SPEED –Programa de Apoio ao Desenvolvimento Económico e Empresarial Plano Quinquenal do Governo Moçambicano: Implicações para o Ambiente de Negócios Nota1 1. CONTEXTUALIZAÇÃO No dia 14 de Abril de 2015, o Plano Quinquenal do Governo Moçambicano foi aprovado por lei nos termos da Resolução Nº 12/2015. O Plano Quinquenal baseia-se no manifesto do Partido eleito para governar o país, neste caso, a FRELIMO, e também incorpora acções que nortearão o Governo durante o seu mandato. O mesmo destina-se a ser uma declaração de visão de alto nível em vez de um plano de acção específico, cujas especificidades constam nos documentos estratégicos e planos de trabalho de cada Ministério. Desta forma, o Plano (doravante PQG que significa Plano Quinquenal do Governo) é elaborado para orientar o Governo e demais partes interessadas. Como tal, deve ser tratado como uma das bases para a justificação do trabalho realizado e, se possível as actividades que envolvem o Governo devem estar especificamente ligadas às acções plasmadas no PQG, o que lhes dará relevância e demonstrará às instâncias públicas interessadas como uma reforma ou actividade específica irá orientar o Governo no alcance dos objectivos definidos. 2. O PQG O PQG tem enfoque no crescimento inclusivo. Pela primeira vez, este inclui indicadores em função dos quais pode-se medir o desempenho do Governo volvidos cinco anos. No entanto, estes indicadores variam dos mais gerais (total penetração telefónica) para os mais específicos (600 medalhas desportivas ganhas) e são menos propensos a ser úteis como ferramentas de monitoria do que indicadores constantes dos planos estratégicos de sectores específicos. Globalmente, os indicadores são decepcionantes e pouco ambiciosos, visando, por exemplo, aumentar de 6% para 12% a taxa de alfabetização em crianças que completaram a 3ª classe, e criar empregos para menos de 10% das pessoas que anualmente entram no mercado laboral através de uma combinação de empregabilidade do sector público e privado. De modo geral, há falta de correlação entre os objectivos gerais e as prioridades do Plano (veja abaixo) e os indicadores estabelecidos. Ao título de exemplo, as prioridades de desenvolvimento 1 Carrie Davies, Assessora Sénior de Política Comercial 2 Esta Nota foi elaborada pelo Projecto SPEED da USAID, as opiniões aqui reflectidas são inteiramente da autora do capital humano ea criação de emprego não estão reflectidas nos indicadores de baixa alfabetização e de emprego. O Plano estabelece cinco prioridades e três pilares a citar: Cinco Prioridades: Consolidar a Unidade Nacional, a Paz e a Soberania; Desenvolver o Capital Humano e Social; Promover o Emprego, a Produtividade e a Competitividade; Desenvolver Infra-estruturas Económicas e Sociais; Assegurar a Gestão Sustentável e Transparente dos Recursos Naturais e do Ambiente. Três Pilares de Suporte: Consolidar o Estado de Direito Democrático, Boa Governação e Descentralização; Promover um Ambiente Macro-Económico Equilibrado e Sustentável; Reforçar a Cooperação Internacional. Estas prioridades e os pilares são repartidos por área de responsabilidade ministerial, muitas vezes com uma série de sobreposições. No entanto, serão estas prioridades e pilares que nortearão as acções do Governo nos próximos anos. 3. ÁREAS RELEVANTES PARA O PROJECTO SPEED Segue-se um breve resumo do PQG. Tal não pretende ser uma análise abrangente, mas apenas para destacar uma série de potenciais preocupações e também áreas onde o documento se relaciona com os trabalhos do Projecto SPEED. As Secções e respectivas alíneas referentes ao PQG constam entre parênteses. i. Agricultura, Segurança Alimentar e Terras Ao longo do documento, há um forte enfoque sobre o papel da agricultura como um componente fundamental do desenvolvimento e da industrialização. No entanto, parece que faltam acções específicas. Por exemplo, o PQG indica que o Governo pretende “promover o aumento da produtividade do sector familiar” (40-a), mas não está claro como isso seria feito. Além disso, há um equívoco fundamental sobre o significado de segurança alimentar, pois em todo o documento, entende-se como sendo assegurar que cada família produz o suficiente para si mesmo (40-h, 40-s). O Governo pretende criar mecanismos de financiamento para o sector familiar, com condições especiais, propondo subvenções, o que sugere um aumento no papel do Estado nesta área (40-b, 40-k, 40-t e u). O governo planeia promover a expansão da oferta de sementes estratégicas (40-e), que também pode sugerir o envolvimento contínuo do Estado. Há pouca, senão nenhuma menção às outras alfaias agrícolas, tais como fertilizantes. Existe uma melhoria geral da legislação do sector agrário (40-q), cartografia dos solos (40-r, 65), ordenamento territorial (65-i) e, aprimorar o acesso aos DUATS (65). 