REINTRODUÇÃO DE BARU EM ÁREAS DE CERRADO ALTERADO Marcos Pellegrini Coutinho¹; Artur de Paula Sousa²; Cleiton da Silva Oliveira²; Lucas Emanuel Nunes Gonçalves²; Vitor Corrêa de Mattos Barretto³ Resumo O barueiro (Dipteryx alata Vog.) é uma leguminosa arbórea (Papilionoideae) produtora de frutos, madeira e sombra de excelente qualidade. Os frutos exercem importante papel na alimentação da fauna, bovinos e extrativistas. Por ser árvore de múltiplos usos, torna-se importante o desenvolvimento de pesquisas para avaliar o comportamento da germinação dessa espécie, principalmente por meio da semeadura direta. Essa pesquisa teve por objetivo avaliar a germinação e sobrevivência inicial de baru em áreas de Cerrado da Universidade Estadual de Goiás, Unidade de Ipameri-GO. O experimento foi instalado em dezembro de 2011, sendo os tratamentos representados por sementes de baru com polpa e sem polpa. Para o preparo da área selecionou-se um Cerrado regenerando e abriram-se covas com enxada, totalizando-se 49 covas por tratamento, onde se adicionou duas sementes por cova. O espaçamento das covas, no geral, em função da regeneração natural, foi de 3 x 3 m. Cinco meses após o plantio avaliou-se a sobrevivência das plântulas nas duas áreas. O percentual de sobrevivência das plântulas de baru sem polpa foi de 73,46%, diferindo das sementes com polpa, onde não houve germinação. Dessa forma, pode-se concluir que é possível reintroduzir o barueiro no Cerrado apenas com o plantio de sementes, desde que despolpadas. Palavras-chave: Conservação, Dipteryx alata, semeadura direta, regeneração. Abstract The barueiro (Dipteryx alata Vog.) is a leguminous tree (Papilionoideae) producer of fruit, wood and shadow of excellent quality. The fruits have an important role in the feeding of wildlife, cattle and extractive. For being multipurpose tree, it becomes important to the development of research to evaluate the germination behavior of this species, mainly through direct seeding. This research aimed to evaluate the germination and early survival of baru in Cerrado’s areas of the Universidade Estadual de Goiás, Ipameri-GO. The experiment was installed in December 2011, being represented by treatments with pulp and seeds baru without pulp. For the preparation of the area was selected an regenerating cerrado and opened up holes with hoe, totaling 49 holes per treatment, where was added two seeds per hole. The spacing of holes, in general, according to the natural regeneration was 3 x 3 m. Five months after planting evaluated the survival of seedlings in both areas. The survival rate of seedlings of baru without pulp was 73.46%, differing significantly from the seeds with pulp, where there was no germination. In this way, it can be concluded that it is possible to reintroduce the barueiro in the Cerrado only planting seeds, since pulped. Keywords: Conservation, Dipteryx alata, direct seedling, regeneration. Introdução O cerrado é o segundo bioma mais rico em biodiversidade do Brasil e também o berço de muitas espécies endêmicas de vegetais e animais, sendo que, muitas delas servem como base para a alimentação humana, medicamentos e uma infinidade de outras utilidades (DURIGAN et al., 2011). Estima-se que o Bioma possui mais de 11 mil espécies de plantas, cerca de 199 espécies de mamíferos, 837 espécies de aves, 180 de répteis e 150 de anfíbios ao longo de 2 milhões de quilômetros quadrados (AQUINO et al., 2009). O barueiro (Dipteryx alata Volg. - Fabaceae), também vulgarmente conhecido como baru, coco-feijão, cumaru, castanha-de-ferro, entre outros nomes (CORRÊA, 1984; LORENZI, 1992 e LACA-BUENDIA, 1992; SANO et al., 2004), é de ocorrência no cerrado e na floresta estacional semidecídua, nos estados de Goiás, Minas Gerais, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e São Paulo (LORENZI, 1992; SANO et al., 2004), sendo conhecida como fixadora de nitrogênio no solo, ocorrendo em áreas mais férteis (BOTEZELLI, 2006). O baru apresenta ampla utilidade desde paisagismo, madeira