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REPERCUSSÃO GERAL DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO
E A NECESSÁRIA AUTOCONTENÇÃO DO STF
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1. INTRODUÇÃO
O Supremo Tribunal Federal, como se dotado de um toque de Midas, transforma tudo
em matéria constitucional, asfixiando prematuramente a criatividade dos demais tribunais.
Questões que seriam muito bem tratadas pela justiça ordinária acabam passando pela
apreciação do Supremo.
É certo que muito da “culpa” pelo exagero das manifestações do Supremo Tribunal
Federal é do próprio texto constitucional, que tudo prevê, esgotando os assuntos da legislação
ordinária.
Para refrear tal impulso do Supremo de “tudo decidir”, deveria ser lançado no Brasil,
tal qual existe nos Estados Unidos, um movimento de autocontenção do Supremo Tribunal
Federal, com técnica minimalista1, que tem como objetivo colocar em evidência a importância
da interlocução silenciosa entre a Suprema Corte e o restante do Poder Judiciário.
A técnica minimalista de autocontenção recomenda, em síntese, que não decidir,
muitas vezes, é melhor do que decidir em demasia.
A necessidade de se debaterem as ideias e argumentos nas instâncias inferiores é
indispensável para o amadurecimento da questão, especialmente quando a matéria versa sobre
temas constitucionais.
É certo que o Supremo Tribunal Federal é o guardião da Constituição, por expressa
previsão constitucional. Mas isso não retira a mesma tarefa de todos os demais tribunais e
juízes. O Supremo Tribunal Federal tem a competência para dizer a última, mas não a única
decisão no Poder Judiciário. Ou, na oportuna expressão de Stanziola: “A interpretação
constitucional não é algo de se apropriar por uma Corte, ainda que seja Suprema.”2
Seguramente, entre outras razões que justificam essa prudência minimalista, encontrase o efeito vinculativo oriundo das decisões da Suprema Corte.
1
SUNSTEIN, Cass R. One case at a time: judicial minimalism on the Supreme Court. Cambridge, Mass.;
London: Harvard University Press, 1999.
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As decisões prematuras ou inoportunas do Supremo Tribunal Federal têm como
consequência o risco de seus precedentes virem a ser descumpridos e, assim, haver
desprestígio da Corte.
É importante que o próprio Supremo Tribunal Federal não inviabilize o seu trabalho,
ao criar temas constitucionais para causas não tão constitucionais assim, petrificando o
direito, com súmulas e decisões concentradas vinculantes, sem permitir a necessária
oxigenação do sistema, com a necessária valorização dos juízos ordinários e seus intérpretes.
É disto que trata esta tese. É necessário que o Supremo Tribunal Federal adote uma
posição de Corte Constitucional e se manifeste apenas quando existir relevante interesse
nacional, em poucos casos por ano, nos moldes da Suprema Corte Americana.
Neste sentido, a legislação brasileira permite que o Supremo Tribunal Federal escolha
– discricionariamente – os casos que pretende julgar, conforme a nova regulamentação do
recurso extraordinário, com a necessária comprovação da “repercussão geral”. Com este
instrumento o Supremo poderá organizar a sua agenda, de acordo com o que for mais
relevante para a nação, assumindo uma postura muito mais de Tribunal Constitucional do que
de justiça especializada ou quarta instância recursal.
Adotando essa postura, a estrutura do Judiciário acabará fortalecendo os demais
tribunais brasileiros, afastando, assim, a síndrome de meros entrepostos de decisão judicial.
Feita esta breve introdução, passaremos a analisar o modelo americano, para a
necessária comparação de critérios de escolha de casos para julgamento perante a Corte
Máxima.
2. Modelo Americano de autocontenção da Corte Suprema.
2
VIEIRA, Renato Stanziola, Jurisdição constitucional brasileira e os limites de sua legitimidade democrática,
Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 324.
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A Corte americana detém a liberdade para escolher os casos em que pretende atuar,
utilizando um sistema de self-restraint (autocontenção), porque nos Estados Unidos a regra é
que a Suprema Corte se manifesta apenas nos hard cases.
O mecanismo de escolha de casos é fundamental para se poder realizar uma atividade
de autocontenção.
A Suprema Corte americana seleciona os casos que são submetidos à sua jurisdição.
Em um país como os Estados Unidos, com mais de 300 milhões de habitantes3, e com um
sistema constitucional que depende em grande parte da força vinculante das decisões da
Suprema Corte e do respeito que tem o povo pela Corte, é necessário limitar a jurisdição
obrigatória e deixar discricionariamente para conhecer somente os casos de grande
importância jurídica.
A autocontenção, também denominada de autorrestrição judicial ou judicial selfrestraint, prega que ao Poder Judiciário cabe uma atitude de deferência às decisões/atos dos
demais poderes.4
O “judicial sef-restraint” defende que os juízes da Suprema Corte não deveriam
decidir questões que não fossem essenciais para o caso concreto que têm em mãos. Também
deveriam evitar a discussão de questões que ainda não estejam “maduras” o suficiente. Para
tanto, deveriam “sair pela tangente” ou se negar a apreciar a matéria, através de uma negativa
de certiorari (o equivalmente no Brasil à negativa de admissibilidade do recurso
extraordinário pela ausência de repercussão geral).
O amadurecimento das questões é essencial para a solução do caso pela Suprema
Corte. Nos Estados Unidos, com a aplicação do princípio federalista, antes da Suprema Corte
decidir, utilizaria os Tribunais estaduais e as Cortes federais inferiores como “laboratórios
experimentais” de decisões.5
3
Estimativa de 2012 (Disponível em: < http://pt.wikipedia.org/wiki/Estados_Unidos >. Acesso em: 10 ago.
2012).
4
MORO, Sergio Fernando. Jurisdição constitucional como democracia. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.
p. 206.
5
Nesse sentido, ao declinar os benefícios do sistema difuso, Paulo Bonavides explica que “não se deve afastar,
nem desconsiderar, nem anular o controle difuso. Em si mesmo, ele já é magistério e escola, onde juízes de
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Dessa forma, a Suprema Corte diminuiria o risco de rejeição da sua decisão, caso já
tivesse havido um debate nas Cortes estaduais e federais inferiores e existisse uma definição
bem fundamentada da matéria.
O ponto a favor da interferência da Suprema Corte de forma cautelosa e em pequena
escala no processo de interpretação da Constituição é o de que ela não é a intérprete solitária
do texto, mas sim “participante em um sistema elaborado de deliberação democrática”. O
Judiciário, de forma geral, deve dar a necessária abertura ao diálogo.6
Na teoria do minimalismo judicial, o Tribunal deve ser muito cuidadoso, para não
retirar antecipadamente do diálogo público e dos meios democráticos os problemas
fundamentais da sociedade, bem como para não desestimular esse diálogo e rever
constantemente seus próprios resultados.