3 Esta Nota foi elaborada pelo Projecto SPEED da USAID, as opiniões aqui reflectidas são inteiramente da autora ii. Comércio e Indústria No PQG, não há nenhuma secção específica sobre o comércio ou a integração regional. Questões relevantes estão dispersas ao longo do documento, mas constam principalmente nas prioridades 3 e 4. Não há uma visão clara sobre o comércio ea integração regional. Em vários trechos do PQG é evidenciado um desejo geral de melhorar o ambiente de negócios e aumentar as exportações, mas não há nenhuma indicação clara de como isso será feito. Um objectivo declarado é o de “modernizar a economia e industrializar com orientação para as exportações”, com acções específicas incluindo a promoção das exportações, a diversificação, a realização de feiras de negócios, o fortalecimento das PME que exportam, o desenvolvimento de infra-estruturas para feiras de negócios, a melhoria dos procedimentos de certificação, a implementação de instrumentos da SADC, estimular a manufactura para aumentar a adição de valor, a promoção da criação de bases logísticas para facilitar as exportações, a criação de medidas para proteger a indústria nacional emergente, a promoção de zonas francas industriais e zonas económicas especiais, e a consolidação do Programa Nacional de Parques de Ciência e Tecnologia (41). Porém, não está claro como muitas dessas acções serão concretizadas, particularmente quando há limitações no âmbito das secções que lidam com reforma do ambiente de negócios (veja abaixo). A industrialização é vista como vector para o desenvolvimento (7). Espera-se que findo os cinco anos, a contribuição da indústria no PIB aumente de 11% para 21%. Há um foco na indústria orientada para a exportação, mas os mecanismos propostos (por exemplo infraestruturas para as feiras e exposições (42-a e d)) mostram uma clara falta de consciência sobre as barreiras existentes às exportações. O Plano tem por objectivo estimular a indústria transformadora para o valor acrescentado, mas não há nenhuma indicação sobre como será operacionalizado (42 g). Por exemplo, o mesmo centra-se na necessidade de incremento da produção para gerar excedentes para exportação, não vê o negócio orientado à exportação como uma opção, mas sim vê as exportações como um complemento para o aumento da produção no sector agrário (38). A promoção de bases logísticas para exportação sugere que o modelo TEEN pode ser considerado bem sucedido e replicável (42-i). A protecção para a indústria nacional é também inclusa (40-k). Não existe uma ligação clara entre os aspectos do PQG, tais como a integração regional e o reforço das medidas de protecção, ou a relação entre infra-estruturas, o ambiente de negócios e o desenvolvimento agrícola e industrial. O PQG demonstra uma intenção de formalizar cada vez mais a economia, mas isso parece envolver a intervenção do Governo, por exemplo, “consolidar a rede comercial retalhista e, gradualmente converter o sector informal numa rede estruturada” (45-i) e “consolidar e expandir mercados grossistas e retalhistas dos produtos primários nacionais” (45-k). O PQG indica a intenção de garantir que as flutuações das taxas cambiais são benéficas aos exportadores (95-c), o que sugere a intervenção estatal significativa nos mercados monetários, semelhante à Secção 93-h, que afirma que o Governo irá “intervir no mercado cambial para 4 Esta Nota foi elaborada pelo Projecto SPEED da USAID, as opiniões aqui reflectidas são inteiramente da autora garantir a estabilidade cambial”. Ainda mais positivo é o foco na expansão de métodos alternativos de pagamento (95-d e E). iii. Ambiente de Negócios A melhoria da competitividade é vista como importante (2), embora não seja clara a forma como esta será alcançada. Ademais, considera-se pertinente ter um ambiente de negócios mais atrativo aos investimentos nacional e estrangeiro (17). Deve haver a simplificação e melhoria geral na prestação de serviços públicos (78-d). A Secção 79 aborda a melhoria do ambiente de negócios, indicando que as acções a serem empreendidas envolverão a simplificação dos procedimentos para melhorar a competitividade, garantir que Moçambique alcance uma posição de destaque como reformador na tabela classificativa do Doing Business, a eliminação de barreiras aos novos operadores no mercado, a redução do tempo para a emissão de DUATs, a implementação do sistema de e-BAU e melhoria do diálogo público-privado. O objectivo é de reduzir o número de dias para o licenciamento de uma empresa de 10 para 6 e o número de procedimentos para a abertura de uma empresa de 9 para 5 (Quadro 5). A secção 93-n especificamente indica que o sistema de reembolso do IVA será melhorado. No entanto, não há propostas de reformas significativas, daí que não está claro como as classificações de Moçambique seriam consideravelmente melhoradas por uma abordagem que sugere ajustes ao invés de uma reforma radical. iv. Infra-estruturas Reconhece-se o papel das infra-estruturas no desenvolvimento assim como o estabelecimento de parcerias público-privadas (26-s). As melhorias de infra-estruturas são vistas como associadas à produtividade (39). Infra-estruturas tecnológicas e de comunicações melhoradas são reconhecidas como importante para o desenvolvimento (33-ee). É feita referência à necessidade de melhorar as infra-estruturas de transportes rodoviários e marítimos, mas não há nenhuma indicação de planos para novas medidas concretas (35 m-p). Embora, na Secção 48 estejam detalhadas as estradas que devem ser melhoradas ou construídas, não há indicação