04/09/12
Inteiro Teor (1609292)
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001389-­24.2002.4.03.6113/SP
2002.61.13.001389-­2/SP
RELATORA
APELANTE
: Juíza Federal Convocada SILVIA ROCHA
: SANDRA REGINA PAIM
REGINA APARECIDA PEIXOTO POZINI e
ADVOGADO :
outro
APELADO
: Justica Publica
RELATÓRIO
A Juíza Federal Convocada Silvia Rocha (Relatora):
O Ministério Público Federal ofereceu, em 05/11/2003, denúncia em desfavor de SANDRA
REGINA PAIM em razão da prática dos crimes tipificados no artigo 231, §§2º e 3º (duas vezes),
ambos c.c. o artigo 69 do Código Penal.
A denúncia narra o seguinte:
"1. Consta dos inclusos autos de inquérito policial que nos anos de 1996 a 2002, Sandra Regina
Paim, com intuito lucrativo, promoveu a saída de mulheres brasileiras para país estrangeiro, a
fim de que lá exercessem a prostituição.
2. A presente persecução penal foi instaurada a partir do depoimento de uma das vítimas, Érika
Gomes, a qual relatou que a denunciada lhe propôs trabalhar como 'garota de programa' num
Cassino, localizado na cidade de Castellon Dela Plana, na Espanha.
3. Conforme apurado nos presentes autos, Érika Gomes conheceu Sandra Regina Paim quando
tinha quinze (15) anos, e desde então a denunciada queria enviá-­la para a Espanha. Relata,
outrossim, que quando completou dezoito (18) anos, a denunciada lhe fez proposta de trabalho,
como meretriz, em um cassino na Espanha. Após aceitar, Sandra providenciou todo o
necessário para a viagem, inclusive convencendo a mãe de Érika.
4. Claro está, também, que não foi somente Érika a vítima. Sandra Regina Paim arregimentou
mais mulheres com a mesma finalidade, e marcou um encontro com as mesmas, '... no qual
compareceu também 'Pepe', pessoa esta de origem espanhola cujas fotografias ficaram em
poder da Polícia Federal;; esse homem e Sandra explicaram em detalhes como seria o trabalho
na Espanha, quanto ganhariam e como viveriam;; Sandra disse que ganhava mil dólares por
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mulher que embarcasse para a Espanha;; na Espanha, mais precisamente na região de Castela e
Lion, ficou hospedada em um apartamento junto com oito brasileiras;; esse apartamento ficava
a poucas quadras do Cassino Gran Clube ...' (fl. 76).
5. Dispôs, ainda, Érika que enfrentou alguns problemas no exterior e decidiu voltar ao Brasil.
Através da intervenção da policia brasileira, via Interpol, conseguiu retornar. Porém, 'em 20 de
fevereiro de 1998, ou seja, alguns dias depois que a declarante havia retornado ao Brasil,
Sandra Regina novamente procurou a declarante obrigando-­a a voltar para a Espanha para
saldar a dívida contraída ...', inclusive utilizando de ameaças para conseguir tal intento,
conforme depoimento de fl. 10. Ato contínuo Érika aceitou voltar a Espanha, mas, como foi
assaltada na rodoviária de São Paulo, antes do embarque, retornou para Franca.
6. Destarte, além de Sandra Regina Paim angariar mulheres para se prostituírem no exterior,
segundo se depreende do termo de declarações de Érika Gomes a fls. 76/77e demais provas
constantes dos autos, a denunciada cometeu a infração com o fim de lucro e utilizando-­se de
grave ameaça [...]
7. Estácia Maria Rodrigues, em seu termo de declarações de fls. 12/14, também ratificou as
declarações da primeira depoente sobre a conduta de Sandra Regina Paim de promover a saída
de mulheres para o exterior visando ao exercício da prostituição. Relatou inclusive sua
experiência na Espanha, país para onde foi ser 'garota de programa', após ser convencida pela
denunciada. Ademais, aduziu que no mesmo mês em que partiu para o referido país, outras
garotas também o foram, entre elas Sandra, Lúcia, Érica, Valdirene e Andressa. Por fim,
informou que depois de três meses na Espanha, recebeu a passagem de volta para o Brasil.