A Suprema Corte americana deve ter o equilíbrio, o bom senso de apenas se
manifestar quando essencial para a ordem social. Fora dessa hipótese, há uma indevida
ingerência na sociedade. Indevida porque o resultado – que somente pode ser constatado por
erro e acerto (empiricamente) – pode ser o próprio descrédito da mais alta Cúpula (ou, como
diz Oscar Vilhena Vieira, por um “processo de fadiga”). É o princípio custo/benefício levado
às barras dos Tribunais.7
primeira instância aprendem a ler com mais frequência, e a interpretar com mais familiaridade e exação
científica, os textos constitucionais”. (Teoria constitucional da democracia participativa: por um direito
constitucional de luta e resistência, por uma nova hermenêutica, por uma repolitização da legitimidade. 3. ed.
São Paulo: Malheiros, 2008, p. 310).
6
“O papel dos juízes, além disso, não é exclusivamente o de contar a verdade sobre o significado da
Constituição – de forma como cada um, pessoalmente, pensa que ela seria idealmente entendida – mas é
também, às vezes predominantemente, o de participar em um projeto necessariamente cooperativo de
implementação da Constituição”. No original: “The role of judges, moreover, is not only to tell the truth about
the meaning of the Constitution - of how each one personally, think it would ideally be understood - but also,
sometimes predominantly, to participate in a necessarily cooperative project of implementation of the
Constitution.” (FALLON JR., Richard H. The Supreme Court, 1996 Term – Foreword: implementing the
Constitution. Harvard Law Review, v. 111, n. 1, p. 147-148, 1997 − nossa tradução).
7
Marcelo Figueiredo, citando e interpretando Cass Sunstein, apresenta esboço do custo da decisão do Judiciário
no orçamento público, a saber: “1. Os cidadãos vigilantes devem saber como os recursos públicos são
alocados. A nação tem o direito de saber onde aloca cada centavo. 2. Os americanos parecem esquecer
facilmente que os direitos individuais e as liberdades dependem fundamentalmente de uma ação vigorosa do
Estado; 3. direitos custam, dependem de recursos econômicos; todos os direitos batem às portas das arcas
públicas; 4. recursos são finitos; 5. de um modo geral, lamentavelmente, indivíduos que não vivem sob um
governo capaz de tributar e conceder ordens e medidas judiciais não têm na prática direitos garantidos; um
Estado ausente, não raro implica em um Estado onde não se garantem direitos a ninguém; 6. o custo dos
direitos tem diferentes pesos, ‘valem’ de forma diferente. A liberdade de imprensa é mais valiosa a alguém já
bem posicionado na sociedade do que a alguém que mora embaixo da ponte; 7. os direitos têm um custo social,
como também orçamentário; 8. a atenção aos custos dos direitos não se prende a saber apenas o seu valor, mas
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Decisões da Suprema Corte a respeito de políticas públicas podem ser desastrosas.
Uma decisão que exija, por exemplo, o aumento de gastos com transporte escolar pode
deslocar recursos de uma área com clamor igual ou até maior por investimento público –
como programas médicos ou assistenciais para a população carente. A criação de um direito
amplo contra a poluição pode ter uma variedade de efeitos maléficos e não previstos, como o
aumento do desemprego e da pobreza, bem como a elevação dos preços.8
Ely apresenta interessante analogia para visualizar a importância da autocontenção da
Suprema Corte. Diz ele que essa tarefa “pode ser chamada de uma orientação ‘antitruste’ em
oposição a uma orientação ‘regulatória’ dos negócios econômicos – ao invés de ditar
resultados substantivos ela intervém somente quando o ‘mercado’, em nosso caso o mercado
político, está em mau funcionamento sistêmico”9. Esse pensamento tem fundamento na
premissa de que a função da Suprema Corte é a de “desobstruir os canais de participação
política”.
Para a teoria da “autocontenção” da Corte Suprema, a Constituição tem como função
precípua garantir os direitos fundamentais, os mecanismos de preservação da democracia e da
estrutura do Estado. Se eventual caso colocado à apreciação da Corte não tratar desses temas,
não merece a sua apreciação.
O Supremo Tribunal Federal teria um papel “didático de orientação geral do Estado”
na implementação da Constituição e cumprimento dos direitos fundamentais.10, atuando como
educador político par excellence (pedagogo constitucional).11
‘quem’ decide alocá-lo, na proteção de ‘que tipos’ de direitos e ‘para quem’; 9. todos os direitos são dotados de
um custo, sejam os chamados negativos ou os chamados positivos, pois todos implicam e pressupõem o
pagamento de tributos para financiá-los, para implementa-los e para executá-los; 10. as deliberações e decisões
públicas envolvendo os gastos de recursos públicos deveriam focar as seguintes questões: a) quanto queremos
e quanto podemos gastar com cada direito? b) qual a melhor maneira de gastá-los?; c) qual a melhor maneira
de despender os recursos com máxima proteção com um mínimo custo?; e, d) todo o processo foi motivado e
justificado amplamente?” (O controle das políticas públicas pelo Poder Judiciário no Brasil: uma visão geral,
Revista de Direito do Estado, RDE, Rio de Janeiro, Renovar, n. 7, p. 217-253, jul./set. 2007, p. 236).
8
SUNSTEIN, Cass R., One case at a time: judicial minimalism on the Supreme Court, cit., p. 230.
9
“The approach to constitutional adjudication recommended here is akin to what might be called an ‘antitrust’
as opposed to a ‘regulatory’ orientation to economic affairs – rather than ditate substantive results it intervenes
only when the ‘market’, in our case the political market, is systemically malfunctioning.” (ELY, John Hart,
Democracy and distrust: a theory of judicial review, Cambridge: Harvard University Press, 2002, p. 105)
10
TAVARES, André Ramos (Coord.). Justiça constitucional: pressupostos teóricos e análises concretas. Belo
Horizonte: Fórum, 2007. p. 163.
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7
Não deve o Tribunal federativo ser tratado como mero “entreposto” de decisão
judicial, mas como potencial juízo definitivo da lide. Essa seria a concepção de regra geral
diante da organização do Poder Judiciário. A questão seria submetida à Corte Suprema
somente na hipótese excepcional do litígio ingressar em campo que comprometa a boa saúde
da ordem constitucional.
No Brasil, o sentimento de “entreposto” de decisão judicial está muito presente,
principalmente nos Tribunais Regionais Federais e Estaduais. Nesse aspecto, seria salutar o
reforço da autoestima desses Tribunais, dando-lhes o poder de – em regra − solucionar por
último o litígio. Significa um refoço da ideia federativa, dando maior poder de fato aos
Tribunais de Justiça dos Estados, sejam eles grandes ou pequenos, ricos ou pobres. O
Supremo Tribunal Federal não irá mais pairar sobre eles como simplesmente uma outra
instância revisora.
Devido ao grande aumento do número de ações submetidas à apreciação da Suprema
Corte ao longo da história dos Estados Unidos, o Congresso conferiu à Corte poderes cada
vez mais amplos para que a própria Corte selecionasse os casos a examinar.
