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O USO LOCAL DO ACETONIDO DE TRIANCINOLONA NO TRATAMENTO DE
QUELÓIDES E CICATRIZES HIPERTRÓFICAS
O USO LOCAL DO ACETONIDO DE TRIANCINOLONA
NO TRATAMENTO DE QUELÓIDES E CICATRIZES
HIPERTRÓFICAS *
TRIANCINOLONE ACETONIDE USED LOCALY IN
THE TREATMENT OF KELOIDS AND
HYPERTROPHIC SCARS
Gustavo Lara ACHÔA **
Ana Lúcia ALVARES-CAPELOZZA ***
Clóvis MARZOLA ****
João Lopes TOLEDO-FILHO ****
Marcos Maurício CAPELARI ****
Gustavo Lopes TOLEDO ****
Daniel Luiz Gaertner ZORZETTO ****
_____________________________________________
* Trabalho de monografia apresentado como parte dos requisitos da Disciplina de Metodologia do
Ensino e Pesquisa, para a conclusão do Curso de Especialização em Cirurgia e
Traumatologia Buco Maxilo Facial da Associação Paulista de Cirurgiões Dentistas –
Regional de Bauru em 2003.
** Especialista em Cirurgia e Traumatologia Buco Maxilo Facial, concluente do Curso e autor da
monografia.
*** Professora do Departamento de Semiologia da Faculdade de Odontologia de Bauru da USP e
orientadora da Monografia.
**** Professores dos Cursos de Residência e Especialização em Cirurgia e Traumatologia Buco
Maxilo Facial do Colégio Brasileiro de Cirurgia e Traumatologia Buco Maxilo Facial,
Hospital de Base da Associação Hospitalar de Bauru e da APCD Regional de Bauru.
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O USO LOCAL DO ACETONIDO DE TRIANCINOLONA NO TRATAMENTO DE
QUELÓIDES E CICATRIZES HIPERTRÓFICAS
RESUMO
Os quelóides e as cicatrizes hipertróficas são lesões cutâneas de
aspecto e microscopia semelhantes, porém distinguíveis, de sintomatologia peculiar e
que incidem igualmente entre os gêneros e prevalecem em negros e asiáticos,
normalmente formando-se como conseqüência de incisões cirúrgicas, traumas,
infecções, entre outros. A literatura científica das últimas quatro décadas nos
apresenta a injeção local de corticosteróides como o alicerce do tratamento e
profilaxia da formação de quelóides e cicatrizes hipertróficas. Diferentes autores
citam o acetonido de triancinolona como a droga de escolha neste tratamento pela
sua eficácia na diminuição volumétrica e sintomatológica das lesões. Esta revista da
literatura tem como intuito estabelecer o mecanismo de ação, a melhor escolha para o
tratamento, tendo em vista a possibilidade de uma excisão da lesão. Além disso,
também indicar protocolos para se obter o sucesso total da terapia local injetável com
o acetonido de triancinolona nos quelóides e cicatrizes hipertróficas.
ABSTRACT
Keloids and hypertrophic scars are skin lesions of similar appearance
and microscopic features, peculiar symptoms, equal incidence between male and
female, and higher prevalence on Africans and Asians, usually appearing after
injuries as surgery incisions, trauma, infections, etc… In the last four decades
scientific literature presents local injection of corticosteroids as the corner stone to
the management and prevention on formation of keloids and hypertrophic scars.
Several authors take the triamcinolone acetonide as the main drug in this treatment,
because of efficiency on the lesions extent and symptoms decrease. The purpose of
this review is to establish the mechanism of action, better choice for treatment,
counting on the possibility of lesion excision. Also, indicate protocols to obtain
success of the therapy with local injection of triancinolone acetonide in keloids and
hypertrophic scars.
Unitermos: Queloides; Cicatrizes Hipertróficas; Lesões pele; Corticosteróides.
Uniterms: Keloids; Hypertrophic scars; Skin lesions; Corticosteroids.
INTRODUCÃO
Há aproximadamente 1.700 AC, como na idade média, descrições e
ilustrações vêm relatando uma das lesões mais difíceis de serem tratadas com
sucesso nos dias de hoje, os quelóides. A partir de 1802, por revisão de Alibert, uma
diferenciação entre esta lesão e as cicatrizes hipertróficas, de características clínicas,
histológicas e, etiologias semelhantes foram definidas.
Predominantemente
compostas por deposições exacerbadas de colágeno e glicoproteínas e, definidas
como um crescimento fibroso na pele, as lesões são diferenciadas em seus aspectos
clínicos (MURRAY, 1994).
Cicatrizes hipertróficas permanecem dentro das margens da ferida
original e tendem a regressão com o passar do tempo, enquanto quelóides
ultrapassam a área original do ferimento à pele, tendendo a manter uma elevação e,
podendo variar, sendo frequentemente associados com prurido, dor ou disestesia,
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O USO LOCAL DO ACETONIDO DE TRIANCINOLONA NO TRATAMENTO DE
QUELÓIDES E CICATRIZES HIPERTRÓFICAS
dificuldade de movimentação e contratura local (LARRABEE; EAST; JAFFE et
al., 1990).
A incidência de lesões queloidais são maiores em negros e asiáticos
(CHOWDRI; MASARAT; MATTOO et al., 1999) na faixa etária de 10 a 30 anos
e, igualmente entre homens e mulheres (COHEN; McCOY, 1980). Formam-se
devido a infecções crônicas (MAGUIRE, 1965), acne (URIOSTE; ARNDT;
DOVER, 1999), ou ainda trauma como incisões cirúrgicas, injeções, lacerações,
tatuagens, queimaduras, vacinações e traumas específicos ou não. Alguns relatos
literários de lesões em locais onde não houve algum tipo de trauma deve-se
provavelmente ao esquecimento ou impercepção do trauma pelo paciente
(MAGUIRE, 1965; MURRAY, 1994 e URIOSTE; ARNDT; DOVER, 1999).
Diversas regiões do corpo podem ser acometidas por quelóides com
maior ou menos susceptibilidade, principalmente as costas e o pescoço, seguido pelo
peito, orelhas e terço inferior da face e, raramente em regiões palmo plantares
(PARSONS, 1966). As membranas mucosas tendem a não ser afetadas, porém o
quelóide de córnea já foi relatado (SHUKLA; ARORA; ARORA, 1975).
Mesmo podendo afetar qualquer parte corpórea, na maioria das vezes,
as cicatrizes hipertróficas ocorrem em extremidades e tronco. Elas tendem a se
desenvolver quando uma injúria alcança a derme reticular ou mais profunda e,
normalmente são secundárias a queimaduras de segundo ou terceiro grau, ou ainda
feridas com reparo epitelial atrasado (MUIR, 1990).
Microscopicamente os quelóides são formados por nódulos contendo
pequenos fibrócitos e separados por bandas de fibroblastos imaturos compostas por
feixes de colágeno de fibras espessas de aparência hialinizada e brilhosa. As
cicatrizes hipertróficas organizam-se em fibras paralelas e uniformes, não tão bem
demarcadas, tão pouco de aspecto polido (STURIM, 1968 e URIOSTE; ARNDT;
DOVER, 1999).
