REFERÊNCIA INDUSTRIAL
QUÍMICA NA MADEIRA
Tratamento de
madeiras é para
profissionais
Foto: UPM - Irmãos Maggioni
Se um leigo observa uma Usina de Preservação de Madeiras em operação,
muitas vezes com automação completa, sequer pode imaginar os fenômenos
e variáveis que estão em jogo para que, ao final do processo e com o
trabalho de profissionais capacitados, se obtenha uma carga de madeira
tratada de modo homogêneo, com valores de retenção e de penetração nos
padrões estabelecidos pelas normas vigentes
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O
processo de tratamento preservativo de madeira sob pressão é um fenômeno de transporte de
massa (mecânica dos fluidos), em que um líquido preservativo deverá ser transferido de um reservatório
para o interior da madeira, que é um meio poroso com características próprias, por meio de pressão externa que é a
chamada driving force.
Para se ter uma ideia, trata-se de um processo muito mais complexo do que o bombeamento doméstico de
água de um poço subterrâneo para um reservatório ele-
vado que, então, abastecerá uma habitação por gravidade. Neste exemplo, desde que o dimensionamento tenha
sido feito de maneira correta e não haja problemas com a
tubulação, o transporte se dá em regime turbulento (número de Reynolds > 2000) e facilmente se atinge o estado
estacionário. Nesta situação, otimiza-se a transferência de
líquidos de modo simples, alterando-se o diâmetro de tubulações, potência e tipo de bomba.
No caso da impregnação de madeiras, as condições
são bem diversas porque grande parte do processo de
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Foto: divulgação
transferência ocorre em regime laminar, não estacionário
e com diversas variáveis intervenientes. Algumas delas podem, de maneira simplificada, ser assim enumeradas:
•
Diferentes espécies de madeira (anatomia)
em um mesmo tratamento;
•
Densidade variável das peças a serem tratadas;
•
Relação cerne/alburno;
•
Variabilidade do teor de umidade entre as peças;
•
Relação: lenho inicial/lenho tardio;
•
Permeabilidade da madeira (dimensão dos
poros);
•
Aspiração de pontoações (só no caso de
coníferas);
•
Viscosidade da solução de tratamento;
•
Quantidade de material particulado;
•
Teor de extrativos;
•
Polaridade do solvente;
•
Tempo de impregnação;
•
Magnitude e duração das fases de vácuo
e pressão.
O relacionamento da retenção e da penetração obtidas
em um tratamento preservativo, diante de tantas variáveis
envolvidas, tem sido estudado e equacionado por diversos
pesquisadores (Siau, Skaar, Stamm, Petty, entre outros),
Humberto Tufolo Netto
Diretor comercial da Montana Química S. A.
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Foto: divulgação
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Ennio S. Lepage
Consultor técnico da Montana Química S. A.
mediante adoção de modelos matemáticos, alguns deles
bem complexos.
Nesses modelos a retenção é expressa em termos de
fração de vazios disponíveis na madeira, designada pela
notação FVL. Em uma primeira aproximação, em regime
estacionário, Siau, J. determinou depois de formidável
desenvolvimento matemático, envolvendo a quase totalidade das variáveis anteriormente mencionadas, que a
retenção é proporcional à raiz quadrada do tempo de impregnação, isto é FVL = (2 t)1/2, onde:
FVL = fração de vazios = retenção máxima
T = tempo de impregnação.
Essa relação foi confirmada por Petty, J.A., usando madeira de Pynus sylvestris. Posteriormente Gonzales, G.E. e
Siau, J., trabalhando com Fagus grandifolia e Eucalyptus diglupta (ambas folhosas) observaram um comportamento
parecido. A diferença é que as permeabilidades e retenções
variaram ao longo do tempo, com três permeabilidades diferentes, caracterizadas graficamente (retenção X tempo)
por três segmentos de reta com coeficientes angulares diferentes (k1= 18,9; k2= 0,75 e k3= 0.01). Em outras palavras,
as permeabilidades do substrato (madeira) mudaram três
vezes com o tempo.
A retenção de ingredientes ativos na madeira é so-
mente um dos três parâmetros de um bom tratamento,
que pode assegurar a qualidade final do produto. Não
se pode desprezar os parâmetros de penetração e distribuição do preservativo em toda extensão da porção
permeável, tema amplamente estudado para as espécies de madeira comumente utilizadas pelas usinas de
preservação de madeiras.
Soluções amparadas por análise simplista do processo têm sido difundida por fornecedor, objetivando
estimular as usinas a adotarem mudanças em seus
equipamentos. Isso colocaria em risco aspectos relacionados à segurança operacional e à qualidade do
tratamento. A elevação da pressão de tratamento de
12kgf/cm² (quilograma força por centímetro quadrado)
para até 18kgf/cm², com objetivo de reduzir o tempo de
duração da fase de pressão, é uma medida muito preocupante, pois coloca em risco vários aspectos. Alguns
deles são apresentados a seguir:
A elevação da pressão de trabalho exige reestudo
técnico de engenharia do vaso de pressão (autoclave),
principalmente das calotas (fundo e porta). Também é
necessária a reavaliação do dimensionamento das tubulações, válvulas e também redimensionamento da
válvula de segurança. Exige, ainda, uma readequação
de projeto (revisão de cálculos) e do prontuário técnico, em atendimento à NR13 do Ministério do Trabalho
e Emprego.
Devemos destacar que a preservação de madeiras
no Brasil conta com importante representatividade da
Abpm (Associação Brasileira de Preservadores de Madeira) que juntamente com empresas do setor conduziram a revisão e atualização das normas técnicas NBR
e desenvolveu o Qualitrat – programa de autorregulamentação que tem por objetivo a certificação de usinas
que operam dentro das boas práticas de origem, qualidade e legalidade e, portanto, acréscimo de valores
para o mercado de madeira tratada.
O aumento da pressão de trabalho, com redução do
tempo de pressão, colocará em risco a segurança operacional e a qualidade da madeira tratada. Todas estas
considerações foram feitas com objetivo de mostrar aos
empresários responsáveis do setor de preservação que
o encurtamento do ciclo de tratamento de uma carga
de madeira, principalmente de folhosas, está longe de
ser resolvido com medidas paliativas tomadas com alterações operacionais do ciclo de tratamento. Elas passam ao largo do nível de responsabilidade das pessoas
que, por desconhecerem os aspectos legais envolvidos
em uma operação de Usina de Tratamento de Madeira,
ignoram a necessidade de regularização da Licença de
Operação da unidade com a nova descrição dos procedimentos de trabalho.
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