UMA COMPARAÇÃO ENTRE ESTI~~TIVAS
POR pIFERENTES
~TODOS
DA RAZÃO DE BOWEN OBTIDAS
(FLORESTA ~~Z6NICA)
Leonardo Deane de Abreu sá
Antônio Ocimar Manzi
Yelisetti Viswanadham
Instituto de Pesquisas Espaciais - INPE
Ministério da Ciência e Tecnologia -MCT
C.P. 515 - 12201 - são José dos Campos - SP
RESUMO
~ estudada a variabilidade diária da razão de Bowen e
seus valores são comparados quando calculados segundo diferentes
mêtodos acima da copa da Floresta Amazônica de terra firme. são
apresentadas, igualmente, as variabilidades diárias dos fluxos
verticais de calor sensível e de calor latente. Os resultados
mostram que, em média, a razão de Bowen e o fluxo vertical de
calor sensível apresentam seus valores máximos no período da
manhã. O fluxo vertical de calor latente, todavia, possui máximo
ao meio-dia. Isto parece indicar que os valores do fluxo de
calor sensível e da razão de Bowen respondem mais rapidamente às
flutuações do saldo de radiação incidente (determinadas pela
ocorrência de nebulosidade) do que os valores do fluxo vertical
de calor latente. As variacões ao lonoo do dia das razões de
Bowen obtidas a partir da ~elação ent~e fluxos turbulentos de
calor sensível e de calor latente são similares àquelas
calculadas atrav~s de gradientes, embora estas últimas
apresentem em média valores inferiores às primeiras.
1. INTRODUÇÃO
A cobertura florestal da região Amazônica se
constitui numa das fontes mais importantes de calor latente em
escala planetária (Molion e Kousky). Os processos de troca
turbulenta que aí ocorrem contribuem não apenas para determinar
as características do clima da Amazônia mas influem igualn~ente
nos processos físicos que se verificam na atmosfera em
latitudes mais elevadas (Nobre, 1984). Todavia, na Amazônia são
poucas as informações quantitativas disponíveis sobre a maneira
pela qual a energia para a evaporação da água é obtida, ou em
outras palavras, é pouco conhecido o papel desempenhado pelo
fluxo vertical de calor latente no balanço de enersia existente
sobre a Floresta Amazônica. O que torna o problema mais
complexo é o fato de as plantas não atuarem como estruturas
passivas mas como elementos vivos que cont~m organismos
~ativamente sofisticados os quais regulam a passagem da 5gua e
de gás carbônico atravês de seus sistemas de uma maneira
particularmente eficiente (Sellers, 1985). A razão Ge Bowen (Bo)
definida como o quociente entre o fluxo vertical de calor
sensível H e o fluxo vertical de calor latente .I~ 6 o p~r~mcl ro
normalmente usado para caracterizar a maneira pela qual é feita
a partição da energia disponível para transporte turbulento
entre cada um dos fluxos acima.
217
Todavia, as dificuldades na medição destes acima de
superfícies vegetad~s são bem conhecidas (McNeil e Shuttleworth,
1975). A técnica do balanço de energia a qual pode ser usada com
realtivo êxito acima de vegetação baixa, é difícil de ser aplicada
acima de superfícies aerodenamicamente muito rugosas pois aí a
troca de calor sensível e de calor latente entre a superfície e a
atmosfera é rápida. e os gradientes de temperatura e de umidade
específica são muito pequenos (McNeil e Shuttleworth, 1975). Dois
métodos alternativos para o cálculo de H e de LE são o das
covariâncias (Shuttleworth et alii, 1984) e c dos gradientes com
uso de sistemas de intercâmbio dos sensores entre duas alturas
para reduzir a possLvel ocorrência de erros sistemáticos nas
medições feitas por sensores individuais (Gash e Stewart, 1975).