para construção civil, produção de papel para embalagens ou impressão, na culinária regional e medicina alternativa no controle de reumatismos e fornecimento de elevadas concentrações de proteína bruta, extrato etéreo, fibras e de minerais. As sementes são utilizadas, ainda, como anti-reumáticas (FERREIRA, 1998). É uma das poucas espécies que apresentam frutos com polpa carnosa durante a estação seca no Bioma Cerrado, sendo espécie importante para alimentação da fauna nessa época e os consumidores da polpa de baru podem facilitar a germinação e o estabelecimento das plântulas (SANO et al., 2004). O avanço das atividades humanas, principalmente a expansão da fronteira agrícola e a pecuária, ocasionam profundas modificações no Bioma Cerrado e apresentam-se como um dos desafios na preservação do meio ambiente (ALHO e MARTINS, 1995). Em meio às alternativas de restauração de ecossistemas degradados, está o reflorestamento; técnica que visa alcançar benefícios ecológicos como: redução da pressão sobre as florestas nativas, aumento da absorção de gás carbônico, regulagem do ciclo hidrológico, proteção e conservação do solo, redução da poluição do ar e dos recursos hídricos (VICTORIA et al., 1991; FRANCO, 1992; CARPANEZZI, 2000; MORA; GARCIA, 2000; DURIGAN et al., 2011). A utilização de produtos obtidos do reflorestamento ainda não ocorre de forma desejável. Há uma exploração insustentável dos recursos madeireiros ou não madeireiros oriundos de espécies florestais, independente do atrativo mercado interno ou externo (MMA, 2006). Mendonça (1997) descreve que o a inserção de espécies nativas além dos benefícios socioeconômicos e de recuperação promove a conservação da biodiversidade e o enriquecimento da diversidade florística contribuindo como fonte de renda permanente, pois os plantios além de produtos madeireiros servem como fonte de renda de extrativismo de óleos, frutos e sementes. Oliveira e Rosado (2002) ressaltam a importância desta espécie em sistemas silvipastoris e na recuperação de pastagens, pois sendo uma árvore perenifólia com copa frondosa, promove sombra para o gado, fornecendo, também, frutos para a sua alimentação nos períodos de estiagem. Apesar do conhecimento do potencial do baru para projetos de reflorestamentos e arborização, dados sobre as atividades ligadas ao seu cultivo, produção e consumo são ainda pouco pesquisados e difundidos. Nesse sentido, pesquisas que determinem o comportamento em campo, avaliando a germinação, sobrevivência e desenvolvimento dessa espécie de uso múltiplo, conhecida como baru ou barueiro, podem contribuir com a biodiversidade e subsidiar o reflorestamento de propriedades rurais, sendo interessante nos trabalhos de reintrodução de indivíduos em áreas que necessitem de intervenção humana, de forma a melhorar suas características. Dessa forma, o presente trabalho testou a reintrodução de baru com e sem polpa em áreas de cerrado em regeneração. Material e métodos A implantação do experimento, ou seja, o plantio de sementes de baru com e sem polpa ocorreu em áreas da fazenda experimental da Universidade Estadual de Goiás (UEG), Unidade Universitária de Ipameri-GO. A Unidade está localizada nas seguintes coordenadas 17°43'10.58", de latitude (S) e 48° 8'12.41", de longitude (W) e a 800 m de altitude (Figura 1). O clima da fazenda, segundo a classificação de Koppën, é do tipo Aw, com precipitação média de 1.500 mm/ano e temperaturas médias anuais de 23ºC (SEPIN, 2011). Figura 1. Localização da área de plantio Figure 1. Location of the planting area A coleta das sementes foi realizada no mês de agosto de 2011, também em área da UEG, UnU Ipameri, onde coletaram-se frutos de 5 matrizes, distantes 100 m entre si, empregando-se podão e catação manual dos frutos caídos no chão. Parte dos frutos foi beneficiada no Laboratório de Sementes Florestais (LSF), em equipamento constituído por um segmento de madeira de aroeira, acoplado em sua extremidade superior a uma lâmina de saibro de moto-serra, previamente