O presente trabalho deriva de uma pesquisa mais ampla que vem sendo realizada junto ao Programa de Mestrado e Doutorado em Administração, da Universidade Positivo, sobre o processo de institucionalização da política ambiental na cidade de Curitiba, Capital do Estado do Paraná, processo que se desdobra do final da década de 1980 até os dias de hoje. Durante a fase de levantamento de dados, foram consultados periódicos locais com o objetivo de iniciar o mapeamento dos principais atores envolvidos neste processo de institucionalização. Através do procedimento de leitura flutuante foi possível perceber que mais do que fornecer subsídios para uma pesquisa mais ampla, o conteúdo veiculado pela mídia impressa da Capital paranaense também revela uma sugestiva associação de significados a respeito dos problemas ambientais derivados do espaço delimitado pela Região Metropolitana de Curitiba (RMC), suficientemente relevante para ser analisada por um trabalho específico. Desta forma, o tema deste trabalho está ligado às construções de significado contidas na mídia impressa da Capital paranaense, durante as duas últimas décadas, que associam a Região Metropolitana de Curitiba à emergência de problemas ambientais percebidos como peculiares. A documentação que subsidia a análise foi obtida junto ao acervo temático mantido pela Biblioteca Pública do Estado do Paraná, formado por matérias retiradas do jornal de maior circulação de Curitiba. Submetida aos procedimentos de análise de conteúdo, tal como sistematizados por Laurence Bardin (2008), esta documentação foi mapeada através de dimensões detectadas dentro dos limites internos do próprio conteúdo. Num primeiro momento observou-se, tendo como parâmetro de avaliação o critério da recorrência, que os programas elaborados pela Prefeitura Municipal de Curitiba para o gerenciamento dos resíduos sólidos urbanos aparecem como o eixo mais abordado para articular as relações entre a cidade principal e aquelas que estão situadas no seu entorno. Em função disso, num segundo momento, adotou-se uma estratégia de análise de cunho qualitativo com o objetivo de identificar as associações de significado estabelecidas a partir desse eixo. A análise indicou a possibilidade de divisão do conteúdo em dois registros temporais distintos. No primeiro, que avança até o final da década de 1990, os programas de gerenciamento de resíduos sólidos urbanos aparecem como conseqüência de uma administração municipal com capacidade para elaborar respostas eficientes e inovadoras para os problemas ambientais que enfrenta. Enquanto a Prefeitura Municipal de Curitiba tende a ser apresentada como um ator cuja conduta é pautada pela racionalidade técnica, a Região Metropolitana de Curitiba tende a ser apresentada como um espaço distante, que no futuro irá impor o desafio de que as mesmas soluções que garantem qualidade de vida para a Capital sejam replicadas nas demais cidades. No segundo, que tem como marco o início dos anos 2000 e a emergência de uma acirrada polêmica sobre o iminente esgotamento do aterro sanitário usado até os dias de hoje, a Região Metropolitana de Curitiba passa a ser apresentada como o espaço no qual o planejamento racional e eficiente não é mais possível. Esta impossibilidade é diretamente remetida ao fato de que, enquanto o espaço da cidade pode ser pensado e transformado através de órgãos cuja competência é estritamente técnica, o espaço metropolitano demanda a interação de órgãos municipais e estaduais, o que implica a substituição da competência técnica pela articulação política. Dito de outra maneira, estes dois registros temporais situam a Região Metropolitana, de um lado, como sombra no horizonte da cidade que passou a ser rotulada de “capital ecológica” e, de outro, como a origem de problemas ambientais que dificilmente podem ser contornados por conta da dinâmica política que os envolve. Tendo como base esses resultados obtidos através do tratamento descritivo do próprio conteúdo, o trabalho argumenta com o objetivo de sustentar as seguintes inferências. 1) O conteúdo analisado reflete uma tendência que caracteriza a cultura política que se origina com o processo de globalização. De acordo com Milton Santos (2000), esta cultura estabelece dois pólos de ação privilegiados: o global e o local. Como conseqüência, pólos intermediários ou regionais, tais como regiões metropolitanas, convertem-se em espaços nos quais os instrumentos à disposição do poder público perdem a efetividade. 2) O conteúdo analisado reflete uma concepção de meio ambiente que o situa como objeto passível de ser manipulado por conhecimentos e práticas orientadas pela suposta neutralidade técnico-científica. Nesse sentido, reflete também a concepção de que a esfera política, palco do confronto de interesses, por ser incompatível com essa suposta neutralidade, tende a originar obstáculos ao adequado enfrentamento dos problemas rotulados como “problemas ambientais”. Referências Bibliográficas ACSELARD, H. MELLO, C. BEZERRA, G. Cidade, ambiente e política: problematizando a Agenda 21 local. Rio de Janeiro: Garamond, 2006. ARANTES, O. VAINER, M. MARICATO, E. A cidade do pensamento único. Petrópolis: Vozes, 2000. BARDIN, L. Análise de Conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2008. DUARTE, J. MARTINEZ, R. (orgs.). Comunicação: discursos, práticas e tendências. São Paulo: Rideel, 2001. SANTOS, Milton. Por uma outra globalização. São Paulo: Record, 2000.