Paciente: José Amaury Pereira — Coator: Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo Habeas corpus. Alegado nulidade da citação editacia, por encontrar-se o paciente, na oportunidade, em regime de cumprimento de prisão albergue domiciliar. Peado tambim fiaidado entnegativa de autoria. Alegações insuscetíveis de serem consideradas. No primeiro caso, não apenas ante a inexistência, nos autos, de prova de que o paciente se achava preso ao tempo em que se tentou a sua citação pessoal, mas também por não se encontrar a prisão albergue abrangida pela regra da Súmula n° 351; e, no segundo pelo evidente descabimento, no habeas corpos, de reexame de prova com vistas à alteração, quanto ao mérito, da sentença condenatória. Pedido indeferido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, em indeferir o pedido de «habeas corpus», vencido o Sr. Ministro Sepúlveda Pertence, Relator, que o deferia. Brasília, 29 de junho de 1993 — Moreira Alves, Presidente— Rmar Gaivão, Relator p/o acórdão. RELATÓRIO O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: 1. José Amaury Pereira, impetra, habeas corpus alegando nulidade da citação editalícia e, portanto, da subseqüente condenação à revelia, por ter sido considerado em local incerto e não sabido, ao mesmo tempo em que cumpria prisão-albergue domiciliar por outro delito, na comarca. 2.0 paciente foi absolvido em primeira instância e condenado — provido apelo do Ministério Público — pelo Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo a 6 anos e 13 dias de reclusão por roubo qualificado. 3. As informações —quanto ao decreto de revelia — são as seguintes (fls. 54/55): «Recebida a denúncia (fl. 29, doc. n° 4), tentou-se a citação pessoal do paciente, sem sucesso (fl. 69/v, doc. n° 5). Determinado o chamamento por edital e expedidos os ofícios de praxe (fls. 71/72, 76 e 80/v, doc. n° 6), veio aos autos a informação de que o acusado se encontrava em regime de prisão-albergue domiciliar desde 6 de maio de 1983 (fl. 78/v, doc. n° 7). Diligenciou-se novarnente no sentido de citar pessoalmente o réu, ocasião em que se comunicou ter sido o paciente beneficiado com a prisão-albergue domiciliar desde 11 de maio de 1983 (fls. 82/92v, 95/96, 98/v, 100/104v e 1071v, doc. n° 8). A seguir, o Juízo a quo decretou a revelia do réu, nomeando-lhe defensor dativo (fls. 108/109, doc. n° 9).» 4. Acrescenta o ilustre Juiz Lustosa Goulart, Presidente do TACrim-SP: «Após novas e frustadas tentativas de localização do paciente (fls. 176/v, 184/v, e 188/189, doc. n° 12), manifestaram-se as partes (fls. 1901191, doc. n° 13), sobrevindo, então, sentençaabsolutória, com fundamento no art. 386, VI, do Código de Processo Penal (fls. 194/197, doc. n° 14). 220 R.T.J. —150 Inconformado, recorreu o representante do Ministério Público (fls. 200, 202/206 e 210/212, doe. n° 15), tendo a E Sexta Câmara desta Corte, por votação unânime, dado provimento à apelação para condenar o recorrido à pena de 6 anos de reclusão e 13 dias-multa, por roubo agravado e determinar a expedição de mandado de prisão (fls. 224/229, doc. n° 16). 0 v. acórdão restou irrecorrido (fl. 230, doc. n° 17) e o mandado de prisão foi cumprido em 19 de abril de 1989 (fls. 236/237v, doe. n° 18). Por derradeiro, esclareço que o paciente formulou, neste Tribunal, o Pedido Revisional n° 196.200/1, que o E Segundo Grupo de Câmaras, sem discrepância de votos, indeferiu (fls. 2/6 e 18/22, doc. n° 19). (...)» 5. 0 ilustre Subprocurador-Geral Mardem Pinto opina pelo indeferimento da ordem, aduzindo (fl. 156): «(...) não há qualquer irregularidade na citação editalícia e no decreto de revelia. Com efeito, o impetrante e paciente foi procurado no endereço que indicou no interrogatório policial, ou seja, na Rua 6, n° 35, Jaraguá (fl. 68), endereço constante também dos documentos de fls. 61, 62 e 72, e também no endereço do seu trabalho, não sendo encontrado, frustrando-se as tentativas de citação pessoal, como pode ser conferido às fls. 75, 92 e 92/verso. Nada importa o fato de o paciente ter sido beneficiado, em outro processo, com a prisão-albergue domiciliar, seja porque o mesmo não comprovou que esteja em gozo do citado beneficio na época em que foi tentada a citação pessoal, o que ocorreu em março a julho de 1985 (fls. 75 e 92), sendo certo que os documentos de fls. 82, 94/verso, 97, 100/verso e 104 apenas indicam que o impetrante e paciente foi beneficiado com o citado regime a partir de maio de 1983, nada indicando sobre o término do mesmo, seja porque os documentos acima referidos deixam claro que, por uma falha Inexplicável do sistema, ninguém se preocupou em anotar o endereço do impetrante e paciente, seja fmahnente porque a hipótese (prisão-albergue domiciliar sem endereço do condenado) evidentemente não se enquadra no enunciado da Súmula n° 351 do STF. Já a alegação de que não seria o autor do crime, bem como a de que a condenação estaria fundada exclusivamente em provas do inquérito e em reconhecimento fotográfico, não podem ser apreciadas em habeas corpos, que por seu objetivo e rito processual, em regra, não comporta reexame da prova visando à alteração, quanto ao mérito, da sentença condenatória. Pelo exposto, somos pelo conhecimento e denegação da ordem.» (grifado) o relatório. VOTO O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: A citação por edital, por sua notória inutilidade, na quase totalidade das vezes, é modalidade de chamamento do réu ao processo que só se legitima, quando exauridos os meios de que disponha o juízo para a localização do denunciado e sua citação pessoal. Ora, no caso, o paciente comprovou que, depois de vindo aos autos a informação de achar-se cumprindo pena, sob regime de prisão-albergue domiciliar — que importava na obrigação de comparecimento periódico ao Juízo das Execuções Criminais —, efetivamente ali compareceu diversas vezes, duas delas — 13-11-85 e 14-2-86 (fl. 44) — antes que, em 24-4-86, lhe fosse decretada a revelia. Patente , assim, que se descurou o Juiz do processo de diligência que teria propiciado a citação pessoal, estou cru que não R.TJ —150 se pode negar a nulidade da citação por edital, que contaminou irremediavelmente o processo. 4. Defiro a ordem para declarar-lhe a nulidade, desde o decreto de revelia, com a soltura do paciente, se por al não estiver preso: é o meu voto. VOTO O Sr. Ministro limar Gaivão: Sr. Presidente, vou pedir vênia ao Ministro Relator para denegar a ordem, perfilhando, para tanto, os fundamentos do parecer da douta Procuradoria. VOTO O Sr. Ministro Moreira Alves (Presidente): Também acompanho o eminente Ministro Ilmar Gaivão, tendo em vista a circunstância de que, procurado no domicílio indicado, onde, aliás, devia estar cumprindo a prisão-albergue domiciliar, não foi encontrado o paciente. Tentou-se, inclusive, a sua localização no local tido como o 221 de trabalho e, com isso, exauriram-se as possibilidades para encontrá-lo. Assim, também indefiro o babeas corPua. EXTRATO DA ATA HC 70.239 — SP — Rel.: Min. Sepúlveda Pertence. Pacte.: José Amaury Pereira. Impte.: José Amaury Pereira. Coator: Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo. Decisão: A Turma indeferiu o pedido de «habeas carpas». Vencido o Sr. Ministro SeptIlveda Pertence, Relator, que o deferia. Relator para o acórdão o Sr. Ministro Ilmar Gaivão. Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Sydney Sanches, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e finar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Miguel Franzino Pereira. Brasília, 29 de junho de 1993 — Ricardo Dias Duarte, Secretário. RAMAS CORPUS 70.240 — SP (Primeira 'Turma) Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello Pacientes: Nivaldo Rodrigues e outros — Impetrantes: Imo Ishi e outros — Coator: Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Habeas corpos. Apelação criminal interposta exclusivamente pelos réus. Agravamento do regime de cumprimento da pena. Ofensa ao art. 617, in ene, do CPP. Reformado in pejas. Pedido deferido. O Tribunal, ao julgar recurso interposto exclusivamente pelos réus, não pode agravar o regime inicial de cumprimento da pena, alterando-o, ausente qualquer iniciativa recarga' do Ministério Público, de senil-aberto para fechado. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes au- tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- bunal Federal, em Primeira Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigiáficas, por unanimidade de votos, em deferir o pedido de «habeas comusa, 222 R.T.J. —150 para manter o regime penal semi-aberto estabelecido na sentença de primeiro grau. Brasília, 8 de junho de 1993 —Moreira Alves, Presidente — Celso de Mello, Relator. RELATÓRIO cumprimento das sanções penais impostas, o regime semi-aberto (fls. 16/17). Consta destes autos, no entanto, que o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, ao julgar recurso de apelação criminal exclusivamente interposto pelos pacientes, veio a agravar-lhes a situação jurídico-penal, na medida em que, ausente qualquer O Sr. Ministro Celso de Mello: Trata- iniciativa recursal do Ministério Públise de habeas corpus, com pedido de limi- co, impôs-lhes o regime penal fechado para nar, impetrado em favor de Nivaldo Rodri- efeito de cumprimento das penas (fl. 23). gues, Paulo Roberto Firmo e Paulo Cezar Houve, à toda evidência, no caso predos Reis, contra acórdão do Tribunal de sente, clara ofensa ao preceito inscrito no Justiça do Estado de São Paulo que, julgan- art. 617 do Código de Processo Penal que do apelação criminal exclusivamente inter- veda, nos recursos exclusivos da defesa, posta pelos réus, ora pacientes, agravou- o agravamento do status poenalis do réu. lhes o regime inicial de cumprimento da O princípio da reformatio in pejas, ao pena, alterando-o de semi-aberto pata feimportar em restrição aos poderes dos Trichado (fls. 19/23). bunais, constitui garantia subjetiva dos senConcedi, às fls. 64/65, a medida liminar tenciados, que dele extraem, como líquido requerida pelos impetrantes para manter os e certo, o direito de não verem agravada, pacientes, até final julgamento deste ha- ante a ausência de recurso do Ministério beas corpus, no regime penal semi-aberto, Público, a sua própria situação jurídica, tal determinado pela sentença condenatória como definida pela decisão penal condenaproferida pelo Juízo de Direito da l' Vara tória emanada do órgão judiciário de priCriminal da comarca de São Bernardo do meiro grau. Campo (fls. 9/17). O Supremo Tribunal Federal, ao aprePrestadas as informações pelo órgão ciar tema idêntico ao suscitado na presente apontado como coator (fls. 74/79), ma- impetração, decidiu que, verbis: nifestou-se o Ministério Público Federal no diabas corpus. Homicídio simples. sentido da concessão do writ, por entender Apelação interposta exclusivamente configurada, na espécie, uma nítida hipótepela defesa. Agravamento do regime se de reformatio in pejus, eis que o TriprisionaL Reformado in pejas. Pedido bunal de Justiça, ao julgar recurso interposdeferida to exclusivamente pelos ora pacientes, cul— O juízo ad quem não pode, ao minou por impor-lhes regime penal mais apreciar recurso interposto exclusivagravoso que aquele fixado na sentença condenatória de primeira instância (fls. mente pela Defesa, agravar o regime 126/134). prisional imposto ao réu condenado. Essa atuação processual do Tribunal, que torÉ o relatório. na mais gravoso o regime de execução VOTO da pena, sem que haja recurso do Ministério Público, incide na censura da lei O Sr. Ministro Celso de Mello (Relaque veda a reformatio in pejus. tor): A sentença proferida pelo magistrado de primeira instância, após ressaltar «a pri— A norma inscrita no art. 617 do mariedade e ausência de maus antecedenCódigo de Processo Penal, que obsta o tes dos acusados», fixou, como regime de agravamento da pena quando somente R.TJ —150 o réu houver apelado da sentença, tem por objetivo impedir que os Tribunais onerem a situação jurídico-penal dos acusados quando destes — exclusivamente destes — for a impugnação recursa! deduzida.» (HC 69.477-2-RS, Rel. Min. Celso de Mello, Primeira Turma, julgamento em 30-6-92, votação unânime) A Colenda Segunda Turma desta Suprema Corte, por sua vez, ao julgar o HC 69.504-SP, Rel. Min. Paulo Brossard, e tendo presente situação jurídica rigorosamente idêntica à destes autos, houve por bem deferir o writ constitucional em acórdão assim ementado (DJ de 23-10-92), verbis: «Habeas corpos. Reformado ia O Tribunal, ao julgar apelação interposta exclusivamente pelo réu, agravou o regime inicial de cumprimento da pena de semi-aberto para fechado, sem qualquer fundamentação. Configuração da reformado in pejas. Habess corpus deferido.» Idêntica orientação jurisprudencial foi também consagrada em decisão deste Tribunal no julgamento do HC 67.747SP, Rel. Min. Francisco Rezek, Dl de 3-8-90, verbis: «Habena corpas.ReformatioMpojus. Apelação exclusiva da defesa. Agra- 223 vamento do regime de cumprimento da pena. Tribunal que, julgando apelação da defesa, agrava o regime inicial do cumprimento da pena. Flabeas corpus deferido.» Sendo assim, e tendo presente, ainda, o parecer inteiramente favorável da douta Procuradoria-Geral da República (fls. 126/134), defiro o pedido para, continuando a liminar anteriormente concedida, manter, em favor dos ora pacientes, o regime penal semiaberto estabelecido na sentença condenatória de primeiro grau. É o meu voto. EXTRATO DA ATA HC 11C70.240—SP---Rel.: Min. Celso de Mello. Pactes.: Nivaldo Rodrigues e outros. Imptes.: Isao Ishi e outros. Coator: Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Decisão: A Turma deferiu o pedido de «habeas corpos», para manter o regime penal semi-aberto estabelecido na sentença de primeiro grau, nos termos do voto do Relator. Unânime. Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Sydney Sanches, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e limar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza. Brasília, 8 de junho de 1993 — Ricardo Dias Duarte, Secretário. HABEAS CORPUS N° 70.249 — MS (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello Paciente: Anadilson da Costa Leite — Impetrante: Maria Anete Barros — Coator: Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul Habena corpus. Defensor público. Lei rt• L060/50 (art. 5°, § 5,, com a redação dada pela Lei 7.871/89. Declaração de inconstita- e 224 R.T.J. — 150 cionalidade pela Seção Criminaldo Tribtsnalde Justiça. Inadmissibilidade. Princípio da reserva de plenário (CF, art. 97). bisa:idade da decisão intpugnada.Pedidodeferido. — Nenhum órgão fraccionário de qualquer Tribunal dispõe de competência, no sistema jurídico brasileiro, para declarar a inconstitucionalidade de leis on atos emanados do Poder Público. Essa magna prerrogativa jurisdidonal foi atribuída, em grau de absoluta exclusividade, ao Plenário dos Tribunais ou, onde houver, ao respectivo Órgão Especial. Essa extraordinária competência dos Tribunais é regida pelo princípio da reserva de Plenário, inscrito no artigo 97 da Constituição da República. — Suscitada a questão prejudicial de constitudonalidade perante órgão fraccionário de Tribunal (Câmaras, Grupos, Turmas ou Seções), a este competirá, em acolhendo a alegação, submeter a controvérsia jurídica ao Tribunal Pleno. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Primeira Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em deferir o pedido de «habeas comum. Brasília, 4 de maio de 1993 — Moreira Alves, Presidente — Celso de Mello, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Celso de Mello: O Ministério Público Federal, em parecer do ilustre Subprocurador-Gemi da República, Dr. Edson Oliveira de Almeida, assim resumiu e apreciou os fundamentos da presente impetração, concluindo — após registrar a existência de precedente do Supremo Tribunal Federal no exame da matéria — pela concessão da ordem de habeas corpus (fls. 43/45), verbis: «Inconstitucionalidade de lei federal declarada pela Seção Criminal do Tribunal de Justiça: nulidade por ofensa ao artigo 97 da Constituição Federal. A colenda Seção Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso do Sul não conheceu, por intempesli- vidade, de embargos infringentes criminais opostos por meio da Assistência Judiciária, uma vez que não reconhecido, ao argumento de inconstitucionalidade, o benefício do prazo em dobro previsto no artigo 5°, § 5°, da Lei n° 1.060/50 (redação da Lei n° 7.871/89). A impetrante alega que a Seção Criminal não tem competência para declarar a inconstitucionalidade de lei, conforme estatuído no artigo 97 da Constituição Federal. A Constituição Federal (artigo 97) reserva o julgamento da constitucionalidade das leis para o Tribunal Pleno (ou órgão especial, onde houver, art. 93, XI), uma vez que exigido, para a declaração da inconstitucionalidade, o voto da maioria absoluta dos membros do Tribunal ou do respectivo órgão especiaL O incidente deve ser suscitado no órgão fracionário e, uma vez acolhido, cabe sobrestar o julgamento até a decisão plenária (Código de Processo Civil, artigos 480 a 482). Pelo exposto, (...), opino pelo deferimento do writ para que seja anulado o acórdão dos embargos infringentes opos- R.TJ —150 tos em favor do paciente, com o fim de ser renovado o julgamento, observado o artigo 97 da Constituição Federal, em caso de acolhimento da preliminar de inconstitucionalidade.» É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): A questão suscitada no presente babem corroa não é nova, uma vez que esta Turma, apreciando-a em wrlts anteriores, proclamou que somente o Plenário dos Tribunais — ou, onde houver, o correspondente órgão Especial — dispõe de competência para declarar a inconstitucionalidade dos atos estatais. A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o HC 69.921-9 (DJ de 26-3-93), Rel. Min. Celso de Mdlo, resolveu idêntica controvérsia jurídica, ora renovada nesta sede processual, em acórdão assim ementado: «Habitas corpos. Defensor público — Praia recursal espedal. Prejudidai de Inconstitucionalidade. Ld n° 1.060/50 (art. 5°, 5°), com a redação dada pela Lei n° 7.871/89. Princípio da reserva de Plenário (CF, art. 97). Incompetência da Seção Criminal do Tribunal de Justiça para a declaração de inconstitudonalidade. Necessidade de o incidente de inconstitucionalidade ser submetido ao plenário do tribunal. Pedido deferido. — A declaração de inconstitucionalidade de leis ou atos emanados do Poder Público submete-se ao princípio da reserva de Plenário consagrado no art. 97 da Constituição Federal. A vigente Carta Política, seguindo uma tradição iniciada pela Constituição de 1934, reservou ao Plenário dos Tribunais a competência funcional por objeto do juízo para proferir decisões declaratórias de inconstitucionalidade. 225 Órgãos fraccionários dos Tribunais (Câmaras, Grupos de Câmaras, Turmas ou Seções), muito embora possam confumar a legitimidade constitucional dos atos estatais (RTJ 98/877), não dispõem do poder de declaração da inconstiticionaliclade das leis e demais espécies jurídicas editadas pelo Poder Público. Essa especial competência dos Tribunais pertence, com exclusividade, ao respectivo Plenário ou, onde houver, ao correspondente órgão especial. —A norma inscrita no art. 97 da Carta Federal, porque exclusivamente dirigida aos órgãos colegiados do Poder Judiciário, não se aplica aos magistrados singulares quando no exercício da jurisdição constitucional (RT 554/253).» Esse entendimento reflete a orientação jurisprudencial firmada pelo Supremo Tribunal Federal a propósito do tema em questão, como se verifica dos seguintes precedentes: 4Habeas corpos. Incidente de inconstitucionalidade levantado, no julgamento de embargos infringentes, na Seção Criminal do Tribunal de Justiça, e por ela julgado. Inobservância do disposto no artigo 97 da Constituição Federal. Habeas corpus deferido, para anular o acórdão ora impugnado, a fim de que a Seção Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, voltando a julgar os embargos infringentes a ela interpostos, levante, querendo, o incidente de inconstitucionalidade da mencionada Lei n° 7.871/89 perante o Plenário daquela Corte.» (HC 69.730-5-MS, Rel. 11%. Moreira Alves, DJ de 18-12-92) «Incompetência de órgão fracionário de Tribunal para declarar a inconstitucionalidade do prazo em dobro previsto no art. 5°,. § 5°, da Lei n° 1.06W50 (ralação dada pela Lei n° 7.871-89). 226 R.TJ. — 150 Babe= corpus deferido, para que, cial de constitucionalidade da Lei n° 7.871, anulado o acórdão ora impugnado, a de 1989. Seção Criminal do Tribunal de Justiça Deixo de ordenar a soltura do ora pado Estado de Mato Grosso do Sul, vol- ciente, eis que, não obstante invalidado o tando a julgar os embargos infringentes acórdão que declarou a intempestividade a ela interpostos, levante, querendo, o do recurso de embargos infringentes e de incidente de inconstitucionalidade da nulidade, ainda subsiste a condenação pemencionada Lei n° 7.871/89 perante o nal a ele imposta pela prática do delito de Plenário daquela corte.» latrocínio, qualificado como crime hedion(HC 69.913-8-MS, ReL Min. Octavio do pela Lei n° 8.072/90. Gallotti, DJ de 2-4-93). Registro que o ora paciente foi condena«Controle incidente de constitucio- do à pena de 23 anos de reclusão, a ser nalidade: quorum qualificado para a de- cumprida em regime fechado, por infração claração de inconstitucionalidade de lei, ao art. 157, § 3°, última parte, do Código à exigência do qual é irrelevante que se Penal, eis que teria cometido — já vigente tenha ou não formulado argüição explí- a lei que define os crimes hediondos (Lei cita, bastando que a aplicação da norma n° 8.072 de 25-7-90) — o delito de latrocída lei incidente haja sido afastada, no nio. caso concreto, sob fundamento de conA sentença penal condenatória, proferitrariedade à Constituição.» da pelo magistrado de primeira instância, (HC 69.939-1-MS, Rel. Afira Sepúlvefoi confirmada em sede =cursai, por votada Pertence, DJ de 19-3-93) ção majoritária, quando do julgamento da Nenhum órgão fraccionário de qualquer apelação criminal interposta pelo ora paTribunal dispõe de competência, no siste- ciente. ma jurídico brasileiro, para declarar a inNada legitima, em conseqüência, a preconstitucionalidade de leis ou atos emana- tendida expedição de alvará de soltura em dos do Poder Público. Essa magna prerrofavor do ora paciente. gativa jurisdicional foi atribuída, em grau É o meu voto. de absoluta exclusividade, ao Plenário dos Tribunais ou, onde houver, ao respectivo EXTRATO DA ATA Órgão Especial. Essa extraordinária comHC 70.249 — MS — Rel.: Min. Celso petência dos Tribunais é regida pelo princípio da reserva de Plenário, inscrito no de Mello. Pacte.: Anadilson da Costa Leite. Impte.: Maria Mete Barros. Coator. Tribuartigo 97 da Constituição da República. nal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Suscitada a questão prejudicial de cons- Sul. titucionalidade perante órgão fraccionário Decisão: A Turma deferiu o pedido de de Tribunal (Câmaras, Grupos, Turmas ou «habeas corpus», nos termos do voto do Seções), a este competirá, em acolhendo a Relator. Unânime. alegação, submeter a controvérsia jurídica ao Tribunal Pleno. Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Assim sendo, defiro o pedido, a fim de que a Seção Criminal do Tribunal de Justi- Octavio Gallotti, Sepúlveda Pertence, Celça do Estado de Mato Grosso do Sul, vol- so de Mello e limar Gaivão. Subprocuratando a julgar o recurso de embargos infrin- dor-Geral da República, Dr. Arthur de Casgentes e de nulidade interposto pela Defen- tilho Neto. Brasília, 4 de maio de 1993 — Ricardo soria Pública, suscite, querendo, perante o Plenário daquela Corte, a questão prejudi- Dias Duarte, Secretário. R.T.J —150 227 BARRAS CORPUS N° 70275 — SP (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro limar Gaivão Paciente: Gilmar de Jesus — Coator: Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo Habeas corpos. Prescrição retroativa configurada. Prazo dindruddo pela menoridade do paciente à época dos fatos esem que houvesse interrupção pelo fator superveniente da reincidência. Comprovado o transcurso de mais de dois anos entre a data do recebimento da denúncia e a da publicação da sentença, concede-se a ordem para se declarar extinta a punibilidade do paciente pelo crime de furto, pelo qual foi apenado com um ano de reclusão, tendo em vista a sua menoridade à época do cometimento do delito e a circunstância de não ter sido interrompido o prazo prescridonal então em curso (art. 109, V, c/c art. 115, ambos do CP). Soltura do paciente se por al não se encontrar preso. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em deferir o pedido de «habeas corpus», nos termos do voto do Relator. Brasília, 22 de junho de 1993 —Moreira Alves, Presidente — limar Gaivão, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Limar Gaivão (Relator): A Procuradora do Estado, Janora Rocha Rossetti, no exercido da assistência judiciária gratuita, impetra habeas corpos em favor de Gilmar de Jesus, ora recolhido ao Centro de Readaptação Penitenciária de Taubaté-SP, alegando estar o paciente sofrendo constrangimento ilegal, em virtude de o Tribunal de Alçada Criminal não lhe ter reconhecido a prescrição da pretensão punitiva estatal. Alega que, denunciado pelo crime de furto (art. 155 do CP), foi o paciente condenado a um ano de reclusão, tendose em apelação majorado a pena reclusiva para um ano e dois meses, circunstância esta que afirma não ter afetado, ainda naquela época, a consumação da prescrição, que, no caso, é de dois anos, por contar ele, quando do fato, menos de vinte e um anos, e jáhaver tallapso transcorrido entre adata do recebimento da denúncia (27-6-73) e a da publicação da sentença (1°-7-75). Em conseqüência, requeraconcessãodaordem para que seja expedido alvará de soltura. Prestando informações, o ilustre Presidente do Tribunal apontado como coator, Juiz Lodosa Goulart, relata as principais ocorrências do processo em primeira e segunda instâncias, encaminhando as respectivas peças (fls. 20/46). A douta Procuradoria-Geral da República, por seu ilustre Subprocurador-Geral Mantem Costa Pinto, opina, às fls. 48/49, pela concessão da ordem. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro limar Gaivão (Relator): O douto parecer, acolhendo os fundamentos da impetração, assim se manifesta, verbis (fl. 49): 228 R.TJ. — 150 «O presente habeas corpus deve ser conhecido e concedida a ordem. É que o paciente, que na data do fato era menor de vinte e um anos (fls. 12 e 37), e que não é reincidente (fl. 37), foi condenado em um ano e dois meses de prisão, ocorrendo a prescrição no prazo de dois anos, conforme arts. 109, inciso V, 110 e 115, todos do Código Penal, prazo que fluiu entre o recebimento da denúncia, ocorrido em 28-6-73 (fl. 20), e a sentença, datada de 1°-7-75 (fl. 37), ocorrendo a chamada prescrição retroativa. Pelo exposto, somos pelo conhecimento e concessão da ordem. É o parecer.» Evidenciado, pelo que consta dos autos, inexistir entre aquelas datas qualquer causa impeditiva da prescrição, ou interruptiva relacionada a reincidência, é inegável que é de se acolher a conclusão da douta Praça- radoria-Geral da República quanto a estar extinta a punibilidade do paciente, razão pela qual defiro o habeas carpas, determinando seja o mesmo solto, se por al não estiver preso. EXTRATO DA ATA HC 70.275 — SP — Rel.: Mia limar Gaivão. Pacte.: Gilmar de Jesus. Impte.: Janota Rocha Rossetti. Coator: Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo. Decisão: A Turma deferiu o pedido de «habeas corpus», nos ternos do voto do Relator. Unânime. Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Sydney Sanches, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e limar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Miguel Frauzino Pereira. Brasília, 22 de junho de 1993 — Ricar- do Dias Duarte, Secretário. HABEAS CORPUS N° 70331— PR (Segunda Turma) Relator O Sr. Ministro Carlos Velioso Paciente: Mário Sérgio Capelari —Impetrante: O mesmo —Coator. Tribunal de Alçada do Estado do Paraná Penal. Processual penal. Habeas empas. Questão não examinada pelo Tribunal a quo. Exame de prova. I — Inexistência de ato do Tribunal a quo, de modo a Firmar a competência do Supremo Tribunal Federal (CF, art. 102, I, 0. II — O tema alusivo à deserção da apelação criminal envolve matéria de prova, que não pode ser examinada em sede de babeas corpos. III — Indeferimento do writ quanto ao exame da deserção da apelação criminal. IV — Devolução dos autos ao Tribunal a quo para julgamento das alegadas nulidades. R.TJ —150 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráflats, por decisão Uflállált, conhecer, em parte, do «habeas corpos», quanto à deserção e, nessa parte, o indeferir. No mais, determinou a remessa dos autos ao Tribunal de Alçada do Estado do Paraná para que conheça do pedido quanto à alegação de nulidade da sentença, julgando-o como entenda de direito. Brasília, 1° de junho de 1993 — Néri da Silveira, Presidente — Carlos Velloso, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Carlos Velloso (Relator): Mário Sérgio Capelari, condenado a 13 anos de reclusão e 100 dias-multa pelo crime previsto no art. 157, ã 2°, I e 11, do Código Penal, c.c. os arts. 29 e 70 do mesmo Código, apelou da sentença para o Tribunal de Alçada do Estado do Paraná, mas o recurso foi julgado deserto, em face da fuga do réu. Interpostos embargos declaratalos, foram eles rejeitados. Foi interposto, então, com fundamento no art. 105, III, a e c, da Constituição, recurso especial para o Egrégio Superior Tribunal de Justiça, recurso a que foi negado seguimento pelo Tribunal de Alçada do Estado do Paraná, que, no entanto, recebeu o inconformisrno do recorrente como babais carpas, a ser dirigido ao Supremo Tribunal Federal, nos termos do art. 648, VI, do CPP e com base no art. 102, I, 1, da Constituição. O Ministério Público Federal, pelo parecer do ilustre Subprocurador-Geral Cláudio Lemos Ponteies, opina pelo «não-conhecimento do IIC quanto ao exame dos termos insertos no Recurso Especial transformado, com a sua conseqüente remessa ao TJ paranaense, e pelo conhecimento, com posterior indeferimento, do tema que 229 fala da deserção da apelação criminal uma vez tratar-se de matéria probatória». Sustenta o parecer que é equivocada a declinatoria foi, salvo no tocante ao exa- me da deserção decretada em grau de recurso, pois, pelo que se vê dos autos, «os ternas trazidos a essa Corte Alta não lograram o exame prévio do TA paranaense para delimitar a competência deste STF no examinar o writ. Inexistindo o ato do Tribunal que venha a ensejar o seu exame da forma do art. 102, I, 1, da CF, não é de se atribuir a esta Corte a competência para o seu respectivo exame». Entende, por isso, que seria o caso de se transformar o recurso especial interposto em babas oorpus a ser apreciado pelo próprio Tribunal de Alçada no tocante «às nulidades processuais argüidas e mencionadas por ocasião da decisão de fls. 303/4». No que concerne à deserção, tema tratado no acórdão de fls. 303/304, por envolver exame de prova, não pode ser apreciado no âmbito do babas carpim É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Carlos Valioso (Relatar): O parecer da Procuradoria-Geral da República (fls. 371/373), da lavra do ilustre Subprocurador-Geral da República Cláudio Lemos Ponteies, assim equacionou a controvérsia: «Fazendo-se um breve histórico dos acontecimentos, ternos que Mário Sérgio Capdari, denunciado e condenado a 13 anos de reclusão pelo crime do artigo 157, § 2°, I e II do CP, c.c. os arts. 29 e 70 do mesmo Estatuto Repressivo, apelou da referida sentença, cujo recurso, face à fuga do réu, restou declarado deserto pela Corte de Alçada ad quem. 2. Ao embargo de declaração interposto, entendeu o Tribunal por rejeitar também este recurso, argumentando, com razão, tratar-se de matéria que não 230 R.T.J. — 150 objetivara suprir obscuridade, ambigüidade, omissão ou contradição. Ato seqüencial, Capelarl apresenta Recurso Especial com base nas alíneas a e c do inciso IQ, do artigo 105 da CF, para o que o TA do Paraná, negando seguimento ao recurso, assim especificore o... este recurso não merece ultrapassar este juízo prévio de admissibilidade. É que pela alínea a da norma autorizadora não houve indicação de dispositivos infraconstitucionais supostamente violados pelo acórdão recorrido e, no que tange à letra c, não se demonstrou divergência jurisprudencial, conforme as exigências contidas no art. 255 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça. Todavia, as questões suscitadas na petição recurso' merecem ser levadas ao conhecimento do Pretório Excelso, ao menos através de habeas corpos. Inclusive, é o douto parecer ministerial de fl. 359 que realça a relevância das alegações do réu e recomenda o envio dos autos à instância ad quem como pedido de habeas corpus. Face ao exposto, nego seguimento ao recurso especial e recebo o inconformismo do recorrente como de habeas corpus, nos termos do art. 648, inc. VI, do Código de Processo Penal, o qual deve ser dirigido ao Colendo Supremo Tribunal Federal, de acordo com o art. 102, inciso I, letra i, da Carta da República» (fls. 365/366) Daí a tramitação da lide neste último patamar, a fim de que, como visto, examine-se os temas insertos no pedido do réu, ora paciente. Datíssima vênia do entendimento exarada pela Corte de Alçada Estadual, estamos em que a dedinatoria fori está equivocada, exceto, é claro, para o exame da deserção decretada em grau de recurso (vide fls. 303/304). É que, conforme se depreende do exame dos autos, os temas trazidos a essa Corte Alta não lograram o exame prévio do TA Paranaense para delimitar a competência deste STF no examinar o writ. Inexistindo o ato do Tribunal que venha a ensejar o seu exame na forma do art. 102, I, i, da CF, não é de se atribuir a esta Corte a competência para o seu respectivo exame. Seria, pois, ao ver do MPF, o caso de se transformar a interposição do Recurso Especial em HC para o seu próprio exame pela Corte Estadual de Alçada, na parte alusiva às nulidades processuais argüidas e mencionadas por ocasião da decisão de fls. 303/4. 8. Quanto ao tema da deserção, apesar de já ter sido tratada no acórdão de fls. 303/4, envolve esta matéria de cunho probatório e que, por isso, refoge ao âmbito do HC (vide fls. 325/331).» Correto o parecer. É que as questões que estão sendo submetidas ao exame do STF deveriam ter sido apreciadas, antes, pelo Tribunal de Alçada do Estado do Paraná, para fixar a competência desta Corte. Dessa maneira, como bem salientou o parecer do Ministério Público Federal, devem estes autos retornar àquele Tribunal, para que, como habeas corpus, as questões atinentes às alegadas nulidades sejam examinadas. Já no tocante à deserção, matéria apreciada pelo Tribunal de Alçada paranaense, não pode esta Corte apreciá-la, tendo em vista os termos em que foi posta, por envolver reexame de prova, inviável em sede de habeas corpus. Isto posto, indefiro o writ no pertinente à deserção e determino a remessa dos autos R.T.J — 150 ao Tribunal de Alçada do Paraná, para exame da alegação de nulidade feita pelo paciente. EXTRATO DA ATA HC 70.331 — PR — Rel.: Min. Carlos Venoso. Pacta.: Mano Sérgio Capelati (Advs.: Moacyr Correa Filho e outros). Coator: Tribunal de Alçada do Estado do Paraná. Decisão: Por unanimidade, a Turma conheceu, em parte, do «habeas corpos», quanto à deserção e, nessa parte, o indeferiu. No mais, determinou a remessa dos autos ao 231 Tribunal de Alçada do Estado do Paraná para que conheça do pedido quanto à alegação de nulidade da sentença, julgando-o como entender de direito. Presidência do Sr. Ministro Néri da Silvam. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Paulo Brossard, Carlos Venoso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Mantem Costa Pinto. Brasília, 1° de junho de 1993 — José Wilson Aragão, Secretário. HABEAS CORPUS N° 70.378 — (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro Francisco Rezek Paciente: Franco Tiberio — Impetrante: José Ferreira Gomez — Coator: Relator da PPE 151-7 Babam corpos. Formalização do pedido extradicional Superação do prazo da Lei n' Ausência de ilegalidade. Apresentação, após o prazo de noventa dias preconizado pelo Estatuto do Estrangeiro, do pedido formal de extradição. Circunstância que sana o vido resultante da superação do prazo. Precedentes do STF (HHCC na 57.446 e 68.684). Habeas carpas indeferido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na confonnidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, em indeferir o pedido de «habeas camas». Brasília, 23 de junho de 1993 — Paulo Brossard, Presidente— Francisco Rezek, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Francisco Rezek (Relatar): Adoto como relatório a manifestação do Subprocurador-Geral da República Cláudio Fonteles acerca da espécie: «Cuida-se de ordem de habeas corpus impetrarei por José Ferreira Gomez em favor do italiano Franco Tiberio objetivando a revogação do mandado de prisão preventiva sob a alegação de dmcumprimento do prazo de 90 dias previsto no § 2° do artigo 82 da Lei n° 6.815/80. Sem razão o impetrante. Assim está em trecho das inflamações prestadas pelo Exmo. Sr. Ministro Celso de Mello, verbis: «Em atenção ao pedido de informações consubstanciado no Ofício n° 683/R, de 25-5-93, para instruir o Habeas Carpes n° 70.378-0, do qual 232 R.TJ. — 150 V. Ex.* é o Relator, tenho a honra de esclarecer que, a requerimento do Sr. Ministro da Justiça, foi decretada, em 28 de janeiro do corrente ano, para fins extradidonais, por ato do Exmo. Sr. Ministro-Presidente do Supremo Tribunal Federal, a prisão preventiva de Franco Tiberio (doc. 1). A custódia cautelar do ora padente efetivou-se em 2-2-93, data em que foi capturado por agentes do Departamento de Policia Federal, na cidade do Rio de janeiro» (doc. 2). (V. fl. 10 — grifamos.) Como se vê, foi decretada a prisão preventiva do paciente para fins de extradição apedido do Exmo. Sr. Ministro da Justiça. A Lei n° 6.815/80, em seu artigo 82, §§ 1° e 2°, determina que, efetivada a prisão, o Estado requerente deverá formalizar o pedido de extradição em 90 dias e a prisão será mantida além desse prazo. É certo que o Governo Italiano deveria ter formulado o pedido extradicional em 2-5-93. Ocorre que o referido pedido só foi encaminhado à Suprema Corte em 12-593. Assim, mesmo formalizada a extradição tardiamente, não se configura excesso de prazo, conforme pacifica jurisprudência do Supremo Tribunal Federal charla à fl. 11. Opina, pois, o MPF pelo indeferimento do pedido.» (fls. 30/32) É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Francisco Rezek (Relator): Há, de fato, sólida e uniforme jurisprudência do Supremo no sentido de não configurar-se aí uma razão para a concessão da ordem de habeas corpos com o seu intuito liberatório. Quando o Estado estrangeiro formula ao Brasil um pedido de prisão cautelar para fins de extradição, apresentando documentação mínima, a lei não quer que o extraditando fique detido indefinidamente em nome desse gesto provisório, e diz que o Estado requerente tem prazo de noventa dias — contados da prisão — para formalizar o pedido extradicional. A custódia não será mantida além desse prazo, se o Estado nele não se manifesta. Verifico — e não me surpreende este fato — que a República Italiana endereçou às Relações Exteriores do Brasil o pedido formal em 29 de abril. Portanto, perfeitamente dentro do prazo. Se esta Casa veio a receber o pedido formal no dia 12 de maio seguinte, é por que entre a Chancelaria, o Ministério daJustiça e este ponto da Esplanada, alguns dias se consomem no trânsito de documentos... De modo que a República Italiana honrou o prazo; e como quer que seja, esse atraso por conta do trânsito do pedido formal entre as Mações Exteriores, a Justiça e o Supremo, embora freqüente, nunca é algo abusivo; chega a uma semana ou pouco mais que isso. Não há dúvida de que um pedido de habeas corpos que desse entrada no Supremo passados os noventa dias, que se contam da prisão efetiva do extraditando, se confirmado que naquela data o Estado requerente ainda não apresentou pedido formal, há de conceder-se o habeas corpos. O que não adianta muito, visto que, se no momento de examinar-se o pedido de habeas corpos o pedido formal chegou, ainda que com atraso, às mãos do governo brasileiro, a_prisão simplesmente tem continuidade. E que em nenhuma hipótese a lei justifica a assertiva de que a exaustão do prazo de noventa dias, sem que o Estado requerente o observe, seja um fundamento para liquidar-se o tema da extradição, pondo-se em liberdade definitiva o extraditando. R.TJ — 150 233 Assim, nos termos do parecer da Pro- vio Gallotti, Presidente. Presidiu o julgacuradoria-Geral e invocando a jurispru- mento o Ministro Paulo Brossard. dência da Casa, indefiro o pedido. Não Presidência do Sr. Ministro Octavio Galacho que tenha havido ilegalidade nem lotti. Presentes à Sessão os Srs. Ministros abuso de poder no gesto do Ministro Cel- Moreira Alves, Néri da Silveira, Sydney so de Mello quando manteve a prisão de Sanches, Paulo Brossard, Sepúlveda Perextraditando. tence, Carlos Venoso, Marco Aurélio, IIEXTRATO DA ATA mar Gaivão e Francisco Rezek. Ausente, o Sr. Ministro Celso de HC 70.378 — RJ —Rel.: Min. Francis- justificadamente, Mello. co Rezek. Paute.: Franco Tiberio. Impte.: Procurador-Geral daRepública, Dr. AnJosé Ferreira Goma Coator: Relator da tonio Fernando Barros e Silva de Souza, PPE 151-7 Decisão: Por votação unânime, o Tribu- Substituto. nal indeferiu o pedido de «habeas corpos». Brasília, 23 de junho de 1993 — Luiz Ausente, ocasionalmente, o Ministro Octa- Tomimatsu, Secretário. HABEAS CORPUS N° 70.467 — MS (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio Paciente e Impetrante: Luiz Mário da Silva— Coator: Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul Regime de cumprimento da pena. Progressão. Artigo 2 1; § dela! "072/90. Na dicção da ilustrada maioria do Supremo Tribunal Federal, o regime de cumprimento da pena não se coloca no âmbito da individualização desta, o que atrai a impossibilidade de assentar-se a procedência da pecha de inconstitucional era relação à regra do 1° do artigo 2° da Lei n° 8.072/90. A atuação em Órgão fracionado é conducente a homenagear-se o entendimento da maioria, ressalvando-se a convicção pessoal. A unidade do Direito não subsiste quando grassa o dissono intestino, ou seja, quando órgãos do mesmo Tribunal decidem de forma conflitante. ACÓRDÃO RELATÓRIO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em indeferir o «habeas corpos». O Sr. Ministro Marco Aurélio — Com este babam corpos, visa o Impetrante e Paciente a alcançar a progressão no regime de cumprimento da pena. Em síntese, tem com inconstitucional a Lei n° 8.072/90, por contrariar o princípio da individualização da pena (fls. 2 a 4). Solicitadas informações à Corte de origem, prestou-as o Vice-Presidente — Desembargador Osvaldo Rodrigues de Melo —na forma do que se contém Bradá, 10 de agosto de 1993 — Néri da Silveira, Presidente— Marco Aurélio, Relator. 234 R.T.J. — 150 à fl. 15. Resume a tramitação da ação penal em que condenado o Paciente. A Procuradoria-Geral da República, evocando o que decidido por esta Corte nos Habena Corpus # 69.657-SP, redigido pelo Ministro Francisco Rezek, cujo acórdão foi publicado no Diário da Justiça da União, de 18 de junho de 1992, e 69.603SP, relatado pelo Ministro Paulo Brossard, com acórdão veiculado no Diário da Justiça da União de 23 de abril de 1993, ambas as decisões do Plenário, pronuncia-se pelo indeferimento da ordem. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Inicialmente, ressalvo entendimento pessoal sobre a competência para apreciação deste habeas coreus. É que na definição respectiva são consideradas as pessoas dos envolvidos quer como pacientes, quer como autoridades apontadas como Gostoras. No caso, o Paciente não goza de prerrogativa de foro, sendo que os Desembargadores do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul estão submetidos à jurisdição direta do Superior Tribunal de Justiça, que atrai a incidência do disposto na alínea c do inciso Ido artigo 105 da Carta. Todavia, até aqui, esta não é a conclusão dominante, razão pela qual coloco em plano secundário a convicção individual para homenagear a jurisprudência da Corte, deixando para discutir a matéria em sede própria, ou seja, no Plenário, o que já vem ocorrendo em face do julgamento da Medida Reclarnatória n° 341-DF. Após o voto do Ministro-Relator — Moreira Alves — externei dissensão, seguindo-se pedido de vista formulado pelo Ministro Francisco Rezek. Quanto à matéria de fundo, fiquei vencido nas vezes em que o Pleno a examinou, contando com a companhia honrosa do Ministro Sepúlveda Pertence. Transcrevo as razões pelas quais assim procedi, salientan- do que no Plenário prevaleceu a tese de que o regime de cumprimento da pena não está no âmbito da individualização assegurada constitucionalmente. Daí a ausência de inconstitucionalidade do § 1° do artigo 2° da Lei n° 8.072/90. Denego a ordem, procedendo à transcrição das razões pelas quais tenho convencimento contrário a tal enfoque, que ressalvo, nesta oportunidade: «Preceitua o parágrafo em exame que nos crimes hediondos definidos no artigo 1° da citada Lei, ou seja, nos de latrocínio, extorsão qualificada pela morte, extorsão mediante seqüestro e na forma qualificada, estupro, atentado violento ao pudor, epidemia com resultado morte, envenenamento de água potável ou de substância alimentícia ou medicinal, qualificado pela morte, genocídio, tortura, tráfico ilícito de entorpecente e drogas afins e, ainda, terrorismo, a pena será cumprida integralmente em regime fechado. No particular, contrariando-se consagrada sistemática alusiva à execução da pena, assentou-se a impertinência das regras gerais do Código Penal e da Lei de Execuções Penais, distinguindo-se entre cidadãos não a partir das condições sóciopsicológicas que lhes são próprias, mas de episódio criminoso no qual, por isto ou por aquilo, acabaram por se envolver. Em atividade legislativa cuja formalização não exigiu mais do que uma linha, teve-se o condenado a um dos citados crimes como Sr. de periculosidade ímpar, a merecer, ele, o afastamento da humanização da pena que o regime de progresso viabiliza, e a sociedade, o retorno abrupto daquele que segregara, á então com as cicatrizes inerentes ao abandono de suas características pessoais e à vida continuada em ambiente criado para atender a situação das mais anormais e que, por isso mes- R.TJ — 150 mo, não oferece quadro harmônico com a almejada =socialização. Sr. Presidente, tenho o regime de cumprimento da pena como algo, que, no campo da execução, racionaliza-a, evitando a famigerada idéia do Mal pelo mal causado' e que sabidamente é contrária aos objetivos do próprio contrato social. A progressividade do regime está umbilicalmente ligada à própria pena, no que acenando ao condenado comdias melhores, incentiva-o à correção de rumo e, portanto, a empreender um comportamento penitenciário voltado à ordem, ao mérito e a uma futura inserção no meio social. O que se pode esperar de alguém que, antecipadamente, sabe da irrelevância dos próprios atos e reações durante o período no qual ficará longe do meio social e familiar e da vida normal que tem direito um ser humano; que ingressa em uma penitenciária com a tarja da despersonalização? Sob este enfoque, digo que a principal razão de ser da progressividade no cumprimento da pena não é em si a minimização desta, ou o beneficio indevido, porque contrário ao que inicialmente sentenciado, daquele que acabou perdendo o bem maior que é a liberdade. Está, isto sim, no interesse da preservação do ambiente social, da sociedade, que, dia-menos-dia receberá de volta aquele que inobservou a norma penal e, com isto, deu margem à movimentação do aparelho punitivo do Estado. A ela não interessa o retorno de um cidadão, que enclausurou, embrutecido, muito embora o tenha mandado para detrás das grades com o fito, dentre outros, de recuperá-lo, objetivando uma vida comum em seu próprio meio, o que o tempo vem demoastrando, a mais não poder, ser uma quase utopia. Por sinal, a Lei n" 8.072/90 ganha, no particular, contornos contraditórios. A um só tempo dispõe sobre o cumprimento da pena no 235 regime fechado, afastando a progressividade, e viabiliza o livramento condicional, ou seja, o retorno do condenado à vida gregária antes mesmo do integral cumprimento da pena e sem que tenha progredido no regime. É que, pelo artigo 5° da Lei 8.072/90, foi introduzido no artigo 83 do Código Penal preceito assegurando aos condenados por crimes hediondos, pela prática de tortura ou terrorismo e pelo tráfico ilícito de entorpecentes, a possibilidade de alcançarem a liberdade condicional, desde que não sejam reincidentes em crimes de tal natureza — inciso V. Pois bem, a Lei em comento impede a evolução no cumprimento da pena e prevê, em flagrante descompasso, beneficio maior, que é o livramento condicional. Descabe a passagem do regime fechado para o semiaberto, continuando o incurso nas sanções legais a cumprir a pena no mesmo regime. No entanto, assiste-lhe o direito de ver examinada a possibilidade de voltar à sociedade, tão logo transcorrido quantitativo superior a dois terços da pena. Conforme salientado na melhor doutrina, a Lei re 8.072190 contém preceitos que fazem pressupor não a observância de uma coerente política criminal, mas que foi editada sob o clima da emoção, como se no aumento da pena e no rigor do regime estivessem os únicos meios de afastar-se o elevado índice de criminalidade. Por ela, os enquadráveis nos tipos aludidos são merecedores de tratamento diferenciado daquele disciplinado no Código Penal e na Lei de Execuções Penais, ficando sujeitos não às regras relativas aos cidadãos em geral, mas a especiais, despeitando a que, fulminando o regime de progressão da pena, amesquinha a garantia constitucional da individualização. 236 R.T.J. — 150 Diz-se que a pena é individnslizatia porque o Estado-Juiz, ao fixá-la, está compelido, por norma cogente, a observar as circunstâncias judiciais, ou seja, os fatos objetivos e subjetivos que se fizeram presentes à época do procedimento criminalmente condenável. Ela o é não em relação ao crime considerado abstratamente, ou seja,ao tipo definido em lei, mas, por força das circunstâncias reinantes à época da prática. Daí cogitar o artigo 59 do Código Penal que o juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, não só as penas aplicáveis dentre as cominadas (inciso I), como também o quantitativo (inciso II), o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade — e, portanto, provisório, já que passível de modificação até mesmo para adotar-se regime mais rigoroso (inciso III) — e a substituição da pena privativa da liberdade aplicada, por outra espécie de pena, se cabível. Dizer-se que o regime de progressão no cumprimento da pena não está compreendido no grande todo que é a individualização preconizada e garantida constitucionalmente é olvidar o instituto, relegando a plano secundário a justificativa socialmente aceitável que o recomendou ao legislador de 1984. É fechar os olhos ao preceito que o junge a condições pessoais do próprio réu, dentre as quais (=surgem o grau de culpabilidade, os antecedentes, a conduta social, a personalidade, alfun, os próprios fatores subjetivos que desaguaram na prática delituosa. Em duas passagens, o Código Penal vincula a fixação do regime às circunstâncias judiciais previstas no artigo 59, fazendo-o no § 30 do artigo 33 e no inciso III do próprio artigo 59. Todavia, ao que tudo indica, receouse, quando da edição da Lei n° 8.072/90, que poderia faltar aos integrantes do aparelho judiciário, aos juizes, aos tribunais, o zelo indispensável à definição do regime e sua progressividade e, aí, alijou-se do crivo mais abalizado que pode haver tal procedimento. Assentar-se, a esta altura, que a definição do regime e modificações posteriores não estão compreendidas na individualização da pena é passo demasiadamente largo, implicando restringir garantia constitucional em detrimento de todo um sistema e, o que é pior, a transgressão a princípios tão caros em um Estado Democrático como são os da igualdade de todos perante a lei, o da dignidade dapessoa humana e o da atuação do Estado sempre voltada ao bem comum. A permanência do condenado em regime fechado durante todo o cumprimento da pena não interessa a quem quer que seja, muito menos à sociedade que um dia, mediante o livramento condicional ou, o mais provável, o esgotamento dos anos de clausura, terá necessariamente que recebe-lo de volta, não para que este torne a delinqüir, mas para atuar como um partícipe do contrato social, observados os valores mais elevados que o respaldam. Por último, há de se considerar que a própria Constituição Federal contempla as restrições a serem impostas àqueles que se mostrem incursos em dispositivos da Lei n° 8.072/90 e dentre elas não é dado encontrar a relativa à progressividade do regime de cumprimento da pena. O inciso XLIII do rol das garantias constitucionais — artigo 5' — afasta, tão-somente, a fiança, a graça e a anistia para, em inciso posterior (XLVI), assegurar de forma abrangente, sem excepcionar esta ou aquela prática delituosa, a individualização da pena. Como, en- R.T.J —150 tão, entender que o legislador ordinário o possa fazer? Seria a mesma coisa que estender aos chamados crimes hediondos e assim enquadrados pela citada Lei, a imprescritibilidade que o legislador constitucional somente colou às ações relativas a atos de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático (inciso XLIV). Indaga-se: 6 possível ao legislador comum fazê-lo? A resposta somente pode ser negativa, a menos que se coloque em plano secundário a circunstância de que a previsão constitucional está comida no elenco das garantias constitucionais, conduzindo, por isso mesmo, à ilação no sentido de que, a contrario sensu, as demais ações ficam sujeitas à regra geral da prescrição. O mesmo raciocínio tem pertinência no que concerne à extensão, pela Lei em comento, do dispositivo atinente à demência ao indulto, quando a Carta, em norma de exceção, apenas rechaçou a anistia e a graça — inciso XLIII do artigo 5°. Destarte, tenho como inconstitucional o preceito do â 1° do artigo 2° da Lei n° 8.072/90, no que dispõe que a pena imposta pela prática de qualquer dos 237 crimes nela mencionados será cumprida, integralmente, no regime fechado. Com isto, concedo parcialmente a cedem, não para ensejar ao Paciente qualquer dos regimes mais favoráveis, mas para reconhecer-lhe, porque cidadão e acima de tudo pessoa humana, os benefícios do instituto geral que é o da progressão do regime de cumprimento da pena, providenciando o Estado os exames cabíveis. É o meu voto. EXTRATO DA ATA HC 70A67 — MS — Rel.: Ivfin. Marco Aurélio. Parle. e Impte.: Luiz Mário da Silva Contar: Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul. Decisão: Por unanimidade, a Turma indeferiu o «habeas corpos». Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Carlos Venoso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. Ausente, justificadammte, o Sr. /vfinisto Paulo Brossard. Subprocurador-Geral da República, o Dr. Haroldo Ferraz da Nóbrega. Brasília, 10 de agosto de 1993 — José Wilson Aragão, Secretário. HARPAS CORPUS N° 70.476 —DF (Primeira Turma) Relate O Sr. Ministro Sydney Sanches Paciente: Milton Carlos Soares de Oliveira — Impetrante: Adelcy Maria Rocha Simões Conta — Coator: Superior Tribunal ffilitar Habitas corpos. Processo Penal. Nulidade. Cerceamento de defesa Tendo sido, pelo acórdão impugnado, considerada desnecessária e impertinentes prova pretendida pelo padente e não havendo este, na impetração do habeas capas, logrado demonstrar sua necessidade e perlinênda, não é de se acolher a alegação de nulidade, por cerceamento de defesa. Sobretudo quando a condenação se apoiou em numerosos 238 R.TJ. — 150 elementos de convicção, que não se haveriam de infirmar com a prova visada. Indemonstrado prejuízo para a defesa e não se caracterizando hipótese de constrangimento ilegal, é de se denegar a ordem impetrada. Habeas carpas indeferido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos,em indeferir o pedido de «habeas corpos», nos termos do voto do Relator. Brasília, 28 de setembro de 1993 — Moreira Alves, Presidente — Sydney Sanches, Relatar. RELATÓRIO O Sr. Ministro Sydney Sanches (Relatar): O ilustre Subprocurador-Geral da República, Dr. Mudem Costa Pinto, no parecer de fls. 199/204, resumiu a hipótese e, em seguida, opinou, nos termos seguintes: «Ementa: Habeas carpas. Alegação de nulidade. Sem prova de efetivo prejuízo inviável é a pretensão de anular o procedimento penal. Trata-se de habeas carpas impetrado pela advogada Adelcy Maria Rocha Simões, Corrêa, Defensora Pública da Justiça Militar Federal, em beneficio de Milton Carlos Soares de Oliveira, alegando que o mesmo foi condenado pelo Conselho Especial de Justiça para a Marinha, em três meses e quinze dias de prisão, como incurso nas penas do art. 157 do Código Penal Militar, decisão integralmente confirmada pelo egrégio Superior Tribunal Militar, buscando-se a nulidade do processo, a partir do indeferimento da diligência requerida na petição vista em cópia à fl. 8 da presente impetração, ao fundamento de que o indeferimento da diligência requerida feriu o princípio constitucional do direito de ampla defesa. 0 presente habeas carpas deve ser conhecido mas, no mérito, denegado a ordem. Com efeito, a defesa, na petição vista em cópia às fls. 8, requereu a expedição de ofício à UNISME, para que esta enviasse ao Juízo «histórico médico, diagnóstico apresentado, e tudo o que constar na referida unidade de terapia com respeito ao CF Mareio de Carvalho Continha (vítima), no período compreendido entre o início de 1984, até 1986; tratamentos sob o acompanhamento dos Drs. Carneiro e Nascimento, conforme noticiam os autos». A diligência, como se vê do despacho lançado na própria petição, foi deferido em parte. Não se conforma a impetrante com o deferimento parcial de seu pedido, sustentando assim que houve cerceamento de defesa, tendente a levar à anulação do procedimento. A pretensão da impetrante não pode ser atendida, seja porque a diligênda requerida e negada em parte não tem relação direta como fato ilícito apurado, consistente no crime de violência contra superior (art. 157 do CPM), seja porque não se demonstrou, de forma objetiva, como competia à impetrante, a ocorrência de efetivo prejuízo para a defesa, incidindo na hipótese a regra geral segundo a qual não se proclama nulidade sem prova de prejuízo concreto. Ademais, as informações prestadas pelo Juiz Auditor ao egrégio Supe- R.TJ — 150 rior Tribunal Militar, quando do julgamano da correição parcial Sentada pela defesa do paciente após o indeferimento da diligência em evidência, deixam claro que tudo que interessava ao processo, referente à vítima e co-réu Márcio de Carvalho Coutinho, no que respeita ao histórico médico do mesmo, na referida Unidade Integrada de Saúde Mental, já integravam os autos, o que vem reforçar a tese da ausência de prejuízo, sendo útil transcrever parte das referidas informações, como consta dos autos da citada correição parcial, verbis: «Tão logo o APF deu entrada neste juizo demos vista ao MPM e ciência à Defensoria de Oficio, conforme se depreende de fl. 40 (xerox anexa). No mesmo dia da conclusão proferimos duas decisões (cópias anexas), inclusive colocando em liberdade o ora requerente, apesar da gravidade da conduta que lhe era atribuída. A exordial acusatória foi recebida por despacho datada de 13-2-92 (cópia anexa) e no prazo legal (fl. 267). Os acusados foram interrogados no mesmo dia 11-3-92 (fls. 306/7, 308/9, 31W11, 312 e 313/v.), ocasião em que determinamos a vinda aos autos da ficha médica dos acusados, conforme ata de fl. 314 (xerox anexa), por terem os acusados deixado evidenciado que vinham passando por problemas emocionais. Os acusados arrolaram, no prazo legal, suas testemunhas (em 23-31992), sendo que a defesa do requerente, CB Milton, a destempo, fora do prazo previsto no artigo 417, § 2°, do CPPM, arrolou mais de uma testemunha, conforme petição de fl. 300 (xerox anexa), que deferimos. A Unidade Integrada de Saúde Mental (UISM), atendendo requisi- 239 ção deste Juiz, enviou, através de Ofí- cio n° 196, os documentos confidenciais dos acusados, incluindo-se uma Informação Médica e um Parecer que, juntamente com as Fichas de Atendimento, serviram de suporte ao laudo médico de fl. 345, que se reporta a todos os atendin2entos do Oficial acusado, desde 1986 (documentos anexos). Dando-se vista as partes para diligências (em 8-4-92), nos termos e prazos estabelecidos no artigo 427 do CPPM, a Defesa do CB Milton em requerimento de fl. 361, dando uma visão distorcida do interrogatório do outro acusado, afirma que o mesmo esteve em tratamento na UISM 'no período compreendido entre o infido de 1984 até 1986', quando na citada peça refere-se a tratamento de três meses e devido a problema pessoal e familiar. Na própria petição indeferimos, fundamentadamente, a diligência. A Defesa do CB Milton pede reconsideração, através da petição de fl. 363, que mereceu o despacho de fl. 364, que preferiu omitir em suas peças xerocadas que, entretanto, anexamos à presente. À fl. 365 determinamos que viessem aos autos o que mais existisse na UISM, apesar de, a priori sabermos que nada mais existia, porquanto na requisição que fizéramos à fl. 320, no início da instrução, englobava todo o histórico médico dos mesmos. À fl. 366, encontram-se informe do referido nosocômio, ou seja estava cumprida a diligência da Defesa. A Defesa do CB Milton, em petição que poderá ser apreciada pelo E. SIM insiste na absurda diligência que mereceu o nosso indeferimento. 240 R.TJ. — 150 À fl. 368, a Defesa do CB Dalton requer reconsideração do despacho anterior e pede nova diligência, agora fora do prazo legal, cujo despacho encontra-se na própria petição, e devidamente fundamentado. Srs. Ministros, Em momento algum praticamos qualquer ato que mereça ser corrigido, por erro ou omissão inescusáveis, que seja abusivo ou tumultuário. Ao contrário, temos evitado diligências inúteis e zmtiéticas. A prova no processo penal é dirigida ao Juiz, para que o mesmo forme seu convencimento, e cumpre às partes apresentarem os objetivos de suas diligências. A Defesa do 0 Milton, além de se equivocar na leitura do texto do interrogatório do outro acusado, também se enganou na fundamentação de sua insistente diligência, ao dizer no item 11 da Correição: «Por outro lado, os próprios assentamentos militares do co-réu CF Márcio, às fls.243 e244, registram LESM obtida no 2° sem/84, no período compreendido entre 2610-84 a 25-4-85, corroborando aos já mencionados documentos de fls. 338 e 302, em amparo, portanto, à pretensão da defesa, o que torna mais gravoso, data varia o r. despacho impugnado, considerandose que, o direito processual constitucional, consubstanciado no contraditório e na ampla defesa, tem sido consagrado tanto doutrinária como jurisprudencialmente.» A licença constante do documento de fls. 243/244, citada pela defesa, refere-se à licença especial denominada de licença-prêmio e referente ao 1° decênio, nada tendo a ver com licença para tratamento médico. Finalmente, e em especial, entendemos que os documentos trazidos aos autos, principalmente o laudo médico de fl. 345, que a defesa omitiu entre as peças que entendeu indispensáveis a levar ao conhecimento de VV. Exas., que juntamos àpresente, reportando-se à toda a vida pristina do co-réu CF Márcio, já fornece elementos suficientes ao exame da matéria Os fatos passados na vida privada do co-réu CF Manto em 1984 não merecem qualquer registro nos seus assentamentos e, caso viessem aos autos, em nada alterariam o conteúdo do Laudo de fl. 345, e só teria o condão de avançar em intimidades familiares que só poderiam vir à colação por determinação do Juiz ou por iniciativa do próprio paciente, caso contrário, atropelar-se-ia a ética médica Aliás, a Defesa do mencionado acusado, em petição trazida aos autos, apresenta seu repúdio pela Defesa do CB Milton (xerox anexa).» (fls. 145/147). Está assim demonstrada, ademais, através das informações acima transcritas, a impertinência da diligência requerida pela defesa do paciente. Pelo exposto, somos pelo conhecimento e denegação da ordem. É O pantera. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Sydney Sanches (Rela- tor): 1.0 babam corpos é impetrado contra o v. acórdão do E Superior Tribunal Militar, que, mantendo indeferimento de diligência requerida pela impetrante, em favor do paciente (fl. 8), indeferiu a correição parcial reproduzida às fls. 13/19. 2. É este o teor desse acórdão (fls. 2129): R.TJ —150 «Superior Tribunal Militar — Correição Parcial n° 1.404-O/RJ Correição parcial. Art. 498 do CPPM. Incensurável a decisão recorrida que indeferiu reiteradas diligências divorciarias da matéria tratada na ação penal. Indeferimento da Correição. Decisão unânime. Relator: Ministro Alte Esq. José do Cabo Teixeira de Carvalho. 12,4arente: Milton Carlos Soares de Oliveira, CB. Mar. Recorrida: Os despachos do Exmo. Sr. Juiz-Auditor da P Auditoria de Marinha da 1° CJM, de 28-4 e 30-4-92, proferidos nos autos do Processo n° 1/92-9, com pedido de liminar no sentido de suspenda o citado processo até o julgamento da presente correição. Advogada: Dra. Adelcy Maria Rocha Simões Corrêa Vistos, relatados, etc. A defesa do CB Mar. Milton Carlos Soares de Oliveira, com fundamento no art. 498 do CPPM, requer Correição de Decisões do Exmo. Dr: Juiz-Auditor da la Auditoria de Marinha da 1* proferidas nos autos do Processo n° 1/92-9, aduzindo em síntese, o seguinte: Através de denúncia foi instaurado o Processo n° 1/92-9 contra o CF Márcio de Carvalho Coutinho e o CB-EP Milton Carlos Soares de Oliveira, aos quais foram imputadas as condutas antijurídicas ínsitas nos arts. 209 para o primeiro e nos arts. 157 e 209, todos do CPM, para o segundo denunciado. Os fatos narrados na denúncia ocorreram an 29-11-91 e 2-12-91. Com o prosseguimento normal do frito, após a oitiva das testemunhas do MPM e da defesa «e vindo aos autos por determinação do Colendo Conselho Especial de Justiça, documentos encaminhados pela UISM relacionados aos dois co-réus», sendo o relatório de aten- 241 dimento médico do CF Márcio relativo a atendimentos médicos realizados em 1986, «abriu-se vistas às partes para os fins do artigo 427 do CPPM». Com base no relatório de atendimento médico do CF Márcio e em seu interrogatório onde informou que leve problemas em 1984, de ordem pessoal familiar, o que levou o interrogando a um tratamento de três meses na UISM', a ilustre Advogada-de-Ofício requereu diligências 'no sentido de ser encaminhado ao juízo, conforme referência feita no interrogatório (fl. 302, in line) e através do documento de fl. 338, histórico médico, diagnóstico apresentado, e tudo o que constar na referida Unidade de Terapia com respeito ao CF Márcio de Carvalho Coutinho, no período compreendido entre o início de 1984 até 1986...' Requereu, igualmente, a Defesa, expedição de ofício à Casa do Marinheiro, no sentido de ser enviado ao juízo cópia do detalhe de serviço do dia 29-11-91. A primeira diligência foi indeferida pelo douto Juiz-Auditor nos seguintes termos: «Defiro em parte eis que a diligência se refere a tratamento que iniciou-se em 1984 e continuou até 1986, quando o interrogando refere-se a tratamento de três meses e devido a problemas pessoal e familiar que nada têm a ver como fato, objeto do presente. Os documentos de fls. 336/345, reportam-se a tratamento do acusado desde 1986 e são por demais minudentes.» (fl. 19). Inconformada com o referido Despacho, a Defesa solicitou reconsideração, 'no que foi atendida pelo r. Juízo, que determinou ofício para seu cumprimento, quando, então, veio aos autos o documento da UISM de fl. 366 informando que lá não existiam registros do período solicitado'. 242 R.T.J. — 150 Argumentando que referida informação entra em contradição com os documento s de fl. 338 (relatório de atendimento médico do CF Márcio e fl. 302 (interrogatório do referido Oficial), a ilustre defensora apresentou o requerimento de fl. 21 onde assevera: '... por não haver sido atendido ainda o seu pedido, com os esclarecimentos que entende imprescindíveis ao desempenho de seu munus é o presente para requerer a V. Ex.' se digne em determinar a expedição de oficio ao CAIO Carlos Barbosa Carneiro (DSM), no sentido de ser infonnado se o CF Márcio de Carvalho Coutinho esteve sob tratamento com o mesmo, no período requerido, qual o diagnóstico apresentado àquela época, e quais outros esclarecimentos sobre a evolução do tratamento que possa prestar'. (fl. 21) Tal requerimento foi indeferido pelo Exmo. Dr. Juiz-Auditor nos seguintes termos: 'Indefiro o requerido eis que se não há registros da UISM o atendimento foi de natureza particular. Registramos a insistência no equívoco da requerente eis que o CF Márcio não ficou em tratamento de 1984 a 1986 e sim por três meses devido a problemas de ordem pessoal e familiar que nada tem a ver com o deslinde da causa.' (fl. 21) Novamente inconformada com o indeferimento de sua postulação, volta a Defesa a solicitar reconsideração (fl. 22) tendo o douto Magistrado mantido integralmente os Despachos impugnados. Repudiando tal decisão, argumenta a Advogada-de-Oficio que «cerceou-se à defesa o direito ao esclarecimento de matéria umbilicahnente ligada ao desate da quaestio, em que pese, lhe haver sido indeferida diligência, porque considerada intempestiva, quando, data vertia, não encerrada a prova da mesma». E prossegue argumentando: «Por outro lado, os próprios assentamentos militares do co-réu CF Márcio, às fls. 243 e 244, registram LESM obtida no 2° sem/84, no período compreendido entre 26-10-84 a 25-4-85, corroborando aos já mencionados documentos de fls. 338 e 302, em amparo, portanto, à pretensão da defesa, o que torna mais gravoso, data veria, o r. despacho impugnado, considerando-se que, o direito processual constitucional, consubstanciado no contraditório e na ampla defesa, tem sido consagrado tanto doutrinária como jurisprudencialmente.» Em seguida, ilustra sua petição com farta jurisprudência relacionada ao caso em apreço. Finalizado, 'requer-se' a essa egrégia corte castrense, seja corrigido o erro com o deferimento do solicitado pela defesa (fl. 361, inciso I, de conformidade com fl. 368) pois só assim, feita a correição solicitada, poderemos caminhar para a mais completa segurança da distribuição da justiça. Requer-se outrossim, por esse tribunal não o determinando o juízo a quo, a liminar suspensão do processo, até a solução da presente correição, já que, em se tratando de matéria de prova , tal medida tem sido acolhida pela iterativa jurisprudência de nossos tribunais (fls. 3/9). A ilustre defensora anexou os documentos acostados às fls. 10 usque 23. Informações prestadas pelo Exmo. Sr. Juiz Auditor, Dr. Carlos Alberto Marques Soares às fls. 24/28, com documentos anexos às fls. 29/45. Com vistas à Procuradoria-Geral da Justiça Militar, pelo parecer de fls. 50/58, o insigne Procurador, Dr. Marco Antonio Pinto Biliar opinou pelo 'indeferi- R.T.J — 150 mento da Correição, diante da ausência de qualquer de seus pressupostos'. É o relatório. Fruto de obstinação da ilustre defensora do CB Milton Carlos Soares de Oliveira, aporta a esta Corte de Justiça a presente Correição Parcial visando trazer aos autos do Processo n° 1/92-9 fatos relacionados à vida privada do co-réu CF Márcio de Carvalho Cadinho, ocorridos entre 1984 e 1986, cujas informações, inclusive, não consta de registros e 'nada tem a ver com a prova relacionada com os fatos apurados na Ação Penal Militar em curso na P Auditoria de Marinha'. (Parecer, fl. 9) A informação precisa do FJC1310. Dr. Juiz Auditor (fls. 24/28) esclarece os fatos como a seguir verbis: «Tão logo o APF deu entrada neste juízo, demos vista ao MPM e ciência à Defensoria de Ofício, conforme se depreende da fl. 40 (xerox anexa). No mesmo dia da conclusão proferimos duas decisões (cópias anexas), inclusive colocando em liberdade o ora requerente, apesar da gravidade da conduta que lhe era atribuída. A excedia' acusatóriafoi recebida por despacho datado de 13-2-92 (cópia anexa) e no prazo legal (fl. 267). Os acusados foram interrogados no mesmo dia 11-3-92 (fls. 301/2v e 303/4v) sendo que as testemunhas arroladas pelo MPM depuseram no dia 18-3-92 (fls. 306/7, 308/9, 310/11, 312 e 313/v), ocasião em que determinamos a vinda aos autos da ficha médica dos acusados, conforme ata de fl. 314 (xerox anexa), por terem os acusados deixado evidenciado que vinham passando por problemas emocionais. Os acusados arrolaram, no prazo legal, suas testemunhas (23-3-92), sai- 243 do que a Defesa do requerente, CB Mito; a destempo, fora do prazo previsto no artigo 417, § 2° do CPPM, anulou mais uma testemunha, conforme petição de fL 330 (xerox anexa), que deferimos. A Unidade Integrada de Saúde Mental (UISM), atendendo requisição deste Juiz, enviou, através do Ofício n° 1%, os documentos confidenciais dos acusados, incluindo-se unia Informação Médica e um Parecer que, juntamente com as Fichas de Atendimento, servirem de suporte ao laudo médico de fl. 345, que se reporta a todos os atendimentos do Oficial acusado, desde 1986 (documentos anexos). Dando-se vista as partes para diligências (em 8-4-92), nos termos e prazos estabelecidos no artigo 427 do CPPM, a Defesa do CB Milton em requerimento de fl. 361, dando uma visão distorcida do interrogatório do outro acusado, afirma que o mesmo esteve em tratamento na UISM `no período compreendido entre o inido de 1984 até 1986', quando na citada peça refere-se a tratamento de três meses e devido a problema pessoal e familiar. Na própria petição indeferimos, fundamentadamente, a diligência. A Defesa do CB Milton pede reconsideração, através da Petição de fl. 363, que mereceu o despacho de fl. 364, que preferiu omitir em suas peças xerocadas que, entretanto, anexamos à presente. À fl. 365 determinamos que viessem aos autos o que mais existisse na UISM, apesar de, a priori sabermos que nada mais existia, porquanto na requisição que fizéramos à fl. 320, no início da instrução, englobava todo o histórico médico dos mesmos. R.T.J. —150 À fl. 366, encontra-se informe do referido nosocômio, ou seja estava cumprida a diligência da Defesa. A Defesa do CB Milton, em petição que poderá ser apreciada pelo E. STM, insiste na absurda diligência que mereceu o nosso indeferimento. À fl. 368, a Defesa do CB Milton requer reconsideração do despacho anterior e pede nova diligência, agora fora do prazo legal, cujo despacho encontra-se na própria petição, e devidamente fundamentado. Srs. Ministros, Em momento algum praticamos qualquer ato que mereça ser corrigido, por erro ou omissão inescusáveis, que seja abusivo ou tumultuário. Ao contrário, temos evitado diligências inúteis e aidéticas. A prova no processo penal é dirigida ao Juiz para que o mesmo forme seu convencimento e cumpre às partes apresentarem os objetivos de suas diligências. A Defesa do CB Milton, além de se equivocar na leitura do texto do interrogatório do outro acusado, também se enganou, na fundamentação de sua insistente diligência, ao dizer no item 11 da Correição: «Por outro lado, os próprios assentamentos militares do co-réu CF Márcio, às fls. 243 e 244, registraram LESM obtida no 2° semJ84, no período compreendido entre 26-10-84 a 25-4-85, corroborando aos já mencionados documentos de fls. 338 e 302, em amparo, portanto, à pretensão da defesa, o que torna mais gravoso, data venta, o r. despacho impugnado, considerando-se que, o direito processual constituciaal, consubstanciado no contraditório e na ampla defesa, tem sido consagrado tanto doutrinária como jurisprudencialmente.» A licença constante do documento de fls. 243/244, citada pela defesa, referese à licença especial denominada de licença-prêmio e referente ao 1° decênio, nada tendo a ver com licença para tratamento médico. Finalmente, e em especial, entendemos que os documentos trazidos aos autos, principalmente o laudo médico de fl. 345, que a defesa omitiu entre as peças que entendeu indispensáveis a levar ao conhecimento de VV. Exas., que juntamos à presente, reportando-se à toda a vida prístina do co-réu CF Márcio, já fornece elementos suficientes ao exame da matéria. Os fatos passados na vida privada do co-réu CF Márcio em 1984 não mereceram qualquer registro nos seus assentamentos e, caso viessem aos autos, em nada alterariam o conteúdo do laudo de fl. 345, e s6 teria o condão de avançar em intimidades familiares que só poderiam vir à colação por determinação do Juiz ou por iniciativa do próprio paciente, caso contrário, atropelar-se-ia a ética médica. Aliás, a Defesa do mencionado acusado, em petição trazida aos autos, apresenta seu repúdio ao requerido pela Defesa do CB Milton (xerox anexa). O douto parecerista, Dr. Marco Antonio Pinto Binar assim comenta as decisões hostil] Tsclag: «Data venta, o juízo não cometeu qualquer erro ou omissão inescusáveis ou ato abusivo ou tumultuário que deva ser corrigido. Não há qualquer cerceamento de defesa a ser obviado. Sob nossa ótica, trata-se de prova despropositada, sem qualquer referência ou nexo com a matéria debatida na ação penal.» R.T.J —150 A corroborar tudo o que acima foi discutido, colacionamos jurisprudência desta Egrégia Corte Castrense consubstanciada na Correção Parcial if 1348-5, decisão unânime de 8-9-88. Recurso Criminal n° 5.817-1, decisão unânime de 8-6-88 e o Recurso Criminal n's 5.973-9, decisão de 7-3-91, Relator o Eminente Ministro Jorge Frederico Machado de Sant'Anna, cuja ementa transcrevemos verbis: «Recurso Criminal. I — Conhecidas, ex vi do art. 516 do CPPM as decisões suscetíveis de impugnação, através dos recursos em sentido estrito, resulta inconteste, que a hipótese, ali, não encontra encarte, por justo lhe faltar os pressupostos objetivos de admissibilidade. 11 — O ~ame da quaestlo, que alardeia o cerceamento de defesa, como notório, somente encontra cabimento, na via recamai da Correição Parcial, segundo a inteligência do art. 498, alínea a do CPPM. IlI — Escorreito e incensurável o decimam recorrido, que houve por indeferir a repetição de diligências, posto que, além de desnecessárias, se mostram inexeqüíveis, no lugar e no tempo. IV — A unanimidade, conhecido o pedido como Correição Parcial, ex vi do art. 498, alínea a do CPPM, para indeferila, mantendo-se o r. despacho hostilizado.» Com relação ao pedido de liminar, para melhor apreciação dos autos, antes do julgamento do Processo em rInstância, este Relator deferiu o pedido da Defesa através do Despacho acostado à fl. 60. Isto posto, Acordam os Ministros do Superior Tribunal Militar, por unanimidade, em indeferir a Correição Parcial para manter os Despachos impugnados. Brasília, DF, em 28 de maio de 1992. 245 Ass.: Dr. Antonio Carlos de No1Vfmistro Vice-Presidente, no exercício da Presidência Ass.: AlteEs q. José do Cabo Teixeira de Carvalho — Ministro Relator. "Fui presente' Ass.: Milton Menezes da Costa Filho, Procurador-Geral da Justiça Militar> Como se vê, tanto o Juiz Auditor quanto o E Superior Tribunal Militar demonstraram a desnecessidade e a impertinência da prova pretendida pela defesa do réu, ora paciente. E na impetração de fls. 2/6 não conseguiu a impetrante demonstrar a necessidade e a pertinência de tal prova. Menos ainda que sua falta causou prejuízo à defesa. De resto, a sentença de primeiro grau, e os acórdãos que julgaram a apelação e os embargos infringentes interpostos em favor do ora paciente, examinaram, aprofundadamente, os elementos de prova reunidos nos autos e concluíram por sua condenação, quanto ao delito de violência contra superior (art. 157 do Código Penal Militar) (fls. 113/132, 151/172 e 17W196). Destaco do acórdão, proferido nos embargos infringentes, os tópicos destinados à fundamentação e à conclusão (fls. 18W196): «O ora embargante foi denunciado por dois fatos delituosos. O primeiro, ocorrido em 29 de novembro de 1991 e o segundo, em 2 de dezembro do mesmo ano. O embargante, juntamente, com o coréu foi absolvido quanto aos fatos ocorridos na segunda data, tendo a sentença a quo transitado em julgado nessa parte, em razão do conformismo do Ministério Público Militar. O ora embargante foi condenado, pelo Conselho Especial de Justiça, em razão gania 246 R.TJ. — 150 dos fatos ocorridos em 29 de novembro de 1991, à pena de 3 (Cês) meses e 15 (quinze) dias de prisão, como incurso no art. 157 do Código Penal Militar, de o parágrafo 3°, do mesmo artigo. Este Tribunal, por maioria de votos, negou provimento ao apelo então interposto, o que possibilitou a oposição dos presentes Embargos. Os Ministros Antonio Carlos de Nogueira, Revisor, Chentban Rosa Filho e AMO Fagundes, deram provimento ao apelo da defesa, para absolver o ora embargante, com base no artigo 439, letra B, do Código de Processo Penal Militar. A divergência no julgamento anterior está em que a douta minoria entendeu que a ação praticada pelo ora embargente é atípica. Tal divergência obriga que se reexamine a prova dos autos. Foram ouvidas, em juizo, doze testemunhas, sendo arroladas cinco na denúncia, quatro pela defesa do Oficial e três pela defesa do ora embargante. Dessas testemunhas, apenas, uma — o SO Manoel Senécio Mão, fls. 310 e verso,assistiu aos fatos ocorridos, a 29 de novembro de 1991, e pelos quais foi o CD Mar. Milton Carlos condenado, enquanto que a testemunha de defesa, Wilder Barroso, 2° SGT — ER que embora não tenha assistido aos fatos ocorridos a 29 de novembro de 1991, sobre os mesmos conversou com o embargante e assim afirmou, à fl. 325: «que, com relação ao fato ocorrido no dia 29, o CB Milton disse ao depoente que agira daquela forma, porque estava 'de cabeça quente', tendo demonstrado arrependimento pelo fato;» A testemunha SO Brlão, testemunha presencial, às fl. 310 e verso, relatou: «que no dia 29, o depoente se dirigiu à sala do Vice-Diretor, levando uns documentos que precisariam ser assinados; que após a assinatura dos mesmos, o Vice-Diretor chamou o depoente para que o acompanhasse na inspeção que iria ser feita na incumbência; que pôde verificar, acompanhando o Sr. Vice-Diretor que as quadras externas estavam sujas, e havia grama alta no local, fato que foi chamado atenção pelo vice-diretor, que imediatamente mandou que chamasse à sua presença o CB Milton que era o responsável pela manutenção do local; que o depoente se dirigiu ao CB Milton, e como o mesmo tratava da manutenção da piscina, com roupa própria, determinou que o mesmo trocasse de roupa e comparecesse à presença do Vice-Diretor; que o Vice-Diretor não estava aparentemente nervoso; que ao ser interpelado pelo Cmte. Márcio, que fez de forma normal, o CB Milton disse ao Oficial que conhecia sua incumbência, e que sabia que estava pegando, e que estava dando serviço, um por um; que o depoente não pode afirmar com precisão se o Comandante, teria dito: «Venha cá, porra!», ou «Vem cá, seu porra!»; que o CB Milton disse que não precisava ir ver a grama porque de onde ele se encontrava dava para ver a grama; que o Comandante falava normalmente com o CB Milton, não era em tom agressivo, e que ele disse: «Venha cá, que vou lhe apresentar a grama», e o CB Milton, que não precisava porque já conhecia a grama; que neste momento o Cmte. jáestava voltado para o local, em movimento, já de costas para o CB Milton; que CD Milton, indo em direção ao Comandante, quando o CB Milton empurrou o Comandante e o agrediu com um soco, o qual parece ao depoente, que teria atingido o ombro do R.T.J —150 Oficial, e voltou-se e se atracou com o CB Milton; que, melhor dizendo, entrou em choque como CB Milton; que o depoente não precisou naquele dia, ou percebeu qualquer lesão, tanto num quanto noutro acusado; que melhor esclarecendo, o CB Milton empurrou o Oficial pelas costas, o qual perdeu o equilíbrio e, impulsionado que foi à frente, ato continuo em que recebeu a agressão, soco, do CB Milton; que o Oficial, tão logo se equilibrou, virou-se de frente para o CB Milton e revidou entrando em soco e pontapés os dois, sendo imediatamente separados pelo depoente.» O ora embargante, ao ser interrogado, às fls. 303 e seguintes, declarou: «que o interrogando considera como verdadeira a imputação que lhe é feita na denúncia, com relação ao fato ocorrido no dia 29-11-91 (...); que no dia 29, como já registrado anteriormente, o interrogando estava em efetivo serviço na piscina da Casa do Marinheiro, e era o único «EP», a bordo quando, por volta das dez horas, foi chamado pelo SO Brião, para que comparecesse à presença do CF Márcio; que o mesmo estava muito exaltado e gesticulava muito, e na presença do SO, perguntou ao interrogando porque ele não tinha cuidado da grama, da quadra de vôlei, tendo o interrogando esclarecido ao Oficial que a faina era grande e que, no momento, precisava, como prioridade, liberar a piscina, que a grama da citada quadra não atrapalhava a prática do esporte, pois ficava entre as pedras; que o Oficial ainda perguntou ao interrogando se tinha visto a grama; que o interrogando respondeu ao Oficial, que estava vendo a grama; que a resposta não foi em tom de deboche, e então o Oficial, disse 247 o seguinte: «Vamos lá ver, porra!», mandando que o interrogando se deslocasse até o local da grama; que o interrogando nesse momento agrediu o Oficial com um soco, e que o mesmo estava de frente para o interrogando; que revidou e entrou em luta corporal com o ora acusado, tendo sido os dois separados pelo SO Brião, que o soco atingiu o Oficial no rosto.» Inconteste, pela prova produzida que o ora embargante, no dia 29 de novembro de 1991, após ser chamado a atenção sobre a grama existente, perto da quadra de vôlei, e, ainda, não retirada, findou por agredir seu superior, o CF Márdo Coutinho. Afirma-se, no voto vencido, sustenta-se, nas razões dos Embargos e no parecer da Douta Procuradoria-Geral da Justiça Militar, que o CF Márcio Comlinho, se despiu de sua condição de superior ao dirigir-se ao embargante, para reclamar do corte da grama, levando este último a agir como agiu. O voto vencido, as razões dos embargos e o parecer da Procuradoria-Geral da Justiça Militar entenderam que o ora embargante agiu acobertado, pelo contido no inciso II, do artigo 47 do Código Penal Militar, que dispõe: «Artigo 47: Deixam de ser elementos constitutivos do crime: 1 — (omissis) II —A qualidade de superior ou a de inferior, a de Oficial de dia, de serviço ou de quarto, ou a de sentinela, vigia ou plantão quando a ação é praticada em repulsa a agressão.» Data veria, não é isso que se colhe da prova coligida. A expressão proferida pelo co-réu, CF Márcio Coutinho, através da qual se procura ajustar a atitude do embargante ao preceituado no inciso II do artigo 47 248 R.T.J. — 150 do Código Penal Militar está a merecer apreciação. Tudo gira em torno das expressões: «Vem cá, seu porra!» ou «Venha cá, porral» Não resta a menor dúvida de que a primeira delas é ofensiva à honra da pessoa a quem é dirigida, em que pese a palavra última da expressão, de tão chula, com a 'modernidade' de nossa sociedade, infelizmente, já é ouvida corriqueiramente, proferida por adultos, de ambos os sexos, em ambiente não condizente com tal linguajar, por adolescentes e crianças e até mesmo nos programas de televisão, que invadem os lares brasileiros, nos mais diversos rincões. A expressão de tão chula, parece comezinha, encontran-se hoje no Novo Dicionário Aurélio, l a edição, 12' impressão, 1975. Entretanto, vejamos o que consta da prova O CF Márdo Condito nega tenha se dirigido ao embargante, empregando aexpressão: 'Venha cá, seu para!', para, em outra parte de seu intarogatório afirmar que ao dirigir-se ao C113 Milton Carlos ter dito: «pena, venha ver o mato.» Por sua vez, o embargante afirma que o Oficial ao dirigir-se àsua pessoa disse: «Vamos lá ver, porra»; o que vem a confirmar a negativa do co-réu CF Márdo Coudt. Por sua vez, a testemunha presencial, o SOBrião, à fi. 310, ao depor emito, afirmou não poder precisar a expressão proferida pelo Oficial co-réu, nestes autos. Não se pode dizer, em razão da prova constante dos autos, que o ora embargente tenha desferido um soco no rosco de seu superior em repulsa a agressão verbal da parte deste. Não se pode afirmar que a qualidade de superior, do co-réu, CF Márdo Couanho, elemento constitutivo do crime de violência contra superior Laja desaparecido, quando da agressão praticada pelo, ora embargante, CB Mar Milton Carlos, no dia 29 de novembro de 1991, contra Oficial Superior. Não há que modificar-se o acórdão embargado. Assim, acordam os ministros do Superior Tribunal Militar, por maioria de votos, em rejeitar os Embargos interpostos por Milton Carlos Soares de Oliveira, Cabo daMarinha, paramente: o Acórdão embargado. Superior Tribunal Militar, 22 de abril de 1993. Ass.: Ten. Brig. do Ar. Cherubim Rosa Filho, Ministro-Presidente. Ass.: Dr. Antonio Carlos de Seiras Telles, frfinistro,Relator. Ass.: Alte. Esq. José do Cabo Teixeira de Carvalho, Ministro-Revisor 'Fui presente' Ass.: Dr. Milton Menezes da Costa Filho, Procurador-Geral da Justiça Militar». Ora, não se pode inferir, em face da fundamentação do acórdão transcrito (que, aliás, não está sendo aqui impugnado), que a prova pretendida pela defesa do réu, ora paciente, considerada desnecessária e até impertinente, pudesse, por si só, elidir os elementos que foram considerados nos três julgamentos de mérito (sentença, acórdãos da apelação e dos embargos infringentes). Assim, indemonstrado real prejuízo para a defesa, é de se indeferir o habena coreus, como demonstrou, aliás, o parecer do Ministério Público federal. 