Isso possibilita manter um controle sobre o volume de serviço que chega àquela
Corte12, permitindo que ela se ocupe apenas dos casos realmente importantes. A importância
não está relacionada necessariamente à expressão financeira do caso concreto. Mais
importante é o caráter principiológico envolvido, ou seja, o fato de que os princípios jurídicos
em discussão sejam relevantes para a resolução de casos futuros. Em outro dizer, os casos são
selecionados não tanto pela sua importância para os litigantes daquele caso concreto, mas
mais pela repercussão que a decisão daquele caso possa ter sobre casos futuros ou sobre a
evolução do direito.
A importância do caso não se avalia a partir do ponto de vista das partes interessadas.
Nas palavras do Chief Justice Frederick Moore Vinson, “a Suprema Corte não está, e nunca
11
HÄBERLE, Peter. Jurisdição constitucional como força política. In. TAVARES, André Ramos (Coord.).
Justiça constitucional: pressupostos teóricos e análises concretas. Belo Horizonte: Fórum, 2007. p. 80.
12
Interessante observar que o ano judiciário (que vai de setembro até junho do ano seguinte) não se encerra
enquanto todos os casos selecionados naquele ano não forem encerrados. Ou seja, há recesso para os Justices
apenas quando concluirem todos os trabalhos daquele ano. (FACCHINI NETO, Eugênio. Estrutura e
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esteve preocupada prioritariamente com a correçao de erros cometidos pela Corte
inferior”.13 A preocupação central é a solução dos casos que tenham repercussão nacional,
que sejam essenciais para a manutenção dos valores democráticos e federalistas americanos,
daí a justificativa principal para se aceitar a discricionariedade na Corte Suprema.14
Com efeito, no sistema americano, a Suprema Corte federal está autorizada por lei a
exercer esse poder discricionário, de receber ou não recursos desde 1925, com a lei The
Judges Bill Act. Assim, em regra, o jurisdicionado tem direito apenas a uma revisão pelas
Cortes de Apelação.
A porcentagem das petições que são conhecidas pela Suprema Corte americana
normalmente é menor que cinco por cento, pois se tivesse que resolver o mérito de todos os
casos apresentados, não teria tempo. Haveria um contingente pendente de julgamento em
milhares de casos, convertendo a Corte americana numa “‘fábrica judicial’, emitiendo
opiniones practicamente sumarias, com poco valor a largo plazo.”15
É justamente deste déficit a que me refiro nesta tese. A quantidade de decisões
brasileiras – praticamente sumárias – sem o devido aprofundamento da matéria pelo Supremo
Tribunal Federal dota suas decisões de pouco valor, no longo prazo.
O critério para aceitar a análise de um caso pela Suprema Corte americana é
discricionário. A recusa no conhecimento da certiorari não implica que a Corte aprovou ou
confirmou a sentença do tribunal inferior. Somente tem o efeito de deixar a decisão como
restou decidido no juízo ordinário.16
funcionamento da justiça norte-americana. Revista da Ajuris: doutrina e jusrisprudência, v. 36, n. 113, p. 167,
mar. 2009).
13
MEADOR, Daniel John. Os tribunais nos Estados Unidos. Tradução de Ellen G. Northfleet. Brasília: USIS,
Serviço de Divulgação e Relações Culturais, 1996. p. 36.
14
Essa é a origem do entendimento dos Tribunais Superiores brasileiros, que não admitem os recursos que
tratem do erro ou acerto do juiz ordinário. Em outro dizer, o Tribunal Superior não tem como função primeira
corrigir eventuais erros das instâncias inferiores, mas sim a de solucionar e uniformizar as divergências na
aplicação da lei.
15
BAZAN, Victor (Coord.). Desafios del control de constitucionalidad. Buenos Aires: Ciudad Argentina, 1996.
p. 290.
16
Ibidem, p. 290.
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A Suprema Corte só intervirá nos casos claros e somente quando não puder ser
evitada a discussão, em evidente prestígio ao que restou decidido nas demais instâncias do
Poder Judiciário.
Negar a admissibilidade do recurso na Suprema Corte americana é a regra geral,
acentuando-se que as teses de prejudicialidade (mootness) muitos se assemelham à atual
repercussão geral do recurso extraordinário (art. 102, § 3º, da CF) e a antiga “relevância
federal” existente na Constituição de 1967 (art. 119, § 1º).
Em resumo, nos Estados Unidos, a Corte Suprema aceita discricionariamente o
recurso certiorari, adotando uma postura minimalista, julgando apenas o essencial e relevante
para conservar os valores constitucionais americanos.
É certo que conferir poder discricionário sempre envolve certo risco. O Tribunal
Constitucional pode recusar-se a decidir questões cuja resolução seria relevante ou desejada,
pode atuar com preocupações de “governabilidade”, ou outras ainda menos nobres, mas o
risco deve ser sopesado em razão do inconveniente de se ter uma Suprema Corte que não
consegue realizar o seu trabalho.
3.
A
Repercussão
Geral
do
Recurso
Extraordinário
como
mecanismo de autocontenção.
3.1 Supremocracia
Desde a promulgação da Constituição Federal de 1988, as competências atribuídas ao
Supremo Tribunal Federal vêm se alargando. Nesse sentido, todo um novo arcabouço
legislativo foi criado, a saber: Emendas Constitucionais ns. 3/93 (que instituiu o efeito
vinculante nas ações direta de constitucionalidade), 45/2004 (da reforma do Judiciário) e da
legislação infraconstitucional:
Leis ns. 9.868/99 (que regula a ação direta de
inconstitucionalidade), 9.882/99 (que regula a arguição de descumprimento de preceito
fundamental), 11.417/2006 (que disciplina a súmula vinculante), 11.418/2006 (que regula a
repercussão geral no recurso extraordinário) e as alterações no Regimento Interno do
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Supremo Tribunal Federal, em especial a do artigo 324 pela Emenda Regimental n. 31, de
29.5.2009 (que flexibiliza a admissibilidade do recurso extraordinário).17
Toda essa nova sistemática constitucional, ampliando os poderes do Supremo,
podemos denominar de “consolidação de normas sobre os poderes do Supremo Tribunal
Federal”.
Oscar Vilhena Vieira chama de “supremocracia” o atual arranjo institucional
brasileiro, com o ciclo de concentração de poderes nas mãos do Supremo.
Para esse autor, a concentração de poderes decorre das dificuldades advindas desde a
criação do Supremo Tribunal Federal18, em 1891, em que as instâncias ordinárias – em razão
da falta do stare decisis da common law – não ficavam vinculadas às decisões do Supremo.
Em resposta a isso veio a supremocracia, que diz respeito, “em primeiro lugar, à autoridade
recentemente adquirida pelo Supremo de governar jurisdicionalmente (rule) o Poder
Judiciário no Brasil. (...) Num segundo sentido, o termo supremocracia refere-se à expansão
da autoridade do Supremo em detrimento dos poderes. (....) É a figura do Supremo Tribunal
Federal como conciliadora dos demais poderes”. 19
No mesmo sentido, Clèmerson Merlin Clève faz um apanhado das alterações da
Constituição Federal pós-1988, para chegar à conclusão de que “o controle de
constitucionalidade passa a sofrer uma verticalização, ou seja, a compressão da jurisdição
constitucional difusa e a primazia da jurisdição constitucional concentrada, exercitada pelo
Supremo Tribunal Federal”.20
17
“Artigo 324 - (...) §1º - Decorrido o prazo sem manifestações suficientes para recusa do recurso, reputar-se-á
existente a repercussão geral. § 2º - Não incide o disposto no parágrafo anterior quando o Relator declare que
a matéria é infraconstitucional, caso em que a ausência de pronunciamento no prazo será considerada como
manifestação de inexistência de repercussão geral, autorizando a aplicação do artigo 543-A, parágrafo 5º, do
Código de Processo Civil.”
