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©2015 Jonas Rafael dos Santos
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permissão da editora e/ou autor.
S2373 Santos, Jonas Rafael dos.
Senhores Escravos: a estrutura da posse de escravos em Mogi das Cruzes
(1777-1829)/Jonas Rafael dos Santos. Jundiaí, Paco Editorial: 2015.
156 p. Inclui bibliografia.
ISBN: 978-85-8148-407-5
1. História do Brasil 2. Economia cafeeira 3. Sistema escravista 4. Demografia I. Santos, Jonas Rafael dos.
CDD: 900
Índices para catálogo sistemático:
História do Brasil
Economia brasileira
Escravidão
981
338.981
326
IMPRESSO NO BRASIL
PRINTED IN BRAZIL
Foi feito Depósito Legal
Agradecimentos
A realização desta obra só foi possível graças à colaboração
direta ou indireta de muitas pessoas. Manifestamos gratidão a
todas elas, de forma particular:
À Profa. Dra. Ida Lewkowicz pela atenção e dedicação dispensada na orientação competente e encorajadora deste trabalho, além do apoio pessoal sempre constante.
Aos funcionários da FHDSS – de modo especial aos da biblioteca e da sessão de pós-graduação.
Ao Tércio Pereira Di Gianni pela atenção dispensada ao
longo do período de recolhimento dos dados no Arquivo Permanente do Campus e por todos os recursos necessários para
pesquisa disponibilizados.
Ao Luciano Goulart Brito e ao André Luis de Almeida Campos do Pólo Computacional, que muito auxiliaram com seus conhecimentos de informática.
Ao colega Paulo Eduardo Teixeira, que me esclareceu algumas dúvidas a respeito do programa de computador SPSS.
Ao Prof. Dr. Renato Leite Marcondes, que se disponibilizou
a calcular o Índice de Gini.
À Profa. Dra. Sílvia Conrado Jacintho pelo incentivo constante desde o início da graduação
À banca examinadora composta pelos professores Dr. Horacio Gutiérrez e Dr. José Flávio Mota.
A todos os professores da pós-graduação, em especial ao
Prof. Dr. Ivan Aparecido Manuel.
Ao professor Jurandir Campos pela atenção dispensada
A todos colegas da pós-graduação, em especial a Clayton
Romano, Antonio Marco Ventura Tito Flávio Belini, Rosana Ap.
Cintra, Fábio Lanza, Andréia Militão, Guilherme Pupo, Itamar
Teodoro e Maísa Rosa.
Aos amigos Anderson Garcia, Bruno Leonardo e, em especial, Diogo da Silva Roiz e Lucas Miranda Pinheiro, Alexandre
Silva e Gustavo Bueno, que foram imprescindíveis na reta final
da concretização da pesquisa.
A toda minha família e aos amigos de infância que sempre
me incentivaram, especialmente nesta etapa da minha vida.
À Capes (Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Ensino Superior), pelos dois anos de bolsa de estudo, que tornaram possível a realização desta obra.
SUMÁRIO
Introdução...........................................9
Capítulo I..........................................15
Capítulo II.........................................55
Capítulo III.......................................83
Considerações Finais.....................145
Fontes Primárias Manuscritas......147
Fontes Primárias Impressas..........147
Referências.....................................149
INTRODUÇÃO
“A utilização da abordagem demográfica faz-se necessária
em função do anonimato pessoal imposto à maioria do escravos pelos registros documentais”.
(Schwartz, 1986. p. 37)
A imagem dominante a respeito dos regimes escravistas do
Brasil até a década de 1980, foi fundamentada a partir do estudo das características de populações cativas vinculadas à grande
lavoura de mercadorias destinadas à exportação, sendo o tráfico
de negros africanos essencial para manutenção e crescimento da
mão de obra. As escravarias neste tipo de economia, eram compostas, em sua maioria, por homens com faixa etária elevada,
poucas mulheres e crianças. Até a abolição do tráfico, era difícil
para os escravos ligados a regiões baseadas em atividades tipo
exportação, casarem-se, constituírem famílias e reproduziremse: seu perfil demográfico caracterizava-se por altas razões de
masculinidade, estrutura etária inchada nas idades produtivas,
natalidade e nupcialidade reduzidas, e elevada mortalidade1.
