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QUANTO SE MUDOU DO QUE ERA?
Novas respostas velhas a velhos problemas novos, avanços e retrocessos
acerca da atenção ao uso de drogas
Liana de Menezes Bolzan
Manoela Rodrigues Munhoz
Rossana Lopes Pereira de Souza
*
**
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Resumo: Este artigo possui como proposta a discussão referente ao Projeto de Lei da Câmara
37/2013, que traz dentre outros elementos, a questão da internação compulsória para as pessoas
que fazem uso de drogas. Esta proposta representa um retrocesso às conquistas e garantias de
direitos previstos através da Lei da Reforma Psiquiátrica brasileira. Demonstra o agravamento das
expressões da questão social, a retração do Estado mínimo de direitos e o avanço neoliberal.
Palavras-chave: Políticas Públicas. Reforma Psiquiátrica. Internação Compulsória. Questão Social.
1.
INTRODUÇÃO
Com o presente artigo nos propomos a discutir a internação compulsória de
pessoas que fazem uso de drogas, a partir da proposta do Projeto de Lei da Câmara
37/2013. Situamos essa análise partir da reflexão dos históricos avanços e dos
temidos retrocessos aos quais estão vulneráveis as políticas públicas no país sob a
égide do modelo neoliberal.
O caráter repressivo e cerceador de liberdade previsto no projeto em questão,
opõem-se à trajetória de defesa dos direitos humanos e sociais do Movimento da
Luta Antimanicomial. Ao pautar o atendimento em Saúde Mental na perspectiva da
reclusão de indivíduos considerados “indesejados”, a proposta fere os princípios
constitucionais do direito de ir e vir agrava o processo de estigmatização das
pessoas e legitima a mercantilização da saúde por meio de atendimentos
específicos em clínicas e/ou comunidades terapêuticas, prestados pela iniciativa
privada.
*
. Assistente Social. Especialista em Saúde Mental Coletiva, Mestranda (bolsista CAPES) em Serviço
Social pelo Programa de Pós-Graduação em Serviço Social da Pontifícia Universidade Católica do
Rio Grande do Sul
**
Assistente Social. Especialista em Gestão da Política de Assistência Social. Servidora da Prefeitura
Municipal de Porto Alegre. Mestranda (bolsista CAPES) no Programa de Pós - Graduação em Serviço
Social da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS.
***
Assistente Social. Residência Integrada em Saúde Mental Coletiva pela Escola de Saúde Pública.
Mestranda (bolsista CAPES) no Programa de Pós - Graduação em Serviço Social da Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS
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2.
A Questão Social e o Uso de Drogas na Sociedade Capitalista
Na sociedade capitalista, o discurso combativo de intolerância a determinadas
drogas, em última instância corresponde a critérios exclusivos da saúde, no geral
essas posições de juízo de valor fazem referência aos interesses da classe
dominante.
Dito isso, julgamos necessário considerar o tema em questão a partir de sua
historicidade, contemplando o contexto político, social e econômico em que estão
expostas as pessoas que fazem uso de drogas. Com isso, estamos dizendo que,
nenhuma atividade, ato, relação, ou valor pode ser analisado de maneira isolada e
unilateral.
A perspectiva de historicidade e de totalidade se impõe como critério para
desvelar sua realidade objetiva. Nesse sentido mesmo não considerando o
uso de drogas como práxis, especialmente quando analisamos as formas
alienadas de subjetividade que resultam da relação do homem com
diferentes drogas, é possível identificar relações entre essa atividade e
formas de resistência, de contestação e de criatividade que apontam na
direção da riqueza humano-genérica, no sentido ontológico social do termo.
(BRITES, 2006, p. 44).
Nesse sentido, cabe-nos ressaltar que o uso de drogas sempre esteve
presente na história da humanidade, de diversas maneiras adquirindo valores
distintos em diferentes contextos históricos e culturais e nem sempre foi associado à
marginalidade ou criminalidade. Como refere Brites (2006), a artificial dualidade
criada em relação às drogas consideradas legais e ilegais contribui para a
construção social de categorias diferenciadas de cidadãos que fazem uso de drogas,
relegando aqueles que consomem drogas ilícitas ao anonimato e à exclusão.
