2 Sistema financeiro 2.1Introdução No sistema bancário, o risco de liquidez de curto prazo apresentou aumento no último semestre, mas permaneceu em nível confortável. O risco de liquidez estrutural não se alterou, e as operações de longo prazo continuam suportadas por fontes de recursos estáveis. Segue baixa a dependência de recursos externos. No primeiro semestre de 2015, o ambiente de crédito espelhou o cenário de desaquecimento econômico, juros mais elevados, condições menos favoráveis no nível de emprego e redução no nível de confiança dos consumidores e dos empresários. Esse cenário levou à redução na demanda por crédito e à adoção de critérios de concessão mais conservadores por parte das instituições financeiras, contribuindo para reduzir a taxa de crescimento da carteira de crédito do Sistema Financeiro Nacional (SFN). Apesar do cenário, a inadimplência23 agregada do sistema não apresentou aumento significativo até o encerramento do semestre, variando 0,2 p.p. Essa variação foi, em parte, contida por renegociações de crédito e por cessões de créditos inadimplentes sem retenção de riscos24. A cobertura da inadimplência por provisões continua em nível satisfatório, o que evidencia a resistência do sistema de crédito ante o cenário acima descrito. 23/ A inadimplência é mensurada pelo quociente entre o saldo total de operações de crédito que apresentam parcelas vencidas há mais de noventa dias e o saldo total da carteira de crédito. 24/ A renegociação de crédito é um procedimento a princípio saudável para buscar ajustar o serviço da dívida à capacidade de pagamento do tomador de crédito quando essa capacidade se reduz. A cessão de créditos inadimplentes sem retenção de riscos por parte do cedente também pode representar prática adequada de gestão, por ter como objetivo a geração de valor mediante a venda definitiva de carteira problemática. No entanto, ambos os eventos reduzem o saldo total de operações inadimplentes sem que, necessariamente, haja pagamento de dívidas em atraso. A rentabilidade do sistema bancário aumentou, influenciada por maiores margens de intermediação, com destaque para ajustes nas taxas de concessão e fortes resultados com tesouraria. Em ambiente de condições econômicas adversas, os bancos enfrentam maiores perdas com provisões. Entretanto, seguem direcionando esforços para ganhos de eficiência e buscando fontes diversas de receita, com incremento de rendas advindas do segmento de seguros, serviços, meios de pagamento e ampliação de outros resultados de participação societária na formação do lucro líquido. A confortável situação de solvência do sistema pôde ser constatada pela estabilidade, no semestre, dos elevados níveis de capitalização e pelos resultados da simulação da plena implementação do arcabouço de Basileia III, da introdução do futuro requerimento de Razão de Alavancagem, e dos testes de estresse. Esses últimos mostraram que o sistema bancário brasileiro apresentou adequada capacidade de suportar efeitos de choques decorrentes de cenários adversos, bem como de mudanças abruptas nas taxas de juros e de câmbio, na inadimplência ou nos preços dos imóveis residenciais. A estimativa do shadow banking brasileiro continua a mostrar que os riscos provenientes desse setor são conhecidos e limitados. Contudo, o caráter dinâmico do mercado financeiro tem levado as autoridades reguladoras a se manterem atentas à sua evolução. Ainda que os testes de estresse demonstrem a adequada capacidade do sistema bancário para suportar cenários adversos, convém destacar os eventos com maior potencial de impacto e que, por essa razão, são objetos de contínuo monitoramento. Os principais fatores de risco que podem impactar ainda mais o mercado de crédito e a inadimplência estão associados aos efeitos de uma eventual deterioração mais significativa dos ambientes econômicos interno e externo, gerando pressões adicionais sobre Outubro 2015 | Relatório de Estabilidade Financeira | 16 emprego e renda das famílias e sobre custos e receitas das empresas. Novos requerimentos de recuperação judicial de empresas como as envolvidas na operação Lava Jato e o endividamento das empresas em moeda estrangeira são exemplos de situações que demandam atenção especial. No caso do endividamento em moeda estrangeira, ressalte-se o efeito mitigador de riscos proporcionado pela existência em larga escala de hedge operacional e financeiro. Destaque-se que, para efeito das seções 2.2 Liquidez, 2.4 Rentabilidade e 2.6 Testes de estresse de capital, o escopo das análises é o sistema bancário, aqui constituído pelas instituições Banco Comercial, Banco Múltiplo, Caixa Econômica, Banco de Câmbio e Banco de Investimento, e pelos conglomerados financeiros compostos por ao menos uma dessas modalidades de instituições. Os Bancos de Desenvolvimento não estão incluídos, exceto na seção 2.3 Crédito, na qual as análises envolvem todo o SFN. A seção 2.5 Solvência, por exigência regulatória vigente desde 1º de janeiro de 2015, tem como escopo o conglomerado prudencial. A seção 2.6 Shadow banking abrange também outras entidades e atividades não reguladas pelo BCB. 2.2Liquidez No semestre, o sistema bancário apresentou redução nos ativos líquidos e desaceleração do ritmo de crescimento do crédito e das captações. Nesse contexto, o risco de liquidez de curto prazo aumentou, embora permaneça em nível confortável. Já o risco de liquidez estrutural não se alterou, e as captações estáveis mantiveram-se em patamar suficiente para suportar os ativos de longo prazo. O Índice de Liquidez (IL25) do sistema reduziu-se de 2,01 para 1,73 (Gráfico 2.2.1) em decorrência da queda dos ativos líquidos e do incremento da simulação do fluxo de caixa estressado das instituições financeiras. O aumento de R$38 bilhões no fluxo de caixa estressado é explicado pela elevação da métrica que estima a expectativa de saques de depositantes em conjunto com o já mencionado aumento da exposição das instituições financeiras a riscos de mercado. A elevação da métrica, por sua vez, deriva do comportamento das captações líquidas observadas em Letras de Crédito Imobiliário (LCIs), Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs) e letras financeiras, insuficientes para compensar os saques em instrumentos como poupança, depósitos a vista e a prazo. Tal comportamento também reduziu o ritmo de crescimento das captações e aprofundou a mudança que vem ocorrendo em seu mix. Gráfico 2.2.1 – Índice de Liquidez un. R$ bilhões 800 2,00 640 1,60 480 1,20 320 0,80 160 0,40 0 Jan 2012 Jul Jan 2013 Jul Jan 2014 Jul 0,00 Jan 2015 Ativos líquidos Fluxo de caixa estressado Índice de Liquidez Base de dados A distribuição do risco de liquidez entre as instituições continua não causando preocupação, pois a representatividade das instituições financeiras com IL abaixo de um permanece baixa (Gráfico 2.2.2). Gráfico 2.2.2 – Distribuição de frequência para o Índice de Liquidez1/ % dos ativos do sistema 55 Os ativos líquidos reduziram-se em R$24 bilhões em decorrência da queda no estoque de títulos públicos federais detidos pelas instituições financeiras. Essa queda é explicada pelo aumento de margens depositadas em câmaras de compensação, efeito da maior exposição das instituições financeiras a taxas de juros prefixadas e dólar, e pela transferência de liquidez para os demais segmentos da economia. 25/ O IL tem como objetivo mensurar se os bancos possuem fontes suficientemente líquidas de recursos para financiar suas necessidades de caixa de curto prazo em cenário de estresse. Instituições com IL superior a um (100%) possuem ativos líquidos suficientes para suportar esse cenário. Para detalhes da definição da métrica, vide Conceitos e Metodologias, item a. 71 72 44 33 8 22 4 17 18 <0,8 3 4 0,8-1,0 13 7 5 1,0-1,2 1,2-1,4 8 9 1,4-1,6 5 1,6-1,8 9 11 12 1,8-2,0 ≥2,0 0 Índice de Liquidez Dezembro 2014 Junho 2015 1/ Os valores sobre as barras referem-se ao número de instituições financeiras com Índice de Liquidez pertencente ao intervalo correspondente. Base de dados Outubro 2015 | Relatório de Estabilidade Financeira | 17 O risco de liquidez estrutural do sistema bancário, mensurado dessa edição do REF em diante pelo Índice de Liquidez Estrutural26 (ILE), fechou o primeiro semestre de 2015 no patamar de 1,07 (Gráfico 2.2.3), indicando que, de forma agregada, os bancos contam com fontes de recursos estáveis em níveis acima do necessário para suportar os ativos de longo prazo. Gráfico 2.2.4 – Distribuição de frequência para o Índice de Liquidez Estrutural1/ % dos ativos do sistema 70 23 56 22 42 28 Esse risco vinha aumentando nos últimos anos, decorrente do maior ritmo de expansão da carteira de crédito, principalmente por parte dos bancos públicos, e do aumento de outros ativos de longo prazo, como créditos tributários e participações societárias em companhias coligadas e controladas, fazendo com que o ILE saísse de 1,12 ao fim de 2011 para 1,06 no encerramento de 2013. Desde 2014, vem ocorrendo desaceleração do crédito e, de forma proporcional, das captações estáveis, tendência que permaneceu no primeiro semestre deste ano, sem impacto significativo na liquidez estrutural dos bancos. Gráfico 2.2.3 – Índice de Liquidez Estrutural un. R$ bilhões 5.000 1,20 4.000 1,06 3.000 0,92 2.000 0,78 1.000 0,64 0 Dez 2011 Jun Dez 2012 Jun Dez 2013 Jun Dez 2014 Jun 0,50 Recursos estáveis disponíveis Recursos estáveis necessários Índice de Liquidez Estrutural 10 8 10 < 0,8 10 8 0,8-0,9 10 11 14 0,9-1,0 14 13 1,0-1,1 1,1-1,2 10 59 1,2-1,3 57 0 ≥ 1,3 Índice de Liquidez Estrutural Dezembro 2014 Junho 2015 1/ Os valores sobre as barras referem-se ao número de instituições financeiras com Índice de Liquidez Estrutural pertencente ao intervalo correspondente. Base de dados A dependência do sistema bancário de funding de origem externa27 continua baixa (Gráfico 2.2.5). As captações no exterior permanecem nos patamares do semestre anterior, sendo seu aumento em reais decorrente da desvalorização da moeda ante o dólar norte-americano em 2015. Em moeda estrangeira, o funding internalizado reduziu 4,5% (Gráfico 2.2.6), variação concentrada em captações livres. As captações de linhas externas vinculadas a operações de crédito interno, destinadas a repasses ou financiamentos do comércio exterior, mantiveram-se estáveis, indicando confiança no sistema financeiro brasileiro e disponibilidade de liquidez internacional. Gráfico 2.2.5 – Perfil das captações externas Como percentual das captações totais % 20 Base de dados 16 Houve melhora na dispersão do risco de liquidez estrutural das instituições (Gráfico 2.2.4), sob a ótica da representatividade do valor dos ativos. As instituições financeiras que apresentavam ILE igual ou superior a um correspondiam a 93% dos ativos do sistema no encerramento do primeiro semestre de 2015, ante 85% ao fim de 2014. O número e a representatividade das instituições financeiras que financiam parte de suas operações de longo prazo com passivos menos estáveis permaneceram praticamente inalterados. 