8. Cláudia Aparecida Franco, às fls. 09/10, corroborou o depoimento de Erika Gomes, e
afirmou que a denunciada também lhe propôs ir para a Espanha se prostituir;; contudo, não
aceitou em virtude de que na época estava grávida."
A denúncia foi recebida em 11/11/2003 (fl. 114).
Processado o feito, sobreveio sentença, proferida e publicada 17/06/2004 (fls. 194/210), que
condenou a ré SANDRA REGINA PAIM, como incursa no artigo 231, caput e §3º (duas vezes), na
forma do artigo 71, c.c. artigo 231, caput e §3º, na forma do artigo 14, II, e artigo 69, todos do
Código Penal, à pena de 5 (cinco) anos e 3 (três) meses de reclusão, em regime inicial semi-­aberto, e
45 (quarenta e cinco) dias multa no valor de 1/10 (um décimo) do salário mínimo vigente à época do
pagamento.
A defesa apela (fls. 218/221). Pleiteia a absolvição da ré, com fundamento no artigo 386, III, do
Código Penal, ao argumento de que inexiste provas de ter a ré influenciado na decisão das vítimas de
irem a Espanha trabalhar como prostitutas, bem como de que tenha lucrado com a ida das vítimas
àquele país. Subsidiariamente, requer o perdão judicial, por se tratar de pessoa trabalhadora, primária,
ter endereço fixo e ser mãe de família, ou, ainda, a diminuição da pena para o mínimo legal.
Com contrarrazões do Ministério Público Federal (fls. 225/231).
O Ministério Público Federal, em parecer da lavra Procuradora Regional da República Jovenilha
Gomes do Nascimento, opinou pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
À revisão.
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SILVIA ROCHA Juíza Federal Convocada
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RELATORA
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APELANTE
: SANDRA REGINA PAIM
REGINA APARECIDA PEIXOTO POZINI e
outro
: Justica Publica
ADVOGADO :
APELADO
VOTO
A Juíza Federal Convocada Silvia Rocha (Relatora):
A apelante SANDRA REGINA PAIM foi denunciada como incursa nas penas do artigo 231, §§ 2º e
3º (duas vezes), c.c. o artigo 69, ambos do Código Penal.
Entretanto, a ré foi condenada à pena do artigo 231, caput e §3º (duas vezes), c.c. o artigo 71 do
Código Penal em concurso material (artigo 69 do Código Penal) com o artigo 231, caput e §3º (uma
vez), c.c. artigo 14 II e parágrafo único, do Código Penal.
A redação do artigo 231 do Código Penal, anterior à Lei 11.106/2005, vigente à época dos fatos,
tinha o seguinte teor:
Tráfico de mulheres
Art. 231 -­ Promover ou facilitar a entrada, no território nacional, de mulher que nele venha
exercer a prostituição, ou a saída de mulher que vá exercê-­la no estrangeiro:
Pena -­ reclusão, de três a oito anos.
§ 1º -­ Se ocorre qualquer das hipóteses do § 1º do art. 227:
Pena -­ reclusão, de quatro a dez anos.
§ 2º -­ Se há emprego de violência, grave ameaça ou fraude, a pena é de reclusão, de 5 (cinco) a
12 (doze) anos, além da pena correspondente à violência.
§ 3º -­ Se o crime é cometido com o fim de lucro, aplica-­se também multa.
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1. Da materialidade e da autoria quanto ao crime consumado.
Inicialmente, esclareço que a materialidade delitiva deve ser analisada relativamente à cada vítima
mencionada na denúncia e conjugando-­se o caput do artigo 231 com o seu §3º do Código Penal,
consoante a condenação imposta na sentença.