Os estudos a respeito da estrutura da posse de escravos possibilitaram repensar estes estereótipos sobre o sistema escravista
brasileiro, especialmente em relação ao tamanho da posse de escravos e ao dinamismo interno da economia do Brasil.
Estes estudos, ao revelarem um padrão de distribuição de propriedade escrava diferente daquele que a historiografia tradicional
estabelecera como norma e um dinamismo da economia mercantil de subsistência abastecedora de mercados locais, que absorvia
um grande número de escravos, permitiram a compreensão da
1 Cf. Gutiérrez, H. Demografia Escrava numa Economia Não-Exportadora: Paraná,
1800-1830, p. 312-3.
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Jonas Rafael dos Santos
complexidade do sistema escravista brasileiro. Dessa forma, a
associação da mão de obra escrava e economia exportadora deixou de ser aceita como regra, possibilitando assim à incorporação
questões, regiões e períodos omitidos ou pouco abordados pela
historiografia predecessora no estudo da economia brasileira.
A historiografia, durante muito tempo, concentrou quase
exclusivamente os estudos a respeito da economia escravista de
São Paulo no período de consolidação da economia cafeeira e
de transição do trabalho escravo para o livre. Contudo, a partir
da década de 1980, em meio ao revisionismo delineado acima,
procurou-se entender as transformações econômicas que ocorreram anteriormente a 1850, as quais permitiram a introdução e
desenvolvimento da economia cafeeira.
Os trabalhos nesta linha são vários e privilegiaram como
fonte as listas nominativas de habitantes que se encontram no
Arquivo Público do Estado de São Paulo, e a análise da posse
de escravos como metodologia. Englobam regiões paulistas que
se tornariam após 1850, grandes produtoras de café, bem como
às que ficaram à margem dessa atividade. Dentre estes trabalhos, há um conjunto que tem procurado verificar o impacto da
economia cafeeira nas regiões do Vale do Paraíba Paulista e do
litoral Norte, no início do século XIX2.
Tem-se evidenciado que as localidades situadas no Litoral Norte e no Vale do Paraíba da Capitania e depois Província de São Paulo
entre o final do século XVIII e o início do XIX, apresentaram transformações econômicas significativas, constituindo a introdução e
2 Fernandez, R.V.G. Transformações econômicas no Litoral Norte Paulista (1778-1836).
Marcondes, R. L. e. A arte de acumular na gestação da economia cafeeira: formas de enriquecimento no Vale do Paraíba paulista durante o século XIX. Motta, J. F. Corpos escravos, vontades livres: Posse de escravos e família escrava em Bananal, (1801-1829). Luna, F. V. Areias:
posse de escravos e atividades econômicas (1817-1836). Luna, F. V. Estrutura da posse de
escravos e atividades produtivas em Jacareí. Rangel, A.S. Escravismo e Riqueza: a formação da
economia cafeeira, Taubaté 1765-1836. Luna, F. V. . São Paulo: População, Atividades e Posse de escravos. Luna, F.V. Características demográficas dos escravos de São Paulo (1777-1829).
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Senhores Escravos
desenvolvimento do café como principal fator. Por outro lado, demonstram que juntamente com a introdução e desenvolvimento do
café houve um aumento significativo na razão de masculinidade dos
escravos, no número de cativos em idade produtiva e na porcentagem dos escravos de origem africana, o que atesta a transformação
da economia paulista de subsistência para plantation no início do
século XIX. Todavia, as transformações econômicas propiciadas
pelo café apresentaram variações regionais devido às características
climáticas, de distribuição fundiária e de povoamento que se refletiram no sucesso ou não da economia cafeeira.
Neste sentido, à medida que surgiram trabalhos localizados,
que procuraram entender o processo de introdução e desenvolvimento do cultivo do café, permitiu-se a compreensão da
complexidade da gestação da economia cafeeira, evitando assim
a generalização que foi marca registrada da historiografia tradicional, até então. Dessa forma, este trabalho estuda a estrutura
da posse de escravos em Mogi das Cruzes entre 1777 e 1829,
objetivando contribuir para compreensão da complexidade da
formação da economia cafeeira.
Trata-se de uma análise longitudinal – 1777-1829 – uma vez
que por meio do acompanhamento da estrutura da posse de
escravos nas duas fases selecionadas, anteriores à introdução do
café (1777-1801 e 1801-1818), permitirá perceber com melhor
precisão o impacto do seu cultivo em Mogi das Cruzes.