Diversos autores concordam com a teoria de que lesões queloidais e
cicatrizes hipertróficas são caracterizadas por um aumento simultâneo da síntese de
colágeno e da atividade da colagenase, porém de maneira instável, favorecendo a
síntese do colágeno (KETCHUM; COHEN; MASTERS, 1974; LINARES;
LARSON, 1978; MURRAY, 1994 e URIOSTE; ARNDT; DOVER, 1999). Tal
desequilíbrio pode ser justificado por um estímulo (HOOPES; SU; IM, 1971), ou
ainda por uma inibição enzimática (DIEGELMANN; BRYANT; COHEN, 1977),
podendo tais teorias, relacionar-se diretamente a fatores que regem o crescimento e a
atividade fibroblástica (KATATOWSKI, 1968).
Os tratamentos ou prevenções propostos para estes tipos de lesões
incluem três diferentes meios como a correção do metabolismo anormal de colágeno
quando o equilíbrio entre síntese e degradação tenha sido afetado, a alteração da
resposta imune/inflamatória e, a manipulação das propriedades mecânicas do reparo
de feridas.
A literatura mostra que a injeção local de corticosteróides tem sido o
alicerce do tratamento e profilaxia dos quelóides e cicatrizes hipertróficas, associada
ou não a outros métodos de tratamento que venham a envolver a cirurgia excisional,
crioterapia, pressão local, radioterapia, medicamentos tópicos, entre outros.
Durante os últimos quarenta anos, trabalhos de pesquisa (KETCHUM
et al., 1966; KETCHUM; ROBINSON; MASTERS, 1967; GRIFFITH;
MONROE; McKINNEY, 1970; KETCHUM; MASTERS; ROBINSON, 1971;
JAWORSKI, 1973; TANG, 1992; MURRAY, 1994 e BERMAN; BIELEY, 1996)
e, relatos de casos clínicos (MURRAY, 1963; MAGUIRE, 1965 e MINKOWITZ,
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O USO LOCAL DO ACETONIDO DE TRIANCINOLONA NO TRATAMENTO DE
QUELÓIDES E CICATRIZES HIPERTRÓFICAS
1967), realizados por diferentes autores em diferentes locais citam o acetonido de
triancinolona (9-fluoro-hidrocortisona) no tratamento local injetável dos quelóides e
cicatrizes hipertróficas. Ojetiva-se neste trabalho, estabelecer o mecanismo de ação,
a melhor escolha de tratamento e, protocolos indicados para a obtenção de sucesso
deste tipo de terapia, bem como a apresentação de casos clínico-cirúrgicos, daí a sua
importância na literatura.
REVISTA DA LITERATURA
Os quelóides e cicatrizes hipertróficas incidem apenas no ser humano
e a primeira descrição reconhecida foi no Papyrus de Smith por volta de 1.700 A.C.
Desde a idade média ilustrações antigas de africanos representam a formação de
quelóides por propósitos ornamentais. Em 1802 ALIBERT realizou uma revisão de
quelóides diferenciando-os das cicatrizes que permaneciam dentro das margens do
trauma inicial (URIOSTE; ARNDT; DOVER, 1999).
Pela definição, as cicatrizes hipertróficas permanecem dentro das
margens da ferida original tendendo a regressão com o passar do tempo, enquanto os
quelóides ultrapassam a área original do ferimento à pele mantendo uma elevação e,
podendo variar. Frequentemente são associados com prurido, dor ou disestesia,
dificuldade de movimentação e contratura local (LARRABEE; EAST; JAFFE et
al., 1990).
Ambas as lesões são resultantes de infecções crônicas (MAGUIRE,
1965), acne (URIOSTE; ARNDT; DOVER, 1999) ou ainda traumas como as
incisões cirúrgicas, injeções, lacerações, tatuagens, queimaduras, vacinações e
traumas específicos ou não. Alguns relatos literários de lesões em locais onde não
havia nenhum trauma deve-se provavelmente ao esquecimento ou impercepção do
trauma pelo paciente (MAGUIRE, 1965; MURRAY, 1994 e URIOSTE; ARNDT;
DOVER, 1999).
Embora os quelóides e as cicatrizes hipertróficas sejam, supostamente,
conhecidos por todo cirurgião, sua etiologia é ainda obscura e seu tratamento muito
controverso. A incidência de lesões queloidais é maior na faixa etária de 10 a 30
anos, igualmente entre homens e mulheres (COHEN; McCOY, 1980), prevalecendo
em negros e asiáticos. Diversos tipos de tratamentos têm sido defendidos, mas
nenhum pode ser considerado de sucesso universal (CHOWDRI; MASARAT;
MATTOO et al., 1999).
A área pré-esternal, a região superior das costas e, posterior do
pescoço são os locais mais susceptíveis à formação dos quelóides. As orelhas, a
região deltóide, peito e terço inferior da face são considerados de uma
susceptibilidade moderada. Por outro lado as lesões são raras nas solas dos pés,
palmas das mãos, pênis (PARSONS, 1966), escroto e pálpebra superior. As
membranas mucosas tendem a não ser afetadas, entretanto o quelóide de córnea já foi
relatado (SHUKLA; ARORA; ARORA, 1975).
As cicatrizes hipertróficas tendem se desenvolver quando uma injúria
alcança a derme reticular ou mais profunda. Pode ser normalmente secundária
quando da queimadura de segundo e terceiro grau, ou ainda feridas com reparo
epitelial atrasado e, na maioria das vezes ocorrendo em extremidades e tronco,
mesmo podendo afetar qualquer parte corpórea (MUIR, 1990).
Microscopicamente os quelóides são compostos por feixes de
colágeno de fibras espessas, bandas hialinizadas de aspecto brilhante, acomodados
em nódulos contendo pequenos fibrócitos e, separados por bandas de fibroblastos
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O USO LOCAL DO ACETONIDO DE TRIANCINOLONA NO TRATAMENTO DE
QUELÓIDES E CICATRIZES HIPERTRÓFICAS
imaturos. As cicatrizes hipertróficas organizam-se em fibras paralelas e uniformes,
não tão bem demarcadas (STURIM, 1968 e URIOSTE; ARNDT; DOVER, 1999),
sendo a síntese de colágeno maior nos quelóides que nas cicatrizes hipertróficas
(COHEN; DIEGELMANN, 1977) que contêm menor quantidade de matriz
mucóide e fibras sem aspecto vítreo e limitadas aos parâmetros da lesão (NICOLAI
et al., 1987).
A cultura in vitro não demonstra diferenças significativas de aparência
ou tamanho entre células da pele normal, de cicatrizes maduras e de quelóides
(RUSSELL; WITT, 1976).
O mecanismo patogênico da formação de quelóides e cicatrizes
hipertróficas ainda são desconhecidos (NICOLAI et al., 1987). A descoberta de
anticorpos antinucleares próximos a fibroblastos contidos em quelóides, porém não
em cicatrizes hipertróficas (JANSSEN DE LIMPENS; CORMANE, 1982) e, a
teoria que o desenvolvimento de lesões queloidais baseia-se na resposta auto-imune à
excreção sebosa enclausurada, produzida por glândulas sebáceas, contribui para a
definição mais completa dessas patologias (OSMAN; GUMMA; SATIR, 1978).
Fatores variados, incluindo a descendência étnica e a localização da
ferida, são importantes na avaliação se o reparo tecidual irá acontecer de modo
esteticamente aceitável ou desenvolverá um quelóide ou uma cicatriz hipertrófica.
Os tratamentos ou prevenções propostos para estes tipos de lesão incluem três
diferentes meios, como a correção do metabolismo anormal de colágeno quando o
equilíbrio entre a síntese e a degradação tenha sido afetado, a alteração da resposta
imune/inflamatória e, a manipulação das propriedades mecânicas do reparo das
feridas. A injeção local de corticosteróides tem sido o alicerce do tratamento e a
profilaxia dos quelóides e das cicatrizes hipertróficas (ALSTER; WEST, 1997).