Assim, tenho que o objeto material do delito consiste na promoção (ser a causa geradora) ou
facilitação (tornar algo acessível, sem necessidade de grandes esforços) de saída de mulher do
território nacional para exercer a prostituição no estrangeiro visando o lucro.
Feita esta análise e considerando os elementos constantes dos autos, verifico estar suficientemente
demonstrada a materialidade do crime de tráfico de mulheres relativamente às vítimas Estácia Maria
Rodrigues e Érika Gomes, uma vez cada, bem como a autoria de SANDRA REGINA PAIM.
Com efeito, a partir dos depoimentos testemunhais, é inconteste que tais mulheres foram exercer a
prostituição no estrangeiro, in casu, na Espanha, por intermédio de terceira pessoa, no caso
SANDRA, que facilitou a empreitada.
Confiram-­se, primeiramente, os depoimentos judiciais de Estácia e Érika sobre como foi
providenciada a sua viagem para Espanha:
"Disse que quando tinha 18 anos perguntou sobre os trabalhos na Espanha e a ré lhe respondeu
que tinha uma conhecida de nome Lana que tinha contatos lá. Esclareceu que tinha interesse na
Espanha pois já era garota de programa e queria melhorar de vida. Mencionou que Lana era
garota de programa na Espanha em outro Cassino mas sempre ela visitava a depoente no
apartamento em que morava. Citou que a Sandra lhe contou que o contato da Espanha estava
em Franca e se a depoente quisesse falar com ele deveria ir ao Restaurante Lanchão, o que ela
fez. Informou que no Restaurante Lanchão encontrou o rapaz espanhol, Estácia e outras
garotas sendo que ele as orientou para que tirassem o passaporte em Ribeirão Preto e que
comprassem a passagem aérea. Esclareceu que nessa ocasião ele forneceu euros para essas
despesas. Afirmou que posteriormente tirou o passaporte e comprou a passagem e viajou para
a Espanha no dia 20 de janeiro de 1998. Relatou que lhe foi dado também mil e duzentos
dólares para entrar na Espanha. Disse que foi recebida no aeroporto por 3 homens que a
levaram para conhecer o Cassino e o apartamento em que iria residir com as demais
brasileiras. [...] informou que a Estácia foi uma semana antes ou depois da depoente a
Espanha e que dividiram um apartamento lá. Afirmou que as garotas iam a Espanha de 15 em
15 dias. [...] Esclareceu que conheceu a ré aos 15 anos através de sua amiga Damiana e que
nessa época a sua amiga já tinha ido para Espanha. Posteriormente em visita ao seu filho a ré
e a depoente conversaram sendo que a primeira informou de que era casada na Espanha e que
sabia que as meninas que faziam programas lá estava, ganhando bem. Assim sendo a ré
perguntou para a depoente: "Por que você não vai para lá se quer ter uma vida melhor?".
Reafirmou de que o contato com a Sandra tinha sido antes do encontro com o espanhol no
Restaurante Lanchão. Pelo que se lembra Sandra não estava no restaurante. Retificando a
informação anterior recordou-­se de que na verdade a ré estava no Restaurante Lanchão
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juntamente com o espanhol pois era quem fazia a tradução das informações prestadas por ele.
Disse que ouviu dizer de suas colegas de quarto na Espanha de que Sandra recebia mil dólares
por mulher que mandava para lá. Respondeu que quando foi tirar o passaporte em Ribeirão
Preto foi acompanhada de Sandra, Estácia e sua mãe. Afirmou que foi a Sandra quem as levou
para tirar foto e posteriormente a Polícia Federal de Ribeirão Preto para dar entrada ao
passaporte. [...] Informou que a ré lhe sugeriu que tentasse a vida lá pois outras garotas
estavam ganhando um bom dinheiro lá." [Érika Gomes -­ fls. 141/143]
"Respondeu que não conheceu a ré antes da viagem dela para a Espanha. Esclareceu que
conheceu a ré depois da primeira viagem de Sandra a Espanha. Afirmou que a ré já foi várias
vezes a Espanha e que já a conhece há um bom tempo. Respondeu que a Andressa levou Tite a
sua casa em Franca. Afirmou que em outra ocasião Sandra foi a sua casa acompanhada de um
gerente de clube espanhol. Disse que a visita foi rápida e que a ré somente apresentou seu
acompanhante a ela. Esclareceu que esse acompanhante da ré era pessoa diversa de Tite.