26/ O ILE tem como objetivo mensurar se os bancos possuem fontes suficientemente estáveis de recursos para financiar suas atividades de longo prazo. Assim, instituições com ILE igual ou superior a um (100%) são menos suscetíveis a futuros problemas de liquidez. Para detalhes da definição da métrica vide boxe Índice de Liquidez Estrutural e no anexo Conceitos e Metodologias, item b. 12 8 4 Dez 2010 Jun 2011 Dez Jun 2012 Dez Jun 2013 Dez Jun 2014 Dez 0 Jun 2015 Captações externas mantidas no exterior versus captações totais Captações externas que ingressam (vinculadas) versus captações totais Captações externas que ingressam (livres) versus captações totais Base de dados 27/ A métrica Captações externas mantidas no exterior versus captações totais está sendo alterada a partir desta edição do REF. Foram incluídas as captações em depósitos interfinanceiros pelas dependências dos bancos brasileiros no exterior junto a não ligadas. O indicador foi recalculado desde o início da série, resultando na elevação das captações mantidas no exterior de 5,2% para 6,2% das captações totais no fechamento do primeiro semestre de 2015. Outubro 2015 | Relatório de Estabilidade Financeira | 18 Gráfico 2.2.6 – Perfil das captações externas Valores absolutos em dólares US$ bi 250 200 150 100 50 Jun 2011 Dez Jun 2012 Dez Jun 2013 Dez Jun 2014 Dez 0 Jun 2015 Captações externas mantidas no exterior Captações externas que ingressam (vinculadas) Captações externas que ingressam (livres) Base de dados Assim, o risco de liquidez agregado permanece baixo, tanto em uma perspectiva de curto como de médio prazo. A distribuição do risco de liquidez entre as instituições financeiras demonstra situação confortável, e a dependência de funding externo continua reduzida. Em suma, as instituições financeiras apresentam capacidade de suportar cenários adversos de restrição de liquidez. Outubro 2015 | Relatório de Estabilidade Financeira | 19 Índice de Liquidez Estrutural 1 Contexto do desenvolvimento da métrica A crise financeira internacional revelou fragilidades na gestão do risco de liquidez por parte dos bancos e chamou a atenção dos reguladores para a necessidade de se desenvolverem mecanismos de monitoramento e gestão desse risco, tanto no campo microprudencial quanto em âmbito sistêmico. Em resposta a essas vulnerabilidades, o Comitê de Supervisão Bancária da Basileia (BCBS) estabeleceu, dentro do arcabouço denominado Basileia III, dois requerimentos de liquidez. Um deles, denominado Liquidity Coverage Ratio (LCR)1, refere-se a um indicador de liquidez de curto prazo que já foi incorporado à regulamentação brasileira2 e será exigido a partir de outubro de 2015. Outro requerimento, denominado Net Stable Funding Ratio (NSFR)3, abrange a liquidez estrutural e tem recomendação de implementação a partir de 2018, conforme cronograma acordado pelos países do G-20. Buscando incorporar os conceitos do NSFR ao processo regular de monitoramento, o BCB desenvolveu o Índice de Liquidez Estrutural (ILE), proxy do indicador do BCBS. 2 Síntese dos conceitos e da metodologia O risco de liquidez estrutural ocorre quando ativos de longo prazo4 são financiados com recursos que podem 1/ <http://www.bis.org/publ/bcbs238.htm> 2/ Resolução CMN n° 4.401, de 27 de fevereiro de 2015, com metodologia definida pela Circular BCB nº 3.749, de 5 de março de 2015. 3/ <http://www.bis.org/bcbs/publ/d295.htm> 4/ No risco de liquidez, são considerados de longo prazo os ativos e os passivos com maturidade acima de um ano. ser exigidos no curto e no médio prazo. Para que não ocorram problemas futuros de liquidez, esses ativos necessitam de funding compatível com sua estrutura de vencimentos. Para mensurar esse risco, construiu-se o ILE, que corresponde à razão entre os recursos estáveis disponíveis – formados pelas captações que a instituição espera manter no horizonte de um ano (recursos de terceiros) e pelo capital (recursos próprios) – e os recursos estáveis necessários – representados pelo total de ativos, até mesmo fora de balanço, com prazos acima de um ano e/ou baixa liquidez. Um índice superior a 1,0 (100%) sugere uma estrutura de funding adequada ao tipo de negócio da instituição financeira. Os recursos estáveis disponíveis e necessários são calculados com base na soma dos saldos das contas passivas (incluindo-se o patrimônio) e ativas, respectivamente, após a aplicação de fatores de ponderação5, que refletem o grau de exigibilidade6 e de liquidez7 desses componentes. As informações de prazos e contrapartes são obtidas nas centrais de registro e custódia e no Sistema de Informações de Crédito (SCR). 3 Análise da liquidez estrutural do sistema bancário Na evolução do ILE (Gráfico 1), pode-se observar os efeitos das mudanças ocorridas no Sistema Financeiro Nacional (SFN) nos últimos anos. 5/ Para detalhes dos ponderadores aplicados, vide anexo Conceitos e Metodologias, item b. 6/ Quanto maior o ponderador (0% a 100%), maior a estabilidade do funding. 7/ Quanto maior o ponderador (0% a 100%), maior a necessidade de o ativo ser financiado com recursos estáveis. Outubro 2015 | Relatório de Estabilidade Financeira | 20 A ampliação de instrumentos de captação com maior maturidade, como Letras Financeiras (LF), e aqueles direcionados a clientes de varejo – principal fonte de financiamento estável dos bancos (Gráfico 2) –, tais como emissões de letras de crédito e depósitos de poupança, elevaram a participação das captações consideradas como recursos estáveis disponíveis no passivo total, que passaram de 63% em dezembro de 2011 para 66% em junho de 2015. No lado do ativo, o crescimento de modalidades de crédito mais longas como crédito consignado e imobiliário, que constituem a principal exigência por funding estável (Gráfico 3), juntamente com o aumento de títulos de baixa liquidez8 e outros ativos de longo prazo, tais como créditos tributários e participações societárias, elevaram a necessidade por recursos estáveis, saindo de 56% dos ativos totais em dezembro de 2011 para 62% em junho de 2015. Gráfico 1 – ILE e representatividade dos componentes no balanço un. % 1,15 75 1,09 70 1,03 65 0,97 60 0,91 55 0,85 Dez 2011 Jun Dez 2012 Jun Dez 2013 Jun Dez 2014 Jun 50 Recursos estáveis necessários/ativos totais Recursos estáveis disponíveis/passivos totais ILE (eixo da esquerda) Base de dados Gráfico 2 – Evolução dos recursos estáveis disponíveis Valores ponderados R$ bilhões 4.000 O processo de alongamento de captações e concessão de empréstimos de longo prazo perde força a partir de meados de 2014, fazendo com que o ILE, que vinha se reduzindo gradativamente, esteja praticamente estável e em nível acima do mínimo desejável (1,07 em junho de 2015). Assim, pode-se afirmar que as instituições financeiras têm conseguido alongar as operações de crédito e viabilizar a continuidade do processo de intermediação financeira sem comprometer a gestão do risco de liquidez estrutural. 13% 13% 15% 22% 21% 15% 22% 24% 21% 20% 12% 22% 22% 22% 23% 41% 41% 43% 43% 43% Dez 2011 Dez 2012 Dez 2013 Dez 2014 Jun 2015 3.200 2.400 1.600 800 0 Captações varejo (< 1 ano) Captações varejo/atacado (> 1 ano) Capital Captações atacado (< 1 ano) Base de dados Gráfico 3 – Evolução dos recursos estáveis necessários Valores ponderados R$ bilhões 4.000 21% 10% 11% 21% 12% 12% 47% 47% Dez 2011 Dez 2012 19% 20% 3.200 12% 11% 12% 10% 2.400 50% 52% 51% Dez 2013 Dez 2014 Jun 2015 20% 12% 11% 1.600 800 0 Operações de crédito longo prazo Operações de crédito curto prazo TVM e derivativos Outros ativos Base de dados 8/ Títulos Públicos Federais (TPFs) vinculados a garantias e títulos privados sem liquidez no mercado secundário. Outubro 2015 | Relatório de Estabilidade Financeira | 21 2.3Crédito No primeiro semestre de 2015, o ambiente de crédito caracterizou-se pelo aprofundamento de tendências observadas no semestre anterior: desaquecimento econômico, juros mais elevados, condições menos favoráveis no nível de emprego e redução no nível de confiança dos consumidores e dos empresários. Esse cenário levou à redução na demanda por crédito e à adoção de critérios de concessão mais conservadores por parte das instituições financeiras. Tal ambiente contribuiu para reduzir a taxa de crescimento da carteira de crédito do SFN, ocorrendo, até mesmo, variação real negativa nos bancos privados. Como consequência do ambiente mais adverso, houve aumento nas taxas de inadimplência, principalmente no crédito a pequenas e médias empresas e nas linhas concedidas a pessoas físicas que apresentam maior risco de inadimplência, como cheque especial, empréstimo sem consignação e rotativo de cartão de crédito. Em todas essas situações, esse efeito foi mais pronunciado nos bancos públicos, uma vez que os bancos privados, conforme já destacado em Relatórios de Estabilidade Financeira (REFs) anteriores, vem, há alguns semestres, direcionando suas carteiras para linhas de crédito com menor inadimplência. Apesar do cenário e dos aumentos nas linhas destacadas, a inadimplência agregada do sistema não apresentou aumento significativo até o encerramento do semestre, variando 0,2 ponto percentual (p.p.). Essa variação foi em parte contida por cessões de créditos inadimplentes e renegociações de crédito. Destaca-se que o montante de provisões continua significativamente superior à inadimplência, o que evidencia a resistência do sistema de crédito ante o cenário acima descrito. Há, no entanto, diferenças relevantes entre esses indicadores de crescimento, inadimplência e provisões quando segmentados por tipo de controle, por porte de tomador ou por produto, conforme análises a seguir. O estoque de crédito doméstico28 continuou a crescer no primeiro semestre, mas a taxas cada vez menores. Até junho de 2015, o crescimento em doze meses ficou em 9,8% (Gráfico 2.3.1). Esse percentual inclui a 28/ Crédito doméstico: operações de crédito concedidas por instituições financeiras no Brasil. contribuição da desvalorização cambial, que elevou o estoque em reais das operações referenciadas em moeda estrangeira29. Descontando a inflação do período, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), de 8,9%, o crescimento real foi de 0,9% (Gráfico 2.3.2). Essa redução no crescimento foi observada tanto nos bancos públicos quanto nos privados. Nos públicos, a carteira de crédito doméstico encerrou junho de 2015 com variação em doze meses de 14,3%, ante 17,2% um ano antes. Nos bancos privados, apesar de o ritmo de crescimento ser bem inferior ao dos bancos públicos nos últimos três anos, também houve desaceleração no período: a variação em doze meses ficou em 4,7%, contra 5,9% no período anterior, em termos nominais. O crescimento real do crédito nos bancos públicos e privados foi de 5,0% e -3,8%, respectivamente, de junho de 2014 a junho de 2015 (Gráfico 2.3.2)30. As diferentes taxas de crescimento entre esses dois segmentos fizeram aumentar novamente a participação das instituições públicas no crédito doméstico total, que atingiu 55,0% em junho de 2015. Gráfico 2.3.1 – Crescimento anual nominal do crédito doméstico por controle % 35 28 21 14 7 Jun 2010 Dez Jun 2011 Dez Jun 2012 Público Dez Jun 2013 Privado Dez Jun 2014 Dez 0 Jun 2015 Total Base de dados As taxas de juros continuaram sua trajetória de elevação no primeiro semestre de 2015 (Gráfico 2.3.3), tanto para os créditos livres quanto para os direcionados, influenciada pelo repasse, por parte das instituições financeiras, das elevações da taxa Selic31 e pela revisão 29/ Do total de operações do crédito doméstico em junho de 2015, 7,2% eram representadas por operações referenciadas em moeda estrangeira, quase sempre o dólar dos Estados Unidos da América (EUA). A desvalorização de 40,9% do real ante o dólar dos EUA no período de doze meses foi responsável por aproximadamente 2,0 p.p. do crescimento anual das operações de crédito doméstico. 