XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012
MAL/BEM-ESTAR DOCENTE EM ESCOLAS PÚBLICAS DE PORTO ALEGRE
Me. Aline Rocha Mendes
Supervisora Educacional da Rede Municipal de Ensino de Porto Alegre
Me. Jamile Zacharias
Professora de História e Educação Infantil da Rede Privada de Ensino de Porto Alegre
Dr. Juan José Mouriño Mosquera
Faculdade de Educação da PUCRS
Dr. Claus Dieter Stobäus
Faculdade de Educação da PUCRS
Dr. Saul Neves de Jesus
Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Universidade do Algarve
O presente trabalho analisa alguns dos achados sobre níveis de mal/bem-estar docente de duas
Dissertações de Mestrado do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação da PUCRS,
de Mendes (2011) e Zacharias (2012), que buscaram levantar dados recentes de quatro escolas
públicas de Porto Alegre, procurando contrastar com os resultados de pesquisas anteriores de
Jesus (1998), em Portugal. A temática do mal-estar docente vem sendo estudada desde o final da
década de 80, em especial por Esteve (1994) na Espanha. Mais recentemente, aborda-se a
vertente do bem-estar, enquanto pessoa e profissional, em especial com os trabalhos de Jesus
(1996, 1998, 2007), e Mosquera e Stobäus (1996, 2006, 2008). Também aparece claramente a
fundamentação dos estudos da Afetividade, da Psicologia da Saúde e da Psicologia Positiva, em
um sentido de direcionar para ações que possibilitem detectar estes níveis pesquisados pelas
autoras, para poder propor estratégias de intervenção. A metodologia adotada foi quantiqualitativa, recolhendo os dados dos docentes das escolas através de questionários e
complementando com entrevistas semiestruturadas com alguns deles. Foram aqui destacados em
especial alguns dos achados quantitativos (n1 = 30; n2= 22) nas dimensões interno/externas
(projeto profissional, motivação intrínseca, sucesso profissional, estresse profissional, exaustão
profissional), ligadas a condições de trabalho, infraestrutura, formação inicial e continuada e
salários dos docentes. Os achados qualitativos (n1=5, n2= 5) complementares são aqui
relacionados a estes dados. Ressaltam algumas possibilidades de retorno a estes professores,
destacando-se a necessidade de uma Educação para a Saúde Docente, Educação Continuada e
implementação de aspectos mais afetivamente intra e interpessoais positivos e saudáveis no
contexto escolar.
Palavras-chave: Estresse. Mal-estar docente. Bem-estar docente. Trabalho docente.
Introdução
Ser professor, na atualidade, não é tarefa fácil. Antigamente, bastava o educador possuir
domínio dos conteúdos e conhecer estratégias e recursos didáticos para ser considerado um bom
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profissional. Hoje, além desta exigência, um bom professor deve compreender os processos
cognitivos, psíquicos e emocionais que envolvem o sujeito; estimular a criticidade e a autonomia
de seus alunos, bem como incentivá-los a pesquisar; entender e potencializar a aprendizagem dos
alunos em processo de inclusão; saber construir valores com seus educandos; e estar
constantemente se atualizando.
O problema surge quando estas novas exigências não são acompanhadas de formação
inicial e em serviço apropriadas para atender todas estas demandas da sociedade atual. Neste
contexto caótico, o educador vê-se despreparado, inseguro, sobrecarregado de trabalho,
assumindo diversos papéis e não dispondo dos recursos adequados para realizar um trabalho com
qualidade, pois a infraestrutura física e material das escolas públicas é precária. Também sentese frustrado por não poder investir na própria formação, já que os baixos salários, principalmente
das escolas estaduais, não possibilitam ao mesmo buscar novos conhecimentos. Une-se a isto a
falta de valorização do docente pela própria sociedade, que não reconhece o seu valor social e
responsabiliza-o pelos problemas da educação, como se a família e o Estado fossem isentos de
seus papéis e responsabilidades. Frente a esta situação, surge no contexto educacional o
fenômeno do mal-estar docente, o qual vem sendo diagnosticado em diversos países.