No início de 1950 foi observado que os esteróides adreno-corticais
promoviam um atraso do reparo de feridas tanto em animais quanto em homens e,
provavelmente com um efeito inibitório sobre a fibroplasia (GRIFFITH, 1966).
A aplicação direta de cortisona por um período prolongado de tempo
demonstrou uma perda de espessura da pele, limitada a área injetada, numa
experiência com ratos (BAKER; WITHTAKER, 1950). Esses autores já haviam
notado, microscopicamente, diferenças nos tecidos fibroblásticos conectivos em
estudos anteriores. Nesse trabalho notou-se a completa ausência de tecido de
granulação, apenas com uma fina camada de tecido conectivo, grande número de
fibras colágenas e, a ausência de proliferação fibroblástica com pouca formação de
vasos sanguíneos.
A injeção de hormônios adrenocorticotróficos em quelóides causaria
redução de sua sintomatologia e uma discreta diferença clínica (CONWAY;
STARK, 1951). Posteriormente, uma molécula modificada conhecida como
triancinolona (9-fluoro-hidrocortisona) foi usada com sucesso no tratamento de
quelóides, sendo o uso de acetonido de triancinolona atribuído também ao tratamento
das cicatrizes hipertróficas (MURRAY, 1963).
O uso do acetonido de triancinolona, controlado em casos clínicos, já
provava sua eficácia em aproximadamente 90% dos casos, tanto para a regressão de
quelóides quanto para as cicatrizes hipertróficas (KETCHUM; SMITH;
ROBINSON et al., 1966).
Em continuidade ao primeiro estudo de 1966, chegava-se a 500 casos
controlados no Centro Médico de Kansas, experimentando sucessos e insucessos
com o uso do acetonido de triancinolona. Estabeleceu-se, desta maneira um
protocolo para tais aplicações configurando o tempo e a quantidade da droga em
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O USO LOCAL DO ACETONIDO DE TRIANCINOLONA NO TRATAMENTO DE
QUELÓIDES E CICATRIZES HIPERTRÓFICAS
relação à idade do paciente e, ao tamanho da lesão (KETCHUM; ROBINSON;
MASTERS, 1967).
Um caso de regressão de quelóide tratado com grande sucesso é
descrito após 22 meses de injeções de acetonido de triancinolona numa criança de 9
anos de idade (MAGUIRE, 1965).
A ação de corticosteróides supostamente baseia-se no lançamento
potencializado hormonalmente de uma protease celular no meio extracelular do
tecido conectivo, induzindo a ativação proteolítica da colagenase e a digestão do
colágeno (HOUCK; PATEL, 1965).
Essa substância quando localmente injetada em ratos demonstra não
afetar o colágeno maduro in vitro, enquanto que in vivo o aumento da solubilidade
deste colágeno é consistentemente dependente de tempo, sugerindo um efeito
catalisador ou facilitador da ação da colagenase (KETCHUM; ROBINSON;
MASTERS, 1967).
O mecanismo pelo qual a administração de corticosteróides provoca a
diminuição de cicatrizes está relacionado ao aumento da atividade de colagenase
(HOUCK; SHARMA, 1968).
A partir dos estudos em ratos (BAKER; WITHTAKER, 1950),
diversos relatos sobre as complicações da terapia com corticosteróides em humanos
foram realizados, tendo como pontos principais as atrofias subcutâneas (AYRES,
1964 e BEARDWELL, 1967) e, cutâneas, acompanhando o caminho das veias de
drenagem linfática ou não (MAGUIRE, 1965; FRITSCH, 1970; JAWORSKI,
1973 e KIKUCHI; HORIKAWA, 1974). Isso tudo, além da despigmentação e
telangiectasia (JAWORSKI, 1973; MURRAY, 1994 e CHOWDRI; MASARAT;
MATTOO et al., 1999). A solução de esteróide deve ser sempre injetada dentro da
lesão e, o extravasamento para o tecido normal poderia resultar nas complicações
acima citadas (BRISSET; SHERRIS, 2001).
Em revistas da literatura, cita-se a influência das linhas de tensão que
poderiam interferir nas cicatrizes, da raça, das associações entre quelóides e
hormônios de estímulo melanocitário (MSH), além da localização das lesões no
corpo e da idade do indivíduo. Diversas teorias sobre o efeito microscópico e
bioquímico da cortisona são apresentadas na literatura e, o mau uso ou não
protocolado do acetonido de triancinolona, que poderia provocar efeitos colaterais
indesejados, como raramente é atribuído à Sindrome de Cushing, a este tratamento
fora dos padrões limites da droga (KETCHUM; COHEN; MASTERS, 1974 e
ROCKWELL; COHEN; ERLICH, 1989).
Os resultados obtidos pela injeção de triancinolona em quelóides e
cicatrizes hipertróficas são encorajadores, porém a aplicação é limitada pelo tamanho
da lesão, pois grandes volumes requerem maiores aplicações aumentando assim o
risco de efeitos sistêmicos (DATUBO-BROWN, 1990).
Diversos autores concordam com a teoria de que lesões queloidais e
cicatrizes hipertróficas são caracterizadas por um aumento simultâneo da síntese de
colágeno e da atividade da colagenase, porém de maneira instável favorecendo a
síntese do colágeno (KETCHUM; COHEN; MASTERS, 1974; LINARES;
LARSON, 1978; MURRAY, 1994 e URIOSTE; ARNDT; DOVER, 1999). Tal
desequilíbrio pode ser justificado por um estímulo no caso do aumento de atividade
do DNA e glicose-6-fosfato dehidrogenase (HOOPES; SU; IM, 1971) ou ainda uma
inibição enzimática, no caso das alfa-globulinas provocarem a diminuição da
atividade da colagenase (DIEGELMANN; BRYANT; COHEN, 1977). Tais
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O USO LOCAL DO ACETONIDO DE TRIANCINOLONA NO TRATAMENTO DE
QUELÓIDES E CICATRIZES HIPERTRÓFICAS
teorias podem estar diretamente relacionadas a fatores que regem o crescimento e a
atividade fibroblástica (KATATOWSKI, 1968).
As medidas de colagenase in vitro podem não ser tão precisas quanto
as medidas de atividade de colagenase in vivo (DIEGELMANN; BRYANT;
COHEN, 1977).
Para espanto dos autores, foi demonstrado num estudo, que a
proporção de colágeno e a síntese total da proteína em quelóides em regressão após o
uso de triancinolona não tiveram quaisquer alterações (COHEN; KEISER, 1973).
Em outro estudo, para exploração da influência das proteoglicanas
sobre a atividade da colagenase em cicatrizes hipertróficas, sugere-se que o aumento
da concentração da proteoglicana condroitina-4-sulfato, contribui para a produção
excessiva de colágeno (LINARES, LARSON, 1978).
Durante uma pesquisa sobre as atividades enzimáticas em epitélio e
derme de cicatrizes hipertróficas e quelóides, sendo a escolha das enzimas a serem
estudadas, baseada nas suas mudanças, em tumores malignos, além do discreto
aumento de 13 delas. Foram notadas grandes diferenças na atividade da glicose-6fosfato desoxihidrogenase, aumentada também em tumores malignos. Atividade de
6 a 13 vezes maior no tecido quelóide ou cicatricial hipertrófico que em tecido
normal, além da diminuição do metabolismo de enzimas de aminoácidos e ácidos
gordurosos e uma duplicação do índice de DNA (HOOPES; SU; IM, 1971).