9. Isto posto, indefiro o pedido. R.T.J —150 EXTRATO DA ATA HC 70.476 — DF -- Rel.: Min. Sydney Sanches. Pacto.: Milton Carlos Soares de Oliveira. Impte.: Adelcy Maria Rocha Simões Conta. Coator: Superior Tribunal Militar. Decisão: A Turma indeferiu o pedido de «habeas corpus», nos termos do voto do Relator. Unânime. 249 Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Sydney Sanches, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e limar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Artur Castilho Pereira Neto. Brasília, 28 de setembro de 1993 — Ricardo Dias Duarte, Secretário. HABEAS CORPUS N° 70.521 — SP (Segunda Turma) Relator. O Sr. Ministro Marco Aurélio Paciente e Impetrante: Carlos Alberto de Almeida — Coator: Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Intimação. Defensoria pública. Pessoalidade. Por força da norma inserta no 4 5' do artigo 5° da Lei n° 1.060, de 5 de fevereiro de 1950, com a redação dada pela Lei n° 7.871/89, a intimação do defensor público ou de quem exerça cargo equivalente há de se fazer de forma pessoal. O presto é aplicado quando constatada a atuação da Procuradoria de Assistência Judiciária da Procuradoria-Geral do Estado de São Paulo. O desatendimento à citada formalidade, porque essencial à valia dos atos, resulta na nulidade, impondo-se concessão de ordem para que se observe o dispositivo. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em deferir o «habeas corpos», nos termos do voto do Ministro Relator. Brasília, 14 de setembro de 1993 — Néri da Silveka, Presidente — Marco Aura), Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Marco Aurélio: O Impetrante e Paciente, mediante peça subscrita pelo Procurador do Estado de São Paulo, Dr. Waldir Francisco Honorto Júnior, pleiteia a concessão da ordan, afim de que seja reaberto o prazo para interposição do tear so cabível contra o acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que implicou o desacollihnento de pedido formulado em apelação. Em síntese, aponta que, em razão da Suficiência financeira que atravessa, gozou da assistência judiciária do Estado e que, assim, a intimação para a ciência do que decidido pelo egrégio Tribunal teria que ocorrer com observância ao disposto no artigo 5° da Lei n° 1.060, de 5 de fevereiro de 1950. Este habeas corpos foi impetrado inicialmente perante o Superior Tribunal de Justiça, que declinou da competência, conforme decisão de fl. 28. Distribuído inicialmente ao Ministro Sepúlveda Pertence, declarou este impedimento (fl. 32). À fl. 34, deferi liminar para suspender a eficácia de audiência admonitória. R.T.J.-150 250 Aos autos vieram as informações de fls. 45 a 48, nas quais o Vice-Presidente do Tribunal de Justiçado Estado de São Paulo, Desembargador Dagoberto Saltes Cunha Camargo, revela a tramitação da ação penal também que o acórdão prolatado pela Corte teve publicidade mediante inserção em exemplar do Diário Oficial. Reconhece-se a inexistência da intimação pessoal, contrapondo-se ao pleito as normas insculpidas no Regimento Interno daquele Tribunal. Remetidos os autos à Procuradoria-Geral da República, oficiou o proficiente Subprocurador-Geral, Dr. Édson Oliveira de Almeida, assim sintetizando tal parecer: dntimação. Defensor público. Determina o artigo 5° do § 5° da Lei n° 1.060/50 (redação dada pela Lei 7.871/89) que o defensor público seja intimado pessoalmente de todos os atos do processo em ambas as instâncias, contando-se-lhe em dobro todos os prazos. Caso em que, após julgamento de apelação pelo Tribunal de Justiça, o processo baixou à origem sem que do acórdão fosse intimado pessoalmente o defensor público. Parecer pelo deferimento da ordem para realização da correta intimação do defensor público e conseqüente reabertura do prazo de recurso.» (fls. 67 a 72) Recebi os presentes autos para estudo em 30 de agosto de 1993, liberando-os para julgamento em 4 do mês seguinte (fl. 73). É o relatório. VOTO deral. Os integrantes dos Tribunais de Justiça dos Estados estão submetidos à jurisdição direta, nos crimes comuns e de responsabilidade, do Superior Tribunal de Justiça, o que atrai a pertinência da alínea c do citado inciso, no sentido de que compete ao Superior Tribunal de Justiça processar e julgar originariamente os «habeas corpus» quando o coator ou o paciente for qualquer das pessoas mencionadas na alínea a, ou quando o coator for Ministro de Estado, ressalvada a competência da Justiça Eleitontl. A De tração, em si, não é dirigida contra o • gão, mas conta aquele que o apresenta. Todavia, até aqui, este não tem sido o entendimento da maioria, razão pela qual coloco em plano secundário a convicção pessoal, deixando para discutir o tema em sede própria, a do Plenário, o que j á vem ocorrendo mediante apreciação da medida reclamatória n° 341-1-DF. Após o voto do Relator, Ministro Moreira Alves, dissenti, pedindo vista o Ministro Francisco Rezek. Conheço da impetração. Quanto à matéria de fundo, bem a enquadrou o ilustre Subprocurador-Geral da República que oficiou neste processo, Dr. Édson Oliveira de Almeida. O § 5° do artigo 5° da Lei n° 1.060/50 é categórico ao dispor que: O Sr. Wmistro Marco Aurélio (Relator): Continuo convencido de que a definição da competência para o julgamento de habeas corpus ocorre consideradas as pessoas nele envolvidas. É incontroverso que o Paciente não goza de prerrogativa de foro. Logo, cabe perquirir a situação daqueles que integram o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Revela-a a alínea a do inciso I do artigo 105 da Constituição Fe- A redação do parágrafo decorreu da edição da Lei n° 7.871/89. É incontroverso que, no Estado de São Paulo, a Defensoria Pública tem atuação mediante Órgão da Procuradoria-Geral do Estado. Assim, incumbia a intimação pessoal. Concedo a ordem para afastar a declaração de trânsito em julgado do acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, proferido no Processo n° 353/90 e determinar que se e «Nos Estados onde a assistência judiciária seja organizada e por eles mantida, o defensor público, ou que exerça cargo equivalente, será intimado pessoalmente de todos os atos do processo, em ambas as instâncias, contando-selhes em dobro todos os prazos». R.T.J —150 proceda à intimação pessoal do Procurador que atua na defesa do ora Impetrante e Paciente. É o meu voto. EXTRATO DA ATA HC 70.521 — SP — Rel.: Min. Marco Aurélio. Pacta.: Carlos Alberto de Almeida. Impe.: O Mesmo. Coator: Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. 251 Decisão: Por unanimidade, a Turma deferiu o »habeas corpos», nos termos do voto do Ministro Relator. Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Paulo Brossard, Carlos Venoso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Haroldo Ferraz da Nóbrega. Brasília, 14 de setembro de 1993 — José Wilson Aragão, Secretário. RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 114306 —SP (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Carlos Venoso Recorrente: Ccanponel — Componentes Elétricos Ltda. —Recorrido: Estado de São Paulo Consfiluelonal. Tributário. ICM Direito de crédito pela entrada de matéria-prima intpootada com isenção do imposto. 1 — Não tendo o acórdão decidido a questão constitucional posta no recurso extraordinário, dele não se conhece. II — RE não conhecido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por decisão unânime, não conhecer do recurso extraordinário. Brasília, le de dezembro de 1992 —Néri da Silveira, Presidente — Carlos Venoso, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Carlos Valioso: Tratase de ação declaratória ajuizada por Com- pond Componentes Elétricos Ltda. contra a Fazenda do Estado de São Paulo, com o objetivo de ver reconhecido o seu direito de creditamento do ICM, incidente nas importações de matérias-primas adquiridas com isenção. A sentença de fls. 1029/1037 julgou o pedido procedente. A Décima Câmara Civil do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por unanimidade, deu provimento à remessa oficial e ao recurso da ré, julgando a autora caracedora da ação. Ententeu o aresto que «em hipóteses como a dos autos, não se cuida de simples ação declaratória, mas de ação constitutiva— condenatória, decorrente do pedido que encara, com efeito equivalente ao ação de repetição de indébito». Assim, »o êxito da demanda estava condicionado à prova do fato de que o contribuinte de direito, ou seja, a autora, suportara o encargo ou não passara para o contribuinte de 252 R.TJ. — 150 fato o ônus do tributo de cujo valor pretendeu creditar-se». Inconformada, a autora interpõe recurso extraordinário, fundado no art. 119, III, a e d da Constituição anterior, argüindo a relevância da questão federal. Sustenta a recorrente que o aresto violou o art. 23, H, da Carta Magna, bem como divergiu da jurisprudência desta Corte. Inadmitido o recurso na origem, subiram os autos por força do provimento do agravo de instrumento. A ilustre Subprocuradora-Geral da República Odflia Ferreira da Luz Oliveira, em parecer de fls. 1180/1181, opina pelo não conhecimento do recurso extraordinário. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Carlos Valioso (Relator): Destaco do parecer da Procuradoria. Geral da República, lavrado pela ilustre Subprocuradora-Geral Odflia da Luz Oliveira: II Falta pressuposto de admissibilidade do recurso: o prequestionamento da matéria constitucional. O acórdão ficou no plano (subconstitucional) das condições da ação, negando a legitimidade da recorrente para pleitear a restituição do tributo. Como não chegou ao mérito da causa, absteve-se de examinar o princípio da não-cumulatividade do ICM. III Assim sendo, opino pelo não-conhecimento do recurso extraordinário.» (fls. 1180/1181). Está correto o parecer. O acórdão recorrido decidiu a causa no plano das normas infraconstitucionais. Noutras palavras, a questão constitucional posta no recurso extraordinário não foi decidida pelo acórdão recorrido. Não conheço do recurso. EXTRATO DA ATA /(.-) Segundo o acórdão, a prova produzida demonstra que houve transferência do encargo aos adquirentes da mercadoria e, assim, tem-se verdadeira repetição de indébito, para a qual a recorrente não está legitimada. RE 114.306 — SP — Rel.: Min. Carlos Venoso. Reate.: Componel — Componentes Elétricos Ltda., sucessora de Compela —Componentes Elétricos Lida (Adv.: João Carlos Nicolella). Recdo.: Estado de São Paulo (Adva.: Yara de Campos Escudero). No recurso extraordinário, invocase ofensa ao princípio constitucional da não-cumulatividade (art. 23, inc. II, da Constituição de 1967, na redação da Emenda n° 1, de 1969), bem como matéria infraconstitucional. Indeferido o recurso, houve agravo para o Supremo Tribunal Federal, provido, mas ficando preclusa a matéria infraconstitucional, dado que a argüição de relevância não foi reiterada. Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Carlos Valioso, Marco Aurélio e Francisco Rezeis. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Paulo Brossard. Subprocuradora-Geral da República, a Dra. Odflia Ferreira da Luz Oliveira. Decisão: Por unanimidade, a Turma não conheceu do recurso extraordinário. Brasília, PI de dezembro de 1992 — José Wilson Aragão, Secretário. R.TJ — 150 253 RECURSO EXTRAORDINÁRIO ir 116.761 — AL (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves Recorrente: Instituto de Administração Financeira da Previdência e Assistência Social — IAPAS — Recorrida: Companhia Integrada de Desenvolvimento Agropecuário de Alagoas — CIDAL Contribuições para o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço. Prescrição. — Esta Corte, ao julgar, por seu Plenário, o RE 100.249, firmou o entendimento, em face da Emenda Constitucional n" 1/69, de que as contribuições para o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço não se caracterizam como créditos tributários ou contribuições equiparáveis a tributos, razão por que não se lhes aplica a prescrição qüinqüenal prevista no Código Tributário Nacional. Recurso extraordinário conhecido e provido. ACÓRDÃO qüenal prescricional, previsto no artigo 174 do CTN. Vistos, relatados e discutidos estes au11 — Apelação desprovida.' tos, acordam os Ministros da Primeira Tur(fi. 71) ma do Supremo Tribunal Federal, na confomradade da ata do julgamento e das notas Este é o entendimento que a maioria taquigráficas, por unanimidade de votos, dos componentes desta egrégia Corte conhecer do recurso e lhe dar provimento, vem adotando e que também adoto. nos termos do voto do Relator. Nesse ruamo sortido, teriapara aponBrasília, 16 de março de 1993 — Motar uma enormidade de precedentes, os reira Alves, Presidente e Relator. quais, já é do conhecimento dos ilustres pares. RELATÓRIO No entanto, dispenso-me de enumeO Sr. Ministro Moreira Alves (Relarar ditos precedentes por entender destar): É este o teor do acórdão recorrido, piciendo. prolatado em embargos infringentes pelo Rejeito os embargos. extinto Tribunal Federal de Recursos: É como voto.» (fi. 82) «Por primeiro há de se transcrever o Opostos embargos de declaração, foram acórdão lavrado pelo eminente Ministro eles rejeitados por cresto, onde se lê: Pádua Ribeiro: «No confuso fundamento dos embar'Execução fiscal. Contribuições gos, o embargaste pontilha inúmeros previdenciárias. FGTS. dispositivos legais, em uma tentativa de Prescrição qüinqüenal. Caracterilançar dúvidas sobre a constitucionaliração• dade da aplicação do prazo qüinqüenal com respeito à decadência e prescrição I — As contribuições previpara com os créditos previdenciários. denciá'rias, inclusive as relativas ao FGTS, consubstanciam tributos, É de somenos importância o apontaachando-se sujeitas ao prazo qüinmento de tão diversos artigos do CTN e 254 R.T.J. — 150 da Carta Magna, pois que, em nenhum momento sequer, existe conflito entre eles. Poderia eu alongar-me na interpretação de tais dispositivos, com a fmalidade de esclarecer ao embargante as dúvidas que foram levantadas quando de seus embargos. Todavia, como em julgados passados, sempre vem o IAPAS apresentando recursos a esse respeito, o que me parece ser do seu desconhecimento que a matéria ora tratada já se encontra jufisprudenciahnente firmada, como se pode constatar através da Súmula n° 108, deste Tribunal, que a este serve como ementa. Na realidade, os embargos é que não indicam com clareza o ponto obscuro, duvidoso ou omisso que desejam atacar. Quer o Instituto, assim, reavivar a discussão da tormentosa questão do prazo prescricional das contribuições previdenciárias, ressalte-se, inoportunamente. Bastaria, assim, deter-me nessa preliminar, sem apreciar o mérito do caso vertente. Aprecio-o, no entanto, em respeito ao direito da parte de ver seu pedido tutelado juridicamente. Faço transcrever parte do parecer da douta Subprocuradoria-Geral da República, que demonstra claramente a improcedência dos embargos: 'A natureza jurídica das contribuições parafiscais ou especiais suscitou algumas divergências na interpretação oferecida pelos Tribunais, principalmente no período que antecedeu a EC n° 8/77. Após a edição dessa Emenda Constitucional, e desde o julgamento do RE n° 86.595 (RTJ 87/271), o Colendo Supremo Tribunal Federal acolheu a tese de que a partir dessa EC, as contribuições deixaram de ter natureza jurídica tributária. Esse entendimento do Excelso Pretório acha-se também consolida- do em recente julgamento do RE n° 100.790.7 — Relator Ministro Francisco Rezek (DS de 13-3-87, pág. 3882). Ora, tratando-se as contribuições apuradas e exigidas no período de 1/67 a isto é, anteriores à Emenda Constitucional n° 8/77, encontramse elas vinculadas à natureza tributária, que à época as afetava' — fls. 112/113. Vê-se, pois, que sem razão de ser os embargos oferecidos pelo IAPAS. Aliás, os mesmos fundamentos destes embargos foram utilizados pelo embargante nos EDcI na AC n° 101.445PA, julgado em 20 de novembro de 1985, tendo a eg. Quinta Turma rejeitado os embargos. Por todo o exposto, conheço os embargos mas os rejeito. É como voto.» (fls. 117/119) Interposto recurso extraordinário, foi ele admitido pelo seguinte despacho: «O IAPAS, buscando amparo na letra a do permissivo constitucional, recorre extraordinariamente de acórdão da Segunda Seção deste Tribunal que, em grau de embargos, entendeu consumarse em cinco anos o prazo de prescrição para cobrança dos créditos relativos ao FGTS, a teor do art. 174, do CTN, ante sua natureza tributária. O recorrente acusa de equívoca a qualificação dessas contribuições como tributo, em face dos diversos dispositivos constitucionais arrolados. Argúi, ainda, relevância da questão federal. Sobre a controvérsia, tem sido predominante a orientação jurisprudencial desta Corte (Súmula n° 107), de que, mesmo para as contribuições do FGTS, aplica-se o prazo qüinqüenal da prescrição, mormente aos períodos de compe- sn R.T..1 —150 tênia anteriores ao advento da Emenda Constitucional n° 8/77. Já agora, entretanto, a Corte Suprema definiu a natureza do FGTS, segundo inúmeras decisões proferidas na esteira do RE 100.249, das quais destaco as seguintes: 'Fundo de Garantia do Tempo de Serviço. Natureza de contribuição social, prevista no número X do artigo 43, da Carta da República, para custeio do encargo previsto no n° XIII do seu artigo 165. Definida a natureza do FGTS, pelo Plenário da Suprema Corte, no julgamento do RE 100.249, em sessão de 2-12-87, pacificado fica o entendimento que não se aplica às contribuições a prescrição qüinqüenal prevista no Código Tributário Nacional, mesmo para os créditos relativos ao período anterior à Emenda Constitucional n° 8, de 1977. Recurso conhecido e provido.' (RE 114.386-0-RJ—Rel. Mm. Carlos Madeira — I» de 12-2-88 — pág. 1993). 'Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Natureza jurídica Prescrição. Decadência. Ao julgar, recentemente, o RE 100.249, o Plenário desta Corte, por maioria de votos entendeu que as contribuições para o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) não são contribuições previdenciárias, mas, sim, contribuições sociais, que, mesmo antes da Emenda Constitucional n° 8/77, não tinham natureza tributa, razão por que não se lhes aplica o disposto nos artigos 173 e 174 do CTN. Recurso extraordinário conhecido e provido.' (RE 114.252-9-SP — Rel. Mia Moreira Alves — Dl de 11-3-88 — pág. 4747) 255 'Contribuições devidas ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço. Não configuram espécies de tributo, sendo alheias, à sua disciplina, as normas estabelecidas, pelo Código Tributário Nacional, a respeito da prescrição e da decadência. Precedente do Tribunal Pleno (RE 100.249). Recurso provido, para afastar a prescrição (art. 174 do CTN).' (RREE 112.888-7-SP e 112.697-3MG — Rel. Min. Octavio Gallotti — DJ de 11-3-88 — pág. 4746). 'Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Contribuição estritamente social, sem caráter tributário. Inaplicabilidade à espécie do art. 173 do CTN, que fixa em cinco anos o prazo para constituição do crédito tributário. RE conhecido e provido para se afastar a declaração de decadência Precedente do Plenário.' (RE 110.012-5-AL — Rel. Mm. Sydney Sambes — DJ de 11-3-88 — pág. 4745). 'FGTS — Recusada a natureza tributária da contribuição, não ocorre a prescrição qüinqüenal do art. 174 do Código Tributário Nacional (julgamento do RE 100.249 — Pleno). Recurso extraordinário conhecido e provido: (RREE 114.372-O-RN e 109.613-6-SP — Tel. Min. Oscar Corrêa — DJ de 26-2-88 e 12-2-88 —págs. 3195 e 1991). Daí que, tratando-se de definir a natureza jurídica do FGTS, frente à matéria constitucional argüida, o presente recurso extraordinário, ao contrário de inúmeros outros, merece encaminhamento ao Supremo Tribunal Federal. Ante o exposto, admito o recurso. Quanto à argüição de relevância da questão federal, observe-se o disposto no art. 328, 1°, do RISTF, com a 256 R.T.J. —150 redação dada pela Emenda Regimental n" 2, de 4-12-85.» (fls. 140/141) Propiciado o desdobramento do recurso extraordinário em extraordinário e especial, o ora recorrente dele não se valeu. Às fls. 164/166, assim se manifesta a Procuradoria-Geral da República, em parecer da Dra. Anadyr de Mendonça Rodrigues: «O Recurso Extraordinário foi interposto em 14 de janeiro de 1988, com fundamento exclusivamente na alínea a do permissivo constitucional, fazendo alegação de ofensa aos artigos 21, § 2°, I, 62, § 2°, 163, parágrafo único, e 165, XIII, da Emenda n° 1, de 1969, e a disposições de lei ordinária, a par de fazer argüição de relevância da questão federal (não apreciada, segundo fl. 151). O Exmo. Sr. Ministro Relator, na esteira do decidido por essa Excelsa Corte no julgamento do RE 117.329-7-MG, houve por bem facultar ao Recorrente o desdobramento do apelo (fl. 154), mas o interessado não se valeu de tal faculdade (fl. 158), assim ficado preclusas as questões infraconstitucionais. Os temas constitucionais estão assaz prequestionados, porque o V. Acórdão recorrido assim decidiu: toniribuições previdendfulas. Prescrição. I Dado o caráter tributário das contribuições previdenciárias, forçosamente estão submetidas à prescrição qüinqüenal estabelecida no CIN. Precedentes. II— Embargos rejeitados.' (fl. 87) Essa Suprema Corte, todavia, chegou a entendimento contrário àquele abraçado pelo E. Tribunal a quo: 'Fundo de Garantia do Tempo de Serviço. Sua natureza jurídica. Constituição, art. 165, XIII. Lei n° 5.107, de 13-9-1966. As contribuições para o FGTS não se caracterizam como crédito tributário ou contribuições a tributo equiparáveis. Sua sede está no art. 165, XIII, da Constituição. Assegura-se ao trabalhador estabilidade, ou fundo de garantia equivalente. Dessa garantia, de índole social, promana, assim, a exigibilidade pelo trabalhador do pagamento do FGTS, quando despedido, na forma prevista em lei. Cuida-se de um direito do trabalhador. Dá-lhe o Estado garantia desse pagamento. A contribuição pelo empregador, no caso, deflui do fato de ser ele o sujeito passivo da obrigação, de natureza trabalhista e social, que encontra, na regra constitucional aludida, sua fonte. A atuação do Estado, ou de órgão da Administração Pública, em prol do recolhimento da contribuição do FGTS, não implica tomá-lo findar do direito à contribuição, mas, apenas, decorre do cumprimento, pelo Poder Público, de obrigação de fiscalizar e tutelar a garantia assegurada ao empregado optante pelo FGTS. Não exige o Estado, quando aciona o empregador, valores a serem recolhidos ao Erário, como receita pública. Não há, contribuição de natureza fiscal ou parafiscal. Os depósitos do FGTS pressupõem vínculo jurídico, com disciplina no Direito do Trabalho. Não se aplica às contribuições do FGTS o disposto nos arte. 173 e 174, do CIN. Recurso extraordinário conhecido, por ofensa ao afastar a prescrição qüinqüenal da ação.' (RE 100.249-2-SP, Rel. Mia Oscar Corrêa, in DJ de 1-7-88, pág. 16903). 4 O parecer é, por conseguinte, de que o Recurso Extraordinário comporta conhecimento e provimento.» É o relatório. R.TJ —150 VOTO O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): I. A questão constitucional foi prequestionada nas razões dos embargos infringentes (fls. 75f76) e, posteriormente, nos embargos declaratórios (fls. 90/91). Esta Corte, ao julgar, por seu Plenário, o RE 100.249, firmou o entendimento, em face da Emenda Constitucional n° 1/69, de que as contribuições para o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço não se caracterizam corno créditos tributários ou contribuições equiparáveis a tributos, razão por que não se lhes aplica a prescrição qüinqüenal, prevista no Código Tributário Nacional. O acórdão recorrido divergiu desse entendimento. Em face do exposto, conheço do presente recurso, e lhe dou provimento. 257 EXTRATO DA ATA RE 116.761 — AL — Rel.: M1111. Moreira Alves. Recte.: Instituto de Administração Financeira da Previdência e Assistência Social — LAPAS (Advs.: Paulo Cesar Gontijo e outros). Recda.: Companhia Integrada de Desenvolvimento Agropecuário de Alagoas — CIDAL (Adv.: Manoel Cícero do Rego). Decisão: A Turma conheceu do recurso e lhe deu provimento, nos temos do voto Relator. Unânime. Impedido o Sr. Ministro Limar Gaivão. Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Octavio Gallotti, Sepúlveda Pertence, Celso de Meio e Ihnar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza. Brasília, 16 de março de 1993 —Ricardo Dias Duarte, Secretário. RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 118.344 (SEGUNDO) — RS (Segunda Turma) (Primdro RE na RTJ 137/892) Relata: O Sr. Ministro Marco Aurélio Recorrentes: Oswaldo Opitz e outros — Recorrido: Condomínio do Edifício Dom Feliciano Condomínio. Parte comum. Alteração. «Quorum». A aquisição da unidade privativa faz-se considerados os perímetros das partes COMUM Previsto na convenção de condomínio que a alteração destas últimas somente é possível uma vez alcançada a manifestação favorável de todos os condôminos, descabe, em sutil estratégia, afastar o requisito da unanimidade. A mudança do quorum há de se fazer mediante observância do mesmo quantitativo estabelecido na cláusula condondnial para a valia da deliberação sobre o tema. Se a modificação das partes comuns está jungida à unanimidade, a da convenção que assim dispõe também fica vinculada à concordância de todos os condôminos, sob pena de cair por terra a garantia Inidalmente consignada, colocando-se em plano secundário o princípio da não-contradição. Vulnera o preceito constitudonal assegurador da intangibilldade do direito de propriedade decisão judicial em que desse modo não se conclui. 258 R.T.J. — 150 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em conhecer do recurso e lhe dar provimento, para restabelecer a sentença de fls. 273 a281. Brasília, 24 de agosto de 1993 — Néri da Silveira, Presidente — Marco Aurélio, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Marco Aurélio: Valhome do relato que tive oportunidade de fazer quando submeti a esta Turma o segundo recurso extraordinário interposto e que o foi considerado o acórdão do Superior Tribunal de Justiça de fls. 521 a 527, em que se assentou o não-conhecimento do especial em virtude da óptica de que não teria sido formalizada a argüição de relevância Friso que no julgamento daquele recurso prevaleceu a tese que abracei, consoante a qual, diante da decisão prolatada pelo meu antecessor, Ministro Carlos Madeira, não cabia ao Superior Tribunal de Justiça adentrar a questão alusiva à argüição de relevância, porque a ele os autos foram remetidos para apreciar não o extraordinário, mas o especial. Confira-se com a ementa de fl. 596. Do relatório que se encontra às fls. 577 a 582, pinça a referência à síntese do julgado do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, ressaltando que analisamos agora o primeiro recurso extraordinário sob o ângulo constitucional: «Condomm 'io. Área amura A maioria qualificada dos condôminos pode decidir acerva da alteração de destinação de área comum, mormente quando a construção pretendida determina acréscimo da mesma sem prejuízo real ao uso, gozo e fruição de área descoberta. A unanimidade dos condôminos só se exige, nos casos expressos em lei, nas hipóteses em que a deliberação da maio- ria qualificada incide sobre a fração ideal de terreno de cada condômino, ampliando-se em relação a alguns e diminuindose em relação a outros. A arnpliaçãodo espaço-estacionamento, para locação ou cessão de uso aos condôminos que não disponham de garagem sem alienação, não reduz a fração ideal de terreno que originariamente cada condômino dispõe, nem reduz sua participação nas coisas de uso comum, sempre que se trata de área acrescida.» (fl. 391) No extraordinário, abstraída a matéria legal que restou analisada pelo Superior Tribunal de Justiça em face da conversão do citado recurso, nessa parte, em especial, sustentam os Recorrentes que o decidido resultou na transgressão ao direito de propriedade. Argumentam que, por ato inicialmente formalizado— a Convenção —previu-se que qualquer alteração de área comum deveria contar com a manifestação da unanimidade dos condôminos, não podendo prevalecer alteração perpetrada por vontade da maioria, com o fim de afastar tal requisito. As razões apresentadas foram reiteradas conforme peça de fls. 463 a 471, vindo aos autos as contra-razões de fls. 485 a 495, refutando-se a viabilidade do extraordinário, ante o fato de a controvérsia envolver a Convenção do Condomínio e, portanto, o alcance respectivo. O Recorrido afirma ainda que somente subsiste a questão alusiva ao artigo 462 do Código de Processo Civil, no que se teria levado em conta, no julgamento dos embargos infringentes, a modificação daquele regimento. Quanto a este recurso extraordinário, o Ministério Público Federal emitiu o parecer de fls. 572 a 575, salientando que a decisão da Corte de origem discrepa da garantia constitucional insculpida no § 22 do artigo 153 da Carta pretérita, repetida na atual. A deliberação da Assembléia de Condôminos, adotada por maioria de votos, no sentido de mudar a destinação de área comum do imóvel, de sorte a atribuir R.T.J —150 o uso privativo a parte de alguns dos con&num ' os, em detrimento da minoria vencida, estaria a evidenciar a ofensa ao direito de propriedade. Esclareço que, em face do julgamento do segundo recurso extraordinário interposto, os autos foram remetidos ao egrégio Superior Tribunal de Justiça, que não conheceu do especial resultante da conversão, vencidos os ffmistros Valdemar Zveiter e Nilson Naves (fls. 603 a 626). Tal decisão transitou em julgado —certidão de fl. 627. Recebi os presentes autos para exame em 4 de agosto de 1993, liberando-os para inclusão em pauta no dia 15 seguinte (fl. 628). É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Os pressupostos gerais de recorribilidade estão atendidos. Os documentos de fls. 15 e 16 revelam regulara representação processual, constando à fl. 472 a guia comprobatória do preparo. Quanto ao prazo recursal, a decisão que se pretende alvejada com este extraordinário teve publicidade formalizada com o exemplar do Diário da Justiça de 27 de outubro de 1987 — terçafeira (fl. 413) — ocorrendo a manifestação do inconformismo em 11 imediato —quarta-feira (fl. 415) — e, portanto, dentro dos quinze dias. Resta destarte o exame do enquadramento do citado recurso no permissivo constitucional alusivo à transgressão a preceito da Carta de 1969. Quanto ao prequestionamento, ressaltou com acerto o ilustrado Ministério Público que o Tribunal de Justiça, ao prolatar o acórdão de fls. 386 a 412, decidiu sobre o direito de propriedade, tanto assim que, à fl. 400, deixou consignado que cio caso presente, as resoluçães assembleiares (sic) não atingem o direito de propriedade e de posse dos condôminos». Logo, em que pese não haver menção, no atesto impugnado, ao artigo 153, 22, da Constituição 259 Federal, tenho como objeto de debate e decisão prévios o tema nele versado. O instituto do prequestionamento não pode ser potencializado a ponto de exigir-se referência a números de dispositivos legais, sob pena de sobrepor-se o fetichismo da forma ao conteúdo. Diz-se prequestionado certo tema quando o órgão julgador haja emitido juízo a respeito e isto aconteceu, porquanto a controvérsia dirimida está ligada, justamente, ao direito de propriedade dos Recorrentes, considerada a transmudação de parte comum em área destinada ao uso de alguns condôminos. Neste sentido, decidiu o Tribunal Pleno, conforme depreende-se das ementas transcritas no parecer «Diz-se prequestionada determinada matéria quando esta consta decidida no acórdão impugnado. Descabe exacerbar o instituto a ponto de exigir que o Órgão julgadcr faça referência aos algarismos do diploma legal pertinente à hipótese. O prequestionamento tem como razão de ser a necessidade de proceder-se a cotejo para, somente então, dizer-se do enquadramento do recurso na hipótese legal e isto é viabilizado pela simples adoção de entendimento sobre o tema jurígeno (RE 118.934-7-PR, Rel. Min. Marco Aurélio, in DJ de 7-12-90, pág. 14641). Impor, para configuração do prequestionamen0a, além da matéria veiculada no recurso, a referência ao número do dispositivo pertinente, extravasa o campo da razoabilidade, chegando às raias do exagero e do mero capricho, paixões que devem estar ausentes quando do exercício do ofício judicante. (RE 128.518-4-DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, in DJ de 8-3-91, pág. 206).» Da violência ao artigo 153, § 22, da Constituição Federal Articulam os Recorrentes com a vulneração ao artigo 153, 22, da Constituição 260 R.TJ. —150 Federal anterior. Aduzem que a destinação de parte comum do Condomínio à feitura de garagens, para atender àqueles que não a possuem no prédio, alcança o direito de propriedade, não podendo resultar, assim, de deliberação de parte dos condôminos. Conforme consta do acórdão atacado, o Condomínio é constituído de cinqüenta e duas unidades autônomas. Destas, segundo o disposto no artigo 3° da Convenção, apenas trinta e dois têm assegurado o direito a espaço de estacionamento de automóvel na garagem coletiva, bem como o conforto decorrente de portão automático de acesso e a segurança advinda da guarita, contando, ainda, com manobristas. Há a individualização das vagas de garagem à razão de um trinta e dois avos. A Convenção prevê também a existência de partes de uso comum, inalienáveis e ligadas de forma acessória, indissoluvelmente, às unidades privativas, estabelecendo o artigo 2° a necessidade de contar-se com o consenso unânime para qualquer alteração. O artigo 4° da Convenção confirma a regra do artigo 2°, ao revelar-se que as coisas comuns e aquelas que dizem respeito à harmonia do edifício não podem ser modificadas sem a concordância de todos os condôminos e, mesmo assim, há de se ter presente a estabilidade e a segurança do próprio edifício, viabilizando o dispositivo legal o recurso da maioria ao suprimento judicial. Por outro lado, o artigo 8° fixa como direito dos condôminos o uso e a fruição das partes comuns, sem com isso impedir o uso e o gozo por parte dos demais. Entrementes, mediante Assembléia Geral realizada em 5 de janeiro de 1981, à qual compareceram vinte e cinco condôminos dos cinqüenta e dois que fonnam a totalidade, decidiu-se, por maioria simples dos presentes — dezesseis votos a nove — aprovar-se a construção de vinte garagens no pátio dos fundos do edifício, constituindo-se Comissão para acompanhar a construção e regulamentar a venda das gara- gens. Em 21 de janeiro de 1981, deliberouse, mais, que cada unidade de estacionamento ficaria vinculada ao apartamento do condômino como acessório ao principal, sendo inalienável como unidade autônoma, muito embora passível de venda em conjunto com o respectivo apartamento. Posteriormente, no dia 3 de setembro de 1981, voltou-se a tratar do assunto pertinente à alienação dos espaços-estacionamentos, cogitando-se da construção de um play ground sobre a garagem. Tais decisões conduziram seis condôminos à busca do Judiciário, a fim de obstaculizar a construção. Para tanto, tiveram presente que aquelas providências estariam a vulnerar os respectivos direitos de propriedade e não apenas os atinentes ao uso das parta comuns. A Corte de origem concluiu, por maioria de votos, vencido o proficiente Desembargador Adroaldo Furtado Fabrício, pela improcedência do inconformismo demonstrado, levando em conta ocorrência de fatos novos, e acionando, assim, porque confirmado o acórdão anterior, a norma inserta no artigo 462 do Código de Processo Civil. Uma nova Assembléia teria sido realizada era 21 de dezembro de 1981, ou seja, cerca de um mês após o ajuizamento da presente demanda. Nela transmudou-se a deliberação alusiva à venda das garagens em mera utilização, apreciando-se projeto que estaria a revelar um acréscimo de área de 248.02m2 de terraço, a englobar um plus de play ground de 56,92m`. As vagas, pela nova resolução, ao invés de serem alienadas, passariam ao Condomínio, explorando este a locação respectiva, gerando, conseqüentemente, receita. Por outro lado, no ano que se seguiu, mais precisamente em 23 de março de 1982, realizou-se nova Assembléia-Geral Extraordinária, à qual compareceram quarenta e quatro condôminos, dedicindo-se pela reforma de alguns artigos da Convenção, por quarenta votos a favor e quatro contrários. Dentre estes, o artigo 2° da Convenção, no que previa necessária a unanimidade para alteração das R.TJ —150 partes comuns. Passou-se a ter o quorum qualificado de dois terços. Perante a Corte de origem surgiram, então, as duas correntes. A da maioria, concluindo pela legitimidade da alteração, cogitando de acréscimo da área destinada à parte comum e da impossibilidade de potencializar-se o critério alusivo à concordância de todos. A segunda, assentada na circunstância de a modificação haver alcançado o direito de propriedade dos ora Recorrentes, pois perderam a parte que até então era comum, sem que tenham contribuído, mediante manifestação de vontade, para tanto. A hipótese é interessante e, de início, verifica-se que o artigo 462 do Código de Processo Civil foi empolgado visando a esvaziar a causa de pedir formulada na presente demanda. Iniludivehnente, os Recorrentes alcançaram, a mercê da compra das respectivas unidades autônomas, um determinado quadro e este fez-se real pela certeza de que estavam adquirindo as referidas unidades, consideradas, também, as áreas comuns. Daí o autor do voto vencido haver asserido à fl. 409, que: «O que determina a esse rigor e até a exigência da unanimidade para determinadas deliberações é o fato de que cada condômino, ao adquirir a sua unidade autônoma no condomínio, não a adquire só, mas a adquire com determinados acessórios e com determinados direitos subjetivos que aderem à propriedade exclusiva daquela determinada unidade autônoma. Por outras palavras, seja aquele que adquire quando da incorporação, seja aquele que adquire posteriormente, não adquire um apartamento, ou uma loja, ou uma sala, ou um conjunto só, adquire com esta unidade autônoma, com essa economia individual, adquire também a parcela ideal do mais que existe, ou deva existir, ou esteja previsto existir no edifício.» 261 E realmente assim o é. A aquisição da unidade privada, autônoma, faz-se com inicial extensão às áreas de uso comum e, no caso dos autos, isto restou mais patenteado quando houve a adesão dos condôminos a uma escritura de Convenção em que foi prevista, expressamente, a impossibilidade de haver modificação de parte comum sem a concordância de todos. Ajustaram-se os condôminos em tal sentido, mas eis que o inconformismo em torno da inexistência de vagas na garagem suficientes à utilização por todos, já que somente a trinta e duas unidades foram atribuídas, conduziu à deliberação, por escassa maioria — dezesseis votos a nove, não estando presente sequer metade dos condôminos — ao esquecimento da norma convencional proibitiva. Dirse-á, como o fez a Corte de origem, que, em data posterior, a maioria dos condôminos houve por bem alterar o teor do artigo 2° da Convenção quanto ao consenso unânime. Isto realmente ocorreu quando já ajuizada a presente demanda. Acontece que o procedimento objetivou driblar o desiderato previsível da controvérsia. A este dado somase outro, ligado à incongruência Difícil é conceber que se possa modificar um dispositivo da Convenção, que preveja a unanimidade, mediante deliberação tomada por maioria. Conclusão diversa implica tomar letra morta a unanimidade exigida. O meio pertinente à alteração não pode ser implementado sem observância do quorum a ser modificado. Se no preceito convencional cuida-se da unanimidade, por lógica racional a alteração respectiva há de ser promovida também com respeito ao aludido quorum. No caso, não se atentou para o princípio da não-contradição, deixando de haver a coerência. Enveredou-se por raciocínio contraditório. A um só tempo, teve-se presente o fato de o artigo 2° cogitar da unanimidade para a deliberação em torno da alteração das partes comuns e modificou-se, por maioria, embora absoluta, o que exigido, esvaziando-se, assim, com contrariedade a direito dos Recorrentes, a garrar- 262 RTJ.