Felizmente, pesquisas comprovam que nem todos os professores sofrem com o mal-estar,
apresentando, contrários a isto, sentimentos de satisfação e realização profissional, considerados
como indicativos de bem-estar docente. Assim, investigações sobre a temática do mal/bem-estar
dos professores vêm apresentando dados significativos para que possam ser realizadas mudanças
no âmbito educativo, a fim de melhorar e qualificar a profissão docente.
O presente artigo insere-se nesta abordagem mais atual, tendo como objetivo analisar os
níveis mal/bem-estar apresentados por docentes de quatro escolas públicas do município de Porto
Alegre. Os dados deste trabalho são resultados parciais de duas dissertações realizadas durante o
curso de Mestrado do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação da Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), que estão inseridas no grupo de pesquisa
Mal-estar e Bem-estar na Docência.
Consideramos este estudo, baseado em nossas reflexões e releituras, em especial do
estudo de Zacharias (2012) relevante, na medida em que estaremos revendo o tema, trazendo
subsídios para prevenir e minimizar o mal-estar, possibilitando a promoção do bem-estar dos
professores, e qualificando, consequentemente, o trabalho docente.
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2 Referencial Teórico
A temática do mal-estar docente vem sendo investigada desde a década de 1970,
refletindo uma preocupação mundial. Segundo Esteve (1994, p. 24-25), o conceito de mal-estar
docente vem sendo utilizado para “[...] descrever os efeitos permanentes de caráter negativo que
afetam a personalidade do professor como resultado das condições psicológicas e sociais em que
se exerce a docência”, ou seja, o educador passa a manifestar sintomas físicos, cognitivos e/ou
emocionais negativos, em decorrência de situações adversas que se apresentam na sua profissão.
De acordo com Blase (1982 apud ESTEVE, 1994, p. 25), o conjunto dos diversos fatores
sociais e psicológicos, presentes durante a ação pedagógica, estão produzindo “[...] um ciclo
degenerativo da eficácia docente”. Para Esteve (apud JESUS, 1996), os fatores que provocam
mal-estar levam o educador a obter resultados negativos no processo de ensino e de
aprendizagem, o que diminui sua satisfação, motivação e empenho profissional, originando uma
menor eficácia profissional, tornando mais provável a ocorrência de resultados negativos.
Jesus (2004, p. 122) complementa que o “conceito de mal-estar traduz um processo de
falta de capacidade por parte do sujeito para fazer face às exigências que lhe são colocadas pela
sua profissão”. Distingue três etapas no desenvolvimento do processo de mal-estar docente: na
primeira etapa, as exigências da profissão esgotam os recursos do professor, causando estresse;
na segunda, o educador tenta corresponder a estas exigências, aumentando seus esforços; e na
terceira, começam a surgir os sintomas decorrentes do mal-estar docente.
Esteve (1994) estabeleceu uma classificação dos possíveis fatores que configurariam a
presença de mal-estar docente:
Fatores de segunda ordem: incidem indiretamente sobre a ação docente, afetando a
eficácia do professor ao promover uma diminuição da sua motivação no trabalho, relacionandose com as condições ambientais e o contexto em que se exerce a docência, como a modificação
no papel do professor e dos agentes tradicionais de socialização, a contestação e as contradições
da função docente, a modificação do apoio do contexto social, os objetivos do sistema de ensino
e o avanço dos conhecimentos, e a imagem do professor; e
Fatores de primeira ordem: incidem diretamente sobre a ação docente, gerando tensões de
caráter negativo em sua prática cotidiana, como os recursos materiais e as condições de trabalho,
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a violência nas instituições escolares, e o esgotamento docente e a acumulação de exigências
sobre o professor.
Esteve (1994) considera que os fatores de mal-estar repercutem negativamente na prática
docente, acarretando insatisfação, baixa motivação, esgotamento, cansaço, ansiedade, estresse,
depressão, mau relacionamento com os colegas, pedidos de transferência de escola, enfermidades
generalizadas e, consequentemente, absentismo e abandono da profissão. Estes dois últimos são
as reações mais frequentes assumidas pelos professores para lidar com os problemas físicos e
psicológicos, existindo uma relação estreita entre o absentismo e a intenção de abandonar a
profissão. Desse modo, o absentismo aparece como uma forma de buscar um descanso, um
alívio, que permita ao professor escapar momentaneamente das tensões acumuladas no trabalho,
tendo como última opção o abandono real da profissão.
