Ensaios e Ciência: Ciências Biológicas,
Agrárias e da Saúde
ISSN: 1415-6938
[email protected]
Universidade Anhanguera
Brasil
dos Reis, Bruna; Novaes Paraizo, Marcelo Fabiano; Campos, Denise
MOTRICIDADE DE LACTENTES QUE VIVEM EM ABRIGO
Ensaios e Ciência: Ciências Biológicas, Agrárias e da Saúde, vol. 16, núm. 4, 2012, pp. 39-50
Universidade Anhanguera
Campo Grande, Brasil
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Ensaios e Ciência
Ciências Biológicas,
Agrárias e da Saúde
MOTRICIDADE DE LACTENTES QUE VIVEM EM
ABRIGO
Vol. 16, Nº. 4, Ano 2012
RESUMO
Bruna dos Reis
Faculdade Anhanguera de Campinas
unidade 3
[email protected]
Marcelo Fabiano Novaes Paraizo
Faculdade Anhanguera de Campinas
unidade 3
[email protected]
Denise Campos
Faculdade Anhanguera de Campinas
unidade 3
[email protected]
Acredita-se que por carência de estimulação, de vínculos afetivos e
atenção emocional, as crianças que vivem em abrigos podem apresentar
alterações no desenvolvimento neuropsicomotor. Objetivo: Avaliar a
motricidade de lactentes que vivem em abrigo, visando detectar
precocemente possíveis atrasos ou alterações motoras, e encaminhá-los
para intervenção. Metodologia: Tratou-se de um estudo transversal.
Foram incluídos 5 lactentes, com idade entre 7 e 12 meses, de ambos os
sexos, que vivem em abrigo. Para avaliação foi utilizada a Alberta
Infant Motor Scale (AIMS), uma escala canadense que visa detectar
lactentes com suspeita de atraso ou alteração no desenvolvimento
motor. Resultados: Pôde-se notar que a maioria dos lactentes (80%)
foram classificados abaixo do percentil 50, ou seja, abaixo da média do
grupo normativo canadense. Cabe destacar ainda que 40% dos lactentes
apresentaram suspeita de atraso motor e por isso foram encaminhados
para estimulação na clínica de fisioterapia da Faculdade Anhanguera
de Campinas (FAC).
Palavras-Chave: motricidade; lactentes; fatores de risco; abrigo.
ABSTRACT
It is believed that children living in shelters may show alterations in
motor development due to lack of stimulation, affective linkages and
emotional care. Objective: To evaluate the motor performance of infants
living in shelter, in order to detect possible early motor delays or
alterations, and direct them to intervention. Methodology: This was a
cross-sectional study. It was included five infants, aged between 7 and
12 months, of both sexes, living in shelter. For evaluation, it was used
Alberta Infant Motor Scale (AIMS), a Canadian scale that aims to detect
infants with suspected delay or alteration in motor development.
Results: It should be noted that the majority of infants (80%) were
classified below the 50th percentile, or below the average Canadian
normative group. It is important to emphasize that 40% of infants had
suspected motor delay and therefore they were referred to stimulation
in the Physiotherapy Clinic of Faculty Anhanguera de Campinas
(FAC).
Keywords: motor activity; infant; risk factors; shelter.
Anhanguera Educacional Ltda.
Correspondência/Contato
Alameda Maria Tereza, 4266
Valinhos, São Paulo
CEP 13.278-181
[email protected]
Coordenação
Instituto de Pesquisas Aplicadas e
Desenvolvimento Educacional - IPADE
Artigo Original
Recebido em: 16/07/2012
Avaliado em: 26/11/2012
Publicação: 11 de dezembro de 2013
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40
Motricidade de lactentes que vivem em abrigo
1.