Não podemos desconsiderar que a tentativa de retomada da perspectiva
conservadora nas estratégias de intervenção e cuidado da política de saúde se da
no cenário capitalista de exploração, dominação e reprodução das desigualdades.
Isto reflete na fragmentação, no focalismo, na descontinuidade e especialmente no
financiamento das políticas sociais. A conjuntura da sociedade capitalista por meio
da centralidade na política econômica em detrimento da social, é expressa pela
retração da intervenção estatal a fim de garantir “liberdades individuais”, um dos
seus reflexos mais aparentes é mercantilização dos serviços considerados básicos
para a população. Transforma-se assim o agente político em agente econômico, e
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por consequência, o cidadão em consumidor. Nesse contexto das relações impostas
pelo capital, às políticas públicas se atribui valor de uso e valor de troca.
Vivenciamos mundialmente a desregulamentação da atividade econômica, a
abertura dos mercados e a intervenção mínima do Estado, esse cenário constitui a
radicalização da lógica neoliberal, incidindo em diversas restrições sociopolíticas,
através da reforma do aparelho estatal e sua relação com a sociedade. A retração
de direitos conquistados historicamente pela classe trabalhadora é um reflexo das
características da contemporaneidade capitalista. Nesse contexto a questão social é
agravada pela profunda desigualdade social, aumentando o acúmulo de riquezas de
uma minoria, em detrimento das privações da classe trabalhadora.
Referendado e apoiado pelas políticas imperialistas ditadas pelos
organismos multilaterais, o capital subordina, aos seus fins de valorização,
toda a organização da vida em sociedade: a economia, a política e a
cultura. Potencia as mistificações – o mundo dos seus fetichismos tornando opacas as relações de exploração e subordinação política que
mantém com os trabalhadores (e suas lutas), que nutrem o processo de
acumulação e sua desagregação (IAMAMOTO, p.53, 2010).
A estes valores sociais também podemos atribuir que a concepção de
questão social está enraizada na contradição capital versus trabalho, em outros
termos, é uma categoria que tem sua especificidade definida no âmbito do modo
capitalista de produção. Como refere Iamamoto (2007), a questão social é
apreendida como o conjunto das expressões das desigualdades da sociedade
capitalista madura, cenário em que o trabalho torna-se mais amplamente social,
enquanto a apropriação dos seus frutos mantém-se privada, monopolizada por uma
pequena parte da sociedade.
Ao utilizarmos, na análise da sociedade, a categoria questão social, tornamos
evidente a situação em que se encontra a maioria da população, aquela que só tem
na venda de sua força de trabalho os meios para garantir sua sobrevivência. Com
isso, ressaltamos as diferenças entre trabalhadores e capitalistas, no acesso à
direitos e na apropriação unilateral da riqueza socialmente produzida, trazendo à
tona o abismo da desigualdade social. O histórico de enfrentamento da questão
social está marcado por um passado – que de tempos em tempos volta a nos
assombrar- de criminalização das suas múltiplas expressões, mais precisamente por
meio de abordagens policialescas. Segundo o resgate histórico de Couto:
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Os pobres no início da República eram presos porque eram pobres; ser
pobre era uma contravenção; seu comportamento era considerado um
comportamento fora dos padrões da normalidade. Assim, programas que
atendiam a população pobre trabalhavam na perspectiva de adestrá-los,
torná-los mais dóceis, mais resignados com aquilo que a sociedade lhe
oferecia. Todo comportamento reivindicatório do pobre era considerado uma
contravenção e ele era preso. O Estado não tinha nenhuma
responsabilidade com eles, limitava-se a transferir para a iniciativa privada o
atendimento dessa demanda. (2005,s/pg.).
Constatamos que pouco ou nada se avançou na superação da
criminalização da pobreza, que insiste em tratar como culpados ás vítimas do
sistema capitalista de produção. Trata-se do histórico processo que transforma as
expressões da questão social em problema exclusivos da assistência social ou da
violência, ou ainda, a associação de ambos. Os desprovidos das virtudes
enaltecidas pelo sistema capitalista são os criminosos em potencial, representam um
“perigo social” que deve ser erradicado, assim se justificam as medidas coercitivas
de cunho higienista e conservador que partem de uma pequena, mas poderosa
parcela da sociedade.
