EXPLORANDO O CONJUNTO DE CANTOR DOS TERÇOS
MÉDIOS: UMA PROPOSTA PARA A SALA DE AULA
BACCARIN, Fabio Luis – UNESPAR/FECEA
[email protected]
Agência Financiadora: CAPES
RESUMO: Este trabalho procura apresentar o conjunto de Cantor e através dele
explorar conceitos matemáticos presente em vários níveis do ensino. O uso de
processos recursivos infinitos é desafiador e fascinante para os alunos,
proporcionando-lhes o contato com sequências, limites, introdução à geometria
fractal entre outras. A proposta é apresentar a construção deste conjunto como
uma ferramenta desencadeadora da investigação dos elementos matemáticos
que surgem naturalmente quando definimos o seu processo gerador.
PALAVRAS-CHAVE: Ensino de Matemática; Sequências; Fractais.
ABSTRACT: This work looks for to present the set of Cantor and through it to
explore mathematical concepts present in some levels of education. The use of
infinite recursive processes is challenging and fascinating for the pupils, providing
to them the contact with sequences, limits, introduction to fractal geometry among
others. The proposal is to present the construction of this set as a grader tool of
the inquiry of the mathematical elements that appear of course when we define its
generating process.
KEY-WORDS: Education of Mathematics; Sequences; Fractals.
1
INTRODUÇÃO
As
investigações
matemáticas
envolvem,
naturalmente,
conceitos,
procedimentos e representações matemáticas, mas o que mais fortemente as
caracteriza é este estilo de conjectura-teste-demonstração, afirma PONTE (2006,
p.10). Neste sentido este artigo propõe investigar o conjunto de Cantor como
ferramenta para a inserção de vários conceitos matemáticos como: recorrências,
progressões geométricas, noções de limites, séries infinitas e a geometria fractal.
Na construção do conjunto os alunos se deparam desde problemas simples
como operações de frações, reconhecimento de padrões até conceitos e
propriedades mais sofisticadas, como as referentes à topologia do conjunto.
Porém, o contato com o infinito é que faz surgir as intrigantes constatações.
2
REFERENCIAL TEÓRICO:
Georg Cantor (1845-1918), matemático, nascido na Rússia, mudou-se em
1856 para Alemanha onde se doutorou pela Universidade de Berlim em 1867.
Ficou conhecido por ter elaborado a moderna Teoria dos Conjuntos. Segundo
Cantor dois conjuntos são equivalentes, ou têm a mesma cardinalidade, quando é
possível estabelecer uma correspondência biunívoca entre os elementos destes
dois conjuntos, isto é, um relação que leve elementos distintos de um conjunto em
elementos distintos do outro conjunto, sendo todos os elementos objetos desta
correspondência. Cantor denominou de enumerável os conjuntos que tem a
mesma cardinalidade com o conjunto dos números naturais (ℕ). Imaginava-se
então que dois conjuntos infinitos possuíam a mesma cardinalidade, até que em
1894, Cantor demonstra que o conjunto dos números reais (ℝ) tem cardinalidade
diferente da dos números naturais.
Segundo LIMA (2004, p.163-164), dado um conjunto
ℝ um ponto
chama-se ponto interior de X quando existe um intervalo aberto (a, b) tal
que
, quando todos os seus pontos são interiores o conjunto será
chamado de conjunto aberto.
Chama-se vizinhança de um ponto a, qualquer conjunto que contenha a
interiormente. Diz-se que um número a é ponto de acumulação de um conjunto X
se toda vizinhança de a contém infinitos elementos de X. Desta forma, ÁVILA
(1999, p.75) define que um conjunto é fechado quando ele contém todos os seus
pontos de acumulação. Podemos também verificar em ÁVILA (1999, p.77) a
demonstração de que um conjunto é fechado se, e somente se, seu
complementar é aberto e que a interseção de conjuntos fechados é um conjunto
fechado. Um conjunto é dito totalmente desconexo, na reta, quando não contém
intervalos.
Segundo SALLUM (2005), um fractal é uma figura que pode ser quebrada
em pequenos pedaços, sendo cada um desses pedaços uma reprodução do todo.
Não podemos ver um fractal porque é uma figura limite, mas as etapas de sua
construção podem dar uma idéia da figura toda. Seu nome se deve ao fato de que
a dimensão de um fractal não é um número inteiro. Diz-se que os fractais têm
complexidade infinita, são geralmente autossimilares, independem de escala e
muitos deles podem ser gerados por um processo recorrente.
3
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Explorar matematicamente o conjunto de Cantor é o objetivo da atividade,
o passo inicial é a definição. Segundo LIMA (2004) o conjunto de Cantor dos
terços médios aqui simplesmente chamado de conjunto de Cantor e nomeado
pela letra K, é um subconjunto fechado do intervalo [0,1], obtido como
complementar de uma reunião de intervalos abertos, do seguinte modo: retira-se
do intervalo [0,1] seu terço médio aberto (1/3, 2/3), depois retira-se o terço médio
aberto de cada um dos intervalos restantes [0,1/3] e [2/3,1]. Sobra então a união
de quatro intervalos fechados. Em seguida, retira-se o terço médio aberto de cada
um desses quatro intervalos. Repete-se o processo indefinidamente. O conjunto K
dos pontos não retirados é o conjunto de Cantor. Após a definição propõe aos
alunos a construção de três ou quatro iterações com o auxílio da régua, lápis e
uma folha pautada ou, ainda melhor, se pudermos utilizar o software livre de
geometria dinâmica Geogebra.