18
Até 1889, o Supremo Tribunal Federal tinha o nome de Supremo Tribunal de Justiça.
19
VIEIRA, Oscar Vilhena. Supremocracia. Revista de Direito do Estado, RDE, n. 12, p. 60, out./dez.. 2008.
20
CLÈVE, Clèmerson Merlin. Estado constitucional, neoconstitucionalismo e tributação. Disponível em:
<http://www.cleveadvogados.com.br/neoconstitucionalismo-jurisdicao-constitucinoal-tributacao-doc.co>.
Acesso em 9 ago. 2012, p. 10. Vale também citar Manoel Gonçalves Ferreira Filho: “O quadro acima mudou
com a Constituição de 1988 e vem mudando cada vez mais, em razão da legislação infraconstitucional e, mais
recentemente, da Emenda n. 45/2004. De mais em mais, o controle concentrado ganha terreno e, diga-se desde
logo, se politiza.” (Aspectos do direito constitucional contemporâneo. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 72).
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Tudo parece exigir uma última palavra do Supremo. Se, por um lado, isso demonstra a
importância contemporânea dessa instituição, por outro é sintoma de uma forte crise de nosso
sistema democrático, que hoje depende deste novo “Poder Moderador” para funcionar.21
Daniel Sarmento chama de “ubiquidade constitucional” esse fenômeno de transformar
todas as discussões jurídicas em matéria constitucional, situação que pode gerar, segundo o
autor,
um
problema
de
“panconstitucionalização
constitucionalização metodologicamente descontrolada”.
do
direito,
ou
mesmo
uma
22
Ressalta Oscar Vilhena Vieira que o Supremo Tribunal Federal tornou-se presente na
vida das pessoas. A cada habeas corpus polêmico, milhões de pessoas acompanham o
julgamento pela TV Justiça ou pela internet, “um maior número de brasileiros vai se
acostumando ao fato de que questões cruciais de natureza política, moral ou mesmo
econômica são decididas por um tribunal, composto de onze pessoas, para as quais jamais
votaram e a partir de uma linguagem de difícl compreensão, para quem não é versado em
direito”.23
A questão que preocupa é saber até que ponto o Supremo Tribunal Federal aguenta a
pressão de ter que decidir todas as questões e o inevitável desgaste perante a sociedade, diante
de tamanha exposição nos meios de comunicação de massa.24
Não se quer aqui discutir quem tem o “direito de errar por último”. Não é essa a
questão, mesmo porque sem dúvida é o Supremo Tribunal Federal que detém, na nossa
Constituição, esse direito25. A questão aqui colocada não é “quem” pode errar por último, mas
“quando” o Supremo pode errar por último. Pretendemos demonstrar, no decorrer do trabalho,
21
VIEIRA, Oscar Vilhena, Supremocracia, Revista de Direito do Estado: RDE, Rio de Janeiro, Renovar, n. 12,
p. 55-75, out./dez. 2008, p. 55.
22
SARMENTO, Daniel. Ubiquidade constitucional: os dois lados da moeda. In: SOUZA NETO, Cláudio Pereira
de; SARMENTO, Daniel (Coords.). A constitucionalização do direito: fundamentos teóricos e aplicações
específicas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. p. 115.
23
VIEIRA, Oscar Vilhena, ob. cit., p. 59.
24
Importante esclarecer, desde logo, que esta tese não repudia esses mecanismos de racionalização do sistema.
Pelo contrário, pretendemos contribuir para o aprimoramento do próprio mecanismo criado, principalmente, a
partir da Emenda Constitucional n. 45/2004, que tem como uma das principais metas acelerar a prestação
jurisdicional e aumentar a eficiência da máquina jurisdicional. A ideia é mostrar que dentro da atual
“consolidação de normas sobre os poderes do Supremo Tribunal Federal”, que concentrou os poderes na
cúpula do Poder Judicário, deve existir regras que apontam para a necessária “dosagem” (ou limites) desse
poder conferido ao Supremo.
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12
que o Supremo Tribunal Federal pode deixar de decidir, e assim fortalecer as instâncias
ordinárias, conforme adiante explicaremos.
Assim, se de um lado é necessário pensar na agilidade do processo e na redução do seu
tempo de duração, de outro lado é primordial assegurar mecanismos que garantam uma
abertura para a oxigenação do sistema, pois a decisão do Supremo Tribunal Federal não pode
ser tomada sem o devido e amplo debate do tema pela sociedade.
Percebe-se, em conclusão, que a discussão sobre a legitimidade da justiça
constitucional é uma discussão sobre os seus limites. No atual contexto, os limites do
Supremo Tribunal Federal não estão bem delineados.
3.2 O necessário amadurecimento da tese, antes da decisão do STF
Para “limitar” o poder conferido ao Supremo Tribunal Federal devemos analisar a
legislação em vigor, onde encontraremos parâmetros para “tentar” delinear os limites da nossa
Corte Suprema.
A primeira delas é o necessário amadurecimento da tese nas instâncias ordinárias.
Com efeito, tal previsão encontra-se, por exemplo, na legislação que trata da Súmula
Vinculante (Lei n. 11.417/2006), em seu art. 2º:
“Artigo 2 - O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por
provocação, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, editar
enunciado de súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá
efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à
administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e
municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma
prevista nesta Lei.
Ou no requisito para o conhecimento da ação declaratória de constitucionalidade (Lei
n. 9.898/99):
“Artigo 14 - A petição inicial indicará:
(...)
25
A esse respeito ver: MENDES, Conrado Hubner. Controle de constitucionalidade e democracia. Rio de
Janeiro: Elsevier, 2008.
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13
III - a existência de controvérsia judicial relevante sobre a aplicação da
disposição objeto da ação declaratória.”
Ou, ainda, na arguição de descumprimento de preceito fundamental (Lei n. 8.882/99):
“Artigo 3º - A petição inicial deverá conter:
(...)
V - se for o caso, a comprovação da existência de controvérsia judicial
relevante sobre a aplicação do preceito fundamental que se considera
violado.”
Por seu turno, a Lei n. 11.417/2006, em seu artigo 2º, contém expressa disposição de
que somente será editada a súmula vinculante “após reiteradas decisões sobre matéria
constitucional”.
O comando é claro ao determinar a utilização da súmula vinculante apenas após a
maturação dos debates nas instâncias ordinárias e reiteradas manifestações sobre a questão
constitucional.