Partindo-se da premissa que, no contexto atual, as políticas públicas se
constituem no instrumento central para o enfrentamento da questão social e suas
múltiplas expressões, é preciso superar a condição subalterna dessas aos ditames
econômicos, deflagrada no gritante contrastante de uma economia de padrões
internacionais associada a um inexpressivo campo de desenvolvimento social.
Neste cenário, de contradições da sociedade capitalista, onde a “igualdade
jurídica dos cidadãos livres é inseparável da desigualdade econômica”, é
promulgada a Constituição de 1988, considerada como constituição cidadã. Em seu
capítulo que aborda a seguridade social, a política de saúde é compreendida como
um direito de todos e dever do Estado, dando inicio ao Sistema Único de Saúde –
SUS, que posteriormente é regulamentado pelas leis orgânicas nº 8.080/1990 e Lei
nº 8.142/1990.
É com base nesta legislação e seus princípios que se constitui a política de
saúde mental no Brasil, tendo como seu marco legal a Lei nº 10.216/2001, que
dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas com transtornos mentais,
redimensionando o modelo assistencial em saúde mental.
A partir da reforma psiquiátrica, que determinou o fechamento progressivo
dos hospitais psiquiátricos, para serem substituídos por leitos em hospitais gerais e
a construção de uma rede de serviços especializada e ambulatorial, são criados
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novos serviços de atenção em saúde mental, como: os Serviços Residenciais
Terapêuticos (SRTs), Programa de Volta para Casa, Unidades Psiquiátricas em
Hospitais Gerais (UPHG) e Centros de Atenção Psicossocial (CAPS).
Os CAPS são criados através da Portaria/GM nº. 336, em 19 de fevereiro de
2002, dividindo-se nas seguintes modalidades de serviço: CAPS I, CAPS II e CAPS
III, CAPSi (infantil) e CAPSad (álcool e outras drogas). Nesse contexto, os CAPSad
se configuram como um serviço de grande importância da Reforma Psiquiátrica,
operando como um meio socializador e propiciando tratamento em liberdade. Assim,
os CAPS são considerados dispositivos estratégicos para a organização da
rede de atenção em saúde mental. Eles são referência para um território e
devem oferecer espaço de acolhimento e convivência para usuários de AD
que desenvolveram processos de ruptura de suas relações sociais. A
reinserção social pode se dar a partir do CAPS, mas sempre em direção à
comunidade. (OLIVEIRA,SANTOS, 2010, p.81).
Neste sentido, como forma de ampliar as estratégias de atenção aos usuários
destes serviços, é instituída em 2004, a Política do Ministério da Saúde para a
Atenção Integral dos Usuários de Álcool e outras Drogas, que aborda a Redução de
Danos como uma diretriz de cuidado. Esta proposta constitui-se num novo olhar
sobre a temática do uso de drogas, onde a abstinência deixa de ser o único objetivo
a ser alcançado, dando enfoque as singularidades dos indivíduos, respeitando as
diferentes escolhas de vida, visando ao desenvolvimento de estratégias para que o
uso de drogas seja o menos prejudicial possível.
Com relação às questões de internação hospitalar destes usuários, a lei nº
10.216 refere em seu artigo 4º que “a internação, em qualquer de suas modalidades,
só será indicada quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes”.
E no artigo 6º desta legislação estabelece os tipos de internação psiquiátrica, como:
“I - internação voluntária: aquela que se dá com o consentimento do usuário; II internação involuntária: aquela que se dá sem o consentimento do usuário e a
pedido de terceiro; e III - internação compulsória: aquela determinada pela Justiça”.
(BRASIL, 2001).
Em contraponto a esses avanços e como desculpa para atualizar a legislação
sobre drogas, neste momento crítico de retrocessos na área da saúde é
apresentado o Projeto de Lei da Câmara (PLC) 37/2013, de autoria do Deputado
Federal Osmar Terra. Este projeto dispõe sobre o Sistema Nacional de Políticas
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Públicas sobre Drogas e as condições de atenção aos usuários ou dependentes e
do financiamento das políticas sobre drogas. Expõe de maneira camuflada a
intenção da internação compulsória de quem faz uso de drogas e propõe
claramente, desconstruir as conquistas garantidas pela Reforma Psiquiátrica,
promovendo assim uma indústria de internações forçadas.