Esclareceu que no almoço mencionado ficou no restaurante por pouco tempo e que quando foi
embora juntamente com Andressa, permaneceram a Ritinha, Érika e Tite. Afirmou que até a
ocasião em que permaneceu no restaurante a Sandra não tinha aparecido. Citou que Ritinha se
chama também Valdirene mas não é a testemunha arrolada pela acusação. Explicou que a
informação prestada na Delegacia em relação a presença da ré no almoço foi dada em razão de
ter a Érika dito na Espanha que a ré também estava nesse almoço. Esclareceu que
provavelmente a ré chegou no restaurante depois de sua saída. Afirmou em retificação que
Sandra foi junto com ela e outras garotas para tirarem passaporte em Ribeirão Preto, pois
Andressa não sabia onde era a Polícia Federal mas a ré sim. Afirmou que era amiga da ré não
sabendo dizer quanto a Ritinha, Érika e Andressa." [Estácia Maria Rodrigues -­ fls. 139/140]
Vê-­se, por conseguinte, que foi SANDRA quem indicou às vítimas o contato que as levou a Espanha,
o qual também as orientou acerca da emissão dos passaportes, bem como lhes forneceu dinheiro para
as despesas.
Da leitura dos depoimentos, observa-­se que a ré SANDRA participou ativamente das negociações
juntamente com o espanhol, servindo, inclusive, como tradutora para as vítimas.
Além disso, a vítima Érika aduz que SANDRA recebia mil dólares por mulher que conseguia mandar
para a Espanha.
De outro lado, a ré nega ter intermediado a ida das vítimas para a Europa, o que, entretanto, não
condiz com as demais provas dos autos. O interrogatório de SANDRA confirma que, de fato, ela
possuía contato com pessoas na Espanha, na mesma cidade para a qual as vítimas Érika e Estácia
foram enviadas, qual seja, Castellon della Plana. Veja o seu teor:
"Em 1993 eu fui trabalhar na Espanha em um Clube como garota de programa. Eu fui através
de uma mulher chamada Dalila, num local no Bom Retiro em São Paulo, que fiquei conhecendo
através de anúncio em jornal. Ela providenciou o meu embarque e depois na Espanha eu tive
que pagar por isso. Dois meses depois eu conheci um espanhol chamado Angel Jimenez
Adelantado. Ele pagou minhas dívidas no Clube e me levou para morar com ele. Eu fiquei
grávida e nós viemos para Franca em 1995 para que eu pudesse dar a luz a meu primeiro filho
com ele. Depois do nascimento o Angel voltou para a Espanha e fiquei morando no Brasil por 3
anos. Depois eu voltei para a Espanha e fiquei morando com o Angel até o ano de 2000. Depois
eu voltei novamente para ter nosso segundo filho. Meu primeiro filho ficou morando com minha
mãe. Eu ainda mantenho minha relação com o Angel e ele vem uma vez por ano ao Brasil. [...]
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Elas me disseram que iriam para a mesma cidade que eu havia ficado na Espanha, chamada
Castellon de Plana." (SANDRA REGINA PAIM -­ fl.129)
É patente, portanto, que SANDRA praticou os atos executórios do crime tipificado no artigo 231 do
Código Penal, pois apresentou as vítimas Érika e Estácia aos donos do clube espanhol, onde iriam
exercer a prostituição, e levou-­as à Polícia Federal para tirar passaportes, tal como orientado pelo
dono do clube espanhol.