INTRODUÇÃO
Desenvolvimento significa crescimento, progresso, ampliação. Nós seres humanos
crescemos externamente, com ganho de peso e altura, e internamente, com ampliação das
capacidades psicológicas. Sendo assim, conforme crescemos novas capacidades físicas e
psicológicas vão se desenvolvendo (Rios, 1999).
A organização do desenvolvimento começa na concepção, de modo que o
domínio motor, afetivo-social (conduta pessoal-social) e cognitivo (conduta adaptativa e
linguagem) se diferenciam gradualmente. Inicialmente o comportamento motor é a
expressão da integração de todos os domínios. Este caráter do movimento indica o
importante papel do domínio motor no desenvolvimento do ser humano (Tani et al.,
1988).
O primeiro ano de vida é considerado um dos mais críticos para o
desenvolvimento infantil. Neste período, o desenvolvimento motor apresenta um ritmo
acelerado de mudanças, as quais resultam na aquisição de mobilidade, visto que o
lactente evolui de uma postura passiva em decúbito dorsal para a postura ortostática
(Santos, Campos, 2010; Silva et al., 2011).
Sabe-se que o desenvolvimento neural é fundamental para aquisição de
habilidades, porém outros fatores como a prática e a interação com o ambiente, também
exercem influência sobre o desenvolvimento motor. Admite-se então, que o
desenvolvimento motor tem uma base genética, mas as habilidades inatas só se
desenvolvem conforme o lactente encontra um ambiente favorável (Campos et al., 2005;
Campos, Santos, 2005).
Embora o desenvolvimento seja comum a todas as crianças, a idade para a
aquisição de novas habilidades varia, pois a evolução se dá tanto por fatores genéticos
como
ambientais.
Acredita-se
que
a
velocidade
do
desenvolvimento
motor,
principalmente durante os primeiros 12 e 18 meses de vida, é influenciada pela maneira
com que os pais manejam o lactente (Shepherd, 1988).
Além disso, vários estudos mostram que fatores ambientais, tais como condições
sócio-econômicas da família, grau de escolaridade, situação conjugal, e ocupação da mãe,
também influenciam o desenvolvimento infantil (Sameroff, 1998; Sonnander, 2000;
Halpern et al., 2002; Campos et al., 2007). Nesse sentido, as instituições de abrigo são
frequentemente mencionadas como locais de impacto negativo para o desenvolvimento
psicomotor (Nascimento et al., 2010).
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De acordo com a Lei No. 8069 (1990), toda criança ou adolescente tem direito a
ser criado e educado no seio da sua família e, excepcionalmente, em família substituta,
assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente livre da presença de
pessoas dependentes de substâncias entorpecentes. Aos pais incumbe o dever de sustento,
guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, a obrigação de cumprir e fazer
cumprir as determinações judiciais. A perda e suspensão do pátrio poder são decretadas
judicialmente, nos casos previstos na legislação civil, bem como na hipótese de
descumprimento injustificado dos deveres e obrigações.
O abrigo é uma medida provisória e excepcional, utilizada como forma de
transição para a colocação em família substituta, não implicando privação de liberdade. A
permanência breve ou continuada no abrigo está inteiramente relacionada à história
singular de cada criança e/ou adolescente. Desta forma, a promoção de ações efetivas de
inserção social se constitui um objetivo permanente, para que o abrigo seja realmente uma
medida protetiva, de caráter excepcional e transitório (Estatuto da criança e do
adolescente, 1990).
O abrigo é um ambiente ecológico de muita importância para as crianças e
adolescentes institucionalizados, configurando o microssistema onde eles realizam um
grande número de atividades, funções e interações, como também um ambiente com
potencial para o desenvolvimento de relações mútuas, de equilíbrio de poder e afeto
(Siqueira, Dell'Aglio, 2006).
A família proporciona para a criança um ambiente de carinho, amor, segurança,
proteção, valores, religião, além de condições materiais, lazer, passeios e apoio emocional.