Diante destas constatações acerca do mal-estar docente, passaremos agora a refletir sobre
a influência da Psicologia Positiva, através de relatos dos autores que passaram a direcionar suas
investigações para a promoção do bem-estar docente. Seligman e Csikszentmihalyi (2000, p. 5)
afirmam que “o objetivo da Psicologia Positiva é começar a catalizar uma mudança no foco da
Psicologia da única preocupação com o reparo das piores coisas da vida para também construir
as qualidades positivas”.
Jesus e Rezende (2009) complementam que a Psicologia Positiva está centrada sobre as
emoções positivas, sobre o estudo do bem-estar, da felicidade, da alegria, do otimismo, da
esperança, do amor, do perdão, ou seja, voltada para a promoção da saúde. Os autores
esclarecem que o bem-estar subjetivo vem sendo compreendido como uma tendência global da
pessoa para experienciar os acontecimentos da vida de forma positiva. Nesta perspectiva, o
sujeito é entendido como ativo, pois se considera que a personalidade constitui um papel
essencial. Assim, afirmam (p. 17) que o bem-estar é o “[...] resultado da orientação geral positiva
do sujeito para os acontecimentos de vida”. Atualmente, Seligman (2011) coloca que o bem-estar
é o principal construto da Psicologia Positiva. Também explica que existem cinco elementos que
contribuem para compreensão do bem-estar: a emoção positiva, o engajamento, o sentido, os
relacionamentos positivos e a realização.
Jesus (1996) mencionava que cada vez mais há uma consciência de que ser um bom
professor demanda aprendizagem e desenvolvimento de competências e qualidades relacionais,
em depois (2007) esclarece que um professor motivado e realizado, que experiencia bem-estar na
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profissão, é aquele que tem a capacidade de conseguir superar os problemas que permeiam sua
prática pedagógica, podendo esta capacidade ser aprendida e desenvolvida pelo educador.
Por isto, entendemos que o docente pode experienciar tanto mal-estar como bem-estar na
profissão, dependendo da forma como encara as situações que se apresentam no contexto
educativo em que atua. Sendo assim, acreditamos que algumas medidas de intervenção, no
intuito de promover o bem-estar docente, podem e devem ser realizadas pelo próprio educador,
como investir no desenvolvimento da sua afetividade.
Lembrando a parte da afetividade, Casassus (2009, p. 204) explica que a Educação
também resulta das relações que são construídas entre docentes e discentes, e que elas são
essencialmente emocionais, afirmando que “[...] a aprendizagem depende principalmente do tipo
de relações que se estabelecem na escola e na classe” e que, por isto, a dimensão afetiva deveria
ser uma das finalidades da Educação. Complementa que a prática docente é tanto cognitiva como
afetiva e que os professores estão constantemente experienciando diversas emoções ao mesmo
tempo, já que seu trabalho é permeado pelas relações. Assim, acredita que (p. 214):
A compreensão emocional que surge quando os professores estabelecem vínculos com
os alunos e fazem desses vínculos o suporte da aprendizagem cria condições propícias
para a aprendizagem e para resultados acadêmicos de alto nível, gera sentimentos de
satisfação e bem-estar profissional nos professores, transforma a tarefa educativa numa
aventura comum, vitaliza os fazeres do ensinar.
Araújo (2003) explicita que a afetividade é uma das dimensões que constituem o
psiquismo humano, juntamente com as dimensões biológica, cognitiva e sociocultural, bem
como as dimensões da consciência e do inconsciente. Nesta lógica, a dimensão afetiva é
constituída pelas emoções e pelos sentimentos, bem trabalhado por Mosquera e Stobäus (2006).