Logo, conclui-­se que SANDRA REGINA PAIM facilitou a saída de mulher do território nacional
para exercer a prostituição no estrangeiro visando o lucro, incidindo, dessa forma, no artigo 213,
caput e §3º, do Código Penal, na sua redação original.
2. Da materialidade e da autoria quanto ao crime tentado.
O magistrado a quo condenou a ré SANDRA também pelo crime do artigo 231, caput e §3º, do
Código Penal, na modalidade tentada (art. 14, II), relativamente à vítima Érika Gomes.
A condenação deve ser mantida.
Os depoimentos de Érika, em certos momentos, demonstram imprecisão, contudo, a versão de que a
ré SANDRA a teria procurado novamente, após seu retorno da Espanha, para lá voltar foi
apresentada tanto em sede inquisitorial, como em juízo:
"A declarante voltou para a casa, que ficou um longo tempo sem ter notícias de Sandra, não
conversou com a mesma, até que a Sandra procurou pela declarante para que a mesma
retornasse para a Espanha para pagar a dívida que havia deixado lá, que a declarante disse
que se era uma dívida dela, ela voltaria para pagar, que então providenciou documentação e
foi para a cidade de São Paulo para tomar o avião, mas na rodoviária Terminal do Tietê foi
furtada, levaram sua bolsa com cerca de 800 dólares, que a declarante registrou ocorrência no
posto policial do terminal e conseguiu uma passagem e voltou para Franca, que tal fato
ocorreu entre o ano de 1999 a 2000. Que na cidade de Franca registrou o boletim de
ocorrência d polícia civil no plantão policial, que foi atendida pelo investigador Cássio, que a
declarante contou apenas sobre o furto, não mencionando o motivo da viagem ao investigador.
Que a Sandra a procurou para saber o porque da desistência da viagem, que a declarante
contou sobre o furto, que a Sandra disse que ela teria que pagá-­la." (fls. 15/16)
"alguns dias depois que a declarante havia retornado para o Brasil, Sandra Regina novamente
procurou a declarante obrigando-­a a voltar para a Espanha para saldar a dívida lá contraída,
e Sandra lhe disse que caso a declarante aceitasse retornar, ela, Sandra, pagaria com a própria
vida em razão da dívida;; concordou em voltar para a Espanha e quando estava na rodoviária
em São Paulo, foi assaltada, ocasião em que levaram o dinheiro que seria usado para pagar a
passagem;; em razão desse fato, Sandra começou a ameaçar de morte a declarante, fato este
que a levou a fazer uma ocorrência na Delegacia da Defesa da Mulher." (fls. 76/77)
"Disse que nunca foi cobrada pela dívida da viagem ao Brasil e que somente teve contato de
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novo com a ré em 2002 conforme o episódio já relatado. [...] Disse que quando retornou a
Franca foi procurada pela Sandra que a levou para um advogado. Esclareceu que pelo
advogado foi orientada para procurar o Dr. Palim para fins de retirar a queixa firmada pela
sua mãe o que foi feito. Afirmou que não foi procurada por Sandra para fins de cobrança da
dívida da primeira viagem, mas posteriormente disse que a ré lhe ofereceu uma nova viagem a
Espanha para um outro Cassino o que aceitou. Esclareceu que essa segunda viagem não correu
pois foi assaltada na rodoviária de São Paulo. Afirmou que não conseguiu fazer um boletim de
ocorrência na rodoviária." (fls. 141/143)
Assim, diante da afirmação veemente da vítima Érika de que teve contato com SANDRA, mesmo
após ter retornado da Espanha, quando foi convidada novamente a ir para Europa, o que não ocorreu
unicamente porque o dinheiro que seria utilizado para o custeio de sua passagem foi furtado, dá ensejo
à manutenção da condenação por tentativa de tráfico de mulheres com obtenção de lucro.
Desta feita, restam comprovadas a materialidade delitiva e a autoria do crime disposto no artigo 213,
caput e §3º, do Código Penal, na sua redação original, na forma do artigo 14, II, do mesmo código.