Este ambiente proporciona um desenvolvimento saudável à criança. No abrigo, as
crianças sofrem privação materna, associada à carência de estímulos (Torquato et al.,
2011).
Acredita-se que por falta de estimulação, vínculos afetivos e atenção emocional,
as crianças de abrigo podem apresentar deficiências motoras, cognitivas, dificuldade em
processar a linguagem e, consequentemente, prejuízo no processo de aprendizado (Silva
et al., 2006).
A vida em orfanatos tende a inibir as áreas de inteligência das crianças,
interferindo na coordenação motora geral, interação social e linguagem. Verificou-se que
78% das crianças romenas provenientes de orfanato estavam atrasadas quando foram
adotadas. Além disso, observou-se que cerca de 20% dos adotados eram “crianças
prejudicadas”, ou seja, crianças muito afetadas pela institucionalização em orfanatos.
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Essas crianças, após quatro anos de sua adoção, continuaram tendo problemas emocionais
e de desenvolvimento (Ballone, 2004).
2.
METODOLOGIA
Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa (CEP) da Anhanguera
Educacional (n°2394/2012). Tratou-se de um estudo transversal. Foram incluídos 5
lactentes, com idade entre 7 e 12 meses, de ambos os sexos, que vivem no abrigo
Associação de Educação do Homem de Amanhã (AEDHA). Foram excluídos lactentes que
apresentaram síndromes genéticas e malformações congênitas. Para avaliação do
desempenho motor foi utilizada a Alberta Infant Motor Scale (AIMS). A AIMS é uma
escala canadense, que foi projetada para mensurar a evolução da motricidade desde o
nascimento até o período de marcha independente.
Segundo Piper e Darrah (1994), os objetivos da escala são: identificar os lactentes
com desempenho motor atrasado ou anormal, proporcionar informações sobre as
atividades motoras já alcançadas, as que estão se desenvolvendo e aquelas que os
lactentes ainda não realizam. Além disso, a escala se propõe a mensurar o desempenho
motor antes e depois de um programa de intervenção, e avaliar a eficácia de programas
de reabilitação de lactentes com disfunções motoras.
De modo geral, a AIMS é caracterizada pela observação, pelo mínimo manuseio
do lactente e reconhecida como um instrumento bastante sensível para detectar alterações
nos lactentes de risco, devendo ser utilizada apenas por profissionais devidamente
capacitados. Essa escala é composta por 58 itens, que ilustram a seqüência de
desenvolvimento do controle postural em 4 posições: prono (21 itens), supino (9 itens),
sentado (12 itens) e em pé (16 itens). Cada item apresenta uma ilustração do lactente em
uma posição específica e uma descrição chave sobre o local de descarga de peso, o
alinhamento postural e os movimentos realizados contra a gravidade.
Os materiais utilizados na avaliação foram: ficha de avaliação padronizada,
brinquedos adequados para a idade do lactente, colchonete, e um móvel que serviu de
apoio para a postura ortostática. O tempo médio para administração da avaliação foi de
20 minutos para cada lactente.
Durante a avaliação, para cada uma das posições (prono, supino, sentado e em
pé) foi identificada uma “janela de desenvolvimento”, a partir da observação da
habilidade mais primitiva e mais complexa exibida pelo lactente. Cada item dentro da
“janela” foi registrado como observado “O” ou não observado “NO”. Um item foi
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registrado como observado, somente se o lactente manifestou a postura como mencionada
na descrição chave do manual e da ficha de avaliação.
Acredita-se que os itens anteriores à “janela de desenvolvimento” sejam
habilidades motoras já alcançadas pelos lactentes, os itens dentro da “janela” sejam
habilidades motoras que estão se desenvolvendo e os itens posteriores à “janela” sejam
habilidades motoras ainda não adquiridas pelos lactentes. Sendo assim, dentro da “janela
de desenvolvimento”, foram pontuados somente os itens observados durante a avaliação,
e fora da “janela”, foram pontuados todos os itens que antecedem a mesma.