Metodologia
Relataremos, a seguir, os elementos que consideramos mais relevantes nas pesquisas de
Mendes (2011), quanti-qualitativa, e de Zacharias (2012), quantitativo, em que aplicaram o
Instrumento para Avaliação das Variáveis que Constituem Indicadores do Bem/Mal-estar
Docente (JESUS, 1998), respectivamente, com 30 docentes em uma escola municipal e 22
professores de três escolas estaduais, todas localizadas no município de Porto Alegre. Jesus
(1996), em sua tese de doutorado, aplicou este instrumento na fase de sua elaboração, em
professores e potenciais professores portugueses dos ciclos finais do ensino básico e secundário,
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em Coimbra, Portugal, com 16 variáveis, sendo que a autora aplicou quatro delas que serão
descritas a seguir. A análise dos resultados quantitativos foi realizada com Estatística Descritiva.
A avaliação do projeto profissional indica o grau em que o professor deseja continuar
exercendo a profissão docente, quanto maior for o resultado maior a orientação para seguir na
profissão docente.
A avaliação da motivação intrínseca indica o grau de motivação (satisfação e realização)
do professor em sua atividade de ensino. Segundo Jesus (1996), a motivação intrínseca explica a
satisfação que o sujeito percebe na atividade, vivenciando-a como um fim em si mesmo, sem
sentir necessidade de recompensas externas.
A avaliação do sucesso profissional indica o grau de sucesso alcançado pelo professor
perante a realização de alguns objetivos profissionais, no domínio de relacionamento com os
alunos. As variáveis acima citadas são consideradas indicadoras de bem-estar docente, sendo que
quanto maior a pontuação pode se avaliar que o docente apresenta melhores níveis de bem-estar
na profissão.
A avaliação do estresse profissional indica a intensidade e a frequência de estresse do
professor, ante certas situações com os alunos em aula.
A avaliação da exaustão profissional indica a intensidade e a frequência de exaustão do
professor com relação ao trabalho docente. O estresse e a exaustão profissional são variáveis
classificadas como indicadoras de mal-estar docente, quanto maiores os resultados da pontuação
nestas medidas, maiores também serão considerados os níveis de mal-estar.
Na parte qualitativa, buscando completar com mais dados, Zacharias (2012) entrevistou
cinco professores da escola municipal e cinco educadores das escolas estaduais, utilizando uma
entrevista semiestruturada de Stobäus e Mosquera (2009), contendo as seguintes questões: que
aspectos positivos você destaca em sua atuação como docente? Que aspectos negativos você
destaca em sua atuação como docente? Que dificuldades você destaca como causadoras de
algum grau de mal-estar em relação a sua atuação como docente? Que satisfações você destaca
como causadoras de algum grau de bem-estar em relação a sua atuação como docente? Para
examinar os dados desta etapa foi utilizada a Análise de Conteúdo de Bardin (2010).
Foram convidados a participar do primeiro estudo (MENDES, 2011), são docentes de
uma escola municipal pesquisada, localizada em um bairro periférico da cidade de Porto Alegre,
que funciona nos três turnos, atendendo aproximadamente 1300 alunos, tinha um corpo docente
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de 96 professores em 2010. O grupo de 30 docentes têm entre 28 e 64 anos de idade, com uma
idade média de 48 anos. Eles têm, em média 16 anos de ingresso na Prefeitura Municipal de
Porto Alegre, e em média 12 anos de atuação na escola.
O segundo grupo, de 22 docentes (ZACHARIAS, 2012), pertence a três escolas estaduais
envolvidas na pesquisa estão localizadas na região central do município de Porto Alegre e
funcionam em nível de Educação Infantil (EI) e/ou de Ensino Fundamental (EF), durante dois
e/ou três turnos. A maioria do alunado é de classe baixa. Das três escolas participantes, 22
docentes realizaram a pesquisa, dos quais três (13,63%) estão entre 26 e 30 anos de idade, quatro
(18,18%) entre 31 e 39 anos, onze (50%) entre 43 e 50 anos e quatro (18,18%) entre 51 e 57
anos. Com relação ao tempo de serviço, sete (31,81%) possuem de 1 a 5 anos de serviço, cinco
(22,72%) possuem de 9 a 12 anos de serviço, seis (27,27%) possuem de 17 a 25 anos de serviço
e quatro (18,18%) possuem de 27 a 35 anos de serviço.