É certo que, no final das contas, a última palavra é do Supremo Tribunal Federal, que
pode decidir até mesmo sem levar em consideração os argumentos levantados durante anos de
debate de uma “dada” causa no Poder Judiciário. Isso de fato pode ocorrer, mas não sem uma
boa argumentação. O importante não é o resultado final do julgamento do Supremo, mas sim
a oferta de debate do tema com a sociedade, após amadurecida a questão nas instâncias
ordinárias.
Aliás, é evidente que as decisões do Supremo não se pautam em agradar a “maioria”,
mesmo porque é da essência da atividade de controle de constitucionalidade proferir decisões
contramajoritárias, daí porque pouco importa o resultado do julgamento, mais importante é a
forma como conduzida a controvérsia, até sua solução final.26
26
“Pouco importa o resultado do julgamento”, mas com a ressalva de que deve obedecer aos princípios
substanciais básicos da Constituição e, em especial, a prevalência dos direitos fundamentais do ser humano. A
questão não se atém às teorias procedimentalistas/substancialistas. No caso brasileiro, como adiante
demonstraremos, as duas devem se complementar, utilizando o Supremo Tribunal Federal os mecanismos
principiológicos (substanciais) de decisão, ao mesmo tempo que deve existir o fortalecimento da jurisdição
ordinária, garantindo a dialogicidade da norma com a sociedade, na instância judicial mais próxima (primeiro e
segundo grau de jurisdição). Veja-se, por exemplo, o conhecido caso Morsang-Sur-Orge, em que a Prefeitura
local proibiu um inusitado concurso de arremesso de anões à distância. A matéria foi apreciada pelo Conselho
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Assim, a postura do Supremo Tribunal Federal na condução processual da
“controvérsia constitucional”, conforme a legislação acima transcrita, deveria ser a de
autocontenção, pois é seu dever – como regra geral − aguardar o prévio debate judicial nas
instâncias ordinárias, para somente depois decidir.
Não decidir, muitas vezes, é melhor do que decidir em demasia. A necessidade de se
debaterem as ideias e argumentos nas instâncias inferiores é indispensável ao
“amadurecimento” da questão, especialmente quando a matéria versa sobre temas
constitucionais.
Essa preocupação foi resumida por Oscar Vilhena Vieria, que relata o efeito colateral
de uma Constituição “maximizadora”, decorrente de uma interpretação do Texto Maior no
sentido de que tudo é matéria constitucional, sem campo de liberdade dado ao corpo político,
gerando, em qualquer movimento brusco, um incidente de inconstitucionalidade e, em
consequência, a judicialização de um embate essencialmente político.27
Neste sentido, importante repisar que a força das decisões proferidas pela Suprema
Corte americana, paradigma da Corte brasileira, é justamente a escolha de poucos casos por
ano para julgamento; apenas são tratadas as questões realmente importantes para a nação e as
demais devem ser relegadas à jurisdição ordinária.
Para se preservar essa legitimidade, deve o Supremo Tribunal Federal ponderar a
quantidade/qualidade de intervenções nos temas jurídicos do país. Não pode, a qualquer
tempo, atrair a competência para dizer a única interpretação do direito. O Supremo tem
legitimidade para proferir a última decisão, mas não a única.
3.3 A REPERCUSSÃO GERAL DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO
de Estado francês no sentido de que o espetáculo ofenderia à dignidade dos portadores de deficiência e que tal
direito não podia ser disponibilizado, mesmo que por seu titular. Esse exemplo bem ilustra a importância de
não se colocar de lado a busca pela efetividade do direito fundamental (no caso, à dignidade) previsto no texto
constitucional. A íntegra dessa relevante decisão administrativa francesa está disponível em:
<http://www.legifrance.gouv.fr/affichJuriAdmin.do?idTexte=CETATEXT000007877723&dateTexte=>.
Acesso em: 9 ago. 2012.
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A alteração do texto constitucional com a “consolidação de normas sobre os poderes
do Supremo Tribunal Federal” parece querer elevar o Supremo à condição de Corte
Constitucional, que apenas analisa aos casos relevantes para a nação brasileira, nos mesmos
moldes do writ of certiorari do direito norte-americano para acesso à Suprema Corte
americana.
O sistema recursal, até o advento da Emenda Constitucional n. 45, permitia que
qualquer causa, em tese, pudesse ser levada à apreciação do Supremo Tribunal Federal,
bastando que houvesse uma controvérsia constitucional, o que é relativamente comum, já que
a Constituição Federal é analítica, extensa e procura disciplinar praticamente todos os ramos
do direito.
A maior crítica que se fazia à atuação dos Tribunais Superiores, e principalmente do
Supremo Tribunal Federal, é atuar como uma terceira ou quarta instância recursal. Willian
Santos Ferreira, em precioso artigo, diz que há uma aparente democratização do acesso às
instâncias extraordinárias.
Aparente porque o volume é tão descomunal que se passa a trabalhar com julgamentos
em escala, o que é uma contradição em termos, já que se trata dos órgãos de cúpula do Poder
Judiciário, cujo acesso deveria ser algo extraordinário28. Assim, o que era para ser um acesso
democrático, passa a ser um mecanismo de acesso que quer agradar a todos, mas acaba não
agradando a ninguém.
A criada repercussão geral procura impedir que o Supremo Tribunal Federal se
transforme numa quarta instância, e tem todas as condições para isso, ao diminuir
consideravelmente a carga de trabalho desse tribunal, resultado que acaba por, de forma
indireta, beneficiar os jurisdicionados, que terão talvez uma jurisdição prestada com mais
vagar e mais cuidado, pois haverá acórdãos, já que em menor número, que serão fruto de
reflexões mais demoradas e aprofundadas por parte dos julgadores.29
27
VIEIRA, Oscar Vilhena, Supremocracia, cit., p. 60.
FERREIRA, Willian Santos. Sistema recursal brasileiro, de onde viemos, onde estamos e para onde (talvez)
iremos. In: COSTA, Hélio Rubens Batista Ribeiro; RIBEIRO, José Horácio Halfeld Rezende; DINAMARCO,
Pedro da Silva (Coords.). Linhas mestras do processo civil: comemoração dos 30 anos de vigência do CPC.
São Paulo: Atlas, 2004. p. 747.
29
MEDINA, José Miguel Garcia; WAMBIER, Luz Rodrigues; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Repercussão
geral e súmula vinculante: relevantes novidades trazidas pela EC n. 45/2004. In: WAMBIER, Teresa Arruda
28
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A função de um tribunal constitucional não é atuar como segunda instância de
apelação, mas sim construir jurisprudência constitucional, atuando apenas quando necessário
para a ordem social.
A repercussão geral do recurso extraordinário, prevista no artigo 102, parágrafo 3º, do
Texto Constitucional, e disciplinado no artigo 543-A do Código de Processo Civil, determina
que:
“Artigo 543-A - O Supremo Tribunal Federal, em decisão irrecorrível, não
conhecerá do recurso extraordinário, quando a questão constitucional nele
versada não oferecer repercussão geral, nos termos deste artigo.
§ 1º - Para efeito da repercussão geral, será considerada a existência, ou não,
de questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou
jurídico, que ultrapassem os interesses subjetivos da causa.