Considerando que cada item equivale a um ponto, foi calculado um escore total, a partir
da somatória de pontos obtidos nas 4 posições (prono, supino, sentado e em pé). A seguir,
o escore total e a idade do lactente foram projetados numa curva de desenvolvimento, que
classifica o lactente em uma faixa de percentil que varia entre 5 e 90 . Esse percentil foi
responsável por indicar a posição de cada lactente em relação à amostra normativa
canadense de mesma idade. Quanto mais alto o percentil de classificação, menor a
probabilidade de atraso no desenvolvimento motor. Nesse sentido, as autoras da escala
sugerem maior atenção ao desenvolvimento de crianças classificadas no percentil 10 ou
abaixo (Piper, Darrah, 1994).
3.
RESULTADOS
O abrigo Associação de Educação do Homem de Amanhã – Aedha, possui 28 crianças, 15
do sexo feminino e 13 do sexo masculino, com idade entre zero e 12 anos, sendo uma
criança portadora da Síndrome de Down. A instituição é sustentada pela mantenedora
Guardinha de Campinas e convênio com empresas.
Ao todo foram avaliados 5 lactentes, 3 do sexo masculino e 2 do sexo feminino,
com idade variando entre 7 e 12 meses. Verificou-se que a maioria dos lactentes (60%) era
do sexo masculino, todos os lactentes nasceram a termo e um lactente apresentou baixo
peso ao nascimento. Todas as mães, exceto de um lactente, utilizaram drogas na gestação.
Além disso, cabe destacar, que de modo geral, os lactentes apresentaram boa vitalidade ao
nascimento, visto que o Apgar de 5’ foi maior que 8 para todos os lactentes, vide Tabela 1.
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Tabela 1. Dados neonatais dos lactentes avaliados.
Lactente Sexo
Data de
Idade
Nascimento Gestacional
Peso ao
Estatura ao
Nascimento Nascimento
Perímetro Apgar Apgar
Cefálico 1’
5'
1*
F
04/09/2011
39s 5d
3,515 kg
50 cm
35 cm
9
10
2
F
05/09/2011
40s 3d
2,920 kg
46 cm
34 cm
9
10
3
M
01/07/2011
40s 3d
2,730 kg
46 cm
31 cm
9
10
4
M
29/08/2011
37s 1d
2,085 kg
43 cm
33 cm
9
10
5
M
29/03/2011
38s
3,200 kg
50 cm
34 cm
9
9
s= semanas, d= dias, kg= quilogramas, cm= centímetros, * mãe não usou drogas na gestação
A Tabela 2 mostra os dados referentes à institucionalização de cada lactente.
Verificou-se que todos os lactentes vieram para o abrigo devido a violência doméstica, a
maioria deles (60%) foram abrigados logo após o nascimento e nenhum lactente recebe
visita de familiares.
Tabela 2. Dados de abrigamento.
Lactente
Motivo do
Abrigamento
Data de
Abrigamento
Idade de
Abrigamento
Tempo de
Abrigamento
Recebe
visita
1
Violência doméstica
05/09/2011
01 dia
7 meses
Não
2
Violência doméstica
05/09/2011
01 dia
7 meses
Não
3
Violência doméstica
20/07/2011
19 dias
9 meses
Não
4
Violência doméstica
29/08/2011
01 dia
7 meses
Não
5
Violência doméstica
24/04/2011
26 dias
12 meses
Não
A Tabela 3 apresenta os resultados da avaliação dos lactentes com a AIMS.