— 150 tia que decorria da Convenção. A mudança somente seria válida se observado outro princípio, que é o da identidade, ou seja, uma vez houvesse contado com o consenso unânime dos condôminos. Indubitavelmente, o que providenciado pela maioria não é de molde a alcançar a propriedade dos dissidentes, porque sob a proteção do que ajustado anteriormente. Na verdade, os demais condôminos acabaram por reconhecer o óbice intransponível ao intento de criar, no lugar do espaço comum, novas garagens. Procuraram afastá-lo, engendrando a alteração. No entanto, pecaram ao fazê-lo, pois deixaram de lado a circunstância de se tratar de dispositivo convencional ao qual estava colada a necessidade de se ter o consenso unânime. Nem se diga que a Convenção pode ser modificada pelo quorum qualificado. Esta premissa sofre temperamento e este decorre, justamente, da existência de disposições convencionais às quais se impôs o critério da unanimidade, somente afastável, consoante visto, por suprimento judicial e este não veio à balha. Sensibilizou-se a Corte de origem com o que seria a ausência de perda da área comum. Evidentemente, a construção verificada, se o foi, como é incontroverso, em área comum e para a utilização de parte dos condôminos, diminuiu esta última, não frutificando a idéia pertinente à feitura de um terraço. Na espécie, não cabe confundir parte comum com a fração ideal de cada unidade. É certo que, não ocorrendo a alienação inicialmente prevista, as frações continuaram as mesmas. Todavia, a idêntica conclusão não se chega quanto às partes comuns, pois as garagens passaram a ocupar um dimensionamento, não cabendo cogitar da substituição pelo acréscimo alusivo ao terraço ajardinado que, no voto vencido quando do julgamento da apelação, foi rotulado como tentativa de dourar a pílula, disfarçando, na verdade, a modificação. Uma área comum totalmente livre foi objeto de construção e, o que é pior, não com idêntico destino, mas para beneficiar, no campo da comodidade, alguns condôminos, muito embora lhes sendo imposto o ónus de pagar um aluguel. A segurança das relações jurídicas restou infringida pela deliberação da maioria dos condôminos. Mudaram as regras adrede estabelecidas e o fizeram sem a observância da exigência estipulada — unanimidade, muito embora tergiversando via mudança do que inicialmente ajustado. Os Recorrentes vieram-se alcançados, ferindose-lhes o direito de propriedade, sendo de se presumir que, no tocante a cada qual, houve diminuição do patrimônio, pois antes contavam com a unidade autônoma e área comum ampla, sendo que a construção das novas vagas de garagem, para utilização por terceiros, acabou por diminuir esta última. Meu convencimento sobre a matéria, longe de potencializar os efeitos nefastos da unanimidade, coincide com o do autor do voto vencido — Desembargador Adroaldo Furtado Fabrício, e agora, também com o da ilustre Subprocuradora-Geral da República, Dra. Anadyr de Mendonça Rodrigues. Conheço o recurso pela violência ao artigo 153, § 22, da Constituição Federal anterior. No mérito, provejo-o para, reformando o acórdão de fls. 391 a 412, restabelecer o entendimento sufragado pelo juízo e para a sentença de fls. 273 a 281. É o meu voto. EXTRATO DA ATA RE 118.344 — RS — Rel.: Min. Marco Aurélio. Rectes.: Oswaldo Opitz e outros. (Advs.: Aristides Dutra Boeira, Henrique Fonseca de Araujo e outros). Recdo.: Condomínio do Edifício Dom Feliciano. (Adv.: Ajadil de Lemos). Decisão: Por unanimidade, a Turma conheceu do recurso e lhe deu provimento, para restabelecer a sentença de fls. 273/281. Falou pelos recorrentes o Dr. Henrique Fonseca de Araújo. R.TJ — 150 263 Presidência do Sr. Ministro N&i da Sil- Geral da República, o Dr. Artur Castilho veira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Pereira Neto. Paulo Brossard, Carlos Velloso e Marco Brasília, 24 de agosto de 1993 — José Aurélio. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Francisco Rezek. Subprocurador- Wilson Aragão, Secretário. RECURSO EXTRAORDINÁRIO Ir 120.924 — SP (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves Recorrente: Valte de Oliveira — Recorrido: Estado de São Paulo ' da de culpa Responsabilidade objetiva do Estado. Ocorrem exclusiva da vítima. Esta Corte tem admitido que a responsabilidade objetiva da pessoa jurídica de direito público seja reduzida ou excluída conforme haja culpa concorrente do particular ou tenha sido este o exclusivo culpado (Ag. 113.722-3-AgRg e RE 113587). No caso, tendo o acórdão recorrido, com base na análise dos elementos probatórios cujo nane não é admissível em recurso extraordinário, deddido que ocorreu culpa exclusiva da vítima, inexistente a responsabilidade civil da pessoa jurídica de direito público, pois foi a vítima que deu causa ao infortúnio, o que afasta, sem dúvida, o nexo de causalidade entre a ação e a omissão e o dano, no tocante ao ora recorrido. Recurso extraordinário não conhecido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superno Tribunal Federal, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em não conhecer do recurso. Brasília, 25 de maio de 1993 — Moreira Alves, Presidente e Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Moreira Alva: É este o teor do acórdão recorrido (fls. 275/276): «Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n° 106.646-1, da Comarca de São Paulo, em que é apelante Valte de Oliveira, sendo ape- lada a Fazenda do Estado de São Paulo: Trata-se de recurso de autor objetivando a reforma da r. sentença de fls. 245/9, que julgou improcedente a ação indenizatória que propôs contra a Fazenda pelo atropelamento e morte de sua esposa por viatura policial, que teria ultrapassado sinal vermelho da Rua Senador Vergueiro, em São Bernardo do Campo. A r. sentença concluiu pela improcedência, diante da prova testemunhal corroboradora da contestação, que alegou culpa exclusiva da vítima, a qual não respeitou o sinal, que lhe era contrário. O recurso sustenta que em face da responsabilidade objetiva há o dever de indenizar e mais que o reexame da prova leva à culpa do motorista da viatura. Houve resposta. É o relatório. À evidência a responsabilidade objetiva não implica em indenizar qualquer dano, posto que comprovada a total isenção de culpa da Administração inexiste o pressuposto para responder. A orientação doutrinária e jurisprudencial nesse sentido é uniforme. A prova é clara e uníssona no sentido da culpa exclusiva da vítima, com exceção da testemunha José Agripino Tavares (fls. 34/6), que, todavia, não explicou a razão da mudança da versão que dera no processo administrativo (fl. 60). A par de tal prova ser de testemunha única, tem-se que aparenta ser claramente de favor. Todos os outros depoimentos quer na fase administrativa, corno na judicial, são claros, coerentes e coincidentes. Só o de tal testemunha discrepa e tem-se que é contraditório. A improcedência é a conclusão lógica e decorrente dos fatos. Isto posto, Acordam, em Primeira Câmara Cfvel do Tribunal de Justiça, por votação unânime, em negar provimento ao recurso.» Interposto recurso extraordinário, foi ele admitido por este despacho (fls. 288289): «Trata-se de ação ordinária de indenização proposta contra a Fazenda do Estado de São Paulo, objetivando indenização por morte causada por viatura policial. A ação foi julgada improcedente em primeiro grau, sendo a decisão confirmada por acórdão unânime da Egrégia Primeira Câmara Civil deste Tribunal. Inconformado, recorre extraordinariamente o autor, com fundamento no artigo 102, inciso BI, letra a, da Constituição Federal. Impugnação às fls. 284/286. O recurso merece prosperar, porque não se trata apenas de reexame de questão de fato, como pretende a Fazenda do Estado. Discute-se, isto sim, o alcance real do dispositivo constitucional que estabelece a chamada responsabilidade objetiva do Estado. O tema foi prequestionado, tendo a Câmara Julgadora afirmado a tese-de que 'a responsabilidade objetiva não implica em indenizar qualquer dano, posto que comprovada a total isenção de culpa da Administração..? (fl. 275) Deve, assim, ser processada a inconformidade para que a questão seja decidida pela Colenda Suprana Corte. Diante do exposto, defiro o processamento do recurso extraordinário interposto.» Às fls. 307/311, assim se manifesta a Procuradoria-Geral daRepública, em parecer da Dra. Anadyr de Mendonça Rodrigues: «O Recurso extraordinário foi interposto em 10 de fevereiro de 1989, dizendo-se fundamentado exclusivamente na alíneas do art. 101, HL da Carta de 1988 e fazendo alegação de ofensa aos artigos 107, parágrafo único, da Emenda n° 1, de 1969, e 37, parágrafo 6°, da vigente Carta Magna, e foi admitido na origem (fls. 188/189). 1 Eis o v. acórdão recorrido: «À evidência a responsabilidade objetiva não implica em indenizar qualquer dano, posto que comprovada a total isenção de culpa da Administração inexiste o pressuposto para responder. R.TJ — 150 A orientação doutrinária e jurisprudencial nesse sentido é unifonne. A prova é clara e uníssona no sentido da culpa exclusiva da vítima, com exceção da testemunha José Agripiao Tavares (fls. 34/6), que, todavia, não explicou a razão da mudança da versão que dera no processo administrativo (fl. 60). A par de tal prova ser de testemunha única, tem-se que aparenta ser claramente de favor. Todos os outros elementos, quer na fase administrativa, como najudicial, são claros, coerentes e coincidentes. Só o de tal testemunha discrepa e tem-se que é contraditório. A improcedência é a conclusão lógica e decorrente dos fatos.» (fls. 275/276) 3. O recurso extraordinário, por sua vez, assim se sustenta: «A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de Direito Público é objetiva, ou seja, independe da prova de culpa ou dolo, quando seus servidores causarem danos a terceiros, no exercício de sua função. A respeito do art. 107, da Constituição Federal, o ilustre constitucionidista, Manoel GooçalvesFerreira Filho, em sua obra, Comentários à Constituição Brasileira, 5' Edição, 1984, teceu as seguintes considerações: 4(A. responsabilidade objetiva do Estado: Mantém-se na Constituição vigente, a solução adotada na Constituição de 1946 (artigo 194), ou seja, a responsabilidade, dita objetiva do Estado por danos causados no exercício de função pública a particulares. Em face desse 265 princípio, quem sofreu o dano, para haver do Estado a reparação desse dano, apenas deve provar ter sido ele causado no exercício da função pública A reparação prescinde de prova de culpa ou dolo por parte do causador, depende exclusivamente de estar este no exercício de função pública. Esta solução é de justiça social, visa reparar de modo equitativo os encargos sociais. O custo do serviço público, no qual se inclui o dano causado a particulares, deve ser repartido por todos. Se a vítima do dano arcasse com este ou tivesse de comprovar a culpa ou dolo para vê-lo ressarcido, estaria suportando mais do que sua parte, como integrante da comunidade. Note-se que funcionário público, no texto em exegese, abrange todo aquele que exerce função pública, ou seja, a que título for. Abrange, portanto, os servidores do regime especial nos termos do artigo 106, os eventualmente sujeitos ao regime trabalhista etc.» Assim é que o parágrafo 6° do artigo 37 da Constituição Federal vigente deixa claro o seguinte: Permanece a responsabilidade da pessoa jurídica de Direito Público, principalmente aos danos causados por seus funcionários a terceiros, no exercício de suas funções, exigindose, apenas, a prova da culpa ou do dolo, para assegurar o direito de regresso• Isto significa que, realmente, a pessoa jurídica de Direito Público deve provar a culpa ou dolo do servidor, quando pretender obter regressiw mente deste, o que pagou a título de indenização. R.T.J. — 150 266 A responsabilidade civil objetiva do Estado é tranqüilamente aceita pela maioria dos administrativistas, e para excluí-la, somente a culpa exclusiva da vítima, e, no presente caso, não fora comprovada a culpa da mesma, eis que agiu com a devida cautela. Precedentes da Corte.» (Ag. 113.722-3-AgRg-SP, Rel. Min. Sydney Sanches, in DJ de 20-3-87, pág. 4600, destaques nossos) Além do mais, faz-se mister ressaltar que o próprio Supremo Tribunal Federal, adotou o entendimento agora mencionado e conforme se segue: 'A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito público, não depende da prova de culpa, exigindo apenas a realidade do prejuízo injusto' (RTJ 47/378 — RF 169/137.» (fls. 280/282) Tudo posto, não merece conhecimento o recurso extraordinário. mite pesquisa em torno da culpa do particular, para o fim de abrandar ou mesmo excluir a responsabilidade estatal, ocorre, em síntese, dian- É que a culpa da vítima do dano — exclusiva ou concorrente — constitui, conforme o caso, fator excludente ou mitigador da responsabilidade civil do Estado. 6. Trata-se de entendimento que essa Excelsa Corte há muito consagra, do que são meros exemplos os seguintes vv. arestos: «Responsabilidade civil de pessoa jurídica de direito público (autarquia) (Departamento de Estradas de Rodagem do Estado de São Paulo) (art. 107 da CF), litisdenunciada pela ré, em ação indenizatória por colisão de veículos em rodovia estadual. A responsabilidade objetiva da pessoa jurídica de direito público (no caso litisdenunciada) pode e deve ser reduzida, se houver culpa concorrente da demandante (ré-litisdenunciante, na hipótese). Acórdão que assim decide, com base na prova dos autos (Súmula n° 279), não viola o artigo 107 da CF. «A responsabilidade civil do Estado, responsabilidade objetiva, com base no risco administrativo, que ad- te dos seguintes requisitos: a) nexo causal entre o dano e a ação administrativa.» (RE 113.587-5-SP, Rd. Min. Carlos Velloso, in DJ de 3-4-92, pág. 4292, destaques nossos) Ocorrendo culpa exclusiva do particular que sofreu o dano — como, in hoc casu, decidiu o E. Tribunal a quo, ao abrigo da Súmula n° 279 —, deixa de existir o imprescindível nexo causal justificador da atribuição da responsabilidade civil ao Estado. O parecer é, por conseguinte, de que o recurso extraordinário não comporta conhecimento.» É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): 1. Como bem demonstra o parecer da Procuradoria-Geral da República, esta Corte tem admitido que a responsabilidade objetiva da pessoa jurídica de direito público seja reduzida ou excluída conforme haja culpa concorrente do particular ou tenha sido este o exclusivo culpado (Ag. 113.722-3-AgRg e RE 113.587). No caso, tendo o acórdão recorrido, com base na análise dos elementos probatórios cujo reexame não é admissível em recurso extraordinário, decidido que ocorreu culpa exclusiva da vítima, inexiste a responsabilidade civil da pessoa jurídica de direito público, pois foi a vítima que deu causa ao infortúnio, o que afasta, sem dúvida, o nexo R.T.J — 150 de causalidade entre a ação e a omissão e o dano, no tocante ao ora recorrido. 2. Em face do exposto, não conheço do presente recurso extraordinário. EXTRATO DA ATA RE 120.924 — SP — Rel.: Min. Moreira Alves. Recta: Valte de Oliveira. (Advs.: Rogerio da Silva Gonçalves e outros). Recdo.: Estado de São Paulo (Advs.: Mima Cianci e outros). 267 Decisão: A Turma não conheceu do recurso extraordinário, nos termos do voto do Relator. Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e limar Gaivão. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Sydney Sanches. Subprocurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza. Brasília, 25 de inalo de 1993 — Ricar- do Dias Duarte, Secretário. AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 131.249 (AgRg) — MS (Segunda Turma) Relator: O Sr. Afmistro Carlos Valioso Agravante: Banco Bamerindus do Brasil S/A — Agravado: Antônio Balbino de Almeida Júnior tucionat ConstitactonaL Recurso Extraordinário. Matéria infraconsti- I — Inocorrd' wia de questão constitucional decidida, certo que a argumentação do recorrente gira em torno de matéria infraconstitudonal — valor de provas e interpretação do art. 74, CLT. II — RE inadmitido. Agravo improvido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por decisão unânime, negar provimento ao agravo regimental. Brasília, 1° de junho de 1993 — Néri da Silveira, Presidente — Carlos Valioso, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Carlos Vdloso: Tratase de agravo regimental contra decisão que negou seguimento ao agravo de instrumento interposto de decisão indeferitória do processamento de recurso extraordinário manifestado com fundamento no art. 143 da Constituição anterior, em que se aponta como violado o art. 153, parágrafos 1° e ? da mesma Carta. Tem este teor a decisão agravada: Entendeu a decisão agravada que o extraordinário não tinha condições de prosperar, porque, no caso «a discussão gira em torno da interpretação de dispositivo da Norma Consolidada — art. 74 —, o que não enseja o recurso com base no art. 143, da Norma Maior, que pressupõe a violação direta e frontal a preceito constitucional...» 268 R.T.J. — 150 Está correta a decisão agravada, por isso que, como bem acentua o parecer da Procuradoria-Geral da República, «toda a argumentação do recorrente trata, na verdade, de matéria infraconstitucional — valor de provas e interpretação do art. 74 da Consolidação das Leis do Trabalho» (fi. 83). Diz o agravante, depois de historiar o andamento do processo nas instâncias inferiores, que pretende lhe seja dado 4(0 direito constitucional de ver apreciada a questão do exercício de cargo de confiança exercido pelo reclamante, o que faz com que o mesmo não tenha direito a horas extras, e, quanto ao depoimento de uma única testemunha, contraditada pelo reclamado, por ter o mesmo ação própria contra o mesmo banco, depoimento este determinante da condenação ocorrida, o que é expresso no art. 5°, H e XXXVda CF, no momento processual adequado e necessário...», conforme jurisprudência da Suprema Corte (RE 114.230-8-BA, Rel. Min. Oscar Corrêa, DJ de 27-11-87). Ressalta que a decisão ora agravada não enfrentou a questão constitucional posta em julgamento e que «o que ficou ausente é a análise de questões fálicas anteriores e definidoras de circunstâncias próprias para o deslinde de questões propostas, como o exemplo do cargo de confiança que nada tem com a interpretação do art. 74 da CLT». É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Carlos Velloso (Relator): A Procuradoria-Geral da República, oficiando às fls. 79/80, parecer lavrado pela ilustre Subprocuradora-Geral Odilia Ferreira da Luz Oliveira, assim se manifestou: O recurso extraordinário indeferido volta-se contra acórdão que negou provimento a agravo dirigido, por sua vez, contra despacho denegatório de seguimento a recurso de revista. Tal acórdão afastou, sem justificar, a violação dos arts. 153, *à 1°, 2° e 4°, da Constituição em vigor à época (fl. 55). O ora agravante, então, opôs embargos de declaração, cujo acórdão justificou apenas a negativa de ofensa ao § 4°, continuando omisso quanto aos ৠ1° e 2° (fi. 59). No extraordinário, o agravante aponta infrigência dos *à 1° e ? por parte do acórdão do Tribunal Regional do Trabalho, quando é certo que deveria atacar a decisão proferida no agravo de instrumento. Isso jáé suficiente para não se conhecer do recurso extraordinário. Mas podese salientar, ainda, o fundamento do despacho agravado: toda a argumentação do recorrente trata, na verdade, de matéria infraconstitucional — valor de provas e interpretação do art. 74 da Consolidação das Leis do Trabalho. BI Demonstrada a inviabilidade do recurso extraordinário, opino pelo desprovimento do agravo». (fls. 79/80) Por isso mesmo, neguei trânsito ao agravo de instrumento, dado que, conforme é fácil verificar, a argumentação do recorrente gira em tomo de matéria infraconstitucional —valor de provas e interpretação do art. 74, CLT. Confiam a decisão agravada, por seus fundamentos. Nego seguimento ao agravo. EXTRATO DA ATA Ag. 131.249 (AgJtg) —MS--Rel.: Min. Carlos Venoso. Agte.: Banco Bamerindus do Brasil S/A (Adv.: Cristiana Rodrigues Gontijo). Agdo.: Antonio Balbino de Almeida Júnior (Adv.: Jose Torres das Noves). Decisão: Por unanimidade, a Turma negou provimento ao agravo regimental. Au- R.T.J —150 sentes, ocasionalmente, os Ministros Paulo Brossard e Francisco Rezek. Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Paulo Brossard, Carlos Venoso, Mamo Au- 269 rélio e Francisco Rezek. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Mardem Costa Pinto. Brasília, 1° de junho de 1993 — José Wilson Aragão, Secretário. RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 140370 — MT (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence Recorrentes: Guido Laino e cônjuge — Recorridos: Fernando Gonçalves de Souza e outros Sentença: exigência constitucional de fUndamentação: intdigênda. O que a Constituição exige, no art. 93, IX, é que a decisão judicial seja fundamentada; não, que a fundamentação seja correta, na solução das questões de fato ou de direito da lide: declinadas no julgado as premissas, corretamente assentadas ou não, mas coerentes com o dispositivo do acórdão, está satisfeita a exigênda constitudonal. ACÓRDÃO depomos e principalmente, a introdução de gado nas pastagem, atingindo uma área de Vistos, relatados e discutidos estes au- centenas de hectares, difícil de precisar. tos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na conOs réus contestaram a demanda, neganformidaie da ata do julgamento e das notas do a turbação da posse dos autores, uma vez taquigráficas, por unanimidade de votos, que, desde 1980, estão ocupando as terras em não conhecer do recurso extraordinário. mansa e pacificamente, fazendo melhorias imóvel, bem como a posse de seus anteBrasília, 20 de abril de 1993 —Moreira no cessores de 1974 e a dos antecessores Alves, Presidente — Sepúlveda Pertence, destes, dedata mais de 30 anos; aduziram, mais, Relatos. que, de qualquer modo, os autores jamais RELATÓRIO exerceram posse na parte da fazenda, que reclamam. O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: O juiz de primeiro grau acolheu o pediCuida-se de ação de possessória, dita de manutenção, proposta por Fernando Gon- do, com fundamento no artigo 499 do Cóçalves de Souza e outros contra Guido Lai- digo Civil e 926 do Código de Processo no e cônjuge. Civil. Entendendo a sentença configurasse, no caso, má-fé na posse dos réus, não Alegaram os autores que são senhores e lhes deferiu indenização. possuidores de 3.038 hectares de terras «pastais e lavradias», cujas divisas descrevem, O Tribunal de Justiça deu provimento, denominadas «Fazenda Santa Paula», em em parte, à apelação dos réus, apenas para Barra do Bugres, MT, e que, há mais de três reconhecer-lhes a boa-fé e, em conseqüênanos, os réus invadiram parte dessas terras cia, deferir a indenização das benfeitorias com piquetes de gado, barracão, chiqueiro (fl. 276). 270 R.TJ. — 150 O voto condutor do acórdão, na parte em que confirmou a sentença, é do seguinte teor (fis. 268/273): «Versa esta causa sobre uma ação de manutenção de posse proposta por Fernando Gonçalves de Souza e Antônio Gonçalves de Souza e suas respectivas mulheres, ora apelados, contra os apelantes Guido Laino e sua mulher, através da qual os autores visam garantir sua posse sobre uma área, da qual dizem ser senhores e possuidores, constantes de 3.038 hectares de terras pastais e lavradias, destacada em porção certa, do antigo lote «Santa Elvira», Município de Barra do Bugres, tendo seu marco inicial na barra do Ribeirão Onça Magra do Rio Paraguai, seguindo as divisas conforme foram descritas na inicial, onde também historia a origem da propriedade, inclusive afi rmando que a mesma se acha cadastrada no INCRA sob o n° 903.035.036.021-1, bem assim fora adquirida de José Luiz Nespoli, matrícula n° 12.844, Livro n° 2, registro 7.381, registro feito no RI daquela corna/Ca. Alegam eles, autores, que os atos de turbação se configuram em invadirem uma parte das mesmas terras (há mais de três anos), e que se situam abaixo dos alagados da 'Baía Grande', até a foz do Ribeirão Onça Magra, no Rio Paraguai, com piquetes para gado, barracão, chiqueiro de porcos e, prmcipalmente, a introdução de gado nas pastagens naturais, cuja turbação é difícil de se precisar, mas que atinge a centenas de hectares. Os réus contestaram a demanda e renovaram nas razões do apelo, asseverando que não turbaram a posse dos apelados, pois que, desde 1980, mansa e pacificamente, lá estão ocupando e fazendo melhorias no imóvel, enquanto que seus antecessores em-IÇA-Hun posse sobre o mesmo desde 1974 e, por sua vez, aqueles que lhes transferiram, exerciam-na há mais de trinta anos e nunca, em tempo algum, os apelados exerceram posse no imóvel, nem tampouco seus antecessores. Não tendo exercido atos possessórios, carecem de ação, eis que ausente um dos pressupostos: o da posse anterior. Dizem, ainda, que a ação não pode prosperar, porque a posse não é duvidosa, pois a exercem, como também não há como se oferecer guarida à mesma, tal como fora proposta, porque impossível o exame do domínio. Por último dizem: não se nega que os apelados sejam titulares e seus antecessores, de alguma área, naquelas proximidades; o que se recusa é sua incidência onde a pretendem; se reconhecer tratar-se de posse de boa-fé, lhes seja assegurado o direito de indenização pelas benfeitorias realizadas no imóvel. A presente ação, também chamada de força turbativa, é prevista nos artigos 499 do Código Civil e 926 do Código de Processo Civil. É certo que, no juízo possessório, não se discute a propriedade: nem por isso quer dizer que o legítimo proprietário seja preterido em seu direito pelo simples possuidor. Com efeito, segundo se vê dos artigos 505 do Código Civil e 923 do Código de Processo Civil, os mesmos versam sobre a hipótese da alegação do domínio na ação possessória, sendo ambos claros em preverem esta situação. Comentando a respeito, salienta Carvalho Santos, 'será absurdo negar-se a posse a quem, evidentemente possui o domínio, obrigando-o, por simples formalismo, a volta a juízo armado dos mesmos documentos e das mesmas demais provas, por meio da ação reivindicatória, para pleitear aquilo mesmo que lhe foi negado e que, nessa nova ação, R.T.J —150 lhe será deferido' (Código Civil Int., vol. VII, pág. 160). Também, a respeito, a jurisprudência tem entendido da mesma forma, como se vê voto do Desembargador Jesus de Oliveira Sobrinho, quando Relata: «É assim que o artigo 923 do Código de Processo Civil, ao versar a hipótese da alegação de domínio na ação possessória, expressa e exclusivamente se refere à manutenção e à reintegração, conforme podemos verificar do seu texto In verbis: «Não obsta, porém, à manutenção ou à reintegração na posse a alegação do domínio...» (v. Edson Prata, Rep. de Jur., do CPC 3921 — Vol. 15, pág. 4914). Portanto, no tocante à matéria alegada pelos apelantes, sustentando não poderem os apelados, com respeito à proteção de sua posse, alegarem a exceptio proprietatis, a mesma não pode ser acolhida, pois, a pretensão exposta na inicial, objetiva a proteção da posse na qualidade de senhor e possuidor. Também, a irresignação dos apelantes ao pertinente às alegações, quando afirmam não terem turbado ou molestado a posse dos apelados, bem assim de que estes não mantêm aposse sobre o trato de taras, cujos limites vêm traçados na inicial, não merece provimento neste outro aspecto, e tem cabimento a ação. Ora, no caso em exame, a prova é exuberante, no sentido de que os apelados, não só mantinham a posse anterior na área disputada, que é justamente o requisito principal da ação possessória, e que, embora nela molestados por atos praticados por eles apelantes, não veio a perdê-la. A instrução da causa, inclusive com a prova pericial, clareou a controvérsia Pelo que se verifica do laudo pericial, da lavra do Dr. Perito do Juízo, age- 271 ciando suas afirmativas, encontramos o seguinte: Ao responder ao 10° quesito formulado pelos apelados: «10. Se a ocupação dos suplicados Unido Laino e sua mulher estão dentro do perímetro da Fazenda SantaPaula, antes Fazenda Santa Elvira? Resposta: A ocupação dos réus Unido Laino e sua mulher está dentro do perímetro da Fazenda Santa Paula, dos autores...» (fi. 99-TJ) Nesta mesma resposta, o Dr. Perito fez a seguinte observação: «Veja planta da Fazenda Santa Paula confeccionada com elementos da Escritura recebida pelos autores, e também planta e memorial descritivo da medição primitiva do lote Santa Elvira, onde há apressa referência à confluência do Rio Onça Magra com o Rio Paraguai, margem direita deste.» (fi. 99M) Ainda a prova documentada por fotografias existentes nos autos, deixa bem clara a certidão da posse dos apelados e os vestígios dos atos de turbação por parte dos apelantes. In casu, entendemos mais, ser decisiva em favor dos apelados a prova testemunhal para estabelecer a posse anterior dos mesmos e a turbação pelos atos praticados pelos apelantes. Vejamos: Para a testemunha de nome José Ramos da Cruz, em seu depoimento, informa o seguinte que o córrego Onça Magra deságua no Rio Paraguai, mas no local a que se refere a inicial, o rio tem dois braços, um deságua numa baía conhecida por baião e o outro desce para a baía Fabrício; que dessas bafas, o riacho Onça Magra acaba desaguando no Rio Paraguai; que até 1970, o Sr. tinido Laino não residia 272 R.TJ. — 150 no local; que a familia que residia no vel objeto da ação, provou que os venlocal era conhecida cano família Ludedores deram-lhes a posse (título) de cas.» (fl. 170-Ti) fato, no imóvel objeto da venda e que essa posse foi violentada, depois por Lendo-se os depoimentos das demais atos praticados pelos apelantes. testemunhas inclusive as arroladas pelos apelantes, verifica-se que suas inforA prova, efetivamente, não demonsmações não são conflitantes, 'porém, tra a alegada posse que pudesse ensejar robustas à pretensão dos apelados, apea prescrição aquisitiva de propriedade, sar de se apresentarem de difícil comde que alegaram os apelantes, cujaprova preensão', como bem asseverou o MM. estava a seu cargo. Juiz prolator da decisão recorrida. Assim, deve vingar a ação possessóÉ muito significativo, por outro lado, ria proposta pelos apelados, como apreque os apelantes reconhecem dois fatos: ciou e decidiu o MM. Juiz, ut sinta a) «não se nega que os apelados sejam em sua sentença, pois que o proprietário titulares e seus antecessores, de alguma e possuidor é o legítimo titular da resárea, naquelas proximidades»; b) não pectiva ação. negam estar ocupando e fazendo melhoAliás, a propósito, já foi decidido: rias no imóvel, afirmando que não existe incidência com a posse dos apelados. «Possessória — Reintegração de posse — Ação ajuizada por comDemais disso, as alegações dos apeprador de imóvel — Procedência — lantes, vêm desacompanhadas de eleApelação não provida mentos convincentes, enquanto que os apelados, autores da ação, como lhes Admite-se a reintegração de posse incumbia, produziram provas dos fatos para o comprador de imóvel a posse constitutivos da relação jurídica litigiodeste, posto que o atual Código de sa (mc. 1, art. 333 do CPC), provas essas Processo Civil suprimiu a ação de satisfatórias de sua posse jurídica e a imissão de posse.» (cf. Apel. Cível n° continuação desta, que vem caracteri246.377 —4° Cara C. do TJSP, Rel. zando pela prática dos atos exeriorizanDes. Henrique Machado, julgamento tes da propridade. em 23-10-75, In Rep. de Jur. do CPC —Edson Prata, vol. 16, pág. 4974, n° Caracterizou-se, destarte, a turbação 3947). que se haveria de obstar com o emprego do interdito de manutenção de posse, Os embargos de declaração, que alegasendo que sentença recorrida examinou ram erro material e obscuridade na motivacom propriedade a espécie em deslinde, ção, quanto à prova testemunhal, bem como pois que o magistrado, fundamentada- contradição, dúvida e omissão quanto à mente, louvou-se não só na prova teste- perícia, e pediram o esclarecimento das munhal, que se afina com as conclusões dúvidas e suprimento das omissões, foram periciais e ainda na inspeção judicial rejeitados (Lis. 293/296). realizada, como razão de decidir. Donde a interposição de recurso exO certo, em suma, é que, segundo a traordinário e recurso especial, ambos deprova apurada nos autos, ficaram de- feridos (fls. 355/356 e 352/354). monstrados, amplamente, os requisitos No Superior Tribunal de Justiça o recurnecessários à posse dos apelantes, incluso especial não foi conhecido. sive a localização da área litigiosa, consoante o requerido na inicial, isto porO RE, a, alegou vulneração dos arte. 5°, que, na qualidade de adquirentes do imó- XXXV e 93, IX, da Constituição Federal, R.TJ —150 por ausência de motivação dos acórdãos, conforme resumiu o recorrente, verbis (fl. 315): «a) tendo o v. acórdão concluído que os Réus não tinham razão em argüir o usucapião, havendo reconhecido a posse de boa-fé, cumpria atendesse ao reclamo dos embargos declaratórios, motivando a inoconência da presaição, com a enunciação de data e fatos concretos; afirmando o v. acórdão que os Autores estavam na posse e que esta depois foi violentada pelos Réus, conto este é um ponto nodal da ação possessória, impunha-se fosse declinado quando e como sucedeu tal violência; inscrevendo o v. Acórdão que a prova pericial clareou a controvérsia e como aquela prova registra que na área em litígio 'não foram encontradas manifestações da presença dos Autores', essa contradição precisava ser esclarecida.» (11. 315) Oficiando pelo Ministério Público Federal, a ilustre Subprocuradora-Gera1, Anadyr Rodrigues opinou pelo não conhecimento do recarrso. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relato* Restrito à matéria constitucional, cinge-se o recurso extraordinário à alegação de ofensa do art. 93, IX, da Lei Fundamental, que determina sejam fundamentadas todas as decisões do Poder Judiciário. 2. Dei-me ao trabalho de ler — e à Turma, o de ouvir —todo o voto condutor do acórdão recorrido. O seu teor demonstra que, sejam quais forem os seus defeitos na apreciação da prova ou na aplicação do direito aos fatos que julgou provados, o certo é que não se pode afirmar que careça de motivação: o que a Constituição exige, no preceito invocado, é que a decisão seja fundamentada, não, que a fundamentação 273 seja correta: cl«rlistates no julgado as razões do decime, está satisfeita a exigência constitucional. Vícios de motivação existente podem levar à cassação ou à rescisão do julgado. Assim, por exemplo, a contrariedade substancial à lei ou à Constituição, que na motivação se revele; ou ainda o erro de fato, como, em tese, o que os recorrentes imputam ao acórdão, no ponto em que admitiu como real um fato que dizem inexistente, qual a posse dos autores sobre a área questionada que, ao contrário, os réus já ocupariam, antes da aquisição pelos primeiros da Fazenda em que se inclui a gleba. São questões, no entanto, que ou reclamam via processual diversa ou, quando acaso dessem margem ao recurso extraordinário, não guardam pertinência com a exigência de motivação das decisões judiciais, único fundamento constitucional deduzido na interposição do presente. Certo, há um defeito de fundamentação de sentença que se pode reputar equivalente ao de sua inexistência: é a de falta de coerência lógico-jurídica entre amotivação e o dispositivo (CF, HC 69.419, 23-692, Pertence, Dl 28-8-92). Não é o caso, porém. Acertadamente ou não, o acórdão recorrido, à luz da prova ou da interpretação, que emprestou, a normas de direito possessório, assentou premissas que induziram à procedência do pedido de reintegração. 7. Desse modo, não conheço do recurso: é o meu voto. EXTRATO DA ATA RE 140.370 — MT — Rel.: Mn. Sepúlveda Pertence. Recta.: Guido Laino e cônjuge (Advs.: Rubens Amo Sella e outro). Recdos.: Fernando Gonçalves de Souza e outros (Adv.: Antônio Antero de Almeida). 274 R.TJ. — 150 Decisão: A Turma não conheceu do recurso extraordinário, nos termos do voto do Relator. Unânime. Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Octavio Gallotti, Sepúlveda Pertence, Cel- so de Mello e limar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Miguel Franzino Pereira. Brasília, 20 de abril de 1993 — Ricardo Dias Duarte, Secretário. RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 140.705 — CE (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence Recorrente: União Federal — Recorridos: Rádio FM Casablanca Ltda. e outros. Contribuição soda! sobre o lucro (Lei n° 7.689/88): constitudonalidade de sua instituição, fundada no art. 195, I, CF; inconstituelomdidade, porém, de sua exigência sobre o lucro apurado em 31-12-88, à vista do art. 195, § 6°, da Constituição (STF, RREE 146.733 e 138.284). Renda das pessoas jurídicas, no caso o ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes au- lucro». (fls. 59/65) O acórdão recorrido manteve a sentença tos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na con- de primeiro grau, fundando-se em decisão formidade da ata do julgamento e das notas plenária do Tribunal a quo, que acolhera a taquigráficas, por unanimidade de votos, argüição de inconstitucionalidade da citada em conhecer do recurso e dar-lhe provi- lei. mento, em parte. Opostos embargos de declaração, foBrasília, 6 de abril de 1993 — Octavio ram acolhidos, determinada a juntada aos Gallotti, Presidente — Sepúlveda Perten- autos do acórdão plenário que decidiu o incidente de inconstitucionalidade. (fl. ce, Relator. 106) RELATÓRIO O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence- do.A União interpôs, então, RE, b, admitiCuida-se de ação proposta pelas empresas o relatório. recorridas, objetivando seja declarada a inexigibilidade da contribuição social instituíVOTO da pela Lei n° 7.689/88, sobre os lucros O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence apurados pelas autoras, ou pelo menos, em relação ao exercício financeiro de 1989, (Relator): Dado que a decisão recorrida declarou a inconstitucionalidade de lei feano-base de 1988. A sentença de primeira instância julgou deral, conheço do recurso extraordinário procedente a ação, declarando, incidental- (CF, 102, III, b). Ao julgar o RE 146.733, de 29-6-92, mente, a inconstitucionalidade da referida lei federal instituidora da exação questio- Moreira Alves, e o RE 138.284, de 1°-7-92, nada, «na parte que tomou o mesmo fato Venoso, o plenário do Supremo Tribunal, gerador e base de cálculo do Imposto de embora reputasse válida a instituição da R.TJ —150 contribuição social impugnada — objeto dos arts. 1°, 2° e 3° da Lei n° 7.689/88 — declarou a inconstitucionalidade do seu art. 8°, que já a tomava exigível sobre o lucro do exercício de 1988, contrariando a regra de anterioridade mitigada do art. 195, ü 6°, da Lei Fundamental. No caso, foi julgada procedente a ação, reconhecendo a sentença, incidentemente, que a Lei n° 7.689/88 é inconstitucional «na parte em que tomou o mesmo fato gerador e base de cálculo do Imposto de Renda das pessoas jurídicas, no caso o lucro». (f1 65) O acórdão recorrido confirmou a sentença, fundando-se em precedente do plenário que acolhera argüição de inconstitucionalidade da Lei n° 7.689/88, «à míngua de Lei Complementar que estabeleça o âmbito dentro do qual pode o legislador ordinário criar contribuições sodais com fundamento no artigo 149 da Constituição». 275 EXTRATO DA ATA RE 140.705 — CE —Rel,: Min. Sepfilveda Pertence. Recte.: União Federal (Adva.: Procuradoria da Fazenda Nacional). Recdos.: Rádio FM Casablanca Ltda. e outros (Advs.: Schubert de Farias Machado e outro). Decisão: A Turma conheceu do recurso e lhe deu provimento, em parte, nos termos do voto do Relator. Unânime. Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotti, na ausência justificada do Sr. Ministro Moreira Alves (Presidente). Presentes à Sessão os Srs. Ministros Sepúlveda Pertence e Celso de Mello. Ausente, justificarbunente„ o Sr. Ministro limar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Miguel Frauzino Pereira. Brasília, 6 de abril de 1993 — Ricardo Dias Duarte, Secretário. RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 140.924 (EDd) —DF (Primeira Turma) Relator. O Sr. Ministro Moreira Alves Embargante: Miguel Tavora Goulart Lopes — Embargada: União Federal Embargos de declaração. — Inexistência de omissão no acórdão embargado. — O acórdão recorrido, salientando que o Plenário da Corte havia julgado, recentemente, dois recursos extraordinários sobre casos análogos ao presente, se fundou nesses precedentes que decidiram que o artigo 8° do ADCT da Constituição não se aplica a promoções, por merecimento, de militares, porquanto, se estivessem em serviço ativo a das não teriam direito, uma vez que elas, por sua própria natureza, geram apenas expectativa de direito. Aliás, ainda que não fosse — como é — índia à natureza mesma da promoção por meredmento a inexistência de direito a ela, o só fato de a Constituição dizer que os anistiados teriam direito às promoções a que teriam direito se continuassem na ativa implicaria a elementar necessidade, para a aplicação, ou não, do texto constitucional, 276 R.TJ.— 150 da verificação da existência, ou não, desse direito em face da legislação a ele pertinente. Isso, evidentemente, diz respeito à aplicação direta da Constituição, e a concessão de direito inexistente implica, também, obviamente, desrespeito direto ao texto constitucional, por inobservfmda da condição por ele estabelecido. Embargos de declaração rejeitados. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, ha conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, rejeitar os embargos de declaração, nos termos do voto do Relator. Brasília, 30 de março de 1993 — Moreira Alves, Presidente e Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): É este o teor do acórdão embargado: e... lê (fls. 237/238) A esse atesto opõem-se embargos declaratórios em que se alega (fis. 242/255): e... lê ...» É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): 1. Não há omissão alguma ase suprida O acórdão recorrido, salientando que o Plenário da Corte havia julgado, recentemente, dois recursos extraordinários sobre casos análogos ao presente, se fundou nesses precedentes que decidiram que o artigo 8° do ADCT da Constituição não se aplica a promoções, por merecimento, de militares, porquanto, se estivessem em serviço ativo a elas não teriam direito, uma que elas, por sua própria natureza, geram apenas expectativa de direito. Aliás, ainda que não fosse —como é — insita à natureza mesma da promoção por merecimento a inexistência de direito a ela, o só fato de a Constituição dizer que os anistiados teriam direito às promoções a que teriam direito se continuassem na ativa implicaria a elementar necessidade, para a aplicação, ou não, do texto constitucional, da verificação da existência, ou não, desse direito em face da legislação a ele pertinente. Isso evidentemente, diz respeito à aplicação direta da Constituição, e a concessão de direito inexistente implica, também, obviamente, desrespeito direto ao texto constitucional, por inobservância da condição por ele estabelecida 2. Em face do exposto rejeito os presentes embargos. EXTRATO DA ATA RE 140.924 (Ene» — DF — ReL: Min. Moreira Alves. Embte.: Miguel Távora Goulart Lopes (Advs.: Hélio Gonçalves e outro). Embda: União Federal. Decisão: A Turma rejeitou os embargos de declaração, nos termos do voto do Relator. Unânime. Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Octavio Gallotti, Celso de Mello e limar Gaivão. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Sepúlveda Pertence. Subprocurador-Geral da República, lk Antonio Fer -nadoBrseSilvuza. Brasília, 30 de março de 1993 — Ricardo Dias Duarte, Secretário. R.TJ — 150 277 RECURSO EXTRAORDINÁRIO N• 141.649 — SP (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro limar Gaivão Recorrente: Instituto Nacional do Seguro Social — INSS — Recorrida: Aparecida Fogaça de Oliveira Previdência Social Artigo 58 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. A revisão dos benefídos previdenciários expressos em quantidade de salários mínimos, na data de sua concessão, pelo critério estatuído, para o futuro, pelo artigo 58 do Ato das Disposições Constituicionals Transitórias, não abrange prestações anteriores ao período Inicial de sua vigência. Recurso extraordinário conhecido e provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os lvfmistros do Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigraficas, por unanimidade de votos, em conhecer do recurso e lhe dar provimento, nos termos do voto do Relator. Brasília, 21 de setembro de 1993 — Moreira Alves, Presidente — Binar Gaivão, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro limar Gaivão (Relator): O Segundo Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo deu provimento ao apelo do obreiro, reconhecendo-lhe o direito de perceber auxílio-doença acidentário no período de 4 de novembro de 1984 a 17 de novembro de 1986 e, a partir daí, aposentadoria por invalidez, e determinou que os benefícios, desde a data de sua concessão, tivessem seus valores reajustados levando-se em conta a incidência do art. 58 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, de modo que viessem a corresponder à mesma quantidade de salários tnínimos por ocasião do pagamento. No recurso extraordinário interposto pelo Instituto Nacional do Seguro Social — INSS, exclusivamente com fundamento na alínea a do permissivo constitucional, alega-se ofensa ao art. 58 do Ato das Disposições Constitucionais Transitória Aduz-se que as modificações no critério de reajuste dos benefícios previdenciários decorrentes da nova Constituição só passaram a ser aplicáveis a partir do tnês de abril de 1989, pois até o sexto mês seguinte à promulgação da Carta a atualização processara-se pela aplicação dos índices previdenciários. O recurso foi admitido na origem pelo despacho de fls. 127/128. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro limar Gaivão (Relator): Trata-se, no caso, de auxílio-doença acidentário e aposentadoria por invalidez que o mesto recorrido determinou que fossem pagos a partir de 17 de novembro de 1984, e 18 de novembro de 1986, respectivamente. Ao determinar a observância para todo o crédito do critério estatuído, para o futuro, pelo artigo 58 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, sobre prestações anteriores ao período inicial de sua vigência, como o próprio texto observa quando diz «as prestações mensais dos benefícios atualizados de acordo com este artigo serão devidas e pagas a partir do sétimo 278 R.TI. — 150 mês a contar da promulgação da Constituição», o acórdão recorrido fez retrooperar a referida disposição. Procede, assim, o articulado pela autarquia recorrente. Aliás, precedentes similares já foram julgados por esta Turma — RE 137.794-1 — Relator o eminente Ministro Octavio Gallotti e RE 140.492, de que fui relator, seguindo-se, a partir daí, o julgamento de outros casos. O entendimento que ficou estabelecido está expresso na ementa do acórdão dos recursos que relatei, verbis: «Previdência Social. Artigo 58 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. A revisão dos benefícios previdenciários expressos em quantidade de salários mínimos, na data de sua concessão, pelo critério estabelecido, para o futuro, pelo artigo 58 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, não abrange prestações anteriores ao período inicial de sua vigência- Recurso extraordinário conhecido e provido.» Ante o exposto, conheço do recurso e lhe dou provimento. EXTRATO DA ATA RE 141.649 — SP — ReL: Min. Binar Gaivão. Recto.: Instituto Nacional do Seguro Social—INSS (Advs.: AneteRodello e outros). Recria.: Aparecida Fogaça de Oliveira (Advs.: Fernando Guimarães de Souza e outro). Decisão: A Turma conheceu do recurso e lhe deu provimento, nos termos do voto do Relatar. Unânime. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Min. Sepúlveda Pertence. Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes h Sessão os Srs. Ministros Sydney Sanches, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e limar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Artur Castilho Pereira Neto. Brasília, 21 de setembro de 1993 — Ricardo Dias Duarte, Secretário. RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 143.619 — PE (Primeira Turma) (AgRg na RTJ 148/286) Relator: O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence Recorrente: União Federai — Recorrida: Ferreira Pinto & Cia. Ltda. Controle incidente de constitucionalidade: declaração de luconstitucionalidade por acórdão plenário, que, embora proferido em causa diversa, se integra à decisão do órgão fracionário que, com base nele, afastou a incidência da lei julgada inválida: cabimento de embargos de declaração para obter de Turma julgadora a determinação de juntada aos autos do teor de decisão plenária em que fundou o julgamento do caso concreto. ACÓRDÃO em conhecer do recurso e dar-lhe provimento, em parte. Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na con- Brasília, 6 de abril de 1993 — Octavio formidade da ata do julgamento e das notas Gallottt Presidente— Sepfalveda Pertentaquigráficas, por unanimidade de votos, ce, Relator. R.TJ — 150 RELATÓRIO 0Sr. MlnistniSepúlvedaPertaice Cuida-se de ação ajuizada pela empresa recorrida, visando à declaração de inexistência de débito fiscal correspondente à contribuição social instituída pela Lei n° 7.689/88, relativamente ao ano-base de 1988. A ação foi julgada improcedente em primeira instância, mas o Tribunal Regional Federal da 5' Região, por sua l' Turma, deu provimento à apelação da autora, declarando a inconstitucionalidade da exação questionada. A União opôs embargos de declaração, pretendendo a explicitação de que o «acórdão embargado se funda na decisão do Plenário proferida na Argüição de inconstitucionalidade suscitada na AMS 976-AL» e a «incorporação ao anato impugnado de todos os fundamentos que ensejaram a referida declaração de inconstitucionalidade». A Turma, porém, rejeitou os embargos, nestes ternos (fl. 129): «Embargos declaratórios. Decisão da Turma.Argiiiçãodeinconstituciona!idade suscitada em outro processo. Quando, em processo de competência das Câmaras ou Turmas, verifica-se o incidente de inconstitucionalidade, a decisão do Pleno passa a ser parte integrante do acórdão que vier a ser proferido pelo órgão fracionado. Todavia, em processo diverso, em que não foi suscitado o incidente, mesmo que se discuta questão de direito idêntica, as razões e os fundamentos (consubstanciados nas notas taquigráficas) daquela decisão plenária não se incorporamformalmente ao acórdão do órgão fracionado, embora sobre este julgamentoproduzamefeitos. A função do julgador, nos embargos declaratórios, não é responder à perquirição sobre decisão em argüição de inconstitucionalidade de lei suscitada em outro processo submetido ao julgamento do Tribunal. 279 Embargos rejeitados. Decisão unânime.» A União interpôs recurso especial e recurso extraordinário, ambos admitidos. No Superior Tribunal de Justiça, contudo, o relator do recurso especial negou-lhe seguimento (fl. 165), sem interposição de recurso (fl. 166v.). O RE, a e b, aponta contrariedade aos artigos 97 e 5°, XXXV, da Constituição Federal. Sustenta a recorrente que, se tem «no caso presente, uma decisão de Turma declarando inconstitucionalidade de lei em flagrante contrariedade ao artigo 97, da CF, pelo que manifestamente nula». Acrescenta que «instada a sanara omissão através de embargos declaratórios (...), a. Egrégia Turma insistiu em não reconhecê-la, denegando, assim, a prestação Jurisdicional em violação ao artigo 5°, inciso XXXV, da Carta Magna». Pede ainda que, se não conhecido pelo primeiro fundamento, seja o recurso recebido pela alínea b — já que a decisão declarou a inconstitucionalidade de lei federal — e reconhecida a constitucionalidade da Lei n° 7.689/88. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): É firme nesta Turma e no Tribunal que, no controle incidente, o acórdão plenário que resolve e declara a inconstitucionalidade suscitada é parte integrante da decisão do caso concreto, juntamente com o acórdão posterior, do órgão parcial, que aplica à lide a solução da questão prejudicial. 2. Nessa linha, assentamos, no AgRg RE 141.988, em 5-5-92, de que fui relator: «1. Em processos cujo julgamento caiba aórgãos parciais do Tribunal, suscitada a argüição de inconstitucionalida- 280 R.T.J. — 150 de da norma incidente, dá-se repartição de competência por objeto do juízo, devolvendo-se ao Plenário a decisão da questão prejudicial de constitucionalidade. 2. Desse modo, é no acórdão plenário que se há de buscar a motivação da decisão recorrida, com respeito à argüição de inconstitucionalidade, sendo indiferente o que a propósito do mérito dela, contra ou a favor, se diga no acórdão da Turma.» Trata-se de entendimento que deriva do art. 97 da Constituição. Não obstante, no caso concreto, para negar-se, em embargos de declaração, a incorporar ao seu acórdão o do Tribunal Pleno, que decidira a prejudicial de inconstitucionalidade, partiu o acórdão recorrido de uma distinção, assim deduzida no voto condutor do ilustre Juiz Francisco Falcão (fl. 125): «Quando, em processo de competência das Câmaras ou Turmas, verifica-se o incidente de inconstitucionalidade, a decisão do Pleno passa a ser parte integrante do acórdão que vier a ser proferido pelo órgão fracionado. Todavia, em processo diverso, em que não foi suscitado o incidente, mesmo que se discuta questão de direito idêntica, as razões e os fundamentos (consubstanciados nas notas taquigráficas) daquela decisão plenária não se incorporam formalmente ao acórdão do órgão fracionado, embora sobre este julgamento produzam efeitos. Por outro lado, a função do julgador, nos embargos declaratórios, não é responder à perquirição sobre decisão em argüição de inconstitucionalidade de lei suscitada em outro processo submetido ao julgamento do Tribunal.» 5. Estou, data veada, em que o distinguo da decisão recorrida é de ser repelido, porque, levado às últimas conseqüências, implicaria a nulidade do julgado. Como assinalei no RE 121.791, no âmbito do Supremo Tribunal, o art. 101 RISTF, que mantém sua força de lei, prescreveu que a adedaração deconsütucionaNade ou incomtitudondidade de Id ou ato normativo, pronunciada por maioria qualificada, aplica-se aos novos feitos submetidos às Turmas ou ao Plenário», ressalvada a proposta de revisão da jurisprudência (art. 103). Ao disciplinar, para os outros tribunais, o incidente da argüição de inconstitucionalidade (arts. 480/482), o Código de Processo Civil não conferiu expressamente à declaração plenária essa eficácia vinculante dos órgãos parciais de cada tribunal, fora do processo em que proferida. Não obstante, é certo que se tem difundido a rotina de aplicação pelas Turmas da precedente declaração de inconstitucionalidade, dispensando-se nova remessa da questão ao Plenário. É prática que se impôs por óbvias razões de economia processual, à qual, em linha de principio, não se opõe o art. 97 da Constituição: sua legitimidade, no entanto, pende de que o órgão parcial, ao decidir a causa, se considera juridicamente vinculado à decisão plenária da questão de inconstitucionalidade, não obstante tenha sido provocada em processo diverso. Se, ao contrário, a Turma pretende reduzir o acórdão plenário a mero precedente jurisprudencial sem força vinculante, a conseqüência é que não poderá decidir da causa, sem novamente submeta ao Pleno a prejudicial de inconstitucionalidade. De tudo resulta que, para ser válida, a decisão do órgão fracionário há de receber, como parte integrante sua, o acórdão do Tribunal Pleno, declaratório da inconstitucionalidade de que se cogite. 12. E, nessa hipótese, provada por embargos de declaração, não pode a Turma furtar-se a trazer aos autos o acórdão plenf» R.T.1 —150 rio que é parte integrante da decisão da Causa. 13. Desse modo, conheço do recurso e lhe dou provimento para detenninar que a Turma faça juntar o acórdão plenário reclamado nos embargos de declaração: é o meu voto. EXTRATO DA ATA RE 143.619 — PE — ReL: Min. Sepúlveda Pertence. Recte.: União Federal (Adva.: Procuradoria da Fazenda Nacional). Recda.: Peneira Pinto & Cia. Ltda. (Advs.: Renato Santos Pinheiro e outros). 281 Decisão: A Turma conheceu do recurso e lhe deu provimento, nos termos do voto do Relator. Unânime. Presidência do Sr. Ministro Octavio Gallotti, na ausência justificada do Sr. Ministro Moreira Alves (Presidente). Presentes à Sessão os Srs. Ministros Sepúlveda Pertence e Celso Mello. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro limar Gaivão. SubprocuradorGeral da República, Dr. Miguel Franzino Pereira. Brasília, 6 de abril de 1993 — Ricardo Dias Duarte, Secretário. AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 143.689 (AgRg) — SP (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro limar Gaivão Agravante: Companhia Brasileira de Aço — Agravado: Estado de São Paulo ICM Mercadoria adquirida de outra unidade federativa sob o regime de alíquota reduida. Pretendido reconhecimento do direito ao crédito da diferença Alegaçdo de contrariedade ao princípio da ndo-ounuelatividade. A aquisição de mercadoria adquirida de outra unidade federada sob o regime de "nota reduzida não enseja crédito fiscal pela diferença. Ausência de afronta ao princípio da não-cumtdatividade, que objetiva tão-somente permitir que o imposto incidente sobre a mercadoria, ao final do ciclo produção-distribuição-consumo, não ultrapasse, em sua soma, percentual superior à allquota máxima prevista em lei, resultado que não se inviabiliza pela denegação do pretendido crédito. Agravo regimental a que se, nega provimento. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Trilbuinal Federal, por sua Primeira Turma, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Relator. Brasília, 21 de setembro de 1993 — Moreira Alves, Presidente — filmar Gaivão, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro limar Gaivão (Relator): Trata-se de agravo regimental ajuizado contra o despacho que negou seguimento ao agravo de instrumento, verbis (fl. 200): 282 R.TJ. — 150 «Companhia Brasileira de Aço ajuizou ação ordinária contra o Estado de São Paulo, pretendendo o reconhecimento do direito ao crédito do ICM correspondente à diferença de alíquotas nas operações interestaduais. A ação foi julgada improcedente, tendo sido mantida, em apelação, a decisão. Donde o recurso extraordinário, com fundamento no art. 102, III, a e c da Constituição Federal, alegando que o acórdão recorrido violou o princípio constitucional danão-cumulatividade, e considerou válida lei estadual contestada em face da Resolução do Senado Federal. O despacho agravado indeferiu o recurso, salientando que a jurisprudência do Pretório Excelso abona a tese do acórdão recorrido (fls. 67/68). Tratando-de de caso de alíquota reduzida, e não de isenção, comporta mero abatimento, considerado o valor efetivamente cobrado, e não aquele resultante da alíquota máxima. Ainda recentemente, em sessão da Eg. Primeira Turma, julguei caso de idêntica natureza (RE 135.189-6), onde me manifestei no sentido de que o princípio da não-curnulatividade do ICM, ao que se depreende da letra do art. 23, da CF/69, e ainda do art. 155, parágrafo 2°, I, da CF/88, se expressa pela necessidade de compensar-se, em cada operação relativa à circulação da mercadoria, o montante do tributo que foi cobrado nas operações anteriores, seja pelo próprio Estado, seja por outro, de molde a permitir que o imposto incidente sobre a mercadoria, ao foral do ciclo produção-distribuição-consumo, não ultrapasse, em sua soma, percentual superior ao correspondente à alíquota máxima prevista em lei para o tributo. Assim, improcede a alegação de violação à norma constitucional invocada, mostrando-se descabida a pretensão crediticia deduzida pelo recorrente. Frente ao art. 38 da Lei n° 8.038/90 e ao parágrafo 1° do art. 21 do RISTF, nego seguimento ao agravo.» Alegou a agravante que a presente ação, contrariamente ao que se verificou no precedente invocado na decisão impugnada, versa fatos verificados antes do advento da EC n° 23/83 (agosto/82 — dezembro/83), havendo sido sustentado que, em face da declaração de inconstitucionalidade da Resolução n° 7/80, do Senado Federal, deve prevalecer, ou incidir, a única alíquota constitucionalmente válida, isto é, a de 16%; e que, não obstante tenha a Constituição Federal feito menção, no art. 23, inc. II, ao crédito do imposto «cobrado» nas operações anteriores, há de entender-se que o sentido do termo «cobrado» não pode ser outro a não ser o de ICM «incidente» nas operações anteriores, posto que o direito ao crédito decorre da realização do fato gerador relativo à operação anterior, e não da circunstância de o montante devido ter, ou não, sido efetivamente recolhido. Aduziu ter sido esse o entendimento que prevaleceu no STF, relativamente às aquisições isentas, de matéria-prima, o que não impediu que o creditamento fosse efetuado, uma vez que o imposto foi considerado como «incidente» na operação anterior, por força do princípio da não•cumulatividade. Assim, se por deito da mencionada Resolução n° 07/80, do Senado, havia exoneração de uma parcela do ICM vendido para outro Estado, não poderia o Estado de destino exigir o tributo sobre essa parte, sob pena de enriquecimento ilícito. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro limar Gaivão (Relator): Mantenho o despacho agravado, pelos seus próprios fundamentos. R.T.J —150 O princípio da não-cumulatividade do ICM já se exprimia pela necessidade de abater-se «o montante cobrado nas anteriores (operações) pelo mesmo ou por outro Estado», como meio apto a impedir que o imposto incidente sobre a mercadoria, ao final do ciclo produção-distribuição-consumo, venha a ultrapassar, em sua soma, percentual superior ao correspondente à alíquota máxima prevista em lei para o tributo. Se, por efeito da alíquota reduzida, beneficiou-se a agravante com pagamento menor de imposto, não há como reconhecer-lhe direito a creditar-se, senão pelo quanfinn desembolsado, não havendo que se falar em exigência, pelo Estado de destino da mercadoria, da parcela que foi objeto de dispensa, se, na venda do produto ao consumidor, não afetada pela isenção parcial, embute-se o tributo integral, que a agravante se limita a recolher ao Fisco. Hipótese de idêntica natureza já foi apreciada por ambas as Turmas do Supremo Tribunal Federal (RE 135.189 e Ag. 283 143.387, de que fui relator e Ags. 135.832 e 135.512, relator Ministro Marco Aurélio). Manifesta, pelas razões expostas, a improcedência do agravo, meu voto é no sentido de negar-lhe provimento. EXTRATO DA ATA Ag 143.689 (AgRg) — SP —Rel.: Min. limar Gabião. Agtes.: Cia. Brasileira de Aço (Advs.: Celso Botelho de Moraes e outros). Agdo.: Estado de São Paulo (Advs.: Eliana Maria Barbieri Bertachini e outros). Decisão: A Turma negou provimento ao agravo, nos termos do voto do Relator. Unânime. Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Sydney Sanches, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e Ilmar GalVão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Artur Castilho Pereira Neto. Brasília, 21 de setembro de 1993 — Ricardo Dias Duarte, Secretário. AGRAVO DE INSTRUMENTO Ir 146.605 (AgRg) — PR (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro limar Gaivão Agravante: Banco Bamerindus do Brasil S.A. — Agravado: Joel Leite Pedroso Trabalhista. Bancária Horas extraordinárias. Deferimento com base nos fatos murados nas provas. Alegação de afronta ao art. 5°, inc. XXXV, da Constituição. A questão de saber-se se é justificável ou não pedido de reavaliação das provas colhidas nos autos, que levaram ao deferimento das horas extras, não se alça a nível constitucional, sendo inviável de exame na via do recurso extraordinário, a despeito da alegada negativa de prestação jurisdidonal e cerceamento de defesa. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Relator. 284 R.TJ. — 150 Brasília, 18 de maio de 1993 — Moreira Alves, Presidente — limar Gaivão, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro limar Gaivão (Relator): O Banco Bamerindus do Brasil S.A. apresenta agravo regimental, inconformado com o despacho que negou seguimento ao agravo de instrumento de teor seguinte (fls. 63/64): «O Banco Bamerindus do Brasil S.A., inconformado com a decisão regional que deferiu o pagamento, como extraordinárias, das sétimas e oitavas horas laboradas pelo obreiro bancário, recorreu, via revista, para o Tribunal Superior do Trabalho, apontando violação ao inc. XXXV do art. 5° da Constituição Federal, porquanto, no seu entender, não lhe foi prestada a jurisdição completa quando da decisão proferida em embargos de declaração, culminando com o cerceamento de defesa. Inadmitida a revista, foi interposto agravo de instrumento, que restou desprovido pela Terceira Turma daquela Corte. Está consignado no acórdão (fl. 37): «Todavia, o v. acórdão Regional (fls. 10/16), juntamente com a r. decisão declarativa, ao contrário do que alega o Recorrente, entregou-lhe ampla prestação jurisdicional, apreciando todas as questões que lhe foram submetidas a julgamento, fundamentando-as como prescreve a lei.» Daí o recurso extraordinário interposto pela instituição bancária, com fundamento no art. 102, BI, a, da Carta Federal, onde persiste o Banco na alegação de afronta ao art. 5°, inc. XXXV, porque, no seu entender, não houve uma análise dos fatos narrados nas provas, e as razões que levaram à formação do convencimento do julgador limitam-se à simples afirmação de que a prova tes- temunhal convence do fato alegado. Argúi, ainda, a inconstitucionalidade do art. 40 da Lei n° 8.177/91, que trata da exigência do depósito recursal. O recurso não foi admitido, por implicar o revolvimento de matéria finco-probatória, vedado pelo princípio inscrito na Súmula n° 279 desta Corte. Na minuta de agravo insiste o agravante na inconstitucionalidade da exigência do depósito recursal, e contesta a aplicação da Súmula, porque não pretende rever prova, mas sim saber os motivos que levaram à formação da convicção do juízo, já que, segundo alega, afirmações de natureza meramente dispositiva não atendem à necessidade de ampla defesa. Verifica-se que a decisão que deferiu as horas extraordinárias ao agravado o fez, à evidência, baseado «no conjunto probatório que dos autos consta, examinado à exaustão». Assim esclareceu o Tribunal Regional do Trabalho da e Região nos embargos declaratórios opostos com objetivo de sanar omissão referente à apreciação da prova Não há como o recorrente alegar que a decisão recorrida não lhe entregou a ampla prestação jurisdicional. Embora possa parecer inexata, aos olhos do recorrente, a jurisdição foi prestada. Assim, frente ao art. 38 da Lei n° 8.038/90 e ao â 1° do art. 21 do RISTF, nego seguimento ao agravo.» Insiste o agravante em que ocorrera negativa de prestação jurisdicional e cerceamento de defesa, tese que diz vir sustentando desde a interposição dos embargos de declaração na instância regional, mas, no entanto, a matéria foi rechaçada ao argumento de situar-se no âmbito estrito da prova Acrescenta que a preliminar argüida no recurso extraordinário e novamente colocada em destaque no agravo de instrumento, referente à inconstitucionalidade do R.TJ — 150 art. 40 da Lei n° 8.177/91, que exige depó- sito a cada novo recurso, foi apenas referida, mas não decidida pelo despacho ora ~o. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro limar Gaivão (Relator): A questão de saber-se se é justificável ou não o pedido de readdise das provas colhidas nos autos, que levaram ao deferimento das sétima e oitava horas como extras, não se alça a nível constitucional, sendo inviável de exame na via do recurso extraordinário. Embora o agravante insista que houve negativa da prestação jurisdicional e cerceamento de defesa, não se poderia averiguar tal ocorrência sem nova avaliação das provas e dos faros que as instâncias ordinárias consideraram demonstrados. Com relação à inconstitucionalidade da legislação que trata do depósito recursal na Justiça do Trabalho, como poderia o despacho deliberar a respeito dessa questão se não foi questionada no acórdão recorrido? O recurso extraordinário é julgado nos limites em que é interposto e em relação à matéria que ficara decidida no julgado. 285 A par disso, há em trâmite nesta Corte a Ação Direta de Inconstitucionalidade 836, que nata do referido tensa, cujo pedido de concessão de medida liminar foi indeferido em sessão plenária realizada em 11-293. Tala circunstância, nego provimento ao agravo regimental, mantendo íntegros os fundamentos do despacho agravado. EXTRATO DA ATA Ag 146.605 (AgRg) —PR — Rel.: Min. Ilmar Gaivão. Agte.: Banco Bamerindus do Brasil S/A (Advs.: Cristina Rodrigues Gontijo,Nicanor Favero Filho coutais). Agdo.: Joel Leite Pedroso (Adv.: Vivaldo Silva da Rocha). Decido: A Turma negou provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Relatar. Unânime. Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Sydney Sanches, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e limar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza. Brasília, 18 de maio de 1993 — Ricardo Dias Duarte, Secretário. AGRAVO DE INSTRUMENTO lsr 147.414 (AgRg) — RJ (Segunda Turma) Relatar. O Sr. Ministro Carlos Valioso Agravante: Lecy dos Santos Bastos — Agravados: Espólio de Luiz Eurico Ferreira e outros Constitucional. Acórdão: fundamentação. CF, art. 93, a I — Inocorrênda da falta alegada no sentido de que o acórdão não conteria fundamentação, com ofensa ao art. 93, IX, da Constituição Federal. II — RE inadmitido. Negativa de trânsito ao agravo de instrumento. Agravo regimental improvido. 286 R.T.J. — 150 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na C011formidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por decisão unânime, negar provimento ao agravo regimental. Ausentes, ocasionalmente, os ATmistrcs Paulo Brossard e Marco Aurélio. Brasília, 15 de junho de 1993 — Néri da Silveira, Presidente — Carlos Venoso, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Carlos Venoso: A decisão de fl. 250, por mim proferida, negou seguimento ao agravo de instrumento interposto de decisão denegatória do processamento de recurso extraordinário fundado no art. 102, a, da Constituição, em que se alega ofensa ao art. 93, IX, da mesma Carta. Publicada a decisão, interpõe Lecy dos Santos Bastos agravo regimental (fls. 252/254), sustentando que o acórdão recorrido ofendeu o art. 93, IX, da Constituição, porque «não contém uma linha sequer de fundamentação esclarecido o Motivo por que acolheu integralmente a reconvenção dos ora agravados e, em decorrência, mandou incluir no monte partilhável todos os bens arrolados um a um no pedido recon~danai». Contesta que pretenda discutir prova, afirmando que objetiva «exigir do Estado uma tutela fundamentada, que lhe esclareça o porquê de terem sido tais bens, de sua exclusiva propriedade, induídos na sociedade de fato». No que toca à alegada falta de prequestionamento, salienta que a violação ao texto constitucional surgiu no acórdão, pelo que interpôs embargos de declaração do acórdão recorrido, em que destacou, verbis: «Portanto, o decisum da ação e o dedsum relativo à reconvenção não foram fundamentados, motivo por que violou o Acórdão, de forma frontal, o inciso IX do art. 93 da Constituição Federal e, também, os arts. 131, 458, II e 459, do Código de Processo Civil». Pede, por isso, «seja reconsiderado o r. despacho ou, se assim não se entender, seja o presente recurso encaminhado à consideração da Colenda Turma..» É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Carlos Venoso (Relator): A agravante tem razão quando sustenta que interpôs embargos de declaração para o fim de prequestionar o dispositivo constitucional inscrito no art. 93, IX, da Constituição. Verifico que a ora agravante, mediante a petição e razões copiadas às fls. 163/168, sustentou, em embargos de declaração, que «o acórdão não apresentou qualquer fundamento para dar pela procedência da reconvenção». (fls. 165/168). Rememoremos a questão. A ora agravante, Lecy dos Santos Bastos, ajuizou ação ordinária de declaração de sociedade de fato, cumulada com declaratória de sua propriedade sobre os bens adquiridos na sua constância, com reivindicação dos referidos bens, contra o Espólio de Luiz Eurico Ferreira e contra os herdeiros necessários Luiz Eurico FerreiraFilho, Gustavo Adolfo Brito F,asjra, Maria Cristina Peneira Moura Brasil do Amaral e seu marido Oswaldo Moura Brasil do Amaral Filho, e Luiz Eduardo Brito Ferreira (fls. 13/47). A açãofoi contestada, tendo sido apresentada, também, reconvenção (fs. 84 e ss.). A ação foi julgada procedente, e improcedente a reconvenção, por sentença do MM. Juiz de Direito (fls. 144/151). Os réus-reconvintes apelaram (fl. 152). A ?Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, pelo acórdão que está, por cópia, às fls. 154/158, lavrado pelo Desembargador Wehbi Dib, deu «parcial provimento ao recurso para diminuir-se R.TJ — 150 a partilha». O acórdão preservou os lega dos, vale dizer, o que o finado Luiz Enrico Fentira legou, em testamento, para a apelada, ora agravante. Preservou, também, «os bens vindos à autora durante o período, os quais permanecerão consigo, porque assim desejou o companheiro». Entendeu o acórdão, todavia, que «não faz jus a apelada à meação». E deu as razões por que assim decidia (fls. 1571158), concluindo, então, por dar «parcial provimento aos apelos para julgar-se procedente a reconvenção, no que concerne à partilha, ficando diminuída da metade para os parâmetros acima, mantido o reconhecimento da sociedade de fato». (fl. 158) A ora agravante, repito, intapôs embargos de declaração: sustentou que o acórdão julgara extra pana (fis. 163/165)e que apresenta ausência de fundamentação (lis. 165/168). Julgando esses embargos, o Tribunal esclareceu, no ponto em que se alega falta de fimdamentação, que «o acórdão vem com cinco páginas de fundamentação.A leitura de fls. 92.35 a 9237 reflete inconformismo, mas sem comprovar qualquer dos vícios entnnerados no art. 535 do diploma proa- c omo Por tais motivos, nega-se provimento ao recurso de Lecy dos Santos Bastos». (fls. 172/174, especialmente fl. 173). Posta assim a questão, é fácil verificar que o agravo regimental deve ser improvido. É que, ao contrário do alegado, o acórdão está fundamentado. Pode não estar impecavehnente fundamentado, mas está suficientemente fundamentado. É consultá-lo, por cópiaàs fis. 154/158.A fundamentação que está 287 ali posta embasa a procedência da reconvenção. O que não é possível é verificar, na instância extraordinária, se a fundamentação fálica está ou não correta. O Tribunal a quo, em tal matéria, decide soberanamente, pelo que não pode a ora agravante, agora, pretenda o seu =exame. Mantenho, pois, o que escrevi no fecho da decisão agravada: «Observe-se, ademais, que os acórdãos de fls. 154/158, 172/174 e 180/181 estão suficientemente fundamenta dos. Sem dúvida, o que pretende o recorrente é o reexame de provas, o que é vedado na via extraordinária». Do exposto, nego provimento ao agravo regimental. EXTRATO DA ATA Ag 147.414 (AgRg) —RJ —Rel.: Min. Carlos Venoso. Agte.: Lecy dos Santos Bastos (Advs.: Mauro Fichtner Pereira e outros). Agdos.: Espólio de Luiz Enrico Parara e outros (Adv.: Paulo Fontenelle). Agdos.: Maria Cristina Ferreira Moura Brasil do Amaral e cônjuge (Adv.: João Borsidi Neto). Decisão: Por unanimidade, a Turma negou provimento ao agravo regimental. Ausentes, ocasionalmente, os Ministros Paulo Brossard e Marco Aurélio. Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Paulo Brossad, Carlos Venoso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Mantem Costa Pinto. Brasília, 15 de junho de 1993 — José Wilson Aragio, Secretário. AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 147.935 (Agltg) — RS (Segunda Turma) Relator: O Sr. Afmistro Carlos Venoso Agravante: Instituto Nacional do Seguro social — INSS — Agravado: Alfredo Rojabn R.TJ. — 150 288 Constitucional. Preridencikrio. Benefício. CF, art. 201, § § 5* e 6'. I — Alegação no sentido de que o acórdão, tendo decidido pela auto-aplicabilidade dos § § 5" e 6° do art. 201, da Constituição, teria violado o art. 2° da mesma Carta, que consagra o principio da independência e harmonia dos Poderes. Improcedência do alegado, dado que cabe aoJudiciário fazer valer a vontade concreta da Id e da Constituição. Para isto, há de interpretar a uni ou a Constituição, sem que isto implique ofensa ao princípio inscrito no art. 2° da CF. II — RE inadmitido. Agravo improvido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na confonnidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por decisão unânime, negar provimento ao agravo regimental. Brasília, 9 de março de 1993 —Néri da Silveira, Presidente — Carlos Velloso, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Carlos Velloso: Tratase de agravo regimental contra decisão que negou seguimento ao agravo de instrumento da decisão denegatória do processamento de recurso extraordinário interposto de acórdão que decidiu pela auto-aplicabilidade dos §§ 5° e 6° do art. 201 da Constituição. O recurso extraordinário fundamentase no art. 102, III, a, da mesma Carta, argumentando que o acórdão ofendeu o art. 2° da Lei Maior. É deste teor a decisão agravada: «Entende a decisão agravada que o recorrente não conseguiu demonstrar o modo pelo qual o princípio da independência e harmonia dos poderes, inscrito no referido artigo 2°, fora violado. Está correta a decisão. O Tribunal, entendendo auto-aplicáveis os §§ 5° e 6° do art. 201 da Constituição, simplesmente fez o que lhe cabia, dado que cabe ao Judiciário fazer valer a vontade concreta da lei e da Constituição. Para isto, há de interpretar a lei ou a Constituição. E foi o que ocorreu. Nego seguimento ao agravo.»-(fl. 36) Sustenta o agravante que a questão constitucional foi exaustivamente ventilada na decisão recorrida. Ademais, o Ministro Relator, ao negar seguimento ao recurso interposto, afirmando que o Tribunal a quo fez valer a vontade concreta da Constituição, entendendo auto-aplicáveis os §§ 5° e 6° do art. 201, da Constituição, teria extrapolado os limites estabelecidos no art. 38 da Lei 8.038/90, tuna vez que o recurso não saia intempestivo, incabível ou improcedente, além de não ser matéria sumulada nesta Corte. Alude, finalmente, ao parecer emitido pelo Ministério Público Federal no RE 151.080-3-SP,favorávelà pretensão do recorrente, e a julgados do Egrégio Tribunal Regional Federal da 1' Região, no sentido de que o beneficio previdenciário previsto no art. 201, § 5°, da Constituição, depende de norma regulamentadora. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Carlos Venoso (Relator): Sustentou a autarquia agravante, no recurso extraordinário, que «O Poder Judiciário ao deferir a pretensão postulada na inicial se investiu de prerrogativas que são do Poder Legislativo, quebrando e ferindo o principio estabelecido no artigo 2° da R.TJ —150 Constituição Federal, da independência e harmonia dos Poderes». Esta foi a questão constitucional posta no recurso extraordinário. O eminente Presidente do Tribunal a quo, ao indeferir o processamento do RE, sustentou que o recorrente não conseguiu demonstrar o modo pelo qual o princípio da independência e harmonia dos poderes, inscrito no artigo 2°, da Constituição, fora violado. Constei acertada essa decisão, por isso que, entendendo o acórdão auto-aplicáveis os âl) 5° e 6° do art. 201 da Constituição, simplesmente fez o que lhe cabia, dado que compete ao Judiciário fazer valer a vontade concreta da lei e da Constituição. Para isto, há de interpretar a lei ou a Constituição, sem que isto implique ofensa ao princípio da independência e hamsonia dos Poderes (CF, art. 2°), princípio que o ora 289 agravante afirmou, no RE, que fora violado. Do exposto, nego provimento ao agravo regimental. EXTRATO DA ATA Ag 147.935 (AgItg) — RS —Rel.: Min. Carlos Valioso. Agte.: Instituto Nacional do Seguro Social — INSS (Advs.: Jayme Paz da Silva e outros). Agdo.: Alfredo Rojalut (Adv.: Nilvin Ehlert). Decisão: Por unanimidade, a Turma negou provimento ao agravo regimental. Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Paulo Brossard, Carlos Valioso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Haroldo Ferraz da Nóbrega. Brasília, 9 de março de 1993 — José Wilson Aragão, Secretário. AGRAVO DE INSTRUMENTO PP 148.658 (EDcI-AgRg) — (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Carlos Venoso Embargante: Instituto Nacional do Seguro Social — INSS — Embargado: Atilia Capovila Processual cialL Embargos de declaração. RISTF, art. 337. I — In000rrênda, em termos objetivos, dos pressupostos dos embargos de declaração: dúvida, obscuridade, contradição ou omissão. RISTF, art. 337. II — Embargos de declaração rejeitados. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por decisão unânime, rejeitar os embargos de declaração. Brasília, 11 de maio de 1993 — Néri da Silveira, Presidente — Carlos Vdloso, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Carlos Velloso:O acórdão negou provimento ao agravo regimental interposto contra decisão que negou se- 290 R.TJ.— 150 guimento ao agravo de instrumento da decisão indeferitória do processamento de recurso extraordinário manifestado com fardamento no art. 102,111, a, daConstituição, em que se alegava violação ao § 5° do art. 195, da mesma Carta. Foi assim ementado o acórdão: .S.,menta: ConstitudonaL Previdenetário. Revisão e reposição de beneficio. CF, art. 201, § 5°. Recurso extraordinário: questão constitucional posta no RE que não foi decidida pelo acórdão. I —Eficácia plena e aplicabilidade imediata da norma inscrita no § 5° do art. 201 da Constituição. Esta a questão decidida pelo acórdão. II— A questão constitucional posta no RE — ofensa ao § 5° do art. 195 da CF — não foi decidida pelo acórdão. Não cabimento, por isto, do RE. III—RE inadmitido. Agravo regimental improvido.» (fl. 45) Publicado o acórdão, interpõe o Instituto Nacional do Seguro Social embargos de declaração (fls. 47/50), alegando ter havido omissão e obscuridade na decisão ora embargada, pois a questão posta no recurso extraordinário versaria exatamente sobre a auto-aplicabilidade do § 5° do art. 201 da Lei Maior e, a referência ao § 5° do art. 195, da mesma Carta teria sido feita, «simplesmente, pela íntima correlação entre uma e outra norma, retro». Ademais, o exame da auto-aplicabilidade do mencionado § 5° do art. 201 da Constituição somente seria possível à luz dos arts. 58 e 59 do ADCT, relacionando-se com o princípio constitucional da previsão da fonte de custeio do benefício previdenciário (CF, art. 195, § 5°). Finalmente, alude o recorrente à jurisprudência do Egrégio Tribunal Regional Federal da r Região, compendiada em Súmula, bem como aos Mandados de 1njunção n°s 215-1-RS, Rel. Min. Celso de Mel- lo e 322-O-DF, Rel. Min. Néri da Silveira, cujas decisões seriam «diametralmente opostas ao do venerando decisório ora recorrido». É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Carlos Velloso (Relator): A dúvida que autoriza os embargos de declaração é a dúvida objetiva. O mesmo deve ser dito em relação à omissão e à obscuridade. É que a dúvida objetiva, tal como a obscuridade e omissão, podem ser sanadas. Já a dúvida subjetiva, esta se resolve com a leitura atenta do acórdão. É o caso dos autos. Aqui, no RE, a autarquia recorrente sustentou que o acórdão ofendera o art. 195, § 5°, da Constituição, argumentando que a majoração de benefícios previdenciários para um salário mínimo dependeria da criação da respectiva fonte de custeio, mediante lei ordinária. A questão constitucional decidida pelo acórdão, entretanto, foi outra: a eficácia plena e aplicabilidade imediata da norma inscrita no § 5° do art. 201 da Constituição. Quer dizer, o acórdão não decidiu a questão constitucional posta no recurso extraordinário. Exatamente isto o que ficou proclamado no acórdão desta Tunna, às fls. 34/38. O acórdão embargado, pois, não incidiu nas increpações que lhe faz a embargante, que pretende, na verdade, um novo julgamento, dado que empresta efeitos modificativos aos embargos; numa outra perspectiva, os embargos poderiam ser considerados protelatórios. Numa outra oportunidade poderei voltar ao tema, tendo em vista o disposto no § 2° do art. 339 do Regimento Interno, ou parág. único do art. 538, CPC. Rejeito os embargos. EXTRATO DA ATA Ag 148.658 (EDcl-AgRg) — SP — Rel.: Min. Carlos Velloso. Embte.: Instituto Nacional do Seguro Social — INSS (Adv.: R.TJ —150 Francisco Antonio Fogaça). Embda.: Atilia Capovila (Adva: Maria Rosalina Nichos Domiciano). Decisão: Por unanimidade, a Turma rejeitou os embargos de declaração. Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira Presentes à Sessão os Srs. Ministros 291 Paulo Brossard, Carlos Venoso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Mardem Costa Pinto. Brasília, 11 de maio de 1993 — José Wilson Aragão, Secretário. RECURSO EXTRAORDINÁRIO Isr 148.663 — SP (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello. Reclamante:União Federal — Reclamada:Têxtil São João Clitnaco Ltda. Contribuição social sobre o lucro das pessoas jurídicas. Lei tt* 7.689/1181 Natureza jurídica A questão da Lei Complementar. Princípio da irretroatividade das leis tributárias. Inconstitucionalidade da cobrança com referência ao período-base de 1988. Precedentes do STF. Recurso extraordinário provido em parta A qualificação jurídica da exação instituída pela Lei n° 7.689188 nela permite identificar espécie tributária que, embora não se reduzindo à dimensão conceituai do imposto, traduz típica contribuição social, constitucionalmente vinculada ao financiamento da seguridade social. Tributo vinculado, com destinação constitudonal específica (CF, art. 195,1), essa contribuição social sujeita-se, dentre outras, às limitações instituídas peio art. 150, I e IQ, a, da Carta Política, que consagra, como instrumentos de proteção jurídica do contribuinte, os postulados fundamentais da reserva legal e da irretroatividade das leis tributárias. A norma inscrita no art. 8° da Lei n° 7.689/88 — que tornou exigível a contribuição social em questão «a partir do resultado apurado no período-base a ser encenado em 31 de dezembro de 1988» — vulnerou, de modo frontal, o princípio da irretroatividade das leis tributárias, que veda a cobrança de tributos «em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado» (CF, art. 150, III, a). ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Primeira Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em conhecer do recurso e, em parte, lhe dar provimento. Brasília, 13 de outubro de 1992 — Moreira Alves, Presidente — Celso de Mello, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Celso. de Mello: Tratase de causa em que se discute a legitimidade constitucional da contribuição social sobre o lucro das pessoas jurídicas, instituída 292 RTJ. —150 pela Lei n° 7.689, de 15-12-88, para financiamento da seguridade social. O Tribunal Regional Fedeu! da 3' Região, ao julgar a ação em grau de recurso, reportou-se a precedente jurisprudencial do Plenário da Corte para declarar a inconstitucionalidade do próprio ato legislativo de que derivou a criação da contribuição referida Daí o presente recurso extraordinário, interposto pela União Federal com fundamento no art. 102, III, a e b, da Constituição, que venho submeter à apreciação desta Primeira Turma. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): A questão da constitucionalidade da contribuição social instituída pela Lei n° 7.689/88 já foi objeto de apreciação pelo Plenário desta Corte, que, ao julgar o RE 138.284-PA, Rel. Min. Carlos Velloso, estatuiu, verbis: «ConstitudonaL Tributário. Contribuições sodais. Contribees inddentes sobre o lucro das pessoas jurídicas. Lei n" 7.689, de 15-12-88. I — Contribuições parafiscais: contribuições sociais, contribuições de intervenção e contribuições corporativas. CF, art. 149. Contribuições sociais de seguridade social. CF, arts. 149 e 195. As diversas espécies de contribuições sociais. II — A contribuição da Lei n° 7.689, de 15-12-88, é uma contribuição social instituída com base no art. 195, I, da Constituição. As contribuições do art. 195, I, II, III, da Constituição, não exigem, para a sua instituição, lei complementar. Apenas a contribuição do parág. 