3. Da dosimetria da pena.
A defesa pleiteia a aplicação do perdão judicial. Porém, tenho que o instituto não é cabível ao crime
ora em análise.
Como ensina Guilherme de Souza Nucci, ao comentar o artigo 107, IX, do Código Penal, perdão
judicial "é a clemência do Estado para determinadas situações expressamente previstas em lei, quando
não se aplica a pena prevista para determinados crimes, ao serem preenchidos certos requisitos
objetivos e subjetivos que envolvem a infração penal. Trata-­se de uma autêntica escusa absolutória,
que não pode ser recusada pelo réu." (in Código Penal Comentado. 9ª ed. São Paulo: RT, 2008. p.
552.)
Assim, o crime do artigo 231 do Código Penal não prevê nenhuma hipótese de perdão judicial, de
modo que o pedido é descabido.
3.1. Dos crimes consumados.
A sentença fixou a pena base em 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 30 (trinta) dias multa no
valor de 1/10 (um décimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos.
Entretanto, verifico da leitura do decisum, que as circunstâncias judiciais consideradas para a fixação
da pena base acima do mínimo legal constituem elementos do próprio tipo penal, não se podendo
levar em conta, sob pena de bis in idem.
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Sendo assim, é suficiente a pena base de 3 (três) anos de reclusão e 10 (dez) dias-­multa no valor de
1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, pois não há elementos nos autos
passíveis de se aferir a situação financeira da ré.
Não há agravantes e atenuantes.
Na terceira fase, não há causas de diminuição da pena, mas apenas a causa de aumento decorrente da
continuidade delitiva, visto que o crime foi cometido duas vezes (contra Érika e Estácia), nos termos
do artigo 71 do Código Penal, o que enseja o aumento de 1/6, pelo que a pena resta definitiva em 3
(três) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 11 (onze) dias multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do
salário mínimo vigente à época dos fatos.
3.2 Do crime tentado.
A sentença fixou a pena base em 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 30 (trinta) dias multa no
valor de 1/10 (um décimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos.
Entretanto, verifico da leitura do decisum, que as circunstâncias judiciais consideradas para a fixação
da pena base acima do mínimo legal constituem elementos do próprio tipo penal, não se podendo
levar em conta, sob pena de bis in idem.
Sendo assim, é suficiente a pena base de 3 (três) anos de reclusão e 10 (dez) dias-­multa no valor de
1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, pois não há elementos nos autos
passíveis de se aferir a situação financeira da ré.
Não há agravantes e atenuantes.
Na terceira fase, não há causas de aumento de pena, mas apenas a causa de diminuição em razão da
tentativa, consoante artigo 14, II, do Código Penal, o que enseja a diminuição de 2/3 da pena, pelo
que resta definitiva em 1 (um) ano de reclusão e 3 (três) dias multa, no valor de 1/30 (um trigésimo)
do salário mínimo vigente à época dos fatos.
4. Do concurso material.
Considerando que os crimes consumados praticados contra Érika e Estácia ocorreram em momento
consideravelmente anterior (cerca de 1 ano) ao delito tentado, é de ser reconhecido o concurso
material, não sendo possível considerar a tentativa como continuidade dos delitos consumados.
Desse modo, nos termos do artigo 69 do Código Penal, as penas de ambos os crimes devem ser
somadas, perfazendo um total de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 14 (quatorze) dias-­
multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos.
Impossibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, em razão do
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quantum da pena.
Fica mantido o regime inicial semi-­aberto para o cumprimento da pena, tal como fixado na sentença.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação para diminuir a pena base para o mínimo legal,
mantendo no mais a sentença, restando a pena definitiva em 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de
reclusão e 14 (quatorze) dias-­multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à
época dos fatos.
Após o trânsito em julgado, expeça-­se mandado de prisão.
É o voto.