As fontes utilizadas neste trabalho são as listas nominativas
de habitantes de Mogi das Cruzes e os mapas resumos a respeito
da produção econômica que estão anexadas às mesmas.
As listas nominativas de habitantes (censos antigos) foram
produzidas a partir de 1765, em decorrência da reestruturação
administrativa da Capitania de São Paulo com objetivos militares
e econômicos; as últimas foram efetuadas pouco depois de 1830.
Estas apresentam variações de conteúdo no tempo e no espaço.
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Jonas Rafael dos Santos
Maria Luiza Marcílio3 classificou-as como protoestatística, e
subdividiu-as em três fases: A primeira compreende o período
de 1765 a 1798, no qual as listas são compostas com informações essencialmente demográficas. Nesta fase, constam nas listas
dados a respeito do nome, idade e estado conjugal do chefe do
fogo bem, como da sua mulher, filhos, agregados e dos escravos
que começam a ser discriminados apenas a partir de 1775. Na segunda fase (1798-1830) as listas contam com dados econômicos,
como as atividades desenvolvidas pelos chefes dos fogos, bem
como a produção de cada fogo, ao contrário da primeira que
apresentava apenas a renda de cada um. São acrescentados, também, dados a respeito da origem dos moradores. Na terceira, após
1830, houve um processo de reestruturação na coleta dos dados.
Estes, que antes eram de responsabilidade das milícias, passaram
para os juízes de paz que os anotaram a partir dos quarteirões e
não mais por bairros que eram representados pelas companhias.
Nesta fase, houve apenas um ano de coleta sistemática, 1836, que
se encontra organizado no livro de Daniel Muller4.
Em Mogi das Cruzes, as listas nominativas se enquadram nas
subdivisões estabelecidas por Marcílio e, portanto, em alguns anos
omitem informações, principalmente a respeito da naturalidade dos
escravos. Neste sentido, para atingir nossos objetivos, utilizaram-se,
nesta dissertação, quatro anos: 1777, 1801, 1818 e 1829.
O ano de 1777 foi escolhido como marco inicial, uma vez
que é a primeira lista que contém descritivamente os dados demográficos tanto de livres como de escravos e de maneira legível.
O ano de 1801 foi também escolhido porque nesta lista há
todas informações tanto de livres como de escravos, como por
exemplo a naturalidade dos escravos, que é rara neste tipo de
documentação. Além do mais, 1801 marca o período de estabi3 Cf. Marcílio, M. L. Crescimento Demográfico e Evolução Agrária Paulista 1700-1836,
p. 57-65
4 Cf. Muller, D. P. Ensaio d’ un quadro estatístico da província de São Paulo ordenado pelas
leis provinciais de 11 de abril de 1836 e 10 de março de 1837.
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Senhores Escravos
lização da população escrava de Mogi das Cruzes, que perdurou
até 1818, após um grande crescimento no final do século XVIII,
provocado principalmente pelas atividades ligadas ao algodão.
O ano de 1818 foi escolhido porque encerra um período de estabilização da população escrava e inicia uma fase de retomada significativa no seu crescimento devido à introdução do cultivo do café.
O ano de 1829 é o marco extremo da pesquisa, uma vez que
é um ano em que o cultivo do café torna-se a principal atividade praticada pelos moradores, sobrepondo assim o algodão, que
desde o final do século XIX, torna-se o principal produto da Vila.
Os dados das listas nominativas foram cruzados por meio de
um programa de computador, o SPSS, tendo por base a metodologia desenvolvida pelos trabalhos a respeito da estrutura da
posse de escravos, já que:
O conhecimento da estrutura de posse dos cativos, além de
lançar luz sobre a estratificação social vigente em qualquer
sociedade escravista sob análise e representar valioso subsídio para o lineamento das atividades produtivas de maior
significância em cada momento histórico, apresenta-se
como elemento altamente relevante no estabelecimento do
nível relativo de riqueza dos segmentos sócio-econômicos
em que se pode decompor uma comunidade considerada5.