4° do mesmo art. 195 é que exige, para a sua instituição, lei complementar, dado que essa instituição deverá observar a técnica da competência residual da União (CF, art. 195, parág. 4°; CP, art. 154, D. Posto estarem sujeitas à lei complementar do art. 146, III, da Constituição, porque não são impostos, não há necessidade de que a lei complementar defina o seu fato gerador, base de cálculo e contribuintes (CF, art. 146, III, a). —Adicional ao imposto de renda: classificação desarrazoada. IV — Irrelevância do fato de a receita integrar o orçamento fiscal da União. O que importa é que ela se destina ao financiamento da seguridade social (Lei n° 7.689/88, art. 1°). V — Inconstitucionalidacle do art. 8°, da Lei 7.689/88, por ofender o princípio da innroatividade (CF, art. 150, III, a) qualificado pela inexigibilidade da contribuição dentro do prazo de noventa dias da publicação da lei (CF, art. 195,§ 6°). Vigência e eficácia da lei: distinção. VI — Recurso Extraordinário conhecido, mas improvido, declarada a inconstitucionalidade apenas do artigo 8° da Lei n° 7.689, de 1988.» A qualificação jurídica da exação instituída pela Lei n° 7.689/88 nela permite distinguir uma espécie tributária que, embom não se reduzindo à dimensão conceituai do imposto, traduz típica contribuição social, constitucionalmente vinculada ao financiamento da seguridade social. Tributo vinculado, com destinação constitucional específica (CF, art. 195, I), essa contribuição social sujeita-se às limitações instituídas pelo art. 150, I e III, a, da Carta Polida que consagra, como instrumentos de proteção jurídica do contribuinte, os postulados fundamentais da reserva legal e da irretroatividade das leis tributárias. No caso, o princípio da reserva absoluta de lei foi observado, eis que, para efeito de criação da contribuição prevista no inciso I R.T.J —150 do art. 195 da Constituição Federal, não se revela exigível lei complementar, só reclamada para instituição de «outras fontes destinadas a garantir a manutenção ou expansão da seguridade social...» (grifei — CF, art. 195, § 4°). Não se pode desconhecer, a propósito do terna concernente à exigibilidade de lei complementar para a disciplinação normativa de certas matérias, que «É doutrina pacífica, em face do direito constitucional federal, que só se exige lei complementar para aquelas matérias para as quais a Carta Magna Federal, expressamente, exige essa espécie de lei...» (RTJ 113-392, 398, Rel. Min. Moreira Alves). As leis complementares, assim qualificadas em função de expressa designação formal pela Carta Federal, constituem espécies normativas típicas ou nominadas. A sua designação jurídica emerge, desse modo, do próprio documento constitucional. Rege-as, portanto, um princípio de índole constitucional — o da tipicidade positiva, que só considera leis complementares aquelas que ostentem, no plano da Constituição, esse nomear jutas. A Carta Federal, na realidade, prestigiou o conceito formal ou jurídico-positivo de lei complementar, para, com isso, distingui-la das demais leis interativas de normas constitucionais de eficácia limitada (v. Geraldo Ataliba, «Lei Complementar na Constituição», pág. 30, 1971, RT.; José Souto Maior Borges, «Lei Complementar Tributária», págs. 34/35,1975, RT/Educ; Cebo Bastos, «Lei Complementar», págs. 16/17, 1985, Saraiva). Ene, também, o magistério de José Afonso da Silva (v. «Aplicabilidade das Normas Constitucionais», pág. 235, 1968, RT), verbis: «Devemos, desde a vigência da Constituição de 1967, modificar essa terminologia, reservando *expressão leis com- 293 planentares da Constituição apenas para designar aquelas assim previstas no Estatuto Básico da República....» O novo ordenamento constitucional não submeteu ao domínio normativo de lei complementar a instituição das contribuições sociais previstas no art. 195, I, o que legitima, em conseqüência, a sua veiculação mediante simples lei ordinária. Não há, pois, como tratar desse tema em sede de legislação complementar. Afinal, como ressalta Geraldo Andiba (v. «Interpretação no Direito Tributário», pág. 131, 1975, Educ/Saraiva), «(...) só cabe lei complementar, quando expressamente requerida por tecto constitucional explícito. O Congresso Nacional não faz lei complementar à sua vontade, ao seu talante. No sistema brasileiro, só há lei complementar exigida expressamente pelo texto constitucional.» (Grifei) Por outro lado, a existência de expressa autorização constitucional para a cobrança das contribuições sociais (CF, art. 195, I) afasta, por si só, a alegada ofensa ao art. 154, I, do ordenamento constitucional, que proclama o princípio do non bis in idem. Impõe-se observar, finalmente, que a norma inscrita no art. 8° da Lei n° 7.689/88 —que tornou exigível a contribuição social em questão «a partir do resultado apurado no período-base a ser encenado em 31 de dezembro de 1988» — vulnerou, de modo frontal, o princípio da irretroatividade das leis tributárias, que veda a cobrança de tributos «em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado» (CF, art. 150, IQ, a). Daí, a advertência desta Corte, quando do julgamento do RE 146.733-SP, Rel. Mia Moreira Alves, no sentido de que «... a Lei n° 7.689/88, (....) ao determinar, em seu artigo 8°, que essa contribuição já seria devida a partir do lucro 294 R.T.J. — 150 apurado no período-base a ser encerrado em 31 de dezembro de 1988, violou o princípio da irretroatividade contido no artigo 150,11!, a, da Constituição Federal, que proíbe que a lei que institui tributo tenha como fato gerador desse tributo fato ocorrido antes do início da vigência dela» Com estas considerações, e na linha da jurisprudência desta Corte, firmada a partir do julgamento do referido RE 146.733-SP, Rel. Min. Moreira Alves, conheço do recurso e dowlhe provimento, em parte, para, afastando a inconstitucionalidade dos arts. 1°, 2° e 3° da Lei n° 7.689/88, declarada pelo Tribunal a quo, reconhecer a ilegitimidade constitucional tão-somente do art. 8" desse diploma legal, que estabelece, como fato gerador da contribuição em causa, o lucro apurado ainda no período-base findo em 31-12-88. Nesse sentido é o meu voto. EXTRATO DA ATA RE 148.663 — SP — Rel.: Min. Celso de Mello. Recte.: União Federal. (Adv.: Procuradoria da Fazenda Nacional). Renda: Têxtil São João Climaco Ltda. (Adv.: Norton Vilas Boas). Decisão: A Turma conheceu do recurso e lhe deu provimento, em parte, nos termos do voto do Relator. Unânime. Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Octavio Gallotti, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e limar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza. Brasília, 13 de outubro de 1992 — Ricardo Dias Duarte, Secretário. RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 149.478 (AgRg) — MG (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence Agravante: Companhia Cimento Portland Itaú — Agravada: União Federal RE, a: acórdão recorrido de órgão fracionário do Tribunal a quo, fundado na afirmação incidente de constitucionalidade da lei discu- tida, já antes declarada pelo Plenário, em outro processo: hipótese em que, se o acórdão recorrido tem motivação própria, se dispensa a documentação do teor da decisão plenária no mesmo sentido: revisão da jurisprudência anterior. Cuidando-se de declaração incidente de oonstitucionalidade — e não de inconstitucionalidade — da lei, a competência, quando for o caso, será do órgão parcial a quem couber, segundo as normas gerais aplicáveis, julgar o caso concreto (CF, art. 97; CPC, art. 481). Nessa hipótese, — ao contrário do que sucede no caso de declaração de inconstitucionalidade — o acórdão plenário que, decidindo incidente suscitado em outro processo, já houver resolvido, no mesmo sentido, a prejudicial de inconstitucionalidade, é mero precedente de jurisprudência, que não integra, formalmente, porém, a decisão da Câmara ou da Turma. R.TJ — 150 295 Certo, se a última se limita a reportar-se ao precedente do plenário, a juntada deste se fará necessária, quando da interposição do recurso extraordinário, para documentar os fundamentos da decisão recorrida e o prequestionamento dos temas ventilados no apelo constitudonal. Não é o caso, porém, se — invocando ou não o precedente plenário — a decisão da Câmara ou da Turma contém, em si mesma, a motivação da declaração incidente de conslitudonalidade. 5. Revisão da jurisprudência em contrário. ACÓRDÃO Em hipótese similar (RE 156.309-5, 17-10-92, Pertence), decidiu a r Turma Vistos, relatados e discutidos estes audesta Corte: tos, acordam os Ministros do Supremo Tri«RE: acórdão recorrido de Turim bunal Federal, em Sessão Plenária, na condo Tribunal a quo, fundado na obformidade da ata do julgamento e das notas servância devida à decisão plenária taquigrfficas, por unanimidade de votos, anterior da questão de inconstitucioem dar provimento ao agravo regimental nalidade da norma incidente na caupara determinar o processamento do recursa: ausência nos autos, do acórdão so extraordinário. plenário, que inviabiliza o recurso. Brasília, 24 de março de 1993 — SydSó a declaração de inconstitucioney Sanches, Presidente — Sepúlveda nalidade da lei é privativa do plenário Pertence, Relator. dos Tribunais (CF, art. 97), não a RELATÓRIO rejeição da argüição de inconstitucionalidade; não obstante, se a TurO Sr. Ministro Sepúlveda Patenee: Nema, Câmara ou Seção a submete ao guei seguimento ao recurso extraordinário Pleno, a decisão deste, ainda que denestes termos (fl. 249): clare constitucional a lei questiona«Cuida-se de RE de Companhia Cida, se integra, no ponto, ao acórdão mento Portland Baú contra decisão de que, no órgão parcial, a aplica ao caso Turma do Tribunal a quo, que aplicou concreto: dai, a necessidade, também ao caso concreto decisão precedente do nessa hipótese, de que o teor do acórseu Plenário, declaratória da constitudão plenário seja trazido aos autos para que se possa examinar o recurso cionalidade da Lei n° 7.689/88 (contribuição social sobre o lucro dos empreextraordinário.» gadores). A omissão inviabiliza, pois, o RE, ao qual nego seguimento.» Dos autos não consta, entretanto, o teor do acórdão do Tribunal Pleno que Tempestivamente, opfle a recorrente agradecidiu e rejeitou o incidente de incons- vo regimental, com estes fundamentos (fls. titucionalidade. 252/256). De aplicar-se, pois, a jurisprudência a postura data venta formalistica de se exigir presente aos autos o acórdão do Plenário (RE 121 A87, 23-8-90, Pertence) e de ambas as Turmas do STF, de decisão plenária, quando a ela se refere o acórdão recorrido, não pode ser estas a partir do julgamento pela Primeira Turma, do AgRg RE 141.988, de levado a extremos de inviabilizar por completo a total manifestação dessa E 5-5-92. —150 296 Corte, quando já consta do r. acórdão a que todos os elementos e fundamentos para bem ser aferida a natureza da discussão, e o embasamento a que se utilizaram aqueles outros juízes.» (...) «Quando da interposição do Recurso Especial e RecursoFxtraordinfaio, não havia, ali relação a ate ótimo, o namdasalto regimental ou mesmo precdto de jurisprudência de San formal que a então Recorrente devais observar, quanto iro juntada do exigido acórdão. E se não havia essa obrigatoriedade, e da leitura do v. acórdão guerreado, já é possível aferir as razões e argumentos sobre os quais se embasa, como então, após admitido e distribuído e processado nessa Corte, podeo apelo extremo ser alvo de decisão que o inadmite sob a pecha de desconformidade formal? Data veria, e sem querer em momento algum ofender, a r. decisão jurisprudencial que !estreia o r. despacho passa a ter força de precdto normativo de cunho regimental, e portanto de se aplicar a todos os Recursos Extraordinários que venham a ser processados, mas não de forma retroativa àqueles já em trâmite no STF, como é o caso presente. Mas an se admitindo esse efeito retroativo, que ao menos se permita a oportrmidade de uma regularização formal. Com efeito, a carga audológica da decisão plenária do e é de todo relevante (pulado firma a exigincia das condições para uma efetiva e séria apreciação do inteiro teor da discussão a que se seguiu para rejeitar ou acolher incidente de inconstitucionalidacle de lei. ns É pertinente esse dado valorativo quando, por exemplo, o Recurso Fatraordinftrio esteja calcado em acórdão que simplesmente se limita a decidir invocando precedente do plenário de sua própria cone. Até repise está de pleno acordo. O que o Agravante não concorda é estender esse entendimento a todo e qualquer Recurso Extraordinário, sem se aferir se o acórdão especifico não traz osdasare seriam necessários para compres a profundidade e teor do pensamento que esteve a presidir seus protetores. Com efeito Excelência, a decisão recorrida do E. Tribunal Regional Federal da 1° Região, traz esses elementos e subsídios, deforma que não saia necessária a análise do acórdão plenário, da mesma Corte a que se refere, em vista de já estarem presentes os dados que são hábeis para julgar haver ofensa ou não ao texto constitucional. Mas não é sól Em que pesem os argumentos precedentes, a matéria a ser objeto de decisão no Recurso Extraordinário da Agravante já foi decidida an plenária do próprio &grano Mirairei Fedarst.epataars tear, validade e akatassalsta datanuliinkin,da Lei n• 7.61 Se assim é, e havendo pacífico catardimano dessa matéria, é de se indagar: que prejuízo causou &ausência do acórdão a que se refere o despacho agravado? Prejuízo lavada no catardes de v. Ex.*, cudo nade ate a Agravada promove a jantada de aludido acórdão, obtido ~cópia autenticada perene o E. TRF-1', da decisão plenária no REO n° 89.01.097818-MT (vide anexo). Reza o artigo 5° da Lei de Introdução ao Código Civil (a lei das leis), que na aplicação da lei o juiz atenderá aos fins sociais aquecia se dirige e às exigências do bem comum. Ora, que maior finalidade há na lei processual que conduzir as partes e o órgão julgadora uma sadafatória composição da lide nos termos R.T..1 —150 de fazer valer o ordenamento jurídico? os fundamentos da decisão recorrida e o É evidente que as normas processuais prequestionamento dos temas ventilados caminham para a decisão da lide, na no apelo constitucional. composição do conflito, e data veda Não é o caso, porém, se — invocando não em ressaltar facetas técnicas proces- ou não o precedente plenário — a decisão suais. Não são, evidentemente, os mean- da Câmara ou da Turma contém, em si dros técnicos que devem amolecer, mas mesma, a motivação da declaração incidensim a finalidade soda! de apazigua- te de constitucionalidade. mento das relações sociais em face da II norma constitucional, corolário em se atingir o bem comum que dela decorre, Pronto esse modestíssimo voto, ontem, dentro do Estado de Direito. recebi memorial dos ilustres advogados A prevalecer a r. decisão agravada, Min. Xavier de Albuquerque e Aluisio Xaestar-se-á desvirtuando tudo que o direi- via de Albuwaque, o qual constitui, como to propriamente pretende e assegura era de esperar, contribuição valiosa ao enneste caso concreto, quando orientações riquecimento da discussão. de ordem formal não podem sobrepor a A partir de passagem do voto do emiprópria razão de ser da prestação juris- nente Ministro Moreira Alves, no RE dicional.» 121.487, para quem, nos casos de que se Juntou-se o inteiro teor do acórdão ple- cogita, a ausência nos autos dos fundamennário do Tribunal a quo, cuja ausência nos tos da decisão plenária equivale «à falta de autos motivou a negativa de seguimento do prequestionamento das questões constitucionais», depois aventadas no recurso exRE (fls. 258/422). traordinário (RTJ 133/459, 468), o memoÉ o relatório. dal opõe reparos ao que aos autores se afigurou «apuros de rigorismo formal», inVOTO compatíveis com a missão precfpua de O Sr. Ministro Sepálveda Pertence guarda da Constituição, que o texto de (Relator): De minha parte, rendo-me à ar- 1988 conferiu ao Supremo Tribunal Fedegumentação da agravante. ral, em «preceituação normativa (...) de Cuidando-se de declaração incidente de explicitude inédita.» constitucionalidade —e não de inconstituDe minha parte, contudo, jamais situei cionalidade — da lei, a competência, quan- o fundamento básico da orientação firmada do for o caso, será do órgão parcial a quem na desatenção à exigência do prequestionacouber, segundo as normas gerais aplicá- mento. veis, julgar o caso concreto. Certo, no voto referido do Ministro MoNessa hipótese, o acórdão plenário que, reira Alves, a inogação do vício de falta de decidindo incidente suscitado em outro prequestionamento era pertinente —e nisprocesso, já houver resolvido, no mesmo so parece estar acorde o memorial (ti. 10, § sentido, a prejudicial de inconstitucionali- 15) — porque efetivamente o acórdão redade, é mero precedente de jurisprudência, corrido se limitava, no caso concreto então que não integra, formalmente, porém, a examinado, à invocação do precedente do decisão da Câmara ou da Turma. Plenário do Tribunal Federal de Recursos, Certo, se a última se limita a reportar-se que acolhas a argüição de inconstitucionaao precedente do plenário, a juntada deste lidade da lei questionada. se fará necessária, quando da interposição Há casos numerosos, entretanto, nos do recurso extraordinário, para documentar quais, ao contrário, embora invocando a 298 R.TJ. — 150 declaração plenária da inconstitucionalidade aventada, o acórdão ulterior do órgão parcial arrola, com maior ou menor extensão, os fundamentos da ilegitimidade constitucional declarada e nessa hipótese realmente não é a ausência de prequestionamento que pode opor ao conhecimento do recurso extraordinário. Por isso, ao proferir, nesta Turma, o voto-condutor do AgRg RE 141.988, de 5-5-92 — salvo engano, o primeiro de nova série sobre o tema —, já não aludi ao problema do prequestionamento, como se verifica da síntese da motivação do julgado, que consignei na ementa «RE: acórdão recorrido de Turma do Tribunal a quo, fundado na observância devida à decisão plenária anterior da questão de inconstitucionalidade da norma incidente na causa: ausência, nos autos, do acórdão plenário, que inviabiliza o recurso. Emprocessos cujo julgamento caiba a órgãos parciais do Tribunal, suscitada a argüição de inconstitucionalidade da norma incidente, dá-se repartição de competência por objeto do juízo, devolvendo-se ao Plenário a decisão da questão prejudicial de constitucionalidade. Desse modo, é no acórdão plenário que se há de buscar a motivação da decisão recorrida, com respeito à argüição de inconstitucionalidade, sendo indiferente o que a propósito do mérito dela, contra ou a favor, se diga no acórdão da Turma.» Nessa linha, data venda, sigo convencido do acerto da jurisprudência. Na hipótese de aplicação pelo órgão parcial de decisão plenária declaratória de inconstitucionalidade de lei, o que se tem, na decisão do caso concreto, é realmente um julgamento subjetivamente complexo, cuja documentação formal reclama a presença de ambos os acórdãos que o compõem: estou em que não se pode qualificar de «tearicalidade subalterna», nem como «apuros de rigorismo formal» que, para a discussão entre as partes e o julgamento do recurso extraordinário, se reclame a presença nos autos do acórdão plenário que, precisamente no que diz com a questão constitucional que constitui o seu tema, substantiva a decisão recorrida, objeto do apelo. Certo, ao raciocínio contrapõe o memonal — invocando a autoridade do douto Barbosa Moreira — que a decisão plenária no incidente de inconstitucionaldiade, só é «vinculativa para o órgão fracionário, no caso concreto», não havendo regra legal «que a torne obrigatória ad futuram». Desse modo, a rigor, só no mesmo processo em que se suscitou a prejudicial de inconstitucionalidade é que a decisão plenária se incorporaria ao acórdão que o julgou. Aventei o problema no voto que proferi no RE 121.791 — afinal prejudicado por desistência do recorrente — verbis: «No âmbito do Supremo Tribunal, o art. 101, RISTF, que mantém sua força de lei, prescreveu que «a declaração de constitucionalidade ou inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, pronunciada por maioria qualificada, aplica-se aos novos feitos submetidos às Turmas ou ao Plenário», ressalvada a proposta de revisão da jurisprudência (art. 103). Ao disciplinar, para os outros tribunais, o incidente da argüição de inconstitucionalidade (arts. 48W482), o C. Pr. Civ. não conferiu expressamente à declaração plenária essa eficácia vinculante dos órgãos parciais de cada tribunal, fora do processo em que proferida. Não obstante, é certo que se tem difundido a rotina de aplicação pelas Turmas da precedente declaração de inconstitucionalidade, dispensando-se nova remessa da questão ao Plenário.» A essa rotina é que o memorial dos ilustres Xavier de Albuquerque dedica o —150 299 epíteto de «deformação construtiva». E A legitimidade constitucional dessa prática consagrada, no entanto, pende de que acentuam (pág. 8, § 12): «No rigor dos princípios, portanto, o órgão fracionário, ao decidir a causa, se somente no mesmo processo, em que considere juridicamente vinculado à deciproferida, é que a decisão plenária inte- são plenária da questão de inconstitucionagra-se, formando com ela corpo único, lidade,não obstante tenha esta sido provona decisão do órgão parcial. Em proces- cada e resolvida em processo diverso. sos distintos, apenas pode valer, e freSe, ao contrário, a Turma pretende reduqüentemente vale, conto precedente ju- zir o acórdão plenário a mero precedente risprudencial a merecer acatamento. junsprudencial sem força vinculante, a conEsse acatamento tem, por um lado, seqüência é que não poderá decidir da caucomo visto, bom fundamento teórico, e, sa, sem novamente submeter ao Pleno a por outro, ainda melhor fundamento, a prejudicial de inconstitucionalidade. um tempo moral e pragmático. FundaDe tudo resulta que, para ser válida, a mento de boa moral judiciária, porque decisão do órgão fracionário há de receber, obvia, ao menos no âmbito de cada Tri- como parte integrante sua, o acórdão do bunal, o dissenso interpretativo de seus Tribunal Pleno, declaratório da inconstituórgãos parciais e, o que é pior, a dispa- cionalidade de que se cogite. ridade das soluções dadas a lides análoTertius non datur: ou se entende que, gas ou até mesmo iguais. E fundamento de pragmática judiciária, porque, na an- embora prolatada em outro processo, a degústia proverbial do acúmulo de proces- cisão declaratória de inconstitucionalidade sos a julgar, aumenta o rendimento do — pelo menos, enquanto não revista pelo trabalho e agiliza o respectivo desempe- Pleno —é vinculativa da decisão da Turma em cada caso concreto ulterior — hipótese nho. Por tudo isso e diante da massifica- em que o acórdão plenário há de integrar a ção da prestação jurisdicional, que a documentação do julgamento da espécie; vida econômica moderna reclama em ou se continua a insistir na tese, superada avalanchas de casos análogos, a prática pela prática judiciária, que empresta à dedos Tribunais usa optar pelo acatamento cisão plenária, *Ronde proferida, força de do precedente plenário para decidir to- simples precedente jutisprudencial — aldos os demais casos, daí por diante, no ternativa, contudo, que implica a nulidade do julgamento, por incompetênciado órgão sentido que ele haja tomado. fracionário para a declaração de inconstituTrata-se, a bem dizer, de uma defor- cionalidade. mação, posto inspirada em muito bons Reconheço, no entanto, que o problema propósitos, do processo de controle constitucional difuso. Chamemo-la, por isso, se altera radicalmente, se a decisão plenária do incidente de inconstitucionalidade susdeformação construtiva.» citado em processo diverso resultou na deDe minha parte, não vacilo em atribuir claração incidente de constitucionalidade à prática e à convicção subjacente do órgão da lei questionada. parcial, de estar vinculado à declaração pleAí efetivamente — como já antecipara nfuia declaratória de inconstitucionalidade, galas de verdadeiro costume judiciário, que no voto preparado antes do memorial — se impôs por óbvias razões de economia não há como negar a autonomia judicante processual, às quais, em linha de princípio, do órgão parcial, expressa no art. 481 CPC, não creio se oponha o art. 97 da Constitui- que, aliás, resulta, a contrario saem, da regra do art. 97 da Constituição. çaa 300 R.TJ. — 150 Nesse ponto, tenho por irrepreensível o raciocínio final do memorial comentado (pág. 2, I} 17). «Não há, com efeito, como não distinguir as situações. Uma é a de recurso extraordinário contra acórdão de órgão parcial que, com base em inconstitucionalidade declarada aliunde pelo Plenário do respectivo Tribunal, nega aplicação à lei no caso concreto. Somente nesta, caberia, se fosse justificável em si mesma, a aplicação da regra Outra, a de recurso extraordinário contra acórdão de órgão parcial que, ou por entendimento próprio, ou com base em constitucionalidade reconhecida aliunde — quer declaradamente, quer por simples falta de quorum, conto se deu nos dois casos ora versados para a conclusão oposta — pelo Plenário do respectivo Tribunal, dá aplicação lei no caso concreto. Éindiferente que a decisão recorrida assente em entendimento próprio do órgão parcial, ou em precedente plenário a que se remeta; ocorrendo a segunda hipótese, como já visto anteriormente, o precedente plenário terá valido apenas como argumento jurisprudencial, graças àquela deformação construtiva de que se falou, mas não se terá incorporado, em julgamento subjetivamente complexo, no acórdão do órgão parcial. Nesta segunda situação, ocorra uma ou outra das duas hipóteses, não parece caber, mesmo se justificável em si mesma, a dita aplicação. Duas razões, principais militam em prol da negativa Uma, é a já salientada não-incorporação do precedente plenário no acórdão do órgão parcial, de que resulta sua serventia puramente intelectual ou dialética. Outra, a presunção de constitucionalidade das leis, que confere poder ao órgão parcial para, ele próprio, rejeitar qualquer argüição de inconstitucionalidade.» E, depois de citar Buzaid e Pontes de Miranda e invocar velhos julgados do STF (RE 18.681, in Cordeiro de Mello, O Processo no Supremo... 1/249 e RE 22.897, ib., 1/260), prossegue o arrazoado (pág. 14, 19): «Se o acórdão recorrido, de órgão parcial, conclui em termos práticos pela negativa de aplicação da lei com base em inconstitucionalidade declarada aliunde por precedente plenário, pode ser logicamente admissível, aquiesçase, sem conceder, que se lhe reclame a integração, para conhecimento cabal de sua motivação, pelo teor do precedente invocado. Mas, se o acórdão recorrido, também de órgão parcial, conclui em termos práticos pela aplicação da lei, mesmo que o faça com base em constitucionalidade reconhecida aliunde por precedente plenário, já não se mostra logicamente admissivel o reclamo de suaintegração por idêntico modo. Não se mostra admissível, porque o acórdão atacado terá pronunciado conclusão para a qual, primeiro, convergia a presunção de constitucionalidade das leis, e segundo, bastava a autoridade do órgão prolator, embora com eventual arrimo em julgado diverso, a que, quando podia não fazê-lo, tenha dado acatamento. Nesse caso, insista-se, ao julgado acatado ter-se-á tributado mera reverência intelectual.» Concluo, desse modo, que, salvo quando necessário para documentar o prequestionamento, efetivamente não se justifica a exigência, para o conhecimento do recurso extraordinário, da juntada do acórdão plenruio anterior sobre a mesma questão, em outro processo, se o acórdão recorrido, oriundo de órgão fracionário do Tribunal a quo, fundou-se na constitucionalidade da lei incidente no caso concreto. DI Assim fumada a minha convicção — com a retificação parcial que não hesito em R.TJ —150 assumir, de posição contrária que vinha assumindo, como retratado no despacho agravado —, autorizava-me o Regimento a sua reconsideração com o provimento do agravo regimental. Entendi, Porém, que — cuidando-se de questão procedimental recorrente em inúmeros casos —a decisão de rever ou não a orientação que se vem observando devia ser remetida ao Plenário por um imperativo de equanimidade, com o que concordaram os eminentes pares da Primeira Turma. Nesses termos, em conclusão, dou provimento ao agravo para que tenha seguimento o recurso extraordinário: é o meu voto. EXTRATO DA ATA RE 149.478 (AgRg) — MG — Rel.: MIL Sepúlveda Pertence. Agre.: Compa- 301 nhia Cimento Portland Baú (Adv.: Luiz Fernando Ferraz de Rezende) (Advs.: Aluiaio Xavier de Albuquerque e outros). Agda.: União Federal (Adva.: Procuradoria da Fazenda Nacional). Decisão: Por votação unãnime, o Tribunal deu provimento ao agravo regimental para determinar o processamento do recurso extraordinário. Votou o Presidente. Presidência do Sr. ~suo Sydney Sanches. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira, Octavio Gallotti, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence, Celso de Meio, Carlos Velloso, Marco Aurélio, limar Gaivão e Francisco Rezek. Vice-Procurador-Geral da República, Dr. Moacir Antonio Machado da Silva. Brasília, 24 de março de 1993 — Luiz Tomimatsu, Secretário. AGRAVO DE INSTRUMENTO N• 149.549 (AgRg) — MG (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio Agravante: Rubens Ribeiro dos Reis — Agravado: Unibanco — União de Bancos Brasileiros SÃ. Recurso extraordinário. Juízo primeiro de adadssibilMade. A atuação do Juízo primeiro de admissibildade não fica restrita aos pressupostos gerais de recorribilidade. Há de examinar se o extraordinário enquadra-se em una dos permissivos conslitudonals. Nisto não usurpa a competência de órgão do Supremo Tribunal Federal. Sendo negativa a decisão, tem a parte o acesso a esta Corte via agravo de instrumento. Recurso. Prequestionantento. Configuração. O prequestlonamento não resulta da circunstância de a matéria haver sido empolgada pela parte recorrente. A configuração do instituto pressupõe debate e decisão prévios pelo Colegiada ou seja, emissão de juízo explícito sobre o tema. O procedimento tem como escopo o cotejo indispensável a que se diga do enquadramento do recurso extraordinário no permisdvo constitucional, e se o Tribunal «a quo» não adotou entendimento explícito a respeito do fato judgeno veiculado nas razões recameis, inviabilizada fica a conclusão sobre a violência ao preceito evocado pelo recorrente. Recurso extraordinário. Moldura fálica. Na apreciação do enquadramento do recurso extraordinário em um dos permisdvos coes- 302 R.TJ. — 150 *acionais, parte-se da moldura titica delineada pela Corte de origem. Impossível é pretender substituí-Ia para, a partir de fundamentos diversos, alegar-se à conclusão sobre o desrespdto a dispositivo da Lei Básica Federal. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em negar provimento ao agravo regimentaL Brasília, 24 do agosto de 1993 — Néri da Silveira, Presidente —Marco Aurélio, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Marco Aurélio: Insiste o Agravante em asseverar que não cabia ao Juízo primeiro de admissibilidade emitir entendimento sobre a matéria de fundo veiculada no extraordinário. Aponta, mais, que, em relação aos meios suficientes ao pagamento do débito, acabou-se por considerar bens excepcionais pelo inciso III do 3° do artigo 47 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Por último, ressalta que se partiu para a cobrança de correção monetária sem que esta houvesse sido pactuada ou imposta por preceito legal (fls. 99 e 100). Recebi os presentes autos para exame em 1° de junho de 1993, liberando-os para julgamento em 7 imediato (fl. 106). É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Na interposição deste regimental foram atendidos os pressupostos de recorribilidade que lhe são próprios. O Agravante tomou conhecimento do despacho agravado mediante publicação ocorrida no Diário da Justiça de 14 de abril de 1993 — quarta-feira (fl. 98) —protocolando este recurso em 19 seguinte'— segunda-feira (fl. 99) —e, portanto, dentro do qüinqüídio. Quanto à representação processual, os documentos de fls. M e 105 revelam-nos regulares. A parte que se alegou como não abrangida pela decisão atacada diz respeito à cobrança da correção monetária sem previsão contratual ou legal. Contudo, esse tema não foi objeto de debate e decisão prévios quando da prolação do acórdão de fls. 79 a 82. Nada se disse sobre o silêncio da cédula rural pignoratícia e o respectivo contrato relativamente à correção monetária Incumbia ao Agravante proliv-nlar os embargos declaratórios afim de que o órgão julgador emitisse juízo explícito a respeito. No particular, o extraordinário mostrou-se deficiente no tocante ao prequestionamento. No mais, as razões apresentadas não infirmam os fundamentos do ato impugnado, que, assim, transcrevo: «A usurpação alegada pelo Agravante improcede. A uma, porquanto não se pode confundir duas atividades distintas, ou seja, a desenvolvida pelo Juízo primeiro de admissibilidade e a que decorre da atuação de órgão desta Corte. Interposto o recurso, cumpre ao Tribunal de origem dizer do atendimento, ou não, aos pressupostos gerais de recorribilidade e aos específicos, tudo como estabelecido na Lei n° 8.038/90. A duas, porque em tal Diploma não se atribui ao Presidente do Tribunal, em si, o despacho atinente ao recurso então protocolado. A incumbência cabe realmente a quem representa a Corte e nesse campo possível é a disciplina interna no sentido da atuação do Vice-Presidente, no que desenvolve atividade de apoio à presidência, situando-se os respectivos atos, por isso mesmo, no âmbito desta última. Não há como interpretar os preceitos pertinentes à espécie em detrimento da R.TJ —150 racionalização dos serviços. Inexiste irregularidade a contaminar o ato no que o recurso foi despachado não pelo Presidente do Tribunal de origem, mas pelo Vice-Presidente. No tocante aos dispositivos assinalados como infringidos nas razões do extraordinário, verifica-seque emmomento algum colocou-se em plano secundário o princípio da legalidade ou mesmo o concernente à impossibilidade de alguém ser privado dos próprios bens sem o devido processo legal. O acórdão atacado mediante o extraordinário revela que o Agravante não tem jus à anistia referente à correção monetária de vez que, vencido o débito, somente providenciou o ajuizamento da consignatária dois meses após, deixando de ofertar o valor da multa fixada no neonato. Também acrescentou-se cano fundamento a existência de meios à satisfação do débito tal como previsto originariamente. Muito embora seja questionável a obrigatoriedade de inclusão do valor da multa, requisito não contemplado no inciso I do § 3° do artigo 47, afasta-se a transgressão argüida em face ao segundo fundamento da decisão recorrida, isto é, a 303 suficiência de meios para o pagamento da divida. Destarte, tenho como correta a decido que resultou na negativa de trânsito ao extraordinário.» Pelos motivos supra, nego acolhida ao pedido formulado neste regimental. É o mai voto. EXTRATO DA ATA Ag 149349 (AgRg) — MG — Rel.: Mia Marco Aurélio. Agte.: Rubens Ribeiro dos Reis (Advs.: Mareio Gontijo, Raimundo Cândido Júnior e outros). Agdo.: Unibanco — União de Bancos Brasileiros S.A. (Advs.: Paulo Henrique de Carvalho Chamou e outros). Decisão: Por unanimidade, a Turma negou provimento ao agravo regimental. Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Paulo Brossard, Carlos Velloso e Marco Aurélio. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Francisco Rezar. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Artur Castilho Pereira Neto. Brasília, 24 de agosto de 1993 — José Wilson Aragão, Secretário. RECURSO EXTRAORDINÁRIO br 151.508 — DF (Segunda 'Turma) Relator para o acórdão: O Sr. Ministro Marco Aurélio Recorrente: Fundação Hospitalar do Distrito Federal — Recorridos: Abelardo de Oliveira Brito e outros Judiciário. Acesso. óbice. Configuração. A cdstência de provimentos judiciais a envolver o mérito revela o exercício do direito de ação. Descabe confundir decisão relativa a pressupostos de reconibilidade previstos em normas estritamente legais com obstáculo ao acesso ao Judiciário. Recurso extraordinário. Prequestionamento. Se a Corte de origem não adotou entendimento explicito sobre a matéria vdculada no recurso extraordinária, impossível é proceder-se ao cotejo indispensável à conclusão sobre o enquadramento do recurso no permissivo constitucional. 304 R.TJ. — 150 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos, em não conhecer do recurso extraordinário. Brasília, 1° de junho de 1993 — Néri da Silveira, Presidente — Marco Aurélio, Relator para o acórdão. RELATÓRIO O Sr. Ministro Paulo Brossard: Trata-se de recurso extraordinário interposto com base na alínea a, do inciso III do artigo 102, da Constituição Federal que impugna decisão do Tribunal Superior do Trabalho, proferida em agravo de instrumento que visava a subida de recursos de revista que impugnava decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 104 Região proferida em reclamação trabalhista promovida pelos recorridos. Alega-se ofensa ao artigo 5°, inciso XXXV, da mesma Carta constitucional. 2.0 referido agravo de instrumento recebeu, inicialmente, à fl. 61, o seguinte despacho negando-lhe seguimento: «1. Do exame dos autos, verifica-se que o presente Agravo de Instrumento padece de irregularidade de representação, uma vez que o Agravante deixou de transladar aos autos peça essencial para a formação do instrumento, qual seja, a procuração principal. O substabelecimento de fl. 35 não basta para verificar a legitimidade de representação da subscritora das razões =ars ais. 2. Desta forma nego prosseguimento ao Agravo de Instrumento, com bas e tio art. 896, § 5°, in fine, da CLT, bem como no verbete Sumular n° 272 do TST.». 3. Dessa decisão, a ora recorrente, interpôs agravo regimental perante aquela mais alta Corte do Trabalho, alegando violação ao princípio constitucional da prestação jurisdicional, art. 5°, XXXV. Por novo des- pacho do Ministro Relator, à fl. 74, foi negado seguimento também ao agravo regimental, vestis: «Em que pesem as considerações tecidas na peça recursal, o apelo não prospera. Isto porque a agravante não se preocupou em sanar o vicioapontado no despacho ora impugnado, pelo que o agravo regimental, em apreço, padece da mesma irregularidade de representa. ção, que resulta na sua inexistência.» Novo agravo regimental foi interposto dessa decisão pela recorrente, o qual não foi provido pelo acórdão de fls. 92195, cuja ementa é suficiente para revelar o seu conteúdo: Agravo regimental. Objeto. Relator. Faculdade conferida pelo art. 896, 5', da CLT. 1.0 objeto do agravo regimental é a desconstituição do óbice imposto ao prosseguimento do recurso intentado. Sem a impugnação direta às razões expendidas no ato impugnado, o agravo regimental apresenta-se desfundamett- tedo. 2.O art. 896, § 5°, da CLT faculta ao relator, como membro integrante do oolegiado, indeferir o recurso submetido a sua consideração, quando verificar a ausência de qualquer dos pressupostos extrínsecos, indispensáveis ao atendimento das exigências formais do ato de recorrer. Tal procedimento não impede a obtenção da devida prestação jurisdicional, prevista no art. 5°, inciso XXXV, da CF/88. 3. Agravo regimental desprovido. Dessa decisão que se interpôs o presente apelo extraordinário, cuja subida para melhor exame determinei no agravo de instrumento anexo. Transcrevo, na parte que interessa, as razões do recurso: «Ao negar seguimento ao agravo de instrumento, pelas razões que expôs, o MM. Relatar impediu que o pedido cons- R.T.J —150 tante do recurso viesse asa examinado e, conseqüentemente, pudesse vir a ser provido, permitindo-se, assim, a subida da revista interposta pela agravante. Esta decisão, ressalte-se, veio amparada no parágrafo 5° do artigo 896 da CLT e no Verbete n° 272 da Súmula desta Corte de Justiça. Verifica-se, porém, que o Enunciado n° 272 há de ser revisto, resta evidenciado que este verbete tentou reproduzir, data venta, indevidamente, o de n° 288, do E Supremo Tribunal Federal. Indevidamente, porque a jurisprudência daquela Excelsa Corte foi definida no sentido de que o Verbete n° 288 aplica-se, tão-somente a ela, e não aos dentais órgãos judicantes, em face das peculiaridades dos agravos de instrumentos que lhes são dirigidos. Não podem, portanto, os demais Tribunais julgar neste sentido e, tampouco, sumular tais decisões. Assim sendo, não cabe ao MM. Relator indeferir de plano o agravo de instrumento, com base em ausência de peça de translado obrigatório, uma vez que não há respaldo legal para tanto, o que faz com que a decisão proferida nesse sentido afronte o texto constitucional, e o artigo 523 do CPC.» (fia. 97/98) 6. A Procuradoria-Geral da República manifestou-se por meio de parecer da Subprocuradora-Geral Anadyr de Mendonça Rodrigues que conclui, não obstante entenda estar prequestionado o tema constitucional, pelo não conhecimento do recurso: «6. Tudo posto, observa-se, primeiro, que o apelo extremo silencia, completamente, sobre a aplicabilidade, ao caso sob exame, do disposto no art. 896, 5°, in fine, da Consolidação das Leis do Trabalho — comando legal em que está arrimado o V. Acórdão recorrido —, assim se fazendo invocável a &uno- 305 la 283 e ficando o Recurso Extraordinário insuscetível de conhecimento. «É inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles.» De outra parte, é de se consignar que só reconhecendo-se, primeiro, que errou o V. atesto guerreado, ao encontrar apoio para o decidido no disposto no art. 896, ft 5°, in fine, da Consolidação das Leis do Trabalho — assim desrespeitando-o, é que, em segundo passo, poder-se-ia, eventualmente, chegar à conclusão sustentada pelo Recurso Extraordinário. Em tal caso, porém, configurar-seia a ofensa reflexa à Carta Magna, o que não enseja Recurso Extraordinário: «A ofensa ao texto constitucional de fama reflexa não viabiliza o recurso extraordinário.» (Ag 128.2827-AgRg-RS, Rel. Afia Djaci Falcão, In Dl de 11-11-88, pág. 29315). Ademais, afigura-se inegável que a matéria em discussão — tuiparsabilidade da parte pela falta do traslado da procuração, em autos de Agravo de Instrumento — tem nítida natureza processual, o que lhe retini o porte constitucional. Por fim, inexistiu negativa de prestação jurisdicional, porque: «O STF entende haver-se dado a prestação jurisdicional ainda quando inexata, notadamente — como aliás quis o constituinte brasileiro — no âmbito da Justiça do Trabalho, cuja autonomia sobre a matéria só é elidida no caso de afronta direta à Carta da República.» (RE 117.066-2-BA, ReL Min. alio Borja, in Dl de 8-9-89) 306 R.TJ. —150 11.0 parecer é, por conseguinte, de que o Recurso Extraordinário não comporta conhecimento.» o relatório. VOTO O Sr. Ministro Paulo Brossard (Relator): A questão constitucional está preguestionada e quanto a isto não há divergência. Desde o primeiro despacho denegatório, vem a recorrente alegando violação ao princípio da prestação jurisdicional — inciso XXXV, art. 5°, CF — por obstar a decisão o conhecimento do Recurso de Revista e a decisão recorrida diz expressamente, tanto no corpo do acórdão quanto na sua ementa, que não impede ela ou o procedimento por ela invocada a obtenção da devida prestação jurisdicional, prevista na citada norma constitucional. A decisão recorrida negou seguimento ao agravo de instrumento que visava a subida de recurso de revista interposto contra decisão do TRT da 10° Região, ao argumento de deficiência na formação do instrumento; isto é, por constar do traslado cópia apenas do substabelecimento e não da «procuração principal». Fundamentou a decisão tanto no «artigo 896, § 5°, in fine, da CLT.», como no verbete da Súmula n° 272 do TST (fls. 61 e 74). Como esclarece o parecer da Procuradoria-Geral da República a matéria está prequestionada. Desde o primeiro despacho denegatório da subida do Recurso de Revista, vem a recorrente alegando violação à garantia de prestação jurisdicional — inciso XXXV, art. 5°, CF — e a decisão recorrida diz expressamente, tanto no corpo do acórdão quanto na sua ementa, que não impede ela ou o procedimento por ela invocado a obtenção da devida prestação jurisdicional, prevista na citada norma constitucional. 