Neste estudo são observadas as variações de Bo ao longo
do dia, tanto pelo método das covariâncias quanto pelo dos
gradientes. são discutidas as eventuais causas da ocorrência do
valor máximo de Bo antes do fueio-dia. Para isto são analisadas as
variações ao longo do dia de H e de LE bem corno de seus
respectivos coeficientes de variação.
2. DADOS EXPERIMENTAIS
.
O sítio experimental, pertencente ao Instituto
Nacional de Pesquisas da Amazônia, representativo da Floresta
Amazônica de Terra firme, está localizado na Reserva Florestal
"Ducke", a 25km a nordeste de Manaus, e a 83m de altura na
latitude de 2 0 57 1 sul e longitude 59 0 57' oeste. A altura média da
copa florestal é de 35m, e os instrumentos de medida foram
colocados em urna torre de alumínio de 45m de altura, construída
conjuntamente pelo Instituto Hidrológico de Wallingford, pelo
INPA e pelo INPE.
Os fluxos de momentun, calor sensível e evaporação
foram medidos com um sistema "Hydra" desenvolvido no Instituto
Hidrológico do Reino Unido o qual foi colocado a urna altura de
48,4m. Maiores informações sobre o mesmo são encontradas em
Shuttleworth et alii (1984) e em Lloyd et alii (1984). As medidas
de temperatura e umidade foram feitas com psicrômetros de cristal
de quartzo, modelo DY-2854, fabricados pela Hewlett Packard e
colocados nas alturas de 4l,04m e 44,66m acima do solo. foi
empregado um sistema de intercâmbio de termômetros pelo qual a
cada la minutos os sensores trocam mecanicamente de posição ao
longo de trilhas metálicas dispostas em posição vertical. Tal
sistema é apresentado em detalhes por McNeil e Shuttleworth
(1975) .
Os dados, correspondentes
realizada na Amazônia, foram obtidos
17, 24, 25 e 28 de abril de 1985, os
não ocorrência de precipitação até o
3.
à quarta campanha intensiva
nos dias 3 a 6, 9 a l I , 14 a
quais se caracterizam pela
momento da coleta dos mesmos.
r-~TOf)OS
A razão da Bowen (Bo) pode ser obiida através de dois'
m6todos distintos:
218
a) Métodos das covariâncias segundo o qual Bo é calculada
pelo quociente entre o fluxo vertical de calor sensível
H (W m- 2 ) e o fluxo vertical de calor latente LE (W m- 2 ) ,
ambos obtidos por covariâncias (Lumley e Panofsky, 1964)
através do sistema "Hydra":
H
p c
=
p
W
I
e
I.
(1)
p L Wl ql
LE
onde:
Bo
_
HY e a razao de Bowen obtida pelo metodo das
covariâncias;
L é o calor latente de vaporização da água (J kg- 1 ) ;
p é a densidade do ar (kg m- 3 ) ;
wlé a flutuação turbulenta da velocidade vertical
(m s-l);
e l é a flutuação turbulenta da temperatura potencial ( K)
ql é a flutuação turbulenta da umidade específica
(g kg- 1 ) e
(--) é o operador média em tempo.
b) Método dos gradientes segundo o qual Bo é calculada
através da razão entre gradientes (Lindroth, 1984):
éle/élz
( 2)
BO
= (c /L) (Kh/K )
p.
w
G
êlq/élz
onde:
B0r,
é a razão de Bowen obtida pelo método dos
gradientes;
cp é o calor específico do ar seco a pressão constante
(J kg- 1 K-1);
Kh é o coeficiente de troca turbulenta de calor sensível
(m- 2 s - 1) ;
Kw é o coeficiente de troca turbulenta de vapor d'água
2
(m
s-l);
éle/élz é o gradiente vertical de temperatura potencial
(K m- 1 )
e
élq/êz é o gradiente vertical de umidade específica
(m- 1 ) •
Considerou-se para a razão Kh/Kw o valor de 1,2 nas
situações instáveis em que H>O, e de 0,8 nas situações estáveis
em que H<O, em condições próximas daquelas propostas por Lumley e
Panofsky (1964). Estes valores aqui assumidos para variação de
Kh/Kw com a estabilidade serão objeto de estudos posteriores nos
quais procurar-se-á estudar a dependência das difusividades
turbulentas demomentum, calor sensível e calor latente com
relação aos parâmetros de estabilidade. Foram também calculados
para cada intervalo de 1 hora os valores dos coeficientes de
variação para Bo Hy , B~G' H e LE nos diversos horários do dia. O
coeficiente de variaçao Co de uma grandeza qualquer A é definido
como a razão entre o desvio padrão de A (i.e,oA) e a média de
A(=Ã), para dados de um horário específico.