O requisito do que sejam “questões relevantes” abarca tão somente temas que são
“materialmente constitucionais”, tudo isso visto não como uma regra universal, mas como
critério de interpretação da competência do Supremo.
Dentro do contexto da realidade da Constituição brasileira, poderão existir, ainda
assim, questões decididas pelo Supremo Tribunal Federal de matérias que estão na
Constituição por mero “arbítrio” do constituinte, e que muito bem poderiam se encerrar na
jurisdição no Tribunal local (de origem).30
De qualquer forma, seja materialmente constitucional ou formalmente constitucional,
o fato é que o Supremo Tribunal tem a liberdade para decidir qual a sua competência para
julgar, a ponto de se afirmar, conforme ensina Barroso, “que toda interpretação jurídica é
Alvim (Coord). Reforma do Judiciário: primeiros ensaios críticos sobre a EC n. 45/2004. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2005. p. 374.
30
“Em princípio, no recurso extraordinário estará em debate o respeito ou não à Constituição. Sendo a matéria
constitucional, não haveria sempre a repercussão geral? Num mundo ideal, a resposta seria afirmativa. O
problema é que no Brasil a Constituição se agigantou a tal ponto, tratando de tantas matérias, que isso se
tornou por si só duvidoso. De outra parte, diante da prática brasileira, os recursos extraordinários que chegam
ao Supremo Tribunal Federal versam frequentemente sobre tamanhas frivolidades que não se pode afirmar que
estejam sempre em discussão, de fato, questões constitucionais de alta indagação e relevância, ou, para se usar
a nova terminologia, de repercussão geral.” (FONSECA, Rodrigo Garcia da. O papel do Supremo Tribunal
Federal e a repercussão geral no recurso extraordinário. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva; JOBIM, Eduardo
(Coords.). O processo na Constituição. São Paulo: Quartier Latin, 2008. p. 228).
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também interpretação constitucional. Qualquer operação de realização do direito envolve a
aplicação direta ou indireta da Lei Maior”.31
O grande problema é que não existe um conceito adequado para determinar qual
matéria é do Supremo Tribunal Federal e qual é de competência, por exemplo, do Superior
Tribunal de Justiça. A prática jurisprudencial é que traça os contornos dos limites existentes.
É aí que se encontra uma das mais importantes características de poder da Suprema
Corte brasileira, qual seja a de que ela detém a prerrogativa de definir os limites de sua
própria jurisdição.
Enquanto as demais funções do Estado — Executivo e Legislativo — têm suas
respectivas competências interpretadas pelo Supremo Tribunal, através do chamado controle
de constitucionalidade, “o Judiciário é responsável por definir os limites de sua própria
competência. Bem por isto resulta importante destacar em que medida a ideologia individual
de cada um de seus membros contribui na definição dos limites desta competência”.32
Para Barroso, o Judiciário pode decidir em muitas questões, mas talvez não deva. “O
juiz deve avaliar se ele é, naquelas circunstâncias, a pessoa capaz de produzir a melhor
avaliação e decisão naquela matéria”. Talvez o Judiciário não seja a melhor instância para se
debater se deve ou não ser feita a transposição de um rio, por exemplo. “No contexto de
jucialização, em que o Judiciário pode muito, às vezes é preciso uma gota de humildade para
saber se, embora podendo, deve. Porque pode ser que aquela decisão tenha como autoridade
competente mais qualificada outra que não o juiz.”33
Com efeito, não existem regras claras para traçar a competência da matéria examinada
pelo Supremo Tribunal Federal. Muitas vezes, o Superior Tribunal de Justiça, por exemplo,
parece mero entreposto judicial para o encaminhamento do caso concreto entre a decisão do
31
BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do direito: o triunfo tardio do direito
constitucional no Brasil. Revista do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais, v. 65, n. 4, p. 39-41,
out./dez. 2007, p. 32.
32
APPIO, Eduardo. Controle difuso de constitucionalidade. Curitiba: Juruá, 2008. p. 39.
33
Luis Roberto Barroso. Palestra no seminário Direito e Desenvolvimento entre Brasil e EUA, realizado pela
FGV Direito Rio, no Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (ITO, Marina. Judicialização é fato,
ativismo é atitude. Consultor Jurídico, de 19 maio 2009, disponível em: http://www.conjur.com.br/2009-mai17/judicializacao-fato-ativismo-atitude-constitucionalista, acesso em: 10 ago. 2012).
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Tribunal do Estado e o Supremo Tribunal Federal, dotando este de livre discricionariedade
para dizer se a matéria é constitucional.
Depende então da Corte Constitucional adotar a postura de autocontenção ou de
ativismo judicial para se saber qual o perfil do órgão julgador.
No sistema brasileiro, qualquer caso pode ser levado até o Supremo. Se o processo
estiver bem instruído, tiver sido conduzido por um advogado competente e zeloso, o recurso
devidamente preparado, com todas as cópias claras e legíveis, a matéria prequestionada, o
Tribunal acabará se vendo forçado a julgar qualquer questão, até mesmo o caso da mulher que
atropelou cachorro morto.34
O emprego excessivo de tais expedientes no controle difuso contribui para a elitização
da clientela do Supremo, pois apenas aqueles em condições de contratar advogados
habituados a tais armadilhas processuais lograrão acesso a decisões de mérito, o que pode
restringir a agenda da Corte a causas de expressivo valor econômico, com prejuízo para a
desejada jurisprudência voltada aos direitos fundamentais.35
Por outro lado, uma matéria relevantíssima para o país e para a sociedade será deixada
de lado se a cópia do carimbo do protocolo de interposição do recurso extraordiário não
estiver bem legível (ainda que ninguém, seja o Tribunal local ou a parte contrária, tenha
alegado a sua falsidade ou a intempestividade do recurso). É a distorção do sistema, que acaba
por privilegiar a forma sobre o conteúdo.36
34
“Uma mulher, ao volante de um carro na BR-040 — que liga Brasília ao Rio de Janeiro — atropelou um
cachorro. O animal já estava morto no momento do atropelamento. Mesmo assim, a motorista se sentiu
emocionalmente abalada com a colisão, a ponto de procurar a Justiça para ser ressarcida pelos danos morais e
materiais que sofreu. Teve ganho de causa na primeira e segunda instância, que condenaram a Companhia de
Concessão Rodoviária Juiz de Fora, concessionária da estrada, a indenizá-la em R$ 523 por danos materiais e
em cinco salários mínimos (R$ 1.750) por danos morais.” (Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2006out-24/chega_stf_mulher_atropelou_cachorro_morto>. Acesso em 10 ago. 2012).
35
MORO, Sergio Fernando. Jurisdição constitucional como democracia. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2004. p. 206, p. 216.
36
FONSECA, (FONSECA, Rodrigo Garcia da. O papel do Supremo Tribunal Federal e a repercussão geral no
recurso extraordinário. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva; JOBIM, Eduardo (Coords.). O processo na
Constituição. São Paulo: Quartier Latin, 2008. p. 228), p. 209.