4. Não obstante o parecer da Procuradoria-Geral da República tenha invocado a Súmula 283 desta Egrégia Corte por enten- der que a decisão recorrida assentou em mais de um fundamento, na realidade, ele é um único — falta da procuração prindpal no traslado do instrumento. A base que se invocou para, com esse fundamento, negar seguimento ao agravo de instrumento que são duas: a de ordem legal — art. 896, § 5°, In flne — e a sumular — verbete 272 do TST. Assim sendo, o extraordinário ataca exclusivamente esse fundamento, entendendo que, ao denegar seguimento ao agravo por falta de cópia da procuração no traslado, a decisão obstou a prestação jurisdicional assegurada no art. 5°, XXXV, da Constituição Federal. Desde já, necessário, se faz esclarecer que a recorrida quando da interposição do agravo de instrumento pediu expressamente o traslado da procuração (fl. 3), e depois, quando intimada para indicar as peças, tanto da procuração, como do substabelecimento (fl. 11). Não obstante este fato, o instrumento foi formado apenas com a reprodução do substabelecimento, sem a cópia do instrumento principal de procuração. A aplicação pelo Tribunal Superior do Trabalho da sua Súmula 272, que reproduz a Súmula 288 desta Egrégia Corte, para obstar o seguimento do agravo de instrumento que visa a subida de recursos de revista, é muito questionada. Hoje tanto em relação à denegação de recurso extraordinário como de recurso especial, a norma que disciplina formação do instrumento do agravo que se lhe opõe, é específica, a da Lei n° 8.038/90, art. 28. Ao passo que os demais agravos de instrumento, inclusive aqueles interpostos contra decisão que nega seguimento ao recurso de revista trabalhista, são regidos pelas normas gerais do Código de Processo Civil que, além determinar ao recorrente que indique as peças do processo e quais são as que devem ser obrigatoriamente trasladadas, dispõe no artigo 560, parágrafo único, que em havendo preliminar suscitada no julgamento que - 150 verse sobre nulidade sanável, «o tribunal, havendo necessidade, converterá o julgamento em diligênda, ordenando a remessa dos autos ao juiz, a fim de ser sanado o vido». Aliás, é por essa razão que precedentes desta Egrégia Corte, entendem que a regra da Súmula 288 não se aplica aos tribunais ordinários (RE 95.744, RTJ 101/1317; RE104488,Di de 12-4-85, pág. 4941 e AGRAG 110.101, DJ de 20-6-88, pág. 10936). Na hipótese presente é de se considerar, ainda, que milita em favor da recorrente uma presunção de existência do instrumento principal da procuração, pelo qual a recorrente outorgou os poderes objeto do substabelecimento. Mesmo a aplicação da Súmula 288 perante essa Egrégia Corte tem sofrido temperamentos. Com a entrada em vigor do Código de Processo Civil de 1975, foi da objeto de revisão pelo Plenário e não obstante, houvessem expressivos votos tanto pela sua revogação, como pelo seu abrandamento, foi ratificada em seus termos (AG 64.869 AgRg, Tribunal Pleno, RTJ 87/855). Deste modo, a falta no translado de peça essencial à compreensão da controvérsia, nega-se provimento a agravo que objetiva a subida de recurso extraordinário; cabendo a parte o dever de vigilância na formação do instrumento. Porém, recentemente, esta mesma Turma quando do julgamento do Agrag. 138.312-7, converteu-o em diligência, assinando prazo de dez dias para o agravante regularizar sua representação. Ainda a poucos dias o Ministro Marco Aurélio, por falta no traslado do instrumento de procuração, sugeriu a Turma remessa de processo ao Plenário para o reexame dessa Súmula, no que toca irresponsabilidade da parte na formação do instrumento. Vê-se, assim, que mesmo a aplicação dessa Súmula perante a Corte depende da hipótese concreta que lhe é submetida. 9. Porém, na hipótese dos autos, mesmo que se admitisse a aplicação da regra con- 307 tida na Súmula pelo Tribunal Superior do Trabalho, creio que não se poderia obstar o seguimento do agravo por falta de substabelecimento, porque a recorrente é unia Fundação Pública que integra a administração indireta do Distrito Federal e, por isso, é representada em juízo, ex vi lede, por seus procuradores, nos termos do artigo 12, inciso I, do Código de Processo Civil; hipótese em que se dispensa a apresentação de procuração emJulzo. Sendo arecommte uma fundação pública, mesmo que dotada de personalidade jurídica de direito privado com autonomia administrativa, integra ela a administração pública indireta, artigo 4°, inciso II, alínea d, do Decreto-Lei n° 200/67. Ademais, o fato dela estar sendo defendida em juízo por Procurador do Distrito Federal, reforça a idéia da desnecessidade de apresentação de instrumento de mandato de procuração. Emhipótese semelhante, envolvendo autarquias, esta Egrégia Corte assim decidiu ao julgar o RE 65.729-GB, relatado pelo Ministro Themístocles Cavalcanti: Ementa: Os Procuradores das autarquias não dependem da apresentação de procuração para exercerem as suas fmeçães cru Juízo. C.onhedmento e provimento do Recurso Extraordinário (RTJ 50/395) Mais recentemente, também o Plenário confirmou essa orientação no julgamento dos Embargos de Divergência 121.957DF, interpostos pelo Banco Central do Brasil, relatado pelo Ministro Sepúlveda Pertence. Transcrevo a ementa na parte que interessa: 11 — Advogado: falta de prova, mediante juntada de procuração, de poderes de representação da parte; dispensa, quando se cuida de profissional investido em cargo de advogado de autarquia. A regra geral que decorre do art. 37, assim como do art. 70 EOAB, é a exigência de juntada da procuração outor- R.TJ. —150 308 goda pela parte ao advogado habilitado; mas, a procuração é instrumento do mandato ad judicia, que só é de exigir quando este for o título de representação pela parte do advogado que postula em seu nome; não é o caso, pois, dos advogados do Banco Central e o dos procuradores autárquicos em geral, que, atuando em juízo pela autarquia respectiva, não cumprem mandato ad judicia — contrato que se prova pela procuração, mas exercem atribuição do seu cargo, para o que não dependem de outro título que a investidura nele. (RTJ 137/410). Ante o exposto, admito o pnrsente recurso extraordinário e lhe deu provimento para determinar a subida do recurso de revista para que o Tribunal a quo prossiga no seu julgamento. VOTO (PRELIMINAR) O Sr. ~Iro Marco Aurélio: Sr. Presidente, a Recorrente empolgou um inciso do rol das garantias constitucionais que não pode ser tido como panacéia, como um verdadeiro trampolim para, nas hipóteses de transgressão às normas instrumentais comuns, chegar-se ao Supremo Tribunal Federal, para alçar-se à Suprema Corte matéria de contornos simplesmente processuais, que encontra regência na legislação comum, na legislação dita ordinária. A Recorrente apontou que se teria obsfocalizado o acesso ao Judiciário. Indagase: é possível afirmar-se esse óbice quando dois órgãos investidos do ofício judicante julgaram o mérito? Como dizer-se que o acesso ao Judiciário foi obstaculizado quando o próprio Supremo Tribunal Federal é convocado para emitir entendimento sobre questão estritamente processual? Penso que não, Sr. Presidente. E, já por isso, caminharia no sentido do não-conhecimento do recurso extraordinário. Há mais. Na hipótese dos autos, tivemos urna decisão negativa prolatada pelo Juízo primeiro de admissibilidade do recurso de revista. Entendeu a Presidente do Décimo Regional à época, a Juíza Heloísa Pinto Marques, que a revista não se enquadrava em um dos pamissivos do artigo 896 da Consolidação das Leis do Trabalho. Deu-se a interposição de agravo, só que a formação do instrumento fez-se com peça que não tem vida própria, com um substabelecimento, não se trazendo aos autos o instrumento de mandato, que é a procuração. O Relator, acionando norma estritamente legal, o § 5° do artigo 8% consolidado, negou seguimento ao agravo. E aí o que ocorreu? Alertada, a Fundação trouxe aos autos a prova do credenciamento do advogado, ao interpor o regimental? Não. Pelo menos sob a óptica da Corte de origem, sob o ponto de vista do Relator que atuou junto ao Tribunal Superior do Trabalho, tomou a claudicar, não anexando aos autos a procuração, deixando de sanear, assim, o defeito apontado pelo Relator do processo, por sinal classista e empregador. Exsurgiu, então, novo pronunciamento, consignando-se a inexistência do mandato. E novo regimental, como se houvesse oportunidade para uma verdadeira segunda época, foi protocolado, mas, simplesmente, contendo alegações ligadas à primeira decisão, àquela relativa ao agravo de instrumento e não à referente à última decisão do processo, a decorrente do agravo regimental anterior. Nesse segundo agravo regimental é que foi juntada aos autos a procuração que está à folha 86. Sr. Presidente, não posso assentar, sob pena de abrir uma via larguíssima ao acesso a esta Corte, transmudando-a em instância ordinária no julgamento de recurso que não tem essa índole, que o quadro revela a oposição de obstáculo ao acesso ao Judiciário. Dir-se-á: trata-se de uma Fundação Hospitalar, de uma Fundação de direito público que, portanto, é representada pelos respectivos Procuradores, estando dispensada da apresentação de mandato. Se isso é certo, R.TJ —150 não menos correto é que não podemos julgar, pela primeira vez, o tema, que deveria ter sido articulado junto ao Tribunal Superior do Trabalho. Não podemos asseverar que a Corte de origem claudicou quando Sio houve adoção de entendimento sobre a matéria. Não podemos presumir que, avisada quanto à qualificação da Recorrente, mesmo assim a Corte insistiria na declaração de irregularidade da representação processual. A Turma admitirá, neste caso, o preqüestionamento implícito se a Corte não o faz, sequer, naquelas hipóteses em que envolvida a incompetência do órgão julgador? Creio que não podemos dar passo tão largo e, também, que não podemos radio, gr* a hipótese, dispensando formalidade que temos proclamado em inúmeros provimentos judiciais, ou seja, a ligada à convicção de que o preqüestionamento deve estar revelado no processo com um predicado — o da explicitude• que deve significar, sob qualquer ângulo, o debate e a decisão prévios sobre o tema judgeno veiculado no extraordinário. Não sei, sequer, se nesse extraordinário a Recorrente se vale da qualificação de fundação de direito público e conclama a Turma a entender dispensável, no caso, o instrumento de mandato. Ouso, inclusive, consignar que a matéria é estranha ao extraordinário. Faço-o, Sr. Presidente, porque confio na atuação da Procuradoria-Geral da República, na forma cuidadosa com que a ilustre SubprocuradoraGeral da República, Anadyr de Mendonça Rodrigues, aprecia os casos que são colocados sob o abalizado crivo que sempre demonstra. Peço vênia ao nobre Relator, para não conhecer do extraordinário. VOTO (PRELIMINAR) OSr. Ministro Carlos Venoso: Sr. Presidente, ouvi com a maior atenção a sustentação oral feita pelo jovem e talentoso advogado. 309 Convenci-me de que a questão posta, puramente processual, não ostenta as galas de questão constitucional. Quer dizer, não houve, no caso, ofensa direta à Constituição, e é essa ofensa que autoriza a interposição do recurso extraordinário. Com essas breves considerações, peço vênia ao eminente Ministro Relator, cujas opiniões e votos tenho o costume de respeitar, para, divergindo, no caso, não conhecer do recurso extraordinário, nos termos do voto do Sr. Ministro Marco Aurélio. VOTO O Sr. Ministro Néri da Silveira (Presidente): Também peço vênia ao Sr. Mmistro-Relator, para acompanhar o voto do Sr. Ministro Marco Aurélio, não conhecendo do presente recurso. Fundado o apelo na alegação de ofensa ao inciso XXXV do art. 5° da Constituição, bem de ver é que não restou demonstrada a vulnerado desses:apositivo. Todo o debate é desenvolvimento em torno de matéria de natureza processual. Saber se a juntada de instrumento de mandato haveria de darse no caso concreto; se, mesmo não tendo trazido aos autos, o respectivo mandato, quando interpôs o recorrente o agravo de instrumento, estaria este recurso em condições de ser conhecido ou não: essas indagações põem-se em plano estritamente processual e só se poderia efe tivamente chegar a eventual demonstração de ofensa à regra maior invocada, depois de ser dirimida dita questão processual. É da orientação da Corte que a ofensa à Constituição deve ser imediata e direta para ensejar conhecimento do apelo extraordinário. Com essas breves considerações, não conheço do recurso. EXTRATO DA ATA RE 151.508 — DF — Rel.: Min. Paulo Brossard. Recte.: Fundação Hospitalar do 310 R.Ti. —150 Distrito Federal (Advs.: Angela Silveira Banhos e outros). Recdos.: Abelardo de Oliveira Brito e outros (Advs.: Marcos Luís Borges de Resende e outros). Decisão: Por maioria de votos, a Turma não conheceu do recurso extraordinário. Vencido o Sr. Ministro Relatar que dele conhecia e lhe dava provimento. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Francisco Rezek. Lavrará o acórdão o Ministro Mar- co Aurélio. Falou pelos recorridos o Dr. Marcos Luís Borges de Resende. Presidência do Sr. Ministro Nfti da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Paulo Brossard, Carlos Venoso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Mardem Costa Pinto. Brasília, 1° de junho de 1993 — José Wilson Aragão, Secretário. AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 152.775 (AgRg) — SP (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio Agravantes: Waldir Ambrósio Gil e outro —Agravado: Estado de São Paulo Recurso Extraordinário. Moldura fálica. Legislação locaL A teor do disposto no artigo 337 do Código de Processo Civil, a parte que alegar direito municipal, estadual, estrangeiro ou consuetudinário provar-lhe-á o teor e a vigência, se assim o determinar o juiz. A atuação em sede extraordinária faz-se a partir da moldura tática delineada, soberanamente, pela Corte de origem. Constando do acórdão atacado que a legislação local não contempla um certo direito, descabe cogitar da vulneração ao inciso XXXVI do artigo 5° da Constituição Federal, no que revela a intangibilidade do ato jurídico perfeito e acabado, do direito adquirido e da coisa julgada. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em negar provimento ao agravo regimental. Brasília, 10 de agosto de 1993 — Néri da Silveira, Presidente—Marco Aurélio, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Marco Aurélio: Ao negar acolhida ao pedido formulado no agravo de instrumento, assim relatei a hipótese: O Juízo primeiro de admissibilidade, em despacho da lavra do Terceiro Vice- Presidente — Desembargador Yussef Cahali — apontou que não foi preguesdanado tema constitucional, citando, relativamente àquele instituto, o que decidido no Agravo de Instrumento n° 135.005-9-PA, no qual funcionei como Relator. Indicou como óbices ao trânsito do extraordinário os Verbetes de na 282 e 356 da Súmula da jurisprudência predominante desta Corte. Por último, salientou que, no máximo, poder-se-ia estar diante de hipótese a revelar afronta à Carta intennediada pelo desrespeito a norma estritamente legal, o que não viabiliza o extraordinário (folhas 45 a 47). Coma minuta de folhas 3 a 5, procuram os Agravantes demonstrar o enquadramento do recurso no permissivo R.T.J —150 constitucional. Afirmam que a Corte de origem aludiu à necessidade de observar-se o princípio isontiinico e refutou o conflito da postura adotada pelo Estado com a Carta. Aos autos veio a contraminuta de folhas 49 a 53, no sentido de que a controvérsia foi dirimida à luz da Lei Complementar n° 567/88, do Estado de São Paulo. A seguir, fiz consignar que Órgão julgador apreciou a questão sob o ângulo da legislação local e que, para dizer-se da ofensa ao direito adquirido dos Agravantes indispensável seria o exame do respectivo texto. Frisei que em momento algum foi obstaculizado o acesso ao Judiciário, tanto assim que a demanda foi julgada, no mérito, por dois órgãos integrantes do Poder Judiciário local (folhas 59 e 60). Com o telegrama de folha 62, os Agravantes insistem etn asseverar que a decisão impugnada mediante o extraordinário conflito com a garantia insculpida no inciso XXXVI do artigo 5° da Carta. Discorrem sobre a defesa apresentada no processo a partir da inicialInfonnaram o envio do original, na mesma data, a esta Corte, o que ocorreu conforme revelam as peças de folhas 64 a 67. Recebi os presentes autos para análise em 17 de junho de 1993, liberando-os, para julgamento, no dia 21 imediato (folha 68). É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relatar): A matéria de fundo veiculada neste regimental está a merecer o conhecimento do Colegiado. As peças, folhas 17 e 20, comprovam a regularidade da representação processual, sendo que, publicada deci- 311 são atacada no Diário de 4 de junho de 1993 — sexta-feira (folha 61) — deu-se a protocolação do agravo em 11 seguinte — sexta-feira (folha 64) — e, portanto, dentro do qüinqüídio. A atração em sede extraordinária faz-se a partir da moldura fálica delineada, soberanamente, pela Corte de origem. Conforme fiz ver ao apreciar o pedido formulado no agravo de instrumento, decidiu a Quarta Câmara Civil de Férias do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo mediante interpretação de lei local — a Lei Complementar n° 567/88 — que, a teor do disposto no artigo 337 do Código de Processo Civil, depende de prova. Sem o afastamento das premissas lançadas na decisão, impossível é dizer da inobservância ao direito adquirido dos Agravantes. Por isso, nego acolhida à reiteração do pedido de trânsito do extraordinário. É o meu voto. EXTRATO DA ATA Ag 152.775 (Aglig) — SP —Rel.: Min. Marco Aurélio. Agtes.: Waldir Ambrósio Gil e outro (Adv.: Celso RolimRosa). Agdo.: Estado de São Paulo (Advs.: Maria Luciana de Oliveira Facchina e outro). Decisão: Por unanimidade, a Turma negou provimento ao agravo regimental. Ausente, ocasionalmente, o Ministro Carlos Velloso. Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Carlos Velloso, Marco Aurélio e Francisco Rezek. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Paulo Brossard. Subprocurador-Geral da República, o Dr. Haroldo Ferraz da Nóbrega. Brasília, 10 de agosto de 1993 — José Wilson Aragão, Secretário. 312 R.TJ. — 150 AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 152.992 (AgRg) — SP (Prisndra Turma) Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello Agravante: Instituto Nacional do Seguro Social —INSS —Agravada: Maria Aparecida Monteiro Constitucional. Prevideaddrio. Valor mínimo do beneficio. Fonte de cadeia CF, art. 195, § E Aplicabilidade bnediata da norma inscrita no art. 201, §§ 5' e 611, da Casta Política. Precedentes Aproe regimental bnprovida A jurisprudência de ambas as Turmas do Supremo Tribunal Federal firmou-se, de modo unânime e uniforme, no sentido da auto-aplicabilidade das normas inscritas no art. 201, §§ 5` e 6', da Constituição da República. A garantia jurídico-previdenciária outorgada pelo art. 201, §§ 5" e e, da Carta Federal deriva de norma provida de elidida plena e revestida de aplicabilidade direta, imediata e integral. Esse precdto da Lei Fundamental qualifica-se como estrutura jurídica dotada de suficiente densidade normativa, a tornar prescindirei qualquer mediação legislativa concretizadora do comando nele positivado. Essa norma constitucional —por não reclamar a baresposido legislatoris — opera, em plenitude, no plano Jurídico, todas as suas conseqüências e virtualidades "acida. A exigência inscrita no art. 195, § 5°, da Carta Política traduz comando destinatário que exclusivo, tem,por, o próprio legislador, no que se refere à criação, majoração ou extensão de outros benefícios ou serviços da seguridade social. A aplicabilidade do conteúdo normativo do art. 201, 0 5' 6°, da Constituição, por revelar-se plena, imediata e integral, não depende, por isso mesmo, da indicação de qualquer específica fonte de custeio. ACÓRDÃO RELATÓRIO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Primeira Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em negar provimento ao agravo regimental. Brasília, 3 de agosto de 1993 — Moreira Alves, Presidente — Celso de Mello, Relatar. O Sr. Ministro Celso de Mello: O presente recurso de agravo — manifestado pelo INSS sob a forma de «agravo regimental» (RISTF, art. 317) —, insurge-se contra a decisão por mim proferida (fls. 28/29) que negou trânsito, na esfera do Supremo Tribunal Federal, a agravo de instrumento deduzido em face de ato decisório da Presidência do Tribunal Regional Federal da 3° Região que não admitiu o processamento R.T.J — 150 do apelo extremo interposto pelo ora recorrente. Em suas razões recursais, expendidas neste agravo, o recorrente deixou consignado que (As. 32/34), verbis: «Não se conforma o Instituto Agravante com o eminente dedsum ora agravado por versar a matéria dos autos sobre auto-aplicabilidade ou não de norma constitucional, cuja interpretação é, inafastavelmente, conjugada com a regra do art. 195, 5° da própria Constituição Federal e a do art. 59 do ADCT. E, em conseqüência, trata-se de hipótese de preceito constitucional cuja eficácia somente se operou com o advento da Lei n° 8.213/91 — norma regulamentadora do multicitado preceito constitucional. Conseguinte, somente a partir da referida Lei n° 8.213/91, pode-se atribuir plena eficácia à atinente norma constitucional. Em suma, vigora o irrefutável entendimento de que multicitado preceito constitucional (art. 201, § 5°) não é auto-aplicável, visto que 'para o desfrute do direito garantido pelo texto magno, o legislador constituinte fez depender da vontade integrativa do legislador ordinário'. Enfim, trata-se de Interpretação conjugada da norma constitudonal dtada com a regra do art. 195, 5°, da Lei Maior, e a do art. 59, parágrafo único, do ADCT'. É 'caso em que, com eficácia operada a partir do advento da Lei n° 8.213/91, diploma normativo-integrativo que lhe dá aplicabilidade plena, sobreveio a atividade regulamentadora do preceito constitucional'. Com efeito, é de se atentar para a lite/alidade do disposto no caput do art. 201, cuja redação é absolutamente idêntica ao caput do art. 195, ao remeter à Id a matéria nele disciplinada ('nos ter- 313 mos da lei'). A imperatividade do comando contido no § 5° de ambos os dispositivos fica, claramente, na dependência da lei prevista no respectivo caput, de sorte a inexistir qualquer razão jurídica para se conferir auto-aplicabilidade a um deles, enquanto o outro seria destinado ao legislador. Se este fosse o caso de um dos artigos, deveria ser o art. 201, já que esta regra se reporta aos 'planos de previdência social', por sua vez objeto do art. 59 do ADCT. Nem se poderia distanciar o artigo 201 do parágrafo 5° do art. 195, por força também do disposto no parágrafo 2° desse mesmo dispositivo constitucional (art. 201). Aduz, finalmente, que (fls. 38/43): Na verdade, data mata vaia, aludido preceito constitucional (99 5° e, ainda, o 6° do artigo 201 da CF), possuindo conteúdo programático, não poderiam ter aplicação imediata Nem prescindir de fonte de custeio total. Isto, mesmo se considerado dito preceito uma garantia fundamental, comportando ainda a seguinte indagação: — de que valeria o Legislador assegurar tal garantia sem o meio de concretizá-la? Relevante é que o Legislativo, o Executivo e o próprio Judiciário vêm entendendo pela não auto-aplicabilidade dos multicitados dispositivos constitucionais (ff 5° e 6° do art. 201 da CF). Mais ainda relevante é que, até mesmo nesse Pretório Excelso há precedente neste sentido, com remissão a concernentes proposições legislativas que deram concreção ao art. 201 da Magna Carta, como se demonstra, retro. E, volta-se a repetir, em não se tratando de disposições auto-aplicáveis, unicamente podem ser tidas como normas regulamentares da mesma espécie as Leis 314 R.TJ. — 150 na 8.212/91 e 8.213/91. A nenhuma outra lei, data maxima venia, pode-se atribuir mesma função regulamentadon. De se destacar que a Lei n° 7.787/89, mencionada em inúmeras decisões pertinentes à mesma espécie em exame como geradora de fonte de custeio para aplicação do parágrafo 5° do art. 201 da Constituição Federal, apenas cuidou expressamente de reajustamento de valor de beneficio previdenciário, em função do disposto no art. 58 do ADCT (arts. 14 e 15 da Lei n° 7.787/89), bem ainda de alteração de alíquotas para determinadas categorias de contribuintes, sem implicar fonte total de custeio (art. 195, § 5° da CF). Desde a inicial do feito que se discute exatamente a aplicabilidade, o momento de aplicação de pertinente dispositivo constitucional. E o venerando acórdão extraordinariamente recorrido não elidiu nem poderia elidir a questão relativa, simplesmente por ter tomado como marco inicial ou momento desta aplicabilidade a Lei n° 7.787/89. Evidentemente, com este entendimento, apenas, foi decidido equivocadamente o mérito da causa E o que é mais fundamental, sendo, como também afirma a Jurisprudência, conjugada a interpretação do multicitado dispositivo constitucional (art 201, § 5°) com regra do artigo 195, § 5°, da Lei Maior, e a do artigo 59 do ADCT, desta mesma interpretação, data maxima venda, além de não poder se afastar o Julgador, ter-se-ia também matéria que, pelo que se depreende do disposto no art. 5°, VII, do RISTF, refoge do âmbito da competência da própria e Egrégia Turma Julgadora. Outrossim, a correlação entre os parágrafos 2°, 5° e 6°, do ext. 201 da Lei Máxima, com o art. 195, parágrafo 5° desta mesma Lei, bem ainda com os arts. 33, 40 e 145 da Lei n° 8.213/91 é incompatível com o decisum ora agravado e, particularmente, não poderia coexistir esse mesmo venerando despacho agravado com referidos dispositivos legais (arts. 33, 40 e 145 da Lei n° 8.213/91), a não ser que fossem tidos estes (multicitados dispositivos legais) como inconstitucionais, o que é por demais relevante para, por si só, remeterse o feito ao Plenário dessa Calcada Corte de Justiça, em conformidade com o disposto no art. 11, I, do RISTE Ante o exposto, invocando os suplementos altamente judiciosos do Emérito Julgador, pede-se seja reconsiderado o eminente decisum ora agravado e, assim, valendo-se Vossa Excelência da faculdade assegurada pelos art. 21, IV, 22 do RISTF, que submeta mesma matéria ao Plenário dessa Excelsa Corte de Justiça, com o que, ainda com a maxima venta, pôr-se-ia termo definitivo à demanda, que abriga milhares de casos desta mesma natureza que ainda tramitam e estão subindo ao Excelso Pretório, os quais poderiam ser abrangidos em uma única decisão, dirimindo, precipuamente, divergência jurisprudencial entre os Egrégios Tribunais Regionais Federais...» Por não me haver convencido das razões apresentadas, submeto o presente recurso à apreciação desta E. Primeira Turma. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Celso de Mello (Relatar): Trata-se de recurso extraordinário, não admitido pela Presidência do Tribunal inferior, no qual o ora agravante busca a reforma do acórdão impugnado no ponto em que este, decidindo a questão da aplicabilidade da norma inscrita no art. 201, §§ 5° e 6°, da Constituição Federal, interpretou o alcance desse preceito em função da regra consubstanciada no art. 195, § 5°, da mesma Carta Política, e no art. 59 do ADCT/88. R.TJ —150 315 O Instituto Nacional do Seguro Social De outro lado, a exigência inscrita no — INSS, ao deduzir o recurso extraordiná- art. 195, § 5°, da Carta Política traduz corio, (a) alegou que a decisão do Tribunal a mando que tem, por destinatário exclusiquo infringiu o art. 195, § 5°, da CF; (b) vo, o próprio legislador, no que se refere à sustentou que o preceito inscrito no art. criação, majoração ou extensão de outros 201, §§ 5° e 6°, da Carta Política depende, benefícios ou serviços da seguridade sopara efeito de sua incidência, de necessária cial. complementação normativa a ser concretiDesse modo, a aplicabilidade do conteúzada pelo legislador e (c) salientou que o do normativo do art. 201, §§ 5° e 6°, da acórdão impugnado ofendeu o art. 59 do Constituição, por revelar-se plena, imediaADCT/88. ta e integral, não depende, por isso mesmo, Denegado o apelo extremo, manifestou da indicação de qualquer específica fonte recorrente este agravo de instrumento de custeio. para o Supremo Tribunal Federal. Devo registrar, não obstante estas conNeguei-lhe provimento, quer em função siderações, que a parte ora agravada conda auto-aplicabilidade da norma constitu- formou-se com o pronunciamento emanacional em questão, quer em face da forma do do Tribunal Regional Federal em quesincoerente e ilógica com que deduzida a tão, satisfazendo-se com o reconhecimento pretensão recursal pela autarquia recorren- judicial, ainda que em menor extensão te, quer, finalmente, pela uniforme orienta- temporal, do seu direito ao reajuste do ção jurisprudencial fixada, sem maiores das'- beneficio previdenciário. ceptações, no tema em exame, por ambas A circunstância de o acórdão impugnaas Turmas do Supremo Tribunal Federal. do haver estabelecido a vigência do beneCom efeito, a garantia jurídico-previ- fício previdenciádo em questão a partir da denciária outorgada pelo art. 201, §§ 5° e Lei n° 7.787/89, e não a dentar de 5-10-88, 6°, da Carta Federal deriva de aorta provi- em nada favorece a pretensão recursal do da de eficácia plena e revestida de aplica- INSS, especialmente em face do conteúdo bilidade direta, imediata e integral. Esse da petição com que deduziu o apelo extrepreceito da Lei Fundamental qualifica-se mo. como estrutura jurídica dotada de suficienA entidade autárquica recorrente, não te densidade normativa, a tornar prescin- obstante tenha expressamente reconhecido dível qualquer mediação legislativa con- que o acórdão impugnado fundamentou-se cretizadora do comando nele positivado. na Lei n° 7.787/89, sustenta, de modo inSendo assim, desveste-se de qualquer coerente e ilógico, que o Tribunal a quo fomento jurídico a pretensão =cursai que deu aplicabilidade direta e imediata ao cobusca condicionar a aplicabilidade do art. mando emergente do art. 201, ¢§ 5° e 6°, da 201, §§ 5° e 6°, da Lei Fundamental, quer Constituição. à edição de lei, quer à implantação proDaí, a creta decisão da Presidência do gressiva dos planos de custeio e de benefi- Tribunal a quo que, aplicando à espécie a cio, nos termos fixados pelo art. 59 do Súmula 284 do STF, deixou de admitir o ADCT/88. recurso extraordinário interposto pelo Na realidade, a norma constitucional em INSS. questão —por não reclamar a haterpositio Impõe-se registrar, por necessário, que legialatoris — opera, em plenitude, no pla- a matéria suscitada na presente sede prono jurídico, todas as suas conseqüências e cessual já foi apreciada por ambas as Turvirtualidades eficaciais. mas do STF que, em precedentes tapeei- 316 R.T.J. —150 ficas, repeliram a pretensão recursol ora deduzida pelo INSS: «Previdendário. Beneficio. Piso salarial. Art. 201, §§ r e 6' da Condituição Federal. As normas dos dispositivos acima mencionados, que estabelecem piso igual ao salário-mini:no para os benefícios previdenciários e gratificação natalina dos aposentados e pensionistas'equivalente aos proventos do mês de dezembro, são auto-aplicáveis, independendo sua eficácia de edição de lei ordinária regulatnentadora. Agravo regimental improvida» (Ag 147.972-9-SP (AgRg), Rel. Km. limar Gaivão, Primeira Turma, DJ de 1°-7-93). dlendido previdenclário — Piso —Fonte de custeio. As regras contidas nos §§ 5° e 6° do artigo 201 da Constituição Federal têm aplicabilidade imediata. O disposto no § 5° do artigo 195 não as condiciona, já que dirigido ao legislador ordinário, no que vincula a criação, majoração ou extensão de benefício ou serviço da seguridade social à correspondente fonte de custeio total.» (Ag 148.401-3-RS (AgRg), Rel. 1Vfin. Marco Aurélio, Segunda Turma, DJ de 26-3-93) «Recurso extraordinário. Previdência Sodal. Benefício previdenciário. Constituição, art. 201, ৠ5° e 6°. Sua auto-aplicabilidade. Não se opõem à sua eficácia plena e imediata aplicação o art. 195, § 5°, da Constituição, nem os arts. 58 e 59, do Ato de suas Disposições Transitórias. Hipótese em que o acórdão recorrido estabeleceu a vigência do benefício a que se refere o § 5° do art. 201, da Constituição, a partir da Lei n° 7.787/89, e não a contar de 5-10-88, conformandose, entretanto, o autor com o julgado. Recurso extraordinário do INSS não ad- miúdo. Agravo regimental a que se nega provimento.» (RE 162.170-3/SP (AgRg), Rel. Mm. Md da Silveira, Segunda Turma, DJ de 11-6-93) Como assinalado, o entendimento exposto vem merecendo, em sucessivos e inúmeros julgados, a adesão uniforme dos membros integrantes desta Suprema Corte, o que torna de todo dispensável — ante a posição comum e convergente de ambas as Turmas — a submissão do pleito recursal ao Plenário do Tnhunal, v.g.: Ag 147.470-0 (AgRg), Rel. Min. Sepálveda Pertence, Primeira Turma, julg. em 29-6-93; RE 151.082-1 (AgRg), Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, julg. em 29-693; Ag 149.953-3 (AgRg), Rel. Min. Britar Gaivão, Primeira Turma, I» de 1°-7-93; Ag 152.4074 (AgRg), Ra Mlii. Néri da Silveira, Segunda Turma, julg. em 21-593. Impõe-se referir, neste ponto, que o INSS, ao sustentar a necessidade de apreciação da presente causa pelo Plenário do STF, deduziu nesta sede recursol questão inteiramente nova, versando a alegada inconstitucionalidade dos arts. 33, 40 e 145 da Lei te 8.213/91. Esse aspecto da controvérsia, porque sequer ventilado no acórdão recorrido, não se torna passível de cognição na instância recursal extraordinária, por evidente ausência de configuração do requisito do prequestionamento. Não ventilada no acórdão recorrido a quaestio — que somente agora veio a ser suscitada pela parte recorrente—, deixa de caracterizar-se, tecnicamente, o prequestionamento da matéria, necessário ao conhecimento do recurso extraordinário (RTJ 98/754 — 116/451). A imprescindibilidade do prequestionamento como requisito viabi fixador do apelo extremo impõe, consoante adverte Castro Nunes («Teoria e Prática do Poder Judiciário», pág. 345, item n° 11, 1943, Forense), R.T.I —150 a existência de «uma controvérsia anterior à interposição do recurso», verbis: É que, pelo recurso extraordinário, o Supremo Tribunal não julga questões novas, que já então seriam por ele decididas em instância (mica.» É pacífico o entendimento deste Supremo Tribunal — apoiado no magistério da doutrina (Rodolfo de Camargo Mancuso, «Recurso Extraordinário e Recurso Especial», págs. 123/124, 1990, RT) —, no sentido de que «No exame do recurso extraordinário, no Supremo Tribunal Federal, não é aplicável o princípio jura novit cursa, pelo que os temas a serem apreciados devem ser anteriormente examinados na instância a quo. É o que resulta da jurisprudência consubstanciada nos Verbetes na 282 e 356 da Súmula.» (RE 99.978-7 (EDc1), Rel. Min. Aldir Passarinho, DJ de 22-8-86). «Não se aplica ao julgamento do recurso extraordinário, pelo Supremo Tribunal Federal, o princípio jura novit Mia.» (Ag 141.873-7-SP (AgRg), Rel. Min. Celso de Meio, DJ de 7-5-93). Disso tudo resulta a impossibilidade de apreciar, nesta sede recursal, um tema jurídico que, por ausência de prequestionamento, não pode ter acesso à via do apelo extremo. Finalmente, não procede a alegação do ora agravante de que precedente desta Corte, em matéria análoga, teria merecido, em sede de processo injuncional, decisão incompatível com o teor do ato decisório ora impugnado. Uma leitura atenta da decisão proferida no MI 215-1-RS (DJ de 16-3-90) evidencia 317 que a referência à incompletude das normas inscritas no art. 201, §* 5° e 6°, da Consfituição Federal foi feita ad argumentandum Untura, com o claro propósito de demonstrar que, mesmo que se reconhecesse a necessidade de ulterior integração normativa dos preceitos em questão (não se declarou, portanto, que era imprescindível a interpositio legislatoris), a ação injuncional, de todo modo, não mereceria Utak° pelo fato de, a partir da formalização de proposições legislativas várias concernentes à matéria, não mais ~imputável ao Congresso Nacional, precisamente pelo caráter positivo dessa atuação parlamentar, a inertia agendi vel deliberandi, cuja ocorrência pode, em tese, dar lugar ao mandado de injunção. Assim, e com estas considerações, nego provimento ao presente agravo. É o meu voto. EXTRATO DA ATA Ag 152.992 (AgRg) — SP — Rel.: Mn. Celso de Mello. Agte.: Instituto Nacional do Seguro Social — INSS (Adva.: Vilma Westmann Anderlini). Agda.: Maria Aparecida Monteiro (Adv.: José Ferreira das Neves). Decisão: A Turma negou provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Relator. Unânime. Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Sydney Sanches, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e limar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Miguel Franzino Pereira. Brasília, 3 de agosto de 1993 — Ricardo Dias Duarte, Secretário. 318 R.T.J. — 150 AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 153377 (AgRg) — RJ (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio Agravante: Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do Estado do Rio de Janeiro — CREA — Agravado: Emerson B. Martins Recurso. Representação processual. Autarquia Corporativista (Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia) —Adrocoda-Geral da Unido. A legislação disdplinadora da Advocacia-Geral da União não dispôs sobre o aproveitamento automático dos advogados das autarquias corporativistas, mormente considerada a inexistência de demonstração do vinculo empregaticio. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em negar provimento ao agravo regimental. Brasília, 24 de agosto de 1993 — Néri da Silveira, Presidente — Marco Aurélio, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Marco Aurélio: Deixei de conhecer do pedido formulado no agravo de instrumento em face à irregularidade da representação processual. Não foi trasladado o instrumento de mandato. Observei, assim, o Verbete de n° 288 que integra a Súmula da jurisprudência predominante desta Corte. O Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do Estado do Rio de Janeiro — CREA/RJ, ressaltando a qualidade de autarquia federal, sustenta que, a teor do disposto no artigo 17 da Lei Complementar n°73, de 10 de fevereiro de 1993, tem a representação exercida pela Advocacia-Geral da União e que a subscritora do agravo, atuando como advogada da Autarquia, passou a compor a Instituição. Procedeu à juntada do instrumento de folha 55, acompanhado da peça relativa à transferência dos poderes, com reservas, de folha 56. Recebi os presentes autos para exame em 2 de agosto de 1993, liberando-os em 4 seguinte. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relato): Conheço deste agravo regimental, porquanto atendidos os pressupostos de recorribilidade que lhe são próprios. Os documentos de folhas 55 e 56 revelam regular a representação processual, sendo que o recurso foi protocolado dentro do prazo legal. No mais, ainda que se pudesse agasalhar a tese sobre a integração automática dos advogados das autarquias corporativistas, com ou sem vínculo empregai:feio, à Advocacia-Geral da União, passo demasiadamente largo, verifica-se que o agravo interposto foi subscrito pela profissional da advocacia Dra. Regina Célia Pinheiro Amorim Fonseca, que se qualificou como advogada. O credenciamento veio aos autos mediante peça reveladora de substabelecimento, isto quando da protocolação do regimental. O artigo 17 da Lei Complementar n° 73, no que prevê que aos órgãos jurídicos das autarquias e das fundações públicas compete a sua representação judicial e extrajudicial, bem como a atividade de consultoria e assessoramento jurídico, espelha R.TJ —150 justamente o contrário do que sustentado. Revela a preservação de tais órgãos nas estruturas respectivas. De qualquer forma, a representação das autarquias pressupõe o vínculo dos procuradores como tais, e este não ficou comprovado nos autos. Por estas razões, tenho como íntegra a referência ao Verbete de n° 288 da Súmula. Nego acolhida ao pedido formulado no regimental. É como voto. EXTRATO DA ATA Ag 153.377 (AgRg) —RJ —Rel.: Min. Marco Aurélio. Agte.: Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia 319 do Estado do Rio de Janeiro — CREA (Advs.: Regina Célia Pinheiro Amorim Fonseca e outros). Agdo.: Emerson B. Martins. Decisão: Por unanimidade, a Turma negou provimento ao agravo regimental. Presidência do Sr. Ministro Néri da Silveira. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Paulo Brossard, Carlos Velloso e Marco Aurélio. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Francisco Rezek. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Artur Castilho Pereira Neto. Brasília, 24 de agosto de 1993 — José Wilson Aragão, Secretário. AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 153.625 (AgRg) — RS (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro limar Gaivão Agravante: Estado do Rio Grande do Sul—Agravada Sucessão de Albertina Cangeri Imposto de transmissão causa mortas. Alkuota. Fixação pelo Senado Federal —CF169, art. 23, I. CFISS, art. 15% IV. A nova Carta Constitucional manteve a antiga regra de que cabe ao Senado Federal estabelecer as aliquotas máximas do imposto de transmissão causa moras. Diante da existência de resolução reguladora da matéria compatível com o novo texto, não restou espaço para o legislador estadual dispor acerca da alíquota do tributo, sob invocação do 3° do art. 34 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Agravo regimental improvido. ACÓRDÃO RELATÓRIO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Relator. O Sr. Ministro limar Gaivão (Relator): O despacho contra o qual o Estado do Rio Grande do Sul manifesta agravo regimental temo seguinte teor (fl. 63): Brasília, 14 de setembro de 1993 — Moreira Alves, Presidente — Binar Gaivão, Relator. «O Estado do Rio Grande do Sul recorre extraordinariamente contra o acórdão do Tribunal de Justiça da mesma unidade federativa que, nos autos do inventário dos bens deixados por morte do agravado, determinou o recolhimen- 320 R.TJ. —150 to do imposto de transmissão causa mores a uma alíquota máxima de 4%, quando o correto seria de 8%, conforme determina a legislação estadual. Alega que foram afrontados os §§ 3° e 5° do art. 34 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias e o art. 155, § 1°, inc. IV, da Constituição Federal. O recorrente sustenta que a Lei Estadual n° 8.821/89, que fixou a alíquota de 8%, superior à de 4% prevista na Resolução n° 99/81, do Senado Federal, foi recepcionada pelo Sistema Tributário Nacional introduzido pela Constituição Federal vigente, enquanto que o ato senatorial é totalmente incompatível com a nova distribuição de competência tributária. A via recursal foi trancadana origem, aludindo-se o despacho a precedentes, do mesmo Tribunal, em casos similares, que concluíram não só pela inconstitucionalidade da Lei n° 8.821/89, como também que a Resolução do Senado fora recepcionada pelo texto constitucional, permanecendo, pois, inalterada a competência para fixação de tdíquota máxima do imposto de transmissão causa morlis. A Lei Magna impõe ao Senado Federal a determinação das alíquotas máximas do referido tributo. A legislação estadual não pode ultrapassar os limites estabelecidos pela Resolução. A situação anterior não se modificou ante o advento da Carta atual, de modo que a afirmação da decisão recorrida no sentido de que a Resolução n° 9W81 foi recepcionada no concemente ao texto das alíquotas não há de ser contestada frente aos preceitos constitucionais invocados. Assim, frente ao art. 38 da Lei n° 8.038/90 e ao § 1° do art. 21 do RISTF, nego seguimento ao agravo.» Sustenta o agravante que o despacho não podia analisar o mérito da causa, cabendo-lhe apenas enfrentar os pressupostos de admissibilidade do recurso extraordinário, e que estes se encontram preenchidos. Afirma que os fundamentos da decisão no sentido de que a Resolução do Senado Federal — que limitou as alíquotas de 4% (quatro por cento) —foi recepcionada pelo atual texto constitucional não podiam levar à conclusão de que o recurso é manifestamente incabível ou improcedente, pois isso concerne ao mérito da controvérsia. Reedita os argumentos expendidos no agravo de instrumento, salientando que este Supremo Tribunal Federal tem determinado a subida de recurso para melhor exame, devendo assim proceder em relação a estes autos. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro limar Gaivão (Relator): A Lei n° 8.038/90, em seu artigo 38, contrariamente ao que entende o agravante, autoriza o relator, no Supremo Tribunal Federal, a negar seguimento ao recurso manifestamente incabível ou improcedente. Recurso extraordinário dessa espécie, entre outros, é o que vem fundado em alegação, manifestamente improcedente, de ofensa à Constituição Federal. Trata-se de hipótese de não-conhecimento do recurso, conforme vetusta orientação do Supremo Tribunal Federal, nada impedindo, pois, que, diante de sua configuração, o próprio Relator, que a tanto, antes da Lei n° 8.038/90, já se achava autorizado pelo art. 21, § 1°, do RISTF, negue, de pronto, seguimento ao apelo, tanto mais quando se sabe que de sua decisão cabe recurso da espécie ora apreciada, para o Colegiado. Não há falar-se, pois, em usurpação da competência da Corte pela decisão agravada. No tocante ao mérito, melhor êxito não colhe o recorrente. R.TJ — 150 Com efeito, a Carta de 1988, no que concerne ao imposto de transmissão de bens imóveis e de direitos reais sobre imóveis, até então previsto de forma integral como de competência dos Estados (art. 23, 1, da CF/69), o que fez foi desmembrá-lo, deixando com os Estados tão-somente a parte relativa à transmissão causa morde e por doação (art. 155, 1, a) e atribuindo o restante aos Municípios (art. 156, 11). Não houve, portanto, criação de novo imposto, mas simples desdobramento de tributo já existente. Relativamente ao que foi deixado à competência dos Estados, manteve a nova Carta, no art. 155, IV, a antiga regra (art. 23, § 2°, segunda parte, da CF/69) de que cabe ao Senado Federal estabelecer as aliquotas máximas do tributo, já agora, é verdade, independentemente de proposta do Presidente da República, aspecto irrelevante para o deslinde da controvérsia. Sendo assim, se de novo imposto não se trata e já que se estava diante de resolução do Senado reguladora da matéria, é fora de dúvida que, em face do princípio da recepção, pelo qual é de ter-se como sobreviventes ao advento da nova Carta, as nomes que se mostram com ela compatíveis, como previsto no art. 34, § 5°, do ADCT/88, especificamente para a matéria tributária, é fora de dúvida que não restou espaço para falar-se em omissão da aludida Casa, suscetível de ser sanada pelo legislador estadual ou ensejadora de pretensa competência legislativa, ilimitada, dos Estados, acerca das mencionadas alíquotas, muito menos sob invocação do § 3° do ~acionado preceito transitório, que não trata de delegação dessa espécie. Hipótese símile já foi apreciada pela Segunda Turma (AgRg n° 150.617-3, Relator o eminente Ministro Marco Aurélio, DJ de 20-8-93), com acórdão assim ementado: «Imposto causa mos*. Alíquota — Atuação dos Estados. Tal como 321 previsto na Carta pretérita — § 2° do artigo 23 — a atual reserva ao Senado Federal a fixação das alíquotas referentes ao imposto causa morta — inciso IV do artigo 155. Não há como falar em transgressão ao artigo 34, §§ 3° e 4°, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias quando o provimento judicial repousa nessas premissas. Impossível é perquirir da lacuna indispensável a que se tenha como legítima a atuação da unidade federativa prevista no § 3° do artigo 34 referido, valendo notar que, pela regra inserta no § 5° desse artigo, o afastamento da legislação anterior, para ensejar a atividade dos Estados, pressupõe incompatibilidade, ou seja, lacuna.» Havendo o acórdão recorrido decidido de acordo com essa orientação, não há que se falar em afronta aos textos constitucionais invocados e, conseqüentemente, em cabimento do recurso extraordinário. Meu voto, pois, é no sentido de negar provimento ao agravo regimental. EXTRATO DA ATA Ag 153.625 (AgRg) —RS —Rel.: Min. limar Gaivão. Agte.: Estado do Rio Grande do Sul (Advs.: Vera Lucia Zanette e outros). Agdo.: Sucessão de Albertina Cangeri (Advs.: Nelco Sangoi e outro). Decisão: A Turma negou provimento ao agravo, nos termos do voto do Relator. Unânime. Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Sydney Sanches, Celso de Mello e limar Gaivão. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Sepftiveda Pertence. Subprocurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza. Brasília, 14 de setembro de 1993 — Ricardo Dias Duarte, Secretário. 322 RT.J. — 150 AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 153.870 (AgRg) — SP (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Sydney Banhes Agravante: Carlos Roberto Micelli — Agravado: Primeiro Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo Recurso. «Fax». Embargos dedaratúrios opostos a decisão de Relator de Agravo de Instrumento, no Supremo Tribunal Federal. Conversão dos embargos em agravo regimental. Não conhecimento deste, porém, por intempestivo. O recurso pode ser interposto, no Supremo Tribunal Federal, mediante «fax», mas a petição original deve ser apresentada à Secretaria do Tribunal, no prazo legal, sob pena de ser considerado intempestivo. Precedentes. Agravo regimental não conhecido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em não conhecer do agravo, nos termos do voto do Relator. Brasília, 28 de setembro de 1993 — Moreira Alves, Presidente — Sydney Sanches, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Sydney Sanches (Relatar): 1. Às fls. 102/103, proferi, como Relator, a seguinte decisão: «Decisão: 1. A respeitável decisão, impugnada mediante o presente agravo de instrumento, tem o teor seguinte (fl. 91): «Processo n't 525.158-7/02 — São Paulo (fls. 249-58): Nos termos do art. 105, II, b, da Constituição da República, denegada a ordem em mandado de segurança originário, cabível recurso ordinário. Consoante posicionamento firmado pelo Colendo Supremo Tribunal Federal, 'A locução constitucional — <quando denegaténa a decisão> — tem sentido amplo, pois não sé compreende as decisões que, apreciando o meritum causae, indeferem o pedido de mandado de segurança, como também abrange aquelas que, sem julgamento do mérito, operam a extinção do processo' (Supremo Tribunal Federal — Pleno — Mandado de Segurança n° 21.112-1 — PR — AgRg, Relator Ministro Celso de Mello, in DJ de 29-6-90, pág. 6220). In casa, indeferida a petição inicial do mandamus e julgado extinto processo, foi negado provimento ao agravo regimental interposto e rejeitados os embargos de declaração apresentados. Assim, induvidosamente não se valeu o ora recorrente da via recursal adequada, razão por que indefiro o processamento do recurso extraordinário. São Paulo, 24 de novembro de 1992 Ass.: Paulo Bonito Junior, Vice-Presidente, no impedimento do Presidente» R.TJ —150 2. Na petição de interposição do agravo (fls. 315), insiste o agravante no processamento do recurso extraordinário, invocando o direito de ação, os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa e alegando o descumprimento do inc. IX do art. 93 da Constituição Federal, porque não fundamentada a decisão agravada. Decido: Como demonstrou a respeitável decisão impugnada, o recurso cabível, na espécie, era o ordinário, para o Superior Tribunal de Justiça (art. 105, II, b, da Constituição Federal), e não o extraordinário para o Supremo Tribunal Federal (art. 102, III, da Constituição Federal), (v. tb. arts. 26 e seguintes e art. 33 da Lei n° 8.038, de 28-5-90), não podendo este preceder o exaurimento das instâncias ordinárias. Nesse sentido é a orientação do precedente do Plenário desta Corte, referido na decisão ora recorrida. E nas razões de agravo não conseguiu o agravante demonstrar o desacerto desta. Nem que lhe haja faltado fundamentação. 3. Isto posto, com base no art. 21, parágrafo 1°, do RISTF, e no art. 38 da Lei n° 8.038, de 28-5-90, nego seguimento ao agravo de instrumento. Publique-se.» 2. Inconformado, o agravante, apresentou «embargos declaratórios», mediante «fax», alegando e pleiteando o seguinte: «1°) em 12 de agosto de 1993, pela imprensa oficial foi publicado o r. despacho judicial: 'Decido: 1. Como demonstrou a respeitável decisão impugnada, o recurso cabível, na espécie, era o ordinário, para o Superior Tribunal de Justiça (art. 105, II, b, da Constituição Federal), e não o ex- 323 traordinário para o Supremo Tribunal Federal (art. 102, III, da Constituição Federal) (v. tb. arts. 26 e seguintes e art. 33 da Lei n° 8.038, de 28-5-90), não podendo este preceder o exaurimento das instâncias ordinárias.... Data magma veda, inicialmente:— Os embargos de declaração podem caber contra qualquer decisão judicial, seja qual for a sua espécie, o órgão de que emane e o grau de jurisdição em que se profira... (extraído da pág. 215, da monografia 'O Novo Processo Civil Brasileiro' da lavra do insigne Ministro Barbosa Moreira), com todo respeito e acatamento o nosso pedido para endereçar ao Pretório Excelso em virtude do digno Presidente enfeixar a figura máxima da Magistratura Nacional, portanto, existiu simplesmente o excesso de zelo pela matéria inusitada e não foi tratada de maneira correta como poderá o Prof. Cândido R. Dinamarco na pág. 275 da 'A lastmmentalidade do Processo': 'O juiz moderno compreende que só se lhe exige imparcialidade no que diz respeito à oferta de iguais oportunidades às partes e recusa a estabelecer distinções em razão das próprias pessoas ou reveladoras de preferências personalíssimas. Não se lhe tolera, porém, a indiferença. ...', explicitar-nos. 2°) Data maxima veda, com todo o acatamento e respeito, o presente Embargos de Declaração tem a finalidade precfpua de esclarecer unia obscuridade ou seja não foi invocado o princípio da fungibilidade e havendo a substitutibilidade do encaminhamento legal do presente Agravo de Instrumento, para ser acolhido e julgado no Egrégio Superior Tribunal de Justiça, Brasília, DF. 3°) Data veda, pela sensibilidade jurídico-social do insigne Ministro Relator, sem dúvida irá visualizar o nosso pedido sob a ótica inserida na 'HameneuÚca e Aplicação do Direito' nas págs. 324 R.TJ. — 150 168/9 do inesquecível jurista Carlos Hutt juritis, pereat Maximiliano: mundus': 'Faça-se justiça, ainda que o mundo pereça'. A interpretação sociológica atende cada vez mais às conseqüências prováveis de um modo de entender e aplicar determinado texto; quanto possível busca uma conclusão benéfica e compatível com o bem geral e as idéias modernas de proteção aos fracos, de solidariedade humana. Faça-se justiça, porém de tal sorte que o mundo prossiga a rumo dos seus altos destinos... 'Sum. mum jos, summa injuria': 'supremo direito, suprema justiça'; 'direito elevado ao máximo, injustiça em grau máximo resultante'. O excesso de juridicidade é contraproducente; afasta-se do objetivo superior das leis; desvia os pretórios dos fins elevados para que foram instituídos; 'faça-se justiça, porém do modo mais humano possível, de sorte que o mundo progrida, e jamais pereça. ...' Data maodma venial, esta é a única medida jurídica, com devido respeito e acatamento, que entendemos compatível para não colocar o art. 1°, eaput da Lei Magna em xeque ou seja, o Estado Democrático de Direito e sem postergar os incisos II e III do mesmo comando constitucional que consagra a cidadania e a dignidade da pessoa humana e levando em consideração o art. 85 do Código Civil: 'Nas declarações de vontade se atenderá mais à sua intenção que ao sentido literal da linguagem'. Para acolher nosso Embargos de Declaração e, data venta, utilizando-se do princípio da fungibilidade se digne remeter o presente Agravo de Instrumento para o Egrégio Superior Tribunal de Justiça para ser apreciado. Isto posto, aguardamos com toda a serenidade e confiança creio no Pretório Excelso e no digno e honrado Ministro Relator, por esta Justiça feita por ho- meus de sólida formação moral, que se nutrem de um sentimento comum de nacionalidade, de amor a seu povo e ao Direito, que sabem encontrar, mesmo além do texto frio da lei, os caminhos da Paz Social para ser modificado o r. despacho judicial como orienta a jurisprudência pacífica (RTJ 86/359, RE 88.958; RTJ 43/323, RE 56.300; RTJ 53/332, RE 67.953; RTJ 8W548 e RTJ 94/1167, RE 87.092) para assegurar uma diretriz segura e legal para o acolhimento do presente Embargos de Declaração e haver a sua modificação e adequação ao técnico-jurídico e ao justo. Nestes termos, p. deferimento. 'Ilyrk deison' De Araraquara p/Brasflia, 17 de agosto de 1993 — Carlos Roberto MieeR1, OAB/SP n° 39.102.» Às fls. 108/109, veio para os autos o original da petição de interposição dos «embargos declaratórios.» À fl. 110, despachei, encaminhando os autos a esta l• Turma, para exame dos «embargos declaratórios», como agravo regimental (art. 317 do RISTF) e determinando a retificação da autuação, quanto a isso. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Sydney Sanches (Relator): Embargos declaratórios não são oponíveis a decisão singular de Relator, no Supremo Tribunal Federal, em face do disposto no art. 337 do seu Regimento Interno, segundo o qual são eles cabíveis contra acórdão. E não pode o recurso ser conhecido como agravo regimental, que seria o cabível na espécie, porque, embora interposto mediante «fax», no prazo legal, a petição original só foi apresentada ao protocolo da Secretaria do Tribunal fora desse prazo. É que a decisão recosida foi publicada no dia 12-8-93, R.TJ —150 quinta-feira, dia útil, tendo-se escoado o prazo de cinco dias, a 17-8. O original do recurso s6 se protocolou no dia 18-8. Intempestivamene, portanto. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem entendido que a petição original deve ser apresentada ao protocolo dentro do prazo legal (MI 372-6 (AgRg), Rel. Mia. Celso de Mello, DJ de 21-2-92; MS 21.230 (AgRg), Rel. Min. Paulo Brossard, DJ de 24-10-91; MS 21A03-1, Rel. Mia Moreira Alves, DJ de 21-10-91; Ag 143.783 (AgRg), Rel. Mui. Celso de Mello, DJ de 4-9-92; Ag. 140.697-6 (AgRg), hfin. Sepúlveda Pertence, DJ de 24492; Ag. 136.727, Rel. /Tm. Celso de Mello, Dl de 14-9-93, pág. 18669). Não conheço, pois, do recurso. 325 EXTRATO DA ATA Ag 153.870 (AgRg) (AgRg)—SP—Rel.: Min. Sydney Sanches. Agte.: Carlos Roberto Micelli (Adv.: O mesmo). Agdo.: Primeiro Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo. Decisão: A Turma não conheceu do agravo, nos termos do voto do Relator. Unânime. Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Sydney S Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e limar Gaivão. Subprocurador-Geral da República, Dr. Artur Castilho Pereira Neto. Brasília, 28 de setembro de 1993 — Ricardo Dias Duarte, Sevtário. RECURSO EXTRAORDINÁRIO W158.315 — PB (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro limar Gaivão Recorrente Antónia Lúcia Navarro Braga — Recorridos: Partido Social Trabalhista — Procuradoria Regional Eleitoral Eleitoral Impugnação a registro de candidatura a Prefeito de capital Inelegibilidade. Candidata casada civilmente com ex-prefsito, que renunciou ao mandato executivo para postular outro cargo majoritário. Prejudicialidade. Tendo o recurso extraordinário ingressado no Supremo Tribunal Federal após a realização das eleições de 3 de outubro de 1992, deve-se considerá-lo prejudicado, em razão de ter perdido objeto, visto que se limita a pedido de registro de candidatura ao referido pleito. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, por seu Tribunal Pleno, na ~anuidade da ata do julgamento e das noas taquilliftelcas , por unanimidade de votos, em julgar prejudicado o recurso. Brasília, 4 de agosto de 1993 — Octavio Gallotti, Presidente — limar Gaivão, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro limar Gaivão (Relatar): O Partido Social Trabalhista — PST impugnou o registro da candidatura a Pre- 326 R.TJ. — 150 feito da cidade de João Pessoa da Deputada Federal Antônio Lúcia Navarro Braga pelo Partido Democrático Trabalhista — PDT. Argumentou no sentido da inelegibilidade, tendo em vista que a candidata é casada civilmente com o ex-Prefeito eleito no ano de 1988, para mandato de quatro anos, embom não o tenha concluído, por ter renunciado em abril de 1990 para se candidatar ao Governo do Estado da Paraíba, não logrando êxito no pleito. A impugnação foi julgada procedente pelo MM. Juiz Eleitoral, vindo a ser indeferida pelo Tribunal Regional Eleitoral, que proclamou a elegibilidade da candidata, considerando que seu marido havia renunciado na primeira metade do mandato, inocorrendo a vedação do art. 14, § 7 3, da Constituição Federal. Em grau de recurso especial, interposto pelo Procurador Regional Eleitoral e pelo impugnante, o Tribunal Superior Eleitoral reformou a decisão regional, em acórdão de que foi relator o Ministro José Cândido. Ficou expressa no acórdão a inelegibilidade da recorrida para o cargo de Prefeito, no território da jurisdição do titular, seu cônjuge, mesmo tendo ocorrido afastamento definitivo do cargo por tempo superior ao referido no art. l4, § 7°, da Constituição. No recurso extraordinário interposto com fundamento no art. 102, BI, a, da Constituição Federal alega-se que a exegese proclamada pelo acórdão recorrido não pode prevalecer, pois consagraria interpretação ofensiva aos §§ 5°, 6° e z do art. 14 da Carta Federal. recurso foi admitido pelo seguinte despacho (fi. 305): «Antônio Lúcia Navarro Braga, candidata a Prefeito do município de João Pessoa, PB, pela legenda do Partido Democrático Trabalhista —PDT, nas eleições de 3 de outubro passado, manifesta recurso extraordinário da decisão do Tribunal Superior Eleitoral consubstanciado no Acórdão n° 12.552, de 17 de r setembro de 1992, que a declarou inelegível para o cargo à vista do disposto no § 7° do artigo 14, da Constituição Federal, uma vez ser a candidata cônjuge do então Titular do cargo. Nas razões do extraordinário, alegase afronta ao disposto nos §§ 5°, 6° e 7° do mesmo artigo 14, em razão da interpretação sistemática e teleológica emprestada pelo Tribunal aos referidos dispositivos constitucionais. O Tribunal, ao declarar a inelegibilidade, considerou sua orientação já consagrada no sentido de que a norma ínsita no § 7° do artigo 14 da Carta de 1988 comporta interpretação teleológica compatível com o princípio republicano da não continuidade dos ocupantes de cargo de Chefia do Executivo, evitando, destarte, a colocação da máquina administrativa a serviço de candidaturas, a fim de propiciar sucessões. Conquanto o recurso possa ser considerado prejudicado, face a realização das eleições municipais, a relevância da quaestio iuris é incontestável e merece ser examinada pelo egrégio Supremo Tribunal Federal, razão pela qual admito o seu processamento.» A Procuradoria-Geral da República opinou pelo não-conhecimento do recurso nestes ternos (fi. 315): «Observo, preliminarmente, que a petição de recurso e as respectivas razões, incluirias as assinaturas dos mandatários da recorrente, foram juntadas aos autos por fotocópia, o que impede o conhecimento do recurso. Além disso, é certo que a pretensão da recorrente está prejudicada, pela superveniência da eleição, de que não participou por força do acórdão recorrido —como, aliás, já observou o Presidente do Tribunal Superior Eleitoral, no despacho de admissão. R.TJ — 150 De todo modo, parece-me acertada a interpretação dada por tal acórdão aos dispositivos constitucionais apontados conto infringidos: a Carta quis evitar a continuidade (para não dizer perpetua ção) de indivíduos (art. 14, § 5°) ou grupos familiares (art. 14, § 7°) em cargos de chefia do Poder Executivo. A aplicação do prazo do § 6°, pretendida pela recorrente, é inaceitável, pois tal dispositivo trata de matéria diversa — a concorrência dos titulares desses cargos a outros cargos eletivos — ao passo que a vedação do § r, segundo o Tribunal Superior Eleitoral, limita-se ao mesmo cargo.» É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Betar Gaivão (Relator): Há a examinar a questão preliminar da prejudicialidade do extraordinário, apontada no despacho presidencial de admissibilidade e no parecer da Procuradoria-Geral da República, em face de o recurso ter sido apreciado após a realização das eleições municipais de 3 de outubro de 1992. Segundo precedentes específicos desta Corte (RE 118.068; RE 118.268; RE 118.272; RE 118.308), tendo aqui che- 327 gado o recurso extraordinário, em 23 de outubro de 1992, após a realização das eleições, deve-se considerá-lo prejudicado, em razão de ter perdido objeto, visto que se limita a pedido de registro de candidatura ao referido pleito. Nesse sentido o meu voto. EXTRATO DA ATA RE 158.315 — PB — Rel.: Min. limar Gaivão. Recta.: Antonia Lúcia Navarro Braga. (Advs.: Antonio Vital do Rego e outros). Recdo.: Partido Social Trabalhista. (Advs.: Luiz Rafael Mayer e outros). Renda: Procuradoria Regional Eleitoral. Decisão: Por votação unanime, o Tribunal julgou prejudicado o recurso. Votou o Presidente. Presidência do Sr. Ministro Otavio Gallotti. Presentes à Sessão os Sn. Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira, Sydney Sambes, Sepedveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Venoso, Marco Aurélio e limar Gaivão. Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Paulo Brossazd e Francisco Rezek. Vice-Procurador-Geral da República, Dr. Moacir Antonio Machado da Silva. Brasília, 4 de agosto de 1993 — Luiz Tomimatsu, Secretário. RECURSO EXTRAORDINÁRIO rir 160.322 (AgRg) — SP (Primdra Turma) Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello Agravante: Instituto Nacional do Seguro Social — INSS — Agravado: Dionisio do Disterro Marques Rasam extraordinário. Recesso forense ido comprovado. Embargos de declaração extanportbteas. Ineficácia suspensiva do prazo recurso!. Intempesilvidade do apelo extrema Agravo regimental intprovido. O prazo legal referente à interposição do recurso extraordinário não se suspende quando os embargos de declaração, opostos ao acórdão do Tribunal inferior, são deduzidos extemporaneamente. —150 328 O Supremo Tribunal Federal, não está vinculado aos pronundamentos da instância a quo, pertinentes ao juízo de admissibilidade dos recursos. A drcunsanda de o Tribunal local deixar de reconhecer a extemporaneidade dos embargos de declaração não subtrai à Suprema Corte o poder de reexaminar esse pressuposto mamai, que constitui elemento necessário à verificação da tempestividade do próprio apelo extremo. Isto posto, nego seguimento ao recurso extraordinário dada a sua evidente intempestividade (Lei n° 8.038/90, art. 38).» Inconformado, o INSS intapfie agravo regimental, sustentando a tempestividade dos embargos declaratórios e a conseqüente suspensão do prazo do recurso extraordinário, por se ter verificado, no período, recesso forense. De outro lado, argumenta que a suspensividade dos embargos de declaração decorre, de todo modo, da circunstância de o Tribunal a quo tê-los julgado e acolhido. O Sr. Ministro Celso de Mello: Neguei É o relatório. trânsito ao presente recurso extraordinário VOTO nos seguintes termos: O Sr. Ministro Celso de Mello (Rela«Trata-se de recurso extraordinário, admitido na origem, interposto contra tor): Nego provimento ao agravo. acórdão do Segundo Tribunal de Alçada Não obstante o agravante sustente ter Civil de são Paulo, com base no art. 102, havido recesso forense no período comIQ, a, da Constituição Federal. preendido entre 16-4-92 (quinta-feira sanO recurso é intempestivo. Publicado ta) e 21-4-92 (Tiradentes), nada há nos o acórdão recorrido em 6-4-92, segun- autos que comprove a suspensão do curso da-feira, foram opostos, extempora- dos prazos nesses dias. Tampouco o agravante fez juntar certineamente, embargos de declaração dão expedida pelo Tribunal a quo, comproem 22-4-92, quarta-feira. vando a ocorrência do recesso. A intempestividade dos embargos Não podendo presumir a alegada susretira-lhes o efeito suspensivo do prazo correspondente ao recurso principal — pensão de prazos no âmbito do Tribunal a o recurso extraordinário, no caso. Com quo, tenho que, publicado o acórdão em isso, o prazo de trinta dias fixado para a 6-4-92, segunda-feira, o prazo de dez dias interposição do recurso extraordinário viu-se esgotar em 16-4-92, quinta-feira santa. Ainda que se considere essa data como viu-se esgotar em 6-5-92, terça-feira. feriado forense, os embargos hão de ser O recurso extraordinário, contudo, tidos como intempestivos. O primeiro dia só foi interposto em 27-5-92, quarta-fei- útil após a Semana Santa foi 20-4-92, sera, após a publicação do acórdão lavrado gunda-feira; o recurso, porém, foi protoconos embargos em 15-5-92, sexta-feira. lizado apenas em 22-4-92, quarta-feira. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Primeira Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em negar provimento ao agravo regimental. Brasília, 25 de maio de 1993 —Moreira Alves, Presidente — Celso de Mello, Relator. RELATÓRIO RTJ —150 Por último, não procede o argumento do INSS no sentido de que o julgamento dos embargos pelo Tribunal de origem ilide a sua eventual intempestividade. O Supremo Tribunal Federal não está vinculado, de modo algum, aos pronunciamentos da instância a quo, pertinentes ao juízo de admissibilidade dos recursos. A circunstância de o Tribunal local deixar de constatar a extemporaneidade dos embargos de declaração não subtrai à Suprema Corte o poder de reexaminar esse pressuposto recursal, que constitui elemento necessário à verificação da tempestividade do próprio apelo extremo. A intempestividade dos embargos de declaração—que os argumentos de agravo não lograram infirmar — retira-lhes, consoante registra a própria decisão agravada, o efeito suspensivo do prazo referente ao recurso extraordinário. Impõe-se acentuar que essa ineficácia suspensiva dos embargos de declaração extemporâneos tem sido reconhecida e proclamada pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, cujos pronunciamentos advertem que os prazos recursais não se suspendem «com os embargos declaratórios interpostos a destempo» (RTJ 121/1252, Rel. Mm. Carlos Madeira). 329 Publicado o acórdão recorrido em 6-4-92, o prazo para a interposição do apelo extremo pelo INSS, que é de 30 dias, esgotou-se em 6-5-92, sendo que o recurso só veio a ser protocolizado em 27-5-92. Intempestivo o recurso extraordinário, mantenho a decisão que lhe negou seguimento. É o meu voto. EXTRATO DA ATA RE 160.322 (AgRg) — SP —Rel.: Min. Celso de Mello. Agte.: Instituto Nacional do Seguro Social — INSS (Adva.: Maria Teresa Ferreira Cahali). Agdo.: Dionisio do Disterro Marques (Advs.: Luiz Gonzaga Curi Kachan e outros). Decisão: A Turma negou provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Relator. Unânime. Presidência do Sr. Ministro Moreira Alves. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e limar Gaivão. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Sydney Sanches. Subprocurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza. Brasília, 25 de maio de 1993, Ricardo Dias Duarte, Secretário. RECURSO EXTRAORDINÁRIO N' 161390 — AL (Medida Cautelar) (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence Requerente: Procurador-Geral de Justiça do Estado de Alagoas —Requerido: Câmara Municipal de Maceió Controle de constitucionalidade: lei municipal em face de preceito da Constituição do Estado, ainda que se trate de reprodução compulsória de norma da Constituição Federal: competência do Tribunal de Justiça, afirmada em precedente do STF (Red. 383, M. Alves), que aconselha no caso o deferimento de medida cautelar em favor do RE que sustenta a mesma tese. 330 R.T.J. — 150 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em referendar decisão do Ministro Sepúlveda Pertence, que deferira o pedido de medida liminar. Brasília, 1° de abril de 1993 — Octavio Gallotti, Presidente —Sepúlveda Pertence, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Sr. Presidente, o Procurador-Geral de Justiça do Estado de Magoas propôs ao Tribunal de Justiça daquele Estado ação direta de insconstitucionalidade de lei do município de Maceió relativa a cálculo de proventos do funcionalismo municipal. Apontou como parâmetro da inconstitucionalidade argüida a Constituição do Estado. No núcleo da fundamentação da ação direta, aduziu, porém, o Procurador-Geral de Justiça (fl. 6): «No art. 40, incisos I, II, III, a Carta Federal instituiu o modelo de aposentadoria a ser adotado em nosso sistema jurídico: Art. 40.0 servidor será aposentado: I — por invalidez permanente, sendo os proventos integrais quando decorrentes de acidentes em serviço, moléstia profissional ou moléstia grave, contagiável ou incurável, especificadas em lei; II — compulsoriamente, aos setenta anos de idade, com proventos proporcionais ao tempo de serviço; III — voluntariamente: aos trinta e cinco anos de serviço, se homem, e aos trinta, se mulher, com proventos integrais; aos trinta anos de efetivo exercício em funções de magistério, se professor, e vinte e cinco anos, se professora, com proventos integrais; aos trinta anos de serviço, se homem, e aos vinte e cinco, se mulher, com proventos proporcionais a esse tempo; aos sessenta e cinco anos de idade, se homem, e aos sessenta, se mulher, com proventos proporcionais ao tempo de serviço. Com relação ao valor dos proventos, o instituto de aposentadoria deve-se harmonizar com outros princípios constitucionais, dentre eles o da isonomia e o da paridade vencimental, previstos respectivamente nos arts. 5°, caput, e 39, parágrafo primeiro. A isonomia pressupõe iguais oportunidade de ingresso e ascensão funcional no serviço público. Faz parte de sua essência o tratamento igualitário do ponto de vista jurídico aos especificamente iguais nos termos da lei. Essa igualdade assenta-se sobre bases sólidas e transparentes. Valoriza as qualidades técnicas e dedicação demonstradas no dia-a-dia. Já a paridade vencimental, regulamentada por lei complementar, permite que a todos os servidores seja dada a isonomia de vencimentos nos cargos e atribuições assemelhadas ou iguais no âmbito dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Quando o servidor entra em gozo da aposentadoria, deve perceber seus proventos dentro dos padrões acima esposados. Qualquer discriminação legal ou tratamento diferenciado à situação fimcional, tolhendo iguais oportunidades para os servidores, é inconstitucional.), Ft.T.J —150 F., só então, argumenta (fl. 7): «Como não poderia deixar de ser, a Constituição do Estado de Alagoas, em seu art. 57,1, 11, e III, adotou idêntica sistemática de aposentadoria. Além do mais, estabeleceu, em seu art. 47, inciso VIL a isonomia vencimental nos mesmos moldes da Constituição Brasileira. O Tribunal de Justiça deferiu liminar (11.28); no entanto, no julgamento definitivo, o acórdão acolheu, por unanimidade, a preliminar de incompetência do Tribunal de Justiça. Leio a sua fundamentação (11,48): «A hipótese em exame, trata-se de Ação Direta de Inconstitucionalidade Genérica onde o autor — o ProcuradorGeral de Justiça do Estado de Alagoas, pretende a ineficácia da Emenda n° 2/91 — à Lei Orgânica do Município de Maceió, promulgada em 23 de agosto de 1991, que acrescentou ao art. 86 da aludida Lei Orgânica, os parágrafos 6' e 7°, constante do Diário Oficial de 24 de agosto de 1991, alegando afrontar as Constituições Federal e Estadual. Em mesa para julgamento, argüiu-se preliminar de incompetência deste Tribunal de Justiça para o processamento e julgamento da presente ação, face suposta agressão e afronta da Constituição Federal, pelo ato impugnado. Os artigos apontados, na Constituição Estadual e na Federal, instituem como devem ser adotados os princípios norteadores do direito relativo à aposentadoria do servidor público. Portanto, não se há que falar em afronta ao texto constitucional estadual, só e só, uma vez que existindo igual determinação na Constituição Federal, é esta que está sendo afrontada pelo ato impugnado, pois esta sendo superior, deve ser observada. 331 Finalmente, a competência do Coleado Tribunal de Justiça para conhecer e julgar Ação Direta de Inconstitucionalidade, na forma do art. 133, inciso IX, letra o, da Constituição Estadual, só se dá quando o texto impugando lesa a própria Constituição Estadual, o que não ocorre ia casa, uma vez que se existe afronta à Carta Magna do País, esta deve ser observada, tomando competente para julgamento o Coleado Supremo Tribunal Federal, por força do disposto no art. 102, inciso I, letra a, da Constituição Federal.» Donde o recurso extraordinário que, além de repisar argumentos de mérito, ataca o fundamento da preliminar acolhida pelo Tribunal de Justiça, verbis (fl. 65): «Depois, os Tribunais de Justiça são competentes para declarar a inconstitucionalidade de leis municipais, podendo, havendo inconformisrno, ser a matéria novamente apreciada pelo STF, a quem cabe a última palavra sobre o caso. Não observamos, assim, quaisquer conflitos que possam trazer prejuízos à uniformização de julgamentos sobre matérias constitucionais idênticas. Por fim, caso o entendimento constante do Acórdão contestado prevaleça, o STF ficará congestionado de ações, uma vez que o sistema constitucional brasileiro, caracterizado pela prodigalidade de normas, fatalmente lhe transferirá a competência para declarações de inconstitucionalidade de todas as leis municipais do Brasil, pois, a rigor, ao invés de contrariarem as Constituições Estaduais, estaria a grosso modo colidindo com a Carta Maior. Isso seria um absurdo, porque os Tribunais Estaduais, na prática, se julgariam incompetentes para o julgamento de qualquer ação de inconstitucionalidade.» E, ao final, pede liminar, neste recurso extraordinário, aduzindo (11.66): 332 R.TJ. — 150 «A relevância dos fundamentos emerge da exposição antecedente, aqui evocada para evitar cansativa repetição. A lide apresentada à jurisdição desse Eg. Supremo Tribunal Federal sustenta direito plausível, mesmo em se tratando de recurso extraordinário. O receio da ineficácia do provimento final sobressai da realidade exposta, pois diversos pedidos de refomulação de cálculos de proventos com base na Lei Orgânica já foram deferidos peia Procuradoria-Geral do Município, o que está causando evidente dano ao erário. Leve-se em consideração a extrordinária probabilidade de êxito na pretensão do Ministério Público e a quase impossível devolução ao Município dos valores pagos indevidadmente. Inexoravelmente estão unidos o fumas boni Mis e o periculum in mora. Admitido o recurso, que me foi distribuído, deferi a liminar à fl. 78 verso, verbis: «Ad referendum, entendendo presentes os seus pressupostos, defiro a medida cautelar para restabelecer, até o julgamento do presente recurso, a liminar deferida pelo Tribunal a quo» (fi. 28). Para o referendum, trago os autos à apreciação do Plenário. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Como o Tribunal verificou do relatório, a discussão que se estabeleceu neste processo perante o Tribunal de Justiça de Alagoas repisa, com menos desenvolvimento, a longa polêmica em que nos envolvemos, particularmente no julgamento da Reclamação n° 383, relativa ao momentoso caso do 1PTU do Município de São Paulo. Malgrado vencido, ou porque vencido, eu, que sustentara tese similar à do acórdão recorrido, neste caso, tenho de ceda à evidência de que o voto da maioria do Tribunal empresta plausibilidade evidente ao recursos extraordinário e, conseqüentemente, grande probabilidade de que a decisão dele venha a resultar na devolução do caso ao julgamento do Tribunal de Justiça de Alagoas. Ora, se esse, o Tribunal de Magoas, órgão provavelmente competente, julgou reunidos os pressupostos da suspensão cantelar, a mim se me afigurou conveniente o deferimento da liminar para evitar que os riscos — que, segundo o Tribunal, eliminar visou a evitar —, se consumem e se tornem irremediáveis. Por isso, voto pelo referendum. EXTRATO DA ATA RE 161.390 (Medida Cautelar) — AL —Rel.: Min. Sepúlveda Pertence. Reqte.: Procurador-Geral de Justiça do Estdo de Alagoas. Reqda.: Câmara Municipal de Maceió (Mv.: Wellington Calheiros Mendonça)• Decisão: Por votação unânime, o Tribunal referendou decisão do Ministro Sepfdveda Pertence, que deferira o pedido de medida liminar. Votou o Presidente. Procurador-Geral da República, Dr. Moacir Antonio Machado da Silva, na ausência ocasional do Dr. Aristides Junqueira AlvarengaPresidência do Sr. Ministro Octavio lotti. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira, Paulo Brossant, Sepúlveda Pertence, Carlos Venoso, Marco Aurélio e limar Gaivão. Ausentes, justificaria:n=1e, os Srs. Ministros Sydney Sanches, Presidente, Celso de Mello e Francisco Rezek. Procurador-Geral da República, Dr. Aristides Junqueira Alvarenga. Brasília, 1° de abril de 1993 — Luiz Tondmatsu, Secretário. R.T..1 — 150 333 RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 162.139 (AgRg) — SI' (Segunda 'Turma) Relator O Sr. Ministro Paulo Brosaard Agravante: Instituto Nacional do Seguro Social —INSS —Agravado: Santo Augusto Sávio Previdência social. Benefício previdendário. Vinculação conslituakmaL Auto-aplicabilidade. O preceito inserto no art. 201, §§ 5° e 6°, da Constituição Federal é auto-aplicável, porque se qualifica como estrutura jurídica dotada de suficiente densidade normativa. O disposto no § 5° do art. 195 da Constituição Fedaul não constitui óbice à sua incidência, vez que é dirigido ao legislador ordinário, tão-somente no que vincula a criação, majoração ou extensão de beneficio ou serviço da seguridade social à correspondente fonte de custeio. Precedentes. Agravo Regimental a que se nega provimento. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros componentes da Segunda Turma do Supremo Tribunal Fedaal, por tmanimidade de votos e na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, negar provimento ao agravo regimental. Brasília, 22 de junho de 1993 — Néri da Silveira, Presidente — Paulo Broaurd, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Paulo Brossard: Cuida-se de agravo regimental interposto contra decisão denegatória que proferi nos autos do extraordinário, verbis: «Trata-se de recurso extraordinário no qual a recorrente sustenta violação aos acta. 201, e seus parágrafos, e 195, § 5°, da Constituição Federal, e ao art. 59 do ADCT, ao argumento de que a majoração de beneficio previdenciário dependeria da criação da respectiva fonte de custeio, e, assim, a norma constitu- cional inserta no art. 201, §§ 5° e 6°, não tem aplicação imediata. A questão já foi dirimida pela 2° Turma desta Corte no sentido de que as regras atidas nos §§ 5° e 6° do artigo 201 da Constituição Federal têm aplicação imediata. O disposto no § 5° do artigo 195 não as condiciona, já que dirigido ao legislador ordinário, no que vincula a criação, majoração ou extensão de beneficio ou serviço da seguridade social à correspondente fonte de custeio total. Precedentes: Ag(AgRg) 148.401-3, 148.309-2, 148.407-2, 148.342-4, 148.455-2, Relatar Ministro Marco Aurélio, acórdão publicado no DJ de 26 de março de 1993; Ag(AgRg) (Mel) 148.641-5, 148.643-1, 148.658-0, Relata Ministro Carlos Velloso, julgado em 11 de maio de 1993; Ag(AgRg) 152.411-2, 152.407-4, 152.471-6, 152.394-9, 162.212-2, 152.388-4, Relata Ministro Nérl da Silveira, julgado em 14 de maio de 1993. 334 R.TJ. — 150 Ante o exposto, com base no art. 21, § 1°, do RISTF, nego seguimento ao recurso.» No agravo regimental interposto, sustenta a recorrente que o entendimento externado não pode prevalecer, posto que a norma constitucional inserta no art. 195, § 5° somente pode ser interpretada se conjugada com a do art. 59 do ADCT. Portanto, somente com o advento da Lei n° 8.213/91, que as regulamentou, esses dispositivos vieram a ter eficácia plena. E isto porque, para a fruição do direito garantido pelo preceito constitucional, o legislador constituinte fez depender da vontade integrativa do legislador ordinário. Acresce, em apoio a sua tese, que a imperatividade do comando contido no § 5°, tanto do artigo 195, quanto do art. 201, da Constituição Federal, cria um liame de dependência da lei regulamentadora, de sorte a inexistir qualquer razão jurídica para se conferir auto-aplicabilidade a um deles. Após transcrever jurisprudências dos Tribunais Regionais Federais, traz à colação o despacho proferido nos autos do Mandado de Injunção n° 215-1/RS, Relator Ministro Celso de Mello, que assevera ser diametralmente oposto às decisões exaradas. Requer, a final, seja reconsiderada a decisão proferida. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Paulo Brossard (Relator): A questão acerca da auto-aplicabilidade do art. 201, §§ 5° e 6°, da Constituição Federal, já foi dirimida por esta 'ruma, oportunidade em que se firmou o entendimento no sentido de sua eficácia plena, visto que esse preceito constitucional qualifica-se como estrutura jurídica dotada de suficiente densidade normativa, a tomar prescindível qualquer mediação legislativa concretizadora do comando nele positi- vado. Quando a Constituição, em seu § 5° do art. 201, diz que «nenhum beneficio que substitua o salário de contribuição ou o rendimento de trabalho do segurado terá valor mensal inferior ao salário mínimo» estabeleceu um estalão abaixo do qual fica vedado descer. Em caso algum. De modo que o legislador, querendo ou não, está agrilhoado a esse critério certo, definido, inquestionável, conhecido, com força própria para imperar e obstar, sem o auxílio de lei, que nesta parte é inteiramente desnecessária, porque se sabe que nenhum beneficio, nenhum, que substitua o salário de contribuição ou o rendimento de trabalho, nenhum, será inferior a salário mínimo. Portanto, não se concebe a pretensão recursal que busca condicionar a aplicabilidade do art. 201, §§ 5° e 6°, da Constituição, quer à edição de lei, quer à implantação progressiva dos pl