Dentre as habilidades avaliadas, as mais prejudicadas estavam relacionadas à posição
sentada e em pé. Pôde-se notar que a maioria dos lactentes (80%) foram classificados
abaixo do percentil 50, ou seja, abaixo da média do grupo normativo canadense. Cabe
destacar ainda que 40% dos lactentes apresentaram suspeita de atraso motor, visto que
foram classificados no percentil 5, e por isso foram encaminhados para estimulação
precoce na clínica de fisioterapia da Faculdade Anhanguera de Campinas (FAC). Além
disso, as cuidadoras do abrigo foram orientadas quanto às atividades que podem ser
realizadas para estimular o desenvolvimento motor das crianças.
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Tabela 3. Desempenho dos lactentes na avaliação com a Alberta Infant Motor Scale.
Lactente
Idade na
Avaliação
Pontuação
em Prono
Pontuação
em Supino
Pontuação
Sentado
Pontuação
em Pé
Pontuação
Total
Percentil
1
7m 5d
8
8
3
1
20
5
2
7m 4d
13
9
3
3
28
25
3
9m 8d
20
9
12
3
44
50
4
7m 11d
10
7
3
1
21
5
5
12m 11d
19
9
12
10
50
25
m= meses, d= dias
Considerando o ambiente do abrigo, os lactentes ficam em um quarto pequeno,
contendo 5 berços, armário embutido para roupas e brinquedos, janela grande, e um
espaço pequeno para eles ficarem no chão. A rotina dos lactentes começa pela manhã.
Após acordarem, tomam banho, mamadeira, e vão para atividades diárias como: banho
de sol, atividades com brinquedos e DVD infantis. A seguir almoçam, se necessário, é feita
a higiene dos lactentes, descanso da tarde e novamente ficam brincando. Os lactentes
recebem Shantala, uma vez por semana, durante 20 minutos e também recebem
estimulação uma vez por semana, durante 20 minutos, realizada por voluntários, sem
formação profissional específica. A estimulação é feita por meio de brincadeiras,
atividades com músicas e massagens. Ao todo são 3 cuidadoras que se revezam para ficar
com os lactentes. Duas cuidadoras se alternam durante os dias da semana e uma
cuidadora permanece com os lactentes a noite.
4.
DISCUSSÃO
O ambiente em que o lactente vive pode dar diferentes formatos ou moldar aspectos do
comportamento motor. O ambiente positivo age como facilitador do desenvolvimento
normal, pois possibilita a exploração e interação com o meio. Entretanto, o ambiente
desfavorável atrasa o desenvolvimento e restringe as possibilidades de aprendizado da
criança. Paralelamente aos fatores de risco biológico, as desvantagens ambientais podem
influenciar negativamente a evolução do desenvolvimento das crianças (Melo et al., 2011).
O abrigo tem a função de oferecer à criança atendimento dentro de sua faixa
etária incluindo cuidados de saúde, higiene, alimentação e atividades lúdicas. Esta
instituição a qual pode ser pública e, às vezes até privada, tem recebido significante
atenção social por abrigar crianças principalmente de pouca idade contribuindo, então,
para seu crescimento e desenvolvimento. As crianças que vivem em abrigos podem
apresentar alterações no desenvolvimento neuropsicomotor devido à carência de
estímulos, vínculos afetivos e atenção emocional. Além disso, deve-se considerar como
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agravante a grande demanda de crianças, falta de cuidadores e/ou falta de instrução dos
cuidadores. (Lanzillotta et al., 2011).
Além da falta de estimulação e experiência no ambiente, é fundamental o
entendimento de que a ausência de laços afetivos durante a infância também interfere no
desenvolvimento da criança, o que pode afetar suas relações sociais e com o meio. A
separação de pessoas significativas e a institucionalização prolongada agem como
importantes fatores de risco para o potencial de desenvolvimento da criança (Nascimento
et al., 2010).
Nesse sentido, acredita-se que as crianças que possuem carência de estímulos
corporais e ambientais poderão apresentar dificuldades no decorrer do desenvolvimento
atribuídas, em grande parte, ao fato de terem crescido num ambiente carente de estímulos
(Lampreia, 1985).