Co =
°A
A
( 3)
2~
4. ANÁLISE DOS RESULTADOS
Nas figu~as la e lc são apresentados, respectivamente,
valores médios horários correspondentes a l i dias-ªe dados de
BO Hy e de Bor, (os quais são indicados por BO Hy e BO ,
G
respectivamente).
Nas figuras lb e ld são mostrados os valores dos
coeficientes de variação de BO Hy e de BO , respectivamente.
G
Observam-se comportamentos similares nas variações
de BaHy e Bar, no decorrer do dia. Assim, eles apresentam valores
POSitlVOS en~re 7:00h e 16:30h e negativos nos demais horários.
Adernais, seus valores máximos ocorrem no período da manhã, às
II:OOh para BO Hy e antes das 8:00h para Bor,. Após o meio-dia,
ambos os valores decrescem com o avançar dd tarde. Estes
resultados não estão inteiramente de acordo com os apresentados
por sá et alii (1986) os quais não apontaram um decréscimo tão
acentuado nos valores da razão de Bowen no período vespertino.
Eles, contudo, concordam com os apresentados por McCaughey
(1985) o qual estudou a variação diurna da razão de Bowen sobre
uma floresta em Ontário, Canadá. A observação das figuras lb e ld
aponta comportamentos semelhantes dos coeficientes de variação de
BO Hy e Bo ao longo do dia. Dur~nte o dia, seus valores máximos
ocorrem n8s períodos de transiçao do dia para a noite quando os
valores de H e de LE variam rapidamente e são pequenos em valor
absoluto. Há um ponto de mínimo relativo do coeficiente de
variação da razão de Bowen antes do meio-dia. Depois deste
horário os valores de Co tendem a crescer até o fim da tarde.
Isto pode ser atribuido à presença das nuvens as quais começam a
se intensificar após às 11:OOh devido ao aumento da atividade
convectiva. Assim, O coeficiente de variação cresce naqueles
horár~os em que é maior a probalidade de ocorr~ncia de
nebulosidade no céu. Para que se possa explicar melhor o
comportamento de Bo no decorrer do dia são apre~entadas as
figuras 2a, 2b, 2c e 2d. Na figura 2a são mostrados
os
valores médios horários dos fluxos verticais de calor sensível H
ao longo do dia e na 2b são apontados os respectivos coeficientes
de varia~ão. Similarmente, as figuras 2c e 2d con~êm as mesmas
informaçoes para o calor latente LE.
