Regressividade do Sistema Tributário Brasileiro
Amir Khair
Nas discussões sobre a proposta de reforma tributária predominou o
conflito federativo e uma questão ficou oculta nas discussões dessa temática: quem
paga a conta pública?
O Brasil tem uma carga tributária elevada e em ascensão e sua
distribuição pela sociedade beneficia quem ganha mais e sacrifica quem ganha menos.
Isso é apresentado no gráfico abaixo que compara a carga tributária
conforme a renda familiar segundo o trabalho da Professora Maria Helena Zockun, no
“Projeto Simplificando Brasil”, de outubro de 2005, baseado nas Pesquisas de
Orçamento Familiar (POF).
Em 2004 quem tinha renda familiar até dois salários mínimos (SM) pagou
48,9% dela em tributos e quem tinha mais de 30 SM, 26,3%. Naquele ano a carga
tributária aumentou para todas as faixas de renda e a regressividade piorou em
relação a 1996. Isso agrava a situação da má distribuição de renda existente e reduz
o consumo das classes de renda média e baixa, indo na contramão do crescimento
sustentável do país.
A regressividade existe devido à elevada participação dos tributos
indiretos, que são os que não dependem da condição econômica do contribuinte. São
os tributos sobre o consumo, lucro, movimentação financeira e taxas.
As relativas ao consumo são: Imposto sobre os Produtos Industrializados
(IPI), Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS), Programa
de Integração Social (PIS), Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico
(CIDE) relativa às atividades de importação ou comercialização de petróleo e seus
derivados e gás natural, Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e sobre
prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação
(ICMS) e Imposto sobre os Serviços de qualquer natureza (ISS).
Sobre o lucro temos o Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e a
Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Sobre a movimentação financeira
temos a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) vigente até
dezembro de 2007 e o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).
Os tributos diretos são os que incidem sobre a mão de obra e o
patrimônio. Sobre a mão de obra temos o Imposto de Renda Pessoas Físicas (IRPF) e
na Fonte (IRF), Contribuição Previdenciária (INSS), Seguro de Acidentes do Trabalho,
Sistema “S”/SEBRAE, Salário Educação, INCRA, Fundo de Garantia por Tempo de
Serviço (FGTS), Seguridade dos Servidores e Outras Contribuições Sociais da União.
Sobre o patrimônio temos o Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF),
Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), Imposto sobre a Transmissão de Bens
Imóveis (ITBI), Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA),
Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doações (ITCD) e Imposto Territorial Rural
(ITR).
Mesmo no caso dos tributos diretos como o INSS pago pelos
trabalhadores existe regressividade. Quem ganha até o teto (R$ 2.894,28) paga 8,9%
em média de seus rendimentos, mas quem ganha R$ 10.000 paga apenas 3,2%. O
quadro e gráfico abaixo evidenciam que a participação dos tributos indiretos tem se
mantido estável em torno de 60% desde 1991.
Quadro 1
Essa elevada participação da carga tributária indireta é devida
fundamentalmente aos impostos sobre o consumo, com destaque para o ICMS, que é
responsável por cerca da metade da mesma, conforme gráfico abaixo.
Essa participação já foi maior até 1998 e se reduziu devido ao maior
crescimento relativo da COFINS e com a criação da CIDE combustíveis em 2002.
Diminuir a tributação sobre o consumo significa reduzir especialmente as
alíquotas do ICMS e também da COFINS e do PIS. Efeito importante para reduzir o
peso da tributação sobre o consumo é reduzir a zero todas as alíquotas dos produtos
da cesta básica. Isso requer compensação de outro tributo de caráter direto, para não
reduzir a arrecadação da União e dos Estados, que têm no ICMS 83% em média das
suas receitas totais. O Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF) poderia cumprir esse
papel.
O fim da CPMF a partir de 2008 irá reduzir a tributação indireta em
quatro pontos percentuais, o que representa uma melhora no ônus e na distribuição
tributária, mas ainda falta muito para possibilitar uma melhor e mais justa distribuição
tributária.
Amir Khair é Mestre em Finanças Públicas pela FGV e consultor (página na Internet:
www.amirkhair.com.br; endereço eletrônico: [email protected]).
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