Um estudo que comparou o crescimento e desenvolvimento de crianças
institucionalizadas com o de crianças que vivem com suas mães biológicas, demonstrou
que as crianças sob cuidados institucionais, afastadas do convívio familiar, apresentaram
crescimento e desenvolvimento mais pobres, sendo significativo o atraso encontrado nas
diferentes áreas do desenvolvimento (Nascimento et al., 2010).
Seguindo
essa
linha
de
pesquisa,
Castanho
(2003)
caracterizou
o
desenvolvimento motor de crianças institucionalizadas, e mostrou indícios de que o
atraso motor, apresentado pela amostra, pode estar relacionado ao ambiente e a falta de
estimulação. Neste estudo 30 crianças de ambos os sexos, com idades entre zero e dezoito
meses, abrigadas a mais de 10 dias na instituição, foram avaliadas com a AIMS. Pôde-se
notar que 97% das crianças foram classificadas abaixo do percentil 50. Além disso, a
análise do grau de desvio motor das crianças, agrupadas por trimestre, mostrou pior
resultado para o grupo do 4º trimestre (9 a 12 meses).
Semelhante a esses achados, no presente estudo, a maioria (80%) dos lactentes
apresentaram baixo desempenho motor, sendo classificados abaixo do percentil 50 da
AIMS; e 40% dos lactentes foram detectados como suspeita de atraso motor, visto que
foram classificados no percentil 5 da AIMS. Tais resultados concordam com os autores
acima, que também verificaram desempenho motor inferior em crianças de abrigo, e
atribuíram tal fato ao ambiente institucional, com falta de estimulação e vínculos afetivos.
Devido à importância e ao impacto dos atrasos no desenvolvimento no que se
refere à morbidade infantil, é fundamental identificar as crianças de risco, o mais
precocemente possível, a fim de minimizar os efeitos negativos. A avaliação do
desenvolvimento da criança é ineficiente quando utilizada somente a impressão clínica.
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Bruna dos Reis, Marcelo Fabiano Novaes Paraizo, Denise Campos
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Os testes de triagem aumentam a taxa de identificação de crianças com suspeitas de
atraso, além de possibilitar o encaminhamento para diagnóstico e intervenção em
momento oportuno (Campos et al., 2007). Existem evidências suficientes de que quanto
mais precoce for o diagnóstico e a intervenção, menor será o impacto desses problemas na
vida futura da criança (Miranda et al., 2003; Lanzillotta et al., 2011). Segundo Willrich e
colaboradores (2008), a intervenção nos primeiros anos de vida apresenta resultados mais
eficazes.
Uma gama de fatores de risco pode levar ao surgimento de disfunções motoras,
dentre os quais se destaca o baixo peso ao nascimento (Halpern et al., 2002; Mancini et al.,
2004; Reis et al., 2009). Lactentes nascidos com baixo peso apresentam maiores taxas de
crescimento subnormal, condições de saúde adversas e problemas no desenvolvimento.
Quanto aos aspectos motores, esses lactentes apresentam comportamento abaixo do
normal no controle da motricidade axial, apendicular e visuo-motora (Santos et al., 2004).
Cabe destacar que, neste estudo, uma criança (número 4) apresentou baixo peso
ao nascimento e foi classificada no percentil 5 da AIMS. Neste caso, o fator de risco
biológico (baixo peso ao nascimento) se somou ao fator de risco ambiental
(institucionalização). Tal fato pode justificar o baixo desempenho motor encontrado.
Outro fator de risco descrito pela literatura refere-se ao uso de drogas durante a
gestação. No século XX o índice de mulheres usuárias de alguma droga, tabaco ou álcool
aumentou significativamente, e com isso, há preocupação com o seu consumo, pois uma
mulher dependente química pode não estar escravizando apenas a si própria, mas
também a outro ser ainda em fase de desenvolvimento. Este ser, ainda em
desenvolvimento, pode apresentar comprometimento do desenvolvimento bio psicosocial (Fabbri, Pedrão, 2000).