específica se o foco será em estradas rurais, ou nos corredores, ou impulsionado pelo comércio ou outros factores. O governo pretende aumentar o acesso e a qualidade da energia eléctrica (50-A, 51), mas a proposta baseia-se em parcerias tanto de investimento estatal como público-privadas com sucesso improvável a menos que haja uma reforma significativa do sector no que se refere aos acordos em matéria de aquisições e redução nos custos subsidiados da energia eléctrica. v. Turismo Este sector é raramente mencionado no documento, embora o turismo deva ser promovido como instrumento de coesão social (26-n) e é visto como sendo algo que deve ser focado ao 5 Esta Nota foi elaborada pelo Projecto SPEED da USAID, as opiniões aqui reflectidas são inteiramente da autora nível comunitário (45 o).O único indicador directamente relacionado com o turismo é o aumento de 3 para 7, o número de investimentos de turismo comunitário (Quadro 4). vi. Emprego A geração de emprego sustenta os objectivos de desenvolvimento do PQG, mas não se sabe como o emprego será criado e a este respeito, os indicadores reais são bastante modestos (6, Tabela 1) com menos de 10% das pessoas que ingressam no mercado de trabalho a serem empregues durante o período de cinco anos. Embora o relatório reconheça a necessidade de melhorar a qualidade do ensino primário, habilidades para a vida, educação de adultos e formação técnico-profissional (33), não existe uma ligação clara entre estes aspectos e a geração de emprego. Existe um novo conceito de melhoria do Sistema de Informação do Mercado de Trabalho (43N) e de promover a certificação internacional dos centros de formação técnico-profissional (43l), bem como promover de mecanismos extra-judiciais de resolução de conflitos laborais (43-p). No entanto não há nenhuma indicação de acções para tornar o emprego mais flexível e sensíveis às mudanças económicas. vii. O Papel do Estado O documento faz menção regular à necessidade de incentivar o empresariado nacional e fornecer demais incentivos. Na verdade, a palavra “incentivar” é uma das mais frequentemente utilizadas no documento. Em geral, o PQG parece indicar a intenção de uma maior participação Estado e do Governo na economia. Além das acções específicas, como da criação de centros públicos de serviços e equipamentos agrícolas, reforçam esta percepção (40-i), assim como o plano de aumentar a capacidade das reservas físicas de cereais geridas pelo Estado (Quadro 2, 58-c) e a implantação de centros logísticos agro-alimentares nos principais corredores de desenvolvimento (58-d). viii. Participação e Diálogo Público-Privado Ao longo do documento, o PQG refere-se à importância do diálogo e a necessidade do Governo para discutir políticas, reformas e legislação com as partes interessadas antes e depois da aplicação (12, 24, 26, 43, 84), sugerindo potencial abertura à legislação sobre participação pública, e também indicando um compromisso com no mecanismo reformado de diálogo público-privado. ix. Conteúdo Local Em todo o documento, o conteúdo local é referenciado (38-iv), mas não está claro como o Governo interpreta este termo. Por exemplo, na Secção 28-iv do PQG lê-se “promover a cadeia de valor de produtos primários nacionais para assegurar a integração de conteúdo local”. 4. CONCLUSÕES 6 Esta Nota foi elaborada pelo Projecto SPEED da USAID, as opiniões aqui reflectidas são inteiramente da autora De modo geral, o PQG é uma miscelânea confusa de objectivos e acções bastante específicas e muito gerais destinadas a atender esses indicadores. Há uma falta generalizada de coesão que resulta de aparente falta de uma visão clara sobre onde o Governo quer que Moçambique esteja daqui a cinco anos. Sem uma visão orientadora, as acções aparecem ad-hoc e muitas vezes parecem não abordar os problemas específicos que se destinam a resolver. Os objectivos indicam um desejo de melhorar a competitividade do país, transformar a agricultura e industrializar, todos considerados como objectivos louváveis. Porém, parece haver uma falta de compreensão ou reconhecimento dos problemas que até agora resultaram na falta de competitividade e industrialização. Como resultado, as medidas propostas são susceptíveis de ficar aquém dos objectivos. Isto é evidente no tema sobre a intervenção do Governo e envolvimento do Estado na economia que permeia o PQG. Ao invés de apresentar as principais reformas necessárias e reduzir o papel do Estado, o PQG propõe ajustes menores com o risco de descoordenar os Ministérios, e que irá resultar em maior centralização e controlo, no lugar de seguir princípios do mercado livre. Posto isto, será importante que o Projecto SPEED reconheça estes constrangimentos e procure atingir os seus objectivos tendo os pontos positivos do PQG, tais como aumento de opções para o diálogo e a participação do público e melhorias propostas na legislação sobre terras como alavanca para estabelecer relações que podem ser utilizadas para discutir outras abordagens que possam de forma mais eficaz apoiar o governo na realização dos seus objectivos declarados. 7 Esta Nota foi elaborada pelo Projecto SPEED da USAID, as opiniões aqui reflectidas são inteiramente da autora