Para melhor endender a síntese realizada apósa s discussões, organizamos os resultados
da pesquisa na Tabela 1 (em Anexo), que apresenta as médias obtidas nos estudos de Portugal,
de Jesus (1998), e os em Porto Alegre, de Mendes (2011) e Zacharias (2012), buscando
contrastar estes dados obtidos.
No projeto profissional, a média obtida por Mendes (2011) foi 1,13% mais elevada que
a de Jesus (1998), indicando que estes docentes demonstram que desejam permanecer na
profissão. No estudo de Zacharias (2012) a média encontrada foi 20,63% mais baixa que a média
de Jesus, indicando que estes professores apresentam um menor desejo em desempenhar a
profissão docente.
Na motivação intrínseca, a média constatada por Mendes (2011) foi 8,32% maior do que
aquela encontrada por Jesus (1998), indicando uma maior motivação intrínseca nos docentes
brasileiros. Por seu turno, Zacharias (2012) obteve uma média 8,14% mais baixa que a média de
Jesus, identificando, nestes educadores, uma menor motivação intrínseca para a atividade de
ensino.
No sucesso profissional, Mendes (2011) encontrou uma média 5,79% maior daquela
constatada por Jesus (1998). Zacharias (2012) também encontrou um percentual mais elevado
(4,6%), indicando que os professores brasileiros avaliam de forma mais positiva seu sucesso
como docente, quanto à realização das metas profissionais, do que os docentes portugueses.
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Nas entrevistas com cinco professores da escola municipal (MENDES, 2011, p. 85)
encontramos falas que podem relacionar-se à variável projeto profissional, como por exemplo,
“e acreditar que sou um agente de mudança social”. Também demonstraram a sua motivação
intrínseca para a profissão docente nas entrevistas, como por exemplo, “[...] acredito no que eu
faço, acredito no futuro e acho que a educação ainda vai mudar este país [...]”. Em relação ao
sucesso profissional relataram que, por exemplo, “me faz muito bem perceber o aluno melhor em
relação a si mesmo, nem que seja um dedinho”. Entendemos que estas citações puderam
complementar os dados obtidos nos questionários.
Os professores das escolas estaduais (ZACHARIAS, 2012, p. 113) indicam menor desejo
de permanecer na profissão docente e baixa motivação intrínseca, como mencionado nas
entrevistas, “[...] o salário que é miserável, que tu não consegue nem te alimentar”; também é
citada a falta de infraestrutura, “[...] isso é um impedidor, falta de recursos em todos os aspectos
na escola”; além disso, a demanda de alunos que necessita de atendimento especializado, “[...]
tu está dentro de sala de aula, tu está dentro da escola, está tentando auxiliar, mas tu vê que
aquele auxílio não basta para o desenvolvimento da criança”. Já a variável sucesso profissional
é percebida de forma positiva pelos professores, a de “ver o resultado do aluno e encontrá-los,
posteriormente, em profissões de grande atuação na sociedade [...] a gente percebe a atuação
do aluno e o aproveitamento daquilo que foi ensinado”.
No estresse profissional, a média obtida por Mendes (2011) foi 17% mais elevada que a
média de Jesus (1998), também a média de Zacharias (2012) resultou 18,47% maior, indicando
que os docentes brasileiros apresentam um alto nível de estresse profissional.
Na exaustão profissional, a média obtida por Mendes (2011) foi 29,4% mais elevada que
a média de Jesus (1998), como também Zacharias (2012) encontrou 37,9% maior exaustão nos
professores brasileiros, indicando que estes apresentam um alto nível de exaustão profissional.
Em relação a este estudo acreditamos que os altos índices apresentados pelo grupo nas variáveis
estresse e exaustão profissional, estão envolvidos com a questão social dos alunos aos quais os
docentes brasileiros atendem. Os estudantes têm uma condição social bastante carente e
necessitando de atendimentos e ajudas, nas áreas da assistência social e da saúde, as quais nem
os professores nem a escola podem dar, gerando uma sobrecarga e frustração que pode se
transformar em estresse e exaustão.
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Segundo Codo (1999), os professores têm, por princípio, esta característica de querer
resolver „tudo o que podem‟ pelos seus alunos, gerando uma expectativa grande que, ao longo do
tempo, pode transformar-se em burnout. O burnout pode ser considerado como o mal-estar
docente em sua manifestação mais aguda e crônica (ESTEVE, 1994).