~ marcante a diferença de comportamento de H com
relação a LE. Enquanto o primeiro apresenta um máximo antes do
meio-dia e possui valores negativos durante a noite, o segundo
apresenta um máximo ao meio-dia e possui valores positivos em
qualquer horário. Todavia, durante o dia, H possui valor máximo
de aproximadamente 150Wm- 2 ao passo que o máximo de LE ultrapassa
350Wm- 2 • A noite, contudo, os valores de H e LE possuem
aproximadamente o mesmo valor absoluto e sinais contr~rios. Isto
sugere que durante a noite a energia necessária para a evaporação
da água da copa florestal é retirada da atmosfera circundante via
fluxo de calor sensível. Durante o dia, porém,
a maior parte
da energia disponível para transporte turbulento, a qual é
fornecida pelo saldo de radiação solar, é cedida para que haja
transporte de vapor d'água para atmosfera em detrimento do fluxo
de calor sensível. Outro resultado interessa~te é obtido pela
comparação das figuras 2b e 2d as quais cont~m, respectivamente,
as variações no decorrer do dia dos coeficientes de variação de
220
H e de LE. Enquanto os primeiros parecem ser muito sensíveis a
variação da radiação solar incidente no decorrer do dia, os
6ltimos parecem
~er
menos sensíveis ã mesma. Por outro
lado, enquanto os máximos e mínimos do coeficiente de variação
do calor sensível ocorrem nos períodos de transição do dia para a
noite,os máximos do coeficiente de variação do calor latente
ocorrem ã noite e os mínimos, no período da manhã. Aparentemente,
a ocorrência de crescente atividade convectiva com formacão de
nuvens cumulusnimbus a partir do fim do período matinal deve
ser o fator determinante da forma da figura 2b no período diurno
a qual aponta valores crescentes do coeficiente de variação do
calor sensível a partir das 10:00h. Conclui-se, assim, que a
energia que incide sobre a Floresta Amazônica é utilizada
prioritariamente para evapotranspiração. Durante o dia, quando há
pouca nebulosidade, uma forte atividade convectiva favorece o
aumento do fluxo de calor sensível. O fluxo de calor latente
parece ser menos sensível ãs flutuações da radiação solar
incidente e ã noite, quando não há radiação solar incidente, ele
continua existindo às custas do calor sensível fornecido pela
atmosfera.
5. NOTA CONCLUSIVA
Estes estudos são importantes para compreender os
processos físicos reais que ocorrem acima da Floresta Amazônica
no decorrer do dia e também em diferentes estacões do ano. No
futuro dever-se-á conduzir uma pesquisa mais detalhada nesse
sentido após a seleção de diferentes conjuntos específicos de
dados do Experimento Micrometeorológico na Região Amazônica.
6.
AGRADECI~ffiNTOS
Os autores agradecem a colaboração dos Drs. James
Shuttleworth, Christopher J. Moore, John H.C. Gash e John
Roberts e do Sr. Colin R. Lloyd, do Institute of Hydrology de
Wallingford, Reino Unido, que formaram a equipe britãnica
co-realizadora do Experimento Micrometeorológico na Amazônia. são
gratos igualmente aos Drs. Luiz Carlos Baldicero Molion e Carlos
Afonso Nobre e ao Sr. Vicente de Paula Silva Filho do Instituto
de Pesquisas Espaciais, aos Srs. Ari de Oliveira Marques Filho,
Gilberto Fernando Fisch, Maria de Nazaré Goes Ribeiro, Artªmio
Plana Fattori e Mauro Januário do Instituto de Pesquisas da
Amazônia, Osvaldo M.R. Cabral da Empresa Brasileira de Pesquisas
Agropecuárias, José Carvalho de Moraes da Universidade Federal
do Pará, Dr. Sukaran R. Patel da Universidade Federal da Paraíba
e Sr. Leandro Ferreira de Aguiar da Fundação Universidade do
Amazonas os quais integraram a parte brasileira do mencionado
Experimento. são gratos, igualmente, ao Dr. Romísio Geraldo B.
André pelas críticas e sugestões apresentadas.
7. REFE~NCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Journa1 of the Roya1 Meteoro10gica1 Society, 110(466):11431169, Oct. 1984.
---
222
Ib)
•".l-.~----,-h-""-:~~b--::':"-.---;:'
Fig. 1. - Evolução diária das médias horárias da razão de Bowen
pelos métodos: (a) das covariâncias e (c) dos
gradientes; (b) e (d) apresentam seus respectivos
coeficientes de variação.
Fig. 2. - Evolução diária das médias horárias dos fluxos: (a) de
c~lor sensível e (c) de calor latente; (b) e (d)
apresentam seus respectivos coeficientes de variação.
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