O que significa, de verdade, informatizar uma empresa
Por Luiz Carlos Marasco
Aristóteles distinguia duas memórias: a mnémê e a anámnêsis, sendo a primeira relativa ao ato de
arquivar o passado, de registrar informações ou impressões e a segunda na reativação ou
recuperação do passado ou informações armazenadas. As duas independentes entre si, embora
esteja a recuperação de informações evidentemente limitada àquelas armazenadas, ou seja, se a
informação não estiver armazenada ela não poderá ser recuperada. Também a informação pode
estar armazenada, mas não poder ser recuperada por falha ou ausência de método de
recuperação. Nos dois casos, a informação não estando armazenada ou não podendo ser
recuperada, está instalada a amnésia (perda ou falta de memória). Assim o bom uso de
informações dependeria basicamente de uma boa forma de armazenagem de informações e de
uma também boa forma de recuperação das informações armazenadas.
A boa forma de armazenagem de informações deve garantir a sua completicidade, correção e
atualização, independente do método utilizado para a recuperação. Ou seja, a informação está lá
e é completa, correta e atual (mnémê) bastando para quem dela necessite a construção de uma
forma de recuperação (anámnêsis).
A recuperação por outro lado só assume importância significativa se atender ao desejo de
informações do interessado. O interessado é muito mais que um profissional preocupado em
defender suas criações do esquecimento. Lembrança (recuperação de memória armazenada,
anámnêsis) passa a ser sinônimo de conhecimento. É possível atentarmos para como as técnicas
informáticas são capazes de modificar a relação memória pessoal/texto ou memória
pessoal/mundo. Para tanto, é suficiente imaginarmos a leitura de um texto orientado por algum
software através do qual o texto da informação requerida seria selecionado de um esquema
ramificado onde cada escolha exclui prioritariamente outra(s) do mesmo nível, à(s) qual(is) não
podemos recorrer concomitantemente. As observações teóricas sobre os processos de
memorização humana na leitura mostram, ao contrário, capacidades diferentes de
contemporaneidade e coordenação, fundadas, não na simples sucessão de contigüidade, mas em
afinidades não redutíveis a simples palavras-chave.
A conclusão a que se chega é que a informação requerida de uma base armazenadora depende
fundamentalmente do desejo do interessado e que a mesma não é conhecida, a priori, de maneira
suficiente para a construção de uma forma de recuperação de tal forma genérica que possa
atender a todos os diferentes interessados. Assim, o que se busca são ferramentas que permitam
a construção, a qualquer tempo, de formas de recuperação tão especializadas quanto forem os
desejos de recuperação de informação de diferentes interessados em uma mesma base
armazenadora.
Se imaginarmos uma base de informações de uma empresa, não é difícil entender as
diferenças de objetivos e, portanto, de desejos de informações entre pessoas que atuem nos
níveis operacional, tático (ou gerencial) e estratégico (ou de direção) da mesma empresa. As
informações são basicamente as mesmas, porém o nível operacional precisa de informações
para a execução dos processos, o nível tático precisa de informações para controlar os
processos enquanto o nível estratégico precisa informações sumariadas para controlar a
própria empresa.
Para esta empresa, as informações devem ser armazenadas de tal forma que fiquem
independentes de qual será o interessado ou de como será a recuperação (método). Os
recuperadores deverão ser especializados por interessado (o que não é muito bom, visto os
paralelismos e redundâncias de solução que poderiam ser instalados) ou flexíveis e genéricos
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para atender as diferentes necessidades de informação (o que poderia implicar em grande
complexidade na construção de tais soluções).
As boas formas de armazenagem de informação são possíveis hoje em dia e melhoram cada
vez mais. Técnicas de normalização de relações de dados e gerenciadores de bancos de
dados relacionais (principalmente) ou orientados a objetos (ainda em aperfeiçoamento)
permitem que as informações sejam bem mantidas.
Quanto às formas de recuperação, acontece cada vez mais das empresas entenderem o valor da
informação para gerirem seus negócios. Descobrem que não basta a informatização de processos
administrativos, com o registro e recuperação de informações (mnémê e anámnêsis) limitada ao
nível operacional, deixando os demais níveis sem agilidade para a obtenção de dados de controle
ou resumos informativos (uma forma de amnésia para os níveis tático e estratégico).
Os softwares de gestão empresarial (ERP, Enterprise Resource Planning), de informações
executivas (EIS, Executive Information System) e ferramentas de usuário final (Query
Languages), tentam suprir as necessidades, fornecendo formas de recuperação ágeis e, ao
mesmo tempo, abrangentes e genéricas para os vários níveis organizacionais, em substituição
ou em complemento a funções específicas, desenhadas e implementadas para atender a
buscas também específicas de informações. Todavia, as melhores soluções impõem preços
ainda proibitivos para a maioria das empresas.
Cada organização deve procurar sua solução, analisando as relações custo-benefício
evidentemente. Porém, as empresas devem entender que o tratamento e disponibilidade de
informações precisam ser encarados como fatores críticos de sucesso para a gestão
empresarial e que os investimentos realizados nessa direção retornam em pouco tempo, se
bem realizados.
O que estamos falando é que não se planeja e/ou gerencia a informática pela tecnologia, mas
pelas necessidades de armazenamento ou recuperação de informações dos processos
administrativos que ela deve atender ou pelas possibilidades (controle e apoio à tomada de
decisão) que ela pode agregar. Isso só se faz através da construção de um planejamento bem
construído ou pela construção de um Plano Diretor de Sistemas de Informações.
Um Plano Diretor de Sistemas de Informações não trata de tecnologia de informática, mas de
necessidades e prioridades administrativas de apoio de informática a processos, que devem ser
atendidas. Definidas as necessidades administrativas de informação, que sempre é um plano
estratégico e, por isso, de longo prazo, podem-se definir planos táticos, de médio prazo, de
projetos de informatização, agora sim com ênfase na tecnologia a ser aplicada. Estes planos são
conhecidos como Planos Diretores de Informática e, ao contrário do que se vê em muitas
organizações, são dependentes da existência de um Plano Diretor de Sistemas de Informações.
Também é preciso entender que um plano de informatização não é tarefa épica e memorável em
uma empresa, mas sim trabalho continuado e perene de revisão, re-análise, replanejamento e
implantação de melhorias.
Tudo isso, nós chamamos de Gestão de Informática.
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