Estudos mostram que a cocaína atravessa rapidamente a barreira placentária,
sem sofrer metabolização, agindo diretamente nos vasos sanguíneos do feto,
determinando vasoconstrição, além de malformações urogenitais, cardiovasculares e do
sistema nervoso central (Yamaguchi et al., 1998). Segundo Corradini et al. (1996), o uso da
cocaína durante a gestação pode provocar atrasos no desenvolvimento neuropsicomotor.
Com relação ao álcool e tabaco, é importante dizer que o consumo durante a
gestação pode causar atrasos no desenvolvimento físico e mental do lactente (Corradini et
al., 1996). Há ainda riscos de malformação congênita, morte súbita na infância e alterações
do comportamento (Cruz et al., 2011). No presente estudo todas as mães, exceto uma,
utilizaram algum tipo de droga durante a gestação. Sendo assim, acredita-se que o uso de
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Motricidade de lactentes que vivem em abrigo
drogas durante a gestação também tenha influenciado o baixo desempenho motor dos
lactentes institucionalizados.
O presente estudo apresenta algumas limitações que devem ser levadas em conta
quando se considera o estudo e suas contribuições. Primeiro, foram incluídos 5 lactentes
no estudo, de modo que não se pode generalizar tais achados para a população. Segundo,
houve dificuldade para discutir os resultados encontrados, devido à carência de pesquisas
publicadas sobre o assunto na área de fisioterapia. Existem vários trabalhos investigando
os aspectos emocionais e psicoafetivos de crianças institucionalizadas, mas há uma
carência
de
pesquisas
verificando
a
influência
do
ambiente
institucional
no
desenvolvimento motor.
5.
CONCLUSÃO
O presente estudo avaliou a motricidade de lactentes que vivem em abrigo e verificou que
a maioria dos lactentes foi classificada abaixo do percentil 50, ou seja, abaixo da média do
grupo normativo canadense. Além disso, 40% dos lactentes apresentaram suspeita de
atraso motor, sendo encaminhados para estimulação precoce. Acredita-se que o baixo
desempenho motor pode estar associado ao ambiente institucional, o qual proporciona
poucas oportunidades para os lactentes brincarem e interagirem com o meio.
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Ensaios e Ciência: Ciências Biológicas, Agrárias e da Saúde  Vol. 16, Nº. 4, Ano 2012  p. 39-50
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Motricidade de lactentes que vivem em abrigo
Marcelo Fabiano Novaes Paraizo
Graduado em Fisioterapia pela Universidade José
do Rosário Vellano (2004), Especialista em
Fisioterapia Aplicada à Neurologia Adulto pela
Unicamp (2005) e Mestre em Ciências Médicas
pelo departamento de Neurologia da Unicamp
(2009).
Diretor
Assistente
da
Faculdade
Anhanguera de Campinas - unidade 3.
Denise Campos
Graduação em Fisioterapia pela Pontifícia
Universidade Católica de Campinas (PUC/2002),
Mestrado em Fisioterapia pela Universidade
Metodista de Piracicaba (UNIMEP/2005), Curso
Básico de Tratamento Neuroevolutivo - Conceito
Bobath (2007) e Doutorado em Ciências
Biomédicas, Área de Concentração: Neurologia,
pela Universidade Estadual de Campinas
(Unicamp/2010). Atualmente é Pesquisadora do
Grupo
Interdisciplinar
de
Avaliação
do
Desenvolvimento Infantil (GIADI / FCM /
Unicamp), Grupo de Pesquisa Cadastrado no
CNPq; Professora e Supervisora de Estágio de
Fisioterapia em Neurologia Adulto e Infantil na
Faculdade Anhanguera de Campinas (FAC). Tem
Experiência na Área de Fisioterapia, com Ênfase
em Neurologia Adulto e Infantil.
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