O PLC 37/2013 não inova ao trazer a questão da internação compulsória, até
porque a mesma já está prevista no Código Civil de 2002, conforme prescreve a Lei
da Reforma Psiquiátrica, de maneira clara que deve ser feita em caráter
excepcional, porém o atual projeto procura legitimar este procedimento policialesco
deixando de observar a individualidade de cada situação.
O PLC abre prerrogativas para a criação de novos serviços de “saúde”, que
não estão vinculados ao SUS, mas que receberão financiamento superior aos
serviços substitutivos ao modelo manicomial, que já estão dispostos em lei desde
2002. Traz em suas propostas medidas que retomam as atrocidades cometidas no
período de vigência do modelo de tratamento manicomial e hospitalocêntrico, tais
como o isolamento do sujeito e sua segregação do seio da sociedade, reeditando o
antigo modelo que serviu à higienização das cidades, retirando da rua os "loucos" e
"vagabundos", com a intenção de “proteger” a propriedade privada e higienizar as
cidades. Desta forma:
A desigualdade que preside o processo de desenvolvimento do país tem
sido uma de suas particularidades históricas: o moderno se constrói por
meio do arcaico, recriando nossa herança histórica brasileira ao atualizar
marcas persistentes e, ao mesmo tempo, transformando-a no contexto da
globalização. Isso atribui um ritmo histórico particular ao processo de
mudanças, uma cedência histórica particular, em que tanto o novo quanto o
velho se alteram. Essa coexistência de temporalidades históricas desiguais
faz com que a questão social apresente, hoje, tanto marcas do passado,
quanto do presente, radicalizando-a. (Iamamoto, 2007, p.37)
Tal medida de tratamento proposta neste ano de 2013, tende a percorrer os
mesmos caminhos do passado quando pessoas acometidas por transtornos mentais
eram trancafiadas nos manicômios, por um longo período de tempo e
geograficamente deslocadas para lugares distantes da cidade. Os "loucos" de hoje
usam drogas! E as semelhanças, conforme diz Oliveira, são muitos:
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unidos pelo mesmo nexo, ainda que se trate de fenômenos absolutamente
distintos, os Loucos e os que usam Drogas são historicamente apanhados
numa mesma conjuntura da sociedade brasileira na qual os seus destinos
são traçados em movimentos complementares, decididos ao mesmo tempo
nas esferas da política (mudam alguns dos atores, mas os corredores do
Congresso Nacional volta a virar arena de uma disputa que reflete
perspectivas opostas); da administração das políticas públicas (a
controvérsia sobre a inclusão das comunidades terapêuticas no âmbito do
SUS) e no plano da cultura (o desserviço da desinformação terrífica
prestada pelos meios de comunicação de massas com a produção de
histeria coletiva em relação ao crack) (OLIVEIRA, 2012, p. 49).
Nesta perspectiva o PLC 37/2013, resgata a já ineficiente política criminal
brasileira sobre drogas, que se assemelha as “políticas criminalizadoras de drogas
que incha as prisões da maioria dos países do mundo”, como afirma Castilho (2012,
pág. 37) e que promove mais violência, reforçada pelo apoio da polícia, sob a
maquiagem do tratamento-internação, que não mais será viabilizado apenas
judicialmente, e que a partir de então unirá agentes públicos da saúde e polícia.
Conforme enfatiza Brites (2006, pág. 47), “o critério de criminalização torna-se
manipulável por interesses econômicos e políticos, que extrapolam qualquer critério
de saúde e, de maneira contraditória, passam a valer para algumas drogas e para
outras não”, deixando-nos a mercê de interpretações e usos da lei, para satisfazer
não apenas o mercado, mas também as conveniências políticas e estéticas,
principalmente em momentos que antecedem grandes eventos esportivos, que
nosso país sediará.