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Título da Tese
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O Supremo Tribunal Federal julga dezenas de milhares de causas por ano37, mas a
maioria delas através de decisões monocráticas (art. 557 do CPC), ou por “blocos”, com
julgamentos repetitivos e frequentemente sem que o mérito seja tocado nem de perto. São
formados mutirões de servidores em busca de eventuais falhas na formação dos agravos de
instrumento, independentemente do tema envolvido nas discussões. A seleção de processos a
serem julgados se torna quase lotérica.
As estatísticas de casos julgados e acórdãos publicados ao ano dizem, portanto, que a
imensa maioria dos processos resolvidos atualmente pelo Supremo Tribunal Federal (algo em
torno de 88,20% deles) não são levados a julgamento colegiado, quer nas Turmas, quer no
Plenário, mas são objeto de julgamento monocrático38. Em realidade, segundo Veríssimo, são
processos que sequer deveriam ter sido objeto de recurso para o Supremo, pois se trata de
matéria de menor complexidade, situações de solução evidente.39
Conforme Veríssimo, pode-se fazer a conjectura de que, mesmo sem previsão legal,
ainda antes da Emenda Constitucional n. 45/2004, já existia no Supremo Tribunal Federal
uma espécie de juízo de relevância “destinado a tornar viável a gestão de casos nas Turmas e
no Plenário”, juízo justificado formalmente sob o prisma formal-procedimental da
admissibilidade, ainda mais quando se tem em conta a rigidez com que o Supremo foi
construindo ao longo do tempo suas exigências formais e materiais de admissibilidade do
recurso extraordinário.40
37
“(...) quando olhamos o número de casos julgados pelo Supremo Tribunal Federal, ele aparece, na comparação
internacional, como uma evidentíssima anormalidade. Quando olhamos, contudo, para os julgamentos
colegiados, a anormalidade começa a amenizar. Quando focamos nossa atenção exclusivamente ao trabalho do
Plenário, a imagem que temos é algo mais próximo do que poderia ser considerado ‘normal’, em termos de
volume de trabalho atribuído a um tribunal com as características dessa Corte.” (VERÍSSIMO, Marcos Paulo,
A Constituição de 1988, vinte anos depois: Suprema Corte e ativismo judicial “à brasileira”, cit., p. 422).
38
VERÍSSIMO, Marcos Paulo, A Constituição de 1988, vinte anos depois: Suprema Corte e ativismo judicial “à
brasileira”, cit., p. 420.
39
O litigante deveria ter mecanismos de contenção que o desestimulasse a interpor recursos manifestamente
inadmissíveis, conformando-se com a possibilidade de já ter experimentado o day in Court. Nos Estados
Unidos, esse bom senso de não propor ações incabíveis e de não recorrer em casos perdidos é cultural; no
Brasil, por enquanto, não sentimos a mesma filosofia, razão pela qual outros mecanismos deveriam ser
adotados, tais como o aumento no valor do preparo, multa pesada para recursos procrastinatórios, em casos
reiterados o próprio subscritor da petição deveria ser representado perante a respectiva instituição, dentre
outros.
40
VERÍSSIMO, Marcos Paulo, A Constituição de 1988, vinte anos depois: Suprema Corte e ativismo judicial “à
brasileira”, cit., p. 421.
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Em consequência, as questões realmente importantes para o país se perdem em meio à
avalanche de rejeições por motivos processuais, ou demoram anos e anos para chegar ao fim,
e acabam vindo à tona em tempo inadequado.41
3.3.1 IMPORTÂNCIA DO ART. 324 DO RI/STF.
Em 29.05.2009, o Supremo Tribunal Federal alterou o regimento interno, para facilitar
a inadmissibilidade do recurso extraordinário, em razão da ausência de repercussão geral,
quando a matéria versada no recurso não tratar de matéria constitucional.
Determina o artigo 324 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, com a
nova redação dada pela Emenda Regimental n. 31, de 29.05.2009:
“Artigo 324 - Recebida a manifestação do(a) Relator(a), os demais
ministros encaminhar-lhe-ão, também por meio eletrônico, no prazo comum
de 20 (vinte) dias, manifestação sobre a questão da repercussão geral.
§1º - Decorrido o prazo sem manifestações suficientes para recusa do
recurso, reputar-se-á existente a repercussão geral.
§2º - Não incide o disposto no parágrafo anterior quando o Relator declare
que a matéria é infraconstitucional, caso em que a ausência de
pronunciamento no prazo será considerada como manifestação de
inexistência de repercussão geral, autorizando a aplicação do artigo 543-A,
parágrafo 5º, do Código de Processo Civil.”
É de extrema importância dar destaque à alteração do Regimento Interno do Supremo
Tribunal Federal, pois a modificação acarretou uma substancial mudança na admissibilidade
do recurso extraordinário.
A alteração surgiu com o debate inaugurado pela Ministra Ellen Gracie, no julgamento
do Plenário virtual no Recurso Extraordinário n. 584.608. A conclusão da relatoria,
41
Rodrigo Garcia da Fonseca cita como exemplos: a Lei de Arbitragem, que demorou cinco anos para ser
definida pelo Supremo Tribunal Federal como constitucional; a tablita do Plano Bresses, objeto de decreto-lei
em 1987 e semelhante a normas de outros planos econômicos, somente foi reconhecia como constitucional
pelo Supremo em 2005; a questão da aplicação ou não do Código de Defesa do Consumidor às operações
bancárias também levou vários anos para ser julgada, e ainda com dúvidas quanto à real extensão da decisão.
Observa o autor que “o longo tempo para julgamentos de tamanha relevância causa grande insegurança
jurídica, e multiplica ainda mais o número de recursos, pois os juízes de primeira instância e os Tribunais de
Justiça ou Regionais Federais acabam por não uniformizar a jurisprudência no país, e proferem julgados os
mais diversos, durante vários anos. Enquanto não há manifestação do Supremo Tribunal Federal sobre
determinado tema, as partes são indiretamente estimuladas a continuarem recorrendo, pois as teses ainda
poderão ser vencedoras” (O papel do Supremo Tribunal Federal e a repercussão geral no recurso
extraordinário, cit., p. 210).
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acompanhada por maioria, é a de que as matérias infraconstitucinais não têm repercussão
geral.
Antes da alteração era – relativamente – difícil negar a admissibilidade do recurso
extraordinário, porque era necessário que, no mínimo, quatro ministros se manifestassem –
expressamente – concordando com a inexistência da repercussão geral.
O silêncio dos ministros representava a existência ficta da repercussão geral (nos
termos do parágrafo 1º acima transcrito, ao contrário do que ocorre na Suprema Corte
Americana) e o recurso extraordinário deveria ser recebido pelo relator – ao menos no que
toca ao critério da “repercussão geral”, não obstante a possibilidade do relator inadmitir por
inúmeros outros motivos, examinados a fortiori.