Quanto às entrevistas, podemos refletir que, apesar de complementares e mesmo sendo
poucas, permitem dizer que os docentes da escola municipal relataram terem diversos sintomas
de mal-estar, tais como: ansiedade, frustração, adoecimento, somatização, desgaste/cansaço
físico, desgaste/cansaço mental, depressão, febre, sobrecarga, e fadiga (MENDES, 2011). Já os
docentes das escolas estaduais mencionam sentirem esgotamento, desgaste emocional e mental,
sobrecarga, e cansaço (ZACHARIAS, 2012). Estes sintomas já foram identificados por Esteve
(1994), e podemos relembrá-los: esgotamento, ansiedade, estresse.
Jesus (1998) propõe que, a partir das médias calculadas em seu estudo, baixas nas
variáveis de bem-estar e altas nas variáveis de mal-estar, os docentes podem favorecer sua
situação profissional e pessoal, participando do Programa de Formação para Prevenção do Malestar Docente, com o intuito de, com a formação continuada, instrumentalizar professores a lidar
melhor com seu cotidiano, minimizando ou prevenindo a ocorrência de mal-estar. Este aspecto
também fo encontrado no trabalho de Sampaio (2008), quando utilizou Oficinas.
Comentários Finais
Para podermos fechar sobre nossas discussões, tentaremos comentar através de
considerações de autores eu nos permitem melhor entender a temática, além de posicionamentos
nossos. Verificamos que os professores que foram pesquisados por Mendes e Zacharias
apresentam altos níveis de mal-estar nas variáveis analisadas, embora tenham índices que
demonstram seu desejo por permanecer na profissão docente por mais tempo, e avaliarem
positivamente seu sucesso profissional. Podemos, aqui, considerar que as modificações
necessárias à melhoria do trabalho destes docentes perpassa os diversos setores responsáveis pela
Educação, assim como por eles mesmos, pois constatamos que são autores de suas próprias
escolhas no âmbito profissional e pessoal, que necessitam e merecem apoios.
Para tanto, o que aqui podemos propor são algumas modificações que podem ser
realizadas no âmbito coletivo e individual para qualificação do trabalho docente.
Modificações nas condições de trabalho docente
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Pensamos que a prevenção é o mais importante, se não for possível, contamos em
detectar precocemente e agir para a minimização do mal-estar docente. Outras medidas de
intervenção que podem ser tomadas também por outros setores responsáveis pela Educação, para
que se possa oferecer suporte ao trabalho do professor e qualificar o processo de ensino que
promove, com reflexos em melhores níveis de aprendizagem de seus alunos. Neste sentido,
acreditamos ser fundamental a implementação de melhorias das condições de trabalho, de
mudanças curriculares nos cursos de Licenciatura, e, principalmente em o docente entender,
utilizar e ter condições várias par efetivamente realizar, ao longo de toda sua carreira, uma
formação continuada docente (vontade, apoios, salários, tempos, contextos, férias, trabalhos em
equipe, entre tantas outars formas).
Schwartzman (2005) explica que os recursos destinados à Educação estão enviesados
para o Ensino Superior, devendo, portanto, haver uma melhor distribuição destes recursos. Desta
forma, priorizando os investimentos dos recursos para a Educação Básica, seria possível
melhorar as condições de infraestrutura na escola pública e aumentar o salário dos professores, o
que contribuiria para a otimização do ambiente escolar. Isto são as denominadas políticas
públicas.
Em relação à questão salarial, Esteve (1994) destacava bem que pesquisas comprovam
que os salários aparecem como o principal motivo de insatisfação, estresse e vontade de
abandonar a profissão, ou seja, os baixos salários contribuem para o desgaste da docência.
Portanto, o aumento dos salários dos professores é essencial para que os mesmos se sintam
motivados e valorizados, melhorando, assim, a qualidade do ensino.