Em estudos anteriores demonstrou-se o aumento do nível de glicose6-fosfato desoxihidrogenase e, a diminuição de atividade de alanina
aminotransferase, notando-se a modulação de ambas as enzimas a níveis normais,
para as características destes tipos de lesão dentro de uma semana após injeção local
de triancinolona. Assim, é sugerido o uso da droga de forma pré-operatória na
tentativa de minimizar a recorrência (IM; MULLIKEN; HOOPES, 1975).
A associação de lesões queloidais à gravidez é reportada e atribuída,
possivelmente, ao aumento de estrógeno endógeno durante este período
(MOUSTAFA; ABDEL-FATTAH, 1975).
Os corticosteróides parecem inibir o crescimento de fibroblastos e
inibir a alfa-2-macroglobulinas (McCOY; DIEGELMANN; COHEN, 1980).
Descobertas sugerem que as alfa-globulinas estariam envolvidas na
formação cicatricial anormal e que a triancinolona poderia remover os inibidores de
colagenase, como a alfa-1-antitripsina, permitindo assim a ativação da colagenase e
consecutivamente a quebra e reabsorção do colágeno excessivo (DIEGELMANN;
BRYANT; COHEN, 1977).
Sabe-se ainda que desde a década de 60, há uma influência na inibição
da proliferação de fibroblastos por antiinflamatórios esteroidais (BERLINER;
PANAGIOTIS; NABORS, 1967). A ação dos corticosteróides sobre os fibroblastos
pode ser explicada como a possibilidade de que os glicocorticosteróides induzam a
síntese de algumas proteínas, que poderiam modificar eventos celulares chaves,
comprometendo múltiplos sistemas celulares e, produzindo a inibição do crescimento
dos fibroblastos in vivo (PRATT, 1978).
A comparação entre os fibroblastos colhidos de tecidos normais e
queloidais in vitro, dos mesmos indivíduos e expostos à hidrocortisona sugere que a
expressão do fenótipo de quelóide, tanto para o crescimento quanto a síntese de
colágeno, restrito às células isoladas do nódulo quelóide. Os fibroblastos derivados
destes quelóides crescem numa densidade máxima menor, enquanto a síntese de
colágeno não é significativamente reduzida e proteínas não colágenas são produzidas
em maior abundância (RUSSEL; RUSSEL; TRUPIN, 1978).
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O USO LOCAL DO ACETONIDO DE TRIANCINOLONA NO TRATAMENTO DE
QUELÓIDES E CICATRIZES HIPERTRÓFICAS
Outro estudo in vitro sugere que a regressão dos quelóides após a
injeção de triancinolona seja secundária à inibição do crescimento dos fibroblastos e
diminuição da síntese de colágeno, não havendo diferenças na resposta por
fibroblastos queloidais e de pele normal (McCOY; DIEGELMANN; COHEN,
1979).
Uma hipótese mais aprofundada de ação dos corticosteróides é
demonstrada com o efeito da metilpredinisolona no decréscimo dos níveis de TGF[beta] e IGF-I nos fluidos do reparo de feridas e hidroxiprolina tecidual durante uma
comparação dos efeitos dos esteróides e retinóides em ratos (WICKE et al., 2000).
A injeção intralesional por pressão sem o uso de agulhas foi mostrada
através de um instrumento chamado de Dermo-Jet, tirando o desconforto das
aplicações com agulhas (VALLIS, 1967).
O tratamento puramente por excisão de lesões queloidais e cicatrizes
hipertróficas
promove
um
benefício
temporário
(O’SULLIVAN;
O’SHAUGHNESSY; O’CONNOR, 1996), demonstrando eficácia em 61,5% dos
casos de quelóides, determinados clinicamente, num estudo onde os índices de
sucesso e insucesso foram comparados diretamente com fatores etiológicos,
localização, duração, história de crescimento, sintomas, entre outras características
das lesões (COSMAN et al., 1961).
Não pode ser provada nenhuma correlação entre a remoção completa
do quelóide, afirmada em cortes microscópicos e, o índice de recorrência da lesão,
sem o uso de tratamentos adjuntos (COSMAN; WOLFF, 1972).
Foi demonstrado também que a injeção de triancinolona é de grande
eficácia em 90% dos casos na redução volumétrica das lesões e seus sintomas, porém
a associação das injeções com a excisão cirúrgica mostra-se o método de maior
sucesso dentro deste índice (GRIFFITH; MONROE; McKINNEY, 1970), sendo a
recorrência mantida abaixo de 50%, ao contrário de apenas excisar a lesão, onde os
índices variam de 45 a 100% (BERMAN; BIELEY, 1996).
Uma coletânea de 60 casos variados por lesões queloidais e cicatrizes
hipertróficas causadas por queimaduras, traumas e punções de vacinas foi
apresentada, tratados pelo uso de Kenacort A com três doses de 5 a 15 mg a cada 3
semanas, em crianças de 6 meses a 14 anos (JAWORSKI, 1973). Nos casos onde
não foi possível uma total regressão das lesões, a cirurgia plástica foi muito facilitada
localmente e o índice de recorrência foi diminuído. O autor cita também a ação
histocitológica da inibição da proliferação fibroblástica e inibição da formação
venosa e permeabilidade vascular causada pelo corticosteróide.
O uso de uma seringa dosadora modificada para o controle de injeção
do corticosteróide é descrito, no intuito de diminuir a atrofia tecidual por
concentração elevada da droga num mesmo local (PENOFF, 1974).
A injeção local de acetonido de triancinolona foi experimentada em
quelóides num grupo e em outro, porém após excisão da lesão com o uso de DermoJet. Como padrão foram utilizadas 4 sessões em intervalos de 14 dias, com doses
máximas de 100 mg por sessão, com mais doses em casos de recorrências. No grupo
onde foram realizadas as excisões antes da corticoterapia local injetável, 86,6% dos
pacientes precisaram de novas sessões após o tratamento padrão, onde nenhum caso
se equiparou em melhora, aos casos da terapia sem excisão (KILL, 1977).
Num estudo comparativo entre os tratamentos por excisão mais
aplicação de triancinolona trans e pós-operatória e colchicina via oral pós-operatória,
concluiu-se que nenhum desses métodos é válido como tratamento adjunto ao ato
cirúrgico (LAWRENCE, 1991).
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O USO LOCAL DO ACETONIDO DE TRIANCINOLONA NO TRATAMENTO DE
QUELÓIDES E CICATRIZES HIPERTRÓFICAS
Para outros autores, o uso de tratamento baseado em excisão e
aplicações intra e pós-operatórias de triancinolona é considerado de grande eficácia
em tratamentos complicados, tanto quanto à recorrência (VALLIS, 1967) e, ao
volume de quelóides e cicatrizes hipertróficas (KETCHUM; COHEN; MASTERS,
1974 e MURRAY, 1994). E, com o intuito de aliviar sintomas, melhorando a
cosmética cutânea, também foi tudo isso sugerido (GRIFFITH; MONROE;
McKINNEY, 1970; TANG, 1992 e CHOWDRI et al., 1999).