Este momento é rico para recordar algumas
operações com frações que também estarão presentes em cada etapa, frisa-se o
conceito de intervalo aberto, a diferença entre conjuntos, a união de intervalos e o
conceito de intervalos disjuntos. A relação de pertinência pode ser explorada
questionando, por exemplo, se ¼ é ou não elemento de K1, primeira etapa da
construção de K.
Sugerimos paralelamente a montagem de uma tabela, para cada etapa,
com informações quanto à quantidade de intervalos em cada iteração, os
intervalos não removidos, o tamanho de cada intervalo fechado e a soma do
comprimento dos intervalos removidos.
Durante a construção, naturalmente, algumas indagações surgem ou
podem ser instigadas pelo professor, tais como:
 Sobram elementos neste conjunto após infinitas iterações? Se existem, quem
são eles? Exiba alguns, ¼ é elemento de K? São infinitos os elementos deste
conjunto? K é enumerável?
 Este conjunto é aberto ou fechado? K contêm intervalos?
 É autossimilar? Possui complexidade infinita? Qual sua dimensão? Independe
da escala? Podemos afirmar que K é um fractal?
Não podemos perder a oportunidade de explorar o conjunto formado pelos
extremos e é intuitivo que estes elementos pertençam a K. Com efeito, em cada
etapa da construção de K são retirados apenas pontos interiores nos intervalos
restantes das etapas anteriores. Também é fascinante notar que os elementos
deste conjunto admitem, na base 3, uma representação só com os dígitos 0 e 2.
Como exemplos:
4
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Da definição de que K é o conjunto de todos os pontos não removidos após
a retirada de infinitos intervalos abertos, An, espera-se o surgimento da
representação simbólica, tal como:
ℝ
ou como
. A figura 1 apresenta os três primeiros passos na construção do conjunto de
Cantor e a tabela os resultados esperados de cada iteração.
Iteração
Quantidade
Intervalos não removidos
de intervalos
Comprimento
A
soma
do
de
comprimento
dos
cada
intervalo
intervalos removidos
K0
1
[0, 1]
1
0
K1
2
[0,1/3] U [2/3,1]= [0,1]-(1/3,2/3)
1/3
1/3
1/9
2/9
[0,1/9]U[2/9,1/3]U
K2
4
[2/3,7/9]U[8/9,1]= [0,1](1/3,2/3)U(1/9,2/9)U(7/9,8/9)
Kn
n
2
(1/3)
n
1/3+2/9+...=1
A resposta às perguntas que ao longo da construção do conjunto foram
aparecendo devem ser fonte para a inserção dos conceitos matemáticos
necessários e, desta forma, sendo respondidas. Primeiramente, o conjunto K não
é vazio, pois em cada passo da sua construção são removidos apenas os pontos
interiores dos intervalos restantes da etapa anterior, isto é, pelo menos os
extremos destes intervalos, como 0, 1/3, 2/3, 1/9, etc. são elementos do conjunto.
LIMA (2004, p.173) completa mostrando que estes pontos são infinitos, de
acumulação e formam um subconjunto enumerável de K. A Indagação continua: o
conjunto de Cantor é enumerável? A resposta é negativa completa LIMA (2004,
p.179), pois K é um conjunto fechado não vazio sem pontos isolados, logo não
enumerável.
Na construção de K após a n-ésima etapa resta apenas intervalos de
comprimento (1/3)n, ou seja, com comprimento tendendo a zero. Daí segue que K
não contém intervalos, pois por menor que seja um intervalo deverá ter
comprimento maior que zero. Explorando a soma dos intervalos removidos temos
uma série que converge para um. Surpreendente quando se analisa a diferença
entre o comprimento do intervalo [0,1] e a somatória dos intervalos removidos,
concluindo que o conjunto K tem medida zero, mesmo como uma infinidade de
elementos.
Este conjunto é autossimilar, pois cada parte do conjunto é semelhante ao
todo, e sendo uma figura limite não existe a representação completa
caracterizando-o com complexidade infinita. Independentemente da escala a que
se observa este conjunto obtém-se sempre a mesma figura. A dimensão fractal,
segundo BARBOSA (2005) está associada a aspereza, espessura, densidade,
textura da figura. É calculada como a razão do logaritmo do número de peças
geradas numa iteração pelo logaritmo do fator de aumento necessário para
igualar a etapa anterior. Portanto, a dimensão fractal do conjunto de Cantor é
.
5
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A simplicidade para construir o conjunto de Cantor reserva sua riqueza
quando se dispõe a explorá-lo. E para fazê-lo com segurança suas propriedades
topológicas devem estar bem definidas, pois é surpreende saber que K é um
conjunto que não possui pontos isolados, não contém intervalos, tem infinitos
elementos bem caracterizados na base três, é não enumerável, e ainda, um
conjunto limitado e fechado. Por outro lado, este modelo é considerando o
precursor da geometria fractal, ramo da geometria não euclidiana, que a partir de
1975 vem obtendo avanços significativos em diversos setores do conhecimento.
.
6
REFERÊNCIAS
ÁVILA, Geraldo de S.S. Introdução à Análise Matemática. 2.ed. São Paulo: Edgar
Blücher, 1999.
BARBOSA, Ruy M. Descobrindo a Geometria Fractal – para a sala de aula. 3.ed. Belo
Horizonte: Autêntica, 2005.
LIMA, Elon L. Curso de Análise.11.ed. Rio de Janeiro:Instituto Nacional de Matemática
Pura e Aplicada, 2004, v.1.
PONTE, J.P.; BROCARDO, J.; OLIVEIRA, H. Investigações Matemáticas na sala de
aula. Belo Horizonte: Autêntica, 2006.
SALLUM, Élvia M. Fractais no ensino médio. Revista do professor de matemática. n.57
2005.
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