30/ Valores do Gráfico 2.3.2 deflacionados, considerando a variação do IPCA. 31/ No segundo semestre de 2014, a meta para a taxa Selic variou de 11,00% para 11,75%. No primeiro semestre de 2015, variou de 11,75% para 13,75%. Outubro 2015 | Relatório de Estabilidade Financeira | 22 da política governamental para o crédito direcionado32. Aumentos foram observados em todas as modalidades de crédito, com mais intensidade naquelas que apresentam maior inadimplência, como cheque especial, rotativo de cartão de crédito e crédito pessoal não consignado. Gráfico 2.3.2 – Crescimento anual deflacionado do crédito doméstico por controle % 24 18 12 6 0 crédito33. O aumento da inadimplência foi mais relevante nos bancos públicos, embora nos bancos privados também tenha havido acréscimo, invertendo a tendência dos últimos anos (Gráfico 2.3.4). No primeiro semestre de 2015, manteve-se a tendência de diminuição da diferença entre a inadimplência dos bancos privados e a dos bancos públicos. Esse processo se iniciou em 2013, quando os bancos privados aumentaram a sua aversão ao risco e passaram a mudar a composição de sua carteira de crédito, privilegiando modalidades de menor risco de inadimplência. Por outro lado, os bancos públicos seguiram tendência contrária, o que explica, em parte, o aumento de sua inadimplência. Gráfico 2.3.4 – Inadimplência por controle % Jun 2010 Dez Jun 2011 Dez Jun 2012 Público Dez Jun 2013 Privado Dez Jun 2014 Dez -6 6,0 Jun 2015 4,8 Total 3,6 Base de dados 2,4 Gráfico 2.3.3 – Evolução das taxas de juros anuais Recursos livres e direcionados 1,2 % 60 48 Jun 2011 Dez Jun 2012 Dez Público 12 Jun 2011 Dez Jun 2012 Dez Jun 2013 Dez Jun 2014 Dez Livre PJ Livre PF Direcionado PJ Direcionado PF 0 Jun 2015 Base de dados Apesar do cenário adverso, a inadimplência não teve aumento significativo, atingindo 2,9% em junho de 2015, índice 0,2 p.p. superior a dezembro de 2014. Ressaltese, porém, que tal aumento ocorreu mesmo diante de eventos que tendem a arrefecer esse indicador, como a realização, na carteira de operações inadimplentes, de cessões sem retenção de riscos e de renegociações de 32/ Nos empréstimos direcionados, o aumento de taxas decorre da política de redução de subsídios governamentais na economia, especialmente em relação ao crédito rural e às operações com repasses do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Dez Privado Jun 2014 Dez 0,0 Jun 2015 Total Base de dados 36 24 Jun 2013 A pré-inadimplência 34 , que constitui indicador antecedente da inadimplência, aumentou no primeiro semestre de 2015 em patamares mais elevados dos que os ocorridos nos primeiros semestres dos anos anteriores (Gráfico 2.3.5). Tradicionalmente, a pré-inadimplência aumenta no primeiro trimestre e recua no segundo. Neste ano, no entanto, não mostra sinais de recuo, tendo havido aumento atípico em junho. Esse movimento aponta para provável continuidade de pressão para aumento da inadimplência durante o segundo semestre. A cobertura da inadimplência por provisões continua satisfatória, conforme corroborado pelo cálculo do Índice de Cobertura da Inadimplência (ICI)35, uma vez 33/ Em junho de 2015, houve cessões de operações inadimplentes, sem retenção de riscos, realizadas por bancos públicos para fora do SFN. A cessão de créditos inadimplentes sem retenção de riscos implica a baixa contábil desses ativos, reduzindo o índice de inadimplência da instituição cedente. Tanto as cessões quanto as renegociações de operações inadimplentes foram mais relevantes nos bancos públicos. 34/ A pré-inadimplência é mensurada pelo quociente entre o saldo total de operações de crédito que apresentam parcelas vencidas entre 15 e 90 dias e o saldo total da carteira de crédito. 35/ O ICI mede a razão entre a provisão contabilizada e o saldo total das operações vencidas há mais de noventa dias. Outubro 2015 | Relatório de Estabilidade Financeira | 23 que a provisão é, aproximadamente, 70% maior do que a inadimplência, tanto nos bancos públicos quanto nos privados (Gráfico 2.3.6). Gráfico 2.3.5 – Pré-inadimplência 15 dias a 90 dias por controle % 6,0 4,8 inadimplência. Destaque-se que esse grupo representa mais de 95% da carteira de crédito doméstico em junho de 2015. Por outro lado, instituições financeiras com indicador inferior a 1,0 representam somente 3,1% do total da carteira de crédito doméstico (Gráfico 2.3.8). Gráfico 2.3.7 – Inadimplência, provisões e baixas para prejuízo % Jun 2011 Dez Jun 2012 Dez Público Jun 2013 Dez Privado Jun 2014 Dez 3,6 6,0 2,4 4,8 1,2 3,6 0,0 Jun 2015 2,4 1,2 Total Jun 2011 Base de dados Dez Jun 2012 Dez Jun 2013 Dez Jun 2014 0,0 Jun 2015 Dez Carteira de crédito classificada nos níveis de E até H Provisões Inadimplência Créditos baixados doze meses seguintes Gráfico 2.3.6 – Índice de Cobertura da Inadimplência por segmento 3,0 Base de dados 2,4 1,8 Gráfico 2.3.8 – Distribuição de frequência para o Índice de Cobertura da Inadimplência1/ 1,2 55% 61 0,6 Jun 2011 Dez Jun 2012 Público Dez Jun 2013 Dez Privado Jun 2014 Dez 58 0,0 Jun 2015 33% 14 12 A avaliação da suficiência da cobertura da inadimplência por provisões permanece, como no semestre anterior, sendo corroborada por outras métricas, como a relação entre as provisões constituídas e os créditos baixados para prejuízo nos doze meses seguintes, ou, especialmente, pela manutenção da proporção entre as provisões constituídas e o total da carteira que apresenta maior risco, composta pelas operações de crédito classificadas nos níveis de E a H (Gráfico 2.3.7). A análise da dispersão do ICI por instituição financeira36 evidencia que a ampla maioria das instituições continua a apresentar provisões no mínimo 30% superiores à 36/ O termo instituição financeira utilizado aqui engloba tanto as instituições financeiras pertencentes a conglomerados quanto instituições financeiras independentes. Nesse teste, as cooperativas de crédito e as instituições financeiras não bancárias não foram consideradas, pois, apesar de serem em grande número, respondiam somente por 3,2% do crédito doméstico total em junho de 2015. 22% 13 11 Total Base de dados 44% 11% 8 7 <0,7 11 18 16 13 0,7≤IC<1 1≤IC<1,3 Dezembro 2014 1,3≤IC<1,6 1,6≤IC<1,9 ≥1,9 0% Junho 2015 1/ As barras indicam a representatividade da carteira e os valores sobre as barras referem-se ao número de instituições financeiras com Índice de Cobertura da Inadimplência naquele intervalo. Base de dados Relativamente ao crédito às famílias, considerando o cenário descrito no início desta seção, importante ponto a ser avaliado refere-se à preservação da capacidade de pagamento das pessoas físicas. Nesse sentido, os indicadores de comprometimento de renda mantêm níveis relativamente similares aos observados no semestre anterior, mas com sinais que demandam atenção contínua. Observa-se que o Comprometimento de Renda das Famílias (CRF)37 indica leve alta em 2015 (Gráfico 2.3.9), influenciado por crescimento menor da renda, aumento da taxa de juros e maior participação de dívidas mais caras no total do endividamento. 37/ Divulgado no Sistema Gerenciador de Séries Temporais (SGS) – Série 19.881. Outubro 2015 | Relatório de Estabilidade Financeira | 24 Gráfico 2.3.9 – Comprometimento de renda Pessoa física % 24 23 22 22 financiamento imobiliário contratadas no âmbito do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE) sofreram a maior desaceleração, impactadas pela menor disponibilidade de recursos. A queda nos depósitos de poupança levou diversos bancos a adotarem políticas de concessão mais restritivas, por meio da redução do percentual máximo de financiamento do valor do imóvel, principalmente, e do aumento nas taxas de juros. 21 Jun 2012 Dez Jun 2013 Dez Jun 2014 20 Jun 2015 Dez CRF Base de dados O Comprometimento de Renda dos Tomadores de Crédito no SFN (CRTC)38 também indica pequena elevação no semestre. Entretanto, a análise por faixa de renda aponta estabilidade, exceto na faixa de menor renda (Gráfico 2.3.10). Gráfico 2.3.10 – CR dos tomadores de crédito no SFN Pessoa física % 25 20 15 A carteira de crédito pessoal consignado retomou a tendência de redução gradual do crescimento que vinha sendo observada desde 2013, interrompida no segundo semestre de 2014 pelo aumento das concessões e refinanciamentos ocorrido em razão da elevação dos prazos máximos regulamentares do crédito consignado para servidores públicos federais e para aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS)39. A retração da carteira de financiamento de veículos aprofundou-se e atingiu variação anual negativa de 8,5% ao fim do semestre. Contribuíram para essa retração, num primeiro momento, o fim da alíquota reduzida de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) em dezembro de 2014, que impactou significativamente as vendas de veículos em 2015, e posteriormente o cenário de maior desemprego e queda da confiança, que atua desestimulando a aquisição de bens de consumo. 