A excisão parcial de lesão queloidal adicionada ao tratamento com
acetonido de triancinolona numa criança de 7 anos foi relatada. O autor fez uso de
injeções de 25-30mg, a partir de 9 dias pós-operatórios, em intervalos de 1-3
semanas, completando um total de 21 aplicações, observando a regressão gradual em
volume e sintomas da lesão, que não apresentou nenhuma recorrência
(MINKOWITZ, 1967).
Um protocolo de tratamento preconiza o uso de injeções locais de
corticosteróides em quelóides ou cicatrizes hipertróficas recentes ao menos uma vez
a cada quatro semanas por até dez meses, estando, nos caos de lesões mais extensas a
terapia por compressão recomendada. A excisão cirúrgica para o redirecionamento
das cicatrizes deve obter resultados isentos de maior hipertrofia, optando-se por
submeter o paciente à radioterapia quando o insucesso da terapia protocolada é
extremo (NICOLAI et al., 1987).
Outras formas de tratamento também foram citadas na literatura,
sendo de grande eficácia, como o uso de esteróides tópicos (SHERRIS;
LARRABEE; MURAKEMI, 1995), folhas de silicone gel, creme e também o
silastic (HIRSHOWITZ, 1991). Porém, quando estes não obtiveram sucesso,
recorria-se novamente às injeções de triancinolona para então retomar o tratamento
inicial (SPROAT et al., 1992).
O uso da radiação foi colocado à prova estatística, até que houvesse
total regressão das lesões e seus sintomas, obtendo-se como resultado 76% de
eficácia estética e sintomática, deixando o uso da hidrocortisona como coadjuvante
no alívio dos sintomas (INALSINGH, 1974).
Em casos de quelóides recentes iniciados por acne, o tratamento
realizado com a criocirurgia sugere ótimos resultados, com média de 80% de
melhora, sendo significativamente melhor que a triancinolona (LAYTON; YIP;
CUNLIFEE, 1994).
Nos casos onde se faz o tratamento de quelóides e cicatrizes
hipertróficas já bem estabelecidas, a triancinolona mantém-se como a primeira
escolha (O’SULLIVAN; O’SHAUGHNESSY; O’CONNOR, 1996).
PROTOCOLO DE TRATAMENTO
Uso protocolado em lesões queloidais e cicatrizes hipertróficas
Cicatrizes de tronco e extremidades menores de 15cm2 podem ser
tratadas apenas com injeções. Em maiores de 15cm2, deve-se optar por um
tratamento excisional e injeções imediatas nas bordas da ferida, pois seria grande
demais a quantidade da droga para ser usada em tal lesão. Nas cicatrizes da face, se
a direção da lesão acompanha a tensão, deve-se excisá-la, injetá-la e, fechá-la
primariamente, numa esplintagem da ferida por um mês. Se a cicatriz não
acompanha uma linha de tensão da pele deve-se alterar a direção da ferida por uma
plastia em Z ou W e, os retalhos injetados. Se houver dificuldades no fechamento da
ferida, procede-se com a injeção das bordas, confeccionando-se um retalho girado ou
107
O USO LOCAL DO ACETONIDO DE TRIANCINOLONA NO TRATAMENTO DE
QUELÓIDES E CICATRIZES HIPERTRÓFICAS
com um enxerto de pele. Em casos de múltiplos quelóides, trata-se um por vez pela
excisão, injeção das bordas da ferida e fechamento primário (KETCHUM;
MASTERS; ROBINSON, 1971).
O uso da triancinolona deve ser protocolado para adultos de acordo
com o tamanho da lesão (Tabela 1) e, em crianças segundo a idade (Tabela 2).
Tabela 1 – Uso protocolado da triancinolona para adultos de acordo com o tamanho da lesão.
Adulto: Dose máxima: 120mg –
Repetida uma vez mensalmente por seis meses
1 a 2 cm2 de lesão: 20 a 40mg
2 a 6 cm2 de lesão: 40 a 80mg
6 a 10 cm2 de lesão: 80 a 100mg
Fonte: KETCHUN, L. D.; MASTERS, F. W.; ROBINSON, D. W. Follow-up on treatment of
hypertrophic scars and keloids with triancinolone. Plast. reconstr. Surg., v. 48, n. 1, p. 8991, 1967.
Tabela 2 – Uso protocolado da triancinolona para crianças de acordo com a sua idade.
Criança: Dose máxima a cada sessão
1 a 2 anos: 20mg
3 a 5 anos: 40mg
6 a 10 anos: 80mg
Fonte: KETCHUN, L. D.; MASTERS, F. W.; ROBINSON, D. W. Follow-up on treatment of
hypertrophic scars and keloids with triancinolone. Plast. reconstr. Surg., v. 48, n. 1, p. 8991, 1967.
O tratamento químico cirúrgico de quelóides pré-existentes inicia-se
com injeções locais de acetonido de triancinolona, mensalmente, durante três meses,
podendo estar associada, em partes iguais, com lidocaína 2% ou epinefrina 1:100.000
(Tabela 3). Embora o efeito da injeção de corticosteróide antes da excisão seja
discutível, deve ser considerado por várias razões como que são raras as formas de
quelóides e cicatrizes hipertróficas que respondem plenamente ao tratamento por
injeções apenas. Ou ainda, se embora misturada com anestésico local, estas injeções
podem vir a causar a sensação de queimação e, os pacientes devem estar cientes do
grau de desconforto pela necessidade de injeções pós-excisionais. Finalmente
porque este tratamento necessita de acompanhamento próximo e em longo prazo e,
sua aceitação antes da excisão é importante para o sucesso (BRISSET; SHERRIS,
2001).
108
O USO LOCAL DO ACETONIDO DE TRIANCINOLONA NO TRATAMENTO DE
QUELÓIDES E CICATRIZES HIPERTRÓFICAS
Tabela 3 – Regime de tratamento químico cirúrgico de quelóides, associado a anestésico em partes
iguais durante três meses.
Tempo decorrido
Regime de tratamento
0
Injeção 1 – Acetonido de Triancinolona de 40mg/ml e anestésico em partes iguais.
1 mês
Injeção 2 – Mesmo que a injeção 1.
2 meses
Injeção 3 – Mesmo que a injeção1.
3 meses
Excisão e injeção 4 – Acetonido de triancinolona de 10mg/ml.
5 – 7 dias
Remoção da sutura – colocação de fita de silicone gel ou pressão local.
1 – 3 semanas Injeção 5 – 1 parte de Acetonido de Triancinolona e 30mg/ml e 4 partes de anestésico.
4 – 6 semanas
Injeção 6 – Mesmo que a injeção 5 – diminuição da fita de silicone gel.
7 – 9 semanas
Mesmo que a injeção 5.
10 – 18 semanas
Continuação conforme necessidade.
Fonte: BRISSET, A. E.; SHERRIS, D. A. Scar contracture, hypertrophic scars, and keloids. Facial
plast. Surg., v. 17, n. 4, p. 263-72, 2001.
RELATO DE CASOS
CASO 1 (ILUSTRATIVO)
Paciente G. L. S., gênero feminino, 37 anos, leucoderma, compareceu
ao Ambulatório do Serviço de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxiolofacial da
Associação Hospitalar de Bauru – Hospital de Base, com queixa de “lesão nodular
e processo infeccioso de lobo de orelha esquerda” (sic). Clinicamente apresentava
infecção das perfurações em lobo de orelha esquerda, utilizadas para instalação de
brincos, sendo que, em uma delas havia crescimento tecidual nodular e séssil com
aspecto e consistência fibrosa característica de quelóide, além de histórico do
paciente para a patologia, e localização característica da lesão (Fig. 1). Em se
tratando de área de atuação da Cirurgia Plástica, por ser lesão em região posterior ao
trágus, fora da área de competência da Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial, a
paciente foi orientada e conduzida à especialidade indicada para o tratamento.