Tendo em vista que os instrumentais metodológicos a respeito da estrutura da posse de escravos avançaram muito desde
o trabalho pioneiro de Francisco Vidal Luna, no início da década
de 1980 e, os aspectos econômicos e demográficos influenciarem decisivamente na estrutura da posse de escravos, optou-se
por fazer a seguinte divisão da dissertação:
No primeiro capítulo, procura-se traçar um panorama sucinto dos estudos a respeito da estrutura da posse de escravos
desde o início da década de 1980, até aqueles elaborados no fi5 Luna, F. V.; Costa, I. Minas Colonial: economia e sociedade. p. 37
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Jonas Rafael dos Santos
nal de noventa. Com este procedimento objetiva-se delinear os
referenciais metodológicos que serão utilizados para estudar a
posse de escravos em Mogi das Cruzes, bem como demonstrar,
mesmo que parcialmente, o dinamismo econômico presenciado
pela Capitania de São Paulo, no final do século XVIII e início
do XIX, uma vez que a análise centraliza-se, principalmente, nos
trabalhos realizados a respeito de várias localidades.
Aborda-se no segundo capítulo, as transformações econômicas e demográficas de Mogi das Cruzes, a partir de informações contidas nas listas nominativas de habitantes e nos mapas
populacionais e de produção, objetivando, assim, visualização do
ambiente em que se analisa a relação entre as características demográficas dos senhores com os aspectos econômicos, que interagem constantemente. Traçou-se um pequeno histórico a respeito
da economia de Mogi, desde o início de seu povoamento, a fim
de evidenciar a importância do dinamismo ocorrido entre o final
do século XVIII e início do XIX. Em relação às transformações
econômicas e demográficas ao final do século XVIII e início do
XIX, preocupa-se em ressaltar que o aumento da importância do
cultivo e manufatura do algodão, no final do século XVIII apresentou-se como fundamental para o crescimento da população
escrava escrava neste período e bem como o fato de que a redução
do ritmo de crescimento do seu cultivo e a extinção da sua manufatura foram decisivas para a estabilização do número de escravos
entre 1801 e 1818. Por outro lado, mostra-se que a introdução e
desenvolvimento do cultivo do café foram imprescindíveis para o
crescimento populacional da escravaria entre 1818 e 1829.
No terceiro capítulo, procura-se, por meio da análise da estrutura da posse de escravos e das variáveis demográficas como sexo,
faixa etária, estado civil e naturalidade dos senhores e escravos,
entender e aprofundar o estudo sobre a dinâmica econômica e
demográfica na localidade de Mogi entre o final do século XVIII
e início do XIX, especialmente, o impacto do cultivo do café, que
se expandia pelo Vale do Paraíba e Litoral Norte de São Paulo, no
início do século XIX, na organização produtiva da localidade.
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CAPÍTULO I
A HISTORIOGRAFIA DA ESTRUTURA
DE POSSE DE ESCRAVOS
“Toda ciência humana, sem uma possante base demográfica, não passa de um frágil castelo de cartas; toda História,
que não recorre à Demografia, priva-se do melhor instrumento de análise”
(Pierre Chaunu, 1974 apud Marcílio, 1977, p. 1)
Vários trabalhos relacionados ao escravismo brasileiro até a
década de 1980 abordaram o sistema escravista numa perspectiva da Casa-Grande. Dessa forma, associaram diretamente mão
de obra escrava e economia exportadora, omitindo assim a importância de economias de subsistência abastecedoras de mercados locais dentro do contexto do sistema escravista brasileiro6.
No entanto, a partir da década de 1980, o regime escravista
que até então acreditava-se que havia recebido o tratamento necessário para sua compreensão, acabou por despertar o interesse
de diversos pesquisadores. Estes, tendo por base fontes censitárias, despenderam um esforço significativo de pesquisa em relação ao sistema escravista brasileiro. Dessa forma, os modelos
tradicionais dos regimes escravistas brasileiro, apresentados nos
trabalhos clássicos de Caio Prado Júnior e Gilberto Freyre,7 de
uma sociedade sustentada basicamente por grandes plantéis de
escravos deixaram de ser aceitos como norma, a partir deste pe-
6 Acerca de uma discussão sobre a evolucão historiográfica neste sentido, ver Motta , J. F; Costa, I. A formação econômica e social do Brasil sob nova ótica.
7 Cf. Prado Júnior, C. Formação do Brasil Contemporâneo. Cf. Freyre, G. Casa Grande
& Senzala.
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