10 5 Até 3 s.m. 3 a 5 s.m. 5 a 10 s.m. Dezembro 2014 > 10 s.m. SFN Gráfico 2.3.11 – Crescimento anual do crédito Principais modalidades PF % 0 40 Junho 2015 30 Base de dados O crescimento da carteira de crédito a pessoas físicas sofreu desaceleração nas principais modalidades (Gráfico 2.3.11), consequência do cenário econômico mais adverso. A carteira de financiamento imobiliário apresentou desaceleração expressiva no segundo trimestre, embora tenha mantido a maior taxa de crescimento entre as modalidades, superior a 20% a.a. As operações de 38/ O Comprometimento de Renda dos Tomadores de Crédito considera apenas a renda das pessoas físicas que possuem endividamento no SFN. É realizado o cálculo individualizado, tomador a tomador, e, então, é utilizada a mediana. Trata-se de métrica distinta do comprometimento de renda das famílias, divulgado no SGS – Série 19.881, que computa a renda de toda a população conforme metodologia utilizada internacionalmente. Para maiores detalhes sobre o Comprometimento de Renda dos Tomadores de Crédito no SFN, ver anexo Conceitos e Metodologias, item c. 20 10 0 Dez 2012 Jun 2013 Dez 2013 Jun 2014 Dez 2014 Imobiliário Consignado Cartão de crédito Sem consignação -10 Jun 2015 Veículos Base de dados Apesar de a inadimplência da carteira de pessoas físicas ter se mantido estável no semestre, comportamentos 39/ As operações de crédito consignado para servidores públicos federais tiveram o prazo máximo elevado de 60 meses para 96 meses e para aposentados e pensionistas do INSS de 60 para 72 meses. Outubro 2015 | Relatório de Estabilidade Financeira | 25 distintos são observados nas principais modalidades (Gráfico 2.3.12). A inadimplência das operações de cartão de crédito e de crédito pessoal sem consignação, modalidades mais sensíveis a pioras no cenário econômico, apresentaram crescimento acentuado no segundo trimestre, movimento ocorrido principalmente nos bancos públicos40. O nível de atrasos da carteira de financiamento de veículos permaneceu estável no semestre, após o fim do longo ciclo de queda da inadimplência, que vinha ocorrendo nos últimos anos, consequência da adoção de políticas conservadoras de concessão pelas instituições financeiras e das baixas para prejuízo das operações de risco elevado concedidas até 2012. Nos semestres anteriores, a queda da inadimplência da carteira de veículos vinha contribuindo significativamente para a redução desse mesmo indicador para o agregado de crédito a pessoas físicas. Esse efeito cessou em 2015, com a estabilização dos atrasos. A inadimplência da carteira de crédito imobiliário apresentou comportamento semelhante ao observado nos semestres anteriores, com tendência de aumento até maio e redução acentuada em junho. Parte significativa dessa redução na inadimplência decorre das renegociações de contratos em atraso que são realizadas com maior intensidade no último mês do semestre, principalmente pelos bancos públicos. Trimestral de Condições de Crédito no Brasil (PTCC) de junho de 2015, realizada pelo BCB, indica arrefecimento adicional na oferta e na demanda de crédito. Essa retração tende a ocorrer tanto no crédito de consumo quanto no financiamento habitacional e é motivada pela deterioração das condições de emprego, pelo comprometimento de renda dos tomadores de crédito, pelo aumento da inadimplência e pela menor confiança dos consumidores. No crédito habitacional, também contribuem para esse cenário a maior taxa de juros e a menor disponibilidade de funding. Passando à análise do crédito às pessoas jurídicas, destaca-se no semestre a redução na taxa de crescimento do endividamento total das empresas não financeiras41. Tanto o crédito bancário doméstico quanto o mercado de capitais registraram queda na representatividade sobre o endividamento total. A participação da dívida contraída no mercado externo, por sua vez, aumentou de 28,9% em dezembro de 2014 para 32,2% em junho de 2015 (Gráfico 2.3.13). Esse incremento, no entanto, ocorreu como consequência da variação cambial no período e não de novas captações no exterior. Gráfico 2.3.13 – Participação no endividamento PJ Por fonte de recursos % 100 80 Gráfico 2.3.12 – Inadimplência Principais modalidades PF 60 % 40 10 20 8 6 4 Jun 2012 Dez Jun 2013 Crédito livre Mercado de capitais 2 Jun 2011 Dez 2011 Jun 2012 Dez 2012 Jun 2013 Dez 2013 Jun 2014 Dez 2014 Dez Jun 2014 Dez 0 Jun 2015 Crédito direcionado Mercado externo Base de dados 0 Jun 2015 Em relação às perspectivas para o mercado de crédito à pessoa física para os próximos meses, a Pesquisa A desvalorização do real ante o dólar pode suscitar preocupações quanto à capacidade de pagamento das empresas, porém uma avaliação mais detalhada aponta para riscos controlados numa perspectiva agregada do SFN. Observa-se que parte significativa da dívida vinculada a moeda estrangeira refere-se a empresas exportadoras, que possuem hedge natural relativo à sua atividade operacional, a companhias que utilizam 40/ A queda da inadimplência da modalidade crédito pessoal sem consignação em junho decorre de cessão sem retenção de riscos de operações inadimplentes para fora do SFN. 41/ No endividamento pessoa jurídica, são considerados o crédito bancário doméstico, o mercado de capitais (debêntures e notas promissórias) e a dívida externa. Imobiliário Consignado Cartão de crédito Sem consignação Veículos Base de dados Outubro 2015 | Relatório de Estabilidade Financeira | 26 o mercado de derivativos local para proteger suas exposições, a corporações que pertencem a um grupo econômico com sede no exterior, o que aumentaria a possibilidade de suporte financeiro intragrupo, e, ainda, a firmas com ativos no exterior em montante relevante, que possam compensar ou justificar economicamente a exposição em moeda estrangeira. O grupo de devedores que não possui proteção cambial relevante e conhecida42 é restrito. A exposição em moeda estrangeira dessas empresas aumentou de 3,1% do PIB em dezembro de 2014 para 3,3% em junho de 2015 (Gráfico 2.3.14), refletindo a desvalorização do real no período. Para esse grupo de empresas não exportadoras, sem hedge financeiro identificado, sem suporte intragrupo e sem ativos no exterior, o impacto da variação cambial em suas dívidas pode resultar em fragilidade financeira e, ainda que até o momento não tenha se traduzido em aumento de sua inadimplência no SFN, trata-se de situação continuamente monitorada. Gráfico 2.3.14 – Dívida das empresas não financeiras Por moeda 3,1 3,1 3,3 3,6 3,3 4,0 6,4 7,3 28,8 28,1 Os bancos públicos, que vinham sustentando a oferta de crédito para as PMEs, encerraram o semestre com crescimento próximo a zero nesse segmento, e os privados apresentam retração nessa carteira desde maio de 2014. Para as grandes empresas, embora os bancos privados tenham registrado taxa de crescimento do crédito menor em 2015, em torno de 16%, os públicos mantêm ritmo próximo a 20% em relação a um ano antes. Gráfico 2.3.15 – Crescimento anual do crédito Pessoa jurídica % 36 27 18 % PIB Jun 2015 9 50 0 40 30 20 Dez 2014 crédito à pessoa jurídica, visto que a carteira de crédito para tais empresas registrou desaceleração cada vez maior, e a carteira para as de grande porte ainda indica crescimento anual de 18,7%, patamar semelhante ao observado em semestres anteriores (Gráfico 2.3.15). Jun 2012 Dez Jun 2013 Dívida em moeda estrangeira (não exportadora sem hedge - outros) Dívida em moeda estrangeira (não exportadora sem hedge - com ativo no exterior) Dívida em moeda estrangeira (não exportadora sem hedge - matriz no exterior) Dívida em moeda estrangeira (não exportadora com hedge local) Dívida em moeda estrangeira (exportadora) Dívida em moeda local Base de dados No crédito bancário doméstico, o estoque de crédito às pessoas jurídicas manteve crescimento inferior ao estoque de crédito às pessoas físicas. A análise por porte indica que as pequenas e médias empresas (PMEs)43 continuaram perdendo participação no estoque total de 42/ Para detalhes sobre os conceitos utilizados para definir cada grupo de empresas com exposição em moeda estrangeira, ver boxe Evolução do Endividamento das Empresas não Financeiras após a Crise Internacional de 2008, do Relatório de Estabilidade Financeira de setembro de 2014. 43/ A segregação por porte utilizou como proxy o valor devido das operações de crédito doméstico. As PMEs são aquelas cujas dívidas são inferiores a R$100 milhões, e as grandes, as com dívidas iguais ou superiores a R$100 milhões. Jun 2014 Dez -9 Jun 2015 PME – Total PME – Privado PME – Público Grandes – Total Grandes – Privado Grandes – Público 10 0 Dez Base de dados A inadimplência das PMEs nos bancos públicos consolidou a tendência de alta e atingiu o maior valor da série histórica no primeiro semestre de 2015, chegando a 5,2% em maio de 2015. Nos bancos privados, também se observa ascensão da inadimplência nesse segmento, embora em menor magnitude (Gráfico 2.3.16), pois medidas para reduzir o risco foram adotadas por tais instituições financeiras desde 2013. Nas empresas de grande porte, o aumento da inadimplência em 2015 foi influenciado fortemente por algumas empresas do setor de energia nos bancos privados. A pré-inadimplência 44 manteve-se em patamares superiores aos observados em períodos anteriores (Gráfico 2.3.17), o que indica provável aumento da inadimplência para ambos os portes no próximo semestre, 44/ A reversão da pré-inadimplência nas grandes empresas ao final do semestre está associada à renegociação de créditos em atraso. Outubro 2015 | Relatório de Estabilidade Financeira | 27 se os créditos que se encontram nesta situação não forem cedidos, renegociados e/ou regularizados. Gráfico 2.3.16 – Inadimplência Pessoa jurídica % 6 5 Em se tratando das perspectivas de mercado, tanto para pessoas físicas quanto para empresas, o ritmo cada vez menor de crescimento das carteiras, observado ao longo de 2014, continuou presente em 2015, o que indica manutenção do baixo crescimento do crédito no segundo semestre. Quanto à inadimplência, a eventual manutenção do cenário adverso para o crédito indica provável continuidade da tendência de aumento dos atrasos nos próximos meses. 