Fig. 1 – Quelóide na orelha.
Fonte: Curso de Cirurgia BMF de Bauru.
109
O USO LOCAL DO ACETONIDO DE TRIANCINOLONA NO TRATAMENTO DE
QUELÓIDES E CICATRIZES HIPERTRÓFICAS
CASO 2
Paciente M. F. C., gênero feminino, 45 anos, leucoderma, compareceu
ao Ambulatório do Serviço de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxiolofacial da
Associação Hospitalar de Bauru – Hospital de Base, com história de redução
cirúrgica de fratura mandibular bilateral há 12 anos. Restou na oclusão, como
sequela, uma mordida aberta anterior, tendo sido preparada ortodonticamente para
correção da Deformidade Dento Facial por meio de cirurgia ortognática. Como
preparo prévio ao procedimento ortodôntico/cirúrgico, houve indicação da remoção
dos meios de fixação da redução, anterior, da fratura mandibular (placas e parafusos
de titânio). Refere que durante a cirurgia de retirada das sínteses, por via intra-oral,
com a utilização de micromotor e brocas, houve superaquecimento dessa peça e, dos
afastadores. Ocasionou queimadura física de 3º grau, com exposição de tecido
conjuntivo, da área da comissura labial direita (sic), cicatrizando com a formação de
um quelóide (Fig. 2).
Fig. 2 – Quelóide no lábio inferior.
Fonte: Curso de Cirurgia BMF de Bauru.
Fechado o diagnóstico de quelóide, foi estabelecido um protocolo de
aplicação do corticóide dexametasona 2 mg intra-lesional, mensalmente, por 6 meses
consecutivos, acompanhado pela aplicação tópica de triancinolona creme (Omcilon–
A “M” R ), intercalado com o cicatrizante e hidratante ContractubexR. Após os 6
meses de terapêutica medicamentosa conservadora, houve uma redução substancial
da lesão queloidal (Fig. 3), momento este em que a remoção da lesão residual foi
indicada.
Após preparo pré-cirúrgico convencional da paciente, sob anestesia
local, bloqueio regional do nervo mentual e infiltrativas terminais à distância, por
acesso intra-oral, procedeu-se a incisão perilesional e excisão da lesão (Figs. 4 e 5),
seguida de sutura por planos profundos com fio reabsorvível VicrylR 4-0 (Fig. 6) e,
intra-dérmica com fio mononylon 6-0 (Fig. 7).
110
O USO LOCAL DO ACETONIDO DE TRIANCINOLONA NO TRATAMENTO DE
QUELÓIDES E CICATRIZES HIPERTRÓFICAS
Fig. 3 – Quelóide no lábio inferior após tratamento com o corticosteróide.
Fonte: Curso de Cirurgia BMF de Bauru.
Fig. 4 – Quelóide sendo excisado.
Fonte: Curso de Cirurgia BMF de Bauru.
Fig. 5 – Após a excisão do quelóide.
Fonte: Curso de Cirurgia BMF de Bauru.
111
O USO LOCAL DO ACETONIDO DE TRIANCINOLONA NO TRATAMENTO DE
QUELÓIDES E CICATRIZES HIPERTRÓFICAS
Fig. 6 – Após a excisão do quelóide, sutura em planos profundos.
Fonte: Curso de Cirurgia BMF de Bauru.
Fig. 7 – Após a sutura intradérmica.
Fonte: Curso de Cirurgia BMF de Bauru.
Fig. 8 – Após 15 dias.
Fonte: Curso de Cirurgia BMF de Bauru.
112
O USO LOCAL DO ACETONIDO DE TRIANCINOLONA NO TRATAMENTO DE
QUELÓIDES E CICATRIZES HIPERTRÓFICAS
A sutura intra-dérmica foi removida no 15º dia de pós-operatório,
quando um bom aspecto cicatricial da abordagem cirúrgica foi evidenciado (Fig. 8).
Orientações pós-operatórias foram reafirmadas à paciente quanto ao uso da
triancinolona tópica e da pomada cicatrizante (Contractubex R), além do uso de
bloqueador solar, caso se expusesse à radiação solar.
O seguimento pós-operatório cursou sem intercorrências, com
intervalos mensais, onde franca regeneração da área operada foi identificada,
apresentando perfeita cicatrização com 120 dias de PO, momento este em que a
paciente se encontrava em condições de alta, sendo mais uma vez orientada ao uso
permanente e profilático de bloqueador solar (Fig. 9).
Fig. 9 – Depois do tratamento e cirurgia.
Fonte: Curso de Cirurgia BMF de Bauru.
DISCUSSÃO
A incidência de lesões queloidais são maiores em negros e asiáticos
(CHOWDRI; MASARAT; MATTOO et al., 1999) na faixa etária de 10 a 30 anos
e, igualmente entre homens e mulheres (COHEN; McCOY, 1980). São formadas
devido a infecções crônicas (MAGUIRE, 1965), acne (URIOSTE; ARNDT;
DOVER, 1999), ou ainda trauma como incisões cirúrgicas, injeções, lacerações,
tatuagens, queimaduras, vacinações e traumas específicos ou não. Alguns relatos
literários de lesões em locais onde não houve trauma deve-se provavelmente ao
esquecimento ou impercepção do trauma pelo paciente (MAGUIRE, 1965;
MURRAY, 1994 e URIOSTE; ARNDT; DOVER, 1999).
Assim, diversas regiões do corpo podem ser acometidas por quelóides
com maior ou menos susceptibilidade, principalmente as costas e o pescoço, seguido
pelo peito, orelhas e terço inferior da face e, raramente em regiões palmo plantares
(PARSONS, 1966).
Apesar de ser a pele o sítio de localização mais frequente, as
membranas mucosas tendem a não ser afetadas, porém quelóide de córnea já foi
relatado (SHUKLA; ARORA; ARORA, 1975).
Portanto, mesmo podendo afetar qualquer parte corpórea, na maioria
das vezes, as cicatrizes hipertróficas ocorrem em extremidades e tronco. Tendem a
se desenvolver quando uma injúria alcança a derme reticular ou mais profunda e,
113
O USO LOCAL DO ACETONIDO DE TRIANCINOLONA NO TRATAMENTO DE
QUELÓIDES E CICATRIZES HIPERTRÓFICAS
normalmente são secundárias a queimaduras de segundo ou terceiro grau, ou ainda
feridas com reparo epitelial atrasado (MUIR, 1990).
O presente estudo diverge da literatura pesquisada quanto à faixa
etária, de 10 a 30 anos, Caso 1, 37 anos, e Caso 2, 45 anos. Quanto à incidência
associada ao padrão racial, pois em ambos os casos, as pacientes do gênero feminino
eram leucodermas, a despeito de que a literatura refere maior incidência nos
melanodermas e xantodermas. Mesmo assim, converge quanto aos aspectos
etiológicos da lesão, uma vez que o Caso 1 teve como causa um processo infeccioso,
e o Caso 2, foi originário de uma queimadura de terceiro grau. Ainda, há uma plena
concordância quanto à localização das lesões, orelha (Caso 1) e, terço inferior da
face, com envolvimento de pele em comissura labial e de pseudomucosa labial em
vermelhão do lábio (Caso 2).