Não devemos nos contentar com medidas que atacam apenas os efeitos e
nem mesmo passam perto de desvelar as causas. A internação compulsória além de
aumentar significativamente os custos do Estado ao atendimento à pessoa que usa
drogas é a materialização de um modelo de tratamento baseado em uma medicina
curativa e lucrativa (para a iniciativa privada), que culminará na proliferação de mais
Comunidades Terapêuticas espalhadas aos redores das cidades, sem fiscalização
dos órgãos competentes e a mercê do enriquecimento de seus donos, como afirma
Harvey (2012, pg 103) “a luta pela lucratividade apressa os capitalistas a explorarem
todo tipo de novas possibilidades”, usando do sofrimento e da escassez de serviços
públicos, os familiares de pessoas que usam drogas que veem na possibilidade da
internação a “cura” para a “dependência química”.
Entidades da área da saúde e dos direitos humanos através de nota pública
repudiaram a votação do projeto de lei que altera a lei de drogas, ressaltando que a
PLC 37/2013, é:
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um instrumento catalisador do estigma carregado por pessoas em
sofrimento, da política de encarceramento em massa de pobres, da
criminalização dos usuários, presos indistintamente como traficantes, da
indústria de internações forçadas, sabidamente ineficazes como tratamento,
e da priorização da atenção em comunidades terapêuticas religiosas, que,
pouco fiscalizadas, afiguram-se como perigosos locais de segregação e
maus-tratos.
Outro fator a que devemos atentar é que a internação compulsória não
afetará de maneira igualitária quem faz uso de drogas, ela incidirá de maneira mais
violenta e com mais frequência sobre os negros, pobres e grupos sociais mais
vulneráveis. A partir disso, é preciso ter cautela com relação a ideia de que o
tratamento destes sujeitos deve ficar sob a responsabilidade das comunidades
terapêuticas, ao invés disso, garantir, ampliar e fortalecer a rede de saúde pública,
principalmente os CAPSad é uma das formas de cuidado com para a pessoa que
usa drogas.
Optar pelas Comunidades Terapêuticas é de alguma forma privatizar o
atendimento a saúde da pessoa que usa drogas, fragilizar a ampliação da rede de
saúde pública e os serviços de atenção a esses indivíduos. Enquanto as
comunidades terapêuticas cobram por seus serviços, os dispositivos oferecidos pelo
estado são universais, equânimes e visam à integralidade.
Para além disso, trata-se de um modelo de atendimento com eficácia mínima,
já que a maioria das pessoas internadas compulsoriamente acabam reincidindo no
uso de drogas, apontando que a coerção como medida de tratamento não funciona.
Para a Sub-Procuradora Geral da Justiça, Ela Castilho “o tratamento compulsório é
violência; segregação sem o devido processo legal. Significa negação da liberdade
individual ou, antes, da própria condição para o exercício dessa liberdade” (2012,
p.36).
3.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir do exposto, pretendemos tornar evidente a possibilidade de um
retrocesso histórico das políticas públicas para a atenção das pessoas que fazem o
uso de álcool e outras drogas. Trata-se da insistência pela manutenção do modelo
manicomial e de todo o seu processo excludente. Com isso, faz-se necessário que a
sociedade supere a lógica repressiva, moralizadora e segregadora ao lidar com
questões relacionadas ao uso de drogas.
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Contudo, identificamos que para dar conta de uma análise profunda acerca
dessa pauta é preciso uma visão histórico-crítica, que consiga visualizar as
contradições postas na sociedade. Na atual conjuntura, a ampliação desse debate
pede uma retomada acerca da garantia do Estado laico, de um questionamento
sobre a existência de espaços de escuta e participação social do usuário em
questão, na construção das políticas públicas, passa pela avaliação das alternativas
de enfrentamento da guerra entre o poder policial e o narcotráfico, e finalmente na
consideração
das
experiências
no
cenário
mundial
nos
processos
de
descriminalização das drogas.
Esse artigo não pretende esgotar essa discussão que extrapola o campo das
políticas públicas. Aqui nos limitamos a suscitar o debate a partir do recorte das
antagônicas alternativas de atenção ao indivíduo que faz uso de drogas, novas
velhas alternativas que nos remetem ao retrocesso de uma trajetória de conquistas
do Movimento Antimanicomial.
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