4 2 1 Jun 2012 Dez Jun 2013 Dez Jun 2014 Dez 0 Jun 2015 PME – Total PME – Privado PME – Público Grandes – Total Grandes – Privado Grandes – Público Base de dados Gráfico 2.3.17 – Pré-inadimplência 15 dias a 90 dias Pessoa jurídica % 5 4 3 2 1 Jun 2012 Dez Jun 2013 Total PJ Dez Jun 2014 PME Dez Jun 2015 0 Grande Base de dados Para o universo das empresas não financeiras, a Pesquisa Trimestral de Condições de Crédito no Brasil (PTCC) indica uma expectativa de oferta menor de crédito para as grandes empresas ao longo do próximo trimestre, em razão das condições gerais da economia doméstica, das condições específicas da indústria/setor ou empresa e da percepção de risco de cada cliente. No caso das micro, pequenas e médias empresas, os níveis de inadimplência e de tolerância ao risco continuam sendo os principais limitadores à oferta de crédito. Do ponto de vista da demanda, o principal fator de impacto para a tomada de crédito é a redução da necessidade de investimento em capacidade instalada e, para as micro, pequenas e médias empresas, também o aumento na taxa de juros. Ainda assim, o SFN apresenta fundamentos adequados para fazer frente a esse ambiente, notadamente, políticas conservadoras na concessão de crédito, conjugadas com elevado grau de provisões em relação à inadimplência para a cobertura da eventual materialização dos riscos advindos do cenário macroeconômico. Por fim, em que pese os bons indicadores de resistência apresentados e a adequada capacidade do sistema bancário para suportar cenários adversos, evidenciada pelos testes de estresse, convém destacar os eventos com maior potencial de impacto e que, por essa razão, são objetos de contínuo monitoramento. Os principais fatores de risco que podem impactar ainda mais o mercado de crédito e a inadimplência estão associados aos efeitos de eventual deterioração mais significativa dos ambientes econômicos interno e externo, gerando pressões adicionais sobre emprego e renda das famílias e sobre custos e receitas das empresas. Novos requerimentos de recuperação judicial de empresas como as envolvidas na operação Lava Jato e o endividamento das empresas em moeda estrangeira são exemplos de situações que demandam atenção especial. No caso do endividamento em moeda estrangeira, ressalte-se o efeito mitigador de riscos proporcionado pela existência em larga escala de hedge operacional e financeiro. 2.4Rentabilidade A rentabilidade do sistema bancário apresentou elevação no primeiro semestre de 2015. O Retorno sobre o Patrimônio Líquido (RSPL) do sistema bancário atingiu 14,8% a.a. em junho de 2015, alta de 1,7 p.p. em relação a dezembro de 2014. O aumento no lucro líquido (LL) do sistema foi impulsionado principalmente pelo resultado dos bancos privados, que cresceu 20,2% no período. Já o LL dos bancos públicos apresentou alta de 9,8%. No Outubro 2015 | Relatório de Estabilidade Financeira | 28 entanto, desconsiderando resultados não recorrentes45, houve avanço moderado nos privados e recuo da rentabilidade nos públicos (Gráficos 2.4.1 e 2.4.2). Gráfico 2.4.1 – Retorno sobre o Patrimônio Líquido anual1/ 2/ Acumulado nos últimos doze meses un. % 2,2 18 2,0 15 1,8 12 1,6 9 1,4 6 1,2 Dez Jun 2009 2010 Dez Jun 2011 Dez Jun 2012 Dez Jun 2013 Dez Jun 2014 Dez Jun 2015 3 As condições econômicas adversas limitaram a expansão das carteiras de crédito, o que aumentou a relevância de fontes alternativas de receita. Permanece o crescimento da participação de rendas advindas do setor de seguros, previdência e capitalização, de meios de pagamento e serviços na formação do lucro líquido. Desse modo, a diversificação das receitas torna o sistema bancário menos dependente dos resultados de intermediação financeira e mais resiliente aos ciclos econômicos. (Gráfico 2.4.3). Gráfico 2.4.3 – Composição do resultado, antes de tributos sobre faturamento e lucro Acumulado nos últimos doze meses R$ bilhões R$ bilhões 240 120 184 90 128 60 72 30 16 0 RSPL anual RSPL anual ajustado1/ Proxy para taxa livre de risco2/ RSPL anual / proxy para taxa livre de risco (eixo da esquerda) RSPL anual ajustado / proxy para taxa livre de risco (eixo da esquerda) 1/ Desconsidera resultados não recorrentes. 2/ Para efeito de comparação com o RSPL, utilizou-se como proxy para taxa livre de risco a média anual da Selic acumulada nos últimos 36 meses, multiplicada por 0,85 para minimizar efeitos tributários. O prazo de 36 meses foi definido com base no prazo médio da carteira de crédito, principal fonte de receita do sistema bancário. Base de dados -40 Dez 2012 Jun 2013 Dez Jun 2014 Dez Jun 2015 -30 Resultado com crédito Gráfico 2.4.2 – Lucro líquido e RSPL anual por controle acionário Acumulado nos últimos doze meses Resultado com tesouraria Receitas com serviços Outros resultados operacionais e não operacionais Resultado de participação societária R$ bilhões % 84 26 67 22 50 18 34 14 17 10 0 Dez Jun Dez Jun Dez Jun Dez Jun Dez Jun Dez Jun 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 6 LL bancos públicos (eixo da esquerda) LL bancos privados (eixo da esquerda) RSPL bancos privados RSPL bancos privados ajustado1/ RSPL bancos públicos RSPL bancos públicos ajustado1/ 1/ Desconsidera resultados não recorrentes. Base de dados 45/ Em novembro de 2014, o Banco do Brasil (BB) e a Cielo fundaram uma empresa de cartões. Essa operação societária gerou acréscimo de R$3,2 bilhões ao LL do sistema bancário no primeiro trimestre de 2015. Além disso, o Banco Santander obteve decisão favorável no Supremo Tribunal Federal (STF) a respeito de cobrança de Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) incidente sobre instituições financeiras e, assim, reverteu provisões para contingências fiscais no valor de R$4,8 bilhões. O banco realizou reforço de provisões de R$1,6 bilhão, resultando em lucro líquido não recorrente de R$3,2 bilhões em junho de 2015. Despesas administrativas (eixo da esquerda) Base de dados O resultado líquido da intermediação financeira atingiu R$181,5 bilhões, aumento de 3,1% em relação a dezembro de 2014. A margem de intermediação foi positivamente influenciada pelo resultado de tesouraria, reflexo da elevação da Selic. Entretanto, a dinâmica entre bancos públicos e privados foi distinta. A maior participação de operações direcionadas na carteira de crédito dos bancos públicos reduz a capacidade de transferir aumentos da Selic às taxas de concessão. Além disso, a elevação das despesas de provisão, reflexo do rápido crescimento das carteiras de crédito e da piora do cenário econômico, pressionou as margens líquidas. Os bancos privados, por sua vez, já vinham direcionando suas concessões para operações de menor risco de inadimplência nos semestres anteriores. No entanto, as recentes condições econômicas provocaram elevação nas despesas de provisão. Ainda assim, os ajustes nas taxas de concessão e os resultados com tesouraria superaram Outubro 2015 | Relatório de Estabilidade Financeira | 29 as perdas com provisões, acarretando crescimento da margem líquida de intermediação (Gráficos 2.4.4 e 2.4.5). Gráfico 2.4.6 – Decomposição do índice de eficiência1/ não ajustado ao risco, por item de despesa % Gráfico 2.4.4 – Margem de intermediação financeira, por controle acionário1/ Acumulado nos últimos doze meses 64 51 % 38 12 26 10 13 8 6 Dez Jun Dez Jun Dez Jun Dez Jun Dez Jun Dez Jun Dez Jun Dez Jun 2011 2012 2013 2014 2015 2011 2012 2013 2014 2015 Bancos públicos comerciais 4 Dez 2009 Jun 2010 Dez Jun 2011 Dez Jun 2012 Dez Jun 2013 Dez Jun 2014 Dez Bancos privados (nacionais e estrangeiros) Outras despesas administrativas Instalações (manutenção, conservação, água, energia, gás e aluguel) TI, telecomunicações e comunicação Depreciação e amortização Serviços de terceiros Pessoal Índice de eficiência 2 Jun 2015 Margem bruta de intermediação financeira: bancos privados 0 1/ Mede a relação entre as despesas administrativas e as receitas de serviços e o resultado de intermediação financeira bruto. Quanto menor o índice, melhor a eficiência. Margem líquida de intermediação financeira: bancos privados Margem bruta de intermediação financeira: bancos públicos Margem líquida de intermediação financeira: bancos públicos Base de dados Margem bruta de intermediação financeira: sistema bancário Margem líquida de intermediação financeira: sistema bancário 1/ Resultado de intermediação financeira dos últimos 12 meses dividido pela média dos ativos geradores de renda de intermediação dos últimos 13 meses. Base de dados Gráfico 2.4.5 – Margem de crédito, por controle acionário Acumulado nos últimos doze meses % 18 14 A quantidade de instituições com retorno abaixo da proxy para taxa livre de risco apresentou pequeno aumento, de 72 para 74. O número de instituições com prejuízo acumulado em doze meses representou 4,0% dos ativos totais do sistema bancário, aumentando de 25 para 30 bancos no primeiro semestre de 2015, sendo 17 nacionais e 13 de controle estrangeiro (Gráfico 2.4.7). Gráfico 2.4.7 – Distribuição de frequência do RSPL anual1/ % dos ativos do sistema 11 100 7 80 4 Dez 2009 Jun 2010 Dez Jun 2011 Dez Jun 2012 Dez Jun 2013 Dez Jun 2014 Dez 60 0 60 Jun 2015 Rentabilidade líquida das operações: bancos privados Rentabilidade líquida das operações: bancos públicos Custo de captação: bancos privados Custo de captação: bancos públicos Margem líquida de crédito: bancos privados Margem líquida de crédito: bancos públicos Base de dados No primeiro semestre, permaneceram os esforços para melhorar os índices de eficiência, principalmente nos bancos privados. No entanto, após o crescimento acentuado das receitas de serviços e a contenção de despesas administrativas observadas nos últimos períodos, resta menos espaço para ganhos adicionais de eficiência (Gráfico 2.4.6). 25 47 30 RSPL < 0 59 20 44 0 < RSPL < 0,85 * Selic Dezembro 2014 40 RSPL > 0,85 * Selic 0 Junho 2015 1/ Os valores dentro das barras referem-se ao número de IFs com RSPL anual pertencente ao intervalo correspondente. Base de dados No segundo semestre, os resultados da intermediação financeira devem ser positivamente impactados por ajustes nas margens de intermediação, favorecidos por maiores resultados com tesouraria e por ajustes nas taxas de concessão de crédito. Os bancos devem seguir a tendência de busca por fontes alternativas de receita como seguros, meios de pagamento, cartões e serviços diversos, porém os ganhos adicionais de eficiência devem ser Outubro 2015 | Relatório de Estabilidade Financeira | 30 menores. Por fim, o ambiente econômico deve continuar exercendo pressão sobre os indicadores de inadimplência, com impactos diretos nas despesas de provisão. Gráfico 2.5.1 – Índices de capitalização e exigência regulatória1/ % 20 2.5Solvência A solvência do sistema bancário permaneceu estável e em patamar elevado no semestre, conforme revelam as métricas utilizadas para sua avaliação. Os índices de capitalização continuaram em níveis superiores aos requerimentos regulatórios, o que, associado aos resultados da simulação da plena implementação do arcabouço de Basileia III e da introdução do futuro requerimento de Razão de Alavancagem, confirmaram a confortável situação de solvência do sistema. Em junho de 2015, o Índice de Basileia (IB) atingiu 16,3% (Gráfico 2.5.1), redução de 0,4 p.p. em relação a dezembro de 2014, influenciado pelos ajustes prudenciais progressivos para a adoção completa das regras de Basileia III e por mudanças de escopo de consolidação46. É importante destacar que o capital principal, considerado de melhor qualidade, continuou superando os três requerimentos de capital em vigor [capital principal (de 4,5% dos ativos ponderados pelo risco – RWA), nível 1 (de 6,0% do RWA) e capital total (de 11% do RWA)], tendo o Índice de Capital Principal (ICP) apresentado redução de 0,2 p.p. no período, para 12,1%. O Patrimônio de Referência (PR) atingiu R$664,9 bilhões em junho de 2015, aumento de 0,2% em relação a dezembro de 2014. Destaca-se como fator de elevação do PR o resultado retido de aproximadamente R$24,0 bilhões e, como redutores, os aumentos de ajustes prudenciais progressivos de BIII (R$21,1 bilhões) e de outros ajustes de avaliação patrimonial (R$5,6 bilhões), em especial as obrigações referentes a planos de previdência de benefício definido de funcionários. 