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Data e Hora:
28/9/2011 20:00:04
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001389-­24.2002.4.03.6113/SP
2002.61.13.001389-­2/SP
RELATORA
APELANTE
: Juiza Convocada SILVIA ROCHA
: SANDRA REGINA PAIM
REGINA APARECIDA PEIXOTO POZINI e
ADVOGADO :
outro
APELADO
D.E.
Publicado em 16/1/2012
: Justica Publica
EMENTA
PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE MULHERES PARA A EUROPA COM O
INTUITO DE LUCRO. ART. 231, CAPUT E §3º, CP. CONSUMAÇÃO E TENTATIVA.
MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. PEDIDO DE PERDÃO JUDICIAL.
DESCABIMENTO. PENA BASE REDIMENSIONADA. CONTINUIDADE DELITIVA.
CONCURSO MATERIAL. ALTERAÇÃO DO VALOR DO DIA MULTA. MÍNIMO LEGAL.
1. Apelação criminal interposta contra sentença que condenou a ré como incursa no artigo 231, caput
e §3º (duas vezes), na forma do artigo 71, c.c. artigo 231, caput e §3º, na forma do artigo 14, II, e
artigo 69, todos do Código Penal, à pena de 5 (cinco) anos e 3 (três) meses de reclusão, em regime
inicial semi-­aberto, e 45 (quarenta e cinco) dias multa no valor de 1/10 (um décimo) do salário mínimo
w eb.trf3.jus.br/acordaos/A cordao/BuscarDocumentoG edpro/1609292
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vigente à época do pagamento.
2. Crime consumado. Materialidade e autoria comprovadas, sobretudo, com base nos depoimentos
das duas vítimas, os quais esclarecem acerca da atuação da ré nas negociações juntamente com o
espanhol, levando-­as, inclusive, à Polícia Federal para tirar passaportes, e de sua estada na Espanha.
3. Crime tentado. Materialidade e autoria que se demonstra pelo depoimento da vítima, que afirmou
veementemente a todo momento que teve contato com a ré, mesmo após ter retornado da Espanha,
quando foi convidada novamente a ir para Europa, o que não ocorreu unicamente porque o dinheiro
que seria utilizado para o custeio de sua passagem foi furtado.
4. O instituto do perdão judicial não é cabível ao crime ora em análise, pois aplicável apenas a
determinadas situações expressamente previstas em lei e desde que preenchidos certos requisitos
objetivos e subjetivos que envolvem a infração penal.
5. Pena base dos crimes consumados e tentado diminuída para o mínimo legal -­ 3 (três) anos de
reclusão e 10 (dez) dias-­multa, pois as circunstâncias judiciais consideradas para a fixação da pena
base acima do mínimo legal constituem elementos do próprio tipo penal, não se podendo levar em
conta, sob pena de bis in idem.
6. Continuidade delitiva mantida, com relação aos crimes consumados, visto que o crime foi cometido
duas vezes (contra Érika e Estácia). Os crimes consumados praticados contra Érika e Estácia
ocorreram em momento consideravelmente anterior (cerca de 1 ano) ao delito tentado, de modo que
é de ser reconhecido o concurso material, não sendo possível considerar a tentativa como
continuidade dos delitos consumados.
7. Valor do dia multa diminuído para 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, já que não há elementos
nos autos passíveis de se aferir a situação financeira da ré.
8. Impossibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, em razão
do quantum da pena. Fica mantido o regime inicial semi-­aberto para o cumprimento da pena, tal
como fixado na sentença.
9. Apelação parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, ACORDAM os integrantes da
Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial
provimento à apelação para diminuir a pena base para o mínimo legal, mantendo no mais a sentença,
restando a pena definitiva em 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 14 (quatorze) dias-­multa,
no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, determinando-­se, ainda,
a expedição de mandado de prisão após o trânsito em julgado, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte do presente julgado.
São Paulo, 13 de dezembro de 2011.
SILVIA ROCHA Juíza Federal Convocada
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