Esteróides adreno-corticais têm a capacidade de promover um atraso
no reparo de feridas tanto em animais quanto em homens, provavelmente com efeito
inibitório sobre a fibroplasia (GRIFFITH, 1966). Observações realizadas sobre os
hormônios adrenocorticotróficos, quando injetados em quelóides, mostram o cessar
do prurido e da dor, mas pouco ou nenhuma mudança na aparência da lesão
(CONWAY; STARK, 1951). A despeito de tal afirmação, o Caso 2 ilustrado não
tem relato de dor ou prurido a serem atenuados, no entanto demonstra uma mudança
substancial no aspecto da lesão após as sessões de corticoterapia preconizadas e
realizadas.
Estes relatos encorajaram diversos autores a tentarem e pesquisarem o
mesmo tratamento com outros hormônios desde a década de 50.
A aplicação subcutânea direta de cortisona por um período prolongado
de tempo demonstra uma perda de espessura da pele, limitada à área injetada, com a
completa ausência de tecido de granulação. Ainda, apenas com uma fina camada de
tecido conjuntivo, maioria de fibras colágenas e, basicamente ausência de
proliferação de fibroblastos e, pouca formação de vasos sanguíneos (BAKER;
WITHTAKER, 1950), que vem de encontro com as observações de que, além de
apenas impedir a progressão de um quelóide, como é a ação da hidrocortisona, o uso
de uma molécula modificada conhecida como triancinolona (9-fluoro-hidrocortisona)
neste tratamento, mostra-se também de grande sucesso na regressão das lesões
(MURRAY, 1963). Com o uso da droga controlada em casos clínicos, já é antiga a
prova de sua eficácia em aproximadamente 90% dos casos, tanto para regressão de
quelóides quanto para as cicatrizes hipertróficas (KETCHUM; SMITH;
ROBINSON et al.,1966), fatos estes, todos verificados no Caso 2 em estudo.
Desde a década de 60, sabe-se muito bem que há uma influência na
inibição da proliferação de fibroblastos por antiinflamatórios esteroidais
(BERLINER; PANAGIOTIS; NABORS, 1967). Dentre as diversas hipóteses, a
ação dos corticosteróides sobre os fibroblastos pode ser explicada com a
possibilidade de que os glicocorticosteróides induzam à síntese de algumas proteínas,
que possam modificar eventos celulares chaves, comprometendo múltiplos sistemas
celulares e, produzindo a inibição do crescimento dos fibroblastos in vivo (PRATT,
1978). Isso, além do lançamento potencializado de uma protease celular no meio
extracelular do tecido conjuntivo, induzindo a ativação proteolítica da colagenase e a
digestão do colágeno (HOUCK; PATEL, 1965). Confirma-se dessa maneira que o
mecanismo pelo qual a administração de corticosteróides provoca a diminuição de
cicatrizes, estando relacionando ao aumento da atividade de colagenase (HOUCK;
SHARMA, 1968 e ALSTER; WEST, 1997), que foi notadamente confirmado pela
redução e diminuição da cicatriz do Caso 2 apresentado.
114
O USO LOCAL DO ACETONIDO DE TRIANCINOLONA NO TRATAMENTO DE
QUELÓIDES E CICATRIZES HIPERTRÓFICAS
O acetonido de triancinolona, localmente injetado em ratos, parece
não afetar o colágeno maduro in vitro, enquanto in vivo o aumento da solubilidade
desde colágeno é consistentemente dependente de tempo, promovendo um efeito
catalisador ou facilitador da ação da colagenase (KETCHUM; ROBINSON;
MASTERS, 1967).
Descobertas sugerem que as alfa-globulinas estão envolvidas na
formação cicatricial anormal, e que um corticosteróide, mais especificamente a
triancinolona, pode remover os inibidores de colagenase como a alfa-1-antitripsina
(DIEGELMANN; BRYANT; COHEN, 1977), a alfa-2-macroglobulinas e, inibir o
crescimento de fibroblastos permitindo assim a ativação da enzima e
consecutivamente quebra e reabsorção do colágeno excessivo (McCOY;
DIEGELMANN; COHEN, 1980).
Uma hipótese mais atual de ação dos corticosteróides é seu efeito no
decréscimo dos níveis de TGF-[beta] e IGF-I nos fluidos do reparo de feridas e
hidroxiprolina tecidual (WICKE et al., 2000). O Caso 2 tem uma evolução positiva
quanto ao uso in vivo da dexametasona injetável, muito embora também tenha tido
como coadjuvantes no tratamento, a utilização tópica da triancinolona e de outro
cicatrizante e hidratante tópico, o ContractubexR.
O efeito microscópico e bioquímico da cortisona e, o mau uso ou não
protocolado do acetonido de triancinolona, podem sim provocar efeitos colaterais
indesejados, como raramente é atribuído à Síndrome de Cushing, nos casos onde se
excede os padrões limites da droga (KETCHUM; COHEN; MASTERS, 1974 e
ROCKWELL; COHEN; EHRLICH, 1989).
Estas drogas de uma forma geral devem ser usadas com muita cautela
para não causarem uma overdose, podendo resultar em efeitos locais colaterais, como
atrofias subcutâneas (AYRES, 1964 e BEARDWELL, 1967) e, cutânea
acompanhando o caminho das veias de drenagem linfática ou não (MAGUIRE,
1965; FRITSCH, 1970; JAWORSKI, 1973 e KIKUCHI; HORIKAWA, 1974),
despigmentação (GOLDMAN, 1962 e MURRAY, 1994) além de telangiectasia.
Estas complicações locais representam pequena incidência no
resultado do tratamento e, na maioria das vezes mostram-se completamente
reversíveis. As infecções sistêmicas e locais também são efeitos colaterais
(CHOWDRI et al., 1999), devendo ser alvo de grande atenção pelo clínico. Muito
embora, complicações iatrogênicas associadas ao uso sem parâmetro dos corticóides
possam estar presentes nesta modalidade de tratamento de quelóides e cicatrizes
hipertróficas. No Caso 2, em foco, nenhuma intercorrência negativa foi manifestada,
uma vez que uma posologia previamente estabelecida, aceitável e compatível com o
tamanho da lesão, foi seguida à risca, e os controles pós-operatórios clínicos foram
seguidos metodicamente.
Os resultados obtidos pela injeção de triancinolona em quelóides e
cicatrizes hipertróficas são encorajadores, porém a aplicação é limitada pelo tamanho
da lesão, pois grandes volumes requerem maiores aplicações aumentando o risco de
efeitos sistêmicos (DATUBO-BROWN, 1990). Isto talvez seja um dos fatores que
colaboraram com o sucesso do tratamento do Caso 2, pois a lesão apresentava menos
de 3 cm2, com a utilização de uma dose relativamente baixa de dexametasona (2 mg),
dentro de limites aceitáveis para o tratamento eficaz, sem efeitos colaterais dos
corticóides.