46/ As Resoluções nº 4.278 e nº 4.281, ambas de 31 de outubro de 2013, estabelecem que a apuração do Patrimônio de Referência (PR) e o cálculo dos requerimentos mínimos de capital, a partir de 1º de janeiro de 2015, devem ser feitos com base nas instituições integrantes do conglomerado prudencial. A Resolução nº 4.280, de 31 de outubro de 2013, estabelece que além das instituições financeiras e das demais instituições autorizadas a funcionar pelo BCB, devem compor o conglomerado prudencial: administradoras de consórcio; instituições de pagamento; sociedades que realizem aquisição de operações de crédito, incluindo-se imobiliário, ou de direitos creditórios, a exemplo de sociedades de fomento mercantil, sociedades securitizadoras e sociedades de objeto exclusivo; outras pessoas jurídicas sediadas no país que tenham por objeto social exclusivo a participação nas entidades mencionadas acima; e os fundos de investimentos nos quais as entidades integrantes do conglomerado prudencial, sob qualquer forma, assumam ou retenham substancialmente riscos e benefícios. 16,1 16,3 12,6 12,9 11,5 12,1 16 12 8 4 Dez 2013 Jun 2014 Dez 0 Jun 2015 Índice de Capital Principal Índice de Patrimônio de Referência Nível I Índice de Basileia 1/ As setas representam os requerimentos regulatórios para os diferentes níveis de capital. Desde janeiro de 2015, o requerimento de Nível I passa a ser de 6%, ante 5,5% que vigorou até dezembro de 2014. Base de dados O RWA aumentou 2,4% no semestre, para R$4.072,6 bilhões em junho de 2015, sendo 89% do montante total referentes a risco de crédito. As parcelas de risco de mercado e de risco operacional, essa última influenciada pelo cronograma de transição47, apresentaram crescimento percentual de 5,6% e 7,5%, respectivamente, superior à parcela de risco de crédito, que avançou 1,8%. Mesmo assim, a distribuição do cumprimento do ICP ponderado por ativos das instituições financeiras (Gráfico 2.5.2), embora mostre algum recuo em relação a dezembro de 2014, revela que todas as instituições, exceto uma de baixíssima representatividade, apresentaram nível de capital principal superior a 7% do RWA, que será o nível requerido em 2019, caso o adicional de capital principal mantenha-se nos limites inferiores estabelecidos48 no art. 8º, incisos I a IV, da Resolução nº 4.193, de 1º de março de 2013. Quando se simula a aplicação dos ajustes regulatórios de Basileia III em sua totalidade aos dados de junho de 2015, evidencia-se discreta melhora no nível de capitalização em relação aos resultados simulados para dezembro de 2014. Nesse caso, o IB projetado49 apresentaria aumento de 0,4 p.p., para 13%, com redução da necessidade 47/ Para maiores informações, ver Circular nº 3.739, de 17 de dezembro de 2014, disponível em <http://www.bcb.gov.br/pre/normativos/circ/2014/ pdf/circ_3739_v1_O.pdf>. 48/ A Circular nº 3.741, de 29 de dezembro de 2014, que dispõe sobre a fixação do valor do Adicional de Capital Principal (ACP), estabeleceu nos limites inferiores do art. 8º, incisos I a IV, da Resolução nº 4.193, de 1° de março de 2013, o valor do ACP que vigorará a partir de 1º de janeiro de 2016. 49/ A simulação da plena implementação de Basileia III foi ajustada e passou a deduzir os ativos intangíveis constituídos até outubro de 2013 e a adotar o fator F que vigerá em 2019 (8%), conforme artigo 4º da Resolução 4.193, de 2013. Outubro 2015 | Relatório de Estabilidade Financeira | 31 total50 de capital de R$10,7 bilhões para R$8,3 bilhões, equivalente a 1,2% do PR do SFN ou a um terço do lucro retido no semestre. A distribuição de frequência revela estabilidade no nível de capitalização das instituições financeiras (Gráfico 2.5.3.). Gráfico 2.5.4 – Distribuição de frequência para a Razão de Alavancagem ponderado por ativos1/ % 80 64 48 Gráfico 2.5.2 – Distribuição de frequência para o Índice de Capital Principal ponderado por ativos1/ 32 14 % 80 0 64 0-3% 3-5% 121 11 0 0 0 - 4,5 0 0 0 4,5-5,125 5,125-7 7-10,5 Dezembro 2014 5-7% 0 >10,5 17 16 99 7-9% 95 0 >9% Junho 2015 1/ Os valores dentro das barras referem-se ao número de IFs com Índice de Alavancagem pertencente àquele intervalo. Base de dados 16 8 1 32 13 Dezembro 2014 48 124 10 9 6 2 A percepção da robustez do SFN é corroborada quando se comparam métricas de estabilidade financeira entre pares internacionais. Os indicadores brasileiros, como o IB e a relação capital/ativos, uma medida mais simples de alavancagem, estão entre os maiores e colocam o país como um dos mais bem capitalizados ante os riscos assumidos (Gráfico 2.5.5). Junho 2015 1/ Os valores dentro das barras referem-se ao número de IFs com Índice de Basileia pertencente àquele intervalo. Base de dados Gráfico 2.5.3 – Distribuição de frequência para a projeção do Índice de Capital Principal ponderado por ativos1/ % 50 Gráfico 2.5.5 – Capital/ativos e IB Últimos dados disponíveis1/ Capital/ativos (%) 40 15 30 15 4 1 2 <4,5 0 15 112 108 8 4,5-5,125 5,125-7 Dezembro 2014 7-10,5 >10,5 USA IN 10 0 AR RU 20 SA CH 0 AU TU MX KO IT JP CA 12 ID 9 BR2/ FR 6 UK GE 3 Junho 2015 1/ Os valores dentro das barras referem-se ao número de IFs com Índice de Capital Principal pertencente àquele intervalo. Base de dados A solidez do SFN é também constatada quando se analisa a adequação das instituições financeiras em relação ao futuro requerimento regulatório, denominado Razão de Alavancagem51 (Gráfico 2.5.4). Verifica-se leve aumento para o indicador (0,1 p.p.), o qual alcançou 7,2% em junho de 2015, muito acima da proposta de requerimento internacional (mínimo de 3%). 50/ Em 2019, considera-se requerimento de 7% do RWA constituído sob a forma de capital principal, 8,5% do RWA sob a forma de capital nível I e 10,5% do RWA sob a forma de PR, contemplando o limite inferior do adicional de capital principal, conforme a Resolução nº 4.193, de 2013. 51/ A metodologia para apuração da Razão de Alavancagem foi definida pelo BCB por meio da Circular 3.748, de 27 de fevereiro de 2015. 10 12 14 16 18 20 22 0 IB (%) Fonte: FMI. 1/ As siglas acima correspondem a: AR = Argentina; AU = Austrália; BR = Brasil; CA = Canadá; CH = China; FR = França; GE = Alemanha; ID = Indonésia; IN = Índia; IT = Itália; JP = Japão; KO = Coreia do Sul; MX = México; RU = Rússia; SA = África do Sul; TU = Turquia; UK = Reino Unido; e USA = Estados Unidos da América. 2/ As informações divergem dos dados encontrados em <http://fsi.imf.org/Default.aspx>, em razão de serem utilizados dados de junho de 2015 do BCB, ainda não disponíveis no referido sítio. Base de dados Assim, a solvência do sistema bancário continua elevada, com níveis de capitalização adequados para suportar os riscos assumidos. Simulações da plena implementação de Basileia III e da introdução do futuro requerimento de Razão de Alavancagem reforçam essa conclusão acerca da estabilidade da solvência em patamar elevado. Outubro 2015 | Relatório de Estabilidade Financeira | 32 2.6 Testes de estresse de capital52 Com a finalidade de mensurar a resistência, bem como a capacidade de absorção de perdas causadas por eventual materialização dos principais riscos a que o sistema bancário se encontra exposto, foram simuladas alterações extremas e adversas nas principais variáveis econômicas e financeiras. Embora os efeitos não sejam lineares para todas as instituições e algumas apresentem desenquadramento em algum requerimento, como resultado das simulações, os resultados obtidos permitem concluir que o sistema bancário brasileiro apresenta adequada capacidade de suportar tanto os efeitos de choques decorrentes de cenários adversos por seis trimestres consecutivos quanto mudanças abruptas nas taxas de juros e de câmbio, na inadimplência, ou quedas generalizadas dos preços dos imóveis residenciais. 2.6.1 Análise de cenário – Testes de estresse nas condições macroeconômicas A análise de cenário baseia-se na aplicação de um modelo estatístico que relaciona cenários macroeconômicos ao risco da carteira de crédito dos bancos. Nessa análise, para cada cenário são projetados, para um horizonte de seis trimestres consecutivos, o crescimento e a inadimplência da carteira de crédito. Todos os cenários se fundamentam na projeção da atividade econômica, da inflação e das taxas de juros e de câmbio, além de choques externos medidos pelo prêmio de risco Brasil e pelos juros americanos. Na Tabela 2.6.1 podem ser observadas as variáveis que compõem cada cenário analisado: Cenário Base, VAR Estressado, Quebra Estrutural e Pior Histórico. As inadimplências projetadas podem ser vistas no Gráfico 2.6.1. Os resultados do cenário VAR Estressado revelam que a inadimplência projetada atingiria, em dezembro de 2016, o máximo de 5,7%, superando as provisões atualmente existentes em 0,50 p.p. Para o cenário de quebra estrutural, na mesma data, o máximo seria de 5,8%. Tabela 2.6.1 – Cenários de estresse macroeconômico (dezembro de 2016) Jun 2015 Cenário base1/ Atividade econômica (IBC-Br) -1,6% Juros (Selic) Cenários Adversos3/ VAR estressado (α = 5%) Quebra estrutural Pior histórico -0,2% -4,6% -4,6% -1,9% 13,1% 12,0% 14,2% 26,4% 18,1% Câmbio (R$/US$) 3,07 3,59 4,55 4,77 3,67 Inflação (IPCA) 8,6% 5,4% 6,5% 19,8% 9,4% Desemprego (PME-IBGE) 6,9% 6,9% 10,8% 10,8% 7,4% 304 304 304 304 385 2,2% 4,0% 5,4% 5,4% 1,7% Prêmio de risco (EMBI+ Br)2/ Juros americanos (Treasury 10 anos) (1) As variáveis obtidas da pesquisa Focus são a previsão para o PIB, a Selic, o câmbio e a inflação. As demais variáveis são constantes por todo o período de projeção (exceto os juros americanos, que seguem trajetória semelhante à utilizada pelo Federal Reserve no Dodd-Frank Act Stress Testing (DFAST) 2015 para o cenário baseline ). (2) Para o VAR estressado e quebra estrutural, o prêmio de risco Brasil (EMBI+Br) máximo, igual a 572, é atingido em dezembro de 2015, retornando gradativamente ao valor inicial em dezembro de 2016. (3) Os critérios de construção de cada cenário são descritos no anexo Conceitos e Metodologias – Estresse de capital. Base de dados 52/ Para detalhes sobre o conceito de Testes de Estresse e a metodologia relacionada aos testes e cenários, refira-se ao anexo Conceitos e Metodologias – Estresse de capital. Outubro 2015 | Relatório de Estabilidade Financeira | 33 Gráfico 2.6.1 – Estresse macroeconômico Inadimplência projetada Gráfico 2.6.3 – Necessidades de capital VAR estressado % Jun 2015 Set Dez Mar 2016 Jun Set Índice de Basileia (%) % do PR 7,0 18,0 0,5 5,6 14,4 0,4 4,2 10,8 0,3 2,8 7,2 0,2 1,4 3,6 0,1 0,0 Dez 2016 0,0 Cenário Focus VAR estressado (α = 5%) Quebra estrutural Pior histórico Provisões constituídas (jun./2015) Jun 2015 Set Dez Mar 2016 Jun Set Dez 2016 Capital Principal (dir.) Complementar (dir.) Nível 2 (dir.) Índice de Basileia 0,0 Base de dados Base de dados Apesar de o nível projetado das variáveis do cenário VAR estressado ser maior em relação aos testes efetuados em dezembro de 2014, houve redução da necessidade de capital (Gráfico 2.6.2) por conta da redução da projeção do crescimento do crédito. Em todos os cenários, o sistema bancário permanece com seus índices de capitalização acima dos mínimos regulamentares. Gráfico 2.6.2 – Necessidades de capital VAR estressado – Evolução % do PR 0,8 0,6 0,5 0,3 0,2 0 1 2 3 4 5 6 0,0 Trimestres Data-base dezembro 2014 Data-base junho 2015 Base de dados Após seis trimestres de deterioração macroeconômica, a necessidade estimada de capitalização do sistema para que nenhum banco se desenquadre53 seria de 0,11% do PR atual do sistema (Gráfico 2.6.3). 