Com relação às mudanças curriculares nos cursos de Licenciatura, mesmo na Europa,
com mudanças recentes incentivadas na „Comunidade do Euro‟, já salientava Jesus (2002) que o
processo de formação de professores deveria ser (re)orientado segundo um modelo relacional,
voltado para o desenvolvimento de qualidades pessoais e interpessoais, constituindo uma
oportunidade para o autoconhecimento do futuro educador, ajudando-o a descobrir e a identificar
o seu estilo de atuação, bem como outros estilos alternativos. Lembremos das relações afetivas.
Para a formação continuada, Jesus (2007) relata sobre um curso de prevenção do malestar docente, que foi aplicado em 26 professores do ensino secundário que se voluntariaram a
participar, desenvolvido em 10 sessões, totalizando 30 horas de duração (3 horas/sessão),
mostrou que alguns indicadores de bem/mal-estar profissional, que foram avaliados na fase
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inicial e final do curso, modificaram-se positivamente, constatando que houve uma diminuição
expressiva do estresse profissional, das crenças irracionais e um aumento da motivação e da
percepção subjetiva de bem-estar profissional. Este programa é um exemplo positivo de
formação em serviço de professores, pois colaborou com o enriquecimento de concepções de
sucesso e bem-estar profissional e com o desenvolvimento da reflexão e do autoconhecimento.
Novamente ressaltamos os achados de Sampaio (2008) e Sampaio e Stobäus (2009, 2010), que
permaneciam após dois anos da realização das Oficinas.
Modificações no âmbito pessoal do professor
Apesar das complexas adversidades presentes no ambiente escolar, o educador pode
experienciar bem-estar na profissão docente, desde que saiba encarar positivamente muitas das
situações adversas que apresentam-se. Portanto, pensamos que o investimento do docente em
elementos como a afetividade pode auxiliar o mesmo para que saiba lidar melhor com estes
momentos conflitantes, o que contribui para o seu bem-estar.
Mosquera e Stobäus (2008, p. 77) comentam que um educador que deseja buscar uma
educação para a afetividade deve ter um maior respeito pelo próximo e uma maior capacidade de
escutá-lo e de compreendê-lo. Ademais, deve “[...] desenvolver uma personalidade mais
saudável, estabelecer melhores relações interpessoais”. Lembremos de momentos de ócio e lazer,
relações interpessoais sadias, colocadas por Mosquera e Stobäus (2006).
Mosquera (1978) salientava, a partir de sua Tese de Doutorado, que a afetividade propicia
aprendizagens mais duradouras e especulava que parte do fracasso da escola deve-se ao fato de
não serem trabalhados e desenvolvidos os aspectos afetivos pelos „atores‟ de toda a escola.
Também Jesus (1996) comenta que diversos estudos vêm considerando que a relação com
os alunos é um fator relevante para a realização e satisfação profissional dos educadores, ou seja,
contribui para uma otimização do trabalho docente.
Neste sentido, concordamos com Zacharias (2012, p. 56), quando afirma que “[...]
trabalhar a dimensão afetiva nas escolas torna-se indispensável, pois proporciona a construção de
vínculos afetivos saudáveis entre professor e aluno, potencializa o processo de ensino e de
aprendizagem, e contribui para que sejam criadas condições favoráveis ao docente durante sua
prática pedagógica”. Ao estarmos na escola, aqui em um sentido amplo, devemos nos dar conta
que lidamos com pessoas (alunos), com seu lado cognitivo, afetivo e social, mas também os
outrso (funcionários, pais, e sem dúvida os docentes), em um contexto (sociedade).
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Referências
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Anexo
TABELA 1 – Médias das variáveis de mal/bem-estar docente de Jesus (1998) e deste estudo
Avaliação do projeto profissional
4,413
Médias
Mendes
(2011):
4,46
Avaliação da motivação intrínseca
22,462
24,33
20,63
Avaliação do sucesso profissional
26,943
28,5
28,18
Avaliação do estresse profissional
317,594
384,53
376,27
Avaliação da exaustão profissional
428,783
607,33
591,31
Variáveis:
Médias Jesus
(1998):
Fonte: Mendes, Zacharias, Mosquera, Stobäus e Jesus (2012)
Junqueira&Marin Editores
Livro 2 - p.003007
Médias
Zacharias
(2012):
3,5
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mal/bem-estar docente em escolas públicas de porto alegre