Em princípio, portanto, presume-se a relevância do tema tratado em todos os recursos
extraordinários. A irrelevância somente será reconhecida se nesse sentido se manifestarem
dois terços dos Ministros (são necessários, no mínimo, oito votos para a configuração da
irrelevância).42
Com a nova redação do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, a situação se
inverte. No silêncio dos demais ministros, a decisão do relator do recurso extraordinário que
não o conhece, pela fundamentação de que não há matéria constitucional nas razões recursais,
acarreta a inadmissibilidade automática do recurso (praticamente automática, pois os demais
ministros terão o prazo COMUM de 20 – vinte – dias, nos termos do art. 324 do RISTJ, para
não concordar com a inadmissibilidade do recurso extraordinário, prazo exíguo que dificulta –
por exemplo – o trabalho de distribuição de memoriais pelos interessados para que o processo
fosse destacado por outro ministro).
É oportuno fazer a comparação dessa negativa de admissibilidade do recurso
extraordinário com a recusa dos recursos na Suprema Corte americana. A idêntica
discricionariedade existente na Corte americana (certiorari) para a escolha dos casos que
escolhe para julgar passa a existir no Supremo Tribunal Federal.
42
MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Recurso extraordinário e recurso especial. 7. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2001. p. 392.
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Digo isso porque o pressuposto do que é “matéria constitucional” é arbitrário do
próprio relator, diante de uma Constituição analítica e dirigente como a nossa em que – em
tese – tudo seria matéria constitucional (ou nada seria).
Ou seja, quando entender oportuno e conveniente, o ministro relator poderá
fundamentar que a matéria versada no recurso extraordinário não trata de ofensa direta à
Constituição Federal, razão pela qual não há repercussão geral e, consequentemente, não se
conhece do recurso extraordinário. Os demais ministrros – no silêncio – estão de acordo com
a inadmissibilidade recursal.
Não é demais supor que a ausência de manifestação dos demais ministros – em
período exíguo de vinte dias – será a regra geral, acarrentando a inadmissibilidade recursal em
massa dos recursos extraordinários.
Nesse contexto, o artigo 324 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal
acaba por instituir a discricionariedade judicial no país. O relator passará a receber somente
os recursos extraordinários que entender por bem admitir e o silêncio dos demais ministros
acarretará o não conhecimento do recurso extraordinário.
A questão pode ser levada para a técnica processual de interposição do recurso
extraordinário. Se o recurso não tiver um fundamento constitucional bem explorado, poderá o
relator fundamentar que as razões recursais − naquele processo específico − não tratou de
matéria constitucional. E aí caberá aos demais ministros manifestarem-se no plenário virtual
expressamente, no exíguo prazo decadencial de vinte dias, a respeito da existência de
repercussão geral.
Com isso, mais uma vez, percebe-se que a postura adotada pelo ordenamento jurídico
brasileiro é a de afastar – ou ao menos permitir esse distanciamento – o Supremo Tribunal
Federal de um recurso extraordinário qualquer, permitindo que apenas as questões escolhidas
pelos ministros sejam apreciadas pela mais alta Corte do país.
A figura se inverte, o recurso extraordinário não é mais um recurso de “cunho
forçado”. A questão poderá não mais ser analisada obrigatoriamente pelo Tribunal Superior,
tal qual o certiorari do direito americano.
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Nesse sentido, Oscar Vilhena Vieira, ao comentar o aumento absurdo de recursos que
chegam (ou chegavam) ao Supremo Tribunal Federal todos os anos, desde a promulgação de
1988,
em
razão
da
explosão
da
litigiosidade
constitucional
decorrente
da
“constitucionalização do direito”, reconhece que, a partir da Emenda Constitucional n. 45, foi
conferida discricionariedade ao Tribunal para escolher os casos que quisesse julgar.
Diz o citado jurista que “definitivamente não é necessário analisar cada recurso
extraordinário e muito menos cada agravo de instrumento que chega ao Tribunal, todos os
dias. Ao restringir a sua própria jurisdição, ao se autoconter, o Supremo estaria ao mesmo
tempo reforçando a sua autoridade remanescente e, indiretamente, fortalecendo as instâncias
inferiores, que passariam, com o tempo, a ser últimas instâncias, nas suas respectivas
jurisdições. É preocupante a posição de subalternidade a que os tribunais de segunda isntância
foram relegados no Brasil, a partir de 1988, quando as suas decissões passaram a ser
invariavelmente objeto de reapreciação”.43
Em síntese, fortalece-se, com isso, o poder discricionário do Supremo Tribunal
Federal de escolher os casos que pretende, na prática, julgar e, de outro lado, fortalece a
jurisdição ordinária, que apenas terá sua decisão revista em situações excepcionais.
CONCLUSÕES
1. O Supremo Tribunal Federal, como se dotado de um “toque de Midas”, transforma
tudo em matéria constitucional, asfixiando - prematuramente - a criatividade dos demais
tribunais; questões que seriam muito bem tratadas pela Justiça ordinária, acabam passando
pela apreciação do Supremo.
2. Enquanto as demais funções do Estado − Executivo e Legislativo − têm suas
respectivas competências interpretadas pelo Poder Judiciário, através do chamado controle de
constitucionalidade, o Supremo Tribunal Federal é responsável por definir os limites de sua
própria competência. É aí que se encontra uma das mais importantes características de poder
43
VIEIRA, Oscar Vilhena, Supremocracia, cit., p. 74.
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Título da Tese
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da Suprema Corte brasileira, qual seja a de que ela detém a prerrogativa de definir os limites
de sua própria jurisdição.
3. É necessário resgatar a importância dos demais órgãos do Poder Judiciário,
principalmente os de primeiro e segundo graus, que estão próximos do jurisdicionado, em
contrapartida ao aumento da verticalização do Judiciário brasileiro, pós-Emenda
Constitucional n. 45/2004.
4. Reforçar o poder da jurisdição ordinária diminui a síndrome depreciativa de “meros
entrepostos” de decisão judicial.
5. A postura contida do Supremo Tribunal Federal contribui para dar maior
credibilidade às suas decisões, com menor desgaste decorrente da exposição nos meios de
comunicação em massa, sem o risco de um “processo de fadiga” e eventual descumprimento
das decisões proferidas.
6. A autocontenção do Supremo Tribunal Federal favorece o amadurecimento das
questões controvertidas nas instâncias ordinárias, utilizando-as como “laboratórios
experimentais”.
7. A legislação brasileira deve ser interpretada sob a ótica minimalista, dando-se
ênfase aos conceitos legais de contenção das decisões do Supremo Tribunal Federal, como,
por exemplo, o previsto na Lei n. 11.417/2006, que permite a edição de súmula vinculante
apenas após “reiteradas decisões sobre a matéria constitucional”.
8. A “repercussão geral do recurso extraordinário” introduz mecanismo discricionário
de escolha de casos concretos para a formulação da agenda de julgamentos do Supremo
Tribunal Federal, nos moldes do writ of certiorari americano.
9. Nos termos do artigo 324 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, com
a redação dada pela Emenda Regimental n. 31, de 29.05.2009, a inexistência de repercussão
geral com fundamento em mera alegação de “tema infraconstitucional” pode levar a
inadmissibilidade do recurso extraordinário por decisão monocrática do ministro relator, e o
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silêncio dos demais ministros será considerado como concordância da inadmissibilidade,
situação que facilita o não conhecimento do recurso.
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Repercussão geral do recurso extraordinário