53/ Uma instituição é considerada desenquadrada se não atender a, pelo menos, um dos três índices de exigência de capital: Índice de Basileia (IB), Índice de Capital de nível I (IPR1) e Índice de Capital Principal (ICP). 2.6.2 Análise de sensibilidade A análise de sensibilidade consiste na aplicação de variações incrementais nas taxas de juros e de câmbio, de aumento da inadimplência e de redução nos preços de imóveis residenciais, com o objetivo de se medir o efeito isolado das alterações de cada uma dessas variáveis sobre o capital e os índices de capitalização dos bancos, mantendo-se os demais fatores de risco inalterados. Os testes de sensibilidade às taxas de câmbio e de juros revelam que os impactos seriam irrelevantes para o sistema. O resultado dos testes de sensibilidade à materialização do risco de crédito, sumarizados no Gráfico 2.6.4, indica que, caso se repita a maior inadimplência já observada no sistema bancário brasileiro desde dezembro de 2000, próxima a 7%, a representatividade dos ativos das instituições bancárias desenquadradas seria de 0,5% do total de ativos do sistema bancário. Em uma situação de inadimplência extrema, próxima de 14,1%, as instituições desenquadradas necessitariam de um aporte de capital de 7,1% do PR do sistema para que se evitasse o desenquadramento. Na simulação de reduções sequenciais nos preços de imóveis, somente após 30% de queda – variação próxima à depreciação acumulada em três anos, ocorrida na última crise imobiliária norte-americana – uma instituição ficaria desenquadrada. Em relação à insolvência, seria necessária uma queda de mais de 45% para que uma instituição ficasse com seu capital principal negativo. O Gráfico 2.6.5 detalha os resultados. Outubro 2015 | Relatório de Estabilidade Financeira | 34 As análises de sensibilidade confirmam que o sistema bancário brasileiro apresenta elevada resistência, uma vez que o Índice de Basileia do conjunto de instituições bancárias somente se situa abaixo do mínimo regulamentar em situações extremamente adversas. Gráfico 2.6.4 – Análise de sensibilidade Risco de crédito 33,2 18 23,9 16 0,4 0,0 0,0 16,3 14 13,1 12 10 Maior inadimplência Provisão observada constituída (desde dez./2000) atual 8 6 4 6,1 2 0,6 0,4 0 3 5 7 9 11 Inadimplência média do sistema (%) 13 Necessidade de capital (% do capital total): Bancos desenquadrados (% do ativo total) Nível II Complementar Bancos em insolvência (% do ativo total) Principal IB estressado (%) Base de dados Gráfico 2.6.5 – Análise de sensibilidade Risco de crédito imobiliário residencial 23,6 23,5 23,5 0,0 0,0 16,3 8,6 Queda (%) acumulada do S&P Case-Shiller 10 (EUA) durante a crise.do subprime (abr./2006 a mai./2009) 17,1 0,8 27,9 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 Queda no preço dos imóveis (%) Necessidade de capital (% do capital total): Nível II Bancos desenquadrados (% do ativo total) Complementar Bancos em insolvência (% do ativo total) Principal IB estressado (%) IB Estressado (%) Base de dados Outubro 2015 | Relatório de Estabilidade Financeira | 35 Impactos de Contágio do Setor Real no Sistema Financeiro Na busca constante de desenvolvimento e aperfeiçoamento de ferramentas de monitoramento do Sistema Financeiro Nacional (SFN), o BCB construiu uma metodologia de contágio para estimar riscos e potenciais impactos provenientes de default de empresas do setor real da economia no sistema financeiro. A metodologia visa estimar o impacto, sobre o SFN, não só das empresas em análise, mas também daquelas que integram a sua rede de conexões, quer sejam, os seus fornecedores, prestadores de serviços e funcionários que, potencialmente, seriam afetados direta ou indiretamente, em caso de default. Com base na estimação dos impactos derivados das exposições do sistema financeiro ao grupo de empresas e famílias, busca-se também estimar o contágio interfinanceiro, representado pelo impacto de problemas em uma instituição financeira no restante do sistema. Este boxe descreve a metodologia empregada e apresenta o resultado de sua aplicação na estimativa de possíveis efeitos do default de empresas citadas na Operação Lava Jato1. 1) Rede e contágio no setor real da economia O desafio de estruturação de uma rede de conexões no setor real da economia e a avaliação do impacto do default que uma ou mais empresas podem gerar não se limita a identificar suas conexões diretas e relevantes com fornecedores e prestadores de serviço, mas também as conexões destes últimos com seus próprios fornecedores e prestadores de serviço, e assim sucessivamente. Cada empresa tem relacionamentos financeiros e comerciais com diferentes fornecedores e prestadores de serviços. Identificar e avaliar a natureza e a relevância de cada um deles e estimar sua interdependência são processos complexos. Uma forma de aquilatar esses relacionamentos e estimar uma medida de dependência econômica entre as empresas é partir da análise dos fluxos de pagamentos e recebimentos entre empresas, calculando a relevância dos pagamentos de uma empresa no total recebido por outra, em certo período de tempo. Essa estimativa foi feita utilizando-se o somatório das Transferências Eletrônicas Disponíveis (TED), registradas no Sistema Brasileiro de Pagamentos (SPB). A representação de uma rede de conexões de empresas do setor real pode ser vista na Figura 1. Com essa medida, é possível estimar a rede de conexões das empresas a partir de determinado grau de dependência. A última etapa da formação da rede de conexões é associar a cada empresa potencialmente impactada a força de trabalho empregada, para o que foram utilizados os dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS). 1/ Operação Lava Jato é o nome de uma investigação realizada pela Polícia Federal do Brasil, cuja deflagração da primeira fase ostensiva deu-se em 17 de março de 2014. Outubro 2015 | Relatório de Estabilidade Financeira | 36 Figura 1 – Rede de conexões do setor real Cada esfera representa um grupo econômico. O tamanho delas é proporcional à sua participação no fluxo de transferências do SPB. As cores das arestas refletem a importância do fluxo de TED para a empresa recebedora – quanto mais vermelho, maior a importância e maiores as chances de contágio. Nem todos os grupos estão representados. Nos casos em que a empresa é integrante de um grupo econômico, a análise pode ser feita pelo grupo, e não pelas empresas individualmente. O mapeamento das empresas em grupos econômicos é realizado com a utilização de fontes diversas, tais como informações de participação societária provenientes da Receita Federal, da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e publicações em demonstrações financeiras. 2) Impactos e contágio no Sistema Financeiro Nacional Na sequência, são avaliadas as exposições do sistema financeiro a cada empresa da rede e seus funcionários. Essas exposições são obtidas de diversas fontes, dependendo de sua natureza, entre elas: • crédito e garantias prestadas no país (fonte: BCB/SCR); •debêntures e notas comerciais (fonte: Cetip, BMF&Bovespa); •dívida externa – BCB/Sistema Câmbio (ROF). Estabelecida a rede de conexões do setor real e identificada sua exposição no SFN, é possível simular os efeitos de contágio causados pela quebra de um ou mais grupos econômicos simultaneamente, incluindo-se o impacto de seus fornecedores e prestadores de serviço diretos e de todas as demais empresas que indiretamente dependam deles de forma relevante, além dos empregados de cada uma dessas empresas. Outubro 2015 | Relatório de Estabilidade Financeira | 37 As exposições das empresas e de seus empregados são o ponto de partida para medir o impacto no SFN. Por meio delas, tem-se a estimativa do impacto sobre cada instituição financeira. Entretanto, caso uma determinada instituição financeira2 não possua capital suficiente para suportar as perdas simuladas e entre em default, um novo processo de contágio, agora no sistema financeiro3, é iniciado. O sistema entra em equilíbrio quando não são observadas quebras adicionais de instituições financeiras. As interconexões entre IFs estão representadas na Figura 2. Figura 2 – Rede interfinanceira As esferas azuis referem-se aos Bancos Múltiplos e Comerciais, as verdes, aos Bancos de Desenvolvimento, as vermelhas, aos Bancos de Investimento, as laranjas, às Cooperativas de Crédito e Financeiras, e as amarelas, às Corretoras e empresas de leasing. 3) Aplicação: estimativas dos efeitos da Operação Lava Jato no Sistema Financeiro Nacional Uma aplicação recente do modelo de contágio adotado pelo Banco Central, descrito neste boxe, é a avaliação da resistência do sistema financeiro a possíveis impactos do default das empresas citadas no âmbito da Operação Lava Jato (construtoras, empreiteiras e grupos econômicos de que fazem parte). Tomando-se por base esse grupo, foi formado um subgrupo de empresas mais vulneráveis denominado Grupo B. Para compor o Grupo B, foram considerados fatores como: (i) classificação média de risco no SCR; (ii) existência de pedido de recuperação judicial; (iii) ocorrência de default no pagamento de títulos no país ou no exterior; e/ou (iv) elevada dependência da Petrobras em sua geração de receitas (Figura 3). O exercício contemplou vários cenários, até mesmo com premissas extremamente conservadoras, como o default de todas as empresas integrantes dos grupos econômicos selecionados e de todas as empresas e grupos econômicos que fazem parte da rede de conexões desses grupos, incluindo-se os funcionários de todas as empresas. Além disso, foram simuladas perdas integrais em caso de default, desconsiderando garantias, seguros e outras formas de mitigação de prejuízos. Destaca-se que os grupos econômicos atuam em vários setores da economia, e nem todos os setores foram envolvidos ou alcançados pelos eventos em debate. Ademais, os modelos de negócios são, em sua maioria, 2/ O conceito de instituição financeira abrange os conglomerados (grupos) financeiros. 