Para o aumento do nível de glicose-6-fosfato desoxihidrogenase e
diminuição de atividade de alanina aminotransferase encontrado em lesões queloidais
e cicatrizes hipertróficas, a modulação de ambas as enzimas a níveis nomais dentro
115
O USO LOCAL DO ACETONIDO DE TRIANCINOLONA NO TRATAMENTO DE
QUELÓIDES E CICATRIZES HIPERTRÓFICAS
de uma semana, após injeção local de triancinolona, sugere o uso da droga de forma
pré-operatória na tentativa de minimizar a recorrência (IM; MULLIKEN;
HOOPES, 1975). O tratamento puramente por excisão de lesões queloidais e
cicatrizes hipertróficas promove um benefício temporário (O’SULLIVAN;
O’SHAUGHNESSY; O’CONNOR, 1996), demonstrando eficácia em 61,5% dos
casos de quelóides (COSMAN; CRIKELAIR; JU et al., 1961). Nenhuma
correlação entre a remoção completa do quelóide, afirmada em cortes histológicos e,
o índice de recorrência da lesão, sem o uso de tratamentos adjuntos, pode ser provada
(COSMAN; WOLFF, 1972). O presente trabalho ilustrado pelo Caso 2 corrobora
com as afirmações retro-citadas, uma vez que o corticóide (dexametasona) foi
utilizado somente no pré-operatório e, a lesão foi completamente removida,
conforme exame clínico trans e pós-cirúrgico, além do microscópico, muito embora
nenhum índice de recidiva da lesão possa ter sido identificada nos controles pósoperatórios instituídos.
A injeção de triancinolona é demonstrada como de grande eficácia em
90% dos casos na redução volumétrica das lesões e seus sintomas, porém a
associação das injeções com a excisão cirúrgica mostra-se o método de maior
sucesso dentro deste índice (GRIFFITH; MONROE; McKINNEY, 1970 e
JAWORSKI, 1973), sendo a recorrência mantida abaixo de 50% ao contrário de se
apenas excisar a lesão, onde os índices variam de 45 a 100% (BERMAN; BIELEY,
1996). Tal afirmação ecoa com o trabalho em questão, apesar da utilização somente
tópica da triancinolona em associação com a dexametasona injetável.
Um protocolo de tratamento preconiza o uso de injeções locais de
corticosteróides em quelóides ou cicatrizes hipertróficas recentes, ao menos uma vez
a cada quatro semanas, por até dez meses, estando, nos casos de lesões mais
extensas, a terapia por compressão recomendada. A excisão cirúrgica para o
redirecionamento das cicatrizes deve obter resultados isentos de maior hipertrofia
(NICOLAI; BOS; BRONKHORST et al., 1987). O protocolo estabelecido em
1971 (KETCHUM; MASTERS; ROBINSON, 1971), através de um vasto controle
de 500 casos em quase 6 anos, as doses máximas da injeção do acetonido de
triancinolona para adultos e crianças, 120 e 80mg respectivamente, tomando por base
o tamanho e o tempo da patologia. O regime de tratamento a ser realizado adjunto
ou separadamente a um plano de injeções pré e pós-operatórias de doses
estabelecidas, considerando-se quando também da excisão cirúrgica da lesão
(BRISSET; SHERRIS, 2001), portanto modificando-se a dosagem de aplicação por
sessão. O trabalho exposto com o Caso 2 segue um protocolo citado, no que toca a
utilização prévia à cirurgia de excisão, porém não realiza aplicações pós-operatórias
de corticosteróides. No entanto, utiliza outras terapêuticas adjuvantes, como a
aplicação tópica da triancinolona, associada ao uso tópico de outro cicatrizante e
hidratante (ContractubexR ).
O uso de uma seringa carpule dosadora modificada para o controle de
injeção do corticosteróide, no intuito de diminuir a atrofia tecidual por concentração
elevada da droga em um mesmo local (PENOFF, 1974) e, injeção por pressão sem o
uso de agulhas, o Dermo-Jet, tirando o desconforto das aplicações com agulhas
(VALLIS, 1967 e KILL, 1977), são alternativas para o controle e facilidade do
tratamento. No Caso 2, a aplicação intra-lesional da dexametasona se deu com o uso
de agulhas e seringas descartáveis usualmente utilizadas pelos diabéticos na
administração da insulina.
Uma alternativa para não se fazer uso de injeções é o uso de esteróides
tópicos. Pela sua absorção tecidual relativamente pobre, através da pele intacta ou
116
O USO LOCAL DO ACETONIDO DE TRIANCINOLONA NO TRATAMENTO DE
QUELÓIDES E CICATRIZES HIPERTRÓFICAS
suturada, esteróides tópicos ajudam na prevenção do desenvolvimento de cicatrizes
anormais apenas em lesões superficiais, tais como as dermoabrasões (SHERRIS,
LARRABEE; MURAKEMI, 1995). Em casos de quelóides recentes iniciados por
acne, o tratamento realizado com a criocirurgia sugere ótimos resultados, com média
de 80% de melhora, sendo significativamente melhor que a triancinolona
(LAYTON; YIP; CUNLIFEE, 1994). Nos casos onde se faz o tratamento de
quelóides e cicatrizes hipertróficas já bem estabelecidas, a triancinolona mantém-se
como a primeira escolha (O’SULLIVAN; O’SHAUGHNESSY; O’CONNOR,
1996). Não obstante a eficácia diminuta atribuída ao uso tópico da triancinolona, no
Caso 2 em pauta, esta terapêutica coadjuvante foi executada. Em que pese o fato da
crioterapia apresentar resultados encorajadores, o Caso 2 já vinha de um processo de
queimadura física e térmica, com o calor, que é o que também se espera da
crioterapia, ou seja, uma queimadura pelo uso do congelamento tecidual, portanto
tal terapêutica foi contra-indicada.
A despeito do que preconiza a literatura, como sendo a triancinolona a
droga terapêutica de primeira escolha, no presente estudo, pela indisponibilidade da
droga injetável na Instituição Pública, além da impossibilidade de aquisição por parte
do paciente, esta substância foi somente utilizada por via de aplicação tópica, sendo o
uso injetável intra-lesional substituído pela dexametasona. Além do uso coadjuvante
de outras substâncias cicatrizante e hidratante, bem como o uso dermo-protetor de
um bloqueador solar.
CONCLUSÕES
Após a interpretação dos artigos pertinentes ao assunto nas últimas
quatro décadas até o presente momento, e de acordo com os objetivos deste trabalho,
pode-se concluir que:
1. O mecanismo de ação pelo uso local de acetonido de triancinolona
no tratamento dos quelóides e cicatrizes hipertróficas não está bem definido quanto
sua base bioquímica. Entretanto é certo afirmar que a facilitação da ação da
colagenase estabelecendo o nível de colágeno próximo ao normal da pele, por
influência ou não sobre os fibroblastos, é constatada pela grande maioria dos autores.
2. O tratamento de escolha para a redução de quelóides está baseado
na idade do paciente, no tamanho e tempo de existência da lesão e, o tratamento pode
ser feito por injeção local da droga ou injeção mais a excisão, sendo da maior
eficácia.
3. Considerando-se a experiência em 500 casos, o protocolo
estabelecido em 1971, para as doses máximas da droga por aplicação, sugere uma
maior segurança para o paciente (KETCHUM; MASTERS; ROBINSON, 1971),
junto ou separadamente ao regime de tratamento proposto (BRISSET; SHERRIS,
2001), nos casos de tratamento por injeção e excisão cirúrgica da lesão.
4. O caso clínico-cirúrgico apresentado mostra, mesmo que de forma
estatisticamente irrelevante, que a associação tópica da triancinolona com a injetável
de outro corticóide pode resultar em uma solução viável para o tratamento de
quelóides e cicatrizes hipertróficas.
REFERÊNCIAS *
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O USO LOCAL DO ACETONIDO DE TRIANCINOLONA NO TRATAMENTO DE
QUELÓIDES E CICATRIZES HIPERTRÓFICAS
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