afiada (Figura 2). Com outro pedaço de madeira batia-se sobre o fruto em contato com a lâmina cortante, obtendo-se sementes intactas e sadias. As sementes foram armazenadas no LSF, em condições naturais, até o momento da semeadura em campo. Figura 2. Detalhe da extração das sementes de baru Figure 2. Detail showing the extraction of baru’s seed A área de plantio compreende um cerrado alterado, em processo de regeneração natural, localizado na Unidade, conforme Figura 1. Para o preparo da área foi realizado marcação das covas em espaçamento de 3 x 3 m entre linhas e covas, com posterior abertura das covas nas dimensões de 10 x 10 x 10 cm de comprimento, largura e profundidade, respectivamente, e realizou-se o coroamento, via capina manual. Para prevenção contra o ataque de formigas cortadeiras, foi distribuído dentro e no entorno da área iscas formicidas. Para o controle de gramíneas invasoras, utilizou-se herbicida Gliz na concentração de 1,5%, aplicado com bomba costal no terceiro mês após o plantio. No segundo e quarto mês pós-plantio, foi espalhado dentro e no entorna da área, formicida na forma de iscas. A semeadura de baru formou duas quadras consecutivas de 21 x 21 m, a contar medida entre a primeira e última cova. Na primeira quadra adicionou-se duas sementes, sem polpa, por cova e, na segunda, adicionou-se dois frutos sem retirada das sementes. O experimento foi implantado em dezembro de 2011 e avaliou-se a taxa de germinação e sobrevivência ao final do período chuvoso, correspondendo a um período de cinco meses após o semeio. Resultados e Discussão Na quadra correspondente ao sistema de semeadura direta sem polpa foi obtido uma taxa de germinação de 52,02%, em relação às 98 sementes utilizadas, e houve plântulas emergindo em 73,46% das covas, diferindo das sementes com polpa, onde não houve germinação (Tabela 1). Tabela 1. Germinação de baru em semeadura direta e danos causados por formigas cortadeiras nas plântulas Table 1. Germination baru in tillage and damage caused by leaf-cutting ants on seedling Sementes / Covas Número de sementes Germinação (%) Despolpadas 98 52,02 Covas 49 73,46 Com polpa 98 0 Covas 49 0 Total de sementes 196 26,02 Silva Júnior (2005) descreve que a taxa de germinação do baru varia de 77 a 90%, após a quebra da dormência. Ainda, de acordo com Durigan et al. (2002) a emergência das plântulas ocorre de 10 a 15 dias após a semeadura e costuma a ser superior a 95%, recomendando a semeadura direta nos recipientes. O percentual de germinação das sementes despolpadas inferior os valores apresentados na literatura, pode ser suprido pelo percentual de covas com plântulas, pois em 73,46% das covas houve germinação de sementes. Ainda, cabe destacar que em algumas covas houve a emergência de duas plântulas (Figura 3), o que representa 30,61%, em relação ao total de covas, evidenciando alta capacidade da espécie em germinar mesmo em condições de campo, embora se recomende sua semeadura em recipiente e condições controladas de viveiro. É possível, que as reservas dos cotilédones, ricos em aleoronas, explique esse fato, conforme Melhem (1974). Figura 3. Detalhe da germinação de duas sementes por cova Figure 3. Detail of germination to seeds for hole Entretanto, Siqueira et al. (1993) apud (SANO et al., 2004), estudando o estabelecimento em campo de baru, para conservação ex situ da população da espécie, praticamente extinta no Estado de São Paulo, concluíram que, este não foi bem sucedido. O baixo estabelecimento foi associado à semeadura direta e aos tratos culturais. Para Melhem (1974), a retirada da polpa evita a proliferação de microrganismos em solos ricos de matéria orgânica que prejudicam a germinação da espécie. Santos et al. (1997) procurando identificar a população fúngica sob sementes de baru observou a presença de sintomas nos folíolos das plântulas que mostraram-se necrosadas e deformadas, com posterior murcha e morte, sendo comprovada a patogenicidade da população fúngica incidente. Segundo Ferreira (1989), a