3/ A rede do SFN é construída a partir das exposições que os conglomerados financeiros têm entre si. Outubro 2015 | Relatório de Estabilidade Financeira | 38 estruturados com um conjunto razoável de garantias do próprio empreendimento, o que pode reduzir significativamente o contágio de eventual evento extremo. Figura 3 – Representação do modelo SFN Rede de conexões do setor real 1º nível Inad. 2º nível (contágio SPB) Perda Impacto direto Grupos econômicos Fornecedores impactados 3º nível (contágio interfinanceiro) Inad. Inad. Perda • • • • Formação dos grupos econômicos Definição dos grupos “vulneráveis” Cadeia de contágio pela dependência de pagamentos Informações do SPB Impacto no emprego Perda Fontes de dados das exposições Impacto direto • • • • • Pessoas ligadas às empresas SCR ROF Sisbacen Cetiip BM&FBovespa Mesmo com o elevado grau de conservadorismo, as simulações realizadas indicam que o sistema financeiro teria condições de absorver os impactos de default das empresas mais vulneráveis citadas na Lava Jato e seu respectivo contágio, incluindo o inadimplemento de empresas fornecedoras e dos seus funcionários. Embora a rentabilidade fosse bastante afetada, nenhuma instituição financeira ficaria insolvente, e o impacto geraria necessidade de capital de R$130 milhões para o reenquadramento de instituições financeiras. Mesmo ampliando a hipótese de default para todas as empresas citadas, seus respectivos grupos, rede de conexões e funcionários, o SFN continuaria mostrando alta resistência, com nenhuma instituição insolvente e uma necessidade de capital para reenquadramento de R$3,4 bilhões, o que equivale a 0,4% do PR atual do sistema. Evidentemente que, nas hipóteses mais extremas, a rentabilidade do SFN seria impactada de forma ainda mais severa. Outubro 2015 | Relatório de Estabilidade Financeira | 39 2.7 Shadow banking Embora o shadow banking brasileiro continue apresentando baixa representatividade em relação ao sistema financeiro, as autoridades reguladoras nacionais entendem a importância de identificar e monitorar as entidades ou atividades que apresentem riscos característicos deste segmento. Assim, a partir desta edição do REF será incluída uma seção específica sobre esse tema, nos moldes do boxe “Shadow banking no Brasil”, publicado no Relatório de Estabilidade Financeira em março de 201554. No boxe foram apresentadas duas estimativas para o shadow banking: uma ampla, outra estrita. Importa destacar que essas métricas estão em constante aperfeiçoamento pelos reguladores nacionais e internacionais, a fim de melhor estimar o objeto em debate; logo, os valores apresentados nesta seção não são exatamente aqueles divulgados no boxe55. A estimativa ampla do shadow banking no Brasil compreende ativos financeiros de entidades não bancárias que fazem intermediação de crédito, cujas atividades podem estar envolvidas em transferência de risco de crédito, alavancagem e transformação de maturidade e de liquidez. Fazem parte dessa estimativa as seguintes entidades: fundos de investimento, fundos de investimento em direitos creditórios, fundos de investimento imobiliário, corretoras e distribuidoras de títulos e valores mobiliários, companhias financeiras – sociedades de arrendamento mercantil, sociedades de crédito imobiliário e sociedades de crédito ao microempreendedor –, sociedades de capitalização e credenciadores não bancários de cartão de crédito. A medida estrita, por sua vez, tem por objetivo mensurar os ativos financeiros relacionados a todas as atividades que representem riscos típicos de shadow banking e que estejam no balanço de qualquer entidade fora do sistema bancário tradicional, independentemente da sua forma ou natureza legal. Assim, a medida estrita resulta de um refinamento que classifica as entidades 54/ Disponível no sítio <http://www.bcb.gov.br/htms/estabilidade/2015_03/ refC6P_1.pdf>. 55/ Segundo a metodologia do FSB, a métrica atual do shadow banking estrito baseia-se no conceito de atividades econômicas, e não apenas em entidades, o que permite aumentar o foco do monitoramento na intermediação de crédito do segmento não bancário que realmente apresenta riscos de shadow banking. Mais informações sobre essa metodologia estão disponíveis em <http://www.financialstabilityboard. org/wp-content/uploads/r_130829c.pdf>. em funções econômicas que detenham esses tipos de riscos (Tabela 2.7.1). Os ativos financeiros das entidades que compõem o shadow banking estrito brasileiro totalizaram R$389,13 bilhões em 2014, ante R$338,38 bilhões em dezembro de 201356. Desse montante, os fundos de investimento representavam 79,3%. Em 2014, o shadow banking estrito cresceu 15,0%, influenciado principalmente pela expansão dos ativos financeiros dos fundos multimercados e referenciados, selecionados conforme os critérios apresentados na Tabela 2.7.1, e dos seguros de crédito, na ordem, 33,9%, 22,9% e 18,8%. No que tange à interconectividade, apenas 0,3% dos ativos financeiros do sistema bancário estavam aplicados nas entidades do shadow banking estrito, e as captações do setor bancário provenientes desse setor – principalmente por meio de letras financeiras – representavam apenas 2,0% dos ativos financeiros bancários (Tabela 2.7.2) em dezembro de 2014. Entretanto, para as entidades do shadow banking estrito, essa interconectividade é mais importante, uma vez que elas investem 25,5% dos seus ativos nos bancos. As estimativas correntes do shadow banking estrito no país possibilitam deduzir que o setor ainda é pouco relevante no sistema financeiro brasileiro, representando 6,6% do total dos ativos financeiros do sistema bancário tradicional e 7,0% do PIB do país. Em relação aos riscos desse segmento, o de maior relevância é o de liquidez, sobre o qual a CVM estabelece regras para os fundos de investimento, com o objetivo de mitigar os riscos de corrida. Como exemplo, é possível citar os mecanismos de gestão de risco de liquidez, incluindo-se a realização de testes de estresse de liquidez57, a marcação a mercado de cotas e de ativos e a suspensão de resgates em situações de estresse de liquidez. 56/ No REF de março de 2015, os ativos financeiros do shadow banking estrito alcançaram R$382,0 bilhões em dezembro de 2013. 57/ A metodologia do Indicador de Resgate em Situações de Estresse da CVM está disponível em http://www.cvm.gov.br/export/sites/cvm/ menu/acesso_informacao/serieshist/estudos/anexos/Teste-de-Estressede-Liquidez-para-Fundos-de-Investimento_vfinal.pdf. Outubro 2015 | Relatório de Estabilidade Financeira | 40 Tabela 2.7.1 – Estimativa do shadow banking estrito no Brasil Função econômica Descrição das atividades típicas Entidades Ativos (R$ milhões) 1 Veículos de investimento coletivo sujeitos a corridas. Compreende os fundos de investimento envolvidos em intermediação de crédito com transformação de maturidade/liquidez e/ou alavancagem. Fundos de investimento com alavancagem superior a 25% ou razão entre ativos líquidos e ativos financeiros totais menor que: - 37% no caso dos fundos referenciados; - 28% no caso dos fundos de renda fixa; e - 26% no caso dos fundos multimercado. 308.772 2 Concessão de crédito com funding de curto prazo. Sociedades de arrendamento mercantil, sociedades de crédito ao microempreendedor, sociedades de crédito imobiliário e sociedades de crédito imobiliário repassadoras não ligadas a conglomerados bancários, cuja razão crédito sobre ativos financeiros seja superior a 10%. Embora essas entidades sejam reguladas e supervisionadas pelo BCB de forma similar às entidades bancárias, foram incluídas pela possibilidade de estarem envolvidas na concessão de crédito e não possuírem acesso direto às linhas de liquidez do BCB nem ao Fundo Garantidor de Créditos (FGC), em linha com os padrões internacionais. 2.917 3 Atividades de intermediação de mercado dependentes de funding de curto prazo ou de funding com garantia de ativos de clientes. Corretoras e distribuidoras de títulos e valores mobiliários não ligadas a conglomerado bancários. Essas entidades, reguladas e supervisionadas pelo BCB de forma similar às entidades bancárias, foram incluídas nessa função econômica por se envolverem em financiamentos a seus clientes com funding de curto prazo. 5.697 4 Facilitação de concessão de crédito. Compreende os seguros celebrados em paralelo a um contrato de empréstimo ou financiamento sem os quais a concessão do crédito fica dificultada ou mesmo inviabilizada. Seguradoras. Nas demais funções econômicas, foram considerados os ativos financeiros totais das entidades. Nesta, tendo em vista a pouca relevância do risco de crédito no balanço das seguradoras, foram consideradas apenas as provisões técnicas dos ramos de seguro que se enquadram no conceito dessa função econômica. Os códigos desses ramos são: 0739, 0740, 0745, 0747, 0748, 0749, 0750, 0775, 0776, 0819, 0859, 0860, 0870, 0977, 1061, 1065, 1068, 1101, 1102, 1103, 1104, 1105, 1106, 1107, 1108, 1109, 1130, 1162, 1163 e 1377. Para maiores detalhes, consulte o Sistema de Estatísticas da Susep, disponível em http://www2.susep.gov.br/menuestatistica/SES/principal.aspx. 16.393 5 Intermediação de crédito baseada em securitização e funding de entidades financeiras. Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC). Os FIDCs da Vale e da Petrobras foram excluídos, pois são usados eminentemente para gestão de caixa dessas empresas. 55.350 389.129 Fontes: BCB, CVM e Susep Tabela 2.7.2 – Interconectividade1/ entre o sistema bancário2/ e o shadow banking estrito Dezembro de 2014 Ativos financeiros Bancos investindo no SB SB investindo em bancos % dos ativos bancários 0,3 2,0 % dos ativos do SB 4,0 25,5 Fonte: BCB 1/ As operações compromissadas com Títulos Públicos Federais, muito embora sejam consideradas na medida do tamanho do shadow banking estrito, são desconsideradas na medida de interconectividade, haja vista o elevado grau de liquidez dos ativos-lastro. 2/ Apenas bancos e conglomerados bancários. Base de dados Outubro 2015 | Relatório de Estabilidade Financeira | 41