contaminação das sementes pode ocorrer predominantemente no solo onde são colonizados por diversos fungos, incluindo saprófitas e parasitas facultativos que têm vida saprofítica no solo ou na matéria orgânica. Danos decorrentes da associação dos microrganismos patogênicos com sementes, não se limitam a perdas diretas da população em campo, mas envolvem outras implicações que podem provocar sérios danos em todo o sistema de produção, tais danos apresentam-se na forma de abortos, vigor e germinação diminuídas além de sintomas de pós-emergência. Cabe ressaltar, em áreas de ocorrência da espécie, que há uma enorme procura pelos frutos por animais domésticos (bovinos) e silvestres responsáveis pela retirada da polpa ao se alimentarem, além de formigas e outros insetos (cupins e pequenos besouros), conforme descreve Sano et al (2004), que podem favorecem favorecer a germinação da espécie. Todavia, as formigas cortadeiras, se não controladas, podem comprometer a reintrodução da espécie. Para Durigan (2005), as formigas cortadeiras são um problema antigo na maior parte do Brasil, onde quer que se tente plantar árvores. Em toda a região de domínio do cerrado ocorrem formigas cortadeiras, que acabam por destruir as mudas plantadas em ataques sucessivos, quando não é feito o seu controle. Nesse trabalho, mesmo fazendo o controle de formigas cortadeiras, constatou-se o ataque de alguns indivíduos (17,64% de plântulas atacadas em relação ao total), posteriormente novamente controlado. Nesse experimento, o controle das formigas cortadeiras, da mato-competição, por meio da aplicação do herbicida, este último favorecendo a vegetação remanescente cerrado, conforme Durigan (2005) e, pode, também, ter reduzido a competição com as plântulas de baru, permitindo sua sobrevivência. Além disso, o controle das formigas cortadeiras, coroamento frequente até o quinto mês da semeadura e o plantio executado durante a estação chuvosa podem ter favorecido a sobrevivência das plântulas, até o momento da avaliação. Os resultados, embora preliminares, indicam que é possível reintroduzir o baru em áreas de cerrado sem necessidade de produção de mudas, reduzindo os custos de recuperação de áreas alteradas do bioma. Cabe ainda ressaltar, com base nesse experimento, que será possível recuperar um hectare de cerrado, investindo R$ 600,00/ha, incluindo os custos de preparo da área, que é mínimo, sementes, semeadura e manutenção da área. Infere-se, por meio dessa técnica, que será possível atrair novos participantes de diferentes níveis econômicos para o processo de recuperação do Cerrado. Algumas iniciativas já estão em andamento em áreas de Cerrado, como o sistema de “muvuca de sementes”, conforme manual “Plante as Árvores do Xingu e Araguaia”, onde sementes plantadas no chão crescem livremente e sem traumas, garantindo vigor inicial das plântulas, que irão desenvolver raízes capazes de buscar água em profundidade no solo, com maior adaptabilidade às condições ambientais adversas (Campos Filho, 2009). Conclusões O beneficiamento das sementes de baru com a retirada da polpa, para a semeadura direta, foi fundamental para o êxito do projeto de reintrodução da espécie em áreas de cerrado, compreendendo uma fase simples, rápida, de baixo custo e eficiente. A espécie apresenta grande potencial para reintrodução em áreas de cerrado por meio da semeadura direta, desde que utilize-se duas sementes por cova, compondo tendência de projetos de reflorestamento de áreas alteradas. Não se recomenda o plantio de baru em áreas de cerrado sem a retirada da polpa, em decorrência de sua dificuldade para germinar. O uso dessa técnica de recuperação do cerrado pode ser importante para atrair novos participantes no processo de recuperação, devido aos baixos custos associados. Referências ALHO, C.J.R.; MARTINS, E. de S. (Eds.). De grão em grão o Cerrado perde espaço: Cerrado - impactos do processo de ocupação. Brasília: WWF– Brasil PRÓ-CER, maio 1995. 66p. 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